revista brasileira de comercio exterior e 124 · diretamente o importador, exigem processos de...

19
vista da FUNCEX Julho/Agosto/ Setembro de 2015 124 .............................................................................................................................................................................................................................. .................................................................................................. . . AO COMÉRCIO EXTERIOR O desafio da inovação Promoção do comércio exterior brasileiro Brasil: perspectivas e desafios EMPRESAS INDUSTRIAIS ESTRANGEIRAS Desempenho exportador no Brasil E Revista Brasileira de Comercio Exterior

Upload: others

Post on 25-Oct-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

vista da FUNCEX

Julho/Agosto/Setembro

de 2015

124

....................................................................................................................................................................................................................................

....................................................................................................

....

AO COMÉRCIO EXTERIOR

O desafio da inovação

Promoção do comércio exterior brasileiro

Brasil: perspectivas e desafios

EMPRESAS INDUSTRIAIS ESTRANGEIRASDesempenho exportador no Brasil

ERevista Brasileira de Comercio Exterior

Page 2: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

1 8 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Henrique de Azevedo Ávila é Doutor em Administração de Empresas pelo Instituto de

Pós-graduação e Pesquisa em Administração da UFRJ (Coppead) e

chefe de Departamento da Área de Comércio Exterior do BNDES

Fabricio Bianchi Catermol Cunha é Doutor em Economia pelo Instituto de Economia (IE/UFRJ)

e gerente da Área de Comércio Exterior do BNDES

Augusto Cesar Arenaro e Mello Dias é Doutor em Administração de Empresas pelo IAG-Escola de Negócios

da PUC-Rio e gerente da Área de Comércio Exterior do BNDES

Financiamento

O crédito oicial à exportação é uma atividade de Estado inerente a todas as economias industrializadas do mundo. A premissa básica para este apoio é que as exportações são um elemento fundamental para o desenvolvimento de um país. Atua-se em nichos nos quais não existe o mercado privado, por diversos motivos que podem envolver vo-lumes e prazos diferenciados, com o objetivo de gerar exportações que não seriam possíveis sem o apoio oicial. As chamadas Agências de Crédito à Exportação (ACEs) proveem crédito às operações das empresas com o objetivo de gerar emprego e renda em seus países de origem.

O ambiente competitivo para uma empresa é fortemente seletivo, e a realização de vendas fora do mercado domésti-co, sem a correspondente oferta de inanciamento para seus clientes importadores, torna-se inviável principalmente em setores de maior conteúdo tecnológico e/ou que precisam de grandes volumes de recursos e maior prazo de pagamento. O crédito é particularmente relevante na comercialização de aeronaves, embarcações, máquinas de grande porte, além de bens e serviços para projetos de infraestrutura. O inanciamento em condições equânimes em relação aos concorrentes internacionais é uma parte tão essencial no processo de decisão de compra pelo importador quanto a qualidade do bem embarcado ou serviço prestado.

No Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é a principal fonte de inan-ciamento de longo prazo para as operações de comércio exterior, e o Fundo de Garantia à Exportação (FGE), vinculado ao Ministério da Fazenda, é o único instrumento público garantidor de inanciamentos de longo prazo às exportações. Neste sentido, faz-se necessária a relexão sobre formas inovadoras de apoio ao comércio exterior, visando à expansão da presença das empresas brasileiras no cenário internacional, principalmente para outros países emergentes e em desenvolvimento, onde a competitividade destas empresas é mais evidente.

Este artigo tem por objetivo destacar a atuação conjunta entre instituições públicas e privadas, de diferentes países, na estruturação de inanciamentos ao comércio exterior. Essa é a uma das principais lacunas do sistema brasileiro, que conta com poucas fontes de funding de longo prazo e baixa participação de coinanciamentos com instituições internacionais. Assim, pretende-se indicar caminhos para superar tais obstáculos.

Henrique Avila Fabricio Catermol Augusto Dias

Financiamento ao comércio exterior: o desaio da inovação e implicações para o caso brasileiro

Page 3: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

1 9Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Para o desenvolvimento do tema, este artigo está di-vidido em três seções. Na primeira, é apresentado um breve relato das mudanças que estão sendo observadas no mercado de crédito à exportação. A segunda seção do artigo destaca a relevância da atuação conjunta entre bancos privados, ACEs e organizações multilaterais. Na terceira seção, enfatizam-se os programas de conirma-ção de cartas de crédito capitaneados por organizações multilaterais. Por im, são apresentadas as conclusões e implicações para o sistema público de apoio às exporta-ções no Brasil.

FINANCIAMENTOS AO COMÉRCIO EXTERIOR: NOVOS MODELOS E ATORES EM CENA

Por deinição, os inanciamentos ao comércio exterior estão relacionados a uma operação comercial interna-cional estabelecida entre um exportador e um importa-dor, em razão da venda de bens e/ou serviços (OECD, 2014a). As duas principais modalidades são:

• Buyercredit, quando se celebra contrato de inancia-mento que formaliza crédito direto ao importador; e

• Supplier credit, quando títulos de crédito irmados entre exportador e importador são posteriormente repassados ao banco inanciador como meio de re-pagamento e/ou garantia do crédito concedido.

A modalidade buyer credit aplica-se particularmente a situações em que o valor do inanciamento é mais ele-vado. As operações são analisadas caso a caso, podendo atender estruturas especíicas de garantia e desembolsos.

Desta forma, resultam em custos de transação mais ele-vados, haja vista a necessidade de preparação de contra-tos, e por terem condições diferenciadas e envolverem diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015).

A modalidade suppliercredit, por sua vez, ao exigir ape-nas a apresentação ao banco inanciador de títulos ou documentos equivalentes, visando ao seu desconto, per-mite processamento mais rápido e menos custoso, sendo por excelência a alternativa adotada nos casos de menor valor e quando um curto prazo de inanciamento já se mostra suiciente para atender às necessidades do impor-tador.

Em seu modusoperandi tradicional, os inanciamentos ao comércio exterior normalmente são cobertos por garantias emitidas por bancos comerciais ou por segu-ro provido por uma ACE. Nessa modelagem simples, o pressuposto é que se tenham mecanismos de garantia e seguro com amplo apetite de risco e solvência inancei-ra inabalável, bem como canais apropriados para a sua execução.

Não obstante, com o crescimento dos luxos de comér-cio junto a países emergentes e em desenvolvimento, os inanciamentos à exportação vêm se diversiicando nas últimas décadas, passando a assumir conigurações dis-tintas, na medida em que surgiu a necessidade de se cria-rem estruturas adequadas a ambientes de maior risco. Neste cenário, as ACEs vêm pleiteando regras de atu-ação mais lexíveis junto a seus governos, organizações multilaterais vêm lançando programas de apoio ao co-mércio exterior, os próprios bancos comerciais têm de-senvolvido soluções inovadoras em busca de mitigação de riscos e otimização de seus luxos de recursos, e inves-tidores institucionais têm demonstrado apetite para tí-tulos emitidos por empreendedores à frente de parcerias público-privadas (PPPs) e estruturas de project inance.

Diferentes métodos e abordagens têm sido introdu-zidos, de acordo com as condições especíicas de cada transação, buscando ancorar os inanciamentos, não só no limite de crédito dos empreendedores e no risco so-berano do país importador, mas também em estruturas que procuram extrair valor do relacionamento global dos empreendedores com instituições inanceiras de na-tureza diversa. De modo geral, as novas abordagens tra-tam o empreendimento onde os bens e serviços impor-tados serão alocados, assim como seu ambiente, como um todo único. Instrumentos como títulos corporativos emitidos no mercado de capitais, swaps negociados no mercado bancário, recebíveis e veículos característicos

Page 4: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

2 0 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

de operações de projectinancetambém vêm sendo uti-lizados para viabilizar inanciamentos ao comércio exte-rior em contextos menos favorecidos.

O modelo singlelender-singleborrower-singleguarantornaturalmente se mantém como solução de maior eco-nomicidade para transações entre empresas com grau de investimento, assediadas por bancos de primeira li-nha, notadamente quando envolvem bens de consumo ou equipamentos com retorno de curto prazo. Todavia, para empresas de menor porte que atuam em mercados de maior risco, esse modelo diicilmente se mostra ei-ciente, tendo em vista as condições inanceiras e os cola-terais habitualmente impostos. Some-se a isto a grande volatilidade vivenciada pelo sistema inanceiro interna-cional nos últimos anos e algumas questões regulatórias decorrentes das regras de Basileia III. Esses fatores, to-mados em conjunto, têm levado as instituições inan-ceiras a se comportar de forma mais conservadora e a adotar regras prudenciais mais rígidas (Auboin e Enge-mann, 2013).

Nesse ambiente, começa-se a observar até o crescimento da presença de instituições não bancárias como novos entrantes na indústria de inanciamento às exportações, especialmente em operações lastreadas por recebíveis. Destacam-se nessa categoria Fundos de Investimento interessados em incluir em suas carteiras ativos vincula-dos a exportações (ICC, 2014b).

A Tabela 1 apresenta o volume de novos negócios de médio e longo prazo obtidos pelas entidades partici-pantes da Berne Union em 2013 e 2014, evidenciando a relevância que assumiram países emergentes e em de-senvolvimento.

A resposta da indústria de exportinance a esses novos de-saios tem sido apoiada em três pilares: compartilhamen-to de risco, coinanciamento e diversiicação de moedas. As próprias ACEs ampliaram suas operações de ressegu-ro com seguradoras privadas para acomodar casos que excedam os limites de risco ixados (Berne Union, 2013). A Agência Multilateral de Garantia de Investimentos – Multilateral Investment Guarantee Agency (Miga) do Grupo Banco Mundial, por sua vez, vem trabalhando ativamente nos países de risco mais alto mirando a cons-tituição de parcerias com provedores de seguro públicos e privados que possam abrir limite adicional para clien-tes e governos (Miga, 2014). Intensiicaram-se, portan-to, esforços no sentido de criar novos produtos e ampliar os mecanismos de cooperação entre bancos comerciais, ACEs, seguradoras e novos partícipes, como as organiza-ções multilaterais (Global Policy Journal, 2015).

Uma rápida análise dos mais recentes Relatórios Anuais divulgados por diferentes ACEs deixa evidente esse mo-vimento de compartilhamento de operações.

O Export-Import Bank of he United States (US Ex-Im) vem se articulando com outras ACEs no intuito de ampliar suas operações de parceria. Apenas em 2013, a instituição estruturou, em conjunto com a Nippon Export and Investment Insurance (Nexi) japonesa, su-porte inanceiro para a exportação de 35 aeronaves de grande porte, viabilizando inanciamentos no montante de US$ 4 bilhões para 14 diferentes companhias aére-as e empresas de leasing localizadas na África, América Latina, Europa, Oriente Médio e Rússia, entre outras regiões (US EX-Im Bank, 2014). Igualmente mereceu destaque em 2013 o apoio do US Ex-Im à exportação de equipamentos e serviços destinados à expansão da planta da Global Foundries na Alemanha, que alcançou US$ 1,03 bilhão como parte de uma operação total de US$ 2 bilhões, a qual contou simultaneamente com a participação da holandesa Atradius e da Nexi.

A necessidade de atuar de forma mais proativa, lexível e eiciente, com foco na construção de soluções inova-

TABELA 1NOVOS NEGÓCIOS DE MÉDIO E LONGO PRAZO

FINANCIAMENTOS E SEGUROS DE CRÉDITO EMITIDOS (EM US$ MILHõES)

País 2013 2014

Estados Unidos 10.670 13.229

Argentina 377 10.417

Bermudas 2.506 7.899

Turquia 7.716 7.160

China 4.345 6.762

Arábia Saudita 6.284 6.512

Etiópia 1.536 5.659

Rússia 6.820 5.450

Emirados Árabes 3.594 4.533

Índia 4.609 4.474

Outros 111.468 92.501

Total 161.938 166.610

Fonte: Berne Union Statistics, 2010-2014.

............................................................................

Financiamento

Page 5: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

2 1Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

doras, passou a ser o objetivo principal da britânica UK Export Finance (UKEF e ECGD, 2015). Dentre os produtos inovadores estruturados pela ACE em 2014, destaca-se a garantia oferecida para bônus emitidos se-gundo a lei islâmica (sukuk), que respaldaram a venda de aeronaves Airbus para a companhia aérea Emirates, assim como o início de operações denominadas na moe-da chinesa, o renminbi (RMB).

Financiamentos atrelados à moeda chinesa também fa-zem parte do portfolio de inovações da ACE alemã Kf W Ipex-Bank, que, em 2014, realizou inanciamentos no montante de RMB 100 milhões, equivalentes a € 12 mi-lhões, para a expansão das plantas da Bosch e da Siemens Hausgeräte GmbH (BSH) na China (Kf W Ipex-Bank GmbH, 2015). A agência alemã igualmente ressalta o uso de títulos mobiliários e bonds como elemento de opera-ções estruturadas. Em termos de parcerias, o destaque em 2014 foi a operação para o projeto eólico da holandesa NOP Agrowind, no montante de € 350 milhões, na for-ma de um sindicato de bancos, que envolveu o Europe-an Investment Bank e o Rabobank. A instituição vem participando de consórcios de bancos internacionais em diferentes situações, e no âmbito de suas parcerias tem se tornado crescente a presença de investidores institu-cionais, como nos casos de PPPs, em que a companhia empreendedora emite bonds no mercado de capitais.

No tocante à italiana Sace, ressaltam-se operações inti-tuladas reverse factoring baseadas em recebíveis emiti-dos contra clientes no exterior, tanto do setor público como do setor privado, que se estendem a fornecedores de grandes grupos industriais do país com a inalidade de otimizar os luxos de pagamento ao longo da cadeia produtiva. Os números impressionam: em 2014, a Sace Factoring contabilizou aproximadamente € 2,7 bilhões com lastro em recebíveis, pulverizados junto a 3.355 de-vedores (Sace, 2015).

Até mesmo a canadense Export Development Cana-da (EDC), que estrategicamente sempre se posicionou como instituição provedora de inanciamentos e garan-tias para suprir lacunas e atender situações para as quais o mercado inanceiro privado não apresenta lastro e apetite de risco em níveis suicientes, passou a reconhe-cer a oportunidade de se adotar uma “abordagem que privilegie parcerias”, de modo a somar suas habilidades e propensão a assumir riscos com a capacitação do setor privado no intuito de ampliar sua lexibilidade e capila-ridade em prol de seus clientes (EDC, 2015).

Nas duas próximas seções são apresentados outros exemplos de operações com características inovadoras,

demonstrando-se que essa realidade se aplica não só às operações ditas estruturadas, tradicionalmente forma-tadas como buyer credits, como também às operações lastreadas por títulos de crédito bancários, classiicadas como suppliercredits.

INOVAÇÃO NAS OPERAÇÕES BUYER

CREDIT: ATUAÇÃO CONJUNTA ENTRE ACEs E PARCERIAS COM O SETOR FINANCEIRO PRIVADO

A criação por diferentes países, de agências públicas voltadas à promoção de suas respectivas exportações não implica necessariamente que o seu funcionamento ocorra de forma isolada. Seria um equívoco tal conclu-são, como se as agências atuassem em um ambiente de competição pura de soma zero entre os países. Além de se articularem, por deinição, com bancos privados, provedores de funding para os inanciamentos por elas garantidos, as ACEs atuam cada vez mais por meio de parcerias entre si. Não é raro o caso em que um projeto de grande porte necessite de um pool de instituições i-nanciadoras e garantidoras para a sua consecução. Tais projetos usualmente envolvem grandes volumes de re-cursos e o fornecimento de bens e serviços de diversos países, o que reforça a necessidade de as agências traba-lharem conjuntamente.

A complementariedade produtiva é um aspecto relevan-te na deinição dos inanciamentos, pois os mandatos das ACEs pelos seus respectivos Estados estão relacio-nados à expansão das atividades de suas empresas nacio-nais, e não apenas a atratividade inanceira da operação é levada em consideração. O objetivo fundamental da busca por novas formas de estruturação dos inancia-mentos é viabilizar as exportações dos países ofertantes do crédito. A Figura 1, na página seguinte, apresenta a estrutura típica de uma operação buyercredit com múl-tiplos participantes.

Exemplos são fartos, embora uma sistematização seja diicultada pela divulgação parcial das atividades dos bancos comerciais e das ACEs. Em junho de 2015, por exemplo, a coreana K-sure e a norueguesa Garanti-Insti-tuttet for Eksportkreditt (Giek) assinaram contrato para a cobertura de inanciamento destinado à construção de um navio no montante de US$ 178,5 milhões pela Hyundai Heavy Industries, para a empresa Edda Fortis na Noruega. A empresa é fornecedora de acomodações em alto mar, por meio de navios-moradia, tal como para

Page 6: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

2 2 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Financiamento

trabalhadores embarcados em plataformas de petróleo. Em 2011, as duas agências assinaram um Memorando de Entendimento para ampliar sua cooperação, devido ao fato de a Marinha Mercante na Noruega ser cliente tradicional de estaleiros coreanos. A operação contou com inanciamentos do DNB Bank, Sparebank e ABN Amro e garantia das duas ACEs.

Quando há o fornecimento de bens oriundos de fabri-cantes de diferentes países a projetos em terceiros mer-cados, a participação conjunta das ACEs segue lógica similar. Exemplo recente pode ser visto na transação anunciada em março de 2015, com a conclusão do pa-cote de inanciamento no valor de £ 720 milhões para o

fornecimento de 1.064 locomotivas pela General Elec-tric (GE) e Bombardier para a Transnet, operadora sul-africana de ferrovias. Os motores serão fornecidos pela Motor & Turbine Union (MTU), empresa do grupo Rolls-Royce. A montagem dos vagões ferroviários será realizada localmente e haverá inanciamentos e garan-tias do US Ex-Im e do EDC para as empresas de seus respectivos países. O crédito contará também com re-cursos dos bancos Barclays, Standard Bank, Old Mutual e Investec Bank.

O coinanciamento também pode estar presente quan-do apenas um bem é exportado, contanto que conte com a participação de mais de um país na sua elaboração.

ACE 1

ACE 2

ACE 3

EXPORTADOR 3

EXPORTADOR 2

EXPORTADOR 1

INSTITUIÇÃOFINANCEIRA 1

INSTITUIÇÃOFINANCEIRA 2

INSTITUIÇÃOFINANCEIRA 3

IMPORTADOR /FINANCIADO

Bens e Serviços

Contratos deFinanciamento

Repagamentos

Contratos deGaran as

Avaliações de Risco

Liberações de Recursos

Prêmios deSeguro

ESTRUTURADOR 1

ESTRUTURADOR 2

ESTRUTURADOR 3

ESPECIALISTA 1

ESPECIALISTA 2

ESPECIALISTA 3

Mandatos Mandatos

FIGURA 1ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO BUYER CREDIT COM MÚLTIPLOS PARTICIPANTES

Fonte: Elaboração própria.

............................................................................

Page 7: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

2 3Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Esse é o caso da operação vencedora do DealoftheYear2014 da publicação Trade&ForfaitingReview. Trata-se do primeiro inanciamento à exportação de aeronaves modelo Superjet 100 da fabricante russa Sukhoi para a companhia aérea mexicana Interjet. Foram comerciali-zadas 20 aeronaves (US$ 415 milhões) e, na estrutura do inanciamento, o Vnesheconombank as adquiriu e arrendou à companhia aérea. A transação foi liderada pelo Natixis, com a garantia da francesa Coface, da ita-liana Sace e da agência russa Exiar. A cobertura foi de 90% pela Exiar, 100% pela Sace e houve a necessidade de se mudar uma lei na França para que a cobertura da Coface pudesse ser também de 100%.

Projetos de grande porte no setor de petróleo e gás são um dos principais nichos de atuação recente das ACEs. Tais empreendimentos envolvem muitas vezes grandes volumes de recursos, prazo longo de maturação e forne-cimento de bens e serviços de diferentes países. Como exemplo, pode ser citado o projeto de produção de gás liquefeito da Australia Paciic LNG, com inanciamen-to total de US$ 8,5 bilhões, que contou com créditos diretos em proporções equivalentes do US Ex-Im (US$ 2,9 bilhões), do China Ex-Im (US$ 2,8 bilhões) e do pool de 16 bancos comerciais (US$ 2,9 bilhões). A em-presa é uma jointventure da australiana Origin Energy, da americana ConocoPhillips e da chinesa Sinopec, sen-do a maior fornecedora de gás natural da Austrália, ten-do como clientes termelétricas, indústrias e residências no sudeste de Queensland. O projeto atual consiste em ampliação dos campos de exploração de gás em Surat e Bowen no centro e no sudoeste de Queensland, a cons-trução de um gasoduto até Gladstone e de uma planta de liquefação com capacidade de processamento de até 9 milhões de toneladas por ano. Da planta de liquefa-ção, o gás será exportado para os mercados da Ásia.

O projeto Ichthys, também na Austrália, tem o valor to-tal de US$ 32 bilhões, dos quais US$ 20 bilhões estão sendo inanciados, sendo os créditos das ACEs corres-pondentes a US$ 16 bilhões. A capacidade inicial de produção será de 8,4 milhões de toneladas de gás natu-ral liquefeito e de 1,6 milhão de gás liquefeito de petró-leo por ano. O gás será transportado de seu local de ex-tração no mar por um gasoduto de 885 quilômetros até a planta de liquefação em terra na cidade de Darwin. O crédito registrado em 2012 diz respeito a garantias con-cedidas pelas agências Nexi (US$ 2,7 bilhões), K-sure (US$ 971 milhões), Atradius (US$ 578 milhões), Euler Hermes (US$ 544 milhões), Kexim (US$ 291 milhões) e Coface (US$ 233 milhões) para inanciamentos de bancos privados, dentre os quais Bank of Tokyo-Mitsu-

bish (BTMU), Sumitomo Mitsui Banking Corporation (SMBC), HSBC e o Commonwealth Bank of Austra-lia (CBA). Além disso, devem ser contratados US$ 5,8 bilhões em inanciamentos diretos do Japan Bank for International Cooperation ( JBIC), Korea Eximbank (Kexim) e da agência australiana Export Finance and Insurance Corporation (Eic).

Um grande projeto no segmento de petróleo e gás que será viabilizado pela participação conjunta de ACEs e bancos comerciais de diversos países é a reinaria Star, na Turquia, com investimento total de US$ 5,6 bilhões. A planta, de propriedade da empresa Socar do Azerbaijão terá capacidade para produzir 10 milhões de toneladas de petróleo bruto por ano e contará com inanciamen-tos de longo prazo no montante de US$ 3,3 bilhões, a serem desembolsados em um total de 8 tranches.

A primeira e maior tranche será de US$ 665 milhões, tendo os bancos BNP Paribas, Crédit Agricole, Deuts-che Bank, ING, KDB, Kf W, Ipex, Mitsubishi UFJ Fi-nancial Group, Natixis, Société Générale e Unicredit como Mandated Lead Arrangers (MLAs). A segunda tranche será de US$ 600 milhões, tendo os bancos Bil-bao Vizcaya Argentaria (BBVA), BNP Paribas, Crédit Agricole, Deutsche Bank, Intesa Sanpaolo, Natixis, So-ciété Générale e Unicredit como MLAs. A terceira tran-che será de US$ 600 milhões, tendo os bancos BBVA, BNP Paribas, Banco Popular Español, Caixabank, Cré-dit Agricole, Deutsche Bank, ING, Société Générale e Santander como MLAs. A quarta tranche será de US$ 445 milhões, a ser concedida pelo Turkiye Garanti Bankasi e garantida pela Sace. A quinta tranche será de US$ 339 milhões, a ser concedida pelo US Ex-Im. A sexta tranche será de US$ 291 milhões, a ser concedida pelo JBIC. A sétima tranche será de US$ 194 milhões, tendo os bancos BNP Paribas (Tokyo), Crédit Agricole (Tokyo), ING Bank (Tokyo) e Mitsubishi UFJ Finan-cial Group, como MLAs. A oitava e última tranche será de US$ 150 milhões, a ser concedida pela EDC. A Socar aportará US$ 1,43 bilhão no projeto, com outros US$ 952 milhões oriundos do Fundo Estatal de Petróleo do Azerbaijão.

O Quadro 1, na página seguinte, apresenta os detalhes da operação, denotando a sua complexidade.

Outro exemplo vem da Reliance Industries, na Índia. Em 2012, a empresa realizou operações distribuídas por créditos do US Ex-Im (US$ 2,1 bilhões), da Euler Hermes (US$ 2,0 bilhões), da Sace (US$ 400 milhões) e da EDC (US$ 50 milhões). Os inanciamentos são

Page 8: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

2 4 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Financiamento

Detalhes da Negociação

BBVA, Crédit Agricole, BNP Paribas, Deutsche Bank,

18 anos

SOCAR

Consultoria:CC Solu ons

Hedge:Na xis, Société Générale CIB

US Ex-Im, JBIC)Financiadora DFI/MFI:Korea Development BankIndústria:

Empreendedores:

Óleo e Gás

Ministry of Economic Development, Azerbaijan;

Tranche 2

Facility cobeta por SACE

Valor:$339 milhões

MLAs:BNP Paribas, Crédit Agricole, ING Bank, MUFG,UniCredit

MLAs:Banco Popular, Banco Santander, BBVA, BNP Paribas, Caixabank, Crédit Agricole CIB, Deutsche Bank, INGBank, Intesa Sanpaolo, KfW IPEX-Bank, Mitsubishi UFJ Financial Group (MUFG), Na xis, Société GénéraleCIB, Turkiye Garanti Bankasi, UniCredit

Prazo:

Valor:$600 milhões

Valor:$194 milhões

MLAs:

Tranche 1 Tranche 4

Facility cobeta por Cesce Facility cobeta por NEXI

BBVA, Caixabank, BNP Paribas, Crédit Agricole,Banco Popular, Deutsche Bank, ING Bank,Santander, Société Générale CIB

Participantes

Bookrunners:BBVA, BNP Paribas, Crédit Agricole CIB, Deutsche Bank, Intesa Sanpaolo, Na xis, Société Générale CIB,UniCredit

Intesa Sanpaolo, Société Générale CIB, Na xis,

MLA:Turkiye Garan Bankasi

Valor:$600 milhões

MLAs:

UniCredit

Tranche 3

Facility cobeta por K-sure

BNP Paribas, Crédit Agricole, Deutsche Bank, INGBank, KfW IPEX-Bank, Korea Development Bank,MUFG, Na xis, Société Générale CIB, UniCredit

Valor:$450 milhões

Valor:$665 milhões

MLAs:

Tranche 5

Emprés�mo direto US Ex-Im

Star RafineriFinanciamento de projeto com apoio de ECA

Turquia

Cesce, K-sure, NEXI, SACE. (As direct lenders: EDC,

Star Rafineri JLT Specialty

Consultor Ambiental:D’appolonia

ACEs:

Financiamento:$3.29 bilhões

Escritório Jurídico:Allen & Overy; Vinson & Elkins

Financiado: Assessoria de Seguros:

Tranche 6

Emprés�mo direto JBIC

$150 milhões

Tranche 8

Emprés�mo direto a prazo Garan� Bankasi

Valor:$291 milhões

Tranche 7

Emprés�mo direto EDC

Valor:

QUADRO 1FINANCIAMENTO ESTRUTURADO PARA A STAR RAFINERI (TURQUIA)

Fonte: TXF Chronicle, 2015.

Page 9: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

2 5Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

destinados à expansão do complexo petroquímico de Jamnagar, no Golfo de Kutch, que inclui a maior reina-ria do mundo. O maior crédito, do US Ex-Im, envolve mais de 65 exportadores americanos e foi estruturado na forma de 50% do total como garantia para recursos do J.P. Morgan e 50% em inanciamento direto, e compre-enderá também a emissão de títulos garantidos pelo US Ex-Im. A garantia da Euler Hermes foi concedida para inanciamento estruturado e sindicalizado pelo Kf W Ipex, junto a bancos privados, em duas tranches iguais, sendo uma em dólares e a outra em euros. Estima-se que haja o envolvimento de pelo menos 40 exportadoras ale-mãs de bens de capital e serviços de engenharia.

A garantia à emissão de títulos era um produto inancei-ro até recentemente associado à exportação de aerona-ves. Pelo instrumento, a companhia importadora emite títulos no mercado de capitais e uma ACE garante o respectivo pagamento de principal e juros ao compra-dor do título. Com isso, a empresa passa a ter acesso aos recursos de longo prazo necessários para a compra dos bens que serão exportados pelas empresas do país da ACE garantidora. A primeira operação de cobertu-ra a títulos pelo US Ex-Im fora do setor aeronáutico foi realizada em uma operação com a Petróleos Mexicanos (Pemex). Em julho de 2012, a empresa completou a emissão de US$ 1,2 bilhão em três ofertas separadas de títulos garantidos pelo US Ex-Im, que contou também com a participação do Goldman Sachs, J. P. Morgan e Crédit Agricole Securities (jointbookrunners). As em-presas fornecedoras dos bens e serviços, que serão com-prados com os recursos originados da transação, estão situadas nos estados do Texas, Louisiana e Califórnia. A utilização do instrumento continua sendo uma fonte de crédito para a empresa.

Em 2014, foram aprovados pelo US Ex-Im mais de US$ 1 bilhão por meio do mercado de capitais para a Pemex, objetivando a compra de bens de capital e serviços ame-ricanos (Trade Finance Magazine, 2012 e Trade & For-faiting Review, 2014).

A britânica UKEF disponibiliza um produto inancei-ro para prover garantia a títulos emitidos por empresas importadoras, sendo notadamente utilizado para a ex-portação de aeronaves pela Airbus. Em abril de 2014, foi lançada uma linha denominada ExportReinancingFacility (ERF), que procura viabilizar o acesso a reinan-ciamentos com taxas competitivas aos importadores após a fase inicial de projetos com funding prestado por bancos comerciais. A agência britânica tem se mostrado mais atuante, tendo renovado o seu portfólio de produ-

tos após a crise de 2008. Em 2014, o orçamento na linha de inanciamentos diretos foi duplicado (para US$ 4,9 bilhões), os limites mínimos e máximos para os valores das operações foram retirados e a taxa de juros foi re-duzida para o patamar mínimo permitido pelas regras internacionais. São realizadas operações bilaterais isola-das, mas o objetivo é a atuação conjunta em coinancia-mentos com bancos privados (Godfrey, 2014).

A realização de empreendimentos com várias fontes de origem dos recursos pode se dar de forma isolada, com o importador obtendo, por conta própria, créditos de forma separada por bancos e ACEs, ou estar incluída em um pacote único.

O US Ex-Im oferta um instrumento denominado one-stop-shop, que traz como vantagem para o importador de bens e serviços de mais de um país a possibilidade de in-cluir as transações em um único pacote e, assim, ter ape-nas um conjunto de documentos, com as condições e procedimentos uniicados para desembolsos e eventual recebimentos de indenizações. A ACE líder provê apoio para toda a operação e negocia o apoio da(s) agência(s) seguidora(s) de forma invisível para o importador. A lí-der estabelece um instrumento inanceiro adicional, em geral resseguro, com a ACE seguidora sobre o valor das exportações cobertas por ela. O US Ex-Im pode ser líder ou seguidor nestes tipos de arranjos. Já existem acordos irmados com as agências de Israel (Ashra), Holanda (Atradius), França (Coface), Reino Unido (UKEF), Canadá (EDC), Austrália (Eic), República Tcheca (Egap), Dinamarca (EKF), Alemanha (Hermes), Japão ( JBIC e Nexi) e Itália (Sace), além de já ter realizado coinanciamentos em casos especíicos com Noruega (Giek), Hungria (H-Exim) e Bélgica (ONDD).

A presença de coinanciamentos também envolve orga-nizações multilaterais, mas a partir de uma perspectiva distinta das ACEs. O foco dos multilaterais está nos efeitos que os investimentos proporcionados pelos i-nanciamentos terão nos países recebedores do crédito (importadores dos bens e serviços), enquanto a princi-pal métrica de desempenho das ACEs está nas exporta-ções geradas nos países de origem do crédito.

No Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o coinanciamento é uma das principais formas de atuação. Em 2014, o BID conseguiu mobilizar re-cursos de terceiros no valor de US$ 2,8 bilhões para esse tipo de inanciamento. Destaca-se o montante de US$ 524 milhões aprovados no âmbito do Fundo de Coinanciamento da China para a América Latina e o Caribe. Outras instituições de destaque nas operações

Page 10: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

2 6 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Financiamento

do BID são a Agência de Cooperação Internacional do Japão ( Jica), o Banco Europeu de Investimento (BEI) e a Corporação para Investimentos Privados Interna-cionais (Opic), incluídas iniciativas de integração in-ternacional e infraestrutura (BID, 2015a). Exemplo desse tipo de inanciamento é a Fase II do Programa de Saneamento da Cidade e Baía do Panamá, no qual houve alocação de US$ 60 milhões de recursos pró-prios do BID, US$ 50 milhões do fundo chinês, US$ 160 milhões da CAF e BEI, além de US$ 71,4 milhões de recursos locais. O objetivo do programa é reduzir o despejo de poluentes na baía e nos rios que cruzam a região metropolitana da cidade, aumentar o percentu-al de tratamento de esgoto e capacitar o Ministério da Saúde local para assegurar a sustentabilidade do siste-ma (BID, 2015b).

O Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) tam-bém coordena e participa de coinanciamentos em grandes projetos de infraestrutura. Em dezembro de 2014, foi concluído o acordo para o inanciamento do projeto de energia eólica em Lake Turkana, Quênia. O projeto, com valor estimado em € 623 milhões, será o maior investimento privado na história do país e foi re-centemente nomeado como o AricanRenewableDealoftheYear2014 pela homson Reuters ProjectFinance International.

O projeto Lake Turkana compreende uma usina de energia de 300 MW, a ser construída e operada pela em-presa Lake Turkana Wind Power Limited, e uma linha de transmissão de 428 km para conectar a usina com a rede elétrica, a ser construída pelo governo do Quênia.

€25m €37.5m

€435m

IFU, NorfundFinnfund

KP&P Aldwych Vestas

Incluindotriodos

EKF The StandardBank of SouthAfrica Limited

AfDBtranches

Cobertura ACEtranches

específicas

BancosComerciais

DFItranche

INSTRUMENTOFINANCEIRO PARAOS INVESTIDORES

CAPITAL

Proparco

FMO

PTA bankNedbankLimited

EIB tranches

DÍVIDA SENIOR

DÍVIDASUBORDINADA

Lake TurkanaWind Power

Limited

EIB como leadfinancier no âmbito

do EU-Africainfrastructure

trust fund

Várias DFIs comofinanciadoras

incluindo DEG,AfDB, PTA bank e

EADB

€150m

€435m

FIGURA 2ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO DO PROJETO DE ENERGIA EÓLICA LAKE TURKANA (QUÊNIA)

Fonte: homson Reuters Project Finance International.

............................................................................

Page 11: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

2 7Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Sendo potencialmente a maior usina de energia eólica da África, o projeto atraiu o apoio inanceiro de diversos bancos comerciais, ACEs e multilaterais, além do pró-prio BAD, BEI, Standard Bank, Nedbank, Netherlands Development Finance Company (FMO), Proparco, Banco de Desenvolvimento do Oeste Africano (Boad), PTA Bank, EKF, Triodos e DEG.

A estruturação inanceira do projeto (ver detalhes na Figura 2) foi liderada pelo BAD, como MandatedLeadArranger, tendo Standard Bank e Nedbank como co-arrangers. O governo dos Países Baixos também conce-deu uma subvenção de € 10 milhões para o projeto, as-sim como a União Europeia (€ 25 milhões), através do EU-Africa Infrastructure Africa Fund (AITF).

Outro grande projeto de infraestrutura que contou com a participação conjunta do BAD com diversos bancos comerciais e organizações multilaterais foi a primeira fase do projeto de energia solar de Ouarzazate, Marro-cos, estimado em € 1,042 bilhão. Aprovado em abril de

2012, com data de conclusão prevista para o segundo se-mestre de 2015, o projeto terá uma capacidade instalada de 500 MW e uma produção estimada de 1.150 GWh/ano. Será o primeiro de uma série de cinco usinas sola-res que terão uma capacidade combinada de 2.000 MW até 2020. Além do BAD, a estruturação inanceira do projeto conta com a participação de outras seis organi-zações multilaterais, incluindo o Banco Mundial, BEI, Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), Banco Alemão de Desenvolvimento (Kf W), Neighbourhood Investment Facility (NIF) da União Europeia, além de outras instituições inanceiras marroquinas (ver deta-lhes na Figura 3).

Na Etiópia, um pacote inanceiro de US$ 865 milhões foi contratado pelo governo do país para a construção de 400 km de infraestrutura ferroviária, em especial o trecho Awash-Woldia. O pacote compreendeu inancia-mento em moldes comerciais combinado com inancia-mentos garantidos por ACEs. A operação representou o maior inanciamento sindicalizado já tomado pelo go-

Financiamento

MASEN

PPA2 PPA1

ONE SPC

Investidores (ONE, SIE, Hassan

II Fund, State)

Carbon Finance

Governo do

Marrocos

Apoio financeiro

concessional

IFIs

(Δ) a ser coberto por GoM,

ou por exportações, se possível

Suporte

do Estado

Masen

Moroccan Agency

for Solar Energy

PPP participantes

SPC

(Solar Power Company)

Dívida refinanciadaCapital (25%)

Capital (75%)

FIGURA 3ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO DO PROJETO OUARZAZARTE (MARROCOS)

Fonte: Banco Mundial.

............................................................................

Page 12: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

2 8 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Financiamento

verno da Etiópia, tendo seus parâmetros calibrados pela curva de risco soberano do país.

O inanciamento comercial, no montante de US$ 450 milhões e prazo de sete anos, envolveu bancos da Europa, África, Oriente Médio e Estados Unidos. O inanciamen-

to garantido por ACEs, no valor de US$ 415 milhões e prazo de 13 anos, foi respaldado pela Swedish Export Credit Guarantee Board – EKN (US$ 83 milhões), Eks-port Kredit Fonden – EKF (US$ 181 milhões) e Swiss Export Risk Insurance – Serv (US$ 151 milhões).

QUADRO 2FINANCIAMENTO ESTRUTURADO PARA A ETHIOPIAN RAILWAYS CORPORATION

Fonte: TXF Chronicle, 2015.

Detalhes da Negociação

Credit Suisse, Deutsche Bank, ING Bank, KfW IPEX-Bank

Financiamento com apoio de ECA

E ópia

Financiamento: (EKN), Swiss Export Credit Insurance (SERV),$865.36 milhões Afreximbank, Svensk Exportkredit (SEK), Export

Ethiopian Railways Corpora on

Credit Bank of Turkey (Turk Eximbank)Financiado:

$83 milhões

Par�cipantes: Par�cipantes:

Tranche 1 Tranche 2

Coordenador:

MLAs:

Indústria: Rail

ACEs: Escritório Jurídico: Clifford Chance

Exportador:Bombardier Sweden

Ethiopian Railways Corpora�on

Participantes

Eksport Kredit Fonden (EKF), Exportkreditnämnden

Credit Suisse

Facility Comercial Facility cobeta por EKN

Valor: Valor:$450 milhões

Facility cobeta por EKF

Valor:$181.36 milhões

AfrAsia Bank, Atlan�c Forfai�erungs, Banque Credit Suisse, Deutsche Bank, ING Bank, KfW IPEX-Credit Suisse, Deutsche Bank, FBME Bank, United Bank, Svensk Exportkredit (SEK)Na�onal Bank, Afreximbank

Tranche 3

MLA:Turkiye Garan�Bankasi

............................................................................

Page 13: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

2 9Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

O coordenador principal da operação foi o Credit Suisse, contando-se também com o apoio do Deutsche Bank, ING Bank e Kf W IPEX-Bank, que orientaram os trabalhos da EKF, EKN e SERV respectivamente. Coube ao Credit Suisse, particularmente, negociar e or-ganizar o conjunto de bancos europeus participantes. A ferrovia está sendo inanciada de acordo com os Princí-pios do Equador, um conjunto de diretrizes que devem ser observadas por instituições inanceiras para que se mitiguem os riscos socioambientais na implementação de grandes projetos de infraestrutura.

O Quadro 2 traz os detalhes da operação, elencando os seus diversos participantes.

Em síntese, conforme evidencia a Tabela 2, vem crescen-do ano a ano a carteira de operações buyercredit estru-turadas em diferentes mercados com ACEs atuando em parceria com outras instituições inanceiras.

INOVAÇÃO NAS OPERAÇÕES SUPPLIER CREDIT: PROGRAMAS DE CONFIRMAÇÃO DE CARTAS DE CRÉDITO COORDENADOS POR ORGANIZAÇÕES MULTILATERAIS

Diversas organizações multilaterais contam com progra-mas inovadores de apoio ao comércio exterior, de modo a alavancar operações com bancos de menor porte esta-belecidos em países de maior risco, ampliando em última instância a base de clientes passíveis de receber inancia-mentos. O objetivo de cada organização multilateral é es-timular os luxos de comércio em suas regiões de atuação, possibilitando que os consumidores ampliem o acesso a bens de consumo essenciais, e as empresas possam im-portar máquinas e equipamentos de modo a assegurar produtividade e qualidade a seus processos produtivos.

TABELA 2RESUMO DAS OPERAÇõES DE FINANCIAMENTO COM A PARTICIPAÇÃO DE ACES

Fonte: Elaboração própria.

Ano Tomador País ACE US$ milhões

2012 Australia Paciic LNG Austrália US Ex-Im e China Ex-Im 5.709

2012 Ichthys LNG Project AustráliaNexi, K-sure, Atradius, Euler

Hermes, Kexim e Coface5.366

2012 Reliance Industries ÍndiaUS Ex-Im, Euler Hermes, Sace

e EDC4.550

2012 Pemex México US Ex-Im 1.200

2012 Masen MarrocosBAD, WB, BEI, KfW e outras

instituições1.150

2014Lake Turkana Wind

Power LimitedQuênia BAD, DEG, BEI, Boad e outras 480

2014 Star TurquiaKDB, KfW, Ipex, JBIC, US

Ex-Im e outras 3.300

2014 Ethiopian Railways Etiópia EKN, EKF e Serv 865

2015 Pemex México US Ex-Im 1.000

2015Panama Sanitation

Program IIPanamá BID, CAF e BEI 341

2015 Edda Fortis Noruega K-sure e Giek 179

2015 Interjet México Coface, Sace e Exiar 415

2015 Transnet África do Sul US Ex-Im e EDC 1.125

............................................................................

Page 14: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

3 0 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Assim, os programas das organizações multilaterais fo-ram criados como medida característica do seu papel desenvolvimentista, no sentido de aumentar a liquidez e reduzir a volatilidade dos mecanismos inanceiros de apoio ao comércio exterior. Diante da crise inanceira de 2008 e de seus desdobramentos nos anos subsequentes, quando houve redução dos luxos de comércio interna-cional em diferentes períodos, as organizações multila-terais decidiram incrementar ainda mais seus progra-mas. Desta forma, eles assumiram também uma função anticíclica, e o seu inquestionável sucesso acabou por le-var as organizações multilaterais a estender sua validade, mantendo-os ativos até hoje.

Note-se que a formulação de produtos inanceiros compartilhados está no DNA das organizações multi-laterais. Essas organizações tradicionalmente procuram atrair bancos comerciais e investidores institucionais para atuarem como co-inanciadores por meio de seus Programas de Financiamento do tipo A/B Loan. Nessa modalidade, a organização multilateral ica responsável pela trancheA do inanciamento, formada com recur-sos do seu próprio orçamento, enquanto as instituições parceiras icam responsáveis pela tranche B. As organiza-ções multilaterais usualmente assumem também o papel de líder e a função de agente administrativo das duas

tranches. O pressuposto, então, é que as instituições parceiras poderão usufruir dos mesmos benefícios que as organizações multilaterais possuem junto a governos, como, por exemplo, imunidades tributárias, status de credor preferencial e isenção de provisões compulsórias, o que, na prática, revelam-se como mitigantes signiica-tivos para aumentar o seu apetite de risco.

Nos programas de apoio ao comércio internacional, o elemento central é a formação de uma rede de bancos comerciais especializados nesse segmento. Celebram-se posteriormente master agreements que têm efeito de contratos “guarda-chuva”, contendo cláusulas que cobrem todos os direitos e obrigações da organização multilateral, seja junto aos bancos emissores, seja junto aos bancos conirmadores dos títulos de crédito que las-treiam as operações. Normalmente, antes da celebração do masteragreement, a equipe da organização multilate-ral gestora do programa realiza duediligences e oferece treinamento para as equipes de back oicedos bancos emissores e conirmadores.

O foco volta-se para transações com importadores pri-vados e o leque de produtos elegíveis é bastante amplo, excluindo apenas produtos de uso restrito, tais como armas e munições. A agilidade no processamento das

FIGURA 4FLUXO TÍPICO DAS OPERAÇõES APOIADAS POR ORGANIZAÇõES MULTILATERAIS

Fonte: Elaboração própria, a partir de apresentações institucionais da International Finance Corporation (IFC).

L/C Stand-by

(Garantia)

Bens Exportados

Exportador

Banco

Internacional

(Confirmador

e/ou

Financiador )

Desconta a L/C

Importador

Organismo

Multilateral

Confirma a L/C

Documentos

Solicita a L/C

Pagamento

Documentos

Pagamento

Documentos

Banco

Local

(Emissor)

L/C em favor do exportador

Master Agreements

Requer a Garantia

............................................................................

Financiamento

Page 15: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

3 1Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

solicitações de crédito e garantia é viabilizada pelo So-ciety for Worldwide Interbank Financial Telecommuni-cation (Sistema Swit) e as questões de natureza jurídica resolvem-se pela Uniform Customs and Practic (UCP 600).

No tocante às modalidades de inanciamento e garantia que podem ser abrigadas nos programas, o escopo usu-almente também é diversiicado: cartas de crédito, letras de câmbio, notas promissórias, inanciamentos pré-em-barque, inanciamentos pós-embarque e garantias con-tratuais (adiantamento de pagamentos, bid e perfor-mance bonds), porém com preponderância da utilização de cartas de crédito - Letter of Credit (L/C).

Os programas trazem vantagens ao criar um padrão uniforme para as operações e facilitar a comunicação entre os participantes, possibilitando que os bancos co-merciais reduzam custos e processem a documentação necessária rapidamente. Embora haja certa competição entre os programas, o mercado é amplo o suiciente para que todas as organizações multilaterais gerem operações relevantes e, sob o ponto de vista dos exportadores e importadores, essa competição é bem-vinda. A Figura 4 apresenta o luxo típico das operações.

A stand-byletterofcreditemitida pela organização mul-tilateral pode eventualmente cobrir até 100% do valor da L/C aberta pelo banco emissor, atraindo, assim, ban-

TABELA 3PROGRAMAS DE CONFIRMAÇÃO DE CRÉDITO DAS ORGANIZAÇõES MULTILATERAIS

Fonte: Independent Evaluation Group (IEG/World Bank, 2013). Nota: ADB = Asian Development Bank; IDB = Inter-American Development Bank.

Organização IFC ADB EBRD IDB

Denominação do Programa

Global Trade Finance Program

(GTFP)

Trade and Finance Program (TFP)

Trade Facilitation Program (TFC)

Trade Finance Facilitation

Program (TFFP)

Início das Operações

2005 2004 1999 2005

Região de Cobertura

Mundo ÁsiaEuropa e Ásia

CentralAmérica Latina e

Caribe

Número de Países Contemplados

91 16 20 20

Número de Transações

11.900 4.236 11.600 1.966

Valor das Transações

(em US$ bilhões)17,0 8,8 9,5 1,96

Número de Bancos Conirmadores

229 em 91 países (+800 se incluídas

as ailiadas)

112 (+400 se incluídas as

ailiadas)

+800 (incluindo-se as ailiadas)

102 em 54 países (268 incluindo-se

as ailiadas)

Número de Bancos Emissores

234 em 93 países 72 102 em 20 países 84 em 21 países

Permite a participação de bancos estatais?

Não Sim Sim

Inadimplência/Perdas

0 02 sinistros;

nenhuma perda0

............................................................................

Page 16: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

3 2 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

cos conirmadores de primeira linha para assumir o ris-co inal da operação. Na hipótese de a stand-by não ser emitida no valor integral, o banco conirmador deverá assumir, se concordar, o risco residual. As operações po-dem ser originadas tanto pelo banco emissor como pelo banco conirmador, sendo então submetidas à organiza-ção multilateral que, por sua vez, se manifesta expressa-mente sobre o percentual de sua cobertura.

A principal vantagem para o banco conirmador é, na-turalmente, contar com o compartilhamento de risco da organização multilateral, sabendo de antemão que aquele determinado banco emissor foi submetido a um rigoroso processo seletivo empreendido previamente. Já para o banco emissor, o programa permite o acesso a uma rede global de bancos conirmadores, possibilitan-do, assim, o aumento de seu volume de negócios.

O primeiro programa foi criado pelo Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento (EBRD), ainda em 1999. Outras organizações foram, a partir de então, seguindo a mesma ideia, e concebendo progra-mas análogos, bem como o seu aperfeiçoamento, foram facilitados pela troca de experiências mútuas. A Tabela 3 apresenta as principais características de cada programa.

Contando com consultoria da IFC, o BAD também lan-çou em 2009 o seu próprio programa, intitulado Trade Fi-nance Initiative (TFI). Entretanto, o programa foi remo-delado em 2013 quando, apesar de receber igualmente a denominação Trade Finance Program (TFP), passou a ser amparado em instrumentos com valor predeterminado e características de certiicado de garantia ou linhas de cré-dito, por meio dos quais as instituições parceiras do BAD se prontiicam a compartilhar riscos ou a prover recursos.

Os programas das organizações multilaterais têm se con-centrado no segmento de commodities, posicionando-se, portanto, como mecanismo para operações de curto prazo. O prazo médio do programa da IFC (GTFP) é, por exemplo, de aproximadamente cinco meses.

Os programas comandados pelas organizações multila-terais abarcam notadamente bancos emissores de carta de crédito sediados em países emergentes, porém têm sido estendidos também a países com baixo grau de desenvolvimento, na medida em que os bancos conir-madores das cartas de crédito possam equacionar a sua exposição e cumprir os requisitos de alocação de capital impostos pelas normas de Basileia.

As organizações multilaterais têm demonstrado clara-mente que incluíram, no conjunto de suas prioridades,

o apoio a operações de comércio exterior, entre outras razões, para facilitar o acesso de empresas de menor por-te a mecanismos de inanciamento, visto que historica-mente apenas grandes empresas vinham conseguindo se beneiciar desses instrumentos.

A plena adimplência constatada nos programas de conir-mação de cartas de crédito deixa evidente que a presença das organizações multilaterais na relação de crédito acaba por estabelecer um comprometimento diferenciado por parte dos importadores e bancos emissores participantes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Lições podem ser aprendidas a partir das estruturas ino-vadoras de inanciamento ao comércio exterior que vêm surgindo no mercado internacional, viabilizando a co-bertura de risco e o acesso a inanciamentos até mesmo para empresas de menor porte.

O fato é que o relacionamento entre ACEs, organizações multilaterais, bancos comerciais, instituições de apoio ao desenvolvimento, investidores institucionais e empreen-dedores, em geral, vem se tornando cada vez mais sois-ticado e complexo, diante do desaio de somar recursos e criar mitigantes que viabilizem a estruturação de inancia-mentos em situações de maior risco comercial e político.

Como resultado de oportunidades de investimento em países com maior endividamento externo e menor grau de maturidade institucional, as organizações atuantes na seara inanceira internacional têm procurado desenvolver formas alternativas de inanciamento que não se resumam a créditos diretos aos importadores ou a títulos providos por bancos comerciais de primeira linha, pela simples im-possibilidade de se contar com instrumentos tão singelos.

Diversas estruturas inovadoras estão ancoradas na combi-nação de diferentes fontes de inanciamento e mecanismos de cobertura de riscos, viabilizando operações, mesmo em contextos de elevada complexidade. Nesse cenário, passou a ser fundamental a elaboração de instrumentos jurídicos que consigam criar comprometimento junto a todos os in-teressados na realização do inanciamento, negociando-se diferentes formas de apoio que possam minimizar perdas e aumentar as possibilidades de recuperação do crédito no caso de insucesso do empreendimento. Com criatividade e capacidade de negociação pode-se buscar amparo, por exem-plo, na legislação tributária do país onde o investimento será realizado, bem como nas regras aplicáveis à execução de ga-rantias, ampliando o leque de situações com risco aceitável.

Financiamento

Page 17: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

3 3Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

Memorandos de Entendimento e cartas de conforto, apesar de não constituírem garantia irme, igualmente têm o seu valor na medida em que haja interesse em se construir uma relação de longo prazo entre credores e devedores. A participação do mercado de capitais tam-bém vem se intensiicando, ampliando as alternativas para se acomodar inanciamentos com taxa de juros ixa ou utilizando moeda local.

Note-se que ações conjuntas entre instituições inanceiras podem proporcionar grandes benefícios. O compartilha-mento de conhecimentos, experiências e capacidade de inovação entre os diferentes parceiros facilita a criação e o desenvolvimento de novos instrumentos, bem como po-tencializa sua eiciência e efetividade. Entretanto, a combi-nação de estratégias de organizações distintas pode trazer sinergias e viabilizar a desejável situação “ganha-ganha”.

Normalmente, as ACEs e as organizações multilaterais estão em posição de exercer liderança neste processo, dada a sua missão de promover o desenvolvimento, sua experiência em ambientes de maior risco e sua maior facilidade de acesso a informações estratégicas. Por sua vez, os bancos comerciais têm maior agilidade no seu processo decisório, na tomada de providências que re-queiram apoio jurídico e na contratação de serviços es-pecializados de terceiros.

Conforme evidenciam avaliações de publicações espe-cializadas (Trade FinanceDeals of theYear,GTRBestDeals,TXFPerfect10DealsoftheYeareProjectFinanceDealsoftheYear), novas iniciativas atreladas a múltiplas fontes de inanciamento e ao princípio de compartilha-mento de risco têm conseguido maximizar a capacidade de resposta das instituições inanceiras, provendo-se so-luções favoráveis para casos complexos.

Para as instituições do governo brasileiro dedicadas a apoiar o comércio exterior, torna-se desaiador acompa-nhar as inovações introduzidas pela indústria inanceira internacional, a partir do reconhecimento da necessida-de de ampliar a lexibilidade de seus produtos, procedi-mentos e práticas em prol da composição de diferentes fontes de recursos e do compartilhamento das respon-sabilidades das entidades tomadoras de risco. Fica cla-ro, portanto, que estas instituições necessitam atuar de forma conjunta e proativa visando ao aperfeiçoamento do marco regulatório relativo ao comércio exterior atu-almente vigente no país, de forma que as instituições inanceiras nacionais possam desenvolver produtos e instrumentos inovadores que permitam um maior com-partilhamento de crédito e risco com organizações in-ternacionais, sejam elas públicas ou privadas.

Tendo em vista o atual cenário econômico brasileiro, onde o alto custo e a baixa disponibilidade de crédito, aliada à aversão para assunção de riscos mais elevados, diicultam, ou até mesmo inviabilizam a concessão de inanciamen-tos ao comércio exterior sob a ótica tradicional, tais ini-ciativas tornam-se absolutamente necessárias para possi-bilitar uma maior inserção e participação de mercado das empresas brasileiras na arena competitiva global.

Naturalmente, devem ser observadas as particularidades do caso brasileiro, em especial a realidade que se impõe ao setor exportador de bens de capital e serviços, cuja competitividade internacional sobressai em segmentos especíicos. Neste sentido, há limites para que as insti-tuições do governo brasileiro possam se inserir na in-dústria inanceira global dedicada às operações de inan-ciamento às exportações. Contudo, parece existir, sim, espaço encorajador para o exercício de modelos e estru-turas novas, o que requer a mobilização dos responsáveis por formulação de políticas, programas e instrumentos de apoio, bem como a ampliação do debate do tema jun-to à comunidade envolvida com o comércio exterior.

Com vistas a incentivar o debate, seguem abaixo relexões acerca de dez medidas que poderiam ser desenvolvidas por instituições de governo e pela iniciativa privada.

Setor Público

• Ampliação do leque de programas de inanciamento existentes, notadamente mediante atuação conjunta com instituições de desenvolvimento, organismos multilaterais e bancos comerciais internacionais.

• Ampliação do conjunto de moedas de referência que balizam os inanciamentos do BNDES à pro-dução e comercialização de bens e serviços com re-conhecida inserção internacional, mediante ajuste na Lei nº 9.365, de 16 de dezembro de 1996, o que possibilitaria que o contravalor em reais dos saldos devedores dos inanciamentos fosse atualizado e remunerado com base em outras moedas além do dólar norte-americano e do euro, observadas as mo-edas internacionalmente conversíveis.

• Estruturação de operações conjuntas da Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Ga-rantias da Secretaria de Assuntos Internacionais (ABGF/SAIN) com outras ACEs no exterior, bem como o estabelecimento de jointventures com segu-radoras e resseguradoras privadas internacionais, de modo a permitir que o FGE possa transferir riscos em situações onde o seu limite de exposição a deter-

Page 18: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

3 4 Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

minado país ou devedor já esteja elevado, ainda que se tenha que promover alterações na Lei nº 6.704, de 26 outubro de1979.

• Celebração de convênios e acordos de cooperação entre as instituições do governo brasileiro e ACEs no exterior, criando-se canais permanentes para a discussão de políticas, metodologias e critérios, buscando-se alinhamento pelo menos em relação a questões de interesse comum, como a promoção do desenvolvimento sustentável, o combate à corrup-ção, a proteção do direito das minorias e a priorida-de para pequenas e médias empresas.

Setor Privado

• Participação ativa dos exportadores na estruturação de projetos no exterior, em parceria com instituições oriundas de outros países e organizações internacionais, nos casos em que a lógica de implantação dos empre-endimentos requeira colaboração conjunta, de modo a dotar os países importadores de capacitação técnica, visando ao desenvolvimento de estudos de viabilidade.

• Iniciativa de replicar no mercado internacional PPPs constituídas com sucesso no Brasil, notada-mente como alternativa para a construção de obras de infraestrutura e a realização de investimentos re-lacionados à oferta de serviços públicos.

Ações Conjuntas

• Articulação permanente junto a subsidiárias de bancos comerciais e seguradoras internacionais es-

tabelecidas no Brasil, particularmente aquelas que tenham o apoio às exportações como um dos seus negócios principais, com o propósito de conhecer com profundidade as estratégias, as necessidades e o modusoperandi dessas organizações em diferentes mercados no exterior, de maneira a detectar espaço para atuação complementar.

• Articulação permanente junto a subsidiárias de empresas multinacionais estabelecidas no Brasil, particularmente aquelas atuantes nas indústrias me-cânica, de equipamentos elétricos e de material de transporte, no intuito de conciliar a oferta de inan-ciamento e garantia com as condições porventura oferecidas pelas ACEs que apoiam suas matrizes e as demais subsidiárias em terceiros países.

• Intensiicação de ações de promoção comercial, de modo a aumentar a presença/visibilidade do Brasil nos mercados-alvo, com ênfase em entendimentos a serem irmados com instituições locais e internacio-nais atuantes em cada mercado, objetivando a cele-bração de acordos-quadro (rameworkagreementsoumasteragreements) que discriminem parâmetros bá-sicos para a realização de operações compartilhadas.

• Incentivo ao desenvolvimento de atividades de alto conhecimento e valor adicionado por parte de for-necedores brasileiros, com a inalidade de aumentar sua competitividade e, consequentemente, sua atra-tividade junto a grandes conglomerados industriais, para que possam absorver etapas de maior valor agregado no processo produtivo característico das cadeias globais de valor.

Financiamento

Page 19: Revista Brasileira de Comercio Exterior E 124 · diretamente o importador, exigem processos de nego-ciação e avaliação mais complexos (BNDES, 2015). A modalidade supplier credit,

RBCE - A revista da

3 5Nº 124 - Julho/Agosto/Setembro de 2015

REFERÊNCIAS

AUBOIN, M.; ENGEMANN, M. Trade inance in pe-riods of crisis: what have we learned in recent years? Staf Working Paper ERSD-2013-01. World Trade Organiza-tion. Economic Research and Statistics Division. 2013.

BID – BANCO INTERAMERICANO DE DESEN-VOLVIMENTO. Relatório Anual. 2015a.

______. Panama city and bay Sanitation Program II. Loan Proposal. 2015b. Disponível em: http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?doc-num=39731790.

BNDES – BANCO NACIONAL DE DESENVOL-VIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Disponível em: http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Apoio_Financeiro/Produtos/BNDES_Exim/produto_eximpos.html. Acesso em: 20 ago. 2015.

EXPORTA PUBLISHING & EVENTS LTD. Berne Union Yearbook. London, United Kingdom. 2013.

US EX-IM BANK – EXPORT-IMPORT BANK OF THE UNITED STATES. Annual Report 2013. Wa-shington, D.C., USA. 2014.

UKEF – UK EXPORT FINANCE; ECGD – EX-PORT CREDITS GUARANTEE DEPARTMENT. Annual Report and Accounts 2014-2015. London, UK. 2015.

EDC – EXPORT DEVELOPMENT CANADA. Annual Report 2014. Reaching for our export po-tential. Ottawa, ON, Canada. 2015.

GODFREY, D. UKEF hits full stride in product inno-vation. Trade & Export Finance News. 2014.

RIORDAN, DAN. Future harmonization in global export credit and investment insurance. Global Policy Journal, 2015. Disponível em: http://www.globalpo-licyjournal.com/blog/16/03/2015/future-harmoniza-tion-global-export-credit-and-investment-insurance. Acesso em: 27 ago. 2015.

ICC – INTERNATIONAL CHAMBER OF COM-MERCE. Rethinking Trade & Finance - an ICC pri-vate sector development perspective. ICC Banking Commission. 2014a.

______. ICC Trade register report. Global risks in trade inance. ICC Banking Commission. 2014b.

IEG - INDEPENDENT EVALUATION GROUP. Evaluation of the International Finance Corpora-tion’s Global Trade Finance Program, 2006-2012. he World Bank. Washington, EUA. 2013.

Kf W IPEX-Bank GmbH. Annual Report 2014. Frankfurt am Main, Germany. 2015.

OECD - ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Glos-sary of statistical terms. 2014a.

______. Report on trends in oicial export credit business volumes. TAD/ECG12/PROV. 2014b.

______. Chinese export credit policies and program-mes. TAD/ECG. 2015.

MIGA – AGÊNCIA MULTILATERAL DE GA-RANTIA DE INVESTIMENTOS. Annual Report 2014. Grupo Banco Mundial. Washington, D. C., USA. 2014.

SACE GROUP. Annual Report 2014. Driving your ambitious. Rome, Italy. 2015.

TRADE FINANCE (2015). Partnering for more ei-cient inancing. Julho, 2013.

TRADE FINANCE MAGAZINE, 14/08/2012.

TRADE & FORFAITING REVIEW, 03/10/2014.

TXF – TRADE & EXPORT FINANCE. TXF Chro-nicle. TXF Limited, v. 1, London, UK. 2015.