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RBA JULHO/AGOSTO DE DE 2011 30 oportunidades C ores variadas, chei- ro da terra, alimen- tos sadios, nutriti- vos e repletos de vitaminas e outros ingredientes fundamentais ao desenvolvimento do ser humano dão o tom a um dos negócios mais nobres na área de alimen- tação: as lojas de produtos hor- tifrutigranjeiros, ou simplesmente sacolões, que vêm resistindo às crises e as mudanças de hábitos dos consumidores há mais de 40 anos. O sacolão é uma invenção mineira. Em meados dos anos 1970, um comerciante conheci- do como Nonô Mil, que vendia verduras no Mercado Central de Belo Horizonte (MG), resolveu li- quidar “lotes” de frutas, verduras e legumes, amontoando os pro- dutos no chão de um corredor. O freguês entrava por um lado e saía pelo outro levando o “lote” numa sacola – daí a origem do termo “sacolão”. Tudo custava mil cruzeiros, uma bagatela na época. Eis a razão porque o co- merciante se tornou conhecido como Nonô Mil. Era, por assim dizer, uma espécie de autosservi- ço primitivo. Depois, o empresá- rio Antonio Eustáquio Alves, que nesta mesma época comerciali- zava produtos hortifrutigranjeiros no mesmo mercado, aprovei- tou a ideia de Nonô, dando-lhe consistência mercadológica. Ele tirou o sacolão do chão do mer- cado, levando-o para as quatro paredes de um estabelecimento comercial. Em 1976, ele abriu a primeira loja num bairro classe média de Belo Horizonte, comer- cializando frutas, legumes e ver- duras em balcões pelo mesmo preço. A resposta ao primeiro sacolão foi imediata e logo ele abriu outro. A partir da década de 80, os sacolões receberam um impulso das Ceasas – sigla e denomi- nação popular das Centrais de Abastecimento – que forneciam assistência técnica e estimula- vam sua expansão. Já os saco- lões que conhecemos hoje são diferentes e não têm ligação com o governo ou com as Centrais de Abastecimento. Eles também praticam a estratégia de nego- ciar diversos produtos por um preço único, mas atendem em sua maioria, um público de clas- Por João Humberto de Azevedo Dois bons negócios na área de alimentos Dois bons negócios na área de alimentos Hortifrutigranjeiros

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Revista Brasileira de Administração

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Page 1: Revista Brasileira de Administração

RBA JULHO/AGOSTO DE DE 201130

oportunidades

Cores variadas, chei-ro da terra, alimen-tos sadios, nutriti-vos e repletos de vitaminas e outros

ingredientes fundamentais ao desenvolvimento do ser humano dão o tom a um dos negócios mais nobres na área de alimen-tação: as lojas de produtos hor-tifrutigranjeiros, ou simplesmente sacolões, que vêm resistindo às crises e as mudanças de hábitos dos consumidores há mais de 40 anos.

O sacolão é uma invenção mineira. Em meados dos anos 1970, um comerciante conheci-do como Nonô Mil, que vendia verduras no Mercado Central de Belo Horizonte (MG), resolveu li-quidar “lotes” de frutas, verduras

e legumes, amontoando os pro-dutos no chão de um corredor. O freguês entrava por um lado e saía pelo outro levando o “lote” numa sacola – daí a origem do termo “sacolão”. Tudo custava mil cruzeiros, uma bagatela na época. Eis a razão porque o co-merciante se tornou conhecido como Nonô Mil. Era, por assim dizer, uma espécie de autosservi-ço primitivo. Depois, o empresá-rio Antonio Eustáquio Alves, que nesta mesma época comerciali-zava produtos hortifrutigranjeiros no mesmo mercado, aprovei-tou a ideia de Nonô, dando-lhe consistência mercadológica. Ele tirou o sacolão do chão do mer-cado, levando-o para as quatro paredes de um estabelecimento comercial. Em 1976, ele abriu a

primeira loja num bairro classe média de Belo Horizonte, comer-cializando frutas, legumes e ver-duras em balcões pelo mesmo preço. A resposta ao primeiro sacolão foi imediata e logo ele abriu outro.

A partir da década de 80, os sacolões receberam um impulso das Ceasas – sigla e denomi-nação popular das Centrais de Abastecimento – que forneciam assistência técnica e estimula-vam sua expansão. Já os saco-lões que conhecemos hoje são diferentes e não têm ligação com o governo ou com as Centrais de Abastecimento. Eles também praticam a estratégia de nego-ciar diversos produtos por um preço único, mas atendem em sua maioria, um público de clas-

Por João Humberto de Azevedo

Dois bons negócios na área de alimentos Dois bons negócios na área de alimentos

Hortifrutigranjeiros

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se menos privilegiada. As novas tendências de mercado apontam para um novo perfil de sacolões, que além de oferecerem os pro-dutos tradicionais, agregam em sua estrutura açougue e uma pe-quena mercearia com itens bási-cos de consumo.

As lojas de produtos hortifru-tigranjeiros são montadas den-tro do modelo de autosserviço, adotado aqui no Brasil principal-mente pelos hipermercados. O consumidor escolhe o produto que deseja ao seu gosto, sem a interferência de um vendedor.

Vale a pena relembrar a his-tória do autosserviço, uma ini-ciativa que revolucionou o co-mércio de todo o mundo. De acordo com historiadores, sur-giu em Paris a primeira loja de departamentos, a Bom Marchè, pioneira na técnica de agrupa-mento dos produtos em catego-rias. Em 1912, os Estados Uni-dos inauguraram a primeira loja do mundo com atendimento por autosserviço, o cash and carry ou “pague e leve”, com preços predeterminados. A técnica de vendas permitiu ao consumidor escolher os produtos e levá-los até o caixa, sem a intervenção de qualquer funcionário ou dono do estabelecimento. Aci-ma de tudo, os produtos pas-saram a ser distinguidos entre si pelas marcas de seus fabrican-tes, dando início à estratégia das marcas comerciais – ca-deias de loja começaram a sur-gir em todo o mundo.

O autosserviço trouxe uma sequência de mudanças que se refletem hoje na montagem do sacolão. As lojas passaram a ter um visual diferente, com o obje-tivo de atrair consumidores. Os

produtos, portanto, ganharam nova roupagem.

Atualmente, o autosserviço é quase que uma exigência do con-sumidor. O freguês faz questão de ver, sentir, manusear e até provar a mercadoria. No caso dos saco-lões, esse contato público/produ-to é direto e fundamental para a conquista do consumidor.

Como pode ser observado, o negócio é relativamente novo no Brasil, mas já se constitui como um dos mais promissores no ramo de alimentação.

MercadoO mercado dos sacolões está

em franca expansão no Brasil, haja vista o crescente número de estabelecimentos que são abertos mensalmente, em especial nas pe-riferias das grandes cidades e nos bairros de classe média. As vanta-gens para o consumidor são diver-sas: em um sacolão, por exemplo, a pessoa pode adquirir de uma só vez os mesmos produtos comercia-

lizados em uma feira livre a preços que chegam a ser 30% inferiores. Isso, sem atropelos, esbarrões e confusões. Além do mais, os pro-dutos estão sempre frescos, com bom cheiro e aroma, coloridos e vistosos. Isso sem falar da como-didade, pois o consumidor pode encontrar todos os produtos do ramo hortifrutigranjeiros – frutas, legumes, verduras, ovos e até car-ne – em um mesmo local, com es-tacionamento próprio, seguro, ao abrigo de intempéries.

O primeiro e principal passo no planejamento de um sacolão é conhecer o seu público con-sumidor. Assim, é fundamental identificar o cliente da região onde será aberto o negócio e se a área tem necessidade de um estabelecimento como este. Para isso, cheque se há feiras, supermercados ou até outros sacolões no local. Em princípio, sabe-se que onde existe uma concentração populacional lá estará também os consumido-res em poten-cial. Todo bra-sileiro, de uma forma geral, consome frutas, legumes e verduras. De ante-mão, sabe-se que as mulheres, em especial as donas de casa, são as clientes mais assíduas e também as mais exigentes. Por outro lado, os sacolões avança-ram no mercado e se tornaram fornecedores preferenciais de pequenos e médios restauran-tes, onde os próprios donos e até mesmo os cozinheiros vão até lá, diariamente, em busca de produtos frescos e com bons preços.

Mas, o principal é saber, por meio de pesquisa, se a área tem

O mercado

dos sacolões

está em franca

expansão no

Brasil

e onde existe uma ão populacional lá

ambém do-en-ra-uma l, consome frutas, verduras. De ante-se que as mulheres,

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Degustar alimentos e bebidas de alta qualidade, de pa-ladar exótico e so-fisticado, sempre

esteve na lista dos prazeres mais apreciados pelas camadas privi-legiadas da população em todos os tipos de sociedade. É para elas que se concebeu na Euro-pa, no início do século passado, um tipo especial de comércio onde os produtos oferecidos estavam mais associados ao prazer do que à satisfação das necessidades humanas. Paraísos dos gourmets, essas mercearias foram batizadas na Alemanha de delikatessen, cuja tradução literal é delicadezas.

As precursoras das delica-tessens, no Brasil, foram gran-des mercearias, como a Casa

Ouro, no Rio de Janeiro, que eram grandes revendedores de secos e molhados e com a popularização dos supermer-cados, focaram sua linha de mercadorias em alimentos e bebidas, nacionais e importa-dos, mais sofisticados. Há cerca de duas décadas, as delicates-sens começaram a se proliferar no Brasil com um formato um pouco diferente das antigas mercearias. São lojas meno-res, mais aconchegantes, de estoques limitados e decora-ção que acompanha o padrão de exigência da sua clientela. O grande segredo do sucesso de uma delicatessen é a alian-ça harmônica de atendimento e estoque. Dentro de uma imensa gama de alimentos e bebidas, o proprietário deve saber como

agradar os seus exigentes clien-tes. Isso impõe ao empresário um bom nível de conhecimen-to dos produtos disponíveis no mercado mundial e discerni-mento sobre sua qualidade.

Comercializar produtos varia-dos, dando ênfase para as cha-madas “delicadezas” – geleias, especiarias, chocolates, peixes defumados, biscoitos, bebidas finas, queijos e frios – pode ser outro segredo de sucesso do negócio. E mais, oferecer ser-viços e atendimento variados, que dependem da criatividade do empresário – como serviços de cestas, montadas pelos clien-tes, com produtos oferecidos nas prateleiras da loja, decorados e entregues pela delicatessen – é outro trunfo para o êxito do em-preendimento.

Delicatessen

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Abertura do mercadoAs delicatessens perderam

força com a política de abertura do mercado brasileiro – iniciada com o Plano Collor, que pôs fim à proibição de importação de produtos que tinham similares

nacionais e uma sig-nificativa queda nas alíquotas – quando os produtos importados puderam chegar às prateleiras dos su-

permercados e até padarias, criando uma forte con-corrência no mercado que até então era exclusiva das

delicatessens. Mas, se por um lado so-freram o impacto dessas medidas,

as delicatessens se

beneficiaram de outra recente mudança na economia brasilei-ra: a estabilidade da moeda.

Sem a inflação nossa de cada dia, que consumia o dinheiro dos assalariados, os brasileiros mu-daram seus hábitos de consumo. Sem medo da desvalorização, eles abandonaram o costume an-tigo das compras mensais. Com-pra-se em quantidades menores e valoriza-se mais o conforto de lojas pequenas, de pouco movi-mento e atendimento persona-lizado – o que soma pontos às delicatessens.

O grande segredo do sucesso de uma empresa deste tipo é a aliança harmônica entre o aten-dimento e estoque. Dentro de uma imensa gama de alimentos e bebidas, o empreendedor deve saber como agradar os seus exi-gentes consumidores. Isso impõe ao empresário um bom nível de conhecimento dos produtos dis-poníveis no mercado mundial e discernimento sobre sua qualida-de. Tanto que grande parte das lojas existentes no Brasil é dirigi-da por pessoas que moraram ou vivenciaram experiência no exte-rior.

Mercado Basicamente destinadas a

uma clientela considerada Clas-se A, as delicatessens passam hoje por um processo de amplia-ção de seu mercado consumi-dor, investindo na superação de preconceitos do tipo “tudo ali é muito caro”. Pessoas de classe média, por exemplo, não raro, se intimidam em entrar em um esta-belecimento desse tipo sem saber que neles, produtos como frios e queijos são quase sempre mais baratos do que nas padarias.

Em princípio, o empreendedor deve saber que vai trabalhar com um mercado bastante específico e exigente. Precisará conhecê-lo muito bem para saber o que ele quer e como agradá-lo.

Mas, antes de começar a des-vendar os segredos do mercado, o empreendedor precisa defi-nir a área em que vai atuar. Ela deve ser, preferencialmente, de grande densidade populacional e concentrar uma população de alto poder aquisitivo. Todas as capitais brasileiras e muitas cida-des de médio e até de pequeno porte, especialmente nas regiões sul e sudeste, já comportam esse tipo de negócio.

A melhor forma de conhecer o universo onde o empresário pre-tende atuar é realizar uma pesqui-sa de mercado, para conhecer o seu consumidor potencial e saber o que ele espera da loja. Só assim o empresário poderá entendê-lo.

Essas informações são funda-mentais para todo o planejamento da loja, seja nas suas instalações, na formação do estoque, na esco-lha dos fornecedores ou o tipo de serviço que a loja vai oferecer.

É importante notar que as de-licatessens não disputam o mer-cado apenas entre si, mas com redes de supermercados e até com padarias e lojas de conveni-ência. Assim, é interessante deli-mitar uma área física de atuação para evitar montar o negócio onde já existam outros estabele-cimentos similares.

Estoque Uma delicatessen de pequeno

porte comercializa pelo menos 600 itens, que podem ser divi-didos em grupos de produtos: vinhos, uísques, destilados, lico-

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produtos que tinham similarenacionais e uma significativa queda naalíquotas – quando oprodutos importadopuderam chegar àprateleiras dos su

permercados e atpadarias, crianduma forte concorrência nomercado quaté então erexclusiva da

delicatessens. Masse por um lado sofreram o impactodessas medidas

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O grande

segredo do

sucesso de uma

delicatessen

é a aliança

harmônica de

atendimento e

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