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I Simpósio Sobre a Biodiversidade da Mata Atlântica 106 Anatomia Foliar de Três Espécies de Justicia L.(Acanthaceae) da Mata Atlântica Elisa Mitsuko Aoyamano 1 & Alexandre Indriunas 2 1. Departamento de Ciências Agrárias e Biológicas, Centro Universitário Norte do Espírito Santo, Universidade Federal do Espírito Santo, CEP 29932-540, São Mateus, ES. E-mail: [email protected] 2. Núcleo Curadoria do Herbário, Instituto de Botânica - São Paulo, CEP 04045-972, São Paulo, SP. RESUMO No Brasil ocorrem cerca de 130 espécies do gênero Justicia L. (Acanthaceae), em praticamente todos os biomas, predominando maior diversidade de espécies na Mata Atlântica e Amazônia. As atuais delimitações da família apontam problemas de circunscrição do gênero, o qual necessita de mais estudos, principalmente com espécies neotropicais. Os trabalhos anatômicos em Justicia são em sua maioria com espécies paleotropicais. O trabalho teve como objetivo realizar um estudo sobre a anatomia foliar de três espécies da Mata Atlântica: Justicia carnea Lindl.,J. kleinii Wassh. & L. B. Sm.http://floradobrasil.jbrj.gov.br/2010/index?mode=4&tid=4156 e J. scheidweilerii V. A. W. Graham. As amostras foram coletadas de espécimes em cultivo no Instituto de Botânica de São Paulo. Foram utilizadas folhas adultas, retiradas do 2º. ao 4º. nós, sendo selecionadas amostras do terço médio da lâmina foliar. Secções transversais foram obtidas a mão livre, com auxílio de lâmina de barbear e isopor e preparadas segundo técnicas usuais de histologia vegetal.Todas as espécies estudadas apresentam folhas hipoestomáticas com epiderme uniestratificada com tricomas tectores unicelulares a pluricelulares, glandulares sésseis e peltados e cistólitos, mesofilo dorsiventral, nervura central com feixe vascular em forma de arco e envoltos por parênquima fundamental. O pecíolo apresenta forma plano-convexa. As principais diferenças encontradas foram que J. kleinii não apresenta tricomas tectores pluricelulares sobre as nervuras e em J. carnea foram observados tricomas tectores pluricelulares na face adaxial. No pecíolo de Justicia carnea e J. kleinii os feixes vasculares são descontínuos e contínuo em J. scheidweilerii,na porção distal, alas laterais que correspondem ao início da expansão da lâmina foliarem duas das espécies, excluindo J. carnea. Para as espécies estudadas as diferentes características podem ser empregadas para suas delimitações, o que contribui para o melhor conhecimento deste gênero representativo e ainda pouco estudado anatomicamente, principalmente em relação às espécies da flora brasileira. Palavras-chave: anatomia, tricomas, cistólitos INTRODUÇÃO A família Acanthaceae abrange cerca de 3500 espécies compreendidas em aproximadamente 200 gêneros distribuídas predominantemente nos trópicos, sendo também algumas espécies encontradas nas regiões temperadas (CRONQUIST,1981; SCOTLAND; VOLLESEN.2000), tendo o Sudeste Asiático, Malásia, Índia, Madagascar, África Tropical, América Central, México, Andes e Brasil como regiões de maior concentração de espécies (DANIEL, 2000). No Brasil ocorrem 41 gêneros com 432 espécies (PROFICE et al., 2010), embora este número esteja subestimado.

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Page 1: RESUMO - SAMBIO i/18.pdfBiodiversidade da Mata Atlântica 106 Anatomia Foliar de Três Espécies de Justicia L.(Acanthaceae) da Mata Atlântica Elisa Mitsuko Aoyamano1& Alexandre Indriunas2

I Simpósio Sobre a Biodiversidade da Mata Atlântica

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Anatomia Foliar de Três Espécies de Justicia L.(Acanthaceae) da Mata Atlântica Elisa Mitsuko Aoyamano1& Alexandre Indriunas2

1. Departamento de Ciências Agrárias e Biológicas, Centro Universitário Norte do Espírito Santo, Universidade Federal do Espírito Santo, CEP 29932-540, São Mateus, ES. E-mail: [email protected]

2. Núcleo Curadoria do Herbário, Instituto de Botânica - São Paulo, CEP 04045-972, São Paulo, SP.

RESUMO

No Brasil ocorrem cerca de 130 espécies do gênero Justicia L. (Acanthaceae), em praticamente todos os biomas, predominando maior diversidade de espécies na Mata Atlântica e Amazônia. As atuais delimitações da família apontam problemas de circunscrição do gênero, o qual necessita de mais estudos, principalmente com espécies neotropicais. Os trabalhos anatômicos em Justicia são em sua maioria com espécies paleotropicais. O trabalho teve como objetivo realizar um estudo sobre a anatomia foliar de três espécies da Mata Atlântica: Justicia carnea Lindl.,J. kleinii Wassh. & L. B. Sm.http://floradobrasil.jbrj.gov.br/2010/index?mode=4&tid=4156 e J. scheidweilerii V. A. W. Graham. As amostras foram coletadas de espécimes em cultivo no Instituto de Botânica de São Paulo. Foram utilizadas folhas adultas, retiradas do 2º. ao 4º. nós, sendo selecionadas amostras do terço médio da lâmina foliar. Secções transversais foram obtidas a mão livre, com auxílio de lâmina de barbear e isopor e preparadas segundo técnicas usuais de histologia vegetal.Todas as espécies estudadas apresentam folhas hipoestomáticas com epiderme uniestratificada com tricomas tectores unicelulares a pluricelulares, glandulares sésseis e peltados e cistólitos, mesofilo dorsiventral, nervura central com feixe vascular em forma de arco e envoltos por parênquima fundamental. O pecíolo apresenta forma plano-convexa. As principais diferenças encontradas foram que J. kleinii não apresenta tricomas tectores pluricelulares sobre as nervuras e em J. carnea foram observados tricomas tectores pluricelulares na face adaxial. No pecíolo de Justicia carnea e J. kleinii os feixes vasculares são descontínuos e contínuo em J. scheidweilerii,na porção distal, alas laterais que correspondem ao início da expansão da lâmina foliarem duas das espécies, excluindo J. carnea. Para as espécies estudadas as diferentes características podem ser empregadas para suas delimitações, o que contribui para o melhor conhecimento deste gênero representativo e ainda pouco estudado anatomicamente, principalmente em relação às espécies da flora brasileira. Palavras-chave: anatomia, tricomas, cistólitos

INTRODUÇÃO A família Acanthaceae abrange cerca de 3500 espécies compreendidas em aproximadamente 200 gêneros distribuídas predominantemente nos trópicos, sendo também algumas espécies encontradas nas regiões temperadas (CRONQUIST,1981; SCOTLAND; VOLLESEN.2000), tendo o Sudeste Asiático, Malásia, Índia, Madagascar, África Tropical, América Central, México, Andes e Brasil como regiões de maior concentração de espécies (DANIEL, 2000). No Brasil ocorrem 41 gêneros com 432 espécies (PROFICE et al., 2010), embora este número esteja subestimado.

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O gênero Justicia L. compreende aproximadamente 700 espécies, sendo o maior dentre as Acanthaceae, distribuído nas regiões tropicais e subtropicais e, no Brasil, ocorrem cerca de 130 espécies (GRAHAM, 1988), em praticamente todos os biomas, predominando maior diversidade de espécies na Mata Atlântica e Amazônia(PROFICE et al., 2010). As atuais delimitações da família apontam problemas de circunscrição do gênero, o qual necessita de mais estudos, principalmente com espécies neotropicais.Os trabalhos anatômicos em Justicia são em sua maioria com espécies paleotropicais (MCDADE et al.,2000, 2008). O trabalho teve como objetivo realizar um estudo sobre a anatomia foliar de três espécies da Mata Atlântica: Justicia carnea Lindl.,J. kleinii Wassh. & L. B. Sm.http://floradobrasil.jbrj.gov.br/2010/index?mode=4&tid=4156 e J. scheidweilerii V. A. W. Graham.

MATERIAL E MÉTODOS As folhas foram coletadas de espécimes em cultivo no Instituto de Botânica de São Paulo. Foram utilizadas folhas adultas, retiradas do 2º. ao 4º. nós, sendo selecionadas amostras do terço médio da lâmina foliar. As folhas foram fixadas em FAA (formaldeído:ácido acético:álcool etílico 50%, 2:1:18, v/v), de acordo com Johansen (1940), mantidas por 48 horas e posteriormente transferidas para etanol 70%. Amostras da porção mediana das folhas (pecíolo e limbo) foram seccionadas transversalmente, à mão livre, com auxílio de lâmina de barbear e isopor, posteriormente clarificadas com solução de hipoclorito de sódio a 25%, coradas com azul de astra 1% e safranina 1% (BUKATSCH,1972), e montadas em lâminas semipermanentes com gelatina glicerinada. As lâminas foram analisadas ao microscópio fotônico e as ilustrações obtidas em fotomicroscópio, com projeção de escalas micrométricas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados mostraram que as folhas das espécies estudadas apresentam epiderme uniestratificada, as células epidérmicas são quadrangulares sendo as da face abaxial menores. As folhas são hipoestomáticas, os estômatos encontram-se na face abaxial um pouco acima do nível das demais células epidérmicas (Figs. 2, 5 e 8). Essa característica é comum em espécies de Acanthaceae (METCALFE; CHALK, 1983; INAMDAR et al.,1983; TAVARES; NEVES, 1993; LARCHER; BOEGER, 2006). Todas as espécies apresentam tricomas tectores unicelulares a pluricelulares e glandulares sésseis e peltados (Figs. 1, 4 e 6). A presença de tricomas glandulares é comum nas espécies da família, em relação aos tectores, a variação do formato, número de células, ornamentação e espessura pode ser empregada para a identificação das espécies (AHMAD, 1978). Assim, no presente estudo, podemos observar que J. kleinii não apresenta tricomas tectores pluricelulares sobre as nervuras (Fig. 4) e em J. carnea foram observados tricomas tectores pluricelulares na face adaxial (Fig. 7).

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Figuras 1-9 – Secções transversais de folhas de Justicia L. 1, 2 e 3–JusticiacarneaLindl., 4, 5 e 6 - J. kleiniiWassh. & L. B. Sm., 7, 8-http://floradobrasil.jbrj.gov.br/2010/index?mode=4&tid=4156 e 9 -J. scheidweileriiV. A. W. Graham. 1, 4 e 7 – Secções da região da nervura central, 2, 5 e 8 – Secções da região do terço mediano do limbo, 3, 6 e 9 – Secções do pecíolo. Quando observados em vista transversal, os litocistos de J. kleinii estão dispostos entre as células do parênquima paliçádico, aparentando atravessar o mesofilo, enquanto nas demais espécies são epidérmicos.Os cistólitos são estruturas restritas a poucas famílias como Moraceae, Urticaceae e Acanthaceae (METCALFE; CHALK, 1983) podendo variar nas Acanthaceae, sendo os cistólitos solitáriosos mais comuns (INAMDAR et al., 1990). A nervura mediana se apresenta biconvexa (Figs. 1, 4 e 7), ao nível do terço médio, em secção transversal, sendo maior o arco abaxial, e, em J. kleinii, a face adaxial apresenta camada de colênquima reduzida, caracterizando assim uma menor proeminência (Fig. 4).As células epidérmicas têm diâmetro reduzido, sob a epiderme ocorre colênquima angular com cerca de 3 a 5 camadas na face adaxial e 4 na abaxial. Envolvendo o sistema vascular há parênquima fundamental com células isodiamétricas e de paredes delgadas, com discretos espaços intercelulares. O sistema vascular está disposto na forma de um arco central, de cujas extremidades são liberados dois pequenos feixes. Nas três espécies estudadas, o mesofilo é dorsiventral disposto em um único estrato de parênquima paliçádico e 4 a 6 camadas de parênquima lacunoso, este tipo de mesofilo é comum em várias espécies da família (METCALFE; CHALK, 1983; TAVARES; NEVES, 1993; LARCHER; BOEGER, 2006). O sistema vascular apresenta organização colateral em todas as nervuras das folhas (Figs. 2, 5 e 8). O pecíolo possui em secção transversal forma plano-convexa, exibindo, na porção distal, alas laterais que correspondem ao início da expansão da lâmina foliarem duas das espécies (Figs. 6

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e 9), excluindo Justicia carnea (Fig. 3). A epiderme é uniestratificada, em posição subepidérmica ocorre uma bainha constituída por cerca de 4 a 6 camadas de colênquima angular. O parênquima subjacente é do tipo fundamental. O sistema vascular está organizado na forma de um arco central, em Justicia carnea e J. kleini são descontínuos (Figs. 3 e 6) e contínuo em J. scheidweilerii (Fig. 9), todas as três espécies apresentam dois pequenos feixes laterais nas extremidades.

CONCLUSÕES

Para as espécies estudadas as diferentes características podem ser empregadas para suas delimitações, o que contribui para o melhor conhecimento deste gênero representativo e ainda pouco estudado anatomicamente, principalmente em relação às espécies da flora brasileira.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AHMAD, K.J..Epidermal hairs of Acanthaceae. Blumea, 24: 101-117. 1978. BUKATSCH, F. Bemerkungen zum Doppelfarbung Astrablau-Safranin. Mikrokosmos, 61: 255. 1972. CRONQUIST, A. An integrated system of classification of flowering plants. Columbia University Press, New York. 1981. DANIEL, T.F. Additional chromosome numbers of American Acanthaceae. Systematic Botany. 25: 15-25.2000. GRAHAM, V. A. W.Delimitation and infra-generic classification of Justicia (Acanthaceae). Kew Bulletin, 43: 551-624.1988. INAMDAR, J.A., BHATT, D.C. & CHAUDHARI, G.S. Structure and development of stomata in some Acanthaceae. Proceeding of the Indian Academy of Science (Plant Science), vol.92 ( 3): 285-296. 1983. INAMDAR, J. A., CHAUDHARI, G. S. & RAMANA RAO, T. V. Studies on the cystoliths of Acanthaceae. Feddes Repertorium 101 (7-8): 417-424. 1990. JOHANSEN, D.A. Plant Microtechnique. McGraw- Hill, New York. 1940. LARCHER, L. & BOEGER, M. R. T. Arquitetura foliar de Odontonema strictum (Nees) O. Kuntze (Acanthaceae) em duas condições de luminosidade, Hoehnea 36(2): 321-327. 2006. MCDADE, L. A., DANIEL, T. F., MASTA, S.; RILEY. K. M.Phylogenetic Relationships within the tribe Justicieae (Acanthaceae): Evidence from molecular sequences, morphology and cytology. Annals of the Missouri Botanical Garden. 87: 435-458.2000. MCDADE, L. A., DANIEL, T. F., IEL, C. A. Toward a comprehensive understanding of phylogenetic relationships among lineages of Acanthaceae s.l. (Lamiales). American Journal of Botany, 95:1-17.2008.

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METCALFE, C. R. & CHALK, L. Anatomy of the dicotiledons: wood structure and conclusion of the general introduction. Clarendon Press, Oxford, UK, 297pp. 1983. PROFICE, S. R., KAMEYAMA, C., CORTÊS, A. L. A., BRAZ, D. M., INDRIUNAS, A., VILAR, T., PESSOA, C., EZCURRA, C. , WASSHAUSEN, D.. Acanthaceae In: Catálogode plantas e fungos do Brasil ed.Rio de Janeiro : Andrea Jakobsson Estúdio : Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, v.1, pp. 570-584. 2010 SCOTLAND, R. W.,VOLLESEN, K. Classification of Acanthaceae. Kew Bulletin 55: 513-589.2000. TAVARES, E. S., NEVES, L. J. Anatomia foliar de Justicia cydoniifolia (Nees) Lindau Acanthaceae. Bradea6(25):220-231. 1993.