[resumo] direito constitucional a

46
1 RESUMO compilação Caderno do Cassiano e Caderno do Martelli 2º ano UFPR DIREITO CONSTITUCIONAL DIREITO PENAL DIREITO PROCESSUAL

Upload: raphael-t-sprenger

Post on 14-Apr-2016

221 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

direito constituciinal primeiras nocoes

TRANSCRIPT

Page 1: [RESUMO] Direito Constitucional A

1

RESUMOcompilação Caderno do Cassiano e Caderno do Martelli

2º ano UFPR

DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITO PENAL

DIREITO PROCESSUAL

Page 2: [RESUMO] Direito Constitucional A

2

Sumário

Direito Constitucional

1º bimestre

Constitucionalismo 4Modelos e estruturas teóricas 5Aula com o monitor Ariel 7Aula com a monitora Maria Eduarda 8Reforma e mutação constitucional 9Constituição no tempo 9Controle de constitucionalidade 11

2º bimestre

Teoria da norma constitucional 12Regras e princípios 12Interpretação constitucional 14

3º bimestre

Controle de constitucionalidade 19Controle judicial de constitucionalidade 22Controle no Brasil (Gilmar Mendes) 23Aula com o monitor Ariel 28Direitos Fundamentais 29

4º bimestre

Titularidade 33Fontes 34Desenho 34Teoria das restrições (Ricardo Martins) 37Aula com a monitora Eduarda 41Colisão dos Direitos Fundamentais 42

Constituições

1824 4718911934193719461967/691988

Direito Penal

3º bimestre

CrimeIntrodução metodológicaTeoria da açãoTipicidade

4º bimestre

Page 3: [RESUMO] Direito Constitucional A

3

Antijuridicidade

Direito Processual

1º bimestre

ConstitucionalismoModelos e estruturas teóricasAula com o monitor ArielAula com a monitora Maria EduardaReforma e mutação constitucionalConstituição no tempoControle de constitucionalidade

2º bimestre

Teoria da norma constitucionalRegras e princípiosInterpretação constitucional

3º bimestre

Controle de constitucionalidadeControle judicial de constitucionalidadeAula com o monitor ArielDireitos Fundamentais

4º bimestre

TitularidadeFontesDesenhoAula com a monitora EduardaColisão dos Direitos Fundamentais

Page 4: [RESUMO] Direito Constitucional A

4

Direito Constitucional

1º bimestre:

O Direito Constitucional é o fundamento de todos os demais tipos de direito (civil,penal, tributário, etc). Entretanto, foi apenas em 1988 que a Constituição passou a recebertal importância no Brasil, o que difere da maioria dos países europeus, onde as cartasconstitucionais ganharam prevalência no ordenamento jurídico entre o final do séc. XVIII e oinício do séc. XIX.

Princípio é o fundamento nuclear do sistema, estando mais ligado a uma funçãoespecífica (teoria clássica) do que à abstração ou à defesa de um determinado valor(concepção de ALEXY e DWORKIN). Assim, mesmo determinadas regras bastante concretas,se válidas para todo um ramo ou ordenamento, podem ser consideradas principiológicas.Deve-se dizer que, adotando a teoria clássica, a Constituição é sim um conjunto deprincípios, pois é o fundamento nuclear do sistema.

De acordo com ZAGREBELSKY, a constituição decide o indecidível, isto é, aquilo quenão mais estará sujeito à discussão. Mas estabelecer preceitos fundamentais numdocumento solene, rígido e protegido de alterações não é algo simples. Alguns acreditamque a constituição reflete o contrato social. Fora a discussão, o certo é que as cartasconstitucionais representam os valores compartilhados pela sociedade, estabelecendonormas de funcionamento para ela.

A primeira constituição conhecida é a dos Estados Unidos, famosa por defender aliberdade e garantir a redução do papel do Estado na sociedade. Tal constituição recebeuesse nome por constituir e unir o povo em torno de si. Os alemães chamam a constituição deVerfassung, ou seja, a modo de existência da sociedade, demonstrando que a cartaconstitucional tem mais a ver com a realidade social do que com um documento(Konstitution). É claro que há exemplos negativos de distanciamento entre Konstitution eVerfassung, mas o grande objetivo do constitucionalismo atual é tornar a constituição maispróxima da realidade social, com o potencial de até mesmo alterar esta última. Argumentosconstitucionais devem fazer parte das discussões políticas.

Nos Estados Unidos, prevaleceu a ideia de restrição do poder do Estado. Por outrolado, o Brasil escolheu ter uma constituição estatalista, segundo a qual o Estado devegarantir uma série de direitos (saúde, educação, segurança, etc) aos cidadãos.

Constitucionalismo

Buscando o desenvolvimento de estruturas de domesticação do poder, movimentosconstitucionalistas começaram a surgir em meados do séc. XVIII, especialmente naInglaterra, pregando a limitação do Estado e a garantia dos direitos individuais. O poder dorei passa a ser contraposto pela autoridade do parlamento, formando um cada vez maissofisticado sistema de freios e contrapesos. A partir dessa nova visão, o papel do cidadão sediferencia do papel do indivíduo. Todos podem ter suas próprias opiniões mas cada um deveaceitar e obedecer as leis promulgadas por seus legítimos representantes. Oconstitucionalismo busca a moderação entre Estado, poder e indivíduo. BOLINGBROKEacreditava que os “princípios imutáveis da razão” teriam o potencial de promover essa

Page 5: [RESUMO] Direito Constitucional A

5

mudança caso recepcionadas pelo texto constitucional dos países.

MONTESQUIEU sistematiza a ideia de divisão das funções do Estado entre trêsdiferentes órgãos que se controlam reciprocamente. JOHN LOCKE já havia pensado aseparação de poderes anos antes, mas foi muito criticado por sua defesa da legitimidade dodireito de resistência contra governos tiranos. HOBBES também defendia esse direito aoestabelecer uma diferenciação entre o autor do contrato social (o povo) e seu ator (oEstado), que sado se distancie do roteiro original pode sofrer resistência. Hoje, defende-se alegitimidade desse direito apenas quando todas as demais possibilidades institucionais seesgotam antes da resolução dos problemas existentes. Isso ocorre quando o governomoderado deixa de existir e um regime totalitário surge.

A constituição americana de 1787, a primeira e modelo para as várias cartas que sesucederam, não parece, contudo, democrática. Os autores da constituição tiveram bastantecuidado em desestimular e se proteger da ditadura/tirania da maioria, criando o Senado eestabelecendo eleições indiretas para presidente (algo que, segundo alguns, demonstra adependência do poder central em relação aos estados federados), o qual pode sofrerimpeachment em caso de crime de responsabilidade. O controle de constitucionalidade peloJudiciário torna as decisões majoritárias ainda mais supervisionadas, dessa vez pelosmagistrados da Suprema Corte, indicados pelo presidente e aprovados pelo Senado.

Constitucionalismo – 3 modelos/estruturas teóricas

A ideia de estabilidade política se encontra no cerne do movimentoconstitucionalista. A partir desse fundamento, três modelo constitucionais surgiram: osmodelos inglês (histórico), americano (povo) e francês (nação).

Para o direito inglês, alguns princípios devem ser colocado acima de qualquer normajurídica escrita, mas sem recorrer à ideia de poder constituinte. O Direito na Inglaterra temcomo função revelar os direitos dos cidadãos, contra o Estado, e não estabelecer um modode existência. Assim, é possível garantir o direito e as garantias dos lordes, em estamentosocial privilegiado em pleno século XXI, apoiado tão somente na tradição. Sem umaconstituição escrita, o Parlamento é soberano, podendo fazer o que bem entender, sem, noentanto, contrariar a história. Um velho ditado inglês afirma: “o Parlamento pode tudo,menos transformar homem em mulher”. Sob a perspectiva inglesa, a vontade dosparlamentares reflete e revela o direito admitido pela sociedade (mas também pelo direitonatural), sem jamais “criar” novos direitos. O máximo que pode ocorrer é o reconhecimentodo direito de alguém (caso dos homossexuais) quando uma mudança social é percebida.

Nos Estados Unidos, por outro lado, a constituição reflete uma ruptura com a históriae a defesa do povo. Não se argumenta mais em favor de direitos e privilégios dedeterminado estamento, mas passa-se à tutela do indivíduo, que é visto como igual a todosos demais e possuidor dos mesmos direitos e condições de qualquer cidadão. De acordo comBRUCE ACKERMAN, surge nos Estados Unidos uma democracia dualista, na qual omovimento constituinte é separado do momento de legislação ordinária. Assim, as decisõesfundamentais do Estado, expressas na Constituição, são tiradas do debate democrático.Apesar das diferenças existentes entre os estados, pode-se dizer, em termos gerais, que osnorte-americanos decidiram criar um grande espaço de autonomia individual e fortesrestrições à atuação estatal. A constituição escrita, solene e rígida busca formalizar e garantiras liberdades do indivíduo, uma vez que é colocada acima de qualquer documento legal e

Page 6: [RESUMO] Direito Constitucional A

6

ainda serve como legitimação para todas as demais normas. Além disso, apesar de aconstituição americana representar a cristalização das decisões políticas fundamentais, nãohá caráter dirigente nesse documento. Pelo contrário, a grande preocupação dos “paisfundadores” foi restringir o âmbito de atuação do Estado, jamais estabelecer um projeto depaís.

Se o modelo americano rompe com a história, o constitucionalismo francês “pisoteia”a história, rompendo completamente com o Antigo Regime. A constituição da França podeaté mesmo ser modificada de maneira relativamente fácil, sendo possível estabelecer váriosmomentos constituintes. Além disso, os franceses decidiram impor tarefas e deveres aoEstado, como a promoção da igualdade e da felicidade. Se nos Estados Unidos procura-se aneutralidade estatal, na França propõe-se a atuação forte do Estado, havendo um projeto desociedade expresso na carta constitucional, o qual reflete o ideal da nação (relacionado aopertencimento à coletividade), muito diferente de povo segundo os norte-americanos.

Tanto na França quanto nos Estados Unidos a democracia é mais valorizada do que naInglaterra, onde se defende uma estabilidade maior.

É preciso, ainda, diferenciar as constituições garantia (típicas do Estado liberal,garantido a autonomia individual e restringindo a atuação do organismo estatal, tendo umcaráter principiológico) das constituições projeto ou dirigentes (as quais projetam umasociedade futura, livre, mas também solidária e atribuidora de funções ao Estado, como asconstituições mexicana, soviética e de Weimar), as quais implicam num compromisso dasociedade e na alocação de recursos para a concretização dos programas e objetivosdefendidos por elas. O problema é que as demandas sociais são inesgotáveis e semprecrescentes conforme se eleva o nível de satisfação das pessoas. No final das contas, apercepção geral é de que as constituições dirigentes contam com pouca ou nenhumaefetividade.

Não obstante essa dificuldade, vista por CANOTILHO como a “morte das constituiçõesdirigentes”, a maior parte dos países europeus decidiu adotar cartas constitucionais sob essemolde a partir da segunda metade do séc. XX. Apesar das divergências, é inegável que asconstituições projeto desfrutam (ou ao menos pretende desfrutar) de legitimidade material.

O estudo do direito constitucional positivo se iniciou na França no século XIX ecorresponde ao Direito Constitucional B da faculdade, O direito constitucional geral refere-seao estudo das categorias relacionadas ao constitucionalismo como poder constituinte, porexemplo. Por fim, o direito constitucional comparado analisa as constituições de outrospaíses ou de outras épocas.

De acordo com ESMEN, o direito constitucional tem seu objeto formado pelo tripéentre forma de Estado, forma e órgãos de governo e os limites ao direito do Estado.

As fontes do direito constitucional são a Constituição, a doutrina, a jurisprudêncianacional e internacional, a legislação infraconstitucional e, de acordo com BOAVENTURA DESOUSA SANTOS, o pluralismo interno (como ocorre na Bolívia, onde as decisões tomadas portribunais dos povos nativos são reconhecidas formalmente pela constituição) e o transconstitucionalismo (algo fora dos textos constitucionais, mas que é compartilhado por todasas sociedades, afirma NEVES).

Segundo DUGUIT, o direito constitucional mantém fortes relações de

Page 7: [RESUMO] Direito Constitucional A

7

interdisciplinariedade com todos os demais ramos do direito público, os quais sãodependentes e refletem os ideais expressos na constituição. No âmbito do direito privado,até mesmo o direito civil deve ser lido a partir da ótica constitucional.

Aula com o monitor Ariel

De acordo com JOSÉ AFONSO DA SILVA, a Constituição é o conjunto dos elementosessenciais do Estado organizados no texto normativo. No entanto, há também outrasconcepções das cartas constitucionais, como a sociológica (a soma dos fatores reais depoderes que regem a sociedade), a política (decisão política fundamental, segundo CARLSCHMITT) e a jurídica (uma norma pura, um dever-ser no pensamento kelseniano). Naconcepção de constituição total de JOSÉ AFONSO DA SILVA, forma, conteúdo, fim e causaseriam aspectos fundamentais expressos pelo texto constitucional.

CANOTILHO atribui à constituição as funções de constituir normativo da organizaçãoestatal, servir como limite aos poderes públicos, fundamentar a ordem jurídica dacomunidade e estabelecer um programa de ação (normas programáticas). Já KARLLOEWENSTEIN vê a divisão de tarefas entre diferentes órgãos públicos, o reconhecimento deuma esfera de autodeterminação individual e o estabelecimento de métodos de adaptaçãoàs mudanças sociais como as funções das constituições.

Formalmente, as normas constitucionais são aquelas que foram incluídas no textoconstitucional conforme o devido processo legislativo. Já as normas que determinam a formaadquirida pelo Estado, ou que garantem direitos aos cidadãos, além das normasprogramáticas, são consideradas normas constitucionais em sentido material.

Forma de Estado: unitária X compostaForma de governo: república X monarquiaSistema de governo: parlamentarismo X presidencialismoRegime político: autocrático X democrático

As constituições se classificam:

Quanto ao conteúdo:Formal ou material

Quanto à forma:escrita ou não-escrita (como no Reino Unido)

Quanto ao modo de elaboração:dogmáticas (escritas) ou históricas (baseadas em costumes)

Quanto à origem:democráticas/promulgadas, outorgadas (ato unilateral do Poder) ou czarista(elaborada pelo governo, ratificada pelo povo)

Quanto à extensão:concisa/sintética (princípios gerais e regras básicas) ou analítica/prolixa(detalhamento minucioso dos direitos)

Quanto à finalidade:garantia (atuação negativa do Estado) ou projeto (atuação negativa do Estado)

Quanto à estabilidade:imutável (nunca se altera), rígida (a reforma requer maiores exigências emcomparação com a legislação ordinária), semirrígida (uma parte é rígida e outra éflexível) ou flexível (mudanças ocorrem por processo legislativo simples)

Page 8: [RESUMO] Direito Constitucional A

8

Quanto à ontologia:normativa (as normas constitucionais são efetivadas para governados egovernantes), nominal (sem efetividade) ou semânticas (apenas formalizam oPoder)

Aula com a monitora Maria Eduarda

O poder constituinte tem natureza política e é considerado uma energiaextremamente forte, capaz de compor toda a ordem jurídica e política de um país. O poderconstituinte baseia-se na soberania do povo e pode se manifestar a qualquer momento,ainda que isso geralmente não ocorra pelo risco de se criar a instabilidade política.

O poder de reforma, diferentemente do poder constituinte originário, é limitado econdicionado pela existência de novos interesses da população, diferentes dos expressos naconstituição vigente. É um poder ulterior, já que é previsto no texto constitucional e nãopode realizar alterações nas cláusulas pétreas.

No caso inglês, entende-se que o poder constituinte revela os valores e princípiosadotados pela sociedade. Nos Estados Unidos, o poder constituinte serve como instrumentopara o estabelecimento das normas fundamentais que regem o relacionamento entre Estadoe indivíduo, enquanto tal poder é considerado supremo pelos franceses e seu titular é opovo.

De acordo com SIEYÈS, todas as classes sociais deveriam participar do debate político,sendo que o poder constituinte deveria estabelecer a organização do Estado e seus órgãosde atuação. Na visão de CANOTILHO, o titular do poder constituinte é o povo (real), em todaa sua grandeza pluralística, representada pela diversidade de credo, etnia, orientação sexual,etc.

Nos momentos de agitação social, nos quais o estabelecimento de um novo direitotorna-se urgente, faz-se necessária a preparação para a elaboração de uma nova cartaconstitucional. Segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA, há quatro modos democráticos de seexercer o poder constituinte originário: (a) direto, quando um projeto é elaboradounilateralmente para subsequente apreciação pelo povo; (b) indireto, quando umaassembleia constituinte é eleita para redigir, debater e aprovar uma nova constituição; (c)misto, nos casos em que o documento elaborado pela assembleia constituinte é submetido àaprovação popular; e (d) convencional, como no caso da Convenção da Filadélfia, na qualconvenções formadas em cada estado federado analisam o texto criado por uma assembleiaconstituinte.

O poder constituinte originário, apesar de estar desvinculado do direito anterior, élimitado pelos anseios do povo, perdendo sua legitimidade caso se negue a manifestar avontade popular e/ou se torne autoritário. Para alguns estudiosos, o poder de reformasimplesmente não existe, mas na opinião de outros, esse poder existe, ainda queincompetente para modificar as decisões mais sensíveis ou o “espírito” da constituiçãoanterior.

JOSÉ AFONSO DA SILVA assevera que a constituição extrai a sua legitimidade daexpressão da vontade popular e da criação de mecanismos que permitam a constanteparticipação política dos cidadãos. Sob a perspectiva do jusnaturalismo, o povo é o naturaldetentor do poder constituinte originário, sendo este, portanto, um poder de direito,

Page 9: [RESUMO] Direito Constitucional A

9

jurídico. Na concepção de outros estudiosos, porém, o poder constituinte é ajurídico oujuridiogênico, rompendo com a ordem jurídica anterior para estabelecer uma nova visãosobre o direito. Na opinião desses estudiosos, o titular desse poder pode, eventualmente,ser o povo, mas também um líder carismático ou um comando revolucionário, por exemplo.

Reforma e mutação constitucional

As reformas modificam o próprio texto da constituição, sendo facilmente verificáveis.Seu intuito é permitir que a carta magna se adapte a novas situações e transformaçõessociais, garantindo, assim, a sua permanência. Entretanto, nem tudo pode ser modificado,havendo um núcleo material intangível ao poder constituído, o qual é, desse modo, limitado,condicionado e derivado. Sua titularidade cabe ao Poder Legislativo.

A reforma pode se dar de dois modos: por revisão constitucional ou emendas. Cincoanos depois de sua promulgação, a Constituição de 1988 passou por um processo de revisão,com a aprovação de seis emendas. Tal processo se esgotou em 1994, não podendo serrepetido.

As emendas, por sua vez, encontram alguns limites. São eles de natureza: (a)temporais (ex: não haverá emenda antes de decorridos x anos da promulgação daconstituição), inexistentes na CF de 1988; (b) circunstanciais, que impedem modificações emtempo de guerra ou estado de sítio, por exemplo; (c) formais, que estabelecem um númeromínimo relativamente alto de deputados e senadores para a aprovação da emenda, ou avedação de se debater uma proposta já rejeitada; e (d) materiais, pelos quais certosprincípios são inalteráveis, como a Federação e o voto secreto universal e periódico (podemser expressos ou implícitos, como por exemplo a titularidade do poder de reforma, que nãose encontra entre as cláusulas pétreas).

As mutações trazem à tona o problema de controlar a atuação do STF como geradordessas mutações.

Constituição no tempo

No pensamento Kelseniano, Estado e Direito se identificam e, à cada nova ordemjurídica, corresponde um novo Estado. É necessário questionar, porém, se uma mudança nanorma hipotética fundamental implica no não aproveitamento de toda a legislaçãoinfraconstitucional. Para KELSEN, uma nova constituição representa uma revolução, mesmoque não haja luta armada ou derramamento de sangue. Sob essa perspectiva, toda avalidade da antiga ordem jurídica se perde e um poder jurígeno é estabelecido. Qualqueralteração contrária à ordem jurídica é considerada, assim, uma revolução (desde que nãotenha sido prevista por esta ordem).

Para KELSEN, a legislação infraconstitucional anterior à nova constituição pode sermantida por razões econômicas, caso não seja incompatível com a nova ordem jurídica.Entretanto, sua validade doravante depende de uma carta magna diferente, sendonecessário adequar seu conteúdo e interpretação ao novo diploma constitucional. PONTESDE MIRANDA, por outro lado, acreditava que mesmo as normas constitucionais pertencentesà antiga ordem jurídica poderiam ser recepcionadas pela que lhe sucede, num fenômenodenominado desconstitucionalização. O pensamento kelseniano não admite essa ideia, mascrê que a recepção das normas pertencentes à antiga ordem jurídica no planoinfraconstitucional consistem numa criação abreviada do direito e, nesse sentido,

Page 10: [RESUMO] Direito Constitucional A

10

econômica. Na visão de Kelsen, apesar de o conteúdo de tais normas não se modificar, seucritério de validade é outro, o que as torna novas leis. Em outras palavras, no Brasil, todanorma elaborada antes de 1988 e que se mantém em vigor até hoje não é válida por estar deacordo com a constituição vigente no tempo em que foi editada, mas porque é compatívelcom a ordem jurídica estabelecida após a promulgação da nova constituição.

Como a recepção das normas é tácita, existe um grande problema relacionado aofiltro que define quais leis devem e quais não podem ser consideradas compatíveis erecepcionáveis pela nova ordem jurídica.

Há três fundamentos do poder político: (a) a natureza (das coisas ou pela força); (b) ahistória (passada ou o desejo de remodelar o futuro); e (c) a vontade de Deus (teocracia) oudo povo (democracia).

Uma nova constituição filtra as antigas leis, selecionando quais normas podem serrecepcionadas pela ordem jurídica ascendente e quais não. De acordo com KELSEN, mesmoas leis recepcionadas se modificam, uma vez que seu critério de validade se altera. O grandeproblema da filtragem constitucional é que ela se realiza implicitamente, raramente seobservando indicações expressas sobre o que pode ou deve ser recepcionado.

Segundo o STF, todas as leis não recepcionadas pela nova constituição se consideramtacitamente revogadas, ainda que o ministro Sepúlveda Pertence preferisse falar em“inconstitucionalidade superveniente”, alocando as discussões ao plano da validade danorma jurídica.

Por meio da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF),legitimados ativos podem questionar a recepção de determinadas normas em abstrato, istoé, sem a referência a qualquer caso concreto e com efeito vinculante estendido a todos.

A compatibilidade de uma norma deve ser avaliada tanto no aspecto formal quantono material. Entretanto, importa dizer que leis com conteúdo materialmente compatível coma nova ordem jurídica podem ser recepcionadas mesmo que formalmente divergentes daconstituição ascendente. Exemplo disso é o Código Tributário Nacional, aprovadooriginalmente como lei ordinária e que após 1988 recebeu o status de lei complementar. Emsíntese, pode-se concluir que o aspecto formal é irrelevante para a recepção constitucional.Contudo, se uma norma tem um vício formal em sua origem (por exemplo uma lei ordináriaé estabelecida para regular matéria reservada a lei complementar sob a antiga constituição,não pode ser recepcionada pela nova ordem jurídica (a lei não poderá ser recepcionadamesmo que a nova constituição estabelecida que o seu conteúdo seja de lei ordinária).

O direito brasileiro não admite a repristinação constitucional, ou seja, uma normaconsiderada inconstitucional por uma nova ordem jurídica não pode ser “ressuscitada” poruma outra nova mudança constitucional. A teoria da desconstitucionalização (defendida noBrasil apenas por PONTES DE MIRANDA), rejeitada no país, afirma que dispositivos de antigasconstituições podem ser recepcionados com força de lei caso não sejam completamenteincompatíveis com a nova carta magna. Aparentemente, é a aura constitucional que impedea recepção de antigas normas por conta de aspectos formais – algo que não se aplica àlegislação infraconstitucional como referida anteriormente.

As constituições nem sempre decidem respeitar o direito adquirido sob a ordemjurídica anterior. De acordo com a Constituição de 1969, a cumulatividade de aposentadorias

Page 11: [RESUMO] Direito Constitucional A

11

era válida, o que não se manteve a partir de 1988. Nesse caso, com a promulgação do novotexto, as pessoas com mais de um benefício passaram a receber apenas um, apesar de nãoprecisarem devolver aquilo que receberam na velha ordem jurídica.

O direito adquirido é respeitado quando se cumprem todos os requisitos para a suaaquisição (por exemplo, 65 anos de idade ou 30 anos de contribuição previdenciária para seaposentar) e é fruível imediatamente. O entendimento do STF é o de que o direito adquiridose mantém, salvo disposição constitucional em sentido contrário. No Brasil, o constituinteexpressamente invalidou os atos administrativos e legislativos que conferiram estabilidade aservidor público sem concurso entre a convocação (setembro de 1985) e a promulgação danova constituição (outubro de 1988) no art. 18 do ADCT. No entanto, quem já trabalhava noserviço público há pelo menos cinco anos (antes de 1983) teve estabilidade reconhecida.

De qualquer forma, a noção de direito adquirido não é pacífica, sendo que regrasgerais são de definição extremamente dificultosa, havendo numerosas especificidades legaisaplicadas aos diversos casos concretos. O que se pode dizer com alguma segurança é que odireito adquirido é protegido contra reformas constitucionais dentro de uma mesma ordemjurídica. Qualquer coisa além disso está aberto a discussão.

Controle de constitucionalidade

Se o controle de constitucionalidade não for atuante, o princípio de supremaciaconstitucional torna-se de todo irrelevante. Na Constituição de 1824, apenas as matériassubstancialmente constitucionais invocavam controle de constitucionalidade, pelo PoderModerador. Já em 1891, ficou estabelecido que caberia ao Judiciário realizar o controle deconstitucionalidade, ainda que não de modo exclusivo, baseando-se no modelo norte-americano, o qual previa – e ainda prevê – somente o controle concreto deconstitucionalidade, também chamado incidental. No sistema de Civil Law adotado peloBrasil à época, a falta de respeito ao precedente permitia decisões contraditórias em casossemelhantes. O Poder Executivo tinha receio do controle abstrato, editando a emendaconstitucional nº 3/1926, que restringia o âmbito de aplicação do “habeas corpus”, porexemplo.

Page 12: [RESUMO] Direito Constitucional A

12

2º bimestre

Teoria da norma constitucional

A norma refere‐se à ordem do legislador, enquanto o dispositivo é o modo com essemandato está expresso na lei, tida em sentido amplo. Os dispositivos, às vezes, necessitamde um preenchimento pela realidade, algo que eventualmente pode alterar a norma devidoa mudanças sociais no tempo.

A doutrina originalista, como sustentada por ANTONIN SCALIA, defende que ainterpretação da constituição a partir da vontade original do constituinte é a maneira maisdemocrática e adequada à proteção do cidadão. Assim, limita‐se a extensão de direitosfundamentais, com, por exemplo, o sigilo de mensagens eletrônicas. A Constituição de 1988não admite o originalismo, uma vez que, sendo uma constituição dirigente, estabelece umprojeto de sociedade e, por conseguinte, de valores como a igualdade e a liberdade. Nesseâmbito, é extremamente difícil conseguir um consenso sobre a norma emanada pelosdispositivos.

Regras e Princípios

A grande distinção entre as normas constitucionais é aquela feita entre regras eprincípios, que têm igual força normativa e dignidade constitucional. Mesmo os princípiosapresentam intensa aplicabilidade e densidade normativa. Após a promulgação daConstituição de 1988, os princípios, até então quase completamente ignorados, passaram aser ultravalorizados. Hoje, tem‐se buscado um equilíbrio maior entre os dois tipos de normasconstitucionais.

De acordo com a teoria clássica, os princípios são mandamentos nucleares do sistema(CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO). Eles diferenciam‐se das regras não sob o ponto devista normativo, mas segundo a perspectiva axiológica. Os princípios servem comofundamentos para a interpretação para todo o ordenamento jurídico, apresentando maiorgrau de abstração. Conforme o princípio da unidade da constituição, não há hierarquia entreas normas constitucionais. Em termos genéricos, pode‐se dizer que as regras estabelecem oscontornos ou limites dos princípios, condensando‐os e explicitando como eles devem seraplicados. Assim, conclui‐se que as regras têm maior densidade normativa, enquanto osprincípios apresentam grande densidade axiológica.

Para CANOTILHO, há princípios estruturantes (Estado de Direito, democracia,República e Federação), constitucionais gerais (igualdade, por exemplo), constitucionaisespecíficos (por exemplo, "os cargos públicos são acessíveis por todos os brasileiros") eregras constitucionais (por exemplo, para ocupar um cargo público é necessário passar porconcurso), em ordem crescente de densidade normativa. Constituições garantia geralmentechegam até os princípios constitucionais gerais ou, quando muito nos princípiosconstitucionais específicos. Para CANOTILHO, cláusulas pétreas seriam princípios políticosconstitucionalmente conformadores, enquanto princípios impositivos atribuem funções aoEstado e princípios garantidores asseguram direitos ao cidadão, como o julgamento por juiznatural.

JOSÉ AFONSO DA SILVA distingue princípios políticos constitucionais (seis ao todo,que promovem a forma de organização da sociedade, o regime político, etc.) e jurídico‐constitucionais (aqueles que refletem o ordenamento jurídico, como o devido processo legal

Page 13: [RESUMO] Direito Constitucional A

13

e a supremacia da constituição).

A partir do final do século XX, a teoria clássica perdeu a força em decorrência dasteorias de RONALD DWORKIN e ROBERT ALEXY, as quais, por sua vez, também sãodivergentes. Entretanto, tanto DWORKIN quanto ALEXY defendem a existência de umadiferença qualitativa entre as regras e princípios.

Na visão do primeiro, o juiz pode decidir de modo discricionário, desde que respeiteos limites internos e externos de sua função (alegoria da rosquinha). DWORKIN separa osargumentos de política dos de princípio, sustentando que, neste último caso, o magistradotem maior liberdade para julgar em comparação com os argumentos de política, maisrelacionados aos direitos coletivos e ao igualitarismo. Enquanto as regras seriam "tudo ounada", o princípio deveria ser sempre ponderado em relação aos demais. HART, adversáriode Dworkin, afirma que nunca se observará o "tudo ou nada", pois sempre há exceções,implícita ou explicitamente. Assim, não existiria espaço para o juiz deixar de aplicar umaregra. Nos casos concretos, DWORKIN afirma que o magistrado deve sopesar princípios,definindo argumentativamente qual é a melhor resposta possível à controvérsia.

De acordo com ALEXY, só existem princípios e regras, não políticas. Para ele, regrassão razões definitivas que não podem ser inobservadas pelo magistrado. Os princípios, poroutro lado, seriam mandados de otimização, os quais devem ser aplicados em sua máximaextensão, diferenciando‐se das regras por não serem definitivos, mas direitos "prima‐facie".DWORKIN pensa em princípios como algo ligado à equidade e à moralidade, enquanto ALEXYadmite até mesmo as políticas como princípios.

Segundo a teoria clássica, os princípios são limitados antes mesmo do caso concreto,ao passo que os teóricos contemporâneos defendem o sopesamento dos princípios deacordo com a realidade concreta das controvérsias. Assim, sob essa perspectiva os princípiossão de todo relativos, não existindo direitos "prima‐facie".

Para JOSÉ AFONSO DA SILVA, as normas constitucionais podem ser de eficácia: (a)plena, de aplicação imediata, como a vedação ao racismo e à tortura, por exemplo; (b)contida, quando ao legislador é facultado o direito de limitar ou conter determinadosdireitos previstos constitucionalmente, como a liberdade de profissão, por exemplo; (c)limitada, quando o legislador deve elaborar um lei para regulamentar determinada situação,como é o caso da greve dos servidores públicos.

Tanto as normas com eficácia contida ou limitada têm também eficácia plena, aindaque as últimas apenas em sentido negativo (não pode haver norma que contrarie o direito àgreve, por exemplo). O mandato de injunção é o instrumento processual adequado àconcretização das normas de eficácia limitada.

A classificação de JOSÉ AFONSO DA SILVA é muito criticada porque não abrange asnormas chamadas "programáticas", as quais, de acordo com REGINA FERRARI, vetamdeterminadas ações que lhe sejam contrárias. Hoje, o entendimento dominante é de que asnormas programáticas têm aplicabilidade plena, autorizando certos projetos dosgovernantes, como as ações afirmativas, por exemplo.

Para a teoria contemporânea, toda essa discussão não faz sentido. O que interessa éa racionalização da aplicação do direito, especialmente no âmbito da decisão judicial, ouseja, sob a perspectiva do juiz. Esses teóricos acreditam que é possível chegar a uma resposta

Page 14: [RESUMO] Direito Constitucional A

14

correta para cada caso a partir de um método lógico, matemático, de ponderação deprincípios segundo características adjacentes à própria realidade concreta.

DWORKIN declara que princípios são exigências de moralidade, enquanto as políticasrepresentam objetivos coletivos, os quais, contudo, não podem sobrepujar os princípios nasdecisões judiciais. O jurista deu grande importância ao Poder Judiciário ao criar a figura do“juiz Hércules”, que, a partir das circunstâncias do caso, conseguiria alcançar a respostacorreta.

ALEXY estabelece uma diferença qualitativa entre regra e princípios derivada de suaaplicação prática. O jurista alemão afirma que as regras são determinações definitivas que,quando em conflito, podem mostrar a invalidade de regras ou forçar a aplicação de umaexceção prevista no ordenamento.

Os princípios, por outro lado, podem colidir entre si (sopesamento é apontado comosolução para tais casos) ou com as regras, quando estas prevalecem por serem maisespecíficas. Assim, ALEXY busca preservar a coesão do sistema mesmo em detrimento damicro justiça.

O jurista alemão fala em mandatos de otimização como dispositivos que tentamassegurar a máxima extensão de um direito fundamental – os princípios. Nos casos de difícilsolução, nos quais dois mandatos de otimização colidem, existem, de acordo com ALEXY,quatro alternativas possíveis:

(1) P¹> P², princípio 1 prevalece sobre o princípio 2(2) P² > P¹, princípio 2 prevalece sobre o princípio 1(3) (P¹>P²) C, princípio 1 prevalece sobre o princípio 2 em face das circunstânciasdo caso concreto(4) (P²>P¹) C, princípio 2 prevalece sobre o princípio 1 em face das circunstânciasdo caso concreto

Na concepção do jurista alemão, as alternativas (1) e (2) são de baixa racionalidade,um extremismo positivista e incompatíveis com ordenamentos jurídicos complexos.Entretanto, as alternativas (3) e (4) pressupõem uma decisão judicial contaminada porsubjetividades do magistrado, o qual, para ALEXY, tem o dever de fundamentar a sua escolhacom argumentos de natureza jurídica, mantendo a racionalidade do sistema pela coerênciacom a regra de sopesamento e com as decisões anteriores.

O jurista alemão é muito criticado pela subjetividade das decisões judiciais e a faltade legitimidade democrática dos juízes. Por seu lado, ALEXY se defende dizendo que asregras lógico‐matemáticas de solução dos casos concretos podem superar o problema desubjetividade e que a representação argumentativa garante a legitimidade dos magistrados.ALEXY ainda afirma que a dignidade da pessoa humana é geralmente indiscutível porque namaioria das vezes deve ser considerada como regra que não admite sopesamento.

Interpretação constitucional

A interpretação, por sempre tratar da linguagem, é extremamente complexa eproblemática. A indeterminação do texto normativo da constituição torna a suainterpretação ainda mais difícil do que a de qualquer outro texto infraconstitucional. Noenfrentamento desse problema, pode‐se adotar uma postura realista, positivista oumetafísica.

Page 15: [RESUMO] Direito Constitucional A

15

A constituição fundamenta‐se no princípio da unidade, o qual prega que todo o textoconstitucional tem a mesma hierarquia normativa. Às vezes, contudo, parece haver certasantinomias no enunciado original da constituição, ocasionadas, em tese, pela interpretaçãoisolada de um único verso constitucional, como fala AYES BRITO.

O princípio da normatividade sustenta que a interpretação do texto da constituiçãodeve conferir a este a maior normatividade possível. Interpretações que reduzam a forçanormativa de um enunciado devem ser evitadas.

O terceiro pressuposto da constituição é a sua supremacia no ordenamento jurídico,o que significa que o sentido do seu texto não pode ser determinado por legislação inferior aela. Discute‐se hoje se esse sentido pode ser preenchido pelos tratados internacionais ounão.

BARROSO apresenta quatro pressupostos para que a constituição tenha forçanormativa:

I. Não buscar o impossível, mesmo que seja um projeto de sociedade.

II. Reconhecimento da eficácia de todas as normas constitucionais.

III. Reconhecimento da eficácia direta das normas que projetem os direitos doscidadãos.

IV. Existência de instrumentos de tutela que possibilitem a aplicação prática dosdireitos dos cidadãos – são os “remédios” constitucionais, como o habeas corpus,por exemplo.

A hermenêutica é a técnica que realiza a interpretação do texto normativo. Aaplicação refere‐se ao momento de concretização do direito na realidade.

A interpretação pela Ciência do Direito é feita pelos doutrinadores sem preocupaçãocom a resolução de casos concretos. Quando a interpretação é feita pelos agentes públicostendo em vista a solução de uma controvérsia real fala‐se em adjucação.

A existência diz respeito à publicação da norma jurídica. A vigência relaciona‐se àentrada em vigor da lei, a partir da qual esta passa a ter coercitividade. A validade, por suavez, significa que a norma foi produzida segundo o devido processo legiferante e está deacordo com a constituição. Por fim, a eficácia (jurídica e social) refere‐se ao fato de a norma“pegar” ou não.

Classificação da interpretação

I. Autêntica: emana do próprio agente que elaborou a normaII. Judicial: emana do JudiciárioIII. Doutrinária: emana da doutrinaIV. Social: emana da sociedade

Quanto aos resultados

I. Declarativa: nem reduz, nem estende o âmbito de aplicação da leiII. Restritiva: reduz o âmbito de aplicação da lei, como na posição do depositárioinfielIII. Extensiva: estende o âmbito de aplicação da norma

Page 16: [RESUMO] Direito Constitucional A

16

SAVIGNY apontava os elementos gramatical, lógico, histórico e teleológico comoformadores do método de interpretação jurídico.

Os métodos clássicos são o lógico‐sistemático, que considera todo o ordenamentojurídico; o histórico‐teleológico, proposto por WINDSCHED, que busca na arqueologiaconstitucional descobrir qual é o sentido que o constituinte desejava conferir ao texto,ligando‐se, em alguma medida, à teoria originalista; o voluntarista, que tenta revelar avontade da lei (“mens legis”), não a do legislador, foi defendido por KELSEN por meio da ideiade adjucação, segundo a qual o magistrado cria a norma para cada caso concreto dentro da“moldura” da lei.

HART sustentava que o juiz reconhece e aplica a regra após a análise do caso concreto(subsunção), salvo situações em que a incompletude do ordenamento torna necessário odecisionismo judicial (criação do direito). DWORKIN refuta as ideias de HART, afirmando sersempre possível que o magistrado extraia a solução correta do sistema jurídico (juizHércules), não permitindo que o julgador crie o direito, conferindo‐lhe apenas o direito deresolver os casos concretos segundo uma moralidade objetiva (valores densoscompartilhados por toda a sociedade). KARL LOEWENSTEIN argumenta que o ordenamentoapresenta lacunas, as quais podem ser ocultas, quando não percebidas no momento daedição da norma (por exemplo, silêncio constitucional em relação à pesquisa om células‐tronco), ou descobertas, quando o constituinte ou o legislador deliberadamente decide seomitir, expressando um “silêncio eloquente”.

A interpretação constitucional, no entanto, tem algumas peculiaridades e métodospróprios. É preciso considerar que toda a constituição tem força normativa (em algunsjulgados, mesmo o preâmbulo tem sido levado em conta) e apresenta certa unidade, alémde supremacia, características que forçam o intérprete a realizar algumas “acrobacias” ou, nalinguagem do ex‐ministro CARLOS AYRES BRITTO, “triplo carpado hermenêutico”. Asupremacia constitucional significa que a constituição deve ser lida por ela mesma e não apartir dos códigos ou legislação infraconstitucional.

Para BARROSO, a superioridade hierárquica, a natureza da linguagem, o caráterpolítico e o conteúdo específico são as peculiaridades da constituição, cujos métodos deinterpretação são:

Método jurídico: tradicional, tal qual formulado por SAVIGNY. Subsunção do fatoà norma.

Método tópico‐problemático: proposto por VIEHWEG, defende a interpretação apartir de casos concretos, ou seja, de problemas específicos. A norma é adaptadapara se adequar à resolução da problemática em questão. No entanto, aprevalência do problema no processo de interpretação parece incompatível comos dispositivos fundamentais da constituição.

Método hermenêutico‐concretizador: exposto por MULLER e HESSE, defende quesó é possível compreender a interpretação compreendendo o contexto no qualse insere o intérprete. Apesar de o problema ser também valorizado, confere‐seprevalência à norma. O texto é visto apenas como a “ponta do iceberg”representado pelo processo de interpretação.

Método científico‐espiritual: SMEND argumenta que é preciso considerar a

Page 17: [RESUMO] Direito Constitucional A

17

constituição como formadora do caráter espiritual da sociedade, transformandoum aglomerado de pessoas em povo, interesses individuais em interesse públicoe assim por diante. É preciso ver os preceitos de direito público em sua funçãointegrativa e constitutiva da sociedade. De alguma forma, justificou asatrocidades do nazismo.

Método jurídico normativo‐estruturante: é preciso investigar os aspectos sociaise econômicos da aplicação do direito, algo defendido por RICHARD POSNER(“Law and Economics”) e correntes marxistas. No Brasil, esse método deinterpretação é quase que completamente refutado, já que é por muitosconsiderado consequencialista.

Nos Estados Unidos, a interpretação é discutida de modo completamente diferente.Em síntese, a doutrina de lá se divide em procedimentalistas e substancialistas.

Os primeiros defendem que a constituição é um mapa de procedimentos,estabelecendo ritos e fazendo a divisão das funções estatais entre diferentes órgãos com ointuito de garantir a liberdade do indivíduo. Em suma, os procedimentalistas creem que otexto constitucional não impõe valores à sociedade, mas apenas procedimento. Os liberaissustentam que, desse modo, o Estado não pode inferir na esfera de liberdade do indivíduoarbitrariamente, mas apenas de forma extremamente fundamentada. Os libertários levamessa ideia até as últimas instâncias, conforme defende ROBERT NOZICKI. Outro grupo deprocedimentalistas são os majoritaristas, que advogam em favor do respeito às decisões damaioria e da liberdade de conteúdo da legislação infraconstitucional. Os crítico‐deliberativos,inspirados em HABERMAS, pregam a preocupação tão somente com a validade(procedimentos) do debate democrático, sem realizar juízos de valor sobre os seusresultados.

Os substancialistas acreditam que a constituição é um conjunto de valores. Osliberais‐igualitários sustentam que a interpretação constitucional deve ser feita a partir dosvalores de liberdade e de igualdade. DWORKIN chega a dizer que este último é o fundamentode todo o texto constitucional americano, defendendo a promoção de condições igualitáriaspelo Estado, para que todos possam se desenvolver de maneira livre. Os comunitaristas,liderados por WALZER e SANDEL, acreditam que a sociedade compartilha determinadosvalores, os quais são consagrados e servem de base à interpretação da constituição. Dessemodo, o Estado faria juízos de valor estabelecendo determinado modelo de vida boa. Ocomunitarismo defende a existência de laços culturais que unem as pessoas numacomunidade. Sob essa ótica, a constituição deve ser lida conforme os valores compartilhadospela sociedade a que se destina. O neoconstitucionalismo, cujo principal expoente é omexicano MIGUEL CARBONEL, sustenta que é preciso conferir força normativa aos princípiosconstitucionais. Embora a ideia original seja interessante, o neocontitucionalismo tornou‐seum pan‐principiologismo que não fornece qualquer segurança às pessoas, nem confereracionalidade ao sistema, como critica LÊNIO STRECK.

O novo constitucionalismo latino‐americano, cujo principal exemplo é a constituiçãoboliviana, defende valores comunitaristas num contexto plurinacional.

Tanto BARROSO quanto CANOTILHO veem a constituição como fundamento dosistema, defendendo que o texto constitucional sirva como princípio de interpretação detodo o ordenamento jurídico. Para esses estudiosos, os princípios constitucionais são

Page 18: [RESUMO] Direito Constitucional A

18

condicionantes da interpretação constitucional, percebendo uma hierarquia axiológica entreas normas da constituição, na qual, contudo, não seria observa hierarquia normativa.

Da mesma forma, deve‐se respeitar a supremacia da constituição e, em relação àlegislação infraconstitucional, presume‐se a sua constitucionalidade e confere‐se prevalênciaà interpretação conforme a constituição.

Ainda, é necessário prezar pelo princípio da unidade da constituição, algo que, porvezes, parece ser impossível. Pode‐se também aplicar o princípio da razoabilidade eproporcionalidade, cujo uso deve ser demonstrado, e o princípio da efetividade (o textoconstitucional) deve ser concretizado.

Page 19: [RESUMO] Direito Constitucional A

19

3º bimestre

Controle de constitucionalidade

É um filtro que verifica a compatibilidade de todos os atos públicos (normativos eadministrativos) com a constituição. Além disso, mesmo as relações interpessoais devemrespeitar os direitos fundamentais, conforme a teoria da incidência horizontal destes.

O controle de constitucionalidade só é realizado em virtude da supremacia daconstituição, tanto em aspecto formal como material. No primeiro caso, a carta magnaestabelece os parâmetros para a validade formal dos atos normativos, como os processos deaprovação das leis ordinárias, medidas provisórias, etc. Cumpre ressaltar que se uma normaanterior à nova ordem constitucional apresentava validade formal sob a égide da antigaconstituição, ela é recepcionada formalmente pela nova ordem. Melhor dizendo, a normajurídica extrai validade formal da constituição em que foi elaborada. A validade material, poroutro lado, sempre deve ser verificada em relação à constituição vigente.

A constituição é materialmente suprema, ou seja, ela não se encontra no ápice doordenamento jurídico apenas porque formalmente se estabelece assim, mas também porqueos valores que consolida estão materialmente acima de qualquer legislação ordinária.

O controle de constitucionalidade contribui para que a constituição tenha eficácianormativa, pois tal controle afasta normas que se chocam com o texto constitucional.

O constitucionalismo baseia-se em três pilares fundamentais: a supremaciaconstitucional, o controle de constitucionalidade e a rigidez constitucional.

Atualmente, há um grande debate a respeito do conflito entre democracia econstituição, uma vez que a carta magna impõe restrições à vontade popular. Já na décadade 1920, CARL SCHMITT e HANS KELSEN discutiam essa questão, defendendo,respectivamente, que a constituição é decisão política fundamental e que a constituição é anorma jurídica fundamental. Desse modo, SCHMITT confere ao Poder Executivo, querepresenta a unidade da nação, o controle de constitucionalidade, ao passo que KELSENargumenta que o Judiciário seria o responsável por realizar essa tarefa. Nesse debate,KELSEN saiu vitorioso, embora sua teoria venha sendo muito criticada no contexto atual emrazão da falta de legitimidade democrática dos magistrados.

Nos Estados Unidos, estudiosos como WALDRON e KRAMES têm defendido oconstitucionalismo popular, argumentando que cabe ao povo a decisão final sobre aconstitucionalidade dos atos públicos, sendo muito criticados por DWORKIN.

O controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário nasceu nos Estados Unidos,onde sempre houve uma grande preocupação com a limitação da vontade da maioria. Odebate atual está focado na indagação sobre a quem cabe o poder de dar a última palavrasobre o conteúdo da constituição, ou seja, sobre quem cabe o controle deconstitucionalidade.

O controle de constitucionalidade importa no afastamento de certas decisões daesfera de discussão da política ordinária de modo definitivo ou, pelo menos, a partir daimposição de uma maior dificuldade na modificação do texto constitucional. Tais decisões,tomadas durante o momento constituinte, são definitivas e insuscetíveis de alteração. Dessemodo, estabelece-se uma nítida distinção entre poder constituinte e poder constituído.

Page 20: [RESUMO] Direito Constitucional A

20

Ao poder constituído são impostos vários limites, derivados de escolhas feitas nopassado, restringindo o alcance da democracia no tempo presente. Enquanto algunschamam esses limites de pré-compromissos, os mais críticos os definem como “regrasmordaça”. Apesar das muitas opiniões contrárias, a tendência atual é de as constituições setornarem cada vez mais longas, reduzindo o espaço de discussão da política ordinária e dopoder constituído.

Apesar de o controle de constitucionalidade ser prática quase universal, não é emtodos os países que o Judiciário é o responsável por essa tarefa. A maioria dos países confereo exercício do controle de constitucionalidade aos juízes por sua alegada neutralidade emrelação às disputas políticas e por serem conhecedores da técnica jurídica. Além disso, oprincípio da inércia da jurisdição e a fundamentação das decisões judiciais garantem, emtese, o caráter neutro do Judiciário.

Por outro lado, o Poder Executivo também pode realizar o controle deconstitucionalidade, embora desde a 2ª Guerra Mundial essa tese não venha sendodefendida. Em virtude de sua natureza democrática, alguns acreditam que o controle deconstitucionalidade deva ser exercido pelo Legislativo. Na França, cabe ao ConselhoConstitucional exercer o “filtro” sobre a constituição, sendo um órgão independente detodos os demais poderes. Por fim, o controle de constitucionalidade pode ser realizado pelopróprio povo, algo que pode ocasionar a falta de proteção suficiente às minorias, diluindo-seo conteúdo do constitucionalismo em favor da democracia.

No Brasil, a última palavra é do Judiciário, ainda que todos os poderes exerçam ocontrole de constitucionalidade.

A aparente naturalidade do controle de constitucionalidade pelo Judiciário se deve,sobretudo, ao conhecimento técnico dos juízes. Nos Estados Unidos, o grau de legitimidadedemocrática dos magistrados da Suprema Corte é muito inferior ao dos membros do STF,uma vez que são indicados por um presidente cujo poder deriva dos estados – e não do povo– e são confirmados por um Senado que, em origem, era eleito indiretamente.

KELSEN foi um ferrenho defensor do controle de constitucionalidade pelo Judiciário,pois, segundo ele, seria ingenuidade política legar ao mesmo poder que elabora as leis ocontrole de constitucionalidade sobre elas.

Nos Estados Unidos, o controle de constitucionalidade pelos juízes se inciou nocomeço do séc. XIX com o caso Marbury vs. Madison, que instaurou a superioridade daconstituição sobre as leis ordinárias naquele país.

No entanto, se na América do Norte as leis inconstitucionais são consideradas nulas,na Alemanha, sob a influência de KELSEN, firmou-se o entendimento de que tais leis sãoanuláveis, sendo que a sua declaração de inconstitucionalidade gera apenas efeitos “exnunc”. No Brasil, adotou-se a primeira tese.

O controle de constitucionalidade pode ser difuso (qualquer juiz pode decidir pelainconstitucionalidade de uma norma) ou concentrado (juízes de instâncias inferiores podemapenas decretar incidentes de inconstitucionalidade, remetendo a matéria à análise de umtribunal constitucional). Em regra, o controle difuso é também concreto, com efeitos “intrapartes”, enquanto o controle concentrado é abstrato, com efeitos “erga omnes”.

O poder Legislativo também faz controle de constitucionalidade. Um projeto de lei

Page 21: [RESUMO] Direito Constitucional A

21

precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da casa iniciadora, bem comopelo plenário. Se aprovado, é votado pela casa revisora e, antes de entrar em vigor, é enviadaao Poder Executivo, para que este sancione ou vete (por motivo político ou jurídico) oprojeto.

A França optou por uma via alternativa para o controle de constitucionalidade, oConselho Constitucional, formado por 3 membros indicados pelo presidente, 3 pelo Senadoe 3 pela Assembleia de Representantes. Até 2010, esse controle era apenas preventivo eexclusivo. No entanto, a partir dessa data, o Judiciário passou a poder criar incidentes deinconstitucionalidade quando a controvérsia se referir a direitos fundamentais.

O controle de constitucionalidade em sentido formal se dá em âmbito subjetivo,quando se analisa se houve respeito à determinação sobre a iniciativa da propositura do atonormativo, a qual é inafastável, e em âmbito objetivo, quando se verifica se o rito e oquórum para a aprovação do projeto de lei foram respeitados.

Em relação à inconstitucionalidade material da constituição, tudo se torna maiscomplexo, pois a interpretação adquire grande relevo. Desse modo, as lutas ideológicas semultiplicam e a discussão se avoluma. Enquanto alguns doutrinadores adotamposicionamento claramente pró-legislador, argumentando que a inconstitucionalidade sópode ser declarada quando se manifestar de maneira clara, outros argumentam que oJudiciário pode tomar postura mais ativa.

O controle de constitucionalidade pode ser preventivo, geralmente realizado peloLegislativo, mas também pelo Judiciário, quando acontece antes de o ato ingressar noordenamento jurídico. Por outro lado, é repressivo quando o ato já desfruta de validade.

Desde a chegada da ministra Carmem Lúcia Rocha ao STF, algumas decisões dotribunal passaram a levar em conta o preâmbulo no controle de constitucionalidade,incluindo aquele no chamado bloco de constitucionalidade, que apresenta os parâmetrospara o controle. Além do preâmbulo, do corpo do texto e do ADCT, os tratados internacionaisde direitos humanos – e aí se discute se todos ou apenas os recepcionados conforme o ritopara aprovação de emendas constitucionais – também podem ensejar o controle, mas deconvencionalidade, o qual não existe no Brasil. Na França, o bloco de constitucionalidade émais extenso.

O Poder Legislativo faz controle preventivo, mas, em alguns casos, tambémrepressivo. Desse modo, um decreto legislativo pode suspender os efeitos de um decreto doExecutivo ou mesmo de resoluções do Judiciário quando os parlamentares compreendemque os outros órgãos de soberania estão exorbitando suas funções. É possível concluir que oLegislativo, de maneira geral, faz controle preventivo.

O Executivo, a partir do poder de veto, faz também controle de constitucionalidade.No entanto, o veto não pode se dar apenas em relação a palavras ou exceções, mas somentesobre artigos, incisos e parágrafos inteiros. Essa é uma inovação da Constituição de 1988. Emtese, o Poder Executivo pode também efetuar controle repressivo ao desaplicar uma normaque considera inconstitucional ou ainda, ao provocar o Judiciário a atuar nesse sentido.

Por fim, o Poder Judiciário exerce controle repressivo e, às vezes, preventivo, quandose ajuíza um mandado de segurança em que um parlamentar alega que tem o direito líquidoe certo de não participar de um processo legiferante nitidamente inconstitucional. De modo

Page 22: [RESUMO] Direito Constitucional A

22

geral, quando se trata de um projeto de emenda constitucional, o Supremo acaba acatando omandado de segurança, algo que não costuma se estender aos projetos de lei. Acompetência do STF deriva do fato de o mandado de segurança ser ajuizado contra opresidente da casa legislativa.

Controle judicial de constitucionalidade

Durante o Império, o controle de constitucionalidade era feito pelo Poder Moderador.Na República, houve alterações, especialmente por conta da influência de Rui Barbosa, quedefendeu e conseguiu implementar o controle exclusivamente difuso e concreto. Em 1934, écriada a ação interventiva, de iniciativa do procurador-geral da República, que permitia ocontrole concentrado de constitucionalidade dos princípios constitucionais sensíveis,referentes ao pacto federativo.

Em 1965, é criada a representação por inconstitucionalidade, também de iniciativa doprocurador-geral da República, extensível, doravante, a toda a constituição. No controledifuso, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade são “ex tunc” e apenas aplicáveis àspartes. Como regra geral do direito brasileiro, o controle de constitucionalidade abstrato geraefeitos “ex tunc” e “erga omnes”.

Com a Constituição de 1988, estende-se o rol dos legitimados a propor ações decontrole abstrato de constitucionalidade, atribuindo-se maior valor a este (em grandemedida, por conta do caso Adauto Cardoso). O rol dos legitimados (são nove, no total) podeser encontrado no art. 103 da constituição.

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a açãodeclaratória de constitucionalidade:

I - o Presidente da República;II - a Mesa do Senado Federal;III - a Mesa da Câmara dos Deputados;IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do DistritoFederal;V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;VI - o Procurador-Geral da República;VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

A jurisprudência, no entanto, entende que alguns dos legitimados têm caráteruniversal, mas aos demais é exigida a demonstração de pertinência temática do objeto dalide em relação a si.

Diferentemente do Executivo, o Judiciário pode vetar somente palavras ou expressõesde um ato normativo. Isso confere uma enorme vantagem ao Supremo em relação aocontrole efetuado pelo Legislativo e pelo Executivo.

O modelo brasileiro é um “mix” dos modelos norte-americano e austríaco,diferenciando-se deste último pelos efeitos “ex tunc” das decisões de controle abstrato epela inexistência de um tribunal genuinamente constitucional.

Além de aumentar o rol de legitimados ativos, a Constituição de 1988 criou a AçãoDireta de Inconstitucionalidade por Omissão (aplicável nas hipóteses em que o Legislativo

Page 23: [RESUMO] Direito Constitucional A

23

não cumpre com o dever de legislar expressamente determinado pelo texto constitucional),de caráter abstrato, cujo equivalente concreto é o mandato de injunção; e, a Arguição deDescumprimento de Preceito Fundamental, de natureza abstrata e cabível aos legitimadosativos. Nas ADPF, o objeto é mais amplo que nas ADI, pois engloba até mesmo direitosanteriores à ordem constitucional vigente. Com a emenda nº 3/93, surgiu a AçãoDeclaratória de Constitucionalidade, a qual serve para garantir a manutenção da validade dedeterminado ato normativo mesmo no controle difuso.

Controle no Brasil1

O controle de constitucionalidade no Brasil pode ser caracterizado pela originalidadee diversidade de instrumentos processuais destinados à fiscalização da constitucionalidadedos atos do poder público e à proteção dos direitos fundamentais. Essa diversidade de açõesconstitucionais próprias do modelo difuso é ainda complementada por uma variedade deinstrumentos voltados ao exercício do controle abstrato de constitucionalidade peloSupremo Tribunal Federal, como a ação direta de inconstitucionalidade (ADI), a ação diretade inconstitucionalidade por omissão (ADO), a ação declaratória de constitucionalidade(ADC) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF).

Controle difuso

O modelo de controle difuso adotado pelo sistema brasileiro permite que qualquerjuiz ou tribunal declare a inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, não havendorestrição quanto ao tipo de processo. Tal como no modelo norte-americano, há um amplopoder conferido aos juízes para o exercício do controle da constitucionalidade dos atos dopoder público.

Ao contrário de outros modelos do direito comparado, o sistema brasileiro nãoreserva a um único tipo de ação ou de recurso a função primordial de proteção de direitosfundamentais, estando a cargo desse mister, principalmente, as ações constitucionais dohabeas corpus, do habeas data, do mandado de segurança, do mandado de injunção, a açãocivil pública e a ação popular.

O habeas corpus destina-se a proteger o indivíduo contra qualquer medida restritivado Poder Público à sua liberdade de ir e vir. Liberdade de locomoção entendida de formaampla, afetando toda e qualquer medida de autoridade que possa em tese acarretarconstrangimento para a liberdade de ir e vir. Ressalte-se que, não obstante a coação àliberdade individual comumente advém de atos emanados do Poder Público, não se podedescartar a possibilidade da impetração de habeas corpus contra atos de particular.

O habeas data é instituto destinado a assegurar o conhecimento de informaçõesrelativas à pessoa do impetrante constantes de registros ou bancos de dados de entidadesgovernamentais ou de caráter público e para permitir a retificação de dados, quando não seprefira fazê-lo de modo sigiloso.

O mandado de segurança é instrumento processual de proteção de direitos decriação genuinamente brasileira e como especialização do direito de proteção judicial efetiva,destina-se a proteger direito individual ou coletivo líquido e certo contra ato ou omissão deautoridade pública não amparado por habeas corpus ou habeas data.

Pela própria definição constitucional, o mandado de segurança tem utilização ampla,

1 Do texto “O Controle da Constitucionalidade no Brasil”, de Gilmar Mendes

Page 24: [RESUMO] Direito Constitucional A

24

abrangente de todo e qualquer direito subjetivo público sem proteção específica, desde quese logre caracterizar a liquidez e certeza do direito, materializada na inquestionabilidade desua existência, na precisa definição de sua extensão e aptidão para ser exercido no momentoda impetração.

Quanto ao cabimento do mandado contra ato normativo o Supremo Tribunal Federaltem orientação pacífica no sentido do não-cabimento de mandado de segurança contra leiou ato normativo em tese, uma vez que ineptos para provocar lesão a direito líquido e certo.A concretização de ato administrativo com base na lei poderá viabilizar a impugnação, compedido de declaração de inconstitucionalidade da norma questionada. Admite-se, porém,mandado de segurança contra lei ou decreto de efeitos concretos.

O Mandado de Injunção tem sua concessão prevista constitucionalmente sempre quea falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos e liberdadesconstitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Detal forma, o mandado de injunção há de ter por objeto o não-cumprimento de deverconstitucional de legislar que, de alguma forma, afete direitos constitucionalmenteassegurados (falta de norma regulamentadora que torne inviável o exercício de direitos eliberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à soberania e à cidadania). Omissãoque tanto pode ter caráter absoluto ou total como pode se materializar de forma parcial.

Além dos processos e sistemas destinados à defesa de posições individuais, aproteção judiciária pode realizar-se também pela utilização de instrumentos de defesa deinteresses difusos e coletivos, como a ação popular e a ação civil pública.

A ação popular é instrumento previsto com o objetivo de anular ato lesivo aopatrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa,ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. A ação civil pública é outro relevanteinstrumento de defesa do interesse geral, sendo destinada à defesa dos chamados interessesdifusos e coletivos relativos ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, aoconsumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, daordem econômica e da economia popular, dentre outros.

A ação popular configura instrumento de defesa de interesse público, não tendo emvista primordialmente a defesa de posições individuais, no entanto as decisões tomadas emsede de ação popular podem ter reflexos sobre posições subjetivas. A ação civil pública, damesma forma, tem-se constituído em importante instrumento de defesa dos direitos emgeral, especialmente os direitos do consumidor.

Controle abstrato

O modelo de controle abstrato adotado pelo sistema brasileiro concentra noSupremo Tribunal Federal a competência para processar e julgar as ações autônomas nasquais se apresenta a controvérsia constitucional.

O modelo abstrato recebeu ênfase da Constituição de 1988, uma vez que,praticamente, todas as controvérsias constitucionais relevantes passaram a ser submetidasao Supremo Tribunal Federal mediante processo de controle abstrato de normas.

A ampla legitimação, a presteza e a celeridade desse modelo processual, dotadoinclusive da possibilidade de suspender imediatamente a eficácia do ato normativoquestionado, mediante pedido de cautelar, constituem elemento explicativo de tal

Page 25: [RESUMO] Direito Constitucional A

25

tendência.

A Constituição Federal de 1988 prevê (art. 103), como ações típicas do controleabstrato de constitucionalidade, a ação direta de inconstitucionalidade (ADI), a açãodeclaratória de constitucionalidade (ADC), a ação direta de inconstitucionalidade poromissão (ADO) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF).

A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) é o instrumento destinado à declaraçãode inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, utilizando comoparâmetro de controle, exclusivamente, a Constituição vigente.

As decisões proferidas em ação direta de inconstitucionalidade possuem eficácia extunc, erga omnes e efeito vinculante para todo o Poder Judiciário e para todos os órgãos daAdministração Pública, direta e indireta – não abrangendo o Poder Legislativo.

Ressalte-se, porém, que a legislação que regulamenta a ação direta deinconstitucionalidade prevê a possibilidade do Plenário do Tribunal modular os efeitos dasdecisões no âmbito do controle abstrato de normas, permitindo ao STF declarar ainconstitucionalidade da norma: (a) a partir do trânsito em julgado da decisão (declaração deinconstitucionalidade ex nunc); (b) a partir de algum momento posterior ao trânsito emjulgado, a ser fixado pelo Tribunal (declaração de inconstitucionalidade com eficácia profuturo); (c) sem a pronúncia da nulidade da norma; e (d) com efeitos retroativos, maspreservando determinadas situações.

O Supremo Tribunal Federal tem evoluído na adoção de novas técnicas de decisão nocontrole abstrato de constitucionalidade. Além das muito conhecidas técnicas deinterpretação conforme a Constituição, declaração de nulidade parcial sem redução de texto,ou da declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade, aferição da “leiainda constitucional” e do apelo ao legislador, são também muito utilizadas as técnicas delimitação ou restrição de efeitos da decisão, o que possibilita a declaração deinconstitucionalidade com efeitos pro futuro a partir da decisão ou de outro momento quevenha a ser determinado pelo tribunal.

A ação declaratória de constitucionalidade (ADC) é o instrumento destinado àdeclaração da constitucionalidade de lei ou ato normativo federal. Tem-se considerado, porisso, a ação declaratória de constitucionalidade como uma Ação Direta deInconstitucionalidade de sinal trocado, ressaltando-se o caráter dúplice ou ambivalentedessas ações. Assim como na ADI, o parâmetro de controle da ADC é, exclusivamente, aConstituição vigente.

O cabimento da ação declaratória de constitucionalidade pressupõe a existência desituação hábil a afetar a presunção de constitucionalidade da lei, não se afigurandoadmissível a propositura de ação declaratória de constitucionalidade se não houvercontrovérsia ou dúvida relevante quanto à legitimidade da norma.

A legislação que regulamente a ação declaratória de constitucionalidade tornapossível ao Supremo Tribunal Federal, por meio de medida cautelar, determinar a juízes eTribunais a suspensão do julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou doato normativo objeto da ADC até seu julgamento definitivo.

Da mesma forma que na ADI, as decisões proferidas em ação declaratória deconstitucionalidade possuem eficácia ex tunc, erga omnes e efeito vinculante para todo o

Page 26: [RESUMO] Direito Constitucional A

26

Poder Judiciário e para todos os órgãos da Administração Pública, direta e indireta eexiste igual possibilidade de que, nos casos em que a decisão com efeitos ex tunc importe emviolação severa da segurança jurídica ou de outro valor de excepcional interesse social, oPlenário do Tribunal module os efeitos das decisões.

A ação direta de inconstitucionalidade por Omissão (ADO) é o instrumento destinadoà aferição da inconstitucionalidade da omissão dos órgãos competentes na concretização dedeterminada norma constitucional, sejam eles órgãos federais ou estaduais, seja a suaatividade legislativa ou administrativa, desde que se possa, de alguma maneira, afetar aefetividade da Constituição. Assim como na Ação direta de inconstitucionalidade e na AçãoDeclaratória de Constitucionalidade, o parâmetro de controle da Ação direta deInconstitucionalidade por Omissão é, exclusivamente, a Constituição vigente.

Nesse sentido, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão pode ter comoobjeto tanto a omissão total, absoluta, do legislador, quanto a omissão parcial, ou ocumprimento incompleto ou defeituoso de dever constitucional de legislar.

Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal adotou o entendimento de que a decisãoque declara a inconstitucionalidade por omissão autorizaria o Tribunal apenas a cientificar oórgão inadimplente para que este adotasse as providências necessárias à superação doestado de omissão inconstitucional. Assim, reconhecida a procedência da ação, deve o órgãolegislativo competente ser informado da decisão, para as providências cabíveis. Se se tratarde órgão administrativo, está ele obrigado a colmatar a lacuna dentro do prazo de 30 dias.

Entretanto, em recentes decisões, o Plenário do Tribunal passou a adotar oentendimento de que, diante da prolongada duração do estado de omissão, é possível que adecisão proferida pelo STF adote providências aptas a regular a matéria objeto da omissãopor prazo determinado ou até que o legislador edite norma apta a preencher a lacuna.Ressalte-se que, nesses casos, o Tribunal, sem assumir compromisso com o exercício de umatípica função legislativa, passou a aceitar a possibilidade de uma regulação provisória dotema pelo próprio Judiciário. O Tribunal adotou, portanto, uma moderada sentença de perfiladitivo, introduzindo modificação substancial na técnica de decisão da ação direta deinconstitucionalidade por omissão.

O Tribunal também passou a considerar a possibilidade de, em alguns casosespecíficos, indicar um prazo razoável para a atuação legislativa, ressaltando asconsequências desastrosas para a ordem jurídica da inatividade do legislador no casoconcreto.

A arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), como típicoinstrumento do modelo concentrado de controle de constitucionalidade, tanto pode darensejo à impugnação ou questionamento direto de lei ou ato normativo federal, estadual oumunicipal, como pode acarretar uma provocação a partir de situações concretas, que levemà impugnação de lei ou ato normativo.

No primeiro caso, tem-se um tipo de controle de normas em caráter principal, o qualopera de forma direta e imediata em relação à lei ou ao ato normativo. No segundo,questiona-se a legitimidade da lei tendo em vista a sua aplicação em uma dada situaçãoconcreta (caráter incidental).

Assim como no caso da Ação Declaratória de Constitucionalidade, é pressuposto para

Page 27: [RESUMO] Direito Constitucional A

27

o ajuizamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental a existência decontrovérsia judicial ou jurídica relativa à constitucionalidade da lei ou à legitimidade do atoquestionado. Portanto, também na arguição de descumprimento de preceito fundamentalhá de se cogitar de uma legitimação para agir in concreto, que se relaciona com a existênciade um estado de incerteza, gerado por dúvidas ou controvérsias sobre a legitimidade da lei. Énecessário que se configure, portanto, situação hábil a afetar a presunção deconstitucionalidade ou de legitimidade do ato questionado.

Ademais, a arguição de descumprimento de preceito fundamental somente seráadmitida se não houver outro meio eficaz de sanar a lesividade. O juízo de subsidiariedadehá de ter em vista, especialmente, os demais processos objetivos já consolidados no sistemaconstitucional.

Nesse caso, cabível a ação direta de inconstitucionalidade ou a ação declaratória deconstitucionalidade, não será admissível a arguição de descumprimento. Em sentidocontrário, não sendo admitida a utilização de ações diretas de constitucionalidade ou deinconstitucionalidade — isto é, não se verificando a existência de meio apto para solver acontrovérsia constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata — há de se entenderpossível a utilização da arguição de descumprimento de preceito fundamental.

É o que ocorre, fundamentalmente, nas hipóteses relativas ao controle delegitimidade do direito pré-constitucional, do direito municipal em face da ConstituiçãoFederal e nas controvérsias sobre direito pós-constitucional já revogado ou cujos efeitos já seexauriram. Nesses casos, em face do não-cabimento da ação direta de inconstitucionalidade,não há como deixar de reconhecer a admissibilidade da arguição de descumprimento.

Cabe a arguição de descumprimento de preceito fundamental para evitar ou repararlesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público. Caberá também a arguiçãode descumprimento quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucionalsobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, inclusive anteriores à Constituição(leis pré-constitucionais).

É muito difícil indicar, a priori, os preceitos fundamentais da Constituição passíveis delesão tão grave que justifique o processo e julgamento da arguição de descumprimento. Nãohá dúvida de que alguns desses preceitos estão enunciados, de forma explícita, no textoconstitucional. Nessa linha de entendimento, a lesão a preceito fundamental não seconfigurará apenas quando se verificar possível afronta a um princípio fundamental, talcomo assente na ordem constitucional, mas também a disposições que confiram densidadenormativa ou significado específico a esse princípio.

Aplicam-se à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental as técnicas dedecisão e de modulação de seus efeitos já apresentadas. Julgada a ação, deverá ser feitacomunicação às autoridades responsáveis pela prática dos atos questionados, fixando-se, sefor o caso, as condições e o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental.

Singularidades do modelo misto

O recurso extraordinário consiste no instrumento processual-constitucional destinadoa assegurar a verificação de eventual afronta à Constituição em decorrência de decisãojudicial proferida em última ou única instância do Poder Judiciário.

Até a entrada em vigor da Constituição de 1988, era o recurso extraordinário —

Page 28: [RESUMO] Direito Constitucional A

28

também quanto ao critério de quantidade — o mais importante processo da competência doSupremo Tribunal Federal. Esse remédio excepcional, desenvolvido segundo o modelo dowrit of error norte-americano pode ser interposto pela parte vencida, no caso de ofensadireta à Constituição, declaração de inconstitucionalidade de tratado ou lei federal oudeclaração de constitucionalidade de lei estadual expressamente impugnada em face daConstituição Federal ou quando a decisão recorrida julgar válida lei ou ato de governo localem face da Constituição.

Recentemente, no âmbito da Reforma do Judiciário implementada pela EmendaConstitucional n° 45, de 2004, foi realizada mudança significativa no recurso extraordinário,cuja admissão deverá passar pelo crivo da Corte referente à repercussão geral da questãoconstitucional nele versada. A adoção desse novo instituto deverá ressaltar a feição objetivado recurso extraordinário.

De acordo com a inovação legal, para efeito de repercussão geral, será considerada aexistência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social oujurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa. Haverá também repercussãogeral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudênciadominante do Tribunal.

Se o Tribunal negar a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos osrecursos sobre matéria idêntica, os quais serão indeferidos liminarmente.

Para evitar a avalanche de processos que chega ao Supremo Tribunal, os Tribunais deorigem poderão selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia eencaminhá-los – somente estes – ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais.Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ãoautomaticamente não admitidos. Por outro lado, declarada a existência da repercussão gerale assim julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciadospelos Tribunais de origem, que poderão declará-los prejudicados ou se retratar.

Será presumida a repercussão geral quando a questão já tiver sido reconhecida ouquando o recurso extraordinário impugnar decisão contrária à súmula ou jurisprudênciadominante da Corte.

Na medida em que tende a reduzir drasticamente o volume numérico de processosque chegam à Corte, assim como a limitar o objeto dos julgamentos a questõesconstitucionais de índole objetiva, a nova exigência da repercussão geral no recursoextraordinário abre promissoras perspectivas para a jurisdição constitucional no Brasil,especialmente quanto à assunção pelo Supremo Tribunal Federal do típico papel de umverdadeiro Tribunal Constitucional.

Aula com o monitor Ariel

Os recursos extraordinários são julgados pelo STF e apresentam repercussão geral, aopasso que os recursos especiais são apreciados pelo STJ. Ambos, entretanto, fazem parte docontrole de constitucionalidade concreto ou difuso (por via incidental), sendo que osprimeiros se referem diretamente a norma constitucional, apresentando, por vezes,repercussão geral. Via de regra, tanto os recursos extraordinários quanto os especiais geramefeitos “ex tunc”.

O controle abstrato ou concentrado de constitucionalidade (por via de ação direta)

Page 29: [RESUMO] Direito Constitucional A

29

pode se dar por ADIn, ADO, ADC, ADInterventiva e ADPF. O STF é o responsável por julgaressas ações, cabendo aos Tribunais de Justiça estaduais fazer o controle abstrato sobrequestões referentes às constituições dos estados.

A ADIn é regulada pela Lei nº 9.868/99 e pelo art. 102, I, “a”, da Constituição Federal.Nessa ação, não pode haver desistência da parte autora nem participação de terceirosinteressados, embora seja permitida a presença de “amicus curiae”. Em regra, os efeitos dadecisão sobre uma ADIn são “erga omnes” e “ex tunc”, apesar da possibilidade demodulações e de não se fazer coisa julgada frente ao Supremo nesses casos (existe apossibilidade de ajuizamento de nova ADIn no futuro).

A ADC também é regulada pela Lei nº 9.868/99 e visa garantir unanimidade sobre aconstitucionalidade de lei ou ato normativo. Os efeitos são o de sustar todos os processosrelacionados ao ato normativo objeto de ADC, apresentando eficácia “erga omnes”.

A ADO proporciona a análise abstrata da constitucionalidade de omissões totais(inexistência de norma infraconstitucional que regulamente o direito garantidoconstitucionalmente), parciais (há lei, mas esta não garante o direito em sua completude) ourelativos (há lei, mas esta garante o direito de apenas um grupo de pessoas determinado).

A ADPF é regulada pela lei Nº 9882/89 e tem grande importância no controle deconstitucionalidade sobre ato do poder público federal, estadual ou municipal que violealgum princípio fundamental. A ADPF apresenta função subsidiária, sendo cabível somentequando todas as demais ações tiverem falhado.

Direitos fundamentais

PEREZ LUÑO:

Modelo constitucional de sociedadeestatuto dos direitos fundamentaisforma de Estadosistema econômico

Estado de direito

Para PÉREZ LUNÕ, o modelo constitucional de sociedade se baseia na escolha de umsistema econômico (atualmente, entre mais ou menos capitalismo), de uma forma de Estado(federação, confederação ou Estado unitário) e num estatuto dos direitos fundamentais, osquais apresentam um regime jurídico próprio, embora não sejam hierarquicamentesuperiores às demais normas constitucionais. No Brasil, os direitos fundamentais têmaplicabilidade plena e imediata (art. 5º, §1º da CF) e não são “numerus clausus” (art. 5º,§ 2ºda CF).

Discute-se se, dentro do Estado de Direito, cada país pode decidir quais direitos sãoconsiderados fundamentais ou se estes devem ter caráter universal. Debate-se a respeito daspossíveis limitações aos direitos fundamentais, como à liberdade de expressão e ao direito àvida, por exemplo.

Os direitos fundamentais podem ser vistos a partir de uma dimensão subjetiva,própria do indivíduo, ou de uma dimensão axiológica ou objetiva, que prega o respeito a taisdireitos por serem fundamentais e próprios de toda a coletividade. Essa última dimensãomostra os princípios sobre os quais a sociedade decidiu se constituir, embora o conteúdo dos

Page 30: [RESUMO] Direito Constitucional A

30

direitos fundamentais seja frequentemente preenchido de maneiras diversas.

Os direitos fundamentais surgiram a partir das demandas por liberdade religiosa epelo afastamento das prisões arbitrárias, que se baseavam na ideia de positivação dosdireitos inatos defendidos pelo jusnaturalismo, durante os séculos XVI e XVII. BARTOLOMÉDE LAS CASAS, JOHN LOCKE e THOMAS PAINE argumentaram em favor de tais direitos e desua positivação. Na França, o surgimento da expressão “direitos fundamentais” se deu porvolta de 1770, apesar de a Europa já contemplar alguns desses direitos desde 1215, com aMagna Carta, que protegia proprietários rurais contra tributação excessiva. Em 1628, há aPetition of Rights, garantindo a liberdade religiosa na Grã-Bretanha e, em 1679, cria-se ohabeas corpus. A Bill of Rights, de 1689, consagra, por fim, os direitos fundamentais, os quaissão constitucionalmente garantidos pela primeira vez na “Constituição do bom povo daVirgínia”, de 1776.

Tanto LOCKE como JOHN STUART MILL foram defensores do direito de propriedade,embora o primeiro os desse maior extensão, conferindo às pessoas os direitos sobre opróprio corpo.

A 1ª geração dos direitos fundamentais diz respeito aos direitos civis e políticos, queexigem a omissão do Estado; a 2ª geração refere-se aos direitos sociais; e a 3ª geraçãoconstitui-se dos direitos econômicos, culturais e ambientais. Para alguns, haveria uma 4ªgeração, a qual compreenderia a democracia direta, segundo PAULO BONAVIDES, mastambém a paz mundial, o direito à internet, etc. Há quem aponte que os direitos civis epolíticos correspondem a um baixo custo ao Estado, enquanto os direitos sociais eeconômicos teriam um custo elevados, algo que é criticado pela professora [Desiree].

Por sua função, os direitos fundamentais se dividem em direitos de defesa e direitosprestacionais. Diferentemente da antiguidade, hoje em dia a realização do sujeito se dá emsua casa, não na pólis. Assim, a concepção atual de liberdade se baseia no caráter negativodesta, legando ao arbítrio da pessoa a decisão sobre participar politicamente ou não, votarou não, etc., enquanto a liberdade dos antigos era compreendida num aspecto mais positivo,como a possibilidade (liberdade) de participação nas discussões da pólis.

Segundo a concepção atual (negativa) de liberdade, o Estado deve abster-se deimpedir ou intervir na esfera privada do indivíduo, o qual pode pretender a abstenção doEstado em alguns casos. Além disso, as pessoas podem pretender também a revogação ouanulação de atos públicos que violem a liberdade do cidadão, bem como o direito de suasopiniões serem consideradas pelo Estado e que este proteja as suas liberdades.

Já os direitos prestacionais buscam a liberdade aliada à igualdade, procurandoconcretizar liberdades positivas, que significam a exigência de certas prestações por parte doEstado. Para atingir essa situação mais equânime, na qual os indivíduos tenham os meiosmateriais (condições fáticas) necessários à fruição da liberdade, alguns defendem os direitossociais, e outros as garantias procedimentais. Os primeiros estão mais relacionados àconformação de um futuro para a sociedade, estando ligados às constituições projeto oudirigentes.

Hoje, acredita-se (não sem certa controvérsia) que o Judiciário pode exigir do Estadoa prestação dos direitos sociais positivados na Constituição.

Sobre os direitos econômicos e culturais, pode-se dizer que não há grande certeza

Page 31: [RESUMO] Direito Constitucional A

31

quanto ao seu conteúdo e extensão.

Os direitos fundamentais parecem formar um rol de direitos universais, indisponíveisà discricionariedade das nações. Entretanto, muitos se opõem a essa ideia, defendendo aautodeterminação dos povos. Na esfera internacional, cada vez mais se positiva essa espéciede moral jurídica transnacional em tratados.

Deve-se também destacar a frequente falta de efetividade dos direitos fundamentaise da extensão do seu conteúdo, em especial no tocante aos direitos prestacionais.

Seja como for, os direitos fundamentais apresentam importância histórica, retórica epolítica, e também jurídica. Os direitos fundamentais e seus discursos marcam a passagemda pré-modernidade à modernidade, do teocentrismo ao antropocentrismo, embora algunsmarxistas acreditem que tais direitos apenas servem à exploração.

Em âmbito político, os direitos fundamentais fizeram com que a dominação de umhomem sobre outro só ocorresse dentro dos limites fixados pelo dominado. O poder já nãomais deriva de uma divindade ou da tradição, mas da vontade humana. O direito passou aser conformado pelos direitos fundamentais, e mesmo o Estado foi limitado como modo deresguardar os direitos dos cidadãos.

Apesar do caráter histórico dos direitos fundamentais defendido pela maioria dadoutrina, há quem pregue a existência de direitos inatos, atemporais, os quais não estariamà disposição nem sequer do poder constituinte. Essa segunda concepção traz o problema dadefinição da extensão de tais direitos atemporais. Aqueles que não enxergam aatemporalidade dos direitos fundamentais pregam que a proibição do retrocesso seriasuficiente para afastar alternativas totalitárias.

Os direitos fundamentais são inalienáveis, imprescritíveis e irrenunciáveis. O debatese instaura quanto à extensão desses direitos que não é pacífica na doutrina, nem najurisprudência. Embora tais direitos sejam inalienáveis, podem ter seu exercício restringidopelo sujeito, tal qual ocorre na publicação de revistas pornográficas e na realização de realityshows. A crise econômica europeia tem colocado em questão a efetividade dos direitosfundamentais naquele continente, embora o rol de direitos passe por uma fase crescente nosEstados Unidos.

Formalmente, um direito é considerado fundamental quando assim é classificadopela Constituição. Entretanto, a cláusula de abertura do art. 5º, § 2º da CF possibilita quemesmos direitos não expressos no texto constitucional sejam invocados judicialmente.

Muito se discute sobre quais são os direitos materialmente fundamentais, que nãopodem ser restringidos pelo legislador ordinário. Para INGO SARLET, direitos fundamentaissão aqueles relacionados ao desenvolvimento da dignidade da pessoa humana, o que éatualmente muito criticado pela abstração do conceito. A professora prefere associar afundamentalidade à cidadania. Seja como for, muito depende da análise dos casos concretos.

Importa destacar, também, que os direitos fundamentais são relativos, havendo tantolimites internos quanto externos a eles. Os primeiros são os limites impostos pelo mesmodiploma que prevê o direito, explicita ou implicitamente, Exemplos disso são a vedação àmanifestação anônima (explícito) e a previsão de eventual responsabilização do sujeito casoofenda a honra de outrem (implícito); além dos limites à formação de partidos políticos quesão um tanto quanto obscuros. Os limites externos são aqueles previstos em lei, explícita (é

Page 32: [RESUMO] Direito Constitucional A

32

preciso ser aprovado no exame da OAB para exercer a profissão de advogado) ouimplicitamente. Nesta última hipótese, se houver conflito entre dois direitos fundamentais,faz-se ponderação.

A titularidade dos direitos fundamentais pode ser de pessoas físicas e jurídicas noque couber. Alguns inserem também as gerações futuras como titulares desses direitos.

A identificação dos direitos fundamentais tem grande relevância, uma vez que elestêm um regime jurídico de proteção próprio, que impede a sua abolição ou restrição. Aterminologia constitucional classifica os direitos fundamentais em direitos individuais,coletivos e difusos. Alguns afirmam que os primeiros compreendem os chamados direitos deliberdade e políticos, que podem ser exercidos pelo próprio indivíduo isoladamente. Osdireitos coletivos só são exercidos coletivamente, sendo que a titularidade pode serindividual ou coletiva. Diferem dos direitos difusos porque a titularidade destes últimos éindeterminada, não havendo qualquer vínculo factual entre seus titulares.

Desde 1985, a ação popular permite que o cidadão ajuíze ação para defender direitoscoletivos e difusos. Da mesma forma, O Ministério Público pode acionar o Judiciário paradefender direitos individuais. O grande problema que se coloca é que grande parte dosmagistrados brasileiros ainda pensa o processo como baseado tão somente em demandasindividuais.

O CDC trata da separação entre direitos coletivos e difusos, embora nas controvérsiasque não se relacionam à esfera consumerista a divisão não seja tão clara.

Page 33: [RESUMO] Direito Constitucional A

33

4º bimestre

Os direitos fundamentais têm como fontes o texto expresso da Constituição, ostratados internacionais dos quais o Brasil faz parte e os princípios e regime adotados peloconstituinte. Se o direito previsto no tratado coincide com o garantido constitucionalmente,não há controvérsia. Se o acordo conferir uma garantia maior, é esta a norma aplicável. Sehouver tratamento diverso dispensado pela Constituição e pelo tratado, aplica-se a normaque dá maior proteção ao indivíduo frente ao Estado.

Os direitos fundamentais têm aplicabilidade imediata, o que significa que o Estadonão pode tomar iniciativas que contrariem tais direitos. O problema é que, em seu aspectopositivo, a efetividade dos direitos fundamentais encontra muitas dificuldades. Em caso decrise econômica e escassez orçamentária, entende-se que não pode haver retrocesso nasgarantias aos direitos sociais, embora a pausa na evolução de tais garantias seja possível.

Os mecanismos de defesa servem para garantir o respeito aos direitos fundamentais.São exemplos o habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança, etc.

Os direitos fundamentais são cláusula pétrea, constituindo o núcleo essencial daConstituição, junto com a federação, a separação dos poderes e o voto secreto universal eperiódico. Debate-se se os direitos sociais poderiam ser revogados por emendaconstitucional, prevalecendo a corrente doutrinária que não permite tal possibilidade.

A eficácia horizontal dos direitos humanos, estendida às relações privadas, éconhecida como “Drittwirkung”. Para alguns, ofensas aos direitos fundamentais não sãotoleráveis em nenhuma esfera, sendo que deve haver aplicabilidade plena e imediata, isto é,sem necessidade de legislação. CANOTILHO defende (certos) casos de eficácia horizontal:

a) Quando há expressa previsão constitucional;

b) Quando há expressa previsão legal;

c) Quando o juiz assim determina;

d) Em relação a entes privados necessários ao exercício de direitos fundamentais(por exemplo, partidos políticos)

Titularidade

Sendo o direito de voto uma prerrogativa fundamental, pode a pessoa jurídica votarou financiar campanhas? Ela pode influenciar a decisão política ou o rumo da nação? O STFdiz que quem titulariza o mandato é o partido, uma pessoa jurídica. Haveria ai, portanto,uma incoerência. Há uma discussão quanto ao cabimento de direitos políticos às pessoasjurídicas. No México, por exemplo, distinguem-se as pessoas jurídicas que podem participardo jogo eleitoral. Não há dúvida que todos os seres humanos são titulares de direitosfundamentais. Pode-se indagar, porém, se apenas as pessoas físicas protagonizam taisdireitos.

Não há, em princípio, impedimento insuperável para que as pessoas jurídicasvenham, também, ser consideradas titulares de direitos fundamentais, não obstante estes,originalmente, terem por referência a pessoa física. Os direitos fundamentais suscetíveis, porsua natureza, de serem exercidos por pessoas jurídicas podem tê-las por titular. Assim, nãohaveria por que recusar às pessoas jurídicas as consequências do princípio da igualdade,

Page 34: [RESUMO] Direito Constitucional A

34

nem do direito de resposta, do direito de propriedade, do sigilo de correspondência, dainviolabilidade de domicílio, das garantias do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e dacoisa julgada. Os direitos fundamentais à honra e à imagem, ensejando pretensão dereparação pecuniária, também podem ser titularizados pela pessoa jurídica. Garantias,porém, que dizem respeito à prisão (e. g., art. 5º, LXI) têm as pessoas físicas comodestinatárias exclusivas. Da mesma forma, não há como se estender, por óbvio, direitospolíticos, como o de votar e o de ser eleito para cargo político, ou direitos sociais, como o deassistência social, às pessoas jurídicas.

Fontes

Quais são os direitos fundamentais que o Estado brasileiro reconhece e onde elesestão? Aqueles localizados na CF são expressamente reconhecidos - arts. 5º, 6 e 7, além deoutros difusos. Os tratados internacionais também são reconhecidos. Reconhece-se aquelesderivados do princípio e do regime adotado pela Constituição, o que causa muita discussão.

Há três possibilidades de princípios ou de direitos fundamentais nos tratados. Elespodem ou ser coincidentes com a CF ou ultrapassarem-na, de forma a complementar aCarta. Ainda, os direitos fundamentais podem ser considerados de maneira diferente. Nosegundo caso, aplica-se o mais benéfico ao cidadão - a CF defende que o acesso à defesa épara todos, o que se interpreta pelo acesso ao advogado (defesa técnica), não especificandoqual tipo de matéria. O STF produziu uma súmula defendendo que em processosadministrativos não há tal necessidade, contrariando, também, o Pacto de São José da CostaRica, pelo qual a defesa técnica se aplica a todos os tipos de processo. Diante desse conflito,como o tratado é mais abrangente que o texto constitucional, deveria ser aplicado o TratadoInternacional.

Controle de convencionalidade: o juiz, no caso concreto, analisa os tratados.

Desenho

(a) Inviolabilidade

(b) Princípios constitucionais sensíveis

(c) Aplicabilidade imediata

(d) Mecanismos de defesa

(e) Núcleo essencial

A primeira marca está no início do art. 5º: “são invioláveis…’’. A segunda marca é quetais direitos fazem parte do elenco dos princípios constitucionais sensíveis (aqueles quepermitem uma ruptura do pacto federal de forma controlada e rápida). Um desses princípiosé a defesa da dignidade da pessoa humana (art. 34). A não-observância deste princípio podelevar a intervenção proposta pelo Procurador Geral da República.

Ainda, eles devem ter aplicabilidade imediata, de acordo com o art. 5º. Eles,portanto, não carecem da intervenção do legislador para serem usufruídos. O direito à saúdeé um direito fundamental de todos, assim como a vida digna. Isso significa dizer que, desde aprevisão dos direitos, impõe-se um espaço de negação do Estado. Agora, o Estado nãopoderá ofender tais direitos. A questão da realização do direito é uma outra questão a servencida — deve-se criar entes administrativos para cumpri-los.

Page 35: [RESUMO] Direito Constitucional A

35

O problema da aplicabilidade é no caso dos direitos prestacionais, que no aspectopositivo, demonstram-se difíceis de serem concretizados. Mesmo que o MP obrigue o Estadoa cumpri-los, é algo trabalhoso, feito a longo prazo.

Quanto aos direitos sociais, há uma demanda sempre crescente. Nunca haverá umasatisfação plena. Se se constrói abrigos para todos, pensar-se-á que é necessário um localmelhor e assim por diante. É justamente essa demanda que impulsiona a evolução social. Adoutrina alemã defende que, no caso de demandas sociais, o retrocesso é proibido. Háproblema no tocante à falta de recursos.

A aplicabilidade, portanto, deverá ser vista de forma bastante temperada. A análisedo caráter do direito é essencial.

As garantias, localizadas no capítulo dos direitos fundamentais, são os mecanismosde defesa dos direitos fundamentais. O habeas corpus é um remédio para o ir e vir, porexemplo. A própria Constituição apresenta a maneira na qual deve-se proteger os cidadãos.O último carácter do desenho constitucional forma o núcleo essencial de um sistemajurídico. As cláusulas pétreas, mesmo que não usuais nas Constituições, são aquelas queprotegem determinados conteúdos constitucionais. No Brasil, são quatro: federação; direitose garantias individuais; voto direto, secreto, universal, periódico e com valor igual ; separaçãode poderes. Protege-se não apenas do legislador ordinário e da discussão da emenda. Oproblema é que a CF garante os direitos e garantias individuais - direito à saúde não está noart. 5º, mas no art. 6 (direitos sociais). Os direitos de segunda dimensão, então, não sãoabarcados. Contudo, embora haja apenas as garantias fundamentais positivadas, deve-se daruma interpretação extensiva, na medida em que melhor protege o cidadão do Estado. INGOSARLET demonstra grande ênfase neste sentido.

Heterovinculação -- eficácia horizontal

O Estado está terminantemente proibido de atacar esses direitos, o que inclui todosos poderes. Fora do Estado, nas relações privadas ou nas relações da esfera privada, háeficácia dos direitos fundamentais? A Hooters, por exemplo, uma lanchonete americana, emseu manual, discrimina como as atendentes devem ser, assim como a Abercrombie. Há umapolítica de contratação clara, mas ela seria constitucional? As seleções para ser um Dragãoda República (soldado) devem ser tomadas pela altura. Um Estado pode fazer concursosapenas para mulheres? O Estado pode fazer tais discriminações, mas apenas se justificadas(concurso para penitenciárias femininas, por exemplo).

Mas se isso pode, porque não se pode contratar apenas negros, hispanos ouasiáticos? Até onde pode uma instituição ou associação privada selecionar as pessoas paraseus assuntos? O critério de discriminação aceito pela Constituição nas relações privadas.

A percepção clara da força vinculante, da eficácia imediata dos direitos fundamentaise da sua posição no topo da hierarquia das normas jurídicas reforçou a ideia de que osprincípios que formam os direitos fundamentais não poderiam deixar de ter aplicaçãotambém no setor do direito privado.

Ganhou alento a percepção de que os direitos fundamentais possuem uma feiçãoobjetiva, que não somente obriga o Estado a respeitar os direitos fundamentais, mastambém o força a fazê-los respeitados pelos próprios indivíduos, nas suas relaçõesindividuais. Ao se desvendar o aspecto objetivo dos direitos fundamentais, abriu-se à

Page 36: [RESUMO] Direito Constitucional A

36

inteligência predominante a noção de que esses direitos, na verdade, exprimem os valoresbásicos da ordem jurídica e social, que devem ser prestigiados em todos os setores da vidacivil e que devem ser preservados e promovidos pelo Estado como princípios estruturantesda sociedade. O discurso majoritário adere, então, ao postulado de que “as normas sobredireitos fundamentais apresentam, ínsitas a elas mesmas, um comando de proteção, queobriga ao Estado impedir que tais direitos sejam vulnerados também nas relações privadas”.

Drittwirkung significaria a aplicação dos direitos fundamentais para a resolução deconflitos das relações privadas. É uma eficácia horizontal, pois é algo entre cidadãos.

A aplicabilidade total dos direitos fundamentais nas relações privadas (“licitação paranamorada’’, pesquisador particular, no regime do direito privado, para ajudar na redação deartigos) sustenta em que os direitos fundamentais representam valores fundamentais quedevem vincular no direito como um todo, não apenas no direito público. Aqueles contráriosapregoam que não sobraria nada da autonomia da vontade privada se isso de fatoacontecesse. As lojas Abercrombie e O Boticário; suas políticas de contratar apenasvendedores ‘’bonitos’’ seriam válidas perante o ordenamento jurídico? Autonomia do direitoou proteção aos direitos fundamentais? Enquanto uns dizem que não é possível haverespaço para ataque aos direitos fundamentais (além disso, não haveria necessidade delegislação, pois os direitos são de aplicação plena e imediata), outros afirmam que os direitosfundamentais podem ser aplicados nas relações privadas, desde que permitido pelalegislação. Poderia, então, abrir-se mão dos direitos fundamentais em nome da autonomiada vontade privada? A eficácia horizontal será ora vista como ação individual ora apenas pelaação do legislador. Seria possível vender o voto? Para a Espanha, vender está na autonomiada vontade, mas comprar seria crime, enquanto para o Brasil, comprar e vender é crime.Estaríamos ora na mão de legisladores mais libertários ora na de mais intervertidos.

Confirma-se o status constitucional do princípio da autonomia do indivíduo no art. 5ºda CF. O debate passa a se desenrolar, então, em torno dos reclamos dos diferentes direitosfundamentais com as exigências do princípio da autonomia privada. Nisso, em última análise,centra-se o problema de resolver quando e como os direitos fundamentais obrigam osparticulares nas suas relações mútuas. Na seleção de candidatos, há um deficit dos direitosfundamentais e na exclusão arbitrária de seus membros também. Na medida em que aspartes se revelem desiguais de fato, o exame da legitimidade da restrição consensual dosdireitos fundamentais haverá de ser objeto de análise mais rigorosa.

O que não se pode perder de vista é que a autonomia privada e, em especial, aliberdade contratual, na lição de HESSE, “encontram o seu fundamento e os seus limites naideia da configuração responsável da própria vida e da própria personalidade”. A autonomiaprivada, com os seus aspectos de autodeterminação e de responsabilidade individual,“compreende também a possibilidade de contrair, por livre deliberação, obrigações que ospoderes públicos não poderiam impor ao cidadão”.

Há, então, de se ponderar entre o princípio da autonomia e os valores protegidoscomo direitos fundamentais, tendo como parâmetro que a ideia de homem assumida pelaConstituição pressupõe liberdade e responsabilidade — o que, necessariamente, envolve afaculdade de limitação voluntária dos direitos fundamentais no comércio das relaçõessociais, mas que também pressupõe liberdade de fato e de direito nas decisões sobre taislimitações.

Page 37: [RESUMO] Direito Constitucional A

37

Canotilho apresenta cinco casos em que os DF são aplicados nas relações privadas:

1. Casos em que a eficácia horizontal está prevista em lei;

2. Situações (?);

3. Situações mediadas pelo juiz em questões de direito privado, que se espraiampelos outros ramos do direito;

4. Eficácia fundamental de direitos - alguns entes privados que são necessáriospara a eficácia dos direitos fundamentais. Ex: Sindicatos e Partidos Políticos;

5. Não é possível defender a eficácia dos DF, pois há um núcleo irredutível daautonomia da vontade. Ex: Herança (uma parte do patrimônio deverá ser divididaentre os filhos, mas a outra metade pode ser dividia do jeito que o pai quiser).Neste caso, o legislador faz o recorte do campo de autonomia.

No Brasil, os direitos fundamentais são protegidos nas relações entre particulares pormeios variados. Eles o são por via de intervenções legislativas — basta notar a pletora deatos legislativos assegurando a formação livre da vontade dos economicamente mais fracos eprevenindo a discriminação, no âmbito das relações civis, em especial nas de consumo e nasde trabalho.

Há casos, igualmente, em que a proteção de direitos fundamentais se efetua pormeio de interpretação e aplicação de cláusulas gerais de direito privado. Dê-se, comoexemplo disso, certa jurisprudência formada em torno de contratos de adesão. Entende-seque a eleição de foro inserida nesses contratos pode ser considerada abusiva (eis a cláusulageral), e, por isso, ilegal, se dela resultar a inviabilidade ou uma especial dificuldade deacesso ao Judiciário (eis o direito fundamental protegido). Preserva-se o direito fundamentalde acesso ao Judiciário, nas relações entre particulares, “de modo indireto, com o auxílio deconceitos amplos, consagrados na ordem privada”.

Quanto à possibilidade de o direito fundamental ser suscitado diretamente comorazão para resolver pendência entre particulares, há precedentes do Supremo TribunalFederal admitindo o expediente. O acórdão do STF em que mais profunda e eruditamente otema foi explorado concluiu que normas jusfundamentais de índole procedimental, como agarantia da ampla defesa, podem ter incidência direta sobre relações entre particulares, emse tratando de punição de integrantes de entidade privada — máxime tendo a associaçãopapel relevante para a vida profissional ou comercial dos associados.

Teoria das restrições2

Numa absoluta simplificação, toda norma jurídica se estrutura da seguinte forma:H → C (se há hipótese, deve ser a consequência). A hipótese do direito fundamental échamada de suporte fático e refere-se ao âmbito de proteção, àquilo que é protegido, e àintervenção, àquilo contra o qual é protegido. Tornaram-se correntes no direitoconstitucional duas teorias sobre o suporte fático: a teoria do suporte fático amplo e a teoriado suporte fático restrito. Pela primeira, o direito fundamental protege prima facie todaação, estado ou posição jurídica que faça parte de seu âmbito temático. Noutros termos:tudo que estiver abrangido pelo conteúdo semântico do dispositivo subsome-se à hipótesedo direito fundamental. Pela teoria restrita, certas ações, condutas ou situações jurídicas são,

2 Do texto “Direito fundamental de acesso à informação”, de Ricardo Marcondes Martins

Page 38: [RESUMO] Direito Constitucional A

38

de plano, excluídas do âmbito de proteção ou do conceito de intervenção, apesar decompreendidas no âmbito temático ou no conteúdo semântico do texto constitucional.Adota-se aqui a teoria do suporte fático amplo: prima facie, vale dizer, no plano abstrato,tudo que é semanticamente compreendido no texto “receber dos órgãos públicosinformações sobre interesse particular, coletivo ou geral” está compreendido no âmbito deproteção do direito ao acesso à informação e toda conduta que impeça esse acesso estácompreendido no conceito de intervenção.

Todos reconhecem em coro uníssono inexistir direitos absolutos: há intervenções quesão admitidas pelo Direito. Em relação a elas, apresentam-se duas teorias: a teoria internados direitos fundamentais e a teoria externa. Pela primeira, os direitos fundamentais sãocompreendidos como regras e, pois, como determinações no âmbito do fático e do jurídico;são, pois, normas definitivas. Para quem a adota não existem propriamente restrições, maslimites: o direito é o resultado da leitura global do ordenamento jurídico; toda regraconstitucional ou legislativa que restringe o âmbito de proteção extraído da hipótese deincidência do enunciado constitucional — e, pois, torna admissível uma intervenção ou,noutros termos, torna admissível o embaraço ao exercício do direito — estabelece, não umarestrição, mas os contornos do direito fundamental. Há, segundo os partidários da doutrinainterna, limites imanentes, extraídos do próprio texto constitucional, e limites extraídos dostextos legislativos: ambos indicam os contornos da norma de direito fundamental.

Pela teoria externa, os direitos fundamentais são compreendidos como princípios:como mandados de otimização no âmbito do fático e do jurídico. São, pois, normas primafacie: asseguram no plano abstrato a máxima proteção possível. Ao lado da norma queestabelece o direito prima facie, encontram-se no ordenamento outras normas jurídicas, querestringem esse direito. Para quem adota a teoria externa, existem autênticas restrições aosdireitos fundamentais. Num primeiro contato com as teorias, pode-se supor uma vinculaçãoentre, de um lado, a teoria do suporte fático restrito e a teoria interna e, de outro, a teoriado suporte fático amplo e a teoria externa. Contudo, inexiste vinculação entre elas: éperfeitamente possível a adoção concomitante da teoria restrita e externa e da teoria amplae interna. Adota-se aqui a teoria ampla e a teoria externa: além da norma-princípio de direitofundamental, que estabelece uma proteção prima facie, há as normas-regra, queestabelecem restrições no plano abstrato (prima facie) e no plano concreto (definitivas).

A adoção da teoria do suporte fático amplo e da teoria externa não se baseia numcaprichoso gosto subjetivo. Teorias científicas não devem ser escolhidas do mesmo modoque se escolhe o sabor de um sorvete: baunilha ou chocolate, teoria “A” ou teoria “B”. Ao seadmitir como positivada a proteção prima facie de todas as situações jurídicas abarcáveispelo conteúdo semântico do dispositivo constitucional e o afastamento prima facie de todasas intervenções sobre essas situações, e ao se distinguir essa norma das normas querestringem a proteção e admitem a intervenção, possibilita-se de modo muito mais efetivo ocontrole no estabelecimento das normas restringentes. A diferença prática entre as teoriasestá exatamente nisto: as teorias restrita/interna dificultam o controle ao negarem aexistência de um direito previamente garantido; para os partidários da teoria restrita, certascondutas são, de plano, extraídas da proteção constitucional, e para os que adotam a teoriainterna, a proteção constitucional só se configura a partir da leitura de toda as normasconstitucionais e legislativas.

Admitem-se quatro tipos de restrições. Duas diretamente constitucionais: a)

Page 39: [RESUMO] Direito Constitucional A

39

restrições estabelecidas por regras constitucionais; b) restrições estabelecidas por princípiosconstitucionais. E duas indiretamente constitucionais: c) restrições estabelecidas por regraslegislativas, a partir de cláusula de reserva expressa na Constituição; d) restriçõesestabelecidas por regras legislativas a partir de cláusulas de reserva implícita naConstituição. A Constituição brasileira estabeleceu expressas restrições ao acesso àinformação: não serão fornecidas “informações cujo sigilo seja imprescindível à segurança dasociedade e do Estado” (restrições diretamente constitucionais estabelecidas em regrasconstitucionais). Por outro lado, não há cláusula de reserva explícita em relação a ele: aocontrário do que fez, por exemplo, no inciso XIII do art. 5º, o constituinte não previuexpressamente a competência para o legislador estabelecer em lei restrições ao acesso (nãoforam admitidas restrições indiretas baseadas em cláusula de reserva expressa). Oconstituinte deixou expressamente ao encargo do legislador apenas a definição do prazopara prestação das informações, o que tecnicamente configura uma conformação e não umarestrição ao direito fundamental — há conformação do direito fundamental quando a normaconstitucional atribui ao legislador o encargo de definir o próprio conteúdo do direitofundamental.

Uma rápida leitura do texto constitucional deixa claro que, independentemente daponderação legislativa, outros valores constitucionais impõem restrições ao acesso, dentreeles os previstos no inciso X do art. 5º, vale dizer, a intimidade, a vida privada, a honra e aimagem das pessoas. Esquematicamente, representando o direito ao acesso por “P1” e osvalores mais pesados ao direito ao acesso por “P2”, sempre que “P2 > P1”, configurar-se-áuma restrição diretamente constitucional baseada em princípios constitucionais.

Mesmo quando não consta cláusula de reserva expressa, o legislador possuicompetência para, à luz da ponderação dos princípios constitucionais por ele efetuada noplano abstrato, fixar em lei restrições ao direito fundamental. São as chamadas restriçõesindiretamente constitucionais baseadas em cláusula de reserva implícita. Pode-se indagar: sesão possíveis restrições legislativas mesmo que não expressamente autorizadas, qual a razãode ser das cláusulas de reserva expressa? Há diferença dogmática importante: quando háuma cláusula de reserva expressa, a imposição da restrição é reforçada pelo peso doprincípio formal que dá primazia às ponderações do constituinte.

Aliás, a teoria dos princípios formais é fundamental para correta compreensão dasrestrições legislativas, sejam as decorrentes de cláusula de reserva expressa, sejam asdecorrentes da cláusula de reserva implícita. Muitas vezes, no plano abstrato, no exame dotexto constitucional, não há como afirmar, independentemente das divergências próprias dopluralismo político, que “P2” tem mais peso que “P1” (P1 P2). Contudo, levando-se em≅conta a discricionariedade legislativa e o peso do princípio formal que a fundamenta, épossível que “P1” seja afastado. Esquematicamente: P2 + Pfl > P1, sendo que “Pfl” é oprincípio formal que dá primazia às ponderações do legislador. As restrições fundamentadasnesse princípio formal são autênticas restrições legislativas. Nos termos expostos, quando hácláusula de reserva expressa, a restrição é reforçada pelo peso do princípio formal que dáprimazia às ponderações do constituinte originário (P2 + Pfl + Pfco > P1); quando não hácláusula de reserva expressa, inexiste esse reforço argumentativo. Quando, no planoabstrato, o peso do direito fundamental restringido é maior do que o peso dos valores quejustificam a restrição legislativa (P1 > P2 + Pfl), esta é inconstitucional.

Conforme exposto, quando o constituinte enuncia em uma regra constitucional uma

Page 40: [RESUMO] Direito Constitucional A

40

restrição a um direito fundamental, há uma restrição diretamente constitucional baseada emregra. Por trás de toda regra existe um princípio, ou melhor, um valor positivado. No caso,quando o constituinte enuncia uma regra de restrição, ele deixa consignado no sistema oresultado de sua ponderação no plano abstrato. Noutros termos, o próprio constituinteconstatou que os valores contrários ao direito fundamental são mais pesados do que osvalores concretizados pelo referido direito (P2 > P1) e, ao fazê-lo, reforçou esse resultadocom o peso do princípio formal que dá primazia às ponderações do constituinte originário(P2 + Pfco > P1, sendo que “P2 + Pfco” consiste numa regra constitucional “Rc”). Assim,restrições diretamente constitucionais decorrentes de regras constitucionais podem serrepresentadas por “Rc” ou por “P2 + Pfco”.

Muitas vezes, pela ponderação dos princípios constitucionais, independentemente dopeso de qualquer princípio formal, seja do princípio formal que dá primazia às ponderaçõesdo constituinte — não há regra constitucional (Ø Rc) —, seja do princípio formal que dáprimazia às ponderações do legislador — independente, pois, de regra legislativa —, o direitofundamental tem, no plano abstrato, um peso menor do que outros valores constitucionais(P2 > P1). Eis as restrições diretamente constitucionais decorrentes de princípiosconstitucionais. Nesses casos, cabe, na falta de regra abstrata, à Administração ou aoJudiciário, à luz dos casos concretos, reconhecer a existência dessas restrições. Isso gera doisinconvenientes. Como a enunciação da restrição só ocorre numa norma concreta, a certezade sua existência só surge à luz do caso concreto, o que contraria a segurança jurídica.Ademais, essa enunciação depende do acerto dos agentes administrativos e judiciais e, comoeles são seres humanos, estão sujeitos a erro. Por vários motivos (não ocorrência deimpugnação, trânsito em julgado, etc.), os erros podem ser assimilados pelo sistema e,diante disso, resultarem em decisões distintas, o que contraria a igualdade. Daí uma diretrizimportante no sistema: sempre que o resultado de uma ponderação de princípiosconstitucionais for vinculante, isto é, independer da divergência de opinião, do pluralismo e,pois, dos princípios formais que justificam as competências discricionárias, esse resultadodeve ser fixado numa norma abstrata, em respeito à segurança jurídica e à igualdade.Justamente por isso, muitas das restrições estabelecidas pelo legislador não sãopropriamente restrições legislativas, alicerçadas no princípio formal que dá primazia àsponderações do legislador (Pfl), mas, sim, a enunciação pelo legislador de restriçõesdiretamente constitucionais baseadas em princípios.

Há, assim, restrições legislativas próprias e restrições legislativas impróprias.Enquanto aquelas decorrem da competência discricionária do legislador, estas não se apoiamnessa competência: são simples enunciação legislativa de uma imposição do textoconstitucional. Nas restrições legislativas impróprias, a ponderação no plano abstrato dosprincípios constitucionais é vinculante. Vale dizer: trata-se, na verdade, de uma restriçãodiretamente constitucional baseada em princípios constitucionais que, em homenagem àsegurança jurídica e à igualdade, é enunciada pelo legislador. A regra legislativa (“Rl”) naverdade traduz algo que é imposto pela Constituição (P2 > P1) e não algo que depende dadiscricionariedade do legislador (P2 + Pfl > P1). Caso o legislador se omitisse (Ø Rl), essarestrição seria impositiva.

Muitas vezes o legislador se omite e não enuncia a restrição imprópria. Como se tratade uma imposição do texto constitucional e a inexistência de regra abstrata viola a segurançae a igualdade, está o Poder Executivo autorizado, nesses casos, a enunciar a restrição numregulamento. São regulamentos executivos não da lei, mas da Constituição. Trata-se de

Page 41: [RESUMO] Direito Constitucional A

41

restrições regulamentares impróprias: não se apoiam na competência discricionária daAdministração; são, na verdade, restrições diretamente constitucionais baseadas emprincípios constitucionais enunciadas pelo Executivo em regulamento administrativo, dianteda omissão legislativa, por exigência da segurança jurídica e da igualdade.

Aliás, o sistema jurídico não admite restrições a direitos fundamentais alicerçadas nadiscricionariedade administrativa, isto é, no princípio formal que dá primazia às ponderaçõesda administração (P2 + Pfa > P1). Se os pesos de “P1” e “P2” forem mais ou menosequivalentes (P1 P2), o peso deles não pode ser reforçado pelo princípio que dá primazia≅às ponderações administrativas (Pfa). Com efeito: restrições administrativas próprias sãoinconstitucionais. Restrições administrativas impróprias só podem ser enunciadas em regrasadministrativas abstratas quando, no plano abstrato, de modo vinculante, os princípiosopostos ao direito fundamental forem mais pesados que ele. Pode acontecer que asuperioridade dos pesos só se verifique à luz das circunstâncias do caso concreto. Nessecaso, a enunciação da restrição só será efetuada na norma concreta. Tratar-se-á, enfim, derestrição diretamente constitucional baseada em princípios constitucionais e reconhecidapor ato administrativo ou jurisdicional.

Aula da monitora Maria Eduarda

De acordo com o art. 5º da Constituição, os direitos fundamentais têm aplicabilidadeimediata, impossibilitando ao Poder Público realizar atos que os contrariem.

Para JOSÉ AFONSO DA SILVA, os direitos podem ter eficácia plena, contida oulimitada. Seu filho, VIRGÍLIO AFONSO DA SILVA, considera que tal classificação é inútil emrelação aos direitos fundamentais, os quais, por serem princípios, têm grande complexidade.De acordo com o jurista, é preciso esclarecer qual o conteúdo essencial dos direitosfundamentais, embora esse conteúdo possa ser restringido, a depender das circunstânciaspróprias do caso concreto.

No entender de VIRGÍLIO AFONSO DA SILVA, regulações e restrições têmpraticamente o mesmo sentido, sendo que toda norma constitucional é, de algum modo,restringida. Segundo o jurista, a adoção de um suporte fático restrito diminui a proteção aosdireitos, sendo mais adequada a admissão de um suporte fático amplo, com a diferenciaçãoentre direito “prima facie” e direito definitivo. Apesar de ser muito comum a confusão entrerestrição e violação de direito fundamental, ele distingue ambas as hipóteses pelo fato deque a restrição é baseada na Constituição e a violação não.

De acordo com o jurista, o direito estabelece seus próprios limites, não havendo quese falar em limitações externas à aplicação. Os juízes são os responsáveis por exercer osopesamento e a regra da proporcionalidade, restringido o exercício do direito nos casosconcretos quando adequado for. A proporcionalidade se configura quando há adequação,necessidade (exigibilidade), e proporcionalidade em sentido estrito (ponderação).

Os direitos fundamentais não são absolutos, mas restritos por limites explícitos(internos e externos) e implícitos (internos e externos). Os primeiros são facilmenteidentificáveis, mas os últimos costumam gerar grande discussão. Para JORGE MIRANDA, olegislador não pode atingir o núcleo essencial do direito, deve editar regras gerais, abstratase prospectivas (nunca retroativas) e que defendem um direito fundamental superior.

A teoria interna só vê limites explícitos. Entretanto, a teoria externa não se limita a

Page 42: [RESUMO] Direito Constitucional A

42

tal, defendendo o sopesamento ou ponderação. A concorrência de direitos fundamentais seconfigura quando a situação jurídica do mesmo sujeito é protegida por mais de um direito.

Colisão dos direitos fundamentais

Segundo a teoria interna, as colisões são apenas aparentes, pois a partir deinterpretação sistemática seria possível determinar as regras aplicáveis ao caso concreto.

A teoria externa, por outro lado, reconhece a ocorrência de colisões. Adota-se umaampla proteção aos direitos fundamentais, considerando-os como princípios. Faz-sedistinção entre colisão em sentido amplo e em sentido estrito.

No primeiro caso, há colisão entre direito fundamental e bem constitucionalmenteprotegido. Nos casos em que o direito fundamental não é suscetível de legislação restritiva,prevalece o direito fundamental. Se, no entanto, o direito fundamental em questão admitelegislação restritiva, prevalece o bem constitucionalmente protegido. A lei restritiva, para serválida, precisa passar pelo teste de proteção ao núcleo essencial do direito, daproporcionalidade, da generalidade/abstração e da prospectividade.

A colisão em sentido estrito se dá entre dois direitos fundamentais. Nessa situação,deve-se delimitar o âmbito de extensão do direito fundamental, pois é possível que a colisãoseja meramente aparente. Desse modo, analisa-se se a Constituição protege a conduta e estapassa pelo teste da lei restritiva. Se de fato existir colisão, então passa-se ao sopesamento ouponderação, com obrigação de justificação da decisão pelo magistrado, o que confeririaracionalidade ao sistema. Para ALEXY, as fórmulas da lógica matemática devem ser aplicadasa todos os campos do saber, incluindo o direito, evitando aspectos pessoais na sentença.DWORKIN prefere falar em juiz Hércules. CARLOS SANTIAGO NINO, por outro lado, defendeque cada juiz pertence a um projeto maior, no qual não se pode imprimir sua própriaconcepção pessoal, como ocorre na secular construção de uma catedral gótica.

Se a colisão acontecer entre dois direitos não passíveis de restrição ou entre doisdireitos passíveis de restrição, é necessário analisar as circunstâncias do caso concreto. Nahipótese de a colisão ocorrer entre um direito restritivo e um direito fundamental nãopassível de restrição, haverá a prevalência deste último. De qualquer modo, deve-se acentralidade da ideia de menor ofensa ao direito sacrificado, configurando um “sacrifícioproporcional”.

O principal traço distintivo entre regras e princípios, segundo a teoria dos princípios,é a estrutura de direitos que essas normas garantem. No caso das regras, garantem-sedireitos (ou impõem-se deveres) definitivos, ao passo que, no caso dos princípios, sãogarantidos direitos (ou são impostos deveres) prima facie.

1. Aplicabilidade e eficácia (José A. Virgílio)

O autor defende que as normas podem ter: (1) eficácia plena; (2) eficácia contida e(3) eficácia limitada . Apenas a primeira teria eficácia imediata, ao passo que as outrasdeveriam ser intermediadas pelo legislador. Esse doutrinador afirma que há uma redução daaplicabilidade quando há uma colisão de direitos. Se não se determina o conteúdo essencial,o conteúdo já é de pouca valia, além do conteúdo destes direitos dever se aplicado da formamais ampla possível.

Page 43: [RESUMO] Direito Constitucional A

43

2. Suporte fático

Em uma definição preliminar, é possível dizer que o preenchimento do suporte fáticode uma norma é a condição para que a sua consequência jurídica possa ocorrer. Comodefinir o suporte fático de normas como as que garantem a igualdade, a liberdade deexpressão ou o direito à privacidade?

Há dois requisitos: o âmbito de proteção do direito fundamental e a intervençãoestatal.

• Suporte fático restrito

A característica principal das teorias que pressupõem um suporte fático restrito paraas normas de direito fundamental é a não-garantia a algumas ações, estados ou posiçõesjurídicas que poderiam ser, em abstrato, subsumidas no âmbito de proteção dessas normas.Seria o caso de argumentos em que se baseiam uma exclusão, a priori, de alguma ação,estado ou posição jurídica do âmbito de proteção de alguns direitos.

Assim, por exemplo, quando o Min. Celso de Mello afirma, no HC 70.814, que “acláusula tutelar da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode constituir instrumento desalvaguarda de práticas ilícitas”, ou quando o Min. Maurício Corrêa sustenta, no HC 82.424,que “um direito individual não pode servir de salvaguarda de práticas ilícitas, tal comoocorre, por exemplo, com os delitos contra a honra”, essas são exclusões de condutas a priorido âmbito de proteção de alguns direitos fundamentais (sigilo de correspondência - art. 5°,XII e liberdade de expressão - art. 5°, IV).

• Suporte fático amplo

As teorias que se baseiam em um suporte amplo rejeitam a premissa de exclusão apriori, constantes do suporte fático restrito. A definição do suporte restrito é, em geral, aprópria definição daquilo que é definitivamente protegido; no segundo caso - suporte amplo- definir o que é protegido é apenas um primeiro passo, já que condutas ou situaçõesabarcadas pelo âmbito de proteção de um direito fundamental ainda dependerãoeventualmente de um sopesamento em situações concretas antes de se decidir pelaproteção definitiva ou não.

Nesse suporte fático, o que é protegido prima facie é toda ação, estado ou posiçãojurídica que possua alguma característica, que, isoladamente considerada, faça parte doâmbito temático de um determinado direito fundamental, deve ser considerada comoabrangida por seu âmbito de proteção, independentemente da consideração de outrasvariáveis. A definição é propositalmente aberta, já que é justamente essa abertura quecaracteriza a amplitude da proteção. Também a resposta individualizada à mesma questão -o que é protegido prima facie? - segue o mesmo caráter aberto.

Exemplo: o que é protegido pelo direito à livre manifestação do pensamento (constituição,art. 5°, IV)? Toda e qualquer manifestação de pensamento, não importa o conteúdo (ofensivoou não), não importa a forma, não importa o local, não importa o dia e o horário. O mesmovale para todos os direitos fundamentais.

Page 44: [RESUMO] Direito Constitucional A

44

3. Resolução de conflitos

• Teoria interna x Teoria Externa

Se fosse necessário resumir a ideia central da teoria interna, poder-se-ia recorre àmáxima “o direito cessa onde o abuso começa’’, ou seja, a partir do enfoque da teoriainterna que o processo de definição dos limites de cada direito é algo interno a ele.

Se isso é assim, ou seja, se a definição do conteúdo e da extensão de cada direito nãodepende de fatores externos e, sobretudo, não sofre influência de possíveis colisõesposteriores, a conclusão a que se pode chegar, em termos de estrutura normativa, é quedireitos definidos a partir do enfoque da teoria interna têm sempre a estrutura de regras.Isso se deve ao fato de que, se direitos fundamentais e sua extensão são definidos a partir dateoria interna e não podem, por conseguinte, participar em um processo de sopesamento,toda vez que alguém exercita algo garantido por um direito fundamental, essa garantia temque ser definitiva, e não apenas prima facie.

Ao contrário da teoria interna, que pressupõe a existência de apenas um objeto, odireito e seus limites, a teoria externa divide esse objeto em dois: há, em primeiro lugar, odireito em si, e, destacado dele, as suas restrições.

É a partir desta distinção que se pode chegar ao sopesamento como forma de soluçãodas colisões entre direitos fundamentais e, mais do que isso, à regra da proporcionalidade,com suas três sub-regras: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.Isso porque é somente a partir do paradigma da teoria externa, segundo a qual as restrições,quaisquer que sejam a sua natureza, não têm nenhuma influência no conteúdo do direito,podendo apenas, no caso concreto, restringir o seu exercício, que se pode sustentar que, emuma colisão entre princípios, o princípio que tem que ceder em favor de outro não tem afetaa sua validade e, sobretudo, a sua extensão prima facie. A não-atenção a essa simplesdistinção pode ser fonte de algumas incompreensões teóricas.

O que acontece quando duas posições diferentes, protegidas como direitosfundamentais, opõem-se numa mesma situação? A doutrina cogita de colisão de direitos emsentido estrito ou em sentido amplo. As colisões em sentido estrito referem-se apenasàqueles conflitos entre direitos fundamentais. As colisões em sentido amplo envolvem osdireitos fundamentais e outros princípios ou valores que tenham por escopo a proteção deinteresses da comunidade.

• Colisão na teoria interna

Na verdade, todas as colisões são aparentes, pois uma visão sistêmica e global doordenamento jurídico pode dar a reposta. Essa é a ideia da teoria interna. Um direitofundamental funcionará como regra e o suporte fático, será amplo. Haverá colisão dedireitos, que poderão ser defensáveis dos direitos. Então, há algumas formas de resolver essacolisão.

- Colisão e solução em sentido amplo

Para tanto, há a diferenciação entre direito fundamental e bem constitucionalprotegido. O Estado pode distribuir desigualmente as receitas da União entre os estados? ACF apregoa que o Estado deve agir para diminuir as desigualdades. Mas há a discrepânciacom a igualdade federativa. Para decidir qual deve prevalecer, um direito fundamental ou um

Page 45: [RESUMO] Direito Constitucional A

45

bem constitucionalmente protegido, existem duas categorias: (1) direitos fundamentais nãosuscetíveis a lei restritiva (como a proibição da tortura) e colisão com bemconstitucionalmente protegido; e (2) direitos fundamentais suscetíveis a lei restritiva(propriedade, liberdade de profissão e o direito de ser votado, a elegibilidade) e bemconstitucionalmente protegido.

No caso 1, há uma preponderância do direito fundamental não suscetível a leirestritiva sobre o bem constitucionalmente protegido. O Art. 57, VII (princípio de inocência) éum exemplo. A moralidade das eleições é um bem constitucionalmente protegido. Em nomeda moralidade, poderei restringir o princípio da inocência? Teoricamente, não poderia serrestringido, mas faticamente, ocorre na Lei da Ficha Limpa.

No caso 2, por sua vez, um direito fundamental cuja restrição é constitucionalmentepermitida poderá ceder perante um bem constitucionalmente protegido se respeitado oteste da lei restritiva. A elegibilidade poderia cair perante o princípio da moralidade se oteste é feito adequadamente. A restrição não pode atacar o núcleo essencial do direito, deverespeitar a proporcionalidade, a generalidade/abstração e a prospectividade dos direitos.

Ressalta-se que os direitos fundamentais só podem ser restritos por lei.

Colisão e solução em sentido estrito

Há, em conflito, num caso específico, dois direitos fundamentais em colisão detitulares diversos (portanto, não é concorrência). Esse problema de colisão será solucionadopelos seguintes passos: (1) pode ser que não sejam preenchidos os pressupostos objetivos esubjetivos do direito ou que a cobertura constitucional não cubra a conduta, pelo que, então,verifica-se se a conduta que está sendo confrontada por outro direito fundamental éacobertada pela CF; (2) verifica-se se há uma lei restritiva adequada para o direitofundamental - os elementos de proteção de conduta. Nesse primeiro momento, então,observa-se se existe tal conflito.

Se existir, de fato, a colisão entre direitos fundamentais, o sopesamento/ponderaçãodeverá ser feito. A teoria externa diz que, ao decidir um caso, o juiz deverá justificar umdireito em face de outro - e esta justificação traria a racionalidade. Mas há críticas de queisso pode conceder uma carta branca ao magistrado. Para ALEXY, não haveria decisõescontraditórias, pois é uma operação lógica, como a lógica matemática. Para DWORKIN, o juizé um juiz Hércules, dado que ele consegue enxergar a solução em qualquer caso. A visão doromance em cadeia acredita que o juiz é partícipe de uma tradição literária composta porjurisconsultos que já escreveram e que escreverão sobre o tema - o magistrado, então,deverá ser coerente e respeitar com o que já foi decidido e sua decisão deverá servir de basepara as futuras sentenças. Carlo Santiago NINO defende que, para garantir que hajaracionalidade, é necessário que cada magistrado se sinta como um construtor de umacatedral gótica, ou seja, estas catedrais demoram séculos para serem feitas e, então, váriosconstrutor participarão da obra. Logo, cada um não deverá impor sua subjetividade, pois osenso de unidade se perderia.

Para os que defendem a ponderação, essas alegorias são como soluções que afastama possibilidade de um sistema incoerente, pois ou aplica-se a lógica matemática ou aromance em cadeia ou a construção de uma catedral gótica - e assim, fundamenta-se apossibilidade do sopesamento.

Page 46: [RESUMO] Direito Constitucional A

46

Surge então o seguinte quadro: Deve-se aplicar uma sentença que menos agrida umdireito do outro. Na Alemanha, uma empresa pôs nas prateleiras o produto ‘ ’Chokolate’’,feito de grãos de arroz. Há o conflito entre a livre iniciativa e o direito do consumidor. Paratanto, há de se ter o mínimo possível de agressão entre os dois direitos.

A ideia é que, na contraposição, um ceda, mas o faça o mínimo possível. Não podehaver um sacrifício desproporcional dos direitos.

• Colisão na teoria externa

Para a teoria externa, existe colisão, pois os bens constitucionais, segundo a lógicados princípios, são regidos pelos mandatos de otimização e pela garantia prima facie dosdireitos. Em princípio, tudo estaria albergado pelo Direito. Nessa teoria, em outras palavras,aparentemente, tudo cabe – aquele que tem liberdade de expressão tem o direito de falartudo o que ele quer, inclusive se manifestar de outras formas senão as palavras – essa é aideia predominante nos EUA. Na Alemanha, por outro lado, há uma proibição de formaçãode ideias que agridam a democracia.

Se se fundamentam os direitos fundamentais pela ideia do legislador ou se osfundamentam na racionalidade da situação fática. Esse dualismo é o que difere as duasteorias.

A. Direito fundamental não passível de restrição x Direito fundamental nãopassível de restrição

B. Direito fundamental não passível de restrição x Direito fundamental passívelde restrição

C. Direito fundamental passível de restrição x Direito fundamental passível derestrição- Colisão em sentido amplo

• Direitos fundamentais x bem constitucionalmente protegido

1) Direitos fundamentais não suscetíveis a lei restritiva x bem jurídico protegido-> DFs prevalecem

2) DFs suscetíveis a lei restritiva x bem constitucionalmente protegido -> teste leirestritiva (núcleo essencial, proporcionalidade, generalidade/abstrata,prospectividade)