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OBRAS INDICADAS PELA COPEVE - UFPI RESUMO DA OBRA SONETOS Vinícius de Moraes A PAZ EST` NA BOA EDUCA˙ˆO

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OBRAS INDICADAS PELACOPEVE - UFPI

RESUMO DA OBRASONETOS

Vinícius de Moraes

�A PAZ ESTÁ NA BOA EDUCAÇÃO�

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SONETOS(Vinícius de Moraes)

SONETO DA CONTRIÇÃO

1º QUARTETO

Veja o canto de amor do sonetista para com sua amada. Observe que aumentando a

intensidade dos sofrimento, da dor, aumenta também o amor dele para com ela. Na mesma proporção.

2º QUARTETO

Não obstante, o amor é também fruto do mistério. Tudo que envolve um vai não vão; umpode não pode determina a obscuridade, a dúvida. E o que é o amor além de sofrimento, alumbramento,

dor, catarse, evasão, ...

1º TERCETO

Aqui há o grau comparativo de igualdade de onde, alma e coração se eqüivalem naimportância do amor. O que também é devido à presença e a saudade.

2º TERCETO

A alma, a humildade, o equilíbrio e a harmonia se junta para dar o alumbramento daquele

momento de alteridade e sublimicidade.

SONETO À LUA

Por que tens, por que tens olhos Fugaz, com que direito tens-me [escuros [presa

E mãos lânguidas, loucas e sem fim A alma que por ti soluça nuaQuem és, que és tu, não eu, e estás E não és Tatiana e nem Teresa:

[em mimImpuro, como o bem que estás nos

[puros?E és tão pouco a mulher que anda

Que paixão fez-te os lábios maduros [na ruaNum rosto como o teu criança assim Vagabunda, poética e indefesaQuem te criou tão boa para o ruim Ó minha branca e pequenina lua!E tão fatal para os meus veros

[duros?

Desde os remotos tempos a lua provoca suspiros enamorados nos enamorados. O

clima, o momento de sedução que a lua prova e da fé àqueles que, numa evasão total buscam nelalua a realização de seus sonhos. É a magia, o enigma, o belo. É a lua!

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SONETO DE SEPARAÇÃO

De repente do riso se fez-se o pranto De repente, não mais que de repente

Silencioso e branco como a bruma Fez-se de triste o que se fez amanteE das bocas unidas fez-se a espuma E de sozinho o que se fez contente.

E das mãos espalmadas fez-se o

[espanto.Fez-se do amigo próximo o distante

De repente fez-se o vento Fez-se da vida uma aventura errante

Que dos olhos desfez a última De repente, não mais que de [chama [repente

E da paixão fez-se o pressentimento

E do momento imóvel fez-se o [drama

1º QUARTETO

Bem como em outros sonetos, a rima é uma forte aliada quanto à sonoridade, quanto ao

poder de musicalidade de que temo soneto. Observe a rima rica no 1º e 4º verso e a rima pobre no 2ºe 3º verso.

2º QUARTETO

A adversidade entre as idéias dá origem à antítese uma preocupação extremada do autor

na busca das extremidades, dos extremos; mar / terra; Europa / América (extremos do OceanoAtlântico; paixão / pressentimento; calmaria / tempestade e outras mais)

1º TERCETO

Veja a dualidade entre tristeza / amante e sozinho / contente. Além do mais a repetição

do que, como pronome relativo enriquecendo este terceto o que não diminui a antítese, aliás afluiainda mais ou talvez na mesma velocidade.

2º TERCETO

Ainda continua na mesma antagonicidade entre claro / escuro; entre o mar / terra; entre

céu / mar numa subjugação daquilo que é confortável, harmônico.

SONETO DO MAIOR AMOR

Maior amor nem mais estranho Louco amor meu quando toca, fere [existe E quando fere, vibra, mas prefere

Que o meu, que não sossega a coisa Ferir a fenecer - e vive a esmo [amada

E quando a sente alegre, fica triste

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E se a vê descontente, dá risada. Fiel à sua lei de cada instanteDesassombrado, doido, delirante

E que só fica em paz se lhe resiste Numa paixão de tudo e de si mesmo.

O amado coração, e que se agradaMais da eterna aventura em que

[persiste

Que de uma vida mal-aventurada.

Olhe com que velocidade, com que ânsia quer o sonetista amar, amor, ser amado, estar

amando. É a vida que brota a todo instante de seus 20 anos. É uma constante busca do maior amor,do melhor amor, do eterno amor enquanto dure.

Explícita ou implicitamente em todos os sonetos o tema regente é o amor. Amor eterno,

amor distante, amor próximo. Amor é o lema na poesia e na música. Não é por menos que Viníciusé considerado o mais apaixonado dos sonetistas e músicos do País.

Em "Quatro Sonetos de Meditação" o poeta não fala apenas de amor entre um homem e

uma mulher. Fala principalmente da necessidade do renovo, do rejuvenescer o amor. Mesmo que navida esvai seu amor, logo você encontrará outro amor e tocará sua vida e será ou quem sabe buscará

sempre, o amor.

SONETINHO A PORTINARI

O pintor pequeno É cor de pinturaO grande pintor Muito louro, vi-o

Ruim como um veneno Dentro da moldura

Bem como uma florVi-o da Inglaterra De um quadro de aurora

Uma tarde, vi-o O olhar azul frio:

No ermo, vadio - Lá ia ele embora.Brodovski onde a terra

Um dos maiores pintores do modernismo brasileiro, Portinari, elevou a arte da pinturabrasileira aos padrões mais aceitáveis mundialmente falando. Viveu na mesma época de Vinícius,

eram amigos e certamente buscavam idéias e idéias um no outro.

SONETO AO INFERNO

Inverno, doce inverso das manhãs Por que ruflaste as tremulantes asasTranslúcidas, tardias e distantes Ala do céu? O amor das coisasPropício ao sentimento das irmãs [váriasE ao mistério da carne das amantes: Fez-te migrar - inverno sobre casas!

Quem és, que transfiguras as maçãs Ó anjo das lumináriasEm iluminações dessemelhantes Preservador de santos e de estrelasE enlouqueces as rosas temporãs Que importa a noite lúgubre escondê-las?

[instantes?

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O translúcido, talvez a opacidade do inverno europeu, já que o soneto foi escrito durantea estada do sonetista em Londres no ano de 1939.

Atente-se para os dois versos finais do primeiro quarteto.

"Propício ao sentimento das irmãs

E ao mistério da carne das amantes:"

A inocência virginal das irmãs e o pecado atenuante das amantes que buscam na carne

a sua felicidade.

EPITÁFIO

Aqui jaz o Sol Aqui jaz o SolQue criou a aurora O andrógino meigo

E deu luz ao dia E o violento, que

E apascentou a tarde

O mágico pastor Possui a forma

De mãos luminosas De todas as mulheresQue fecundou as rosas E morreu no mar.

E as despetalou

É uma elegia aquilo que é fúnebre. Não é por menor que já no primeiro verso dá-se a

construção.

"Aqui jaz o sol",

Jazigo tudo que se encerra em féretro, morto, enterrado.No segundo quarteto observamos que aquele que constrói (3º verso) é também o mesmo

que destrói (4º verso). É o jogo de palavras para dar vida ao poema, dando ao sol todos os poderes

naturais que lhe é devido.No quarto terceto observamos que apesar de possuir a forma de todas as mulheres,

este morre no mar.

SONETO DE FIDELIDADE

De tudo, ao meu amor serei atento E assim, quando mais tarde meAntes, e com tal zelo, e sempre e [procure

[tanto Quem sabe a morte, angústia de

Que mesmo em face do maior [quem vive [encanto Quem sabe a solidão, fim de quem

Dele se encante mais meu [ama

[pensamento.Eu possa me dizer do amor (que

Quero vivê-lo em cada vão momento [tive):

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Em seu louvor hei de espalhar meu Que não seja imortal posto que é [canto [chama

E ir meu riso e derramar meu pranto Mas que seja infinito enquanto dure.

Ao seu pesar ao seu contentamento.

Aqui há o excedente, o excesso, o ápice do zelo, do cuidado em não pecar contra ti, Oh

amada! Pode-se notar o equilíbrio suave, porém forte, das palavras mimetricamente colocadas nosdevidos lugares. Caso o tiremos uma apenas, não teremos mais o mesmo poema e sim, outro.

Enquanto eu amar-te é lindo, é sublime, porém se acaso o amor faltar, deixa de ser

sublime e passa a ser uma coisa qualquer, incapaz de contigüidade.Este soneto é o mais conhecido de Vinícius. Muitos e de muitas formas é utilizado para

demonstrar qualquer plangência de amor platônico, efervescente.

SONETO DE DESPEDIDA

Uma lua no céu apareceu Mas não partira delas; a mais loucaCheia e branca; foi quando, Apaixonou-me o pensamento; dei-o

[emocianada Feliz - eu de amor pouco e vida

A mulher a meu lado estremeceu [poucaE se entregou sem que eu dissesse

[nada.

Larguei-as pela jovem madrugada Mas que tinha deixado em meu

Ambas cheias e brancas e sem véu [enleio

Perdida uma, a outra abandonada Um sorriso de carne em sua bocaUma nua na terra, outra no céu Um gota de leite no seu seio.

Veja a bela construção deste soneto. Foi só a lua aparecer e como um encantamento,quase uma hipnose, a mulher entregou-se ao amor do homem ao seu lado estava sem sequer uma

palavra de persuasão.

Ambas brancas, cheias e sem véu. O véu está invocando a não virgindade de ambas, jáque, as duas conforme o autor participação do ato.

BILHETE A BAUDELAIRE

Poeta, um pouco à tua maneira Que não revia desde o tempo

E para distrair o spleen Em que te lia e te reliaQue estou sentindo vir a mim A ti, a Verlaine, a Rimbaud...

Em sua ronda costumeira

Folheando-te, reencontro a rara Como passou depressa o tempo

Delícia de me deparar Como mudou a poesia

Com tua sordidez preclara Como teu rosto não mudou!

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Ao ler o soneto percebemos o encantamento que o discípulo tem para com seu mestre.Conforme Otto Lara Resende, Vinícius iniciou suas leituras lendo justamente: Rimbaud, Verlaine e

Baudálaire, poetas considerados grandiosos na construção da poesia pura européia.

MÁSCARA MORTUÁRIA DE GRACILIANO RAMOS

A epopéia a Graciliano Ramos nos dá a noção do poder de canto que tem este soneto eseu viador. Ao amigo Graciliano de tantas lutas e tantas vitórias. Podemos perceber também a busca

da mortalidade. É o sincronismo em ação.

Feito só sua máscara paterna Feito pó, feito pólen, feito fibra

Sua máscara tosca, de acridoce Feito pedra, feito o que é morto e

Feição, sua máscara austerizou-se [vibraNuma preclara decisão eterna. Sua máscara enxuta de homem forte

Feito só, feito pó, desencantou-se Isto revela em seu silêncio à escuta:Nele o íntimo arcanjo, a chama Numa severa afirmação da luta

[interna. Uma impassível negação da morte.

Da paixão em que sempre se[queimou

De seu duro corpo que ora longe

[inverna.

OS QUATRO ELEMENTOS

O fogo, a terra, o ar e a água representam as formas de construção deste planeta. Porém

metaforicamente Vinícius os elevou para a excentricidade da mulher que está ou pode ser formada apartir destes elementos. Há também presença picante no final do 2º elemento: a terra. Veja.

Mas eu que não sou bobo, digo nada...Ah, é assim... (só penso). Muito bem:

Antes que a terra a coma, como eu.

QUESTÃO DE VESTIBULAR

ÁRIA PARA ASSOVIOInelutavelmente tu O madrigal se escreveRosa sobre o passeio Se é do teu costumeBranca! E a melancolia Deixa que te eu leve.Na tarde do seio.

(Sê... mínima e breve:As cássias escorrem A música do perfumeSeu ouro a teus pés Não guarda ciúme).Conheço o sonetoPorém tu quem és?

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QUESTÃO 01 - O soneto acima pode ser analisado, comoa) uma metáfora;

b) a mulher amada vista num deslumbramento todo cheio de utensílios, aparatos, acessórios...;

c) um soneto de canto e encantamento da mulher ideal. Não aquela mulher subjetiva imaterial, massim, aquela de carne e osso acometida também de pecados;

d) é um canto de amor;

e) todas corretas.

Conheço o soneto

Porém tu quem és?

QUESTÃO 02 - Marque a alternativa INCORRETA quanto aos versos acima, retirados do soneto,

Ária para Assovio.a) o sonetista se diz conhecedor de todos os sonetos;

b) o autor de diz conhecedor dos sonetos, mas indaga a mulher, quem és?

c) Apesar de conhecer o soneto o autor desconhece as artimanhas das mulheres;d) Devido às várias características da mulher e suas perscrutações o autor diz-se não conhecedor

de mulheres;

e) B - C e D são corretas

ANFIGURI

Aquilo que eu ouso Homem, sou a fera

Não é o que quero Poeta, sou um loucoEu quero o repouso Amante, sou pai.

Do que não espero.

ida, quem me dera...Não quero o que tenho Amor, dura pouco...

Não sei de onde venho Poesia, aí!...

Sei para onde vou.

QUESTÃO 03 - Conforme soneto acima a figura de linguagem predominante, é

a) metáfora;b) antítese;

c) hipérbole;

d) metonímia;e) catacrese.

QUESTÃO 04 - A presença mais acidentada da picante libido de Vinícius nesta obra está nos sonetos:a) Os Quatros elementos; Poética;

b) Os Quatro elementos; Soneto de Despedida;

c) Os Quatro elementos; Poética;d) Soneto da Rosa; Poética.

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QUESTÃO 05 - Quanto à obra é CORRETO afirmar,a) tem construção em prosa;

b) faz parte do Parnasianismo brasileiro;

c) faz parte do modernismo brasileiro;d) pode ser considerada uma epopéia.

GABARITO: 1 - E, 2 - A, 3 - B, 4 - B, 5 - C

A DISCUSSÃO DO SONETO

VINÍCIUS DE MORAES estreou em 1933, aos vinte anos, com O Caminho para a Distância

- um livro, a começar pelo título, embriagado pela vertigem das grandes abstrações e das grandes

alturas. Com invocações ao Espírito e à Verdade - tudo com maiúsculas - o poeta reivindica um lugarprivilegiado, como ser assinalado e meio esotérico, compassivo para com os homens, mas certamente

acima de todos os homens:

A vida do poeta tem um ritmo diferente.

E a sua alma é uma parcela do infinito distante.

Sua alma sofre "pavorosamente a dor de ser privilegiada". O poeta está comprometido,

como um missionário, com "o infinito que ninguém compreende":

Ele é o eterno errante dos caminhos

Que vai pisando a terra e olhando o céu.

Na verdade, olhava mais o céu do que pisava a terra; a que se sentia, contudo, atraído

por uma incoercível, terrena e já evidente - pelo menos nas entrelinhas - lei de gravidade.Ao primeiro livro, segue-se Forma e Exegese, que é de 1935, no qual o autor anunciava

de cara - "em preparo"- um romance (O Conhecimento do Amor) e novo livro de poemas (A Face do

Anjo), dois títulos expressivos e reveladores. Amor e Anjo, ambos com A grande, eram entidadespróximas, senão a face de um mesmo e único Mistério (também com M grande). A dedicatória

mantém-se na mesma soberba altitude:

A JEAN-ARTHUR RIMBAUD

E

JACQUES RIVIÈREEM DEUS

Em Forma e Exegese, já está um dos primeiros poemas que Vinícius selecionaria para asua Antologia Poética - "Ausência", no qual o lírico dribla o cipoal de angústias metafísicas em que o

"poeta altíssimo" andava enredado. Forma e Exegese respira o mesmo estro que O Caminho para a

Distância, mas é ainda mais ambicioso, mais altissonante, mais pomposo. O poeta espraia-se numritmo solene, é um sacerdote que, do alto de sua sapiência, fala à turbamulta, sem com ela confundir-

se.

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Em 1936, surge Ariana, a Mulher, que, segundo o próprio autor, encerra "a sua fasetranscendental, freqüentemente mística", Transcendental, sim; mística, nem tanto, a menos que se

tome a palavra no sentido vulgar, de "alegórico", ou "esotérico", e que estará próxima de um juvenil

mistifório do que de um misticismo contemplativo. A verdade, porém, é que Ariana, mais do que osotaque antigo, guarda ainda a opulenta retórica da primeira fase e nela assenta como a luva à mão.

A data da mudança que se operou no poeta não pode ser fixada com precisão, mas é

fora de dúvida que ele, que só celebrava no altar de Rimbaud e outros clérigos de alto coturno,transitou do reino do sublime para o plano do real. Despojou-se da contemplação narcisista de seus

provavelmente imaginários tormentos pessoais. A linguagem, como tinha de ser, desce ao natural,

senão ao coloquial. Desaparecem os sustenidos artifícios e os falsetes que não lhe pertenciam. Opoeta deixa de fazer pose; cedo enjoa de orgulhosas inquietações mais ou menos postiças e, no seu

caso, de uma ênfase muito mais adolescente do que poética. Nessa primeira fase, de que Forma e

Exegese, até pelo título, é tão característica, o ritmo é largo, claudeliano, ou brasileiramenteschmidtiano (não nos esqueçamos de que Schmidt, editor do livro de estréia de Vinícius, foi, com

este, objeto de um longo estudo apologético de Octavio de Faria - Dois Poetas). As metáforas,

pandas, têm então envergadura condoreira e buscam, aflita e presunçosamente, uma eloqüênciaque abomina o silêncio e exerça o comezinho.

Dentro de um contexto de reação às trivialidades, às piadas e às rastaqüerices da onda

modernista, que vinha de 1922, o poeta imposta e alça a voz para cantar a "mulher desespero", a"que perpetua o desespero humano", o "ser ignorado", O "fardo da carne" acentua os espasmos de

uma adolescência literariamente manipulada para encher o seu farnel metafórico; O que lhe importa

não é ver o que existe e o cerca, mas o que está para lá do que existe e o cerca. Cuida de entrevermais do que ver. É um vidente, à maneira de Rimbaud. A inspiração confunde-se freqüentemente

com o delírio, ainda que fabricado a duras penas. Além de feroz o altíssimo, como se confessa, o

poeta quase imberbe é grave, gravíssimo, até que a aceitação do real o convide a deixar de serinquilino do sublime, a recolher as velas de sua desbragada inspiração. É natural, pois, que a princípio

a mudança lhe soe como empobrecimento.

Meu sonho, eu te perdi; tornei-me em homem.

Feito homem, homem entre homens, homem entre coisas, o poeta se dá conta de seuscinco sentidos alertas, que de resto nunca lhe faltaram, pois os eflúvios místicos - vá lá - de sua fase

sublime sempre se mesclaram de inequívocos arrancos sensuais, sobretudo em O Caminho para a

Distância, quando ele estava, quem sabe, menos consciente de sua aristocrática missão de... bardo(ou de vate, à escolha).

Descendo ao concreto o poeta faz as pazes com a vida. Caminha para assumir a sua

naturalidade. Livra-se das penas de pavão e de águia que se tinha acrescentado. Já não é uma avedo paraíso. Não mais necessita de exacerbar, por vanglória de super-homem, as razões de sua

angústia. Ao contrário, procura apazigá-las. Descobre o chão em que pisa, encara o cotidiano e não

se envergonha - a partir de Novos Poemas - de falar como todo mundo, tão coloquial quanto... ManuelBandeira (que de resto lhe fornece a epígrafe para aquele livro: "Todos os ritmos, sobretudo os

inumeráveis"). A poesia já não é desdenhosa; não é contra, mas a favor; não se derrama em apóstrofes

nem se despenha em cascatas espumejantes para inglês ver; nasce do encontro e não do conflito,da aliança e não do atrito. Poeta e cidadão se encontram, entendem-se, falam a mesma língua.

E a mulher se encarna. Ainda estará longe do padrão meio faceto e muito íntimo da

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famosa "Receita de Mulher", mas já não é mais uma transfiguração perturbadora e etérea - espéciede fantasma inexistente de um castelo que também não existe. A mulher agora é gente, vai ser

companheira e amiga:

Não, tu não és um sonho, és a existência

Tens carne, tens fadiga e tens pudor

No calmo peito teu.

O poeta reconhece os amigos: "Soneto a Octávio de Faria", "Saudade de Manuel

Bandeira", "Balada de Pedro Nava", "Mensagem a Rubem Braga", "Máscara Mortuária de GracilianoRamos", "A Última Viagem de Jayme Ovalle". Volta-se para o tempo presente, esquece as profecias

de timbre apocalíptico. Talvez já não pense na posteridade e, por isso, quem sabe, começa a assegurá-

la. Os poetas intelectuais franceses e os poetas metafísicos ingleses fazem parte de uma aventuraespiritual encerrada. Pablo Neruda, sensual e social, e Garcia Lorca, valorizado pelo martírio, tornam-

se familiares. Vinícius veste-se sob medida, põe-se à vontade dentro de um lirismo que, sobretudo a

partir de Cinco Elegias (1943), está mais - solto, mais desenvolto. Os largos verbos de largo fôlegodespem a sua adjetiva púrpura de nobreza perfunctória - e duvidosa. O poeta multiplica os seus

ritmos e persegue a sua substância, desvenda os próprios temas. Dispõe de um instrumento hábil e

adestrado. Sua manipulação do verso é acrobática, com uma flexibilidade musical capaz de fazermisérias.

É a época das baladas. A "Balada do Mangue", cuja publicação na Revista do Brasil

constitui um caso nacional. "Rosário", em que se viram reminiscências lorquianas ("La Casada Infiel").A 'Balada das Meninas de Botafogo": a mulher já não tem nada da idealização de musa incorpórea.

Das pobres flores gonocócicas à amada, a mulher agora é de carne e osso. Mulher que trabalha, que

anda de bicicleta, que habita em suma a cidade do real. E porque aí também habita, o poeta estáimpregnado de uma consciência social que o convoca para as preocupações de seu tempo. Tempo

de guerra: "Balada dos Mortos dos Campos de Concentração", "A Bomba Atômica", "A Rosa de

Hiroxima". De um certo desdém altivo, que não lhe era genuíno, Vinícius caminha assim para acompreensão e depois para a via larga e misericordiosa da absolvição geral:

Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres.

A matéria do poeta, "a quem foi dado se perder de amor pelo seu semelhante", é a vida -

"e só a vida, com tudo o que ela tem de sórdido e de sublime". Nada que é humano lhe é estranho.Uma sublimidade pejorativamente angélica cede lugar ao "sentimento da fecundidade da vida". A

fórmula viniciana de viver intensamente guarda, contudo, ressaibos da antiga sede de absoluto, ou

qualquer coisa parecida: a consciência do insatisfatório, a certeza de que tudo afinal é pouco.O poeta altíssimo está, finalmente, na boca das multidões. Agora, sim, olha o céu, mas

sobretudo pisa a terra.

Já n'O Caminho potra a Distância, seu livro de estréia, Vinícius divulga os seus primeirossonetos. O primeiro deles, pela ordem de paginação, Revolta, é claramente, um autoconvite para

abandonar o pranto, a solidão, o espaço e, deixando de ser água das alturas infinitas, vir habitar o

mundo:O mundo é bom. O espaço é muito triste...

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É uma antecipação premonitória do itinerário que aqui procuramos rastrear. Já o segundosoneto d'O Caminho chora copiosamente: o poeta é um incompreendido, um perdido, um desesperado

que se esforça em demonstrar-se que é impraticável conciliar a alegria de viver com a nobre missão

de poetar. Dois versos logo no primeiro quarteto definem uma pretensa filosofia de cunho romântico,tão século XIX:

- A vida é um sonho vão que a vida leva- Cheio de dores tristemente mansas.

A mesma temática reaparece no terceiro e último soneto d'O Caminho - "Judeu Errante",que nada tem ainda da marca pessoal de Vinícius. Essa marca só vai aparecer, nítida e finalmente

livre, em Novos Poemas, que se abre com "Ária para Assovio", incorporada à Antologia mais tarde

selecionada pelo poeta. A seguir, "Amor nos Três Pavimentos" assinala a chegada de Vinícius aomundo, ao chão de todo mundo. Fundem-se aí a linguagem do amor e a linguagem da infância. Amar

á ser feliz, logo, ser criança. O poeta entra na posse de um instrumento literário capaz de lhe dar, de

saída, o seu "Soneto de Intimidade", a que se seguem - todos incluídos nos Novos Poemas - o"Soneto à Lua", o "Soneto de Agosto", o "Soneto de Katherine Mansfield", o "Soneto de Contrição", o

"Soneto de Devoção" e o "Soneto de Inspiração".

Uma vez na posse de sua língua pessoal, Vinícius nunca mais deixará de compor osseus sonetos. Observa Paulo Mendes Campos, com razão, que "depois do modernismo, inimigo do

soneto, foi Vinícius de Moraes que começou a criar gosto pelo soneto de forma regular". Composição

poética de quatorze versos, com dois quartetos e dois tercetos, há mil maneiras de fazer um soneto,sem contar a estrambótica. O soneto está em todas as literaturas e, desde o século XIII, resiste a

todas as revoluções. Não há a rigor grande poeta que não tenha sonetado - Dante, Petrarca,

Shakespeare. Nas letras portuguesas, as duas mais altas vozes são de exímios sonetistas - Camõese Fernando Pessoa. O soneto é, a bem dizer, a carta de identidade de um poeta. É preciso chamar-

se, porém, Charles Baudelaire, ou equivalente, para meter-se na caminha de força - de um soneto e

de fato empreender, com disciplina e liberdade, obra pessoal, poeticamente válida.No Brasil, depois da rigidez parnasiana, responsável por algumas peças marmóreas,

mas perenes (Raymundo Correa, Olavo Bilac, Alberto de Oliveira), a reação simbolista floresceu

com sonetistas do porte de Alphonsus de Guimaraens e Cruz e Sousa. O movimento modernista,para oxigenar o provinciano e sufocante ambiente literário nacional, precisou saudavelmente mover

campanha mortal contra o soneto. Como era de esperar, os resultados foram positivos: o soneto não

morreu, mas ressurgiu renovado e, nem por isso, menos popular. Os próprios corifeus do modernismo- Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Jorge de Lima, Carlos Drummond de Andrade - conquistaram

o direito de cometer os seus sonetos sem renunciar à personalidade e à poesia.

Forma poética popular desde a sua origem, o soneto é, para o poeta, como diz PauloMendes Campos, "um desafio e uma brincadeira". Desafio sobretudo, quero crer, pelo convite a

reformar uma fórmula esgotada e sempre inesgotável; brincadeira que, como todo ato lúdico, só dá

prazer dentro de um mínimo de regras, nessa inebriante conciliação da liberdade com a disciplina.Vinícius é um que aceitou o desafio e saiu-se bem dele. Seu lugar, na volta ao soneto, se

volta houve entre nós, está historicamente assegurado. Seus sonetos, longe de serem acadêmicos,

isto é, frios, natimortos, são essencialmente modernos: respiram a mesma naturalidade de suasmelhores composições. A lição camoniana, que por sua vez será petrarquiana, amplia, nos sonetos

vinicianos, esse espaço imponderável, mas nítido, da liberdade interior, sem a qual o soneto é apenas

COLÉGIO PRO CAMPUS - “A PAZ ESTÁ NA BOA EDUCAÇÃO” - OBRAS INDICADAS - COPEVE - UFPI

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um exercício enfadonho e bem-pensante, tendente ao sublime, mas tão-só conceituoso, o que querdizer antipoético. O cilício do soneto, para usar a expressão feliz de Carlos Parte de Moraes, como

todo recurso de ascese, há de conduzir a mais liberdade, o que no caso é também mais personalidade,

ou seja - originalidade.É fácil entender, por tudo isso, como faltava à bibliografia de Vinícius de Moraes este Livro

de Sonetos. Aqui se juntam todos os de sua lavra que o poeta considera realizados, impregnados,

pois, de sua marca pessoal. Vários deles já correm mundo e freqüentam obrigatoriamente ascoletâneas do gênero. Conquistaram, com o favor do público, o direito à permanência. É o caso do

"Soneto de Fidelidade", cujos ecos - pelo menos os ecos - estão em todas as oiças. Ou do "Soneto

de Separação", que, como aquele, atravessa, impávido, em decassílabos espontâneos, ainda quede sabor clássico - ou camoniano, o que dá na mesma - os escolhos de um tema eterno. Na mesma

linha, eu poderia citar o "Soneto do Amor Total". Metro e rima variam, porém, segundo as exigências

do tema, ou segundo os caprichos do poeta, que é, no soneto ou fora dele, um malabarista que nãorecua diante do salto mortal. Aí está, entre tantos, "A Pêra", que não me deixa mentir.

Desafiando e brincando, ao longo de trinta e cinco anos de fidelidade à poesia, Vinícius

construiu este Livro de Sonetos, do qual se poderá dizer, sem querer bancar o profeta, que o público- já consagrou; com o que dá provas de bom-gosto e discernimento. De todas as formas poéticas,

fora a quadrilha em redondilhas, o soneto é por certo a mais popular, inclusive - ou sobretudo -

porque de mais fácil memorização. A unidade da peça e até o galope dos versos, quase sempreheróicos, assim como a distribuição geométrica e visual em quartetos e tercetos, são bons arrimos

para a memória, que aliás, em matéria de sonetos, é ajudada pelo seu melhor servo, que ó coração.

Saber de cor, no caso, - mesmo saber de coração. Também quanto a esse aspecto da acolhidapopular, é fora de dúvida que Vinícius, com os seus sonetos, várias vezes acertou na mosca.