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A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO: realidade e possibilidades Tânia Maria de Moura Fonseca 1 Gislene Lonitz Bida 2 Resumo: Provocar uma reflexão sobre a importância da relação professor-aluno no dia a dia escolar foi o principal objetivo deste trabalho. O estudo e a pesquisa realizada em parceria com os alunos do Curso de Formação de Docentes do Colégio Estadual Major Vespasiano Carneiro de Mello mostrou um professor consciente dos problemas vivenciados pela educação pública, mas que ainda precisa superar seus conflitos. A pesquisa realizada enfocou quesitos essenciais que fazem do professor um profissional competente, destacando aspectos relevantes como interação cognoscitiva e também os aspectos sócio-emocionais presentes no processo ensino- aprendizagem. Foi também indagado sobre o ponto de vista dos alunos do turno da noite a respeito de sua aprendizagem, dos fatores que determinam o sucesso ou o fracasso escolar, do seu relacionamento e interação com os professores. Outro ponto discutido e analisado foi a disciplina que está diretamente ligada à prática docente, à autoridade profissional, técnica e moral do professor. Os resultados alcançados foram positivos indicando que a realidade vivida é passível de mudanças, mas para isso é preciso formar uma consciência coletiva, onde cada um dos envolvidos no processo ensinar-aprender reconheça a importância de pensar com mais seriedade sobre o problema da evasão e repetência, buscando alternativas que viabilizem a melhoria do ensino em nosso país. Palavras chaves: Fracasso escolar, relação professor-aluno, realidade, possibilidades. Abstract: The main objective of this article is to discuss the importance of the teacher- student relationship in the daily school routine. The study and survey of the students attending the Docent Preparation Center from Major Vespasiano Carneiro de Mello State School indicate that teachers are aware of the public school system problems, but that they still need to overcome their reservations. The survey focused on essential aspects that make for a competent teacher, highlighting relevant topics like cognoscitive interaction and also socio-emotional aspects present in the teaching- learning process. Night class students were questioned about their learning, about the 1 Professora Pedagoga PDE, Col. Est. Major Vespasiano C. de Mello 2 Professora Orientadora UEPG

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A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO: realidade e possibilidades

Tânia Maria de Moura Fonseca1

Gislene Lonitz Bida2

Resumo: Provocar uma reflexão sobre a importância da relação professor-aluno no dia a dia escolar foi o principal objetivo deste trabalho. O estudo e a pesquisa realizada em parceria com os alunos do Curso de Formação de Docentes do Colégio Estadual Major Vespasiano Carneiro de Mello mostrou um professor consciente dos problemas vivenciados pela educação pública, mas que ainda precisa superar seus conflitos. A pesquisa realizada enfocou quesitos essenciais que fazem do professor um profissional competente, destacando aspectos relevantes como interação cognoscitiva e também os aspectos sócio-emocionais presentes no processo ensino-aprendizagem. Foi também indagado sobre o ponto de vista dos alunos do turno da noite a respeito de sua aprendizagem, dos fatores que determinam o sucesso ou o fracasso escolar, do seu relacionamento e interação com os professores. Outro ponto discutido e analisado foi a disciplina que está diretamente ligada à prática docente, à autoridade profissional, técnica e moral do professor. Os resultados alcançados foram positivos indicando que a realidade vivida é passível de mudanças, mas para isso é preciso formar uma consciência coletiva, onde cada um dos envolvidos no processo ensinar-aprender reconheça a importância de pensar com mais seriedade sobre o problema da evasão e repetência, buscando alternativas que viabilizem a melhoria do ensino em nosso país.

Palavras chaves: Fracasso escolar, relação professor-aluno,

realidade, possibilidades.

Abstract: The main objective of this article is to discuss the importance of the teacher-student relationship in the daily school routine. The study and survey of the students attending the Docent Preparation Center from Major Vespasiano Carneiro de Mello State School indicate that teachers are aware of the public school system problems, but that they still need to overcome their reservations. The survey focused on essential aspects that make for a competent teacher, highlighting relevant topics like cognoscitive interaction and also socio-emotional aspects present in the teaching-learning process. Night class students were questioned about their learning, about the

1 Professora Pedagoga PDE, Col. Est. Major Vespasiano C. de Mello 2 Professora Orientadora UEPG

factors that determine their success or failure in school and about their relationship and interaction with teachers. Another topic that was analyzed is the discipline that is directly connected to the teaching practice, to the professional, technical and moral authority of the teacher. The results obtained were positive, indicating that it's possible to change the current state. It is, however, necessary to establish some collective awareness where every one involved in the teaching-learning process recognizes the importance of taking the school desertion and failure problems seriously, searching for alternatives that will improve the country's education system.

Os altos índices de evasão e repetência na educação formal brasileira é

um desafio que precisa ser enfrentado por todos que direta ou indiretamente

fazem parte do sistema educacional. Outro indicativo que evidencia o fracasso

escolar em nossas escolas é o número de alunos aprovados por conselho de

classe, ou ainda a grande dificuldade que muitos apresentam para aprender os

conteúdos escolares. Tudo isso somado ao desinteresse nas aulas, à

indisciplina e pior ainda á violência física, verbal ou moral apresentam um

quadro assustador, que requer atenção, reflexão e tomada de decisões e

atitudes. É urgente e necessário buscar soluções, mesmo com a consciência

de que os professores, equipe pedagógica e direção de uma escola não têm o

poder de solucionar todos os problemas gerados pelo contexto atual. A

sociedade exclusiva em que vivemos, onde poucos têm muito e a maioria da

população vive em condições precárias, a inversão dos valores morais e éticos

na política e na vida, a desestruturação da família onde os primeiros alicerces

da educação deveriam ser construídos está contribuindo na formação de

crianças e jovens predispostos ao fracasso escolar.

A escola e os professores não podem e nem devem ser vistos como os

“salvadores da Pátria”, mas fazem parte dessa estrutura e têm uma função

social a cumprir: socializar o conhecimento. A tarefa não é das mais fáceis,

pois a concretização do ensino só é efetivada através da aprendizagem e os

fatores que interferem nesse processo de forma positiva ou negativa são

muitos. Entre eles está a relação professor-aluno, ou melhor, o trabalho

desenvolvido pelo professor, que vai do planejamento ao desenvolvimento da

aula e, portanto um ponto possível de ser revisto por todos os educadores, em

todos os níveis de ensino. Pesquisar, refletir, analisar e concluir sobre o

trabalho docente, suas mazelas, seus êxitos é também essencial para a

formação de professores conscientes e capazes de perceber que todo

profissional deve avaliar o seu próprio desempenho e reconhecer no seu

alunado indivíduos em formação.

Entender que ser professor é fazer a mediação entre o aluno e o

conhecimento, criando um clima favorável em sala de aula, empregando

metodologias e recursos capazes de despertar o interesse, mantendo a classe

disciplinada, tornando o ensino significativo é vital para a qualificação

profissional do professor.

Promover momentos de reflexão mais aprofundada sobre o trabalho

docente, junto aos alunos do Curso de Formação de Docentes do Colégio

Estadual Major Vespasiano Carneiro de Mello, e ainda de forma indireta

provocar um repensar nos professores que atuam no turno da noite nesse

colégio e alguns professores da rede municipal de ensino, séries iniciais do

Ensino Fundamental, foi o principal objetivo da elaboração do Projeto PDE: A

RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO: realidade e possibilidades.

Num primeiro momento, o projeto foi apresentado a todos os professores

do Colégio durante uma reunião pedagógica no início do ano letivo/2009.

Houve demonstração de interesse pela maioria dos professores presentes,

confirmando que os profissionais que atuam nesse Colégio são conscientes da

real importância do seu trabalho e da necessidade de estabelecer um bom

relacionamento com seus alunos em sala de aula.

Os alunos do Curso de Formação de Docentes conheceram o projeto

em uma aula de Estágio e a receptividade foi positiva, inclusive percebeu-se

certo orgulho em fazer parte de um trabalho científico diretamente ligado à sua

formação, onde teriam um papel importante a desempenhar, construindo e

aprofundando junto com a professora seus conhecimentos sobre o tema

tratado.

Valorizar o aluno ressaltando a importância de sua participação nas

atividades acadêmicas de sala de aula é promover um clima favorável à

aprendizagem criando vínculos de confiança, respeito entre professor e alunos.

A relação professor-aluno está impregnada de história, de séculos de

reflexões sobre o ofício de educar. Até os profissionais que desconhecem

nomes e as obras dos grandes pensadores da educação, são influenciados por

suas idéias em suas práticas pedagógicas. Pensar e rever a nossa prática

docente é urgente e necessário. Perguntar por que a criança tão curiosa

quando começa a descobrir o mundo, vai se desinteressando e aos poucos

achando a escola “chata” e tediosa? Por que o professor ensina e o aluno não

aprende? Por que professor e alunos não conseguem se perceber como

aliados?

ANASTASIOU e ALVES (2006) abordam o ensinar e o aprender com

uma visão diferente, destacando o significado etimológico do verbo ensinar, do

latim ensignare, marcar com um sinal, que deve ser de vida, de busca, de

despertar para o conhecimento. Afirmam também que aluno e professor

precisam sentir o sabor do conhecimento. O dar aula deve ser substituído pela

expressão “fazer aula”, onde professor e alunos desempenham seus papéis,

interagindo e construindo saberes.

ANTUNES (2008) faz uma sátira classificando os docentes em

professores e “professauros”, destacando que o segundo grupo apresenta

formas de pensamento comuns ao período Cretáceo, dominado pelos grandes

dinossauros.

Quanto ao ano letivo que se inicia: Para os professores, uma

oportunidade ímpar de aprender e crescer, um momento mágico de

revisão crítica e decisões corajosas; para os professauros, o

angustiante retorno a uma rotina odiosa, o eterno repetir amanhã tudo

quanto de certo e de errado se fez ontem. (ANTUNES 2008 p.13)

O autor destaca várias características positivas que muitos professores

apresentam e ao mesmo tempo aponta o desânimo, o cansaço, a

repetitividade, a obrigação, o ver no aluno um cliente chato, que está ali apenas

para atrapalhar, incomodar. Fala também dos sonhos que os professores

acalentam, da esperança de superar os desafios, a fim de se fazer da arte de

amar, o segredo de viver; enquanto que os ditos “professauros” a vida se

transforma numa rotina chata, se trabalha por imposição, se casa por

obrigação, seu sonho é a aposentadoria e quem sabe o quanto antes morrer.

No final da página, pergunta: Conhece alguém que pertence a uma ou a outra

categoria? E você, a que categoria pertence?

Provocar no professor de amanhã e no professor de hoje uma

inquietação, mexer com conceitos arraigados como raízes profundas, foi o

principal objetivo do projeto. Somos professores, mas temos muito ainda de

professauros. Ter consciência de nossas falhas, dos erros que cometemos, das

mudanças que ocorreram no mundo, de que o aluno de hoje não é igual ao de

ontem e que o professor de hoje tem um enorme desafio a enfrentar é um

primeiro passo no difícil caminho que temos a percorrer. Encontrar meios de

preservar saberes e valores e ao mesmo tempo inovar para garantir a criação e

assegurar o progresso é um conflito vivido pelos educadores e pelas escolas

que pretendem cumprir seu papel social.

A primeira atividade proposta aos alunos participantes do projeto foi o

desafio de estudar alguns textos teóricos que fundamentaram o trabalho,

refletir, analisar e expor o assunto. A turma foi dividida em grupos de três ou

quatro elementos, os textos foram distribuídos e a professora fez uma pequena

explanação, orientando sobre o tempo disponível, forma de apresentação,

inclusive destacando a importância de fazer perguntas que estimulassem um

pequeno debate.

Após a leitura, os grupos decidiram repartir o texto, em seguida

distribuíram as partes entre si, enfim organizaram a forma em que fariam a

apresentação do trabalho. O resultado foi muito bom, pois a maioria

demonstrou desembaraço e compreensão sobre a teoria estudada, expondo de

forma clara e fazendo relações com experiências vividas ou observadas. Foram

destacados pontos importantes que favorecem a relação professor aluno e

entre eles falou-se sobre a confiança, pois não existe nenhum tipo de relação

que se sustente sem a sua presença, seja na escola, seja na família e até

mesmo no trabalho

HOUAISS (2004): “Sentimento de segurança na sinceridade ou

competência de alguém, crédito, fé”: Confiança. È clara a definição e

indispensável sua presença em sala de aula, pois sem ela a relação professor-

aluno se torna difícil e a aprendizagem impossível. Sabemos que essa relação

tem dois lados e depende de ambos, porém é ao professor, como mediador do

processo ensino-aprendizagem, que cabe a responsabilidade de procurar

desenvolver vínculos com seus alunos.

Estabelecer vínculos de confiança vai exigir do professor

aperfeiçoamento constante, respeito á realidade do aluno e a busca de meios

para trabalhar com uma clientela que chega à escola com informações,

conhecimentos e orientações adquiridas de diferentes formas, como família,

amigos, mídia, igreja, internet e outras. Outro aspecto importante a considerar

na conquista da confiança dos alunos é o domínio dos conteúdos e de

metodologias adequadas, que despertem o interesse e tornem o ensino

significativo.

SANTOS (2008) destaca um conjunto de atitudes que compõe uma

relação de respeito e confiança mútua entre professor e alunos, e ainda ajuda a

promover um contexto propício para uma aprendizagem significativa:

• Propor desafios que estejam ao alcance dos alunos.

• Ajudar na superação das dificuldades.

• Monitorar a linguagem utilizada em sala de aula e a linguagem natural

do aluno.

• Garantir um ambiente em que o aluno se sinta parte do processo.

• Reconhecer e valorizar os pequenos sucessos de cada aluno.

• Estimular a conquista da autonomia em seus alunos.

Outro aspecto apontado pelos grupos, como fator essencial no trabalho

docente é dar significado ao conteúdo trabalhado, procurando estabelecer

pontes entre o novo conhecimento e o saber dos alunos. O professor deve

compreender que o aluno necessita construir um sentido real e concreto com

relação ao conteúdo e para isso precisa interagir com o objeto do

conhecimento.

SANTOS (2008) afirma que o professor precisa vencer algumas

barreiras para promover a aprendizagem significativa:

• Compreender que seu principal papel não é dar aulas, mas, sim

provocar a aprendizagem.

• Refletir e questionar: O que dá mais trabalho, facilitar a aprendizagem

ou impor a aprendizagem?

• Encarar o desafio de oportunizar em suas aulas momentos de trabalho

efetivo dos alunos, em que sejam levados a criar, analisar, simplificar,

enfim a desenvolver sua capacidade de pensar.

• Compreender que a aprendizagem se constrói de dentro para fora e

para isso o aluno precisa interagir, deixar de ser passivo.

• Entender que a finalidade principal da educação escolar é a

aprendizagem, não o programa de ensino.

Dar significado aos conteúdos é um grande desafio que precisamos

encarar, mesmo que isso signifique desmanchar o que já temos pronto, mexer

em nossa acomodação, tirar os pés da terra firme, vencer nossos medos. A

tarefa é árdua e longa, pois os obstáculos são muitos e pode até nos parecer

uma “missão impossível”.

SANTOS (2008) afirma que o principal papel do professor, na promoção

da aprendizagem significativa, é desafiar os conceitos já assimilados, para que

se ampliem e se tornem mais sólidos, possibilitando estabelecer ligações com

novos conhecimentos. Um conceito bem elaborado e consistente é com

certeza um ótimo alicerce para a aquisição de novos conceitos. Preparar uma

aula significativa requer que o professor busque formas de desafiar as

estruturas conceituais dos alunos. Esse desafio pode ser promovido através de

uma pergunta, de um questionamento, de uma problematização ou qualquer

outro recurso que desperte a curiosidade, o interesse, que “mexa” com os

alunos.

Ainda segundo o autor, são dois os tipos de aprendizagem que ocorrem

numa sala de aula: a aprendizagem superficial e a aprendizagem profunda.

A aprendizagem superficial acontece quando se dá maior importância ao

que será exigido como tarefa, às exigências que serão feitas sobre o conteúdo.

A memorização das informações para provas é uma conseqüência, existe uma

imposição externa, não há reflexão, um pensar sobre, os elementos ficam

soltos e são esquecidos facilmente.

A aprendizagem profunda acontece quando o aluno quer entender o

significado do que está estudando, é levado a pensar sobre o conteúdo, a

relacioná-lo com aprendizagens anteriores, com suas vivências, quando

argumenta, pergunta, responde.

Os motivos que levam a uma ou outra aprendizagem estão relacionados

às condições dos alunos, ao seu universo e principalmente à própria situação

de ensino, ao que acontece em sala de aula que é o resultado da vontade e

capacidade do professor para dar ou não significado ao que ensina. Promover

uma aprendizagem profunda significa planejar e organizar situações de ensino

que motivem, desafiem e estabeleçam uma relação de respeito e confiança

entre professor e alunos.

Na continuidade do desenvolvimento do projeto, foi proposto aos alunos

a elaboração de questões para entrevistar professores e alunos, buscando

questionar aspectos relevantes sobre a relação professor-aluno. As questões

foram elaboradas individualmente e analisadas pela professora servindo de

base para a elaboração da entrevista que foi realizada posteriormente.

Os principais aspectos abordados na elaboração das perguntas estavam

relacionados principalmente à disciplina escolar, à competência do professor

como fator primordial relacionado ao sucesso ou fracasso do aluno, à

importância do planejamento, do domínio de classe. Algumas questões

destacaram de forma evidente a preocupação com o papel do aluno, seus

deveres, suas responsabilidades e sobre a necessidade de uma escola

exigente, onde ter direitos é resultado do cumprimento dos deveres.

Na revista Atividades e Experiências - Positivo – Março/2008, LUFT fala

sobre o sentido da educação. Para ela educar não é simplesmente instruir,

ensinar a calcular, ler e escrever; educar é primeiramente ensinar a pensar, é

preparar para questionar, ser capaz e consciente na hora de fazer escolhas e

viver sua vida. Educar é fazer enxergar o mundo, suas belezas, suas regras,

seus perigos e suas possibilidades.

Desenvolver a capacidade de discernir, entender, julgar, escolher é mais

importante do que um belo prédio, alta tecnologia. Ela afirma também, que

embora todos busquem ter uma vida alegre e saudável, é preciso seriedade,

limites dentro da escola, pois só assim se aprende a distinguir o certo e o

errado, o bom e o mau, o melhor ou o pior. A vida não perdoa, as regras

precisam existir e precisam ser cumpridas, até mesmo as punições devem

fazer parte do dia a dia educacional.

A escola deve ser amorosa e alegre, mas deve ter autoridade e

hierarquia, deve incutir nos alunos o respeito por si mesmo, pela natureza, pelo

outro e pela vida. A escola precisa ter normas que devem ser respeitadas por

todos, não se pode admitir a prática do “faça o que eu digo, mas não faça o

que eu faço”. Cumprir horários e prazos, ser assíduo não vale só para o aluno,

vale para todos que compõem o ambiente escolar.

Com relação ao planejamento, LIBÂNEO (1991) afirma que a escola, os

professores e os alunos fazem parte da dinâmica das relações sociais; que o

meio escolar sofre influências da economia, da política e da cultura que

caracterizam a sociedade de classes. O meio escolar está impregnado de

interesses e implicações sociais, portanto é preciso refletir muito na hora de

planejar. O planejamento deve ser uma ação consciente do professor

determinando o rumo que quer dar ao seu trabalho. É um meio para se

programar as ações docentes, mas é também um momento de pesquisa e

reflexão ligado à avaliação.

O autor lembra também que a ação docente ganha eficácia na medida

em que o professor vai acumulando e enriquecendo experiências ao lidar com

as situações concretas de ensino. Isso significa que para planejar o professor

vai utilizar seu conhecimento didático e metodológico, e ao mesmo tempo sua

experiência prática. O registro dos novos conhecimentos e novas experiências

no plano de ensino vai possibilitar ao docente um criar e recriar sua própria

didática, enriquecendo sua prática profissional e propiciando uma maior

segurança em sala de aula.

LIBÂNEO (1991) observa que para planejar é necessário conhecer as

reais condições dos alunos. Não adianta introduzir matéria nova, se os alunos

carecem de pré-requisitos. Um professor não pode justificar o fracasso dos

alunos pela falta da base anterior; o suprimento das condições prévias de

aprendizagem deve constar no plano de ensino. Não deve alegar que os

alunos são desinteressados; é ele que deve criar condições, utilizando

metodologias adequadas, tornando o ensino significativo e interessante. Enfim,

todas as dificuldades apresentadas pelos alunos, que atrapalham a

aprendizagem, devem ser o ponto de referência para planejar e iniciar ou dar

continuidade ao trabalho escolar.

Algumas das questões elaboradas pelos alunos sugeriam também que

se indagasse sobre quem é o aluno da escola pública, que características os

nossos docentes vêem nesse aluno, se existe diferença entre ele e o aluno da

escola particular. Ficou evidente a preocupação sobre o que se ouve e se vê a

respeito da clientela escolar que freqüenta as escolas Municipais e Estaduais.

Como diz LIBÂNEO (1991), alguns professores estabelecem padrões de

desempenho, considerando um aluno normal aquele que tem melhores

condições socioeconômicas e maior desenvolvimento intelectual. Crianças que

apresentam condições diferentes a essa, são consideradas carentes,

atrasadas, candidatas a uma provável reprovação. Condicionam o sucesso

escolar a uma condição de vida, esquecendo que o desenvolvimento das

capacidades mentais, a aprendizagem do aluno deve ter como ponto de partida

a realidade que a criança apresenta ao ingressar na escola. Se o meio social

em que a criança ou adolescente vive não dispõe das condições para o

desenvolvimento intelectual, a escola, o ensino pode prover um ambiente

necessário de estimulação e é para isso que o professor se prepara

profissionalmente.

A importância do professor no processo ensino-aprendizagem é

evidente, está posto como condição essencial para a melhoria ou não do

ensino - aprendizagem. Conduzir a ação educativa para um resultado positivo

depende em grande parte da relação professor-aluno em sala de aula, da

postura, vontade e comprometimento do professor. Respeitar o aluno, ser

capaz de percebê-lo como um individuo em desenvolvimento, que precisa de

apoio, de estimulo, de compreensão e de muita cobrança vai trazer mudanças

positivas no processo ensino-aprendizagem.

O professor pode não ser o único responsável pelo fracasso escolar,

mas ter consciência da importância do seu trabalho é motivo suficiente para

que repense seu papel, reflita sobre seu desempenho, procure alternativas,

perceba que pode sim fazer a diferença.

As respostas obtidas nas entrevistas mostram que a maioria dos

professores participantes dessa etapa do projeto ao responder as questões

propostas, reconhece o trabalho docente como um dos fatores que interferem

diretamente para o sucesso ou o fracasso do aluno na aprendizagem escolar,

embora atribuam também ao meio social uma parcela bastante significativa da

culpa desse fracasso.

Na entrevista os professores apontaram como principais fatores

responsáveis pela evasão escolar e a repetência o meio social/família, o

desempenho do professor e o sistema educacional. A quantificação das

respostas dadas resultou no gráfico a seguir.

Fatores que contribuem para o fracasso escolar na visão dos professores entrevistados

46%

38%

16%

Meio Social/Família Desempenho Professor Sistema Educacional

Essa percepção dos professores não é utópica, pois os pesquisadores

dos fatos educacionais já apontaram resultados muito semelhantes a esse.

LIBÂNEO (1991) lembra que os dados demonstram que a escola pública

não consegue reter as crianças na escola, a perda de alunos já nessa década

é significativa e preocupante. Diz ele que isso pode ser explicado por fatores

externos à escola, mas que a exclusão escolar tem a ver, principalmente com o

que a escola e os professores fazem ou deixam de fazer. Uma pesquisa da

Fundação Carlos Chagas, São Paulo, em 1981, pesquisou as causas mais

gerais da repetência escolar. O seu objetivo foi de verificar e explicar esse

problema não só pelas dificuldades dos alunos, mas por fatores como

condições familiares, o corpo docente, a relação professor-aluno e aspectos da

própria estruturação da organização escolar. A conclusão a que esse estudo

chegou foi de que não se pode atribuir culpa a um só fator. Entre as principais

causas encontradas, como as condições de vida e as condições físicas e

psicológicas, a mais decisiva foi o fato de que a escola, na sua organização

curricular e metodológica, não esta preparada para trabalhar com crianças e

jovens provenientes de um nível sócio-econômico baixo.

A escola e os objetivos escolares têm em vista um aluno idealizado e

não um aluno concreto. A escola supõe que o aluno tenha todos os pré-

requisitos necessários à aprendizagem dos conhecimentos que vêm expressos

nos currículos, ignorando totalmente os conhecimentos e experiências, o seu

nível de preparo para aprender determinados conteúdos.

Os alunos que não se enquadram no modelo pré-estabelecido pela

escola são considerados preguiçosos e desinteressados, o que desencadeia

um processo natural de exclusão escolar. A escola e os professores

esquecem-se de que o ponto para iniciar a aprendizagem precisa estar

diretamente vinculado ao que o aluno já conhece, é como querer ancorar um

navio numa profundidade em que a corrente da âncora não alcança.

O papel social da escola é de assegurar a apropriação dos

conhecimentos humanos a todos os que vivem nessa sociedade, e isso requer

uma tomada de posição, um compromisso ético-político de todos os

professores no sentido de buscar meios e condições para que a unidade

ensino-aprendizagem se torne realidade. Uma das principais qualidades do

professor é de saber vincular as tarefas escolares com as condições prévias

dos alunos para enfrentá-las, pois é daí que surgem as condições necessárias

à aprendizagem. É essencial que o processo pedagógico seja organizado de

forma a fazer com que as dificuldades, tornem-se subjetivas na mente do

aluno, provocando nele a vontade de vencê-las. Essas dificuldades precisam

ser bem dosadas, não devem nunca exceder a capacidade de entendimento,

nem devem ser tão fáceis que não exijam pelo menos um pouco de esforço

para resolvê-las. Toda nova aprendizagem deve de alguma forma estar ligada

a um conhecimento já existente na cabeça do aluno.

Na entrevista realizada foi perguntado também, porque alguns

professores conseguem manter a disciplina em sala de aula e outros não. As

respostas apontaram o professor e o que diz respeito ao seu trabalho como

responsáveis diretos pelo comportamento inadequado dos alunos.

Porque o professor não consegue manter a disciplina em sala de aula

48%

46%

6%

Falta de domínio nos conteúdos/liberdade excessiva aos alunos/problemas na relaçãoprofessor-aluno Falta de planejamento ou metodologia inadequada

Não gostam do que fazem/vocação

Na questão sobre o segredo da boa relação professor-aluno, os

resultados demonstram com clareza que o próprio professor se percebe como

responsável pelo ambiente escolar favorável ao processo ensino-

aprendizagem. Os resultados apontados no gráfico apontam as qualidades que

um professor precisa ter, do emocional ao intelectual e técnico.

Condições para boa relação professor - aluno

72%

19%

9%

Respeito, equilíbrio emocional, compreensão e confiança são a base para a eficiência dotrabalho docente;

Conhecimento, compromisso, organização e firmeza;

Entusiasmo, criatividade e poder de comunicação.

Foi perguntado se o professor pode ser fator decisivo para o sucesso ou

o fracasso do aluno, as respostas demonstraram a percepção clara da grande

maioria dos professores em relação à sua própria responsabilidade no que diz

respeito aos resultados da aprendizagem escolar.

O professor pode ser fator decisivo para o sucesso ou o fracasso do aluno

Sim89%

Não11%

Sobre a importância do planejamento houve um consenso em todas as

respostas. Ficou evidente que os professores tem consciência de que um

trabalho sério requer sempre um pensar, decidir, planejar.

O planejamento é um guia, estabelece diretrizes e os meios para a

realização do trabalho docente. Ele não assegura por si só, a qualidade da

aula, mas é um instrumento que vai possibilitar ao professor maior segurança,

melhor aproveitamento do tempo disponível, o uso de estratégias adequadas a

cada conteúdo a ser assimilado, pelos alunos.

39%

61%

0%

20%

40%

60%

80%

Importância do Planejamento

Fator decisivo para uma aula de qualidade

Diretriz e segurança no trabalho do professor

Na questão sobre como o professor vê o aluno da escola pública as

respostas abordaram vários itens, sendo a maioria dos professores considera-o

um aluno normal, igual a qualquer aluno de qualquer escola, com suas

facilidades e suas dificuldades.

Como o professor vê o aluno da escola pública

37%

5%

12%

2%

3%

2%

7%

Igual a qualquer aluno dequalquer escolaParticipativo einteressadoDesinteressado

Dócil e afável

Sem limites

Sem base/desinformado

Carente de atenção

Vale registrar algumas frases escritas pelos professores entrevistados

sobre este assunto:3

“Acredito que os alunos da escola pública não apresentam um único

perfil, assim como os da escola particular”.

“O aluno da escola pública é igual aos outros, o que o torna diferente é a

pouca cobrança e ajuda da família sobre o seu estudo”.

“O aluno da escola pública é aquele que precisa realmente aprender e

muitas vezes não está sendo estimulado para isso”.

“Muitos entram na escola com vontade de aprender e são dedicados,

mas quando não são incentivados e cobrados perdem o interesse e

comparecem à escola apenas por obrigação”.

“Todos os alunos são ideais se o professor se fizer ideal”.

“Um aluno cheio de surpresas a serem descobertas, podendo ter muitas

habilidade e facilidades ou apresentar dificuldades, falta de bom

comportamento, incertezas a serem manejadas pelo professor”.

“Desinteressados, estudam pouco fora da sala de aula, não há cobrança

da maioria dos pais, por outro lado quando interessados são criativos”.

“O aluno da escola pública é muito bom, é aberto às inovações, é

curioso. Só é preciso melhorar o sistema educacional, um maior

comprometimento dos professores e da família”

“O aluno da escola pública é tão bom quanto o aluno da escola

particular, porém a falta de planejamento da SEED desestrutura a escola,

fazendo com que o aluno sofra a consequências disso”.

“Igual a qualquer de outra escola; com limitações ou não; com desejo de

saber ou não; com família estruturada ou não, com recursos financeiros ou

não”.

3 A entrevista não solicitou a identificação dos professores participantes, não sendo possível determinar a autoria das frases citadas.

“Indiferente da situação econômica, eles são capazes de aprender e

aprender com qualidade. São esforçados e sabem o que querem na vida. E a

escola na maioria das vezes é o “lobo mau” no final de cada história dentro de

seus muros”.

“Só se vê bem com o coração” (Saint Exupéry) “É disso que todo o aluno

precisa, tanto na escola pública como na particular: amor, pois só o amor

constrói”.

Perceber o aluno da escola pública como um indivíduo normal, igual a

todos os outros, com suas potencialidades e suas dificuldades, mas capaz de

aprender é um grande passo em direção a melhoria da qualidade de ensino em

nossas escolas. Melhor ainda quando o professor consegue identificar que ele

também tem responsabilidade, que a culpa do fracasso escolar não é exclusiva

do aluno ou do meio social ou do sistema educacional.

Reclamar que o aluno não corresponde às suas expectativas, que as

cobranças da escola conduzem ao fazer inócuo, falso, está na fala de muitos

“professauros” que povoam nossas escolas. Porque não se perguntar: O que

posso fazer para melhorar esse quadro tão criticado por mim? Porque não

refletir sobre suas aulas: Conheço meus alunos? Será que minha metodologia

é adequada/ Estou sendo claro em minhas explicações? Meus alunos estão

conseguindo acompanhar meu raciocínio? São muitas as perguntas a serem

feitas quando se tem consciência de sua responsabilidade, quando se é um

professor compromissado, que gosta de ensinar e consegue perceber que não

existe ensino se não houver aprendizagem.

Nas entrevistas com alunos do ensino noturno abordaram-se aspectos

referentes à aprendizagem, às qualidades de um bom professor, ao lado

afetivo do relacionamento professor-aluno, à responsabilidade e ao papel do

aluno. Foram realizadas 28 entrevistas e os resultados demonstraram que

muitos de nossos alunos são conscientes de suas obrigações, de que

conseguem perceber que uma grande parte da culpa pelo fracasso na escola

cabe a eles mesmos: “Como todo professor tem suas obrigações, o aluno deve

ter também, como fazer tarefas, cumprir seus compromissos na data certa, ser

educado e tratar o professor com respeito” (afirmativa de um aluno).

A primeira questão solicitou que fossem apontados três fatores que

prejudicam a aprendizagem, as respostas foram bastante diversificadas, sendo

que das sete razões citadas, cinco referem-se ao trabalho realizado pelo

professor e três ao comportamento dos alunos.

Fatores que mais prejudicam a aprendizagem na visão dos alunos

11%4%

31%

25%

7%

11%11%

Indisciplina

Faltas

Desinteresse

Monotonia das aulas

Relacionamento doprofessor com os alunosConversas paralelas

Professor desanimado

A segunda questão perguntou se gostar ou não do professor interfere na

aprendizagem, a maior parte dos alunos respondeu sim, ficando evidente a

importância do aspecto afetivo, portanto desenvolver uma relação amistosa em

sala de aula cria condições favoráveis ao processo ensino-aprendizagem.

Gostar ou não do professor interfere na aprendizagem

Sim82%

Não18%

Os alunos entrevistados também apontaram qualidades que apreciam

em seus professores, entre elas foi possível destacar paciência, respeito ao

aluno, dedicação, bom humor, ser exigente, explicar bem, ser dinâmico, ser

dedicado, criatividade e estar bem atualizado.

Foi indagado sobre o que não gostam em seu professores e as

respostas foram: mau humor, insegurança, não impor limites, não exigir, não

dar atividades para fixação, arrogância, “enrolador”, cobrar o que não ensinou

faltoso e falar rápido demais.

Os entrevistados também afirmaram que o melhor professor não é

aquele que “passa a mão na cabeça do aluno”, ou seja, o professor “bonzinho”.

O bom professor é o que ensina bem e depois cobra, exige do aluno.

A última questão pergunta se o aluno também é culpado por não

aprender, todos responderam sim, porque não se esforçam ou não prestam

atenção nas aulas.

As respostas obtidas na entrevista demonstram que existe um grau bem

significativo de consciência e conhecimento da realidade que vivenciamos em

nossas escolas. Os professores e os alunos não são indivíduos alienados,

reconhecem seus papéis e suas falhas no contexto escolar, porém isso não é o

suficiente para modificar ou reverter o fracasso escolar, seja pela evasão, seja

pela reprovação ou pela aprovação pelo conselho de classe.

A jornada a percorrer é longa, os obstáculos são muitos, porém

reconhecer que existem possibilidades, que ninguém pode fazer mágica, mas

que mesmo com limitações é possível mudar pelo menos alguns aspectos da

realidade da sala de aula, é um começo, é iniciar a caminhada rumo a uma

educação verdadeiramente democrática.

Estou semeando as sementes da minha mais alta esperança. Não

busco discípulos para comunicar-lhes saberes. Busco discípulos,

para neles plantar minhas esperanças”. (Rubens Alves)4

4 Fonte: GUEDES, Egly. Saboreando a Educação. Caicó – RN, 2009. Disponível em:http://egly-saboreandoaeducao.blogspot.com/2009/09/diante-do-que-foi-exposto-percebe-se.html

REFERÊNCIAS ANASTASIOU, L. das G. Camargo; ALVES, L. Pessate (orgs). Processos de Ensinagem na Universidade. 6ª ed. - Joinville SC: Univille, 2006. 144 p. ANTUNES, Celso. Professores e Professauros: Reflexões sobre a aula e práticas pedagógicas diversas. 2ª Ed. – Petrópolis RJ: Ed. Vozes, 2008. BYINGTON, C. A. Botelho. A Construção Amorosa do Saber: O fundamento e a finalidade da Pedagogia Junguiana. São Paulo: Religare, 2003. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Sales e FRANCO, Francisco Manoel de Mello. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa. 2ª Ed. – Rio de Janeiro, 2004. LIBÂNEO, J. Carlos. Didática. (Coleção Magistério 2º Grau. Série formação de professores). 1ª reinpressão. São Paulo: Cortez, 1991. LUFT, Lya. O sentido da educação. Revista atividades e experiências, nº 1, Curitiba: Positivo, 2008, p.52. SANTOS, Julio César Furtado. Aprendizagem significativa: modalidades de aprendizagem e o papel do professor. 1ª Ed. Porto Alegre: Mediação, 2008. VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Construção do conhecimento em sala de aula. São Paulo: Libertad, 1994 (Cadernos Pedagógicos do Libertad,2).