responsabilidade civil pelo risco: danos causados por veículos de circulação terrestre
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Pesquisa bibliográfica sobre Responsabilidade Civil pelo Risco: Danos Causados por Veículos de Circulação Terrestre, no âmbito da unidade curricular de Trabalho Orientado de Direito Civil, da responsabilidade da Dr.ª Alice Feiteira. 15 valoresTRANSCRIPT
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Universidade Autónoma de LisboaDepartamento de Direito
RESPONSABILIDADE CIVIL PELO RISCO: DANOS CAUSADOS POR VEÍCULOS DE CIRCULAÇÃO TERRESTRE
Trabalho apresentado para a unidade curricular
TRABALHO ORIENTADO DE DIREITO CIVIL.
Nome da aluna: Mónica Isabel Fonseca Sequeira Lima
N.º 20070373, 2.º Ano, Diurno
Docente: Dr.ª Alice Feiteira
LISBOA
2009
2
À minha família.
3
AGRADECIMENTOS
À Doutora Alice Feiteira, pela sua disponibilidade e partilha de conhecimentos.
4
Índice
1. A RESPONSABILIDADE CIVIL..............................................................................7
1.1. Conceito de Responsabilidade Civil....................................................................7
1.2. Evolução Histórica e Tipos de Responsabilidade Civil.....................................8
1.3. Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual......................................9
1.4. A Responsabilidade Civil pelo Risco.................................................................10
2. DANOS CAUSADOS POR VEÍCULOS DE CIRCULAÇÃO TERRESTRE....10
2.1. Pressupostos da Responsabilidade pelo Risco. Pessoas responsáveis............10
2.1.1. Direcção Efectiva do Veículo......................................................................11
2.1.2. Utilização em Interesse Próprio. Responsabilidade do Comitente.........12
2.1.2.1. Responsabilidade Solidária na Comissão...........................................13
2.1.2.2. A Presunção de Culpa do Comissário no art.º 503.º, n.º 3 CC.........14
2.1.2.3. Responsabilidade de Terceiro.............................................................15
2.2. Danos Indemnizáveis..........................................................................................16
2.2.1. Veículo em Circulação................................................................................16
2.2.2. Danos Abrangidos pela Responsabilidade Objectiva...............................16
2.2.3. Danos Não Abrangidos pela Responsabilidade Objectiva.......................17
2.3. Beneficiários da Responsabilidade Objectiva..................................................17
2.3.1. Pessoas e Coisas Transportadas por Virtude de Contrato......................18
2.3.2. Pessoas Transportadas Gratuitamente......................................................19
2.3.3. Terceiros.......................................................................................................19
2.4. Pluralidade de Responsáveis pelo Dano...........................................................20
CONCLUSÃO................................................................................................................22
BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................23
5
INTRODUÇÃO
A responsabilidade relaciona-se com a liberdade, com a racionalidade e com a
capacidade de assumir a autoria de um agir e suas consequências. A responsabilidade
civil é uma fonte das obrigações, mas não se limita a esse ramo do Direito. A
Responsabilidade Civil pelo Risco (ou objectiva) destina-se a obrigar certa pessoa a
reparar danos causados a outrem, sem que seja necessário um juízo de censura. A
finalidade deste trabalho é especificar quem são os responsáveis pelos danos causados
pela utilização em interesse próprio de veículos de circulação terrestre, que danos e
beneficiários serão abrangidos pela responsabilidade pelo risco.
De uma maneira geral, procurou-se definir os conceitos de responsabilidade civil
contratual e extracontratual, assim como o conceito de responsabilidade pelo risco, e
descrever sumariamente a evolução histórica da responsabilidade civil. Analisou-se um
dos modelos de responsabilidade objectiva, nomeadamente os danos causados por
veículos de circulação terrestre, e mais precisamente no que diz respeito aos seus
pressupostos, pessoas responsáveis, beneficiários e danos indemnizáveis.
Foi utilizado o método histórico para enquadrar historicamente o conceito de
responsabilidade civil. Para a necessária fundamentação conceptual e teórica sobre as
questões relacionadas com os danos causados por veículos de circulação terrestre
utilizou-se a Pesquisa Bibliográfica (essencialmente livros) e a Pesquisa Documental
(nomeadamente legislação e jurisprudência).
Este trabalho encontra-se dividido em, essencialmente, duas partes. A primeira parte
descreve a Responsabilidade Civil e a segunda parte é dedicada aos Danos Causados
por Veículos de Circulação Terrestre. Na primeira parte fala-se do Conceito de
Responsabilidade Civil, da sua Evolução Histórica e Tipos de Responsabilidade Civil,
da Responsabilidade Civil contratual e Extracontratual, e da Responsabilidade Civil
pelo Risco. A segunda parte divide-se em Pressupostos da Responsabilidade pelo Risco
e Pessoas Responsáveis (direcção efectiva do veículo, utilização em interesse próprio,
responsabilidade do comitente), Danos Indemnizáveis (veículo em circulação, danos
abrangidos pela responsabilidade objectiva e danos não abrangidos pela
responsabilidade objectiva), Beneficiários da responsabilidade Objectiva (pessoas e
coisas transportadas por virtude de contrato, pessoas transportadas gratuitamente,
terceiros) e Pluralidade de Responsáveis pelo Dano.
6
1. A RESPONSABILIDADE CIVIL
1.1. Conceito de Responsabilidade Civil
O conjunto das normas jurídicas civis é ordenado formal e materialmente. Além da
sistematização do Código Civil pelo modelo germânico, existem princípios
fundamentais que alicerçam e norteiam o nosso direito civil.1 Um desses princípios é o
da responsabilidade civil.
Segundo Carvalho Fernandes,2 o comportamento jurídico das pessoas pode afectar e
causar dano nos interesses de outrem e, quando tal sucede, quem causa o dano deve
repará-lo. A responsabilidade civil é, portanto, essa obrigação legal em que o
responsável deve compensar patrimonialmente o mal que a vítima sofreu,
independentemente da vontade das partes.3 Neves Pereira define a responsabilidade civil
como uma fonte de obrigações que consiste no «dever resultante de facto humano que
tenha provocado dano (prejuízo) a um titular de direito ou interesse, de natureza
jurídico-privada, legalmente tutelado».4
A responsabilidade civil distancia-se da responsabilidade moral e ainda da
responsabilidade criminal ou penal, embora a responsabilidade civil possa ser conexa
com a criminal. A responsabilidade moral não é jurídica e pertence, segundo Almeida
Costa,5 ao domínio da consciência, não havendo necessariamente uma exteriorização de
comportamento. Quanto à segunda distinção, recordemos que a responsabilidade civil é
direito civil, direito privado, enquanto que a responsabilidade penal é do âmbito do
direito penal, direito público. Entre os ilícitos civil e penal há diferenças formais e
materiais, sobretudo no que toca à natureza das suas sanções. Veremos, no ponto
seguinte, que nem sempre foi assim.
Na responsabilidade civil procura-se reparar patrimonialmente um dano privado,
importa restituir os interesses lesados. Na responsabilidade criminal foi ofendido um
dever jurídico que é do interesse da colectividade, sendo que as suas sanções procuram
1 Cf. MOTA PINTO, Carlos Alberto da – Teoria Geral do Direito Civil. 4.ª ed. actual. Coimbra: Coimbra
Editora, 2005. p. 952 Cf. CARVALHO FERNANDES, Luís A. – Teoria Geral do Direito Civil: Introdução. Pressupostos da
Relação Jurídica. 3ªed. rev. e actual. Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, 2001. Vol. 1. p. 88.3 Cf. ALMEIDA COSTA, Mário Júlio – Noções de Direito Civil. Coimbra: Almedina, 1980.4 NEVES PEREIRA, Manuel de Sousa Domingues das – Introdução ao Direito e às Obrigações. 2.ª ed.
Coimbra, Almedina, 2001. p. 260.5 Ibidem, p. 70.
7
defender a sociedade: procura-se prevenir (ao intimidar e reeducar o delinquente) e
retribuir (ao expiar o delinquente da sua culpa) através de penas e medidas de
segurança.6
1.2. Evolução Histórica e Tipos de Responsabilidade Civil
Almeida Costa7 descreve-nos a evolução da responsabilidade civil: tempos houve em
que era reconhecido à vítima um direito de vingança através do qual se reparava o dano
e se punia o seu causador, estabelencendo-se um nexo de causalidade entre o
comportamento do agente e o dano, sem atentar à sua intenção. Mais tarde tornou-se
possível indemnizar pecuniariamente a vítima, em lugar de sofrer a sua vingança, o que
já denunciava uma certa intervenção dos poderes públicos, tendo inclusivamente fixado
limites para essas sanções pecuniárias, entre outras medidas. Paulatinamente assistiu-se
à separação da responsabilidade civil da responsabilidade penal e, com a Lei das XII
Tábuas, a vítima era frequentemente forçada a aceitar a compensação pecuniária e abrir
mão do seu direito de vingança. Posteriormente surgiram discussões doutrinais que se
debruçavam sobre a análise psicológica da culpa.
Nos tempos modernos, a concepção clássica de responsabilidade civil, fundada na ideia
de que o homem, enquanto ser livre, é responsável pelos seus actos, baseia-se sobretudo
na culpa, isto é, numa imputação psicológica de um facto ao seu autor. O agente
responde por cometer um facto intencional ou por negligência, por falta de diligência
para evitar tal acto (culpa stricto sensu). Assim, de acordo com Carvalho Fernandes,8 a
responsabilidade dizia-se subjectiva. Posteriormente, segundo este autor, surgiram, além
da responsabilidade subjectiva, novas modalidades de responsabilidade independente da
culpa – responsabilidade objectiva ou responsabilidade pelo risco – e em casos
excepcionais, de responsabilidade independente da ilicitude – responsabilidade por
intervenções lícitas. Mais recentemente deu-se uma nova evolução quanto à cobertura
do dano: como repará-lo quando é impossível apurar o responsável ou quando este não
tenha condições materiais para tal? Esta questão é relevante quando os danos atingem
valores particularmente elevados (certos acidentes de trabalho, de viação, ou em
instalações industriais, por exemplo). Recorre-se, para obter reparação dos danos, ao
6 Ibidem, p. 70.7 Ibidem, p. 71-72.8 Cf. CARVALHO FERNANDES, op. cit., p. 88-90.
8
Estado ou a um seguro obrigatório (sobretudo nos acidentes de trabalho e de viação) ou
facultativo.
1.3. Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual
A responsabilidade civil tem na sua base várias classificações possíveis, consoante o
autor em questão. Menezes Leitão triparte a responsabilidade civil em responsabilidade
por culpa, pelo risco e pelo sacrifício9
A Responsabilidade Contratual ou Obrigacional (ou ainda negocial) resulta da violação
de um direito de crédito ou de uma relação obrigacional existente entre o causador do
dano e da vítima.10 Podem surgir também de negócios jurídicos unilaterais ou da lei.11
A Responsabilidade Extracontratual ou Extra-obrigacional consiste na infracção de um
dever jurídico geral (obrigação em sentido amplo), ou seja, de um dever geral de
conduta imposto a todos os indivíduos e que corresponde aos direitos absolutos.12
Dentro da Responsabilidade Civil Extracontratual existem dois tipos:
A – Responsabilidade subjectiva ou por culpa (art. 483.º, n.º 1 Código Civil) – que
implica um juízo de reprovação pessoal da conduta do agente. Assenta num nexo entre a
vontade do autor e o facto. Pressupõe a existência de um facto voluntário do agente, a
prática de um facto ilícito, a imputação do facto ao lesante, um dano e um nexo entre o
dano e o facto.13 Tem funções de reparação do dano, de prevenção e punição de
condutas.14
B – Responsabilidade objectiva ou pelo risco (art. 499.º e seguintes Código Civil) –
implica a prática de um facto lícito (colocar o veículo em circulação), facto esse que cria
ou mantém um risco. A prática desse facto cria um proveito próprio ao agente. Como
tal, este deve arcar com as consequências que daí advenham, já que delas colhe
benefício.15
9 Cf. MENEZES LEITÃO, Luís Manuel Teles de – Direito das Obrigações: Introdução, Da Constituição
das Obrigações. 7.ª ed. Coimbra: Almedina, 2008. Vol. 1. p. 285-286.10 Cf. ALMEIDA COSTA, op. cit., p. 75-76.11 Cf. ALMEIDA COSTA, Mário Júlio de, 1999 – Direito das Obrigações. 6.ª ed. Coimbra: Almedina,
1994.12 Cf. ALMEIDA COSTA, Noções... , p. 76.13 CLARA LOPES, Maria – Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel. Lisboa: INCM,
1987. p. 22.14 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 285-286.15 Cf. CLARA LOPES, op. cit., p. 23.
9
1.4. A Responsabilidade Civil pelo Risco
A Responsabilidade Civil pelo Risco ou Objectiva é independente de culpa. Vimos já
que se destina a obrigar certa pessoa a reparar danos causados a outrem, sem que seja
necessário ou relevante qualquer juízo de censura. O Código Civil (CC) responsabiliza
quem provocar danos na esfera jurídica de terceiro e exige a demonstração da sua culpa.
Alberto González16 considera tal justo devido ao carácter penalizador, do ponto de vista
patrimonial, da responsabilidade objectiva, para o lesante – daí a necessidade de impôr
limites máximos ao montante indemnizatório devido (art. 508.º e 510.º CC).
O autor da conduta que leva ao surgimento de danos na esfera de outrem desenvolve
uma acção/omissão lícita e não culposa, socialmente admissível e vantajosa para aquele.
Assim, «só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos
especificados na lei», nos termos do n.º 2 do art. 483.º CC. Um dos modelos de
responsabilidade objectiva refere-se aos danos causados por veículos de circulação
terrestre, sobre o qual nos iremos debruçar.17
Há que acrescentar que, embora esta responsabilidade seja independente de culpa,
alguns autores referem-se-lhe como objectiva para a subdividir em responsabilidade
pelo risco e por factos lícitos/pelo sacrifício, classificação diferente da de Menezes
Cordeiro.18 Não há portanto completa concordância quanto à classificação da
responsabilidade civil e da responsabilidade pelo risco na doutrina.
2. DANOS CAUSADOS POR VEÍCULOS DE CIRCULAÇÃO TERRESTRE
2.1. Pressupostos da Responsabilidade pelo Risco. Pessoas responsáveis.
Verifica-se, a propósito do n.º 1 do art. 503.º CC, a existência da responsabilidade
objectiva do utilizador de um veículo, limitado aos riscos próprios do dito veículo, e que
a lei obriga que seja previamente garantida por um seguro de responsabilidade civil
automóvel, sem o qual este não pode circular. Segundo Menezes Leitão19, tal obrigação
de seguro (nos termos do DL n.º 291/2007 de 21 de Agosto) recai sobre o proprietário,
usufrutuário, locatário financeiro ou adquirente sob reserva de propriedade do veículo
16 Cf. ALBERTO GONZÁLEZ, José – Responsabilidade Civil. Lisboa: Quid Juris, 2007. p. 24-25.17 Ibidem, op. cit., p. 25-26.18 Que divide a Responsabilidade objectiva em Responsabilidade por factos lícitos/pelo sacrifício e
responsabilidade pelo risco. Cf. MENEZES CORDEIRO, António – Direito das Obrigações. Lisboa:
Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1994. Vol. 2.19 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 375-376.
10
em questão. Os veículos abrangidos, de acordo com o memo autor, incluem os que
circulam nas vias rodoviárias e ferroviárias (art. 508.º, n.º 3 CC), nomeadamente:
automóveis, bicicletas, carros eléctricos, motocicletas, comboios e carruagens de
metropolitano.
Será sobre a pessoa que tiver a direcção efectiva do veículo de circulação terrestre e o
usar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, que recairá a
responsabilidade pelo risco. Esta responderá pelos danos daí provenientes, nos termos
do n.º 1 do art. 503.º CC.
2.1.1. Direcção Efectiva do Veículo
Segundo Clara Lopes, ter a direcção efectiva do veículo «consiste no poder real de
disposição do veículo, abrangendo todos os casos em que, com ou sem domínio
jurídico, as pessoas a quem especialmente incumbe, pela situação de facto em que se
encontram investidas, tomar as providências necessárias para que o veículo funcione
sem causar danos a terceiros.»20 É, portanto, exercer um poder de facto ou controle
sobre o veículo.21 Para Antunes Varela, 22 tal não equivale à ideia de ter o volante nas
mãos aquando da ocorrência do acidente. Tem a direcção efectiva quem, de facto, goza
ou usufrui das vantagens do veículo, e a quem «cabe controlar o seu funcionamento»: a
essa pessoa chamamos de detentor.
Em regra, o responsável (a pessoa que responderia pelos danos) seria o proprietário da
viatura, pois aproveita as suas vantagens, devendo arcar com os riscos da sua utilização.
Mas, como lembra Menezes Leitão,23 o proprietário não é o único detentor legítimo do
veículo, sendo de admitir um hipotético usufrutuário, locatário, comodatário ou
adquirente com reserva de propriedade; ou ainda um detentor ilegítimo, como um ladrão
que furta ou rouba a viatura. Desta forma, a titularidade do direito sobre o veículo (ou
legitimação jurídica), isto é, o seu domínio jurídico não é exclusivamente decisiva para
fundamentar a responsabilidade objectiva.24
Assim, exclui-se o passageiro de um táxi, o instruendo de uma aula de condução e o
proprietário, locatário, comodatário ou usufrutuário a quem o veículo foi furtado ou
20 CLARA LOPES, op. cit., p. 24-25.21 Cf. MENEZES LEITÃO, op.cit., p.22 Cf. ANTUNES VARELA, João de Matos – Direito das Obrigações. 9.ª ed. Coimbra: Almedina, 1996.
p. 679, 681.23 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 375-376.24 Cf. ALMEIDA COSTA, Direito..., p. 527-528.
11
roubado, de responder objectivamente, pois não possuem a sua direcção efectiva,
segundo o art. 503.º, n.º 1 CC. Para Menezes Leitão,25 estas pessoas não são imputáveis,
pois não estão em condições de exercer um poder de facto sobre o veículo, e
responderão, por motivos de equidade, e caso o detentor não possa reparar os danos
causados, nos termos do n.º 1 do art. 489.º CC.
2.1.2. Utilização em Interesse Próprio. Responsabilidade do Comitente.
O interesse da pessoa que utiliza a viatura pode ter natureza patrimonial ou não
patrimonial, sendo um interesse próprio, não necessariamente exclusivo, sendo
irrelevante, como veremos, a sua licitude ou ilicitude.26
Este requisito, plasmado no art. 503.º, n.º 1 CC, afasta a responsabilidade objectiva dos
comissários, que conduzem a viatura por conta de outrem, isto é, em proveito ou às
ordens de outra pessoa (comitente).27 O detentor/comitente, dispondo do poder real
sobre o veículo, utiliza-o através de um intermediário, isto é, do comissário/condutor,
«que lhe realiza um serviço ou presta uma actividade sob a sua direcção e segundo as
instruções dele»; falando-se assim de comissão. Nela existe um vínculo, uma relação de
dependência ou subordinação entre comissário e comitente, e consiste na realização de
uma actividade ou serviço por conta e ordem de outrem, independentemente de ser um
acto isolado (um recado) ou uma relação duradoura (motorista profissional).28 Assim,
são requisitos da responsabilidade do comitente: a existência dessa comissão, que se
caracteriza pela relação já referida, e que permite ao comitente dar instruções ou ordens
ao comissário; e que um facto danoso tenha sido cometido pelo comissário ao exercer a
função que lhe fora confiada. O detentor é responsável solidariamente pelos danos
causados pelo condutor se se provarem factos que tipifiquem uma relação de comissão,
conforme o art. 500.º, n.º 1 CC.29
Para que o comitente responda pelas omissões ou actos do comissário, é fundamental a
prática de um acto danoso, mesmo que intencionalmente ou contra as instruções do
comitente, no exercício da função confiada ao comissário. Existe exercício de função
25 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 376.26 Cf. ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 528.27 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 681.28 CLARA LOPES, op. cit., p. 25.29 Cf. NETO, Abílio, anot. – Código Civil Anotado. 14.ª ed. actual. Lisboa: Ediforum, 2004. p. 595 (§1),
p. 596 (§6).
12
sempre que o comissário aja «dentro do quadro geral da função a ele cometida e ainda
que aí se afaste das instruções do comitente ou proceda intencionalmente.» 30
2.1.2.1. Responsabilidade Solidária na Comissão.
Assim, não se deve pensar que o detentor do veículo apenas responde se, no momento
da ocorrência do facto danoso, a viatura estiver a ser utilizada pelo comissário no
interesse (imediato ou exclusivo) do detentor, ou seja, por um mero uso material da
mesma.31 Para Clara Lopes,32 a utilização em interesse próprio consiste também no uso
económico ou moral da viatura em seu proveito. Antunes Varela33 fala igualmente de
uma utilização com interesses reprováveis, por exemplo, o proprietário que empresta o
veículo para um fim imoral ou ilícito.
Embora, segundo Antunes Varela,34 a responsabilidade objectiva recaia sobre o
condutor, o proprietário também será responsabilizado (Assentos STJ de 14/4/1983,35
26/1/1994, 2/3/1994). Porém, o condutor não responderá se provar que não houve culpa
da sua parte. Caso se prove a culpa do condutor, ou se este não conseguir ilidir a
presunção legal, o condutor e o detentor/proprietário da viatura responderão
solidariamente perante o terceiro lesado. Nos termos do art. 500.º, n.º3 CC, caso seja o
detentor/comitente do veículo a pagar a indemnização, terá direito de regresso contra o
condutor/comissário.
2.1.2.2. A Presunção de Culpa do Comissário no art.º 503.º, n.º 3 CC.
O art. 503.º, n.º 3 CC admite duas hipóteses: A) presume-se a culpa do comissário; B)
conduziu o veículo fora do exercício das suas funções de comissário, e como tal aplica-
se o art. 503.º, n.º 1 CC.
Hipótese A) Há uma verdadeira presunção de culpa, prevista no art. 487.º, n .º 1 CC,
aplicável à relação entre o lesado e o condutor/comissário da viatura. A
responsabilidade pelo risco, neste caso, não se limita apenas à responsabilidade
30 Ibidem, p. 596 (§5).31 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 681-682.32 Cf. CLARA LOPES, op. cit., p. 25.33 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 682.34 Ibidem, p. 682.35 Assento Supremo Tribunal de Justiça (STJ) n.º 1/83, publicado no Diário da República N.º 146/83,
Série I, 1.º Suplemento, de 28-06-1983, p. 2328(1)-2328(4).
13
objectiva do dono e à responsabilidade existente entre o comitente/dono e o
comissário/condutor – abrange igualmente a relação lesado-condutor. Há aqui uma clara
inversão do ónus da prova relativa à culpa, em desfavor do condutor. O mesmo não
sucede se a viatura for conduzida pelo próprio dono: aí, a prova da culpa incumbirá ao
lesado, que requer a indemnização.36
O Assento STJ de 26/1/199437 refere que a culpa presumida do comissário se aplica no
caso da colisão de veículos, previsto no art. 506.º, n.º 1 CC.
O Assento STJ de 2/3/1994 determinou que «a responsabilidade por culpa presumida do
comissário, nos termos do art. 503.º, n.º 3 CC, não tem os limites fixados no n.º 1 do art.
508.º CC». 38
Poderia pensar-se que a inversão do ónus da prova é injusta, mas há que ter em conta
que os comissários são, na sua maioria, motoristas profissionais, pessoas das quais
justificadamente se exige perícia especial no exercício da condução e que podem com
maior facilidade elidir a presunção legal de culpa, caso não exista, da sua parte, aquando
da ocorrência do acidente.39
Hipótese B) Segundo Antunes Varela,40 o condutor por conta própria não é afectado
pela presunção de culpa do art. 503.º, n.º3 CC, aplicando-se a responsabilidade
objectiva nos termos do art. 503.º, n.º 1 e 505.º CC, e respeitando os limites máximos de
indemnização fixados no art. 508.º CC para a responsabilidade sem culpa. Por outro
lado, segundo Antunes Varela,41 não se lhe aplica, perante o lesado, tal como o
comissário, qualquer responsabilidade solidária do comitente, cujo direito de regresso
será, na maioria das vezes, incobrável.
36 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 682-683, 685.37 Assento STJ n.º 3/94, publicado no Diário da República (D.R.) n.º 66/94, Série I-A, de 19-03-1994, p.
1399-1402. Corrigido pela Rectificação n.º 8/94, publicado no D.R. n.º 95/94, Série I-A, de 23-04-1994,
p. 1983. Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 684.38 Assento STJ n.º 7/94, publicado no D.R. n.º 98/94, Série I-A, de 28-04-1994, p. 2061-2064. Cf.
ANTUNES VARELA, op. cit., p. 684-685.39 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 383. No mesmo sentido: ANTUNES VARELA, op. cit., p. 685-
686.40 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 686.41 Ibidem, p. 686.
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Nas situações em que se prove a culpa do condutor no acidente, o detentor ou utente
pode ser chamado a responder como detentor do veículo e criador do risco intrínseco à
sua utilização (aplicando-se-lhe os limites de responsabilidade fixados no art. 508.º CC)
ou como comitente, cobrindo assim (toda) a obrigação de indemnizar por parte do
comissário (sem limites pré determinados).42
O condutor responde independentemente de culpa (art. 503.º, n.º 1 CC), se o acidente
ocorrer no momento em que o comissário usava o veículo contra a vontade do detentor
ou sem ela, isto é, fora das suas funções, ainda que habitualmente o conduza por conta
de outrem como comissário (art. 503.º, n.º 3 CC, in fine).43
2.1.2.3. Responsabilidade de Terceiro
Quando o veículo é conduzido, ocasionalmente, por terceiro, será também o detentor
responsabilizado? Se a viatura é utilizada contra ou sem a vontade do detentor, por uso
abusivo da mesma, na opinião de Antunes Varela44 não há fundamento para
responsabilizar o detentor, da mesma forma que se afastou a responsabilidade do
proprietário ou utente do veículos para quem tiver a direcção efectiva do veículo (art.
503.º, n.º 1 CC). Contudo, a situação é diferente se a viatura foi utilizada com
autorização do detentor, caso de aluguer ou empréstimo. No primeiro caso, a viatura é
usada no interesse do locatário e do locador; ambos têm a sua direcção efectiva e
respondem solidariamente pelo dano. No caso de comodato, a responsabilidade recai
sobre comodante e comodatário (a não ser que o comodatário esteja encarregado de
zelar pela conservação e bom funcionamento do veículo, sendo que nesse caso a
responsabilidade será do comodatário).45
2.2. Danos Indemnizáveis
«Os danos que a pessoa responsável é obrigada a indemnizar são os que tiverem como
causa (jurídica) o acidente provocado pelo veículo.»46 Não caberá aqui uma análise do
nexo de causalidade entre o facto e o dano como pressuposto da responsabilidade civil,
sendo a análise seguinte direccionada para os danos causados por veículos.
42 Acórdão STJ de 13-I-1970 apud ANTUNES VARELA, op. cit., p. 686, 687.43 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 687.44 Ibidem, p. 687.45 Ibidem, p. 688.46 Ibidem, p. 690.
15
O n.º1 do art. 503.º CC consagra uma norma especial que inclui não só os danos
resultantes dos acidentes causados pelo veículo em circulação (destruição ou
danificação de coisas, colisão com outro veículo, atropelamento de pessoas), mas
também os provocados pelo veículo estacionado (colisão provocada por viatura
estacionada em lugar indevido ou parada fora de mão sem a sinalização devida, por
porta de viatura que ficou aberta indevidamente, acidente provocado por explosão do
depósito de gasolina ou por veículo que se destravou).
2.2.1. Veículo em Circulação
Não importa se a via onde ele circula é pública, isto é, aberta ao trânsito em geral,
privada, destinada à circulação de viaturas dos habitantes de um imóvel ou de uma
empresa, ou se circula fora de qualquer via.47
2.2.2. Danos Abrangidos pela Responsabilidade Objectiva
Segundo Almeida48, considera-se risco próprio do veículo «tudo o que se relacione com
a máquina enquanto engrenagem de complicado comportamento, com os seus vícios de
construção, com os excessos ou desequilíbrios da carga do veículo, com o seu maior ou
menor peso ou sobrelotação, com a sua maior ou menor capacidade de andamento, com
o maior ou menor desgaste das suas peças, ou seja, com a sua conservação, com a
escassez de iluminação, com as vibrações inerentes ao andamento de certos camiões
gigantes, susceptíveis de abalar os edifícios ou quebrar os vidros das janelas. É o pneu
que pode rebentar, o motor que pode explodir, a manga de eixo ou a barra da direcção
que podem partir, a abertura imprevista de uma porta em andamento, a falta súbita de
travões ou a sua desafinação, a pedra ou gravilha ocasionalmente projectadas pela roda
do veículo...». Cabe ainda dentro do art. 503.º, n.º 1 CC os acidentes provenientes da
máquina de transporte e os ligados ao condutor: o risco de síncope, colapso cardíaco,
congestão ou outra doença súbita.49
2.2.3. Danos Não Abrangidos pela Responsabilidade Objectiva
Os danos não abrangidos pela responsabilidade objectiva são aqueles que não têm
ligação com os riscos específicos da viatura; «os que são estranhos aos meios de
circulação ou transporte terrestre, como tais; os que foram causados pelo veículo como
47 Ibidem, p. 691.48 Cf. ALMEIDA, Dario M. apud ANTUNES VARELA, op. cit., p. 692.49 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 692. No mesmo sentido: ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 541.
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poedriam ter sido provocados por qualquer outra coisa móvel: é o caso de alguém
tropeçar no veículo recolhido na garagem e se ferir nele, como poderia ter-se ferido em
qualquer outro objecto aí arrumado, ou de alguém ter entalado a mão própria ou de
outrem ao fechar a porta do automóvel, ou de o condutor ter agredido outrem com a
manivela do veículo, como poderia tê-lo feito com qualquer outro instrumento
contundente.»50 São, portanto, danos relacionados com riscos estranhos ao veículo, e
que poderão ser indemnizados no âmbito da responsabilidade por factos ilícitos, se se
reunirem os requisitos necessários. 51
2.3. Beneficiários da Responsabilidade Objectiva
Entre os beneficiários, e nos termpos do art. 504.º, n.º 1 CC, figuram os terceiros,
pessoas que, encontrando-se fora da viatura, são lesadas na sua saúde, vida ou
integridade física, as pessoas transportadas na viatura por virtude de um contrato de
transporte, quanto aos danos causados nas coisas com ela transportadas e na sua pessoa,
e das pessoas transportadas gratuitamente, apenas quanto aos danos causados na sua
própria pessoa.52
Menezes Leitão distingue apenas, entre os beneficiários, terceiros e pessoas
transportadas, incluindo entre as últimas, como exemplo, o maquinista, motorista,
cobrador de bilhetes, assistente de viagem.53
2.3.1. Pessoas e Coisas Transportadas por Virtude de Contrato
Às pessoas e coisas nessa situação aplica-se o regime de responsabilidade do contrato
de transporte e da responsabilidade fundada na culpa, em caso de violação ilícita dos
seus interesses ou direitos,54 e que não iremos aprofundar aqui. Debrucemo-nos então
sobre as regras da responsabilidade objectiva aplicáveis a estes casos.
Para Antunes Varela55, ao utilizar um veículo para transportar pessoas ou coisas
mediante um contrato, verifica-se a existência de duas situações de risco:
A) O risco corre para quem explora ou usa o veículo, para seu próprio interesse, no
transporte de pessoas, mercadorias ou coisas, isto é, o transportador, que retira maiores
50 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 693.51 Cf. ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 542.52 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 693, 694.53 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 378.54 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 694.55 Ibidem, p. 694.
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vantagens da actividade do veículo, e que responde objectivamente pelos danos
causados à pessoa e coisas por ela transportadas.
B) Existe risco para quem usa os veículos para se transportar.
Este regime aplica-se aquando da existência de um contrato de transporte autónomo e
também se este ocorrer devido a cláusula incluída noutro contrato (de trabalho ou de
prestação de serviços, por exemplo).56
De acordo com Menezes Leitão,57 a responsabilidade apenas inclui «os danos que
atinjam a própria pessoa e as coisas por ela transportadas (art. 504.º, n.º 2), sendo por
isso excluídos da responsabilidade objectiva os danos em coisas não transportadas com
a pessoa e os danos reflexos sofridos pelas pessoas referidas nos arts. 495.º, n.ºs 2 e 3, e
496.º, n.º 2» CC, que tenham sofrido danos patrimoniais ou não patrimoniais. Para
Almeida Costa, «estas só têm um direito autónomo a indemnização, desde que exista
culpa do condutor.»58
A lei refere no n.º 4 do art. 504.º CC que «são nulas as cláusulas que excluam ou
limitem a responsabilidade do transportador pelos acidentes que atinjam a pessoa
transportada»,59 o que, segundo Menezes Leitão, sugere que no contrato de transporte as
partes podem excluir ou limitar a responsabilidade do transportador pelos danos que
atingem as coisas que são transportadas.60 Ao estatuir a nulidade das cláusulas que
afastem ou limitem a responsabilidade quanto às pessoas transportadas, este normativo
visa proteger a integridade física e vida destas, e evitar que o transportador negligencie
o cumprimento dos seus deveres de cuidado e diligência para com elas.61
2.3.2. Pessoas Transportadas Gratuitamente
Quando à prestação do transportador não corresponder uma contraprestação, o
transporte diz-se gratuito, independentemente dos interesses do transportador,62 ou,
segundo Almeida Costa,63 sendo de natureza contratual ou de mera cortesia ou
benevolência.
56 Ibidem, p. 695.57 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 378-379.58 Cf. ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 533.59 Código Civil. 7.ª ed. Coimbra: Almedina, 2007. p. 105.60 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 379.61 Cf. ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 534.62 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 696.63 Cf. ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 534.
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Para Almeida Costa,64 nesta hipótese cessa a responsabilidade objectiva e o
transportador responde apenas se tiver culpa (art. 504.º, n.º 2 CC), isto é, aplica-se o
regime da responsabilidade por factos ilícitos, cabendo ao lesado o ónus da prova de
culpa do autor da lesão, sendo a culpa apreciada em abstracto (art. 487.º, n.ºs 1 e 2 CC).
Segundo o n.º3 do art. 504.º CC, «no caso de transporte gratuito, a responsabilidade
abrange apenas os danos pessoais da pessoa transportada», excluindo-se assim os danos
nas coisas transportadas com a pessoa, não se pondo em causa a validade das cláusulas
que excluam ou restrinjam a responsabilidade relativamente às coisas transportadas.65
2.3.3. Terceiros
O conceito de terceiros (art. 504.º, n.º 1 CC), afectados nas suas pessoas ou bens pelo
acidente, abrange não só os que se encontravam fora da viatura, mas também «as
pessoas ocupadas na actividade do veículo (ex: motorista, maquinista, cobrador ou
fiscal de transportes colectivos), sempre que o acidente se relacione com os riscos que
são próprios daquele», e tendo em conta que estes terceiros possuem um contrato de
trabalho com uma entidade transportadora, o que se irá reflectir na responsabilidade
objectiva.66
2.4. Pluralidade de Responsáveis pelo Dano
Pode acontecer que várias pessoas possam ser responsáveis pelos danos que os lesados
sofreram, podendo haver, ou não, culpa. Vejamos um exemplo: D conduz um veículo
por conta de F (comitente) e atropela G culposamente. Segundo Antunes Varela,67 o
dono do veículo (art. 503.º n.º1 CC) e o condutor (art. 503.º n.º3 CC) respondem
simultaneamente pelos danos causados à vítima (ferimentos, morte, impossibilidade de
trabalhar, etc.). Se não houve culpa do condutor, serão os detentores do veículo os
responsáveis, senão se verificar qualquer causa de exclusão da responsabilidade.
Se os danos forem causados em terceiro (lesado) por uma colisão de dois veículos,
ambos os detentores dos veículos são responsáveis, independentemente da culpa do
condutor, desde que no caso de não existir culpa do condutor se verifiquem os
pressupostos da responsabilidade objectiva, conforme o art. 507.º CC. Perante terceiros
64 Ibidem, p. 534.65 Ibidem, p. 535.66 Ibidem, p. 532-533.67 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 720.
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ou pessoas transportadas, os vários responsáveis respondem solidariamente face ao
lesado (art. 507, n.º 1 CC).68
Se apenas um dos responsáveis (por exemplo, o condutor) teve culpa no acidente
(produzindo-se concorrência entre culpa e risco, conforme o art. 507.º, n.º 1 CC), será
este a responder, e o responsável que pagou a indemnização ao lesado terá direito de
regresso contra ele pela totalidade (art. 507.º, n.º 2 e 497.º, n.º 2 CC). Se o culpado tiver
pago a indemnização, o outro responsável não terá direito de regresso contra ele.69
Se não houver culpa dos responsáveis, ou seja, se existe apenas concorrência de riscos,
a obrigação de indemnizar fundar-se-á na responsabilidade objectiva e repartir-se-á a
indemnização de acordo com o proveito ou vantagens que cada responsável tira do
veículo. Este critério vale não só no caso dos danos terem resultado de uma viatura
usada por várias pessoas, mas também no caso de serem causados por mais de um
veículo (art. 507.º, n.º 2, 1.ª parte CC).70 Em caso de dúvida, considera-se que o
interesse de cada um dos responsáveis no uso do veículo é igual, nos termos do art.
506.º, n.º 2 CC (por analogia).71
68 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 386. No mesmo sentido: ANTUNES VARELA, op. cit., p. 720-1;
ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 545.69 Cf. MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 386. No mesmo sentido: ANTUNES VARELA, op. cit., p. 721;
ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 545.70 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 721-722; & ALMEIDA COSTA, Direito…, p. 545.71 Cf. ANTUNES VARELA, op. cit., p. 722.
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CONCLUSÃO
Poder-se-á afirmar que os objectivos deste trabalho foram alcançados.
Poderia ter-se desenvolvido mais o tema deste trabalho quanto à presunção de
culpa do comissário no artigo 503.º, n.º 3 CC, ao pesquisar mais sobre jurisprudência
recente e posições doutrinárias contrárias. O mesmo se aplica à parte sobre danos
indemnizáveis, que aqui definimos.
Determinaram-se os beneficiários da responsabilidade objectiva, contudo dever-
se-ia ter enriquecido esta secção com jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça.
De uma maneira geral, foram alcançados os objectivos deste trabalho, todavia
teria sido interessante desenvolver, como já dissemos, a problemática da presunção de
culpa do comissário mais profundamente.
LIMA, Mónica Isabel Fonseca Sequeira – Responsabilidade Civil pelo
Risco: Danos Causados por Veículos de Circulação Terrestre. Lisboa:
Universidade Autónoma de Lisboa, 2009. Disponível em WWW:
http://www.scribd.com/doc/16100619/Responsabilidade-Civil-pelo-Risco-
Danos-Causados-por-Veiculos-de-Circulacao-Terrestre.
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