responsabilidade civil. fornecimento de energia elétrica

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T R I B U N A L D E J U S T I Ç A R S JASP Nº 70038803524 2010/CÍVEL 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA RESPONSABILIDADE CIVIL. SUSPENSÃO DO SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SECAGEM DE FUMO. PREJUÍZOS. Responsabilidade objetiva da empresa concessionária de serviço público e responsabilidade solidária da Cooperativa que retransmite a energia elétrica fornecida pela CEEE. Relação de consumo. Perda da qualidade da produção de fumo em vista da interrupção do fornecimento de energia elétrica. Ausência de quebra de nexo causal ao presente feito. Prejuízo demonstrado. Dever de indenizar. Valor da condenação com base em laudo técnico idôneo, suficiente para aferir o quantum dos prejuízos suportados. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. A remuneração do advogado deve atentar à atividade desenvolvida pelo causídico, retribuindo de forma adequada o trabalho do profissional. Atenção às operadoras do § 3º do art. 20 do CPC. Majoração dos honorários fixados em 1º Grau. NEGARAM PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES E PROVERAM O RECURSO ADESIVO. UNÂNIME. APELAÇÃO CÍVEL DÉCIMA CÂMARA CÍVEL Nº 70038803524 COMARCA DE ENCRUZILHADA DO SUL COOPERATIVA SUDESTE DE ELETRIFICACAO RURAL LTDA - COSEL APELANTE/RECORRIDO ADESIVO COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUICAO DE ENERGIA ELETRICA CEEE D APELANTE/RECORRIDO ADESIVO C.V. RECORRENTE ADESIVO/APELADO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos.

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JASP Nº 70038803524 2010/CÍVEL

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RESPONSABILIDADE CIVIL. SUSPENSÃO DO SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SECAGEM DE FUMO. PREJUÍZOS. Responsabilidade objetiva da empresa concessionária de serviço público e responsabilidade solidária da Cooperativa que retransmite a energia elétrica fornecida pela CEEE. Relação de consumo. Perda da qualidade da produção de fumo em vista da interrupção do fornecimento de energia elétrica. Ausência de quebra de nexo causal ao presente feito. Prejuízo demonstrado. Dever de indenizar. Valor da condenação com base em laudo técnico idôneo, suficiente para aferir o quantum dos prejuízos suportados. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. A remuneração do advogado deve atentar à atividade desenvolvida pelo causídico, retribuindo de forma adequada o trabalho do profissional. Atenção às operadoras do § 3º do art. 20 do CPC. Majoração dos honorários fixados em 1º Grau. NEGARAM PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES E PROVERAM O RECURSO ADESIVO. UNÂNIME.

APELAÇÃO CÍVEL

DÉCIMA CÂMARA CÍVEL

Nº 70038803524

COMARCA DE ENCRUZILHADA DO SUL

COOPERATIVA SUDESTE DE ELETRIFICACAO RURAL LTDA - COSEL

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO

COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUICAO DE ENERGIA ELETRICA CEEE D

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO

C.V.

RECORRENTE ADESIVO/APELADO

A CÓR DÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

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Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara

Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento

às Apelações e prover o Recurso Adesivo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os

eminentes Senhores DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ E DES.

TÚLIO DE OLIVEIRA MARTINS.

Porto Alegre, 25 de outubro de 2012.

DES. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA,

Relator.

R E L AT ÓRI O

DES. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA (RELATOR)

C.V. ajuizou(ram) “Ação de Indenização por Danos Materiais”

em face de COOPERATIVA SUDESTE DE ELETRIFICACAO RURAL LTDA

– COSEL e COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUICAO DE ENERGIA

ELETRICA CEEE D, partes qualificadas nos autos.

A princípio, adoto o relatório às fls. 196-7, verbis:

Nos dizeres da inicial, o requerente refere que no dia 10 de fevereiro de 2007, estava realizando a cura de fumo de parte de sua produção em estufa elétrica quando, por volta das 9h30min houve falta de energia elétrica, havendo o desligamento da estufa até às 14h15min, havendo prejuízo na cura dos fumos que estavam sendo processados no momento. Aduz que com a falta de energia elétrica pelo período de 4h45min, os produtos que estavam na estufa murcharam em razão da diminuição da temperatura, havendo perda na qualidade do produto e, consequentemente, prejuízos financeiros. Refere que no momento haviam 100 arroubas de fumo na estufa, esperando obter após a secagem a classe de fumo BO1 e BO2, sendo que após o ocorrido, o fumo desvalorizou-se para as classes TO2, TL3, T3K. Assim, refere que possuiu um prejuízo de R$ 3.200,00 por culpa das requeridas que no dia realizaram reformas na rede sem proceder o correto aviso aos produtores da região que

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utilizam energia elétrica para o processamento de sua produção. Pede a procedência da demanda com a condenação das requeridas ao pagamento de indenização por danos materiais, corrigidos monetariamente. Pede a concessão do benefício da gratuidade judiciária. Junta documentos (fls. 02/15).

O autor comprovou o pagamento das custas processuais a fls. 24.

Citada, a COSEL – Cooperativa Sudeste de Eletrificação Rural apresenta contestação aduzindo que não é responsável pela falta de fornecimento de energia elétrica. Aduz que a inicial refere que o corte de energia ocorreu pela fornecedora CEEE. Alega é somente uma repassadora de energia, que compra a energia e repassa aos seus associados. Pede a improcedência da ação. Junta documentos (fls. 30/59).

Citada, a CEEE-D apresenta contestação postulando a retificação do polo passivo para que faça constar CEEE-D – Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica. No mérito, pede a improcedência da demanda sob o argumento de que o autor não apresenta prova dos argumentos articulados na inicial. Refere que existe previsão legal da ANEEL que autoriza a queda de energia por período de até 17 horas. Alega a inexistência de responsabilidade da CEEE-D pelo dano causado. Pede a improcedência da demanda (fls. 60/105).

Houve réplica (fls. 107/116).

Durante a instrução ouviu-se três testemunhas (fls. 170/173).

Memoriais (fls. 175/182, 183/187 e 188/192).

Deliberando quanto ao mérito, decidiu o(a) Dr(a). Juiz(a) de

Direito:

ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE, o pedido formulado por C.V., na forma do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para condenar os réus COOPERATIVA SUDESTE DE ELETRIFICAÇÃO RURAL LTDA – COSEL e COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – CEEE-D, ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 3.200,00 (três mil e duzentos reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M a contar da data do evento danoso, ou seja, 10/02/2007, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Outrossim, as Rés arcarão com o total das custas processuais e ao pagamento de honorários de advogado ao patrono do Autor, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, forte o que dispõe o artigo 20, §3°, do Código de Processo Civil, tendo por norte o trabalho realizados pelos advogados e natureza da causa.

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COOPERATIVA SUDESTE – COSEL apela. Sustenta que

interrupção no fornecimento de energia elétrica à propriedade do autor foi

responsabilidade da CEEE, atuando a recorrente apenas como repassadora

do serviço. Destaca que o laudo apresentado pelo demandante foi

expressamente impugnado, pelo que incorreta a assertiva da sentença de

não haver requerimento de prova pericial. Aduz que o apelado não

apresentou o fumo para ser examinado, tendo o Juízo singular acolhido

documentos que foram contestados, defendendo a incidência do Estatuto e

do Regimento Interno da Cooperativa ao exame da pretensão deduzida na

inicial, e não apenas o Código de Defesa do Consumidor, pois o associado

se submete às normas do cooperativismo, havendo, no caso, previsão

expressa de que a Cooperativa não se responsabiliza por prejuízos

decorrentes da suspensão do fornecimento de energia elétrica pelo Sistema

Supridor CEEE-D. Anota que o laudo juntado pelo autor não indica a

quantidade e qualidade de fumo atingida pelo episódio descrito na inicial,

restringindo-se a fazer projeção com base na capacidade da estufa. Analisa

a prova coligida ao processo e impugna o valor fixado aos honorários

advocatícios de sucumbência. Requer, ao fim, o provimento da Apelação em

seus termos, para se julgar a ação improcedente.

A CEEE-D igualmente apela. Suscita, em preliminar, carência

de ação por ilegitimidade passiva. No mérito, impugna o laudo acostado pelo

autor para comprovar as alegadas perdas, pois além de o documento ter

sido produzido unilateralmente, a vistoria ocorreu um mês após o fato

descrito na inicial, não havendo pesagem do fumo, qualificação das folhas,

pelo que inexiste prova efetiva dos danos materiais e do evento que lhe teria

dado causa. Assevera que o demandante não se desincumbiu do ônus de

provar os fatos constitutivos do seu direito, conforme lhe impunha o art. 333,

inc. I, do Código de Processo Civil. Menciona inexistir evidências de que o

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autor estava realizando cura de folhas de fumo das Classes BO1 e BO2 e de

que houve perda de qualidade do produto, tampouco comprovação do nexo

de causalidade entre a ação que lhe é atribuída e os danos reclamados.

Postula, ao final, o acolhimento do apelo.

Em contrarrazões, a parte recorrida rebate os argumentos

trazidos nos apelos, pedindo a manutenção da sentença no mérito,

oferecendo, ainda, Recurso Adesivo no qual requer a majoração dos

honorários advocatícios de sucumbência, argumentando não terem sido

observados os parâmetros do art. 20 do Código de Processo Civil,

sublinhado que a condenação deu-se no valor de R$ 3.200,00 (três mil e

duzentos reais), o que resulta em remuneração de R$ 320,00 (trezentos e

vinte reais) ao seu advogado.

Vieram-me os autos conclusos, por redistribuição, oportunidade

em que, através do despacho constante à fl. 247, foi determinado o retorno

dos autos à origem, tendo em vista que o Recurso Adesivo interposto pelo

autor não sofreu juízo de admissibilidade.

Recebido o recurso na origem, intimadas as partes, a

Cooperativa demandada ofertou contrarrazões.

Subiram os autos.

É o relatório.

V O TO S

DES. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA (RELATOR)

Das Apelações.

A matéria objeto da presente demanda não é inusitada nesta

Corte, havendo precedentes, dentre os quais acórdão da Sexta Câmara

Cível, relator o Des. NEY WIEDEMANN NETO, cujos termos bem calham

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ser trazidos como razões de decidir, conforme excertos a seguir transcritos,

verbis:

Ementa: Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação de indenização. Mantida a responsabilidade solidária da cooperativa que retransmite a energia elétrica fornecida pela CEEE. Comprovação da falta de energia. O mau funcionamento do serviço público que causa prejuízo a particulares gera a obrigação de indenizar os danos materiais. No caso concreto, a falha no serviço prestado teve repercussão relevante na esfera patrimonial do autor, produtor de fumo. Apelos desprovidos. (Apelação Cível Nº 70037688330, julgado em 17/03/2011).

(...).

Primeiramente, entendo ser a COSEL, juntamente com a CEEE, responsável pelos danos ocasionados pela falta de energia elétrica, tendo em vista retransmitir a energia fornecida pela CEEE.

Saliento que as especificidades da entidade cooperativa não são capazes de eximi-la da responsabilidade por danos causados aos usuários dos serviços que presta, sendo impossível desconstituir o caráter de prestação de serviço o fornecimento de energia que pratica.

Neste sentido:

RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS. SECAGEM DE FUMO. DANOS E NEXO DE CAUSALIDADE SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADOS. PERDA DE QUALIDADE DO FUMO PROVOCADA PELA SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA NA REDE DA RÉ. APLICAÇÃO DO CDC. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO E DECORRENTE DA INEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ART. 37, §6º DA CF. LEGITIMIDADE DA COOPERATIVA PARA RESPONDER PELOS DANOS CAUSADOS AOS CONSUMIDORES NA ÁREA EM QUE ATUA COMO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71001981612, Segunda Turma Recursal Cível,

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Turmas Recursais, Relator: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em 18/03/2009).

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MATERIAIS PERDA DO FUMO EM FACE DE SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PERCENTUAL MANTIDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA CONFIGURADA. DENUNCIAÇÃO DA LIDE DA AES SUL. INDEFERIMENTO. A Celetro Cooperativa de Eletrificação Centro Jacuí Ltda. responde pelos danos materiais causados a consumidor em face da suspensão do fornecimento de energia elétrica. Temporal não pode ser tratado como mero caso fortuito, excludente de responsabilidade, na medida em que a concessionária de energia elétrica deve ter uma adequada estrutura e planejamento. Mostra-se prova suficiente a declaração da Associação dos Fumicultores do Brasil afirmando que o autor sofreu danos na cura do fumo em razão da falta de energia elétrica, com a demonstração, ainda, do resultado do valor de tais danos. Os honorários advocatícios devem ser fixados de modo que não aviltem a profissão de advogado. Quando as partes decaem de suas pretensões em igual proporção, os ônus da sucumbência devem redimensionados. A denunciação da lide há de ser indeferida quando inocorrentes as hipóteses previstas no art. 70 do CPC. APELAÇAÕ PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70028292712, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 29/10/2009).

Consigno que estão em um pólo da relação dois fornecedores e no outro um consumidor, e havendo entre eles um produto ou a prestação de um serviço, as regras a serem aplicáveis à relação jurídica em comento serão as previstas na Lei nº 8.078/90, ou seja, o Código de Defesa do Consumidor.

Tratando-se de questão de fato e de direito, indispensável o exame da prova trazida aos autos, cabendo inicialmente ressaltar que a falta de energia elétrica na data e horário afirmado pelo autor é incontroversa, tendo inclusive sido confeccionado boletim de ocorrência pela COSEL, fl. 10, onde fez constar o seguinte:

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“Na condição de responsável técnico da COSEL neste município, comunico que na data e horário supra referido ocorreu falta de energia elétrica no sistema supridor da CEEE, motivo este que deixou todo o sistema elétrico da COSEL sem energia, ocasionando transtornos e prejuízos nas estufas de fumo movidas a energia elétrica, o que, certamente, irá gerar indenizações pelo produto perdido.”

O laudo apresentado por profissional habilitado (fls. 12-13), engenheiro agrônomo, é hábil para comprovar o dano sofrido, sendo que constou expressamente que o processo de secagem não pode ser interrompido após o amarelecimento das mesmas, acarretando em perda da qualidade final do produto.

O agrônomo declarou que quando a energia retornou os danos já estavam presentes e eram irreparáveis, e em vista da perda da qualidade do fumo o prejuízo traduz-se em R$ 3,54/kg conforme tabela oficial de preços de fumo.

A alegação de que a pretensão do autor não pode subsistir, por ter sido realizado laudo após transcorridos três meses do evento danoso, não convence, conquanto o contexto probatório ampara o direito postulado pelo autor em sua petição inicial. Destarte, tenho como comprovada a perda da qualidade do fumo que estava sendo curado neste dia na propriedade do autor.

(...).

Diante de tais elementos probatórios mostra-se devidamente demonstrado o nexo causal entre a falta de energia elétrica e a perda de qualidade do fumo que secava na estufa elétrica da propriedade do autor.

O autor logrou comprovar os fatos constitutivos de seus direito, nos termos do que dispõe o inciso I do art. 333 do Código de Processo Civil, enquanto inexiste nos autos a prova de existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, conforme prevê o inciso II do citado dispositivo legal.

O artigo 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor, dispõe que para elidir a responsabilidade do fornecedor deve

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restar comprovada a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, o que não ocorreu no caso dos autos, devendo, portanto, ser reconhecido o dever de indenizar, pois presente o nexo de causalidade entre o defeito no serviço e os danos causados.

Nesse sentido:

Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação de indenização por danos materiais. Aplicação do Código de Defesa ao Consumidor. Responsabilidade objetiva da concessionária de energia elétrica. Corte injustificado e demora no restabelecimento do serviço. Perda na qualidade do fumo secado em estufa. Dever de indenizar os prejuízos. Sentença mantida. À unanimidade, negaram provimento ao apelo. (Apelação Cível Nº 70035456557, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 26/08/2010).

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MATERIAIS DECORRENTES DA PERDA DO FUMO EM RAZÃO DA SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA. APLICABILIDADE DO CDC. A responsabilidade do fornecedor independe de culpa, bastando a prova do nexo causal entre a conduta (ação ou omissão) e o dano gerado. Os danos restaram devidamente demonstrados, na medida em que suficiente como prova as declarações da Associação dos Fumicultores do Brasil. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70027238807, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, Julgado em 10/06/2010).

Ademais, sinalo que o argumento trazido pela CEEE de ausência de ilicitude em sua conduta, uma vez que a Resolução nº 24 da ANEEL autoriza a queda de energia, não prospera. Mesmo que não tenha extrapolado o indicador de continuidade DMIC – Duração Máxima de Interrupção por Consumidor, ocorrendo dano deve ser ressarcido, independentemente do lapso temporal de falta de energia.

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Destarte, estou em manter a procedência da demanda, porquanto totalmente comprovados os danos sofridos e seu nexo causal com a falta de energia elétrica.

In casu, de igual forma como no precedente supra referido, o

autor evidenciou o fato determinante do prejuízo alegado, por intermédio da

Comunicação de Ocorrência por cópia à fl. 10; o nexo de causalidade entre

o evento e o dano, desde o laudo à fl. 11 e do documento por cópia à fl. 59,

este apresentado pela Cooperativa demandada, dando conta da interrupção

do serviço; e a responsabilidade da parte demandada, na condição de

prestadoras de serviço de fornecimento de energia elétrica.

Por fim, calha averbar que a responsabilidade das requeridas

ao presente feito é objetiva, à luz do que dispõe o art. 37, § 6º, da

Constituição Federal, não sendo necessária a comprovação de culpa para a

configuração da responsabilidade civil.

Do Recurso Adesivo.

A inconformidade manifestada pelo recorrente é de ser

acolhida.

Acerca dos elementos considerados à fixação dos honorários

advocatícios, leciona YUSSEF SAID CAHALI1:

Na fixação dos honorários de advogado serão atendidos, ainda, os fatores objetivos [além dos subjetivos, sujeitos à apreciação pessoal do julgador], especificados no art. 20, § 3º, c: “a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço”.

Assim, uma causa em que se discutem graves questões de direito exige mais do advogado do que outra em que o pedido se funda em jurisprudência pacífica, sem qualquer controvérsia plausível. Nestes casos, geralmente, a natureza da ação pressupõe que o vencedor se tenha servido dos préstimos profissionais de advogado especializado na questão

1 Honorários advocatícios – 3. ed. – São Paulo : Ed. RT, 1997, pp. 465-6.

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jurídica objeto da lide, reclamando dele pesquisas e formulação de teses pioneiras, que vão servir de roteiro para o julgador.

Na valorização do trabalho realizado pelo advogado, ainda que o critério da lei tenha em vista exclusivamente a prestação judicial em matéria civil, é de reconhecer-se como prestação judicial não apenas aquela em que o trabalho se desempenha no cumprimento de um verdadeiro e próprio ato processual (audiência, arrazoados, sustentação oral, memoriais, precatórios), mas compreende a atividade que se desenvolve fora do processo, desde que estreitamente dependente de um mandado relativo à defesa ou representação em juízo, como preordenado à atuação da atividade propriamente processual ou a esse complementar (diligência junto a outros processos, em outras esferas etc.).

Assim, se há necessidade de serem ouvidas testemunhas residentes em outras cidades, em outros Estados.

O trabalho profissional prestado deve receber remuneração condigna e segundo as peculiaridades do caso.

Na espécie, em que pese o objeto da lide não guarde

complexidade, o feito teve dilação probatória em audiência, onde o patrono

da parte autora desenvolveu qualificado e dedicado trabalho, tendo a parte

requerida oferecido substancial oposição às teses esposadas pelo

requerente.

A remuneração do advogado deve atentar à atividade

desenvolvida pelo causídico, retribuindo de forma adequada o trabalho do

profissional.

Nesse passo, considerando a qualidade e o número de

intervenções do patrono da autora no feito, a natureza da causa, o conteúdo

econômico da lide, e bem assim a necessidade de remunerar

condignamente o profissional do Direito, impedindo o aviltamento do nobre

exercício da advocacia, estou que o percentual de 20% (vinte por cento)

sobre o valor atualizado da condenação esteja melhor adequado ao

pagamento pelo trabalho desenvolvido pelo procurador do demandante.

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Isso posto, estou por negar provimento às Apelações e prover

o Recurso Adesivo, pelas razões e na forma supra alinhadas.

É como voto.

DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ (REVISOR) - De acordo com o(a)

Relator(a).

DES. TÚLIO DE OLIVEIRA MARTINS - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA - Presidente - Apelação

Cível nº 70038803524, Comarca de Encruzilhada do Sul: "NEGARAM

PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES E PROVERAM O RECURSO ADESIVO.

UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: FERNANDA PESSOA CERVEIRA TONIOLO