residências artístico-poéticas em dança

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Residências artístico-poéticas em dança Marcílio de Souza Vieira Organizador

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Residências artístico-poéticas em dança

Marcílio de Souza VieiraOrganizador

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Residências artístico-poéticas em dança

Marcílio de Souza VieiraOrganizador

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ReitorJosé Daniel Diniz Melo

Vice-ReitorHenio Ferreira de Miranda

Diretoria Administrativa da EDUFRNMaria da Penha Casado Alves (Diretora)Helton Rubiano de Macedo (Diretor Adjunto)Bruno Francisco Xavier (Secretário)

Conselho EditorialMaria da Penha Casado Alves (Presidente)Judithe da Costa Leite Albuquerque (Secretária)Adriana Rosa CarvalhoAnna Cecília Queiroz de MedeirosCândida de SouzaFabrício Germano AlvesFrancisco Dutra de Macedo FilhoGilberto CorsoGrinaura Medeiros de MoraisJosé Flávio Vidal CoutinhoJosenildo Soares BezerraKamyla Álvares Pinto

Leandro Ibiapina BevilaquaLucélio Dantas de AquinoLuciene da Silva SantosMarcelo da Silva AmorimMarcelo de Sousa da SilvaMárcia Maria de Cruz CastroMarta Maria de AraújoMartin Pablo CammarotaRoberval Edson Pinheiro de LimaSibele Berenice Castella PergherTercia Maria Souza de Moura MarquesTiago de Quadros Maia Carvalho

Secretária de Educação a DistânciaMaria Carmem Freire Diógenes Rêgo

Secretária Adjunta de Educação a DistânciaIone Rodrigues Diniz Morais

Coordenadora de Produção de Materiais DidáticosMaria Carmem Freire Diógenes Rêgo

Coordenadora de RevisãoAline Pinho Dias

Coordenadora EditorialKaline Sampaio

Gestão do Fluxo de RevisãoEdineide Marques

Conselho Técnico-Científico – SEDISMaria Carmem Freire Diógenes Rêgo – SEDIS (Presidente)Aline de Pinho Dias – SEDISAndré Morais Gurgel – CCSAAntônio de Pádua dos Santos – CSCélia Maria de Araújo – SEDISEugênia Maria Dantas – CCHLAIone Rodrigues Diniz Morais – SEDISIsabel Dillmann Nunes – IMDIvan Max Freire de Lacerda – EAJJefferson Fernandes Alves – SEDISJosé Querginaldo Bezerra – CCETLilian Giotto Zaros – CBMarcos Aurélio Felipe – SEDIS

Maria Cristina Leandro de Paiva – CEMaria da Penha Casado Alves – SEDISNedja Suely Fernandes – CCETRicardo Alexsandro de Medeiros Valentim – SEDISSulemi Fabiano Campos – CCHLAWicliffe de Andrade Costa – CCHLA

Revisão de ABNTEdineide Marques

Revisão Linguístico-TextualFabíola Barreto

Revisão TipográficaIlana Lamas

DiagramaçãoIsadora Veras Lobo de Paiva Ygor Anario

CapaEliza Mizziara

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Catalogação da publicação na fonteUniversidade Federal do Rio Grande do Norte

Secretaria de Educação a Distância

Vieira, Marcílio de Souza.Residências artístico-poéticas em dança [recurso eletrônico] / organi-zado por Marcílio de Souza Vieira. – 1. ed. – Natal: EDUFRN, 2021.6700 KB; 1 PDF

ISBN nº 978-65-5569-150-4

1. Prática artístico-criativa. 2. Dança. 3. Dança - Residência. I. Título.

CDU 793V658r

Elaborada por Edineide da Silva Marques CRB-15/488.

Direitos de publicação em língua portuguesa no Brasil:EDUFRN – Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Avenida Salgado Filho, 3000 - Campus Universitário59.078-970 –Natal-RN

Brasil

Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1999.

Em vigor no Brasil desde 2009.

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PREFÁCIO

O livro em questão intitula-se Residências artístico-poéticas em dança e é organizado pelo Professor Doutor Marcilio de Souza Vieira, docente do curso de graduação em dança e dos Programas de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Pós-Graduação em Educação (PPGEd) (PPGArC) e Pós-Graduação em Ensino de Artes (PROFARTES) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN. Com seus onze capítulos, a obra apresenta um exercício reflexivo calcado em práticas artístico-criativas em dança, todas elas enfeixadas pelo modo tanto propositivo quanto logístico de encontro de trabalho chamado de “residência”, um modus operandi tornado bastante habitual nos anos mais recentes em meios em que a dança se propaga como campo de saber. Esse constitui já um dos pontos de mérito da publicação.

A publicação oferece oportunidades diferenciadas, reunidas em um mesmo volume de reflexão, sobre uma prática recorrente no meio da dança e exercida talvez irrefletidamente, ou, ao menos, sem a reflexão devida. Isso se refere aos motivos pelos quais os artistas da dança optam pela nomenclatura “residência” em detri-mento de outras também utilizadas em contextos análogos, tais como “workshop”, “curso”, “ateliê” ou “oficina”. Para muito longe de uma mera opção entre sinônimos, trata-se, na residência, de uma escolha ético-estética que, como tal, enseja um posiciona-mento político acerca da troca de saberes implicada nesse processo. Percebe-se, por entre a multiplicidade de vozes que compõem a publicação, um pano de fundo comum versando sobre isso.

Destaca-se o caráter internacional da publicação, o que lhe agrega significativo valor, ainda mais quando se observa a presença

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de dois pesquisadores latino-americanos, integração sempre relevante tanto mais seja pertinente. O volume reúne textos de autores de cinco países distintos, todos eles artistas-pesquisadores, cada qual com proposição reflexiva própria sobre as residências das quais participaram na condição de proponentes (e não de professores, faça-se notar) dos trabalhos. Os escritos de Clermont Pithan (França), Isabelle Dufau (França), Javier Díaz Dallanias (Chile), José Ángel Árambula Ochoa (México), Marcilio de Souza Vieira (Brasil) e Angelika Hauser-Dellefant (Áustria) compõem os seis capítulos textuais da publicação que se entremeiam com outros cinco, todos eles constantes de imagens fotográficas documentais das ações realizadas.

O conteúdo do volume mostra-se acessível ao público acadê-mico em geral, mas também a um público não acadêmico e se adequa bem a ambos os perfis de leitores. Destina-se particularmente aos pesquisadores, artistas e estudantes de dança orientados por inquie-tude investigativa acerca dos processos criativos, especialmente os processos gestados na cooperação entre pessoas, também na mediação pessoas e procedimentos (técnicos/ tecnológicos), ainda, na horizontalidade de funções. Por isso mesmo, interessa também aos pesquisadores, artistas e estudantes mais vocacionados aos temas da educação em/de/com dança.

Um trabalho de criação, tal como o estabelecido nas resi-dências em questão, do qual o artista participa como proponente, mas com tal função tanto deslocada quanto desassociada e, por que não dizer, também desassossegada, da posição de professor, tem muito a ensinar aos mestres em formação e aos já supostamente formados acerca da possível e talvez importante relação recíproca e autoimplicada entre modo e técnica para muito longe de uma conformação conteudista dos procedimentos didáticos de práticas dançadas. Nesse contexto, destaca-se, ainda, a presença de uma

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das residências, e as reflexões que no livro se fazem corresponder, lidando com poéticas populares da dança, justamente essas em que tal reciprocidade e autoimplicação muitas vezes já estão dadas de saída. Esse se constitui um mérito da obra, que se alinha de modo interessante a outras já circulantes no país, versando sobre processos criativos em dança, orientados, entretanto, exclusiva-mente pela dança contemporânea.

Thereza RochaProfessora adjunta dos cursos de graduação em dança da

Universidade Federal do Ceará/UFC.

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Residência, local de dança

Residência no dicionário Aurélio quer dizer “[...] 1. Morada habi-tual num lugar. 2. Casa onde se reside, morada [...]” (FERREIRA, 2001, p. 601). Residência também é local para artistas exporem suas práxis. Ela tem o propósito de servir como espaço temporário para os artistas desenvolverem seus projetos e de ser percebida como possibilidade de trocas de dança, de articulação de pensamento em/para/com dança em torno de uma investigação que não se esgota em um olhar rápido sobre sua atuação imediata. Partindo desse pressuposto, a presente obra apresenta reflexões trazidas por artistas que realizaram residências artísticas desenvolvidas no Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e também em Passa e Fica, cidade do interior do sertão potiguar, localizada a 101 quilometros, à sudoeste da capital, Natal.

Como ponto importante, a discussão sobre a residência envolve a relação de cada artista com o desconhecido, o que se apresenta a ele ao aceitar um convite para viver uma situação, e que rapidamente pode converter-se em adversidade. Não se trata apenas de visitar ou estar, mas de estabelecer vínculos com as pessoas, os espaços e os lugares, permitir relacionar-se para produzir a partir dessa interação. É preciso pensar, ainda, que a ansiedade e o medo, peculiares aos seres humanos e muitas vezes motivadores dessa forma de relação com o mundo, são, nesse caso, elementos importantes como parte desse desafio de estar deslocado e viver junto. Inserido em outro contexto, o artista não tem mais o controle absoluto e, percebendo-se como incapaz de deter isso em suas mãos, lança-se em uma experiência – e não em uma aventura – que o toma por inteiro.

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A reflexão que segue nos capítulos conclama um olhar amplo e aberto sobre o potencial e sobre a importância das residências artís-ticas em/com/para a dança, seja no processo de formação do artista, seja no de formação artística de licenciados em dança e em artes de maneira geral e professores de dança. A esse respeito, entendemos a residência como uma plataforma para atuação e reflexão sobre práticas artísticas, nesses escritos, em particular, referimo-nos às práticas artísticas em dança, centradas na necessidade de pensar a produção de forma crítica e como geradora de conhecimento.

As residências ocorreram no ano de 2018, nos meses de abril, maio, agosto, setembro, e dezembro respectivamente, com as seguintes temáticas: Imersões Poético-Acadêmicas como Processos de Formação do Artista-Pesquisador-Docente; Perspectivas das Danças Populares; Emergencia Escénica; Conecta México; e Ritmo e ação. Essas ações/residências foram registradas como projetos de extensão ligados à Pós-Graduação em Artes Cênicas (PPGArC) e ao curso de Licenciatura em Dança e teve apoio da Pró-Reitoria de Pós-Graduação da UFRN.

Destarte, a escrita deste livro, a várias mãos e em diversos idiomas, com uma tradução para a língua portuguesa brasileira, compõe um mosaico das residências artísticas em/com/para dança e sua práxis, a saber: Imersões Poético-Acadêmicas como Processos de Formação do Artista-Pesquisador-Docente, projeto coordenado pela professora Márcia Strazzacappa (LABORARTE/UNICAMP), com a participação dos artistas franceses, Isabelle Dufau e Clermont Pithan; Residência Artística: perspectivas das danças populares, coordenada pelo professor Marcilio de Souza Vieira, com a participação dos alunos do componente curricular Práticas Educativas em Dança Popular1 do curso de Licenciatura

1 Componente curricular ministrado no primeiro semestre de 2018 e 2019 em que os alunos tiveram a experiência artístico-estética de ministrar oficinas de danças da tradição no 8º e 9º Festival de Cultura de Passa e Fica-RN.

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em Dança da UFRN ocorrida na cidade de Passa e Fica – RN; Emergencia Escénica, que teve como proponente o artista chileno, Javier Díaz Dalannais; e Conecta México, que foi proposta pelo californiano radicado no México, Ángel Arámbula, a convite de Diana Fontes, organizadora do Encontro Nacional de Dança Contemporânea do RN. Houve, ainda, a oficina Rhythm and Acting, ministrada por Angelika Hauser-Dellefant, por ocasião do 3º Seminário Internacional Corpo e Processo de Criação nas Artes Cênicas, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa CIRANDAR e pelo PPGARC.

As Imersões Poético-Acadêmicas poderiam ser conside-radas como uma A/R/Tografia no campo das artes cênicas, ou seja, uma A/R/Tografia para a dança e para o teatro?! – ques-tiona sua propositora, Marcia Strazzacappa. Nessa direção, ela continua: deveríamos ampliar a dimensão do artista-docente para artista-pesquisador-docente, como propõe o prefixo A/R/T Artista/Researcher (pesquisador)/Teacher (professor) na A/R/Tografia? Deveríamos dizer imersão (singular) ou imersões (plural)? Poderíamos propor as imersões como uma metodologia de pesquisa em si no campo de/em dança, teatro, performance? Quais os pontos de aproximação e de distanciamento dessas meto-dologias? Poderíamos aplicar as imersões para além do trabalho com artistas, vislumbrando processos de formação humana? Imersões [no plural] indicam, igualmente, caminhos de ir e vir, ações de mergulhar em profundidade e voltar à superfície, interior e exterior, permeadas de movimentos, que são a essência do fazer, do criar e do pesquisar em dança.

O projeto supracitado não foi o primeiro a ocorrer na Universidade Federal, em Natal. Em 2016, o projeto já havia sido realizado, porém, sem a presença de convidados externos. Na edição da qual se trata a presente obra, as imersões poéticas

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contaram com a presença de dois artistas franceses: Isabelle Dufau e Clermont Pithan. Eles contribuíram, respectivamente, com uma oficina de dança contemporânea em torno da noção de ritmo do corpo, por meio de uma metodologia desenvolvida pela artista da dança e coreógrafa francesa, Françoise Dupuy2, e com a realização de um workshop sobre teatro e novas tecnologias.

Isabelle Dufau explicou em sua oficina que as noções de força, tempo e espaço regem o corpo em movimento e criam o ritmo. O corpo é definitivamente regido pelo ritmo. Em outras palavras, o corpo é ritmo, é tempo e é espaço. Em sua oficina, Dufau lançou mão de conceitos trazidos a partir do trabalho da coreógrafa Françoise Dupuy. O ensino de Françoise Dupuy não propõe modelos nem formas, pelo contrário, oferece ao aluno ferramentas para construir sua própria dança.

Clermont Pithan, por sua vez, propôs uma imersão nas tecnologias para a dança baseado no Programa (software) Isadora. O referido software permite tratar imagens em captação direta ou a partir de arquivos. Embora tenha sido concebido inicialmente para a dança, ao permitir tratar o fluxo de imagens e sons em tempo real da cena, com captação e restituição, ampliou seu uso para a cena contemporânea, como o teatro e a performance. Pithan propôs um atelier de descoberta dessa interface digital de manipulação de imagens e mapeamento e uma improvisação cênica de uma mídia sensível.

2 Desde os anos 1940, Françoise Dupuy desenvolveu uma dança herdeira da experiência Hellerau-Luxembourg e da dança expressionista alemã. Nela, a relação com o espaço é muito forte. A noção de ritmo traduz-se pelas qualidades de tensão no corpo, pela maneira como o corpo pode modificar o seu próprio espaço interno e o espaço onde ele evolui.

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Perspectivas das Danças Populares apresentou-se como uma possibilidade de vivência dos alunos do Curso de Licenciatura em Dança e em Teatro a partir da apreciação/fruição e do fazer do 8º Festival de Cultura de Passa e Fica, considerado o maior celeiro cultural do Rio Grande do Norte. A residência teve por objetivo proporcionar a vivência e a fruição das danças populares por meio de intercâmbio cultural entre os grupos de dança popular da cidade de Passa e Fica, os grupos convidados das mais diversas partes do país e os alunos do componente curricular Práticas Educativas em Dança Popular, fomentando o conhecimento teórico-prático entre a práxis dos grupos populares de dança que se apresentarão no Festival e os conteúdos programáticos do componente curricular citado.

A Emergencia Escénica foi abordada a partir da base do corpo como um surgimento de relações, uma plataforma para o discurso e um discurso em si. A emergência é vista como flores-cimento do corpo devido à coordenação de diferentes domínios, ao mesmo tempo que contingencia princípios que investigam o corpo nos processos criativos e interpretativos, como elemento fundacional das ações feitas em cena. Para tanto, foi realizado um trabalho psicofísico do intérprete, além das leituras que o corpo propõe como elemento conceitual e articulado com o restante da cena/espaço. A residência artística teve como objetivo articular e desenvolver ferramentas para estruturar uma dramaturgia corporal particular, melhorando e expandindo os processos cria-tivos dos participantes, e há um foco particular na eliminação de obstáculos psicofísicos.

Ademais, a contribuição do californiano radicado no México, Ángel Arámbula, fez-nos refletir sobre o piso móvel na dança contemporânea contribuindo para pensar a dança sobre outros vieses. Em sua proposição de dança denominada piso móvel, ele articula as alavancas e os motores do corpo com a

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relação de peso, corpo e articulações com o chão, além da expansão e do uso eficiente do corpo articular, relação horizontal-vertical como rampas de subida e descida. Nesse trabalho, há espaço ainda para a comunicação e as convenções do olhar, com a cinestesia e a percepção tridimensional do corpo como possibilidade de habitar espaço pessoal e consciência grupal.

Não poderia deixar de citar o trabalho desenvolvido pela professora Angelika Hauser-Dellefant que trata do ritmo e da ação em trabalhos de dança e teatro. Assim, este livro se propõe a contar/narrar essas residências.

Agradecemos a contribuição escrita desses artistas que se esforçaram para além da residência artística. Agradecimentos também para os pareceres para este livro, de Márcia Strazzacapa (UNICAMP) e Thereza Rocha (UFC), que, com um olhar cuida-doso, contribuíram para a feitura final desta obra. Como dito, foi feito por várias mãos. Agradecemos, por fim, as traduções dos textos para a língua portuguesa feitas por Maíra Montenegro (Rhythm and Acting); e a tradução do texto escrito em “portunhol” de Javier Díaz Dalannais e do texto de José Arámbula, por Iane Licurgo (La Identidad).

Natal, 2020Marcilio de Souza Vieira

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SUMÁRIO

1 As Imagens (I): Poéticas da Dança 17

2 Ritmo do Corpo: un Atelier de danse contemporaine à l’UFRN 21Isabelle Dufau

2.1 Ritmo do Corpo: um Atelier de dança contemporânea na UFRN

48

3 Le dispositif vidéo-numérique comme élément de l’écriture scénique: Une experimentation dans le cadre du Projet “Imersões Poético-Acadêmicas” à l`UFRN, Natal

76

Clermont Pithan

3.1 O dispositivo de vídeo digital como parte da escrita cênica: uma experimentação no âmbito do projeto “Imersões Poético-Acadêmicas” na UFRN, Natal

100

4 As Imagens (II): A Cena Ensina 124

5 La Identidad 127Javier Díaz Dalannais

5.1 A Identidade 147

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6 As Imagens (III): Outros modos de dançar

163

7 Natal y su danza vibrante 167José Ángel Arámbula Ochoa

7.1 Natal e sua dança vibrante 170

8 As Imagens (IV): Danças da Tradição 173

9 Quando o sertão potiguar vira festa 176Marcilio de Souza Vieira

10 As Imagens (V): Ritmo e ação 184

11 Rhythm and Acting 186Angelika Hauser-Dellefant

11.1 Ritmo e Atuação 195

Sobre os autores 205

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AS IMAGENS (I) POÉTICAS DA DANÇA

Marcilio de Souza Vieira

As imagens Poéticas da Dança foram fotografadas na Imersão Poético-Acadêmica – Jam session que teve como propositora Márcia Strazzacappa (UNICAMP). Elas mostram momentos da Oficina de dança contemporânea em torno da noção de ritmo do corpo, desenvolvida pela artista da dança e coreógrafa francesa, Isabelle Dufau, e da Oficina Software Isadora e Improvisação Cênica: desco-berta e experimentação, que teve a proposição de Clermont Pithan (FRANÇA) e dispositivo de observação de Marcilio Vieira (UFRN).

As noções de força, de tempo e de espaço regem o corpo em movimento e criam o ritmo. O corpo é definitivamente regido pelo ritmo. Ele é ritmo, isto é, tempo e espaço. Para a residência artística, Dufau se utilizou da técnica de dança de Françoise Dupuy (1940), que desenvolveu uma dança herdeira da experiência Hellerau-Luxembourg e da dança expressionista alemã. Nela, a relação com o espaço é muito forte. A noção de ritmo traduz-se pelas qualidades de tensão no corpo, pela maneira como o corpo pode modificar o seu próprio espaço interno e o espaço onde ele evolui. O ensino da técnica de Françoise Dupuy por Isabelle Dufau não propõe modelos nem formas, pelo contrário, a técnica oferece ao intérprete criador ferramentas para construir a sua própria dança. Foi por meio desse ensino que Isabelle Dufau desenvolveu sua própria dança enriquecida pelo confronto, durante sua estadia

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no Brasil, com uma dança em que a questão do ritmo também é essencial, senão, vital.

Para a Oficina Software Isadora e Improvisação Cênica, Clermont Pithan utilizou-se do Programa (software) Isadora, que permite tratar imagens em captação direta ou a partir de arquivos. Esse programa foi concebido inicialmente para a dança, no entanto, ao permitir tratar o fluxo de imagens e de sons em tempo real da cena, a captação e a restituição, o artista brasileiro residente na França amplia seu uso para a cena contemporânea, como o teatro e a performance. Ele propôs um atelier de descoberta dessa interface digital de manipulação de imagens e mapeamento e uma improvisação cênica de uma mídia sensível.

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RITMO DO CORPO UN ATELIER DE DANSE CONTEMPORAINE À L’UFRN

Isabelle DUFAU

Rencontres et découverte

Les trois journées de stage réalisées auprès des étudiant.e.s et professeur.e.s de l’UFRN de Natal ont permis d’expérimenter le travail de Rythme du Corps, élaboré par Françoise Dupuy, danseuse et chorégraphe, figure emblématique de la danse moderne en France. Ce travail concerne à la fois la recherche, la transmission et la création. Il apporte non pas des formes chorégraphiques mais des outils fondamentaux pour que chacun.e puisse penser, questionner, construire et enrichir sa propre démarche artistique. Il s’adresse ainsi tant aux danseuses et danseurs qu’aux comédien.ne.s, musicien.ne.s, circadien.ne.s, en accord avec sa mobilité et son propre niveau technique.

Le Rythme du corps porte et remet en jeu l’héritage de Jaques-Dalcroze. Il propose une relation à la musique qui engage le corps dans son entier, qui révèle sa musicalité intérieure et explore la symbiose comme l’autonomie. Cette relation entre en résonance avec la pensée d’Isadora Duncan (2003) pour qui le corps tout entier doit vibrer aux accords de la musique et le danseur en “traduire les émotions”. De même pour Jaques-Dalcroze : “on n’écoute pas la musique uniquement avec les oreilles ; on l’entend résonner dans le corps tout entier, dans le cerveau et dans

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Ritmo do corpo: un atelier de danse contemporaine à l’UFRN

le cœur” (JAQUES DALCROZE, 1948, p. 58). C’est par le rythme que la danse peut atteindre la poésie. C’est par l’espace construit rythmiquement que les corps trouvent leur expressivité et l’œuvre son sens avant toute narration.

La transmission du Rythme du corps passe par l’expérimentation des différents éléments de langage qui le composent. Nous allons donc aborder ces principaux éléments en les décrivant de façon isolée, même si dans la pratique ils sont en corrélation constante les uns avec les autres. Leurs interactions ouvrent sur des complexités mouvantes et enrichissantes. Elles contribuent à rendre le corps disponible, “éveillé” comme le dit Françoise Dupuy (2012), et permettent d’explorer de nouveaux états de présence, de découvrir et expérimenter de nouvelles qualités, initiations, phrasés et résolutions de mouvement. La qualité du mouvement dépend de ce qui se passe avant et après son déroulement, de la façon dont on le prépare et de comment on le conclut. La danse est alors un passage, un entre deux états d’émotions, d’intentions, de désirs. Un entre deux silences aussi. Plutôt que de parler de technique et de création, Françoise Dupuy (2012) préfère parler de maitrise et d’inventivité, jumelées tout au long du parcours de danse. Certains des éléments ont été expérimentés lors de ce premier stage, d’autres pourront faire l’objets d’une prochaine rencontre…

Créer le vide

La construction du corps est aussi importante que celle de l’espace où il évolue. Créer son espace de danse demande d’être d’abord à l’écoute de son propre corps, de ses micro-oscillations, de son agitation intérieure. Il est ensuite nécessaire de faire silence en

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Isabelle Dufau

soi pour permettre l’émergence d’un mouvement non volontaire, inédit, singulier.

Le vide va permettre au corps de trouver ce silence, d’inhiber certains des nombreux mouvements qu’il contient pour en organiser un en particulier. Mais ce vide n’est pas un rien, et créer du vide n’est pas produire une absence. Faire un plein de vide permet d’ouvrir un espace neuf, d’accueillir ce qui est autre.

Le vide est cet entre-deux propice à la création, à la transformation du corps des danseurs et du public ; il agit comme une condition première pour qu’il y ait danse. Le vide est également réel et concret, et son lieu essentiel dans le corps est la zone que Françoise Dupuy (2012) appelle corps central, située au niveau du ventre, légèrement sous le nombril. Il s’apparente au Hara japonais (GRAF DURCKEIM, 1974), ou au chakra sacré dans la pratique du yoga. L’accès à cette partie est possible en activant les extrémités.

L’instant de vide avant et après chaque mouvement est essentiel, il doit toujours être questionné et défini, que la danse soit improvisée ou écrite. Le vide construit aussi notre relation à l’espace par une prise de conscience de ce qui se joue, de ce qui existe entre deux segments du corps, deux appuis, deux (voire plusieurs) partenaires. Cela engendre un état de présence particulier, à la fois dense et perméable, entre l’agir et l’être agi par ce qui se déploie, gonfle ou se flétrit entre les surfaces impliquées. Le corps interagit avec l’espace en le sculptant. Ce n’est plus seulement la ligne ou la direction du geste qui fait sens, mais aussi l’espace, le volume qu’elle qu’elle a créé, qu’elle fait vibrer entre deux surfaces du corps.

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Ritmo do corpo: un atelier de danse contemporaine à l’UFRN

Faire silence

Le silence est une autre sorte de vide, pleine de vibrations. Par rapport à la danse, il représente un arrêt qui ouvre une parenthèse : pour retenir, suspendre, interroger le flux et l’énergie du mouvement. Il suscite l’écoute et provoque une attention participante. Dans l’atelier de danse, pour le travail de préparation corporelle, il est donc important de mettre les élèves en état de repos, de calme, avant de commencer à bouger.

Le silence est pour Dalcroze “le seul élément de contraste qui puisse faire valoir complètement le mouvement sonore” (JAQUES-DALCROZE, 1965, p. 15 ). Il donne à la danse sa respiration, son espace, lui confère intelligibilité et sens.

Avant que ne commence la danse, il installe un temps et une texture spatiale donnée par le niveau de tension des corps en présence. C’est un silence actif, qui annonce la qualité de la danse à venir. L’immobilité apparente des corps est chargée d’une vibration intérieure, cette “résonance intérieure” dont parle Wassily Kandinsky (1989)1.

Comme les accents, les silences modifient la qualité rythmique de la danse. L’arrêt du mouvement à l’intérieur du phrasé peut représenter une rupture totale, un blocage, comme dans les contractions ou les impacts. Il peut aussi se faire dans une qualité de résonance, qui préserve et propage le rayonnement du geste au delà du corps, sans que soit interrompu le souff le. La suspension maintient alors le continuum du mouvement. L’arrêt s’envisage aussi en équilibre : une troisième qualité de silence, vibrante de micro-ajustements, entre le

1 KANDINSKY, Wassily. Du spirituel dans l’art, et dans la peinture en particulier. Paris: Denoël, Folio Essais,1989.

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Isabelle Dufau

stable et l’instable, comme un temps ralenti, un passage vers un prolongement du geste, une chute ou un repos.

Le silence est indissociable de l’écoute et de la respiration. Danser dans le silence redonne une liberté et une autonomie au mouvement, rend perceptible la musicalité intérieure du corps, en révèle l’intime.

Dans le travail de Rythme du Corps, l’introduction de silence plus ou moins prolongé, préparé ou inattendu, permet d’expérimenter l’écoute et la réactivité, la présence des appuis, la capacité de maintenir le tempo. Cette qualité apprend la conscience des durées, puis permet d’acquérir la régularité. D’autre part, la relation danse-musique, qui intègre l’écoute musicale, l’attention au son produit par les frappes : mains, tambours, par les pas ou la respiration, est aussi une façon de développer la sensibilité au silence, à ses différentes qualités.

Respirer

Par l’alternance de l’inspir et de l’expir, la respiration crée la relation du dedans au dehors, elle détermine nos échanges premiers et essentiels avec ce qui nous environne et avec les autres. L’activité respiratoire, pulmonaire, est à la fois automatique et volontaire. Elle varie avec nos gestes et nos émotions. Dans un article consacré au souffle2, Hubert Godard (1994) observe ces variations du centre de gravité dues au simple fait de respirer, compensées par les micro-réajustements du système postural. Il existe ainsi un lien entre posture et respiration.

2 GODARD, Hubert. Le souffle, le lien. Marsyas, Paris, n. 32, p. 27-31, déc. 1994.

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Ritmo do corpo: un atelier de danse contemporaine à l’UFRN

La relation au sol, la tension des pieds et du dos jouent de façon alternée sur le f lux respiratoire : l’inspir entraîne un redressement et une diminution des courbures de la colonne, un creusement de la voûte plantaire. Puis sur l’expir, les courbures de la colonne sont accentuées et la voûte plantaire s’atténue. Ce balancement, ce mouvement d’aller-retour automatique et involontaire, se transmet à l’ensemble du corps par le biais des fascias. Il s’accorde et s’intègre aux autres mouvements du corps.

Ondulation - flux et reflux - flexion et expansion

Le Rythme du Corps ne met pas en jeu un travail intentionnel sur l’activité respiratoire, en tant que technique ou méthode. La respiration fait cependant pleinement partie de la danse. Elle intervient de façon consciente à l’émergence du mouvement et en détermine la qualité expressive, les nuances, le phrasé. De la qualité du souffle dépend donc celle du geste mais aussi de l’espace qu’il engendre.

Avec la respiration, le mouvement part toujours du centre. Il rayonne à travers le corps et se propage au delà des extrémités. Le mouvement de rassembler - déployer introduit la diagonale dans le corps et active le dos, le prépare à l’accueil de l’espace arrière. La capacité de trouver un appui avec le dos permet une respiration tranquille, donc un rapport au monde apaisé.

Par l’interaction ouverture-fermeture, la respiration apporte au danseur la force nécessaire pour s’ex-poser dans une globalité du corps. Le souffle donne accès à l’intime et porte l’imaginaire. Chez Françoise Dupuy (2012) : le souffle circule à travers le corps, par les articulations comme lieux de passage, et se prolonge au delà des gestes. C’est par le souffle, en relation avec la qualité des appuis, qu’elle aborde la fluidité des bras.

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La respiration est aussi ce qui nous relie au passé tout en nous projetant dans l’avenir, elle est à la fois continuité et naissance, renouvellement dans cette continuité. Le f lux et le ref lux du mouvement, en lien avec les alternances de la respiration, sont les deux pôles d’un même vecteur. La qualité de l’un découle de l’autre, de la même façon que dans le mouvement dansé, la capacité de déployer dépend de celle de rassembler, d’offrir celle d’accueillir, de vider celle de remplir, d’aller celle de revenir… Traverser l’un comme l’autre de ces pôles, permet de trouver les élans et les appuis nécessaires pour explorer et enrichir les différents modes d’oppositions.

Poser sa présence, porter son regard

La qualité de présence est abordée par le travail rythmique sur les tensions, les durées, les accents, les silences, les variations de vitesse et de tonicité du mouvement, tous ces éléments qui entraînent une transformation profonde de la texture corporelle, qui modulent le régime expressif du geste, la relation au monde. Elle s’expérimente aussi par la relation aux autres. La présence est issue de cet état du corps en résonance avec la densité de l’espace. Elle est aussi liée à la mobilité du sternum, sa capacité d’ouverture et de fermeture qui permet au corps de s’exposer.

L’état de présence est modifié par la façon dont s’initie le mouvement : geste réalisé de façon volontaire, avec une intention donnée : spatiale, expressive, ou bien geste qu’on laisse advenir, comme s’il était provoqué de l’extérieur, en dehors de notre volonté. Cette mobilité imaginaire relie le mouvement au souffle, met le corps dans une qualité d’être agi par, dans une porosité avec l’espace, dans une écoute diffuse qui s’exerce par toute la surface de la peau.

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Le regard n’est pas travaillé de façon spécifique, mais il est actif, concret. Il fait partie de l’exploration des différentes qualités de présence, de tension et de densité corporelle mises en jeu, en lien avec la qualité des appuis. Le regard reflète, soutient et prolonge l’intention spatiale et expressive du mouvement. Il accompagne ainsi ses modulations dues à la respiration et aux mouvements induits de la colonne vertébrale. Il s’intègre au travail des successions - dans la colonne vertébrale reliée aux membres et aux extrémités. Porter son regard suppose une capacité de distanciation, et requiert une mobilité qui dégage le corps de tout agrippement : à une gravité extérieure, à l’environnement. Le regard est donc intégré au travail corporel et à la respiration pour développer cette mobilité.

Habiter sereinement son corps permet d’offrir ses gestes à l’autre, à l’extérieur, et de les accueillir en retour. La relation des appuis au sol, du corps à l’espace, génère une présence et une mobilité qui conjuguent porter et être portée.

Se placer à la marche

Nous pouvons nous placer dans un espace de danse en reposant sur nos deux appuis, placés en parallèle ou en légère ouverture, selon une organisation corporelle symétrique, dans un repos stable. Nous pouvons aussi, comme le suggère Françoise Dupuy (2012), nous placer à la marche : un appui repose par toute la plante du pied au sol, l’autre appui est en arrière, en contact au sol par l’avant du pied, comme lors d’une marche en suspens. Le poids du corps est légèrement en avant. L’appui arrière est actif, prêt pour la propulsion du corps. Cette situation favorise une stabilité mobile, active, permettant une réponse plus directe et immédiate du corps

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aux stimulations et aux projets de déplacement. Le corps est ancré sans être installé, il est entre deux moments ou entre deux actions.

Marcher

La marche apparait comme un acte simple et naturel. Pourtant, elle est paradoxalement un des mouvements les plus complexes de la danse. Difficile et immédiatement révélateur de la personnalité et de la qualité de présence du danseur. En fait, la marche n’a rien de naturel, comme il n’existe pas de “ façon naturelle” (MAUSS, 1999) chez l’adulte, nous dit Marcel Mauss. La marche procède d’une façon de faire acquise. Dans la danse, elle représente même un véritable choix esthétique, voire idéologique.

Si, selon Virgile, “la déesse se reconnaît à son pas” (VIRGILE(1845 apud DE CERTEAU, 1990, p. 101), le rythme de la marche, sa lourdeur ou sa légèreté, l’impact du pas sur le sol, permet d’identifier une personne, souvent bien avant de la voir. La marche nous révèle, elle reflète notre manière d’être au monde.

La marche n’a pas seulement pour objectif de nous conduire à un point d’arrivée, de porter notre intérêt vers ce point final. Comme pour les sculptures de Giacometti, ses hommes et ses femmes marchant, elle nous met avant tout dans l’expérience du traverser : traverser l’espace et être traversée par l’espace, s’en imprégner et s’ouvrir à ses vibrations, s’en éprendre plutôt que le prendre. Marcher nous met ainsi dans l’expérience du rythme, seule ou avec un groupe, un même c(h)œur, en relation étroite et profonde avec ce qui nous environne.

Le travail profond sur les différentes qualités de la marche prend en compte la sensibilité et la tactilité des pieds sur le sol, puis la façon dont le corps s’engage dans l’espace de danse. Françoise

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Dupuy (2012) n’utilise pratiquement jamais la marche quotidienne, où l’appui se fait sur les talons, mettant en quelque sorte le corps en retrait. Sur le plan de l’imaginaire, elle induit un certain refus, comme si le corps n’était pas complètement investi.

De la même façon, l’impact du talon au sol paraît plus rude et rompt avec la f luidité du déplacement, il va à l’encontre du continuum du mouvement. Cela devient évident lorsqu’on allonge le pas. Dans la course, où l’engagement du corps à l’espace est plus direct, la réception se fait sur l’avant du pied.

La métaphore du pinceau sur la feuille ou la toile peut décrire le déplacement du danseur : “le corps comme un pinceau”. Cette image correspond aussi à la façon dont le pied va se poser sur le sol : elle renvoie à la calligraphie, à ce qu’elle suppose de souplesse et de délicatesse du poignet, en lien avec le souffle. La marche par les orteils favorise donc une relation fine et sensible à l’espace, permettant la projection, le sens d’aller vers, l’engagement et l’investissement du corps dans et à travers l’espace.

Les pieds sont très actifs, impliquant le repousser des orteils, la maitrise du poids investi et la qualité de sa réception sur le sol. Les genoux marquent la direction du déplacement. Tout l’avant du corps traverse l’espace, corps et visage sont ouverts, le regard est vivant. La marche permet de travailler sur les qualités de poids, sur la réactivité et l’écoute, de prendre conscience des durées sonores et d’apprendre à les différencier.

Le déséquilibre apparaît comme le principal élément organisateur du pas, déclinant des gammes nuancées de tension-détente, de la suspension dirigée à la chute. Il entraîne le déplacement après un glissement du centre de gravité vers l’avant - ou l’arrière, comme réponse pour ne pas chuter, pour récupérer la verticalité après la micro-chute du premier transfert d’appui. Cette

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récupération peut s’effectuer immédiatement ou progressivement, sur un déplacement plus ou moins prolongé.

Avec le déroulement de la marche, la notion de déséquilibre s’estompe au profit d’un contrôle du transfert de poids par le centre et les appuis, pour maintenir une continuité, un legato dans le déplacement: sans à-coup, sans changement de niveau, avec l’idée de glisser en traversant l’espace. Il existe une unité entre le corps et la façon dont celui-ci aborde le sol. La marche est à la source des états du corps et elle en répercute les différentes nuances : abandon, résistance, concordance… Elle est déjà un geste expressif, non pas une simple transition, et fait entièrement partie du projet chorégraphique. Elle implique toute la colonne vertébrale et oblige le corps à être actif dans sa globalité, le mettant tout de suite en relation avec l’espace et exigeant sa coordination totale. Elle est pour Dalcroze le véritable point de départ de la conscience rythmique.

Le travail sur les déplacements, issu de l’héritage de Mary Wigman, met particulièrement en jeu le cercle et la figure du 8. Réalisés en parcours dans l’espace, ils sont aussi présents dans le corps, tracés par les coudes ou le bassin, par un pieds glissant sur le sol. Le pas, le pied qui se pose sur le sol sont aussi créateurs de son, dans toutes les nuances de sa tactilité : caresse, frappe, glissement, frottement, tapotement, effleurement…

Les mains

Dans sa Philosophie du geste, Michel Guérin met en dialogue les pieds et les mains en soulignant que “le geste […], c’est d’abord l’arc pied-main. Toutes les fois que les pieds affirment la droiture du corps, les mains répondent par un goût de saisir et de transformer une matière” (GUERIN, 2011, p. 28 ). Toutes les fois que les mains

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cherchent, repoussent, caressent, frappent, effleurent, flottent… les pieds répondent par une qualité d’appui différente, le corps imprime une présence inédite à l’espace. Il existe une relation subtile entre la plante du pied au contact du sol et la paume de la main au contact de l’air, comme celle de deux diaphragmes qui palpitent l’un avec l’autre, de deux peaux qui respirent l’une avec l’autre. Les mains offrent au corps un appui à l’espace, elles sont actives, indiquent une direction, confirment une tension. Elles accompagnent le corps dans son voyage expressif.

Vibrer

La vibration verticale permet d’éveiller la mobilité et l’allongement de la colonne vertébrale, de prendre conscience de l’axe de gravité par le sens du poids, de stimuler la relation à l’espace. Elle favorise la circulation du flux du mouvement à travers le corps, elle engendre sa circulation de façon rythmique. Françoise Dupuy (2001, p. 33) parle souvent de sens de rebond dans le mouvement, en lien avec la respiration. Elle suggère ainsi de “laisser rebondir le souffle”. Passer de la vibration verticale à l’oscillation horizontale est une façon d’explorer les possibles du mouvement. En augmentant l’amplitude, on arrive au rebond et à l’élan. En espaçant le repousser, on introduit une autre façon de trouver un allongement de la colonne vertébrale.

Contracter et détendre

Le travail sur les tensions permet de défaire les blocages qui restreignent la disponibilité du corps en explorant la contraction

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et la décontraction musculaire à tous leurs degrés de rapidité et d’intensité – de la crispation totale à l’atonie. Le corps rendu disponible est capable de répondre rapidement et avec précision aux stimuli, par des changements de direction, des arrêts, des chutes, des ruptures, des modifications du flux du mouvement. Le contrôle de la tonicité permet aussi d’atteindre une grande amplitude de mouvement sans raideur, et une subtilité sans mollesse. Comme le rappelle Laurence Louppe (2000), le travail sur le tensionnel n’engage pas un durcissement du corps, mais une variation des textures du mouvement, une alternance d’états organiques. Il permet d’accéder à une qualité d’écoute, une conscience de l’ancrage au sol, une présence active à l’espace et une réactivité aux appels. Cette qualité s’exerce, par exemple, dans les propositions de déplacements en zigzag.

La tension transforme aussi l’espace et le temps dans lesquels le corps s’inscrit. Une tension continue crée un rapport de résistance à l’espace. Si elle est soudaine, fulgurante, son intensité extrême provoque une rupture et un déchirement, à la fois de l’action et de l’espace, comme un cri qui répond à une nécessité intérieure ou qui réagit à un événement extérieur. Prise de façon progressive, elle installe un crescendo dramatique, un dialogue élastique avec l’espace.

Les variations de tension ref lètent et expriment les modifications des sentiments profonds de notre être. Les nuances du mouvement forment alors ce “chant intérieur” révélé par Dalcroze (1965). Le tensionnel est en effet l’endroit où le corps se bouleverse et s’anime. La maîtrise de sa propre force, de sa propre tonicité et de sa propre densité permet aussi de s’ajuster à celle de l’autre.

Lorsque le corps est en mouvement, la contraction provoque un blocage du flux. Le poids est comme suspendu, absent, puis il revient dans la détente. Le travail sur la contraction-détente est

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donc un moyen d’aborder la conscience du poids. Françoise Dupuy (2012) insiste particulièrement sur la détente du bassin, liée au poids, en opposition à la suspension de la cage thoracique ou de la tête. Cette notion de double direction dans le corps favorise la construction de la verticalité en lien avec la gravité, et donc de l’équilibre. Laisser agir la force gravitaire permet d’utiliser la force de réaction du support de manière efficace et économique.

Comme pour l’inspir et l’expir, il existe toujours des temps de repos entre chaque phase de la contraction-détente. La détente se fait dans une globalité du corps. Il est nécessaire de passer par la contraction pour atteindre la détente, et permettre la f luidité du mouvement. Le travail sur la contraction et la détente rend le corps disponible, à l’écoute des impulsions et perméable aux résonances des appels.

Impact et résonance

Françoise Dupuy rejoue ici la notion d’impact/impulse développée par Kurt Jooss dans son Tanztheater, pour caractériser le masculin et le féminin. L’impact, associé à l’énergie masculine, engage les actions de donner, de combattre ; l’impulse, associé à l’énergie féminine, engage des actions d’avantage liées aux notions d’accepter, de recevoir. Le masculin est également associé, chez Laban, au stabile : à l’équilibre, relié aux axes verticaux et horizontaux, et le féminin au labile : à la perte de l’équilibre, à la mobilité, reliés à la diagonale. Le stabile se situe d’avantage dans l’espace et le poids, le labile dans le temps et le flux. Le travail sur l’impact et la résonance avec les mots, par exemple : “Frapper ! - Il a frappé”, met en jeu la différenciation entre les énergies masculines et féminines, pour une expression plus dramatique du mouvement.

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Mobiliser la colonne vertébrale 

La colonne vertébrale est un centre de force, en interconnexion avec la respiration et la gravité. Pour éveiller la colonne vertébrale et préparer sa mise en mouvement, on peut commencer avec des vibrations verticales, sur place, comme on l’a vu précédemment.

La présence et l’expressivité du dos, la mobilité de la colonne vertébrale sont mises en jeu à travers les torsions, les courbes, les inclinaisons, les diagonales ou les spirales. Celles-ci viennent des recherches de Rudolf Laban (1998) sur les gammes de mouvements, rendues possibles grâce à la figure de l’icosaèdre, et sont un élément fondamental de la danse moderne. Elles imposent des lignes de tension très fortes dans l’espace.

La mobilité de la colonne est aussi travaillée dans le passage de la courbe à la ligne dans le corps. Dans les déplacements et les marches, la colonne vertébrale est engagée dans sa globalité. Le dos est toujours très présent et expressif. Il fait vivre l’espace arrière, dessinant la trace du mouvement dans l’espace.

Les mouvements de bras sont totalement reliés à la colonne vertébrale, ils bougent en résonance avec ses évolutions. Ils accompagnent le travail sur les courbes du dos: courbe avant en dessinant un volume rond devant, mains en regard du sternum ; inclinaisons latérales en dessinant un S horizontal, un coude vers le haut et l’autre vers le bas ; arche avec l’intérieur des bras arrondi vers le haut comme pour soutenir un grand volume en avant haut.

Dans les torsions, les bras sont côté bas ou dirigés vers le haut. Les bras aident à prendre conscience de la mobilité de la colonne, ils peuvent prolonger la direction des mouvements, mais Françoise Dupuy (2001) insiste aussi sur la capacité d’engager la colonne vertébrale dans toutes ses courbes, dynamiques et directions sans utiliser les gestes de bras, qui peuvent faire illusion quant à sa réelle mobilité.

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Successions

La mobilité de la colonne vertébrale est également travaillée dans les successions, sur le plan sagittal, latéral et en spirale. Françoise Dupuy (2001) utilise la barre du studio pour créer un point d’appui à partir duquel s’opère un éloignement. La succession n’est pas envisagée comme une forme, mais comme un acte continu, comme un déplacement à chaque instant de son déroulement. Elle est donc reliée à l’espace. Elle permet d’accéder à une verticalité sans raideur, parce que mobile, non figée, en déplacement constant.

La succession vertébrale s’envisage comme un mouvement ternaire : appui - déplacement - autre appui. Les mouvements déliés des bras se font aussi en succession. Comme pour la colonne vertébrale, la succession crée un agencement qui favorise la circulation du flux de l’énergie, qui ouvre des espaces. Laurence Louppe (2000) rappelle que le travail de la succession a été fondamental à l’origine de la danse moderne, et que selon Ted Shawn, François Delsarte en aurait été l’initiateur3. La succession est le seul moyen d’être sûr qu’on travaille avec le corps central, mettant en jeu les muscles profonds qui sont les mêmes qui font la spirale. Comme pour la contraction-détente, elle permet de faire voyager le curseur du poids.

Spirale 

La spirale est un geste fondateur chez Françoise Dupuy. Initiée par la tête ou le bassin, elle s’effectue dans un mouvement

3 LOUPPE, Laurence. Corps : matière poétique. Revue Quant à la Danse, n. 1, p. 106, 2004.

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ascendant ou descendant. Elle traverse la colonne vertébrale, l’entraîne en ouverture vers le haut ou en courbe vers le bas, et prolonge son rayonnement au delà du corps. Elle se déploie dans un mouvement sur ou hors l’axe de gravité, suivant alors des lignes diagonales. La spirale peut aussi tracer un parcours dans l’espace, ou définir une façon de se relever dans un mouvement volumique qui traverse le corps et se poursuit par un déplacement. Elle engage un rapport circulaire à l’espace.

La spirale suppose une liberté du torse. Elle existe dans le bassin avec le mouvement de la marche, dans les contractions et dans les sauts où elle s’organise tout au long de la colonne vertébrale. Elle est aussi liée à la résonance dans le mouvement en succession. Le déplacement en spirale dans l’espace implique que celle-ci soit déjà présente dans le corps : le trajet est inscrit dans le geste. Il en est de même pour le cercle ou la diagonale.

Élan et impulsion

Reliés à la notion d’impulsion, l’élan exprime le désir, le plaisir de la relation avec l’espace, le jaillissement de la nécessité intérieure qui fait naître le mouvement. L’élan correspond à la notion d’anacrouse développée par Jaques-Dalcroze (1965). Il est abordé dans une conscience du poids et des appuis. Le travail avec les tambours à main permet de prendre conscience de ce poids et d’en jouer à travers le balancer, le lancer et la réception de l’élan, en symbiose avec la respiration. L’élan est avant tout un aller vers, un échange et une mise en relation. Il projette le corps dans l’espace avec un engagement total de soi. L’élan déploie une énergie que l’on peut apprivoiser pour la développer, lui donner une direction, une adresse, une résolution dans l’espace et le temps.

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Aborder l’élan par un travail deux par deux, à travers des jeux d’impulsions données ou reçues sur une partie du corps, qui vont provoquer un déplacement selon la direction induite, en résonance avec l’intensité transmise, permet d’expérimenter le geste et le mouvement non volontaires, la sensation d’être agi par un événement inconnu et imprévu, le plaisir d’accueillir et se laisser surprendre par l’autre. On peut ensuite réinvestir cette expérience traversée dans une mise en mouvement à partir de nos propres impulsions et élans.

La vibration sonore du gong donne une autre sorte d’impulsion qui se diffuse à travers le corps des danseurs, le long de la colonne vertébrale, suscitant le déploiement du mouvement jusque dans les bras. L’élan déploie une parole que le corps inscrit dans l’espace.

Phrasé

Élément fondamental de la danse, le phrasé se dessine selon les quatre temps du partir, développer, arriver et reposer. Il part de la respiration et suppose une impulsion qui va toucher et affecter le corps, permettre au mouvement de s’organiser selon les altérations de la matière rythmique. Il se déroule en symbiose avec le souffle et en résonance de l’impulsion – extérieure ou intérieure, qui l’a fait naître. Le phrasé comme le rythme sont, chez Françoise Dupuy, respiratoires. Le corps disponible, dont l’état de présence est un équilibre entre le repos et l’action, accueille cette impulsion pour exprimer son mouvement dans une libération consciente.

Dans son travail musical et rythmique, Jaques-Dalcroze (1965) a insisté sur l’importance des différentes phases du phrasé : anacrouse ou temps de préparation, crouse ou départ

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puis déroulement de la phrase et métacrouse ou résolution du mouvement. S’il est important de prendre conscience et de préciser les initiations de mouvement, la résolution de la phrase est elle aussi fondamentale : suspensive ou conclusive par un impact, une chute, une contraction, un équilibre, en crescendo ou décrescendo d’énergie… elle en détermine l’intention et la portée symbolique.

Le phrasé peut aussi s’organiser en plusieurs impulsions, comporter différents accidents. Son sens de continuité n’exclut pas les contrastes par des accents, rebonds, balancements, micro-chutes ou par des silences, qui relancent ou suspendent un moment son déroulement et sa trajectoire. Le phrasé du mouvement est parfois porté par un phrasé musical. Mais le geste possède aussi sa propre musique intérieure, construite par la respiration et en amont, le sens du poids et de l’orientation.

Le silence révèle et sublime cette musicalité. Il permet au danseur de rentrer plus profondément dans son propre phrasé, d’exprimer sa polyrythmie intérieure, de choisir les modulations d’énergie, de durée et d’espace qui le singularisent, et d’affirmer ainsi son autonomie. Le phrasé dessine un chemin d’une attitude à une autre, d’un silence à un autre. Il est un espace entre - deux événements, deux points de l’espace, deux corps. “Tout geste qui se répète contient en lui même une notion de phrasé” (DUPUY, 2012, p. 82). Il est donc nécessaire d’écouter ce phrasé avant de commencer un nouveau mouvement, pour soi-même ou dans une situation pédagogique de transmission.

Accent

Elément du langage, de ses inflexions, et du champ musical, l’accent appartient avant tout aux expériences du corps : émotion,

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hoquet, trébuchement, palpitation, détournement passager de l’attention… qui perturbent le diaphragme et la respiration, modifient la circulation du f lux intérieur comme extérieur, perturbent le déplacement, captent l’attention, transforment l’intention. L’accent fait partie des nuances qui constituent le phrasé : sa place en fonde la qualité, en détermine le sens et en révèle la portée symbolique. Utilisé en début du phrasé, l’accent donne l’impulsion du mouvement. Au cours du phrasé, il introduit du sens en modulant l’expressivité du geste. À la fin du phrasé, il devient impact et crée un vide soudain qui résonne dans le corps et l’espace. Les accents, comme les contractions, entraînent une modification, voire la destruction de la forme. Ils se manifestent par une intensification fugace ou, comme le dit Laurence Louppe, une “chute intérieure du poids ou du mécanisme tensionnel qui intervient dans un mouvement” (LOUPPE, 2000, p. 170). L’utilisation ou la non-utilisation de l’accent révèle notre façon d’être au monde.

Contrastes et nuances

Les contrastes sont donnés par les oppositions de temps, de force, de poids, d’espace et de dynamique. Ils permettent les transformations même minimes du corps qui font que, pour Françoise Dupuy, le mouvement devient danse.

Les changements de vitesse provoquent, par la modification de la tension musculaire et donc de l’état de corps, des changements d’interprétation. Les moments de silence offrent des instants nécessaires de compréhension et de réflexion, les modifications d’amplitude de mouvement un autre angle de vue sur le propos. Le basculement d’un espace resserré à un espace très ouvert, aéré

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à dense, courbe à linéaire, intériorisé à adressé, transforme aussi la tension ressentie et partagée, interrogeant le risque, la menace, l’accueil, l’oppression, l’apaisement possibles.

Le silence complet est un des éléments de contraste les plus naturels, en musique comme dans le corps. Mais il peut aussi être un support à part entière de la danse, se démarquant ainsi d’une utilisation trop souvent systématique de la musique pour accompagner le mouvement.

Travailler les contrastes et les nuances permet d’exercer notre capacité de changer rapidement d’état de corps, notre faculté de passer en un instant d’une expression à une autre, d’un caractère ou tempérament à un autre. Il est nécessaire d’éprouver les extrêmes pour affiner ensuite les subtilités de nuances du mouvement.

Les variations de f lux, de tonicité peuvent naître d’un sentiment intérieur ou bien s’envisager comme une modification de l’espace - sa densité, sa texture, qui vont en retour contraindre le geste. Une interaction et une porosité existent entre le corps, le rythme et l’espace : les contrastes et les oppositions entre les matières du corps et de l’espace créent le rythme du mouvement.

Vitesse et durée

La durée fait partie des éléments constitutifs de la danse, elle est même, selon Françoise Dupuy (2001), ce qui fait qu’il y a danse. Les variations de vitesse et de durée du mouvement sont travaillées à travers la marche, les temps de silences, les situations de contractions - détentes. Les propositions à deux ou en groupe permettent d’expérimenter la réalisation simultanée de phrases de mouvements sur plusieurs vitesses, déclinées de la vitesse de base en double vitesse ou double lenteur.

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On peut observer alors les différences de qualités de présence corporelle liées aux variations de la tension musculaire, le contrôle de la continuité dans le geste, la qualité des appuis, l’écoute, la musicalité intérieure et la maitrise du tempo comme de la durée. C’est une proposition qui peut se réaliser sur une musique, en s’appuyant sur son tempo et ses mesures, ou bien dans le silence. Elle s’enrichit également d’une organisation spatiale, d’un jeu de contrastes rythmiques entre les danseurs, d’une palette de mouvements allant du geste quotidien, voire du signe, au mouvement dansé.

La vitesse et les durées sont expérimentées rythmiquement avec la marche, qui permet de représenter corporellement les valeurs de notes : noires, blanches, croches, triolets, silences, etc, d’expérimenter les accélérations et ralentis, les changements de vitesse, le passage d’une mesure à une autre par l’accentuation du premier temps ou par exemple, par un changement de direction dans l’espace, le passage d’un temps binaire à un temps ternaire. Toutes ces modulations sont réalisées grâce au contrôle du transfert de poids d’un appui à l’autre, qui engage aussi la globalité du corps car c’est le corps tout entier, nous rappelle Jaques-Dalcroze, qui doit être mis en mouvement pour créer le “sentiment rythmique” (JAQUES-DALCROZE, 1965, p. 39).

Dissociation 

La marche, lente ou rapide, ainsi que le déplacement en général, sont un moyen de travailler les dissociations, notamment entre le haut et le bas du corps. Un jeu s’établit entre le mouvement des pas, dont il faut gérer l’alternance du transfert de poids sans créer de rupture, et un mouvement legato dans le haut du corps,

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qui doit se libérer de l’influence du poids dans l’alternance des pas. Les deux mouvements s’exercent dans des plans différents: plutôt sagittal pour la marche et plutôt multiple pour le haut du corps. Ils engagent des tonicités opposées: flux contrôlé pour la marche et mouvement dans le haut du corps qui tend vers un flux libre.

Une autre approche, plus rythmique, de la dissociation est celle de la battue Dalcroze : la mesure musicale n’est pas donnée seulement avec la main, mais avec tout le corps. Elle se fait sur place ou en déplacement, joue avec le voyage du rythme dans le haut ou le bas du corps, engage tout le corps dans la représentation d’un rythme ou d’une mesure musicale avec la maîtrise tonique et spatiale que cela suppose. Elle développe la capacité de passer rapidement d’une vitesse de pas à une autre, dans la conscience et la régularité rythmique du tempo et des durées.

Françoise Dupuy prolonge ce dernier mouvement par un engagement du dos en courbe vers le bas, avec un sens de poids. Il se fait dans l’intention de “prendre la force de la terre”; le mouvement de 1 à 2 ramène cette force à soi ; puis les bras s’ouvrent, avec une projection vers l’avant, pour “aller vers l’autre”; le dernier mouvement relie le corps au ciel, avec cependant l’intention d’aller vers l’avant.

Le travail des dissociations révèle la polyrythmie du corps et la variété des nuances de son discours gestuels et expressif. Il met en jeu les modulations du poids, les accents et les silences, fait du corps en mouvement, selon Françoise Dupuy (2001, p. 26), une “palette vibrante de couleurs contrastées”. Il active, là encore, le curseur du poids par la séparation haut-bas. La séparation droite-gauche mobilise quant à elle cette articulation fondatrice qui rend possible la torsion, et donc la relation élastique à l’autre. L’importance du dos et la conscience de l’espace arrière, dissocié de l’espace avant, donnent une présence à tous les plans de l’espace.

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Suspension 

Elle intervient souvent à la suite d’un élan qui lance ou soulève le corps dans l’espace, depuis la verticalité ou à partir d’une chute opérant comme un tremplin pour se repousser. Pour Jaques-Dalcroze (1965), elle est une ponctuation de la phrase, un point rythmique, le point culminant d’un crescendo ou d’un décrescendo.

La suspension ne se fait pas sans une conscience forte des appuis : c’est par l’ancrage au sol – ou du moins une certaine qualité d’ancrage, nous le verrons ensuite – que peut s’accomplir un détachement flottant dans le haut du corps, c’est par l’opposition terre / ciel que la suspension peut vivre, d’où l’importance pour Françoise Dupuy du travail sur la qualité des appuis, sur le poids et la détente, sur le repousser et les double-directions dans le corps. La suspension contient l’idée d’envol, d’impulsion qui projette le corps vers le haut, dans l’aérien; elle n’est pas maintenue comme pour un vol, ou un état de flottaison. Plutôt qu’un état, la suspension est un passage : elle évolue vers une transformation, un nouveau rapport à l’espace. La suspension est un aller vers, fragile, transitoire, plus qu’une installation. Elle chemine, dans le corps et l’espace, plutôt qu’elle ne maintient le corps en planer. Elle joue avec l’élasticité de l’espace.

Ce cheminement vers le haut suscite un déplacement du sens de poids : des pieds vers l’oreille interne, avec l’idée d’aménager un sol interne. Puis elle conduit à un déséquilibre qui, par l’opération d’un glissement dans le centre moteur, projette le corps dans le déplacement, la détente ou la chute lente et conduite, ou encore en abandon brusque du poids. La suspension correspond à un moment de vide retrouvé, un silence où résonnent toutes les nuances des mouvements qui la précèdent. Elle ouvre sur une visibilité inédite de l’espace, comme lieu des réalisations et des possibles.

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Entrer dans la danse !

Tout ce travail autour du rythme, de la qualité de mouvement, de l’écoute, de la relation aux autres et à l’espace, s’accompagne généralement d’un instrument de percussion traditionnel: le tambour à main, qui s’apparente au bendir marocain, frappé avec la main ou avec une mailloche. L’utilisation du tambour à main était présente chez Jaques-Dalcroze (1965) comme chez Laban (1998). Françoise Dupuy se rapproche peut-être plus de Jaques-Dalcroze (1965) car elle se sert du tambour comme d’un instrument d’abord en lien avec la musique, moins chargé de mystique ou de chamanisme. Le tambour devient chez elle un prolongement spatial et rythmique du corps, ou le partenaire médiateur d’un dialogue permanent avec l’espace. Il rend visible la façon dont le corps s’investit pour donner vie au son dans toutes ses nuances de timbre et d’intensité. Il affine la sensibilité musicale reliée au corps et à l’espace.

L’utilisation du tambour marque une autre étape dans l’expérience du Rythme du Corps, il permet de l’approfondir, de l’ouvrir à d’autres possibilités de mise en mouvements, reliant de façon plus intime danse et musique, geste et son, forme et cheminement. Cette nouvelle étape reste donc à inventer, pour continuer, à travers les rencontres et les échanges à venir, de nourrir et enrichir notre propre danse, notre singularité.

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Références

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RITMO DO CORPOUM ATELIER DE DANÇA

CONTEMPORÂNEA NA UFRN

Isabelle DufauTraduzido por Marcilio de Souza Vieira

Encontros e descobertas

Os três dias de estágio com alunos e professores da UFRN de Natal permitiram experimentar o trabalho de Ritmo do Corpo, desenvolvido por Françoise Dupuy, dançarina e coreógrafa, figura emblemática da dança moderna na França. Esse trabalho diz respeito ao mesmo tempo à pesquisa, à transmissão e à criação. Ele fornece não apenas formas coreográficas mas também ferramentas fundamentais para que todos possam pensar, questionar, construir e enriquecer sua própria abordagem artística. Destina-se, portanto, a bailarinos e comediantes, músicos, circenses, de acordo com sua mobilidade e seu próprio nível técnico.

O Ritmo do Corpo carrega e desafia o legado de Jaques-Dalcroze (1948). Oferece uma relação com a música que envolve todo o corpo, que revela sua musicalidade interior e explora tanto a simbiose como a autonomia. Essa relação ressoa com o pensamento de Isadora Duncan (2003), para quem todo o corpo deve vibrar com os acordes da música; e o dançarino, para “traduzir as emoções”. Da mesma forma, para Jaques-Dalcroze (1948, p. 131): “não ouvimos música apenas com nossos ouvidos; você pode ouvi-la ressoando

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em todo o corpo, no cérebro e no coração”1. É através do ritmo que a dança pode chegar à poesia. É através do espaço ritmicamente construído que os corpos encontram sua expressividade e traba-lham seu significado antes de qualquer narração.

A transmissão do Ritmo do Corpo passa pela experimen-tação dos diferentes elementos da linguagem que o compõem. Portanto, abordaremos esses elementos principais descrevendo-os isoladamente, mesmo que na prática eles estejam em constante correlação entre si. Suas interações se abrem para mover e enri-quecer complexidades. Eles ajudam a tornar o corpo disponível, “acordado”, como Françoise Dupuy (2012) diz, e permitem explorar novos estados de presença, descobrir e experimentar novas qualidades, iniciações, frases e resoluções de movimento. A qualidade do movimento depende do que acontece antes e depois de ocorrer, como é preparado e como é concluído. A dança é então uma passagem, um entre dois estados de emoções, intenções, desejos. Um entre dois silêncios também. Em vez de falar sobre técnica e criação, Françoise Dupuy prefere falar sobre domínio e criatividade, combinados ao longo da jornada da dança. Alguns dos elementos foram testados durante esse primeiro estágio, outros podem ser objeto de um futuro encontro...

Criar o vazio

A construção do corpo é tão importante quanto a do espaço em que evolui. Criar seu espaço de dança requer primeiro ouvir seu próprio corpo, suas micro-oscilações, sua agitação interior. É necessário, então, permanecer em silêncio

1 JAQUES-DALCROZE, Émile. Notes bariolées. Genève: éd. Jeheber, 1948. p. 131.

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para permitir o surgimento de um movimento involuntário, sem precedentes e singular.

O vazio permitirá ao corpo encontrar esse silêncio, inibir alguns dos muitos movimentos que ele contém para organizar um em particular. Mas esse vazio não é nada, e criar o vazio não é estar produzindo uma ausência. Preencher um vazio abre um novo espaço, acomodando outro.

O vazio é esse meio favorável à criação, à transformação do corpo dos dançarinos e do público; atua como uma condição primária para dançar. O vazio também é real e concreto, e seu lugar essencial no corpo é a área que Françoise Dupuy chama de corpo central, locali-zado no nível do abdômen, um pouco abaixo do umbigo. É semelhante ao Hara japonês2, ou ao chakra sagrado na prática do yoga. O acesso a essa parte é possível ativando as extremidades.

O momento do vazio antes e depois de cada movimento é essencial, deve sempre ser questionado e definido, seja a dança improvisada seja a escrita. O vazio também constrói nossa relação com o espaço ao tomar consciência do que está em jogo, do que existe entre dois segmentos do corpo, dois apoios, dois (ou até vários) parceiros. Isso cria um estado de presença particular, denso e permeável, entre o ato e o ser exercido pelo que se desenrola, incha ou murcha entre as superfícies envolvidas. O corpo interage com o espaço esculpindo-o. Não é mais apenas a linha ou a direção do gesto que faz sentido, mas também o espaço, o volume que ele criou, que vibra entre duas superfícies do corpo.

2 GRAF DURCKHEIM, Karlfield. Hara, centre vital de l’homme. Paris: Le courrier du livre, 1974.

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Calar-se

O silêncio é outro tipo de vazio, cheio de vibrações. Comparado à dança, representa uma parada que abre um parên-tese: reter, suspender, questionar o fluxo e a energia do movimento. Estimula a escuta e gera a atenção participativa. Na oficina de dança, para o trabalho de preparação do corpo, é importante colocar os alunos em um estado de descanso, calmo, antes de começar a se mover.

O silêncio é para Jaques-Dalcroze (1965, p. 83) “o único elemento de contraste que pode enfatizar totalmente o movimento do som”3. Dá à dança sua respiração, seu espaço próprio, confere--lhe inteligibilidade e significado.

Antes do início da dança, ele instala um tempo e uma textura espacial dados pelo nível de tensão dos corpos presentes. É um silêncio ativo, que anuncia a qualidade da dança por vir. A aparente quietude dos corpos é carregada por uma vibração interna, aquela “ressonância interna” da qual Wassily Kandinsky (1989)4 fala.

Como as acentuações, os silêncios modificam a qualidade rítmica da dança. Parar o movimento dentro do fraseado pode representar uma ruptura completa, um bloqueio, como em contra-ções ou impactos. Também pode ser feito com uma qualidade de ressonância, que preserva e propaga a radiação do gesto para além do corpo, sem interromper a respiração. A suspensão então mantém o continuum do movimento. A parada também é vista

3 JAQUES-DALCROZE, Émile. Le rythme, la musique et l’éducation. Lausanne: éd. Fœtich, 1965. p. 83.

4 KANDINSKY, Wassily. Du spirituel dans l’art, et dans la peinture en particulier. Paris: Denoël, Folio Essais, 1989.

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em equilíbrio: uma terceira qualidade de silêncio, vibrante com microajustes, entre o estável e o instável, como o tempo lento, uma transição para uma extensão do gesto, uma queda ou um descanso.

O silêncio é inseparável de ouvir e respirar. Dançar em silêncio dá liberdade e autonomia ao movimento, torna perceptível a musicalidade interior do corpo, revela sua natureza íntima.

No trabalho de Ritmo do Corpo, a introdução de um silêncio mais ou menos prolongado, preparado ou inesperado, torna possível experimentar a escuta e a capacidade de resposta, a presença de apoio, a capacidade de manter o andamento. Essa qualidade ensina a consciência das durações e adquire regulari-dade. Em contrapartida, a relação dança-música, que integra a escuta musical, a atenção ao som produzido pelas batidas – mãos, bateria, passos ou respiração –, também é uma forma de desen-volver sensibilidade ao silêncio, às suas diferentes qualidades.

Respirar

A partir da alternância de inspiração e expiração, a respiração cria a relação de dentro para fora, determina nossas primeiras e essenciais trocas com o que nos rodeia e com os outros. A atividade respiratória e pulmonar é automática e voluntária. Varia de acordo com nossos gestos e emoções. Em um artigo dedi-cado à respiração, Hubert Godard (1994)5 observa essas variações no centro de gravidade devido ao simples ato de respirar, compen-sado por microrreajustes do sistema postural. Existe, portanto, um vínculo entre postura e respiração.

5 GODARD, Hubert. Le souffle, le lien. Marsyas, Paris, n. 32, p. 27-31, déc. 1994.

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A relação com o solo, a tensão dos pés e das costas atuam de maneira alternada no fluxo respiratório: a inspiração provoca um endireitamento e uma redução nas curvaturas da coluna vertebral, um alargamento do arco do pé. Na expiração, as curvaturas da coluna são acentuadas e o arco do pé é reduzido. Esse balanço, esse movimento de vaivém automático e involuntário, é transmitido a todo o corpo através das fáscias. Combina e se integra com outros movimentos do corpo.

Ondulação – fluxo e refluxo – flexão e expansão.

O Ritmo do Corpo não envolve trabalho intencional na atividade respiratória, como técnica ou método. Respirar é, no entanto, parte integrante da dança. Intervém conscientemente no surgimento do movimento e determina sua qualidade expressiva, suas nuances e seu fraseado. A qualidade da respiração depende, portanto, da qualidade do gesto, mas também do espaço que gera.

Com a respiração, o movimento sempre começa no centro. Ele irradia pelo corpo e se espalha para além das extremidades. O movimento de reunir-espalhar introduz a diagonal no corpo e ativa as costas, preparando-o para a recepção do espaço de trás. A capacidade de encontrar apoio nas costas permite que você respire com calma e, portanto, relacione-se com o mundo pacífico.

Com base na interação aberto-fechado, a respiração fornece ao dançarino a força necessária para se expor a todo o corpo. A respiração dá acesso ao íntimo e carrega a imaginação. Em Françoise Dupuy (2012), a respiração circula pelo corpo, pelas articulações como locais de passagem e se estende para além dos gestos. É pela respiração, em relação à qualidade do suporte, que ele aborda a fluidez dos braços.

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Respirar também é o que nos conecta ao passado enquanto nos projeta para o futuro; é continuidade e nascimento, renovação nessa continuidade. O fluxo e o refluxo do movimento, ligados à alternância da respiração, são dois polos do mesmo vetor. A qualidade de um segue a do outro, da mesma maneira que, no movimento da dança, a capacidade de espalhar depende da de reunir, de oferecer a de acolher, de esvaziar a de encher, de ir voltar... Atravessar um ou outro desses polos permite encontrar o ímpeto e o apoio necessários para explorar e enriquecer os diferentes modos de oposição.

Instaurar sua presença, seu olhar

A qualidade da presença é abordada pelo trabalho rítmico de tensões, durações, acentuações, descansos, variações de veloci-dade e tônus de movimento, todos esses elementos que provocam uma profunda transformação da textura corporal, que modulam o regime expressivo do gesto, a relação com o mundo. Também é experimentado pelo relacionamento com os outros. A presença vem desse estado do corpo em ressonância com a densidade do espaço. Também está ligado à mobilidade do esterno, sua capa-cidade de abertura e fechamento, que permite ao corpo se expor.

A qualidade da presença é modificada pela maneira como o movimento é iniciado: gesto realizado voluntariamente, com uma intenção: espacial, expressiva ou por gesto que é permitido acon-tecer, como se fosse causado por fora, fora da nossa vontade. Essa mobilidade imaginária conecta o movimento à respiração, coloca o corpo em uma qualidade de ação, na porosidade do espaço, em uma escuta difusa que é exercida por toda a superfície da pele.

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O olhar não é trabalhado especificamente, mas é ativo, concreto. Faz parte da exploração das diferentes qualidades de presença, tensão e densidade corporal envolvidas, em conexão com a qualidade do suporte. O olhar reflete, apoia e amplia a intenção espacial e expressiva do movimento. Assim, suporta suas modu-lações devido à respiração e a movimentos induzidos da coluna vertebral. Ele se integra ao trabalho das sucessões – na coluna vertebral conectada aos membros e às extremidades. Transportar o olhar supõe uma capacidade de distanciamento e requer uma mobilidade que liberte o corpo de qualquer aderência: para uma gravidade externa, para o meio ambiente. Portanto, o visual é integrado ao trabalho corporal e à respiração para desenvolver essa mobilidade.

Viver pacificamente em seu corpo permite que você ofereça seus gestos a outras pessoas de fora e os receba em troca. A relação de apoios no chão, do corpo para o espaço, gera uma presença e mobilidade que combinam carregar e ser carregado.

Colocar-se à la marche

Podemos nos colocar em um espaço de dança descansando em nossos dois suportes, colocados em paralelo ou em ligeira aber-tura, de acordo com uma organização corporal simétrica, em um descanso estável. Também podemos, como sugere Françoise Dupuy (2012), colocar-nos à la marche: um suporte repousa sobre toda a planta do pé no chão, o outro suporte está atrás, em contato com o solo pela frente do pé, como uma marcha interrupta, suspensa. O peso corporal é ligeiramente para a frente. O suporte traseiro está ativo, pronto para a propulsão do corpo. Essa situação promove estabilidade móvel e ativa, permitindo uma resposta mais direta e

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imediata do corpo às estimulações e aos projetos de deslocamento. O corpo está ancorado sem ser instalado, é entre dois momentos ou entre duas ações.

Andar

O caminhar parece um ato simples e natural. No entanto, é paradoxalmente um dos movimentos mais complexos da dança, difícil e imediatamente revelador da personalidade e da qualidade da presença do dançarino. De fato, caminhar não é natural, pois não há “caminho natural” no adulto, diz Marcel Mauss (1999)6. A caminhada prossegue de maneira adquirida. Na dança, repre-senta até uma escolha estética e ideológica real.

Se, de acordo com Virgile7, “a deusa se reconhece por seu passo”, o ritmo da caminhada, seu peso ou sua leveza, o impacto do passo no chão, possibilita identificar uma pessoa, muitas vezes muito antes de vê-la. A caminhada nos revela, reflete nossa maneira de estar no mundo.

O objetivo da caminhada não é apenas levar-nos a um ponto de chegada, trazer nosso interesse a esse ponto final. Assim como as esculturas de Giacometti, seus homens e mulheres caminhando, ela nos coloca acima de tudo na experiência de atravessar: atra-vessar o espaço e ser atravessado por ele, absorvendo-o e o abrindo para suas vibrações, sentir isso em vez de tomá-lo. Andar assim nos coloca na experiência do ritmo, sozinho ou com um grupo,

6 MAUSS, Marcel. Sociologie et anthropologie. 8. éd. Paris: Quadrige; PUF, 1999.

7 VIRGILE, Enéide, I, 405, cité par Michel de Certeau dans L’invention du quotidien, 1. arts de faire. Paris: Gallimard, Folio Essais, 1990. p. 147.

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um coração ou coro unido, em estreita e profunda relação com o que nos rodeia.

O trabalho profundo sobre as diferentes qualidades da caminhada leva em consideração a sensibilidade e o toque dos pés no chão, e a maneira como o corpo se envolve no espaço da dança. Françoise Dupuy (2012) quase nunca usa a caminhada diária, em que o apoio está nos calcanhares, colocando o corpo em uma situação de afastamento. No nível imaginário, induz uma certa rejeição, como se o corpo não estivesse completamente investido.

Da mesma forma, o impacto do calcanhar no chão parece mais áspero e rompe com a fluidez do movimento, indo contra o continuum do movimento. Torna-se óbvio quando você amplia o passo. Na corrida, em que o envolvimento do corpo com o espaço é mais direto, o pouso é feito no antepé.

A metáfora do pincel na folha ou na tela pode descrever o movimento do dançarino: “o corpo feito pincel”. Essa imagem também corresponde à maneira como o pé vai pousar no chão: refere-se à caligrafia, ao que supõe flexibilidade e delicadeza do punho, em conexão com a respiração. Andar pela parte dianteira dos pés promove, portanto, uma relação fina e sensível com o espaço, permitindo a projeção, a direção a seguir, o comprometi-mento e o investimento do corpo no e através do espaço.

Os pés são muito ativos, envolvendo repelir os dedos, controlar o peso investido e a qualidade de sua recepção no chão. Os joelhos marcam a direção da caminhada. Toda a frente do corpo atravessa o espaço, corpo e rosto estão abertos, o olhar está vivo. Caminhar torna possível trabalhar nas qualidades de peso, capacidade de resposta e audição, tomar consciência das durações dos sons e aprender a diferenciá-las.

O desequilíbrio aparece como o principal elemento organi-zador do passo, explorando a gama nuançada entre relaxamento e

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tensão, suspensão direcionada e queda. Causa deslocamento após deslizar o centro de gravidade para frente – ou para trás, como uma resposta para não cair, para recuperar a verticalidade após a microqueda da primeira transferência de suporte. Essa recuperação pode ser feita imediata ou gradualmente durante uma caminhada mais ou menos prolongada.

Com o progresso da caminhada, a noção de desequilíbrio desaparece em favor de um controle da transferência de peso pelo centro e pelos suportes, para manter a continuidade, um “legato” no movimento: suavemente, sem alteração de nível, com a ideia de deslizar pelo espaço. Existe uma unidade entre o corpo e a maneira como ele se aproxima do chão. Caminhar é a fonte dos estados do corpo e reflete as diferentes nuances: abandono, resistência, concordância... Já é um gesto expressivo, não uma transição simples, e é parte integrante do projeto coreográfico. Envolve toda a coluna, e força o corpo a ser ativo por inteiro, colocando-o imediatamente em contato com o espaço e exigindo sua total coordenação. Para Dalcroze (1965), é o verdadeiro ponto de partida da consciência rítmica.

O trabalho sobre deslocamentos, da herança de Mary Wigman, particularmente põe em jogo o círculo e a figura do 8. Realizados no espaço, eles também estão presentes no corpo, traçados pelos cotovelos ou pela pélvis, por um pé deslizando no chão. O passo, o pé que é colocado no chão, também é criador do som, com todas as nuances de sua tatilidade: carícia, golpe, escorregão, fricção, batida, toque...

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Mãos

Em sua obra Filosofia do gesto, Michel Guérin (2011, p. 37)8 coloca os pés e as mãos em diálogo enfatizando que “o gesto [...] é antes de tudo o arco pé-mão. Sempre que os pés afirmam a reatitude do corpo, as mãos respondem com gosto pela apreensão e transfor-mação da matéria”.

Sempre que as mãos procuram, empurram, acariciam, golpeiam, tocam, flutuam, os pés respondem com uma qualidade diferente de apoio, o corpo dá uma presença sem precedentes ao espaço. Existe uma relação sutil entre a planta do pé em contato com o solo e a palma da mão em contato com o ar, como a de dois diafragmas que pulsam entre si, de duas peles que respiram uma ao encontro da outra.

As mãos dão suporte ao corpo no espaço, são ativas, indicam uma direção, confirmam uma tensão. Eles acompanham o corpo em sua jornada expressiva.

Vibrar

A vibração vertical possibilita despertar a mobilidade e o alongamento da coluna, tomar consciência do eixo de gravidade pela direção do peso, estimular a relação com o espaço. Promove a circulação do fluxo de movimento através do corpo, gera sua circulação de maneira rítmica. Françoise Dupuy (2001, p. 33) frequentemente fala sobre a faculdade de ricochete — rebound — no movimento, ligada à respiração. Ela sugere, assim, “deixar

8 GUERIN, Michel. Philosophie du geste. Arles: Actes Sud, 2011. p. 37.

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o sopro ricochetear”. Passar da vibração vertical à oscilação hori-zontal é uma maneira de explorar as possibilidades de movimento. Ao aumentar a amplitude, chegamos ao ricochete e ao elance. Ao espaçar a frequência do empurrar, apresentamos outra maneira de encontrar um alongamento da coluna vertebral.

Contratar e relaxar

Trabalhar com as tensões ajuda a quebrar os bloqueios que restringem a disponibilidade do corpo, explorando a contração e o relaxamento muscular em todos os seus graus de velocidade e intensidade — da tensão total à atonia. O corpo disponibilizado é capaz de responder rápida e precisamente a estímulos, por mudanças de direção, paradas, quedas, rupturas, mudanças no f luxo de movimento. O controle do tônus muscular também permite alcançar uma grande variedade de movimentos sem rigidez e uma sutileza sem moleza. Como Laurence Louppe (2000)9 lembra, o trabalho do tônus muscular não envolve um endurecimento do corpo, mas uma variação das texturas do movimento, uma alternância de estados orgânicos. Ele fornece acesso à qualidade da audição, conscientização do aterramento, presença ativa no espaço e capacidade de resposta às chamadas. Essa qualidade é exercida, por exemplo, em propostas de cami-nhadas em zigue-zague.

A tensão também transforma o espaço e o tempo em que o corpo está inscrito. A tensão contínua cria uma relação de resis-tência com o espaço. Se é repentina, deslumbrante, sua extrema

9 LOUPPE, L. Poétique de la danse contemporaine. Bruxelles: Contredanse, 2000. p. 164.

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intensidade causa uma ruptura e um rasgo, tanto da ação como do espaço, como um grito que responde a uma necessidade interna ou que reage a um evento externo. Tomado gradualmente, estabelece um crescendo dramático, um diálogo elástico com o espaço.

Variações na tensão refletem e expressam mudanças nos sentimentos profundos de nosso ser. As nuances do movimento formam então essa “canção interior” revelada por Dalcroze (1965). A tensão muscular é realmente o lugar onde o corpo se comove e ganha vida. Dominar a própria força, o próprio tônus e a própria densidade também permite ajustar-se ao tônus do outro.

Quando o corpo está em movimento, a contração causa bloqueio do fluxo. O peso é como suspenso, ausente, depois retorna em relaxamento. O trabalho de contração-relaxamento é, portanto, uma maneira de abordar a percepção do peso. Françoise Dupuy (2012) insiste particularmente no relaxamento da pelve, ligado ao peso, em oposição à suspensão da caixa torácica ou da cabeça. Essa noção de dupla direção no corpo promove a construção da verti-calidade em conexão com a gravidade e, portanto, do equilíbrio. Deixar a força gravitacional agir permite que a força de reação do suporte seja usada de maneira eficaz e econômica.

Como na inspiração e na expiração, sempre há tempos de descanso entre cada fase do processo de contração-relaxa-mento. O relaxamento ocorre em todo o corpo. É necessário passar pela contração para alcançar o relaxamento e permitir a f luidez do movimento. O trabalho de contração e relaxamento torna o corpo disponível à escuta dos impulsos e permeável às ressonâncias dos chamados.

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Impacto e ressonância

Françoise Dupuy (2012) reitera ainda a noção de impacto/impulso desenvolvida por Kurt Jooss em seu Tanztheater para caracterizar o masculino e o feminino. O impacto, associado à energia masculina, envolve as ações de dar, de lutar; o impulso, associado à energia feminina, engaja-se em ações de vantagem ligadas às noções de aceitar, de receber. O masculino também está associado, em Laban, ao estável: ao equilíbrio conectado aos eixos vertical e horizontal; e o feminino, por sua vez, ao lábil: à perda do equilíbrio, à mobilidade, à diagonal. O estável é mais presente no espaço e no peso; o lábil, no tempo e no fluxo. Trabalhar o impacto e a ressonância com as palavras, por exemplo, “Bater! – Ele atacou”, põe em jogo a diferenciação entre as energias masculina e feminina para uma expressão mais dramática do movimento.

Mobilizar a coluna vertebral

A coluna vertebral é um centro de força interligado à respiração e à gravidade. Para despertar a coluna e se preparar para colocá-la em movimento, podemos começar com vibrações verticais, no local, como vimos anteriormente.

A presença e a expressividade das costas e a mobilidade da coluna vertebral são colocadas em jogo através de torções, curvas, inclinações, diagonais ou espirais. Elas vêm da pesquisa de Rudolf Laban (1998) sobre as amplitudes de movimentos possibilitadas pela figura do icosaedro, e são um elemento fundamental da dança moderna. Elas impõem linhas muito fortes de tensão no espaço.

A mobilidade da coluna também é trabalhada na passagem da curva para a linha no corpo. Nos deslocamentos e caminhadas,

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a coluna vertebral está envolvida em sua totalidade. O dorso é sempre muito presente e expressivo, dá vida ao espaço de trás, desenhando o rastro de movimento no espaço.

Os movimentos do braço estão totalmente conectados à coluna vertebral, movem-se em ressonância com suas evoluções. Eles acompanham o trabalho nas curvas das costas: curva frontal desenhando um volume redondo na frente, mãos voltadas para o esterno; inclinações laterais desenhando um S horizontal, um dobrado para cima e o outro para baixo; arco com a parte interna dos braços arredondada para cima, como se quisesse suportar um grande volume no topo.

Em torções, os braços estão do lado para baixo ou dire-cionados para cima. Os braços ajudam a tomar consciência da mobilidade da coluna vertebral, podem estender a direção do movimento, mas Françoise Dupuy (2012) também insiste na capacidade de envolver a coluna vertebral em todas as suas curvas, dinâmicas e direções sem usar gestos nos braços, que pode ser uma ilusão quanto à sua verdadeira mobilidade.

Sucessões

A mobilidade da coluna vertebral também é trabalhada em sucessões, nos planos sagital, vertical e horizontal. Françoise Dupuy usa a barra do estúdio para criar um ponto de suporte a partir do qual se afastar. A sucessão não é vista como uma forma, mas como um ato contínuo, como um deslocamento a cada momento de seu desenvolvimento. Então, está conectado ao espaço. Proporciona verticalidade sem rigidez, pois é móvel, não congelado, em constante movimento.

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A sucessão da coluna vertebral é vista como um movimento ternário: apoio – deslocamento – outro apoio. Os movimentos soltos dos braços também são feitos em sucessão. Como na coluna vertebral, a sucessão cria um arranjo que promove o fluxo de energia, o que abre espaços. Laurence Louppe lembra que o trabalho da sucessão foi fundamental para a origem da dança moderna e que, segundo Ted Shawn, François Delsarte teria sido o iniciador10. A sucessão é a única maneira de ter certeza de que você está trabalhando com o corpo central, envolvendo os músculos profundos, que são os mesmos que fazem a espiral. Tal como acontece com a contração-relaxamento, ela permite que o controle deslizante do peso viaje.

Espiral

A espiral é um gesto fundador em Françoise Dupuy. Iniciado pela cabeça ou pelve, é realizada em um movimento para cima ou para baixo. Atravessa a coluna vertebral, puxa-a para cima ou se curva para baixo e estende sua radiação para além do corpo. Ela é implantada em um movimento dentro ou fora do eixo de gravidade, seguindo as linhas diagonais. A espiral também pode traçar um percurso no espaço ou definir uma maneira de subir em um movimento de volume que atravessa o corpo e continua com um deslocamento. Ela gera uma relação circular com o espaço.

A espiral supõe a liberdade do torso. Existe na pelve com o movimento de caminhar, nas contrações e nos saltos pelos quais se organiza ao longo da coluna vertebral. Também está ligada à

10 LOUPPE, Laurence. Corps : matière poétique. Revue Quant à la Danse, n. 1, p. 106, 2004.

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ressonância do movimento em sucessão. O movimento espiralar no espaço implica que ele já está presente no corpo: o caminho está escrito no gesto. É o mesmo para o círculo ou a diagonal.

Enlace e impulso

Ligado à noção de impulso, o enlance expressa o desejo, o prazer da relação com o espaço, a manifestação da necessidade interior que dá origem ao movimento. O enlace corresponde ao conceito de anacruse desenvolvido por Jaques-Dalcroze (1965). É abordado com uma consciência de peso e apoio. Trabalhar com o tambor (bendir) permite que você se conscientize desse peso e o experimenta através do balanço, do lançamento e do recebimento de impulso em simbiose com a respiração. O enlace é acima de tudo um movimento, uma troca e uma conexão. Ele projeta o corpo no espaço com total comprometimento. O impulso emprega uma energia que podemos domar para desenvolvê-lo, dar-lhe uma direção, um endereço, uma resolução no espaço e no tempo.

A aproximação do enlace – trabalhando dois a dois, por meio de conjuntos de impulsos dados ou recebidos em uma parte do corpo, o que causará um deslocamento na direção induzida, em ressonância com a intensidade transmitida – permite experi-mentar o gesto e o movimento não voluntário, a sensação de ser acionado por um evento desconhecido e imprevisto, o prazer de acolher e ser surpreendido pelo outro. Podemos então reinvestir essa experiência cruzada em um movimento a partir de nossos próprios impulsos e enlaces.

A vibração sonora do gongo dá outro tipo de impulso que se difunde pelos corpos dos dançarinos, ao longo da espinha,

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causando a propagação do movimento para os braços. O enlace emprega uma palavra que o corpo inscreve no espaço.

Fraseado

Elemento fundamental da dança, o fraseado toma forma de acordo com os quatro tempos de partida, desenvolvimento, chegada e descanso. Ele parte da respiração e supõe um impulso que toca e afeta o corpo, permitindo que o movimento se orga-nize de acordo com as alterações da matéria rítmica. Ocorre em simbiose com a respiração e em ressonância do impulso – externo ou interno, que lhe deu origem. O fraseado como o ritmo é, para Françoise Dupuy, respiratório. O corpo disponível, cujo estado de presença é um equilíbrio entre descanso e ação, recebe esse impulso para expressar seu movimento em uma libertação consciente.

Em seu trabalho musical e rítmico, Jaques-Dalcroze (1965) insistiu na importância das diferentes fases do fraseado: anacruse ou tempo de preparação, cruse ou partida, depois progressão da frase e metacruse ou resolução do movimento. Se é importante estar ciente e especificar as iniciações do movimento, a resolução da sentença também é fundamental: suspensiva ou conclusiva por um impacto, uma queda, uma contração, um equilíbrio, em crescente ou decrescendo de energia... determina sua intenção e seu significado simbólico.

O fraseado também pode ser organizado em vários impulsos, envolvendo diferentes acidentes. Seu senso de conti-nuidade não exclui contrastes de acentuações, rebotes, oscilações, microquedas ou descansos, que revivem ou suspendem por um momento seu curso e sua trajetória. O fraseado do movimento às vezes é realizado por um fraseado musical. Mas o gesto também

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tem sua própria música interior, construída pela respiração e, anteriormente, pela sensação de peso e orientação.

O silêncio revela e sublima essa musicalidade. Permite ao dançarino aprofundar-se em seu próprio fraseado, expressar sua polirrítmica interna, escolher as modulações de energia, duração e espaço que o diferenciam e, assim, afirmar sua autonomia. O fraseado traça um caminho de uma atitude para outra, de um silêncio para outro. É um espaço entre — dois eventos, dois pontos de espaço, dois corpos. “Todo gesto repetitivo contém em si uma noção de fraseado” (DUPUY, 2012, p. 155)11. Portanto, é necessário ouvir esse fraseado antes de iniciar um novo movimento, para si ou em uma situação pedagógica de transmissão.

Acentuação/acento

Elemento da linguagem, de suas inf lexões e do campo musical, o acento pertence sobretudo às experiências do corpo: emoção, soluços, tropeços, palpitações, desvio transitório da atenção... que perturbam o diafragma e a respiração, modificam a circulação de fluxos internos e externos, perturbam o movi-mento, captam a atenção, transformam a intenção. O acento é uma das nuances que compõem o fraseado: seu lugar estabelece sua qualidade, determina seu significado e revela sua dimensão simbólica. Utilizado no início do fraseado, o acento dá impulso ao movimento. Durante o fraseado, introduz significado modulando a expressividade do gesto. No final do fraseado, torna-se impacto e cria um vazio repentino que ressoa no corpo e no espaço.

11 DUPUY, F. On ne danse jamais seul - Ecrits sur la danse. Villers-Cotterets: éd. Ressouvenances, 2012. p. 155.

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Acentuações, como contrações, levam à modificação ou mesmo à destruição do formulário. Elas se manifestam por uma intensificação fugaz ou, como Laurence Louppe (2000, p. 170)12 diz, por uma “queda interna de peso ou no mecanismo tensional que intervém em um movimento”. Usar ou não a acentuação revela nosso modo singular de estar no mundo.

Contrastes e nuances

Os contrastes são dados pelas oposições de tempo, força, peso, espaço e dinâmica. Permitem as transformações, as vezes mínimas, do corpo para que, segundo Françoise Dupuy, o movi-mento se torne dança.

As mudanças na velocidade causam, pela modificação da tensão muscular e, portanto, do estado do corpo, mudanças de interpretação. Os momentos de silêncio oferecem um tempo necessário de compreensão e reflexão, mudanças na amplitude de movimento, outro ângulo de visão sobre o assunto. A mudança de um espaço apertado para um espaço muito aberto, arejado para denso, curvado para linear, internalizado para endereçado (direcionado), também transforma a tensão sentida e comparti-lhada, questionando o risco, a ameaça, o acolhimento, a opressão, o possível apaziguamento.

O silêncio completo é um dos elementos mais naturais de contraste, tanto na música quanto no corpo. Mas também pode ser um apoio completo à dança, diferenciando-se assim do uso sistemático da música para acompanhar o movimento.

12 LOUPPE, L. Poétique de la danse contemporaine. Bruxelles: éd. Contredanse, 2000. p. 170.

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Trabalhar em contrastes e nuances nos permite exercitar nossa capacidade de mudar rapidamente os estados corporais, nossa capacidade de passar instantaneamente de uma expressão para outra, de um personagem ou temperamento para outro. É necessário experimentar os extremos para refinar as sutilezas das nuances do movimento.

As variações no fluxo e no tônus podem surgir de um senti-mento interior ou até mesmo ser consideradas uma modificação do espaço — sua densidade, sua textura, que, por sua vez, restringirão o gesto. Há uma interação e uma porosidade entre o corpo, o ritmo e o espaço: os contrastes e oposições entre os materiais do corpo e do espaço criam o ritmo do movimento.

Velocidade e duração

A duração é um dos elementos constitutivos da dança, é até, segundo Françoise Dupuy (2012), o que faz a dança acontecer. As variações de velocidade e duração do movimento são traba-lhadas pela caminhada, pelos momentos de silêncio, pelas situações de contração-relaxamento. As propostas em pares ou em grupos permitem experimentar a realização simultânea de sentenças de movimento em várias velocidades, a partir da velocidade básica, experimentando velocidade dupla ou lentidão dupla.

Podemos então observar as diferenças na qualidade da presença corporal ligadas às variações na tensão muscular, ao controle da continuidade no gesto, à qualidade do suporte, à escuta, à musicalidade interna e ao controle do andamento e da duração. É uma proposição que pode ser realizada na música, com base em seu andamento e em suas medidas, ou em silêncio. Também é enriquecido por uma organização espacial, um jogo

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de contrastes rítmicos entre os dançarinos, uma paleta de movi-mentos que vão desde o gesto cotidiano, ou mesmo do signo, até o movimento da dança.

A velocidade e as durações são experimentadas ritmi-camente com a caminhada, o que torna possível representar os valores das notas fisicamente: preto, branco, colcheias, trigêmeos, descansos etc., para experimentar aceleração e desaceleração, mudanças de velocidade, passagem de uma medida para outra pela acentuação da primeira batida ou, por exemplo, por uma mudança de direção no espaço, a passagem de um tempo binário para um tempo ternário. Todas essas modulações são realizadas graças ao controle da transferência do peso de um suporte para o outro, que também envolve todo o corpo porque é o corpo inteiro, lembra Jaques-Dalcroze (1965, p. 39), que deve ser acionado para criar o “sentimento rítmico”13.

Dissociação

Andar devagar ou rápido, assim como o movimento em geral, é uma maneira de trabalhar em dissociações, principalmente entre a parte superior e inferior do corpo. Um jogo é estabelecido entre o movimento dos passos, cuja alternância de transferência de peso deve ser gerenciada sem criar uma pausa, e um movimento de “legato” na parte superior do corpo, que deve ser liberado da influência do peso no corpo na alternância dos passos. Os dois movimentos são exercidos em planos diferentes: principalmente sagital para caminhar, e múltiplo para a parte superior do corpo.

13 JAQUES-DALCROZE, Émile. Le rythme, la musique et l’éducation. Lausanne: éd. Fœlisch, 1965. p. 39.

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Eles envolvem tonalidades opostas: fluxo controlado para cami-nhar e movimento na parte superior do corpo, que tende a um fluxo livre.

Outra abordagem mais rítmica da dissociação é a da batida Dalcroze: a medida musical não é dada apenas com a mão, mas com todo o corpo. É feito no local ou em deslocamento, brinca com a jornada do ritmo na parte superior ou inferior do corpo, envolve todo o corpo na representação de um ritmo ou de uma medida musical com o controle tônico e espacial que isso implica. Ela desenvolve a capacidade de se mover rapidamente de um ritmo para outro, na consciência e na regularidade rítmica do andamento e das durações.

Françoise Dupuy (2012) estende esse último movimento, envolvendo as costas em uma curva descendente, com uma sensação de peso. É feito com a intenção de “tomar a força da terra”; o movi-mento de 1 para 2 traz essa força para si; então os braços se abrem, com uma projeção para a frente, para “ir para o outro”; o último movimento conecta o corpo ao céu, com a intenção de avançar.

O trabalho das dissociações revela a polirrítmica do corpo e a variedade de nuances de sua fala gestual e expressiva. Coloca em jogo as modulações de peso, acentuações e descansos, faz do corpo em movimento, segundo Françoise Dupuy (2012, p. 82), uma “paleta vibrante de cores contrastantes”. Ele ativa, nesse caso também, o cursor do peso pela separação entre parte de cima e parte de baixo. A separação direita-esquerda mobiliza essa articu-lação fundadora que torna possível a torção e, portanto, a relação elástica com outra pessoa. A importância das costas e a consciência do espaço de trás, dissociadas do espaço frontal, dão presença a todos os planos do espaço.

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Suspensão

Geralmente ocorre após um momento que lança ou eleva o corpo no espaço, da vertical ou de uma queda, operando como trampolim para repelir. Para Jaques-Dalcroze (1965), é uma pontu-ação da frase, um ponto rítmico, o culminar de um crescendo ou um decrescendo.

A suspensão não acontece sem uma forte conscientização dos suportes: é ancorando no chão — ou com certa qualidade de ancoragem, como veremos mais adiante — que um destacamento flutuante pode ser realizado no topo do corpo, é pela oposição terra/céu que a suspensão pode viver, daí a importância para Françoise Dupuy de trabalhar a qualidade do apoio, do peso e do relaxamento, do ato de empurrar, das duplas direções no corpo.

A suspensão contém a ideia de voo, de um impulso que projeta o corpo para cima, numa qualidade aérea; não é mantido como em um voo ou em um estado de flutuação. Mais do que um estar, a suspensão é um passar: evolui para uma transformação, uma nova relação com o espaço. A suspensão é um ir em direção a, frágil, transitório, mais do que uma instalação. Viaja pelo corpo e pelo espaço, em vez de manter o corpo pairando sobre ele. Brinca com a elasticidade do espaço.

Esse movimento ascendente causa uma mudança no sentido do peso: dos pés ao ouvido interno, com a ideia de criar um solo interno. Em seguida, leva a um desequilíbrio que, pela operação de um escorregamento no centro motor, projeta o corpo em deslo-camento, no relaxamento ou na queda lenta e dirigida, ou mesmo na perda abrupta do peso.

A suspensão corresponde a um momento de vazio redescoberto, um silêncio em que ressoam todas as nuances dos

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movimentos que a precedem. Ela abre sobre uma visibilidade sem precedentes do espaço, como lugar de realizações e possibilidades.

Entrar na dança!

Todo esse trabalho sobre ritmo, qualidade de movimento, escuta, relacionamento com os outros e com o espaço geralmente é acompanhado por um instrumento de percussão tradicional: o tambor de mão, que é semelhante ao Bendir marroquino, tocado com a mão ou com uma baguete. O uso do tambor manual estava presente em Jaques-Dalcroze (1965), bem como em Laban (1998). Françoise Dupuy (2012) pode estar mais perto de Jaques-Dalcroze (1965) porque ela usa o tambor como um instrumento antes de tudo musical, menos carregado de misticismo ou xamanismo. O tambor torna-se nela uma extensão espacial e rítmica do corpo, ou o parceiro mediador de um diálogo permanente com o espaço. Torna visível a maneira como o corpo investe para dar vida ao som em todas as suas nuances de timbre e intensidade. Refina a sensibilidade musical ligada ao corpo e ao espaço.

O uso do tambor marca outro estágio da experiência do Ritmo do Corpo, permite aprofundá-lo, abri-lo a outras possibi-lidades de entrar em movimento, conectando de maneira mais íntima a dança e a música, o gesto e o som, a forma e o procedi-mento. Portanto, essa nova etapa ainda precisa ser investigada, para continuar, por meio dos encontros e trocas que virão, a nutrir e enriquecer nossa própria dança, nossa singularidade.

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Referências

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LE DISPOSITIF VIDÉO-NUMÉRIQUE COMME ÉLÉMENT

DE L’ÉCRITURE SCÉNIQUE UNE EXPERIMENTATION DANS LE

CADRE DU PROJET “IMERSÕES POÉTICO-ACADÊMICAS” À LUFRN, NATAL

Clermont PITHAN

Mon parcours de chercheur

En tant que régisseur général dans un théâtre municipal de la banlieue parisienne, je m’occupe de l’accueil technique des spectacles programmés pour chaque saison culturelle. Je suis également amené à créer des régies lumière, vidéo et plateau pour des artistes invités, des associations, et aussi pour mon propre travail artistique. Ce travail a commencé au Brésil où j’ai accompagné de nombreuses compagnies de théâtre, de cirque et de danse, dans différents lieux culturels, officiels ou alternatifs. J’ai moi-même été danseur, acteur et même clown dans un cirque traditionnel. Je me suis alors intéressé à la lumière et j’ai choisi d’orienter mon parcours vers cet aspect plus technique du spectacle vivant, qui me permet cependant d’exprimer toute ma créativité artistique.

Après une licence en danse à L Université de Campinas (UNICAMP), les formations et stages que j’ai suivis ont été des habilitations techniques ou des validations d’acquis liées à la

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maîtrise des technologies en usage dans le cadre professionnel, comme par exemple le contrôle des projecteurs automatiques associés aux consoles numériques, ou encore des habilitations en électricité ou pour l’utilisation d’agrès. La reprise des études universitaires dans le contexte de mon parcours et de mon travail quotidien de machiniste, a permis de remettre ce parcours en question à travers les outils de la réflexion académique confrontés à l’expérience pratique du plateau. Le fait de revenir sur le terrain professionnel après chaque cours, de confronter la réflexion à la pratique - sur la place du théâtre dans notre société, sur ses principes fondamentaux - a été un véritable moteur.

Dans la continuité de mon travail et de mes recherches sur les interactions entre évolutions techniques de la lumière de plateau et écriture scénique, je me suis intéressé aux dispositifs vidéo-numériques qui mettent en jeu les nouvelles technologies numériques. La possibilité de relier recherche théorique et expérience pratique de création a permis de concrétiser une démarche qui valorise le collectif, qui met l’agencement numérique au service d’une dramaturgie, qui confronte et associe les différents langages artistiques.

Les nouvelles pratiques numériques liées au théâtre font émerger divers registres de présence de l’acteur sur scène. Béatrice Picon-Vallin (1998, p. 9.), dans son article “Hybridation spatiale, registre de présence”, aborde les notions d’identification, d’illusion, de spectateur, de présence, de personnage et d’œuvre qui sont pour elle en voie de transformation. En effet, la cohabitation sur scène des corps réels et de leur projection en images, décomposant ou multipliant leur présence, suscite d’autres modes de relations et d’interactions entre les acteurs, sollicite une autre implication du public et un nouveau mode de réception de la narration. “Le principe structurel du théâtre est bien la relation multiple, l’échange

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entre êtres humains rassemblés” précise B. Picon-Vallin (1998, p. 10), l’utilisation du numérique ne doit donc pas remplacer la mise en relation réelle et charnelle, mais au contraire lui ouvrir de nouveaux espaces et de nouveaux défis.

Béatrice Picon-Vallin interroge aussi le devenir métaphorique de l’image projetée sur scène dans un contexte dramaturgique. L’image projetée, pour avoir un sens et une fonction dans la mise en scène, ne peut pas être une simple allégorie, ni le rapporteur de ce qui se passe sur le plateau. Elle doit interagir avec les corps qui réalisent la performance, interpeler et investir le public. L’utilisation de vidéos peut vite rendre le théâtre explicatif ou n’avoir qu’un rôle anecdotique. Au delà de la dimension poétique, émotionnelle ou humoristique qu’elle peut contenir, son intérêt réside avant tout dans le contrepoint critique, la mise en abîme ou la mise en crise des situations présentées sur scène.

L’image vidéo capte immédiatement l’attention du public, son utilisation entre donc en conflit avec les corps en présence. C’est une dimension qui doit être prise en compte dans la mise en scène et dans l’écriture dramatique. La question de l’écriture dramatique apparaissait déjà dans ma précédente recherche autour du texte de Franz Kafka : Un compte rendu pour une académie, écrit en 1917, et qui s’appuyait sur la mise en scène de la compagnie de théâtre «Boa Companhia”1 au Brésil.

Les interactions entre la lumière et la dramaturgie ont été alors le moteur des mes réflexions. Je continue aujourd’hui à interroger les frontières entre dramaturgie et mise en scène, en orientant cette fois-ci mes recherches sur la construction de dispositifs vidéo-numérique mettant en jeu les nouvelles

1 Companhie théâtrale à Barão Geraldo, Campinas, SP, fondée et dirigée par Verônica Fabrini, actrice, metteur-em-ssène et professeur à l Institut d Arts à L université de Campinas/ Unicamp.

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technologies numériques. Plutôt que l’image elle-même, ce sont les relations possibles entre l’acteur et ses images traitées et projetées sur scène qui m’ont intéressé.

Dans mon travail, j’aborde le dispositif vidéo-numérique comme un champ d’exploration et de création pour le régisseur comme pour l’acteur. Ce dispositif me permet en effet d’interroger les registres de présence des acteurs sur scène, afin de faire évoluer ma propre écriture dramatique, en convoquant sur le plateau des éléments qui font partie de notre appropriation du quotidien pour les faire dialoguer avec les outils du théâtre. Dans la société actuelle, où les rapports de présence sont bouleversés par la médiation numérique, le théâtre apparaît comme un forum d’évolution - un espace possible d’échanges et d’expérimentation - lié aux questions de présence. Comme la société, il se transforme avec l’évolution numérique.

Qu’en est-il alors de la mise en scène et de la dramaturgie ? Le dispositif vidéo-numérique, au delà d’accompagner et enrichir une écriture scénique, peut-il faire lui-même dramaturgie ? Quel rôle joue alors le metteur en scène ? Quelle est la place des acteurs au sein de ce dispositif ? Que devient la fonction jusque-là technique du régisseur ?

Le choix d’Isadora

Parmi toutes les possibilités et les ressources technologiques, le logiciel Isadora est un outil qui permet de traiter les images et les sons en temps réel ou à partir de fichiers. Il a été étudié et expérimenté lors du séminaire “Théâtre et nouvelles technologies” mis en place par le professeur Georges Gagneré en 2015. Autour de l’utilisation de ce logiciel, nous avons exploré le rapport au temps et

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la notion d’interactivité, le rapport à l’espace et à la réalité hybride: entre le physique et le numérique. Georges Gagneré (2015) met au centre de ses démarches l’introduction du numérique dans l’écriture scénique. Il a donc proposé de créer un dispositif pour mettre en relation un acteur avec des images captées en direct grâce au logiciel Isadora. Au cours de l’année 2016-2017, j’ai participé en auditeur libre à ce même séminaire et à partir de cet exercice de création, j’ai décidé de travailler autour d’un dispositif qui mettrait les artistes de la scène (danseurs, acteurs, etc…) en situation d’expérimentation, les confrontant à leur propre image augmentée et projetée. Ce procédé donne la possibilité de visualiser, par la spatialisation de la projection, sa propre image sur des superficies variées. L’objectif étant de créer du sens, du discours qui puisse être utilisé sur scène. La thématique du séminaire était de pouvoir travailler avec sa propre image augmentée en taille et en nombre, ainsi que de pouvoir traiter cette vidéo-projection en direct.

Description technique

Le dispositif est composé de caméras, d’ordinateurs portables (équipés du logiciel Isadora) et de contrôleurs MIDI. Les superficies utilisées comme écrans pour la projection des images captées par les caméras constituent un autre aspect de ce dispositif. Elles peuvent être en partie éclairées par des projecteurs de théâtre de type découpes ou par le vidéos-projecteur. Les acteurs peuvent ainsi se placer devant et se confronter aux images projetées. L’espace devant les superficies-écrans peuvent aussi être capté par une des cameras.

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Installation

Le dispositif comporte une série de branchements électriques et numériques. Les caméras sont connectées à l’ordinateur avec des adaptateurs qui permettent de palier aux différences entre les divers langages vidéo. Chaque ordinateur est raccordé à un vidéo-projecteur et à un contrôleur MIDI.

Dans l’agencement que je décris, l’ordre de mise en route des machines est décisif car chaque appareil doit reconnaître le suivant dans la chaîne captation-transformation-projection de l’image numérique. Une fois que tout est connecté, les caméras et le vidéo-projecteur peuvent être allumés et le dernier à être mis en route sera l’ordinateur. Lorsque l’ordinateur est allumé, on peut ouvrir le logiciel Isadora qui est le cœur du traitement des images.

Avec l’ouverture d’Isadora on peut commencer les pas de patch qui nous permettront, dans un premier temps, de vérifier que les caméras sont reconnues par l’ordinateur, démarrant ainsi la chaîne basique de l’image numérique. Le traitement des images sera exécuté sur Isadora à partir d’un patch spécifique pour chaque circonstance.

Calibrage

Après avoir vérifié que les caméras sont connectées, ont peut commencer la phase appelée calibrage. Les images projetées sont de différentes tailles en fonction de la distance entre le vidéo-projecteur et l’écran. Il faut donc, en fonction de la place du vidéo-projecteur, régler le trapèze, le sens (face ou contre-jour de l’arrivée de l’image) ainsi que le zoom.

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Chaque fois que l ’on modifie la distance entre le vidéo-projecteur et la surface de projection, tous les pas du patch Isadora doivent aussi être revus car les coupures, les collages d’images ainsi que les places choisies sur l’écran ne sont plus valables. Chaque fois que le dispositif est modifié, des ajustements doivent être effectués même si les changements sont minimes: distances et angles dans la pose du vidéo-projecteur et de la caméra. Ces variations doivent être prises en compte dans la mise en place des deux vidéo-projecteurs du dispositif, en fonction de la composition des images et du résultat final recherché. Quand le bon placement des deux vidéo-projecteurs est trouvé, la prochaine étape consiste à éclairer la superficie de l’écran qui servira d’espace scénique pour les acteurs qui participent à la scène, à côté des images numériques projetées. Cet espace peut être éclairé de différentes façons.

Figure 1 - Patch Source: Dossier personnel du chercheur

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La question de la lumière

Pour l’installation du dispositif, trois types d’éclairages doivent être mis en place :

- l’éclairage pour les acteurs qui se placent devant les caméras.

- l’éclairage pour l’écran.

- l’éclairage de l’espace de circulation à l’intérieur du dispositif.

Le premier type d’éclairage est prévu pour la captation vidéo. Il est différent d’une lumière de théâtre et ne doit pas être une lumière directe. La caméra vidéo travaille avec les contrastes entre la superficie éclairée et les zones sombres pour rendre un résultat en deux dimensions. Il faut donc atténuer au maximum les passages d’une partie éclairée à une partie sombre. La lumière doit être indirecte, réfléchie.

Pour les enregistrements réalisés à l’intérieur ont doit utiliser des réflecteurs devant les sources de lumière. Pour palier au manque d’éclairages spécifiques pour la captation vidéo, j’ai choisi de travailler avec deux projecteurs de lumière de type PC placé latéralement, afin de minimiser les ombres sur les visages.

Pour compenser les angles d’attaque des lumières des projecteurs, dus à la hauteur des perches, j’ai placé des projecteurs type PAR 36 sur pieds, au sol. Pour les acteurs qui utilisent la table de lecture ou qui lisent devant le pupitre, je me suis servi d’un projecteur type PC avec la focale ouverte au maximum, doublé d’un projecteur type PAR 36 sur pieds.

Le deuxième éclairage a été élaboré avec des projecteurs qui éclairent l’écran. Comme l’intention est de créer des figures

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géométriques (carrés et rectangles), les projecteurs choisis sont du type découpes.

Les découpes sont des projecteurs pour le théâtre qui utilisent traditionnellement une lampe à incandescence. Ce sont des projecteurs dotés d’un jeux de deux lentilles de focalisation, dont une est appelée condensateur et permet d’obtenir une focalisation très précise du faisceau lumineux. On les appelle projecteurs à découpes, parce qu’ils sont munis d’une série de quatre couteaux qui permet de tailler le faisceau lumineux avec une grande précision. Pour l’utilisation dans mon dispositif, j’ai accroché les découpes de façon à avoir la zone à éclairer bien en face pour que l’ombre portée soit cachée par le corps de l’acteur.

Le troisième type d’éclairage concerne la circulation dans l’espace du dispositif. Cet espace, qui comprend les le mobilier et l’équipement technique, ainsi que la zone qui borde toutes les machines, doit être éclairé de façon peu intense pour ne pas nuire à la projection des images. L’intensité doit cependant être suffisante pour donner à voir la scène, et pour que les acteurs eux-mêmes puissent voir leur espace de jeu. C’est aussi une question de sécurité, au sein d’un dispositif composé de nombreux équipements.

Le résultat de cet agencement devient une espèce d’arène proposé aux intervenants, un champ d’expérimentations ludique et varié. Une fois que ces variables sont ajustées, l’écriture du patch peut commencer.

Le Patch

Tout d’abord la définition du terme patch, dont la fonction d’assignation est au cœur de mon travail de régisseur. Le patch est en quelque sorte un programme informatique. Depuis l’arrivée du

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numérique, il permet de manipuler le temps présent de la scène et de le reconstituer. Le matériel ainsi traité à la vitesse de l’instantané peut être rendu sur la scène où il vient d’être créé. C’est le cas des régies élaborées avec le logiciel Isadora2, créé pour réaliser en live la manipulation interactive de médias : entre autres des vidéos enregistrées, des vidéos en live, des sons.

Le patch dans une régie lumière est un système qui permet d’assigner des informations ou des fonctions à des faders - c’est-à-dire des tirettes de commande. Le mot est en quelque sorte, dans le domaine de la lumière, une mutation, une évolution du terme branchement, toujours appliqué actuellement dans la création des régies analogiques. Le terme “régie” est quant à lui utilisé pour parler des dispositifs mis en place pour la gestion de la sonorisation et de l’éclairage des spectacles vivants. Les exemples d’élaboration de patch proposés ici sont liés au domaine de la lumière, qui concerne plus spécifiquement ma pratique et ma démarche. J’emploierai l’expression “pas de patch” pour désigner une étape de la conduite technique.

Dans une régie lumière analogique, un projecteur est branché sur un circuit électrique afin de pouvoir, par exemple, le contrôler à partir d’une tirette : le fader. Cela permet d’envoyer sur la scène un effet lumineux qui va rendre visible ou bien cacher (par absence de lumière) un personnage, un objet ou même tout un pan du décor et de l’espace scénique. Ces mécanismes technologiques peuvent donc participer à l’écriture scénique, par la manipulation des boutons de la console.

Afin de créer des changements spatiaux sur la scène et ainsi modifier l’écriture scénique, un des premiers recours

2 On trouve une explication de ce logiciel sur le site: http://www.dossiers-techniques.fr/logiciels/le-logiciel-isadora.html. Accédé en: 27 abr. 2018.

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utilisé dans les techniques d’éclairage a été de pouvoir contrôler par une seule action un ensemble de sources de lumière. Avec l’invention du jeu d’orgues aux alentours de 1820, ce procédé s’est perfectionné et a trouvé ses pleines potentialités avec l’arrivée des lampes électriques à l’incandescence. Avant la création de la technologie DMX3 dans les années 1980, les jeux d’orgues - ou consoles lumière - analogiques travaillaient déjà en combinant une ou plusieurs sources lumineuses. L’arrivée de l’électronique a marqué un tournant: ce n’est plus simplement le nombre de projecteurs qui peut être contrôlé mais aussi plusieurs autres types d’effets, comme la temporisation des entrées et des sorties de projecteurs, les fondus, les effets chenillards4, la synchronisation de la lumière avec le son. Avec l’arrivé des consoles numériques, il devient possible d’archiver dans le disque dur de la console lumière plusieurs séquences d’un plan de conduite et donc de mémoriser toute une série d’informations comme l’intensité, les temps d’entrée et/ou de sortie des projecteurs. Sur un jeu d’orgues, une mémoire correspond à un ensemble d’informations sur un état lumineux. Les mémoires peuvent être déclenchées manuellement sur la console elle-même ou par une commande externe.

Le patch permet d’associer des actions pour la construction des régies du spectacle vivant. Dans la régie lumière, il correspond à l’affectation de l’équipement (gradateurs, changeurs de couleurs et autres projecteurs) aux circuits de contrôle. Les circuits de contrôles sont des circuits électriques composés d’un ensemble de conducteurs parcourus par un courant électrique. Le patch

3 (Digital Multiplexing) Le DMX 512 est un protocole de communication entre une console et les différents éléments qu’elle est susceptible de piloter.

4 Mouvement lumineux qui se produit en allumant et éteignant successivement une série de lampes ou LED. L’effet se traduit par un déplacement de cette lumière dans un sens choisi, par exemple de gauche à droite.

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permet de piloter plusieurs gradateurs avec un seul circuit. Il met donc en jeu un grand nombre d’affectations possibles. Dans une régie analogique, on exécute ce qu’on appelle aujourd’hui patch droit (patch 1:1) : une machine branchée au circuit 1 répond au potentiomètre 1, le 2 au 2 et ainsi dans la suite.

Pour la conduite des effets d’un plan d’éclairage, d’une suite d’effets sonores, pour des projections d’images ou même pour la machinerie de plateau, nous pouvons relier les pas de patch les uns aux autres, afin d’organiser une suite de déclenchements et ainsi obtenir une conduite complètement automatisée. Dans l’utilisation du logiciel Isadora, j’appelle patch l’envoi des commandes algorithmiques vers les interfaces de captation, transformation ou restitution de données numériques. Ces instructions données au logiciel permettent créer les effets souhaités.

Construire le patch signifie mettre en place un à un tous les acteurs et toutes les connexions nécessaires, puis les sauvegarder pour une exécution ultérieure. L’objectif de cette mosaïque de visages était d’avoir une image formée par le mélange des deux visages : le visage nouvellement formé est constitué de l’assemblage des deux moitiés de chaque visage, comme on peut le voir dans les photos qui suivent.

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Figure 2 - Enregistrement de l expérimentation dans l`atelier dirigé par Clermont Pithan au théâtre de l`université de Natal, UFRN, 27 avril 2018.

Source : Photo Marcia Strazzacappa.

Le logiciel Isadora permet d’effectuer l’acquisition d’images depuis une ou plusieurs caméras. Chaque scène dans Isadora est un programme complet composé d’un ou de plusieurs modules qui traite les vidéos, le son ou les autres données utilisées. L’encodage d’Isadora est préparé à partir des outils que les développeurs du logiciel appellent acteurs ou modules. Pour la scène en question, deux chaines de captation, transformation et projection des images on été mises en place5.

5 Pour approfondir l’approche du logiciel, il est possible de consulter le site de ses créateurs www.troikatronix.com. Accédé en: 27 abr. 2018.

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Figure 3 - Mises en placeSource : Dossier personnel du chercheur

Pour chacune des chaines, le premier acteur utilisé est l’acteur Video In Watcher qui exécute l’importation des images depuis la caméra. Dans la partie en haut et à gauche de l’acteur, on peut voir la case où inscrire le numéro du channel (canal), qui envoie les images. Chaque canal correspond à une des caméras connectées à l’ordinateur et reconnue par Isadora.

Figure 4 - ChannelSource : Dossier personnel du chercheur

Le deuxième acteur est le Crop, qui sert à couper les images. On peut voir ci-dessus les quatre possibilités de coupe : left, rigth,

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top et bottom (gauche, droite, haut et bas). Le troisième acteur est le Flip, qui permet d’inverser horizontalement ou verticalement la projection de l’image.

Figura 5 - Projecter

Source : Dossier personnel du chercheur

Figure 6 - Flip

Source : Dossier personnel du chercheur

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Le quatrième acteur est le Projector (projecteur). Dans cet acteur, on trouve les fonctions liées au placement et à la taille de l’image projetée. Parmi les fonctions proposées, la position horizontale et la position verticale permettent de choisir la place de l’image dans le champ de projection. Les fonctions width, height et zoom permettent de traiter la taille de la projection de l’image en l’étirant vers le haut, sur les côtés ou, avec le zoom, en la diminuant ou en l’augmentant. La fonction blend interfère sur la superposition des images : en transparence ou de façon opaque, une image cachant alors l’autre. La fonction intensity (intensité) permet de faire apparaitre ou disparaitre l’image projetée.

Tous les acteurs sont liés entre eux pour connecter la chaine captation-transformation- projection des images. Deux chaines identiques ont été créées pour recevoir les images des deux caméras. Dans chaque chaine, les acteurs ont été préparé avec des valeurs algorithmiques distinctes dans perspective d’être assemblés.

J’ai introduit l’acteur Control Watcher dans chaque chaine pour contrôler les valeurs de la fonction intensity. Il permet d’interférer manuellement sur ces valeurs à partir d’un contrôleur MIDI, lors de l’opération de la conduite. Je vais donc présenter le contrôleur MIDI, qui est un outil important pour la restitution des conduites.

Figure 7 - Control Watcher

Source : Dossier personnel du chercheur

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Le MIDI (Musical Instrument Digital Interface) est un protocole de communication qui permet à des équipements compatibles MIDI de dialoguer entre eux. Créé initialement pour être utilisé dans le domaine de la musique, il est maintenant utilisé dans d’autres domaines comme la vidéo. Pour utiliser le contrôleur MIDI, on doit le connecter à l’ordinateur avec une clé USB et le configurer si besoin. Un message MIDI contient une information de valeur : sur un fader en gradation jusqu’à 128 pas, ou sur une touche tout ou rien.

Figure 8 - MIDI (Musical Instrument Digital Interface)

Source : Dossier personnel du chercheur

L’acteur Control Watcher permet de recevoir les messages de changement de valeur du contrôleur MIDI et de les transmettre à la fonction Intensity de l’acteur Projector. Cela nous permet de gérer en direct l’entrée et la sortie des images pendant l’exécution du patch.

Le paradigme du numérique

Le savoir-faire dans l’utilisation des équipements, liés à la fabrication de la scène, permet de faciliter l’action, car les machines soutiennent les effets recherchés. Sans le patch adéquat, les outils technologiques n’ont aucune fonction créative. Les agencements

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numériques sont des objets mécaniques sans valeurs constructives si l’on ne maîtrise pas leurs procédés.

La fragilité et la complexité des installations sont aussi à prendre en compte dans les projets de réalisations artistiques. Dès que l’on commence à travailler avec des dispositifs numériques, plusieurs facteurs mécaniques ou digitaux peuvent en effet venir interrompre une expérimentation nouvelle ou même un agencement déjà rodé. Un câble mal branché ou mal placé, un défaut de réseau ou un dysfonctionnement dans un des logiciels peut créer une interférence dans la mise en route ou la liaison entre les machines et donc retarder ou même empêcher une prestation. L’emploi d’équipements informatiques sur scène ou dans la vie quotidienne nous confronte plus ou moins régulièrement au bogue ou bug, c’est à dire au dysfonctionnement soudain dû à un défaut de conception ou d’utilisation du programme informatique.

En ce qui concerne l’arrivée des projecteurs automatiques sur la scène théâtrale, et qui sont contrôlés numériquement, l’encodage des mouvements pour ce type de machines est encore très limité par rapport aux libertés de mouvements des acteurs sur scène, même si ces projecteurs ont déjà largement remplacé les poursuites6 dans les spectacles musicaux et de variétés. Les déplacements de ces projecteurs y sont plus facilement associés au rythme d’une musique ou à d’autres actions liées à la mise en scène.

6 Projecteur monté sur un tripode, réglable et orientable par un machiniste pour suivre (voire pointer) et cerner les déplacements d’un acteur ou d’un artiste. Une iris permet de régler la taille du faisceau de lumière.

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Le numérique comme paradigme

Les changements dans la manière de mettre en œuvre l’éclairage d’un spectacle ont entraîné des transformations dans l’écriture scénique, car ils apportent de nouveaux recours visuels et sonores. Tous les autres domaines liés au théâtre : costumes, décors, diffusion, mais aussi la réception de l’œuvre, sont également touchés par ces changements. Dans nos efforts d’appropriation des nouvelles technologies imposant de nouveaux savoir-faire, nous sommes amenés à adapter notre façon de concevoir notre univers quotidien 7. Pour cela, nous devons appréhender les nouveaux outils connectés, notamment les écrans, omniprésents dans notre environnement. Gabrielle Girot, dans une communication à la Sorbonne Paris 3 en 20148, évoque leur omniprésence également sur les scènes du spectacle vivant, instaurant une dualité entre présence et distance, entre l’ailleurs et l’ici, le maintenant et l’avant. Les écrans imposent une nouvelle construction du réel, dans le quotidien comme sur scène où elle interroge la propre performativité de l’image.

La scène, lieu d’exécution des patchs

Mon parcours artistique m’a toujours permis de créer les régies de mes prestations. En tant que régisseur général d’une

7 Voir notamment Patrice Duchemin «Comment le numérique a révolutionné nos modes de vie : journée d’un individu ordinaire», article publié le 1er mars 2013 sur le site: www.atlantico.fr

8 communication lors du congrès Le Jeu de l’acteur face aux écrans – entre tradition et mutation, sur le titre «L’écran dans les pratiques performatives du théâtre actuel», juin 2014, Paris, France. Sorbonne Paris 3. hal-01492843

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salle de spectacles, je mets en place les régies conçues par d’autres régisseurs pour les spectacles en tournées. J’accompagne des metteurs en scène, des chorégraphes, des circassiens, des musiciens et d’autres artistes pour leur permettre de concevoir leurs projets scéniques. J’installe également les dispositifs de leurs mises en scène. Aujourd’hui, la plus grande partie de mon travail de création se réalise du côté de la technique. Lorsque je vois un acteur sur scène, je cherche à déchiffrer le dispositif qui l’environne.

A travers le dispositif vidéo-numérique, où la technologie tient une place importante, je recherche une écriture scénique capable de prendre en compte les besoins d’autonomie de l’acteur en ce qui concerne la conduite de son jeu, tout en apportant un contrepoint à la rigidité de rendu des engins utilisés. Moins le régisseur agit dans la conduite d’un spectacle, moins il est possible de laisser une place à l’imprévu : la présence et l’interférence du régisseur pendant la prestation donne aux acteurs plus de souplesse d’interprétation, plus de possibilité d’improvisation car ils sont soutenus par une régie réactive, qui peut intervenir instantanément. Une place est alors accordée à l’inattendu et à la surprise, pour les acteurs comme pour le public.

La scène est devenue, pour moi, le lieu d’exécution des patchs. Créer l’enchantement, rechercher l’émerveillement ne sont pas les seuls facteurs qui stimulent une envie de faire et de créer. Une prestation n’a pas lieu d’être si elle n’arrive pas à dépasser ou à faire oublier les agencements techniques qui la composent. Cependant, la présence visible de ces agencements peut elle aussi générer étonnement et enchantement, grâce justement à leur manipulation à vue et aux transformations qui s’opèrent en direct devant le public, comme une magie révélée, un processus dont il devient partie prenante. Le patch contribue clairement à façonner le théâtre d’aujourd’hui.

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Le dispositif comme paysage scénique

Il est intéressant de noter qu’avec l’arrivée du numérique dans le champ de la création des matériaux sonores, le terme paysage sonore a remplacé celui de bande son. L’aspect bi- dimensionnel a donc fait place à une vision tridimensionnelle du son, qui va dans le sens des nouvelles conceptions de diffusions d’images vidéo: en 3 D.

La notion de paysage pourrait également s’appliquer au dispositif vidéo-numérique, dans lequel les différentes machines sont présentes sur scène et utilisées à vue. Elles matérialisent ainsi un espace inédit, qui suscite la circulation, le jeu et surtout avec lequel il est possible d’interagir. A la différence d’un simple décor, ce paysage technologique est capable d’engendrer lui-même d’autres paysages, d’autres espaces, et donc d’autres systèmes de mises en relations.

Les acteurs qui circulent au sein de ce paysage en sont d’une part les éléments, les objets vivants et mouvants. Ils en sont aussi les concepteurs, non pas en installant ou déplaçant les machines, mais en opérant la conduite, et ainsi en participant à la modification de cet espace : rythme des projections d’images, par l’interférence dans les registres de présence.

L’utilisation du numérique dans l’écriture scénique, telle que je la conçois, n’a pas pour enjeu de remplacer l’acteur par des machines et ni de travailler sur la conception d’avatars. L’acteur reste au centre de ma démarche artistique.

Lexpérience à l`UFRN

En tant qu’invité du Projet “Imersões poético-acadêmicas na formação do artista pesquisador docente” sous la coordination

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de Marcia Strazzacappa, j’ai pu conduire un atelier pratique pour les étudiant.e.s en Licence (Théâtre et Danse), avec aussi la participation d’étudiant.e.s en Master, de quelques chercheurs du centre et de professeurs du Département Danse. Nous avons fait des expériences autour de l`utilisation du logiciel Isadora, dans le petit théâtre du département. En absence de cameras videos avec objectif à focale variable donnant la possibilité de zoomer, nous avons utilisé des webcams, c’est à dire des caméras conçues pour être utilisées comme des périphériques d’ordinateur, et dont la fonction n’est pas d’atteindre une haute qualité d’image. Afin de palier à ce manque, nous avons utilisé directement les possibilités de traitement du logiciel pour exécuter des agrandissements et pour cadrer des objets ou des parties de corps. Nous avons utilisé deux ordinateurs (un Mac et un PC) avec le logiciel Isadora sous sa version demo.

L idée de l atelier était surtout de montrer les possibilités et les applications de la vidéo-numérique pour les créations artistiques. Les étudiants sont partagé en 3 groupes : un pour faire la technique derrière les ordinateurs; un deuxième devant la caméra, comme artistes de la scène; et le troisième comme public. Il était possible de changer de groupe au cours des expérimentations.

Au début, nous avons joué avec la création d’images à partir du collage des visages (comme dans le registre présenté plus haut), pour se familiariser avec les équipements. Ensuite, nous avons pris un phrasé de la chorégraphie créée dans l`atelier d’Isabelle Dufau9 pour jouer devant la caméra et créer ainsi une autre scène. La différence entre travailler avec des élèves de théâtre et de danse a été évidente, car les étudiant.e.s de théâtre

9 Isabelle Dufau, danseuse et chorégraphe Française a été aussi invité dans le cadre du Projet «Imersões». Elle a conduit un atelier basé sur le travail de Françoise Dupuy pendant la semaine du 23 au 26 avril.

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sont plus habitués à proposer des scènes avec des dialogues et des antagonismes, alors que les élèves de danse proposent plutôt des scènes de mouvements de groupe.

À la fin, l atelier a dévoilé quelques possibilités d application de la technologie sur scène. Mais le plus important est que l atelier a réussi à surmonter la peur de certains étudiant.e.s face à l`usage de la technologie. Il a donné le goût de la création et de l`innovation.

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Références

DUCHEMIN, Patrice. Comment le numérique a révolutionné nos modes de vie: journée d’un individu ordinaire. 2013.

GAGNERÉ, Georges. Emergence et fragilité d’une recherche-création (2000-2007). Ligeia dossiers sur l’Art, Théâtre laboratoires, année XXVIIIe, n. 137-40, janv./juin 2015.

GIROT, Gabrielle. L’écran dans les pratiques performatives du théâtre actuel. communication lors du congrès Le Jeu de l’acteur face aux écrans – entre tradition et mutation, Paris, France. Sorbonne Paris 3, 2014.

PICON-VALLIN, Béatrice. Les écrans sur la scène; Hybridation spatiale, registres de présence. Béatrice, Lausanne: L’Âge d’Homme, 1998.

PITHAN, Clermont. Le dispositif vidéo-numérique comme élément de l’écriture scénique: les projets MosaïKa et Magdalena. 2017. (Master II en Mémoire Création) – Université Paris 8, Paris, 2017.

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O DISPOSITIVO DE VÍDEO DIGITAL COMO UM ELEMENTO

DA ESCRITA CÊNICA UM EXPERIMENTO NO ÂMBITO

DO PROJETO IMERSÕES POÉTICO-ACADÊMICAS NA UFRN, NATAL

Clermont PithanTraduzido por Marcilio de Souza Vieira

Minha carreira de pesquisa

Como diretor de palco de um teatro municipal nos subúrbios de Paris, cuido da recepção técnica dos shows programados para cada estação cultural. Eu também tenho de adaptar iluminação, vídeo e cenografia para artistas convidados, associações e me ocupo da criação do próprio trabalho artístico. Esse trabalho começou no Brasil, onde acompanhei muitas companhias de teatro, circo e dança, em diferentes locais culturais, oficiais ou alternativos. Eu próprio já fui dançarino, ator e palhaço em um circo tradicional. Então, eu me interessei pela luz e escolhi direcionar meu percurso para esse aspecto mais técnico do espetáculo, o que também me permite expressar toda a minha criatividade artística.

Após o bacharelado em Dança na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), os treinamentos e estágios que segui foram direcionados às habilitações técnicas ou à validação de

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O dispositivo de vídeo digital como um elemento da escrita cênica: um experimento no âmbito do projeto imersões poético-acadêmicas na UFRN, Natal

conhecimentos adquiridos relacionados ao domínio das tecnolo-gias em uso no contexto profissional, como o controle de projetores (holofotes) automáticos associados a consoles digitais, ou as certi-ficações em eletricidade para o uso desses aparelhos. A retomada dos estudos universitários no contexto da minha carreira e do meu trabalho diário como técnico possibilitou questionar essa jornada a partir das ferramentas de reflexão acadêmica confrontadas com a experiência prática do palco. Voltando ao campo profissional após cada curso, confrontar a reflexão com a prática – do lugar do teatro em nossa sociedade, em seus princípios fundamentais – foi uma verdadeira força motriz.

Na continuidade do meu trabalho e da minha pesquisa sobre as interações entre evoluções técnicas da iluminação de palco e da escrita cênica, interessei-me por dispositivos de vídeo que colocam em jogo novas tecnologias digitais. A possibilidade de vincular pesquisa teórica e experiência prática de criação possibilitou concretizar uma abordagem que valoriza o coletivo, que coloca o arranjo digital a serviço de uma dramaturgia, que confronta e associa diferentes linguagens artísticas.

Novas práticas digitais ligadas ao teatro trazem à tona vários registros da presença do ator no palco. Béatrice Picon-Vallin (1998, p. 9), em seu artigo Hibridização espacial, registro de presença, aborda as noções de identificação, ilusão, espectador, presença, personagem e a obra, que estão passando por grandes por transformações. De fato, a coabitação no palco de corpos reais e sua projeção em imagens, fragmentando ou multiplicando sua presença, dá origem a outros modos de relações e interações entre os atores, solicita outro envolvimento do público e um novo modo de recepção da narração. “O princípio estrutural do teatro é de fato a relação múltipla, a troca entre seres humanos reunidos”, especifica Picon-Vallin (1998, p. 10). O uso do digital não deve

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substituir a conexão real e carnal, mas, ao contrário, abre novos espaços e novos desafios.

Béatrice Picon-Vallin também questiona o futuro metafó-rico da imagem projetada no palco em um contexto dramatúrgico. A imagem projetada, para ter um significado e uma função na encenação, não pode ser uma alegoria simples, nem o repórter do que está acontecendo no cenário. Ela deve interagir com os corpos que executam a performance, deve desafiar e questionar o público. O uso de vídeos pode rapidamente tornar o teatro explicativo ou ter apenas um papel anedótico. Além da dimensão poética, emocional ou bem-humorada que o vídeo pode conter, seu interesse reside sobretudo no contraponto crítico, no colocar em risco as situações apresentadas no palco.

A imagem do vídeo capta imediatamente a atenção do público, seu uso, portanto, entra em conflito com os corpos presentes. Essa é uma dimensão que deve ser levada em conside-ração na encenação e na escrita dramática.

A questão da escrita dramática já apareceu em minha pesquisa anterior, acerca do texto de Franz Kafka: Discurso para uma academia, escrita em 1917, baseada na encenação da companhia de teatro Boa Companhia1 no Brasil. As interações entre luz e drama-turgia foram então o motor das minhas reflexões. Hoje, continuo questionando as fronteiras entre dramaturgia e encenação, desta vez, concentrando minha pesquisa na construção de dispositivos de vídeo envolvendo novas tecnologias digitais. Mais do que a própria imagem, foram as possíveis relações entre o ator e suas imagens processadas e projetadas no palco que me interessaram.

1 Companhia teatral sediada em Barão Geraldo, Campinas-SP, fundada e dirigida por Verônica Fabrini, atriz, diretora teatral e docente do Instituto de Artes da Unicamp.

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O dispositivo de vídeo digital como um elemento da escrita cênica: um experimento no âmbito do projeto imersões poético-acadêmicas na UFRN, Natal

No meu trabalho, abordo o dispositivo de vídeo como um campo de exploração e criação para o diretor de palco e para o ator. Esse dispositivo me permite interrogar os registros de presença de atores no palco, a fim de desenvolver minha própria escrita dramá-tica, convocando o conjunto de elementos que fazem parte de nossa apropriação diária para fazê-los interagir com as ferramentas de teatro. Na sociedade de hoje, em que as relações de presença passam pela mediação digital, o teatro aparece como um fórum para a evolução – um possível espaço de troca e experimentação – vinculado a questões de presença. A cena como a sociedade está mudando com a evolução digital.

E quanto à encenação e à dramaturgia? O dispositivo de vídeo digital pode, além de acompanhar e enriquecer uma escrita cênica, fazer a própria dramaturgia? Que papel o diretor desem-penha? Qual é o lugar dos atores nesse sistema? O que aconteceu com a função anteriormente técnica do diretor?

A escolha do software Isadora

Entre todas as possibilidades e os recursos tecnológicos, o software Isadora é uma ferramenta que permite processar imagens e sons em tempo real ou a partir de arquivos. Foi estudado e testado durante o seminário Teatro e novas tecnologias, criado pelo professor Georges Gagneré, em 2015. Em torno do uso desse software, exploramos a relação com o tempo e o conceito de intera-tividade, a relação com o espaço e a realidade híbrida: entre o físico e o digital. Georges Gagneré (2015) introduz a tecnologia digital no centro de sua escrita de palco. Ele propôs, então, a criação de um dispositivo para fazer dialogar um ator com imagens capturadas ao vivo usando o software Isadora.

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Durante o ano de 2016-2017, participei como ouvinte desse seminário e, a partir desse exercício criativo, decidi conceber um dispositivo que colocaria os artistas performáticos (dançarinos, atores etc.) em uma situação experimental, confrontando-os com sua própria imagem aumentada e projetada. Esse processo permite visualizar, pela espacialização da projeção, sua própria imagem em diversas superfícies. O objetivo era criar significado, um discurso que pudesse ser usado no palco. O tema do seminário era poder trabalhar com sua própria imagem aumentada em tamanho e número, além de poder processar essas projeções de vídeo ao vivo.

Descrição técnica

O dispositivo consiste em câmeras, laptops (equipados com o software Isadora) e controladores MIDI (Musical Instrument Digital Interface). Um aspecto desse sistema são as áreas usadas como telas para projetar as imagens capturadas pelas câmeras. Eles podem ser parcialmente iluminados por projetores de teatro do tipo elipsoidal ou pelos próprios projetores de vídeo. Os atores podem, assim, ficar na frente e confrontar as imagens projetadas. O espaço localizado na frente das áreas das telas também pode ser capturado por uma das câmeras.

Instalação

O dispositivo possui uma série de conexões elétricas e digi-tais. As câmeras estão conectadas ao computador com adaptadores que compensam as diferenças entre os vários idiomas do vídeo.

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Cada computador está conectado a um projetor de vídeo e a um controlador MIDI.

No layout que descrevo, a ordem na qual as máquinas são iniciadas é decisiva porque cada dispositivo deve reconhecer o próximo na cadeia de captura-transformação-projeção da imagem digital. Quando tudo estiver conectado, as câmeras e o projetor de vídeo poderão ser ligados e o último a ser iniciado será o compu-tador. Quando o computador está ligado, você abre o software Isadora, que é o coração do processamento de imagens.

Com a abertura do software Isadora, é possível iniciar as etapas do patch que nos permitirão, inicialmente, verificar se as câmeras são reconhecidas pelo computador, iniciando assim a cadeia básica da imagem digital. O processamento da imagem será realizado no software Isadora a partir de um patch específico para cada circunstância.

Calibração (verificação do funcionamento de um instrumento, de modo a ajustar as suas especificações de acordo com um padrão)

Após verificar se as câmeras estão conectadas, é possível iniciar a fase chamada calibração. As imagens projetadas são de tamanhos diferentes, dependendo da distância entre o projetor de vídeo e a tela. Portanto, é necessário, dependendo do local do projetor de vídeo, ajustar o trapézio, a direção (face ou contra a luz da chegada da imagem) e o zoom.

Sempre que você altera a distância entre o projetor de vídeo e a superfície de projeção, todas as etapas do patch Isadora também devem ser revisadas, pois cortes, colagens de imagem e

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locais escolhidos na tela não são mais válidos. Cada vez que o dispositivo é modificado, é necessário fazer ajustes mesmo que as alterações sejam mínimas: distâncias e ângulos na instalação do projetor de vídeo e da câmera. Essas variações devem ser levadas em consideração na instalação dos dois projetores de vídeo do dispositivo, dependendo da composição das imagens e do resultado final desejado.

Quando o posicionamento correto dos dois projetores de vídeo é encontrado, o próximo passo é iluminar a área da tela que servirá como espaço de cena para os atores que participam da performance, ao lado das imagens digitais projetadas. Esse espaço pode ser iluminado de diferentes maneiras.

Figura 1 - Fragmento do Softwere IsadoraFonte: Arquivo pessoal do pesquisador

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A questão da luz

Para a instalação do dispositivo, três tipos de iluminação devem ser instalados:

- Iluminação para atores que estão na frente das câmeras.

- A iluminação da tela.

- A iluminação do espaço de circulação no interior do dispositivo.

O primeiro tipo de iluminação é fornecido para captura de vídeo. É diferente de uma luz de teatro e não deve ser uma luz direta. A câmera de vídeo trabalha com os contrastes entre a área iluminada e as áreas escuras para restituir um resultado em duas dimensões. Portanto, é necessário minimizar as passagens de uma parte iluminada para uma parte escura. Por isso, a luz deve ser indireta, refletida.

Para gravações internas, use refletores em frente às fontes de luz. A fim de compensar a falta de iluminação específica para captura de vídeo, optei por trabalhar com dois projetores de luz do tipo PC colocados lateralmente, de modo a minimizar as sombras nos rostos.

No intuito de compensar os ângulos de ataque das luzes dos projetores, devido à altura dos postes, coloquei holofotes do tipo PAR 36 nos pés, no chão. Para os atores que usam a mesa de leitura ou que leem em frente à mesa, usei um projetor do tipo PC com a distância focal aberta ao máximo, juntamente com um projetor do tipo PAR 36 nas pernas.

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A segunda iluminação foi desenvolvida com projetores que iluminam a tela. Como a intenção é criar figuras geométricas (quadrados e retângulos), os focos escolhidos são do tipo elipsoidal.

Os elipsoidais são projetores para o teatro que tradicional-mente usam uma lâmpada incandescente. Esses projetores têm um conjunto de duas lentes de foco, uma das quais é chamada de capacitor e permite uma focagem muito precisa do feixe de luz. Eles são chamados de projetores de corte, porque possuem quatro facas que cortam o feixe de luz com grande precisão. Para uso no meu dispositivo, pendurei os elipsoidais a uma altura suficiente e bem de frente, de forma que a sombra projetada fique oculta pelo corpo do ator.

O terceiro tipo de iluminação diz respeito à circulação no espaço do dispositivo. Esse espaço, que inclui os móveis e equipamentos técnicos, bem como a área que circunda todas as máquinas, deve ser pouco iluminado para não interferir na projeção das imagens. No entanto, a intensidade deve ser sufi-ciente para permitir que a cena seja vista pelo público e para que os próprios atores possam ver seu espaço de jogo. O que é também uma questão de segurança, em um dispositivo composto por inúmeros equipamentos.

O resultado desse arranjo se torna um tipo de arena proposta aos intervenantes, um campo lúdico de experimentação. Uma vez que essas variáveis são ajustadas, a preparação do patch pode começar.

O Patch

Primeiro, apresentaremos a definição do termo patch, cuja função está no centro do meu trabalho como diretor de palco. O

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patch é uma espécie de programa de atribuição digital ou analógica. Desde o advento do digital, tornou possível manipular o tempo presente da cena e o reconstruir. O material assim processado na velocidade do instantâneo pode ser restituído no palco em que acabou de ser criado. É o caso dos mapas de controle desenvol-vidos com o software Isadora2, criados para realizar manipulação interativa ao vivo de mídias, entre outros, vídeos gravados, vídeos ao vivo, sons, imagens. O patch em um plano/mapa de controle de luz é um sistema que permite atribuir informações ou funções aos faders – ou seja, botões de controle.

De alguma forma, a palavra é, no campo da luz, uma mutação, uma evolução do termo conexão, ainda hoje aplicada na criação de planos para controle analógicos. O termo regie (organizaçao material do espetáculo, em frances) é usado para falar dos dispositivos criados para o gerenciamento dos sistemas de som, de iluminação e dos outros componentes de performances em direto. Os exemplos de desenvolvimento de patches oferecidos neste estudo estão relacionados ao campo de luz, que se relaciona mais especificamente à minha prática e minha abordagem. Usarei a expressão “passo de um patch” para designar cada uma das ações de um plano técnico de luz.

Em um plano de controle de luz analógico, um projetor é conectado a um circuito elétrico para que, por exemplo, possa ser controlado a partir de um potenciômetro: o fader. Isso permite que um efeito de luz seja enviado ao palco, o que tornará visível ou que ocultará (pela ausência de luz) um personagem, um objeto ou mesmo uma seção inteira do cenário ou do espaço do palco. Esses procedimentos tecnológicos feitos a partir dos botões do console

2 Uma explicação deste software pode ser encontrada no site: http://www.dossier-s-techniques.fr/logiciels/le-logiciel-isadora.html Acessado em: 27 abr. 2018.

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(mesa de luz), podem, portanto, ser participantes da escrita da cena. A fim de criar mudanças espaciais no palco e, assim, modificar a escrita cênica, um dos primeiros recursos usados nas técnicas de iluminação foi poder controlar, por uma única ação, um conjunto de fontes de luz. Com a invenção do console de luz, por volta de 1820, esse processo foi aperfeiçoado e encontrou todo o seu poten-cial com a chegada de lâmpadas elétricas incandescentes. Antes da criação da tecnologia DMX3 na década de 1980, os consoles analógicos já funcionavam combinando uma ou mais fontes de luz. A chegada das mesas de luz eletrônicas marcou um ponto de virada: não é mais apenas o número de projetores que pode ser controlado mas também vários outros tipos de efeitos, como o tempo das entradas e saídas do projetor, os desaparecimentos, os efeitos de chase4, a sincronização da luz com o som. Com a chegada dos consoles digitais, torna-se possível arquivar no disco rígido do console de luz várias sequências de um plano de iluminação e, portanto, memorizar toda uma série de informações como intensidade, momento de entrada e/ou saída do projetor. Em um console de luz, uma memória corresponde a um conjunto de informações para estabelecer um estado luminoso em um determinado momento de um espetáculo. As memórias podem ser acionadas manualmente no próprio console de luz ou por um comando externo.

O patch possibilita combinar ações para o gerenciamento material da performance ao vivo. No gerenciamento de luz, ele corresponde à atribuição do equipamento (dimmers, projetores

3 O DMX (Digital Multiplexing) 512 é um protocolo de comunicação entre um console e os vários elementos que ele é capaz de controlar.

4 Movimento luminoso que ocorre ao ligar e desligar sucessivamente uma série de lâmpadas ou LEDs. O efeito resulta no deslocamento dessa luz na direção escolhida, por exemplo, da esquerda para a direita.

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tradicionais ou automáticos ou ainda outros equipamentos) aos circuitos de controle, que, por sua vez, são circuitos elétricos compostos por um conjunto de condutores atravessados por uma corrente elétrica. O patch permite controlar vários dimmers com um único circuito. Portanto, envolve um grande número de tarefas possíveis. Em uma condução analógica de um plano de luz, executamos o que se pode chamar de patch direto (patch 1:1): uma máquina conectada ao circuito 1 responde ao potenciômetro 1,2 a 2 e assim por diante. Em relação aos efeitos de um plano de iluminação, com uma série de efeitos sonoros, para projeções de imagens ou mesmo para a maquinaria de palco, podemos conectar as etapas do patch umas às outras, a fim de organizar uma série de gatilhos e, assim, obter uma unidade totalmente automatizada.

Ao usar o software Isadora, chamo de patch o envio de comandos algorítmicos para as interfaces de captura, de trans-formação ou de restauração de dados digitais. Essas instruções fornecidas ao software permitem criar os efeitos desejados.

Construir o patch significa configurar todos os atores e todas as conexões necessárias, um por um, salvando-os para execução posterior. O objetivo desse mosaico de faces era ter uma imagem formada pela mistura das duas faces: a nova face formada consiste na montagem das duas metades de cada face, como podemos ver nas fotos a seguir.

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Figura 2 - Registro de experimentação no workshop liderado por Clermont Pithan no teatro da Universidade de Natal, UFRN, 27 de abril de 2018.

Fonte: Foto Marcia Strazzacappa.

O software Isadora permite importar imagens de uma ou mais câmeras. Cada cena no Isadora é um programa completo que consiste em um ou mais módulos que processam vídeos, sons ou outros dados utilizados. A codificação do Isadora é preparada usando as ferramentas que os desenvolvedores de software chamam de atores ou módulos.

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Figura 3 - Mesa do Softwere IsadoraFonte: Arquivo pesoal do pesquisador

Para a cena em questão, foram configurados dois canais para capturar, transformar e projetar imagens5. Para cada canal, o primeiro ator usado é o Video In Watcher, que realiza a impor-tação das imagens da câmera. Na parte superior esquerda do ator, podemos ver a caixa onde se deve escrever o número do canal que envia as imagens. Cada canal corresponde a uma das câmeras conectadas ao computador e reconhecidas pelo Isadora.

Figura 4 - CanalFonte: Arquivo pesoal do pesquisador

5 Para aprofundar a abordagem do software, é possível consultar o site de seus criadores www.troikatronix.com Acesso em: 27 abr. 2018.

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O segundo ator é o Crop, que é usado para recortar as imagens. Podemos ver acima as quatro possibilidades de corte: left, rigth, top e bottom (esquerda, direita, superior e inferior) (Figura 4). O terceiro ator é o Flip, que permite inverter a projeção da imagem na horizontal ou na vertical (Figura 5).

Figura 5 - “Flip”Fonte: Arquivo pesoal do pesquisador

O quarto ator é o projetor. Nesse ator, encontramos as funções relacionadas ao posicionamento e ao tamanho da imagem projetada. Entre as funções propostas, as posições horizontal e vertical permitem escolher o local da imagem no campo de projeção. As funções de largura, altura e zoom permitem processar o tamanho da projeção da imagem esticando-a para cima, para os lados ou, com o zoom, diminuindo ou aumentando. A função de mesclagem interfere na sobreposição de imagens: transparente ou opaca, uma imagem escondendo a outra. A função de intensidade permite que a imagem projetada apareça ou desapareça.

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Figura 6 - ProjetorFonte: Arquivo pesoal do pesquisador

Todos os atores estão ligados para conectar a cadeia de captura-transformação-projeção de imagens. Dois canais idên-ticos foram criados para receber as imagens de duas câmeras. Em cada cadeia, os atores foram preparados com valores algorítmicos separados, com vista a ser acoplados em uma montagem.

Eu introduzi o ator Control Watcher em cada cadeia para controlar os valores da função de intensidade. Ele permite que você interfira manualmente nesses valores a partir de um controlador MIDI durante a operação do plano da cena. Então, eu vou apre-sentar o controlador MIDI, que é uma ferramenta importante para a operação dos planos de cena.

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Figura 7 - Observador de controleFonte: Arquivo pessoal do pesquisador

O MIDI (Musical Instrument Digital Interface) é um proto-colo de comunicação que permite que equipamentos compatíveis com esse protocolo MIDI se comuniquem. Originalmente criado para uso em música, atualmente é usado em outras áreas, como vídeo. Para usar o controlador MIDI, você deve conectá-lo ao computador com uma chave USB e o configurar, se necessário. Uma mensagem MIDI contém informações valiosas: em um fader de escurecimento de até 128 etapas ou em uma tecla de on/off.

Figura 8 - Interface digital de instrumento musicalFonte: Arquivo pessoal do pesquisador

O ator Control Watcher permite receber mensagens de alteração de valor do controlador MIDI e as transmitir à função

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Intensity do ator Projector. Isso nos permite gerenciar a entrada e a saída de imagens ao vivo enquanto o patch está sendo executado.

O paradigma digital

O know-how no uso de equipamentos, vinculado à produção de cenas, facilita a ação, pois as máquinas vêm em apoio na execução dos efeitos desejados. Sem um patch correto e eficaz, as ferramentas tecnológicas não têm função criativa. Os agen-ciamentos digitais não passam de objetos mecânicos sem valor construtivo se o artista digital não domina seus processos.

A fragilidade e a complexidade das instalações também devem ser levadas em consideração em projetos artísticos. Assim que você começa a trabalhar com dispositivos digitais, vários fatores mecânicos ou digitais podem realmente interromper um novo experimento ou mesmo um arranjo já estabelecido. Um cabo conectado ou colocado incorretamente, uma falha na rede ou um mau funcionamento em um dos softwares pode criar interferência na inicialização ou na conexão entre as máquinas e, portanto, atrasar ou até impedir um processo que funcionava anteriormente. O uso de equipamentos de informática no palco ou na vida cotidiana nos confronta mais ou menos regularmente com uma anomalia de funcionamento ou bug, ou seja, disfunção súbita devido a um defeito no design ou no uso do programa de computador.

Em relação à chegada de projetores automáticos (controlados digitalmente) ao cenário teatral, a codificação dos movimentos para esse tipo de máquina ainda é muito limitada em comparação à liberdade de movimento dos atores no palco, mesmo que esses

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projetores já tenham substituído amplamente o canhão seguidor6 em shows musicais e de variedades. O movimento desses projetores é mais facilmente associado ao ritmo da música ou a outras ações relacionadas à encenação.

O digital como paradigma

As mudanças na maneira de iluminar um show levaram a uma evolução da escritura cênica, pois trazem novos recursos visuais e sonoros. Todas as outras áreas relacionadas ao teatro – figurinos, cenários, distribuição, mas também a da obra –foram afetadas por essas mudanças. Em nossos esforços para se apropriar das novas tecnologias que impõem novas habilidades, nós somos levados a adaptar nossa maneira de conceber nosso universo cotidiano7. Para isso, precisamos entender as novas ferramentas conectadas, em particular, às telas, que são onipresentes em nosso ambiente. Gabrielle Girot, em uma comunicação na Sorbonne Paris 3, em 20148, evoca sua onipresença também nos palcos das artes cênicas, estabelecendo uma dualidade entre o face a face e o virtual, entre outro lugar e aqui, agora e antes. As telas impõem

6 Projetor montado em um tripé, ajustável e orientável por um mecânico para acompanhar (ou até apontar) e identificar os movimentos de um ator ou artista. Uma íris ajusta o tamanho do feixe de luz.

7 Veja em particular Patrice Duchemin, Como a tecnologia digital revolucionou nosso estilo de vida: o dia das pessoas comuns, artigo publicado em 1 de março de 2013, no site www.atlantico.fr Acesso em: 27 abr. 2018.

8 A tela nas práticas performativas do teatro atual, comunicação durante o congresso The Game do ator na frente das telas – entre tradição e mutação, junho de 2014, Paris, França. Sorbonne Paris 3. Disponível em: hal-01492843.

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uma nova construção da realidade, no cotidiano e no palco, onde questionam a própria performatividade da imagem.

A cena, local de execução dos patches

Meu percurso artístico me permitiu criar e gerir a organi-zação material dos meus espetáculos. Como diretor de palco de uma sala de espetáculos, eu adapto e monto os planos projetados por outros diretores de palco para shows em turnê. Acompanho diretores, coreógrafos, artistas de circo, músicos e outros artistas para permitir que eles reconfigurem seus projetos cênicos em função das condições técnicas da sala onde eu os acolho. Também instalo e calibro os dispositivos para suas performances. Hoje, a maior parte do meu trabalho criativo é feita no lado técnico. Quando vejo um ator no palco, tento decifrar o dispositivo que o rodeia.

Por meio do dispositivo de vídeo digital, em que a tecnologia desempenha um papel importante, procuro uma escrita cênica capaz de levar em conta as necessidades de autonomia do ator em relação à condução de seu jogo, além de tentar propor um contra-ponto à rigidez que, por vezes, a utilização dessas máquinas podem reivindicar. Quanto mais os técnicos de cena têm possibilidades de interferir durante a condução da apresentação de um show, maior é o espaço para o inesperado: a presença e a interferência do diretor de palco durante a performance dão aos atores mais flexibilidade de interpretação, mais possibilidade de improvisação porque eles são apoiados por um gerenciamento reativo, que pode intervir instantaneamente. Um lugar é dado ao inesperado e à surpresa, tanto para os atores quanto para o público.

O palco se tornou, para mim, o local onde os patches são executados. Criar encantamento, buscar admiração não são os

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únicos fatores que estimulam o desejo de fazer e criar. Uma perfor-mance não tem lugar de ser, a meu ver, se não conseguir exceder ou fazer esquecer as disposições técnicas que a compõem. No entanto, a presença visível desses arranjos também pode gerar espanto e encantamento, graças justamente à sua manipulação à vista e às transformações que ocorrem diretamente na frente do público, como a magia revelada, num processo no qual os espectadores também se envolvem. O patch contribui diretamente para moldar o teatro de hoje.

O dispositivo como uma paisagem cênica

É interessante notar que, com a chegada do digital no campo da criação de materiais sonoros, o termo paisagem sonora substituiu o de trilha sonora. Passamos a uma visão tridimensional do som, que segue na direção dos novos designs para a transmissão de imagens de vídeo: em 3D.

A noção de paisagem também pode se aplicar ao dispositivo de vídeo digital, no qual as várias máquinas estão presentes no palco e usadas à vista. Assim, materializam um novo espaço, que inspira a circulação, o brincar e, sobretudo, com o qual é possível interagir. Esse cenário tecnológico é capaz de gerar outras paisagens, outros espaços e, portanto, outros sistemas de relacionamento.

Os atores que circulam nessa paisagem são, por um lado, seus elementos, objetos vivos e em movimento. Eles também são os projetistas, não instalando ou movendo as máquinas, mas operando na condução e participando da modificação desse espaço: ritmo das projeções da imagem pela interferência nos registros de presença.

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O uso do digital na escrita de palco, como eu o entendo, não se destina a substituir o ator por máquinas ou a trabalhar no design de avatares. O ator permanece no centro da minha abordagem artística.

A experiência na UFRN

Como convidado do Projeto Imersões poético-acadêmicas na formação do artista pesquisador docente, sob a coordenação de Marcia Strazzacappa, pude realizar um workshop prático para estudantes de graduação (Teatro e Dança), também com a participação de mestrandos, alguns pesquisadores do centro e professores do Curso de Dança. Fizemos experimentos com o uso do software Isadora no pequeno teatro do Departamento de Artes. Na ausência de câmeras de vídeo com lente focal variável que permitam o zoom, usamos webcams, ou seja, câmeras proje-tadas para ser usadas como periféricos de computadores e cuja função não é obter alta qualidade de imagem. Para compensar essa falta, usamos diretamente as possibilidades de processamento do software para executar ampliações e enquadrar objetos ou partes do corpo. Utilizamos dois computadores (um Mac e um PC) com o software Isadora em sua versão demo.

A ideia do workshop foi principalmente mostrar as possibi-lidades e aplicações do vídeo digital para criações artísticas. Para tanto, os alunos foram divididos em 3 grupos: um para executar a técnica por trás dos computadores; um segundo na frente da câmera, como artistas performáticos; e o terceiro como público. Foi possível mudar de grupo durante os experimentos.

No início, exploramos de forma lúdica a criação de imagens a partir da colagem de rostos (como no registro apresentado acima), para nos familiarizarmos com o equipamento. Depois,

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fizemos um fraseado da coreografia criada na oficina de Isabelle Dufau9 para tocar na frente da câmera e, assim, criar outra cena.

A diferença entre trabalhar com estudantes de teatro e dança era óbvia, pois os estudantes de teatro estão mais acostu-mados a realizar cenas com diálogos e antagonismos, enquanto os estudantes de dança tendem a oferecer cenas de movimento em grupo. No final, o workshop revelou algumas possibilidades de aplicação da tecnologia no palco. Mas, o mais importante é que o workshop conseguiu superar o receio de alguns estudantes que enfrentam o uso da tecnologia. O atelier propiciou a possibilidade de vivenciar o prazer da criação e da inovação.

9 Isabelle Dufau, dançarina e coreógrafa francesa também foi convidada como parte do Projeto Imersões. Ela liderou um workshop baseado no trabalho de Françoise Dupuy durante a semana de 23 a 26 de abril.

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Referências

DUCHEMIN, Patrice. Comment le numérique a révolutionné nos modes de vie: journée d’un individu ordinaire. 2013.

GAGNERÉ, Georges. Emergence et fragilité d’une recherche-création (2000-2007). Ligeia dossiers sur l’Art, Théâtre laboratoires, année XXVIIIe, n. 137-40, janv./juin 2015.

GIROT, Gabrielle. L’écran dans les pratiques performatives du théâtre actuel. communication lors du congrès Le Jeu de l’acteur face aux écrans – entre tradition et mutation, Paris, France. Sorbonne Paris 3, 2014.

PICON-VALLIN, Béatrice. Les écrans sur la scène; Hybridation spatiale, registres de présence. Béatrice, Lausanne: L’Âge d’Homme, 1998.

PITHAN, Clermont. Le dispositif vidéo-numérique comme élément de l’écriture scénique: les projets MosaïKa et Magdalena. 2017. (Master II em Mémoire Création) – Université Paris 8, Paris, 2017.

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AS IMAGENS (II) A CENA ENSINA

Marcilio de Souza Vieira

As imagens II são resultantes da Oficina Emergencia Escénica, ministrada por Javier Díaz Dalannais, e abordou a base do corpo como um emergir de relacões, como plataforma para o discurso e como discurso de si (emergência como florescimento do corpo através da coordenação de diferentes domínios, ao mesmo tempo da contingência discursiva do atuante). A oficina investigou o corpo nos processos criativos e interpretativos como elemento fundacional das ações feitas em cena. Passou pelo trabalho psicofísico do intérprete além de contar com as leituras que o corpo propõe como elemento conceitual e articulado com o restante da cena/espaço.

A Emergência Cênica é abordada a partir da base do corpo como emergência de relacionamentos, plataforma para a fala e como a própria fala. O princípio da oficina indagou sobre o corpo nos processos criativos e interpretação como elemento de ações funda-mentais realizadas no palco. A residência artística teve como objetivo articular e desenvolver ferramentas para estruturar uma dramaturgia corporal específica, capacitando e expandindo os processos criativos em dança. Além disso, houve foco particular na práxis artística em que foi observada a eliminação de obstáculos psicofísicos. O artista, em sua proposição, articulou o treinamento psicofísico, a materialidade, a construção e a desconstrução do dançarino/ator, além das relações corpo/espaço íntimo e voz/texto/assunto.

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Javier Díaz DALANNAIS

Muy buenas tardes a todos2, les agradezco profundamente la invitación para compartir esta clase inaugural del presente período académico de la Pós Graduação de Artes Cênicas del Departamento de Artes de la Universidade Federal do Rio Grande do Norte, agradezco muchísimo al profesor, coordinador, doctor y amigo Robson Haderchpek, doy gracias por la asistencia de cada uno de ustedes. Sin ninguna duda confío profundamente en la clareza de mis emociones, y mis intenciones aquí con ustedes, y son estas las principales vías de transporte de hoy.

Hoy, en esta hora realizaré mi práctica ref lectante en la compañía de ustedes, junto a ustedes. Hablo de la práctica pues enfocaremos eso de practicarnos en distintas situaciones, dominios, estados, como un fenómeno del emerger de nosotros mismos, de hecho como la única posibilidad de estar aquí... Entiendo eso como una cosa terriblemente maravillosa: No es la vida que permíteme practicar o practicarme, pero al revés, es la práctica, a lo que me da la vida, la posibilidad de vivir, vivo

1 O texto de DALANNAIS foi traduzido do “portunhol” para o espanhol por Iane Licurgo.

2 O texto que segue foi texto produzido e lido escrito pelo autor para a aula inaugural do PPGArC. Nele, o autor traz algumas interfaces com a residência artística desenvolvida no Departamento de Artes da UFRN com alunos do referido programa, alunos de graduação dos cursos de Dança e Teatro e artistas da comunidade.

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pues practico me. Hablaremos sobre La Identidad, sobre una emergencia, como urgencia y, una emergencia como un nacimiento o creación de la identidad, hacerse y deshacerse de la identidad, eso de manos atadas con hacernos y deshacernos de nosotros mismos, nuestros cuerpos, nuestra miente, NOSOTROS.

Ojalá transitemos, haciéndonos y deshaciéndonos, deshaciendo algunas cosas que nos pesan, tal vez demasiado para esta ocasión. Me emociona de sobremanera la presencia de Ana Clara Veras, la cual, sin que sepas, me hizo reflejar y está siendo grande inspiración/acción para mí. TE AGRADEZCO DE MI ALMA.

Tal vez les sorprenda esta particularidad que hago, sin embargo pido que acepten esta situación, ya que responde a una única posibilidad, la de relacionarnos con el mundo, o mejor dicho con nuestros mundos de manera particular, o sea de manera íntima, también porque toda reflexión compartida hay que ver con algo, una situación personal, teorizamos sobre nosotros en el mundo, nuestros mundos. E entre ellos, sea el mundo del teatro, de la danza, de lo escénico, etcétera, aunque sea un momento fugaz de una cruzada de miradas, una mirada de reojo, o la sensación de estar particularmente con cada uno dos presentes aquí ahora.

Creo que si toda relación hay esta particularidad, hay que ver directamente conmigo, esta relación es una relación íntima, una relación que se desprende desde mi interior. Eso espero, así que espero nos acompáñenos.

¿Quien soy? ¿Donde empiezo? ¿Qué soy? ¿Donde termino? ¿Cuándo soy?

Soy lo que no soy, soy de acuerdo a lo que no soy. Henry Tajfel (1982), psicólogo social, polaco, posteriormente nacionalizado

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británico, nos hace la propuesta de que la identificación tiene una relación a la comparación y, esta desarrollaría la categorización: O sea, soy rasgos que me “particularizan o diferencian de los otros”. A partir de aquí me emplazo en un lugar, o sea, me pongo en un lugar diferente. Soy Javier porque na soy Joao, Soy chileno porque no soy argentino, etc.

Mi casa es tu casa… frase cotidiana en México cuando conocemos alguna persona, claramente esta expresión corresponde a un acto de generosidad e amistad, ofreciendo a casa propia como posibilidad de nuevo encuentro y espacio de amistad. Para mí como extranjero, con una cultura de un grado de reserva más marcado, no es así. Mi casa es mi casa y, su casa es su casa. En el momento en que su casa sea mi casa, se me produce un desorden que invalida la comparación y diferencia, entonces mi lógica es puesta en riesgo, de hecho pierde una lógica de identidad, es raro que mi casa sea tu casa, alguna cosa aquí pierde identidad. Además de ser más lógico que mi casa sea mi casa porque no es la suya, me gustaría que fuera una hermosa casa, ojalá mejor y más grande, fresca, iluminada, acogedora, interesante, etc, que la suya. No me bastará solamente encontrar esta diferencia de oposición entre nuestras casas, también buscaré remarcar más esas diferencias para que así se quede claro la identidad y no vamos perder el sentido de la lógica.

Ahora bien, esta extensión y cantidades de diferencias, que añaden y añaden suena para mí a una dinámica de concurrencia. Entonces la identidad que crio es aquella que me particulariza y se diferencia del otro. Esta diferencia es un valor a lo cual me trae algunos beneficios: Ser del grupo de teatro me hace más exótico que ser del grupo de secretariado o contador, eso en algunos lugares me traerá más grande plusvalía e en otros, claramente van apuntarme de hippie, lastimoso, que consume marihuana. Así como apuntamos una competición en esta identificación y

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La identidad

marcación de las diferencias que nos dan identidad, esto nos pedirá una organización de valores. Alguien tendrá que organizar lo que vale más y menos. ¿Quién será lo que determine estos valores, qué grupo, desde qué lugar, por qué motivos organizacionales, van determinar estos valores?

Bueno, talvez puedo mirar en otra dirección: Yo soy de acuerdo al papel, al rol que adopto, o sea, ahora ustedes que están adelante, oyéndome, en ese lugar común, e yo en este lugar apartado, diferente a lo de ustedes, (yo me encuentro sentado en un lugar diferenciado que me distingue de lo común) este lugar distinguido espacialmente, geográficamente, esta situación nos instala en papeles que tenemos empezado a jugar, lo del alumno y el profesor, entonces estos papeles empiezan a determinar mi conducta, de esto nos hala Erving Goffman (1963) y su teoría da acción social. Entonces yo soy profesor porque en este momento me relaciono a partir de este papel, llegando a casa seré el esposo de Ana, con mi madre seré su hijo, con el doctor, yo seré el paciente. No solo somos este papel que adoptamos, más también enfrentamos a otros papeles, y estos regúlanos, digamos que se parece a un acuerdo, una convención, un establishment que dirígenos en ese sentido.

Vamos imaginar que llegamos a un concierto de rock, y en el estadio solamente veo muchas personas con delantal blanco y bisturís en la mano, eso sería muy raro, entraría en colapso en nuestro sentido de lógica… IDENTIDAD Y LÓGICA, dúo que vamos desarrollar pronto. Entonces Goffman nos envía a estos papeles y estos en conjunto, en diálogo, al establishment. Somos relaciones organizadas, una lógica. Ahora bien, estos papeles fueron puestos desde una coordinación determinada por valorización y organización nacidas desde un lugar, un lugar de identidad, una lógica, esta por su turno a se apoya en una certeza, esta certeza se apoyará en una verdad. Empecemos a oir com más insistencia esta palabra: verdade.

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Identidad – lógica – certeza – verdad.

Este grupo de palabras son evidentes cuando visitamos el dentista, el médico. La identidad que nos extraemos de ellos es una relación de: Identidad – lógica – certeza – verdad. Rápidamente nos sentamos en silencio, tímidos, frágiles ante un hombre de la ciencia. Lo identificamos, buscamos la lógica de ese papel desde una organización de certezas y finalmente concluímos de eso, una verdad.

Esta organización lógica, estos papeles, verdades, necesitan de todo un aparato de sustentación y, por eso empezamos a crear instrumentos entorno al papel desarrollado. Ejemplos, tenemos el los certificados, como los títulos universitarios, uniformes, disposiciones espaciales específicas, etc. Eso lo adoptamos para organizar las cosas, para no perdernos ante una lógica que danos una certeza.

Nosotros tenemos esta relación de creencia, credibilidad delante los papeles de manera tan enraizada que entonces surgen jugadores de papeles. Cuando se crean los papeles, cuando estos están bien jugados, bien “actuados , deben ser coherentes.

Podemos ver en los charlatanes esta relación de jugadores de papeles. Ellos seleccionan el papel a desarrollar y crean este entorno que apoya o concreta una verdad que acreditamos por su apariencia, por la lógica y coherencia de aquella organización. Se me pasó hace un año, un hombre que se vestía bien, hablaba y sustentaba asuntos interesantes, tenía todo un aparato que me hizo conceder a él un lugar de confianza, configuró en mí toda una disposición en mi actuar en favor de él. Entonces, este charlatán desapareció con el dinero que tenía facilitado le para emprender una compra importante. Cuando yo cuento esta anécdota, mis amigos me dicen: - ¿Pero cómo tú le creíste? ¿Cómo dejaste llevar

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por su apariencia? ¿Cómo primero, no buscó conocer a esa persona? Entonces yo contesto: - Pues sí, me dejé llevar por las apariencias, en la verdad no conocía a la persona. Yo le vi actuando como una persona decente, y veo ahora que creí en alguien jugando un papel. Mis amigos insisten: - ¿Tú crees en todo lo que ves?

Yo les regreso la pregunta: - ¿Amigos, cómo ustedes actúan cuando un dentista pide para ustedes sentaren y abrir la boca? ¿Cuándo la policía pide para tu detener el carro y bajar? ¿Cuál es tu postura ante la clase del profesor?

¿Sabemos si un policía es justo? ¿Sabemos si un dentista conoce o va saber lidiar con mis dientes?¿El profesor, cuánto sabe lo que está enseñando? Nosotros actuamos con total creencia ante los papeles y sus organizaciones, lógicas e construcciones que nos dicen cómo disponernos delante estos papeles.

¿Qué se sucede cuando recibimos un papel nuevo, porque esto es tanto en una dirección como en la inversa. Nos instalamos en un papel y también, nos conceden papeles que determinan nuestra identidad.

En una situación de ausencia de los padres, o responsable de la casa, el hermano mayor es quién muchas veces adopta este papel, y en poco tempo empieza a actuar con actitud coherente a este papel, comienza a organizar lo que este papel demanda, se pone más responsable, atento, cuidadoso, etc. Un alumno da su primera clase y hasta el tono de su cuerpo cambia, se instala en una postura que le da garantías de sustento de su nuevo papel. Se pasa mucho en la adolescencia donde muchas chicas acaban se convirtiendo en la más bonita, pero que por una concepción propia, adoptan esta condición por lo comentario de los chicos que la cortejan. Crean una identidad a partir de la descripción de un tercero.

Cuando aparece este otro, esta relación me lleva a otro lugar, el lugar de la apreciación por parte del otro, o sea, mi identidad

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a partir de la mirada del otro. Yo soy lo que la otra persona ve: Una mirada que nos construye. El intercambio de miradas crea un entretejido, construimos y nos construyen. Una identidad emergente, recíproca, negociada. (MEAD, 2015)

En el curso de teatro de la universidad yo quería hacer el papel de Ricardo III, y la profesora de actuación me decía que no era suficiente que yo creerse ser Ricardo III, necesitaba que mis compañeros, los otros actores, me vieran como Ricardo III, yo necesitaba aparecer en la mirada del otro para existir en esta identidad deseada. Comenzamos a ser, o a intentar ser coherentes con estas descripciones que las personas tienen hecho de nosotros, porque si no fuera así, entonces quién seríamos nosotros? ¿Nadie?

En toda interacción al atribuimos alguna cosa: - Mírelo, debe de ser feliz dentro de este carro último modelo, e en hondo no sabemos ni si es el dueño del carro, etc. Nosotros atribuímos una série de cualidades o no a aquello que no conocimos, nos anticipamos.

Mi familia aún me pregunta cómo és mi vida de actor, lo que hago cuando no estoy actuando en el teatro. Creo que estarían más tranquilos se fuera un actor de cinema o televisión, más de teatro?

Ustedes me dirán: ¿Su familia es un poco atrasada, cierto? Y les contesto: - Mi familia es promedio, o sea, está en una situación común a muchas, si no, la mayoría de las familias que no tienen un acceso más grande al universo artístico. Mi familia lee y si dispone delante los papeles porque así conciben a las relaciones sociales.

Bueno, hasta aquí encontramos algunas definiciones de identidad, de identidad social. Entonces me pregunto sobre mi identidad, mi relación individual con la identidad:

¿Cómo yo me emerjo, aparezco, me construyo? Soy muchas piezas, pedazos de alguna cosa? Soy el funcionamiento del sistema nervioso central, soy un conjunto de huesos, líquidos, impulsos eléctricos, neuronas, sangre, etc.? Talvez no consiga encontrar

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esa identidad contando estes fragmentos, pedazos de este Yo, un Yo biológico estrutural. Continúo con la búsqueda del Yo, de mi identidad y empiezo la busca desde un lugar muy profundo: mi alma es mi identidad.

Acho que nem um nem otro me deixa satisfeito ainda. Me preguntan: ¿Quién eres tú? Y, yo comienzo: Yo soy Javier, soy así, nací allá, me dedico a… me gusta eso… hago esto y aquello… Leyendo esta descripción, al parecer soy eso, una descripción, una historia, o sea un género literario. Soy una novela, una historia que se va contando a la medida que la minoría va seleccionando a las mejores pasajes, o a los pasajes que necesito inventar para que yo/historia sea bien sucedido. Además, porque vivimos en el lenguaje, nada más justo que nos relatar, contar nuestra historia. Somos un género literário. También nos cuentan, nos leen, nos anuncian, enuncian, nos dan un título, etc. Todas acciones legítimas de un observador, de un otro que habla de sí mismo o directamente de un otro ahí que me observa, o en este caso de un yo dislocado.

Si soy una historia, esta puede ser una bella historia, puedo escribir la mejor historia posible. Puedo ser mi autor y en esta relación estar muy atento cuando, escribiéndome aparezca pasajes de la historia que pueden ser violentas, amorosas, injustas, etc. Soy el responsable delante mi escrita.

Continúo buscando mi identidad y llego a un lugar que me hace pedir ayuda a las personas al rededor. Preguntaré a ustedes: ¿Dónde comienzo yo? ¿Dónde acabo? (Me hago esta pregunta a los asistentes presentes en la clase)

Cuatro personas responden donde ellas piensan que comienzo y acabo, dan cuatro respuestas diferentes: Algún de ustedes están mintiéndome, tres de ustedes están mintiendo: ¿Quienes son los mentirosos? ¿Usted, usted, o usted? Acabamos de conocernos y ya están me mintiendo? (Este juego con los asistentes

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generalmente provoca un momento de relajamiento y entramos en un juego)

¿Quién de ustedes miente, nadie? O sea, todos están hablando la verdad o para ser más exactos, cada un de usted está hablando a su verdad? ¿Será que cada un de nosotros tenemos una verdad?

Entonces, si cada uno de nosotros tiene una verdad, hay sentido hablar de verdad? La verdad no es aquella cosa única, determinada por un inicio y final, una certeza, medible cuantificable o por lo menos aquella cosa cierta, única que sirve de referencia para todo lo demás?

Bueno si hay tantas verdades, todo eso que acabo de enumerar pierde algo de sentido, de lógica de certeza de… verdad. ¿Hay sentido, lógica, razón, hablar de verdad? Si no hay verdad, este lugar absoluto, tal vez sea legítimo decir que no ha principio ni fin, ya que verdad es referencia de principio e fin.

Los puntos de referencia, verdaderos se han perdido, se perdieran con la verdad. No hay comienzo, no hay fin. Entonces, lo que se queda? El tránsito.

Tal vez seamos solo el tránsito. Este tránsito que es tan difícil de dominar, ya que una vez cazado, se transforma en una verdad, o por lo menos en esta ilusión de verdad.

Ustedes me dirán: Javier, no venga a decir que yo no soy algo concreto, que solamente soy tránsito… O lo que es el tránsito? Estoy de acuerdo que no queremos no ser, nadie quiere no ser. Nadie quiere no ser dicho, nombrado, descrito… si no me nombran, desaparezco?

No, aparece el silencio! El silencio? Más de lo que me está hablando, silencio? Yo me llamo Carlos, me llame por favor. Si yo te llamo Carlos, cerramos usted ahí, Carlos acaba muy pronto, pierde a su condición de tránsito, de potencia.

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Es como el silencio, el silencio como posibilidad de escucha, como posibilidad de sonido. El silencio es tránsito, es la infinidad que usted puede ser. Solo que hay que permitirse oír y, para eso, tal vez sea necesario un poco de silencio.

Escuchar VS HablarTransito VS Posición Potencia VS ReferenciaCuriosidad Incertidumbre VS Certeza

¡No me confunda diciendo que yo no soy!Sí, tú no eres, tú está siendo.

Pero lo que está siendo, que cosas están siendo para que aparezca el yo: mi pensamiento, pienso luego existo? Mi sangre que corre, mis fluidos, mi sistema nervioso actuando, mi memoria, el lenguaje, el mundo afuera, lo que yo sé o ignoro? ¿Si es un transito, lo que transita?

Todo lo anterior: soy relación. Una situación al cual es un conjunto de relaciones.

¿Soy un cúmulo de cosas, o sea, de aquí a 20 años más yo debería estar enorme de tanto que acumulo durante la vida? No creo que sea bien así, yo tengo 41 años de vida y se fuera de la manera que me dice, entonces debería pesar mil toneladas y ser muy alto y, mi apariencia dice todo lo contrario, creo que con el pasar del tempo me quedo más flaquito y más bajito.

Entonces tal vez esta cuestión de hacerse y deshacerse tenga sentido. Para que el show siga el trapecista tiene que prenderse,

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soltar e volver a prenderse en el trapecio. Me construo y desarmo constantemente.

¿Pero si eso fuera así, entonces no llego a ningún lugar concreto, final, verdadero? Al parecer solo se queda la potencia. Usted se acepta potencia?

Emergimos y DesaparecemosYo sé que nadie quiere sumir, desaparecer, nosotros

queremos solamente aparecer, ser, tener una identidad. Nadie quiere ser un nadie.

Más atentos que hay ventajas: Ulises usando su particular inteligencia, al huir del Cíclope respondió delante la interrogación ¿Quién anda ahí?: Nadie! Entonces el Ciclope grita a los guardias: Nadie está huyendo, nadie está huyendo!

Si nadie está huyendo, entonces no es necesario arrestar a nadie. ¿Alguien aquí le gustaría de ser nadie y conseguir así huir del Cíclope?

De acuerdo con el profesor Leandro Karnal, en una de sus clases online comentó: ¨Cuando yo aceptar que no soy nadie, damos la oportunidad de emerger . Ahora bien, en tiempos como los de hoy, con tantas voces se levantando para hacerse visibles y reconocidas, cómo sería ese negocio, ese asunto de ser nadie, cuando hemos luchado tanto tiempo para sernos escuchados y no ignorados?

Siento que hay que ver con confiar en el poder, en la precisión de ser un tránsito tan incisivo, un tránsito que actúa de manera local, detallada, sutil, amorosa, en el espacio y tiempo inmediato, donde incluso la reunión o coincidencia de estos encuentros producen este cuerpo social significativo. Entonces hago de mi práctica del mi yo, de esta mi identidad tránsito¨ una cuestión de obra de arte, como lo sugirió Foucault entre otros, hacer de nuestra relación con lo nuestro inmergir, de ese detalle transitorio a mejor

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deriva que podamos tener consciencia, una deriva amorosa, una obra de arte de nuestras vidas, sabiendo que ellas solo harán una caricia e se irán.

Entonces cuando te acaricio tú puedes, ojalá, que se estremezca, o entonces se sorprenda y tenga que reconfigurar su cuerpo de acuerdo a la emoción de la sorpresa o del estremecimiento. Ese gesto que continuará, será un gesto lleno de contundencia.

Entonces sí, no soy las partes, no soy solamente eso o aquello, la reducción de mis partes o lugares, ni solamente la percepción de mi entorno, la lógica de los conceptos míos. Soy lo que está ocurriendo entre ellos, este conversar, esta platica entre lo que está ocurriendo mientras lo que se sucede, se sucede.

— Ahora van decirme: Ah Javier, ok entonces vives en el mundo de lo nunca jamás? Y le contesto: Espera ahí, no, yo vivo en Cuernavaca, soy hombre, soy profesor, etc., y usted ataca de vuelta :

— Usted es una construcción, una identidad, es todo aquello que negó anteriormente.

— Sí, pero mira bien, en el hondo, en el hondo acepto usar estas convenciones, sabiendo que son solamente eso, convenciones, permitiendo entonces, ser las potencias que puedo ser, e así usted.

Somos las relaciones con las cosas, no las cosas en sí. Empezamos en la relación, no en las partes. Somos una situación.

Otra relación es la que apunta el investigador Luc Delannoy (2015), director del Instituto de Neuroartes. Nos habla en su última publicación sobre ser-nos emergencias ilusorias de un Todo, un Todo sin principio ni final, sin identidad ya que es un Todo.

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Imagine un mar muy agitado, olas de ese mar emergiendo por aquí y por allá, como una danza. Entonces podríamos pensar que cada vez que yo distingo una ola como algo independiente de la mar, estoy criando una ilusión de independencia, estoy otorgando identidad a un transito que es la mar. Además de esto podemos decir que cada ola está conectada a este Todo, o sea no hay tal ola, hay una manifestación del Todo.

Permítame contarles una historia:

Es la historia de un hombre a quien yo definiría como: buscador…

Un buscador es alguien que busca, no necesariamente alguien que encuentra. Ni es alguien que sabe lo que precisamente está buscando.

Un día, el buscador sintió que debía dirigir-se a la ciudad de Kammir. Tenía aprendido a hacer caso a estas sensaciones que venian de um lugar desconocido de si mismo. Por eso dejó todo y se fué.

Después de 2 días de andar por los caminos llenos de polvo, avistó, al lejos, Kammir. Un poco antes de llegar al pueblo, le llamó la atención una colina a la derecha del camino. Estaba cubierta de un verde maravilloso y había inmensos árboles, pájaros y flores encantadoras. En su alrededor había una especie de zanja de madera lustrada.

Una pequeña puerta de bronce lo invitaba a entrar.

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De repente, sintió que olvidaba la ciudad y sucumbió lentamente entre las piedras blancas que estaban distribuidas como que a suerte, entre los arboles.

Se dejó pasear sus ojos, que eran los de un buscador, y tal vez por eso descubrió aquella inscripción sobre una de las piedras.

Abdul Tareg, vivió 8 años, 6 meses, 2 semanas y 3 días

Se emocionó un poco al percibir que aquella piedra no era simplemente una piedra: era una lapide.

Sintió pena al pensar que un niño de tan tierna edad estaba sepultada en aquel lugar.

Mirando al rededor, el hombre se dio cuenta de que la piedra al lado también tenía una inscripción. Se acercó para leerla. Decia:

Yamir Kalib, vivió 5 años, 8 meses y 3 semanas

El buscador se sintió terriblemente emocionado. Aquel lindo lugar era un cementerio, y cada piedra era una sepultura.

Una por una, empezó a leer las lapides. Todas tenían inscripciones similares: un nombre y el tiempo de vida exacto del muerto.

Mas aquilo que mais aterrou foi verificar que o que mais tempo tinha vivido passava pouco mais dos onze anos…

Tomado por uma horrível dor, sentou-se e pôs-se a chorar.

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O cuidador do cemitério passava por ali e aproximou-se. Viu-o a chorar, em silêncio, durante algum tempo, e depois perguntou-lhe se chorava por algum familiar.

- Não, por nenhum familiar – disse o buscador – Que passa neste sítio? Que coisa tão terrível há nesta cidade? Porque há tantas crianças enterradas neste lugar? Que horrível maldição caiu sobre esta gente, que os obrigou a construir um cemitério para crianças?

O ancião sorriu e disse:

- Pode ficar tranquilo. Não existe tal maldição. O que acontece é que aqui temos um velho costume. Vou-lhe contar …

“Quando um jovem chega aos 15 anos, os seus pais oferecem--lhe um pequeno caderno, como este que aqui tenho, para que o pendure ao pescoço. É tradição entre nós que, a partir desse momento, cada vez que alguém desfruta intensamente de algo, abre o caderno e anota nele:

Á esquerda, o que foi o desfrutado.

Á direita, quanto tempo durou o gozo.

Conheceu a sua namorada e apaixonou-se por ela. Quanto tempo durou essa paixão enorme e o enorme prazer de conhecê-la? Uma semana? Duas? Três semanas e meia…?

E depois, a emoção do primeiro beijo, o prazer maravilhoso do primeiro beijo.

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Esta es la historia de un hombre al que yo definiría como buscador.

Un buscador es alguien que busca. No necesariamente es alguien que encuentra. Tampoco es alguien que sabe lo que está buscando. Es simplemente alguien para quien su vida es una búsqueda.

Un día nuestro Buscador sintió que debía ir hacia la ciudad de Kammir. Él había aprendido a hacer caso riguroso a esas sensaciones que venían de un lugar desconocido de sí mismo, así que dejó todo y partió.

Después de dos días de marcha por los polvorientos caminos, divisó Kammir a lo lejos, pero un poco antes de llegar al pueblo, una colina a la derecha del sendero le llamó la atención.

Estaba tapizada de un verde maravilloso y había un montón de árboles, pájaros y flores encantadoras.

Estaba rodeaba por completo por una especie de valla pequeña de madera lustrada, y una portezuela de bronce lo invitaba a entrar.

De pronto sintió que olvidaba el pueblo y sucumbió ante la tentación de descansar por un momento en ese lugar.

El Buscador traspasó el portal y empezó a caminar lentamente entre las piedras blancas que estaban distribuidas como por azar entre los árboles.

Dejó que sus ojos, que eran los de un buscador, pasearan por el lugar… y quizá por eso descubrió, sobre una de las piedras, aquella inscripción?

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Abedul Tare, vivió 8 años, 6 meses, 2 semanas y 3 días?

Se sobrecogió un poco al darse cuenta de que esa piedra no era simplemente una piedra.

Era una lápida, y sintió pena al pensar que un niño de tan corta edad estaba enterrado en ese lugar?

Mirando a su alrededor, el hombre se dio cuenta de que la piedra de al lado también tenía una inscripción.

Al acercarse a leerla, descifró:

Lamar Kalib, vivió 5 años, 8 meses y 3 semanas.

El buscador se sintió terriblemente conmocionado. Este hermoso lugar era un cementerio y cada piedra una lápida. Todas tenían inscripciones similares: un nombre y el tiempo de vida exacto del muerto, pero lo que lo contactó con el espanto, fue comprobar que, el que más tiempo había vivido, apenas sobrepasaba 11 años.

Embargado por un dolor terrible, se sentó y se puso a llorar.

El cuidador del cementerio pasaba por ahí y se acercó, lo miró llorar por un rato en silencio y luego le preguntó si lloraba por algún familiar.

– No, ningún familiar? dijo el buscador – Pero… ¿qué pasa con este pueblo? ¿Qué cosa tan terrible hay en esta ciudad? ¿Por qué tantos niños muertos enterrados en este lugar? ¿Cuál es la

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horrible maldición que pesa sobre esta gente, que lo ha obligado a construir un cementerio de niños?

El anciano cuidador sonrió y dijo:

“Puede usted serenarse, no hay tal maldición, lo que pasa es que aquí tenemos una vieja costumbre. Le contaré… Cuando un joven cumple quince años, sus padres le regalan una libreta, como ésta que tengo aquí, colgando del cuello, y es tradición entre nosotros que, a partir de entonces, cada vez que uno disfruta intensamente de algo, abra la libreta y anote en ella:

a la izquierda, qué fue lo disfrutado,

a la derecha, cuánto tiempo duró ese gozo.

¿Conoció a su novia y se enamoró de ella?

¿Cuánto tiempo duró esa pasión enorme y el placer de conocerla?

¿Una semana, dos?

¿Tres semanas y media?

¿Y después?, la emoción del primer beso, ¿cuánto duró?

¿El minuto y medio del beso? ¿Dos días? ¿Una semana?

¿Y el embarazo o el nacimiento del primer hijo? ¿Y el casamiento de los amigos? ¿Y el viaje más deseado? ¿Y el encuentro con el hermano

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que vuelve de un país lejano? ¿Cuánto duró el disfrutar de estas situaciones?,

¿horas?, ¿días?

Así vamos anotando en la libreta cada momento, cada gozo, cada sentimiento pleno e intenso… 

Y cuando alguien se muere,

es nuestra costumbre abrir su libreta

y sumar el tiempo de lo disfrutado,

para escribirlo sobre su tumba.

Porque ése es, para nosotros,

el único y verdadero TIEMPO VIVIDO.”

(Jorge Bucay)

Tal vez mi identidad es esta relación de mi tiempo desfrutado, de mi tiempo vivido.

Gracias.

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La identidad

Referências

BUCAY, Jorge. El buscador. Blog narrative breve. Disponível em: narrativabreve.com/2014/10/cuento-jorge-bucay-el-buscador.html. Acesso em: 23 nov. 2017.

DELANNOY, Luc. Una cuestión de conciencia. [S.l.]: Ediciones Metales Pesados, 2017.

DELANNOY, Luc. Neuroartes, un laboratorio de ideas. [S.l.]: Ediciones Metales Pesados, 2015.

GOFFMAN, E. Stigma: notes on the management of spoiled identity. Englewood Cliffs, New Jersey: Prentice-Hall, 1963.

GRACIA, Tomás Ibañez (coord.). Introducción a la psicología social. [S.l.]: Editorial UOC, 2004.

MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. El árbol del conocimiet: Las bases biológicas del entendimiento humano. [S.l.]: LUMEN Editorial Universitaria, 2003.

MATURANA, Humberto. El sentido de lo humano. Granica: Editor J. C. Saez, 2008.

MEAD, George Herbert. Mind, Self, and Society: The Definitive Edition. Chicago: The Difinitive Editions, 2015.

TAJFEL, H. Grupos humanos e Categorias sociais: Estudos em psicologia social. Lisboa: Livros Horizonte, 1982. v. I.

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Javier Díaz Dalannais Traduzido por Iane Licurgo Gurgel Fernandes1

Realizarei minha prática reflexiva na companhia de vocês, com vocês. Falo de prática porque abordaremos isso, sobre nos praticar em diferentes situações, domínios, estados, como um fenômeno do emergir de nós mesmos, de fato como única posibilidade de estar aqui... Entendo, a partir disso, uma coisa, para mim, terrivelmente maravilhosa: não é a vida a que me permite praticar ou me praticar, mas bem ao inverso, é a prática que me dá a vida, a posibilidade de viver, vivo porque me pratico. Conversaremos sobre La Identidad, sobre uma emergência, como urgência e, uma emergência como um nascimento ou criação da identidade, fazer-se e se desfazer da identidade, isso de mãos dadas com fazer-nos e nos desfazer nós mesmos, nossos corpos, nossa mente, NÓS. Espero transitarmos, fazendo-nos e nos desfazendo, desfazendo algumas coisas que nos pesam, talvez demasiado, para esta ocasião.

Talvez lhes surpreenda esta particularidade que faço, sem embargo peço que aceitem esta situação, já que responde a uma única posibilidade, a de nos relacionarnos com o mundo, ou melhor dito, com os nossos mundos de maneira particular, ou seja, de maneira íntima, também porque toda reflexão compartilhada tem a ver com algo, uma situação pessoal, teorizamos sobre nós

1 Iane Licurgo é Mestra em Artes Cênicas pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFRN e professora de Artes/Dança da rede pública de Ensino do estado do Rio Grande do Norte.

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no mundo, nossos mundos. E entre eles, seja o mundo do teatro, da dança, do cênico etc., ainda que seja um momento fugaz de um cruzar de olhares, um canto de olho, ou a sensação de estar particularmente com cada um dos presentes aqui agora. Acredito que se toda relação tem essa particularidade, que tem a ver direta-mente comigo, essa relação é uma relação íntima, uma relação que se desprende desde o meu interior. Isso espero, assim como espero que nos acompanhemos.

Quem sou? Onde começo? Que sou? Onde termino? Quando sou?

Sou o que não sou, sou de acordo ao que não sou. Henry Tajfel (1982), psicólogo social, polonês, posteriormente naciona-lizado britânico, faz-nos a proposta de que a identifição tem uma relação com a comparação e esta desenvolveria a categorização: ou seja, sou sinais que me “particularizam ou diferenciam dos outros”. A partir de aqui me ocupo de um lugar, ou seja, eu me coloco em um lugar diferente. Sou Javier porque não sou João, sou chileno porque não sou argentino etc.

Mi casa es tu casa… frase cotidiana no México quando conhecemos alguma pessoa. Cclaramente, essa expressão corres-ponde a um ato de generosidade e amizade, oferecendo a casa própria como possibilidade de novo encontro e espaço de amizade. Para mim, como extrangeiro, com uma cultura, com um grau de reserva mais marcado, não é assim. Minha casa é minha casa e sua casa é sua casa. No momento em que sua casa seja minha casa, isso me produz uma desordem que invalida a comparação e a diferença, então, a minha lógica é posta em risco, de fato perde uma lógica de identidade, é estranho que minha casa seja sua casa, alguma coisa

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perde identidade. Além de ser mais lógico que minha casa seja minha casa porque não é a sua, gostaria que fosse uma bela casa, tomara que melhor, maior, mais fresca, iluminada, acolhedora, interessante etc. que a sua. Não me bastará só encontrar essa dife-rença de oposição entre nossas casas, também procurarei remarcar mais essas diferenças para que assim fique explícita a identidade e não vamos perder o sentido de lógica. Agora, bem, essa extensão e quantidade de diferenças, que somam e somam soa para mim como uma dinâmica de concorrência.

Então, a identidade que crio é aquela que me particulariza e se diferencia do outro. Essa diferença é um valor, o qual me traz mais ou menos benefícios: ser do grupo de teatro me faz mais exótico que ser do grupo de secretariado ou contador, isso em alguns lugares me trará maior plusvalía e em outros, claramente, vão me apontar de hippie, digno de pena, maconheiro. Assim como apontamos uma competição nessa identificação e marcação das diferenças que nos dão identidade, isso nos pedirá uma organização de valores. Alguém terá de organizar o que vale mais ou menos. Quem será que determina esse lugar, que grupo, desde onde, por quais motivos organizacionais vão determinar esses valores?

Bom, talvez possa olhar em outra direção: eu sou de acordo com o papel, o rol que adoto, ou seja, agora vocês que estão aí na frente, ouvindo-me, nesse lugar comum, e eu nesse lugar apar-tado, diferente do de vocês (eu me encontro sentado em um lugar diferenciado que me distingue do comum), esse lugar distinguido espacialmente, geograficamente, essa situação nos instala em papéis que nós começamos a jogar, o do aluno e do professor. Então, esses papéis começam a determinar minha conduta, isso nos fala Erving Goffman (1963) e sua teoria da ação social. Desse modo, eu sou professor porque nesse momento me relaciono a partir desse papel, chegando em casa serei o esposo de Ana; com minha mãe, serei seu

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filho; com o doutor, eu serei o paciente. Não somos só esse papel que adotamos mas também nos enfrentamos com outros papéis, e eles nos regulam. Digamos que aparece um acordo, uma convenção, há um establishment que nos dirige nesse sentido.

Vamos imaginar que chegamos a um concerto de rock, e no estádio encontro apenas muitas pessoas com avental branco e bisturis na mão. Isso seria muito esquisito, entraria em colapso o nosso sentido de lógica… IDENTIDADE E LÓGICA, dupla que vamos desenvolver logo. Então, Goffman remete-nos a esses papéis e esses, em conjunto, em diálogo, ao establishment. Somos relações organizadas, uma lógica. Agora, esses papéis foram colocados com base em uma coordenação determinada por valorização e organização nascidas a partir um lugar, um lugar de identidade, uma lógica, e essa, por sua vez, apoia-se em uma certeza. Essa certeza se apoiará em uma verdade. Começamos a ouvir com mais insistência essa palavra: verdade.

Identidade – lógica – certeza – verdade

Esse grupo de palavras torna-se evidente quando visitamos o dentista, o médico. A identidade que nós extraímos deles é uma relação de: identidade – lógica – certeza – verdade. Rapidamente, nós nos sentamos em silêncio, tímidos, frágeis perante um homem da ciência. Nós o identificamos, procuramos a lógica desse papel a partir de uma organização de certezas e finalmente concluímos disso uma verdade.

Essa organização lógica, esses pepéis, essas verdades, precisam de todo um aparato de sustento e, por isso, começamos a criar instrumentos em relação ao papel desenvolvido. Exemplo: termos nos certificado do título universitário, dos uniformes, das

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disposições espaciais específicas etc. Adotamos isso para organizar as coisas, para não nos perdernos diante uma lógica que nos dá uma certeza.

Nós temos essa relação de crença, credibilidade perante os papéis de maneira tão enraizada que então surgem “jogadores de papéis”. Quando se criam os papéis, quando eles estão bem jogados, distribuídos, bem “atuados”, devem ser coerentes.

Podemos ver nos palestrantes essa relação de jogadores de papéis. Eles selecionam o papel a desenvolver e criam esse entorno que apoia ou concretiza uma verdade que acreditamos pela sua aparência, pela lógica e coerência daquela organização. Aconteceu comigo faz um ano, um homem que se vestia bem, falava e sustentava assuntos interessantes, tinha todo um aparato que me fez conceder a ele um lugar de confiança, configurou em mim toda uma disposição no meu atuar em favor dele. Então, esse charlatão sumiu com o dinheiro que eu lhe tinha facilitado para empreender uma compra importante. Quando eu conto essa anedota, meus amigos me dizem: – Mas como você acreditou nele? Como se deixou levar pela aparência? Como, primeiro, não procurou conhecer essa pessoa? Então eu respondo: – Pois é, eu me deixei levar pelas aparências, na verdade, não conhecia a pessoa. Eu o vi atuando como uma pessoa decente, e vejo agora que acreditei em alguém jogando um papel. Meus amigos insistem: – Você acredita em tudo o que vê?

Eu lhes devolvo a pergunta: – Amigos, como vocês agem quando um dentista pede para vocês sentarem e abrirem a boca? Quando a polícia pede para você parar e descer do carro? Qual é a sua postura na aula de um prefessor?

Sabemos se um policial é justo? Sabemos se um dentista conhece ou vai saber lidar com os meus dentes? O professor, quanto sabe do que está ensinando? Agimos com total crença diante dos

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papéis e de suas organizações, lógicas e construções que nos dizem como nos portar perante esses papéis.

O que acontece quando recebemos um papel novo, porque isso é tanto numa direção como na inversa. Nós nos inserimos em um papel e também nos concedem papéis que determinam nossa identidade.

Num caso de ausência dos pais, ou responsável da casa, o irmão maior é quem muitas vezes adota esse papel, e em pouco tempo começa agir com atitude coerente ao papel, começa a orga-nizar o que esse papel demanda, fica mais responsável, atento, cuidadoso etc. Um aluno dá a sua primeira aula e, pronto, até o tom do seu corpo muda, ele se instala em uma postura que lhe dê garantias de sustentar o seu novo papel. Acontece muito na adoles-cência que muitas meninas acabam sendo a menina bonita, mais do que por uma concepção própria, adotam essa condição pelos comentários dos meninos que a cortejam. Criam uma identidade a partir da descrição de um terceiro.

Quando aparece esse outro, essa relação me leva a outro lugar, o lugar da apreciação por parte do outro, ou seja, minha identidade a partir do olhar do outro. Eu sou o que a outra pessoa vê: um olhar que nos constrói. O intercâmbio de olhares cria um entrelaçado, construímos e nos constroem. Uma identidade emergente, recíproca, negociada (MEAD, 2015).

No curso de teatro da universidade, eu queria fazer o papel de Ricardo III, e a professora de atuação me dizia que não era suficiente que eu acreditasse ser Ricardo III, precisava que meus colegas, os outros atores, me vissem como Ricardo III, eu precisava aparecer nos olhos do outro para existir nessa identidade desejada. Começamos a ser, ou tentamos ser coerentes com essas descrições que as pessoas têm feito sobre nós, porque se não for assim, então quem seríamos nós? Ninguém?

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A identidade

Em toda interação atribuímos alguma coisa: – Olhe, ele deve ser feliz dentro desse carro último modelo, e no fundo não sabemos nem se é o dono do carro etc. Nós atribuímos uma série de quali-dades ou não àquilo que não conhecemos, nós nos antecipamos.

Minha família ainda se pergunta como é minha vida de ator, o que faço quando não estou atuando no teatro. Acho que estariam mais tranquilos se fosse um ator de cinema ou televisão, mas de teatro?

Vocês me dirão: – A sua familia é um pouco atrasada, certo? E eu lhe respondo: – Minha familia é mediana, ou seja, está numa sitação comum a de muitas, se não da maioria das famílias que não tem um maior acesso ao universo artístico. Minha familia lê e se dispõe perante os papéis porque assim compreendem as relações socias.

Bom, até aqui encontramos algumas definições de iden-tidade, de identidade social. Então me pergunto sobre minha identidade, minha relação individual com a identidade: como eu emerjo, apareço, me construo? Sou muitas peças, pedaços de alguma coisa? Sou o funcionamento do sistema nervoso central, sou um conjunto de ossos, líquidos, impulsos elétricos, neurônios, sangue etc.? Talvez não consiga achar essa identidade contando esses fragmentos, pedaços desse Eu, um Eu biológico estrutural. Continuo com a pesquisa do Eu, da minha identidade e começo a procurar a partir de um lugar muito profundo: minha alma é minha identidade. Acho que nem um nem outro me deixa satisfeito ainda.

Se me perguntam: – Quem é você? Eu começo: – Eu sou Javier, sou assim, nasci lá, me dedico a... gosto de... faço isso e aquilo... Lendo essa descrição, ao parecer, sou isso: uma descrição, uma história, ou seja, um gênero literário. Sou uma novela, uma história que vai se contando à medida que a memória vai selecio-nando as melhores passagens, ou as passagens que preciso inventar

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para que eu/história seja bem-sucedido. Além do mais, porque vivemos na linguagem, nada mais justo que nos relatar, contar nossa história. Somos um gênero literário. Também nos contam, nos leem, nos anunciam, enunciam, nos dão um título etc. Todas essas são ações legítimas de um observador, de um outro que fala de si mesmo ou diretamente de um outro lá que me observa, ou, nesse caso, de um eu deslocado.

Se sou uma história, esta pode ser uma bela história, posso escrever a melhor história possível. Posso ser o meu autor e, nessa relação, estar muito atento quando, me escrevendo, apareçam passagens da história que podem ser violentas, amorosas, injustas etc. Sou o responsável frente à minha escrita.

Continuo procurando a minha identidade e chego a um lugar que me faz pedir ajuda às pessoas ao redor. Perguntarei a vocês: – Onde eu começo? Onde acabo? (Faço essa pergunta aos assistentes presentes na aula).

Quatro pessoas respondem onde elas acham que começo e acabo, dão quatro respostas diferentes. Alguém de vocês está mentindo para mim, três de vocês estão mentindo: quem são os mentirosos? Você, você, ou você? Acabamos de nos conhecer e já estão mentindo pra mim? (Essa relação com os assistentes geral-mente provoca um momento de relaxamento e entramos num jogo).

Quem de vocês mente? Ninguém? Ou seja, todos estão falando a verdade, ou, para ser mais exatos, cada um de vocês está falando a sua verdade? Será que cada um de nós tem uma verdade? Então, se cada um de nós tem uma verdade, tem sentido falar de verdade? Verdade não é aquela coisa única, determinada por um início e final, uma certeza, medível, quantificável ou pelo menos aquela coisa certa, única que serve de referência para todo o demais?

Bom, se existem tantas verdades, tudo isso que acabo de enumerar perde algo de sentido, de lógica, de certeza de… verdade.

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A identidade

Tem sentido, lógica, razão, falar de verdade? Se não há verdade, esse lugar absoluto, talvez seja legítimo dizer que não há princípio nem fim, já que verdade é referência de princípio e fim.

Os pontos de referência verdadeiros se perderam, se perderam com a verdade. Não há começo, não há fim…. Então, o que fica? O trânsito. Talvez sejamos só trânsito. Esse trânsito que é tão difícil de dominar, já que uma vez caçado, transforma-se em uma verdade, ou pelo menos nossa ilusão de verdade.

Vocês me dirão: – Javier, não me venha dizer que eu não sou algo concreto, que sou somente trânsito... o que é o trânsito? Estou de acordo que não queremos não ser, ninguém quer não ser. Ninguém quer não ser dito, nomeado, descrito... Se não me nomeam, desapareço?

Não, aparece o silêncio! O silêncio? Mas do que está me falando, silêncio? Eu me chamo Carlos, me chame, por favor. Se eu te chamo Carlos, fechamos você aí, Carlos acaba muito rápido, perde a sua condição de trânsito, de potência.

É como o silêncio, o silêncio como possibilidade de escuta, como possibilidade de som. O silêncio é trânsito, é a infinidade que você pode ser. Só que tem de se permitir ouvir e, para isso, talvez seja necessário um pouco de silêncio.

Escutar vs FalarTrânsito vs PosiçãoPotência vs ReferênciaIncerteza vs Certeza

— Não me confunda dizendo que eu não sou! — É, você não é, você está sendo.Mas, o que está sendo, que coisas estão sendo para que

apareça o eu: o meu pensamento. Penso, logo existo? O meu sangue

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que corre, os meus fluidos, meu sistema nervoso agindo, minha memória, a linguagem, o mundo lá fora, o que eu sei ou ignoro? Se é um trânsito, o que trasita?

— Tudo o anterior: sou relação. Uma situação que é um conjunto de relações.

— Sou um acúmulo de coisas, ou seja, daqui a 20 anos mais eu deveria estar enorme de tanto que acumulo durante a vida?

— Não acho que seja bem assim, eu tenho 41 anos de vida e, se for do jeito que me diz, então, deveria pesar mil toneladas e ser muito alto e, a minha aparência diz todo o contrário, acho que, com o passar do tempo, fico mais magrinho e mais baixinho.

Então, talvez essa questão de se fazer e desfazer tenha sentido. Para que o show continue o trapezista tem de se segurar, soltar e voltar a segurar o trapézio.

Eu me construo e desarmo constantemente.

— Mas, se for assim, então não chego a nenhum lugar concreto, final, verdadeiro?

— Ao parecer, só fica a potência. Você se aceita potência?

Emergimos e desaparecemos.Eu sei que ninguém quer sumir, desaparecer, nós

queremos somente aparecer, ser, ter uma identidade. Ninguém quer ser ninguém.

Mas, atentos que há vantagens: Ulisses, usando sua particular inteligência, ao fugir do Ciclope respondeu perante a

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A identidade

pergunta: quem anda aí? – Ninguém! Então, o Ciclope grita aos guardas: “Ninguém está fugindo, ninguém está fugindo!”.

Se ninguém está fugindo, então não é preciso prender alguém. 

— Alguém aqui gostaria de ser ninguém e conseguir assim fugir do Ciclope?

O professor Leandro Karnal, em uma de suas aulas on-line, comentou: “Quando eu aceitar que não sou ninguém, damos a oportunidade de emergir”. 

Agora, bem, em tempos como os de hoje, com tantas vozes se levantando para se fazerem visíveis e reconhecidas, como seria esse negócio, esse assunto de ser ninguém, quando temos lutado tanto tempo por ser ouvidos e não ignorados?

Sinto que tem a ver com confiar no poder, na precisão de ser um trânsito tão incisivo, um trânsito que atua de maneira local, detalhada, sutil, amorosa, no espaço e tempo imediato, em que, inclusive, a reunião ou a coincidência desses encontros produzem esse corpo social significativo. Então, faço da minha prática do meu eu, desta minha “identidade trânsito” uma questão de obra de arte, como sugeriu Foucault e, entre outros, fazer da nossa relação com o nosso emergir, desse detalhe transitório, a melhor deriva de que podemos ter consciência, uma deriva amorosa, uma obra de arte da nossas vidas, sabendo que elas só farão uma carícia e irão embora.

Assim, quando te acaricio, você pode, tomara, se estremecer, ou então se surpreender e precisar reconfigurar seu corpo de acordo com a emoção da surpresa ou do estremecimento. Esse gesto que continuará será um gesto cheio de contundência.

Por isso, sim, não sou as partes, não sou somente isso ou aquilo, a redução das minhas partes ou dos lugares, nem somente

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a percepção do meu entorno, a lógica dos meus conceitos. Sou o que está ocorrendo entre eles, esse conversar, esse papo entre o que está ocorrendo enquanto acontece o acontecer.

— Agora vão me dizer: – Ah, Javier, ok, então, você mora no mundo do nunca jamais?

— E eu lhes respondo: – Espera aí, não, eu moro en Cuernavaca, sou homem, sou profesor etc. e você “ataca de volta”:

— Você é uma construção, uma identidade, é tudo aquilo que negou anteriormente.

— Sim, mas olhe bem, no fundo, no fundo, aceito usar essas conven-ções, sabendo que são somente isso, convenções, permitindo, então, ser as potências do que posso ser, e assim é você.

Somos as relações com as coisas, não as coisas em si. Começamos na relação, não nas partes. Somos uma situação.

Outra relação aponta o pesquisador Luc Delannoy (2015, 2017), diretor do Instituto de Neuroartes. Ele nos fala, em sua última publicação, sobre sermos emergências ilusórias de um Todo, um Todo sem princípio nem final, sem identidade já que é um Todo.

Imagine um mar muito agitado, ondas desse mar emergindo por aqui e por lá, como uma dança. Então, poderíamos pensar que cada vez que eu distingo uma onda como algo independente do mar, estou criando uma ilusão de independência, estou outorgando identidade a um trânsito que é o mar. Além disso, podemos dizer que cada onda está conectada a esse Todo, ou seja, não há tal onda, há uma manifestação do Todo.

Permita-me contar uma história:

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A identidade

É a história de um homem a quem eu definiria como: buscador…

Um buscador é alguém que busca, não necessariamente alguém que encontra. Nem é alguém que sabe o que precisamente está buscando.

Um dia, o buscador sentiu que devia dirigir-se à cidade de Kammir. Tinha aprendido a fazer caso a essas sensações que vinham de um lugar desconhecido de si mesmo. Por isso deixou tudo e partiu.

Após 2 dias de andar pelos caminhos poeirentos, avistou, ao longe, Kammir. Um pouco antes de chegar ao povo, chamou-lhe muito a atenção uma colina à direita do caminho. Estava coberta de um verde maravilhoso e havia imensas árvores, pássaros e flores encantadoras. Ao seu redor, havia uma espécie de vala de madeira lustrada. Uma pequena porta de bronze convidava-o a entrar.

De repente, sentiu que esquecia a cidade e sucumbiu lentamente entre as pedras brancas que estavam distribuídas como que à sorte, entre as árvores.

Deixou pasear os seus olhos, que eram os de um buscador, e talvez por isso descobriu aquela inscrição sobre uma das pedras.

Abdul Tareg, viveu 8 anos, 6 meses, 2 semanas e 3 dias. Emocionou-se um pouco ao perceber de que aquela pedra não era simplesmente uma pedra: era uma lápide. Sentiu pena ao pensar que uma criança de tão terna idade estava sepultada naquele lugar.

Olhando à sua volta, o homem deu-se conta de que a pedra ao lado também tinha uma inscrição. Aproximou-se para lê-la.

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Dizia: Yamir Kalib, viveu 5 anos, 8 meses e 3 semanas. O buscador sentiu-se terrivelmente emocionado. Aquele lindo lugar era um cemitério, e cada pedra era uma sepultura.

Uma por uma, começou a ler as lápides. Todas tinham inscrições similares: um nome e o tempo de vida exacto do morto. Mas aquilo que mais o aterrorizou foi verificar que o que mais tempo tinha vivido passava pouco mais dos onze anos…Tomado por uma horrível dor, sentou-se e pôs-se a chorar.

O cuidador do cemitério passava por ali e se aproximou. Viu-o a chorar, em silêncio, durante algum tempo, e depois lhe perguntou se chorava por algum familiar.

– Não, por nenhum familiar – disse o buscador. – Que passa neste sítio? Que coisa tão terrível há nesta cidade? Porque há tantas crianças enterradas neste lugar? Que horrível maldição caiu sobre esta gente, que os obrigou a construir um cemitério para crianças?

O ancião sorriu e disse:

– Pode ficar tranquilo. Não existe tal maldição. O que acontece é que aqui temos um velho costume. Vou-lhe contar…

“Quando um jovem chega aos 15 anos, os seus pais oferecem--lhe um pequeno caderno, como este que aqui tenho, para que o pendure ao pescoço. É tradição entre nós que, a partir desse momento, cada vez que alguém desfruta intensamente de algo, abre o caderno e anota nele: à esquerda, o que foi o desfrutado. À direita, quanto tempo durou o gozo.

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A identidade

Conheceu a sua namorada e se apaixonou por ela. Quanto tempo durou essa paixão enorme e o enorme prazer de conhecê-la? Uma semana? Duas? Três semanas e meia…?

E depois, a emoção do primeiro beijo, o prazer maravilhoso do primeiro beijo.

E a gravidez e o nascimento do primeiro filho? E o casamento dos amigos? E a viagem mais desejada? E o encontro com o irmão que regressa de um país longínquo? Quanto tempo durou o desfrutar dessas situações? Horas? Dias?

Assim, vamos anotando no caderninho cada momento que desfrutamos… Cada momento.

Quando alguém morre, é nosso costume abrir o caderninho, e somar o tempo do desfrutado para escrevê-lo sobre a sua sepultura.

Porque esse é, para nós,

O único e verdadeiro TEMPO VIVIDO”

Jorge Bucay (2014)

Talvez minha identidade seja essa relação do meu tempo desfrutado, do meu tempo vivido.

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Referências

BUCAY, Jorge. El buscador. Blog narrative breve. Disponível em: narrativabreve.com/2014/10/cuento-jorge-bucay-el-buscador.html. Acesso em: 26 jul. 2020.

DELANNOY, Luc. Una cuestión de conciencia. [S.l.]: Ediciones Metales Pesados, 2017.

DELANNOY, Luc. Neuroartes, un laboratorio de ideas. [S.l.]: Ediciones Metales Pesados, 2015.

GOFFMAN, E. Stigma: notes on the management of spoiled identity. Englewood Cliffs, New Jersey: Prentice-Hall, 1963.

GRACIA, Tomás Ibañez (coord.). Introducción a la psicología social. [S.l.]: Editorial UOC, 2004.

MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. El árbol del conocimiet: Las bases biológicas del entendimiento humano. [S.l.]: LUMEN Editorial Universitaria, 2003.

MATURANA, Humberto. El sentido de lo humano. Granica: Editor J. C. Saez, 2008.

MEAD, George Herbert. Mind, Self, and Society: The Definitive Edition. Chicago: The Difinitive Editions, 2015.

TAJFEL, H. Grupos humanos e Categorias sociais: Estudos em psicologia social. Lisboa: Livros Horizonte, 1982. v. I.

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AS IMAGENS (III) OUTROS MODOS DE DANÇAR

Marcilio de Souza Vieira

As Imagens III foram dispositivo de observação do professor Marcilio Vieira (UFRN). A residência artística foi ministrada por Ángel Arámbula, que apresentou a técnica por ele desenvolvida denominada de Piso Móvel. A residência teve o Encontro Nacional de Dança Contemporânea do Rio Grande do Norte como parceria. As imagens foram fotografadas no momento em que a oficina ocorreu em espaços do Departamento de Artes da UFRN.

A oficina Piso Móvel propôs-se a desenvolver a capacidade de usar a percepção e a sensação do movimento a partir de uma orientação e coordenação ideais, a partir de dinâmicas que ajudaram os intérpretes-criadores a construir mapas de movimentos, apoiados pela conexão do olhar em direção à tridimensionalidade do espaço; também de identificar o uso espacial por meio do movimento pessoal e da consciência com o movimento do grupo para desenvolver uma convenção com o corpo do outro e seus limites com o espaço.

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NATAL Y SU DANZA VIBRANTE

José Ángel Arámbula OCHOA

Encontrar conexión definitivamente es importante para poder reconocernos como humanos, en Natal se sienten los cuerpos vibrantes y dispuestos a indagar en otros algoritmos que el movimiento nos tiene preparados para dialogar con el cuerpo, y esto sin duda me hace sentir en casa. El compartir esta maravillosa semana llena de sorpresas, convivencia, receptividad, armonía y sobre todo gozo entre los que asistieron a este taller piso articular, llenó de energía positiva el aula de este maravilloso recinto universitario. Sin duda estos encuentros de Danza hacen posible que podamos compartirnos como individuos, y reconocernos a través del otro.

Natal, Brasil, un semillero de artistas con mucha potencia, un lugar energéticamente lleno de magia, de gente maravillosa y bailarines comprometidos con su quehacer artístico. La danza no miente está estrechamente ligada al fenómeno del crecimiento, que es una expresión vital del proceso de la vida y para la vida.

La danza no solo construye cuerpos, construye mentes pensantes, mentes abiertas para dialogar a través del cuerpo y del habla. La danza ha sido un detonador de comunicación en el mundo, por medio de ella se dialoga lo que somos y lo que portamos culturalmente a través de los años. La danza es tan efímera, pero deja huella en quien se comparte con honestidad.

La danza es para quien se compromete y para quien le da el verdadero valor a lo que se construye en ella. La danza puede ser

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José Ángel Arámbula Ochoa

para todos, solo hay que saber que queremos de ella, y que somos capaces de construir y hacer por ella. La danza es un proceso y es parte de la vida. Abrir la mirada expande las posibilidades y abre el universo del pensamiento y por ende del movimiento.

Me siento orgulloso de estar en este lugar donde los cuerpos dúctiles dialogan con el piso, con el aire, con la estructura de un salón adecuado para saltar, para fluir, para desplazar los cuerpos pensantes, los cuerpos tan diversos con diferentes procesos y cualidades. Aplaude enormemente a Diana Fontes, Marcelo Zamora, Marcilio Vieira, patrocinadores y a todo un equipo de trabajo quien ha estado de cerca para que todo esto sea posible.

Como guía de este taller me siento completamente agradecido, el hecho de estar presente me sigue dando herramientas para seguir construyendo la danza del presente y el futuro. Cierro con estos dos pensamientos de dos grandes de la danza y presento la técnica de danza por mí desarrollada.

Sistema de Entrenamiento

Tal como lo veo, esta residencia artística hizo posible que el interprete creador tenga una visión general de las posibilidades, así como el acceso a herramientas específicas derivadas del entrenamiento “Piso Articular”, aplicando en su cuerpo los principios de la física a través de mecanismos anatómicos, incluyendo el estilo y cualidades de movimiento. Dentro de este entrenamiento es importante considerar e identificar el trabajo progresivo del bailarín, en términos de velocidad, densidad, equilibrio, control, precisión, arrojo del movimiento, la ejercitación de la memoria, la coordinación, el desplazamiento por el piso por medio de palancas y anclajes, así como la utilización del sistema

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Natal y su danza vibrante

óseo como detonador del movimiento, además de la mirada como conector de la visión periférica y tridimensional. Asimismo, el interprete creador aumentará su nivel de alerta individual y colectiva al momento de relacionarse con el espacio escénico y con otros cuerpos proporcionando elementos útiles para la interpretación.

Finalmente, en este trabajo desarrollado para los creadores, especialmente en la ciudad de Natal pude ver el identificación de uso de las palancas simples, a través de dinámicas que lo ayuden eficientemente en el movimiento por medio de los impulsos y el traslado del peso de su cuerpo, utilizando los motores de desplazamiento continuo y del sistema óseo como detonador principal de las palancas; la construcción de Construya la relación del peso con el piso, a través del depósito del cuerpo, utilizando las articulaciones principalmente de brazos y piernas para los cambios de dirección en relación con el espacio y el traslado del cuerpo, además de aplicar la liberación de articulaciones para que identifique distintas dinámicas del cuerpo y nuevas posibilidades de movimiento prestando atención al espacio habitado.

Y además, el desarrolle de la capacidad para utilizar la percepción y sensación del movimiento a través de una orientación óptima y de coordinación, a través de dinámicas que ayuden a construir mapas de movimiento, apoyados por la conexión de la mirada hacia la tridimensionalidad del espacio. Dicho de otra manera, la relación de peso, cuerpo y articulaciones con el piso de las Palancas y motores, el expansión y aprovechamiento eficiente del cuerpo articular, el relación horizontal-vertical: rampas de ascenso y descenso; comunicación y convenciones a partir de la mirada, la kinestesia y la percepción tridimensional del cuerpo e el habitar el espacio personal y conciencia grupal.

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NATAL E SUA DANÇA VIBRANTE

José Ángel Arámbula OchoaTraduzido por Iane Licurgo Gurgel Fernandes

Encontrar conexão definitivamente é importante para poder nos reconhecermos como humanos. Em Natal, os corpos se sentem vibrantes e dispostos a indagar em outros algoritmos que o movi-mento nos tem preparado para dialogar com o corpo, e isso sem dúvida faz-me sentir em casa. Compartilhar essa maravilhosa semana cheia de surpresas, convivência, receptividade, harmonia, e sobretudo alegria entre os que participaram dessa oficina Piso articular, encheu de energia positiva a sala deste maravilhoso recinto universitário. Sem dúvida, esses encontros de dança tornam possível que possamos compartilhar como indivíduos e que nos reconheçamos através do outro.

Natal, Brasil, um sementeiro de artistas com muita potência, um lugar energeticamente cheio de magia, de gente maravilhosa e bailarinos comprometidos com o seu fazer artístico. A dança não mente, está estreitamente ligada ao fenômeno do crescimento, que é uma expressão vital do processo da vida para a vida.

A dança não apenas constrói corpos mas também constrói mentes pensantes, mentes abertas para dialogar por meio do corpo que fala. Ela tem sido uma detonadora de comunicação com o mundo, através dela, dialoga-se com o que somos e o que possu-ímos culturalmente ao longo dos anos. É tão efêmera, mas deixa uma brecha em quem se compartilha com honestidade.

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Natal e sua dança vibrante

A dança é para quem se compromete e para quem dá o verdadeiro valor ao que se constrói nela. Ela pode ser para todos, só precisamos saber o que queremos dela, e o que somos capazes de construir e fazer por ela. A dança é um processo e é parte da vida. Abrir os olhos expande as possibilidades e abre o universo do pensamento, do movimento.

Sinto-me orgulhoso de estar neste lugar onde os corpos dúcteis dialogam com o chão, com o ar, com a estrutura de uma sala adequada para saltar, para f luir, para deslocar os corpos pensantes, os corpos tão diversos com diferentes processos e quali-dades. Aplaudo enormemente Diana Fontes, Marcelo Zamora, Marcilio Vieira, patrocinadores e a toda uma equipe de trabalho que esteve perto para que tudo fosse possível.

Como guia desta oficina, sinto-me completamente agra-decido, o feito de estar presente segue dando-me ferramentas para seguir construindo a dança do presente e do futuro. Fecho com esses dois pensamentos de dois grandes nomes da dança e apresento a técnica da dança por mim desenvolvida.

Sistema de treinamento

Da maneira como eu a vejo, esta residência artística tornou possível que o intérprete/criador tenha uma visão geral das possibilidades, assim como o acesso às ferramentas específicas derivadas do treinamento Piso Articular, aplicando no seu corpo os princípios da física a partir de mecanismos anatômicos, incluindo o estilo e a qualidade de movimento.

Acerca deste treinamento, é importante considerar e identi-ficar o trabalho progressivo do bailarino, em relação à velocidade, à coordenação, ao deslocamento pelo chão por meio de alavancas e

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José Ángel Arámbula Ochoa

âncoras, assim como a utilização do sistema ósseo como impusio-nador do movimento, além de um olhar como conector da visão periférica e tridimensional. Dessa forma, o intérprete/criador aumentará seu nível de alerta individual e coletivo no momento de relacionar-se com o espaço cênico e com os outros corpos, proporcionando elementos úteis para a interpretação.

Finalmente, neste trabalho desenvolvido para os criadores, especialmente na cidade de Natal, pude ver a identificação do uso das alavancas simples, por meio de dinâmicas que ajudam eficien-temente no movimento através dos impulsos e da transferência do peso do seu corpo, utilizando os motores de deslocamento contínuo e o sistema ósseo como impulsionador principal das alavancas; a construção da relação do peso com o chão, a partir do depósito do corpo, utilizando as articulações principalmente dos braços e pernas para as mudanças de direção em relação ao espaço e à transferência do corpo, além de aplicar a liberação de articulações para que se identifiquem diferentes dinâmicas do corpo e novas possibilidades de movimento prestando atenção ao espaço habitado.

Além disso, desenvolve-se a capacidade para utilizar a percepção e a sensação do movimento a partir de uma ótima orientação e de coordenação, por meio de dinâmicas que ajudem a construir mapas de movimento, apoiados pela conexão da visão para a tridimensionalidade do espaço. Dito de outra maneira, percebe-se a reação de peso, corpo e articulações com o chão, as alavancas e motores, a expansão e o aproveitamento eficiente do corpo articular, a relação horizontal-vertical: rampas de ascensão e descida; comunicação e convenções a partir do olhar, a cinestesia e a percepção tridimensional do corpo e o habitar o espaço pessoal e a consciência grupal.

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AS IMAGENS (IV)DANÇAS DA TRADIÇÃO

Marcilio de Souza Vieira

As Imagens IV foram registradas nas oficinas minstradas pelos alunos do componente curricular Práticas Educativas em Dança Popular, disciplina do curso de Licenciatura em Dança da UFRN. Os registros fotográficos também trazem um recorte do 8º Festival de Cultura de Passa e Fica, RN.

Além da práxis artistíca, foi preciso um momento de apre-ciação dos espetáculos de grupos convidados para o festival como uma educação do olhar para as danças da tradição. Os alunos tiveram a oportunidade de troca de ideias com grupos mais experientes, assim como com pessoas que estavam se iniciando nas danças populares.

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QUANDO O SERTÃO POTIGUAR VIRA FESTA

Marcilio de Souza VIEIRA

Concebida nos moldes da Cité des Arts, em Paris (local que hospeda artistas do mundo), a Residência Artística é uma visão contemporânea das antigas bolsas de viagens. São projetos que têm como objetivo principal servir de residência temporária para artistas exporem suas ideias, suas concepções de arte, sua dança.

Expomos, nesta obra, a partir do relato de experiência da residência artística Perspectivas das Danças Populares, as vivências em danças da tradição com um grupo de dançarinos que parti-ciparam do 8º Festival de Cultura de Passa e Fica, no Rio Grande do Norte, vivenciando as danças do Tambor de Crioula, Carimbó, Samba de Roda e Jogo e Dança para as danças de tradição. A residência foi ministrada pelos alunos do componente curricular Práticas Educativas em Dança Popular, no primeiro semestre de 2018, e coordenada pelo responsável pela disciplina, Professor Doutor Marcilio de Souza Vieira, do curso de Licenciatura em Dança do Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Nas vivências, os alunos tiveram de conviver com a incer-teza na arte, contribuindo para uma produção que se alimentou do risco, da chance, do improviso, criando desordem, ambiguidade e contradição na produção do conhecimento, visto que o grupo era heterogêneo e essa heterogeneidade ia do gênero à idade dos

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Quando o sertão potiguar vira festa

participantes. A proposta misturava arte e conhecimento em danças da tradição a partir das vivências em sala de aula, com espaço para o erro, para a dúvida, para o medo e para o encontro.

A residência artística se amparou nas “epistemologias do Sul” de Boaventura de Souza Santos (SANTOS; MENESES, 2010), com um olhar investigativo para o fazer e o fruir da dança, em especial, as chamadas danças da tradição, permitindo um encontro que produz diversidade entre saberes e danças. A expressão “epistemologias do Sul”, cunhada por Santos e Meneses (2010), serve como metáfora da exclusão e do silenciamento de povos e culturas que, ao longo do processo histórico do mundo Ocidental, foram dominados pelo capitalismo e colonialismo. Uma visão etnocêntrica do conhecimento imprimiu sentidos únicos às culturas e às formas de existência, constituindo-se como afirmação de uma ética, de um modo de operar que coloca como “inferior” outras formas de saber, sentenciando o racionalismo científico como única saída para a humanidade. A epistemologia dominante fundamenta-se em contextos culturais e políticos bem definidos: o mundo moderno cristão Ocidental, o colonialismo e o capitalismo. Nesse sentido, a produção do conhecimento, o modo como se faz, onde se faz e o que se faz não é exterior aos contextos sociais e políticos que o configuram.

A ideia de um Sul global – em que a condição pós-colonial não pode ser deixada de lado quando se pensa em contextos polí-ticos, científicos e culturais – possui caracterização das condições políticas específicas que fazem parte desta reflexão: a experiência aconteceu no interior do sertão potiguar, na cidade de Passa e Fica, pertencente à microrregião e mesorregião do Agreste poti-guar, localizada no sudoeste da capital do estado, distando desta 101 quilômetros. A residência ocorreu durante o 8º Festival de Cultura da cidade que margeia sua emancipação. Nesse festival,

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Marcilio de Souza Vieira

são convidados grupos de danças da tradição local, regional e nacional para três dias de festa e fruição das danças populares, assim como alunos do curso de Licenciatura em Dança da UFRN para ministrar oficinas para os grupos participantes.

Explicamos anteriormente para os alunos envolvidos nas oficinas o sentido da residência artística e algumas noções dessa experiência foram então apreendidas e discutidas. Como eixo principal, escolhemos três palavras que significaram muito: mobi-lidade, deslocamento e dança. Das duas primeiras, empreendemos o espaço: mudar de lugar, promover movimento de mudança, uma vez que os alunos envolvidos não conheciam, em sua maioria, a cidade, tampouco os participantes oriundos de grupos de danças populares do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Pará.

A esse respeito, Amilcar Packer (2014, p. 29) aponta que a mobilidade/deslocamentos de uma residência artística

[...] não pode estar restrita ao mero deslocamento de corpos e objetos de um ponto para outro, pois lida e constitui práticas e fenômenos dos mais variados, respondendo a disposições locais e mundiais, políticas, culturais, sociais, históricas, econômicas, e porque não também lembrar, religiosas, produzindo subjetividades e constituindo comunidades.

Da segunda palavra, dança, o que havíamos aprendido em sala de aula com as danças da tradição – sua apreciação, vivência e contextualização, com enfoque na tradição, nos elementos da oralidade/gestualidade que caracterizam os modos de produção dessas manifestações em contextos culturais diversos –, foi consi-derado para a preparação e a execução das oficinas com públicos distintos que iam de pessoas de idades entre dez a cinquenta anos.

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Quando o sertão potiguar vira festa

Além disso, buscamos o desenvolvimento de processos de compo-sição coreográfica com base na pesquisa e na análise das matizes culturais afro-brasileiras, indígenas e europeias que caracterizam as danças populares, bem como a discussão desses processos no contexto do ensino da dança.

Munidos dessas informações, pontuamos ainda que os programas de residência artística, de maneira geral, propõem a mobilidade dos profissionais de arte para criar condições propícias para a pesquisa em contextos estrangeiros ou nacio-nais, promovendo a desterritorialização como condição básica da criação. No caso da experiência realizada em Passa e Fica-RN, por se tratar de um lugar que já faz e realiza experimentações com as danças da tradição, a residência artística coadunou-se com as perspectivas da organização do evento no qual, além da fruição de tais danças, os dançarinos/brincantes são convidados a participar das oficinas de outras danças que não sejam aquelas já dançadas usualmente por eles.

O projeto de residência nos instigou, primeiramente, a pensar em uma forma compartilhada de uso do espaço, resolvendo e organizando questões bem práticas como: fluxos de horários, entrada de pessoas no espaço, assim como o aprimoramento da guarda dos materiais de pesquisa. Importante explicitar que, nessa residência, os alunos levaram consigo adereços e figurinos indis-pensáveis às danças ensinadas para que os participantes, além da vivência corporal, pudessem, de certa maneira, manusear/vestir os adereços e figurinos que compunham aquela determinada dança.

As oficinas ocorreram em horários concomitantes dando oportunidade para que os participantes pudessem escolher aquela que mais lhes agradasse fazer. Em média, cada oficina teve 40 participantes e mais um grupo de oficineiros do curso de Dança da UFRN coordenado pelo professor responsável.

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Marcilio de Souza Vieira

As experiências vivenciadas nas oficinas de Tambor de Crioula; Carimbó; Samba de Roda; e Jogo e Dança para as danças de tradição tornaram possíveis outros modos de ver dança, além de os alunos/oficineiros poderem, em outro momento, apreciar outras danças pelos participantes das oficinas.

A experiência com o Tambor de Crioula, Carimbó, Samba de Roda e Jogo e Dança para as danças de tradição demonstrou outras possibilidades de vivenciar essas danças para além da repetição e da oralidade muito comum nas danças de cunho folclórico ou tradi-cional, embora Vieira (2012) venha a dizer que é comum, nas danças da tradição, a aprendizagem se dar pela visualidade e pela oralidade. O autor comenta que a aprendizagem de uma determinada dança da tradição se dá, geralmente, na informalidade, na observação, no escutar e na repetição que são cruciais para a aprendizagem. Repetir é, assim, uma forma de conhecer. Repetir ou imitar não é uma limi-tação, mas uma liberação que o brincante conquista ao maestrar as regras da brincadeira, podendo criar e traçar novos caminhos para o folguedo. Essa aprendizagem pela repetição fortalece os laços, o pertencimento de um grupo, os valores de uma ética que são repassados ao espectador pela dança e pela música.

A vivência se deu não apenas pela repetição de passos já instituídos como ainda pela construção conjunta de vivenciar tais passos/movimentos para uma cena expandida das danças da tradição. Para compreender a vivência das oficinas, fez-se neces-sário vivenciá-la, pois se trata de um conhecimento vinculado ao corpo, configurado pelo movimento e pela percepção que criam gestualidades próprias e vocabulários significativos.

Nas oficinas, foi levada em consideração a tradição oral como produção de linguagem e de conhecimento nesses folguedos, o que significa depreender o indivíduo como produtor de texto, autor de sua palavra, de sua dança. Significa, também, buscar

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outras concepções para a compreensão desses sujeitos que se manifestam por suas gestualidades para demonstrar sua dança, bem como suas relações com o aprender que se dá pela escuta, pela visão, pela oralidade e pelo corpo. Tais elementos se constroem pelo viés da poética da oralidade, pautando-se numa teatralidade da brincadeira como uma prática coletiva. Nesse saber estabele-cido, os brincantes dão conta das canções pela sua “vocalidade”, fazendo ressurgir, por suas vozes, as cançonetas de cunho religioso ou profano, conduzindo e presentificando saberes expressos no corpo pelos de gestos e cantos (VIEIRA, 2012).

Assim, nas oficinas, os movimentos dançados fizeram parte da experiência corporal do brincante, pois, ao vivenciar as danças citadas, seus corpos vibraram, dançaram, celebraram a brinca-deira, festejaram, cantaram e encantaram. Para embasar essa experiência corporal, tomamos o argumento de Merleau-Ponty (1999, 2007), que trata tal experiência corporal como originária, que redescobre a unidade fundamental do mundo como mundo sensível. Em sua concepção, o conjunto de experiências humanas só pode ser configurado e protagonizado por um corpo, e qual-quer forma de distanciamento entre o homem e o mundo sensível merece ser questionada. O corpo próprio ou vivido constitui a maneira pela qual nos instalamos no mundo, tanto ganhando quanto doando significação.

O sensível, para o autor citado, é a experiência do pensa-mento, é uma espécie do Ser, é um apelo à palavra, seja pelo corpo, seja pela memória. O sensível se encarna no corpo e é, também, uma prolongação de sua carne. As coisas, então, não existem mais em si, sendo aqui e agora, em seu lugar e em seu tempo; elas só existem, como afirma o filósofo, no término desses raios de espa-cialidade e temporalidade, emitidos no segredo da minha carne, e sua solidez não é a de um objeto puro que o espírito sobrevoa,

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Marcilio de Souza Vieira

“[...] mas é experimentada por mim do interior enquanto estou entre elas, e elas se comunicam por meu intermédio como coisa que sente” (MERLEAU-PONTY, 2007, p. 113). Nas vivências a partir das oficinas, o sensível se deu nas reelaborações de passos/movimentos, nas configurações de novos desenhos coreográficos, nos entrelaçamentos de canções, risos, abraços, acertos e erros; na celebração do corpo brincante como festa.

Corpo que se fez poética através das danças Tambor de Crioula, Carimbó, Samba de Roda, que desperta e reconvoca seus brincantes para brincar e perceber para além das coisas já ditas, já vistas, já percebidas. Corpos que consideram a linguagem dos gestos, que convidam a ouvir, a ver, que se deixam falar, que acionam suas capacidades expressivas, encarnadas, corpos que inauguram sentidos, que se movem para significar, para comu-nicar, que querem ser lembrados, que se deixam falar, criar, que se direcionam a um educar aberto à transformação, à inovação.

Seduzidos pela astúcia dionisíaca e pelo espírito reflexivo apolínico, celebramos a festa por meio das danças Tambor de Crioula, Carimbó, Samba de Roda, além da apreciação de outras danças que foram possíveis de ver e apreciar no citado festival, contribuindo para uma educação do olhar sensível desses alunos que ensinaram e aprenderam com essas danças da tradição.

Diante dessas paisagens, destacamos uma compreensão de Educação que extrapola os saberes disciplinares; que, mesmo sendo conduzida por uma edição de natureza apolínica, embriaga-nos com uma aprendizagem desregrada, provocadora, autônoma, que se dá pelo processo da escuta, da visão, do riso, que se manifesta no corpo como se fôssemos possuídos pelo espírito dionisíaco que desperta o encantamento por uma Educação que não mesura, não censura, não quantifica, mas que dá espaço para uma aprendi-zagem anárquica descortinada pela troca de saberes.

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Referências

MERLEAU-PONTY, Maurice. O visível e o invisível. Tradução de José Artur Gianotti e Armando Mora d’Oliveira. São Paulo: Perspectiva, 2007.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. Tradução de Carlos Alberto Ribeiro de Moura. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

PACKER, A. Resiliências artísticas. In: VASCONCELOS, A.; BEZERRA, A. (org.). Mapeamento de residências artísticas no Brasil. Rio de Janeiro: Funarte, 2014. p. 20-35. Disponível em: https://sistemas.mre.gov.br/kitweb/datafiles/Varsovia/ptbr/file/miolo+capa-livro-res-artisticas-FINAL_baixa-res.pdf. Acesso em: 20 jul. 2020.

SANTOS, B. S.; MENESES, M. P. Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010.

VIEIRA, Marcilio de Souza. Pastoril: uma educação celebrada no corpo e no riso. Jundiaí: Paco Editorial, 2012.

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AS IMAGENS (V)RITMO & AÇÃO

Marcilio de Souza Vieira

As imagens foram fotografadas por Robson Haderchepk, professor do curso de Teatro da UFRN, durante a oficina ministrada por Angelika Hauser-Dellefant, convidada para ministrar a residência artística Ritmo e Ação, no 3º Seminário Internacional Corpo e Processo de Criação em Artes Cênicas, realizado no Departamento de Artes da UFRN. A oficina contou com a participação de alunos dos cursos de Teatro e Dança e do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da citada universidade.

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RHYTHM AND ACTING

Angelika HAUSER-DELLEFANT

In the beginning of the 20th century in Europe fundamental innovations took place in the realm of theater play like in all other arts. Most of all one tried to leave behind a realism and a performance style paralyzed by long tradition. In painting abstraction was a big issue, in dancing more natural forms of expression than the classical ballet were sought and discovered, in music new systems parallel to the diatonic system were created. Some artists like Johannes Itten and Wassily Kandinsky tried to find correspondents between painting, music and dance. Today we know that we can talk at most about analogies, which permit several possibilities of correlations.

When trying to liberate oneself from moral constraints it was indispensable to liberate also the body, leaving behind the corset of rehearsed social rules of behavior and adopting a more natural gestus. How could this be practiced better and more radically than by being naked in the open air? Still today the attitude conveyed in photographs from those times appears radical to us. At the same time one was looking for more profound laws underlying the nature of human beings that could provide a clue for the interlinkage of the various arts.

In addition to the dismantlement of restrictive artistic traditions all arts sought the expression of the invisible, unspeakable and normally not perceivable. In a certain sense they returned to the origin of the arts, to spirituality and mystery. The

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Rhythm and acting

most profound task of art was to build a bridge between the visible and the invisible world. Antonin Artaud for example dreamed about a theater of trance and ritual. For the audience theater should not be spectacle but experience.

Georges Pitoieff (2009, p. 48)1 was deeply touched by a performance he attended in Hellerau. What he witnessed was that people - and not dancers in the traditional sense - emanated a special magic with their natural movements in a certain rhythm, wherein they were subject to principles underlying all scenic processes and in particular theater play.

Pitoieff felt that he might be able to learn those principles without having to be musician or dancer. He stayed a few months with Emile Jaques-Dalcroze and reported afterwards that he now had learned the basics o living theater and henceforth is mastering them.

Adolphe Appia, musician and architect, and Emile Jaques-Dalcroze, musician, composer and founder of rhythmics, both playing a leading role in the festival performances of the educational establishment Hellerau, influenced with their ideas and the new method of rhythmics prominent artists of different sections. Especially in France some of them met: be it Diaghilew and Nijinski, who carried important incentives for modern dance from Hellerau to Paris and St.Petersburg, be it Paul Claudel, who wrote theater pieces and was friends with Auguste Renoir, who in turn had Rainer Maria Rilke temporarily employed as his secretary. Vsevolod Meyerhold, the grand revolutionary of theater in Russia, acted mostly in St.Petersburg and was in contact and

1 French originals: (1) Jacques Copeau. “Avec la vie, les idèes de grandeur et de style se sont èclairèes pour nous, et pour les servir, nous sommes retournés aux principes éternels. ..Musicien et architecte, Appia nous enseigne que la durée musicale, qui enveloppe, commande et règle l action dramatique, engendre du meme coup l espace où celle-ci se développe.”

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exchange with Nijinsky. Several times in the 1910s he sojourned in Paris. At this time he had already based his biomechanics on the tradition of François Delsarte. In later years Jergy Grotowsky, who has profound influence on the international theater scene until today, adopted much of Meyerholds teachings. Through Georges Pitoieff finally the grand revolutionary of French theater came into contact with Appia and Dalcroze.

Jacques Copeau (1974, p. 67) says about his first encounter with Adolphe Appia:

Appia has opened new paths for us. He has led us back to grandeur and to the eternal principles ... He was musician and architect and has taught us that the musical duration, which enwraps, determines and regulates the dramatic action, at the same time lets emerge the space, in which the action takes place.

Jacques Copeau watches several lectures of Emile Jaques-Dalcroze. Inspired by these encounters he conceptualizes together with Susanne Bing a multidisciplinary drama education which comprises cultural knowledge, music, rhythmics, gymnastics, improvisation, facial expression and masque. Soon however they realize that they still have to learn more themselves in order to utilize the full potential of these methods. Those who were trained in this direction still emphasize the fundamental importance of rhythm for theater play, as for instance Giorgio Strehler and Jacques Lecoq. Through them and others this influence spread worldwide. What remains today from the findings of those times? Are they still relevant today?

If one experiences theater productions by Luc Bondy, Christoph Marthaler, Ariane Mnouchkine, Simon McBurney,

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Rhythm and acting

all of them disciples of Lecoq, or productions by Jean Louis Barrault und Peter Brook, one still feels strongly the spirit of these accomplishments, even though their individual styles are very pronounced. They all have in common the intention to lead their spectators through the play in a vitalizing manner and to expand their perception. The activity on stage is something the audience wants to be experience, otherwise they could stay home and read the play in bed. What is it that creates the experience? When the action on stage is vivid the audience is fascinated, tunes in with its breath, is emotionally engaged and open for new impressions. A necessary condition is that the actresses and actors have learned to deploy movement in a differentiated way.

Lecoq (1987, p. 19) says: “Each one of us reveals himself through his gestures, consciously or unconsciously, with or without the desire to communicate”2. He describes further how this gesture turns out to be our primary language and reveals our deeper nature. “The face, the hands, the body disclose our feelings, the passions, the dramatic state [...]” 3(LECOQ, 1987, p. 24).

He also writes:

A movement has no form and no life if there is no rhythm in it, and here we touch the most essential point of movement ... We know about it ( the rhythm, author’s note) that it is the organic essence, that it consists of ascent and descent (verve and letting go) of the relationship between accentuated and unaccentuated tempi, but we

2 “Chacun de nous s exprime - inconsciemment ou non, avec ou sans desir de communiquer - , par des gestes...” (p.19)

3 “Le visage, les mains et le corps manifestant les sentiments, des passions, des etats dramatique...” (p.24)

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are missing his essence once we try to fathom it, much the same as the mystery of life slips from our hands ... The theatrical unification between audience and author via the actors is a rhythmical correspondence ... To speak about movement, rhythm, space and time is to speak of life and its mystery4 (LECOQ, 1987, p. 103).

This phenomenon becomes most evident, if one has occasion to attend a performance in a language we do not understand. If one is thrilled and fascinated by the action on stage even if one does not understand the words, it is a sign of a vital staging5. On the contrary if you are getting bored, drifting off in thoughts and watching the play from a distance, you always will find shortcomings in the rhythms on one or the other level, for example movements lapse into a monotonous rhythm, or the language continues in ever the same mechanical sequences of rising and falling, or breaks and moments of silence are missing.

Space and time are structured by rhythm. Each movement - in everyday life as well as on stage - is subject to rhythmical laws. Someone who has developed a sensibility for this, imparts more

4 “Un mouvement n a aucune forme ni aucune vie s il n as pas de rythme et, là, nous touchons à l aspect majeur du mouvement... Nous savons de lui qu il est essence organique, qu il est fait d´élans et de retombèes, de rapports de temps

forts et den temps faibles, mais il nous echappe dans son essence lorsque on veut le pénétrer, comme nous échappe le mystère de la vie. “ (p.103)

5 This phenomenon I was able to experience for example during the performance in Vienna of Goldoni’s “Baruffe Chiozzotte”, produced by Giorgio Strehler. The piece is written in Venetian dialect which hardly anybody in the audience would understand. Nevertheless this evening has remained in my memory as exceptionally full of atmosphere, variegated, touching and accompanied by seemingly endless roars of laughter from the audience.

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intensity to the play on stage, more presence and new qualities of experience, since being on stage means handling a condensed time.

The human dimension of the actor transmits itself through the tone of voice, the rhythm of language and the rhythm of movements. The change of tempo, crescendo, diminuindo, fortíssimo, pianissimo, acelerando, retardando and the breaks carry the vitality and sensitivity of the play.

Considering the rhythmicalization is a means for the actresses and actors to be emotionally and physically totally present. The rational level quasi follows in the background without disturbing this presence. This mental state creates intensification of life and the easiness of the presentation on stage. In modern language we would call it a feeling of “flow”. Peter Brook (2000, p. 117) circumscribes it thus: “The essence of theater lies in a mystery called “the present moment”. Georges Pitoieff (2009) suggests that Dalcroze had not invented something new but rather had made a discovery, which he could share with everybody - the nature of rhythm and its laws - and that one can unlock rhythm only via the body.

In my work with actresses and actors I have experienced that they have little awareness of partly the most simple rhythmical relationships. Thus it remains quite uncertain if the performance in the evening “works out” or not.

Embarrassment leads to “voids”, as Pitoieff describes it, or leads to rhythmical monotony in a bubbling activity of speech, when trying to override the uncertainty of the situation. These are certainly no good preconditions for showing lively theater. Peter Brook (2000, p. 2) says: “In playing theater one can loose the audience from one moment to the other, if tempo is wrong”, and also: “In theater “just sort of” is the biggest and most malicious enemy” (BROOK, 2000, p. 28).

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For example actresses and actors sometimes have no measure and no precise feeling for what is “fast” and “slow”, not to speak of what is double or half tempo and the resulting change in distributing movement in space. I have always experienced that there is great readiness to learn these things and thus at least to be able to move and talk in basic rhythms.

Particularly through the connection between music and movement the efficacy on stage can be learned in a focused way. Formation of musicality and movement awareness go together here. The following issues of rhythm training seem to me especially relevant for the realm of theater:

• experience of pulsation, f low and synchronicity / (synchronization) and their anchoring in the body;

• translating of different tempi into movement and language;

• unlocking of one’s own rhythms through movement;

• grooving together, giving oneself to the rhythm;

• establish limits between one another / forming rhythms;

• introducing a second level of action parallel to the flow of pulsation;

• playing with rhythmical contrasts and their bodily expression;

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• recognizing the danger of mechanization and seeking means of counteracting it;

• recognizing the significance of pause and silence and their bodily equivalent;

• rhythm in connection with inner pulse and exterior behavior and their synchronization;

• keeping alive forms of movement and language inside yourself.

Music- and Movement Education/Rhythmics offers a methodology to train these abilities and to work on these topics. This allows to enter into an intensified dialogue with theater professionals and to find in exchange with them a working basis for Rhythmics in theater training. Art is a wheel which revolves around a steady center which we can neither grasp nor define, says Peter Brook (2000, p. 135).

Could it be that Rhythmics is located in immediate proximity of this center? Otherwise it would not have the potential to exert so strong an influence on different arts and to interconnect them among each other, particularly in the realm of theater, where movement, musicality of language and architecture in the form of stage and light design cooperate, just as Georges Pitoieff describes it. Emile Jaques-Dalcroze (11) says about this relationship:

Rhythm is the source of all arts.

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References

BROOK, Peter. Das offene Geheimnis. Frankfurt: Fischer Taschenbuchverlag, 2000.

COPEAU, Jacques. Appels. Paris: Gallimard, 1974.

JAQUES-DALCROZE, Emile. Der Rhythmus ist die Quelle aller Künste. Deutsch: Wikimedia Commons, 2017. Translation by the author. Disponível em: ttps://commons.wikimedia.org/wiki/File:Emile_Jaques-Dalcroze,_GT_Wien_Innere_Stadt,_Am_Hof_8.jpg. Acesso em: 11 jul. 2020.

LECOQ, Jacques. Le théatre du geste. Paris: Bordas, 1987.

PITOIEFF, Georges. La rythmique et l acteur. Le rythme, Paris, p. 48, 2009.

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RITMO E ATUAÇÃO

Angelika Hauser-DellefantTraduzido por Mayra Montenegro1

No início do século XX, na Europa, inovações fundamentais ocorreram no campo do teatro como em todas as outras artes. Acima de tudo, havia a tentativa de deixar para trás uma atuação realista e paralisada pela longa tradição. Na pintura, a abstração era uma grande questão; na dança, formas mais naturais de expressão do que as do balé clássico foram investigadas e desenvolvidas; na música, novos sistemas paralelos ao sistema tonal foram criados. Alguns artistas, como Johannes Itten e Wassily Kandinsky, tentaram encontrar correspondentes entre a pintura, a música e a dança. Atualmente, sabemos que podemos falar ao máximo em analogias, que permitem diversas possibilidades de correlações.

Ao buscar a libertação de restrições morais, era indispen-sável liberar o corpo, deixando para trás o espartilho das ensaiadas regras sociais de comportamentos e adotar gestos mais naturais. Como isso poderia ser praticado mais radicalmente do que estando despido ao ar livre? Ainda hoje, a atitude transportada pelas foto-grafias daquela época parece radical para nós. Ao mesmo tempo, havia a busca por leis mais profundas subjacentes à natureza dos

1 Mayra Montenegro de Souza é atriz, cantora, preparadora vocal, funda-dora da Cia. Violetas de Teatro e professora da Licenciatura em Teatro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Possui graduação em Educação Artística com habilitação em Música (UFPB) e mestrado em Artes Cênicas (UFRN).

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seres humanos que poderiam fornecer uma pista para a interli-gação entre as várias artes.

Além do desmantelamento das tradições artísticas restri-tivas, todas as artes procuraram a expressão do invisível, indizível e normalmente não perceptível. Em certo sentido, elas retornavam à origem das artes, à espiritualidade e ao mistério. A tarefa mais profunda seria construir uma ponte entre o mundo visível e o invisível. Antonin Artaud, por exemplo, sonhou com um teatro de transe e ritual. Para a plateia, não deveria ser um espetáculo, mas uma experiência.

Georges Pitoieff2 foi profundamente tocado por uma perfor-mance que presenciou em Hellerau. O que ele testemunhou foram pessoas – não bailarinos no sentido tradicional – emanarem uma mágica especial com os seus movimentos naturais em um certo ritmo em que estavam, sujeitos a princípios subjacentes a todos os processos cênicos e, em particular, ao teatral.

Pitoieff sentiu que ele poderia aprender aqueles princípios sem a necessidade de ser músico ou bailarino. Ele esteve por alguns meses com Emile Jaques-Dalcroze e relatou depois que havia finalmente aprendido as bases do teatro vivo e dali em diante iria dominá-los.

Adolphe Appia (músico e arquiteto) e Emile Jaques-Dalcroze (músico, compositor e fundador da Rítmica), ambos tiveram papel de liderança no festival de performances do estabelecimento de ensino Hellerau, influenciando, com suas ideias e o novo método de rítmica, proeminentes artistas de diferentes segmentos.

2 Pitoieff: La rythmique et l acteur, Paris 1923; in: Le rythme, Genf 2009, p.48. Original em francês: “Avec la vie, les idèes de grandeur et de style se sont èclairèes pour nous, et pour les servir, nous sommes retournés aux principes éternels. ..Musicien et architecte, Appia nous enseigne que la durée musicale, qui enveloppe, commande et règle l action dramatique, engendre du meme coup l espace où celle-ci se développe”.

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Especialmente na França, alguns deles se encontraram: seja com Diaghilew e Nijinski, que levaram importantes estímulos para a dança moderna de Hellerau para Paris e São Petersburgo; seja com Paul Claudel, que escreveu peças teatrais e foi amigo de Auguste Renoir, que, na época, havia empregado Rainer Maria Rilke temporariamente como seu secretário. Vsevolod Meyerhold, o grande revolucionário do teatro na Rússia, atuou sobretudo em São Petersburgo e manteve contato com Nijinsky. Várias vezes, na década de 1910, ele permaneceu em Paris. Nesse período, ele já havia baseado sua biomecânica na tradição de François Delsarte. Anos mais tarde, Jerzy Grotowsky, que tem profunda influência no teatro internacional ainda hoje, adotou muitos dos ensinamentos de Meyerhold. Finalmente, por meio de Georges Pitoieff, o impor-tante revolucionário do teatro francês teve contato com Appia e Dalcroze.

Jacques Copeau (1974, p. 67) diz do seu primeiro encontro com Adolphe Appia:

Appia abriu o caminho para nós. Ele nos levou de volta à grandeza e aos princípios eternos... Ele era músico e arqui-teto e nos ensinou que a duração musical, que envolve, determina e regula a ação dramática, ao mesmo tempo permite emergir o espaço, onde a ação acontece3.

Jacques Copeau assistiu a diversas palestras de Emile Jaques-Dalcroze. Inspirado por esses encontros, ele conceituou,

3 Appia has opened new paths for us. He has led us back to grandeur and to the eternal principles ... He was musician and architect and has taught us that the musical duration, which enwraps, determines and regulates the dramatic action, at the same time lets emerge the space, in which the action takes place (Copeau: Appels; Gallimard, Paris 1974; p.67).

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com Susanne Bing, uma pedagogia teatral multidisciplinar, que compreendia conhecimentos culturais, rítmica, ginástica, impro-visação, expressão facial e máscara. Logo, perceberam que eles mesmos ainda necessitavam aprender mais a fim de utilizar todo o potencial desses métodos. Aqueles que foram treinados nessa direção ainda enfatizam a importância fundamental do ritmo para o espetáculo teatral, por exemplo, Giorgio Strehler e Jacques Lecoq. A partir deles, entre outros, essa influência se espalhou pelo mundo. O que permanece das descobertas daqueles tempos? Ainda são relevantes hoje? Ao assistir às produções teatrais de Luc Bondy, Christoph Marthaler, Ariane Mnouchkine, Simon McBurney, todos discípulos de Lecoq, ou produções de Jean Louis Barrault e Peter Brook, ainda sentiremos fortemente o espírito daquelas conquistas, embora os estilos individuais sejam bem pronunciados.

Eles todos têm em comum a intenção de levar seus espec-tadores pelo espetáculo de uma maneira vitalizante e de expandir suas percepções. A atividade em cena é algo que a audiência quer experienciar, do contrário, poderia ficar em casa e ler um livro na cama. O que cria a experiência? Quando a atuação é viva, a audi-ência é encantada, sua respiração é sintonizada, é emocionalmente envolvida e aberta a novas impressões. Uma condição necessária para isso é que atrizes e atores tenham aprendido a desenvolver seus movimentos de maneira diferenciada.

Lecoq (1987, p. 19) diz: “Cada um de nós revela a si mesmo através dos gestos, consciente ou inconscientemente, com ou sem desejo de comunicação”4. Ele descreve mais à frente como essa gestua-lidade se torna nossa primeira linguagem e revela nossa natureza mais

4 Each one of us reveals himself through his gestures, consciously or unconsciously, with or without the desire to communicate (Lecoq: Le théatre du geste; Bordas, Paris 1987, p.19). Original em Francês: “Chacun de nous s exprime - inconsciemment ou non, avec ou sans desir de communiquer - par des gestes...” (p.19).

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Ritmo e atuação

profunda: “A face, as mãos, o corpo expõem nossos sentimentos, as paixões, o estado dramático [...]” (LECOQ, 1987, p. 24).5

Ele também escreve:

Um movimento não tem forma nem vida se não tem ritmo nele, e aqui tocamos no ponto mais essencial do movimento... Nós sabemos disso (o ritmo, a nota do autor) que é a essência orgânica, que consiste em subida e descida (sustentar e deixar ir) da relação entre o tempo acentuado e não acentuado, mas estamos perdendo sua essência, uma vez que tentamos entendê-lo, da mesma forma que o mistério da vida escorrega de nossas mãos... A união teatral entre audiência e autor através dos atores é uma correspondência rítmica (LECOQ, 1987, p. 103).6

Esse fenômeno se torna mais evidente ao assistir a uma apresentação em uma língua que não entendemos. Se alguém fica emocionado e fascinado pela atuação em cena, mesmo sem compreender as palavras, é um sinal de uma atuação viva7.

5 The face, the hands, the body disclose our feelings, the passions, the dramatic state... (oc.cit; p.24). Original em francês: “Le visage, les mains et le corps manifestant les sentiments, des passions, des etats dramatique...” (p.24).

6 A movement has no form and no life if there is no rhythm in it, and here we touch the most essential point of movement ...We know about it ( the rhythm, author’s note) that it is the organic essence, that it consists of ascent and descent (verve and letting go) of the relationship between accentuated and unaccentuated tempi, but we are missing his essence once we try to fathom it, much the same as the mystery of life slips from our hands...The theatrical unification between audience and author via the actors is a rhythmical correspondence...To speak about movement, rhythm, space and time is to speak of life and its mystery (loc.cit; p.103).

7 Este fenômeno eu pude experienciar, por exemplo, durante a performance em Vienna: “Baruffe Chiozzotte”, de Goldoni, produzida por Giorgio Strehler. Esta peça foi escrita num dialeto Veneziano, que dificilmente alguém na

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Do contrário, se você fica entediado, afastando-se em pensa-mentos e assistindo ao espetáculo de forma distanciada, você sempre irá encontrar deficiências no ritmo em um ou outro nível. Por exemplo, movimentos caem em um ritmo monótono, ou a linguagem continua na mesma sequência mecânica de subida e descida, ou faltam momentos de pausas e silêncios.

Espaço e tempo são estruturados pelo ritmo. Cada movi-mento – na vida cotidiana assim como na cena – está sujeito às leis rítmicas. Alguém que desenvolveu uma sensibilidade para isso transmite mais intensidade à atuação na cena, maior presença e novas qualidades de experiência, já que estar em cena significa lidar com um tempo condensado.

A dimensão humana do ator é transmitida pelo tom da voz, do ritmo da linguagem e pelo ritmo dos movimentos. A mudança de tempo, crescendo, diminuindo, fortissimo, pianis-simo, accelerando, ritardando e as pausas carregam a vitalidade e a sensibilidade do espetáculo.

Consideramos que a ritmização é um meio para atrizes e atores estarem emocional e fisicamente totalmente presentes. O nível racional quase segue em segundo plano sem perturbar essa presença. Esse estado mental cria intensificação da vida e facilita a atuação em cena. Na linguagem moderna, chamaríamos isso de um sentimento de “fluxo”. Peter Brook (2000, p. 17) circunscreve-o assim: “A essência do teatro está em um mistério chamado ‘o momento presente’” 8. Georges Pitoieff (2009) sugere que Dalcroze

plateia entenderia. Não obstante esta noite permaneceu em minha memória como algo excepcional, cheio de atmosferas variadas e momentos tocantes, acompanhado de rugidos e risos aparentemente intermináveis da plateia.

8 Peter Brook: Das offene Geheimnis; Fischer Taschenbuchverlag Frankfurt am Main 2000; p.117 (English edition: Peter Brook. The Open Door. Thoughts on Acting and Theatre. Anchor; Reprint edition 2005).

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Ritmo e atuação

não criou algo novo, mas sim fez uma descoberta que poderia compartilhar com todos – a natureza do ritmo e suas leis – e que ninguém pode desbloquear o ritmo a não ser pelo corpo.

No meu trabalho com atrizes e atores, tenho vivenciado que eles apresentam pouca consciência, até certo ponto, das mais simples relações rítmicas. Assim, permanece bastante incerto se o desempenho da cena “dá certo” ou não.

Dificuldades levam a “vazios”, como Pitoieff descreveu, ou levam a uma monotonia rítmica em um borbulhante discurso, ao tentar superar a incerteza da situação. Essas, certamente, não são boas condições prévias para mostrar um teatro vivo. Peter Brook (2000, p. 22) diz: “Ao fazer teatro podemos perder a plateia de um momento para outro, se o tempo está errado”. E também: “No teatro, ‘mais ou menos assim’ é o maior e mais malicioso inimigo” (BROOK, 2000, p. 28).

Por exemplo, atrizes e atores às vezes não têm medida nem sentimento precisos do que é “rápido” e “lento”, sem falar no que é dobrar ou dividir o tempo e a mudança resultante da distribuição do movimento no espaço. Eu tenho percebido que eles sempre apresentam grande prontidão para aprender essas coisas e, assim, pelo menos, são capazes de se mover e falar em ritmos básicos.

Particularmente, por meio da conexão entre música e movimento, a eficácia na atuação pode ser aprendida de maneira focada. Formação em musicalidade e consciência de movimento caminham juntas nesse caso. As seguintes questões de treinamento rítmico parecem ser relevantes para mim na área do teatro:

• Vivência da pulsação, fluxo e sincronia/sincronização e seu ancoramento no corpo;

• Tradução de diferentes tempos em movimento e fala;

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• Desbloqueio do seu próprio ritmo pelo movimento;

• Dançar/improvisar juntos, entregando-se ao ritmo;

• Estabelecer limites entre um e outro/formando ritmos;

• Introduzir um segundo nível de ação paralela ao fluxo da pulsação;

• Brincar com contrastes rítmicos e suas expressões corporais;

• Reconhecer o perigo da mecanização e procurar maneiras de combatê-la;

• Reconhecer o significado da pausa e do silêncio e seu equivalente corporal;

• Ritmo em conexão com a pulsação interna e compor-tamento externo e sua sincronização;

• Manter vivas formas de movimento e linguagem dentro de si.

Educação em Música e Movimento/Rítmica oferece uma metodologia para treinar essas habilidades e trabalhar esses tópicos. Isso permite entrar em um diálogo intensificado com profissionais do teatro e encontrar, na troca com eles, uma base de trabalho para a Rítmica no treinamento teatral. “A arte é um veículo que gira em torno de um centro estável que não podemos agarrar nem definir”, diz Peter Brook (2000, p. 135).

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Ritmo e atuação

Será que a rítmica estaria localizada numa proximidade imediata desse centro? Do contrário, não teria o potencial de exercer uma inf luência tão forte nas diferentes artes e de interconectá-las entre si, particularmente no campo do teatro, onde movimento, musicalidade da fala e da arquitetura na forma do desenho de luz e palco cooperam, assim como Georges Pitoieff descreveu. Emile Jaques-Dalcroze fala sobre essa relação: “O ritmo é a fonte de todas as artes” 9.

9 https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Emile_Jaques-Dalcroze,_GT_Wien_Innere_Stadt,_Am_Hof_8.jpg

Original: “Der Rhythmus ist die Quelle aller Künste”.

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Referências

BROOK, Peter. Das offene Geheimnis. Frankfurt: Fischer Taschenbuchverlag, 2000.

COPEAU, Jacques. Appels. Paris: Gallimard, 1974.

JAQUES-DALCROZE, Emile. Der Rhythmus ist die Quelle aller Künste. Deutsch: Wikimedia Commons, 2017. Translation by the author. Original. ttps://commons.wikimedia.org/wiki/File:Emile_Jaques-Dalcroze,_GT_Wien_Innere_Stadt,_Am_Hof_8.jpg. Acesso em: 11 jul. 2020.

LECOQ, Jacques. Le théatre du geste. Paris: Bordas, 1987.

PITOIEFF, Georges. La rythmique et l acteur. Le rythme, Paris, p. 48, 2009.

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Sobre os Autores

Angelika HAUSER-DELLEFANT

Estudou música e movimento/rítmica em Hannover, Alemanha; Teatro Gestual em Paris, com Jacques Lecoq e Philippe Gaulier; e tem o diploma do Método Franklin (Educação do Movimento). Desde 1983, leciona Rítmica e Improvisação ao Piano na Universidade de Música e Artes Cênicas de Viena. De 1992 a 2004, lecionou Rítmica e Teatro para Dançarinos na Universidade Bruckner de Música e Artes Cênicas de Linz, trabalhando prin-cipalmente com dançarinos. Atua como musicista, dançarina, coreógrafa, atriz e, desde 2002, dirige o Instituto de Música e Treinamento de Movimento e Musicoterapia da Universität für Musik und Darstellende Kunst Wien, Áustria.

Clermont PITHAN

Brasileiro radicado na França. Artista da dança, palhaço e técnico de iluminação. Mestre em Teatro pela Universidade Paris 8, França, onde desenvolveu pesquisa no campo da iluminação e tecnologia. Bacharel em Dança pela Unicamp, Brasil. Foi palhaço do Circo Bouglione (França) apresentando números clássicos de palhaçaria com malabares e volteio (cavalo). Atualmente, é diretor da equipe técnica do teatro de Villiers-le-Bel, município ao Norte de Paris.

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Isabelle DUFAU

Francesa. Artista da dança, coreógrafa, pesquisadora e pedagoga da dança. Durante sua estadia no Brasil, foi bolsista da Fundação VITAE e ganhadora do Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte APCA, como coreógrafa revelação. Dançou em Companhias, tais como: as de Holly Cavrell (Brasil), Lidia Martinez (Portugal), Clara Gibson (USA) e Dominique Dupuy (França). Autora do livro Éclats – L Artesanat poetique d ùne eouvre: Françoise Dupuy (2017) ao lado de Laurence Saboye.

Javier Díaz DALANNAIS

Ator, dançarino, diretor e dramaturgo teatral. Foi coordenador geral do Festival Internacional de Teatro, Escena Mazatlán, do qual ele é um dos fundadores e curador. Fundador e diretor do Mazatlan Theatre Show, ator e diretor do grupo de teatro Los Hijos de María. No México, foi diretor artístico do projeto Funeral para uma ideia. É mestrando no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFRN.

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José Ángel Arámbula OCHOA

Bailarino, coreógrafo e facilitador docente. Em 2002, fundou a Companhia Lux Boreal, da qual é atualmente diretor geral, onde desenvolve o ensino, a divulgação, a promoção e a criação da dança contemporânea. Com a empresa Lux Boreal, viajou para impor-tantes festivais em mais de 20 estados da República Mexicana. Ele também desenvolveu um relacionamento enriquecedor com o sul da Califórnia com base em colaborações de natureza binacional, bem como no cenário da dança internacional, em países como Chile, Venezuela, Nicarágua, Bolívia, Porto Rico, Espanha, Letônia, Brasil, Argentina, França, Irlanda, Alemanha, Romênia e Suíça.

Marcilio de Souza VIEIRA

Bolsista de Produtividade em Pesquisa – nível 2, Artista da Cena, Pós-Doutorado em Artes e em Educação, Doutor em Educação, Professor do Curso de Dança e dos Programas de Pós-Graduação PPGArC, PPGEd e PROFARTES da UFRN. Líder do Grupo de Pesquisa em Corpo, Dança e Processos de Criação (CIRANDAR) e Membro pesquisador do Grupo de Pesquisa Corpo, Fenomenologia e Movimento (Grupo Estesia/UFRN).

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Este livro foi produzido pela equipe editorial da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte.

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