resenha: capital social e empreendedorismo local
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RESENHA DE “CAPITAL SOCIAL E EMPREENDEDORISMO LOCAL”
CAMILA MAGALHÃES
TEXTO ORIGINAL: ALBAGLI, Sarita e MACIEL, Maria Lucia. Capital social e empreendedorismo local. 28 p.
Estudos recentes sobre empreendedorismo despertaram um novo
significado a esse conceito que sempre foi associado à qualificação de indivíduos.
Nesse artigo, Sarita Albagli e Maria Lucia Maciel legitimam os sistemas de relações
com caráter inovador que favorecem mudanças e crescimento. As autoras discutem
o papel do capital social para o desenvolvimento local e a importância dos processos
interativos e cooperativos de aprendizado e inovação.
O empreendedorismo até pouco tempo se caracterizava como um conjunto
de atributos pessoais (otimismo, imaginação, habilidade analítica, etc.) independente
do contexto em que se situava. Agora, refere-se à criação de novos e pequenos
negócios que geram empregos e renda, à capacidade de inovação e aprendizagem
(investimento em pesquisa, marketing, etc.) ou ainda iniciativas pertinentes à
melhoria das condições de vida locais sempre levando em conta as características
do ambiente, ou seja, há melhores condições para o empreendedorismo se
desenvolver em locais propícios à colaboração, interação e aprendizado.
Já o conceito de capital social difundiu-se tão rapidamente que sua definição
é muito abrangente e pouco precisa. Os autores precursores do conceito remontam
à sociologia clássica e outros entendem apenas como uma metáfora que contribui
para evidenciar processos e situações econômicas. Pierre Bordieu utilizou o termo
para referir-se a vantagens de pertencer a uma comunidade (dividido desigualmente
e inerente à conflitos por se tratar de uma estrutura social), já James Coleman o vê
como um processo não-intencional onde os indivíduos trabalham por um bem
comum, trocam informações e/ou confiam uns nos outros. Mas foi Robert Patman
que popularizou o conceito definindo-o como traços da vida social – redes, normas e
confiança – que facilitam a ação e a cooperação na busca de objetivos comuns.
Para alguns teóricos o capital social não existe sem os benefícios dele
esperados, aqui não haveriam possíveis implicações negativas. Outros acreditam
que ele é um bem público (valores e crenças) e que os efeitos esperados podem
dar-se ou não em casos específicos. Um dos principais desafios para defini-lo é
separar analiticamente suas características, origens e efeitos. E se for entendido
como um conjunto de valores não pode ser medido ou quantificado.
O capita social tem ainda duas outras perspectivas: individual, em que
indivíduos tem acesso a informações e relações de confiança para obter ganhos; e
comunitário, um ativo coletivo que pode melhorar a qualidade de vida de uma
comunidade (tanto dentro da comunidade – bonding – quanto entre grupos
heterogêneos – bridging). Sobre a discussão “intencional/espontâneo” há uma falsa
dicotomia, pois, resultado da construção social ao longo de processos históricos de
colaboração, competição e conflito, não é um mero produto de planejamento,
embora a colaboração e confiança possam ser construídas em prol de benefício
próprio.
No âmbito dos benefícios econômicos, estudos de Putman sobre a Itália
revelaram que a interação dos atores sociais empenhados em uma combinação de
competição e cooperação trouxe resultados positivos e que as diferenças regionais
independem da riqueza, mas sim, do grau de engajamento cívico. Alguns autores
também afirmam que o capital social proporciona menores custos na disseminação
da informação, maior conhecimento mútuo e estabilidade organizacional.
As empresas locais constituem o veículo pelo qual as relações sociais, a
cultura e os códigos da população incidem diretamente sobre a atividade produtiva,
logo, determinam as condições para o empreendedorismo, o desenvolvimento local
e a capacidade de inovação e aprendizado.
Aqui atentamos para pontos importantes nos processos de constituição de
sistemas produtivos locais:
Primeiramente, a educação (formal e informal). Estudos comprovam que há
uma correlação entre nível de instrução, aprendizado e interação produtiva. Não por
acaso, os sistemas mais desenvolvidos e bem-sucedidos tiveram a preocupação de
implantar instituições de ensino. O conhecimento é crucial ao desenvolvimento de
um sistema de inovação e o aprendizado interativo é parte importante do capital
social, pois, além de ser um fator de competitividade e desenvolvimento, esse
conhecimento não-formalizado é transmitido em contatos interpessoais.
Podemos citar ainda, apoiados em pesquisas, a importância de uma
liderança para mobilização de grupos sociais locais.
Ao avançar na explanação das autoras, nos deparamos com o item coesão
social (trata de identidade, desigualdade e interesses). A desigualdade econômica
não contribui para o sentimento de pertencimento a uma comunidade, eliminando a
construção de interesses coletivos.
Essa característica aliada à interação mobilizou esforços em iniciativas
comunitárias, temos como exemplo as cooperativas auto-gestionárias, que
aumentam a renda, reduzem desigualdades, geram empregos e elevam o nível de
qualidade de vida, além de contribuir para o desenvolvimento socioeconômico local
e garantir a sustentabilidade de longo prazo da empresa (por estar inserida na
dinâmica econômica local e envolver diversos atores e instituições sociais).
Embora teóricos questionem se essa economia solidária é um caminho para
mudanças econômico-sociais do país, ou é apenas uma estratégia social
compensatória, ou ainda um processo de terceirização e barateamento de mão-de-
obra. É fato que as experiências comunitárias têm contribuído para a redução de
problemas sociais e geram empreendimentos produtivos que contribuem para o
desenvolvimento local sustentável.
Entretanto, essas iniciativas oferecem ao Estado a oportunidade de eximir-
se de responsabilidades na provisão do bem-estar social, enquanto os governos
deveriam proporcionar condições propícias ao desenvolvimento do capital social, e
se valer dele em estratégias de superação da pobreza e desenvolvimento local.
As autoras contextualizaram cada característica própria do capital social de
maneira muito coesa e inteligente. Suas observações podem ser confirmadas pelas
pesquisas de Carlos Milani (cientista político e doutor em Socioeconomia do
Desenvolvimento, pesquisador NEPOL/UFBA). Para ele, capital social é,
resumidamente, o somatório de recursos inscritos nos modos de organização da
vida social de uma população. É um bem coletivo que garante o respeito de normas
de confiança mútua e de comportamento social em vigor.
Logo, a afirmação das autoras de que o capital social serve como base para
a promoção do empreendedorismo, da inovação, aprendizado e desenvolvimento
local é reforçada ao ser entendida como um tipo de empreendedorismo econômico.