religiões e democracia - conic.org.br · concentração do mundo em sistemas sociais cada vez mais...

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Religiões e Democracia é um espaço que se propõe a refletir as relações entre a religião e a democracia. A ideia é trabalhar a temática com o auxílio de perguntas feitas a lideranças religiosas, teólogos e teólogas, cientistas da religião e de outras áreas do conhecimento. Convidamos vocês para lerem as entrevistas e manifestarem opiniões. Sempre em um espírito de diálogo e respeito às ideias. Saiba mais em www.conic.org.br. Boa leitura. Pedro Triana – Doutor em Ciências da Religião Tua verdade? Não, a Verdade, e vem comigo buscá-la. A tua guarda-te lá.. 1 Uma reflexão sobre o diálogo inter-religioso e a teologia do pluralismo religioso “As religiões e caminhos espirituais devem dialogar juntos para serem a consciência ética da humanidade e o grito pacífico dos empobrecidos”. Dom Helder Câmara 2 “Não haverá paz entre as nações sem a paz entre as religiões. Não haverá paz entre as religiões sem o diálogo entre as religiões. Não haverá diálogo entre as religiões se não se investigam os fundamentos das religiões”. Mahatma Gandhi 3 1 Antonio Machado (1875-1939), poeta espanhol. Nascido em Sevilla, deixou um grande legado dentro do modernismo espanhol e formou parte da denominada “Geração do 98”, foi membro da Real Academia Espanhola. Alguns de seus livros mais importantes foram: “Soledades”, “Campos de Castilla” e “La Guerra. Dentre sua obra poética podemos destacar: A um olmo seco, Caminante no hay camino, El crimen fue em Granada, Anoche cuando dormia, Elegía de um madrigal, Españolito que vienes al mundo e La mujer manchega. Veja: Antonio Machado - Poemas de Antonio Machado http://www.poemas-del-alma.com/antonio- machado.htm#block-bio#ixzz4BwBaeI4L 2 Dom Hélder Câmara, na Conferência das Religiões pela Paz, Kyoto, Japão, 1970. 3 Ainda que fosse Hans Küng quem popularizou a frase, realmente foi pronunciada por Mahatma Gandhi. Confira Wayne, Teasdale, “Sacred Community at the Dawn of the Second Axial Age”, em, Sourcebook of the

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Religiotildees e Democracia eacute um espaccedilo que se propotildee a refletir as relaccedilotildees entre a religiatildeo

e a democracia A ideia eacute trabalhar a temaacutetica com o auxiacutelio de perguntas feitas a lideranccedilas

religiosas teoacutelogos e teoacutelogas cientistas da religiatildeo e de outras aacutereas do conhecimento

Convidamos vocecircs para lerem as entrevistas e manifestarem opiniotildees Sempre em um espiacuterito

de diaacutelogo e respeito agraves ideias Saiba mais em wwwconicorgbr Boa leitura

Pedro Triana ndash Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo

ldquoTua verdade

Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua guarda-te laacute1

Uma reflexatildeo sobre o diaacutelogo inter-religioso e a teologia do pluralismo religioso

ldquoAs religiotildees e caminhos espirituais devem dialogar juntos

para serem a consciecircncia eacutetica da humanidade e o grito paciacutefico dos empobrecidosrdquo

Dom Helder Cacircmara2

ldquoNatildeo haveraacute paz entre as naccedilotildees sem a paz entre as religiotildees

Natildeo haveraacute paz entre as religiotildees sem o diaacutelogo entre as religiotildees

Natildeo haveraacute diaacutelogo entre as religiotildees se natildeo se investigam os fundamentos das religiotildeesrdquo

Mahatma Gandhi3

1 Antonio Machado (1875-1939) poeta espanhol Nascido em Sevilla deixou um grande legado dentro do

modernismo espanhol e formou parte da denominada ldquoGeraccedilatildeo do 98rdquo foi membro da Real Academia Espanhola Alguns de seus livros mais importantes foram ldquoSoledadesrdquo ldquoCampos de Castillardquo e ldquoLa Guerra Dentre sua obra poeacutetica podemos destacar A um olmo seco Caminante no hay camino El crimen fue em Granada Anoche cuando dormia Elegiacutea de um madrigal Espantildeolito que vienes al mundo e La mujer manchega Veja Antonio Machado - Poemas de Antonio Machado httpwwwpoemas-del-almacomantonio-machadohtmblock-bioixzz4BwBaeI4L 2 Dom Heacutelder Cacircmara na Conferecircncia das Religiotildees pela Paz Kyoto Japatildeo 1970 3 Ainda que fosse Hans Kuumlng quem popularizou a frase realmente foi pronunciada por Mahatma Gandhi Confira Wayne Teasdale ldquoSacred Community at the Dawn of the Second Axial Agerdquo em Sourcebook of the

Excluiacutedos da Democracia

A missatildeo da Igreja no mundo eacute proclamar em palavra e accedilatildeo a Boa Nova de salvaccedilatildeo em

Jesus Cristo (Mc 1615) Isso quer dizer que a evangelizaccedilatildeo eacute uma das tarefas prioritaacuterias da

Igreja em obediecircncia ao que Jesus ordenou (Mt 2820) E a Igreja foi chamada pelo Espiacuterito

Santo a dar testemunho da obra de Deus nosso Pai e nossa Matildee que traz reconciliaccedilatildeo cura

e transformaccedilatildeo Dessa maneira a promoccedilatildeo da justiccedila e da paz eacute parte fundamental da

evangelizaccedilatildeo

Apesar de que nem sempre no passado a religiatildeo dos outros foi tratada com o respeito que lhe

eacute devido A evangelizaccedilatildeo deve sempre respeitar as pessoas de outras crenccedilas E hoje estamos

cada vez mais conscientes tanto da grande variedade de religiotildees quanto das verdades e

valores positivos que elas contecircm

No contexto contemporacircneo e de consciecircncia crescente do pluralismo religioso os cristatildeos

tecircm refletido e discutido cada vez mais questotildees como a possibilidade de salvaccedilatildeo para as

pessoas que natildeo creem explicitamente em Cristo ou a relaccedilatildeo entre diaacutelogo inter-religioso e

proclamaccedilatildeo do senhorio de Cristo4

No entanto dados do Disque 100 criado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos

apontam 697 casos de intoleracircncia religiosa entre 2011 e dezembro de 2015 a maioria

registrados nos estados de Satildeo Paulo Rio de Janeiro e Minas Gerais No estado do Rio o

Centro de Promoccedilatildeo da Liberdade Religiosa e Direitos Humanos (Cpril) registou 1014 casos

entre julho de 2012 e agosto de 2015 sendo 75 contra adeptos de religiotildees de matrizes

africana

Para Francisco Rivas Neto sacerdote e fundador da Faculdade de Teologia com Ecircnfase em

Religiotildees Afro-Brasileiras (FTU) baseada em Satildeo Paulo e a uacutenica reconhecida pelo

Ministeacuterio de Educaccedilatildeo como formadora de bachareacuteis no tema eacute impossiacutevel dissociar a

intoleracircncia do preacute-conceito contra o africano o escravo e o negro Diz Francisco Rivas Neto

ldquoOs afro-brasileiros satildeo discriminados preconceituados para natildeo dizer demonizados por

sermos de uma tradiccedilatildeo africanaafrodescendente Logo estamos afirmando que o racismo eacute

causa fundamental do preconceito ao candombleacute e demais religiotildees afro-brasileirasrdquo5

E quando escutamos e tomamos noticia desses fatos poderiacuteamos nos perguntar onde estaacute o

Estado Democraacutetico de Direito Porque a Democracia natildeo se realiza na sua plenitude quando

se exclui marginaliza discrimina e demoniza parcelas da populaccedilatildeo e natildeo se reconhece o

direito de cada pessoa ter uma vida digna assim como o direito agrave vida em todas suas

dimensotildees direito agrave liberdade agrave igualdade agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede assim como agrave praacutetica

religiosa Entretanto a Constituiccedilatildeo Federal da Repuacuteblica Federativa do Brasil jaacute em seu

Worldrsquos Religions J Beversluis (ed) (Novato California New World Library 2000) 238 Citado por Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso (Coleccioacuten Tiempo Axial Edicioacuten digital de ATRIO) 368 httpcursotpradg-nesarchivosVigilTPRVigilCap07pdfe Em portuguecircs Teologia do pluralismo religioso -para uma releitura pluralista do cristianismo (Satildeo Paulo Paulos Coleccedilatildeo tempo axial 2006) Este eacute o primeiro livro de teologia do pluralismo religioso publicado no Brasil com a pretensatildeo de fazer uma exposiccedilatildeo sistemaacutetica e completa deste ramo tatildeo jovem da teologia Confira ainda Hans Kuumlng Islatildeo Passado Presente e Futuro (Lisboa Ediccedilotildees 70 2010) 4 Veja A Igreja Uma visatildeo ecumecircnica (Satildeo Paulo ASTECONIC 2015) 72-73 Traduccedilatildeo do original ldquoThe Church Toward a Common Visionrdquo CMI por Odair Pedroso Mateus e Marie Ann Wagnen Krahn 5 Informativo do CONIC (Ano III ndash janeiro-abril 2016)

preambulo afirma-se que o Estado Democraacutetico de Direito estaacute ldquodestinado a assegurar o

exerciacutecio dos direitos sociais e individuais a liberdade a seguranccedila o bem-estar o

desenvolvimento a igualdade e a justiccedila como valores supremos de uma sociedade fraterna

pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem

interna e internacional com a soluccedilatildeo paciacutefica das controveacutersiasrdquo6

No entanto poderiacuteamos nos perguntar tambeacutem qual o papel social da religiatildeo e as religiotildees

nessas situaccedilotildees de marginalidade exclusatildeo e discriminaccedilatildeo assim como na sociedade em

geral Eacute uma realidade que na sociedade contemporacircnea a religiatildeo natildeo constitui a motivaccedilatildeo

principal do comportamento humano A proacutepria existecircncia dos estados natildeo depende da

sanccedilatildeo religiosa e o debate social cultural e filosoacutefico no se centra em temas religiosos

Poreacutem quando a religiatildeo e os sistemas religiosos se integram na dinacircmica da resistecircncia e

dos reclamos dos setores populares excluiacutedos e discriminados indiacutegenas afrodescendentes

feministas etc ai a religiatildeo e as religiotildees assumem um papel social importantiacutessimo cuja

forccedila e alcance natildeo podem ser subestimados

Dois profetas Dom Elder Cacircmara e Mahatma Gandhi desde contextos culturais e religiosos

diferentes comentam esse papel social da religiatildeo Por um lado Dom Elder Cacircmara

salientou ldquoAs religiotildees e caminhos espirituais devem dialogar juntos para serem a

consciecircncia eacutetica da humanidade e o grito paciacutefico dos empobrecidosrdquo E por outro lado

Mahatma Gandhi afirmou ldquoNatildeo haveraacute paz entre as naccedilotildees sem a paz entre as religiotildees

ldquoNatildeo haveraacute paz entre as religiotildees sem o diaacutelogo entre as religiotildees Natildeo haveraacute diaacutelogo

entre as religiotildees se natildeo se investigam os fundamentos das religiotildeesrdquo

Entatildeo tendo como pano de fundo os comentaacuterios acima expressados refletir sobre o

pluralismo religioso e a teologia do pluralismo religioso se faz uma necessidade e um desafio

tanto teoloacutegico como ecumecircnico tanto na realidade brasileira quanto global E isso eacute o que

estamos propondo fazer a seguir

Uma eacutepoca de mudanccedilas

Fala-se que natildeo estamos vivendo em uma eacutepoca de mudanccedilas mas sim em uma mudanccedila de

eacutepoca Fala-se tambeacutem que estamos vivendo na chamada eacutepoca laquopoacutes-modernaraquo7 onde

desde uma visatildeo e interpretaccedilatildeo unitaacuteria da realidade passa-se agrave vivecircncia de uma pluralidade

radical da descontinuidade e da fragmentaccedilatildeo Daiacute que tambeacutem se fale do fim dos

paradigmas e das utopias8 e de que o caos eacute uma das principais formas nas quais a sociedade

e dentro dela particularmente os empobrecidos experimentam o panorama social e espiritual

de hoje9

6 httpwwwplanaltogovbrccivil_03ConstituicaoConstituicaohtm 7 Os termos ldquopoacutes-modernismordquo eou ldquopoacutes-modernidaderdquo foram primeiramente utilizados na segunda metade do seacuteculo XX para se referir agraves mudanccedilas acontecidas na literatura na arquitetura e na arte Poreacutem tambeacutem se chama ldquopoacutes-modernismordquo eou ldquopoacutes-modernidaderdquo agraves novas visotildees do pensamento filosoacutefico particularmente da segunda metade do seacuteculo XX onde o pluralismo torna-se princiacutepio hermenecircutico fundamental Assim a verdade existe unicamente laquopluralraquo jaacute natildeo existe laquoa verdaderaquo mas laquoas verdadesraquo Confiera Joaquiacuten Garay ldquoTeologiacutea del pluralismo religioso y teologiacutea de la liberacioacutenrdquo em (Koinonia Relat) 310 httplatinoamericanaorg2003textos 8 Franz J Hinkelammert ldquoEl cautiverio de la utopiacutea ndash las utopiacuteas conservadoras del capitalismo actual el neoliberalismo y el espacio para alternativasrdquo em Ensayos (La Habana Editorial Caminos 1999) 200 9 Harvey Cox ldquoMisioacuten en las Ameacutericas ndash Siglo XXI ndash Perspectiva del Norterdquo em Esperanza y justicia en las Ameacutericas ndash discerniendo la misioacuten de Dios (sl se 1998)96

Isto se faz uma realidade no meio de um processo planetaacuterio que se identifica com o termo de

laquoglobalizaccedilatildeoraquo Natildeo eacute nosso objetivo principal refletir sobre os aspectos positivos e negativos

da globalizaccedilatildeo poreacutem eacute uma realidade que a globalizaccedilatildeo marca os tempos de hoje Eacute um

fenocircmeno que penetra tudo e integra tudo e cujos efeitos se fazem presente em toda a

sociedade a niacutevel mundial na poliacutetica na economia nas comunicaccedilotildees na tecnologia nos

Estados nas naccedilotildees afetando ateacute as instituiccedilotildees e sistemas religiosos

No entanto anota Joseacute Mariacutea Vigil10 que o termo laquoglobalizaccedilatildeoraquo eacute um termo errado E ainda

que muitos o utilizem no sentido de laquomundializaccedilatildeoraquo seria melhor lembrar seu sentido

original o qual natildeo eacute mais que o nome que o neoliberalismo atual deu a seu proacuteprio processo

de expansatildeo de capitais depois do fim da guerra fria A laquomundializaccedilatildeoraquo segundo ele por

sua vez eacute um fenocircmeno muito mais amplo e antigo que se refere ao processo de unificaccedilatildeo e

concentraccedilatildeo do mundo em sistemas sociais cada vez mais amplos aproximando-se cada vez

mais agraves dimensotildees mesmas do planeta Mas processo que se intensificou nos uacuteltimos seacuteculos

e que particularmente no seacuteculo XX tem alcanccedilado a totalidade de nosso planeta Hoje

temos a impressatildeo de estar vivendo no apenas no mesmo planeta mas realmente laquoem um

mesmo mundoraquo ou como tambeacutem tem se falado laquoem uma aldeia comumraquo em uma

sociedade mundial mundializada11

Assumindo nesta reflexatildeo as colocaccedilotildees de Vigil caberia agora nos perguntarmos quais

efeitos tem a laquomundializaccedilatildeoraquo sobre a religiatildeo as religiotildees e a teologia

Por um lado a mundializaccedilatildeo faz que as religiotildees natildeo possam mais se ignorar Muitas

sociedades satildeo pluriculturais formadas por imigrantes procedentes de outros paiacuteses bairros

habitados por diferentes etnias e culturas As diferentes religiotildees jaacute natildeo se encontram longe

mas na mesma sociedade e ateacute na mesma cidade Em uma mesma quadra podemos encontrar

uma igreja catoacutelica romana uma igreja evangeacutelica e ateacute um terreiro de candombleacute Dessa

maneira querendo o natildeo querendo as diferentes religiotildees satildeo obrigadas a viver em sociedade

a conviver a comparar-se a confrontar-se e a desafiar-se mutuamente Deste modo os

membros das diferentes religiotildees vatildeo se dando conta que sua religiatildeo natildeo eacute a uacutenica que

existe E aiacute comeccedilam a conhecer e conviver com pessoas de outras religiotildees (vizinhosas

amigosas ateacute membros da proacutepria famiacutelia) tatildeo cheias de amor como os membros de sua

proacutepria religiatildeo E comeccedilam a se perguntarem se sua religiatildeo realmente eacute a laquouacutenica e

verdadeiraraquo Por isso a mundializaccedilatildeo desafia as religiotildees talvez colocando em perigo sua

identidade distintiva mas por sua vez oferecendo novas possibilidades de fecundaccedilatildeo e

revitalizaccedilatildeo Fala-se que a inter-espiritualidade eacute a religiatildeo do terceiro milecircnio12

Por outro lado a mundializaccedilatildeo traacutes tambeacutem desafios para a tarefa teoloacutegica Comenta Joseacute

Maria Vigil que na eacutepoca da mundializaccedilatildeo o teoacutelogo poderaacute ter uma confissatildeo religiosa

determinada mas uma teologia que fale para a sociedade e ao mundo deveraacute ser uma teologia

que possa ter sentido para um destinataacuterio que eacute multireligioso porque em caso contrario natildeo

10 Joseacute Mariacutea Vigil espanholnicaraguumlense catoacutelico teoacutelogo (SalamancaRoma) estudou psicologia em Salamanca Madrid e ManaguaNicaragua Coordenador da Comissatildeo Teoloacutegica Americana da Associaccedilatildeo de Teoacutelogosas do Terceiro Mundo (ASETTEATWOT) 11 Vigil 358-359 12 Ibid 365 O termo laquoInter-espiritualidaderaquo eacute um termo que designa o fenocircmeno crescente do compartilhar inter-religioso dos recursos interiores dos tesouros de cada tradiccedilatildeo Wayne Teasdale The Mystic Heart Discovering a Universal Spirituality in the Worldrsquos Religions proacutelogo do Dalai Lama (Novato California New World Library 1999) 10 Citado por Vigil 365

estaria realmente fazendo teologia no mundo plurirreligioso de hoje mas em um mundo

monoreligioso que jaacute natildeo existe13

Entretanto em um mundo onde a globalizaccedilatildeo neoliberal perpetua o empobrecimento das

grandes maiorias matizado por guerras violecircncia e divisotildees culturais onde se desrespeita e

agride nosso lar natural e onde inclusive a luta contra o terrorismo tem no fundo matizes

religiosos a mundializaccedilatildeo desafia a todas as religiotildees a lutarem juntas por alcanccedilar uma

eacutetica mundial

Afirma a laquoDeclaraccedilatildeo sobre o papel da religiatildeo na promoccedilatildeo de uma cultura de pazraquo

(Catalunha Espanha 1994) ldquoNossas comunidades tecircm a responsabilidade de fomentar uma

conduta inspirada na sabedoria a compaixatildeo a partilha a caridade a solidariedade e o

amor que guie a todos pelos caminhos da liberdade e a responsabilidade As religiotildees devem

ser uma fonte de energia liberadorardquo14

Portanto em nosso mundo mundializado de hoje o diaacutelogo inter-religioso se torna urgente

natildeo apenas para teorizar teologicamente senatildeo para possibilitar a paz a justiccedila e a

fraternidade humana contribuindo assim a dar uma resposta comum na soluccedilatildeo dos grandes e

graves problemas que enfrenta a humanidade

Fundamentos biacuteblicos e teoloacutegicos para uma teologia do pluralismo religioso

O conceito fundamental que sustenta uma visatildeo conservadora fundamentalista eou

exclusivista do cristianismo eacute o conceito de laquorevelaccedilatildeoraquo Uma pessoa que assim pensa e

manteacutem uma postura contraria ao pluralismo invocaraacute a Biacuteblia e a revelaccedilatildeo como sua razatildeo

uacuteltima laquoeacute Deus mesmo quem nos revelou a verdade e noacutes devemos aceitaacute-laraquo Mas a teologia

do pluralismo religioso propotildee uma visatildeo diferente da revelaccedilatildeo Por isso eacute a revisatildeo e

transformaccedilatildeo do conceito de revelaccedilatildeo o que estaacute na base da emergecircncia do pluralismo

como superaccedilatildeo tanto do laquoexclusivismoraquo como do laquo inclusivismoraquo

Poreacutem conveacutem agora realizar algumas clarificaccedilotildees do que se entende por exclusivismo e

inclusivismo Mas ofereceremos apenas os conceitos mais comuns e aceitos dentro da

teologia das religiotildees

Ateacute a primeira metade do seacuteculo XX a posiccedilatildeo teoloacutegica dominante dentro do cristianismo

tem sido o laquoexclusivismoraquo E a expressatildeo simboacutelica desta posiccedilatildeo encontra-se na famosa

sentenccedila atribuiacuteda por uns a Oriacutegenes e por outros a Cipriano laquoextra ecclesiam nulla salusraquo

ou seja laquofora da igreja natildeo haacute salvaccedilatildeoraquo Essa posiccedilatildeo manteve-se constante dentro do

catolicismo praticamente ateacute a primeira metade do seacuteculo XX

Entretanto o exclusivismo pode ser eclesiocecircntrico ou natildeo Assim vemos que no campo

protestante o exclusivismo adquire uma forma no eclesiocecircntrica laquoa sola Feacute a sola Graccedila a

sola Escrituraraquo A figura tiacutepica e simboacutelica desta posiccedilatildeo a encontramos em Karl Barth

(1886-1968) Barth apesar de natildeo ser um fundamentalista protestante opotildee revelaccedilatildeo e

religiatildeo negando que a religiatildeo pudesse ser canal de revelaccedilatildeo Segundo Barth a religiatildeo eacute a

relaccedilatildeo que as pessoas instauram com o poder divino por suas proacuteprias forccedilas ou seja um

intento de manipular a Deus enquanto a feacute eacute a relaccedilatildeo que Deus instaura gratuitamente Daiacute

13 Ibid 366 14 Citado por Vigil 368-369

acrescenta Barth a religiatildeo eacute obra humana sendo nossa tarefa a supressatildeo de toda religiatildeo

nossa feacute eacute a invalidaccedilatildeo radical de tudo o que eacute humano experiecircncia saber posse e

atividade Fora do cristianismo que eacute a religiatildeo perfeita e verdadeira conclui Barth tudo eacute

trevas e afastamento de Deus15

Entretanto o laquoinclusivismoraquo afirma que ainda que a salvaccedilatildeo encontra-se presente de

maneira particular no cristianismo tambeacutem pode ser encontrada de maneira laquodeficiente e

imperfeitaraquo nas outras religiotildees E esta posiccedilatildeo seraacute a que vai se afirmar no mundo teoloacutegico

particularmente dentro da Igreja Catoacutelica Romana e influiraacute os debates e documentos do

Concilio Vaticano II No entanto fazemos a ressalva que no presente esta eacute a posiccedilatildeo

teoloacutegica majoritaacuteria no cristianismo tanto catoacutelico como protestante (cf Hans Kuumlng

Wolfhart Pannenberg Mark S Heim Gregory Baum Monika Hellwig Edward

Schillebeeckx Harvey Cox Roger Haight Marcus Borg entre outros)

Podemos assinalar o catoacutelico Karl Rahner (1904-1984) como uma figura tiacutepica desta posiccedilatildeo

A visatildeo de Rahner em sua teologia das religiotildees se resume em sua teoria de laquocristatildeos

anocircnimosraquo ou seja os natildeo cristatildeos satildeo salvos pela graccedila e presenccedila de Cristo que age

anonimamente entre suas religiotildees Deste modo com uma visatildeo inclusivistacristocecircntrica

postulou que as diversas religiotildees natildeo somente apresentam elementos de uma crenccedila natural

em Deus mas trazem consigo traccedilos substanciais da graccedila doada a Deus ao homem em Jesus

Cristo e que portanto os cristatildeos natildeo apenas podem mas devem considerar outras religiotildees

como legitimas e como caminhos de salvaccedilatildeo16

Passo na sequecircncia a oferecer uma siacutentese dos elementos principais biacuteblicos e teoloacutegicos

dessa nova visatildeo que possibilita as transformaccedilotildees teoloacutegicas que levam a uma mudanccedila de

mentalidade a partir do inclusivismo para o pluralismo

Por um lado Paul Knitter17 afirma que eacute idolatria insistir que haacute apenas um caminho uma

norma uma verdade Nenhuma religiatildeo ou revelaccedilatildeo pode ser somente ou a Palavra de Deus

final ou exclusiva ou inclusiva A realidade eacute plural desde aacutetomos ateacute religiotildees e Deus

precisa de multiplicidade para ser Deus E por outro lado afirma tambeacutem o teoacutelogo indiano

Panikkar que porque a realidade eacute pluralista o misteacuterio da Trindade eacute o fundamento uacuteltimo

para o pluralismo18

Na carta aos Hebreus se diz ldquoHavendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas

maneiras aos pais pelos profetas a noacutes falou-nos nestes uacuteltimos dias pelo Filhordquo (Hb 11) E

comentando esse texto diz Jacques Dupuis19 que o fato de Deus ter falado ldquomuitas vezes e de

15 Karl Barth La revelacioacuten como abolicioacuten de la religioacuten (Madrid 1973) citado por Vigil 62-63 Confira tambeacutem Karl Barth Der Roumlmerbrief 84 citado por Marcelo Barros ldquoA reconciliaccedilatildeo de quem nunca se separourdquo em Pelos muitos caminhos de Deus ndash Desafios do pluralismo religioso agrave Teologia da Libertaccedilatildeo (Goiaacutes Editora Rede 2003) 140 16 Veja Paul F Knitter Jesus e os Outros Nomes (Satildeo Bernardo do CampoBrasil Nhanduti Editora 2010) 24-26 e Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 73-74 17 Paul F Kniter catoacutelico eacute um dos principais teoacutelogos do pluralismo religioso Eacute licenciado em teologia pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana de Roma Itaacutelia (1966) e doutor em teologia pela Universidade de Marburgo Alemanha (1972) Atualmente eacute professor de Teologia Religiotildees do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary em Nova Iorque 18 Veja Knitter 58-60 19 Jacques Dupuis sacerdote belga jesuiacuteta foi professor de Teologia e Religiotildees natildeo Cristatildes na Universidade Gregoriana em Roma Morreu em 2004

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

Excluiacutedos da Democracia

A missatildeo da Igreja no mundo eacute proclamar em palavra e accedilatildeo a Boa Nova de salvaccedilatildeo em

Jesus Cristo (Mc 1615) Isso quer dizer que a evangelizaccedilatildeo eacute uma das tarefas prioritaacuterias da

Igreja em obediecircncia ao que Jesus ordenou (Mt 2820) E a Igreja foi chamada pelo Espiacuterito

Santo a dar testemunho da obra de Deus nosso Pai e nossa Matildee que traz reconciliaccedilatildeo cura

e transformaccedilatildeo Dessa maneira a promoccedilatildeo da justiccedila e da paz eacute parte fundamental da

evangelizaccedilatildeo

Apesar de que nem sempre no passado a religiatildeo dos outros foi tratada com o respeito que lhe

eacute devido A evangelizaccedilatildeo deve sempre respeitar as pessoas de outras crenccedilas E hoje estamos

cada vez mais conscientes tanto da grande variedade de religiotildees quanto das verdades e

valores positivos que elas contecircm

No contexto contemporacircneo e de consciecircncia crescente do pluralismo religioso os cristatildeos

tecircm refletido e discutido cada vez mais questotildees como a possibilidade de salvaccedilatildeo para as

pessoas que natildeo creem explicitamente em Cristo ou a relaccedilatildeo entre diaacutelogo inter-religioso e

proclamaccedilatildeo do senhorio de Cristo4

No entanto dados do Disque 100 criado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos

apontam 697 casos de intoleracircncia religiosa entre 2011 e dezembro de 2015 a maioria

registrados nos estados de Satildeo Paulo Rio de Janeiro e Minas Gerais No estado do Rio o

Centro de Promoccedilatildeo da Liberdade Religiosa e Direitos Humanos (Cpril) registou 1014 casos

entre julho de 2012 e agosto de 2015 sendo 75 contra adeptos de religiotildees de matrizes

africana

Para Francisco Rivas Neto sacerdote e fundador da Faculdade de Teologia com Ecircnfase em

Religiotildees Afro-Brasileiras (FTU) baseada em Satildeo Paulo e a uacutenica reconhecida pelo

Ministeacuterio de Educaccedilatildeo como formadora de bachareacuteis no tema eacute impossiacutevel dissociar a

intoleracircncia do preacute-conceito contra o africano o escravo e o negro Diz Francisco Rivas Neto

ldquoOs afro-brasileiros satildeo discriminados preconceituados para natildeo dizer demonizados por

sermos de uma tradiccedilatildeo africanaafrodescendente Logo estamos afirmando que o racismo eacute

causa fundamental do preconceito ao candombleacute e demais religiotildees afro-brasileirasrdquo5

E quando escutamos e tomamos noticia desses fatos poderiacuteamos nos perguntar onde estaacute o

Estado Democraacutetico de Direito Porque a Democracia natildeo se realiza na sua plenitude quando

se exclui marginaliza discrimina e demoniza parcelas da populaccedilatildeo e natildeo se reconhece o

direito de cada pessoa ter uma vida digna assim como o direito agrave vida em todas suas

dimensotildees direito agrave liberdade agrave igualdade agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede assim como agrave praacutetica

religiosa Entretanto a Constituiccedilatildeo Federal da Repuacuteblica Federativa do Brasil jaacute em seu

Worldrsquos Religions J Beversluis (ed) (Novato California New World Library 2000) 238 Citado por Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso (Coleccioacuten Tiempo Axial Edicioacuten digital de ATRIO) 368 httpcursotpradg-nesarchivosVigilTPRVigilCap07pdfe Em portuguecircs Teologia do pluralismo religioso -para uma releitura pluralista do cristianismo (Satildeo Paulo Paulos Coleccedilatildeo tempo axial 2006) Este eacute o primeiro livro de teologia do pluralismo religioso publicado no Brasil com a pretensatildeo de fazer uma exposiccedilatildeo sistemaacutetica e completa deste ramo tatildeo jovem da teologia Confira ainda Hans Kuumlng Islatildeo Passado Presente e Futuro (Lisboa Ediccedilotildees 70 2010) 4 Veja A Igreja Uma visatildeo ecumecircnica (Satildeo Paulo ASTECONIC 2015) 72-73 Traduccedilatildeo do original ldquoThe Church Toward a Common Visionrdquo CMI por Odair Pedroso Mateus e Marie Ann Wagnen Krahn 5 Informativo do CONIC (Ano III ndash janeiro-abril 2016)

preambulo afirma-se que o Estado Democraacutetico de Direito estaacute ldquodestinado a assegurar o

exerciacutecio dos direitos sociais e individuais a liberdade a seguranccedila o bem-estar o

desenvolvimento a igualdade e a justiccedila como valores supremos de uma sociedade fraterna

pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem

interna e internacional com a soluccedilatildeo paciacutefica das controveacutersiasrdquo6

No entanto poderiacuteamos nos perguntar tambeacutem qual o papel social da religiatildeo e as religiotildees

nessas situaccedilotildees de marginalidade exclusatildeo e discriminaccedilatildeo assim como na sociedade em

geral Eacute uma realidade que na sociedade contemporacircnea a religiatildeo natildeo constitui a motivaccedilatildeo

principal do comportamento humano A proacutepria existecircncia dos estados natildeo depende da

sanccedilatildeo religiosa e o debate social cultural e filosoacutefico no se centra em temas religiosos

Poreacutem quando a religiatildeo e os sistemas religiosos se integram na dinacircmica da resistecircncia e

dos reclamos dos setores populares excluiacutedos e discriminados indiacutegenas afrodescendentes

feministas etc ai a religiatildeo e as religiotildees assumem um papel social importantiacutessimo cuja

forccedila e alcance natildeo podem ser subestimados

Dois profetas Dom Elder Cacircmara e Mahatma Gandhi desde contextos culturais e religiosos

diferentes comentam esse papel social da religiatildeo Por um lado Dom Elder Cacircmara

salientou ldquoAs religiotildees e caminhos espirituais devem dialogar juntos para serem a

consciecircncia eacutetica da humanidade e o grito paciacutefico dos empobrecidosrdquo E por outro lado

Mahatma Gandhi afirmou ldquoNatildeo haveraacute paz entre as naccedilotildees sem a paz entre as religiotildees

ldquoNatildeo haveraacute paz entre as religiotildees sem o diaacutelogo entre as religiotildees Natildeo haveraacute diaacutelogo

entre as religiotildees se natildeo se investigam os fundamentos das religiotildeesrdquo

Entatildeo tendo como pano de fundo os comentaacuterios acima expressados refletir sobre o

pluralismo religioso e a teologia do pluralismo religioso se faz uma necessidade e um desafio

tanto teoloacutegico como ecumecircnico tanto na realidade brasileira quanto global E isso eacute o que

estamos propondo fazer a seguir

Uma eacutepoca de mudanccedilas

Fala-se que natildeo estamos vivendo em uma eacutepoca de mudanccedilas mas sim em uma mudanccedila de

eacutepoca Fala-se tambeacutem que estamos vivendo na chamada eacutepoca laquopoacutes-modernaraquo7 onde

desde uma visatildeo e interpretaccedilatildeo unitaacuteria da realidade passa-se agrave vivecircncia de uma pluralidade

radical da descontinuidade e da fragmentaccedilatildeo Daiacute que tambeacutem se fale do fim dos

paradigmas e das utopias8 e de que o caos eacute uma das principais formas nas quais a sociedade

e dentro dela particularmente os empobrecidos experimentam o panorama social e espiritual

de hoje9

6 httpwwwplanaltogovbrccivil_03ConstituicaoConstituicaohtm 7 Os termos ldquopoacutes-modernismordquo eou ldquopoacutes-modernidaderdquo foram primeiramente utilizados na segunda metade do seacuteculo XX para se referir agraves mudanccedilas acontecidas na literatura na arquitetura e na arte Poreacutem tambeacutem se chama ldquopoacutes-modernismordquo eou ldquopoacutes-modernidaderdquo agraves novas visotildees do pensamento filosoacutefico particularmente da segunda metade do seacuteculo XX onde o pluralismo torna-se princiacutepio hermenecircutico fundamental Assim a verdade existe unicamente laquopluralraquo jaacute natildeo existe laquoa verdaderaquo mas laquoas verdadesraquo Confiera Joaquiacuten Garay ldquoTeologiacutea del pluralismo religioso y teologiacutea de la liberacioacutenrdquo em (Koinonia Relat) 310 httplatinoamericanaorg2003textos 8 Franz J Hinkelammert ldquoEl cautiverio de la utopiacutea ndash las utopiacuteas conservadoras del capitalismo actual el neoliberalismo y el espacio para alternativasrdquo em Ensayos (La Habana Editorial Caminos 1999) 200 9 Harvey Cox ldquoMisioacuten en las Ameacutericas ndash Siglo XXI ndash Perspectiva del Norterdquo em Esperanza y justicia en las Ameacutericas ndash discerniendo la misioacuten de Dios (sl se 1998)96

Isto se faz uma realidade no meio de um processo planetaacuterio que se identifica com o termo de

laquoglobalizaccedilatildeoraquo Natildeo eacute nosso objetivo principal refletir sobre os aspectos positivos e negativos

da globalizaccedilatildeo poreacutem eacute uma realidade que a globalizaccedilatildeo marca os tempos de hoje Eacute um

fenocircmeno que penetra tudo e integra tudo e cujos efeitos se fazem presente em toda a

sociedade a niacutevel mundial na poliacutetica na economia nas comunicaccedilotildees na tecnologia nos

Estados nas naccedilotildees afetando ateacute as instituiccedilotildees e sistemas religiosos

No entanto anota Joseacute Mariacutea Vigil10 que o termo laquoglobalizaccedilatildeoraquo eacute um termo errado E ainda

que muitos o utilizem no sentido de laquomundializaccedilatildeoraquo seria melhor lembrar seu sentido

original o qual natildeo eacute mais que o nome que o neoliberalismo atual deu a seu proacuteprio processo

de expansatildeo de capitais depois do fim da guerra fria A laquomundializaccedilatildeoraquo segundo ele por

sua vez eacute um fenocircmeno muito mais amplo e antigo que se refere ao processo de unificaccedilatildeo e

concentraccedilatildeo do mundo em sistemas sociais cada vez mais amplos aproximando-se cada vez

mais agraves dimensotildees mesmas do planeta Mas processo que se intensificou nos uacuteltimos seacuteculos

e que particularmente no seacuteculo XX tem alcanccedilado a totalidade de nosso planeta Hoje

temos a impressatildeo de estar vivendo no apenas no mesmo planeta mas realmente laquoem um

mesmo mundoraquo ou como tambeacutem tem se falado laquoem uma aldeia comumraquo em uma

sociedade mundial mundializada11

Assumindo nesta reflexatildeo as colocaccedilotildees de Vigil caberia agora nos perguntarmos quais

efeitos tem a laquomundializaccedilatildeoraquo sobre a religiatildeo as religiotildees e a teologia

Por um lado a mundializaccedilatildeo faz que as religiotildees natildeo possam mais se ignorar Muitas

sociedades satildeo pluriculturais formadas por imigrantes procedentes de outros paiacuteses bairros

habitados por diferentes etnias e culturas As diferentes religiotildees jaacute natildeo se encontram longe

mas na mesma sociedade e ateacute na mesma cidade Em uma mesma quadra podemos encontrar

uma igreja catoacutelica romana uma igreja evangeacutelica e ateacute um terreiro de candombleacute Dessa

maneira querendo o natildeo querendo as diferentes religiotildees satildeo obrigadas a viver em sociedade

a conviver a comparar-se a confrontar-se e a desafiar-se mutuamente Deste modo os

membros das diferentes religiotildees vatildeo se dando conta que sua religiatildeo natildeo eacute a uacutenica que

existe E aiacute comeccedilam a conhecer e conviver com pessoas de outras religiotildees (vizinhosas

amigosas ateacute membros da proacutepria famiacutelia) tatildeo cheias de amor como os membros de sua

proacutepria religiatildeo E comeccedilam a se perguntarem se sua religiatildeo realmente eacute a laquouacutenica e

verdadeiraraquo Por isso a mundializaccedilatildeo desafia as religiotildees talvez colocando em perigo sua

identidade distintiva mas por sua vez oferecendo novas possibilidades de fecundaccedilatildeo e

revitalizaccedilatildeo Fala-se que a inter-espiritualidade eacute a religiatildeo do terceiro milecircnio12

Por outro lado a mundializaccedilatildeo traacutes tambeacutem desafios para a tarefa teoloacutegica Comenta Joseacute

Maria Vigil que na eacutepoca da mundializaccedilatildeo o teoacutelogo poderaacute ter uma confissatildeo religiosa

determinada mas uma teologia que fale para a sociedade e ao mundo deveraacute ser uma teologia

que possa ter sentido para um destinataacuterio que eacute multireligioso porque em caso contrario natildeo

10 Joseacute Mariacutea Vigil espanholnicaraguumlense catoacutelico teoacutelogo (SalamancaRoma) estudou psicologia em Salamanca Madrid e ManaguaNicaragua Coordenador da Comissatildeo Teoloacutegica Americana da Associaccedilatildeo de Teoacutelogosas do Terceiro Mundo (ASETTEATWOT) 11 Vigil 358-359 12 Ibid 365 O termo laquoInter-espiritualidaderaquo eacute um termo que designa o fenocircmeno crescente do compartilhar inter-religioso dos recursos interiores dos tesouros de cada tradiccedilatildeo Wayne Teasdale The Mystic Heart Discovering a Universal Spirituality in the Worldrsquos Religions proacutelogo do Dalai Lama (Novato California New World Library 1999) 10 Citado por Vigil 365

estaria realmente fazendo teologia no mundo plurirreligioso de hoje mas em um mundo

monoreligioso que jaacute natildeo existe13

Entretanto em um mundo onde a globalizaccedilatildeo neoliberal perpetua o empobrecimento das

grandes maiorias matizado por guerras violecircncia e divisotildees culturais onde se desrespeita e

agride nosso lar natural e onde inclusive a luta contra o terrorismo tem no fundo matizes

religiosos a mundializaccedilatildeo desafia a todas as religiotildees a lutarem juntas por alcanccedilar uma

eacutetica mundial

Afirma a laquoDeclaraccedilatildeo sobre o papel da religiatildeo na promoccedilatildeo de uma cultura de pazraquo

(Catalunha Espanha 1994) ldquoNossas comunidades tecircm a responsabilidade de fomentar uma

conduta inspirada na sabedoria a compaixatildeo a partilha a caridade a solidariedade e o

amor que guie a todos pelos caminhos da liberdade e a responsabilidade As religiotildees devem

ser uma fonte de energia liberadorardquo14

Portanto em nosso mundo mundializado de hoje o diaacutelogo inter-religioso se torna urgente

natildeo apenas para teorizar teologicamente senatildeo para possibilitar a paz a justiccedila e a

fraternidade humana contribuindo assim a dar uma resposta comum na soluccedilatildeo dos grandes e

graves problemas que enfrenta a humanidade

Fundamentos biacuteblicos e teoloacutegicos para uma teologia do pluralismo religioso

O conceito fundamental que sustenta uma visatildeo conservadora fundamentalista eou

exclusivista do cristianismo eacute o conceito de laquorevelaccedilatildeoraquo Uma pessoa que assim pensa e

manteacutem uma postura contraria ao pluralismo invocaraacute a Biacuteblia e a revelaccedilatildeo como sua razatildeo

uacuteltima laquoeacute Deus mesmo quem nos revelou a verdade e noacutes devemos aceitaacute-laraquo Mas a teologia

do pluralismo religioso propotildee uma visatildeo diferente da revelaccedilatildeo Por isso eacute a revisatildeo e

transformaccedilatildeo do conceito de revelaccedilatildeo o que estaacute na base da emergecircncia do pluralismo

como superaccedilatildeo tanto do laquoexclusivismoraquo como do laquo inclusivismoraquo

Poreacutem conveacutem agora realizar algumas clarificaccedilotildees do que se entende por exclusivismo e

inclusivismo Mas ofereceremos apenas os conceitos mais comuns e aceitos dentro da

teologia das religiotildees

Ateacute a primeira metade do seacuteculo XX a posiccedilatildeo teoloacutegica dominante dentro do cristianismo

tem sido o laquoexclusivismoraquo E a expressatildeo simboacutelica desta posiccedilatildeo encontra-se na famosa

sentenccedila atribuiacuteda por uns a Oriacutegenes e por outros a Cipriano laquoextra ecclesiam nulla salusraquo

ou seja laquofora da igreja natildeo haacute salvaccedilatildeoraquo Essa posiccedilatildeo manteve-se constante dentro do

catolicismo praticamente ateacute a primeira metade do seacuteculo XX

Entretanto o exclusivismo pode ser eclesiocecircntrico ou natildeo Assim vemos que no campo

protestante o exclusivismo adquire uma forma no eclesiocecircntrica laquoa sola Feacute a sola Graccedila a

sola Escrituraraquo A figura tiacutepica e simboacutelica desta posiccedilatildeo a encontramos em Karl Barth

(1886-1968) Barth apesar de natildeo ser um fundamentalista protestante opotildee revelaccedilatildeo e

religiatildeo negando que a religiatildeo pudesse ser canal de revelaccedilatildeo Segundo Barth a religiatildeo eacute a

relaccedilatildeo que as pessoas instauram com o poder divino por suas proacuteprias forccedilas ou seja um

intento de manipular a Deus enquanto a feacute eacute a relaccedilatildeo que Deus instaura gratuitamente Daiacute

13 Ibid 366 14 Citado por Vigil 368-369

acrescenta Barth a religiatildeo eacute obra humana sendo nossa tarefa a supressatildeo de toda religiatildeo

nossa feacute eacute a invalidaccedilatildeo radical de tudo o que eacute humano experiecircncia saber posse e

atividade Fora do cristianismo que eacute a religiatildeo perfeita e verdadeira conclui Barth tudo eacute

trevas e afastamento de Deus15

Entretanto o laquoinclusivismoraquo afirma que ainda que a salvaccedilatildeo encontra-se presente de

maneira particular no cristianismo tambeacutem pode ser encontrada de maneira laquodeficiente e

imperfeitaraquo nas outras religiotildees E esta posiccedilatildeo seraacute a que vai se afirmar no mundo teoloacutegico

particularmente dentro da Igreja Catoacutelica Romana e influiraacute os debates e documentos do

Concilio Vaticano II No entanto fazemos a ressalva que no presente esta eacute a posiccedilatildeo

teoloacutegica majoritaacuteria no cristianismo tanto catoacutelico como protestante (cf Hans Kuumlng

Wolfhart Pannenberg Mark S Heim Gregory Baum Monika Hellwig Edward

Schillebeeckx Harvey Cox Roger Haight Marcus Borg entre outros)

Podemos assinalar o catoacutelico Karl Rahner (1904-1984) como uma figura tiacutepica desta posiccedilatildeo

A visatildeo de Rahner em sua teologia das religiotildees se resume em sua teoria de laquocristatildeos

anocircnimosraquo ou seja os natildeo cristatildeos satildeo salvos pela graccedila e presenccedila de Cristo que age

anonimamente entre suas religiotildees Deste modo com uma visatildeo inclusivistacristocecircntrica

postulou que as diversas religiotildees natildeo somente apresentam elementos de uma crenccedila natural

em Deus mas trazem consigo traccedilos substanciais da graccedila doada a Deus ao homem em Jesus

Cristo e que portanto os cristatildeos natildeo apenas podem mas devem considerar outras religiotildees

como legitimas e como caminhos de salvaccedilatildeo16

Passo na sequecircncia a oferecer uma siacutentese dos elementos principais biacuteblicos e teoloacutegicos

dessa nova visatildeo que possibilita as transformaccedilotildees teoloacutegicas que levam a uma mudanccedila de

mentalidade a partir do inclusivismo para o pluralismo

Por um lado Paul Knitter17 afirma que eacute idolatria insistir que haacute apenas um caminho uma

norma uma verdade Nenhuma religiatildeo ou revelaccedilatildeo pode ser somente ou a Palavra de Deus

final ou exclusiva ou inclusiva A realidade eacute plural desde aacutetomos ateacute religiotildees e Deus

precisa de multiplicidade para ser Deus E por outro lado afirma tambeacutem o teoacutelogo indiano

Panikkar que porque a realidade eacute pluralista o misteacuterio da Trindade eacute o fundamento uacuteltimo

para o pluralismo18

Na carta aos Hebreus se diz ldquoHavendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas

maneiras aos pais pelos profetas a noacutes falou-nos nestes uacuteltimos dias pelo Filhordquo (Hb 11) E

comentando esse texto diz Jacques Dupuis19 que o fato de Deus ter falado ldquomuitas vezes e de

15 Karl Barth La revelacioacuten como abolicioacuten de la religioacuten (Madrid 1973) citado por Vigil 62-63 Confira tambeacutem Karl Barth Der Roumlmerbrief 84 citado por Marcelo Barros ldquoA reconciliaccedilatildeo de quem nunca se separourdquo em Pelos muitos caminhos de Deus ndash Desafios do pluralismo religioso agrave Teologia da Libertaccedilatildeo (Goiaacutes Editora Rede 2003) 140 16 Veja Paul F Knitter Jesus e os Outros Nomes (Satildeo Bernardo do CampoBrasil Nhanduti Editora 2010) 24-26 e Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 73-74 17 Paul F Kniter catoacutelico eacute um dos principais teoacutelogos do pluralismo religioso Eacute licenciado em teologia pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana de Roma Itaacutelia (1966) e doutor em teologia pela Universidade de Marburgo Alemanha (1972) Atualmente eacute professor de Teologia Religiotildees do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary em Nova Iorque 18 Veja Knitter 58-60 19 Jacques Dupuis sacerdote belga jesuiacuteta foi professor de Teologia e Religiotildees natildeo Cristatildes na Universidade Gregoriana em Roma Morreu em 2004

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

preambulo afirma-se que o Estado Democraacutetico de Direito estaacute ldquodestinado a assegurar o

exerciacutecio dos direitos sociais e individuais a liberdade a seguranccedila o bem-estar o

desenvolvimento a igualdade e a justiccedila como valores supremos de uma sociedade fraterna

pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem

interna e internacional com a soluccedilatildeo paciacutefica das controveacutersiasrdquo6

No entanto poderiacuteamos nos perguntar tambeacutem qual o papel social da religiatildeo e as religiotildees

nessas situaccedilotildees de marginalidade exclusatildeo e discriminaccedilatildeo assim como na sociedade em

geral Eacute uma realidade que na sociedade contemporacircnea a religiatildeo natildeo constitui a motivaccedilatildeo

principal do comportamento humano A proacutepria existecircncia dos estados natildeo depende da

sanccedilatildeo religiosa e o debate social cultural e filosoacutefico no se centra em temas religiosos

Poreacutem quando a religiatildeo e os sistemas religiosos se integram na dinacircmica da resistecircncia e

dos reclamos dos setores populares excluiacutedos e discriminados indiacutegenas afrodescendentes

feministas etc ai a religiatildeo e as religiotildees assumem um papel social importantiacutessimo cuja

forccedila e alcance natildeo podem ser subestimados

Dois profetas Dom Elder Cacircmara e Mahatma Gandhi desde contextos culturais e religiosos

diferentes comentam esse papel social da religiatildeo Por um lado Dom Elder Cacircmara

salientou ldquoAs religiotildees e caminhos espirituais devem dialogar juntos para serem a

consciecircncia eacutetica da humanidade e o grito paciacutefico dos empobrecidosrdquo E por outro lado

Mahatma Gandhi afirmou ldquoNatildeo haveraacute paz entre as naccedilotildees sem a paz entre as religiotildees

ldquoNatildeo haveraacute paz entre as religiotildees sem o diaacutelogo entre as religiotildees Natildeo haveraacute diaacutelogo

entre as religiotildees se natildeo se investigam os fundamentos das religiotildeesrdquo

Entatildeo tendo como pano de fundo os comentaacuterios acima expressados refletir sobre o

pluralismo religioso e a teologia do pluralismo religioso se faz uma necessidade e um desafio

tanto teoloacutegico como ecumecircnico tanto na realidade brasileira quanto global E isso eacute o que

estamos propondo fazer a seguir

Uma eacutepoca de mudanccedilas

Fala-se que natildeo estamos vivendo em uma eacutepoca de mudanccedilas mas sim em uma mudanccedila de

eacutepoca Fala-se tambeacutem que estamos vivendo na chamada eacutepoca laquopoacutes-modernaraquo7 onde

desde uma visatildeo e interpretaccedilatildeo unitaacuteria da realidade passa-se agrave vivecircncia de uma pluralidade

radical da descontinuidade e da fragmentaccedilatildeo Daiacute que tambeacutem se fale do fim dos

paradigmas e das utopias8 e de que o caos eacute uma das principais formas nas quais a sociedade

e dentro dela particularmente os empobrecidos experimentam o panorama social e espiritual

de hoje9

6 httpwwwplanaltogovbrccivil_03ConstituicaoConstituicaohtm 7 Os termos ldquopoacutes-modernismordquo eou ldquopoacutes-modernidaderdquo foram primeiramente utilizados na segunda metade do seacuteculo XX para se referir agraves mudanccedilas acontecidas na literatura na arquitetura e na arte Poreacutem tambeacutem se chama ldquopoacutes-modernismordquo eou ldquopoacutes-modernidaderdquo agraves novas visotildees do pensamento filosoacutefico particularmente da segunda metade do seacuteculo XX onde o pluralismo torna-se princiacutepio hermenecircutico fundamental Assim a verdade existe unicamente laquopluralraquo jaacute natildeo existe laquoa verdaderaquo mas laquoas verdadesraquo Confiera Joaquiacuten Garay ldquoTeologiacutea del pluralismo religioso y teologiacutea de la liberacioacutenrdquo em (Koinonia Relat) 310 httplatinoamericanaorg2003textos 8 Franz J Hinkelammert ldquoEl cautiverio de la utopiacutea ndash las utopiacuteas conservadoras del capitalismo actual el neoliberalismo y el espacio para alternativasrdquo em Ensayos (La Habana Editorial Caminos 1999) 200 9 Harvey Cox ldquoMisioacuten en las Ameacutericas ndash Siglo XXI ndash Perspectiva del Norterdquo em Esperanza y justicia en las Ameacutericas ndash discerniendo la misioacuten de Dios (sl se 1998)96

Isto se faz uma realidade no meio de um processo planetaacuterio que se identifica com o termo de

laquoglobalizaccedilatildeoraquo Natildeo eacute nosso objetivo principal refletir sobre os aspectos positivos e negativos

da globalizaccedilatildeo poreacutem eacute uma realidade que a globalizaccedilatildeo marca os tempos de hoje Eacute um

fenocircmeno que penetra tudo e integra tudo e cujos efeitos se fazem presente em toda a

sociedade a niacutevel mundial na poliacutetica na economia nas comunicaccedilotildees na tecnologia nos

Estados nas naccedilotildees afetando ateacute as instituiccedilotildees e sistemas religiosos

No entanto anota Joseacute Mariacutea Vigil10 que o termo laquoglobalizaccedilatildeoraquo eacute um termo errado E ainda

que muitos o utilizem no sentido de laquomundializaccedilatildeoraquo seria melhor lembrar seu sentido

original o qual natildeo eacute mais que o nome que o neoliberalismo atual deu a seu proacuteprio processo

de expansatildeo de capitais depois do fim da guerra fria A laquomundializaccedilatildeoraquo segundo ele por

sua vez eacute um fenocircmeno muito mais amplo e antigo que se refere ao processo de unificaccedilatildeo e

concentraccedilatildeo do mundo em sistemas sociais cada vez mais amplos aproximando-se cada vez

mais agraves dimensotildees mesmas do planeta Mas processo que se intensificou nos uacuteltimos seacuteculos

e que particularmente no seacuteculo XX tem alcanccedilado a totalidade de nosso planeta Hoje

temos a impressatildeo de estar vivendo no apenas no mesmo planeta mas realmente laquoem um

mesmo mundoraquo ou como tambeacutem tem se falado laquoem uma aldeia comumraquo em uma

sociedade mundial mundializada11

Assumindo nesta reflexatildeo as colocaccedilotildees de Vigil caberia agora nos perguntarmos quais

efeitos tem a laquomundializaccedilatildeoraquo sobre a religiatildeo as religiotildees e a teologia

Por um lado a mundializaccedilatildeo faz que as religiotildees natildeo possam mais se ignorar Muitas

sociedades satildeo pluriculturais formadas por imigrantes procedentes de outros paiacuteses bairros

habitados por diferentes etnias e culturas As diferentes religiotildees jaacute natildeo se encontram longe

mas na mesma sociedade e ateacute na mesma cidade Em uma mesma quadra podemos encontrar

uma igreja catoacutelica romana uma igreja evangeacutelica e ateacute um terreiro de candombleacute Dessa

maneira querendo o natildeo querendo as diferentes religiotildees satildeo obrigadas a viver em sociedade

a conviver a comparar-se a confrontar-se e a desafiar-se mutuamente Deste modo os

membros das diferentes religiotildees vatildeo se dando conta que sua religiatildeo natildeo eacute a uacutenica que

existe E aiacute comeccedilam a conhecer e conviver com pessoas de outras religiotildees (vizinhosas

amigosas ateacute membros da proacutepria famiacutelia) tatildeo cheias de amor como os membros de sua

proacutepria religiatildeo E comeccedilam a se perguntarem se sua religiatildeo realmente eacute a laquouacutenica e

verdadeiraraquo Por isso a mundializaccedilatildeo desafia as religiotildees talvez colocando em perigo sua

identidade distintiva mas por sua vez oferecendo novas possibilidades de fecundaccedilatildeo e

revitalizaccedilatildeo Fala-se que a inter-espiritualidade eacute a religiatildeo do terceiro milecircnio12

Por outro lado a mundializaccedilatildeo traacutes tambeacutem desafios para a tarefa teoloacutegica Comenta Joseacute

Maria Vigil que na eacutepoca da mundializaccedilatildeo o teoacutelogo poderaacute ter uma confissatildeo religiosa

determinada mas uma teologia que fale para a sociedade e ao mundo deveraacute ser uma teologia

que possa ter sentido para um destinataacuterio que eacute multireligioso porque em caso contrario natildeo

10 Joseacute Mariacutea Vigil espanholnicaraguumlense catoacutelico teoacutelogo (SalamancaRoma) estudou psicologia em Salamanca Madrid e ManaguaNicaragua Coordenador da Comissatildeo Teoloacutegica Americana da Associaccedilatildeo de Teoacutelogosas do Terceiro Mundo (ASETTEATWOT) 11 Vigil 358-359 12 Ibid 365 O termo laquoInter-espiritualidaderaquo eacute um termo que designa o fenocircmeno crescente do compartilhar inter-religioso dos recursos interiores dos tesouros de cada tradiccedilatildeo Wayne Teasdale The Mystic Heart Discovering a Universal Spirituality in the Worldrsquos Religions proacutelogo do Dalai Lama (Novato California New World Library 1999) 10 Citado por Vigil 365

estaria realmente fazendo teologia no mundo plurirreligioso de hoje mas em um mundo

monoreligioso que jaacute natildeo existe13

Entretanto em um mundo onde a globalizaccedilatildeo neoliberal perpetua o empobrecimento das

grandes maiorias matizado por guerras violecircncia e divisotildees culturais onde se desrespeita e

agride nosso lar natural e onde inclusive a luta contra o terrorismo tem no fundo matizes

religiosos a mundializaccedilatildeo desafia a todas as religiotildees a lutarem juntas por alcanccedilar uma

eacutetica mundial

Afirma a laquoDeclaraccedilatildeo sobre o papel da religiatildeo na promoccedilatildeo de uma cultura de pazraquo

(Catalunha Espanha 1994) ldquoNossas comunidades tecircm a responsabilidade de fomentar uma

conduta inspirada na sabedoria a compaixatildeo a partilha a caridade a solidariedade e o

amor que guie a todos pelos caminhos da liberdade e a responsabilidade As religiotildees devem

ser uma fonte de energia liberadorardquo14

Portanto em nosso mundo mundializado de hoje o diaacutelogo inter-religioso se torna urgente

natildeo apenas para teorizar teologicamente senatildeo para possibilitar a paz a justiccedila e a

fraternidade humana contribuindo assim a dar uma resposta comum na soluccedilatildeo dos grandes e

graves problemas que enfrenta a humanidade

Fundamentos biacuteblicos e teoloacutegicos para uma teologia do pluralismo religioso

O conceito fundamental que sustenta uma visatildeo conservadora fundamentalista eou

exclusivista do cristianismo eacute o conceito de laquorevelaccedilatildeoraquo Uma pessoa que assim pensa e

manteacutem uma postura contraria ao pluralismo invocaraacute a Biacuteblia e a revelaccedilatildeo como sua razatildeo

uacuteltima laquoeacute Deus mesmo quem nos revelou a verdade e noacutes devemos aceitaacute-laraquo Mas a teologia

do pluralismo religioso propotildee uma visatildeo diferente da revelaccedilatildeo Por isso eacute a revisatildeo e

transformaccedilatildeo do conceito de revelaccedilatildeo o que estaacute na base da emergecircncia do pluralismo

como superaccedilatildeo tanto do laquoexclusivismoraquo como do laquo inclusivismoraquo

Poreacutem conveacutem agora realizar algumas clarificaccedilotildees do que se entende por exclusivismo e

inclusivismo Mas ofereceremos apenas os conceitos mais comuns e aceitos dentro da

teologia das religiotildees

Ateacute a primeira metade do seacuteculo XX a posiccedilatildeo teoloacutegica dominante dentro do cristianismo

tem sido o laquoexclusivismoraquo E a expressatildeo simboacutelica desta posiccedilatildeo encontra-se na famosa

sentenccedila atribuiacuteda por uns a Oriacutegenes e por outros a Cipriano laquoextra ecclesiam nulla salusraquo

ou seja laquofora da igreja natildeo haacute salvaccedilatildeoraquo Essa posiccedilatildeo manteve-se constante dentro do

catolicismo praticamente ateacute a primeira metade do seacuteculo XX

Entretanto o exclusivismo pode ser eclesiocecircntrico ou natildeo Assim vemos que no campo

protestante o exclusivismo adquire uma forma no eclesiocecircntrica laquoa sola Feacute a sola Graccedila a

sola Escrituraraquo A figura tiacutepica e simboacutelica desta posiccedilatildeo a encontramos em Karl Barth

(1886-1968) Barth apesar de natildeo ser um fundamentalista protestante opotildee revelaccedilatildeo e

religiatildeo negando que a religiatildeo pudesse ser canal de revelaccedilatildeo Segundo Barth a religiatildeo eacute a

relaccedilatildeo que as pessoas instauram com o poder divino por suas proacuteprias forccedilas ou seja um

intento de manipular a Deus enquanto a feacute eacute a relaccedilatildeo que Deus instaura gratuitamente Daiacute

13 Ibid 366 14 Citado por Vigil 368-369

acrescenta Barth a religiatildeo eacute obra humana sendo nossa tarefa a supressatildeo de toda religiatildeo

nossa feacute eacute a invalidaccedilatildeo radical de tudo o que eacute humano experiecircncia saber posse e

atividade Fora do cristianismo que eacute a religiatildeo perfeita e verdadeira conclui Barth tudo eacute

trevas e afastamento de Deus15

Entretanto o laquoinclusivismoraquo afirma que ainda que a salvaccedilatildeo encontra-se presente de

maneira particular no cristianismo tambeacutem pode ser encontrada de maneira laquodeficiente e

imperfeitaraquo nas outras religiotildees E esta posiccedilatildeo seraacute a que vai se afirmar no mundo teoloacutegico

particularmente dentro da Igreja Catoacutelica Romana e influiraacute os debates e documentos do

Concilio Vaticano II No entanto fazemos a ressalva que no presente esta eacute a posiccedilatildeo

teoloacutegica majoritaacuteria no cristianismo tanto catoacutelico como protestante (cf Hans Kuumlng

Wolfhart Pannenberg Mark S Heim Gregory Baum Monika Hellwig Edward

Schillebeeckx Harvey Cox Roger Haight Marcus Borg entre outros)

Podemos assinalar o catoacutelico Karl Rahner (1904-1984) como uma figura tiacutepica desta posiccedilatildeo

A visatildeo de Rahner em sua teologia das religiotildees se resume em sua teoria de laquocristatildeos

anocircnimosraquo ou seja os natildeo cristatildeos satildeo salvos pela graccedila e presenccedila de Cristo que age

anonimamente entre suas religiotildees Deste modo com uma visatildeo inclusivistacristocecircntrica

postulou que as diversas religiotildees natildeo somente apresentam elementos de uma crenccedila natural

em Deus mas trazem consigo traccedilos substanciais da graccedila doada a Deus ao homem em Jesus

Cristo e que portanto os cristatildeos natildeo apenas podem mas devem considerar outras religiotildees

como legitimas e como caminhos de salvaccedilatildeo16

Passo na sequecircncia a oferecer uma siacutentese dos elementos principais biacuteblicos e teoloacutegicos

dessa nova visatildeo que possibilita as transformaccedilotildees teoloacutegicas que levam a uma mudanccedila de

mentalidade a partir do inclusivismo para o pluralismo

Por um lado Paul Knitter17 afirma que eacute idolatria insistir que haacute apenas um caminho uma

norma uma verdade Nenhuma religiatildeo ou revelaccedilatildeo pode ser somente ou a Palavra de Deus

final ou exclusiva ou inclusiva A realidade eacute plural desde aacutetomos ateacute religiotildees e Deus

precisa de multiplicidade para ser Deus E por outro lado afirma tambeacutem o teoacutelogo indiano

Panikkar que porque a realidade eacute pluralista o misteacuterio da Trindade eacute o fundamento uacuteltimo

para o pluralismo18

Na carta aos Hebreus se diz ldquoHavendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas

maneiras aos pais pelos profetas a noacutes falou-nos nestes uacuteltimos dias pelo Filhordquo (Hb 11) E

comentando esse texto diz Jacques Dupuis19 que o fato de Deus ter falado ldquomuitas vezes e de

15 Karl Barth La revelacioacuten como abolicioacuten de la religioacuten (Madrid 1973) citado por Vigil 62-63 Confira tambeacutem Karl Barth Der Roumlmerbrief 84 citado por Marcelo Barros ldquoA reconciliaccedilatildeo de quem nunca se separourdquo em Pelos muitos caminhos de Deus ndash Desafios do pluralismo religioso agrave Teologia da Libertaccedilatildeo (Goiaacutes Editora Rede 2003) 140 16 Veja Paul F Knitter Jesus e os Outros Nomes (Satildeo Bernardo do CampoBrasil Nhanduti Editora 2010) 24-26 e Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 73-74 17 Paul F Kniter catoacutelico eacute um dos principais teoacutelogos do pluralismo religioso Eacute licenciado em teologia pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana de Roma Itaacutelia (1966) e doutor em teologia pela Universidade de Marburgo Alemanha (1972) Atualmente eacute professor de Teologia Religiotildees do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary em Nova Iorque 18 Veja Knitter 58-60 19 Jacques Dupuis sacerdote belga jesuiacuteta foi professor de Teologia e Religiotildees natildeo Cristatildes na Universidade Gregoriana em Roma Morreu em 2004

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

Isto se faz uma realidade no meio de um processo planetaacuterio que se identifica com o termo de

laquoglobalizaccedilatildeoraquo Natildeo eacute nosso objetivo principal refletir sobre os aspectos positivos e negativos

da globalizaccedilatildeo poreacutem eacute uma realidade que a globalizaccedilatildeo marca os tempos de hoje Eacute um

fenocircmeno que penetra tudo e integra tudo e cujos efeitos se fazem presente em toda a

sociedade a niacutevel mundial na poliacutetica na economia nas comunicaccedilotildees na tecnologia nos

Estados nas naccedilotildees afetando ateacute as instituiccedilotildees e sistemas religiosos

No entanto anota Joseacute Mariacutea Vigil10 que o termo laquoglobalizaccedilatildeoraquo eacute um termo errado E ainda

que muitos o utilizem no sentido de laquomundializaccedilatildeoraquo seria melhor lembrar seu sentido

original o qual natildeo eacute mais que o nome que o neoliberalismo atual deu a seu proacuteprio processo

de expansatildeo de capitais depois do fim da guerra fria A laquomundializaccedilatildeoraquo segundo ele por

sua vez eacute um fenocircmeno muito mais amplo e antigo que se refere ao processo de unificaccedilatildeo e

concentraccedilatildeo do mundo em sistemas sociais cada vez mais amplos aproximando-se cada vez

mais agraves dimensotildees mesmas do planeta Mas processo que se intensificou nos uacuteltimos seacuteculos

e que particularmente no seacuteculo XX tem alcanccedilado a totalidade de nosso planeta Hoje

temos a impressatildeo de estar vivendo no apenas no mesmo planeta mas realmente laquoem um

mesmo mundoraquo ou como tambeacutem tem se falado laquoem uma aldeia comumraquo em uma

sociedade mundial mundializada11

Assumindo nesta reflexatildeo as colocaccedilotildees de Vigil caberia agora nos perguntarmos quais

efeitos tem a laquomundializaccedilatildeoraquo sobre a religiatildeo as religiotildees e a teologia

Por um lado a mundializaccedilatildeo faz que as religiotildees natildeo possam mais se ignorar Muitas

sociedades satildeo pluriculturais formadas por imigrantes procedentes de outros paiacuteses bairros

habitados por diferentes etnias e culturas As diferentes religiotildees jaacute natildeo se encontram longe

mas na mesma sociedade e ateacute na mesma cidade Em uma mesma quadra podemos encontrar

uma igreja catoacutelica romana uma igreja evangeacutelica e ateacute um terreiro de candombleacute Dessa

maneira querendo o natildeo querendo as diferentes religiotildees satildeo obrigadas a viver em sociedade

a conviver a comparar-se a confrontar-se e a desafiar-se mutuamente Deste modo os

membros das diferentes religiotildees vatildeo se dando conta que sua religiatildeo natildeo eacute a uacutenica que

existe E aiacute comeccedilam a conhecer e conviver com pessoas de outras religiotildees (vizinhosas

amigosas ateacute membros da proacutepria famiacutelia) tatildeo cheias de amor como os membros de sua

proacutepria religiatildeo E comeccedilam a se perguntarem se sua religiatildeo realmente eacute a laquouacutenica e

verdadeiraraquo Por isso a mundializaccedilatildeo desafia as religiotildees talvez colocando em perigo sua

identidade distintiva mas por sua vez oferecendo novas possibilidades de fecundaccedilatildeo e

revitalizaccedilatildeo Fala-se que a inter-espiritualidade eacute a religiatildeo do terceiro milecircnio12

Por outro lado a mundializaccedilatildeo traacutes tambeacutem desafios para a tarefa teoloacutegica Comenta Joseacute

Maria Vigil que na eacutepoca da mundializaccedilatildeo o teoacutelogo poderaacute ter uma confissatildeo religiosa

determinada mas uma teologia que fale para a sociedade e ao mundo deveraacute ser uma teologia

que possa ter sentido para um destinataacuterio que eacute multireligioso porque em caso contrario natildeo

10 Joseacute Mariacutea Vigil espanholnicaraguumlense catoacutelico teoacutelogo (SalamancaRoma) estudou psicologia em Salamanca Madrid e ManaguaNicaragua Coordenador da Comissatildeo Teoloacutegica Americana da Associaccedilatildeo de Teoacutelogosas do Terceiro Mundo (ASETTEATWOT) 11 Vigil 358-359 12 Ibid 365 O termo laquoInter-espiritualidaderaquo eacute um termo que designa o fenocircmeno crescente do compartilhar inter-religioso dos recursos interiores dos tesouros de cada tradiccedilatildeo Wayne Teasdale The Mystic Heart Discovering a Universal Spirituality in the Worldrsquos Religions proacutelogo do Dalai Lama (Novato California New World Library 1999) 10 Citado por Vigil 365

estaria realmente fazendo teologia no mundo plurirreligioso de hoje mas em um mundo

monoreligioso que jaacute natildeo existe13

Entretanto em um mundo onde a globalizaccedilatildeo neoliberal perpetua o empobrecimento das

grandes maiorias matizado por guerras violecircncia e divisotildees culturais onde se desrespeita e

agride nosso lar natural e onde inclusive a luta contra o terrorismo tem no fundo matizes

religiosos a mundializaccedilatildeo desafia a todas as religiotildees a lutarem juntas por alcanccedilar uma

eacutetica mundial

Afirma a laquoDeclaraccedilatildeo sobre o papel da religiatildeo na promoccedilatildeo de uma cultura de pazraquo

(Catalunha Espanha 1994) ldquoNossas comunidades tecircm a responsabilidade de fomentar uma

conduta inspirada na sabedoria a compaixatildeo a partilha a caridade a solidariedade e o

amor que guie a todos pelos caminhos da liberdade e a responsabilidade As religiotildees devem

ser uma fonte de energia liberadorardquo14

Portanto em nosso mundo mundializado de hoje o diaacutelogo inter-religioso se torna urgente

natildeo apenas para teorizar teologicamente senatildeo para possibilitar a paz a justiccedila e a

fraternidade humana contribuindo assim a dar uma resposta comum na soluccedilatildeo dos grandes e

graves problemas que enfrenta a humanidade

Fundamentos biacuteblicos e teoloacutegicos para uma teologia do pluralismo religioso

O conceito fundamental que sustenta uma visatildeo conservadora fundamentalista eou

exclusivista do cristianismo eacute o conceito de laquorevelaccedilatildeoraquo Uma pessoa que assim pensa e

manteacutem uma postura contraria ao pluralismo invocaraacute a Biacuteblia e a revelaccedilatildeo como sua razatildeo

uacuteltima laquoeacute Deus mesmo quem nos revelou a verdade e noacutes devemos aceitaacute-laraquo Mas a teologia

do pluralismo religioso propotildee uma visatildeo diferente da revelaccedilatildeo Por isso eacute a revisatildeo e

transformaccedilatildeo do conceito de revelaccedilatildeo o que estaacute na base da emergecircncia do pluralismo

como superaccedilatildeo tanto do laquoexclusivismoraquo como do laquo inclusivismoraquo

Poreacutem conveacutem agora realizar algumas clarificaccedilotildees do que se entende por exclusivismo e

inclusivismo Mas ofereceremos apenas os conceitos mais comuns e aceitos dentro da

teologia das religiotildees

Ateacute a primeira metade do seacuteculo XX a posiccedilatildeo teoloacutegica dominante dentro do cristianismo

tem sido o laquoexclusivismoraquo E a expressatildeo simboacutelica desta posiccedilatildeo encontra-se na famosa

sentenccedila atribuiacuteda por uns a Oriacutegenes e por outros a Cipriano laquoextra ecclesiam nulla salusraquo

ou seja laquofora da igreja natildeo haacute salvaccedilatildeoraquo Essa posiccedilatildeo manteve-se constante dentro do

catolicismo praticamente ateacute a primeira metade do seacuteculo XX

Entretanto o exclusivismo pode ser eclesiocecircntrico ou natildeo Assim vemos que no campo

protestante o exclusivismo adquire uma forma no eclesiocecircntrica laquoa sola Feacute a sola Graccedila a

sola Escrituraraquo A figura tiacutepica e simboacutelica desta posiccedilatildeo a encontramos em Karl Barth

(1886-1968) Barth apesar de natildeo ser um fundamentalista protestante opotildee revelaccedilatildeo e

religiatildeo negando que a religiatildeo pudesse ser canal de revelaccedilatildeo Segundo Barth a religiatildeo eacute a

relaccedilatildeo que as pessoas instauram com o poder divino por suas proacuteprias forccedilas ou seja um

intento de manipular a Deus enquanto a feacute eacute a relaccedilatildeo que Deus instaura gratuitamente Daiacute

13 Ibid 366 14 Citado por Vigil 368-369

acrescenta Barth a religiatildeo eacute obra humana sendo nossa tarefa a supressatildeo de toda religiatildeo

nossa feacute eacute a invalidaccedilatildeo radical de tudo o que eacute humano experiecircncia saber posse e

atividade Fora do cristianismo que eacute a religiatildeo perfeita e verdadeira conclui Barth tudo eacute

trevas e afastamento de Deus15

Entretanto o laquoinclusivismoraquo afirma que ainda que a salvaccedilatildeo encontra-se presente de

maneira particular no cristianismo tambeacutem pode ser encontrada de maneira laquodeficiente e

imperfeitaraquo nas outras religiotildees E esta posiccedilatildeo seraacute a que vai se afirmar no mundo teoloacutegico

particularmente dentro da Igreja Catoacutelica Romana e influiraacute os debates e documentos do

Concilio Vaticano II No entanto fazemos a ressalva que no presente esta eacute a posiccedilatildeo

teoloacutegica majoritaacuteria no cristianismo tanto catoacutelico como protestante (cf Hans Kuumlng

Wolfhart Pannenberg Mark S Heim Gregory Baum Monika Hellwig Edward

Schillebeeckx Harvey Cox Roger Haight Marcus Borg entre outros)

Podemos assinalar o catoacutelico Karl Rahner (1904-1984) como uma figura tiacutepica desta posiccedilatildeo

A visatildeo de Rahner em sua teologia das religiotildees se resume em sua teoria de laquocristatildeos

anocircnimosraquo ou seja os natildeo cristatildeos satildeo salvos pela graccedila e presenccedila de Cristo que age

anonimamente entre suas religiotildees Deste modo com uma visatildeo inclusivistacristocecircntrica

postulou que as diversas religiotildees natildeo somente apresentam elementos de uma crenccedila natural

em Deus mas trazem consigo traccedilos substanciais da graccedila doada a Deus ao homem em Jesus

Cristo e que portanto os cristatildeos natildeo apenas podem mas devem considerar outras religiotildees

como legitimas e como caminhos de salvaccedilatildeo16

Passo na sequecircncia a oferecer uma siacutentese dos elementos principais biacuteblicos e teoloacutegicos

dessa nova visatildeo que possibilita as transformaccedilotildees teoloacutegicas que levam a uma mudanccedila de

mentalidade a partir do inclusivismo para o pluralismo

Por um lado Paul Knitter17 afirma que eacute idolatria insistir que haacute apenas um caminho uma

norma uma verdade Nenhuma religiatildeo ou revelaccedilatildeo pode ser somente ou a Palavra de Deus

final ou exclusiva ou inclusiva A realidade eacute plural desde aacutetomos ateacute religiotildees e Deus

precisa de multiplicidade para ser Deus E por outro lado afirma tambeacutem o teoacutelogo indiano

Panikkar que porque a realidade eacute pluralista o misteacuterio da Trindade eacute o fundamento uacuteltimo

para o pluralismo18

Na carta aos Hebreus se diz ldquoHavendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas

maneiras aos pais pelos profetas a noacutes falou-nos nestes uacuteltimos dias pelo Filhordquo (Hb 11) E

comentando esse texto diz Jacques Dupuis19 que o fato de Deus ter falado ldquomuitas vezes e de

15 Karl Barth La revelacioacuten como abolicioacuten de la religioacuten (Madrid 1973) citado por Vigil 62-63 Confira tambeacutem Karl Barth Der Roumlmerbrief 84 citado por Marcelo Barros ldquoA reconciliaccedilatildeo de quem nunca se separourdquo em Pelos muitos caminhos de Deus ndash Desafios do pluralismo religioso agrave Teologia da Libertaccedilatildeo (Goiaacutes Editora Rede 2003) 140 16 Veja Paul F Knitter Jesus e os Outros Nomes (Satildeo Bernardo do CampoBrasil Nhanduti Editora 2010) 24-26 e Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 73-74 17 Paul F Kniter catoacutelico eacute um dos principais teoacutelogos do pluralismo religioso Eacute licenciado em teologia pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana de Roma Itaacutelia (1966) e doutor em teologia pela Universidade de Marburgo Alemanha (1972) Atualmente eacute professor de Teologia Religiotildees do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary em Nova Iorque 18 Veja Knitter 58-60 19 Jacques Dupuis sacerdote belga jesuiacuteta foi professor de Teologia e Religiotildees natildeo Cristatildes na Universidade Gregoriana em Roma Morreu em 2004

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

estaria realmente fazendo teologia no mundo plurirreligioso de hoje mas em um mundo

monoreligioso que jaacute natildeo existe13

Entretanto em um mundo onde a globalizaccedilatildeo neoliberal perpetua o empobrecimento das

grandes maiorias matizado por guerras violecircncia e divisotildees culturais onde se desrespeita e

agride nosso lar natural e onde inclusive a luta contra o terrorismo tem no fundo matizes

religiosos a mundializaccedilatildeo desafia a todas as religiotildees a lutarem juntas por alcanccedilar uma

eacutetica mundial

Afirma a laquoDeclaraccedilatildeo sobre o papel da religiatildeo na promoccedilatildeo de uma cultura de pazraquo

(Catalunha Espanha 1994) ldquoNossas comunidades tecircm a responsabilidade de fomentar uma

conduta inspirada na sabedoria a compaixatildeo a partilha a caridade a solidariedade e o

amor que guie a todos pelos caminhos da liberdade e a responsabilidade As religiotildees devem

ser uma fonte de energia liberadorardquo14

Portanto em nosso mundo mundializado de hoje o diaacutelogo inter-religioso se torna urgente

natildeo apenas para teorizar teologicamente senatildeo para possibilitar a paz a justiccedila e a

fraternidade humana contribuindo assim a dar uma resposta comum na soluccedilatildeo dos grandes e

graves problemas que enfrenta a humanidade

Fundamentos biacuteblicos e teoloacutegicos para uma teologia do pluralismo religioso

O conceito fundamental que sustenta uma visatildeo conservadora fundamentalista eou

exclusivista do cristianismo eacute o conceito de laquorevelaccedilatildeoraquo Uma pessoa que assim pensa e

manteacutem uma postura contraria ao pluralismo invocaraacute a Biacuteblia e a revelaccedilatildeo como sua razatildeo

uacuteltima laquoeacute Deus mesmo quem nos revelou a verdade e noacutes devemos aceitaacute-laraquo Mas a teologia

do pluralismo religioso propotildee uma visatildeo diferente da revelaccedilatildeo Por isso eacute a revisatildeo e

transformaccedilatildeo do conceito de revelaccedilatildeo o que estaacute na base da emergecircncia do pluralismo

como superaccedilatildeo tanto do laquoexclusivismoraquo como do laquo inclusivismoraquo

Poreacutem conveacutem agora realizar algumas clarificaccedilotildees do que se entende por exclusivismo e

inclusivismo Mas ofereceremos apenas os conceitos mais comuns e aceitos dentro da

teologia das religiotildees

Ateacute a primeira metade do seacuteculo XX a posiccedilatildeo teoloacutegica dominante dentro do cristianismo

tem sido o laquoexclusivismoraquo E a expressatildeo simboacutelica desta posiccedilatildeo encontra-se na famosa

sentenccedila atribuiacuteda por uns a Oriacutegenes e por outros a Cipriano laquoextra ecclesiam nulla salusraquo

ou seja laquofora da igreja natildeo haacute salvaccedilatildeoraquo Essa posiccedilatildeo manteve-se constante dentro do

catolicismo praticamente ateacute a primeira metade do seacuteculo XX

Entretanto o exclusivismo pode ser eclesiocecircntrico ou natildeo Assim vemos que no campo

protestante o exclusivismo adquire uma forma no eclesiocecircntrica laquoa sola Feacute a sola Graccedila a

sola Escrituraraquo A figura tiacutepica e simboacutelica desta posiccedilatildeo a encontramos em Karl Barth

(1886-1968) Barth apesar de natildeo ser um fundamentalista protestante opotildee revelaccedilatildeo e

religiatildeo negando que a religiatildeo pudesse ser canal de revelaccedilatildeo Segundo Barth a religiatildeo eacute a

relaccedilatildeo que as pessoas instauram com o poder divino por suas proacuteprias forccedilas ou seja um

intento de manipular a Deus enquanto a feacute eacute a relaccedilatildeo que Deus instaura gratuitamente Daiacute

13 Ibid 366 14 Citado por Vigil 368-369

acrescenta Barth a religiatildeo eacute obra humana sendo nossa tarefa a supressatildeo de toda religiatildeo

nossa feacute eacute a invalidaccedilatildeo radical de tudo o que eacute humano experiecircncia saber posse e

atividade Fora do cristianismo que eacute a religiatildeo perfeita e verdadeira conclui Barth tudo eacute

trevas e afastamento de Deus15

Entretanto o laquoinclusivismoraquo afirma que ainda que a salvaccedilatildeo encontra-se presente de

maneira particular no cristianismo tambeacutem pode ser encontrada de maneira laquodeficiente e

imperfeitaraquo nas outras religiotildees E esta posiccedilatildeo seraacute a que vai se afirmar no mundo teoloacutegico

particularmente dentro da Igreja Catoacutelica Romana e influiraacute os debates e documentos do

Concilio Vaticano II No entanto fazemos a ressalva que no presente esta eacute a posiccedilatildeo

teoloacutegica majoritaacuteria no cristianismo tanto catoacutelico como protestante (cf Hans Kuumlng

Wolfhart Pannenberg Mark S Heim Gregory Baum Monika Hellwig Edward

Schillebeeckx Harvey Cox Roger Haight Marcus Borg entre outros)

Podemos assinalar o catoacutelico Karl Rahner (1904-1984) como uma figura tiacutepica desta posiccedilatildeo

A visatildeo de Rahner em sua teologia das religiotildees se resume em sua teoria de laquocristatildeos

anocircnimosraquo ou seja os natildeo cristatildeos satildeo salvos pela graccedila e presenccedila de Cristo que age

anonimamente entre suas religiotildees Deste modo com uma visatildeo inclusivistacristocecircntrica

postulou que as diversas religiotildees natildeo somente apresentam elementos de uma crenccedila natural

em Deus mas trazem consigo traccedilos substanciais da graccedila doada a Deus ao homem em Jesus

Cristo e que portanto os cristatildeos natildeo apenas podem mas devem considerar outras religiotildees

como legitimas e como caminhos de salvaccedilatildeo16

Passo na sequecircncia a oferecer uma siacutentese dos elementos principais biacuteblicos e teoloacutegicos

dessa nova visatildeo que possibilita as transformaccedilotildees teoloacutegicas que levam a uma mudanccedila de

mentalidade a partir do inclusivismo para o pluralismo

Por um lado Paul Knitter17 afirma que eacute idolatria insistir que haacute apenas um caminho uma

norma uma verdade Nenhuma religiatildeo ou revelaccedilatildeo pode ser somente ou a Palavra de Deus

final ou exclusiva ou inclusiva A realidade eacute plural desde aacutetomos ateacute religiotildees e Deus

precisa de multiplicidade para ser Deus E por outro lado afirma tambeacutem o teoacutelogo indiano

Panikkar que porque a realidade eacute pluralista o misteacuterio da Trindade eacute o fundamento uacuteltimo

para o pluralismo18

Na carta aos Hebreus se diz ldquoHavendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas

maneiras aos pais pelos profetas a noacutes falou-nos nestes uacuteltimos dias pelo Filhordquo (Hb 11) E

comentando esse texto diz Jacques Dupuis19 que o fato de Deus ter falado ldquomuitas vezes e de

15 Karl Barth La revelacioacuten como abolicioacuten de la religioacuten (Madrid 1973) citado por Vigil 62-63 Confira tambeacutem Karl Barth Der Roumlmerbrief 84 citado por Marcelo Barros ldquoA reconciliaccedilatildeo de quem nunca se separourdquo em Pelos muitos caminhos de Deus ndash Desafios do pluralismo religioso agrave Teologia da Libertaccedilatildeo (Goiaacutes Editora Rede 2003) 140 16 Veja Paul F Knitter Jesus e os Outros Nomes (Satildeo Bernardo do CampoBrasil Nhanduti Editora 2010) 24-26 e Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 73-74 17 Paul F Kniter catoacutelico eacute um dos principais teoacutelogos do pluralismo religioso Eacute licenciado em teologia pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana de Roma Itaacutelia (1966) e doutor em teologia pela Universidade de Marburgo Alemanha (1972) Atualmente eacute professor de Teologia Religiotildees do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary em Nova Iorque 18 Veja Knitter 58-60 19 Jacques Dupuis sacerdote belga jesuiacuteta foi professor de Teologia e Religiotildees natildeo Cristatildes na Universidade Gregoriana em Roma Morreu em 2004

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

acrescenta Barth a religiatildeo eacute obra humana sendo nossa tarefa a supressatildeo de toda religiatildeo

nossa feacute eacute a invalidaccedilatildeo radical de tudo o que eacute humano experiecircncia saber posse e

atividade Fora do cristianismo que eacute a religiatildeo perfeita e verdadeira conclui Barth tudo eacute

trevas e afastamento de Deus15

Entretanto o laquoinclusivismoraquo afirma que ainda que a salvaccedilatildeo encontra-se presente de

maneira particular no cristianismo tambeacutem pode ser encontrada de maneira laquodeficiente e

imperfeitaraquo nas outras religiotildees E esta posiccedilatildeo seraacute a que vai se afirmar no mundo teoloacutegico

particularmente dentro da Igreja Catoacutelica Romana e influiraacute os debates e documentos do

Concilio Vaticano II No entanto fazemos a ressalva que no presente esta eacute a posiccedilatildeo

teoloacutegica majoritaacuteria no cristianismo tanto catoacutelico como protestante (cf Hans Kuumlng

Wolfhart Pannenberg Mark S Heim Gregory Baum Monika Hellwig Edward

Schillebeeckx Harvey Cox Roger Haight Marcus Borg entre outros)

Podemos assinalar o catoacutelico Karl Rahner (1904-1984) como uma figura tiacutepica desta posiccedilatildeo

A visatildeo de Rahner em sua teologia das religiotildees se resume em sua teoria de laquocristatildeos

anocircnimosraquo ou seja os natildeo cristatildeos satildeo salvos pela graccedila e presenccedila de Cristo que age

anonimamente entre suas religiotildees Deste modo com uma visatildeo inclusivistacristocecircntrica

postulou que as diversas religiotildees natildeo somente apresentam elementos de uma crenccedila natural

em Deus mas trazem consigo traccedilos substanciais da graccedila doada a Deus ao homem em Jesus

Cristo e que portanto os cristatildeos natildeo apenas podem mas devem considerar outras religiotildees

como legitimas e como caminhos de salvaccedilatildeo16

Passo na sequecircncia a oferecer uma siacutentese dos elementos principais biacuteblicos e teoloacutegicos

dessa nova visatildeo que possibilita as transformaccedilotildees teoloacutegicas que levam a uma mudanccedila de

mentalidade a partir do inclusivismo para o pluralismo

Por um lado Paul Knitter17 afirma que eacute idolatria insistir que haacute apenas um caminho uma

norma uma verdade Nenhuma religiatildeo ou revelaccedilatildeo pode ser somente ou a Palavra de Deus

final ou exclusiva ou inclusiva A realidade eacute plural desde aacutetomos ateacute religiotildees e Deus

precisa de multiplicidade para ser Deus E por outro lado afirma tambeacutem o teoacutelogo indiano

Panikkar que porque a realidade eacute pluralista o misteacuterio da Trindade eacute o fundamento uacuteltimo

para o pluralismo18

Na carta aos Hebreus se diz ldquoHavendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas

maneiras aos pais pelos profetas a noacutes falou-nos nestes uacuteltimos dias pelo Filhordquo (Hb 11) E

comentando esse texto diz Jacques Dupuis19 que o fato de Deus ter falado ldquomuitas vezes e de

15 Karl Barth La revelacioacuten como abolicioacuten de la religioacuten (Madrid 1973) citado por Vigil 62-63 Confira tambeacutem Karl Barth Der Roumlmerbrief 84 citado por Marcelo Barros ldquoA reconciliaccedilatildeo de quem nunca se separourdquo em Pelos muitos caminhos de Deus ndash Desafios do pluralismo religioso agrave Teologia da Libertaccedilatildeo (Goiaacutes Editora Rede 2003) 140 16 Veja Paul F Knitter Jesus e os Outros Nomes (Satildeo Bernardo do CampoBrasil Nhanduti Editora 2010) 24-26 e Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 73-74 17 Paul F Kniter catoacutelico eacute um dos principais teoacutelogos do pluralismo religioso Eacute licenciado em teologia pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana de Roma Itaacutelia (1966) e doutor em teologia pela Universidade de Marburgo Alemanha (1972) Atualmente eacute professor de Teologia Religiotildees do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary em Nova Iorque 18 Veja Knitter 58-60 19 Jacques Dupuis sacerdote belga jesuiacuteta foi professor de Teologia e Religiotildees natildeo Cristatildes na Universidade Gregoriana em Roma Morreu em 2004

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

muitas maneirasrdquo antes de falar pelo Filho natildeo eacute acidental nem o caraacuteter plural da auto-

manifestaccedilatildeo de Deus eacute apenas uma coisa do passado O caraacuteter decisivo da vinda do Filho

na carne em Jesus Cristo natildeo cancela a presenccedila e accedilatildeo universal do Verbo e do Espiacuterito O

pluralismo religioso se funda sobre a imensidade de um Deus que eacute Amor20 Por outro lado

Paulo na Carta aos Gaacutelatas afirma uma visatildeo universalista inclusiva e plural do evangelho

quando diz ldquo natildeo existe diferenccedila entre judeus e natildeo-judeus entre escravos e livres entre

homens e mulheres todos vocecircs satildeo um soacute por estarem unidos com Cristo Jesusrdquo (Gl 328)

Assim sendo o pressuposto biacuteblico baacutesico e fundamental para uma teologia cristatilde do

pluralismo religioso eacute a compreensatildeo de que Deus eacute amor e salvaccedilatildeo universal (Cf 1 Jo 47-

8) E se o amor de Deus eacute ilimitado nosso amor para com o proacuteximo deve ser ilimitado

tambeacutem Por isso o evangelho nos chama a amar a nosso proacuteximo como a noacutes mesmos (Cf

Mt 2337 Mc 1230 e Lc 1027)

Mas amar ao proacuteximo significa respeitaacute-lo escutaacute-lo trataacute-lo como gostariacuteamos que ele nos

trata-se Significa confrontaacute-lo quando penso que estaacute errado mas tambeacutem estar preparado

para ser tambeacutem confrontado por ele Em fim amar ao proacuteximo significa ser capaz de

dialogar com ele

No entanto a partir do amor ilimitado de Deus que nos chama tambeacutem a amar a nosso

proacuteximo como a noacutes mesmos Knitter reflexiona e afirma que haacute uma coisa errada nas visotildees

tradicionais sobre as outras religiotildees Porque se sustentamos como cristatildeos que nossa verdade

eacute uacutenica ou absolutamente final na qual todos os outros devem estar incluiacutedos natildeo estamos

tratando aos outros como nossos irmatildeos e nossas irmatildes E com essa maneira de agir e pensar

entramos em uma contradiccedilatildeo ou tensatildeo entre o primeiro e o segundo mandamento Deste

modo tendo em conta a prioridade da ortopraxia de amar o nosso vizinho e a nossa vizinha

sobre a ortodoxia das teologias tradicionais a teologia do pluralismo religioso propotildee que

para compreender o grande mandamento os modelos tradicionais ndashtanto exclusivos como

inclusivos- devem ser revistos e revisados Porque o amor sem limites de Deus natildeo estaacute

restrito somente a uma religiatildeo ou caminho espiritual21

A partir desses pressupostos a teologia cristatilde do pluralismo religioso se afasta por um lado

da visatildeo exclusivista natildeo eclesiocecircntrica mas centrada na laquosola Feacute a sola Graccedila e a sola

Escrituraraquo de Karl Barth e por outro lado da visatildeo inclusivista dos laquocristatildeos anocircnimosraquo de

Karl Rahner Mas tambeacutem se afasta de outro laquoKarlraquo ou seja de Karl Marx que natildeo

conseguiu entender que a religiatildeo pudesse ser um veiculo de transformaccedilatildeo social22

Milton Schwantes acostuma dizer que ldquoA Biacuteblia natildeo eacute de ningueacutem A Biacuteblia eacute de todosrdquo E a

partir dessa afirmaccedilatildeo postulava uma leitura ecumecircnica da Biacuteblia Esse enfoque evoluiu para

leituras em direccedilatildeo ao pluralismo religioso a partir de descobertas recentes da arqueologia

que questionam conceitos como ldquopovo eleitordquo e ldquoDeus uacutenicordquo conceitos que tem uma origem

tardia Essas descobertas mostraram que na sua origem Israel natildeo era uma naccedilatildeo mas uma

20 Jacques Dupuis ldquoVerso una teologia cristiana del pluralismo religiosordquo (Brescia Queriniana 1997)520 Citado por Vigil 98 21 Knitter 60-62 22 Paul K Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 Capiacutetulo final do libro coordinado por John Hick e Paul Knitter titulado The Myth of Christian Uniqueness Toward a Pluralistic Theology of Religions (Maryknoll New York Orbis Book 1987) 178-200 Capiacutetulo tambeacutem traduzido ao espanhol com autorizaccedilatildeo do editor Maryknoll em Koinonia Reslat 255 wwwservicioskoinoniaorgrelat255htm

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

multidatildeo de cananeus excluiacutedos com costumes diversos e com crenccedilas em uma pluralidade de

divindades como El Astarte Baal Ashera Anat Elohim Javeacute etc

Assim a arqueologia que volta seu olhar para o entorno do ambiente biacuteblico que busca

resgatar o considerado insignificante mundo cananeu do Israel do Norte oculto na Biacuteblia vai

ao encontro agraves minorias e maiorias excluiacutedas da Ameacuterica Latina e Caribe Ela eacute um auxilio

para a hermenecircutica que privilegia a leitura a partir dos povos ameriacutendios e afrodescendentes

quilombolas indiacutegenas campesinos da leitura de gecircnero etc Afinal de conta os pobres e

excluiacutedos continuam presente na Biacuteblia e mais do que nunca presentes em nosso tempo23

Portanto e resumindo a teologia do pluralismo religioso parte em primeiro lugar do

questionamento agrave pretensatildeo cristatilde de ter a verdade absoluta de ser a uacutenica religiatildeo autecircntica

e de ser o uacutenico caminho de salvaccedilatildeo e consequentemente da valorizaccedilatildeo das outras

religiotildees como caminhos de salvaccedilatildeo e como revelaccedilatildeo de Deus agrave humanidade Assim na

visatildeo do pluralismo religioso laquohaacute muitos Povos de Deusraquo em segundo lugar do

reconhecimento de que a Divina Realidade e Verdade eacute por sua proacutepria natureza sempre

mais do que qualquer ser humano possa compreender ou qualquer religiatildeo possa expressar24

em terceiro lugar da afirmaccedilatildeo de que Jesus eacute uma Palavra que pode ser compreendida

apenas em conversa com outras Palavras eacute o caminho que estaacute aberto para outros

caminhos25 em quarto lugar da certeza de que quando pessoas religiosas escutam juntas as

vozes do sofredor e do oprimido quando tentam responder juntas agraves necessidades deles satildeo

capazes de confiar umas nas outras e sentir a verdade e o poder da singularidade de cada

um26 reconhecendo tambeacutem assim o direito agrave diferenccedila como legitimo finalmente da

certeza de que natildeo eacute autecircntica uma religiatildeo que natildeo se dirige como preocupaccedilatildeo primordial agrave

pobreza e a opressatildeo que infesta nosso mundo27

Por todo o anteriormente dito a teologia do pluralismo religioso natildeo eacute apenas um

reconhecimento mecacircnico e oportunista da realidade religiosa plural de nosso mundo seja

por uma necessidade de convivecircncia ou sobrevivecircncia poreacutem como bem afirmam Faustino

Teixeira28 e Joseacute Mariacutea Vigil a afirmaccedilatildeo de um conhecimento muacutetuo e de um

enriquecimento reciacuteproco29 no compromisso com a construccedilatildeo de um Reinado de Deus que

seja vida justiccedila paz graccedila e amor para todos mas em primeiro lugar para os menos

favorecidos e empobrecidos que satildeo injusticcedilados e privados de seus direitos30

Natildeo haacute outro nome

Sem duacutevida nenhuma o aspecto mais difiacutecil conflitante e neuraacutelgico da teologia do

pluralismo religioso eacute a cristologia E a questatildeo cristoloacutegica tem a ver com o que se tem

23 Conferir agora Joseacute Ademar Kaefer ldquoHermenecircutica Biacuteblica refazendo caminhosrdquo em Estudos de Religiatildeo (Revista Semestral de Estudos e Pesquisas em Religiatildeo Satildeo Bernardo do Campo Universidade Metodista de Satildeo Paulo 2014) 132-133 24 Knitter Jesus e os Outros Nomes 58 25 Ibid 106-113 26 Ibid 34 27 Paul F Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 16 28 28 Faustino Teixeira brasileiro mestre em Teologia pela Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Rio de Janeiro (PUC-RJ) doutor pela Pontifiacutecia Universidade Gregoriana (Roma) 29 Faustino Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus p65 30 Joseacute Mariacutea Vigil ldquoEspiritualidade do pluralismo religioso ndash Uma experiecircncia espiritual emergenterdquo em Pelos muitos caminhos de Deus 132

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

chamado laquoa essecircncia do cristianismoraquo ou seja a compreensatildeo tradicional da unicidade de

Cristo como elemento central e fundamental da identidade cristatilde

Para os criacuteticos da teologia do pluralismo religioso colocar Jesus numa comunidade de iguais

com outros reveladores significa roubar a forccedila do compromisso de disciacutepulos de Cristo e

diluir a coragem da denuncia profeacutetica cristatilde do mal Poderia contribuir para uma

comunidade feliz de religiotildees mas agrave custa da identidade cristatilde31

E as provocaccedilotildees e desafios mais fortes tanto agrave visatildeo tradicional de entender a unicidade de

Cristo como ao inclusivismo vecircm de duas figuras chaves da teologia do pluralismo religioso

John Hick32 e Paul Knitter

Assim por um lado Hick postula a validade de todas as religiotildees mundiais como contextos

autecircnticos de salvaccedilatildeolibertaccedilatildeo os quais natildeo satildeo secretamente dependentes da cruz de

Cristo33 E por outro lado Knitter ainda que reconheccedila que Jesus eacute verdadeiramente a

Palavra salviacutefica de Deus afirma que Ele (Jesus) natildeo eacute a uacutenica Palavra salviacutefica que Deus

pronunciou34

Segundo o Proacutelogo do evangelho de Joatildeo (Jo 11-18) o Deus revelado em Jesus eacute o Deus que

antes tem estado no mundo desde o inicio criando salvando e procurando atrair todas as

coisas agrave pessoa de Deus (cf Pr 120 Sb 91-3101-215-19 111-3 Jo 11-5) Desta maneira

afirmar uma visatildeo cristoloacutegica a partir do LogosSabedoria (cf Pr 1-2 Sb 9-12 Jo 11-18)

presente no Proacutelogo do evangelho de Joatildeo pode abrir a porta e facilitar para os cristatildeos entrar

no diaacutelogo inter-religioso com afirmaccedilotildees do que Deus fez em Jesus (Jo 114-18) mas sem

insistir em que Deus o fez somente em Jesus35

Para Knitter todo o que Jesus diz e faz estaacute inspirado em seu compromisso com a vinda do

laquoReino de Deusraquo (cf Mt 633 Lc 416ss 718-23)36 Jesus nunca se pregou a si mesmo nem

pregou simplesmente laquoDeusraquo Sempre que falava de Deus falava do Reino de Deus O Reino

foi a causa e a razatildeo da sua vida e de sua morte poreacutem nunca deu uma definiccedilatildeo do Reino de

Deus E natildeo o explicita ou define porque natildeo eacute um conceito que ele tenha criado ou

inventado mas um conceito bem antigo nas tradiccedilotildees de Israel particularmente das tradiccedilotildees

profeacuteticas e apocaliacutepticas (cf Ex 1518 Sal 478 Is 2423 527 Dn 43 Ob 21 Mq 47) E

sempre que falava do Reino o fazia mediante a simbologia e a metaacutefora das paraacutebolas onde o

Reino natildeo eacute um fato para aleacutem da historia mas uma realidade deste mundo Eacute Deus em

relaccedilatildeo a esta Terra e a esta historia E para Knitter seraacute precisamente o siacutembolo do Reino de

Deus a chave hermenecircutica para compreender a unicidade de Jesus a unicidade do

cristianismo e a base e a meta para o diaacutelogo inter-religioso

31 Veja Knitter Jesus e os Outros Nomes 67-82 32 John Hick (1922-2012) norte-americano filoacutesofo da religiatildeo e teoacutelogo 33 John Hick A metaacutefora do Deus encarnado (Petroacutepolis Vozes 2000) 121 34 Paul F Knitter No Other Name A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (Maryknoll Orbis Books 1985) 35 Ibid 62-65 36 O termo laquoReino de Deusraquo aparece 112 vezes nos evangelhos e delas 90 vezes nos laacutebios de Jesus Leonardo Boff Jesucristo el liberador (Sal Terrae 1980) p66 Em portuguecircs Jesus Cristo Libertador (Ed 19) (Petroacutepolis Vozes 2008) Tambeacutem uma ampla visatildeo sobre o conceito do laquoReino de Deusraquo pode ser encontrada em Joseacute Mariacutea Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 128-152

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

Anota ainda Harvey Cox37 que a visatildeo centrada no Reino muda todo o significado da

discussatildeo entre as pessoas de diferentes tradiccedilotildees religiosas A finalidade da conversaccedilatildeo eacute

diferente O diaacutelogo inter-religioso natildeo se converte em meta por si mesmo nem numa busca

estritamente religiosa mas em meio para a antecipaccedilatildeo da justiccedila de Deus Converte-se em

praacutexis38

Desta maneira quando os cristatildeos hoje fundamentam a unicidade de Jesus no Reino de Deus

e no siacutembolo da sua morte e ressurreiccedilatildeo eles estabelecem uma laquorelaccedilatildeoraquo com outras

religiotildees que pode ser laquoexclusivaraquo ou laquoinclusivaraquo ou laquopluralista correlacionalraquo Eacute

laquoexclusivaraquo no sentido de que esta compreensatildeo da unicidade de Jesus desafiaraacute qualquer

crenccedila ou praacutetica que no promova um compromisso com o amor e a justiccedila particularmente

com as pessoas oprimidas assim como tambeacutem com a Terra oprimida laquoinclusivaraquo no sentido

que esclarece e realiza o potencial de outras religiotildees para promover o que os cristatildeos

chamam de Reino de Deus laquopluralista no sentido de que reconhece as outras visotildees

encontradas em outras religiotildees e seraacute por sua vez plenamente realizada por elas E seraacute isto o

que Knitter chama laquocristologia correlacional e globalmente responsaacutevelraquo

Finalmente termino esta caminhada pelo pensamento cristoloacutegico da teologia do pluralismo

religioso com as acertadas palavras do teoacutelogo indiano jaacute falecido George Soares Prabhu ldquoa

verdadeira laquounicidaderaquo de Cristo eacute a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um

caminho que natildeo eacute masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a

Vida Convidamos outros para percorrecirc-lo conosco e compartilhar da experiecircncia que temos

tido sem afirmar que eacute o uacutenico caminho ou o uacutenico melhorrdquo39

Ora a mudanccedila do laquocristocentrismoraquo para o laquoreinocentrismoraquo na visatildeo da teologia do

pluralismo religioso tem profundas implicacircncias Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus

e sua justiccedila (Mt 633) o qual no presente significa promover a felicidade de todas as pessoas

deste mundo em vez de procurar primeiro o bem-estar da Igreja significa uma profunda

revisatildeo das visotildees eclesioloacutegica e missiologia tradicionais E essa seraacute a temaacutetica que

pretendemos desenvolver na proacutexima seccedilatildeo

Na busca do Reino de Deus Missatildeo eacute dialogar

Foi na praacutetica do seguimento de Jesus que os primeiros cristatildeos o conheceram e acreditaram

nele Seguimento que implicava estar comprometido ativamente com a vida e as lutas deste

mundo preocupar-se especialmente com as pessoas que estatildeo sofrendo por causa da injusticcedila

e a opressatildeo na esperanccedila de que apesar de fracasso e morte este mundo pode mudar para

melhor40 E aqui certamente nos encontramos no campo do serviccedilo e da missatildeo

E afirmar como faz a teologia do pluralismo religioso uma visatildeo laquoreinocecircntricaraquo da Igreja e

a missatildeo implica por um lado reconhecer que as outras religiotildees natildeo satildeo apenas laquocaminhos

de salvaccedilatildeoraquo (Karl RahnerHans Kuumlng) mas laquocaminhosraquo e possiacuteveis laquoagentesraquo desse Reino

37 Harvey Cox Batista teoacutelogo proeminente teoacutelogo norte-americano ativista pelos direitos civis professor na Escola de Divindades em Harvard 38 Harvey Cox Religion in the Secular City Toward a Postmodern Theology (New York Simons and Schuster 1984)238 Citado por Knitter ldquoPara uma teologia da libertaccedilatildeo das religiotildeesrdquo em Pelos muitos caminhos de Deus p27 39 George Soares Prabhu The Jesus of Faith India (Pune) Mimeo 27-28 Citado por Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 78-79 40 Knitter Jesus e os Outros Nome 122

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

e por outro lado que fazer possiacutevel que todas as pessoas se tornem membros do Reino eacute

mais importante que fazecirc-los membros da Igreja porque a missatildeo de Deus laquomissio Deiraquo eacute

maior que a missatildeo da Igreja e o Reino mais importante que a proacutepria Igreja (Dupuis)

Portanto na visatildeo da teologia do pluralismo religioso a missatildeo soacute tem sentido em uma

perspectiva pluralista e dialogal Ou seja a melhor forma como a Igreja e os seguidores de

Jesus podem servir ao Reino de Deus no mundo atual religiosamente plural e globalmente

ameaccedilado pela globalizaccedilatildeo neoliberal eacute por meio do diaacutelogo porque do contraacuterio a

natureza e o propoacutesito da missatildeo estatildeo perdidos e tornam-se irrelevantes 41

O anteriormente dito implica ter uma visatildeo missionaacuteria dialogal e abrangente onde a

proclamaccedilatildeo e a praacutetica da boa notiacutecia do Reino de Deus devem permear todas as atividades

o dia-a-dia a luta pela justiccedila e pela democracia assim como a liturgia a espiritualidade e a

teologia

Portanto aqui eacute oportuno observar e concluir que ao se afirmar como um novo paradigma a

teologia do pluralismo religioso e o diaacutelogo inter-religioso tecircm serias e profundas

implicacircncias tanto para o trabalho teoloacutegico em geral quanto para o movimento ecumecircnico

em particular

Haacute muitas moradas (Jo 142)

Chegamos ao final desta caminhada pela teologia do pluralismo religioso Certamente o

caminho proposto insere-se no horizonte da reflexatildeo teoloacutegica cristatilde mas estaacute aberto a uma

perspectiva global mais abrangente

E tentando amarrar agora os fios desta caminhada o grande desafio da proposta da teologia

do dialogo e do pluralismo religioso significa em primeiro lugar reconhecer que a laquoverdaderaquo

cristatilde eacute laquoa nossa verdaderaquo mas natildeo eacute a uacutenica e absoluta laquoverdaderaquo ldquohaacute mais verdade

religiosa em todas as religiotildees juntas do que em uma religiatildeo especiacutefica [] Isto se aplica

tambeacutem ao cristianismordquo comenta Schillebeeckx42 em segundo lugar implica o

reconhecimento da diferenccedila genuiacutena que marca as diversas tradiccedilotildees religiosas mas tambeacutem

sua riqueza enquanto autenticamente preciosas assim como o caraacuteter irredutiacutevel e

irrevogaacutevel do outro interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento muacutetuo

e de um reciacuteproco enriquecimento43 e finalmente e resumindo significa e implica estar

convencidos de que todas as religiotildees satildeo laquoverdadeirasraquo tecircm sua laquoVerdaderaquo satildeo caminhos

pelos quais Deus sai ao encontro mas que tambeacutem satildeo todas humanas e por isso limitadas

relativas incompletas e com pecados histoacutericos que as condicionam44

Penso em minha opiniatildeo que os cristatildeos assim como todas as pessoas religiosas tecircm que

admitir honestamente que dentro de nossa condiccedilatildeo humana limitada e finita natildeo pode haver

uma palavra final nem um uacutenico modo de conhecer a verdade que seja vaacutelido para todos os

tempos para todos os lugares e para todas as pessoas

41 Ibid141-155 e 175-180 42 Edward Schillebeeckx (1914-2019) belga proeminente teoacutelogo catoacutelico romano da ordem dos Dominicanos assessor durante o Concilio Vaticano II Veja agora The Church The Human Story of God (New York Crossroad 1990) 166 Citado por Knitter Jesus e os Outros Nome 50 43 Teixeira ldquoO desafio do pluralismo religioso para a teologia latino-americanardquo em Pelos muitos caminhos de Deus 65 44 Vigil Teologiacutea del Pluralismo Religioso 387

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8

Dom Pedro Casaldaacuteliga expressou ldquoA verdade eacute caminhante como as pessoas como a

Historia como o Deus vivo que nos acompanha Natildeo eacute minha nem tua eacute nossa ou somos

dela melhorrdquo45

E retomo para terminar a frase do poeta espanhol Antonio Machado que daacute tiacutetulo a esta

reflexatildeo e que nos adverte ldquoTua verdade Natildeo a Verdade e vem comigo buscaacute-la A tua

guarda-te laacuterdquo

Sem duacutevida nenhuma na casa do Pai e da Matildee comum de toda a humanidade laquohaacute muitas

moradasraquo

Biografia

Pedro Julio Triana Fernaacutendez eacute presbiacutetero da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB)

Diocese Anglicana de Satildeo Paulo (DASP) Doutor em Ciecircncias da Religiatildeo (aacuterea Ciecircncias

Sociais e ReligiatildeoBiacutebliaAntigo Testamento) pela Universidade Metodista de Satildeo Paulo

(UMESP) Representante da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil perante a Comissatildeo

Teoloacutegica do Conselho Nacional de Igrejas Cristatildes do Brasil (CONIC) Coordenador Geral

do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

45 Pedro Casaldaacuteliga ldquoProacutelogordquo em Pelos muitos caminhos de Deus 8