relatório judicialização da política e demandas por juridificação: o judiciário frente aos...

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OBSERVATÓRIO DA JUSTIÇA BRASILEIRA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Av. Antonio Carlos, n. 6627, Pampulha, Sala 4117 Belo Horizonte, Minas Gerais. CEP 31270-901 Ref.: Convocação nº 001/2010 Área temática: Judicialização e equilíbrio de poderes no Brasil RELATÓRIO FINAL DA EXECUÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA: “Judicialização da política e demandas por juridificação: o Judiciário frente aos outros poderes e frente à sociedade” Instituição proponente: Sociedade Brasileira de Direito Público (SBDP) São Paulo Março/2011

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A presente pesquisa tem como objeto de estudo o controle de constitucionalidade exercido pelo Supremo tribunal Federal (STF), em sua forma preventiva e repressiva, analisado a partir de uma perspectiva interna ao processo decisório que se desenvolve no referido tribunal. De maneira resumida, a escolha desse objeto e enfoque de análise encontra justificativa no debate acerca da interação entre os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, que guarda estreita relação com a ideia de “judicialização da política”, tema da linha de pesquisa à qual se vincula o presente trabalho.

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OBSERVATÓRIO DA JUSTIÇA BRASILEIRA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas

Av. Antonio Carlos, n. 6627, Pampulha, Sala 4117

Belo Horizonte, Minas Gerais.

CEP 31270-901

Ref.: Convocação nº 001/2010

Área temática: Judicialização e equilíbrio de poderes no Brasil

RELATÓRIO FINAL DA EXECUÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA:

“Judicialização da política e demandas por juridificação: o Judiciário frente aos outros poderes e frente à sociedade”

Instituição proponente:

Sociedade Brasileira de Direito Público (SBDP)

São Paulo

Março/2011

Judicialização e equilíbrio de poderes no Brasil Convocação nº 001/2010

Instituição Proponente

Sociedade Brasileira de Direito Público – SBDP

Equipe de Pesquisa Carlos Ari Sundfeld (Coordenador)

Ester Gammardella Rizzi Evorah Lusci Costa Cardoso

Flávio Beicker (Assistente de Coordenação) Francisco Carvalho de Brito Cruz

Gabriele Estábile Bezerra Gustavo Cesar Mazutti Lucas Aidar dos Anjos

Luciana Silva Reis (Assistente de Coordenação) Luciana de Oliveira Ramos (Assistente de Coordenação)

Mariana Ferreira Cardoso da Silva Nicole Julie Fobe

Renan Barbosa Fernandes Salomão Barros Ximenes

Consultores

Conrado Hübner Mendes Gabriel Pereira

Mauricio Albarracín

Observatório da Justiça Brasileira (OJB) – UFMG Leonardo Avritzer (Coordenador)

Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Av. Antonio Carlos, nº 6627, Sala 4117 – Pampulha

Belo Horizonte, Minas Gerais

O presente trabalho é uma versão para publicação do relatório final de execução do projeto de pesquisa intitulado “Judicialização da política e demandas por juridificação: o Judiciário frente aos outros poderes e frente à sociedade”, concluído pela Sociedade Brasileira de Direito Público (SBDP) em dezembro de 2010, no âmbito da Convocação nº 001/2010, Área Temática: Judicialização e equilíbrio de poderes no Brasil, promovida pelo Observatório da Justiça Brasileira, centro de pesquisas vinculado à Faculdade de Filosofia e Ciências Humana, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Copyright© – 2011.

Sumário

I. Apresentação e estrutura .................................................................... 5

II. Objetivos e justificativas: o conceito de judicialização, a construção do marco teórico e o desenho da pesquisa .............................................. 6

II.1 Judicialização e seleção da bibliografia ................................................. 7

II.2 Como fazer pesquisa empírica a partir da “judicialização”?.................... 10

II.3 Construindo um marco teórico .......................................................... 15

II.3.1 Interação entre Poderes e protagonismo do Judiciário .................... 17

II.3.2 Potenciais democratizantes no STF ............................................... 19

II.3.3 Onde situar a presente pesquisa .................................................. 20

II.4 Desenho da pesquisa ....................................................................... 23

II.4.1 Análise quantitativa: o que chega e o que faz o STF ....................... 25

II.4.2 Análise qualitativa: onde encontrar a judicialização? ...................... 27

III. Nota metodológica: recorte e seleção de dados ............................. 30

III.1 Ações de controle repressivo de constitucionalidade ........................... 30

III.1.1 Levantamento de dados ............................................................ 30

III.1.2 Grade de análise ....................................................................... 34

III.2 Ações de controle preventivo de constitucionalidade ........................... 36

IV. O controle de constitucionalidade preventivo .................................. 39

IV.1 Análise descritiva dos casos ............................................................. 40

IV.1.1 Impetrante ............................................................................... 40

IV.1.2 Ato questionado ........................................................................ 41

IV.1.3 Liminar .................................................................................... 42

IV.1.4 Julgamento final ....................................................................... 43

IV.2 Análise argumentativa do STF .......................................................... 44

IV.2.1 Legitimidade ativa ..................................................................... 44

IV.2.2 Objeto do controle preventivo ..................................................... 45

IV.2.3 Razões levantadas em julgamentos extintivos............................... 46

IV.2.4 Julgamento de mérito ................................................................ 47

V. O controle de constitucionalidade repressivo ................................... 49

V.1 Fatores de entrada: caracterização das demandas ............................... 49

V.1.1 Quadro geral de temas das ações propostas .................................. 50

V.1.2 Quem acessa o STF: atores-demandantes ..................................... 65

V.1.3 O tempo de questionamento: algumas hipóteses ............................ 83

V.2 Fatores de saída: como decide o STF? ................................................ 85

V.2.1 Dados gerais sobre os tipos de resposta e não-resposta .................. 85

V.2.2 Qual a resposta do STF: decisões liminares e de mérito .................. 90

V.2.3 O papel da liminar no controle de constitucionalidade brasileiro: teoria e dados empíricos ............................................................................... 95

V.2.4 Controle Medidas Provisórias: um grupo especial de ações na jurisprudência do STF .........................................................................102

V.2.5 Perfil dos casos com alguma resposta do STF ................................120

V.2.6 A “não-resposta do STF”: extinção sem julgamento de mérito ........130

V.3 Conclusão parcial ............................................................................140

VI. Processo decisório no STF: análise qualitativa e apontamentos para uma nova agenda de pesquisa .............................................................141

VI.1 Seleção e relato dos casos analisados ..............................................143

VI.1.1 Raposa Serra do Sol .................................................................146

VI.1.2 Importação de pneus usados .....................................................148

VI.1.3 Direito de greve dos servidores públicos .....................................149

VI.1.4 Fundo de Participação dos Estados (FPE) .....................................151

VI.1.5 Verticalização das coligações partidárias .....................................155

VI.1.6 Fidelidade partidária .................................................................157

VI.2 Técnicas de julgamento ..................................................................159

VI.2.1 Mandado de injunção com efeitos constitutivos ............................159

VI.2.2 Interpretação conforme, modulação de efeitos e outras técnicas: lidando com as dificuldades da decisão sobre inconstitucionalidade ..........163

VI.2.3 Decisão aditiva, julgamento extra-petita e formação de um precedente judicial .............................................................................................172

VI.2.4 Execução das decisões: atribuindo tarefas a tribunais inferiores .....177

VI.3 Procedimentos decisórios ................................................................181

VI.3.1 Atores externos: amici curiae e outros ........................................181

VI.3.2 Audiência pública: organização e possível impacto .......................189

VI.3.3 Tempo de tramitação: diferenças que chamam a atenção .............196

VII. Considerações finais .....................................................................197

VIII. Referências bibliográficas ...........................................................204

5

I. Apresentação e estrutura A presente pesquisa tem como objeto de estudo o controle de

constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em sua forma

preventiva e repressiva, analisado a partir de uma perspectiva interna ao

processo decisório que se desenvolve no referido tribunal. De maneira resumida,

a escolha desse objeto e enfoque de análise encontra justificativa no debate

acerca da interação entre os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, que

guarda estreita relação com a ideia de “judicialização da política”, tema da linha

de pesquisa à qual se vincula o presente trabalho.

Sob esse enfoque, foram traçados os dois principais objetivos deste

trabalho. O primeiro deles é o de produzir informações – de certa forma ainda

escassas em trabalhos acadêmicos – que possam de alguma forma lançar luz

sobre como se dá a dinâmica das relações entre as instâncias decisórias

superiores do país, elegendo o controle de constitucionalidade como campo

privilegiado de observação da atividade do Supremo Tribunal Federal em sua

interação com os Poderes Legislativo e Executivo.

Além disso, também buscou-se contribuir para a construção de uma

agenda de pesquisa em direito e ciências sociais que priorize a análise

institucional dos órgãos jurisdicionais, o que significa mapear técnicas decisórias

e mecanismos procedimentais usados por tribunais para delimitar seu próprio

espaço de deliberação. É justamente por meio do estudo desses parâmetros que

o presente trabalho procura fornecer subsídios para uma análise crítica da

qualidade do processo deliberativo e legitimação democrática de órgãos

jurisdicionais em geral, tomando como modelo o STF.

Considerando o objeto de análise, bem como os objetivos

supramencionados, este relatório foi estruturado da seguinte forma: inicialmente

(Capítulo II), é apresentada uma exposição mais detalhada dos objetivos e do

desenho concebido para a presente pesquisa, narrando as dificuldades

encontradas e as escolhas feitas na delimitação do tema da “judicialização da

política”, as quais levaram à construção do chamado marco teórico desta

pesquisa. Em seguida, é exposta a metodologia de coleta e análise das

informações usadas para a construção de um banco de dados sobre controle de

constitucionalidade repressivo e preventivo envolvendo atos normativos

originários do Legislativo e do Executivo federais (Capítulo III).

6

Finalmente, os Capítulos IV e V trazem os resultados da pesquisa

empírica e as discussões realizadas a partir dos marcos teóricos adotados para

análise do controle preventivo e repressivo de constitucionalidade pelo STF.

Realizou-se nessa etapa final da análise quantitativa uma análise cingida, tendo

em vista as variáveis que compõem aquilo que se chamou de fatores de entrada

e fatores de saída.

Tendo em vista algumas conclusões parciais (V.3, infra), considerou-se a

hipótese de que talvez não seja possível identificar a “judicialização da política” a

partir de uma leitura exclusivamente quantitativa de pouco mais de duas

décadas de atividade do STF. Por essa razão, promoveu-se, a título

exemplificativo e em alguns casos selecionados, uma investigação qualitiativa

das técnicas e procedimentos decisórios adotados pelo Supremo, enquanto

elementos que poderão vir a compor o eixo de análise de uma nova agenda de

pesquisa (Capítulo VI). Nas considerações finais (Capítulo VII), são sumarizadas

algumas das hipóteses e conclusões levantadas ao longo do relatório, bem como

discutidas algumas perspectivas de análise do tema para trabalhos futuros.

II. Objetivos e justificativas: o conceito de judicialização, a construção do marco teórico e o desenho da pesquisa

Inicialmente, é preciso esclarecer que a presente pesquisa não se

desenvolve a partir do conceito de judicialização da política, como seria razoável

supor. Isso se explica por uma série de razões, que serão adiante expostas. A

primeira e mais evidente delas é a de que não há na literatura especializada

disponível sobre o tema qualquer consenso sobre uma definição para o termo

“judicialização da política” (cf. tópico II.2, infra). Da mesma forma, tampouco há

espaço e tempo suficientes nesta pesquisa para arriscar qualquer construção

conceitual a respeito (se é que isso seja possível).

Muito embora várias sejam as tentativas de formulação de um conceito

fechado e acabado, como será visto mais adiante, no tópico em que é

apresentada uma pequena revisão bibligráfica sobre o tema, não se pode afirmar

com razoável certeza se há alguma mais “correta” que outra, ou apresente uma

melhor compreensão da “judicialização“. Diante das dificuldades que se

apresentam para aqueles que que se dispuseram a produzir trabalhos teóricos

7

sobre o assunto, natural que, em um estudo com enfoque prioritariamente

empírico, como é o presente, os desafios sejam semelhantes, senão maiores.

As dificuldades para definir de forma minimamente precisa a idéia de

judicialização da política têm impacto direto sobre quaisquer trabalhos aplicados

que pretendam se dedicar ao assunto. Na realidade, há mesmo quem sustente

que um trabalho de cunho empírico (senão impossível) dificilmente poderia ser

concluído com sucesso (Maciel/Koerner, 2002). Tendo um objeto de tão difícil

apreensão, natural que a investigação do tema seja baseada em uma escolha

fundamental: optar por uma noção ou idéia que sintetize um dos possíveis

sentidos que o termo judicialização da política possa exprimir, o que será

apresentado mais adiante (cf. tópico II.3, infra).

O primeiro passo para fundamentar a necessidade de uma escolha de tal

dimensão, bem como instruir o desenho de pesquisa e a formulação de um

marco teórico, foi a realização de um estudo da literatura especializada sobre a

judicialização. Necessário ressaltar que essa pesquisa teórica não teve como

objetivo mapear a totalidade da literatura brasileira sobre o tema da

“judicialização da política”, mas sim acessar textos que tratam da elaboração e

aplicação do conceito, de modo a melhor entender qual posição pode ser

assumida por uma pesquisa empírica que tenha por objetivo compreender o

fenômeno comumente associado a tal conceito.

II.1 Judicialização e seleção da bibliografia Tendo esse objetivo em mente, e considerando as limitações de tempo

da pesquisa, a equipe decidiu iniciar o estudo do tema a partir da literatura, por

meio de levantamento da bibliografia brasileira disponível na Scientific Electronic

Library Online - SciELO1, que congrega os mais importantes periódicos

científicos em diversas áreas, dentre elas, a ciência política e o direito.2 Além

disso, também foram procurados artigos disponíveis nas principais bibliotecas de

direito e ciência política da cidade de São Paulo, i.e., bibliotecas da Faculdade de

1 Cf. http://www.scielo.org/php/index.php. 2 A opção por trabalhar apenas com artigos foi concebida não apenas em razão das limitações temporais do presente trabalho, como também por conta dos objetivos e enfoques acima propostos, cuja priorização seria por resultados empíricos a respeito da dinâmica na relação institucional entre os Poderes e o mapeamento de procedimentos e técnicas decisórias, em detrimento de maiores discussões de cunho teórico-conceituais.

8

Direito da USP3, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP4 e

da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas.5

A pesquisa na Rede SciELO foi feita em duas frentes. Selecionando-se

sempre a opção “pesquisa regional: Brasil”, foi feita inicialmente uma busca no

método “por palavra”, com o uso da palavra-chave ”judicialização”, e depois uma

busca no método “proximidade léxica” com a palavra-chave “judicialização

política”. Nas bibliotecas, a busca foi feita por meio da palavra-chave

“judicialização política”.

A seguir, são expostas as listas de resultados encontrados.

Levantamento bibliográfico na Rede SciELO:

Pesquisa (palavra-chave): “judicialização”

Busca por palavra

Pesquisa Regional: Brasil

Resultados:

1. Arantes, Rogério Bastos, “Direito e política: o Ministério Público e a defesa dos direitos

coletivos”, Revista Brasileira de Ciências Sociais 14 (1999): 83-102. ISSN 0102-6909

2. Carvalho, Ernani Rodrigues de, “Em busca da judicialização da política no Brasil:

apontamentos para uma nova abordagem”, Revista de Sociologia Política 23 (2004):

127-139. ISSN 0104-4478

3. ______. “Revisão judicial e judicialização da política no direito ocidental: aspecto relevantes

de sua gênese e desenvolvimento”, Revista de Sociologia Política 28 (2007): 161-179.

ISSN 0104-4478

4. Chieffi, Ana Luiza, e Barata, Rita Barradas, “Judicialização da política pública de assistência

farmacêutica e eqüidade”, Cadernos de Saúde Pública 25 (2009): 1839-1849. ISSN

0102-311X

5. Couto, Estêvão Ferreira, “Judicialização da política externa e direitos humanos”, Revista

Brasileira de Política Internacional 47 (2004): 140-161. ISSN 0034-7329

6. Da Ros, Luciano, “Poder de decreto e accountability horizontal: dinâmica institucional dos três

poderes e medidas provisórias no Brasil pós-1988”, Revista de Sociologia Política 16

(2008): 143-160. ISSN 0104-4478

7. Faria, José Eduardo, “O sistema brasileiro de Justiça: experiência recente e futuros desafios”,

Estudos Avançados 18 (2004): 103-125. ISSN 0103-4014 3 Cf. http://143.107.2.22/fdusp/biblioteca.htm. 4 Cf. http://www.sbd.fflch.usp.br/site/modules/tinycontent/index.php?id=4. 5 Cf. http://www.fgv.br/bibliotecas/sp/catalogo/.

9

8. Lobato, Anderson Orestes Cavalcante, “Política, constituição e justiça: os desafios para a

consolidação das instituições democráticas”, Revista de Sociologia Política 17 (2001):

45-52. ISSN 0104-4478

9. Maciel, Débora Alves e Koerner, Andrei, “Sentidos da judicialização da política: duas análises”,

Lua Nova 57 (2002): 113-133. ISSN 0102-6445

10. Oliveira, Vanessa Elias de, “Judiciário e privatizações no Brasil: existe uma judicialização da

política?”, Dados 48 (2005): 559-686. ISSN 0011-5258

11. Taylor, Matthew M.; e Da Ros, Luciano, “Os partidos dentro e fora do poder: a judicialização

como resultado contingente da estratégia política”, Dados 51 (2008): 825-864. ISSN

0011-5258

12. Verbicaro, Loiane Prado, “Um estudo sobre as condições facilitadoras da judicialização da

política no Brasil: a study about the conditions that make it possible”, Revista Direito

GV 4 (2008): 389-406. ISSN 1808-2432

13. Verissimo, Marcos Paulo, “A constituição de 1988, vinte anos depois: suprema corte e ativismo

judicial "à brasileira", Revista Direito GV 4 (2008): 407-440. ISSN 1808-2432

14. Vianna, Luiz Werneck; Burgos, Marcelo Baumann; e Salles, Paula Martins, “Dezessete anos de

judicialização da política”, Tempo Social 19 (2007): 39-85. ISSN 0103-2070

15. Yepes, Rodrigo Uprimny, “A judicialização da política na Colômbia: casos, potencialidades e

riscos”, Revista Internacional de Direitos Humanos 4 (2007): 52-69. ISSN 1806-

6445

Pesquisa (palavra-chave): “judicialização política”

Busca por similaridade

Pesquisa Regional: Brasil

Resultados:

16. Carvalho, Ernani, “Trajetória da revisão judicial no desenho constitucional brasileiro: tutela,

autonomia e judicialização”, Sociologias 23 (2010). ISSN 1517-45222

17. Engelmann, Fabiano, “Internacionalização e ativismo judicial: causas políticas e causas

jurídicas nas décadas de 1990 e 2000”, Contexto internacional 29 (2007). ISSN 0102-

85292

18. Marchetti, Vitor; e Cortez, Rafael, “A judicialização da competição política: o TSE e as

coligações eleitorais”, Opinião Pública 15 (2009). ISSN 0104-62762

19. Monteiro, Jorge Vianna, “Quão suprema é a revisão judicial no jogo de políticas públicas?”,

Revista de Administração Pública 40 (2006). ISSN 0034-76122

20. Monteiro, Jorge Vianna, “Intermediação política, revisão judicial & MP nº 324”, Revista de

Administração Pública 40 (2006). ISSN 0034-76122

10

21. Taylor, Matthew M., “O judiciário e as políticas públicas no Brasil”, Dados 50 (2007). ISSN

0011-52582

22. ______. “Citizens against the State: the riddle of high impact, low functionality courts in

Brazil”, Revista de Economia Política 25 (2005). ISSN 0101-31572

23. Vieira, Fabiola Sulpino, e Zucchi, Paola, “Distorções causadas pelas ações judiciais à política de

medicamentos no Brasil”, Revista de Saúde Pública 41 (2007). ISSN 0034-89102

Levantamento bibliográfico na base de artigos das bibliotecas da Faculdade de

Direito da USP, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

e da DireitoGV:

Pesquisa (palavra-chave): “judicialização política”

Resultados:

24. Ferreira Filho, Manoel Gonçalves, “Poder judiciário na constituição de 1988. Judicialização da

política e politização da justiça”, Revista Jurídica da Procuradoria Geral do Município

de São Paulo 1 (1995): 21-42.

25. Sadek, Maria Tereza, “O Judiciário em questão”, São Paulo Perspectiva 10 (1996): 53-59.

II.2 Como fazer pesquisa empírica a partir da “judicialização”? Conforme adiantado anteriormente, o presente tópico se propõe a

discutir os limites e possibilidades de realizar uma pesquisa empírica tendo por

tema uma expressão de conteúdo semântico relativamente vago e muitas vezes

ambíguo. Embora haja um crescente interesse pelo tema da “judicialização da

política”, conforme evidencia a vasta produção bibliográfica – tanto no campo da

ciência política, quanto do direito –, a análise da literatura mostrou que alguns

déficits conceituais e metodológicos podem ser identificados. O principal deles

talvez diga respeito à ausência de uniformidade na abordagem do tema.

A análise preliminar do material bibliográfico selecionado permitiu

identificar e mapear pelo menos quatro sentidos comumente atribuídos à

expressão “judicialização da política”: ela é tratada ora como “replicação de

procedimentos tipicamente jurídicos” em diversas instâncias decisórias

(Tate/Vallinder, 1995: 13), ora como causa de um “aumento das demandas

judiciais” (noção criticada por Carvalho, 2004: 130), ora como “resultado de uma

iniciativa de protagonismo do Poder Judiciário” (e.g., Castro, 1997:150-152), ou

como um “fenômeno circular complexo” (Faria, 2004: 105-107). Esses sentidos

serão melhor expostos e discutidos a seguir.

11

Uma interessante síntese da questão é elaborada por Vanessa Oliveira

(2005), e pode servir como ponto de partida para discutir os problemas inerentes

ao estudo do tema:

“Por judicialização da política entendo a utilização de procedimentos judiciais para a resolução de conflitos de ordem política, tais como controvérsias a respeito de normas, resoluções e políticas públicas em geral, adotadas/implementadas pelos Poderes Executivo e Legislativo. Assim, utilizando o conceito de Tate e Vallinder (1995:13), trato por judicialização o ‘processo de expansão dos poderes de legislar e executar leis do sistema judiciário, representando uma transferência do poder decisório do Poder Executivo e do Poder Legislativo para os juízes e tribunais.’ Simplificadamente, chamei de judicialização a capacidade de o Judiciário intervir em políticas públicas, interferindo ou alterando, em alguns casos, o status quo vigente. (Oliveira, 2005: 559 a 560, sem grifos no original).6

Da síntese sobre o tema apresentada por Vanessa Oliveira, alguns

elementos são bastante importantes para a análise inicial do que seria o conceito

“clássico” de judicialização, pelo menos nos termos formulados pelos pioneiros

no uso da expressão. Segundo Tate/Vallinder (1995: 25), a idéia de

judicialização sempre pressupõe a existência de procedimentos judiciais, uma

vez que trata da ação do Poder Judiciário.

Ao mesmo tempo que parece estar se tratando da ação corriqueira deste

Poder, há, no entanto, a identificação de um processo de expansão do exercício

do poder jurisdicional – seja por um aumento do número de processos, seja pela

maior intensidade de intervenção de suas decisões. Em outra palavras, a

judicialização deveria sempre ser entendida como um fenômeno ou processo no

tempo, cuja evolução poderia ser “medida” com base em análise comparativa da

alteração de indicadores em dois momentos distintos (Taylor e Da Ros, 2008:

830).

Diante desse tipo de abordagem do problema, algumas questões acabam

sendo inevitavelmente levantadas, tais como quais seriam os casos a serem

6 O texto segue (Oliveira, 2005: 560): “Todavia, para poder intervir, o Judiciário deve antes ser acionado. Este processo, independentemente do ator que o promove – se partido político, organizações da sociedade civil, pessoas físicas etc. –, será chamado de politização da justiça, quando se referir ao acionamento desse Poder de modo a interferir em um processo político, nos termos acima descritos.Tratarei a judicialização como um processo de três fases, que implica: primeiramente no acionamento do Judiciário através (sic) do ajuizamento de processos – ou politização da justiça; em segundo lugar, no julgamento do pedido de liminar (quando houver); e, por fim, no julgamento do mérito da ação, que enseja a judicialização da política propriamente dita. Este é o que chamarei aqui de ciclo da judicialização.”

12

contabilizados para medir este processo de amplificação da demanda judicial; ou

mesmo se e em que medida o simples fato de haver mais casos em tramitação

na Justiça brasileira poderia ser um elemento de comprovação do fenômeno da

judicialização.

Para responder a estas perguntas, alguns autores passam a introduzir,

então, um novo elemento na tentativa de definição do fenômeno da

judicialização: esta seria um aumento não da simples atividade jurisdicional, mas

daquela que tem como objeto conflitos de ordem política. Ou, elaborado de outra

forma, a judicialização envolveria conflitos que dizem respeito às decisões que

têm sua esfera de deliberação típica na esfera do Poder Executivo e do Poder

Legislativo.

Nota-se, aqui, que a idéia de judicialização como um fenômeno de

ampliação da atividade do Poder Judiciário passa a ser descrito e caracterizado

pela combinação de dois elementos distintos: (a) um aumento significativo do

número de processos judiciais em tramitação; e (b) uma modificação

(quantitativa) no número de casos em que o Judiciário passa efetivamente a

concentrar diversas decisões que, no momento anterior, haveriam de ser

tomadas no âmbito dos demais Poderes, o que alguns chamam de maior

intensidade da ação do Poder Judiciário, ainda que em decorrência de um arranjo

institucional específico (Carvalho, 2010).

Neste ponto, no entanto, deve-se enfrentar um problema inicial. O Poder

Judiciário tem como funções típicas, constitucionalmente definidas, revisar atos

dos outros Poderes – ao menos nos casos em que se aprecia a

constitucionalidade de normas e demais atos normativos. Ao delegar a

verificação de decisões legislativas e políticas públicas ao Poder Judiciário, é

absolutamente plausível que se admita que a Constituição transfere para sua

esfera de deliberação uma parte das decisões tomadas pelos outros Poderes.

O que aparentemente estaria se afirmando com o conceito de

judicialização, então, é que, em um determinado momento, em comparação com

um anterior, haveria um aumento da função jurisdicional e, em decorrência

desse aumento, o desequilíbrio entre os três Poderes. O Poder Judiciário estaria

assumindo o protagonismo como instância de decisão última a respeito de

conflitos de ordem política, antes dirimidos por outro Poder. Como, no entanto,

comprovar tal desequilíbrio?

13

Essa breve exposição de alguns aspectos comumente associados ao

conceito de judicialização já revela as dificuldades de se formular perguntas de

pesquisa empírica a partir de tais aspectos, o que pode denotar certa fraqueza

do potencial explicativo da ideia de judicialização. Não por outra razão, os

trabalhos analisados não procuram desenvolver uma análise empírica, no sentido

de indicar, ainda que exemplificativamente, os casos em que a decisão tomada

pelo Judiciário deveria estar a cargo dos demais Poderes.7

Em razão das limitações inerentes a um conceito de difícil formulação,

encontram-se críticas de alguns autores na literatura sobre o tema. Ernani

Rodrigues de Carvalho (2004), e.g., afirma que, para discutir o conceito de

judicialização, seria necessária uma visão mais ampla do que a proposta

colocada por Tate/Vallinder (1995), autores que introduziram este debate.

Ao contrário do que esses autores defendem, o conceito de judicialização

não poderia se restringir ao seu caráter procedimental (i.e., não poderia estar

baseado no aumento puro e simples do número de processos), mas deveria

tratar também do caráter substancial do processo. Em outras palavras, seria

necessário questionar, também, até que ponto os juízes modificam as leis ou

atos dos demais Poderes, ou mesmo até que ponto essas decisões realmente

interferem na aplicação de escolhas políticas fundamentais.

Essa pretensão (de apontar as interferências do Judiciário na esfera de

atuação dos demais Poderes) também pode ser confrontada com outro tipo de

questionamento: em que medida a intervenção do Judiciário na esfera de

deliberação dos outros Poderes é nefasta para o sistema constitucional e para a

separação de Poderes? Em alguma medida, por ser órgão revisional, não seria

próprio de sua atividade apreciar matérias que já passaram por outras esferas de

deliberação?

Afirmar que uma decisão judicial implica interferência (ingerência ou

intervenção) em uma escolha política pressupõe um referencial normativo

relativamente consolidado e consistente sobre aquilo que os órgãos jurisdicionais

poderiam/deveriam ou não fazer. Esse desafio acrescenta mais uma dificuldade

7 Ainda que historicamente possa se afirmar que o Executivo ou mesmo o Legislativo tomaram as decisões fundamentais sobre, por exemplo, a política de saúde pública, não é razoável inferir a partir desse fato (e sem qualquer fundamentação) que o Judiciário, sob uma perspectiva normativa, não deveria interferir em questões desse tipo. Não basta dizer que este sempre foi o “estado natural das coisas”, para reprovar a atuação do Judiciário na apreciação dessas questões, e tachá-la de indevida.

14

para se trabalhar com o conceito de “judicialização”, e que pode ser traduzida da

seguinte forma: a idéia judicialização, por si própria, não admite qualquer juízo

de valor.

Débora Maciel e Andrei Koerner (2002), também em perspectiva

crítica, discutem o balanceamento entre os três Poderes como uma possível

origem do processo de judicialização, dialogando com a obra de Werneck

Vianna et alli (1999), que afirmaria a predominância do Executivo sobre o

Legislativo e o insulamento desses Poderes como os fatores que estariam

levando os atores sociais a procurarem o Judiciário para efetivar suas

demandas e expectativas. Os autores, no entanto, acreditam que descrever a

dinâmica inter Poderes em termos de uma “judicialização da política” prejudica

uma análise mais acurada da realidade: “quanto mais contextualizado o foco

analítico, menos consistente e vantajoso parece ser o recurso ao conceito de

judicialização para identificar a dinâmica da expansão das fronteiras do sistema

judicial e os seus efeitos institucionais” (2002: 128).

Os autores concluem, ainda, que a concepção original de “judicialização

da política” seria marcada por uma concepção formal das atribuições e relações

dos Poderes e que, tanto no debate público quanto no acadêmico, haveria

fluidez no uso desta expressão. Por conta disso, o ângulo de interpretação que

combina formulações de teoria do direito e de direito constitucional com

análises macro-sociológicas sobre as transformações sociais das últimas

décadas seria útil para estudos jurídicos e como quadro geral, mas não seria

apropriado para constituir uma base suficiente de formulação de problemas de

pesquisa empírica sobre as instituições judiciais. Haveria espaço, portanto,

apenas para conceitos mais específicos, sem pretensões de generalização ou

universalização, para explicar toda a relação entre Judiciário e demais Poderes.

Dessa análise sumária de alguns poucos autores, já é possível perceber

as dificuldades de se desenhar uma pesquisa empírica que pretenda contribuir

para o debate sobre a judicialização da política. Isso se torna especialmente

difícil se se deseja dar à pesquisa um enfoque que não seja temático – i.e., se a

pretensão não é estudar a judicialização da saúde ou do direito à educação, por

15

exemplo, e sim, a judicialização como um fenômeno institucional que está

alterando a relação entre os Poderes.8

Para avançar nesta discussão e, assim, tentar situar a presente pesquisa

dentre os demais trabalhos que debatem o tema, o tópico seguinte é dedicado à

exposição clara das premissas e escolhas fundamentais para realização de

qualquer pesquisa empírica sobre o tema, diante das inúmeras dificuldades

apontadas para se trabalhar com a idéia pouco convidativa de “judicialização da

política”.

II.3 Construindo um marco teórico A primeira impressão que surge do exame da literatura é a de que o

conceito de judicialização parece ter ao menos um ponto comum em todos os

contextos nos quais é invocado: ele serviria para designar um processo de

expansão do exercício do poder jurisdicional dos tribunais, que passa a ser usado

na decisão de conflitos de ordem política. O que seriam propriamente conflitos

políticos não é algo evidente entre os autores, assim como as perguntas sobre se

e em que medida essa expansão seria fruto de um “voluntarismo ativista” do

Judiciário, ou resultado exclusivo do desenho de competências previsto na

Constituição Federal desde outubro de 1988.

Como salientado no tópico anterior, essa constitui uma das principais

dificuldades práticas de uma pesquisa empírica, uma vez que a definição dessas

questões tem impacto direto no recorte e forma de seleção do material de

análise. Arantes (1997), por exemplo, menciona que um recorte possível seria o

que abrangesse quaisquer conflitos envolvendo realização de políticas públicas.

Um uso mais restrito do conceito, por outro lado, costuma associar a

judicialização ao deslocamento para o Judiciário de disputas políticas típicas do

jogo político-partidário (e.g., Taylor e Da Ros, 2008).

Associada a essa idéia-base, está a noção de desequilíbrio entre os três

Poderes ou anomalia institucional. Posto de outra forma: o Judiciário seria

chamado a intervir nos casos em que o funcionamento do Legislativo e do

Executivo se mostrasse falho (e.g., Castro, 1997); não-digno de confiança

8 Neste ponto, é importante ressaltar que a instituição proponente desta pesquisa tem como objetivos promover o papel da academia no controle social das decisões do STF, o que se alcança por meio da realização de análises institucionais do Tribunal que possam, inclusive, influir em futuras agendas de reformas. Esta pesquisa insere-se nesse contexto.

16

(Ferreira Filho, 1995); ou, ainda, ineficaz, no contexto mais geral de crise da

capacidade regulatória do Estado (Faria, 2004).

Neste ponto, é importante notar que parte da literatura parece considerar

de forma séria a hipótese de que judicialização seria um fenômeno advindo de

um determinado desenho institucional – presente na Constituição de 1988, por

exemplo, que teria atribuído amplos poderes ao Judiciário –, muito mais do que o

resultado de uma “vontade” dos tribunais de intervirem.9 No entanto, ainda não

está muito claro se a formatação de competências e as formas de acesso às

instâncias decisórias garantidas na Constituição Federal devam ser encaradas

como uma das causas da judicilização, ou apenas uma de suas condições

facilitadoras (ou necessárias). É possível que, no presente trabalho, sejam

encontrados dados que apontem para um ou outro sentido.

Longe de tentar justificar a filiação do presente trabalho a um autor ou

uma corrente teórica definida, o que se procurou fazer nos tópicos seguintes é

justamente apresentar as linhas mestras que a equipe de pesquisa julgou

relevantes para caracterizar, ainda que de modo um pouco precário (ante às

dificuldades de conceituação apontadas acima), possíveis maneiras de acessar o

fenômeno da “judicialização da política” com vistas à realização de uma pesquisa

empírica. Essas linhas constituem uma espécie de marco teórico, em função do

qual a presente pesquisa foi concebida e executada.

Esse marco é construído a partir de duas preocupações centrais: Em

primeiro lugar, considerando a primeira idéia freqüentemente associada à

judicialização – de que se trata de uma expansão do exercício do poder

jurisdicional –, qual a melhor maneira de pesquisar o Judiciário de maneira a

caracterizar sua atuação (supostamente expansiva) frente aos demais Poderes?

Em segundo lugar, considerando a segunda idéia freqüentemente associada à

judicialização – de que ela representaria uma espécie de anomalia institucional –,

o que uma pesquisa empírica pode dizer sobre a legitimidade democrática das

decisões do Judiciário? A exposição clara dessas preocupações e da postura

adotada pela equipe de pesquisa diantes destas, é condição necessária para

compreensão das escolhas feitas ao longo do processo de desenho da pesquisa. 9 Este ponto é o argumento central de Carvalho (2010); também Oliveira, 2005, ao afirmar que a judicialização compreende o processo de acionamento do Judiciário, já que este não age por iniciativa própria. De modo contrário, ainda há alguns autores (como Castro, 1997) que destacam como causa do fenômeno a pró-atividade dos tribunais na definição das questões sobre as quais devem intervir.

17

II.3.1 Interação entre Poderes e protagonismo do Judiciário Como visto nos tópicos anteriores, uma idéia subjacente à noção de

“judicialização da política” é a de um protagonismo dos órgãos do Poder

Judiciário na definição de questões de grande relevância nacional, referidas, de

um modo geral, como questões de natureza política, em razão da legitimação

democrática que demandam. Alguns autores chegam mesmo a indicar como

exemplo dessas questões a definição de políticas públicas (tais como saúde,

educação etc.).

Dessa forma, reputa-se razoável partir da premissa de que um estudo

empírico sobre “judicialização da política” deve necessariamente reservar um

espaço de destaque para a produção de dados que possam esclarecer a dinâmica

das relações entre os Poderes, de modo a permitir que se faça uma leitura da

realidade com vistas a definir: (i) o que seria protagonismo do Judiciário? (ii) O

Judiciário brasileiro é de fato protagonista? (iii) Em caso afirmativo, ele não

poderia, nem deveria ser? O presente trabalho, como dito, não pretende

esclarecer de modo peremptório todas essas questões complexas. Ele tem a

finalidade apenas de fornecer informações e subsídios para outros trabalhos que

tentem enfrentar e responder essas perguntas.

A despeito das dificuldades anteriormente apontadas acerca da

caracterização do que seriam questões essencialmente políticas como um âmbito

temático ou locus propício para a ocorrência do fenômeno da judicialização (cf.

II.2, supra), a presente pesquisa procurou evitar tais problemas por meio da

seguinte escolha: tratar exclusivamente de ações envolvendo controle de

constitucionalidade.

Por mais que seja problemático o conteúdo semântico da “judicialização

da política”, parece razoável assumir que problemas de ordem constitucional

(ainda que não em todos os casos) possam, em geral, serem caracterizados

como questões de natureza política. Dessa forma, em relação ao recorte

adotado, acredita-se que, por mais que muitos casos relevantes para a

“judicialização” fiquem de fora10, ele abarca uma parte expressiva das questões e

problemas levados ao STF que tenham, em grande medida, a configuração de

disputas políticas. Em outras palavras, parte-se da premissa de que o controle de

10 Ao mesmo tempo em que outros casos, sem relações diretas com a idéia de “judicialização” e interação de poderes sejam incluídos.

18

constitucionalidade seria um âmbito privilegiado para observação da interação

entre Poderes e, por conseguinte, também do suposto fenômeno da

“judicialização da política”.

Tendo isso em mente, ainda que uma definição fechada e acabada do

que seria tal fenômeno esteja distante das perspectivas deste trabalho, pode-se

dizer que esta pesquisa se estrutura a partir de duas perguntas principais. Em

primeiro lugar, quem acessa o STF e quais questões são levadas à sua

apreciação e deliberação. Em segundo, como decide o STF. Essas perguntas

representam, na verdade, as duas pontas de todo processo jurídico, quais sejam,

o pedido e a resposta da jurisdição.

O palpite (e a aposta!) da presente pesquisa é justamente o de que a

judicialização, enquanto um fenômeno circular, implica a provocação do STF, por

meio do ajuizamento de uma demanda, que, no caso, trata-se de um pedido de

declaração de inconstitucionalidade.11 Por outro lado, a circularidade estaria no

fato de o STF poder reagir à demanda que lhe é proposta. Como estamos no

âmbito do controle de constitucionalidade, inevitável reconhecer, aqui, que um

dos problemas tocados é justamente o da relação entre o Judiciário e os demais

Poderes, que terão sua produção normativa controlada pelo STF.

Olhar para a a figura central do conceito que ora se debate (o Poder

Judiciário), procurando entender sua forma de raciocínio argumentativo e como

essas questãos são enfrentadas nos votos dos ministros, na fundamentação de

suas decisões, é essencial para caracterizar o fenômeno. Como será visto mais

adiante, uma das maneiras de se fazer isso é justamente observando a

argumentação do tribunal ao, por exemplo, delimitar sua própria competência e

reagir à provocação de terceiros. Nessa tarefa, acreditamos que a expertise de

juristas pode ser muito útil.

É preciso deixar claro que a pesquisa não se compromete com uma

caracterização acabada da chamada “judicialização”. O exercício do poder

jurisdicional é visto no contexto de nada mais que um processo de demanda e

resposta – um processo circular, pois a resposta da jurisdição vai influenciar os

11 No caso da ADC, o pedido é inverso, sendo que o que se pretende é a confirmação da constitucionalidade de um texto normativo, a fim de que cessam as dúvidas sobre a aplicabilidade do ato impugnado. Por outro lado, no caso da ADPF, o pedido é para que determinada situação ou ato normativo, que por ser anterior à promulgação da Constituição Federal não pode ser declarado inconstitucional, seja declarado incompatível com a constituição (i.e., declaração de não haver sido por ela recepcionado).

19

tipos de pedidos feitos, e vice-versa. É nesse sentido que a presente pesquisa

buscou dados para elucidar a interação entre os Poderes, que estaria atuando

como suposto protagonista na tomada de decisões de caráter

predominantemente político.

Nesse sentido, a proposta é entender o que ocorre no interior de tal

processo, e não somente nas pontas. A rigor, portanto, a ideia de judicialização

não é ela mesma um conceito-chave para a realização da pesquisa – poder-se-ia

simplesmente falar em um estudo do processo decisório do Supremo Tribunal

Federal. No entanto, como o texto a ser desenvolvido pretende deixar claro (cf.

tópico II.3.3, infra), uma pesquisa desenhada nesses termos cumpre um papel

claro na discussão teórica sobre o termo.

II.3.2 Potenciais democratizantes no STF Outro elemento da discussão presente nos textos e também no debate

sobre a “judicialização da política” diz respeito aos impactos que o fenômeno

poderia ter sobre a legitimidade democrática das escolhas e decisões

fundamentais a serem tomadas no país. Caso se considere, como visto nos

tópicos anteriores, que a judicialização pode ser traduzida na idéia de

protagonismo judicial na definição de questões públicas de grande alcance

nacional, essa decisão (ou conjunto de decisões) deve responder a uma

demanda por legitimação democrática, dado a natureza política das questões

envolvidas.

Essa preocupação com a legitimação das escolhas políticas, por estar

imbricada com o debate acerca da “judicialização da política”, não ficou de fora

do espectro de análise da presente pesquisa. Não por outra razão, a idéia de

mapear os potenciais democratizantes da atuação do Supremo Tribunal Federal

se faz presente como um dos elementos do marco teórico adotado no âmbito da

presente pesquisa.

A idéia de potenciais democratizantes perpassa, enquanto um dos eixos

componentes do marco teórico que forjou a concepção da presente pesquisa, a

análise da “judicialização” enquanto processo, permitindo que se observem os

diversos canais de abertura do STF para a sociedade civil, bem como seus limites

e alcance, não apenas no momento em que o Tribunal é provocado para se

20

manifestar sobre determinada questão, mas também durante as sucessivas

etapas de construção de uma decisão.

II.3.3 Onde situar a presente pesquisa Partindo da noção geral, apresentada pela literatura, do que seria

“judicialização da política”, qual seja, a de que o Judiciário desempenha um papel

de destaque na definição de questões complexas como políticas públicas – idéia

tratada como fio-condutor para grande parte da literatura especializada, ainda

que não isenta de críticas–, é possível identificar três diferentes enfoques ou

linhas de pesquisa específicas para tratar do tema.

A seguir, busca-se identificar essas linhas, relacionando-as com algumas

abordagens feitas até aqui em trabalhos acadêmicos sobre o tema, bem como

procurando indicar qual linha guarda mais afinidade com a presente pesquisa.

Note-se que, com isso, não se pretende construir uma tipologia exaustiva da

literatura sobre “judicialização da política”. Afinal, é possível que vários trabalhos

e autores possam se situar dentro de mais de uma tendência, ou mesmo que

não possam ser identificados com nenhuma delas. A finalidade desta

identificação é apenas a de mostrar quais são os possíveis espaços de discussão

do conceito, de modo a apontar também com mais clareza o espaço que esta

pesquisa pretende ocupar.

Uma primeira tendência da literatura parece estar preocupada em

identificar (i) fatores causais e conseqüências da expansão do poder jurisdicional

e do aumento da litigância, ou a ela correlacionados. Nesse sentido, alguns

trabalhos procuram apontar mudanças institucionais que vieram com a

democratização do país – e.g., a coletivização do processo, aumento de

competências do Ministério Público e a própria Constituição de 1988, ao trazer

direitos sociais e amplas prerrogativas para o Judiciário – ou, no contexto mais

global, com o advento do Estado de Bem-Estar Social. Em parcela desses

trabalhos, parece haver também uma avaliação negativa do modelo institucional

que decorre de tais mudanças, mas não é possível afirmar a existência de um

consenso a respeito dessa leitura.

Alguns trabalhos que parecem estar associados a essa primeira tendência

são Arantes (1997), Castro (1997), Carvalho (2010), Faria (2004), Ferreira Filho

21

(1995), Lobato (2001), Sadek (1996), Taylor e Da Ros (2008), Verbicaro (2008),

Vianna et alii (1999), Vianna e Burgos (2007) e Yepes (2007).

A segunda tendência encontrada na literatura sobre judicialização é a que

busca a idéia de judicialização para (ii) construir uma leitura própria da questão

a partir de um recorte delimitado de problemas e temáticas específicas. Em

outras palavras, esses trabalhos procuram investigar a existência ou não do

processo de judicialização dentro de áreas temáticas específicas – ou mesmo

lançam mão da expressão para tentar explicar a realidade do que ocorre em

áreas ou sub-áreas específicas.

Nesses estudos, geralmente é trabalhado o conceito mais genérico de

judicialização, i.e., o da expansão do poder jurisdicional para áreas antes

adstritas a outros espaços decisórios. Nesse sentido, fala-se, por exemplo, em

judicialização da saúde (Chieffi/Barata, 2009; e Vieira/Zucchi, 2007) e

judicialização da política externa (Couto, 2004; e Engelmann, 2007).

Por fim, a terceira tendência identificada é aquela que procura trabalhar o

conceito de judicialização a partir da perspectiva interna ao Poder Judiciário,

tendo como (iii) foco prioritário de análise o processo decisório e a participação

dos diversos atores que buscam de alguma forma influenciá-lo. Nesse processo,

importam diversas variáveis, tais como as motivações e a fundamentação técnica

desenvolvida pelos órgãos judiciais, bem como o papel desempenhado pelos

atores envolvidos.

Aqui, refere-se tanto àqueles atores que provocam o Judiciário a decidir

sobre determinada questão com viés político, quanto àqueles que procuram

influenciar os tribunais e juízes durante o processo, como terceiro interveniente,

amici curiae ou palestrante em audiência pública, por exemplo.

Neste ponto, trata-se de investigar não apenas se decisões judicias têm

impacto sobre questões “políticas” (output), mas também se e como os juízes e

ministros tratam esse tipo de questão e os dilemas que envolvem uma decisão

sobre temas “politicamente sensíveis”. É nesse sentido que Carvalho (2004)

ressalta a necessidade de discutir o conceito de judicialização não se atendo

somente ao caráter procedimental (o simples aumento do numero de processos),

mas também ao caráter substancial do processo, i.e., tentando investigar qual o

22

papel que o Judiciário se avoca e como ele lida com as dificuldades inerentes à

função que pretende desempenhar.12

Essa tendência parece estar relacionada a uma reação, especialmente da

literatura de ciência política, à vulgarização do conceito, entendendo-se que há

uma “fluidez” no uso da expressão (Maciel e Koerner, 2002). Como trabalhos que

se colocam nessa tendência podem ser citados Carvalho (2004), Maciel/Koerner

(2002), Oliveira (2005), Veríssimo (2008), Marchetti/Cortez (2009) e Taylor

(2005; 2007).

O trabalho proposto por esta pesquisa está mais afeito a essa terceira

tendência. Isso significa que não se pretende fazer um estudo das causas e

efeitos da judicialização, apontando possíveis benefícios ou prejuízos do processo

na sociedade atual. Também não se trata de aplicar o conceito no estudo de um

tema específico (como direito à saúde ou educação, e.g.). A idéia, aqui, é levar a

sério a proposta da linha de análise segundo a qual os processos de

judicialização só serão adequadamente compreendidos com a abertura da “caixa

preta” do Judiciário (Taylor, 2005). Mais do que a judicialização, julga-se

relevante compreender como e com base em quais fundamentos um dos três

Poderes da República – aquele que tem a decisão em última instância – julga

temas que em algum medida dizem respeito também aos outros Poderes.

Aqui, é necessário fazer uma ressalva. Dizer que a proposta de pesquisa

está relacionada a essa terceira tendência não significa adotar os modelos

analíticos propostos pelos autores citados. Além disso, não se pretende elaborar

um novo conceito de judicialização a partir das eventuais falhas dos conceitos

hoje existentes.

Mais do que categorizar e explicar analiticamente a atividade do Poder

Judiciário – à semelhança de alguns trabalhos de ciência política analisados –, o

objetivo aqui é apontar algumas maneiras de investigação dessa atividade que

permitam mostrar a visão de um tribunal de cúpula sobre a interação entre os

Poderes, além de eventuais déficits de legitimidade, bem como potenciais

democratizantes que se fazem presentes ao longo desse processo.13

12 Independentemente de uma avaliação se esse papel é ou não juridicamente legitimado em face do desenho institucional traçado na Constituição Federal de 1988. 13 Nesse sentido, a pesquisa aplicada ora proposta aponta para a necessidade de um exercício de imaginação institucional que teorize sobre o funcionamento apropriado das instâncias decisórias sob um viés normativo localizado dentro do marco do estado democrático de direito.

23

Para isso, não é suficiente trabalhar apenas com o resultado da atividade

jurisdicional, i.e., com o binômio “intervém/não intervém”, extraído das decisões

judiciais. É preciso avaliar a complexidade do processo decisório jurídico como

um todo, que abarca uma multiplicidade de instrumentos à disposição de uma

multiplicidade de atores, e cujo resultado nem sempre se permite situar nos

extremos do binômio acima apontado.

Nesse sentido, para abarcar essa complexidade no âmbito do Supremo

Tribunal Federal, buscou-se: (i) caracterizar as demandas que lá chegam, tanto a

partir de uma tipologia propriamente jurídica dos temas que mais suscitam

questionamentos, quanto a partir de uma tipologia dos próprios atores que

demandam;14 (ii) no que se refere à resposta dada pelo Tribunal, considerar os

significados diversos que podem ter uma liminar, uma decisão de mérito ou uma

decisão que extingue o processo, e qual impacto cada tipo de decisão pode ter

sobre diferentes tipos de atos normativos.15

Para além disso, quando se desce aos detalhes do processo decisório, é

possível perceber que o impacto das decisões do STF nos demais poderes e na

sociedade civil pode variar a depender das técnicas de julgamento empregadas

(e.g., modulação de efeitos da decisão e interpretação conforme a constituição),

bem como do procedimento decisório do tribunal (e.g., realização de audiência

pública e possibilidades de ingresso de amici curiae).

O tópico a seguir é dedicado a detalhar como se deu a execução do

presente trabalho, tendo em vista as considerações feitas acima a respeito dessa

espécie de marco teórico, a partir do qual a pesquisa foi concebida e traçada. A

esse relato foi dado o nome de desenho da pesquisa.

II.4 Desenho da pesquisa A presente pesquisa pretende fornecer um panorama do controle de

constitucionalidade, tanto repressivo quanto preventivo, exercido pelo STF.

Quanto ao controle de constitucionalidade repressivo, optou-se, em um primeiro

momento, por se trabalhar com o controle concentrado-abstrato, tendo sido

possível construir um banco de dados o mais exaustivo possível, por meio da

catalogação completa dessas ações no sítio do STF na internet. 14 Aqui, deve-se ter em mente, por exemplo, que os atores da sociedade civil legitimados para a propositura de ações de controle de constitucionalidade (como entidades de classe e sindicatos) não formam um grupo homogêneo. 15 Cf., a respeito, as considerações feitas no tópico V.II, infra.

24

Esse recorte abrange, portanto, as Ações Diretas de Inconstitucionalidade

(ADI), as Ações Diretas de Constitucionalidade (ADC), e as Argüições de

Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), propostas perante o STF

entre 1988 e julho de 2010, questionando a constitucionalidade de atos

normativos emanados do Legislativo (Congresso Nacional) e Executivo federal.

Dessa forma, foram excluídas as decisões em sede de Recursos Extraordinários

(RE) e Mandados de Segurança (MS), nas quais, em geral, é proferido um juízo

de constitucionalidade para o caso concreto, e em caráter incidental.

A escolha por trabalhar apenas com as ações do controle repressivo

concentrado-abstrato se justifica diante da necessidade de trabalhar com dados

exaustivos por meio do instrumental do sítio do STF na internet, em que todas

essas ações estão devidamente catalogadas e identificadas. De modo diverso, o

tribunal não fornece uma base segura para coleta de dados relativos ao controle

exercido incidentalmente em recursos regulares (como RE e MS). Necessário

fazer a ressalva, entretanto, de que o estudo do controle preventivo de

constitucionalidade foi feito somente com base em decisões proferidas em sede

de MS, único meio legítimo admitido pelo STF para esses casos (cf. III.2, infra).

No que se refere ao controle repressivo, optou-se por trabalhar com dois

grupos de ações: aquelas que questionam atos originários do Poder Legislativo

Federal e aquelas que questionam atos originários do Poder Executivo Federal.

Tal recorte justifica-se pelo fato de ser o controle de constitucionalidade uma das

atividades institucionais que mais claramente se coloca na fronteira entre os

Poderes, fazendo com que seu estudo possa fornecer importantes subsídios para

o estudo da separação de Poderes como algo que é supostamente afetado pela

chamada “judicialização da política” (cf. item II.3.1, supra).

Quando se fala em panorama, entretanto, tem-se um tipo de análise

mais afeita aos estudos quantitativos, por meio do qual é possível, e.g., apurar

os motivos da extinção sem julgamento de mérito (algo que está ligado à “auto-

limitação” do Tribunal, à sua decisão de não decidir, por meio da ausência de

resposta).

No entanto, conforme explicado logo abaixo (II.4.2, infra), não é viável

apontar, por meio desse tipo de estudo, as inúmeras variáveis que aparecem em

toda a extensão do processo decisório, especialmente aquelas que aparecem em

seus detalhes, como apontado na conclusão da seção anterior. Assim, para além

25

do panorama acima descrito, também foi feita uma pesquisa exploratória de

novos procedimentos e técnicas que começam a aparecer no processo decisório

do STF.

Para tanto, escolheu-se analisar determinados casos de ampla

repercussão, inclusive na mídia, que foram considerados como ilustrativos do

fenômeno de “judicialização da política” no Tribunal ou de ativismo judicial. Tais

casos trazem questões diretamente relacionadas às variáveis mencionadas,

como será visto logo adiante.

Com as observações dos tópicos seguintes, pretende-se deixar claro que

o desenho da pesquisa origina-se da identificação, na literatura, de um campo no

qual os juristas podem fazer contribuições mais acuradas. Se a judicialização é

entendida como processo de demanda e resposta, i.e., nos termos da estrutura

do próprio processo jurídico, há várias contribuições que o estudo do Direito

pode fazer para o entendimento desse processo, cujas peculiaridades internas

ainda não foram detalhadas pela literatura analisada. Enxergar as possibilidades

que existem em tal processo é uma maneira de identificar os espaços de

democratização, assim como déficits de legitimidade, existentes no fenômeno da

judicialização.

II.4.1 Análise quantitativa: o que chega e o que faz o STF O presente trabalho é dividido em duas partes. A primeira consiste em

uma análise de cunho quantitativo do controle de constitucionalidade preventivo

(durante o processo legislativo no Congresso Nacional) e repressivo (após a

edição do ato normativo pelo Executivo e pelo Legislativo), realizada com base

dados coletados e trabalhados a partir das informações oficiais, disponíveis no

sítio do STF na internet. A construção de dois bancos de dados – um relativo ao

controle de constitucionalidade de atos do Legislativo, e outro, para o Executivo

federal – é descrita com maiores detalhes no Capítulo III, infra.

Como será visto, esses dados foram coletados e analisados tendo em

vista os dois eixos propostos como marco teórico do presente trabalho: a

interação entre Poderes; e os potenciais democratizantes do STF (cf. item II.3,

supra). A partir das perguntas centrais para esta pesquisa – “quem acessa o

STF?”, “o que é levado a ele?” e “Como decide o STF?” –, essas informações

26

coletadas foram divididas em dois grupos, cada um abrangendo diferentes

variáveis.

No primeiro grupo, chamado de fatores de entrada, encontram-se

informações que dizem respeito aos elementos que caracterizam a demanda que

é levada ao STF. Aqui, esses dados podem ilustrar a “judicialização da política”

entendida não apenas como um aumento da demanda judicial (dados como a

distribuição temporal e periodização das ações propostas ajudam a lançar luz

sobre essa tese), mas também como uma mudança qualitativa dessa demanda

(cf. item II.3.1, supra).

Isso porque as informações e hipóteses levantadas permitem caracterizar

o perfil de quem acessa o STF (tipo de demandante), quais os assuntos mais

recorrentes no controle concentrado de constitucionalidade (temas das ações), e

com que velocidade essas questões emergem da arena política (Congresso

Nacional e Executivo) para serem judicializadas.16

Ademais, essas informações também podem auxiliar na investigação da

presença de potenciais democratizantes no controle de constitucionalidade

brasileiro, haja vista que permitem caracterizar o perfil dos demandantes que

acessam o STF – constitucionalmente legitimados (art. 103, da Constituição

Federal) para provocar o controle concentrado de constitucionalidade –, bem

como o tipo de questão e os problemas que levam ao tribunal.

Sob esse aspecto, também relevante frisar que é o próprio STF quem

confere maior abertura ou restritividade no acesso ao controle concentrado de

constitucionalidade, já que ele mesmo fixa os parâmetros e critérios para aferir a

legitimidade de sindicatos, associações e entidades de classe (pertinência

temática). Dados sobre essa abertura à sociedade civil também são

apresentados no item V.1.2, infra.

O segundo grupo de informações analisadas, chamado de fatores de

saída, procura dialogar com a tese de que a “judicialização da política” diz

respeito não somente ao tipo de demanda judicializada, mas também à forma

com que o STF reage à demanda que lhe é proposta (cf. item II.3.1, supra). Em

outras palavras, esses dados podem esclarecer melhor se e como o STF tem se

16 Por judicialização, aqui, entende-se o simples ato de propor uma demanda judicial (no caso, tendo por objeto o controle concentrado de constitucionalidade de um ato normativo).

27

mostrado mais ou menos “interventivo”17 ao controlar a atividade normatizante

atribuídas constitucionalmente ao Legislativo e, em algumas hipóteses, também

ao Executivo federal.

Destacam-se, neste ponto, não somente os dados sobre o julgamento

final de mérito (ações julgadas procedentes, parcialmente procedentes ), mas

também acerca das ações que foram extintas sem julgamento de mérito (aquilo

que “ficou pelo caminho”, i.e., ações que não obtiveram uma resposta

jurisdicional formal). Além disso, há espaço para discutir a importância que as

decisões em sede de liminar tiveram no controle de constitucionalidade brasileiro

(inclusive levantando hipóteses sobre as reações que os resultados liminares

produzem nos demandantes e no Poder demandado), e as razões pelas quais

essas decisões provisórias estão em movimento descendente, diminuindo sua

participação dentre as decisões do STF cada vez mais.

Tendo em vista o número bastante reduzido de acórdãos encontrados

relativamente ao controle preventivo, este é admitido apenas excepcionalmente

pelo STF, como será visto. Dessa forma, sua análise, ainda que pudesse ser

estruturada da mesma maneira que a concebida para o estudo do controle

repressivo, encontra-se destacada no Capítulo IV, e concentra tanto um exame

de enfoque quantitativo, aqui chamada de análise descritiva (IV.1, infra), quanto

uma análise qualitativa da argumentação desenvolvida pelos ministros nesses

casos, aqui chamada de análise do entendimento do STF (IV.2, infra).

II.4.2 Análise qualitativa: onde encontrar a judicialização? O Capítulo VI é dedicado a uma análise qualitativa das decisões

proferidas pelo STF em sede de controle de constitucionalidade. Como adiantado

anteriormente (cf. II.2, supra), esta análise foi precedida da constatação de que

um mero estudo quantitativo do controle de constitucionalidade talvez não

pudesse dizer muito sobre aquilo que normamente se identifica como

“judicialização da política” no Brasil.

17 Deve-se tomar o cuidado, aqui, de entender “interventivo” não como um juízo de valor negativo, como se o STF estivesse agindo fora de suas prerrogativas constiitucionais, ou mesmo que ao julgar uma lei inconstitucional não tome sua decisão com base em parâmetros objetivos. Para todos os efeitos, a idéia de um STF “interventivo”, no presente trabalho, é usada tão-somente para designar o fato de que estatisticamente (ou quantitativamente) o STF tem barrado mais ou menos a produção normativa dos demais poderes.

28

Essa conclusão está resumida no tópico V.3, infra, e tem como base a

seguinte informação: ainda que seja feita a ressalva de que se trata apenas de

casos de controle de constitucionalidade de atos do Executivo e Legislativo

federais, fato é que, ao menos do ponto de vista quantitativo, em menos de 10%

do total de casos analisados há uma efetiva “intervenção” do STF, ao julgar

procedente uma ADI e declarar inconstitucional um ato normativo produzido pelo

Legislativo ou Executivo, como será visto oportunamente (cf. V.2, infra).18

De maneira geral, pretende-se apontar para uma nova agenda de

pesquisas dentro da ampla temática da “judicialização da política”, além de

oferecer uma contribuição consistente para o debate, utilizando a expertise da

equipe de pesquisa em análise de argumentação jurídica desse tipo. Em termos

mais concretos, o objetivo da análise empreendida é observar do ponto de vista

qualitativo as variáveis internas ao processo decisório do Tribunal. Para tanto, foi

preciso descer ao nível argumentativo dos votos dos ministros para observar

como o tribunal como um todo se situa no contexto da interação entre os

poderes entre os Poderes.

Muito embora possa parecer trivial, à primeira vista, que o exercício do

controle de constitucionalidade pelo STF consista em barrar (por meio da

declaração de inconstitucionalidade) leis e demais atos normativos federais e

estaduais considerados incompatíveis com a constituição – tarefa muitas vezes

traduzidas na idéia de legislador negativo (Pinheiro, 2009: 20) –, há diversos

casos nos quais as decisões do tribunal deixam de se situar em extremidades

opostas (a exemplo do binômio procedente/improcedente), e passam a adentrar

uma espécie de zona cinzenta.

Isso acontece, por exemplo, quando o tribunal, para não declarar a

inconstitucionalidade de uma lei, decide “salvar” o trabalho do legislador e

enuncia aquela que, no seu entender, seria a única interpretação

constitucionalmente possível de determinado texto normativo. Trata-se daquilo

que a teoria jurídica costuma dar o nome de interpretação conforme a

constituição, e que muito difere da noção clássica do STF como mero legislador

negativo que simplesmente extirpa do ordenamento jurídico as normas

inconstitucionais (Bonavides, 2001: 247-49).

18 Trata-se de número relativamente baixo se considere a judicialização como um aumento (numérico) dos casos em que o Judiciário intervém no trabalho dos demais poderes.

29

Independentemente da postura crítica que se possa ter diante de uma tal

técnica decisória (Silva, 2006: 203-05), fato é que questões como a relação

entre os Poderes e o papel que o STF se avoca em situações como no exemplo

acima, permitem ser melhor compreendidas em uma análise qualitativa da

argumentação desenvolvida pelos ministros. Isso porque, caso consideremos

decisões desse tipo apenas por seu output, traduzido no binômio ação julgada

procedente/improcedente, informações como esta são facilmente perdidas.19

Dessa forma, procurou-se investigar, dentre as distintas técnicas

decisórias de que tem lançado mão (e.g., modulação de efeitos, interpretação

conforme a constituição, etc.), como o tribunal, enquanto última instância do

Poder Judiciário e intérprete privilegiado da constituição é o único (em princípio)

capaz de controlar sua atividade, fixando os limites e o alcance de suas próprias

prerrogativas. Essa discussão, invariavelmente, toca a problemática da interação

entre os Poderes, conforme será visto oportunamente.

Além disso, a análise qualitativa também se relaciona a outro dos eixos

de análise proposto no marco teórico (cf. II.3.2, supra). Um dos potenciais

democratizantes da atividade do Supremo consiste na possibilidade, prevista em

lei20, de que entidades de classe, especialistas em assuntos técnicos e

representantes de partes com interesses antagônicos em determinada questão

constitucional participem, em alguma medida, dos trabalho do STF.

Essa abertura do tribunal tem se dado por meio de dois institutos

específicos: os amici curiae e as audiências públicas. Como será visto, a lei

delegou ao próprio tribunal a definição de questões como procedimento para

requerer e a decisão sobre a pertinência, em cada caso, da participação de

atores da sociedade civil como amici curiae ou palestrante em audiência pública.

Aqui, mais uma vez por meio da análise qualitativa, buscou-se avaliar como o

tribunal tem lidado com a questão da abertura à sociedade civil, vista como um

fator com potencial de agregar legitimidade democrática para suas decisões.

19 Não raro, os ministros optam por conferir uma interpretação conforme ao dispositivo normativo impugnado, e julgam a ação improcedente ou parcialmente procedente (ou negam provimento ao recurso). Cf., por exemplo, a ADI 442/SP, Rel. Min. Eros Grau, J. 14.04.2010; e ADPF 46/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, J. 05.08.2009, e item VI.1, infra. 20 Lei nº 9.868/99, art. 7º, § 2º, e art. 9º, § 1º; e Lei nº 9.882/99, art. 6º, § 1º.

30

III. Nota metodológica: recorte e seleção de dados

Neste tópico, expõe-se como foram construídos os três bancos de ações

usados nesta pesquisa para a realização do mapeamento do controle de

constitucionalidade proposto. São: (i) o banco das ações de controle de

constitucionalidade concentrado que questionam atos normativos com origem no

Poder Executivo federal; (ii) o banco das ações de controle concentrado que

questionam atos normativos com origem no Poder Legislativo federal; (iii) o

banco das ações de controle preventivo de constitucionalidade.

Como será adiante exposto, os dois primeiros – que se referem ao

controle repressivo de constitucionalidade – são exaustivos, abarcando todo o

universo de análise, enquanto o último pretende ser uma amostra apenas

representativa. Como será visto mais adiante, a segunda parte do presente

trabalho (análise qualitativa) não foi realizada com base nos casos selecionados

para composição desses três bancos abaixo descritos, tendo observado a um

critério de seleção amostral, por razões que serão expostas oportunamente (cf.

Capítulo VI, infra).

III.1 Ações de controle repressivo de constitucionalidade

III.1.1 Levantamento de dados A coleta de dados para a construção dos bancos de ações de controle de

constitucionalidade repressivo partiu primordialmente de um levantamento

anterior feito em pesquisa realizada no âmbito da instituição proponente,

levantamento este que contemplava todas as ações de controle de

constitucionalidade concentrado21 distribuídas no STF no período compreendido

entre 05/10/1988 e 21/07/2009 e cujo objeto de questionamento eram normas

federais ou atos normativos que tenham tido origem no Poder Executivo.22

A partir desses dados já coletados, foram construídos dois bancos: um

banco para as ações de controle de constitucionalidade concentrado que

questionam atos normativos com origem no Poder Executivo federal e outro

21 ADI (ações diretas de inconstitucionalidade), ADPF (argüições de descumprimento de preceito fundamental) e ADC (ações diretas de constitucionalidade). 22 desenvolvida no âmbito do Projeto Pensando o Direito, da Secretaria de Assuntos Legislativos/Ministério da Justiça (Convocação nº 002/2009), com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Volume #30, Série Pensando o Direito, disponível em: http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={DFCCBE36-4D36-4650-B6DA-E68546FD1E4E}.

31

contendo as ações de controle concentrado que questionam atos normativos com

origem do Poder Legislativo federal.

Para tanto, as atividades desempenhadas pela equipe de pesquisa

compreenderam basicamente a execução de três tarefas fundamentais: (i)

seleção e coleta de novas ações de controle concentrado que questionem atos

originários do Poder Executivo, ajuizadas entre 21/07/2009 (data de

encerramento da coleta do levantamento anterior) e a data de 31/07/2010,

escolhida como marco final para elaboração dos bancos de dados; (ii) a

verificação e atualização das informações colhidas no banco anterior,

especialmente aquelas que dizem respeito à modificação do status das ações que

aguardavam julgamento; (iii) seleção e coleta de ações de controle concentrado

que questionem atos originários do Poder Legislativo, de 1988 até a data limite

de 31/07/2010.

O site do STF apresenta-se como nossa principal ferramenta de pesquisa,

assim, foi necessário lidar com as limitações das informações disponíveis

eletronicamente e das fichas de acompanhamento processual. Isso se justifica

tendo em vista o caráter público dos dados ali disponíveis, bem como as

limitações para coleta e seleção in loco dos casos a serem analisados.

Para a realização do levantamento, partiu-se dos dados encontrados em

“quadros-resumo” das ações, elaborados pelo próprio tribunal, que podem ser

acessados por meio da ferramenta de busca disponível no endereço

http://www.stf.jus.br/ portal/peticaoInicial/pesquisarPeticaoInicial.asp.23 Nem

todas as ações protocolizadas e distribuídas possuem esse tipo de cadastramento

no site, por isso, um grupo de ações cujas informações não estão disponíveis

eletronicamente não pode ser considerado no presente levantamento.24 A

pesquisa foi feita pelo número das ações, em ordem crescente a partir da última

ADI, ADC ou ADPF verificada no levantamento anterior.25

Na atualização do banco de ações que questionam atos do Executivo

federal, foram encontradas 55 novas ações, 6 das quais questionando atos 23Um exemplo de quadro-resumo pode ser visualizado em: http://www.stf.jus.br/portal/ peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=994&processo=994. Acessado em 13.set.2010. 24 Alguns exemplos de ações que se encaixam nesse grupo são ADI 4321-4328; 4336; 4339; 4340; 4341; 4349; 4385; 4390; 4404 e 4415 (dados de Outubro/2010). 25 Segundo o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, as ações de controle de constitucionalidade concentrado são numeradas em ordem crescente, de acordo com a ordem cronológica de sua entrada no Tribunal. Cf. RISTF, art. 55, inc. XXIII, disponível em:http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/legislacaoRegimento Interno/anexo/RISTF_agosto_2010.pdf. Acessado em 13.set.2010.

32

normativos editados por órgãos que compõem o Executivo federal (incluindo a

própria Presidência da República) e, portanto, relevantes para o banco em

questão. Dentre as 49 ações restantes, que questionavam leis ordinárias,

complementares e emendas constitucionais, cujo trâmite necessariamente passa

pelas duas casas legislativas federais, foi preciso identificar quais se originavam

de projeto de lei ou de proposta de emenda constitucional apresentada pelo

Executivo Federal. Os meios para obter estes dados foram os sites da Cãmara

dos Deputados e do Senado Federal.26

Em primeiro lugar, procuraram-se os “dados da norma” segundo o sítio

eletrônico da Câmara dos Deputados (Página Inicial > Atividade Legislativa >

Legislação > Detalhes da Norma). Em seguida, verificou-se a “proposição

originária” (Página Inicial > Atividade Legislativa > Projeto de Lei e Outras

Proposições), atentando-se para o campo autor, a fim de determinar se a lei

havia sido proposta do Executivo ou do Legislativo.

Cabe ressaltar que muitas vezes as proposições originárias citadas no site

do Senado e no da Câmara são distintas, de modo que se considerou como

origem o Executivo sempre que houver Medida Provisória anterior, ainda que

tenha havido propostas de emenda em uma das Casas do Legislativo. Isto

porque não seria possível saber a exata matéria da reforma, podendo não se

tratar do mesmo dispositivo impugnado via Judiciário.

Após este procedimento, concluiu-se que, das 49 ações propostas até

31/07/2010, questionando leis federais e emendas constitucionais, 24 envolvem

legislação cujo autor do projeto é o Executivo, as quais serão incluídas em nossa

análise. Somadas às 6 anteriormente identificadas, há 30 novas ações para o

banco de ações de controle concentrado de atos do Executivo.

Em relação à construção do banco de ações que questionam atos

originários do Legislativo federal, o procedimento foi análogo ao que foi feito na

análise da interação Judiciário-Executivo: a pesquisa pela origem do ato

normativo se deu diretamente nas páginas da Câmara dos Deputados e do

26 http://www2.camara.gov.br/ (Atividade legislativa – Legislação – Pesquisa Simplificada) e (Atividade Legislativa – Projeto de lei e Outras Proposições – Pesquisa pelo número da proposição); e http://www.senado.gov.br/ (Portal Legislação – Legislação Federal – Pesquisa Rápida).

33

Senado Federal acima citadas, por meio das quais se identificou o autor do

projeto como sendo membro de uma das casas legislativas da esfera federal.27

Seguindo essa trajetória de pesquisa, apurou-se que, dentre as 4.434

ADI, 215 ADPF e 28 ADC propostas, distribuídas e catalogadas no sítio do STF na

internet até 31.07.2010:

• 877 ações – aproximadamente 66% do universo de análise desta

pesquisa e 20% do total de ações no STF – dizem respeito ao controle de atos

normativos originados do Poder Executivo Federal.

• 458 ações – que correspondem a 10% do total de ações ajuizadas no

STF, e 34% do universo de análise desta pesquisa – versam sobre a produção

normativa com origem no Legislativo federal (Câmara dos Deputados, Senado

Federal, ou, designados conjuntamente, Congresso Nacional).

Necessário esclarecer que foram considerados atos originários do

Executivo federal, além das normativas que ele tem competência para editar,

como resoluções e portarias, também os projetos de lei e propostas de emenda

constitucional de sua iniciativa, bem como projetos de lei de conversão de

Medidas Provisórias. Da mesma forma, foram exclusivamente considerados atos

originários do Poder Legislativo federal aqueles cuja origem se encontra em

projeto ou proposta apresentada por Deputado ou Senador (quer da situação,

quer da oposição), assim como todas as resoluções do Congresso e decretos

legislativos. Essa distinção é necessária, tendo em vista que parte significativa da

produção normativa do Executivo federal também se submete ao processo

legislativo tradicional. 28

Como é de se supor, foram encontradas algumas ações que questionam

mais de um ato normativo, e que, portanto, pertenceriam a ambos os bancos

construídos. Optou-se, todavia, por se manter os bancos separados, para que

pudesse ser viabilizada a comparação proposta.

27 Cf. http://www2.camara.gov.br/ (Atividade legislativa – Legislação – Pesquisa Simplificada) e (Atividade Legislativa – Projeto de lei e outras proposições – Pesquisa pelo número da proposição). 28 É preciso destacar, ademais, que na seleção das ações que versam sobre atos normativos editados ou com origem no Poder Executivo federal, não se considerou que a sanção da lei ordinária ou complementar sinalizaria o endosso do Executivo ao projeto de lei a ele submetido após o trâmite regular nas casas legislativas. Isso porque, por mais que essa interação entre os poderes decorra necessariamente do próprio arranjo institucional do processo legislativo ordinário, a finalidade de coleta e produção desses dados e informações diz respeito única e exclusivamente à atividade normativa do Poder Executivo (e aos instrumentos que ele tem à disposição para inovar a ordem jurídica), bem como de que forma os demais atores envolvidos no processo reagem a essa atividade.

34

III.1.2 Grade de análise Para fazer o proposto panorama do controle de constitucionalidade

repressivo, foi utilizada, para ambos os bancos de dados, uma grade de análise

comum que apontasse para o que podem ser consideradas as principais variáveis

de análise da tramitação de uma ação de controle de constitucionalidade.

Essa grade de análise havia sido anteriormente desenvolvida para a

pesquisa já citada, cujo banco de dados foi atualizado no presente trabalho.29

Dessa forma, o que se propôs foi desenvolver os desdobramentos originais do

banco de dados já estruturado, cruzando algumas das informações coletadas

com novos elementos, pertinentes ao novo objeto de pesquisa.

As variáveis analisadas são divididas em dois grupos, de acordo com o

momento em que incidem na tramitação da ação pelo STF. Assim, fala-se em

fatores de entrada e fatores de saída.

Relativamente aos fatores de entrada, a preocupação central é

compreender como as demandas judiciais de controle de constitucionalidade

chegam ao STF, independentemente da resposta dada pelo Tribunal. Nesse

sentido, busca-se identificar e classificar as espécies de atos normativos que são

submetidas ao STF (atos normativos questionados); o perfil dos demandantes,

i.e., daqueles que acessam o STF (atores); quais são os temas e as questões

centrais discutidas; bem como o tempo decorrido entre a edição do ato e a data

de ajuizamento da ação.

Por outro lado, o que se denomina fatores de saída diz respeito àquelas

variáveis internas (imputáveis) ao Tribunal, ou seja, o tipo de resposta que o STF

oferece, e o momento em que ele a oferece (tempo de tramitação, quer

considerando a decisão proferida em sede de liminar, quer o momento em que o

STF decide definitivamente o processo).

Importante frisar, neste ponto, que, para efeitos do presente trabalho, a

resposta do STF não é considerada apenas aquela oferecida pelo tribunal em

uma decisão final, com julgamento de mérito. Assim, optou-se por considerar

como resposta do STF também os julgamentos de liminares. Isso porque, a

rigor, o que o tribunal faz ao apreciar um pedido de liminar é rever ou não o ato

normativo impugnado, muito embora o faça em caráter transitório (ou

retratável). Dessa forma, ainda que somente em termos de efeitos imediatos,

29 Controle de Constitucionalidade dos atos do Poder Executivo, op. cit..

35

não há que se falar em distinção entre a revisão do ato normativo na decisão de

mérito e em sede de liminar, suficiente para obstar uma análise conjunta desses

dois tipos de resposta oferecida pelo Supremo Tribunal Federal.

A aplicação da mesma grade de análise aos grupos de ações permite a

extração de dados e produção de gráficos comparativos entre a atuação do

Supremo perante a produção normativa dos Poderes Executivo e Legislativo.

Assim, é possível avaliar se a constitucionalidade dos temas discutidos no âmbito

dos demais Poderes é tratada de maneira semelhante ou distinta pelo STF e

pelos agentes que a ele têm acesso, a depender se o ato normativo questionado

tem origem no Legislativo ou no Executivo federal.

Em relação ao grupo de ações que questionam atos originários do

Executivo, além das análises comparativas baseadas nos fatores de entrada e de

saída, também foi realizado um estudo específico das ações que foram extintas

sem julgamento de mérito; e também das ações que questionam medidas

provisórias (MP). Como será visto, esses dois grupos de ações (das que

questionam MP; e das que foram extintas sem julgamento de mérito)

representam perfis predominantes no universo do controle de constitucionalidade

de atos originários do Executivo federal, o que justifica a análise aprofundada.

O estudo mais detalhado das ações extintas sem julgamento de mérito

fornece um mapa mais completo da relação entre Judiciário e Executivo, na qual

é marcante a ausência de decisão do Tribunal. Umas das perguntas relevantes

nesse campo de análise é justamente como e em quais circunstâncias

exatamente ocorre essa espécie de “inativismo”.

Em relação ao segundo ponto, o controle de constitucionalidade da figura

normativa da medida provisória, note-se que a melhor compreensão acerca de

suas peculiaridades é importante tendo em vista o contexto político e o desenho

institucional brasileiro, no qual este tipo de ato é uma das mais importantes

ferramentas legislativas à disposição do Poder Executivo, tendo em vista seu

alcance e força normativa equiparados aos da lei ordinária. O maior destaque

para a análise das ações que questionam MP justifica-se também frente à

constatação de que esse ato normativo é, dentre as possíveis formas de atuação

normativa do Poder Executivo Federal, segundo conclusões da pesquisa

anteriormente realizada, o que mais sofre questionamento no âmbito do STF.

36

Optou-se por expor essas duas análises mais detalhadas no texto que

discorre sobre os fatores de saída. Em relação à análise das ações extintas sem

julgamento de mérito justamente porque trata do detalhamento de um tipo de

resposta dado pelo STF. Em relação à análise das ações que questionam medidas

provisórias porque notou-se que as constatações mais interessantes sobre esse

grupo de ações envolviam justamente as variáveis concernentes aos fatores de

saída, como se mostrará adiante.

III.2 Ações de controle preventivo de constitucionalidade Na segunda etapa do estudo panorâmico sobre o controle de

constitucionalidade, a proposta foi investigar o entendimento do STF acerca da

apreciação prévia de constitucionalidade das normas, i.e., aquela que ocorre

ainda no momento do processo legislativo, sem que exista propriamente uma lei.

O controle se dá, então, sobre um projeto de lei ou uma proposta de emenda

constitucional. Para atingir esse objetivo, foram analisados qualitativamente os

acórdãos proferidos pelo Tribunal nos quais o controle prévio de

constitucionalidade esteja em questão.

O controle de constitucionalidade preventivo realizado pelo Supremo

Tribunal Federal é um objeto de pesquisa relevante para se analisar a interação

entre o Poder Judiciário e Poder Legislativo. Esse tipo de controle se distingue do

controle repressivo em razão do momento de apreciação da constitucionalidade,

que se dá, no caso do preventivo, antes da entrada em vigor do ato questionado.

Novamente, a principal fonte da equipe foi a página eletrônica do

Supremo Tribunal Federal na internet. Inicialmente, foi usada a ferramenta de

pesquisa de jurisprudência por meio de palavras-chave, na seção “pesquisa

livre”.30 Em pesquisa preliminar, haviam sido encontrados 13 acórdãos a partir

das palavras-chave “projeto adj2 legislativo”, “controle adj2 preventivo”,

“Comissão de Constituição e Justiça”, “Comissão de Constituição, Justiça e

Cidadania”, “CCJC”, “controle prévio” e “veto presidencial”, todos em mandados

de segurança.31 Posteriormente, foi realizada pesquisa com base em duas novas

palavras-chave, “mesa adj2 câmara” e “mesa adj2 senado”, com o objetivo de

encontrar todas as ações que teriam como parte esses dois órgãos ou seus

30 http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp 31 MS 20.257, MS 21.648, MS 21.754 AgR, MS 22.183, MS 22.503, MS 22.864 MC-QO, MS 23.047 MC, MS 24.041, MS 24.138, MS 24.642, MS 24.667 AgR e MS 27.931 MC

37

presidentes. Com base nesse segundo critério de pesquisa, foram encontradas

12 novas ações consideradas relevantes para o estudo, sendo 7 mandados de

segurança32, 2 ADPF33 e 3 ADI34.

Neste ponto, cabem algumas considerações sobre a escolha daquelas

palavras-chave. O controle de constitucionalidade preventivo parece ser algo

admitido pelo STF apenas em ações concretas – i.e., aquelas nas quais não se

questiona a norma abstratamente, como nas ações de controle concentrado

(ADI, ADPF e ADC), e sim, tendo em vista um caso concreto.35 Os resultados das

pesquisas por palavras-chave mostram que o tipo de ação mais frequentemente

usado para o controle preventivo no Judiciário parece ser o mandado de

segurança, interposto por um parlamentar visando sustar um processo legislativo

que estaria supostamente viciado à luz da Constituição.36

Esse mandado de segurança, para ser julgado pelo STF, deve ser

interposto contra a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa do Senado Federal

ou seus Presidentes, já que, constitucionalmente, a competência da Corte para

julgar mandados de segurança contra autoridades do Congresso Nacional incide

apenas nesses casos.37

Uma possibilidade de ampliação do universo de pesquisa tornou-se

encontrar todas as decisões em mandados de segurança impetrados por

parlamentares contra órgãos do Congresso Nacional, em particular contra a Mesa

da Câmara ou contra Mesa do Senado.

Para se chegar a essas decisões, além da busca por palavras-chave, foi

feita também consulta à Assessoria de Gestão Estratégica do STF, sobre a

possibilidade de “acesso à lista de todos os mandados de segurança impetrados,

32 MS 1423, MS 8364, MS 20717, MS 21191, MS 24356, MS 26307 e MS 26600 33 ADPF 1 QO/RJ e ADPF 43 AgR/DF 34 ADI 466, ADI 1330 e ADI 3929 35 A impossibilidade de controle preventivo em abstrato foi estabelecida pelo Tribunal, por exemplo, na ADI 466/DF e na ADPF 43/DF, precedentes relevantes em levantamento cruzado justamente por instarem tal situação. 36 O fundamento jurídico dessa interposição seria o direito público subjetivo dos parlamentares de não serem obrigados a participar de deliberação de projeto de lei ou de proposta de emenda constitucional que viole as limitações materiais, circunstanciais, bem como as demais constantes do art. 60 e seguintes da Constituição Federal. Disso decorre, como será visto, que apenas o parlamentar possui legitimidade para a impetração desse tipo de mandado de segurança. 37 Constituição Federal, art. 102, I, “d”: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: d) o "habeas-corpus", sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o "habeas-data" contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;

38

desde 1988, por parlamentares contra a Mesa das Casas Legislativas ou contra

seus Presidentes, e ao inteiro teor dos acórdãos proferidos em tais ações.” A

consulta foi respondida em 14 de outubro de 2010, sendo que 32 mandados de

segurança foram apontados.38 Além disso, foi realizada ainda uma terceira

estratégia de pesquisa, que consistiu em fazer um levantamento dos precedentes

citados pelo Tribunal nos casos analisados.

Sumarizando, a base inicial de pesquisa foi constituída a partir do

cruzamento de três fontes: a) pesquisa jurisprudencial por meio de palavras-

chave na página eletrônica do STF; b) resposta a consulta específica,

encaminhada pela Assessoria de Gestão Estratégica do STF; e c) levantamento

dos precedentes citados pelo Tribunal nos casos das duas primeiras fontes.

Coerentes com o objeto específico desse estudo, foram selecionados e

analisados somente mandados de segurança propostos após 1988 contra a

presidência e/ou mesa diretora da Câmara dos Deputados e/ou do Senado

Federal que tenham como objeto o processo legislativo, seja este de iniciativa do

Executivo ou dos demais poderes, inclusive nas hipóteses de iniciativa privativa

do Legislativo. Tal escolha somente por ações concretas deste tipo justifica-se a

partir da admissão do Tribunal sobre sua prerrogativa de controle preventivo

somente nesse tipo acionamento. Quando propostos com tal objeto, os

mandados de segurança extrapolam a proteção a direito líquido e certo dos

parlamentares/impetrantes, assumindo uma utilização especial como incidente

jurídico para resolução de conflitos de atribuição ou conflitos entre órgãos.39

Com base nesse recorte, foram excluídas a maior parte das ações

propostas contra as referidas Casas Legislativas, com destaque para aquelas

propostas contra atos de natureza administrativa, funcional ou jurisdicional –

e.g., mandados de segurança propostos contra atos de gestão das presidências

ou mesas diretoras, contra resposta a questão de ordem argüida em tese, contra

atos dos órgãos legislativos em procedimentos disciplinares ou ainda contra atos

relacionados a Comissões Parlamentares de Inquérito.

Assim, após triagem das ações que compunham a base inicial, foram

38 Destaque-se que a própria Assessoria do STF relata dificuldades em se levantar as ações de controle preventivo no período anterior ao ano 2000, razão pela qual os MS identificados pelo órgão são majoritariamente da década compreendida entre 2000 e 2010. (STF. Central do Cidadão. Protocolo de Atendimento n° *46685*). 39 Gilmar Ferreira Mendes; Inocêncio Mártires Coelho; Paulo Gustavo G. Branco, Curso de Direito Constitucional, 2ª ed., São Paulo : Saraiva, 2008, p.538.

39

identificados, tabelados e analisados 36 mandados de segurança. Com isso, foi

alcançado um universo relevante de ações propostas no contexto da Constituição

de 1988, suficiente para as conclusões apresentadas nesse estudo sobre o

padrão decisório do STF e a (in)efetividade do mecanismo de controle judicial

dos atos do processo legislativo ainda em trâmite.

Para o estudo do controle preventivo, julgou-se relevante, em um

primeiro momento, fazer uma exposição descritiva dos dados coletados da

análise das ações. Assim, é possível ter acesso dados quantitativos sobre os i)

impetrantes; ii) os atos questionados; iii) o resultado do julgamento da liminar;

e iv) o resultado do julgamento final.

Além disso, foi realizada uma análise propriamente qualitativa, voltada ao

entendimento do STF, no que toca os seguintes pontos: legitimidade ativa para

impetrar os mandados de segurança; objeto do controle preventivo; razões

levantadas em julgamentos que extinguem a ação sem apreciação do mérito; e

razões levantadas em julgamentos de mérito.

IV. O controle de constitucionalidade preventivo É certo que a Constituição Federal não prevê especificamente esta forma

de controle, uma vez que prioriza a modalidade repressiva. No entanto, ao

estabelecer parâmetros para o processo legislativo constitucional e ao limitar o

poder de reforma, diversos autores afirmam que o sistema constitucional

brasileiro dá ensejo ao exercício de tal modalidade, mesmo que não prevista

explicitamente.40

O STF não tem sua competência para controle de constitucionalidade

preventivo fixada expressamente na Constituição, mas vem firmando a

possibilidade de seu exercício41, mesmo que extremamente limitado pela própria

40 Há autores que qualificam essa modalidade como “controle de constitucionalidade preventivo 'indireto'. Nesse sentido: Anna Cândida da Cunha Ferraz, Notas sobre o controle preventivo de constitucionalidade, Revista de Informação Legislativa, Brasília, Senado Federal, 142(36):292, abr./jun., 1999; Elival da Silva Ramos, Controle de Constitucionalidade no Brasil - perspectivas de evolução, São Paulo, Saraiva, 2010, pp. 62-67. 41 A construção jurisprudencial do instituto ocorre a partir do MS 20.257/DF, apontado como leading case na matéria pelas decisões da Corte. No caso, em que se questionava ato da mesa do Congresso que admitiu a deliberação acerca de proposta de emenda que o impetrante alegava ser tendente a abolir a República, delimitaram-se os principais pressupostos e contornos da matéria. Nesse sentido, o Tribunal entende caber mandado de segurança em que a vedação constitucional se dirige ao próprio processamento da lei ou da emenda, vedando mesmo sua apresentação ou votação. Nesses casos, a inconstitucionalidade é considerada formal e se refere ao próprio processo legislativo, o que se depreende do § 4º ao artigo 60 da Constituição de 1988, que mantém a

40

jurisprudência do tribunal e pelo relativamente pequeno número de demandas

propostas. Não há, portanto, procedimento específico para o controle preventivo,

que costuma ser exercido por meio do mandado de segurança.42

Da ausência de regulação normativa dessa “atribuição” decorre o fato de

que a jurisprudência do tribunal assume papel de fonte jurídica primária do

procedimento de controle preventivo pelo Judiciário. Por isso, a análise dos casos

a que se chegou a partir da pesquisa descrita abaixo é fundamental para

entender como o tribunal enxerga suas competências, qual sua concepção de

separação de Poderes e onde ele coloca os limites para sua atuação.

No estudo específico da relação entre o Judiciário e os demais Poderes, a

análise dessa modalidade de controle jurisdicional se justifica pelo fato de que a

apreciação da constitucionalidade de “matérias ainda em trâmite legislativo” abre

considerável espaço de conflito institucional e de críticas à eventual “politização”

do Judiciário, sendo relevante perceber como o STF tem enfrentado a tensão daí

decorrente.43

De início, deve-se reconhecer que, apesar de um relativamente pequeno

número de ações propostas com este propósito no período pós 1988, a

jurisprudência do STF delimita quase unanimemente as possibilidades de

exercício do chamado controle de constitucionalidade preventivo dos atos do

Legislativo. Há, portanto, um conjunto de critérios delimitadores de legitimidade

e objeto que parece ter se formado na prática do tribunal, assim como é possível

perceber um padrão de processamento de tais matérias.

IV.1 Análise descritiva dos casos

IV.1.1 Impetrante A pesquisa buscou identificar os impetrantes dos mandados de segurança

observando se eram parlamentares, partidos ou outros agentes, obtendo os

seguintes resultados: dos 36 mandados de segurança componentes do universo

mesma estrutura que o § 1º ao artigo 47 da Constituição de 1969, vigente quando do julgamento do MS 20.257/DF, em 1980. 42 Gilmar Ferreira Mendes; Inocêncio Mártires Coelho; Paulo Gustavo G. Branco, Curso de Direito Constitucional, 2ª ed., São Paulo : Saraiva, 2008, p.538. 43 “Sem dúvida, grande vantagem haveria impedir-se de modo absoluto a entrada em vigor de ato inconstitucional. Todavia, a experiência revela que toda tentativa de organizar um controle preventivo tem por efeito politizar o órgão incumbido de tal controle, que passa a apreciar a matéria segundo o que entende ser a conveniência pública e não segundo a sua concordância com a lei fundamental.”. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Curso de Direito Constitucional, 31ª ed, São Paulo : Saraiva, 2005, p.36.

41

de análise, 1 restou sem informações sobre o autor nas fontes da pesquisa; 25

(mais de dois terços) foram ajuizados por parlamentares; 1 deles foi ajuizado por

partido político; e 9 por outros agentes. O resultado preponderante foi de que a

maioria dos mandados impetrados teve parlamentares no pólo ativo, o que se

compatibiliza com o entendimento do Tribunal quanto à exclusiva legitimidade

parlamentar para o controle preventivo.

Buscou-se também identificar os partidos políticos aos quais os

palamentares impetrantes dos mandados de segurança pertenciam, procurando

identificá-los, também, se, à época da proposição, o respectivo partido

compunha os blocos parlamentares de apoio ao governo nas Casas Legislativas,

ou se pertencia à oposição. Dos impetrantes de 26 mandados ajuizados por

parlamentares e partidos 20 deles faziam parte da oposição ao governo federal à

época (mais de três quartos); 4 faziam parte da base do governo; e 2 restaram

indefinidos.44 Há ainda uma evidente inversão de protagonistas de ações entre os

governos Collor/Itamar/Fernando Henrique e o governo Lula, o que sinaliza que,

aparentemente, esse tipo de controle preventivo de constitucionalidade costuma

ser buscado pelas minorias parlamentares, na tentativa de reverter e/ou impedir

derrotas legislativas sofridas.

IV.1.2 Ato questionado A análise dos atos questionados buscou saber o tipo de ato que os

mandados de segurança buscavam obstar andamento. Dos 36 mandados

componentes do universo de análise da pesquisa 3 deles restaram sem

informações; 14 deles (mais de um terço) tiveram como atos questionados

propostas de emendas à Constituição Federal (PECs); 7 questionavam projetos

de lei (PLs); 9, atos da mesa da Casa Legislativa (em sua maioria atos que

possibilitavam a votação em plenário de PECs – MS 25080, MS 23047 e MS

21311 – PLs ou PLCs – MS 23334 e MS 24138); 2, resoluções do Congresso

Nacional; e 1, outros atos.

Nota-se na análise destes dados que a maioria dos mandados buscava

questionar dispositivos frutos de debate extenso, polêmico e amplo na arena

política. O número de PECs questionadas vai neste sentido - 17 se somados atos

de mesa relativos a possibilidade de votação de emendas constitucionais, o que 44 Em alguns casos o partido não tinha posicionamento claro, restando “Indefinido” neste campo de análise.

42

também confirma a percepção de que se recorre ao controle preventivo na

tentativa de impedir derrotas políticas significativas ou mesmo ampliar o debate

sobre matérias altamente polêmicas antes da tramitação final.

IV.1.3 Liminar No que diz respeito ao resultado do julgamento dos pedidos liminares dos

mandados de segurança enquadrados no universo de análise, foi obtido o

seguinte quadro: dos 36 mandados analisados 1 não continha pedido liminar; 11

não tiveram seus pedidos liminares apreciados (entre esses estão todos aqueles

cujos autores não são parlamentares, totalizando 10); 21 foram apreciados e os

pedidos não concedidos (aprox. 58% do total); e 3 foram apreciados e

concedidos.

Analisou-se subsidiariamente o tempo de espera dos pedidos de liminar

apreciados em dias a partir da data de distribuição até a data do julgamento da

liminar. Metade dos pedidos (12 casos) foram apreciados em até 5 dias45, 4

liminares foram apreciadas entre 11 e 30 dias e 7 liminares foram apreciadas

entre 31 e 90 dias. Em um caso o tempo de apreciação foi maior que um ano.

Portanto, um terço (12) dos 36 MS com pedido liminar propostos

obtiveram uma resposta muito rápida do tribunal e quase dois terços (23/36)

obtiveram uma resposta relativamente rápida. Entre aqueles cuja liminar foi

concedida, em dois casos o deferimento ocorreu em até 1 (um) dia, sendo que

no terceiro caso a concessão ocorreu em 12 (doze) dias.

Nos casos cujos autores são parlamentares, conclui-se que a resposta do

tribunal aos pedidos liminares se deu rapidamente em mais de 90% dos casos

(23/25). Nota-se que os três casos que o Tribunal concedeu a liminar foram de

mandados de segurança de iniciativa de parlamentar. Nesses casos, a taxa de

sucesso foi de 12% (3/25), comparada a nenhum sucesso logrado pelos outros

atores-impetrantes.

Esses dados evidenciam o papel secundário que as liminares

desempenham nos casos de controle preventivo de constitucionalidade – ao

menos nos moldes admitidos pelo STF. De um modo geral, essas liminares são

julgadas rapidamente e, invariavelmente, são indefereidas (não concedidas).

45 Em um deles (MS 23334) o pedido liminar foi julgado por prevenção antes da distribuição da ação, pelo presidente do Tribunal, por conta do STF encontrar-se em recesso.

43

Como será visto mais adiante, a relevância das liminares adquire outros

contornos no controle repressivo de constitucionalidade (cf. item V.2.3, infra).

IV.1.4 Julgamento final Relativamente aos julgamentos finais dessas ações, a pesquisa teve o

seguinte resultado: dos 36 mandados analisados, 4 continuam aguardando

julgamento; dos 32 julgados, apenas 5 cinco foram conhecidos e julgados

improcedentes, i.e., tiveram o mérito apreciado, enquanto 27 foram extintos sem

julgamento do mérito (aprox. 81%), sendo que destes 15 não foram conhecidos

– 8 concernentes a impetrantes não-parlamentares – e 12 restaram

prejudicados, a maioria deles por ilegitimidade ativa superveniente46 após a

votação e aprovação ou arquivamento dos atos questionados. Na análise dos

resultados dos julgamentos finais dos mandados de segurança observou-se que

nenhum deles teve a segurança concedida no julgamento final, mesmo aqueles

cujas liminares foram concedidas.

O tempo da data da distribuição até o julgamento final também foi

observado. Em 11 (onze) casos o julgamento se deu em até 1 (um) mês, sendo

que em 6 (seis) deles ocorreu em até 5 dias; 3 (três) casos levaram de 1 (um) a

3 (três) meses até o julgamento e 5 (cinco) casos foram julgados no intervalo de

3 (três) meses a 1 (um) ano. Assim, percebe-se igualmente um padrão

majoritariamente rápido de resposta do tribunal, uma vez que a maioria dos

casos propostos (19/36) foram julgados em menos de um ano, sendo que pouco

menos de um terço (11/36) levou menos de 30 (trinta) dias para que a decisão

final fosse proferida.

Dentre os 11 (onze) casos julgados em menos de trinta dias estão os 9

(nove) MS impetrados por não-parlamentares, o que expressa a posição

amplamente pacificada no STF quanto à ilegitimidade de tais autores, tendendo o

tribunal, por conseguinte, a resolver a matéria rapidamente; nos 2 (dois) outros

casos a liminar havia sido concedida, sendo rapidamente cassada pelo plenário.

Em um deles a cassação se deu com a extinção sem julgamento do mérito e no

outro houve o indeferimento do pedido no plenário.

Uma vez que a taxa de sucesso na obtenção de liminares por

parlamentares é muito pequena (12% dentre as ações com impetrantes 46 Ou seja, o parlamentar impetrante do mandado de segurança perde seu mandato ou deixa de pertencer àquela casa legislativa.

44

parlamentares e 8,6% do todo), não seria possível extrair conclusões definitivas

em relação à concessão das liminares e o resultado do julgamento final.

Contudo, os dados indicam uma tendência ao rápido julgamento das ações nas

quais as liminares são monocraticamente deferidas, i.e., quando se apresenta

uma efetiva ameaça de intervenção entre os Poderes. Os dois MS cujas liminares

foram monocraticamente concedidas, sendo rapidamente cassadas pelo plenário,

estiveram sob a relatoria do Min. Marco Aurélio.47

O MS 26307, cuja liminar foi concedida (no prazo de um dia após a

distribuição) diretamente pelo plenário, após questão de ordem apresentada pelo

relator Min. Ricardo Lewandowski, resolvida no sentido de admitir tal

possibilidade, foi o único caso no qual a liminar chegou a vigorar durante período

considerável de tempo (entre 19/12/2006 e 19/05/2010), mas o processo veio a

ser extinto por perda superveniente de objeto.48

IV.2 Análise argumentativa do STF

IV.2.1 Legitimidade ativa O Tribunal também delimita o instituto do controle preventivo

propugnando que, nesses casos, a legitimidade ativa para a propositura do

mandado de segurança preventivo em face do processo legislativo é exclusiva

dos parlamentares da casa legislativa na qual se encontra em discussão a

proposição questionada (MS 23.565). Nesse sentido:

“A ‘ratio’ subjacente a esse entendimento jurisprudencial apóia-se na relevantíssima circunstância de que, embora extraordinária, essa intervenção jurisdicional, ainda que instaurada no próprio momento de produção das normas pelo Congresso Nacional, tem por precípua finalidade assegurar, ao parlamentar (e a este, apenas), o direito público subjetivo – que lhe é inerente – de ver elaborados, pelo Legislativo, atos estatais compatíveis com o texto constitucional, garantindo-se, desse modo, àqueles que participam do processo legislativo a certeza de prevalecimento da supremacia da Constituição, excluídos, necessariamente, no que se refere à extensão do controle judicial, os aspectos discricionários concernentes às questões políticas e aos atos ‘interna corporis’, que se revelam essencialmente insindicáveis (RTJ 102/27 - RTJ 112/598 - RTJ 112/1023 - RTJ 169/181-182)”.49

47 Cuida-se do MS 21754 e MS 22503. 48 Questão de ordem resolvida em 19-dez-2006, vencido o Min. Marco Aurélio, que negava a possibilidade de que o Relator trouxesse a liminar a exame do Plenário. 49 MS 24.645, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 15.9.2003.

45

Esse entendimento já havia sido firmado no MS 21.642, do mesmo

relator – Min. Celso de Mello, quando apontava que “titulares do poder de agir

em sede jurisdicional, contudo, hão de ser os próprios membros do Congresso

Nacional, a quem se reconhece como líquido e certo, o direito público subjetivo à

correta observância da disciplina juridico-constitucional regradora da formação

das espécies normativas”.50 Foi a partir desse entendimento que o Tribunal não

conheceu dos MS 21.303, 23.328, 23.565, 24.576, 24.593, 24.667, 24.689 e

24.888, nos quais não figuram parlamentares como impetrantes da demanda.

IV.2.2 Objeto do controle preventivo Do ponto de vista das matérias que podem ser objeto do chamado

controle preventivo, a jurisprudência do STF vem firmando tanto limitações

formais quanto limitações materiais ao poder reformador. No que se refere à

apreciação de propostas de emenda à Constituição, o Tribunal tem admitido o

controle preventivo quanto aos limites formais (art.60, caput e §2º, CF51), aos

limites circunstanciais (art.60, caput e §1° e §5°, CF52) e aos limites materiais

(art.60, §4°, CF53).

Na delimitação desses aspectos com base nos precedentes do Tribunal,

destaca-se o relatório do Min. Celso de Mello no julgamento de pedido de liminar

no MS 24.645. Cumpre destacar que, a partir do entendimento firmado pelo MS

20.257, reafirmado no MS 24.645, o Tribunal abre a possibilidade de controle

material preventivo nas hipóteses de cláusulas pétreas, uma vez que a própria

tramitação de matérias contrárias aos limites materiais de reforma se mostraria

inconstitucional.

50 E continua: “o parlamentar, fundado na sua condição de co-partícipe no procedimento de elaboração das normas estatais, dispõe de prerrogativa de impugnar o eventual descumprimento, pela instituição parlamentar, das cláusulas constitucionais que lhe condicional a atividade jurídica.” O MS 21642 aparece como precedente em vários acórdãos e foi citado a partir do MS 21648, pois o primeiro não se encontra no site do STF. 51 Art. 60 - A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros 52 § 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. § 5º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. 53 § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.

46

Quanto aos projetos de lei, diferentemente das propostas de emenda

constitucional vedadas por “cláusula pétrea”, somente caberia controle

preventivo quanto aos aspectos formais – vício de origem, nulidades

procedimentais ou irregularidades no processo legislativo (MS 24.138/DF). O

vício formal precisaria ser alegado em face das garantias do processo legislativo

constitucional. Alegadas violações a dispositivos dos Regimentos Internos das

casas legislativas, segundo entendimento majoritário do STF nos anos

compreendidos por este levantamento, fugiriam ao âmbito do controle judicial de

constitucionalidade, por se tratar de matéria interna corporis do Legislativo,

levando ao não conhecimento das alegações pelo pleno do Tribunal e à cassação

das medidas liminares eventualmente concedidas.54

IV.2.3 Razões levantadas em julgamentos extintivos Segundo entendimento firmado no STF, a aprovação da proposta

legislativa torna prejudicado o Mandado de Segurança, levando à sua extinção

(MS 22.864), uma vez que, do contrário, se lhe estaria emprestando efeito de

ação direta de inconstitucionalidade (MS 21.648).

A partir desse entendimento, o Tribunal não conheceu os MS 21.648,

22.442, 22.487 e 22.872 devido à ilegitimidade ativa superveniente. Nesses

casos, a jurisprudência entende que, havendo promulgação da emenda ou do

projeto de lei questionados, o parlamentar perde a legitimidade ativa, que se

funda no impedimento de deliberação flagrantemente inconstitucional,

justamente porque a deliberação já ocorreu.55

Nos casos em que o Tribunal não conhece da impetração, o que ocorre,

em geral, em menos de uma semana (a exceção são os 62 dias do MS 28.901),

a liminar não chega a ser apreciada. Nos casos em que houve ilegitimidade ativa

superveniente, o relator indeferiu a liminar e o decurso do tempo encarregou o

projeto de lei ou de emenda de ser promulgados. Nesses casos, o tempo entre a

distribuição do processo no STF e a decisão final é bastante elevado, quando

comparado aos demais MS. Enquanto os MS não conhecidos em razão da perda

54 Cf. MS 22.503, MS 21.754, MS 22.183. 55 Cumpre salientar também que, no MS 28.901, apesar de o impetrante ser parlamentar, o mandado de segurança não foi conhecido porque a relatora, Min. Ellen Gracie, entendeu haver impossibilidade jurídica no pedido de arquivamento de projeto de lei e extinguiu o processo com base nos artigos 267, inciso VI e 295, inciso I do Código de Processo Civil. A fundamentação da Ministra coloca a própria possibilidade de intervenção do Poder Judiciário na tramitação do Poder Legislativo fora de questão.

47

superveniente do objeto chegaram a ser discutidos em plenário, resultando em

acórdãos extintivos; os 12 MS considerados prejudicados, em regra, foram

extintos diretamente em decisão monocrática, sendo que nesses casos o tempo

de julgamento também foi elevado.

Fica assim evidente que o entendimento favorável à extinção dos MS em

razão do encerramento da fase legislativa, seja com o não conhecimento do MS

em plenário ou com o despacho monocrático de prejudicialidade, dá ao Tribunal

grande capacidade de domínio sobre sua pauta. Com isso, evita confrontar-se

com o Legislativo, ao mesmo tempo que consolida a quase absoluta ineficácia do

instituto. Uma vez encerrado o processo legislativo, levando-se à extinção do MS,

os mesmos argumentos poderão ser levados novamente ao conhecimento do STF

em sede de controle repressivo.

IV.2.4 Julgamento de mérito Somente em quatro casos a Corte conheceu o MS, chegando a apreciar o

mérito das ações antes de indeferí-las. Em apenas um caso, houve o deferimento

do pedido liminar e o conhecimento do MS no plenário.56 Nesse caso, que tratava

de MS contra reforma constitucional do sistema de previdência social, alegava-se

violação a limitações formais ao poder de reforma. O Min. Marco Aurélio, ao

conceder a liminar, aceitou a argumentação da inicial de que não se tratava de

matéria interna corporis.57

O Tribunal, no entanto, não conhece do mandado de segurança quanto às

primeiras alegações, por se tratar de questão interna corporis do Poder

Legislativo, não sujeita à reapreciação pelo Poder Judiciário; o MS é conhecido

somente quanto às alegações em relação às limitações formais inscritas no §5º

do artigo 60 da CF, mas o Tribunal entende não haver contrariedade ao processo

legislativo constitucional, cassando (em 27 dias) a liminar concedida pelo Min.

Marco Aurélio e indeferindo o pedido.

Nos demais três casos em que os MS foram conhecidos e indeferidos não

56 I.e., MS 22.503. 57 Isso porque “em discussão não se fazem assuntos ligados à economia interna da Câmara dos Deputados, nem procedimento circunscrito ao âmbito da conveniência política, da discricionariedade. Evoca-se, na inicial deste mandado de segurança, o desprezo ao processo legislativo, que possui regência de estatura constitucional, sendo marcantes os preceitos insculpidos nos artigos 59 a 69 da Carta Política da República. A expressão ‘processo legislativo’ é conducente a presumir-se a organicidade e esta é balizada pelas normas em vigor”. Cf. MS 22.503/DF. Nesse caso, o relator também aceitava o argumento de que a tramitação do projeto de emenda desrespeita o §5º do artigo 60 da Constituição Federal.

48

houve concessão de liminar, sendo o julgamento final proferido no prazo de 169

a 1.972 dias. Como no caso anterior, o principal argumento após a análise do

pedido, é o de que os projetos de emenda na verdade não contrariam material

ou formalmente dispositivo constitucional, não havendo, portanto, vício no

processo legislativo. Além disso, há uma evidente interpretação restritiva dos

limites ao poder de reforma na fase legislativa (MS 24.642 e MS 23.047).

No MS 24.138, o questionamento diz respeito a projeto de lei. Assim, o

caso não pode ser subsumido à disciplina dos parágrafos do artigo 60 da

Constituição Federal.58 O Tribunal ratifica o entendimento segundo o qual não

cabe controle preventivo material de projeto de lei, decidindo, por unanimidade,

indeferir o mandado de segurança nos termos do voto do relator.

Consideradas as análises acima, é possível identificar cinco tendências

que se evidenciam no que tange a possibilidade de controle preventivo judicial de

projetos de legislação que tramitam nas casas do Poder Legislativo Federal:

i) O controle preventivo é buscado por parlamentares da minoria

legislativa em sentido estrito, que recorrem ao Judiciário tanto para assegurar

seus direitos de minoria como, principalmente, reverter judicialmente decisões

tomadas pela maioria. Esse limite também se deve ao entendimento restritivo do

STF quanto à legitimidade ativa da propositura deste tipo de ação somente por

parlamentares. A idéia de judicialização, aqui, no sentido de levar ao judiciário

questões interna corporis, parece não encontrar respaldo no STF, o que leva à

segunda conclusão.

ii) A baixíssima taxa de sucesso das ações de controle preventivo

(apenas 3 liminares concedidas, das quais 2 foram cassadas em menos de um

mês; e nenhum julgamento favorável) indica que este, apesar de admitido na

jurisprudência da Corte, não tem sido um meio de efetiva intervenção, porque

58 Nesse sentido se manifesta o relator, o Min. Néri da Silveira, ao apreciar o pedido de liminar: “Não vejo, na espécie, entretanto, caracterizada hipótese de concessão de liminar pretendida, em ordem a impedir venha a Câmara dos Deputados a deliberar sobre o Projeto Lei de nº 5.483, de 2001, que alterou o art. 681 da CLT58. Cumpre observar, desde logo, que não se trata de deliberação sobre proposta de emenda constitucional. Sustenta-se que o projeto de lei em foco é inconstitucional e inconveniente, pelas razões longamente deduzidas na inicial. Não há, entretanto, argüição de vício de origem, nem de qualquer nulidade ou mesmo irregularidade em seu processamento. O que se pretende, em realidade, é discutir, por antecipação, a quaestio iuris de inconstitucionalidade do Projeto de Lei. Releva notar que a matéria, sujeita ao debate da Câmara dos Deputados, - se, nela, aprovada, - ainda dependerá da deliberação do Senado Federal.” Cf. MS 24.138/DF.

49

não se trataria de um momento oportuno para o exercício do controle judicial de

constitucionalidade.

iii) Ao consolidar entendimento favorável à extinção dos MS quando

finalizado o processo legislativo, o Tribunal claramente aponta no sentido de

priorizar o controle repressivo em detrimento da via preventiva.

iv) Esse entendimento também fortalece a capacidade de gestão e

controle da pauta do Tribunal, que nos MS estudados optou, em sua grande

maioria, por não interferir no processo legislativo e preferir aguardar seu

desfecho, seja ele qual for.

v) Apesar de reconhecido pelo Tribunal nas hipóteses de “cláusulas

pétreas”, o controle preventivo de emendas constitucionais materialmente

inconstitucionais59 praticamente inexiste na prática do STF, tendo sido priorizada,

nos 3 casos em que se obteve uma decisão final de mérito, a não intervenção na

fase legislativa, com a aplicação de uma interpretação restritiva dos limites

constitucionais que autorizariam o controle preventivo.

V. O controle de constitucionalidade repressivo Este capítulo tem por objetivo realizar a comparação entre o controle

concentrado e repressivo de constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal

Federal sobre os atos normativos dos Poderes Executivo e Legislativo federais. A

exposição dos dados é feita a partir da divisão analítica entre fatores de entrada

e fatores de saída, conforme já explicado anteriormente (cf. Capítulo III, supra).

V.1 Fatores de entrada: caracterização das demandas Neste ponto específico, a preocupação reside em compreender como as

demandas judiciais que questionam a constitucionalidade da produção

normativa do Legislativo e Executivo chegam ao STF, sem, em um primeiro

momento, avaliar a reposta dada pela Corte Constitucional a essas ações. Para

isso, foram coletados os seguintes dados: (i) o perfil dos demandantes (i.e., de

quem acessa o STF, tanto como autores de ação quanto como amicus curiae);

(ii) o tema sobre o qual esses atos normativos versam; (iii) o tipo de ato

questionado (e.g., leis ordinárias, leis complementares, emendas constitucionais,

59 O reconhecimento dessa possibilidade não é pacífico na literatura. Ver, por exemplo, Conrado Hübner Mendes, Controle de Constitucionalidade e Democracia, Rio de Janeiro, Elsevier, 2008, p. 146, nota 22.

50

medidas provisórias etc.); e (iv) o tempo decorrido entre a produção normativa e

sua impugnação no Judiciário.

As análises feitas adiante não esgotam as possibilidades de cruzamento

de dados, apresentando somente o que pareceu mais relevante para a equipe,

considerados os objetivos de pesquisa propostos. Assim, em relação ao tipo de

ato questionado, cumpre ressaltar que essa categoria fez parte da coleta de

dados, mas não mereceu uma análise diferenciada no exame dos fatores de

entrada (exceto para os casos de controle de atos do Executivo, como será

visto), sendo muito mais relevante para os cruzamentos feitos no tópico dos

fatores de saída. Além disso, em relação ao tempo de questionamento, também

se trata de uma análise preliminar, a partir da qual podem ser estabelecidas

hipóteses e conjecturas, as quais poderão ser confirmadas por meio de mais

análises cruzadas dos dados.

V.1.1 Quadro geral de temas das ações propostas

V.1.1.a Criando uma classificação temática

A classificação temática é muito relevante para a qualificação das

demandas que chegam ao STF, especialmente quando se tem um quadro de

categorias cuja linguagem seja a mesma do objeto categorizado, ou seja,

categorias que se constroem a partir da própria linguagem jurídica. Isso porque,

dessa forma, é possível manter maior proximidade com as discussões que

realmente incorreram em cada ação classificada, sem a necessidade de se fazer

abstrações ou generalizações indevidas.

A primeira versão do quadro de temas aqui apresentado foi desenvolvida

em pesquisa anterior realizada pela instituição proponente60, oportunidade na

qual foram analisados dois modelos de classificação formulados por estudiosos

da atuação do STF, um de Marcus Faro de Castro61 e outro de Werneck Vianna62.

A despeito do rigor metodológico com que ambos foram concebidos, verificou-se

que as categorias por eles criadas não eram suficientes para assegurar que tais

modelos pudessem ser adotados. 60 V. Notas nº 23, supra, e nº 77, infra. O texto sobre os temas reproduz em grande medida do texto da pesquisa anterior, cabendo ressaltar, entretanto, que o quadro de temas foi parcialmente reformulado, a partir das novas ações aqui classificadas. 61 CASTRO, Marcus Faro de. “O Supremo Tribunal Federal e a judicialização da política”. Revista Brasileira de ciências Sociais, v. 12, n. 34, p. 147-156, 1997. 62 BURGOS, Marcelo Baumann; SALLES, Paula Martins; VIANNA, Luiz Werneck. Dezessete anos de judicialização da política. Tempo social. Nov-2007, pp. 39-85.

51

Com efeito, a classificação de Marcus Faro contém itens cuja distinção se

afigura de difícil fundamentação, o que demandaria diversas escolhas da equipe

de pesquisa, contribuindo para que o resultado final se afastasse em muito dos

termos em que a classificação foi criada. A separação, por exemplo, entre

“política fiscal e tributária”, de um lado, e “política monetária” e “política de

rendas” de outro talvez demandasse mais justificativas. Além disso, caberia

inquirir o que representa o tema “política local”, quando o próprio STF não possui

definição clara sobre o alcance desta expressão.63

Por outro lado, os critérios de Werneck Vianna se mostraram

problemáticos na medida em que os grupos temáticos não poderiam ser

facilmente compreendidos e instrumentalizados. De fato, em alguns casos,

pareceu bastante difícil distinguir “regulação da sociedade civil” de “política

social”, e esta de “relações de trabalho” ou de “regulação econômica”, por

exemplo. E mesmo a instituição de regras de interpretação em caso de possível

conflito – como a de que, em havendo menção a trabalho, deve-se classificar

sempre como “relações de trabalho” – não deixa de assinalar a imprecisão dos

termos e a ambigüidade do quadro geral de grupos temáticos.

O STF também procede a uma classificação própria dos temas das ADIs,

ADCs e das ADPFs64. No entanto, não há disponível um quadro de referência que

permita uniformizar as interpretações sobre as ações ajuizadas, podendo isso

resultar na classificação de duas ações idênticas de modo inteiramente diverso.65

Ainda, há casos em que a classificação se resume a “assuntos diversos”, termo

bastante amplo que não permite compreender o real objeto da ação.

Além de tais situações extremas, merece destaque a constatação de que

os grupos temáticos mais adotados pela Corte são o de “Administrativo” e o de

“Constitucional”, categorias amplas, que pouco explicitam o tema de cada ação.

Com efeito, na dimensão das discussões atinentes à competência do STF, a área

de direito administrativo é uma das mais significativas, sendo exigida sempre a

63 A questão da definição do alcance do termo “política local” foi discutida em alguns casos analisados pelo STF, relativos à competência para execução de serviços de saneamento público. Cf. ADI-MC 1746; ADI-MC 2098; ADI 1842; ADI 2077. Para um trabalho a respeito, cf. Veridiana Mansour MENDES, A titularidade do serviço público de saneamento básico na jurisprudência do STF. Monografia apresentada à Escola de Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público, 2008. Disponível em: http://www.sbdp.org.br/arquivos/monografia/131_veridiana.pdf. 64 A classificação do STF encontra-se, por exemplo, na seção “Detalhes”, do “Acompanhamento Processual” de cada ação. Cf., por exemplo, a classificação disponível no site do STF para a ADI nº 4100, em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoDetalhe.asp?incidente=2626442. 65 Cf., por exemplo, a ADI nº 736, ADI nº 1003 e ADI nº 1056.

52

referência à Constituição Federal (sob pena de descabimento da ação de controle

concentrado).

O grupo de pesquisa formulou, assim, um critério próprio para aplicar a

todos os casos analisados, a partir da leitura da ementa dos julgados e dos

dispositivos normativos objeto de cada ação.66

A categorização foi orientada para identificar especificamente os temas

presentes no controle de constitucionalidade repressivo dos atos do Executivo e

Legislativo federais. Ou seja, nossa classificação foi criada a partir de um recorte,

sendo composta, à medida que se realizava a análise, pelos temas que nos

pareceram representativos do conjunto de casos.

Assim, em virtude da especificidade de muitos temas, foram criados

subgrupos para algumas categorias-gerais, aptos a abrigar casos semelhantes.

Isso se deu conforme o grau de recorrência de cada assunto, razão pela qual

alguns temas foram divididos em sub-temas, ao passo que outros restaram mais

genéricos, não havendo motivo para decompô-los. Como exemplo, no tema

“direito penal” não há subclassificações, ao passo que a categoria “serviço

público” foi decomposta em: (a) telecomunicações/radiodifusão; (b) energia

elétrica; (c) água e saneamento básico; (d) transporte; (e) concessão e

permissão.

As ações foram classificadas de acordo com os 20 temas abaixo:

1. Ambiental

2. Civil/Comercial (societário)

3. Consumidor

4. Direitos Fundamentais

4.1. Classificação indicativa

4.2. Direito à informação

4.3. Exercício profissional

4.4. Liberdade de imprensa e de expressão

4.5. Posse e porte de arma

4.6. Sigilo 66 Na seção “Petição Inicial”, do “Acompanhamento Processual” de cada ação, é possível consultar as seguintes informações: dispositivo legal questionado, fundamentação constitucional, resultado da liminar, decisão plenária da liminar, data de julgamento plenário da liminar, data de publicação da liminar, resultado final, decisão final, decisão monocrática da liminar, decisão monocrática final, incidentes, ementa, indexação, fim do documento. Por vezes, algumas dessas informações não estão disponíveis, porém o dispositivo legal questionado foi encontrado na totalidade dos casos e foi essa a nossa principal base para identificar a temática tratada na ação.

53

4.7. Direitos sexuais e reprodutivos

4.8. Anistia

5. Econômico

5.1. Empresa pública/Sociedade de economia mista

5.2. Programa Nacional de Desestatização (PND)

5.3. Planos econômicos

5.4. Regulação

5.5. Sistema financeiro nacional

6. Educação

7. Eleitoral e organização partidária

8. Financeiro (orçamento, precatórios e prestação de contas)

9. Índios/quilombolas

10. Organização institucional

10.1. Agências reguladoras

10.2. Autarquias e outros órgãos

10.3. Ministério Público/Defensoria Pública

10.4. Ministérios

10.5. Congresso Nacional

11. Outras políticas públicas

11.1. Crédito Rural

11.2. Reforma agrária

11.3. Salário mínimo

11.4. Esporte

11.5. Criança e adolescente

11.6. Habitação

12. Penal

13. Processo

13.1. Administrativo

13.2. Civil

13.3. Constitucional

13.4. Penal

13.5. Trabalhista

14. Processo Legislativo

15. Seguridade Social

54

15.1. Assistência social

15.2. Previdência

15.3. Saúde

16. Serviço Público

16.1. Concessão e Permissão

16.2. Energia elétrica/Gás

16.3. Portos

16.4. Telecomunicações/Radiodifusão

16.5. Transporte

16.6. Cartórios e registros

17. Servidor Público

17.1. Cargo/contratação

17.2. Concurso

17.3. Direitos e prerrogativas

17.4. Previdência

17.5. Remuneração

18. Trabalho

19. Trânsito

20. Tributário

Importa destacar que nenhuma ação foi classificada de modo a abarcar

mais de um dos temas estipulados. Cada ação foi classificada por apenas uma

categoria, com a finalidade de se extrair dados gerais dos temas mais

recorrentes na pauta do Tribunal. Desse modo, nos casos que poderiam ser

enquadrados em diversas temáticas, deu-se prioridade ao tema que pareceu

mais relevante na ação, tendo em vista as informações de cada processo,

apresentadas no início deste tópico.

Não obstante as críticas que podem ser direcionadas à ausência de

objetividade na escolha do tema de destaque em cada um desses casos, esse

procedimento configura prática comum na aplicação de classificações de objetos

de grande complexidade, tais como as ações de controle de constitucionalidade,

especialmente pelo fato de sua causa de pedir ser aberta. Além disso, buscou-se

tratar com a maior clareza possível as opções feitas nesses casos, razão pela

qual são descritas abaixo algumas das categorias empregadas na classificação

das ações analisadas.

55

No mais, procurou-se não levar em consideração questões formais/

processuais levantadas pelos ministros ou pela parte que ajuizou a ação. Assim,

é plenamente possível que a leitura da ementa indique que uma ação tenha sido

julgada pelo STF com base em argumentos formais. Da mesma maneira, é

possível que as próprias petições iniciais tenham levantado apenas pontos

relativos à forma. No entanto, a preocupação central foi com a matéria de fundo

dos dispositivos normativos questionados, à exceção do tema “Processo

Legislativo”, como será visto.

A seguir, são apresentados esclarecimentos acerca de algumas

classificações criadas para a presente pesquisa:

Organização institucional

Esta categoria abarca as ações em que o dispositivo questionado trata da

estrutura interna de determinado órgão. Aplica-se também às ações que versam

sobre normas que atribuem competência a algum órgão para que ele exerça

certa função. É o caso, e.g., da ADI nº 81, que trata de um Decreto-Lei Federal

que determina competência aos Conselhos de Educação para intervir no domínio

econômico por meio da fixação de preços, reajustamentos, tabelamentos de

anuidades, etc. A partir dos casos encontrados, houve uma subdivisão em: (i)

Ministérios; (ii) Ministério Público/Defensoria Pública; (iii) Autarquias e outros

órgãos; (iv) Agências Reguladoras; e (v) Congresso Nacional.

Relativamente aos Ministérios, pode-se citar o exemplo da ADI nº 1325,

na qual a Medida Provisória tratava justamente da organização da Presidência da

República e dos ministérios. O art. 49, da MP 1038/95, um dos artigos

questionados nessa ADI, ilustra bem a questão da estrutura e da competência

conforme explicação acima: “até que sejam aprovadas as Estruturas Regimentais

dos órgãos essenciais da Presidência da República e dos Ministérios Civis, de que

trata o art. 38, ficam mantidas as estruturas, as competências, inclusive as

transferidas, e atribuições, a denominação das unidades e a especificação dos

respectivos cargos, vigentes em 27 de junho de 1995.”

Quanto a Ministério Público/Defensoria Pública, a classificação incidiu nos

casos em que estes foram considerados enquanto instituição, e não

relativamente aos direitos e prerrogativas de seus membros (o que se

classificaria como sendo um tema de Servidor Público). Assim, aqui são incluídos

56

os casos de atos normativos que estabelecem as competências desses órgãos

auxiliares da Justiça.

Autarquias e outros órgãos constitui categoria residual, usada para

grupos de ações que não apareceram em grande número. Assim, aqui se inclui

desde o INCRA (ADI nº 1700), até atos normativos relativos à estrutura e

competência da Polícia Rodoviária Federal (ADI nº 1413), passando por atos que

regulamentam a criação de municípios.

Na subcategoria das Agências Reguladoras, foram incluídas ações que

questionam leis que criam agências reguladoras, que são um grupo significativo

nas ações que questionam atos originários do Executivo federal (e.g., ADI nº

3273 e ADI nº 3596).

Por fim, foi criada também a subcategoria Congresso Nacional, para

classificar aquelas ações que questionam decretos legislativos e regulamentos

expedidos por aquele órgão que estabelecem normas de organização dos

trabalhos legislativos, por exemplo (e.g., ADI nº 1635, que trata de limites para

instauração de Comissões Parlamentares de Inquérito na Câmara dos Deputados

e no Senado Federal).

Seguridade Social

Este tema reúne as questões referentes às normas destinadas a

assegurar os direitos relativos à previdência social, à assistência social e à saúde,

com destaque para as disposições sobre os planos de custeio e benefícios. O item

‘previdência social’ inclui o debate acerca de normas que tratam da cobertura

dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada, incluindo a proteção

à maternidade, a proteção ao trabalhador em situação de desemprego

involuntário, a pensão por morte do segurado, etc. Assim, todas normativas

referentes a contribuições sociais foram classificadas neste tema, não em

Tributário. Está excluído, entretanto, o que tocante às normas que regulam a

previdência do servidor público, dado que foi reservado um item específico de

classificação para essa matéria.

Em ‘assistência social’ tem-se a regulamentação da política social

destinada à promoção de auxílio aos necessitados, especialmente nos que se

refere à proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à velhice,

às crianças e adolescentes carentes. Já sob o item ‘saúde’ foram reunidas ações

57

nas quais se tem como objeto de discussão normas que versam sobre as ações e

serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bem como para a

redução do risco de doenças e de outros agravos.

Índios / quilombolas

Inclui as ações dirigidas contra normas voltadas à proteção do

indígena/quilombola, especialmente as que tratam do direito originário sobre as

terras tradicionalmente ocupadas por tais populações. Trata-se de categoria que

incidiu somente nas ações que questionam atos originários do Executivo federal.

Educação

Sob essa categoria, foram reunidos os questionamentos acerca de

normas que versam sobre as políticas voltadas à promoção da educação,

envolvendo, dentre outras, disposições relativas à organização do sistema de

ensino, à universalização do atendimento escolar, à melhoria da qualidade do

ensino, à formação para o trabalho etc.

Processo legislativo

Em linhas gerais, o processo legislativo diz respeito ao “conjunto de

ações realizadas pelos órgãos do Poder Legislativo com o objetivo de proceder à

elaboração das leis”.67 Na presente pesquisa, isso se tornou um tema a partir do

momento em que foram encontradas ações em que, pela descrição do dispositivo

legal questionado, já foi possível perceber que se tratava de um problema

referente ao processo de elaboração desse dispositivo e não propriamente à

matéria de fundo.

O exemplo mais significativo desse tipo de situação encontra-se nas

ações em que uma determinada Medida Provisória é questionada por substituir

outra Medida Provisória cujo prazo de apreciação pelo Congresso Nacional ainda

não havia se esgotado. Ou seja, a alegação de inconstitucionalidade não

questiona o aspecto material da MP, mas sim o fato dela não poder substituir

outra MP que ainda tramita no legislativo. Um exemplo é a ADI nº 1315.

Outras políticas públicas

67 Definição apresentada no sítio eletrônico da Câmara dos deputados: http://www.camara.gov.br/ internet/processo/default.asp?selecao=VIDEO (consulta em: 11/12/09).

58

Com relação à classificação “Outras Políticas Públicas”, é preciso salientar

que se trata de uma categoria excepcionalmente criada com a finalidade de

abarcar políticas públicas que não se encaixariam em nenhuma das demais

categorias, e.g. “Saúde” e “Educação”. Com efeito, não se ignora o fato de que

grande parte das políticas públicas e programas governamentais promovidos

pelo Executivo Federal são instituídos por meio de atos normativos (em razão do

princípio da legalidade). No entanto, a maior parte desses programas

governamentais permite ser inserida em categorias específicas, o que explica seu

caráter subsidiário.68

Foram verificados seis subtemas distintos: salário mínimo (atos

normativos que alteram seu valor, ou estabelecem algum tipo de vinculação

entre seu valor); reforma agrária (política prevista no art. 184 e seguintes, da

CF); crédito rural (política específica que não se enquadra nas práticas de

incentivos econômicos e fiscais a outros setores, já contemplados nas categorias

econômico/regulação e econômico/Sistema Financeiro Nacional, que serão mais

bem detalhadas mais adiante); esporte (Estatuto do Torcedor e lei que

regulamenta o desporto); criança e adolescente (classificação que abarcou a ADI

nº 3446, na qual se questionava vários dispositivos do Estatuto da Criança e Do

Adolescente); e habitação (leis que estabelecem financiamento para habitação).

Trabalho

Abrange discussões relativas ao complexo de normas que regula as

relações empregatícias, além de outras relações normativamente especificadas,

incluindo-se as normas relativas às relações coletivas entre trabalhadores e

tomadores de serviço (associações coletivas). Também a regulação do Fundo de

Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) foi situada sob esse item.

Processo

O tema “Processo” foi subdividido em cinco itens, a saber, “Processo

civil”, “Processo Penal”, “Processo Trabalhista”, “Processo Administrativo”, e

“Processo Constitucional”. Com relação aos três primeiros subtemas, não são

68 Considerando a diversidade de políticas públicas identificadas no levantamento do material analisado, foi criado o tema “outras políticas públicas”, justamente para incluir essas políticas e programas governamentais que não tinham relação direta com quaisquer dos outros temas. O procedimento adotado foi verificar se o tema do ato normativo e da impugnação perante o STF se encaixava em uma das categorias prévias. Em caso negativo, criou-se uma subcategoria dentro do grande tema “outras políticas públicas.”

59

necessários grandes desenvolvimentos. Com efeito, cada item diz respeito ao

conjunto dos institutos que possibilitam a instrumentalização do ramo do direito

material ao qual se ligam.

A categoria “Processo Administrativo”, que inclui questionamentos acerca

do plexo normativo que orienta a solução de controvérsias no âmbito da

Administração, é residual, funcionando somente se não for possível o

enquadramento em outro tema, como tributário ou previdenciário, por exemplo.

Por fim, o item “Processo Constitucional” abarca aspectos tocantes aos

procedimentos de competência do STF para o controle de constitucionalidade,

como, e.g., as disposições sobre o processo e julgamento de ADIs, ADCs e

ADPFs – notadamente à Lei nº 9.868/99 e Lei nº 9.882/99.

Serviço Público

Assumem o caráter de serviço público as atividades que consubstanciam

serviços essenciais à sociedade e que, por isso, são prestadas privativamente

pelo Estado ou pelo setor privado em regime de concessão ou permissão.69 A

partir dessa concepção, o tema “serviço público” foi destrinchado em seis sub-

temas, de acordo com o que foi encontrado na pesquisa: telecomunicações/

radiodifusão70; energia elétrica/gás71; concessão e permissão; portos; transporte

(fluvial, ferroviário e terrestre)72; e cartórios e registros.73

A categoria concessão e permissão foi utilizada em casos mais genéricos,

que tratavam de forma abstrata sobre concessão e permissão para que agentes

privados prestassem serviços públicos. A ADI nº 1582 é um exemplo, dado que o

dispositivo questionado aborda algumas possibilidades de atuação da União em

casos de serviços públicos prestados por pessoas jurídicas em regime de

concessão.

Servidor Público

69 Para mais detalhes, cf. Eros Roberto Grau, A ordem econômica na Constituição de 1988, 13. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. pp. 133-135. 70 É exemplo desse subgrupo a ADI nº 561, cujo dispositivo legal questionado é o Decreto Federal nº177/91, que regulamenta os Serviços Limitados de Telecomunicações. 71 Por exemplo, a ADI nº 3100, na qual se tratou da comercialização de energia elétrica. 72 Por exemplo, a ADI nº 3383, em que o dispositivo questionado “dispõe sobre exploração, mediante permissão e autorização, de serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros”. 73 Por exemplo, a ADI 208, em que o dispositivo questionado tratava da organização do serviço notarial.

60

Para esta categoria, foram consideradas todas as ações cujo objeto de

impugnação era atos normativos que disciplinavam um dos seguintes sub-temas:

concurso público; remuneração dos servidores; previdência de servidores

públicos; cargos e contratação; e direitos e prerrogativas.

No que tange “remuneração dos servidores”, essa subcategoria

contempla desde disposições salariais, até gratificações e outros tipos de

proventos. Na subcategoria “cargos e contratação”, foram incluídas todas as

ações relativas exclusivamente à criação de cargos e reenquadramento de

servidores (e.g., ADI nº 809), contratação temporária (e.g., ADI nº 1567),

regulamentação do estágio probatório dos servidores públicos (e.g., ADI nº

1880) e também contratação de voluntários.

Por fim, há um subtema chamado “prerrogativas e direitos” que

contempla, dentre outras, ações cujo objeto é ato normativo que institui vedação

do exercício de atividade advocatícia por servidores (e.g. ADI nº 4100), ou

mesmo a regulamentação do direito de propriedade por parte de servidores

militares (e.g., ADI nº 3340).

Direitos Fundamentais

O termo “direitos fundamentais” é bastante amplo, podendo abrigar uma

diversidade de casos. Para os fins dessa pesquisa, no entanto, o tema “direitos

fundamentais” tem caráter residual. Isso quer dizer que é possível encontrar

direitos ditos fundamentais em outros temas da classificação, restando nesse

apenas aqueles que não couberam em outra categoria.

É o caso, e.g., de ações que tratam sobre: suspensão do registro de

armas de fogo (e.g. ADI nº 2290); classificação indicativa (e.g. ADI nº 2390);

direito ao sigilo de dados pessoais (e.g. ADI nº 4006); direito à informação (à

verdade), entre outros. Cumpre ressaltar que ações que versavam sobre

regulamentação de profissões, com atos que estabeleciam criação de conselhos

ou regulavam o exercício da advocacia, por exemplo, foram classificadas sob

subtema “exercício profissional”.

Financeiro (orçamento, precatórios e prestação de contas)

Com relação ao a esse tema, foram consideradas não somente questões

estritamente orçamentárias, relativas à elaboração do orçamento anual

(compreendendo tanto o plano plurianual, as leis de diretrizes orçamentárias,

61

quanto à lei orçamentária em si e a criação de créditos extraordinárias,

suplementares e especiais), mas também todo tipo de impugnações que

versassem sobre dívida ativa e passiva da União, seja em face de um Estado,

seja em face de um município – notadamente, os casos em que o ato normativo

tem por objeto a remissão de dívidas entre os mencionados entes. Nessa última

hipótese, também são abrangidos os casos relativos ao pagamento de

precatórios e sua regulamentação.

Além disso, também foram considerados atos normativos que cuidam da

dotação orçamentária de órgãos da administração direta e indireta. Nesse

sentido, quando o tema central gira em torno da destinação de determinada

receita, oriunda da arrecadação de um tributo qualquer, a questão é considerada

estritamente “financeira”, e não “tributária”. Note-se que o Cadastro Informativo

dos Créditos de Órgãos e Entidades federais não quitados (CADIN) também se

encontra abrangido na categoria “financeiro (orçamento)”.

Por fim, ressalte-se que dotações orçamentárias para políticas

específicas, tais como a questão da vinculação dos investimentos em educação

(art. 212, caput, da CF) ou de recursos mínimos na saúde (art. 198, § 2º, da

CF), também foram classificadas como relativas ao tema “financeiro

(orçamento)”. Excepcionalmente, questões financeiras relativas à Previdência

Social, a despeito de se poder considerá-las “financeiro (orçamento)”, pelo fato

de tratarem de questões orçamentárias, foram incluídas no tema “seguridade

social (previdenciário)”.74

Econômico

Dentro desta categoria, decidiu-se por enquadrar todas as questões

relativas à atuação do Estado no e sobre o domínio econômico. Em outras

palavras, seja enquanto agente regulador, seja na qualidade de agente

econômico que participa diretamente do processo de produção, por meio das

empresas com aporte de capital público.

Com relação à atuação do Estado na economia enquanto agente

normativo e regulador, criaram-se os seguintes subtemas: Programa Nacional de

74 Ressalte-se que, nessa hipótese excepcional, somente foram registrados dois casos: (i) amortização da dívida previdenciária (ADI nº 1705); e (ii) dotação orçamentária para pagamentos da Previdência Social decorrentes de litígios administrativos e judiciais (ADI nº 1252).

62

Desestatização; planos econômicos; regulação; empresa pública e sociedade de

economia mista; e sistema Financeiro Nacional.

No primeiro subtema, foram incluídas todas as ações que versassem

sobre algum aspecto do Programa Nacional de Desestatização, conhecido pela

sigla PND, instituído pela Lei nº. 8.031, de 1990, posteriormente modificado e

regulamentado por uma série de atos, notadamente por meio de Medidas

Provisórias. Com relação ao segundo, foram incluídas todas as ações que

impugnavam planos econômicos, tais como o plano Brasil Novo, de 1990 (ADI nº

259), inclusive relativas ao Plano Real.

O que motivou a criação de categorias específicas, tais como planos

econômicos, Sistema Financeiro Nacional e PND, que, à primeira vista, poderiam

sem grandes problemas ser inseridas no subtema “regulação”, foi o volume de

ações encontradas em cada uma dessas categorias no grupo de ações que

questionam atos originários do Executivo. Dessa forma, não haveria sentido

colocar tais casos em uma categoria genérica, sendo que grande parte deles

dizem respeito a três atuações de regulação específicas, hipótese em que tais

dados seriam perdidos ou mesmo dariam margem a interpretações equivocadas

acerca dos temas de maior incidência perante o STF.

Assim, dentro da categoria regulação, foram contempladas todas as

ações cuja impugnação incidia sobre atos normativos que disciplinam atividades

econômicas diversas das consideradas acima como “serviço público” – registre-

se, inclusive, a tentativa de determinar o valor de mensalidades escolares (ADI

nº 1126), publicidade de produtos fumígenos (ADI nº 3311), bem como, e.g., o

plantio e a comercialização de alimentos transgênicos (ADI nº 3328). Além disso,

nessa categoria foram incluídas ações que versassem sobre medidas de

desindexação da economia.

Por fim, foi criada a categoria “empresa pública / sociedade de economia

mista”, justamente com a finalidade de medir a incidência de ações cujo objeto

de impugnação é ato normativo que versa sobre a atuação do Estado enquanto

agente econômico diretamente participante do processo produtivo. Ressalte-se

que esta categoria contempla apenas os casos em que a impugnação incide

sobre questões abstratas envolvendo empresa pública e sociedade de economia

mista.

Nesse sentido, caso o enfoque principal seja relativo aos serviços ou

atividades desenvolvidas pelo agente e essa atividade se enquadre na categoria

de “serviço público”, o tema da ação f

V.1.1.b Distribuição temática das ações

Lembrando que o número de ações de controle concentrado no STF que

questionam atos normativos do Legislativo Federal é 458 e, do Executivo

Federal, 877, pode-se admitir algumas

63

Nesse sentido, caso o enfoque principal seja relativo aos serviços ou

atividades desenvolvidas pelo agente e essa atividade se enquadre na categoria

de “serviço público”, o tema da ação foi classificado como “serviço público”.

V.1.1.b Distribuição temática das ações

Lembrando que o número de ações de controle concentrado no STF que

questionam atos normativos do Legislativo Federal é 458 e, do Executivo

admitir algumas comparações quantitativas.

Gráficos 1 e 2

Nesse sentido, caso o enfoque principal seja relativo aos serviços ou

atividades desenvolvidas pelo agente e essa atividade se enquadre na categoria

oi classificado como “serviço público”.

Lembrando que o número de ações de controle concentrado no STF que

questionam atos normativos do Legislativo Federal é 458 e, do Executivo

comparações quantitativas.

De acordo com o que se apreende dos gráficos, quando o ato é emanado

do Legislativo Federal e, posteriormente, questionado ante o STF, predomina a

temática eleitoral e de organização partidária (14%), seguida

(12%), tributário (11%) e processual (10%). Já para atos de origem no

Executivo, maior expressão tem o tema de servidor público (14%); em segundo

lugar, despontam questões econômicas (13%) e também são representativos

seguridade social (12%) e tributário (11%). Ou seja, em termos gerais, para

atos dos dois Poderes, o que mais chega ao Supremo são as discussões a

respeito de servidor público, tributário e seguridade social, massificadas pelo

maior número de questionam

Em alguns casosos, essa distribuição se explica, inclusive, por conta das

exigências constituicionais para regulação de determinado tema ou assunto ora

por meio de lei de iniciativa de ambos os Poderes Legislativo ou Executivo

(âmbito de competências concorrentes, em que não há exclusividade de nenhum

dos dois Poderes para autoria do projeto de lei).

Ainda assim, verifica

do Executivo ou do Legislativo, sendo a discrepância mais notável a de elei

organização partidária, como os assuntos da produção do Congresso que mais

ensejam recurso ao Supremo Tribunal, porém com baixa incidência na agenda do

Executivo.

64

De acordo com o que se apreende dos gráficos, quando o ato é emanado

do Legislativo Federal e, posteriormente, questionado ante o STF, predomina a

temática eleitoral e de organização partidária (14%), seguida de servidor público

(12%), tributário (11%) e processual (10%). Já para atos de origem no

Executivo, maior expressão tem o tema de servidor público (14%); em segundo

lugar, despontam questões econômicas (13%) e também são representativos

(12%) e tributário (11%). Ou seja, em termos gerais, para

atos dos dois Poderes, o que mais chega ao Supremo são as discussões a

respeito de servidor público, tributário e seguridade social, massificadas pelo

maior número de questionamentos da produção do Executivo.

Em alguns casosos, essa distribuição se explica, inclusive, por conta das

exigências constituicionais para regulação de determinado tema ou assunto ora

por meio de lei de iniciativa de ambos os Poderes Legislativo ou Executivo

tências concorrentes, em que não há exclusividade de nenhum

dos dois Poderes para autoria do projeto de lei).

Ainda assim, verifica-se uma certa constância nos temas ajuizados seja

do Executivo ou do Legislativo, sendo a discrepância mais notável a de elei

organização partidária, como os assuntos da produção do Congresso que mais

ensejam recurso ao Supremo Tribunal, porém com baixa incidência na agenda do

Gráfico 3

De acordo com o que se apreende dos gráficos, quando o ato é emanado

do Legislativo Federal e, posteriormente, questionado ante o STF, predomina a

de servidor público

(12%), tributário (11%) e processual (10%). Já para atos de origem no

Executivo, maior expressão tem o tema de servidor público (14%); em segundo

lugar, despontam questões econômicas (13%) e também são representativos

(12%) e tributário (11%). Ou seja, em termos gerais, para

atos dos dois Poderes, o que mais chega ao Supremo são as discussões a

respeito de servidor público, tributário e seguridade social, massificadas pelo

Em alguns casosos, essa distribuição se explica, inclusive, por conta das

exigências constituicionais para regulação de determinado tema ou assunto ora

por meio de lei de iniciativa de ambos os Poderes Legislativo ou Executivo

tências concorrentes, em que não há exclusividade de nenhum

se uma certa constância nos temas ajuizados seja

do Executivo ou do Legislativo, sendo a discrepância mais notável a de eleitoral e

organização partidária, como os assuntos da produção do Congresso que mais

ensejam recurso ao Supremo Tribunal, porém com baixa incidência na agenda do

65

V.1.2 Quem acessa o STF: atores-demandantes A Constituição Federal, em seu art. 103, explicita os legitimados para a

propositura das ações de controle concentrado de constitucionalidade75: o

Presidente da República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos

Deputados; a Mesa da Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do

Distrito Federal; a Governador de Estado ou do Distrito Federal; o Procurador-

Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; o

Partido político com representação no Congresso Nacional; e a Confederação

sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. A partir desta previsão

constitucional, foram classificados os demandantes das ações de controle

concentrado.

Incluem-se no campo dos demandantes também aqueles que não teriam

legitimidade ativa segundo a constituição, como indivíduos ou municípios, ou

segundo a jurisprudência do próprio STF. Aqui, considerou-se a autodeclaração

dos demandantes nas petições iniciais ou as informações disponíveis sobre

sindicatos e entidades de classe em seus estatutos sociais ou páginas na internet

para realizar sua classificação. O intuito da pesquisa é verificar quem invoca o

STF, independentemente de haver um pronunciamento posterior do tribunal

declarando a ilegitimidade ativa destes atores76 ou uma limitação constitucional.

Nos gráficos abaixo, identifica-se que, nos casos de controle de

constitucionalidade de atos normativos de iniciativa tanto do Legislativo Federal,

quanto do Executivo federal, os atores que mais demandam o STF são os

partidos políticos, seguidos dos sindicatos e entidades de classe. Em conjunto,

essas entidades são responsáveis, respectivamente, por 71% e 80% das ações

75 Este era o rol de legitimados originalmente previsto para as ADIs, que foi posteriormente ampliado para ADCs com a Emenda Constitucional 45/2004. O mesmo rol foi ampliado para as ADPFs, por meio da Lei 9882/1999. Aplica-se também às ações diretas de inconstitucionalidade por omissão, com regulamentação dada pela Lei 12.063/2009. 76 Não foi feita, portanto, uma análise sobre como o STF delimita a legitimação ativa do controle de constitucionalidade, embora essa informação apareça incidentalmente nesta pesquisa quando apresentamos as razões para a extinção de processos sem julgamento de mérito nos casos de controle de constitucionalidade de atos normativos do executivo federal. Entre essas razões está a ilegitimidade de parte (v. item 2.4, infra). Este trabalho de avaliação da legitimidade ativa à luz do STF poderia trazer informações interessantes, acerca de padrões de receptividade do tribunal às demandas de determinados atores. Cf. Carolina Cutrupi Ferreira, Os critérios de legitimidade reconhecidos pelo Supremo Tribunal Federal para propositura de ação direta de inconstitucionalidade. Monografia apresentada à Escola de Formação, sbdp, 2007. Disponível em: http://www.sbdp.org.br/ arquivos/monografia/95_Carolina%20Cutrupi%20Ferreira.pdf.

66

de controle concentrado nos casos do Executivo e Legislativo Federal. Por esta

razão será dado maior enfoque à análise destes atores neste trabalho.

Gráfico 4

4

20

38

49

62

138

226

343

4

7

35

26

59

102

105

125

Presidente, Senado e Câmara

Outros (indivíduo, município)

Governador e legislativo estadual

OAB

Procuradoria-Geral da República

Entidade de classe

Sindicato

Partido político

Demandantesnúmero total de casos

Legislativo Executivo

Para melhor compreender a variação da participação desses

demandantes ao longo do tempo, opt

como unidade de comparação

da política” no STF, esta unidade temporal poderia identificar padrões de

participação dos diferentes grupos de demandantes conforme a composição do

governo federal. Essa periodização foi realizada de dois modos, um a partir da

data de propositura da ação no STF e out

cuja constitucionalidade é avaliada.

subtítulo), procura-se indicar com clareza qual desses dois critérios foi utilizado

para periodização em cada caso.

77 Os períodos presidenciais utilizados nessa pesquisa são Sarney (5.10.1988, data de promulgação da Constituição de 1988, marco temporal inicial da coleta de ações nesta pesquisa até 14.3.1990), Collor (15.3.1990 a 1.10.1992), Itamar Franco (2.10.1992 a 31.12.1994), FHC I (1.1.1995 a 31.12.1998), FHC II (1.1.1999 a 31.12.2002), Lula I (1.1.2003 a 31.12.2006), Laté 30.07.2010, marco temporal final de coleta das ações nesta pesquisa).

67

Gráfico 5

Para melhor compreender a variação da participação desses

demandantes ao longo do tempo, optou-se por utilizar os períodos presidenciais

como unidade de comparação.77 Por se tratar de um estudo sobre

no STF, esta unidade temporal poderia identificar padrões de

participação dos diferentes grupos de demandantes conforme a composição do

governo federal. Essa periodização foi realizada de dois modos, um a partir da

data de propositura da ação no STF e outra a partir da data do ato normativo

cuja constitucionalidade é avaliada. Nos gráficos abaixo (em cada título ou

se indicar com clareza qual desses dois critérios foi utilizado

para periodização em cada caso.

Os períodos presidenciais utilizados nessa pesquisa são Sarney (5.10.1988, data de promulgação

ção de 1988, marco temporal inicial da coleta de ações nesta pesquisa até 14.3.1990), Collor (15.3.1990 a 1.10.1992), Itamar Franco (2.10.1992 a 31.12.1994), FHC I (1.1.1995 a 31.12.1998), FHC II (1.1.1999 a 31.12.2002), Lula I (1.1.2003 a 31.12.2006), Laté 30.07.2010, marco temporal final de coleta das ações nesta pesquisa).

Para melhor compreender a variação da participação desses

por utilizar os períodos presidenciais

Por se tratar de um estudo sobre “judicialização

no STF, esta unidade temporal poderia identificar padrões de

participação dos diferentes grupos de demandantes conforme a composição do

governo federal. Essa periodização foi realizada de dois modos, um a partir da

ra a partir da data do ato normativo

(em cada título ou

se indicar com clareza qual desses dois critérios foi utilizado

Os períodos presidenciais utilizados nessa pesquisa são Sarney (5.10.1988, data de promulgação ção de 1988, marco temporal inicial da coleta de ações nesta pesquisa até 14.3.1990),

Collor (15.3.1990 a 1.10.1992), Itamar Franco (2.10.1992 a 31.12.1994), FHC I (1.1.1995 a 31.12.1998), FHC II (1.1.1999 a 31.12.2002), Lula I (1.1.2003 a 31.12.2006), Lula II (1.1.2007

68

Gráfico 6

0

5

10

15

20

25

30

35

Sarney (88/90)

Collor (90/92)

Itamar (92/94)

FHC I (95/98) FHC II (99/02)

Lula I (03/06) Lula II (07/10)

LEGISLATIVO: Demandantes por período

presidencial (número total de casos/data de propositura da ação)

Partido Político Sindicatos

Entidades de Classe PGR

Governador e legislativo estadual OAB

Não Legitimados (Indivíduos) Presidente e Câmara

69

Gráfico 7

Nas ações de controle concentrado de constitucionalidade de atos

normativos de iniciativa do Legislativo federal é interessante notar a inversão da

participação dos demandantes partidos políticos e entidades sindicais entre os

períodos presidenciais de FHC e Lula. Enquanto o volume de demandas dos

partidos políticos diminui, o das entidades de classe aumenta entre os períodos

de governo dos dois presidentes.

Essa tendência se mantém quando o referencial é não o instante de

acionamento do STF, mas período governamental no qual o ato normativo de

origem do Legislativo federal foi editado. Isso porque um ato normativo

publicado durante um determinado governo poderia vir a ser questionado

durante outro período presidencial diante de uma correlação de forças diversa no

momento de sua edição. Os partidos políticos despontam entre os principais

demandantes de atos normativos de origem do Legislativo federal promulgados

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

Antes de 88

Sarney (88/90)

Collor (90/92)

Itamar (92/94)

FHC I (95/98)

FHC II (99/02)

Lula I (03/06)

Lula II (07/10)

LEGISLATIVO: Demandantes por período

presidencial (número total de casos/data de promulgação do ato normativo)

Partido Político Sindicatos

Entidades de Classe PGR

Governador e legislativo estadual OAB

Não Legitimados (Município e Indivíduos) Presidente e Senado

durante o governo FHC I. Já durante o governo Lula I, as demandas dos partidos

políticos sofrem queda acentuada, enquanto as demandas das entidades de

classe aumentam. Note-se que a

expressiva ao questionar a con

federal, promulgados durante o governo de Fernando Collor.

70

durante o governo FHC I. Já durante o governo Lula I, as demandas dos partidos

políticos sofrem queda acentuada, enquanto as demandas das entidades de

se que a Procuradoria Geral da República tem atuação

expressiva ao questionar a constitucionalidade de atos normativos do L

federal, promulgados durante o governo de Fernando Collor.

Gráfico 8

durante o governo FHC I. Já durante o governo Lula I, as demandas dos partidos

políticos sofrem queda acentuada, enquanto as demandas das entidades de

Procuradoria Geral da República tem atuação

nalidade de atos normativos do Legislativo

Para atos normativos de origem do E

políticos concentram suas demandas no período FHC I e

demandas no mandato de Lula II. Aqui se repete a tendência encontrada no

universo das ações que demandam atos normativos de origem do legislativo

federal, na qual os sindicatos apresentam um pico de demandas durante o

governo FHC I e declive durante os governos de Lula,

classe aumentam suas demandas durante os governos Lula.

As tendências a serem apontadas da diferença “momento de entrada no

STF” e “momento de edição do ato normativo” são que, embora as entidades

classe atinjam maiores patamares como demandantes no governo Lula, boa

parte destes atos foi produzida no primeiro mandato de FHC. O mesmo se

percebe com relação aos partidos políticos, que aumentam sua participação no

marco Lula II, porém no que se ref

71

Gráfico 9

a atos normativos de origem do Executivo federal, os partidos

políticos concentram suas demandas no período FHC I e repetem um pico de

demandas no mandato de Lula II. Aqui se repete a tendência encontrada no

universo das ações que demandam atos normativos de origem do legislativo

federal, na qual os sindicatos apresentam um pico de demandas durante o

live durante os governos de Lula, enquanto as entidades de

aumentam suas demandas durante os governos Lula.

a serem apontadas da diferença “momento de entrada no

STF” e “momento de edição do ato normativo” são que, embora as entidades

classe atinjam maiores patamares como demandantes no governo Lula, boa

parte destes atos foi produzida no primeiro mandato de FHC. O mesmo se

percebe com relação aos partidos políticos, que aumentam sua participação no

marco Lula II, porém no que se refere aos atos emanados nesse governo, sua

xecutivo federal, os partidos

repetem um pico de

demandas no mandato de Lula II. Aqui se repete a tendência encontrada no

universo das ações que demandam atos normativos de origem do legislativo

federal, na qual os sindicatos apresentam um pico de demandas durante o

enquanto as entidades de

a serem apontadas da diferença “momento de entrada no

STF” e “momento de edição do ato normativo” são que, embora as entidades de

classe atinjam maiores patamares como demandantes no governo Lula, boa

parte destes atos foi produzida no primeiro mandato de FHC. O mesmo se

percebe com relação aos partidos políticos, que aumentam sua participação no

ere aos atos emanados nesse governo, sua

72

faixa é estável, revelando resquícios do governo anterior ou anteriores, sendo

levados ao Judiciário.

Os partidos políticos, sindicatos e entidades de classe, por serem os

principais demandantes nos dois universos de ações desta pesquisa, e por

apresentarem interessantes variações ao longo dos períodos presidenciais, terão

maior enfoque neste trabalho. Uma análise mais detida desses atores revela que

eles não representam interesses homogêneos. Por outro lado, as entidades de

classe e sindicatos, a despeito de constituírem categorias de atores diferentes

constitucionalmente, podem ter muito em comum quanto aos interesses que

representam, por exemplo, quando comparadas as demandas de entidades de

profissionais (sejam elas entidades de classe ou sindicatos) e das de caráter

econômico, conforme o setor da economia que representem.

Por essa razão, optou-se por produzir dados sobre a variação dos dois

períodos FHC em contraposição aos dois períodos dos governos Lula,

conjuntamente nos dois universos de ações desta pesquisa (Legislativo e

Executivo), em relação aos atores partidos políticos, sindicatos e entidades de

classe e aos temas que levam ao STF. Para tanto, foram levadas em

consideração as datas de promulgação dos atos normativos questionados e não a

data de propositura das ações.

73

Gráfico 10

0 10 20 30 40 50 60 70 80

Seguridade Social

Tributário

Servidor Público

Econômico

Processo

Organização Institucional

Trabalho

Eleitoral

Processo Legislativo

Financeiro

Serviço Público

Ambiental

Direitos Fundamentais

Educação

Outras políticas

Civil/Comercial

Trânsito

Penal

Consumidor

Índios/Quilombolas

Distribuição de temas por período

presidencial (data de ajuizamento/número total de casos dos dois universos - ações

questionando atos do Executivo e do Legislativo)

Lula I e II FHC I e II

Processo Legislativo

Financeiro5%

Serviço Público4%

Ambiental4%

Direitos Fundamentais

3%

Educação2%

Outras políticas2%

Distribuição de temas (porcentagem somados os casos dos dois universos

Direitos Fundamentais

7%

Penal6%

Econômico6%

Trabalho6%

Serviço Público5%

Ambiental4%

Eleitoral3%

Civil/Comercial2%

Distribuição de temas (porcentagem somados os casos dos dois universos

74

Gráfico 11

Gráfico 12

Seguridade Social14%

Tributário11%

Servidor Público10%

Econômico9%

Processo9%

Organização Institucional

6%

Trabalho6%

Eleitoral6%

Processo Legislativo5%

Ambiental4%

Fundamentais

Educação2%

Outras políticas Civil/Comercial2%

Trânsito1%

Penal1%Índios/Quilombolas

0%

Distribuição de temas - FHC I e II(porcentagem somados os casos dos dois universos - Legislativo e

Executivo)

Financeiro12%

Tributário12%

Servidor Público11%

Processo8%

Seguridade Social7%

Organização Institucional

7%

Econômico

Trabalho

Civil/Comercial2%

Educação2% Trânsito

1% Índios/Quilombolas1%

Distribuição de temas - Lula I e II(porcentagem somados os casos dos dois universos - legislativo e

executivo)

Legislativo e

legislativo e

Da análise dos três gráficos acima sobre a distribuição dos temas dos

atos normativos de origem do Legislativo e do E

nos períodos presidenciais FHC e Lula, pode

absolutos, o número de casos apresentados ao STF é maior no período FHC e

também que há grande variação dos temas entre os períodos de governo dos

dois presidentes.

Nos governos FHC, as demandas nos temas de seguridade social,

tributário, servidor público, econômico e processo representam juntas 53% dos

casos questionando atos normativos do período no STF. Comparativamente, nos

governos Lula, os atos normativos mais demandado

tema financeiro. Tributário e servidor público mantém paralelo com a

porcentagem de demandas dos períodos FHC, e o tema de processo

questionamento de atos normativos econômicos do período FHC.

Também é interessante not

variação entre os dois governos. Os atos normativos no tema eleitoral são mais

questionados no período FHC do que no período Lula. Ademais, ações cujo tema

é processo legislativo, nas quais são questionadas preponderan

Provisórias, como exposto na apresentação de temas acima, deixam de ser

questionadas no período Lula. E em outro sentido, normas de penal e direitos

humanos do período Lula são mais questionadas do que no período FHC

227

312

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Partidos Políticos

Distribuição de atores (porcentagem e números total de casos dos dois universos

75

Da análise dos três gráficos acima sobre a distribuição dos temas dos

de origem do Legislativo e do Executivo federal,

nos períodos presidenciais FHC e Lula, pode-se observar que

o número de casos apresentados ao STF é maior no período FHC e

também que há grande variação dos temas entre os períodos de governo dos

rnos FHC, as demandas nos temas de seguridade social,

tributário, servidor público, econômico e processo representam juntas 53% dos

casos questionando atos normativos do período no STF. Comparativamente, nos

governos Lula, os atos normativos mais demandados no STF correspondem ao

tema financeiro. Tributário e servidor público mantém paralelo com a

porcentagem de demandas dos períodos FHC, e o tema de processo

questionamento de atos normativos econômicos do período FHC.

Também é interessante notar em outros temas menos demandados a

variação entre os dois governos. Os atos normativos no tema eleitoral são mais

questionados no período FHC do que no período Lula. Ademais, ações cujo tema

é processo legislativo, nas quais são questionadas preponderantemente Medidas

Provisórias, como exposto na apresentação de temas acima, deixam de ser

questionadas no período Lula. E em outro sentido, normas de penal e direitos

humanos do período Lula são mais questionadas do que no período FHC

Gráfico 13

13963

113

400476

426

Partidos Políticos Sindicatos Entidades de Classe

Outros atores

Distribuição de atores - FHC I e II(porcentagem e números total de casos dos dois universos -

Legislativo e Executivo)

Da análise dos três gráficos acima sobre a distribuição dos temas dos

xecutivo federal, promulgados

se observar que, em termos

o número de casos apresentados ao STF é maior no período FHC e

também que há grande variação dos temas entre os períodos de governo dos

rnos FHC, as demandas nos temas de seguridade social,

tributário, servidor público, econômico e processo representam juntas 53% dos

casos questionando atos normativos do período no STF. Comparativamente, nos

s no STF correspondem ao

tema financeiro. Tributário e servidor público mantém paralelo com a

porcentagem de demandas dos períodos FHC, e o tema de processo ultrapassa o

questionamento de atos normativos econômicos do período FHC.

ar em outros temas menos demandados a

variação entre os dois governos. Os atos normativos no tema eleitoral são mais

questionados no período FHC do que no período Lula. Ademais, ações cujo tema

temente Medidas

Provisórias, como exposto na apresentação de temas acima, deixam de ser

questionadas no período Lula. E em outro sentido, normas de penal e direitos

humanos do período Lula são mais questionadas do que no período FHC.

113

426

Outros atores

Quando distribuídas as demandas dos partidos políticos ao longo do

tempo, especialmente por períodos presidenciais, é possível notar que há uma

110

222

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Partidos Políticos

Distribuição de atores (porcentagem e número total de casos dos dois universos

0 10 20

PC do B

PDT

PL/PRONA/PR

PMDB

PSC

PPS

PFL/DEM

PHS

PRTB

PST

PSTU

PPR

Ações de Autoria de Partidos Políticos

x Data de ajuizamento(número absoluto de casos

76

Gráfico 14

Gráfico 15

Quando distribuídas as demandas dos partidos políticos ao longo do

tempo, especialmente por períodos presidenciais, é possível notar que há uma

68 85 61

264 247 271

Partidos Políticos Sindicatos Entidades de Classe

Outros atores

Distribuição de atores - Lula I e II(porcentagem e número total de casos dos dois universos -

legislativo e executivo)

20 30 40 50 60 70 80 90 100

Ações de Autoria de Partidos Políticos

x Data de ajuizamento(número absoluto de casos - universos do Executivo e Legislativo)

Lula I e II FHC I e II

Quando distribuídas as demandas dos partidos políticos ao longo do

tempo, especialmente por períodos presidenciais, é possível notar que há uma

61

271

Outros atores

110 120 130

Ações de Autoria de Partidos Políticos

universos do Executivo e Legislativo)

77

alternância entre os partidos demandantes, sendo PFL/DEM, PSDB e PPS os

principais partidos políticos demandantes de atos normativos nos períodos de

governo Lula e PT, PDT e PC do B, durante os governos FHC. Isso indica que há

uma relação entre a tematização no STF e a composição político-partidária do

governo federal e de sua oposição.

Já em relação às entidades de classe e aos sindicatos, é preciso notar,

como já anteriormente afirmado, que eles representam diversas atividades,

profissionais, econômicas e de interesses difusos e coletivos, e por isso não

podem ser tomadas como um todo homogêneo de interesses. Por constituírem

um grupo de atores relevante, que litiga com freqüência no STF, e para melhor

compreender quem representam ao acessarem o STF, merecem uma tentativa

de classificação que procure aproximar as entidades de classe e os sindicatos

segundo os interesses representados. A partir dessa aproximação, tais entidades

poderão, então, ser avaliadas em relação aos temas que levam ao STF.

Entidades de classe e sindicatos foram classificadas, principalmente, com

relação à sua finalidade econômica ou profissional. O intuito era justamente o de

refinar a análise o mais próximo possível de seu perfil de atuação. Uma entidade

de classe de profissionais exerce uma função que muitas vezes confunde-se com

o papel desempenhado por sindicatos de profissionais.

Da mesma forma, sindicatos que representam atividades de

determinados setores econômicos podem atuar de forma parecida a entidades de

classe representativas de atividades econômicas desses mesmos setores. Além

dos sindicatos e entidades de classe, foram encontradas também entidades de

benefício público ou mútuo, que atuam com diferentes finalidades (defesa de

interesses difusos e coletivos, religiosos etc.), e empresas, representando

diferentes setores econômicos. A seguir, o esquema de classificação

desenvolvido para os fins desta pesquisa e que foi utilizado tanto para a

classificação dos demandantes, quanto dos participantes como amicus curiae ou

em audiências públicas78:

78 A classificação foi desenvolvida em Controle de Constitucionalidade dos atos do Poder Executivo, op. cit. e aperfeiçoada na atual pesquisa. Para agrupar de modo mais fidedigno as carreiras profissionais, seja quanto às atividades desenvolvidas, seja quanto ao seu caráter público ou privado, recorremos às definições da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), de 2002, elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego e disponível em: http://www.mtecbo.gov.br.

78

1. ENTIDADES DE BENEFÍCIO PÚBLICO OU MÚTUO a. Entidade de interesses difusos e coletivos b. Entidade de interesses religiosos c. Entidade de assistência social d. Entidade desportiva

2. ENTIDADES DE CLASSE

a. Entidade de classe de profissionais i. Carreiras públicas

1. do poder executivo 2. do poder judiciário 3. do poder legislativo 4. do ministério público ou da defensoria pública 5. de policiais e militares 6. outras carreiras públicas

ii. Setores econômicos 1. do setor econômico primário (agricultura) 2. do setor econômico terciário (serviços)

iii. De representação geral de profissionais b. Entidade de classe de setores econômicos

i. do setor econômico primário (agricultura, aqüicultura, pesca, pecuária, mineração)

ii. do setor econômico secundário (indústria) iii. do setor econômico terciário (comércio, finanças, serviços)

c. Outras entidades de classe

3. SINDICATOS a. Sindicatos de profissionais

i. Carreiras públicas 1. do poder executivo 2. do poder judiciário 3. do poder legislativo 4. do ministério público ou da defensoria pública 5. de policiais e militares 6. outras carreiras públicas

ii. Setores econômicos 1. do setor econômico primário (agricultura, mineração) 2. do setor secundário (indústria) 3. do setor econômico terciário (comércio, finanças, serviços)

iii. De representação geral de profissionais b. Sindicatos de setores econômicos

i. do setor econômico primário (agricultura, pecuária) ii. do setor econômico secundário (indústria) iii. do setor econômico terciário (comércio, finanças, serviços)

4. EMPRESAS

a. do setor econômico secundário (indústria) b. do setor econômico terciário (finanças, serviços)

79

Como se pode perceber, as subdivisões de cada tipo de entidade se

comunicam. Os gráficos abaixo permitem avaliar melhor a representatividade

dos diversos grupos de interesse das entidades de classe e sindicatos. Nota-se a

grande representatividade das entidades profissionais como um todo, quando

comparadas às demais. Dentre as entidades profissionais, despontam as

carreiras públicas. Por sua vez, entre as entidades econômicas é clara a

representatividade do setor terciário. Esse diagnóstico é válido tanto para o

universo das ações de controle de constitucionalidade de atos normativos de

origem do Legislativo, quando do Executivo federal.

Gráfico 16

80

Gráfico 17

Tais dados podem indicar a alta capacidade de mobilização judicial destes

grupos na defesa de seus interesses; bem como podem refletir um recorte de

legitimação ativa produzido pela própria Constituição de 1988. Aqui, mais uma

vez, seria relevante um estudo complementar sobre como o STF recepciona

estes atores e como interpreta a Constituição, com relação à sua legitimidade

ativa. Isso porque o próprio tribunal pode criar um filtro de acesso de grupos de

interesse à sua jurisdição por meio de sua jurisprudência.

V.1.2.a Amicus curiae

Além das entidades que apresentam demandas ao STF, há também

aquelas que participam do debate constitucional de modo incidental, por

exemplo, como amicus curiae. Estas costumam entregar documentos ao tribunal,

contendo informações, teses jurídicas ou mesmo moções de apoio às ações,

procurando subsidiar e influenciar as decisões tomadas pelo tribunal. A atuação

dos amici curiae pode servir também como termômetro do impacto esperado

com a decisão judicial. Isso porque temas de grande repercussão costumam

atrair grupos de entidades, que incidem coletiva ou individualmente no caso, por

meio do instituto do amicus curiae.

O amicus curiae é um instrumento que permite a participação de um

maior número de atores, por ser menos restritivo que o rol de legitimados à

propositura de ações de controle concentrado no STF. E é tido pelo próprio

Tribunal como um meio de participação que promoveria a democratização do

debate constitucional e a pluralidade de argumentos.

81

Os resultados da pesquisa mostram que, do total de 458 casos

impugnando atos editados pelo Legislativo federal, 84 (ou 18,3%) receberam

pedidos de ingresso como amicus curiae. Por outro lado, das 877 ações

questionando atos do Executivo federal, 113 (ou 12,9%) tiveram esta tentativa

de participação incidental. Vale ressaltar que foram consideradas todas as

petições de amicus curiae apresentadas, independentemente de elas terem sido

deferidas pelos ministros relatores. O objetivo aqui, assim como em relação aos

demandantes, era o de medir a demanda de participação e não o filtro de

legitimidade desenvolvido pela jurisprudência do STF.

Gráfico 18

82

Gráfico 19

Observa-se nos quadros acima que há uma sobrerrepresentação das

entidades que mais apresentam amici curiae, pois elas estão também entre as

que mais apresentam demandas ao STF, ao lado dos partidos políticos. Entidades

de classe e sindicatos despontam entre os atores que mais propõem amici curiae

e, ao mesmo tempo, são também as legitimadas para a propositura de ações de

controle concentrado de constitucionalidade no STF.

As entidades de classe têm forte representatividade, participam como

amici curiae de 49,6% do total de ações de controle de constitucionalidade de

atos normativos de origem do Executivo federal que possuem amici curiae

propostos e de 48,8% do total de ações de controle de constitucionalidade de

atos normativos de origem do legislativo federal que possuem amici curiae

propostos. Os sindicatos, por sua vez, apresentam amici curiae em 37,2% das

ações questionando atos do Executivo federal; e em 29,8% das que impugnam

atos do Legislativo federal.

Surge, no entanto, um ator novo nesse debate constitucional, as

associações de interesses difusos e coletivos, ingressando, respectivamente, com

20,4% e 15,5% dos amici curiae.

Na evolução no tempo, pode

amici curiae nos casos que foram apresentados ao STF entre os anos de 200

2005, em contraponto com os períodos anteriores. Este gráfico, portanto, precisa

ser analisado com atenção ao fato de que os anos não correspondem à data em

que os amici curiae foram protocolados no STF, mas sim à data em que o caso

no qual procuraram incidir foi apre

Isso explica a presença de

9.868/1999 (sobre o processo e julgamento de ADI e ADC

9.882/1999 (sobre o processo e julgamento da ADPF

regulem a admissão do amicus curiae

critério do relator, sejam ouvidos “depoimentos de pessoas com experiência e

autoridade na matéria” (art. 9º, par. 1º e art. 6º, pár. 1º, respectivamente).

V.1.3 O tempo de O tempo de questionamento

norma e o ajuizamento da ação de controle de constitucionalidade

importante fator para compreender como são trazidas ao STF as demandas de

controle de constitucionalidade por cada grupo de demandantes. Pode revelar,

por exemplo, a capacidade de organização de determinados grupos para

responderem rapidamente ou não à publicação de determinada norma que

consideram inconstitucional. O rápido questio

83

Gráfico 20

Na evolução no tempo, pode-se apreender forte aumento de petições de

nos casos que foram apresentados ao STF entre os anos de 200

2005, em contraponto com os períodos anteriores. Este gráfico, portanto, precisa

ser analisado com atenção ao fato de que os anos não correspondem à data em

foram protocolados no STF, mas sim à data em que o caso

incidir foi apresentado para apreciação do STF.

Isso explica a presença de amici curiae antes da promulgação da Lei nº

sobre o processo e julgamento de ADI e ADC

sobre o processo e julgamento da ADPF), as quais, embora

amicus curiae em si, abrem oportunidade para que, a

critério do relator, sejam ouvidos “depoimentos de pessoas com experiência e

autoridade na matéria” (art. 9º, par. 1º e art. 6º, pár. 1º, respectivamente).

O tempo de questionamento: algumas hipótesesO tempo de questionamento - lapso temporal entre a publicação da

norma e o ajuizamento da ação de controle de constitucionalidade

importante fator para compreender como são trazidas ao STF as demandas de

role de constitucionalidade por cada grupo de demandantes. Pode revelar,

por exemplo, a capacidade de organização de determinados grupos para

responderem rapidamente ou não à publicação de determinada norma que

consideram inconstitucional. O rápido questionamento pressupõe, por parte dos

se apreender forte aumento de petições de

nos casos que foram apresentados ao STF entre os anos de 2003 e

2005, em contraponto com os períodos anteriores. Este gráfico, portanto, precisa

ser analisado com atenção ao fato de que os anos não correspondem à data em

foram protocolados no STF, mas sim à data em que o caso

sentado para apreciação do STF.

promulgação da Lei nº

sobre o processo e julgamento de ADI e ADC) e da Lei nº

, as quais, embora não

em si, abrem oportunidade para que, a

critério do relator, sejam ouvidos “depoimentos de pessoas com experiência e

autoridade na matéria” (art. 9º, par. 1º e art. 6º, pár. 1º, respectivamente).

questionamento: algumas hipóteses lapso temporal entre a publicação da

norma e o ajuizamento da ação de controle de constitucionalidade – pode ser um

importante fator para compreender como são trazidas ao STF as demandas de

role de constitucionalidade por cada grupo de demandantes. Pode revelar,

por exemplo, a capacidade de organização de determinados grupos para

responderem rapidamente ou não à publicação de determinada norma que

namento pressupõe, por parte dos

demandantes, uma capacidade de organização para demandar que depende de

condições de acesso à informação e disponibilidade de recursos e infra

para intervir judicialmente.

Eventualmente, a celeridade pode refletir

travada na esfera do Congresso Nacional ao STF, representando a insatisfação de

grupos políticos nas negociações da norma confrontada. Por outro lado, uma

maior rapidez no questionamento por parte dos partidos políticos, asso

grande quantidade de deman

constitucionalidade com instrumento de pressão política. Aqui, explica

tanto a velocidade quanto a demora, aguardando

para se manifestar a oposição ao ato normativo.

84

demandantes, uma capacidade de organização para demandar que depende de

condições de acesso à informação e disponibilidade de recursos e infra

para intervir judicialmente.

Eventualmente, a celeridade pode refletir ainda a extensão da discussão

travada na esfera do Congresso Nacional ao STF, representando a insatisfação de

grupos políticos nas negociações da norma confrontada. Por outro lado, uma

maior rapidez no questionamento por parte dos partidos políticos, asso

grande quantidade de demandas, pode aponta para o uso do controle de

constitucionalidade com instrumento de pressão política. Aqui, explica

tanto a velocidade quanto a demora, aguardando-se a melhor conjuntura política

a oposição ao ato normativo.

Gráfico 21

demandantes, uma capacidade de organização para demandar que depende de

condições de acesso à informação e disponibilidade de recursos e infra-estrutura

ainda a extensão da discussão

travada na esfera do Congresso Nacional ao STF, representando a insatisfação de

grupos políticos nas negociações da norma confrontada. Por outro lado, uma

maior rapidez no questionamento por parte dos partidos políticos, associada à

para o uso do controle de

constitucionalidade com instrumento de pressão política. Aqui, explica-se, então,

se a melhor conjuntura política

A análise dos gráficos mostra que predomina, para ambos

analisados, reação em até um ano da edição do ato: 58% para atos do

Legislativo e 68% para atos do Executivo. As porcentagens aproxim

bastante, inclusive, quando o ato

emanado (33%, Legislativo e 30%, Executivo). Interessante notar, entretanto,

com relação aos atos normativos do Executivo federal, a substancial

porcentagem de normas que são

de 11 dias a 1 mês de sua edição.

A similaridade dos tempos de questionamento para os dois grupos de

ações leva a crer que a variação desses tempos pode estar mais relacionada aos

demandantes, ao tema do ato

deliberação desse ato, do que ao espaço de origem deste, Executivo ou

Legislativo.

V.2 Fatores de saída: como decide o

V.2.1 Dados gerais sobre os tUma segunda chave de análise quantitativa aplicada às ações de controle

repressivo de constitucionalidade diz respeito ao que se optou por chamar de

85

Gráfico 22

A análise dos gráficos mostra que predomina, para ambos

, reação em até um ano da edição do ato: 58% para atos do

Legislativo e 68% para atos do Executivo. As porcentagens aproxim

bastante, inclusive, quando o ato é questionado entre 1 e 6 meses

emanado (33%, Legislativo e 30%, Executivo). Interessante notar, entretanto,

com relação aos atos normativos do Executivo federal, a substancial

porcentagem de normas que são levadas ao controle do STF no curtíssimo prazo

de 11 dias a 1 mês de sua edição.

A similaridade dos tempos de questionamento para os dois grupos de

ações leva a crer que a variação desses tempos pode estar mais relacionada aos

demandantes, ao tema do ato questionado e às características do processo de

deliberação desse ato, do que ao espaço de origem deste, Executivo ou

Fatores de saída: como decide o STF?

V.2.1 Dados gerais sobre os tipos de resposta e nãoUma segunda chave de análise quantitativa aplicada às ações de controle

repressivo de constitucionalidade diz respeito ao que se optou por chamar de

A análise dos gráficos mostra que predomina, para ambos os grupos

, reação em até um ano da edição do ato: 58% para atos do

Legislativo e 68% para atos do Executivo. As porcentagens aproximam-se

é questionado entre 1 e 6 meses após ser

emanado (33%, Legislativo e 30%, Executivo). Interessante notar, entretanto,

com relação aos atos normativos do Executivo federal, a substancial

levadas ao controle do STF no curtíssimo prazo

A similaridade dos tempos de questionamento para os dois grupos de

ações leva a crer que a variação desses tempos pode estar mais relacionada aos

questionado e às características do processo de

deliberação desse ato, do que ao espaço de origem deste, Executivo ou

ipos de resposta e não-resposta Uma segunda chave de análise quantitativa aplicada às ações de controle

repressivo de constitucionalidade diz respeito ao que se optou por chamar de

86

fatores de saída, que correspondem aos elementos e informações necessários

para caracterizar o papel do STF na dinâmica do fenômeno da judicialização de

questões políticas. No presente tópico, serão analisadas as variáveis internas do

STF que de algum modo podem, isolada ou conjuntamente, influenciar na sua

atividade de controle da constitucionalidade de tais atos.

Em linhas gerais, esses fatores de saída dizem respeito a duas

informações essenciais: (i) qual o tipo de reação do tribunal, em termos de

output, diante da demanda que lhe é apresentada – aqui, como será visto, foram

consideradas tanto as duas formas de resposta, quanto de não-resposta; e (ii) a

influência dos tipos de resposta em liminar na tramitação desses processos,

como uma variável que age sobre o resultado final da ação (com resposta ou

não-resposta) e o comportamento dos agentes envolvidos. Esses dois fatores,

juntos, constituem aquilo que a equipe de pesquisa buscou para tentar responder

à questão: “como decide o STF?”.

Nos gráficos abaixo, encontram-se resumidas algumas informações

e dados gerais sobre a atividade do STF em controle concentrado de

constitucionalidade questionando atos normativos oriundos do Legislativo e do

Executivo federais. Neles, está retratado o universo de pesquisa referente a cada

Poder: o primeiro diz respeito aos atos emanados do Executivo federal,

enquanto o segundo concerne aos atos oriundos do Legislativo federal.

87

Gráfico 23

Gráfico 24

88

Os dados constantes dos gráficos acima revelam inicialmente os

percentuais de ações que tiveram ou não resposta do STF. Aqui, é possível

verificar que foram consideradas as ações que ainda aguardam julgamento, de

mérito ou de liminar. Observa-se que a proporção de ações aguardando

julgamento é bastante semelhante entre as ações questionando atos originários

do Poder Executivo e Legislativo: 25% e 27%, respectivamente.

Além disso, esses gráficos apresentam a proporção de casos que foram

extintos sem resolução de mérito, ou, para utilizar a terminologia aqui adotada,

ações extintas sem qualquer resposta do tribunal, quer em sede de liminar, quer

no mérito (cf. tópico 2.4, infra).

Do mesmo modo, os dois gráficos também apresentam o universo ou

volume das ações que obtiveram algum tipo de resposta do tribunal (decisão

liminar ou de mérito). Das ações em que se impugnam atos emanados do

Executivo, 28% tiveram alguma resposta do STF. No caso das ações

questionando atos do Legislativo federal, a porcentagem de ações que tiveram

alguma resposta do tribunal sobe para 39%.

Por meio dos gráficos anteriores, também é possível visualizar a taxa ou

proporção de sucesso das ações em que se impugnam atos normativos em

âmbito federal, mapeando também até que ponto essas ações prosperaram no

Supremo.

O primeiro aspecto que merece destaque é o número de ações extintas

sem qualquer tipo de resposta do STF. No caso de questionamento de atos

normativos oriundos do Executivo, o número de ações sem resposta equivale a

46%, enquanto que do total de ações relativas a atos emanados do Legislativo,

33% delas não receberam resposta. O outro tipo de ações sem resposta, as que

ainda aguardam julgamento, correspondem a 25% do universo total do

Executivo e 27% do universo do Legislativo. Observa-se, portanto, que o total de

ações sem resposta envolvendo atos do Executivo é de 71%, enquanto que no

Legislativo, o total de ações sem resposta é de 60%.

Já no universo das ações com resposta (segundo disco de cada gráfico),

nota-se que no caso do Executivo a maior parte delas (12% do total de 29%) é

composta de processos que foram extintos sem julgamento de mérito e com a

liminar julgada improcedente. No caso do Legislativo, os dois principais tipos de

89

processos que aparecem são de ações em que houve julgamento de mérito,

sendo 11% julgadas procedente e 10% julgadas improcedente.

Os dados apresentados até aqui serão mais bem analisados nos tópicos

seguintes, a fim de permitir uma visão mais apurada daquilo que o STF

realmente faz com o conjunto de conflitos que lhe é apresentado por meio do

controle concentrado de constitucionalidade.

De imediato, já é possível identificar que a intervenção do STF (com

efeitos diretos e permanentes) no produto da atividade normativa dos Poderes

Executivo e Legislativo é relativamente baixo (3% e 11% do total de ações

ajuizadas até o momento perante o tribunal), a contrario senso daquilo que

parecem sugerir alguns trabalhos acerca do tema da “judicialização da política”,

e que foram examinados no segundo capítulo do presente trabalho.

Para uma análise mais aprofundada dos dados explicitados nos gráficos

23 e 24, serão examinadas, inicialmente, as respostas oferecidas em sede de

decisão liminar e de mérito. Em seqüência, ainda dentro da análise referente à

questão de “como decide o STF”, serão identificados dados relativos às ações

envolvendo medidas provisórias, por se tratar de um grupo de ações com

características específicas em decorrência do tipo de ato normativo que está em

jogo.

Por fim, serão examinadas aquelas ações que “ficaram pelo caminho”, ou

seja, que não atingiram seu objetivo aparente de obter uma decisão de mérito,

reconhecendo a inconstitucionalidade. Note-se que este tópico será dedicado

exclusivamente às ações extintas sem julgamento de mérito envolvendo atos

normativos originários do Executivo federal.79 A principal questão que será

discutida nesta etapa da pesquisa é “porque o STF extingue o processo sem

decidir o mérito (e, muitas vezes, também a liminar)?“

79 Isso porque não foi possível replicar, em razão de limitações de tempo e recursos humanos, esse levantamento e essa análise também para atos do Legislativo, como será feito nos dois primeiros tópicos do presente capítulo. Em função dos diferentes tipos de atos normativos à disposição de cada Poder, a hipótese é que esses resultados se revelariam consideravelmente distintos. Um indicativo disso pode ser extraído dos dois primeiros gráficos deste capítulo. O controle concentrado de atos do Executivo tem uma taxa relativamente baixa de julgamento de mérito (6%), ao passo que a do Legislativo é maior (21%), o que significa que, proporcionalmente, mais ações envolvendo atos do Executivo são extintas sem qualquer tipo de resposta do tribunal (46% e 33%, respectivamente).

90

V.2.2 Qual a resposta do STF: decisões liminares e de mérito Por uma questão de uniformização da nomenclatura utilizada para

designar as variáveis internas do tribunal, o presente capítulo é dedicado à

análise daquilo que se denomina “resposta do STF”. Nos limites do presente

trabalho, é preciso deixar claro que por “resposta do STF” não se considera

apenas aquele provimento final, em que se julgada o mérito da questão. Uma

justificativa para isso é que, a rigor, o que o tribunal faz ao apreciar o que lhe é

apresentado, inclusive em sede de pedido de liminar, também é rever ou não o

ato normativo impugnado, muito embora, nesse primeiro momento, o tribunal o

faça em caráter transitório, ou reversível.

Além disso, é fundamental ter em mente que, no controle concentrado de

constitucionalidade, os efeitos de uma decisão concessiva de liminar ou uma

decisão procedente são, a rigor, os mesmos: a suspensão dos efeitos do ato

normativo declarado inconstitucional. Assim, não há uma distinção suficiente

entre as decisões de liminar e de mérito (dois tipos de resposta) que justifique

uma análise separada ou distintiva desses dois tipos de resposta que o STF

oferece.

Essas considerações levam à constatação de que cada vez mais se faz

premente a necessidade de desconstruir a idéia segundo a qual a única resposta

de um tribunal somente pode ser aquela da qual decorre a coisa julgada, e que

“diz qual é o direito de forma definitiva”. Isso já foi revelado pela pesquisa

anteriormente desenvolvida, e que inspirou a execução da presente pesquisa,

visto que o tribunal muitas vezes decide de forma definitiva por meio de uma

liminar.80 Nesse sentido, verificou-se que as manifestações do tribunal acerca da

constitucionalidade do ato questionado, ainda que em sede de liminar, têm igual

potencial para influenciar o comportamento dos diferentes atores envolvidos na

dinâmica do controle de constitucionalidade no Brasil.

Portanto, foram consideradas como respostas as seguintes manifestações

do tribunal: (i) decisão de mérito - quer para reconhecer o vício de

inconstitucionalidade, quer para afastar a alegação do vício, confirmando a

constitucionalidade do ato; e (ii) a liminar cujo pedido foi apreciado – ora

80 Cf. “Controle de Constitucionalidade de Atos do Executivo Federal”, op. cit.

91

resultando no indeferimento do pedido, ora resultando na sua concessão e na

conseqüente suspensão da eficácia do ato normativo impugnado.

Relativamente às 458 ações de controle concentrado de

constitucionalidade tendo como objeto ato normativo emanado do Poder

Legislativo, 278 (ou 60%) não tiveram qualquer tipo de resposta do tribunal,

seja porque ainda aguardam julgamento (125 ações, ou 27%), seja porque

foram extintos sem manifestação do tribunal acerca da constitucionalidade do

ato (153 ações, ou 33%), quer em sede de liminar, quer no julgamento de

mérito.

Os dados relativos às ações em que se impugnam atos do Executivo

federal são um pouco distintos, sendo que é maior a proporção de casos sem

resposta do tribunal se comparado às ações envolvendo atos do Legislativo. Das

877 ações analisadas, 401 (46%) haviam sido extintas sem qualquer

manifestação do tribunal (sem provimento liminar e sem decisão de mérito), ao

passo que outras 219 ações (25%) ainda aguardavam julgamento.

A análise dos dados revelou uma proporção reduzida de ações em que

são impugnados atos normativos de origem do Executivo federal com julgamento

de mérito dentre os processos já encerrados: são apenas 9% dos casos,

conforme se verifica no gráfico abaixo. Dentro desse universo de ações, há um

número equilibrado de processos julgados procedentes ou improcedentes.81

Gráfico 25

81 Ressalte-se que, nesta etapa do trabalho, não se faz qualquer distinção entre períodos de governo (exceto, eventualmente, que haja alguma indicação expressa nesse sentido, seja no texto, seja nos gráficos). Os bancos legislativo e Executivo são analisados em face da totalidade das ações que cada uma abrange.

55192%

264%

264%

529%

EXECUTIVO: processos extintos

Sem julgamento de mérito Com revisão Sem revisão

comjulgamento de mérito

No que tange às ações envolvendo atos normativos de origem do

Legislativo federal, no entanto, verif

observada acerca das ações do Executivo. Proporcionalmente, o número de

ações que questionam atos do Legislativo que chegam a ter um julgamento de

mérito é maior do que no caso do Executivo. No gráfico abaixo, pod

que quase um terço dos processos encerrados tiveram seu mérito apreciado

(32%). Dentro desse universo, observa

procedentes (com revisão), enquanto que 44 ações são julgadas improcedentes

(sem revisão).

A explicação para essas diferenças nos dados relativos às ações

envolvendo atos do Executivo e do Legislativo parece estar ligada a dois fatores

centrais: (a) o perfil de quem acessa o STF objetivando a declaração de

inconstitucionalidade de atos normat

(b) o tipo de ato normativo típico impugnado em cada esfera de poder, com

preponderância de medidas provisóri

no caso do Legislativo.82 No entanto, há de se ponderar qu

analisado não perde força: o tempo de tramitação do processo desde seu

ajuizamento, passando pela apreciação da liminar (deferida ou não), até a

decisão final (extinto o processo com ou sem julgamento de mérito).

82 A idéia, aqui, é que a espécie de ato normativo típico do Poder Legislativo mesmas restrições temporais de eficácia que outro instrumento bastante utilizado pelo Poder Executivo, a Medida Provisória, cujo fim da vigência acaba resultando na extinção do processo sem julgamento do mérito por perda do objeto. Cf. item V.2.4,

92

No que tange às ações envolvendo atos normativos de origem do

Legislativo federal, no entanto, verifica-se uma tendência um pouco diferente da

observada acerca das ações do Executivo. Proporcionalmente, o número de

ações que questionam atos do Legislativo que chegam a ter um julgamento de

mérito é maior do que no caso do Executivo. No gráfico abaixo, pod

que quase um terço dos processos encerrados tiveram seu mérito apreciado

(32%). Dentro desse universo, observa-se que 51 ações são julgadas

procedentes (com revisão), enquanto que 44 ações são julgadas improcedentes

Gráfico 26

A explicação para essas diferenças nos dados relativos às ações

envolvendo atos do Executivo e do Legislativo parece estar ligada a dois fatores

centrais: (a) o perfil de quem acessa o STF objetivando a declaração de

inconstitucionalidade de atos normativos oriundos do Executivo e do Legislativo;

(b) o tipo de ato normativo típico impugnado em cada esfera de poder, com

preponderância de medidas provisórias no caso do Executivo e de leis ordinárias

No entanto, há de se ponderar que ao menos um fator

analisado não perde força: o tempo de tramitação do processo desde seu

ajuizamento, passando pela apreciação da liminar (deferida ou não), até a

decisão final (extinto o processo com ou sem julgamento de mérito).

A idéia, aqui, é que a espécie de ato normativo típico do Poder Legislativo -

strições temporais de eficácia que outro instrumento bastante utilizado pelo Poder Executivo, a Medida Provisória, cujo fim da vigência acaba resultando na extinção do processo sem julgamento do mérito por perda do objeto. Cf. item V.2.4, infra.

No que tange às ações envolvendo atos normativos de origem do

se uma tendência um pouco diferente da

observada acerca das ações do Executivo. Proporcionalmente, o número de

ações que questionam atos do Legislativo que chegam a ter um julgamento de

mérito é maior do que no caso do Executivo. No gráfico abaixo, pode-se verificar

que quase um terço dos processos encerrados tiveram seu mérito apreciado

se que 51 ações são julgadas

procedentes (com revisão), enquanto que 44 ações são julgadas improcedentes

A explicação para essas diferenças nos dados relativos às ações

envolvendo atos do Executivo e do Legislativo parece estar ligada a dois fatores

centrais: (a) o perfil de quem acessa o STF objetivando a declaração de

ivos oriundos do Executivo e do Legislativo;

(b) o tipo de ato normativo típico impugnado em cada esfera de poder, com

s no caso do Executivo e de leis ordinárias

e ao menos um fator

analisado não perde força: o tempo de tramitação do processo desde seu

ajuizamento, passando pela apreciação da liminar (deferida ou não), até a

decisão final (extinto o processo com ou sem julgamento de mérito).

a lei - não sofre das strições temporais de eficácia que outro instrumento bastante utilizado pelo Poder

Executivo, a Medida Provisória, cujo fim da vigência acaba resultando na extinção do processo sem

Conforme já mencionado

desempenhado pelo tribunal no controle concentrado de constitucionalidade

brasileiro, serão analisadas as respostas dadas pelo STF nesse contexto.

Os gráficos 27 e 28, a seguir, expõem os tipos de resultados

nos casos do Executivo e do Legislativo em que houve algum tipo de resposta

(mesmo que a ação tenha sido extinto antes de atingir a fase de decisão de

mérito), separando-os entre aqueles que (i) receberam apenas uma resposta em

liminar (com ou sem revisão), (ii) tiveram julgamento de mérito (com ou sem

revisão).

No gráfico relativo às ações em que são impugnados atos normativos

originários do Executivo federal, observa

STF, em 150 deles a resposta oferecida pelo tribunal se limita à decisão que

aprecia o pedido de liminar. Destes, em 102 não há suspensão da eficácia do ato

impugnado (i.e., o STF não o revisou), e em 48 casos houve a revisão do ato em

sede de liminar.

93

Conforme já mencionado anteriormente, para se conhecer qual é o papel

desempenhado pelo tribunal no controle concentrado de constitucionalidade

brasileiro, serão analisadas as respostas dadas pelo STF nesse contexto.

Os gráficos 27 e 28, a seguir, expõem os tipos de resultados

nos casos do Executivo e do Legislativo em que houve algum tipo de resposta

tenha sido extinto antes de atingir a fase de decisão de

os entre aqueles que (i) receberam apenas uma resposta em

sem revisão), (ii) tiveram julgamento de mérito (com ou sem

Gráfico 27

No gráfico relativo às ações em que são impugnados atos normativos

originários do Executivo federal, observa-se que dos 202 casos com resposta do

resposta oferecida pelo tribunal se limita à decisão que

aprecia o pedido de liminar. Destes, em 102 não há suspensão da eficácia do ato

, o STF não o revisou), e em 48 casos houve a revisão do ato em

anteriormente, para se conhecer qual é o papel

desempenhado pelo tribunal no controle concentrado de constitucionalidade

brasileiro, serão analisadas as respostas dadas pelo STF nesse contexto.

Os gráficos 27 e 28, a seguir, expõem os tipos de resultados encontrados

nos casos do Executivo e do Legislativo em que houve algum tipo de resposta

tenha sido extinto antes de atingir a fase de decisão de

os entre aqueles que (i) receberam apenas uma resposta em

sem revisão), (ii) tiveram julgamento de mérito (com ou sem

No gráfico relativo às ações em que são impugnados atos normativos

se que dos 202 casos com resposta do

resposta oferecida pelo tribunal se limita à decisão que

aprecia o pedido de liminar. Destes, em 102 não há suspensão da eficácia do ato

, o STF não o revisou), e em 48 casos houve a revisão do ato em

Relativamente aos atos

as ações extintas, em 48% dos casos (143)

STF. Em 16% deles, a única resposta oferecida pelo tribunal foi uma decisão em

sede de pedido de liminar, sendo que em 17 casos (6%)

e em 31 (10%), denegada.

Já com relação às ações em que são questionados atos normativos de

origem do Legislativo federal, nota

tiveram seu mérito apreciado, sendo que destes

improcedentes (i.e., sem revisão final) e 51 julgadas procedentes (

revisão final). Do total de 143 casos, 48 apenas tiveram o pedido de liminar

apreciado. Em 17 casos, a liminar foi concedida, e em 31, denegada.

Diante disso, a análise exposta nos tópicos seguintes foi realizada com

base nas ações de controle concentrado de constitucionalidade que tiveram

algum tipo de resposta do STF. O universo de ações analisadas nesses tópicos é

formado, então, pelas 257 ações com respo

normativos com origem no Executivo federal; e 180 ações com resposta do STF

em que são impugnados atos normativos oriundos do Legislativo federal. Frise

94

elativamente aos atos do Poder Legislativo, caso se cons

em 48% dos casos (143) houve pelo menos uma resposta do

a única resposta oferecida pelo tribunal foi uma decisão em

sede de pedido de liminar, sendo que em 17 casos (6%) a liminar foi concedida,

e em 31 (10%), denegada.

Gráfico 28

Já com relação às ações em que são questionados atos normativos de

origem do Legislativo federal, nota-se que dos 143 casos examinados, 95 deles

tiveram seu mérito apreciado, sendo que destes 44 ações foram julgada

sem revisão final) e 51 julgadas procedentes (

Do total de 143 casos, 48 apenas tiveram o pedido de liminar

apreciado. Em 17 casos, a liminar foi concedida, e em 31, denegada.

so, a análise exposta nos tópicos seguintes foi realizada com

base nas ações de controle concentrado de constitucionalidade que tiveram

algum tipo de resposta do STF. O universo de ações analisadas nesses tópicos é

formado, então, pelas 257 ações com resposta e que têm por objeto atos

normativos com origem no Executivo federal; e 180 ações com resposta do STF

em que são impugnados atos normativos oriundos do Legislativo federal. Frise

caso se considerem apenas

houve pelo menos uma resposta do

a única resposta oferecida pelo tribunal foi uma decisão em

a liminar foi concedida,

Já com relação às ações em que são questionados atos normativos de

se que dos 143 casos examinados, 95 deles

44 ações foram julgadas

sem revisão final) e 51 julgadas procedentes (i.e., com

Do total de 143 casos, 48 apenas tiveram o pedido de liminar

apreciado. Em 17 casos, a liminar foi concedida, e em 31, denegada.

so, a análise exposta nos tópicos seguintes foi realizada com

base nas ações de controle concentrado de constitucionalidade que tiveram

algum tipo de resposta do STF. O universo de ações analisadas nesses tópicos é

sta e que têm por objeto atos

normativos com origem no Executivo federal; e 180 ações com resposta do STF

em que são impugnados atos normativos oriundos do Legislativo federal. Frise-se

95

que o ponto comum a todos esses casos é justamente o fato de que houve

algum tipo de resposta oferecida pelo STF, seja em sede de liminar, seja em

decisão final, sobre o mérito.

Feitas essas considerações, os tópicos abaixo são dedicados à análise de

dados extraídos de variáveis escolhidas a partir desses casos nos quais houve

algum tipo de resposta do tribunal, seja no exame de um pedido de concessão

de liminar, seja decidindo pela procedência ou improcedência da ação, em uma

decisão de mérito.

V.2.3 O papel da liminar no controle de constitucionalidade brasileiro: teoria e dados empíricos A primeira interação do tribunal com as demandas que lhe são

apresentadas em controle concentrado de constitucionalidade costuma acontecer

com o julgamento do pedido de liminar (quando ele existe), para que, sendo

concedido esse pedido, a eficácia do dispositivo normativo impugnado seja

suspensa.

Apenas para se ter uma idéia da dimensão do papel ocupado pelas

liminares no atual controle concentrado de constitucionalidade brasileiro, basta

verificar que, das 877 ações ajuizadas perante o STF para exame da

constitucionalidade de atos normativos que tiveram origem no Executivo federal,

em 797 (ou 90,9%) havia pedido de liminar para suspender a eficácia do ato

impugnado. Relativamente às ações envolvendo a produção normativa do

Legislativo federal, o pedido está presente em 387 (ou 84,5%), das 458 ações

analisadas.83

O objetivo do provimento em sede de liminar é assegurar um resultado

efetivo de mérito, caso o tribunal esteja convencido da presença de fortes

indícios acerca da inconstitucionalidade de uma lei ou outro ato normativo. Por

disposição legal, a decisão liminar tem efeitos para o futuro, com eficácia ex

nunc, i.e., a partir da decisão que a defere (cf. art. 11, § 1º, da Lei nº

9.868/99), sem retroagir até a data de edição do ato normativo impugnado. A

83 Importante salientar que o papel das decisões liminares ganhou força com a regulamentação das “ações constitucionais” (ação direta de inconstitucionalidade, ação declaratória de constitucionalidade e argüição de descumprimento de preceito fundamental), por meio da Lei nº 9.868/99 e da Lei nº 9.882/99, que também disciplinam o procedimento e os efeitos da concessão de liminares em sede de controle concentrado de constitucionalidade.

96

própria lei, no entanto, admite que o tribunal, com a concordância da maioria de

seus membros, possa atribuir efeitos mais amplos à decisão de liminar.

Não bastasse o elevado número de casos em que o titular da ação pediu

a concessão da liminar, a hipótese ora levantada, segundo a qual as liminares

desempenharam, por um longo período, um papel central no controle exercido

pelo tribunal, também encontra respaldo em uma série de informações colhidas

ao longo da pesquisa.

A despeito do que parece sugerir a legislação e a teoria jurídico-

constitucional, os dados levantados na pesquisa mostram que os resultados

obtidos com os pedidos de liminar têm efeito diverso daquele freqüentemente

descrito para ações judiciais ordinárias em trâmite perante outros tribunais e

instâncias. Em outras palavras, a finalidade da liminar (pelo menos durante um

período relativamente longo da história do controle de constitucionalidade pós

1988) diverge da noção tradicional de “assegurar da efetividade de um

provimento de mérito”.

O presente tópico é destinado a descrever os possíveis efeitos dessas

decisões – usualmente tidas como provisórias – sobre os agentes envolvidos.

Necessário destacar contudo, que o papel aqui descrito para as liminares não

alcança a história recente do STF, tendo experimentado uma relativa

modificação, conforme será visto mais adiante.84

Necessária a ressalva, contudo, de que esse papel diferenciado das

liminares parece ter mais relevância, no entanto, apenas para as ações que

questionam atos emanados do Executivo, sendo menos evidente nos processos

que impugnam a constitucionalidade de atos de origem no Legislativo. Isso se

deve, ao que tudo indica, ao perfil de quem acessa o STF e ao tipo de ato

normativo impugnado nesses casos.

A relevância da liminar no controle concentrado também decorre do fato

de que, como visto no tópico anterior, em um grande número de casos, a

resposta oferecida pelo STF se limita à decisão proferida em sede de liminar.

Esse dado é claramente ilustrado no gráfico abaixo. 84 Isso porque, apenas para adiantar o que será exposto mais a frente, a partir de 2002, constata-se uma sensível queda nos julgamentos de liminares pelo pleno do STF, por meio da aplicação do art. 12, da Lei nº 9.868/99, que aprevia o rito de tramitação das ações de controle de constitucionalidade, e permite que o tribunal, em razão da matéria, decida somente o mérito final da questão. Tem-se, com isso, uma queda sensível da taxa dos chamados julgamentos duplos (em liminar e em decisão de mérito), evitando-se, com isso, que o tribunal se manifeste duas vezes sobre a mesma questão.

Verifica-se que, dos casos envolvendo atos oriundos do Poder

apenas em 10% houve uma decisão em sede de liminar, e também uma decisão

final, de mérito. Nesses casos, o tribunal acabou se manifestando em duas

oportunidades sobre a questão que lhe foi apresentada. Por outro lado, na

grande maioria dos casos

apenas uma oportunidade, quando da apreciação do pedido de liminar.

Diante disso, evidencia

interação entre o Tribunal e aqueles que o acessam ocorreu em sede de

julgamento de liminar. Nesse sentido, a liminar converte

do tribunal àquilo que lhe é demandado. A hipótese levantada no presente

trabalho é a de que, enquanto única resposta do STF, sinalizando o

entendimento do tribunal que provavelmente

mérito, a resposta liminar exerce um efeito decisivo na demanda apresentada.

Em razão dele, há poucos casos nos quais o tribunal chega a se manifestar duas

vezes sobre a questão da constitucionalidade, na liminar e também no

julgamento de mérito.

Esse número é muito

produção normativa do Legislativo, muito embora ainda se possa verificar uma

leve tendência de que a resposta liminar se sobreponha aos casos que

alcançaram um julgamento

97

Gráfico 29

se que, dos casos envolvendo atos oriundos do Poder

apenas em 10% houve uma decisão em sede de liminar, e também uma decisão

final, de mérito. Nesses casos, o tribunal acabou se manifestando em duas

oportunidades sobre a questão que lhe foi apresentada. Por outro lado, na

grande maioria dos casos (90%), o pronunciamento do tribunal se deu em

apenas uma oportunidade, quando da apreciação do pedido de liminar.

Diante disso, evidencia-se que, na maior parte dos casos, a única

interação entre o Tribunal e aqueles que o acessam ocorreu em sede de

mento de liminar. Nesse sentido, a liminar converte-se em única resposta

do tribunal àquilo que lhe é demandado. A hipótese levantada no presente

trabalho é a de que, enquanto única resposta do STF, sinalizando o

entendimento do tribunal que provavelmente se confirmará na decisão de

mérito, a resposta liminar exerce um efeito decisivo na demanda apresentada.

Em razão dele, há poucos casos nos quais o tribunal chega a se manifestar duas

vezes sobre a questão da constitucionalidade, na liminar e também no

muito diferente, considerando os casos envolvendo a

produção normativa do Legislativo, muito embora ainda se possa verificar uma

leve tendência de que a resposta liminar se sobreponha aos casos que

alcançaram um julgamento de mérito (55% a 45%).

se que, dos casos envolvendo atos oriundos do Poder Executivo,

apenas em 10% houve uma decisão em sede de liminar, e também uma decisão

final, de mérito. Nesses casos, o tribunal acabou se manifestando em duas

oportunidades sobre a questão que lhe foi apresentada. Por outro lado, na

(90%), o pronunciamento do tribunal se deu em

apenas uma oportunidade, quando da apreciação do pedido de liminar.

se que, na maior parte dos casos, a única

interação entre o Tribunal e aqueles que o acessam ocorreu em sede de

se em única resposta

do tribunal àquilo que lhe é demandado. A hipótese levantada no presente

trabalho é a de que, enquanto única resposta do STF, sinalizando o

se confirmará na decisão de

mérito, a resposta liminar exerce um efeito decisivo na demanda apresentada.

Em razão dele, há poucos casos nos quais o tribunal chega a se manifestar duas

vezes sobre a questão da constitucionalidade, na liminar e também no

diferente, considerando os casos envolvendo a

produção normativa do Legislativo, muito embora ainda se possa verificar uma

leve tendência de que a resposta liminar se sobreponha aos casos que

Em se tratando de controle de constitucionalidade, a antecipação do

provável entendimento do tribunal por meio da decisão liminar pode operar

sobre os agentes envolvidos de duas maneiras possíveis.

Na primeira situação,

alegação de indícios de inconstitucionalidade em sede de liminar, tem impacto

direto, fazendo com que demandantes percam interesse na demanda. Estes são,

em sua maioria, partidos políticos), que buscam apenas u

confirmatória imediata para sua demanda. No caso mais típico, o das Medidas

Provisórias, e.g., isso se manifesta por meio da ausência de aditamento da inicial

quando há reedição da MP, o que revela uma espécie de desistência tácita do

demandante ante a sinalização negativa do tribunal.

Na segunda situação, na qual o STF efetivamente concede o pedido de

liminar, suspendendo a eficácia do ato impugnado até a decisão de mérito, a

hipótese que se sustenta é a de que o próprio autor do ato impugnado

(Legislativo ou, de maneira mais evidente, o Executivo) recua em sua posição,

diante da manifestação do tribunal, acatando (ainda que liminarmente) a

alegação de inconstitucionalidade do ato normativo, e retira, por meio de

processos legislativos, sua vali

Esses dados e hipóteses poderão ser melhor compreendidos com os

dados apresentados no item V.2.6

alegadas pelo tribunal para extinguir as ações de controle do Legislativo e do

Executivo, mesmo tendo

indicados nos gráficos acima, respectivamente).

98

Gráfico 30

Em se tratando de controle de constitucionalidade, a antecipação do

provável entendimento do tribunal por meio da decisão liminar pode operar

sobre os agentes envolvidos de duas maneiras possíveis.

Na primeira situação, a resposta negativa do tribunal, afastando a

alegação de indícios de inconstitucionalidade em sede de liminar, tem impacto

direto, fazendo com que demandantes percam interesse na demanda. Estes são,

em sua maioria, partidos políticos), que buscam apenas u

confirmatória imediata para sua demanda. No caso mais típico, o das Medidas

Provisórias, e.g., isso se manifesta por meio da ausência de aditamento da inicial

quando há reedição da MP, o que revela uma espécie de desistência tácita do

e ante a sinalização negativa do tribunal.

Na segunda situação, na qual o STF efetivamente concede o pedido de

liminar, suspendendo a eficácia do ato impugnado até a decisão de mérito, a

hipótese que se sustenta é a de que o próprio autor do ato impugnado

(Legislativo ou, de maneira mais evidente, o Executivo) recua em sua posição,

diante da manifestação do tribunal, acatando (ainda que liminarmente) a

alegação de inconstitucionalidade do ato normativo, e retira, por meio de

processos legislativos, sua validade.

Esses dados e hipóteses poderão ser melhor compreendidos com os

item V.2.6, infra, nos quais se buscou avaliar as razões

alegadas pelo tribunal para extinguir as ações de controle do Legislativo e do

Executivo, mesmo tendo julgado os pedidos de liminar (90% e 55% dos casos

indicados nos gráficos acima, respectivamente).

Em se tratando de controle de constitucionalidade, a antecipação do

provável entendimento do tribunal por meio da decisão liminar pode operar

a resposta negativa do tribunal, afastando a

alegação de indícios de inconstitucionalidade em sede de liminar, tem impacto

direto, fazendo com que demandantes percam interesse na demanda. Estes são,

em sua maioria, partidos políticos), que buscam apenas uma resposta

confirmatória imediata para sua demanda. No caso mais típico, o das Medidas

Provisórias, e.g., isso se manifesta por meio da ausência de aditamento da inicial

quando há reedição da MP, o que revela uma espécie de desistência tácita do

Na segunda situação, na qual o STF efetivamente concede o pedido de

liminar, suspendendo a eficácia do ato impugnado até a decisão de mérito, a

hipótese que se sustenta é a de que o próprio autor do ato impugnado

(Legislativo ou, de maneira mais evidente, o Executivo) recua em sua posição,

diante da manifestação do tribunal, acatando (ainda que liminarmente) a

alegação de inconstitucionalidade do ato normativo, e retira, por meio de

Esses dados e hipóteses poderão ser melhor compreendidos com os

, nos quais se buscou avaliar as razões

alegadas pelo tribunal para extinguir as ações de controle do Legislativo e do

julgado os pedidos de liminar (90% e 55% dos casos

99

Em certo sentido, essas considerações também servem para demonstrar

a fragilidade do argumento de que a decisão liminar do tribunal tem caráter

meramente transitório, com efeitos limitados, comparativamente aos de uma

decisão final de mérito. Guardadas as devidas proporções, de um ponto de vista

prático, a decisão da liminar produz efeitos bastante semelhantes aos de uma

decisão definitiva de mérito no controle concentrado de constitucionalidade,

efeito potencializado pelos autores dos atos normativos que foram questionados.

Destaca-se que, desta forma, o Tribunal determina, mesmo antes de

uma decisão final terminativa, retirar a validade de certos atos normativos. Esse

efeito se relaciona pela forma que as decisões liminares são recebidas pelos

agentes envolvidos: muitas vezes como uma antecipação da decisão final,

decorrendo uma reação como se final fosse.

Essa hipótese se sustenta por duas razões principais. A primeira delas é a

de que a decisão liminar, tal qual a definitiva, repercute diretamente no

comportamento dos atores envolvidos no processo de controle concentrado de

constitucionalidade. A segunda, e principal, razão para se sustentar uma

hipótese como essa é a de que, nesse cenário, a decisão liminar, pelo fato de ser

a única resposta do tribunal, também adquire contornos de definitiva, haja vista

que o tribunal não volta a se manifestar sobre a questão, em sede de julgamento

de mérito, permanecendo os argumentos e a ratio decidendi contidos na decisão

liminar.

Mais uma vez, isso apenas tem o condão de reforçar a hipótese de que as

liminares têm elevado potencial para influenciar o comportamento dos atores

envolvidos no processo de controle de constitucionalidade (aqui considerados

Executivo, de um lado, e demandante, de outro), o que acaba também por

justificar sua análise na presente pesquisa.

Considerando a relevância das decisões proferidas em sede de liminar

nos casos analisados, por todas as razões expostas até aqui, é igualmente

importante verificar o “grau de coerência” do STF envolvendo as duas respostas

oferecidas em cada caso.

Na presente pesquisa, considera-se grau de coerência nada mais do que

a medida da freqüência com que o tribunal confirma ou reverte, na decisão de

mérito, o conteúdo e o sentido da decisão proferida por ele mesmo em sede de

liminar. Em outras palavras, o que se buscou analisar é em que medida a

resposta dada pelo tribunal em sede de liminar coincide ou não com o resultado

da decisão final de mérito.

Esse dado serve para endossar as hipóteses acima levantadas, e diz

respeito, em outras palavras, ao que se convencionou chamar, no âmbito da

presente pesquisa, de taxa de manutenção

de mérito. O que foi possível apurar é que, dentre os processos envolvendo atos

normativos do Poder Executivo, o resultado liminar é, quase que

invariavelmente, confirmado na decisão final.

Assim, em aproximadamente 91% dos casos, o resultado da limina

mesmo da decisão final (considerando o grupo de casos em que há as duas

respostas do Tribunal). Ressalte

dados sobre a existência ou não de revisão (total ou parcial) do ato

questionado.85

Os dados relativos às ações envolvendo atos oriundos do Executivo são

um pouco distintos dos dados extraídos dos processos envolvendo atos

normativos do Legislativo, conforme explicitado no gráfico a seguir.

85 Ressalte-se, no entanto, que as conclusões a seguir expostas foram tomadas com base em universo reduzido, considerando exclusivamente os casos em que houve apreciação do pedido de liminar e também julgamento de mérito, caso contrário não haveria duas manifestaçõ(liminar e de mérito) que pudessem ser comparadas: 40 ações do banco do Legislativo.

100

resposta dada pelo tribunal em sede de liminar coincide ou não com o resultado

da decisão final de mérito.

Gráfico 31

Esse dado serve para endossar as hipóteses acima levantadas, e diz

respeito, em outras palavras, ao que se convencionou chamar, no âmbito da

taxa de manutenção das decisões liminares nas decis

de mérito. O que foi possível apurar é que, dentre os processos envolvendo atos

normativos do Poder Executivo, o resultado liminar é, quase que

invariavelmente, confirmado na decisão final.

Assim, em aproximadamente 91% dos casos, o resultado da limina

mesmo da decisão final (considerando o grupo de casos em que há as duas

respostas do Tribunal). Ressalte-se que essa comparação foi feita com base nos

dados sobre a existência ou não de revisão (total ou parcial) do ato

os às ações envolvendo atos oriundos do Executivo são

um pouco distintos dos dados extraídos dos processos envolvendo atos

normativos do Legislativo, conforme explicitado no gráfico a seguir.

Gráfico 32

se, no entanto, que as conclusões a seguir expostas foram tomadas com base em

universo reduzido, considerando exclusivamente os casos em que houve apreciação do pedido de liminar e também julgamento de mérito, caso contrário não haveria duas manifestaçõ(liminar e de mérito) que pudessem ser comparadas: – total de 23 ações do banco do Executivo e 40 ações do banco do Legislativo.

resposta dada pelo tribunal em sede de liminar coincide ou não com o resultado

Esse dado serve para endossar as hipóteses acima levantadas, e diz

respeito, em outras palavras, ao que se convencionou chamar, no âmbito da

das decisões liminares nas decisões

de mérito. O que foi possível apurar é que, dentre os processos envolvendo atos

normativos do Poder Executivo, o resultado liminar é, quase que

Assim, em aproximadamente 91% dos casos, o resultado da liminar é o

mesmo da decisão final (considerando o grupo de casos em que há as duas

se que essa comparação foi feita com base nos

dados sobre a existência ou não de revisão (total ou parcial) do ato

os às ações envolvendo atos oriundos do Executivo são

um pouco distintos dos dados extraídos dos processos envolvendo atos

normativos do Legislativo, conforme explicitado no gráfico a seguir.

se, no entanto, que as conclusões a seguir expostas foram tomadas com base em universo reduzido, considerando exclusivamente os casos em que houve apreciação do pedido de liminar e também julgamento de mérito, caso contrário não haveria duas manifestações do tribunal

total de 23 ações do banco do Executivo e

Aqui, a taxa de manutenção

consideravelmente inferior, ocorrendo em apenas 75% dos casos, ao passo que

nas ações em que se questionam atos com origem no Executivo, a

manutenção chega a 91%.

No que diz respeito à prática de concess

outro ponto importante a ser destacado encontra

reproduzidos abaixo. Neles, é possível visualizar que a maioria das decisões

proferidas pelo STF em sede de liminar não implica a revisão da ativi

normativa de cada Poder, ainda que haja uma tendência um pouco maior para

que se conceda a liminar nos casos em que o ato impugnado foi

Poder Legislativo.

Esse dado é relevante, pois demonstra relativa cautela do tribunal na

apreciação dos pedidos de liminar

STF seria mais condescendente com os pedidos que lhe são feitos ao decidir uma

liminar, uma vez que sua decisão ainda poderia ser revista, no julgamento final.

Ao contrário, não é possível a

mais, nem menos concessivo com os pedidos no momento de conceder ou

denegar um pedido de liminar.

Nos gráficos abaixo, é possível identificar os pedidos de liminar

apreciados pelo STF referente

e Legislativo). Aqui, é retratado o que se pode chamar de

101

taxa de manutenção do resultado liminar na decisão de mérito é

consideravelmente inferior, ocorrendo em apenas 75% dos casos, ao passo que

nas ações em que se questionam atos com origem no Executivo, a

chega a 91%.

No que diz respeito à prática de concessão de liminares pelo tribunal,

outro ponto importante a ser destacado encontra-se ilustrado nos dois gráficos

reproduzidos abaixo. Neles, é possível visualizar que a maioria das decisões

proferidas pelo STF em sede de liminar não implica a revisão da ativi

normativa de cada Poder, ainda que haja uma tendência um pouco maior para

que se conceda a liminar nos casos em que o ato impugnado foi

Esse dado é relevante, pois demonstra relativa cautela do tribunal na

s pedidos de liminar. Isso refuta diretamente a hipótese de que o

STF seria mais condescendente com os pedidos que lhe são feitos ao decidir uma

liminar, uma vez que sua decisão ainda poderia ser revista, no julgamento final.

Ao contrário, não é possível afirmar que o tribunal não tem se revelado nem

mais, nem menos concessivo com os pedidos no momento de conceder ou

denegar um pedido de liminar.

Nos gráficos abaixo, é possível identificar os pedidos de liminar

apreciados pelo STF referentes a atos de cada um dos outros Poderes (Executivo

e Legislativo). Aqui, é retratado o que se pode chamar de taxa de sucesso

do resultado liminar na decisão de mérito é

consideravelmente inferior, ocorrendo em apenas 75% dos casos, ao passo que

nas ações em que se questionam atos com origem no Executivo, a taxa de

ão de liminares pelo tribunal,

se ilustrado nos dois gráficos

reproduzidos abaixo. Neles, é possível visualizar que a maioria das decisões

proferidas pelo STF em sede de liminar não implica a revisão da atividade

normativa de cada Poder, ainda que haja uma tendência um pouco maior para

que se conceda a liminar nos casos em que o ato impugnado foi editado pelo

Esse dado é relevante, pois demonstra relativa cautela do tribunal na

. Isso refuta diretamente a hipótese de que o

STF seria mais condescendente com os pedidos que lhe são feitos ao decidir uma

liminar, uma vez que sua decisão ainda poderia ser revista, no julgamento final.

firmar que o tribunal não tem se revelado nem

mais, nem menos concessivo com os pedidos no momento de conceder ou

Nos gráficos abaixo, é possível identificar os pedidos de liminar

oderes (Executivo

taxa de sucesso na

concessão das liminares em ações referentes a atos originados no Executivo e no

Legislativo.

O percentual de liminares deferid

normativos do Poder Legislativo atinge uma taxa de cerca de 45% do total de

casos em que houve pedido de liminar. Por outro lado, o percentual de liminares

deferidas quando as ações têm por objeto atos normativos emana

Executivo federal cai para 37%.

de uma diferença entre as duas situações, essa desproporção entre os dados não

é sensível ou relevante o suficiente para permitir alguma conclusão de impacto a

partir deste quadro.

V.2.4 Controle Medidas Provisórias: um grupo especial de ações na jurisprudência do STFO estudo em separado das medidas provisórias foi realizado após a

constatação pela equipe de pesquisa de que este seria o ato normativo com o

maior índice de questionamento no Judiciário, além de terem o maior número de

pedidos de liminar apreciados e decisões do mérito

da atuação normativa do Poder Executivo. Daí a razão de ter se entendido

necessário um aprofundamento em seu

exato, em termos quantitativos, das ações de controle de constitucionalidade que

tivessem por objeto medidas provisórias.

102

concessão das liminares em ações referentes a atos originados no Executivo e no

Gráficos 33 e 34

O percentual de liminares deferidas em processos que versam sobre atos

normativos do Poder Legislativo atinge uma taxa de cerca de 45% do total de

casos em que houve pedido de liminar. Por outro lado, o percentual de liminares

deferidas quando as ações têm por objeto atos normativos emana

Executivo federal cai para 37%. Muito embora não se possa ignorar a existência

de uma diferença entre as duas situações, essa desproporção entre os dados não

é sensível ou relevante o suficiente para permitir alguma conclusão de impacto a

ontrole Medidas Provisórias: um grupo especial de ações na jurisprudência do STF O estudo em separado das medidas provisórias foi realizado após a

constatação pela equipe de pesquisa de que este seria o ato normativo com o

de questionamento no Judiciário, além de terem o maior número de

pedidos de liminar apreciados e decisões do mérito – implicando ou não a revisão

da atuação normativa do Poder Executivo. Daí a razão de ter se entendido

necessário um aprofundamento em seu estudo, tornando possível traçar o perfil

exato, em termos quantitativos, das ações de controle de constitucionalidade que

tivessem por objeto medidas provisórias.

Gráfico 35

concessão das liminares em ações referentes a atos originados no Executivo e no

as em processos que versam sobre atos

normativos do Poder Legislativo atinge uma taxa de cerca de 45% do total de

casos em que houve pedido de liminar. Por outro lado, o percentual de liminares

deferidas quando as ações têm por objeto atos normativos emanados do

Muito embora não se possa ignorar a existência

de uma diferença entre as duas situações, essa desproporção entre os dados não

é sensível ou relevante o suficiente para permitir alguma conclusão de impacto a

ontrole Medidas Provisórias: um grupo especial de

O estudo em separado das medidas provisórias foi realizado após a

constatação pela equipe de pesquisa de que este seria o ato normativo com o

de questionamento no Judiciário, além de terem o maior número de

implicando ou não a revisão

da atuação normativa do Poder Executivo. Daí a razão de ter se entendido

estudo, tornando possível traçar o perfil

exato, em termos quantitativos, das ações de controle de constitucionalidade que

103

Da análise do gráfico acima, que mostra o quadro geral das ações conra

atos normativos originados do Poder Executivo, é possível notar que os casos

envolvendo medidas provisórias são aqueles que possuem maior participação,

tanto no número de ações ajuizadas (47% das ações), como também no número

de pedidos de liminar apreciados (60% dos pedidos) e nas decisões que implicam

a revisão da atividade normativa do Poder Executivo federal em sede de liminar

(60% das decisões).

Esse predomínio, no entanto, não é repetido nos casos em que há

julgamento de mérito, tendo em vista que as ações que envolvem MPs

representam apenas 29% das decisões com provimento final – casos em que

ocorre a predominância de ações cujo objeto são leis federais.

Ainda que não se possa precisar com exatidão os fatores que

determinaram esses resultados, é importante observar que a diferença da

quantidade de ações que ingressam no STF por período não implica,

necessariamente, que haja maior ou menor númeor de julgamentos. A tpitulo

exemplificativo, aasta apontar que entre o início de 2005 e final de 2006 foram

ajuizadas 60 ações, ao passo que houve somente 1 decisão de revisão em sede

0

10

20

30

40

50

60

entrada apreciação LIMINAR sucesso na LIMINAR julgamento de MÉRITO sucesso no MÉRITO

Medidas provisórias

Leis

Decretos presidenciais

Portarias, circulares, despachos e instruções normativas, atos, pareceres, orientaçã

o, ordemResoluções

Decretos-lei

Emendas constitucionais, Constituições

liminar. Em contrapartida, no ano de 2000 foram ajuizadas 51 ações e houve 6

decisões liminares com revisão.

O gráfico a seguir mostra os tipos de atos que são revisados nas

liminares e decisões finais pelo tribunal. Novamente, são as medidas provisórias

(46 ações) e as leis federais (16 ações) os atos normativos com maior índice de

revisão pelo STF, dentre os atos normativos do Executivo Federal. Há, no

entanto, uma nítida predominância da

de liminar, que não é acompanhado pelas decisões finais.

Este gráfico corrobora, novamente, a hipótese de que as liminares,

especialmente no caso das medidas provisórias, desempenham um papel

autônomo e diferenciado de simples medida judicial cautelar que visa a proteger

a utilidade de provimento final de mérito. Nota

liminares com revisão proporcionalmente maior em ações que questionavam

medidas provisórias do que nos demais cas

No caso das MPs em particular, há o fato de haver a perda de objeto com

o decurso do prazo de 60 dias de sua edição (prorrogável uma única vez, por

86 Não obstante estes números demonstrarem como o STF tem gerido a sua pauta, não é possível identificar nenhuma inferência direta com peculiaridades das medidas provisórias, uma vez que disparidades como essas ocorrem também nos outros atos normativos.87 Da análise deste gráfico, extraihá proporcionalmente um número bem maior de revisões em sede de liminar do que em grau definitivo. Entretanto, em razão do número muito pequeno destes casos, possíveis hipóteses são menos robustas.

104

liminar. Em contrapartida, no ano de 2000 foram ajuizadas 51 ações e houve 6

decisões liminares com revisão.86

O gráfico a seguir mostra os tipos de atos que são revisados nas

cisões finais pelo tribunal. Novamente, são as medidas provisórias

(46 ações) e as leis federais (16 ações) os atos normativos com maior índice de

revisão pelo STF, dentre os atos normativos do Executivo Federal. Há, no

entanto, uma nítida predominância da revisão de medidas provisórias em sede

de liminar, que não é acompanhado pelas decisões finais.

Gráfico 36

Este gráfico corrobora, novamente, a hipótese de que as liminares,

especialmente no caso das medidas provisórias, desempenham um papel

diferenciado de simples medida judicial cautelar que visa a proteger

a utilidade de provimento final de mérito. Nota-se que houve um número de

liminares com revisão proporcionalmente maior em ações que questionavam

medidas provisórias do que nos demais casos.87

No caso das MPs em particular, há o fato de haver a perda de objeto com

o decurso do prazo de 60 dias de sua edição (prorrogável uma única vez, por

Não obstante estes números demonstrarem como o STF tem gerido a sua pauta, não é possível

inferência direta com peculiaridades das medidas provisórias, uma vez que disparidades como essas ocorrem também nos outros atos normativos.

Da análise deste gráfico, extrai-se que também nos casos de revisão de Decretos Presidenciais e um número bem maior de revisões em sede de liminar do que em grau

definitivo. Entretanto, em razão do número muito pequeno destes casos, possíveis hipóteses são

liminar. Em contrapartida, no ano de 2000 foram ajuizadas 51 ações e houve 6

O gráfico a seguir mostra os tipos de atos que são revisados nas

cisões finais pelo tribunal. Novamente, são as medidas provisórias

(46 ações) e as leis federais (16 ações) os atos normativos com maior índice de

revisão pelo STF, dentre os atos normativos do Executivo Federal. Há, no

revisão de medidas provisórias em sede

Este gráfico corrobora, novamente, a hipótese de que as liminares,

especialmente no caso das medidas provisórias, desempenham um papel

diferenciado de simples medida judicial cautelar que visa a proteger

se que houve um número de

liminares com revisão proporcionalmente maior em ações que questionavam

No caso das MPs em particular, há o fato de haver a perda de objeto com

o decurso do prazo de 60 dias de sua edição (prorrogável uma única vez, por

Não obstante estes números demonstrarem como o STF tem gerido a sua pauta, não é possível inferência direta com peculiaridades das medidas provisórias, uma vez que

se que também nos casos de revisão de Decretos Presidenciais e um número bem maior de revisões em sede de liminar do que em grau

definitivo. Entretanto, em razão do número muito pequeno destes casos, possíveis hipóteses são

105

igual período desde a EC 32/2000)88, tornando possível que tenha havido a perda

de objeto entre a concessão ou negação da liminar e a decisão final. Deve-se

ressaltar que mesmo antes da EC nº 32/2001, quando eram possíveis ilimitadas

reedições das MPs, havia a perda de objeto quando a reedição da medida

provisória não era acompanhada pelo aditamento da ação pelo impetrante.

Possíveis explicações para a grande diferença entre o número de decisões

liminares e de decisões finais de mérito relacionadas à perda de objeto dessas

ações podem ser identificadas como incentivos dados pelo Tribunal por meio da

decisão liminar ao agente normativo, no caso o Executivo Federal, ou ao agente

postulante da demanda.

Nesse sentido, a concessão da liminar sinalizaria ao Executivo possíveis

vícios formais ou materiais da medida provisória questionada, que, se

insanáveis, induziriam a não reedição da MP, ou, caso contrário, provocariam a

reedição da MP já com as devidas modificações julgadas necessárias pelo

Tribunal nos votos proferidos na decisão liminar.

Na hipótese de denegação da liminar, a indução - negativa nesse caso -

seria direcionada ao agente que levou a demanda ao STF, pois, ao vislumbrar o

provável insucesso na decisão de mérito, deixaria de aditar a inicial após a

reedição da MP, restando assim prejudicada a ação.89

A distribuição de concessão de liminares em ações sobre medidas

provisórias dá uma noção mais clara de como se deu o questionamento desses

atos perante o STF. A diminuição da concessão de liminares, de um modo geral

(e relativas às medidas provisórias) segue, aparentemente, uma diminuição

(ainda que em menor proporção) no questionamento desses atos.

Gráfico 37

88 Conforme o §3o do art. 62 da CF, modificado pela EC nº 32, de 11 de setembro de 2001. 89 Não se deve ignorar, no entanto, que outros fatores podem ser determinantes para a ausência de decisão de mérito e que não teriam qualquer relação com as hipóteses levantadas, tais como a possível ausência dos pressupostos processuais por alguma outra causa técnico-processual. Uma análise mais aprofundada sobre as causas da extinção das ações sem julgamento de mérito e a ausência de resposta do tribunal no controle de atos do Executivo será feita no item V.2.6, infra.

De fato, observa

medidas provisórias no período que vai de 1994 a 2004, o que indica que a

diminuição da concessão de liminares nesse período segue a d

questionamento. Isso pode mostrar que a alteração da concessão no tempo não

se deve tanto a uma ação do tribunal, mas sim decorre da própria alteração da

quantidade de questionamentos, sendo a atuação do STF mais reativa a essa

mudança de cenário.

Um dado interessante diz respeito ao tempo de questionamento das

medidas provisórias, contado da data da primeira edição da MP. No gráfico a

seguir, que mapeia o lapso entre a edição da MP e o seu questionamento judicial,

observa-se que de um total de

ou 35%) demorou de 1 a 6 meses para chegar ao STF, enquanto 24% delas

chegaram ao STF mais rapidamente, levando de 11 dias a um mês.

0

5

10

15

20

25

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19

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19

95

19

96

19

97

Distribuição de Medidas Provisórias ao longo

106

De fato, observa-se uma curva decrescente de questionamento de

medidas provisórias no período que vai de 1994 a 2004, o que indica que a

diminuição da concessão de liminares nesse período segue a d

questionamento. Isso pode mostrar que a alteração da concessão no tempo não

se deve tanto a uma ação do tribunal, mas sim decorre da própria alteração da

quantidade de questionamentos, sendo a atuação do STF mais reativa a essa

Um dado interessante diz respeito ao tempo de questionamento das

medidas provisórias, contado da data da primeira edição da MP. No gráfico a

seguir, que mapeia o lapso entre a edição da MP e o seu questionamento judicial,

se que de um total de 394 ações examinadas, grande parte delas (138

ou 35%) demorou de 1 a 6 meses para chegar ao STF, enquanto 24% delas

chegaram ao STF mais rapidamente, levando de 11 dias a um mês.

19

97

19

98

19

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20

00

20

01

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20

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20

06

20

07

20

08

20

09

o de Medidas Provisórias ao longo

do tempo

final com revisão (MP)

liminar com revisão (MP)

entrada de MP

se uma curva decrescente de questionamento de

medidas provisórias no período que vai de 1994 a 2004, o que indica que a

diminuição da concessão de liminares nesse período segue a diminuição do

questionamento. Isso pode mostrar que a alteração da concessão no tempo não

se deve tanto a uma ação do tribunal, mas sim decorre da própria alteração da

quantidade de questionamentos, sendo a atuação do STF mais reativa a essa

Um dado interessante diz respeito ao tempo de questionamento das

medidas provisórias, contado da data da primeira edição da MP. No gráfico a

seguir, que mapeia o lapso entre a edição da MP e o seu questionamento judicial,

394 ações examinadas, grande parte delas (138

ou 35%) demorou de 1 a 6 meses para chegar ao STF, enquanto 24% delas

chegaram ao STF mais rapidamente, levando de 11 dias a um mês.

o de Medidas Provisórias ao longo

final com revisão (MP)

liminar com revisão (MP)

entrada de MP

Dos processos que efetivamente chegaram ao STF, a esmagadora

maioria foi extinta sem julgamento do mérito. Dentro deste universo de análise,

excluíram-se as ações que ainda estão aguardando julgamento, as que ainda não

foram apreciadas e as que não obtiveram liminar.

Nos casos de liminares concedidas, apenas em 8% h

de mérito. Uma razão para isso pode ser justamente o curto prazo de vigência

das medidas provisórias: com a exaustão do prazo, os processos acabam sendo

extintos por perda do objeto, hipótese que é de fato confirmada por meio do

mapeamento dos processos extintos envolvendo medidas provisórias e com

pedidos de liminar apreciados, conforme o gráfico abaixo.

107

Gráfico 38

Dos processos que efetivamente chegaram ao STF, a esmagadora

aioria foi extinta sem julgamento do mérito. Dentro deste universo de análise,

se as ações que ainda estão aguardando julgamento, as que ainda não

foram apreciadas e as que não obtiveram liminar.

Nos casos de liminares concedidas, apenas em 8% há posterior decisão

. Uma razão para isso pode ser justamente o curto prazo de vigência

das medidas provisórias: com a exaustão do prazo, os processos acabam sendo

extintos por perda do objeto, hipótese que é de fato confirmada por meio do

nto dos processos extintos envolvendo medidas provisórias e com

pedidos de liminar apreciados, conforme o gráfico abaixo.

Dos processos que efetivamente chegaram ao STF, a esmagadora

aioria foi extinta sem julgamento do mérito. Dentro deste universo de análise,

se as ações que ainda estão aguardando julgamento, as que ainda não

á posterior decisão

. Uma razão para isso pode ser justamente o curto prazo de vigência

das medidas provisórias: com a exaustão do prazo, os processos acabam sendo

extintos por perda do objeto, hipótese que é de fato confirmada por meio do

nto dos processos extintos envolvendo medidas provisórias e com

Os gráficos a seguir exploram justamente a questão do julgamento de

mérito e da apreciação de pedidos de liminar. Os dad

tese de que, dado o caráter de urgência da ação, tendo em vista o prazo para a

conversão em lei, os processos que têm por objeto o seu questionamento são

apreciados preponderantemente em caráter liminar: com o fim do prazo,

termina-se por extinguir também o processo. D

julgamento de mérito deste ato normativo.

Deve-se ressaltar que, em comparação com outros atos normativos, as

MPs têm um considerável índice de julgamento liminar, ao passo que quand

analisa o julgamento de mérito, o número de decisões cai

gráficos a seguir trazem esses dados.

108

Gráfico 39

Os gráficos a seguir exploram justamente a questão do julgamento de

mérito e da apreciação de pedidos de liminar. Os dados tendem a corroborar a

tese de que, dado o caráter de urgência da ação, tendo em vista o prazo para a

conversão em lei, os processos que têm por objeto o seu questionamento são

apreciados preponderantemente em caráter liminar: com o fim do prazo,

se por extinguir também o processo. Disso, explica-se o baixo índice de

julgamento de mérito deste ato normativo.

se ressaltar que, em comparação com outros atos normativos, as

MPs têm um considerável índice de julgamento liminar, ao passo que quand

analisa o julgamento de mérito, o número de decisões cai substancialmente. Os

gráficos a seguir trazem esses dados.

Os gráficos a seguir exploram justamente a questão do julgamento de

os tendem a corroborar a

tese de que, dado o caráter de urgência da ação, tendo em vista o prazo para a

conversão em lei, os processos que têm por objeto o seu questionamento são

apreciados preponderantemente em caráter liminar: com o fim do prazo,

o baixo índice de

se ressaltar que, em comparação com outros atos normativos, as

MPs têm um considerável índice de julgamento liminar, ao passo que quando se

substancialmente. Os

Dentre os casos que tiveram o seu mérito ou apenas o pedido de liminar

apreciado, foi realizado um mapeamento dos

das demandas ao tribunal. Pôde

sindicatos e partidos são os atores mais ativos em se tratando de

questionamento de atos oriundos do Executivo e, ainda mais, nos casos

envolvendo MP.

No entanto, verifica

liminar apreciado, mas cujo mérito não chegou a ser julgado, é também a

109

Gráficos 40 e 41

Dentre os casos que tiveram o seu mérito ou apenas o pedido de liminar

apreciado, foi realizado um mapeamento dos atores responsáveis pela chegada

das demandas ao tribunal. Pôde-se depreender que as entidades de classe,

sindicatos e partidos são os atores mais ativos em se tratando de

questionamento de atos oriundos do Executivo e, ainda mais, nos casos

Gráfico 42

No entanto, verifica-se que dentre os casos que tiveram o seu pedido de

liminar apreciado, mas cujo mérito não chegou a ser julgado, é também a

Dentre os casos que tiveram o seu mérito ou apenas o pedido de liminar

atores responsáveis pela chegada

se depreender que as entidades de classe,

sindicatos e partidos são os atores mais ativos em se tratando de

questionamento de atos oriundos do Executivo e, ainda mais, nos casos

se que dentre os casos que tiveram o seu pedido de

liminar apreciado, mas cujo mérito não chegou a ser julgado, é também a

atuação dos partidos políticos que se destaca, na medida em que propuseram

61% das ações extintas sem julgamento do mérito, mas que tiveram o pedido de

liminar apreciado.

Isso demonstra

políticos levando demandas ao STF, o seu índice de sucesso é bastante limitado,

pois seus questionamentos

apreciado.

Por outro lado, as entidades de classe e sindicatos desdobram

maiores esforços para atingir êxito em suas demandas em função dos interesses

de seus representados, o que se revela no alto índic

em comparação com o percentual de casos levados por esses agentes no total de

ações envolvendo MPs (cf. gráfico 43

mais por meio do cruzamento dos temas mais recorrentes,

seguir.

110

atuação dos partidos políticos que se destaca, na medida em que propuseram

sem julgamento do mérito, mas que tiveram o pedido de

Gráfico 43

que apesar do grande protagonismo

políticos levando demandas ao STF, o seu índice de sucesso é bastante limitado,

pois seus questionamentos em vários casos não chegam a ter o seu mérito

Por outro lado, as entidades de classe e sindicatos desdobram

maiores esforços para atingir êxito em suas demandas em função dos interesses

de seus representados, o que se revela no alto índice de julgamentos de mérito

em comparação com o percentual de casos levados por esses agentes no total de

ações envolvendo MPs (cf. gráfico 43, supra). Tal hipótese é reforçada

o cruzamento dos temas mais recorrentes, conforme

atuação dos partidos políticos que se destaca, na medida em que propuseram

sem julgamento do mérito, mas que tiveram o pedido de

protagonismo dos partidos

políticos levando demandas ao STF, o seu índice de sucesso é bastante limitado,

ter o seu mérito

Por outro lado, as entidades de classe e sindicatos desdobram-se em

maiores esforços para atingir êxito em suas demandas em função dos interesses

e de julgamentos de mérito

em comparação com o percentual de casos levados por esses agentes no total de

é reforçada ainda

conforme analisado a

Dentre os temas discutidos nas ações que tinham por objeto as 394

medidas provisórias em análise, foi verificada a predominância de questões

econômicas e de seguridade social.

Verificando a incidência de assuntos específicos dentro

grandes temas, identificou

predominância marcante de problemas envolvendo a Previdência Social, ao

passo que o primeiro tema se desdobra em matérias de regulação e de planos

econômicos, havendo também

nacional de desestatização (PND), empresas públicas e sociedades de economia

mista e o sistema financeiro nacional.

111

Gráfico 44

Dentre os temas discutidos nas ações que tinham por objeto as 394

medidas provisórias em análise, foi verificada a predominância de questões

nômicas e de seguridade social.

Verificando a incidência de assuntos específicos dentro

grandes temas, identificou-se que no campo da seguridade social há uma

predominância marcante de problemas envolvendo a Previdência Social, ao

passo que o primeiro tema se desdobra em matérias de regulação e de planos

econômicos, havendo também significativa parcela de casos sobre o plano

nacional de desestatização (PND), empresas públicas e sociedades de economia

mista e o sistema financeiro nacional.

Dentre os temas discutidos nas ações que tinham por objeto as 394

medidas provisórias em análise, foi verificada a predominância de questões

Verificando a incidência de assuntos específicos dentro destes dois

se que no campo da seguridade social há uma

predominância marcante de problemas envolvendo a Previdência Social, ao

passo que o primeiro tema se desdobra em matérias de regulação e de planos

significativa parcela de casos sobre o plano

nacional de desestatização (PND), empresas públicas e sociedades de economia

Esses gráficos apontam

problemáticos na atuação normativa do Executivo federal, mas também

identificam os temas aos quais os atores dão maior importância, quais sejam:

políticas econômicas e reformas previdenciárias. Essa

a hipótese levantada da que a atuação

à utilização do controle de constitucionalidade como instrumento de oposição,

buscando chamar atenção para eventuais f

mesmo modo, parece evidente a

de sindicatos e entidades de classe, que têm interesse direto no questionamento

dessas reformas.

112

Gráfico 45

Gráfico 46

apontam não apenas os temas tidos como

ticos na atuação normativa do Executivo federal, mas também

os temas aos quais os atores dão maior importância, quais sejam:

políticas econômicas e reformas previdenciárias. Essa leitura ajuda

a hipótese levantada da que a atuação dos partidos políticos estaria relacionada

à utilização do controle de constitucionalidade como instrumento de oposição,

buscando chamar atenção para eventuais falhas das políticas governistas. Do

mesmo modo, parece evidente a relação entre temas previdenciários e a atuação

de sindicatos e entidades de classe, que têm interesse direto no questionamento

tidos como mais

ticos na atuação normativa do Executivo federal, mas também

os temas aos quais os atores dão maior importância, quais sejam:

leitura ajuda a corroborar

dos partidos políticos estaria relacionada

à utilização do controle de constitucionalidade como instrumento de oposição,

alhas das políticas governistas. Do

iários e a atuação

de sindicatos e entidades de classe, que têm interesse direto no questionamento

2.1.3. A resposta do STF na decisão de mérito: excesso de

intervencionismo?

No presente tópico

comportamento do STF nos casos em que há julgamento final, procurando traçar

algumas linhas comparativas com as análises que, no tópico anterior, foram

feitas dos casos com resposta em sede liminar, de ações env

normativos com origem no Executivo e no Legislativo federal.

O primeiro, e talvez mais evidente desses dados, é a proporção de casos

nos quais houve decisão liminar

gráfico abaixo ilustra uma proporção

mérito e de liminar, envolvendo atos oriundos do Poder Legislativo (cerca de

12% e 11,5%, respectivamente).

desproporção entre a quantidade de decisões proferidas em sede d

decisões de mérito envolvendo atos normativos

federal.

Outros dados foram levantados, relativamente ao que se chama de taxa

de acesso ao tribunal (i.e.

apreciado pelo STF). Esses dados foram cruzados com outras informações, tais

como os atores e as respectivas

113

2.1.3. A resposta do STF na decisão de mérito: excesso de

No presente tópico, serão avaliados alguns dados gerais sobre o

comportamento do STF nos casos em que há julgamento final, procurando traçar

algumas linhas comparativas com as análises que, no tópico anterior, foram

feitas dos casos com resposta em sede liminar, de ações env

normativos com origem no Executivo e no Legislativo federal.

O primeiro, e talvez mais evidente desses dados, é a proporção de casos

nos quais houve decisão liminar ou de mérito procedentes. Como se nota, o

gráfico abaixo ilustra uma proporção bastante equilibrada de julgamentos de

mérito e de liminar, envolvendo atos oriundos do Poder Legislativo (cerca de

12% e 11,5%, respectivamente). Por outro lado, como visto,

desproporção entre a quantidade de decisões proferidas em sede d

decisões de mérito envolvendo atos normativos com origem no Executivo

Gráfico 47

Outros dados foram levantados, relativamente ao que se chama de taxa

i.e., ações que lograram ter seu pedido de liminar

pelo STF). Esses dados foram cruzados com outras informações, tais

como os atores e as respectivas taxas de acesso em sede de liminar.

2.1.3. A resposta do STF na decisão de mérito: excesso de

serão avaliados alguns dados gerais sobre o

comportamento do STF nos casos em que há julgamento final, procurando traçar

algumas linhas comparativas com as análises que, no tópico anterior, foram

feitas dos casos com resposta em sede liminar, de ações envolvendo atos

O primeiro, e talvez mais evidente desses dados, é a proporção de casos

. Como se nota, o

bastante equilibrada de julgamentos de

mérito e de liminar, envolvendo atos oriundos do Poder Legislativo (cerca de

há considerável

desproporção entre a quantidade de decisões proferidas em sede de liminar e

com origem no Executivo

Outros dados foram levantados, relativamente ao que se chama de taxa

, ações que lograram ter seu pedido de liminar

pelo STF). Esses dados foram cruzados com outras informações, tais

em sede de liminar.

Como se verifica, em ações envolvendo atos normativos

Executivo, os atores que obtiveram maior sucesso na

liminar nas respectivas ações são partidos políticos (47%) e sindicatos e

entidades de classe (34%).

Esses dados são um pouco diferentes quando confrontados com os

extraídos das ações de controle concentrado de const

atos normativos com origem no Legislativo federal. Conforme ilustrado no gráfico

abaixo, a apreciação dos pedidos de liminar, nesses processos, é obtida por três

principais atores: partidos políticos, tal como ocorre nos processos

atos do Executivo (33%); sindicatos e entidades de classe, em segundo lugar

(30%); e, curiosamente, outro ator, com atuação bastante discreta no controle

de atos do Executivo, a saber, o Procurador Geral da República (21%).

114

Como se verifica, em ações envolvendo atos normativos

, os atores que obtiveram maior sucesso na apreciação dos pedidos de

liminar nas respectivas ações são partidos políticos (47%) e sindicatos e

entidades de classe (34%).

Gráfico 48

Esses dados são um pouco diferentes quando confrontados com os

extraídos das ações de controle concentrado de constitucionalidade envolvendo

atos normativos com origem no Legislativo federal. Conforme ilustrado no gráfico

abaixo, a apreciação dos pedidos de liminar, nesses processos, é obtida por três

principais atores: partidos políticos, tal como ocorre nos processos

atos do Executivo (33%); sindicatos e entidades de classe, em segundo lugar

(30%); e, curiosamente, outro ator, com atuação bastante discreta no controle

de atos do Executivo, a saber, o Procurador Geral da República (21%).

Como se verifica, em ações envolvendo atos normativos originários do

apreciação dos pedidos de

liminar nas respectivas ações são partidos políticos (47%) e sindicatos e

Esses dados são um pouco diferentes quando confrontados com os

itucionalidade envolvendo

atos normativos com origem no Legislativo federal. Conforme ilustrado no gráfico

abaixo, a apreciação dos pedidos de liminar, nesses processos, é obtida por três

principais atores: partidos políticos, tal como ocorre nos processos envolvendo

atos do Executivo (33%); sindicatos e entidades de classe, em segundo lugar

(30%); e, curiosamente, outro ator, com atuação bastante discreta no controle

de atos do Executivo, a saber, o Procurador Geral da República (21%).

115

Gráfico 49

A comparação entre a distribuição dos casos em que houve julgamento

de mérito (52 casos do Executivo, dos quais, 29 apenas com julgamento de

mérito, e 23 com julgamento de mérito e também em liminar) e dos 173 em que

houve apreciação da liminar (23 dos quais também houve resposta definitiva de

mérito) também parece indicar dados interessantes quando feito o cruzamento

com os tipos de atos questionados e sua participação no total de casos que

atingiram a fase de decisão de mérito, e aqueles que ficaram apenas na

apreciação de liminar.

Como se vê nos gráficos abaixo, os tipos de atos questionados nos casos

com julgamento de mérito estão em uma proporção um pouco diferente dos

tipos de atos questionados nos casos decididos em sede de liminar. Veja-se, e.g.,

o caso das Medidas Provisórias: a maior parte das ações envolvendo atos

oriundos do Executivo federal que tiveram a liminar apreciada versava sobre

medida provisória. No universo de ações com liminares apreciadas, impugnam-se

dispositivos de uma MP em 130 delas, enquanto que aproximadamente 63 ações

com liminar apreciada impugnam leis de iniciativa do Executivo federal e

aproximadamente 58 ações têm por objeto outros tipos de atos normativos de

origem do Executivo.

Gráfico 50

33%

30%

21%

6%

6%

1%

3%

0%

LEGISLATIVO: apreciação liminar/ator

Partidos Políticos

Sindicatos e Entidades de Classe

PGR

OAB

Governadores

Legislativo Estadual

Presidente

Outros (não legitimados) + Leg. Fed.

Relativamente ao controle dos atos normativos emanados do Legislativo

federal, tal diferença não é verificada. Dentre os 95 casos com resposta,

envolvendo esse grupo de ações, apenas 54 tiveram como resposta uma decisão

final, sendo que em 41 houve aprecia

proporção entre as ações envolvendo leis ordinárias (principal veículo de atuação

116

Gráfico 51

Relativamente ao controle dos atos normativos emanados do Legislativo

federal, tal diferença não é verificada. Dentre os 95 casos com resposta,

envolvendo esse grupo de ações, apenas 54 tiveram como resposta uma decisão

final, sendo que em 41 houve apreciação apenas da liminar. Nesses casos, a

proporção entre as ações envolvendo leis ordinárias (principal veículo de atuação

Relativamente ao controle dos atos normativos emanados do Legislativo

federal, tal diferença não é verificada. Dentre os 95 casos com resposta,

envolvendo esse grupo de ações, apenas 54 tiveram como resposta uma decisão

ção apenas da liminar. Nesses casos, a

proporção entre as ações envolvendo leis ordinárias (principal veículo de atuação

117

normativa do Poder Legislativo) com decisão de liminar se mantém também

entre os casos que alcançaram um julgamento de mérito, ainda que com uma

relativa queda.

Objetivando um estudo mais aprofundado sobre a resposta do STF às

demandas que chegam ao Tribunal, é necessário analisar quais foram os temas

que tiveram sucesso ou não na concessão de liminares e na procedência ou

improcedência do mérito. Nesse contexto, vale lembrar que aquelas ações em

que a liminar foi concedida ou, no mérito, foram julgadas procedentes, o ato

normativo questionado foi declarado inconstitucional; ao passo que aquelas

ações cuja liminar foi denegada ou, no mérito, foram julgadas improcedentes, o

ato questionado foi considerado constitucional.

Gráfico 52

As ações em que se questionaram atos oriundos do Executivo e cujo

pedido de liminar foi concedido versavam sobre os seguintes temas

(respectivamente): econômico (15), processo (12), servidor público (12) e

tributário (8). Com efeito, quando o Executivo decidiu implementar planos

econômicos objetivando o crescimento da economia nacional, alguns setores da

Ambiental; 3Civil Comercial; 2

Consumidor; 4

Direitos Fundamentais; 0

Econômico; 15

Educação; 1

Eleitoral e organização part.; 0

Financeiro; 6

Índios/quilombolas; 0

Organização Institucional; 3

Outras Políticas Públicas; 1

Penal; 0Processo; 12

Processo Legislativo; 1

Seguridade Social; 7

Serviço Público; 4

Servidor Público; 12

Trabalho; 6

Trânsito; 0Tributário; 8

EXECUTIVO: temas das ações com liminares concedidas

economia se sentem prejudicados e propõem ação direta de in

conta tais medidas.

Ademais, quando se tratava de Medida Provisória cujo tema versava

sobre matéria processual

esses tipos de atos normativos normalmente eram objeto de ações de

inconstitucionalidade.

Tais ações visavam a restringir a possibilidade de adoção de medidas

provisórias sobre tais temas (art. 62, parágrafo 1º, inciso I, alíneas

Constituição Federal de 1988

pode ser dito das medidas provisórias que tinham por objeto tratar do regime

dos servidores públicos, pois tais medidas afetam diretamente o orçamento

público. Por essa razão, elas eram comumente questionadas por meio de ações

de controle concentrado de constitucionalid

Já os atos do Poder Legislativo são questionados e apreciados por liminar

principalmente quando versam sobre temas como: seguridade social, servidor

público, tributário, trabalho, econômico, direito eleitoral e organizações

partidárias, processo e financeiro. A situação praticamente se mantém inalterada

118

economia se sentem prejudicados e propõem ação direta de inconstitucionalidade

Ademais, quando se tratava de Medida Provisória cujo tema versava

de algum ramo do Direito (Penal, Civil, Trabalhista),

esses tipos de atos normativos normalmente eram objeto de ações de

Tais ações visavam a restringir a possibilidade de adoção de medidas

temas (art. 62, parágrafo 1º, inciso I, alíneas

1988 – redação conforme a EC n. 32/2001). O mesmo

das medidas provisórias que tinham por objeto tratar do regime

dos servidores públicos, pois tais medidas afetam diretamente o orçamento

público. Por essa razão, elas eram comumente questionadas por meio de ações

de controle concentrado de constitucionalidade.

Gráfico 53

Já os atos do Poder Legislativo são questionados e apreciados por liminar

principalmente quando versam sobre temas como: seguridade social, servidor

público, tributário, trabalho, econômico, direito eleitoral e organizações

rocesso e financeiro. A situação praticamente se mantém inalterada

constitucionalidade

Ademais, quando se tratava de Medida Provisória cujo tema versava

de algum ramo do Direito (Penal, Civil, Trabalhista),

esses tipos de atos normativos normalmente eram objeto de ações de

Tais ações visavam a restringir a possibilidade de adoção de medidas

temas (art. 62, parágrafo 1º, inciso I, alíneas b e d da

redação conforme a EC n. 32/2001). O mesmo

das medidas provisórias que tinham por objeto tratar do regime

dos servidores públicos, pois tais medidas afetam diretamente o orçamento

público. Por essa razão, elas eram comumente questionadas por meio de ações

Já os atos do Poder Legislativo são questionados e apreciados por liminar

principalmente quando versam sobre temas como: seguridade social, servidor

público, tributário, trabalho, econômico, direito eleitoral e organizações

rocesso e financeiro. A situação praticamente se mantém inalterada

quando da análise do mérito: a única exceção é o crescimento das ações sobre o

tema dos direitos fundamentais.

A diversidade de temas pode ser explicada pelo fato do Poder

ser o criador de normas por excelência, versando sobre os mais diferentes

temas. Isso decorre, em parte, do desenho institucional e da distribuição de

competências presentes no texto constitucional.

Por outro lado, dentro do grupo de competênci

Legislativo, é possível afirmar, inclusive, que esses são os temas ou áreas

considerados mais sensíveis de regulação ou juridificação por parte do Congresso

Nacional, tendo em vista a reação provocada nos atores legitimados, que

acessarem o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, como

resultado imediato das tentativas de normatização desses temas pelo legislador.

119

quando da análise do mérito: a única exceção é o crescimento das ações sobre o

tema dos direitos fundamentais.

Gráfico 54

A diversidade de temas pode ser explicada pelo fato do Poder

ser o criador de normas por excelência, versando sobre os mais diferentes

temas. Isso decorre, em parte, do desenho institucional e da distribuição de

competências presentes no texto constitucional.

Por outro lado, dentro do grupo de competências relativas ao Poder

Legislativo, é possível afirmar, inclusive, que esses são os temas ou áreas

considerados mais sensíveis de regulação ou juridificação por parte do Congresso

Nacional, tendo em vista a reação provocada nos atores legitimados, que

arem o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, como

resultado imediato das tentativas de normatização desses temas pelo legislador.

Gráfico 55

quando da análise do mérito: a única exceção é o crescimento das ações sobre o

A diversidade de temas pode ser explicada pelo fato do Poder Legislativo

ser o criador de normas por excelência, versando sobre os mais diferentes

temas. Isso decorre, em parte, do desenho institucional e da distribuição de

as relativas ao Poder

Legislativo, é possível afirmar, inclusive, que esses são os temas ou áreas

considerados mais sensíveis de regulação ou juridificação por parte do Congresso

Nacional, tendo em vista a reação provocada nos atores legitimados, que

arem o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, como

resultado imediato das tentativas de normatização desses temas pelo legislador.

Esses dados são interessantes, pois revelam, por um lado, qual o foco de

atuação da produção normativa, especialmente quando consideramos temas de

competência comum entre ambos os Poderes, tais como leis penais (nenhuma

teve seu mérito apreciado, quer em ações questionando atos emanados do

Executivo, quer questionando atos oriundos do Legislativo).

Curioso, por outro lado, é o enfoque que a legislação eleitoral e de

organização partidária tem, por outro lado, no controle da atuação e do

desempenho normativo do Poder Legislativo (18%, por exemplo, das ações que

atingiram um julgamento de mérito), apesa

exclusiva do Poder Legislativo.

V.2.5 Perfil dos casos com alguma resposta do STFAntes de encerrar esta primeira etapa de análise quantitativa aplicada

sobre o que se convencionou chamar de

alguns dados que contribuem para esclarecer o perfil dos casos que atingem o

julgamento de mérito e/ou uma resposta do tribunal em sede

120

Esses dados são interessantes, pois revelam, por um lado, qual o foco de

mativa, especialmente quando consideramos temas de

competência comum entre ambos os Poderes, tais como leis penais (nenhuma

teve seu mérito apreciado, quer em ações questionando atos emanados do

Executivo, quer questionando atos oriundos do Legislativo).

urioso, por outro lado, é o enfoque que a legislação eleitoral e de

organização partidária tem, por outro lado, no controle da atuação e do

desempenho normativo do Poder Legislativo (18%, por exemplo, das ações que

atingiram um julgamento de mérito), apesar de não ser um tema de iniciativa

exclusiva do Poder Legislativo.

Perfil dos casos com alguma resposta do STFAntes de encerrar esta primeira etapa de análise quantitativa aplicada

sobre o que se convencionou chamar de fatores de saída, serão

alguns dados que contribuem para esclarecer o perfil dos casos que atingem o

julgamento de mérito e/ou uma resposta do tribunal em sede

Esses dados são interessantes, pois revelam, por um lado, qual o foco de

mativa, especialmente quando consideramos temas de

competência comum entre ambos os Poderes, tais como leis penais (nenhuma

teve seu mérito apreciado, quer em ações questionando atos emanados do

urioso, por outro lado, é o enfoque que a legislação eleitoral e de

organização partidária tem, por outro lado, no controle da atuação e do

desempenho normativo do Poder Legislativo (18%, por exemplo, das ações que

r de não ser um tema de iniciativa

Perfil dos casos com alguma resposta do STF Antes de encerrar esta primeira etapa de análise quantitativa aplicada

, serão apresentados

alguns dados que contribuem para esclarecer o perfil dos casos que atingem o

julgamento de mérito e/ou uma resposta do tribunal em sede de liminar.

Diferentemente do tópico anterior, aqui os dados serão apresentados, em sua

maior parte, por meio de um mesmo gráfico comparativo do desempenho das

ações envolvendo atos do Executivo e do Legislativo.

A principal finalidade, aqui, é tentar compreender se outras variáveis

tais como tema da ação, tipo de ato normativo questionado ou mesmo perfil dos

demandantes – exercem algum tipo de influência no desfecho das ações que

receberam algum tipo de resposta do STF.

No gráfico acima são apresentados os temas em relação aos quais foram

concedidas as liminares pleiteadas. As barras azul e verme

origem dos atos questionados, se provenientes do Legislativo ou do Executivo,

respectivamente. As ações em que se impugnam atos do Legislativo que tiveram

mais liminares concedidas versavam sobre tributário (seguido de “eleitoral e

organização partidária”, “processo” e “serviço público”), enquanto que as ações

questionando atos do Executivo com maior número de liminares concedidas são

da área econômica (seguida dos temas de “servidor público”, “tributário” e

“processo legislativo”).

121

Diferentemente do tópico anterior, aqui os dados serão apresentados, em sua

io de um mesmo gráfico comparativo do desempenho das

ações envolvendo atos do Executivo e do Legislativo.

A principal finalidade, aqui, é tentar compreender se outras variáveis

tais como tema da ação, tipo de ato normativo questionado ou mesmo perfil dos

exercem algum tipo de influência no desfecho das ações que

receberam algum tipo de resposta do STF.

Gráfico 56

No gráfico acima são apresentados os temas em relação aos quais foram

concedidas as liminares pleiteadas. As barras azul e vermelha representam a

origem dos atos questionados, se provenientes do Legislativo ou do Executivo,

respectivamente. As ações em que se impugnam atos do Legislativo que tiveram

mais liminares concedidas versavam sobre tributário (seguido de “eleitoral e

zação partidária”, “processo” e “serviço público”), enquanto que as ações

questionando atos do Executivo com maior número de liminares concedidas são

da área econômica (seguida dos temas de “servidor público”, “tributário” e

Diferentemente do tópico anterior, aqui os dados serão apresentados, em sua

io de um mesmo gráfico comparativo do desempenho das

A principal finalidade, aqui, é tentar compreender se outras variáveis –

tais como tema da ação, tipo de ato normativo questionado ou mesmo perfil dos

exercem algum tipo de influência no desfecho das ações que

No gráfico acima são apresentados os temas em relação aos quais foram

lha representam a

origem dos atos questionados, se provenientes do Legislativo ou do Executivo,

respectivamente. As ações em que se impugnam atos do Legislativo que tiveram

mais liminares concedidas versavam sobre tributário (seguido de “eleitoral e

zação partidária”, “processo” e “serviço público”), enquanto que as ações

questionando atos do Executivo com maior número de liminares concedidas são

da área econômica (seguida dos temas de “servidor público”, “tributário” e

Aparentemente, a

fato, os temas sobre os quais esses dois Poderes mais atuam.

de temas sensíveis, cuja normatização causa maior repercussão e mobilização

dos atores legitimados, levando

constitucionalidade, o que levaria a serem estesos temas com o maior número

de atos questionados.

Além disso, é possível sustentar, ao menos aparentemente, que estas

são algumas das áreas naturalmente controversas e

de interesses, envolvendo grupos organizados e de expressivo grande poderio

econômico que, ao se sentirem prejudicados, acessarão o STF para reverter o

ato em vigor.

Dentre as ações que tiveram seu mérito julgado

quais houve de fato e definitivamente uma revisão da produção normativa dos

demais Poderes, a distribuição dos temas com mais decisões desse tipo é um

pouco diferente se comparada à dsitribuição de temas das ações com liminares

concedidas. Assim, os temas de seguridade social e eleitoral/organização

partidária recebem um destaque que não tinham na fase da concessão de

liminares, conforme se verifica no gráfico acima.

122

explicação mais plausível para isso é que são estes, de

fato, os temas sobre os quais esses dois Poderes mais atuam. Ou ainda, trata

de temas sensíveis, cuja normatização causa maior repercussão e mobilização

dos atores legitimados, levando-os a utilizarem o controle concentrado de

constitucionalidade, o que levaria a serem estesos temas com o maior número

Além disso, é possível sustentar, ao menos aparentemente, que estas

são algumas das áreas naturalmente controversas e nas quais há grande disputa

de interesses, envolvendo grupos organizados e de expressivo grande poderio

econômico que, ao se sentirem prejudicados, acessarão o STF para reverter o

Gráfico 57

Dentre as ações que tiveram seu mérito julgado procedente, i.e., nas

quais houve de fato e definitivamente uma revisão da produção normativa dos

demais Poderes, a distribuição dos temas com mais decisões desse tipo é um

pouco diferente se comparada à dsitribuição de temas das ações com liminares

idas. Assim, os temas de seguridade social e eleitoral/organização

partidária recebem um destaque que não tinham na fase da concessão de

liminares, conforme se verifica no gráfico acima.

explicação mais plausível para isso é que são estes, de

Ou ainda, trata-se

de temas sensíveis, cuja normatização causa maior repercussão e mobilização

s a utilizarem o controle concentrado de

constitucionalidade, o que levaria a serem estesos temas com o maior número

Além disso, é possível sustentar, ao menos aparentemente, que estas

nas quais há grande disputa

de interesses, envolvendo grupos organizados e de expressivo grande poderio

econômico que, ao se sentirem prejudicados, acessarão o STF para reverter o

procedente, i.e., nas

quais houve de fato e definitivamente uma revisão da produção normativa dos

demais Poderes, a distribuição dos temas com mais decisões desse tipo é um

pouco diferente se comparada à dsitribuição de temas das ações com liminares

idas. Assim, os temas de seguridade social e eleitoral/organização

partidária recebem um destaque que não tinham na fase da concessão de

123

Isso pode ser explicado pela natureza das questões tratadas em cada

caso, o que pode ser feito, e.g., por meio da análise da quantidade de normas

constitucionais existente sobre cada tema. Isso quer dizer que parece plausível

que, a depender da especificidade das regras contidas no texto constitucional

sobre um determinado tema, o controle de constitucionalidade de atos

normativos referentes a esse tema seja mais favorecido pelo arcabouço

constitucional do que outro tema.

Além disso, é igualmente possível explicar os dados explicitados no

gráfico por meio do tipo de ato normativo (resoluções, leis, decretos, emendas,

medidas provisórias, etc.) cuja natureza seja temporária sem condições para

“sobreviver” a um tempo de tramitação médio relativamente elevado no STF,

sem que, invariavelmente, perca seu objeto em algum momento. Esse é o caso,

e.g., das Medidas Provisórias, que tratam de muitos temas econômicos, o que

explica uma preponderância do Executivo no gráfico acima, e uma redução dessa

taxa de sucesso no momento de uma resposta definitiva do tribunal.

Do mesmo modo, foi examinada a quantidade de decisões proferidas por

ano pelo STF no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade tanto dos

atos normativos com origem no Executivo e no Legislativo federal. Nesse

sentido, os gráficos abaixo apresentam o número percentual de decisões em

relação a atos do Executivo e do Legislativo desde 1988. As barras demonstram

a porcentagem de cada ano em relação ao total (de 1988 a meados de

julho/2010), que representa 100%. Estas porcentagens ilustram cada etapa do

processo, sendo, portanto, quatro barras por ano: liminar apreciada, liminar

concedida, mérito apreciado, mérito procedente.

Os anos em que vemos um porcentual muito maior em relação à média

nas tabelas do Executivo e do Legislativo são, respectivamente, 1995 e 2006.

Gráfico 58

No caso do Executivo, há uma primeira explicação óbvia: neste ano, o

primeiro do governo FHC, o Executivo federal editou diversas normas que

procuravam implementar a Reforma gerencial do Estado

político-partidária, bem como diversos setores da sociedade mobilizaram

contra os atos do Executivo editados naquele ano, o que explicaria o tamanho da

barra referente ao ano citado.

Já no caso das ações envolvendo atos oriundos do Legislativo, uma

explicação possível é o fato de 2006 ter sido o ano subseqüente à instalação do

90 No mesmo sentido, , cf. Rogério Bastgoverno e democracia no Brasil”,

124

No caso do Executivo, há uma primeira explicação óbvia: neste ano, o

primeiro do governo FHC, o Executivo federal editou diversas normas que

procuravam implementar a Reforma gerencial do Estado90, sendo que a oposição

em como diversos setores da sociedade mobilizaram

contra os atos do Executivo editados naquele ano, o que explicaria o tamanho da

barra referente ao ano citado.

Gráfico 59

Já no caso das ações envolvendo atos oriundos do Legislativo, uma

ssível é o fato de 2006 ter sido o ano subseqüente à instalação do

No mesmo sentido, , cf. Rogério Bastos Arantes; e Cláudio Gonçalves Couto, “Constituição,

governo e democracia no Brasil”, Revista Brasileira de Ciências Sociais 21 (2006), pp. 44 e s.

No caso do Executivo, há uma primeira explicação óbvia: neste ano, o

primeiro do governo FHC, o Executivo federal editou diversas normas que

, sendo que a oposição

em como diversos setores da sociedade mobilizaram-se

contra os atos do Executivo editados naquele ano, o que explicaria o tamanho da

Já no caso das ações envolvendo atos oriundos do Legislativo, uma

ssível é o fato de 2006 ter sido o ano subseqüente à instalação do

os Arantes; e Cláudio Gonçalves Couto, “Constituição, 21 (2006), pp. 44 e s.

125

CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e de suas metas de julgamento de casos, o

que pode ter gerado este salto inicial no ano citado, embora os anos seguintes

tenham registrado o retorno à média histórica. Outro fator visível no ano de

2006, referente ao gráfico do Legislativo, é que não houve nenhuma liminar

apreciada. Foi o único ano em que tal fato ocorreu. Necessária a ressalva de que

a presente pesquisa não possui dados suficientes para levantar quaisquer

hipóteses consistentes para tentar explicar esses resultados.91

Ademais, outro aspecto a ser destacado no que diz respeito aos gráficos

58 e 59 é a quantidade de ações que tiveram o mérito apreciado. Uma

explicação possível para este ponto é a maior utilização pelo STF do disposto no

artigo 12, da Lei 9868/1999. Esse dispositivo legal permite ao relator da ação de

controle concentrado de constitucionalidade, em face da relevância da matéria e

de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, submeter

a apreciação da liminar diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar

definitivamente a ação. Ou seja, ao invés de julgar a liminar primeiramente para,

somente em outra ocasião, decidir o mérito, o art. 12 revela-se uma importante

técnica decisória no controle de constitucionalidade para se evitar o duplo

julgamento.

Em pesquisa recente sobre o tema, foi verificado que, entre 1988 e 2006,

87% das ações diretas de inconstitucionalidade apresentavam pedido de liminar

e que, no período compreendido entre 2002 e 2006, 62% dos pedidos liminares

foram submetidos ao procedimento abreviado do art. 12.92 Por meio da análise

do resultado dos julgamentos liminares e finais de todas as ADIs julgadas pelo

STF nesse período, o autor conclui que o uso do art. 12 permitiu que o STF

praticamente extinguisse o julgamento antecipado dos pedidos liminares.

Além disso, indeferindo a liminar ou aplicando o art. 12, tem se o mesmo

resultado nas ADIs, o dispositivo questionado permanece vigente e eficaz, e é

possível a chamada ‘prova terapêutica’ do ato normativo: o Tribunal testa os

efeitos da aplicação da norma por um certo período de tempo, após o qual são

avaliados os resultados e é então julgado o mérito.

91 A mesma conclusão é apresentada por Pedro Luiz do Nascimento Filho, “Medidas cautelares em Ação Direta de Inconstitucionalidade”, In: Diogo R. Coutinho; e Adriana M. Vojvodic (orgs.), Jurisprudência Constitucional: como decide o STF?, São Paulo: Malheiros, 2009, pp. 192-195. 92 Cf. Pedro Luiz Nascimento Filho, “Medidas cautelares em Ação Direta de Inconstitucionalidade”, pp. 192 e ss.

Analisadas as decisões profer

exame dos tipos de atos questionados e o sucesso nas ações (

de inconstitucionalidade) em cada etapa do julgamento (da entrada ao sucesso

no mérito). O universo analisado no gráfico a seguir é forma

origem no Poder Executivo.

Alguns aspectos são visíveis: as curvas referentes a leis e medidas

provisórias chegam a ser inversamente proporcionais. O número de Medidas

Provisórias questionadas é maior que o de leis (40% do tot

menos de 30%); do total de ações em que há apreciação de liminar, vê

disparidade ainda maior (mais de 50% tratam de MPs contra cerca de 25% de

leis), margem que aumenta ainda mais na taxa de sucesso da liminar (55%

contra 25% do total, aproximadamente).

Porém, os gráficos se invertem quando se passa ao mérito. Na

julgamento de mérito, vê

25% do total de ações em que há julgamento; no caso das leis, a taxa é de

50%. Em relação ao sucesso na apreciação do mérito, a disparidade é mantida e

no sentido inverso do das liminares, como já

126

Analisadas as decisões proferidas a cada ano, também procedeu

exame dos tipos de atos questionados e o sucesso nas ações (i.e.

de inconstitucionalidade) em cada etapa do julgamento (da entrada ao sucesso

no mérito). O universo analisado no gráfico a seguir é formado pelos atos de

origem no Poder Executivo.

Gráfico 60

Alguns aspectos são visíveis: as curvas referentes a leis e medidas

provisórias chegam a ser inversamente proporcionais. O número de Medidas

Provisórias questionadas é maior que o de leis (40% do total de ações contra

menos de 30%); do total de ações em que há apreciação de liminar, vê

disparidade ainda maior (mais de 50% tratam de MPs contra cerca de 25% de

leis), margem que aumenta ainda mais na taxa de sucesso da liminar (55%

total, aproximadamente).

Porém, os gráficos se invertem quando se passa ao mérito. Na

julgamento de mérito, vê-se que as medidas provisórias representam cerca de

25% do total de ações em que há julgamento; no caso das leis, a taxa é de

ção ao sucesso na apreciação do mérito, a disparidade é mantida e

no sentido inverso do das liminares, como já foi mostrado. Neste caso, as

idas a cada ano, também procedeu-se ao

i.e., na declaração

de inconstitucionalidade) em cada etapa do julgamento (da entrada ao sucesso

do pelos atos de

Alguns aspectos são visíveis: as curvas referentes a leis e medidas

provisórias chegam a ser inversamente proporcionais. O número de Medidas

al de ações contra

menos de 30%); do total de ações em que há apreciação de liminar, vê-se uma

disparidade ainda maior (mais de 50% tratam de MPs contra cerca de 25% de

leis), margem que aumenta ainda mais na taxa de sucesso da liminar (55%

Porém, os gráficos se invertem quando se passa ao mérito. Na fase de

que as medidas provisórias representam cerca de

25% do total de ações em que há julgamento; no caso das leis, a taxa é de

ção ao sucesso na apreciação do mérito, a disparidade é mantida e

. Neste caso, as

127

medidas provisórias respondem por cerca de 27% do total, enquanto as leis

respondem por mais de 50%.

Muito embora as medidas provisórias sejam responsáveis por cerca de

40% das demandas que chegam ao STF em controle de constitucionalidade de

atos do Executivo, e correspondam às ações com maior taxa de sucesso em

revisão na liminar (mais da metade das liminares concedidas contra o Poder

Executivo), esse volume cai para menos de 25% quando se trata de decisões

definitivas de mérito, com revisão do ato normativo impugnado.

O gráfico acima apresenta um “ponto de intersecção” interessante, e que

ainda merece ser analisado: a inversão (cruzamento) da participação de medidas

provisórias e leis de iniciativa do Poder Executivo entre as fases de obtenção da

liminar com revisão e a fase de julgamento de mérito.

Outro fator visível é que a curva de ações referentes a decretos

presidenciais é descendente do começo ao fim do processo, chegando a

responder por nenhuma das ações em que houve sucesso no mérito (i.e.,

nenhum decreto presidencial teve sua validade retirada por meio de uma ação de

controle concentrado).

Com relação aos atos emanados pelo Legislativo federal, por sua vez,

verifica-se no gráfico abaixo uma maior regularidade quando se trata de atos

normativos do Poder Legislativo, com predomínio absoluto das ações

questionando leis ordinárias (muito embora o tribunal seja um pouco menos

concessivo quanto aos pedidos de liminares).

Esse dado aponta para o fato corriqueiro de que a atuação normativa do

Congresso Nacional se dá principalmente por meio da edição de leis ordinárias.

Note-se, por fim, apenas uma

constitucionais de iniciativa do Poder Legislativo em provimentos finais de

mérito, comparativamente à taxa de sucesso obtida pelos demandantes em sede

de decisão liminar.

Outro dado interessante, e que contr

controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos federais

exercido pelo STF diz respeito à taxa de sucesso dos demandantes nessas ações.

128

Gráfico 61

Esse dado aponta para o fato corriqueiro de que a atuação normativa do

Congresso Nacional se dá principalmente por meio da edição de leis ordinárias.

se, por fim, apenas uma curiosidade: a baixa taxa de sucesso de emendas

constitucionais de iniciativa do Poder Legislativo em provimentos finais de

mérito, comparativamente à taxa de sucesso obtida pelos demandantes em sede

Outro dado interessante, e que contribui para conhecer mais sobre o

controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos federais

exercido pelo STF diz respeito à taxa de sucesso dos demandantes nessas ações.

Esse dado aponta para o fato corriqueiro de que a atuação normativa do

Congresso Nacional se dá principalmente por meio da edição de leis ordinárias.

curiosidade: a baixa taxa de sucesso de emendas

constitucionais de iniciativa do Poder Legislativo em provimentos finais de

mérito, comparativamente à taxa de sucesso obtida pelos demandantes em sede

ibui para conhecer mais sobre o

controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos federais

exercido pelo STF diz respeito à taxa de sucesso dos demandantes nessas ações.

O gráfico acima é bastante interessante, e sugere que, muit

tenham muitos dos seus pedidos de liminar apreciados (e concedidos), os

partidos políticos têm uma participação reduzida no momento em que o tribunal

decide revisar o mérito do ato normativo impugnado, editado pelo Poder

Executivo. Nesse sentido,

sucesso que a Procuradoria

classe.

Por fim, a replicação dessa grade de análise às ações que questionam

atos normativos do Poder Legislativo revela um pr

entidades de classe e partidos políticos nos questionamentos realizados (por

volta de 44% e 27% dos casos, respectivamente). No entanto, esse predomínio

não é mantido nos pedidos de liminar apreciados (os dois atores têm mesma

taxa de sucesso na obtenção da revisão pleiteada em sede de liminar, em torno

de 26%, cada um, dentre todos os casos de deferimento do pedido de liminar).

129

Gráfico 62

O gráfico acima é bastante interessante, e sugere que, muit

tenham muitos dos seus pedidos de liminar apreciados (e concedidos), os

partidos políticos têm uma participação reduzida no momento em que o tribunal

decide revisar o mérito do ato normativo impugnado, editado pelo Poder

Executivo. Nesse sentido, no provimento final, os partidos políticos têm menos

sucesso que a Procuradoria-Geral da República e os sindicatos e entidades de

Por fim, a replicação dessa grade de análise às ações que questionam

atos normativos do Poder Legislativo revela um predomínio dos sindicatos e

entidades de classe e partidos políticos nos questionamentos realizados (por

volta de 44% e 27% dos casos, respectivamente). No entanto, esse predomínio

não é mantido nos pedidos de liminar apreciados (os dois atores têm mesma

a de sucesso na obtenção da revisão pleiteada em sede de liminar, em torno

de 26%, cada um, dentre todos os casos de deferimento do pedido de liminar).

O gráfico acima é bastante interessante, e sugere que, muito embora

tenham muitos dos seus pedidos de liminar apreciados (e concedidos), os

partidos políticos têm uma participação reduzida no momento em que o tribunal

decide revisar o mérito do ato normativo impugnado, editado pelo Poder

no provimento final, os partidos políticos têm menos

Geral da República e os sindicatos e entidades de

Por fim, a replicação dessa grade de análise às ações que questionam

edomínio dos sindicatos e

entidades de classe e partidos políticos nos questionamentos realizados (por

volta de 44% e 27% dos casos, respectivamente). No entanto, esse predomínio

não é mantido nos pedidos de liminar apreciados (os dois atores têm mesma

a de sucesso na obtenção da revisão pleiteada em sede de liminar, em torno

de 26%, cada um, dentre todos os casos de deferimento do pedido de liminar).

Curioso notar o aumento da participação da Procuradoria

República ao longo das fases de julgamento das ações. Muito embora seja

responsável por apenas 14% das ações que chegaram ao STF entre 1988 e

2010, os questionamentos da PGR são responsáveis

(25%) do total da revisão de atos do Legislativo operada pelo Supremo. Isso

pode indicar – sendo necessária mais análises qualitativas e argumentativas para

adequada verificação – uma maior consistência da fundamentação que basei

essas ações, havendo mais coerência na demanda do proponente ao alegar a

inconstitucionalidade do ato normativo impugnado

V.2.6 A “não-resposta do STF”: de mérito Analisadas as respostas dadas pelo STF nos casos de controle

concentrado de constitucionalidade dos atos normativos oriundos do Executivo e

do Legislativo federal, passa

130

Gráfico 63

Curioso notar o aumento da participação da Procuradoria

República ao longo das fases de julgamento das ações. Muito embora seja

responsável por apenas 14% das ações que chegaram ao STF entre 1988 e

2010, os questionamentos da PGR são responsáveis por praticamente um quarto

(25%) do total da revisão de atos do Legislativo operada pelo Supremo. Isso

sendo necessária mais análises qualitativas e argumentativas para

uma maior consistência da fundamentação que basei

essas ações, havendo mais coerência na demanda do proponente ao alegar a

inconstitucionalidade do ato normativo impugnado.

resposta do STF”: extinção sem julgamento

Analisadas as respostas dadas pelo STF nos casos de controle

ntrado de constitucionalidade dos atos normativos oriundos do Executivo e

do Legislativo federal, passa-se a analisar, neste item, as ações em que o STF

Curioso notar o aumento da participação da Procuradoria-Geral da

República ao longo das fases de julgamento das ações. Muito embora seja

responsável por apenas 14% das ações que chegaram ao STF entre 1988 e

por praticamente um quarto

(25%) do total da revisão de atos do Legislativo operada pelo Supremo. Isso

sendo necessária mais análises qualitativas e argumentativas para

uma maior consistência da fundamentação que baseia

essas ações, havendo mais coerência na demanda do proponente ao alegar a

extinção sem julgamento

Analisadas as respostas dadas pelo STF nos casos de controle

ntrado de constitucionalidade dos atos normativos oriundos do Executivo e

a analisar, neste item, as ações em que o STF

131

não analisa o mérito, extinguindo a ação. Trata-se das ações extintas sem

julgamento do mérito.

É importante destacar que a análise desse tipo de ações se limitou ao

exame dos processos em que se impugnam atos normativos oriundos do

Executivo federal. Isso significa que as ações extintas sem julgamento do mérito

envolvendo atos do Legislativo federal não foram analisadas.

A razão para essa delimitação do universo deve-se ao fato de que a

maior parte das ações extintas sem julgamento do mérito refere-se às ações que

têm por objeto atos emanados Executivo federal. Conforme demonstrado no

gráfico 25, das 603 ações encerradas, 551 não tiveram o seu mérito apreciado

pelo STF. Isso significa dizer que 92% das ações em que se impugnam atos

originários do Executivo federal são extintas sem julgamento do mérito, ao passo

que apenas 68% dos processos encerrados, e que envolvem atos normativos

emanados do Legislativo federal, foram extintos sem julgamento do mérito.

Diante da expressiva quantidade de ações relativas a atos oriundos do

Executivo que são extintas sem que o STF tenha apreciado o seu mérito,

procedeu-se a uma investigação individualizada destas ações a fim de se

descobrir os motivos que levaram a não apreciação do mérito. O objetivo, com

isso, é compreender as razões que justificam a ausência de resposta do STF

acerca do mérito de determinadas ações. Para tanto, o levantamento dos

motivos que levaram o STF a deixar de apreciar o mérito foi feito em duas

etapas.

Primeiramente, foram sistematizados os critérios principais que justificam

a extinção do processo sem julgamento do mérito pelo STF. Em segundo lugar,

foram coletados os critérios específicos que trazem informações relevantes sobre

o termo processual mais amplo utilizado no critério principal.

Os critérios principais são aqueles que, normalmente, estão explicitados

(i) na ementa; (ii) na parte dispositiva da decisão; e (iii) na motivação da

decisão analisada. Eles estão reunidos na categoria “Motivo Principal I”.

Cumpre observar, porém, que algumas vezes o STF apresenta dois

motivos principais, fazendo uso de termos processuais igualmente abrangentes e

relevantes para justificar a extinção do processo sem apreciação do mérito.

Nesses casos, optou-se por criar uma categoria chamada “Motivo Principal II”

para que não houvesse confusão entre a fundamentação utilizada pelos ministros

132

e as peculiaridades processuais que servem de base para essa fundamentação.

Os casos em que se verifica a existência de dois motivos principais somam 11

ações.

Os motivos principais identificados na pesquisa estão organizados nas

seguintes categorias:

a) Ausência de manifestação do autor. A falta de manifestação do autor

conduz à extinção da ação por preclusão. É o abandono do processo.

b) Deficiência da representação. Trata-se de uma questão meramente

formal, como falta de procuração de poderes especiais para o advogado,

ou qualquer outro problema que leve à inépcia da inicial por problema na

representação do impetrante. Houve poucos casos extintos por este

motivo.

c) Desistência. A desistência, diferentemente da ausência de manifestação

do autor, que leva à preclusão, é feita por meio de petição. Ou seja, é

uma manifestação do impetrante no sentido de declarar o seu desejo de

não levar adiante a lide.

d) Ilegitimidade ativa ad causam. Esse motivo é bastante recorrente, e

justificou a extinção de ações interpostas por entidades de classe,

partidos, associações civis e sindicatos. É interessante notar que, na ADI

1633, a ministra Carmen Lúcia propõe uma ampliação dos critérios de

legitimidade ativa para a propositura de ADIs, visto que este é um dos

motivos principais que levam à extinção do processo sem julgamento do

mérito.

e) Impossibilidade jurídica do pedido. A impossibilidade jurídica do

pedido conjuga-se diretamente com o pedido de se declarar

inconstitucional dispositivo infraconstitucional. O STF entende que, neste

caso, não é possível apreciar a constitucionalidade do texto. Caberia um

exame de legalidade, o que não compete ao Tribunal fazer.

f) Inépcia da Inicial. A inépcia da inicial configura-se por questões formais,

como a deficiência da representação, ou a falta de impugnação

especificada de dispositivos, enfim, questões procedimentais. Por exemplo,

no precedente da ADI 2.187, em Questão de Ordem, houve a recusa em

apreciar o feito devido à falta de procuração com a indicação do ato

133

atacado na ADI, entendendo que este requisito formal constituía exigência

do Tribunal.

g) Litispendência. Quando a constitucionalidade de determinada lei está em

julgamento no STF e outra ação é proposta concernindo o mesmo

dispositivo, o Supremo termina por extinguir a ação alegando

litispendência.

h) Perda de objeto. A perda do objeto está ligada a diversos fatores, que

foram mais bem tratados no campo “Motivo Específico” (v. adiante).

Conjugam-se aqui, por exemplo, a revogação do dispositivo questionado,

a falta de aditamento da inicial em virtude da conversão de determinada

Medida Provisória em lei etc.

Com o objetivo de detalhar esses critérios processuais que integram as

categorias “Motivo Principal I” e “Motivo Principal II”, foi criado o grupo de

“Motivos Específicos”. Isso se deve ao fato de que, além de saber que a ação foi

extinta sem julgamento de mérito por perda de objeto, por exemplo, é

fundamental saber por que a ação perdeu objeto. Essa segunda explicação é que

faz parte da categoria “Motivo Específico”.

A importância dessa categoria adicional é, portanto, discriminar os

termos processuais mais abrangentes utilizados pelo STF, quais sejam a perda

de objeto e a impossibilidade jurídica do pedido.

Para explicitar os motivos específicos que fundamentam a perda de

objeto, adotou-se a seguinte classificação:

h.1) Alteração substancial da redação original do dispositivo

impugnado. Na ADI 1.442, cujo relator é o ministro Celso de Mello, o

Tribunal reconhece que “[a] revogação superveniente do ato estatal

impugnado faz instaurar situação de prejudicialidade que provoca a extinção

anômala do processo de fiscalização abstrata de constitucionalidade, eis que a

ab-rogação do diploma normativo questionado opera, quanto a este, a sua

exclusão do sistema de direito positivo, causando, desse modo, a perda

ulterior de objeto da própria ação direta, independentemente da ocorrência,

ou não, de efeitos residuais concretos”.

h.2) Constitucionalidade já apreciada em outra ação. Em respeito à

coisa julgada e/ou à economia processual, o Supremo extingue as ações que

134

versam sobre a constitucionalidade de dispositivos que já foram apreciados

em ocasiões anteriores.

h.3) Falta de aditamento da inicial. Um dos principais motivos de extinção

de ações sem julgamento do mérito, a falta de aditamento da inicial

configura-se quando ocorre alteração substancial do dispositivo impugnado na

ação e o autor não emenda a petição inicial informando sobre a nova redação

do texto.

h.4) Dispositivo impugnado deixou de vigorar. É pacífico no STF o

entendimento de que a revogação do dispositivo, ou a conversão de Medida

Provisória em lei, ou mesmo o transcorrer do prazo para a conversão da MP

configuram motivo de extinção da ação sem apreciação do mérito.

Interessante perceber que o STF entende que, mesmo que o texto

constitucional tenha produzido efeitos, o Tribunal está limitado a declarar a

constitucionalidade ou não do dispositivo, e não apreciar os seus efeitos. Nas

ADI 1.314 e 1.315, questionou-se se o fato de o Presidente revogar uma

Medida Provisória por outra, como meio de se esquivar da apreciação do STF,

não seria uma interferência inconstitucional no princípio da separação de

Poderes. O tribunal não concordou com essa afirmação, entendendo que o

Congresso, a qualquer momento, pode restabelecer os efeitos da primeira MP,

mediante a rejeição da Medida ab-rogatória superveniente.

h.5) Direito subjetivo individual. O motivo foi alegado em um único caso,

por se entender que a ação não pode ter seguimento porque não visa ao

controle abstrato de constitucionalidade, e sim à decisão judicial para

atendimento de interesses subjetivos específicos. Ou seja, o objetivo da ação

de controle concentrado não se coaduna com os seus propósitos

constitucionais.

Outro motivo principal bastante abrangente, e que por isso necessita de

motivos específicos para se entender melhor o que justifica a extinção da ação

sem julgamento do mérito, é a impossibilidade jurídica do pedido. Os motivos

específicos utilizados pelo STF para fundamentar a impossibilidade jurídica do

pedido são:

e.1) Dispositivo questionado é norma individual e concreta. Trata-se

de atos que carecem de abstração e generalidade, por essa razão, não são

passíveis de apreciação de constitucionalidade pelo STF. Foram aqui incluídos

135

os seguintes motivos: (i) regulamentos editados pela Administração, pois não

compete ao Supremo analisar a sua constitucionalidade; (ii) dispositivos

infraconstitucionais que correspondem a outros tipos de dispositivos

normativos de cunho regulamentar. Eles produziam, nas palavras dos

ministros, mera “violação indireta”, i.e., não podiam ser apreciados em sede

de infração à Constituição Federal.

e.2) Não houve esgotamento das vias judiciais. Este motivo se faz

presente nas ações de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental

(ADPF) em que o autor não fez uso de todas as vias processuais possíveis

antes de recorrer ao STF por meio desta ação. O Tribunal entende que a

ADPF deve ser utilizada como ultima ratio. Por exemplo, se a norma

impugnada puder ser objeto de ADI, não cabe ADPF. Não é da competência

do Tribunal, portanto, apreciar a questão se ainda houver outros meios

judiciais disponíveis.

e.3) Norma impugnada é anterior à Constituição. Entre 1988 e os

primeiros anos da década de 1990, diversas foram as decisões que

extinguiram ações com base neste motivo. Tendo por precedentes a ADI 2 e

a ADI-MC 1.360, o Supremo entendeu que não cabia alegar a

inconstitucionalidade de leis prévias à Constituição, visto que a anterior tinha

sido, para todos os efeitos, revogada. ADPF foi fixada como procedimento

adequado nesses casos.

Apresentados os critérios utilizados para classificar as razões que levaram

o STF a extinguir as ações analisadas sem apreciar o seu mérito, cumpre

observar os resultados quantitativos obtidos.

136

Gráfico 64

Como se pode verificar do gráfico acima, mais da metade (56%) das

ações analisadas são extintas em razão da perda de objeto. Observa-se

também que a segunda razão mais recorrente para que o STF não aprecie o

mérito da ação é a ilegitimidade ativa ad causam (22%). Em terceiro lugar,

aparece a impossibilidade jurídica do pedido, que justifica a não apreciação

do mérito pelo STF em 17% dos casos envolvendo atos normativos oriundos do

Executivo federal.

Em função da grande quantidade de ações extintas sem julgamento do

mérito por perda de objeto, cabe explicitar os motivos específicos que justificam

a decisão do Tribunal por perda de objeto.

1%

2%

0%

22%

17%

2%

0%

56%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%

Ausência de manifestação do autor

Deficiência da representação processual

Desistência

Ilegitimidade ativa ad causam

Impossibilidade jurídica do pedido

Inépcia da inicial

Litispendência

Perda de objeto

Motivos que justificam a extinção das ações sem julgamento do mérito

137

Gráfico 65

O principal motivo que leva o STF a extinguir a ação por perda de objeto

refere-se aos casos em que o dispositivo impugnado deixou de vigorar. Esta

situação representa 49% dos casos examinados. Na maioria das vezes, essa

situação aparece nas ações que são impugnados dispositivos pertencentes a

medidas provisórias. Nos casos em que a MP era reeditada, duas situações

podiam acontecer: (i) a redação do dispositivo impugnado pode ter sido alterada

após o julgamento da liminar, e.g., ou (ii) o dispositivo impugnado pode ter sido

excluído da nova redação da MP. Nesses casos, a ação perde o objeto, pois o

dispositivo questionado deixou de vigorar.

Como indicado no gráfico anterior, a grande maioria dos casos de perda

do objeto (49%) pode ser atribuída a um recuo do próprio Executivo, quer

porque seus objetivos com a MP já foram atingidos, quer porque há uma decisão

liminar desfavorável, ou mesmo diante da mera existência de uma ação

impugnando o ato em trâmite no STF.

O segundo motivo mais recorrente que fundamenta a extinção da ação

sem julgamento do mérito é a falta de aditamento da inicial. Esse motivo,

presente em 34% dos casos, está diretamente ligado ao motivo específico

anterior, na medida em que a reedição da MP implica, segundo o STF, a

necessidade de aditar a petição inicial alterando o conteúdo do dispositivo

impugnado diante da reedição da MP. Somando-se a falta de aditamento com a

descontinuidade da validade do dispositivo impugnado, temos a maioria

12%

4%

34%

49%0% 1%

Perda de objeto - motivos específicos

Alteração substancial da

redação original do dispositivo impugnadoConstitucionalidade já foi apreciada em outra ação

Falta de aditamento da inicial

Dispositivo deixou de vigorar

Trata-se de direito subjetivo

individual

Sem informação

138

esmagadora dos casos de extinção sem julgamento do mérito, por perda

suberveniente do objeto que dizem respeito a mudanças legislativas que não

foram determinadas pelo próprio STF, mas que foram por ele influenciadas.

Quando o autor não adita a petição inicial, a ação perde o objeto, pois o

dispositivo questionado deixou de vigorar, assim como acontece no motivo

explicitado acima. Nesses casos, verifica-se que os demandantes são os

responsáveis pela extinção sem julgamento de mérito por ausência de

aditamento da inicial.

Da mesma forma, a ação perde o objeto quando houver alteração

substancial da redação original do dispositivo impugnado, o que acontece

em 12% dos casos analisados.

Apresentadas as razões que justificam a extinção da ação sem

julgamento de mérito por perda de objeto, são apresentados também os motivos

que fundamentam a extinção da ação por impossibilidade jurídica do pedido.

Gráfico 66

Das ações extintas sem julgamento do mérito por impossibilidade jurídica

do pedido, 81% delas têm como característica a impugnação de um dispositivo

considerado norma individual e concreta. É o caso das normas de caráter

regulamentar, como por exemplo, os regulamentos editados pela Administração

Pública. A partir da leitura das decisões, detectou-se que o fato de o autor

questionar um dispositivo constante de um regulamento é motivo para que o STF

não aprecie o mérito, por entender que a sua insubordinação deve ser

confrontada com a lei que ele especifica e não com a Constituição.

81%

4%

15%

Impossibilidade jurídica do pedido - motivos

específicos

Dispositivo é norma individual

e concreta

Não houve esgotamento das vias judiciais (ADPF)

Norma anterior à Constituição

139

A título ilustrativo, vale destacar que na ADI 1347-DF, citada em diversas

outras decisões que fizeram uso do mesmo motivo para extinguir a ação sem

resolução do mérito, o STF decidiu que:

“o eventual extravasamento, pelo ato regulamentar, dos limites a que se acha materialmente vinculado poderá configurar insubordinação administrativa aos comandos da lei. Mesmo que desse vício jurídico resulte, num desdobramento ulterior, uma potencial violação da Carta Magna, ainda assim estar-se-á em face de uma situação de inconstitucionalidade meramente reflexa ou oblíqua, cuja apreciação não se revela possível em sede jurisdicional concentrada."

De acordo com o gráfico 66, 15% das ações são extintas sem

julgamento do mérito por impossibilidade jurídica do pedido em virtude de a

norma impugnada ser anterior à Constituição. Além disso, a propositura de

uma ADPF quando ainda não esgotadas as vias judiciais possíveis deu ensejo à

extinção da ação sem julgamento de mérito por se tratar de um pedido

impossível juridicamente, na medida em que um dos pressupostos para

propositura da ADPF não foi observado. Tal situação representa 4% dos casos

examinados.

Diante dos motivos apresentados nesta seção para justificar a extinção

da ação sem julgamento do mérito, é possível afirmar que os demandantes

nas ações de controle de constitucionalidade concentrado em que se

impugnam atos normativos emanados do Executivo federal são, em certa

medida, responsáveis pela ausência de julgamento de mérito em

determinadas ações.

Isso se deve ao fato de que os principais motivos que levam à

extinção da ação sem julgamento do mérito por perda do objeto são

motivados pela falta de aditamento da petição inicial, tarefa que incumbe ao

demandante realizar quando houver alteração substancial da redação original

do dispositivo impugnado ou quando a norma impugnada deixar de vigorar.

As situações em que os demandantes não insistem na propositura da

ação, deixando de aditar a petição inicial para corrigir a redação do dispositivo

questionado, dão ensejo à seguinte reflexão: nesses casos, os atores

poderiam não estar interessados em um resultado efetivo de mérito, mas sim

em acessar o STF apenas como forma de exercer pressão sobre os centros de

140

poder, impugnando uma norma editada pelo Executivo federal com o objetivo

de questionar as políticas do governo.93

Outra razão que justifica a não apreciação do mérito pelo STF é a

ilegitimidade ativa ad causam, fator que é inerente às características dos

demandantes das ações. Mas, neste ponto, vale mencionar que não obstante a

relação de legitimados das ações de controle concentrado de

constitucionalidade estar explicitada na Constituição Federal, o STF

estabeleceu critérios próprios para considerar um sindicato ou uma entidade

de classe legitimado para a propositura de ADI, ADC e ADPF. Nas ações em

que a ilegitimidade ativa justifica a não apreciação do mérito da ação pelo

STF, pode-se dizer que a causa da extinção não dependeria somente dos

demandantes, mas também dos critérios estabelecidos pelo próprio tribunal

para barrar ou não o andamento da ação.

A partir dessas considerações, é possível esboçar as seguintes

reflexões: a primeira está ligada ao tempo de tramitação das ações e a

natureza dos atos impugnados. Muitas vezes, percebe-se que as ações que

impugnam medidas provisórias perdem o seu objeto porque o STF demorou

muito para julgar o mérito da ação (o que ocorre especialmente nos casos em

que o julgamento da liminar já foi realizado, conforme item 2.2.2., supra).

Considerando-se que as MPs são normas de caráter provisório, é preciso que o

STF dê uma resposta rápida a fim de que a reedição da MP não prejudique o

objeto da ação, garantindo assim uma resposta efetiva do tribunal.

V.3 Conclusão parcial A principal finalidade do presente tópico é apontar para uma das

constatações mais centrais extraída da análise dos dados exposta acima, e que

justifica a ampliação da pesquisa e inclusão da análise descrita a seguir (no

capítulo VI): o STF tem poucas decisões de mérito em controle concentrado de

constitucionalidade de atos normativos do Legislativo e do Executivo federais,

sendo mais raras ainda as decisões nas quais a produção normativa desses

93 A presente pesquisa não comprova essa afirmação, mas existem trabalhos no campo da ciência política que demonstram que muitos atores legitimados (como partidos políticos) acessam o STF para exercer oposição à maioria governista. Nesse sentido, ver Matthew M. TAYLOR. Judging Policy: Courts and Policy Reform in Democratic Brazil. Stanford: Stanford University Press, 2008 e Matthew M. TAYLOR e Luciano DA ROS. “Os Partidos Dentro e Fora do Poder: A Judicialização como Resultado Contingente da Estratégia Política”. Dados 51 (2008), pp. 825-864.

141

Poderes é efetivamente revista pelo tribunal (i.e., de alguma forma declarado

inconstitucional).

Um dos dados que chamou atenção nesta etapa da pesquisa é o alto

número de casos em que as demandas propostas são extintas sem julgamento

de mérito (cf. item V.2.1, supra). O total de ações sem resposta final envolvendo

atos do Executivo e do Legislativo federais alcança os 94% e 79%,

respectivamente. Ao mesmo tempo, é relativamente baixa a quantidade de casos

que atingiram o julgamento final de mérito por parte do tribunal: 6% e 21%,

respectivamente. Além disso, outro resultado que merece destaque é que, dentre

todas as ações ajuizadas, em apenas 3% e 11%, houve julgamento de mérito

(total ou parcialmente) procedente, com efetiva revisão do ato normativo do

Executivo ou Legislativo federais, respectivamente.

Esses dados e informações podem colocar em xeque a própria existênica,

no Brasil, de um ativismo judicial ou mesmo de um movimento de “judicialização

da política”. Ora, ainda que apenas do ponto de vista quantitativo, é

relativamente baixa a taxa de “interferência” do Judiciário no âmbito de atuação

normativa dos demais Poderes. Como se depreende dos dados apresentados, a

idéia de que “judicialização da política” é uma realidade no Brasil fica um pouco

prejudicada, caso se considere o baixo volume de casos em que o Supremo

Tribunal Federal julga necessário “intervir” no trabalho dos demais Poderes da

República.

A contrario senso daquilo que parecem sugerir alguns trabalhos acerca do

tema, e que foram examinados no segundo capítulo do presente estudo, o

intervencionismo do STF (com efeitos diretos e permanentes) no produto da

atividade normativa dos Poderes Executivo e Legislativo é relativamente baixo.

Isso parece apontar para a seguinte conclusão: não é suficiente olhar para os

números e resultados do controle de constitucionalidade no Brasil, para

encontrar algum indicador da suposta “judicialização da política”. Essa

constatação deverá ser melhor explorada no capítulo seguinte.

VI. Processo decisório no STF: análise qualitativa e apontamentos para uma nova agenda de pesquisa

O presente capítulo destina-se à exposição sucinta de um modelo de

análise qualitativa do teor das decisões do STF, por meio do mapeamento de

142

técnicas decisórias e de formas de interação entre o tribunal e a sociedade civil.

O objetivo, aqui, é tentar oferecer alguns apontamentos para uma nova agenda

de pesquisa que se insere dentro da temática mais ampla da “judicialização da

política”, por meio da investigação do lastro argumentativo desenvolvido pelo

tribunal em suas decisões. Ademais, acredita-se que esse constitui um campo de

análise no qual a expertise dos juristas pode lhes permitir contribuições

consistentes e relevantes para o debate acerca do tema.

Como resslatado no tópico anterior, sua elaboração partiu da constatação

de que, quantitativamente, a atuação do STF no controle de constitucionalidade

de atos dos Poderes Executivo pouco teria a dizer sobre a idéia de judicialização

da política94 – ainda que nos limites traçados para o marco teórico que orienta a

presente pesquisa (cf. item II.3, supra). A hipótese ora levantada, e que parece

ter se confirmado na presente pesquisa (conforme será visto abaixo), é a de que

a abordagem do tema a partir da perspectiva interna dos órgãos diretamente

envolvidos (tribunais em geral e, no caso, o STF), muito mais do que uma mera

análise de input e output, importa uma investigação que desça ao nível

argumentativo das decisões. Em outras palavras, o que se sustenta é justamente

que um estudo do tema com pretensões de ser o mais completo possível

pressupõe, necessariamente, uma análise qualitativa das decisões do tribunal.

Tendo em vista que a finalidade, aqui, é apenas a de testar algumas

possíveis contribuições que uma abordagem diferenciada poderia oferecer para o

debate acerca da “judicialização da política”, a seleção dos casos analisados não

tem pretensões exaustivas, diferentemente do universo de análise quantitativo

(cf. Capítulo III, supra). Não por outra razão, a análise exposta a seguir é muitas

vezes designada como pesquisa exploratória ou mesmo exemplificativa.

Além disso, necessário esclarecer que, em razão de uma baixa variedade

dos temas e técnicas decisórias envolvidas nas ações de controle de

constitucionalidade com decisão de mérito (cf. item V.2.5, supra), optou-se por

não restringir os casos aqui analisados àqueles que compõem o banco de dados

e universo de análise da etapa quantitativa desta pesquisa (Capítulo V). A seguir

são apresentados, inicialmente, a forma de seleção dos casos, juntamente com

um relato sucinto de cada um.

94 A não ser que se considere que a “interferência” do Poder Judiciário na decisão de questões políticas, por meio do exercício do controle concentrado de constitucionalidade, não passa de uma hipótese sem confirmação prática.

143

VI.1 Seleção e relato dos casos analisados O critério utilizado na escolha dos objetos desta pesquisa exploratória foi

o fato de eles serem casos comumente associados ao processo de judicialização

ou de ativismo judicial. Já como uma primeira aproximação da hipótese colocada

a partir do marco teórico – qual seja, a de que judicialização e/ou ativismo

judicial são conceitos que adquirem significados muito distintos a depender da

situação (cf. item II.3, supra) –, e também a partir da bibliografia analisada,

elaborou-se uma tipologia capaz de identificar grandes grupos de problemas e

conteúdos que, quando levados à apreciação judicial, poderiam ensejar alguma

discussão sobre judicialização ou ativismo.

Como ressaltado anteriormente, esses casos não foram extraídos

exclusivamente do universo de análise montado para os capítulos IV e V, supra,

nos quais procedeu-se a um estudo quantitativo do controle concentrado de

constitucionaldade. Por essa razão, dentre os casos abaixo selecionados e

analisados, também estão incluídos recursos extraordinários (RE), mandados de

segurança (MS) e, inclusive, mandados de injunção (MI). Diferentemente das

ações convencionais (ADI, ADC e ADPF), essas ações e recursos são a via

processual por meio da qual o Supremo exerce o que se chama de controle

difuso ou concreto (incidental) de constitucionalidade de leis e atos normativos

do Executivo e Legislativo federal.

Segue a lista dos casos estudados, indicando os critérios sob os quais

foram selecionados para compor este universo exemplificativo de acórdãos

submetidos a uma análise qualitativa do processo decisório e argumentativo

desenvolvido pelo STF e seus ministros, e nos quais, em alguma medida,

questões relacionadas à interação entre os Poderes e a legitimidade democrática

das decisões judiciais foram abordadas (cf. a descrição dos eixos do marco

teórico no item II.3, supra):

(i) Casos que envolvem obrigações impostas ao Poder Executivo

- Raposa Serra do Sol

- Importação de pneus usados

(ii) Casos que envolvem uma forma de substituição do Poder

Legislativo: exercício excepcional do papel de legislador pela Corte em

casos de omissão reiterada do Legislativo

144

- Greve dos Servidores Públicos

- Fundo de Participação dos Estados (FPE)

(iii) Casos em que há intervenção do Judiciário na dinâmica

político-partidária/ no sistema político-partidário/ na competição

político-partidária

- Verticalização das coligações partidárias

- Fidelidade Partidária

É importante salientar, novamente, que essa seleção não tem pretensões

de ser uma amostra representativa dos “casos de judicialização” que existem no

STF. Por se tratar de uma pesquisa exploratória (e não exaustiva), não se

pretende aqui extrair resultados analíticos conclusivos, e sim, apontar aspectos

que parecem estar sendo desconsiderados pelos estudos sobre judicialização.

Vários fatores concorrem para a construção de um caso paradigmático:

gravidade do conflito, grupos de interesse envolvidos, atenção da mídia,

presença de muitos casos semelhantes ao paradigma, possibilidade de

elaboração de novos parâmetros de interpretação e aplicação do direito para sua

solução. Muitos dos casos do STF mencionados pela bibliografia como

representativos de um fenômeno de “judicialização da política” apresentam esses

fatores, que, como pode se perceber, conjugam aspectos internos e externos ao

próprio tribunal.

Estes estudos, no entanto, valorizam a análise deste fenômeno a partir

da sentença, seu impacto/repercussão, se ela intervém ou não em determinada

política pública. As sentenças são tomadas como unidades em estudos

quantitativos, em que a declaração de inconstitucionalidade é considerada

apenas em termos absolutos. A ausência de uma análise minuciosa da

argumentação contida na sentença faz com que se perca todo um campo de

estudo que poderia levar em consideração minúcias do processo de interpretação

e aplicação do direito.

O controle de constitucionalidade passa por uma série de transformações,

a partir da adoção de novas ferramentas decisórias (interpretação conforme,

decisão aditiva, etc.), surgindo com elas uma série de dificuldades atreladas ao

momento da aplicação dessas decisões (modulação de efeitos, diálogo com

outros Poderes, etc.). O exercício dessas novas atribuições do controle de

145

constitucionalidade pode estar relacionado ao campo de estudos da

“judicialização da política”, embora não tenha recebido a devida atenção.

É interessante, sobretudo, identificar a partir desta pesquisa exploratória

de casos, elementos internos ao processo decisório do tribunal, fatores

institucionais tais como: formas de votação, ferramentas de interpretação e

aplicação do direito utilizadas. O objetivo de empreender uma análise detalhada

desses elementos é dar início a uma nova agenda de pesquisa em direito, que

possa contribuir com uma perspectiva de análise institucional para o debate

sobre judicialização da política e STF.

O processo decisório é, portanto, o eixo comum das análises feitas

adiante. Para fins de clareza da exposição, foi elaborada uma tentativa de

tipologia de aspectos interessantes desse processo. Assim, fala-se em 1)

técnicas de julgamento; e 2) procedimentos decisórios.

O primeiro ponto abarca uma discussão sobre mecanismos dos quais se

valem os juízes constitucionais no momento do julgamento e também em um

momento posterior, para garantir a efetividade do que foi julgado. Nesse tópico,

são discutidas figuras como a modulação de efeitos e da interpretação conforme

a Constituição – técnicas de julgamento que foram formalizadas pela

regulamentação legal do processamento constitucional, feita pela Lei nº 9868/99

(que regulou ADI e ADC) e pela Lei nº 9882/99 (que regulou a ADPF)95 –, mas

também outras figuras que, apesar de não estarem "formalizadas”, cumprem um

papel relevante no momento do julgamento e da execução do que foi decidido.

Aqui, merecem destaque a diferença entre efeitos constitutivos e declaratórios da

sentença, o significado da chamada decisão aditiva, e as questões que se

colocam no momento de implementar o que foi decidido.

95 O art. 27, da Lei nº 9.868/99 (Lei da ADI), e o art. 11, da Lei nº 9.882/99(Lei da ADPF), dispõem que “ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.” Essa é a chamada modulação de efeitos da decisão. A interpretação conforme a Constituição é mencionada no parágrafo único do art. 28, da Lei da ADI: “a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.” Necessário lembrar que a Lei da ADI possui diversos dispositivos contestados face à Constituição Federal – dentre eles, o próprio artigo 27. Cf. ADI 2.231, proposta pelo Conselho Federal da OAB, ainda pendente de julgamento.

146

O segundo ponto refere-se a novas formas de processamento das

questões constitucionais. Importam aqui principalmente os mecanismos de

democratização do processo, com a figura do amicus curiae e realização de

audiências públicas, mas também se discute brevemente algumas possibilidades

à disposição da Corte na gestão dos processos, como o julgamento conjunto de

ações e as formas de lidar com o tempo de processamento de cada ação.

Em razão do caráter exploratório da pesquisa aqui apresentada, a forma

de desenvolvimento dos dados acerca dos casos é feita mais sob o formato de

texto ensaístico do que propriamente sob a forma de um relatório resultante de

pesquisa empírica. Com isso, muito mais do que expor dados descritivos, espera-

se levantar hipóteses para futuras investigações neste novo campo de estudo.

Abaixo, seguem os breves relatos elaborados sobre cada caso, e

indicação de alguns pontos de interesse que serão desenvolvidos neste trabalho,

com a finalidade de situar o leitor nas discussões feitas adiante.

VI.1.1 Raposa Serra do Sol A trajetória do caso Raposa Serra do Sol no STF é representativa das

mudanças do tribunal em relação ao tema da demarcação de terras indígenas.

Em 14 de abril de 2005, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a

reclamação (RCL) 2833, extinguindo por perda de objeto todas as ações que

versavam sobre a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, em face da

substituição da Portaria nº 820/98 pela Portaria nº 534/2005 do Ministério da

Justiça. A Corte declarou-se também, com base na alínea “f”, inciso I, art. 102,

da Constituição Federal, competente para processar e julgar ações contra o

decreto presidencial que homologou a reserva. Tomando por base o argumento

de que essas ações versam sobre conflito federativo, o Tribunal avocou para si a

competência para dirimir esses conflitos demarcatórios.

Essa decisão, arrogando competência ao STF por meio da identificação de

um conflito federativo, rompe com uma tradição na jurisprudência do tribunal,

que considerava os conflitos que envolviam demarcação de terras indígenas de

competência das instâncias inferiores. Essa medida, somada a outros eventos,

possibilitou que o STF pudesse, em seguida, construir um caso paradigmático, no

qual seriam assentadas as bases constitucionais para a demarcação de terras

147

indígenas em geral, i.e., apresentando uma solução não só para o caso concreto

da Raposa Serra do Sol.

Em reação a essa decisão (Rcl. nº 2833) e à regulamentação da nova

portaria, em 20 de abril de 2005, o Senador Augusto Botelho (PDT/RR) ingressou

com ação popular no Supremo Tribunal Federal, pedindo, em face da União, a

suspensão liminar dos efeitos da Portaria 534/2005 e, no mérito, a declaração de

nulidade dessa portaria, que demarcou a reserva Raposa Serra do Sol. A liminar

da ação popular foi, então, indeferida. Em 9 de abril de 2008, o Tribunal

suspende – como uma decisão interlocutória nos limites da Ação Popular – a

retirada de não-índios da região, o que gera processualmente o incurso de uma

série de interessados por meio de mecanismos processuais, como pedidos de

litisconsórcio e assistência, e extra-processuais, como visita de uma série de

interessados na lide aos gabinetes dos ministros, especialmente o do então

Presidente do STF, Min. Gilmar Mendes. A incidência desses outros atores no

processo provoca debates entre os ministros sobre os limites dessa atuação,

sobre se eles poderiam inovar os pedidos da petição inicial, bem como sobre os

limites da decisão do próprio tribunal, para saber se poderia julgar o caso extra

petita.

Em 27 de agosto de 2008, o relator, Min. Carlos Britto, julga a ação

popular improcedente, mas o julgamento é interrompido pelo pedido de vista do

Min. Menezes Direito, que apresenta seu voto em 10 de dezembro do mesmo

ano, inovando ao propor 18 cláusulas condicionantes, não apenas ao processo de

demarcação no caso Raposa Serra do Sol, mas ao das terras indígenas em geral.

O caso serviria como exemplo paradigmático para estes outros processos. A

questão só se resolve em 19 de março de 2009, quando o tribunal decide no

sentido da procedência parcial da ação, nos termos dos fundamentos do Relator

Min. Carlos Britto, que mudou seu voto anterior, e das chamadas “salvaguardas

institucionais” do voto do Min. Menezes Direito, ajustadas após deliberação do

colegiado, configurando 19 cláusulas condicionantes. Ficaram vencidos os Min.

Marco Aurélio, que votou pela total procedência da ação e Min. Joaquim Barbosa,

pela total improcedência. As condicionantes apresentadas no processo geram

discussões entre os ministros com relação aos limites da atuação judicial do

tribunal, sobre se esta seria uma técnica de julgamento legítima, bem como com

relação às possibilidades de sua implementação.

148

VI.1.2 Importação de pneus usados O caso dos pneus envolve uma Arguição de Descumprimento de Preceito

Fundamental, ADPF 101, apresentada ao STF pelo Presidente da República, por

meio da Advocacia Geral da União. O demandante pedia que (i) fossem

declaradas inconstitucionais interpretações judiciais que estavam permitindo a

importação de pneus usados para o país a despeito da política de proibição desse

tipo de importação, estabelecida pelo Executivo Federal por meio de portarias da

Secretaria de Comércio Exterior e de resoluções do Conselho Nacional do Meio

Ambiente e (ii) fossem declaradas constitucionais essas normativas de proibição.

O argumento principal é de que aquelas interpretações judiciais, que

fundamentaram decisões liminares autorizando empresas a importarem pneus

usados, estariam violando os preceitos fundamentais do direito à saúde e da

proteção do meio-ambiente – justamente os preceitos que a política proibitiva

estaria assegurando.

A ADPF foi proposta em meio a uma controvérsia na Organização Mundial

do Comércio, na qual o Estado brasileiro era questionado pela União Européia por

essa política estar supostamente estabelecendo barreiras não-tarifárias, em

desacordo com o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT). Além desse

processo à época em andamento, havia também uma decisão anterior, proferida

em 2002 pelo Tribunal Ad Hoc do Mercosul, que estabeleceu o compromisso do

Brasil de não vedar a importação de pneus usados dos países do bloco. No caso,

foi o Uruguai quem argüiu a incompatibilidade da legislação proibitiva brasileira

com os compromissos de livre comércio assumidos diante do Mercosul.96

A harmonização da jurisprudência das instâncias inferiores do Poder

Judiciário97, que permitiam de maneira ad hoc a importação de pneus usados

e/ou remodelados, era fundamental para evitar uma responsabilização

internacional do Estado brasileiro na OMC, sob o fundamento de ter este uma

política externa incoerente na matéria, ao manter uma política proibitiva

contrariada por permissões do próprio Judiciário.

96 Para um histórico das disputas envolvendo importação de pneus em organismos internacionais, ver Fabio Morosini, “A Guerra dos Pneus”, Casoteca Latino-Americana de direito e política pública, 2006. Disponível em: http://www.gvdireito.com.br/casoteca/casos.aspx?PagId=GTDJNNWM. 97 No caso, eram questionadas decisões de juízes federais das seções judiciárias do Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo; bem como, dos TRF’s da 2ª, 3ª, 4ª e 5ª região.

149

Essa harmonização de interpretação da Constituição poderia ser realizada

pela ADPF 101 com o atendimento da demanda colocada: declaração de

constitucionalidade das normas em vigor, que há muito proibiam as importações

de pneus usados, bem como declaração de descumprimento dos preceitos

fundamentais de direito à saúde e ao meio-ambiente pelas interpretações

judiciais contra essas normas. O caso foi relatado pela Ministra Cármen Lúcia e

teve decisão final em 2009, pela procedência parcial da ADPF proposta, nos

termos adiante detalhados.

Esse caso permite avaliar o desempenho do desenho institucional do

processo decisório do STF nos momentos em que promove interação com atores

que não correspondem às partes que incidem obrigatoriamente no processo

(Advocacia Geral da União, demandante, dentre outros). É um caso com

julgamento de mérito que teve audiência pública e apresentação de amici curiae,

com a participação de atores de diferentes perfis (iniciativa privada, ONGs,

órgãos governamentais etc.).

A importância da avaliação de tais procedimentos reside na capacidade

deliberativa e de legitimação decisória normalmente atribuída a eles.

Mecanismos de participação e de diálogo com atores da sociedade civil em cortes

supremas têm sido considerados teoricamente como espaços de deliberação,

com capacidade de suprir a deficiência de legitimidade das decisões de cortes

não eleitas, decisões estas muitas vezes classificadas como “ativistas”. É preciso,

no entanto, examinar empiricamente o desempenho desse desenho institucional

que promove interação com outros atores, pois, na prática, ocorrem de modo

bastante variado, como será apontado adiante.

VI.1.3 Direito de greve dos servidores públicos O direito de greve dos servidores públicos está assegurado no artigo 37,

VII da Constituição Federal. De acordo com esse dispositivo, para que o exercício

deste direito seja viabilizado, é necessário que ele seja disciplinado por uma lei,

lei esta que ainda não foi editada pelo Poder Legislativo. Diante desse quadro em

que a obrigação de legislar imposta constitucionalmente não foi cumprida pelo

legislador, está configurada a chamada omissão legislativa.

Ante essa ausência de norma, que viabilizaria o exercício desse direito

por servidores públicos, o tema foi levado à apreciação do STF por diversas

150

vezes, merecendo destaque o julgamento dos Mandados de Injunção (MI)

670/ES, 708/DF e 712/PA, em 25 de outubro de 2007. Tais ações foram

propostas por sindicatos que representam a categoria de alguns servidores

públicos: Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo –

SINDPOL, Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de João Pessoa

– SINTEM, e Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará –

SINJEP, respectivamente.

Os MI 670/ES, 708/DF e 712/PA são considerados paradigmas, pois em

suas decisões, o STF alterou o entendimento acerca dos efeitos do mandado de

injunção: foram atribuídos efeitos constitutivos a este, abandonando-se a

posição defendida anteriormente de que o MI possuía efeitos meramente

declaratórios, como apresentado abaixo.

Importante paradigma na compreensão do posicionamento inicial do

Tribunal acerca dos efeitos do mandado de injunção é o MI 107/DF, julgado em

1990. Nesta decisão, definiu-se que o MI é cabível tanto nos casos em que há

omissão total do legislador – situação de absoluta ausência de normas

regulamentadoras de dispositivos constitucionais pendentes de regulamentação –

quanto nos casos de omissão parcial – hipótese em que ocorre o cumprimento

imperfeito ou insatisfatório de dever constitucional de legislar. Além de tratar

desse e de outros pressupostos de cabimento do mandado de injunção, o STF

determinou que a sua função deveria se limitar a declarar a inconstitucionalidade

da omissão detectada e notificar o legislador para que empreendesse as

providências requeridas.

Não obstante o STF tenha declarado a inconstitucionalidade por omissão

do art. 37, VII, da Constituição e dado ciência dessa omissão ao legislador, este

permaneceu inerte, descumprindo o dever constitucional de regulamentar o

direito de greve dos servidores.

Não tendo produzido efeito as decisões declaratórias da omissão

legislativa, o STF acabou por definir uma regra capaz de viabilizar o exercício do

direito de greve, determinando a aplicação, no que couber, de uma norma já

existente no ordenamento jurídico, até que sobrevenha a regulamentação do

Legislativo.

Tal atitude foi tomada pelo STF dezessete anos depois de proferida a

decisão do MI 107/DF, quando do julgamento dos MI 670, 708 e 712, em 2007.

151

Nesses casos, foi firmado o posicionamento de que o mandado de injunção

passou a conformar atuação mais ampla do que a admitida até então. Ou seja, o

STF considerou que o mandado de injunção possui efeitos constitutivos e não

mais apenas declaratórios.

Diante disso, não compete ao STF somente declarar a

inconstitucionalidade da omissão, quando esta for detectada. Passa a cumprir ao

Tribunal determinar também qual a regra aplicável ao caso concreto para sanar a

omissão legislativa e dar concretude aos preceitos constitucionais que ainda

estão pendentes de regulamentação.

Nos MI 670/ES, 708/DF e 712/PA, ao reconhecer a omissão do legislador,

o STF determinou que, diante da longa inércia do Legislativo federal em

regulamentar o artigo 37, VII da CF, deveria ser aplicada ao caso, no que

coubesse, a lei de greve dos trabalhadores em geral (lei federal nº. 7.783, de

1989).

VI.1.4 Fundo de Participação dos Estados (FPE) As ADIs 875, 1.987, 2.727 e 3.243, julgadas em conjunto pelo STF, com

decisão final proferida em 24 de fevereiro de 2010, colocaram em discussão um

dos pontos centrais da estrutura federativa brasileira, com enorme potencial de

embate político no âmbito do chamado “pacto federativo”. Trata-se dos critérios

de cálculo do repasse da receita tributária arrecadada pela União e, por expressa

disposição constitucional, repassada aos Estados e Municípios através do Fundo

de Participação previsto no art.159, inciso I, da CF.98

Por esse motivo, o caso, iniciado com a propositura da primeira ADI em

1993, denota o fortalecimento da Corte enquanto instância legítima de discussão

e solução de questões políticas fundamentais. Expressa, nesse sentido, o

fortalecimento de uma nova postura do STF no diálogo com os demais poderes,

98 Art. 159. A União entregará: I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados quarenta e oito por cento na seguinte forma: (EC n°53/2007, NR) a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal; b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios; c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semi-árido do Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer; d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano; (Incluído pela EC n°53/2007).

152

coerente com as mudanças substantivas de entendimento quanto ao Mandado de

Injunção e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, além do

desenvolvimento de novas técnicas de julgamento no processo de controle

concentrado ancoradas numa interpretação renovada do alcance do art. 27, da

Lei 9868/99, que dispõe sobre a modulação de efeitos.

Especificamente, a não atualização dos critérios nos termos delimitados

pela CF denota certa acomodação de interesses políticos no próprio Legislativo,

capaz de obstruir por mais de vinte anos as reformas institucionais necessárias

ao alcance dos objetivos constitucionais. É nesse contexto que o tema da

“judicialização” e das técnicas decisórias precisa ser estudado no caso.

A CF de 1988 delegou expressamente a Lei Complementar o

estabelecimento de normas sobre a entrega dos recursos do Fundo de

Participação dos Estados, “especialmente sobre os critérios de rateio dos fundos

previstos em seu inciso I, objetivando promover o equilíbrio sócio-econômico

entre Estados e entre Municípios” (art.161, inciso II), determinando ainda que

caberia ao Tribunal de Contas da União o cálculo das quotas de participação de

cada ente federado (art.161, parágrafo único). O Ato das Disposições

Constitucionais Transitórias estabeleceu o prazo máximo de 12 (doze) meses

para a edição da referida lei complementar (ADCT, art.39, parágrafo único),

contexto no qual foi aprovada a Lei Complementar 62, em 1989.

Seguindo a função distributiva atribuída ao FPE, a LC 62/89

regulamentou a Constituição determinando que 85% do Fundo seria destinado

aos Estados das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e 15% aos Estados das

Regiões Sul e Sudeste (art. 2°, incisos I e II). No entanto, resolvida essa razão

distributiva geral entre dois grandes blocos regionais, restava em aberto a

definição dos critérios de participação de cada Estado no âmbito de cada bloco. O

“estado de necessidade legislativa”99 imposto pelo prazo constitucional levou o

Congresso Nacional a explicitamente optar por reproduzir na lei o acordo político

entre os Estados construído no âmbito do Conselho Nacional de Política

Fazendária, estipulando em seu anexo os coeficientes a serem aplicados até o

ano de 1991.100

99 Expressão adotada pela Min. Cármen Lúcia no julgamento conjunto das ADIs (STF. ADI 875. Acórdão – Inteiro Teor, fl. 279). 100 LC n° 62/89, art. 2°, “§1° Os coeficientes individuais de participação dos Estados e do Distrito Federal no Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE a serem aplicados até o

153

Tais coeficientes tomavam como base a média histórica praticada até

então e, nos termos da lei, deveriam ser substituídos por novos critérios, que

deveriam ser fixados em lei específica com base nas informações apuradas pelo

censo de 1990, passando a vigorar a partir de 1992 (LC n° 62/89, art.2°, §2°).

Até que fosse editada a nova legislação, os coeficientes estabelecidos em 1989

continuariam em vigor (§3°).

No entanto, a omissão do legislador ordinário em produzir tal

regulamentação levou à perpetuação dos coeficientes definidos na Lei

Complementar 62/89, que por sua vez reproduzem padrões estabelecidos no

Código Tributário Nacional desde 1965, o que resulta em importantes distorções

entre os entes federados, dadas as profundas mudanças na realidade

demográfica e econômica do país. Esse estado de omissão legislativa, como

reconheceria o próprio STF, havia provocado uma “inconstitucionalização”101

progressiva da referida lei, cada vez menos ajustada aos propósitos

equalizadores estabelecidos na CF.

A ADI 875, proposta em 18 de maio de 1993 pelos Governadores do Rio

Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina contra o art.2°, Incisos I e II, e §§ 1°,

2° e 3°, e o Anexo Único da Lei Complementar 62/1989, foi inicialmente

distribuída ao Min. Néri da Silveira. Segundo os autores, a norma atacada seria

inconstitucional por não observar o comando do art. 161, II, da CF, uma vez que

não dispõe sobre critérios de rateio dos Fundos de Participação. Assim, segundo

os autores, em lugar de fixar regras básicas sobre os critérios distributivos a

serem observados anualmente pelo Tribunal de Contas da União, a Lei

Complementar resumiu-se a estabelecer diretamente os coeficientes. Com isso,

referida norma minimizou a competência constitucional do TCU inscrita no

parágrafo único do art.161, cujo trabalho ficou restrito a um simples cálculo

matemático.

Esta primeira ADI, proposta conjuntamente pelos estados da Região Sul,

que segundo os coeficientes da Lei Complementar 62/89 dividiriam com a Região

Sudeste a menor parcela do FPE – 15%, contra 85% destinados às Regiões

Norte, Nordeste e Centro-Oeste -, trazia como questão de fundo o que os exercício de 1991, inclusive, são os constantes do Anexo Único, que é parte integrante desta Lei Complementar.” 101 Outra expressão adotada pela Min. Cármen Lúcia no julgamento conjunto das ADIs (STF. ADI 875. Acórdão – Inteiro Teor. Debate. Min. Cármen Lúcia, fl. 278). Com ela, a Ministra afirmava tratar-se de reconhecimento de inconstitucionalidade superveniente.

154

estados entendiam ser o desvirtuamento do mecanismo distributivo, “que de

instrumento equalizador das desigualdades regionais, converte-se num

instrumento agressivo da igualdade entre os estados, princípio constitucional

explícito, essencial à forma federativa”.102

A ADI 1.987/DF, distribuída por prevenção ao Min. Néri da Silveira em 15

de abril de 1999, também foi proposta em litisconsórcio ativo, nesse caso entre

os Governadores do Mato Grosso e de Goiás, em face da alegada omissão do

Congresso Nacional em regulamentar o art. 161, II, da CF. Segundo tais estados,

o aspecto positivo da Lei Complementar 62/89 seria a definição de 85% do FPE

para as Regiões mais pobres do país. No entanto, as sucessivas prorrogações dos

coeficientes distributivos arbitrariamente estabelecidos por acordo político na LC

n° 62/89 (através das leis complementares 71/92, 72/93 e 74/94),

desconsiderando-se as informações produzidas no Censo de 1990, traziam

graves distorções no cálculo do coeficiente individual de cada Estado, dentro de

cada bloco regional. Com isso, argumentavam os autores, violava-se o objetivo

constitucional de promoção do equilíbrio socioeconômico entre os entes

federados.

O pedido de antecipação de tutela na ADI 875 não chegou a ser

apreciado. Um fato que merece atenção é que em 04 de abril de 2002 o relator

Néri da Silveira determinou a inclusão das ADIs em pauta para julgamento, vindo

a constar na ordem do dia da sessão de 24 de abril de 2002 – data da última

sessão do relator que se aposentava nesse mesmo dia. No entanto, a apreciação

da matéria acabou sendo adiada “em virtude do adiantado da hora”, o que

resultou na posterior retirada de pauta e indicação de nova relatoria, que ficaria

a cargo do Min. Gilmar Mendes (em 26 de junho de 2002).

Por essa razão, as ADIs seguintes foram distribuídas por prevenção ao

Min. Gilmar Mendes. A ADI 2.727, proposta pelo Governador do Estado de Mato

Grosso do Sul e distribuída em 28 de setembro de 2002, tinha fundamento

semelhante ao da ADI 875, atacando os mesmos dispositivos. Agregava às ações

anteriores o questionamento quanto à violação, pela LC 62/89, da vedação de

delegação de matéria reservada a lei complementar. Já a ADI 3.243, proposta

pelo Governador do Estado do Mato Grosso – mesmo autor da ADI por omissão

1.987 - e distribuída em 29 de junho de 2004, questionava a íntegra da LC

102 ADI 875, Petição Inicial, p.14.

155

62/89, com destaque para o dispositivo que determinava a prorrogação dos

coeficientes nela definidos até que sobreviesse novo critério. Nesse caso, ambas

as ações foram submetidas ao rito do art.12 da Lei n° 9.868/99103, prejudicando-

se os pedidos liminares.

Consta do Acórdão do julgamento conjunto que, nas informações, as

autoridades federais requeridas enfatizaram que “não caberia a este Tribunal

[STF] fixar novos critérios, transformando-se em legislador positivo”.104 A AGU

argumentou que a LC 62/89 não poderia ser atacada via ação direta de

inconstitucionalidade, por se tratar de norma de efeitos concretos, e que a

eventual declaração de inconstitucionalidade inviabilizaria a repartição do Fundo

de Participação, levando assim a uma crise federativa. O Procurador-Geral da

República também proferiu parecer contrário às ADIs, alegando que não caberia

ao STF analisar, em sede de controle concentrado, a alegação de má-distribuição

dos recursos e de sua inaptidão para promover o equilíbrio socioeconômico entre

os entes federados.

VI.1.5 Verticalização das coligações partidárias Em agosto de 2001, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) interpretou a

regra contida no artigo 6o da Lei 9504/97 (Lei das Eleições), determinando que

os partidos políticos que realizassem coligação para eleição de Presidente da

República estariam, dali em diante, proibidos de formar outras coligações para a

eleição de governadores, senador, deputado federal e deputado estadual, que

não aquela formada para a eleição presidencial, uma vez que, apesar de os

partidos políticos gozarem de autonomia, teriam caráter nacional, segundo a

Constituição.105

Em reação a tal instrução, vários partidos ingressam com ação direta de

inconstitucionalidade (a ADI 2626 foi impetrada pelos partidos PC do B, PT, PL,

103 “Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.” 104 Cf. ADI 875/DF. Relatório – Inteiro Teor, fl. 229. 105 Consulta 715, relatada pelo Ministro Garcia Vieira, e formulada pelos Deputados Federais do PDT Miro Teixeira, José Roberto Batochio, Fernando Coruja e Pompeu de Mattos. A Consulta é um mecanismo processual previsto no Código Eleitoral (art. 23, inc. XII), sem qualquer força normativa ou vinculativa, que possibilita a formulação de questões em tese para o TSE. A finalidade da resposta às consultas é antecipar os entendimentos do tribunal, que podem servir como precedente para pronunciamentos futuros.

156

PSB e a 2628 pelo PFL). No entanto, o STF considerou que a instrução do TSE

seria um ato interpretativo não sujeito a controle de constitucionalidade.

Com efeito, as instruções do TSE seriam uma manifestação do exercício

da competência atribuída pelo Código Eleitoral (Lei 4737/65) para cumprimento

das normas eleitorais e a operacionalização do processo eleitoral (art. 23, IX).

Tal competência poderia ser exercida independentemente da consulta prévia, o

que reforçava o argumento acolhido pela maioria dos ministros da ausência de

violação aos principio da legalidade, do devido processo legal e da reserva legal.

Por tais razões, as ADIs 2626 e 2628 não foram conhecidas e a validade

das resoluções do TSE que limitavam a liberdade dos partidos políticos na

constituição de coligações foi mantida.

Pouco após essa decisão, já tramitava um projeto de Emenda

Constitucional no Congresso Nacional para disciplinar as coligações eleitorais,

estabelecendo entendimento contrário à interpretação do TSE. Nesse meio

tempo, o TSE foi novamente provocado a se manifestar a respeito, através de

uma consulta feita pelo PSL (Partido Social Liberal), na qual foi decidido pela

manutenção da verticalização das coligações partidárias para o pleito de outubro

de 2006.106

Ocorre que, em meio à manifestação do TSE, já havia sido aprovada, em

primeiro turno na Câmara dos Deputados, a proposta de Emenda Constitucional

que terminaria com a exigência de verticalização das coligações partidárias. Em

08 de março de 2006, 5 dias após a decisão do TSE, o Congresso Nacional

promulgou a Emenda Constitucional 52, dando nova redação ao artigo 17, § 1o.

Foi assim assegurada aos partidos políticos autonomia para adotar os

critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade

de vinculação entre as candidaturas de âmbito nacional, estadual, distrital ou

municipal; ou seja, foi extinta a exigência de verticalização das coligações

partidárias e, portanto, superado o entendimento do TSE reiteradamente

veiculado em suas instruções.

A partir da aprovação da Emenda, instaurou-se outra polêmica atinente

ao jogo eleitoral. A tensão agora estava relacionada à vigência imediata da nova 106 Consulta realizada em 03 de março de 2006. Cumpre apontar que o PSL, logo após a formulação da consulta ao TSE (21/03/2006), chegou a solicitar ao STF que somente decidisse a ADI 3685 após a manifestação do TSE à referida consulta, o que lhe foi negado uma vez que não era nem impetrante, nem amicus curiae na ADI 3685.

157

regra e, portanto, quanto à sua aplicabilidade ao pleito de outubro de 2006, o

que conflitaria com outro dispositivo constitucional referente à prévia anuidade

das regras disciplinadoras do processo eleitoral.

Em decorrência da aprovação da Emenda e do conflito constitucional

existente, a OAB promoveu ação direta de inconstitucionalidade, ADI 3685,

provocando a jurisdição do STF para que este se manifestasse a respeito da

constitucionalidade ou não da Emenda no que se referia à aplicação imediata da

nova regra.

Em razão da demora nos trâmites legislativos, a EC 52 só entrou em

vigor em março de 2006, mas foi mantida a referência às eleições de 2002,

pretendendo-se com isso a sua aplicação às eleições que ocorreriam dali a seis

meses. Foi impugnada pela OAB a nova redação do art. 17, §2o da CF/88 e o art.

2o da Emenda Constitucional 52/06, que dispunha sobre a vigência imediata da

alteração constitucional.

A decisão tomada pelo Tribunal neste caso é considerada paradigmática

na jurisprudência do STF em termos de procedimentos decisórios pois se tratou

de um julgamento muito rápido, em que houve grande participação de partidos

políticos como amici curiae, e no qual firmou-se a posição praticamente unânime

entre os Ministros no sentido de se tratar de um casuísmo político que deveria

ser reprimido pelo Tribunal em função da segurança jurídica e do principio da

anterioridade anual das regras do processo eleitoral. Baseado nessas razões, o

STF proferiu nesse caso uma decisão de interpretação conforme de um artigo da

própria Constituição, colocando em relevo os limites do legislador reformador

para alterações no texto constitucional.

VI.1.6 Fidelidade partidária Por meio do julgamento dos Mandados de Segurança 26.602/DF, n.º

26.603/DF e n.º 26.604/DF, o STF estabeleceu no país a regra segundo a qual é

vedado ao parlamentar, durante uma legislatura, abandonar o partido político

pelo qual se elegeu, uma vez que o mandato pertenceria ao partido, e não ao

parlamentar eleito.

Os Mandados de Segurança foram impetrados para impugnar uma série

de atos da Mesa da Câmara dos Deputados, editados por seu Presidente (à

época, Deputado Arlindo Chinaglia, PT/SP), nos quais é negado aos partidos

158

impetrantes (DEM, PPS e PSDB) a declaração de vacância de cargo de deputados

que trocaram de partido, a fim de que pudessem assumir os respectivos

suplentes.

O Presidente da casa entendeu “não estar autorizado a declarar a

renúncia ao mandato por parte dos deputados que trocaram de filiação”, por

conta da ausência de previsão legal no Regimento Interno da Câmara dos

Deputados (Art. 239, § 1º).

O fundamento do pedido de declaração de vacância por parte dos

partidos seria uma interpretação do Tribunal Superior Eleitoral, proferida na

Consulta nº 1398107, e que reconhece aos partidos a titularidade do mandato

eletivo obtido em eleições proporcionais – e, portanto, a regra de fidelidade

partidária –, como uma decorrência necessária do sistema eleitoral adotado pela

Constituição.

Em razão disso, toda e qualquer troca de legenda deveria ser entendida

como renúncia tácita por parte do parlamentar desfiliado. Em outras palavras: a

titularidade do mandato eletivo seria direito líquido e certo do partido pelo qual o

ocupante da cadeira houvesse se elegido.

Os mandados de segurança foram todos negados, com exceção de uma

parte do que estava sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia108, que incluía o

mandato de uma parlamentar cuja desfiliação do partido havia ocorrido após a

resposta do TSE à Consulta. Apenas nesse caso específico, concedeu-se o MS em

parte, ocorrendo modulação dos efeitos da decisão do STF, que acabou por

confirmar o entendimento do TSE.

Para ratificar o entendimento do TSE, dando solução definitiva ao caso, o

STF entendeu que, sendo a desfiliação um ato lícito, esta não poderia ser tratada

como hipótese de cassação do mandato. No entanto, mesmo sendo lícito, trata-

se de ato que apresenta conseqüência jurídica, qual seja, provoca a perda

automática do cargo. Nesse sentido, seria um sacrifício do direito pelo eleito, e

107 Nesse caso, a consulta foi do partido Democratas, que levou ao TSE a seguinte pergunta: “os partidos e coligações tem o direito de preservar a vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional, quando houver pedido de cancelamento de filiação ou de transferência do candidato eleito por um partido para outra legenda?” A provocação e a decisão datam ambas do ano de 2007. 108 Trata-se do MS 26.604, impetrado pelo partido Democrata em razão da desfiliação de uma série de parlamentares de seus quadros, e a conseqüente perda do número correspondente de cadeiras. O caso é especialmente interessante em razão da solução formulada pelo Tribunal, aplicando a idéia de modulação de efeitos do controle concentrado em sede de um mandado de segurança, para que fosse atribuído a titularidade dos mandatos ao partidos cadeiras ao impetrante, com exceção daquele em que a desfiliação ocorreu em momento anterior a consulta formulada ao TSE.

159

não uma sanção por ilícito. Em última análise, seria direito do partido político

manter o número de cadeiras obtidas na eleição proporcional.

VI.2 Técnicas de julgamento Como ressaltado anteriormente (cf. item II.4.2, supra), o presente tópico

tem a finalidade de analisar as diferentes técnicas decisórias de que o STF lança

mão ao exercer a função que lhe é atribuída de “guardião da constituição”. Para

tanto, parte-se da premissa de que é insuficiente considerar apenas o resultado

imediato das decisões do tribunal, comumente traduzido em termos de binômios

(procedente/improcedente ou com/sem revisão do ato normativo), sem que

importantes nuances e variações dignas de análise se percam com essa

simplificação.

Ademais, ao considerar-se aquilelas decisões que se situam entre a mera

declaração da inconstitucionalidade de uma lei ou dispositivo, de um lado, e a

simples manutenção do ato normativo impugnado, de outro,109 acredita-se que

questões como a interação entre os Poderes e os limites de sua atuação são

necessariamente abordadas pelo tribunal, oferecendo um rico e importante

campo de análise para a temática da “judicialização da política”.

Em outras palavras, ao decidir um caso em controle de

constitucionalidade110, o STF também fixa os os limites e o alcance de suas

prerrogativas e competências, o que, invariavelmente, o conduz a tocar na

problemática da interação entre os Poderes e o problema da legitimidade de suas

decisões.111

VI.2.1 Mandado de injunção com efeitos constitutivos No caso do direito de greve dos servidores públicos, ao justificar a

mudança de postura do STF quanto aos efeitos do mandado de injunção no MI

670/ES, o Min. Gilmar Mendes mostra uma preocupação em afastar a crítica de

que o Tribunal estaria exercendo um protagonismo legislativo. Para tanto, o

ministro argumenta que, diante de reiteradas omissões do legislador, a não

atuação do STF naquele momento seria, em suas palavras, uma “omissão

109 Ou seja, decisões que empregam aquilo que, aqui, dá-se o nome de técnicas decisórias. 110 Principalmente, ao optar por uma das técnicas decisórias aqui discutidas. 111 Como visto, são extaamente esses os pontos que correspondem aos dois eixos propostos para o marco teórico que orienta a presente pesquisa. Cf. item II.3.1 e 2, supra.

160

judicial”. É assim que ele justifica a aplicação da lei de greve dos trabalhadores

do setor privado ao caso do direito de greve dos servidores públicos:

“Nesse contexto, é de se concluir que não se pode considerar simplesmente que a satisfação do exercício do direito de greve pelos servidores públicos civis deva ficar submetida absoluta e exclusivamente a juízo de oportunidade e conveniência do Poder Legislativo. (...) Enfatizo tão-somente que, tendo em vista as imperiosas balizas constitucionais que demandam a concretização do direito de greve a todos os trabalhadores, este Tribunal não pode se abster de reconhecer que, assim como se estabelece o controle judicial sobre a atividade do legislador, é possível atuar também nos casos de inatividade ou omissão do Legislativo.” (Sem grifos no original)

Uma relevante técnica de julgamento adotada nos acórdãos relacionados

a esse caso envolvem a determinação de aplicação das leis federais 7701/1988

(que cuida da especialização das turmas dos tribunais do trabalho em processos

coletivos) e 7783/1989 (que garante o direito de greve no setor privado e

estabelece os requisitos para tanto) aos conflitos e às ações judiciais que

envolvam a problemática do direito de greve dos servidores públicos.

Contudo, mais do que permitir a incidência destes diplomas legislativos,

no que couber, na delimitação do exercício do direito de greve dos servidores

públicos, o Tribunal define o que o Min. Gilmar Mendes entende por “balizas

procedimentais mínimas” para a apreciação e julgamento dessas demandas

coletivas.

Atendendo às peculiaridades inerentes à prestação de um serviço público,

os ministros consideraram que a aplicação da Lei federal nº 7701/1988 teria que

respeitar algumas condições pré-determinadas, quais sejam: (i) se a paralisação

for de âmbito nacional ou abranger mais de uma região da Justiça Federal, ou

ainda abranger mais de uma unidade da federação, a competência para o

dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça; (ii) ainda no âmbito

federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da Justiça Federal,

a competência será dos Tribunais Regionais Federais; e (iii) para o caso da

jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a

uma unidade da federação a competência será do respectivo Tribunal de Justiça,

ou seja, as greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo respectivo

Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da

paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou

federais.

161

Com relação à Lei federal nº 7783/1989, portanto, o STF buscou “a

coerência entre o exercício do direito de greve pelo servidor público e as

condições necessárias à coesão e interdependência social, que a prestação

continuada dos serviços públicos assegura”. Deste modo, conforme delineado na

retificação de voto do Min. Eros Grau no MI 712/PA, verifica-se uma tentativa de

compatibilizar o princípio da continuidade do serviço público com o exercício do

direito de greve dos servidores públicos.

Assim, além de determinar a aplicação da norma supletiva (que

compreende o conjunto dos art. 1o, 9o, 14, 15, e 17 da lei 7.783/89), o Min. Eros

Grau propõe algumas alterações tidas como necessárias ao atendimento das

peculiaridades da greve nos serviços públicos. São elas: (i) apenas é facultada a

paralisação parcial do trabalho; (ii) durante a greve, serão necessariamente

mantidas em atividade equipes de servidores com o propósito de assegurar a

regular continuidade da prestação do serviço público; e (iii) o comprometimento

da regular continuidade na prestação do serviço público é inadmissível,

consubstanciando abuso do direito de greve. Essas seriam, segundo o Min. Eros

Grau, “balizas procedimentais mínimas” para o exercício do direito de greve dos

servidores públicos.

Já o Min. Gilmar Mendes, no MI 708/DF, ressalta que a deflagração da

greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho, não

hevando que se falar propriamente em prestação de serviços, tampouco no

pagamento de salários. Como regra geral, então, o Min. Gilmar Mendes considera

que os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos. Mas faz uma

ressalva de que os salários podem ser pagos aos servidores no caso em que a

greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento ou por outras

situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão

do contrato de trabalho.

Diante dessas decisões, pode-se afirmar que o STF atribuiu para si a

prerrogativa de delimitar os contornos do exercício do direito de greve dos

servidores públicos, ampliando assim sua competência para julgar temas

salientes do cenário nacional. Isso foi possível com a alteração de entendimento

sobre os efeitos do julgamento do mandado de injunção, que deixam de ser

apenas declaratórios da omissão, passando a ser constitutivos para se suprir a

omissão legislativa.

162

Além disso, pode-se concluir do julgamento dos MI 670/ES, 708/DF e

712/PA que a nova postura do Tribunal em atribuir efeitos constitutivos ao

mandado de injunção demonstra a preocupação em fazer valer as suas decisões

no sentido de dar concretude aos preceitos constitucionais. Ao determinar a

aplicação provisória de outras leis para viabilizar o exercício do direito

assegurado no art. 37, VII, da CF, o STF confere, desde logo, aos impetrantes a

possibilidade de exercer o direito de greve, sem ter que aguardar a atividade do

legislador omisso.

Após o julgamento desses três mandados de injunção, foi proposta a

Reclamação (Rcl) 10798, em que o reclamante visa à suspensão de atos da

Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) com o

intuito de viabilizar o movimento grevista do Sindicato dos Servidores do Poder

Judiciário do Estado do Rio de Janeiro (Sind-Justiça). O sindicato alega que o TJ-

RJ descumpriu com a jurisprudência firmada pelo STF em 2007 que garantiu aos

servidores públicos o exercício do direito de greve.

A recente notícia do Supremo sobre o julgamento liminar desta

Reclamação evidencia alguns dos resultados do julgamento do STF. Na Rcl

10798, o Relator Min. Gilmar Mendes negou o pedido de liminar, observando não

vislumbrar, “num juízo precário, inerente à fase processual, que os atos

impugnados veiculem ofensa ao decidido pelo STF no MI 708/DF”. Segundo ele,

“a complexidade do exercício do direito de greve exige que a administração

pública pratique atos tendentes à adequação da lei de greve do setor privado ao

regime estatutário, concretizando, ademais, o princípio constitucional da

continuidade do serviço essencial, o qual não pode ser abolido pelo legítimo

exercício do direito de greve.” 112

Verifica-se, neste caso, que o ministro reiterou o posicionamento adotado

no MI 708/DF, ao assegurar o exercício do direito de greve dos servidores

públicos desde que observados limites ao exercício desse direito em respeito à

continuidade do serviço público. Isso mostra que o STF está firmando o seu

posicionamento mais propositivo e não tão deferente ao legislador. A questão

que se coloca agora é se ficará a cargo do STF moldar o exercício do direito de

112 Cf. notícia disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo =165238&caixaBusca=N.

163

greve dos servidores públicos, definindo quais os limites da paralisação do

serviço público.

VI.2.2 Interpretação conforme, modulação de efeitos e outras técnicas: lidando com as dificuldades da decisão sobre inconstitucionalidade Iniciando a discussão sobre as técnicas de julgamento relacionadas à

modulação de efeitos e à interpretação conforme, é interessante apontar para os

aspectos curiosos do caso da verticalização das coligações.

Como se tratava de controle de constitucionalidade de uma emenda

constitucional, sua invalidação só poderia ser fundamentada no confronto com

alguma cláusula pétrea. Tal obstáculo foi contornado numa manobra

argumentativa de interpretação sistemática da Constituição, que, combinando

dispositivos esparsos e aparentemente desconexos, criou um fundamento

jurídico para a decisão.

Os ministros do STF empreenderam o que Sepúlveda Pertence chamou

de pesquisa ‘mineralógica’ à procura de uma cláusula pétrea que pudesse ter

sido ofendida. Foram invocados o princípio da segurança jurídica e o principio da

anterioridade anual das regras eleitorais, do qual seria dedutível o direito

individual ao devido processo eleitoral, e que, portanto, seria uma garantia

fundamental, nos termos do § 2o do art. 5o, da CF.

Com esse argumento, é dada procedência ao pedido para que a nova

redação do §1o do art. 17 não fosse aplicável nas eleições de 2006, mas apenas

às subseqüentes, permanecendo vigente naquele pleito a antiga redação do

referido dispositivo. Não houve, portanto, uma declaração de

inconstitucionalidade, nem modulação de efeitos, mas algo parecido com uma

interpretação conforme em que se admitiu a constitucionalidade do dispositivo,

mas a sua inaplicabilidade antes do decurso de um ano de sua vigência.

O resultado, apesar de não anular completamente a decisão legislativa,

postergou sua aplicação para as próximas eleições, por meio da paradoxal

“interpretação conforme a Constituição” de um artigo da própria Constituição -

sendo este um artigo modificado por emenda e o parâmetro de

constitucionalidade, supostas cláusulas pétreas encontradas numa “interpretação

sistemática” da Constituição.

É importante destacar, entretanto, que o Ministro Gilmar Mendes trata o

164

caso como interpretação conforme do art. 2o, da EC 52/06. Esse dispositivo não

trazia uma nova redação para o texto constitucional, mas determinava a vigência

imediata da Emenda e das respectivas modificações. De fato, no caso, parece ter

havido uma incorreção do STF na elaboração da parte dispositiva da ementa

(resumo oficial) do acórdão113, uma vez que haveria se chegado ao mesmo

resultado prático com a simples declaração de inconstitucionalidade do referido

art. 2o, sem necessidade de interpretação conforme para determinação da

vigência temporal da nova redação constitucional.

O caso da fidelidade partidária também apresenta aspectos

interessantes para o estudo sobre as técnicas de julgamento. Ao decidir que a

fidelidade partidária seria “corolário lógico-jurídico necessário do sistema

constitucional vigente”, o STF acaba superando uma série de julgamentos

precedentes, nos quais ele havia afastado a idéia de que a troca de partido

constituiria uma hipótese de renúncia (tácita) ao mandato eletivo.114

Nesses precedentes, o tribunal sempre sustentou que, por um ato

deliberado, o próprio constituinte originário havia excluído essa hipótese do rol

113 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 2º DA EC 52, DE 08.03.06. APLICAÇÃO IMEDIATA DA NOVA REGRA SOBRE COLIGAÇÕES PARTIDÁRIAS ELEITORAIS, INTRODUZIDA NO TEXTO DO ART. 17, § 1º, DA CF. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DA LEI ELEITORAL (CF, ART. 16) E ÀS GARANTIAS INDIVIDUAIS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (CF, ART. 5º, CAPUT, E LIV). LIMITES MATERIAIS À ATIVIDADE DO LEGISLADOR CONSTITUINTE REFORMADOR. ARTS. 60, § 4º, IV, E 5º, § 2º, DA CF. 1. Preliminar quanto à deficiência na fundamentação do pedido formulado afastada, tendo em vista a sucinta porém suficiente demonstração da tese de violação constitucional na inicial deduzida em juízo. 2. A inovação trazida pela EC 52/06 conferiu status constitucional à matéria até então integralmente regulamentada por legislação ordinária federal, provocando, assim, a perda da validade de qualquer restrição à plena autonomia das coligações partidárias no plano federal, estadual, distrital e municipal. 3. Todavia, a utilização da nova regra às eleições gerais que se realizarão a menos de sete meses colide com o princípio da anterioridade eleitoral, disposto no art. 16 da CF, que busca evitar a utilização abusiva ou casuística do processo legislativo como instrumento de manipulação e de deformação do processo eleitoral (ADI 354, rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 12.02.93). 4. Enquanto o art. 150, III, b, da CF encerra garantia individual do contribuinte (ADI 939, rel. Min. Sydney Sanches, DJ 18.03.94), o art. 16 representa garantia individual do cidadão-eleitor, detentor originário do poder exercido pelos representantes eleitos e "a quem assiste o direito de receber, do Estado, o necessário grau de segurança e de certeza jurídicas contra alterações abruptas das regras inerentes à disputa eleitoral" (ADI 3.345, rel. Min. Celso de Mello). 5. Além de o referido princípio conter, em si mesmo, elementos que o caracterizam como uma garantia fundamental oponível até mesmo à atividade do legislador constituinte derivado, nos termos dos arts. 5º, § 2º, e 60, § 4º, IV, a burla ao que contido no art. 16 ainda afronta os direitos individuais da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput) e do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). 6. A modificação no texto do art. 16 pela EC 4/93 em nada alterou seu conteúdo principiológico fundamental. Tratou-se de mero aperfeiçoamento técnico levado a efeito para facilitar a regulamentação do processo eleitoral. 7. Pedido que se julga procedente para dar interpretação conforme no sentido de que a inovação trazida no art. 1º da EC 52/06 somente seja aplicada após decorrido um ano da data de sua vigência. (Grifos acrescentados) 114 São três os principais precedentes citados pela defesa e invocados pelos Ministros para enfrentar a questão da modificação de entendimento anteriormente consolidado pelo próprio tribunal: MS 20.916, MS 20.927 e MS 23.495.

165

de situações que ensejam a perda de mandato, todas elencadas no art. 55 da

Constituição Federal. A maior evidência de que essa teria sido a “escolha”

consciente do constituinte originário seria o fato de que, historicamente, a atual

constituição não trouxe em seu texto a regra da fidelidade partidária,

diferentemente das constituições anteriores (de 1967 e 1969, por exemplo), que

a previam expressamente.

Com a modificação do entendimento anterior, o STF entendeu que estaria

diante daquilo que alguns Ministros denominam mutação constitucional,

concretizada na modificação informal115 do texto do art. 55, da CF, por via

jurisprudencial, passando a reconhecer, na prática, que pertenceria ao partido a

titularidade do mandato eletivo proporcional.

Dentre os relatores dos mandados de segurança que discutiram a

questão, o Min. Celso de Mello é o único que menciona o contexto político e a

“crise” do sistema político-partidário existente no país à época – cujo principal

expoente era o chamado escândalo do “mensalão” – e, após relatar a história de

um parlamentar que trocou de partidos inúmeras vezes, afirma que,

“considerado esse estado de coisas”, a fidelidade partidária deve traduzir “um

valor constitucional revestido de elevada significação político-jurídica”.116

A escolha argumentativa do Tribunal para enfrentar a questão da

modificação de entendimento anterior por meio da idéia de mutação

constitucional pode ser sintetizada no seguinte raciocínio exposto pelo Min.

Gilmar Mendes:

“O STF estaria reinterpretando a Constituição, em toda a sua inteireza (...). A evolução jurisprudencial sempre teria sido a marca de qualquer jurisdição de perfil constitucional. A afirmação de mutação constitucional não implica o reconhecimento, por parte da Corte, de erro ou equívoco interpretativo do texto constitucional em julgados pretéritos. Ela reconhece, ao contrário, a necessidade de contínua e paulatina adaptação dos sentidos possíveis da letra da Constituição à realidade que a circunda.” 117

Em sua jurisprudência, o Tribunal comumente invoca, junto com a

decisão que reconhece a ocorrência de mutação constitucional, a necessidade de

modulação dos efeitos da decisão que reverte posicionamento anteriormente

115 Ou seja, sem modificação formal do texto, pela via de emenda constitucional, promulgada pelo Congresso Nacional. Cf. voto do Min. Gilmar Mendes, fl. 431. 116 Cf. p. 427-431, do MS 26.604. 117 Cf. voto do Min. Gilmar Mendes, MS nº 26.604, p. 448.

166

fixado pela corte. Em linhas gerais, a modulação de efeitos permite ao Tribunal

limitar a produção dos efeitos de uma decisão em relação a seu aspecto

temporal, determinando que possua eficácia tão-somente prospectiva (ou pro

futuro, na expressão de alguns ministros) ou ainda a partir de certo marco

temporal (no passado ou no futuro), que não a data de edição do ato que se

julga inconstitucional.

Além das exigências de caráter formal, tais como quórum mínimo e

reserva de plenário, a lei também estabelece os pressupostos materiais para que

o tribunal decida pela mitigação dos efeitos da declaração de

inconstitucionalidade: (i) a existência de relevante interesse social; ou (ii) que a

decisão represente um sério risco para a segurança jurídica das relações

constituídas sob a égide da lei viciada.118

A estratégia dos Ministros no caso da fidelidade foi, no entanto, a de não

tratar a questão como uma modulação de efeitos nos termos da lei, a fim de

evitar a exigência de quórum de aprovação mínima de dois terços do plenário do

STF.119 A justificativa, aqui, é que se trata de simples mudança de orientação

jurisprudencial (e não de declaração de inconstitucionalidade), bastando que se

invocasse a necessidade de preservar a segurança jurídica das situações

constituídas com base no entendimento anterior do tribunal, o que poderia ser

feito com aprovação por maioria simples dos Ministros presentes à sessão de

julgamento.120

Dessa forma, o Tribunal acabou, por maioria simples do Plenário,

modulando os efeitos para dar eficácia à sua decisão somente a partir da data da

resposta do TSE à Consulta 1.398, de 23 de março de 2007. De um modo geral,

a modulação é justificada de maneira vaga e imprecisa, inclusive na ementa do

acórdão, que invoca razões de segurança jurídica, em vista da mudança, da

evolução jurisprudencial, e também em razão da ausência de modificação formal

da legislação ou do texto constitucional.121

118 Art. 27, da Lei da ADI e art. 11 da Lei da APDF. 119 Nesse sentido, cf. a argumentação desenvolvida pelo Min. Gilmar Mendes, fl. 464 e s. 120 Cf. Min. Elle Gracie, fl. 466. Cumpre destacar que todos os julgados citados como precedente para fundamentar a necessidade de modulação dos efeitos também tratavam de modificação do entendimento jurisprudencial anterior. No entanto, nem a pretexto de preservação da segurança jurídica, deixou-se de observar a exigência de quórum, com aplicação do art. 27. 121 Essa argumentação (preservação da segurança jurídica) aparece no argumento de todos os ministros que votaram a favor da modulação de efeitos. Cf. Carmen Lúcia (fl. 244 e ss.); Ellen Gracie (fl. 461 e ss.); Marco Aurélio (fl. 459 e ss.).

167

Curioso notar que, somente ao decidir pela modulação de efeitos, alguns

ministros se ocupam da questão dos limites da jurisdição constitucional e das

competências e prerrogativas do STF no desempenho da sua função de guardião

da Constituição. Aqui, o problema central que deveria ser enfrentado pelo

Tribunal – e que, no entanto, foi apenas tangenciado por alguns ministros – diz

respeito ao seguinte questionamento: estaria o tribunal legislando, ao afirmar a

fidelidade partidária como regra de estatura constitucional, mesmo sem previsão

expressa no texto da Constituição de 1988?

A maior parte dos ministros parece concordar com a leitura do Min.

Menezes Direito, de acordo com a qual o STF não estaria “legislando, nem

criando norma artificial”. O que o tribunal estaria fazendo, in casu, seria apenas

“dar uma interpretação coerente com o que se contém na CF para preservar-lhe

os princípios”.122

O único que aponta para o risco de que o STF estaria legislando é o Min.

Marco Aurélio. No entanto, os óbices levantados pelo ministro não têm relação

com o reconhecimento de hipótese de perda de mandato eletivo não-expressa no

texto constitucional123, mas, sim, a partir do momento em que o STF estaria

buscando definir os limites temporais para produção de efeitos de seu novo

entendimento.

Segundo o Ministro, o arcabouço normativo não mudou no período (o

texto do art. 55 da CF é o mesmo desde sua promulgação), o que mudou foi

apenas a leitura que o Tribunal faz dos dispositivos constitucionais relacionados à

matéria. Nesse caso, modular os efeitos temporais desse novo entendimento

significaria, na prática, “estipular um prazo” para entrada em vigência da própria

Constituição, fixando termo inicial de sua eficácia, com a evolução do

entendimento do Tribunal.124 Em outras palavras, ao modular os efeitos,

conferindo, na prática, “prazo” para vigência do texto constitucional, o Tribunal

estaria excedendo os limites de sua competência, violando a própria Constituição

da qual decorrem seus poderes.

122 Cf. MS nº 26.604, pp. 292 e s. 123 Segundo o Ministro, ao reconhecer a fidelidade partidária, nem o STF nem o TSE estariam legislando, apenas estabelecendo a concretude e o alcance da própria Constituição. Cf. fl. 457. 124 “O Supremo pode atuar como legislador negativo, mas não como legislador positivo, e o estará fazendo, inspirado, é certo, na resposta do TSE, ao fixar termo inicial da eficácia, da concretude, da Constituição Federal.” Cf. fl. 323. Para ele, a idéia de fato consumado, no Brasil, seria uma miríade para alguns, como justificativa para postergar qualquer modificação. Isso somente seria admitido se a conduta protegida estivesse “harmônico, afinado, com a ordem jurídica”. Cf. fl. 322.

168

Esses dois casos, referentes à competição política e ao jogo eleitoral,

mostram que não é o simples fato de os temas em questão terem sido levados

ao Judiciário que importam para o diagnóstico de judicialização. Para tal, é

relevante estudar a configuração dos julgamentos, pois o “ativismo” parece estar

propriamente na maneira como o Tribunal estabelece suas prerrogativas (como

ocorreu no caso da fidelidade, ao entender que ocorreu uma mutação que

justifica a extração de uma regra do texto constitucional, ainda que não

expressamente prevista na Constituição) e as dos demais Poderes, verificada no

caso da verticalização, em que se discutiu os limites do Poder Legislativo na

alteração do texto constitucional e, consequentemente, a necessidade de que

STF fiscalizasse o respeito a estes limites, contendo eventuais abusos e

casuísmos.

No caso do FPE, merece destaque o estudo da modulação de efeitos da

decisão em relação às discussões sobre os limites de atuação da Corte e o

diálogo indireto com o Poder Legislativo.

Há, no voto do relator da ADI 875, o reconhecimento de que as técnicas

tradicionais de decisão não poderiam ser aplicadas no caso, sob pena de se

chegar, via ADI, a um vácuo jurídico contrário aos propósitos da própria

Constituição. O princípio da nulidade da norma inconstitucional, portanto, deveria

ser aplicado em ponderação com o princípio da segurança jurídica, pois a simples

cassação da norma inconstitucional (com sua consequente exclusão do mundo

jurídico) não seria apta a resolver os problemas decorrentes da omissão parcial.

O Ministro cita, como exemplo, a hipótese da Corte vir a declarar a

inconstitucionalidade por omissão parcial da norma que define o salário-mínimo

em valor flagrantemente inferior aos parâmetros definidos na Constituição. Nesse

caso, ao se aplicar a técnica de declaração de nulidade, o resultado seria

contrário ao preceito constitucional, uma vez que sequer um valor mínimo

restaria regulamentado. Portanto, em casos como esses, a aplicação ponderada

da regra da nulidade permite à Corte lidar com as conseqüências de sua decisão,

as quais foram amplamente discutidas no julgamento das ADIs sobre o FPE.

Antes de citar um conjunto de decisões recentes da Corte em argüições

de inconstitucionalidade por omissão e mandados de injunção que denotam uma

mudança importante na jurisprudência, preceitua o Relator da ADI 875:

“A questão fundamental reside menos na escolha de um processo

169

especial do que na adoção de uma técnica de decisão apropriada para superar as situações inconstitucionais propiciadas pela chamada omissão legislativa. (…) Aqui, não se trata mais de saber se as ações são de inconstitucionalidade por ação ou por omissão (parcial), mas de encontrar uma técnica [diferenciada] de decisão para superar o alegado estado de inconstitucionalidade decorrente de omissão parcial” (fls. 239-24, sem grifos no original).

Dentre essas novas técnicas, estaria a declaração de

inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade, cujos precedentes são as ADIs

3.682 e 2.240 – que reconheceram inconstitucionalidade por omissão legislativa

na regulamentação do processo de criação de novos municípios, sem pronúncia

de nulidade da norma questionada e com estipulação de prazo para supressão do

vácuo normativo, sendo a determinação do Tribunal atendida pelo Congresso.

Nesse ponto, por não admitir uma interpretação extensiva do art.27 da

Lei 9.868/99 que permita tais técnicas decisórias, o Min. Marco Aurélio diverge

da maioria, julgando improcedente os pedidos das ADIs 875, 2.727 e 3.243; e

procedente o pedido de inconstitucionalidade por omissão (ADI 1.987),

assentando seus efeitos a partir da data de julgamento e tomando a lei

complementar como legítima em relação aos rateios pretéritos (ADI 875.

Acórdão – Inteiro Teor, fl. 290).

É importante perceber que, ao rejeitarem tal posição, ancorada na

tradição jurisprudencial da Corte de declarar a inconstitucionalidade por omissão

como forma de apelar ao Congresso Nacional quanto à necessidade de adotar

medidas corretivas, a maioria do Tribunal entendeu que esta técnica não se

mostra eficaz no enfrentamento das situações de inconstitucionalidade, sendo

necessária a adoção de uma decisão determinante.

Nesse sentido, como forma de induzir o Congresso a legislar, é ressaltado

que, a partir de 31 de dezembro de 2012, os coeficientes de repartição

estabelecidos na legislação atual não poderão ser aplicados, com o que se

reafirma a responsabilidade do Poder Legislativo. Ou seja, o problema decorrente

da não aprovação de uma nova lei no prazo fixado (que nos debates é ampliado

em relação à proposta original do Relator, que era de 24 meses) deve ser

resolvido pelo Congresso Nacional, que é o poder competente.

Preocupado com essa questão, o Min. Ricardo Lewandowski ressalta em

seu voto que a Corte não estaria fixando um prazo para o Congresso Nacional, o

que poderia ser entendido como ingerência na pauta do Legislativo, e sim se

170

utilizando de prerrogativa inscrita no art.27 da Lei 9.868/99 para modular a

declaração de inconstitucionalidade (ADI 875. Acórdão – Inteiro Teor, fl. 298).

Apesar de ventilada como questão nas discussões, a Corte não antecipa nesse

momento qual seria a solução jurídica aplicável à hipótese de persistir a mora

legislativa no ano de 2012.

Há assim, um evidente diálogo indireto com o Poder Legislativo,

considerando-se inclusive, na discussão do prazo de vigência da lei

inconstitucional, fatores como “o ano eleitoral”, a “vontade política” dos

legisladores e a necessidade de se aprovar uma reforma tributária. Há, ainda,

indicações na decisão quanto ao conteúdo da norma regulamentadora da

distribuição do FPE que a tornaria compatível com o preceito constitucional.

Nesse sentido, o Min. Relator indica dois parâmetros a serem observados

pelo legislador em observância à CF, art.161, inciso II e parágrafo único:

primeiramente, os critérios distributivos definidos na nova lei devem permitir

“que dados fáticos, apurados periodicamente por órgãos ou entidades públicas

(e.g., o IBGE), possam influir na definição dos coeficientes de participação”; em

segundo lugar, “deve haver a possibilidade [prevista em lei] de revisões

periódicas dos coeficientes” (STF. ADI 875. Acórdão – Inteiro Teor, fls. 259-260).

Tais parâmetros são reafirmados no debate com os demais ministros.

O caso do FPE guarda relação com o caso do direito de greve dos

servidores públicos, discutido anteriormente, pois em ambos o STF se viu

confrontado com uma omissão legislativa. Naquele primeiro caso, entretanto, há

a dificuldade adicional de haver uma lei em vigor, o que não ocorria na questão

dos servidores públicos. Esse aspecto é determinante para as configurações

diversas que cada julgamento assume.

A ADPF 101, referente à importação de pneus usados, é outro caso

que apresenta várias peculiaridades na maneira pela qual se deu o julgamento

da questão. Aqui, não se trata das técnicas regulamentadas de modulação de

efeitos, mas a maneira pela qual o Tribunal resolveu dar conhecimento de sua

decisão implica, na prática, uma espécie de controle dos efeitos do julgamento.

Antes de tudo, cumpre notar que o acórdão desse caso ainda não foi

publicado, ainda que o julgamento tenha se encerrado há mais de 1 ano, no dia

171

24 de junho de 2009. Há apenas a versão provisória de alguns votos disponíveis

para análise.125

No caso, é possível dizer que o dispositivo da decisão do Plenário – o que

efetivamente foi decidido pela Corte – ainda permanece ambíguo. O dispositivo

do voto da relatora Ministra Cármen Lúcia é pelo provimento parcial da ADPF,

para (a) declarar constitucionalmente válidas as normas que proíbem a

importação de pneus, (b) declarar inconstitucionais, com efeitos ex tunc (para o

passado) as “interpretações, incluídas as judicialmente acolhidas, que, afastando

a aplicação daquelas normas, permitiram ou permitem a importação de pneus

usados de qualquer espécie, aí incluídos os remoldados, ressalva feita quanto a

estes àqueles provenientes dos Países integrantes do MERCOSUL, na forma das

normas acima listadas”, (c) excluir dessa incidência de efeitos pretéritos as

decisões judiciais com trânsito em julgado que não estejam sendo objeto de

ações rescisórias (p. 139-140 do voto).

Neste ponto (c), entretanto, a Ministra incluiu uma exceção da exceção,

pois estabeleceu que “Não se incluem nesta exceção [de proteção à coisa

julgada] conteúdos decisórios em aberto ou dispostos de forma ilimitada para o

futuro, pois a partir do que aqui definido ficam proibidas importações de pneus,

dando-se o estrito cumprimento das normas vigentes com os contornos e

exceções nela previstas.” A intenção aqui parece ter sido não permitir que mais

pneus entrassem no país em razão de sentença com coisa julgada (uma

sentença que estabelecesse, por exemplo, que determinada empresa tem direito

a uma licença de importação válida até o ano de 2012), no entanto, essa

intenção não está claramente colocada.

Outro problema está relacionado à questão do Mercosul. Como a própria

Ministra coloca em seu voto (p. 75), na batalha travada entre Brasil e União

Europeia na OMC, o Órgão de Apelação dessa organização decidiu por reverter

decisão anterior, favorável ao Brasil, entendendo que a “isenção de proibição de

importação de pneus usados dada ao Mercosul e as importações de pneus

usados e reformados por meio de liminares, independentemente do volume de

importações que propiciam, configuram uma injustificada e arbitrária 125 Voto da Min. Cármen Lúcia disponível em http://sbdp.org.br/arquivos/material/ 683_101%20CL.PDF; voto do Min. Eros Grau em http://sbdp.org.br/arquivos/material/ 681_101%20EG.PDF; voto do Min. Gilmar Mendes em http://sbdp.org.br/arquivos/material/ 682_101%20GM.PDF; voto do Min. Marco Aurélio em http://sbdp.org.br/arquivos/material/ 680_101%20MA.PDF.

172

discriminação”. A decisão da Ministra – pelo menos na versão do voto que há

disponível – mantém, ainda assim, a legitimidade da exceção ao Mercosul.

Os demais votos disponíveis não trazem esclarecimentos sobre essas

questões. O Ministro Eros Grau concorda com a decisão da relatora, mas não

com a fundamentação por ela apresentada, que ele entende se basear na

ponderação de princípios constitucionais, por considerar que este método

hermenêutico fere a racionalidade do direito. Assim, dedica seu voto a

fundamentar de maneira diversa a mesma decisão, sem usar da ponderação de

princípios. O Ministro Gilmar Mendes segue o voto da relatora, destacando os

motivos pelos quais a decisão tem de preservar a coisa julgada (motivos de

segurança jurídica e guarda do preceito constitucional). Já o Ministro Marco

Aurélio é único a julgar a demanda improcedente, por entender que o princípio

da livre iniciativa e o princípio da legalidade devem prevalecer sobre os

argumentos alegados pelo demandante.

A demora na publicação do acórdão e a ambigüidade do dispositivo do

voto da relatora, havendo inclusive uma aparente manutenção da exceção ao

Mercosul em contrariedade à decisão da OMC, fazem com que o julgamento do

caso dos pneus ainda não tenha um provimento definitivo, mesmo que a

deliberação tenha ocorrido há mais de um ano.

Ainda que não se esteja falando aqui de uma técnica de julgamento nos

moldes da modulação de efeitos, trata-se de um expediente relevante, que

certamente altera a maneira pela qual o entendimento do STF nesse caso é

percebido e aplicado pelos demais atores institucionais.

Como visto, os casos estudados neste tópico revelam que a declaração

de inconstitucionalidade apresenta muito mais sutilezas do que o binômio

constitucional/inconstitucional revela. Para entender e criticar a atividade do

Supremo Tribunal Federal, é preciso ter essas questões em conta.

VI.2.3 Decisão aditiva, julgamento extra-petita e formação de um precedente judicial No caso Raposa Serra do Sol apresenta-se, a partir de iniciativa do

voto do Min. Menezes Direito, 18 condicionantes não apenas ao processo de

demarcação da reserva em questão, mas de terras indígenas em geral. Estas

condicionantes abordariam aspectos que não foram apresentados na petição

173

inicial da ação popular. Isso trouxe para os debates entre os ministros uma série

de discussões acerca do limite da atividade jurisdicional do STF.

Esses debates envolveram a relação entre o que foi pedido pela inicial e

pelos assistentes e se essas condicionantes corresponderiam a um julgamento

extra-petita. Envolveram ainda o objetivo de alcançar com essas condicionantes

não apenas o julgamento do caso concreto da Raposa Serra do Sol, mas o de

estabelecer parâmetros para a demarcação de terras indígenas em geral, o que

também poderia ser traduzido como a formação de um precedente da corte.

Na petição inicial, solicita-se a declaração de nulidade da portaria

534/2005. Como argumentos para fundamentar o pedido, o autor aponta vícios

no processo administrativo da demarcação. Como reforço argumentativo, aponta

(i) que a reserva em forma contínua traria conseqüências desastrosas para o

Estado de Roraima, (ii) que haveria comprometimento da segurança e soberania

nacionais, (iii) que haveria desequilíbrio no concerto federativo e (iv) que haveria

ofensa ao princípio da razoabilidade ao se privilegiar a tutela do índio em

detrimento de outros princípios constitucionais (fls. 245-7).

O autor da demanda, ao pedir expressamente apenas a nulidade da

Portaria n. 534/2005 demanda do exercício jurisdicional, segundo a Min. Cármen

Lúcia, “examinar a validade, ou não, de um ato administrativo no qual se

especifica a demarcação de uma área de terras indígenas em face da

Constituição e da legislação vigente importa em decidir, então, sobre a validade,

ou não, do provimento questionado, tal como examinou e concluiu o eminente

Ministro Relator, Carlos Britto, que concluiu pela improcedência da ação por não

ter vislumbrado qualquer vício naquele provimento”.

Segundo esse modelo jurisdicional, competiria aos ministros apenas

julgar a procedência ou improcedência da ação. Ele difere de outro modelo, que,

segundo a Ministra, seria o demandado pelo Estado de Roraima, reconhecido

como assistente na ação. O Estado de Roraima inova o pedido, pois buscaria no

exercício da jurisdição a alteração do conteúdo do ato questionado.

O voto-vista do Min. Menezes Direito julga parcialmente procedente a

ação popular para que sejam observadas as condições impostas pela disciplina

constitucional ao usufruto dos índios sobre suas terras e inova ao apresentar 18

cláusulas condicionantes ao processo de demarcação de modo geral, embora não

reconheça nenhuma nulidade, tanto na Portaria 534 do Ministro da Justiça, de 13

174

de abril de 2005, quanto no Decreto Presidencial de 15 de abril de 2005. Passa a

enumerar as 18 cláusulas que, posteriormente, seriam deliberadas pelo

colegiado e acabariam por se tornar as 19 constantes no dispositivo do acórdão.

Nesse sentido, o que faz o Min. Menezes Direito é adicionar à disciplina

da Portaria 534/2005, através de sua decisão, determinado regime jurídico que

deduziu das normas constitucionais relativas à questão indígena, o que se

assemelharia também a um suprimento de inconstitucionalidade por omissão.

Sendo assim, a decisão dada pelo ministro se aproximaria ao modelo de

jurisdição demandado pelo Estado de Roraima.

O voto do Min. Menezes Direito provoca a discussão sobre se tais

condicionantes seriam um julgamento extra-petita. O Min. Carlos Britto pondera:

“Só tenho dúvida – mas isso também será objeto de uma rediscussão – se o

julgamento como proposto pelo Ministro Direito de procedência parcial da ação

não caracteriza uma decisão extra petita, porque nada disso foi pedido na ação

popular, nada do que está aqui foi pedido” (fl. 421).

Ao final de seu voto, o Min. Direito apresenta argumentos que

permitiriam afirmar que não se trata de uma decisão extra petita. Trata-se de

apenas dois parágrafos às fls. 415, nos quais o ministro defende a idéia de que a

ação popular julgada no STF é meramente instrumental à questão do conflito

federativo, que é justamente o motivo pelo qual a ação tramita sob competência

do STF, e que é para este conflito federativo que o Tribunal deve fornecer uma

resposta. Essa adaptação do rito da ação ordinária não subverte seu objetivo,

que é apreciação da demanda sobre a nulidade ou não da demarcação, e dá

ainda sentido compatível com a finalidade da competência originária, que é a

resolução do conflito federativo.

Ao longo dos votos e dos debates, os ministros convencem-se da

utilidade da nova técnica decisória proposta pelo Min. Menezes Direito. O Min.

Carlos Britto se convence de que não se trata de decidir fora da demanda e

esclarece: “com essa técnica criativa, inteligente, de condicionar a execução de

nosso julgado a algumas providências, entendo que essa proposta atua no

campo da operacionalização do nosso decisório” (fl. 748).

Mesmo a linha argumentativa da Min. Cármen Lúcia, que parecia indicar

um julgamento extra-petita no voto do Min. Menezes Direito, propõe ao final

algumas das condicionantes com nova proposta de redação.

175

Além da discussão sobre o seu caráter extra petita, as condicionantes

sugerem também o caráter erga omnes de sua aplicabilidade às demais

demarcações de terras indígenas. Logo depois, ainda em seu voto, o Min.

Menezes Direito afirma: “A partir da apreciação deste caso pude perceber que os

argumentos deduzidos pelas partes são também extensíveis e aplicáveis a outros

conflitos que envolvam terras indígenas.

A decisão adotada neste caso certamente vai consolidar o entendimento

da Suprema Corte sobre o procedimento demarcatório com repercussão também

para o futuro. Daí a necessidade do dispositivo explicitar a natureza do usufruto

constitucional e seu alcance” (fls. 415-6).

O que o Min. Menezes Direito parece ter como objetivo com a adoção

dessa técnica decisória é anunciar ao país o entendimento do tribunal acerca do

“usufruto das terras indígenas”, que nada mais é que o regime constitucional

pertinente a essas terras no entendimento do tribunal. Assim, a partir da análise

das controvérsias envolvidas na demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, o

Min. Direito passou a decidir sobre questões que não haviam sido demandadas

ao tribunal na petição inicial, mas que servem de base para que a corte declare

seu entendimento sobre o regime jurídico das terras das reservas indígenas de

todo o país, e não somente da Raposa Serra do Sol.

Entendimento quanto à extensão dos efeitos no qual é acompanhado por

outros ministros, como o Min. Cezar Peluso:

“a postura que esta Corte está tomando hoje não é de julgamento de um caso qualquer, cujos efeitos se exaurem em âmbito mais ou menos limitado, mas é autêntico caso-padrão, ou leading case, que traça diretrizes não apenas para solução da hipótese, mas para a disciplina de ações futuras e, em certo sentido, até de ações pretéritas nesse tema. Parece-me, daí, justificada a pertinência de certos enunciados que deixam claro o pensamento da Corte a respeito. Isso vale, principalmente, em relação às novas demarcações, que envolvem um complexo de interesses, direitos e poderes de vários sujeitos jurídicos, seja de direito público, seja de direito privado (...)”.

Mas esse entendimento sobre a extensão das condicionantes não parece

ser compartilhado pela Min. Cármen Lúcia, que, após proferir seu voto, é

indagada pelo Min. Gilmar Mendes, que com suas condicionantes estaria, na

verdade, propondo diretrizes que podem afetar os procedimentos de

demarcação. E responde: “Sim. Quanto a isso, não me oponho. Eu apenas digo:

176

como estou dando uma decisão, um voto judicial numa ação específica para este

caso”. Ou seja, parece limitar os efeitos para este caso concreto.

A razão que fundamenta ou legitima o exercício das condicionantes

parece variar muito conforme cada ministro e não se chega a uma deliberação

entre eles acerca disso, i.e., a presença dessas condicionantes parece ser apenas

aceita. A Min. Ellen Gracie, por exemplo, apresenta outra justificativa diversa das

anteriores:

“Inicialmente pensava, visto que o objeto da ação diz respeito apenas à desconstituição de uma demarcação já realizada, que poderíamos estar exercendo o pedido original. No entanto, as ponderações colocadas pelos Colegas me convencem de que, efetivamente esse é o melhor caminho a ser seguido pela Corte, ainda mais numa matéria de tanta delicadeza. O Ministro Cezar Peluso mais uma vez o enfatiza ao dizer que não basta apenas a manifestação desta Corte, é preciso que o Estado brasileiro, todo o Estado brasileiro se movimente, se mobilize no resgate dessa dívida ancestral que temos com a população indígena.”

Essa dificuldade de encontrar uma linha de fundamentação comum entre

os ministros pode decorrer da novidade da técnica, da dificuldade de

compreender seus contornos durante o julgamento ou também em parte pode

decorrer da própria forma como se dá o processo decisório do tribunal,

fragmentado em votos sucessivos dos 11 ministros, com esparsos debates entre

os votos, nos quais não necessariamente se dialoga com as razões de decidir do

ministro que votou anteriormente.126

Além da possível capacidade de persuasão do voto, a forma como o Min.

Menezes Direito apresentou as condicionantes, propondo que elas compusessem

a parte dispositiva da sentença, parece ter provocado todos os ministros a se

manifestarem sobre elas. Afinal, teriam de deliberar se ela estaria ou não e em

quais termos na parte dispositiva da sentença.

O caso da Raposa Serra do Sol ilustra, portanto, o amplo espaço que a

Corte tem para inovar suas técnicas de julgamento, e aponta para os problemas

de deliberação sobre essas novas técnicas, problemas estes que parecem

decorrer da própria dinâmica de julgamento no Tribunal.

126 Cf. Adriana Vojvodic, Ana Mara Machado, Evorah Cardoso, Escrevendo um romance, primeiro capítulo: precedentes e processo decisório no STF. Revista Direito GV , v. 9, p. 21-44, 2009.

177

VI.2.4 Execução das decisões: atribuindo tarefas a tribunais inferiores No caso da fidelidade partidária houve, em certa medida, uma espécie

de abstrativização do controle concreto de constitucionalidade, uma vez que a

discussão sobre a questão da interpretação constitucional foi travada em sede de

mandado de segurança, e não em ação direta de inconstitucionalidade (ADI) ou

argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF).127 Apesar disso,

os ministros entenderam, deliberadamente, que a decisão estaria dotada de

efeitos erga omnes, valendo para todos, e não apenas para aqueles que eram

partes nos mandados de segurança.

Um dos indicadores dessa abstrativização é o resultado do debate

travado pelos ministros acerca das exceções à regra da fidelidade partidária –

assim como a própria regra, as exceções também não estão expressas no texto

constitucional. Nesse sentido, a questão dos limites e prerrogativas do STF no

controle de constitucionalidade volta a ser discutida na decisão que reconhece a

fidelidade partidária em um segundo momento, no qual os ministros passam a

discutir maneiras de aplicação da regra, já que esta não poderia atingir algumas

situações específicas.

As ressalvas dos ministros são feitas em relação ao que se chama de

desfiliação justificada, i.e., casos nos quais a troca de partido seria admissível e

que, portanto, não implicariam uma renúncia (tácita) do mandato eletivo. A

primeira dessas situações seria a dos parlamentares que trocarem de legenda

em razão de (i) mudança de orientação ideológica do partido. Ademais, a regra

da fidelidade partidária também poderia ser excepcionada (ii) em casos de

comprovada perseguição política interna ao parlamentar que pretende mudar de

partido.128

Para a implementação de uma decisão nesses termos, o STF se vê diante

da necessidade de regulamentar uma série de procedimentos que assegurem o

respeito à ampla defesa e ao contraditório nos casos de desfiliação justificada.

Nesse momento, o STF acaba enfrentando problemas decorrentes da ausência de

mecanismos e institutos à sua disposição e que sejam adequados para conferir

efetividade à sua decisão.

127 Alguns ministros reconhecem isso expressamente: Min. Joaquim Barbosa, fl. 340; o Min. Cezar Peluso fala em “efeitos declaratórios” do MS (fl. 399). 128 Cf. Min. Carmem Lúcia, fl. 245; e Min. Eros Grau, fl. 248.

178

É plenamente possível cogitar, aqui, que essas dificuldades talvez sejam

resultado em parte da avocação de competências para cujo exercício o tribunal

ainda não esteja institucionalmente preparado para exercer.

Reconhecendo os limites de sua atuação, o tribunal toma uma decisão

curiosa para contornar o problema que lhe surge: determina compulsoriamente

ao Presidente da Câmara dos Deputados que encaminhe os pedidos de

declaração de vacância ao TSE, sendo que este deveria expedir Resolução que

disciplinasse o procedimento de justificação da desfiliação.129

De acordo com alguns ministros, essa solução seria a mais adequada,

tendo em vista que o TSE disporia de competência suficiente para expedir

verdadeiras normas materiais e processuais.130

O caso Raposa Serra do Sol traz outra discussão interessante sobre o

enforcement das decisões do Tribunal. Uma vez computados os votos dos

ministros, inicia-se um debate entre eles sobre a redação das condicionantes ao

processo de demarcação e sobre como seria executada a decisão. O Min. Gilmar

Mendes (fls. 831-32) propõe em seu voto que o STF delegue a execução da

sentença ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, na pessoa de seu

presidente, sob supervisão do relator da ação, Min. Carlos Britto, sob o

argumento de que a realidade fática de extrema complexidade exige uma

proximidade do judiciário para a rápida e célere resolução de controvérsias

durante os procedimentos de execução. O Min. Gilmar Mendes menciona que

essa delegação de atos executórios a tribunais ou juízes locais é comum a outras

cortes constitucionais e menciona em seu voto o caso paradigmático da Suprema

Corte norte-americana, Brown v. Board of Education, que determinou que as

escolas públicas admitissem alunos negros e brancos em igualdade de condições.

O cumprimento da decisão do caso Brown recebeu intensa resistência das

entidades educacionais, o que levou a uma nova demanda à Suprema Corte, na

qual foi discutido pelo tribunal como se daria o processo de execução da

sentença. A solução adotada foi a delegação aos tribunais locais da execução da

decisão.

129 Ou seja, para a especificação, por parte do TSE, de qual o procedimento para os casos de desfiliação justificada, em razão de (i) mudança de orientação programática do partido, ou (ii) perseguição política. A desfiliação justificada não implicaria a perda do mandato eletivo. O TSE acatou a decisão do STF com a edição da Resolução 22.610. 130 Nesse sentido, cf. voto do Min. Gilmar Mendes, fl. 449.

179

A adoção desse procedimento é relevante, pois a discussão de soluções

sobre como acompanhar o processo de execução da sentença, é, de certo modo,

um reflexo do processo de transformação do controle de constitucionalidade. As

condicionantes ao processo de demarcação de terras indígenas adotadas pelo

tribunal exigiriam o acompanhamento da etapa de execução da sentença. Uma

vez que o tribunal incide sobre políticas públicas, já não é suficiente a mera

declaração de inconstitucionalidade, pois ela não gera efeitos automaticamente.

É preciso, nesta etapa, levar em consideração outros atores institucionais

envolvidos na execução da sentença.

Apresentar propostas de como acompanhar a execução de uma sentença

exige também do tribunal a familiarização com outra linguagem, não mais a de

direitos, mas a da própria política pública. Nesse sentido, o Min. Joaquim

Barbosa, manifesta-se:

“creio que nós estamos aqui embrenhando numa seara na qual o Supremo Tribunal Federal não tem nenhuma experiência. Nós estamos adentrando o campo do que se chama judge-made law. É o tipo de atividade típica de países em que o Poder Judiciário faz o direito. Faz o direito e delega a sua execução a um juiz. Mas, delega, como? Delega fixando diretivas claras, fixando metas, fixando prazos. Nós não podemos delegar isso a um Tribunal Regional e aos juízes de Roraima sem essas diretivas claras, porque não nós sabemos qual é a realidade local”.

Os ministros também discutem a possibilidade de estabelecer um prazo

para a implementação da decisão – se deveria ser imediata ou não –, o que

provoca a manifestação durante a sessão, do Advogado-Geral da União, dos

produtores rurais e das comunidades indígenas.

A solução adotada pelo STF é a de execução imediata, mesmo antes da

publicação do acórdão, e a de delegar o acompanhamento da execução para o

relator do caso, Min. Carlos Britto, em conjunto com o presidente do Tribunal

Regional Federal da 1ª Região. Com isso, buscam também evitar um desgaste de

eficácia da sentença, como mencionado pelo Min. Cezar Peluso, “acho que, ao

estabelecermos uma regra de caráter geral, desconhecendo a situação de fato do

local e todas essas implicações possíveis, a Corte toma um passo que pode não

trazer bons resultados de ordem prática”.

A opção do tribunal por transformar o caso Raposa Serra do Sol em um

caso paradigmático, cuja decisão repercutiria para outros processos de

180

demarcação, faz com que o Tribunal mantenha conversações sobre os

parâmetros da execução de sua decisão mesmo após a sentença, como parece

indicar a notícia de reunião do ministro presidente do STF com a Advocacia Geral

da União, a fim de discutir a possibilidade de aplicação do procedimento adotado

no caso em outras áreas de demarcação.131

A discussão sobre a execução das decisões aponta para a conclusão de

que, independentemente de se concordar ou não com a decisão do Tribunal em

cada caso, merecem ser considerados os problemas enfrentados ao se buscar

traçar uma nova política quando se permanece apenas no interior do próprio

Judiciário. O resultado dessa escolha é que os espaços de discussão que

poderiam existir em torno dessa nova política são fechados, permanecendo

restritos à discussão no próprio Judiciário.

Nesse sentido, um questionamento pode ser feito, por exemplo, face à

solução dada ao caso da fidelidade pelo STF: por que razão o Tribunal não

determinou que o Poder Legislativo, enquanto órgão democraticamente

legitimado e que goza de ampla margem de atuação, realizasse a tarefa de

definir as hipóteses de desfiliação justificada e o procedimento para garantia da

ampla defesa e do contraditório? No caso da Raposa Serra do Sol, igualmente,

parece ter sido identificada a necessidade de suprir uma demanda legislativa

sem que se considerasse a participação do próprio Legislativo.

Esses questionamentos direcionam-se a um ponto crucial no debate

sobre judicialização e ativismo, que é justamente a capacidade e a adequação da

realização de políticas pelo Judiciário. Como visto, a discussão sobre esse

aspecto só pode ser alcançada se são entendidas as peculiaridades do

procedimento de cada caso. Pode ser, por exemplo, que, no caso das

demarcações de terras indígenas, a atuação do STF seja bem sucedida,

estabelecendo um modelo de controle de políticas públicas pelo Judiciário.

De qualquer maneira, o que se conclui a partir dos casos estudados é que

a atuação do STF, antes limitada ao controle abstrato de declaração de princípios

a serem seguidos, pode estar se colocando de maneira mais propositiva no que

concerne aos desenhos das políticas públicas. Estudar esse processo a partir da

131Notícia disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo =116222&caixaBusca=N

181

perspectiva aqui proposta, interna ao processo decisório, parece ser essencial

para o controle da legitimidade do Tribunal.

VI.3 Procedimentos decisórios

VI.3.1 Atores externos: amici curiae e outros A figura do amicus curiae foi prevista, ainda que não com esta

nomenclatura, na lei que regulamentou o processo das ADI e ADC, lei 9868/99,

que, em seu art. 7º, § 2º, estabelece que “O relator, considerando a relevância

da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho

irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a

manifestação de outros órgãos ou entidades.” Como se percebe, os requisitos

legais para a admissão de terceiros são a relevância da matéria e a

representatividade dos postulantes. Tais requisitos são, no entanto,

interpretados de maneira muito variada a depender do Ministro relator, que é o

único que pode decidir sobre o pedido de ingresso.132

No caso da verticalização das coligações, foram admitidos como amici

curiae os partidos PMDB, PFL, PDT e PPS, além da assembléia legislativa do Rio

de Janeiro. Apenas o ingresso do PSL foi inadmitido, em razão de o pedido ter

sido formulado 15 minutos depois do início do julgamento.

Apesar de não ter sido requerida divisão de tempo para sustentação oral

dos amici curiae – o que, na visão dos Ministros poderia ser prejudicial à

dinâmica do julgamento – foi solicitado que fosse dada vista dos autos ao autor e

outros interessados e intimada a Procuradoria Geral da República. Na opinião do

Ministro Nelson Jobim, a participação dos atores externos nesse caso configurou-

se mais como um pedido de litisconsorciação do que como mero ingresso na

condição de amicus curiae.

Esse breve relato da admissão de amici curiae no caso da verticalização,

apesar de indicar o grande interesse dos partidos políticos no insucesso da

demanda promovida pela OAB, e em como esse interesse se manifesta com a

abertura da Corte à participação, não parece apontar para conclusões mais

132 Sobre os critérios de deferimento do pedido de ingresso na causa e as diferenças entre os Ministros, sendo uns mais restritivos e outros mais permissivos, ver Thais Catib De Laurentiis, A caracterização do amicus curiae à luz do Supremo Tribunal Federal, Monografia apresentada à Escola de Formação, sbdp, São Paulo, 2007. Disponível em: http://www.sbdp.org.br/arquivos/ monografia/106_Thais%20Catib%20De%20Laurentiis.pdf.

182

substantivas acerca da participação de atores externos nos casos de controle de

constitucionalidade.

A ADPF 101, sobre importação de pneus usados, é o caso mais

paradigmático dentre os escolhidos para as reflexões sobre o tema. Trata-se de

um ótimo exemplo de caso no qual o Supremo Tribunal Federal foi acessado por

inúmeros atores, em momentos diversos, trazendo demandas variadas. Na ação

proposta pelo Presidente da República, demonstraram interesse tanto

associações e empresas do setor privado, quanto atores do terceiro setor e do

próprio governo.

Os amici curiae admitidos no caso foram:

Setor privado, representando o interesse das empresas importadoras de

pneus – colocando-se, portanto, contra a pretensão aduzida na ADPF 101 – as

empresas Pneus Hauer do Brasil Ltda., Pneuback Indústria e Comércio de Pneus

Ltda., Tal Remoldagem de Pneus Ltda., BS Colway Pneus Ltda., Líder

Remoldagem e Comércio de Pneus Ltda., Ribor Importação, Exportação,

Comércio e Representações Ltda., Associação Brasileira da Indústria de Pneus

Remoldados (ABIP), Associação Brasileira do Segmento de Reforma de Pneus

(ABR); Setor privado, representando o interesse das empresas produtoras de

pneus novos – colocando-se, portanto, a favor da pretensão aduzida na ADPF

101 – a Associação Nacional da Indústria de Pneumático (ANIP);

Terceiro setor, colocando-se contra a pretensão aduzida na ADPF,

Associação e Defesa da Concorrênca Legal e dos Consumidores Brasileiros

(ADCL); Terceiro setor, colocando-se a favor da pretensão aduzida na ADPF,

Conectas Direitos Humanos, Justiça Global e Associação de Proteção do Meio

Ambiente da Cianorte (APROMAC); Setor público, também a favor da demanda

colocada, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

Renováveis (IBAMA).

Cabe ressaltar que os pedidos de ingresso na causa formulados por esses

atores foram rapidamente deferidos pela relatora do processo, Ministra Cármen

Lúcia (média de 4 dias entre o ingresso do pedido e o despacho de deferimento),

e apenas em um caso atores133 que postularam o ingresso na causa não foram

133 Tratou-se de um pedido conjunto formulado pelas seguintes empresas: Líder Remodelagem e Comércio de Pneus Ltda.; Camargo Trending Importação e Exportação Ltda.; Jabur Recapagens de Pneus Ltda.; Perfil Pneu Grade Auto Center Recapagens Ltda.; E.B.R.P – Empresa Brasileira de

183

atendidos. Nesse caso, a Ministra apontou razões formais – o pedido trazido não

trazia cópia dos atos constitutivos das empresas, entre outros documentos,

estando ausente também instrumento de procuração do representante legal134 –

para negar o acesso.

O fato de nenhum pedido ter sido negado por motivos substantivos

mostra que a Ministra relatora tem uma tendência em manter o processo aberto

à atuação de terceiros. Na maioria dos despachos, para fundamentar o

deferimento dos pedidos, a Ministra Cármen Lúcia apenas cita a descrição que o

postulante faz de si mesmo, mostrando seu interesse na causa; em alguns

casos, também analisa se a representação processual está adequada. Trata-se,

assim, de decisões muito simples, nas quais a Ministra reconhece de pronto a

legitimidade de intervenção daquele terceiro.

Em dois dos despachos, o de admissão da Pneus Hauer do Brasil Ltda.

(que foi o primeiro ator a postular seu ingresso e também o primeiro a tê-lo

deferido) e o de admissão do IBAMA, a Ministra cita decisão do Ministro Celso de

Mello em despacho que admitiu amicus curiae da ADI 2.130. Nessa decisão, o

Ministro qualifica a intervenção de terceiros como “fator de legitimação social das

decisões da Suprema Corte, enquanto Tribunal Constitucional”, afirmando ainda,

em relação à representatividade das instituições, “a possibilidade de participação

formal de entidades e de instituições que efetivamente representem os

interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e

relevantes de grupos, classes ou estratos sociais” (grifos no original).

Trata-se aqui de um alargamento da chamada representatividade

adequada, pois o Ministro entende que não apenas atores que representem

grupos, classes ou estratos sociais, mas também aqueles que representem

“interesses gerais da coletividade” podem ser admitidos no processo.

É preciso ressaltar que, no caso dos pneus, tratou-se de uma Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), que, por ser um instrumento

processual diverso da ADI e da ADC, em tese, não estaria abarcada pela

regulação da lei 9868/99, onde se coloca a possibilidade de manifestação de

terceiros. A lei 9882/99, que trata do procedimento da ADPF, não traz essa

Reciclagens de Pneus Ltda.; Renovadora Arcos Ltda. Posteriormente, a primeira empresa refez o pedido e foi admitida como amica curiae. 134 Nos termos do Código de Processo Civil, art. 36, a representação processual deve ser feita por advogado legalmente habilitado.

184

mesma possibilidade. A regulamentação da figura do terceiro interessado em

casos de declaração de inconstitucionalidade está, entretanto, no próprio Código

de Processo Civil, art. 482, § 3º, sendo este o dispositivo invocado pela Ministra

Cármen Lúcia em seus despachos de deferimento.

A Lei da ADPF (Lei nº 9.882/99) traz, entretanto, outro mecanismo

previsto pela lei da ADI: em seu art. 6º, § 1º, faculta ao relator “ouvir as partes

nos processos que ensejaram a argüição, requisitar informações adicionais,

designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão,

ou ainda, fixar data para declarações, em audiência pública, de pessoas com

experiência e autoridade na matéria.” Em outras palavras, tem-se aí a

possibilidade de realização de audiência pública – o que também ocorreu no

caso, como será exposto adiante.

Para efeitos de comparação da maneira como é tratado o acesso de

terceiros no STF, é interessante relatar o ocorrido na ADPF 54, sobre a

constitucionalidade da prática de aborto de fetos anencéfalos. Em ambos os

casos, foram tratados temas polêmicos, que afetam uma multiplicidade de

interesses: se no caso dos pneus foram colocados em relevo interesses

econômicos e políticos, neste caso da ADPF 54, são os interesses morais e

religiosos que se colocavam em questão.

Nesta, sob relatoria do Ministro Marco Aurélio, também acorreram

inúmeros pedidos de ingresso como amicus curiae. O Ministro, no entanto,

adotou solução oposta à adotada pela Ministra Cármen Lúcia: indeferiu todos os

pedidos, por entender que não cabe analogia com o instituto previsto na lei da

ADI, sendo certo que a “admissão de terceiros não implica o reconhecimento de

direito subjetivo a tanto” e “fica a critério do relator, caso entenda oportuno.”

Diante da complexidade do tema e da quantidade de atores que

manifestaram interesse em intervir, o Ministro Marco Aurélio decidiu, por outro

lado, convocar audiência pública, valendo-se do dispositivo legal acima citado.135

Assim, neste caso, os dois institutos de abertura à sociedade civil, participação

de terceiros como amicus curiae e audiência pública, parecem ter se confundido,

sendo o segundo usado como forma de abarcar as demandas do primeiro.

135 Thais Catib De Laurentiis, op. cit., p. 47-51. O Ministro convocou todas as entidades que pediram ingresso na causa e também outras, escolhidas a seu critério.

185

Como se verá adiante, não parece ter sido este o uso que foi feito da

audiência pública no caso dos pneus. Neste, a audiência foi entendida como um

momento de reflexão sobre as especificidades técnicas do assunto, sendo que o

deferimento dos pedidos de amicus curiae serviu para a apresentação das razões

jurídicas das entidades interessadas. É o que se depreende das manifestações

trazidas pelas entidades no momento de ingresso como amici curiae.136 Assim,

parece haver um sentido para a figura do amicus curiae que não

necessariamente será suprido com a realização de audiências públicas.

Essa breve comparação com a ADPF 54 mostra também que as decisões

sobre manifestação de terceiros são altamente subjetivas e estão ao exclusivo

critério do relator do caso, variando muito conforme o perfil deste. Essa falta de

uniformidade mostra a ausência de um entendimento da Corte acerca desse

novo instrumento procedimental, o que é um problema quando se pensa que

podem ser aplicados de maneira não isonômica justamente os instrumentos cujo

objetivo é conferir maior legitimidade democrática ao processo decisório no STF.

Por fim, é relevante ressaltar que a participação de terceiros não se

restringe à apresentação de manifestações como amicus curiae ou ao

pronunciamento em audiência pública. A ADPF 101 é um caso muito rico em

demandas diversas, que não necessariamente estão localizadas nesses dois

espaços de atuação. Nesse sentido, a sustentação oral no dia do julgamento

também é um mecanismo que vem sendo usado não só pelas partes, mas

também pelos terceiros interessados.

A possibilidade de sustentação oral pelos interessados é expressamente

prevista pela lei da ADPF, art. 6º, § 2º que, nesse sentido, diferencia-se da lei da

ADI, na qual não se prevê expressamente a possibilidade de sustentação oral de

terceiros. A sustentação oral por terceiros no processo de controle concentrado

de constitucionalidade é, de qualquer forma, regulamentada pelo art. 131, § 3º

do Regimento Interno do STF.

136 A manifestação da ABIP encontra-se disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms /processoAudienciaPublicaAdpf101/anexo/ADPF101ManifestacaoABIP10.pdf, a manifestação da ABR em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/processoAudienciaPublicaAdpf101/anexo/ABR_Asso ciacaoBrasileiradoSeguimentodeReformadePneus.pdf, a manifestação da ANIP em: http://sbdp .org.br/arquivos/material/421_anip.pdf, a manifestação da Conectas Direitos Humanos, da Justiça Global e da APROMAC em: http://sbdp.org.br/arquivos/material/419_amicus%20curiae %20ADPF%20101.pdf. Como se nota, os documentos encontram-se dispersos, não havendo acesso sistematizado a eles disponível no site do STF. Isso é um problema, na medida em que dificulta o acesso aos argumentos colocados pelos interessados que, ao provocarem o STF, pretendem dar visibilidade para suas causas também para a sociedade como um todo.

186

No caso, dos 7 pedidos de sustentação oral, 6 foram deferidos.137 O

pedido indeferido, formulado pela ANIP, foi apresentado, segundo a relatora,

apenas 25 minutos antes do início do julgamento, o que justificou a

impossibilidade de seu deferimento. Assim como no deferimento dos pedidos de

ingresso na causa como amicus curiae, também nos pedidos de sustentação oral,

verifica-se, portanto, uma grande abertura do processo. Foi deferido inclusive o

pedido de uma empresa, Recap Pneus Maringá, que não havia ingressado

anteriormente na causa como amicus curiae.

Além disso, outras demandas, que não de participação por meio de

apresentação de manifestações ou de sustentação oral, foram formuladas nesse

caso pelos atores intervenientes. A própria audiência pública foi uma demanda

apresentada por dois amici curiae, ABIP e ABR, ainda que, como ser verá no

tópico 2.2 adiante, a específica solicitação feita por esses autores não foi um

argumento considerado pela Ministra relatora para justificar a necessidade da

audiência.

Algumas outras demandas apresentadas chegam a causar certa

estranheza se for considerada a natureza do processo, que é de controle de

constitucionalidade concentrado. O primeiro desses pedidos foi apresentado pela

Pneus Hauer do Brasil Ltda., que, admitida como amicus curiae, requereu a

intimação do Presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica

(CADE) para participar do processo. A Ministra interpretou esse pedido como um

requerimento de admissão de mais um amicus curiae e negou a demanda por

considerar que a “admissão do amicus curiae requer adequada

representatividade, além do pedido do próprio interessado para ingressar nos

autos, nessa qualidade.”

Outro pedido surpreendente foi proposto pelo amicus curiae ABIP que,

após o início do julgamento, quando o processo se encontrava com o Ministro

Eros Grau para vistas, propôs argüição de fato novo e superveniente modificativo

da questão em debate. Em um primeiro momento, a entidade chegou até mesmo

a pedir que o feito fosse julgado prejudicado, mas repropôs a demanda, dessa 137 Não há informação cadastrada na página de acompanhamento processual sobre o deferimento dos pedidos de formulados por Pneuback Indústria e Comércio de Pneus Ltda e por Direitos Humanos, Justiça Global e APROMAC. É possível dizer, entretanto, que tais pedidos foram deferidos porque notícia do STF dá conta de que o advogado representante dessas entidades falou no dia do julgamento. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo =104530&caixaBusca=N e http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo =104520&caixaBusca=N.

187

vez pedindo permissão para argüir o suposto fato novo. Não há registro, na

página de acompanhamento processual da ADPF, da resposta dada pela Ministra

a essa demanda.

O amicus curiae ABR também propôs uma demanda atípica assim que foi

habilitada para ingresso na causa: requereu autorização para produção de

provas, o que não é um procedimento previsto para a via de controle

concentrado de constitucionalidade. O pedido foi negado pela Ministra Cármen

Lúcia, sob o argumento de que a fase probatória seria incabível na ADPF porque

a lei que regula esse processo estabelece que a petição inicial deverá conter “a

prova da violação de preceito fundamental” (art. 3º, inciso III), sendo que a

ausência dessa prova é motivo para indeferimento liminar da petição. Assim, o

raciocínio é de que, se a petição foi aceita, é porque a prova já foi

adequadamente produzida. É interessante notar, entretanto, que é justamente

para a discussão da “prova da violação” que se convocou a audiência pública

com especialistas no tema, como se verá adiante.

Outra dessas demandas “inusitadas” foi proposta por empresa, Bética

Indústria e Comércio de Pneus, que não havia se habilitado como amicus curiae

no caso. A empresa requereu, juntamente com a BS Colway Pneus Ltda. – esta,

sim, habilitada como terceira interessada no processo –, que fossem declaradas

válidas as licenças de importação de pneus que possuíam antes do julgamento

do caso (os pedidos foram feitos quase um ano depois de ter sido encerrado o

julgamento). A Min. Relatora não conheceu desses pedidos, mas a íntegra dessas

decisões não está disponível, não sendo possível aferir a fundamentação usada.

Por fim, outra empresa, RIBOR – Importação, Exportação, Comércio e

Representação Ltda., decidiu também inovar ao propor embargos de declaração

da decisão tomada no julgamento final. A empresa constava no processo

também como amicus curiae. Os embargos também não foram conhecidos pela

relatora, em razão de dois fundamentos: em primeiro lugar, por não serem

cabíveis recursos propostos por terceiros (“A jurisprudência deste Supremo

Tribunal está consolidada no sentido do não-cabimento de recursos interpostos

por terceiros não integrantes da relação processual nos processos objetivos de

controle de constitucionalidade na qualidade de partes”), em segundo lugar, por

ser o recurso extemporâneo, uma vez que o acórdão ainda não foi juntado aos

188

autos (sobre as questões que envolvem a demora de publicação desse acórdão,

ver o tópico 1.3. acima).

Todas essas demandas podem ser consideradas atípicas em um processo

de controle de constitucionalidade. O fato de terem sido apresentadas no STF

pode ser um indício de que a grande abertura do processo estimula os atores a

proporem inovações – que, na prática, sempre podem ser acolhidas pelos

Ministros, a depender de sua possível fundamentação jurídica. No caso em

estudo, entretanto, não houve esse acolhimento, o que pode ser explicado, em

parte, por se tratarem de demandas realmente inusitadas, que dificilmente

poderiam ser fundamentadas em bases legais.

Ainda em relação à participação de atores externos, o caso Raposa

Serra do Sol apresenta algumas questões interessantes. Posteriormente ao

encerramento da fase de instrução do processo, vários atores ingressaram com

pedidos de litisconsórcio e assistência perante o Tribunal. A FUNAI requereu

ingresso na qualidade de juridicamente interessada, o Estado de Roraima

requereu ingresso como litisconsórcio ativo necessário. Também postularam

ingresso na lide os produtores rurais afetados pela demarcação e as

Comunidades Indígenas Barro e Socó (fls. 249-52). Esses pedidos são relevantes

para mostrar (i) as tentativas de acesso ao Tribunal, (ii) como o Tribunal recebe

as pretensões de múltiplos atores e (iii) a exata configuração dos pedidos da

demanda, questão central para determinar se o Tribunal excedeu ou não o que

lhe foi demandado ao proferir a decisão. Em última análise, a questão envolve a

relação conflituosa entre novas técnicas e procedimentos decisórios adotados

pelo Tribunal e a disciplina processual clássica adotada.

O Min. Carlos Britto traz esses pedidos a plenário, em questão de ordem,

para que se decida sobre como incorporar esses novos atores e o material que

trazem ao processo. Embora tenham solicitado ingresso no processo após o

encerramento da fase de instrução, o ministro relator despachou a inclusão dos

documentos relevantes ao processo e convocou as partes para manifestarem-se

sobre eles (fls. 343-4). Após essas medidas, o ministro relator encaminha a

discussão ao plenário por meio de questão de ordem. Ao admitir os atores como

assistentes simples, o tribunal deixa claro que, segundo a disciplina processual

atinente a tal posição, eles não poderiam reabrir a fase de instrução ou formular

novas demandas (fls. 345-54).

189

No entanto, os ministros se questionam se os inúmeros documentos e

argumentos trazidos pelos peticionários realmente não acabam por inovar a lide.

Essa questão será retomada, de forma substantiva, no momento de análise da

técnica decisória utilizada pelo Tribunal, para avaliar se o tribunal estaria

decidindo de forma extra-petita.

No caso Raposa Serra do Sol, não houve a realização de audiências

públicas, tampouco o ingresso de amici curiae, em razão de não se tratar de

controle concentrado de constitucionalidade, mas de ação popular. Entretanto,

cabe notar que, conforme consta no acompanhamento processual e nas notícias

envolvendo o caso, inúmeros atores manifestaram-se em reuniões com o

ministro presidente e através de petições e moções de apoio endereçadas ao

tribunal. Essas vias constituiriam modos de incidência extra-processuais.

A par de receber esses atores, o STF também adotou uma postura ativa

nesse contato, por exemplo, com a visita de alguns ministros à área da Raposa

Serra do Sol. O Min. Gilmar Mendes em seu voto faz uma breve avaliação dessa

visita à região, o que indica que também essa seria uma forma de aproximação e

cognição do caso além dos limites do processo. Ou ainda, o Min. Menezes Direito

quando realiza solicitação à FUNAI para que produzisse um mapa da região, que

foi incorporado ao processo como parte de seu voto, e que serviu de base para a

sua fundamentação acerca dos limites da demarcação da terra indígena, ao rever

a teoria dos círculos concêntricos, desenvolvida pelo Min. Nelson Jobim, e

apresentar a proposta do seu método de avaliação do fato indígena.

VI.3.2 Audiência pública: organização e possível impacto A segunda audiência pública da história do Supremo Tribunal Federal foi

realizada na ADPF 101, no dia 27 de junho de 2008, para a discussão da

constitucionalidade da proibição de importação de pneus usados. A primeira, em

24 de abril de 2007, havia ocorrido na ADI 3510, que questionou a

constitucionalidade da Lei de Biossegurança. A audiência pública é um

instrumento procedimental previsto nas leis que regulamentam a ADI (art. 9º, §

1º) e a ADPF (art. 6º, § 1º), e é voltada a ouvir declarações “de pessoas com

experiência e autoridade na matéria”.

Novamente aqui, há diferença em relação à regulamentação dada pela lei

da ADI e pela lei da APDF ao instituto. Enquanto a lei da ADI prevê que os casos

190

de audiência pública serão convocados “em caso de necessidade de

esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência

das informações existentes nos autos”, a lei da ADPF não prevê esse mesmo

requisito, deixando a convocação da audiência a critério do relator, “se entender

necessário”.

No caso dos pneus, a Ministra relatora elencou dois fundamentos

principais para convocar a audiência pública. Em primeiro lugar, para

fundamentar a “repercussão social, econômica e jurídica” da matéria em

discussão, evoca o grande número de pedidos de ingresso na causa como amicus

curiae. Além disso, aproximando-se da disciplina da lei da ADI, ressalta o caráter

técnico da audiência pública, ao afirmar que “questões técnicas sobre a

importação dos pneus e a forma de tal providência ser adotada ou afastada, nos

termos da legislação vigente, impõe, para maior compreensão das questões

postas, audiência de especialistas”.

Assim, é possível dizer que a Ministra considerou esse instrumento

decisório relevante não apenas para aumentar a representatividade da decisão,

ou sua “legitimação social” – tal como o instituto do amicus curiae – mas

também como maneira de esclarecer pontos técnicos relevantes para o próprio

entendimento da matéria. Como aponta Rafael Scavone Bellem de Lima, em

estudo sobre a audiência ocorrida no caso da Lei de Biossegurança138, trata-se de

duas visões diversas sobre o instituto, o que pode implicar em uso diferente

deste. Se o intuito é ter esclarecimentos técnicos, então a divisão binária dos

participantes em grupos a favor e contra a demanda apresentada talvez não seja

a melhor alternativa, pois induz a organização estratégica dos grupos pode

“estimular a exposição de argumentos técnicos que sustentem uma alternativa

de decisão em detrimento do esclarecimento das diversas questões técnicas

envolvidas em um caso”.139

É relevante notar que, até 2009, quando entrou em vigor a Emenda

Regimental 29, incluindo no Regimento Interno do STF a regulamentação do

138 Rafael Scavone Bellem de Lima, A Audiência Pública realizada na ADI 3510-0: A organização e o aproveitamento da primeira audiência pública da história do Supremo Tribunal Federal, Monografia apresentada à Escola de Formação, sbdp, São Paulo, 2008. Disponível em: http://www.sbdp.org.br/arquivos/monografia/125_rafael.pdf 139 Op.cit., p. 26-28. É interessante notar que, no caso da Lei de Biossegurança, o relator quis enfatizar que as regras de organização da audiência tinham como objetivo justamente evitar a contraposição de ideias, não se tratando, portanto, de um debate com contraditório estabelecido (p. 29). Evidencia-se, portanto, a dúvida sobre a utilidade da divisão binária dos participantes.

191

procedimento da audiência pública140, este era ordenado a exclusivo critério dos

relatores do caso. Se, na audiência da Lei de Biossegurança, o relator

determinou que os sujeitos processuais – autor, requeridos e interessados –

indicassem os especialistas que iriam se pronunciar, no caso dos pneus, a

relatora optou por facultar apenas aos amici curiae a indicação de especialistas.

É certo, entretanto, que ainda tenha sido essa a diretiva no despacho que

determinou a realização da audiência, a Ministra Cármen Lúcia facultou

posteriormente a participação de especialistas indicados pelo Presidente da

República.

Assim, pode-se dizer que a primeira e a segunda audiências tiveram

critérios similares de convocação e seleção de especialistas que iriam se

pronunciar. Em ambos os casos, foi solicitado aos atores processuais que

indicassem especialistas, estes não foram simplesmente designados pelo relator,

ao contrário do ocorrido na audiência pública na ADPF 54, sobre o aborto de

fetos anencéfalos, mencionada no tópico 2.1 acima. Isso mostra que, assim

como na seleção de amicus curiae, também na seleção de especialistas

participantes de audiências públicas tem grande peso a subjetividade do relator

no estabelecimento de critérios.141

Também é completamente discricionária a decisão de quanto tempo terá

a cada participante e qual será a duração da audiência pública.142 No caso da

APDF 101, a Ministra Cármen Lúcia determinou que a audiência fosse realizada

em apenas um dia, o que impossibilitou a participação dos 20 especialistas

140 Art. 154. Parágrafo único. A audiência prevista no inciso III observará o seguinte procedimento: I – o despacho que a convocar será amplamente divulgado e fixará prazo para a indicação das pessoas a serem ouvidas; II – havendo defensores e opositores relativamente à matéria objeto da audiência, será garantida a participação das diversas correntes de opinião; III – caberá ao Ministro que presidir a audiência pública selecionar as pessoas que serão ouvidas, divulgar a lista dos habilitados, determinando a ordem dos trabalhos e fixando o tempo que cada um disporá para se manifestar; IV – o depoente deverá limitar-se ao tema ou questão em debate; V – a audiência pública será transmitida pela TV Justiça e pela Rádio Justiça; VI – os trabalhos da audiência pública serão registrados e juntados aos autos do processo, quando for o caso, ou arquivados no âmbito da Presidência; VII – os casos omissos serão resolvidos pelo Ministro que convocar a audiência. 141 A regulamentação do procedimento da audiência pública no RISTF não solucionou esse problema, pois designa ao relator a faculdade de seleção das pessoas a serem ouvidas, sem maiores especificações (art. 154, III). Isso significa que pode haver uma seleção tanto entre especialistas previamente indicados quanto entre especialistas em geral, escolhidos pelo conhecimento pessoal de cada Ministro. 142 Também neste aspecto a regulamentação feita pelo RISTF não criou critérios mais delimitados, estabelecendo apenas que “será garantida a participação das diversas correntes de opinião” (art. 154, II) e que cabe ao relator fixar “o tempo que cada um disporá para se manifestar” (inc. III).

192

indicados, sendo que apenas 11 (2 deles dividindo o tempo de 20 minutos dado

a cada participante) efetivamente participaram. Não é possível aferir se o critério

do sorteio em caso de inexistência de consenso entre os participantes de cada

grupo –critério estabelecido pela Ministra no despacho que determinou a

realização da audiência – foi efetivamente cumprido.143

Das entidades que indicaram especialistas144, apenas uma, a ANIP, não

foi contemplada com a participação de nenhum de seus representantes. Uma

questão interessante refere-se à qualificação dos especialistas participantes. O

intuito da audiência foi o de ouvir esclarecimentos técnicos, não sustentações

jurídicas sobre o tema.145 No entanto, pelo menos dois participantes,

representantes da ABR e da Pneuback Indústria e Comércio Ltda. – um deles se

qualificou como advogado ambientalista e o outro como mestre em gestão

ambiental146 – eram também advogados que fizeram sustentação oral no dia do

julgamento.

Outra questão relevante na realização da audiência pública nesse caso

refere-se à divulgação da decisão que determinou a realização da audiência. É

por meio desta decisão que os envolvidos puderam saber do evento e da

necessidade de indicação de especialistas participantes. Para esta indicação, foi

inclusive estabelecido um prazo, até 20 de junho de 2008, ou 7 dias antes da

audiência. A decisão que determinou a realização data de 9 de junho de 2008.

Ela foi cadastrada no andamento processual da ação, no entanto, apenas em 17

de junho, tendo sido publicada no Diário de Justiça apenas no dia 19 deste mês.

143 As transcrições dessa audiência pública não foram disponibilizadas no site do STF, o que limita a coleta de dados. 144 Houve indicação de especialistas por parte do Presidente da República; do IBAMA; da ABIP; da ABR; da ANIP; da BS Colway Ltda. e Pneus Hauer do Brasil Ltda.; da Conectas Direitos Humanos, Justiça Global e APROMAC; da Pneuback Indústria e Comérico Ltda.; e da Tal Remoldagem de Pneus Ltda. 145 Isso fica claro em esclarecimento dado pelo próprio gabinete da Ministra Cármen Lúcia a indagação feita pela representante da ANIP sobre o sentido do termo especialista: “O sentido da palavra especialista é a que consta da Lei n. 9.882/99 (art. 6º, § 1º), sendo óbvio que audiência pública não é espaço nem promove o momento para sustentação oral jurídica: é a oportunidade para especialistas da área defenderem as teses de que cuida a ação. (...)Como antes ponderado, a menos que se cuide de advogado especialista (não no processo, mas na matéria cuidada), o que se requer é a indicação de especialista no tema debatido e não na defesa da tese judicialmente discutida.”. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/processoAudienciaPublica Adpf101/anexo/ADPF101Consulta1.htm. 146 Conforme notícia do site do STF. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/ verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=92494&caixaBusca=N.

193

No dia 20, uma associação, ADCL, e uma empresa, Líder Remoldagem e

Comércio de Pneus Ltda., que até então não figuravam nos autos como

interessadas, fizeram pedido de ingresso na causa, inclusive para manifestação

em audiência pública. Os pedidos para ingresso como amicus foram deferidos,

mas os pedidos para manifestação em audiência foram, entretanto, indeferidos

por serem considerados intempestivos. Não está claro o fundamento da

intempestividade, vez que as petições foram protocoladas no último dia do prazo

estabelecido pela relatora, sendo que outros atores, que já figuravam na causa –

o Presidente da República, argüente, e a ABIP, amicus curiae – também

apresentara a indicação de participantes da audiência apenas no último dia do

prazo, e puderam participar normalmente da audiência.

É possível que o indeferimento em relação àquelas duas primeiras

entidades tenha se dado porque elas apenas apresentaram o pedido de

manifestação na audiência, sem indicação dos especialistas que participariam. No

entanto, deve-se considerar que a publicação da decisão no Diário de Justiça se

deu apenas no dia 19, sendo que o prazo para indicação de especialistas

terminava no dia 20. Assim, parecem ter sido prejudicadas aquelas entidades

que ainda não estavam inseridas no processo, o que mostra certo fechamento da

audiência pública à participação da sociedade como um todo, restringindo-a aos

sujeitos processuais.

Por fim, ainda em relação à audiência pública realizada na ADPF 101,

algumas palavras sobre o impacto que esse instrumento procedimental teve na

decisão final dos ministros. Como já ressaltado no tópico 1.3, o acórdão desse

julgamento ainda não foi publicado, não sendo possível ter acesso à versão

definitiva dos votos. No entanto, nas versões disponíveis – votos da relatora

Ministra Cármen Lúcia, do Ministro Gilmar Mendes, do Ministro Marco Aurélio e

do Ministro Eros Grau –, é possível perceber que apenas no voto da relatora

questões colocadas durante a audiência pública tiveram um impacto mais

explícito.

Além da relatora, também o Ministro Gilmar Mendes, dentre os votos

disponíveis, cita a realização de audiência pública, mas apenas para informar a

sua realização. Sabe-se que, além da Ministra relatora, os Ministros Ricardo

Lewandowski e Carlos Ayres Britto estiveram presentes durante momentos da

194

audiência147, mas não há notícias sobre a participação de outros. Isso é um

indício de que, se há influência dos debates travados na audiência pública na

discussão e deliberação em Plenário, esta ocorre apenas por meio do voto do

relator.

A Ministra procura deixar claro, em seu relatório, o nível de abertura do

processo à participação de atores externos, revelando que, além da audiência

pública, ocorreram “ainda, aproximadamente vinte audiências no Gabinete com

interessados, representantes do Argüente e dos Argüidos e membros da

sociedade ou de seus representantes políticos aportando subsídios ou

informações sobre a matéria” (p. 12). Além disso, volta a mencionar os

fundamentos de realização da audiência: “A especificidade e a repercussão que

abrangem o tema, somadas à necessidade de um exame mais acurado das

razões e dos fundamentos veiculados na presente ação e melhor compreensão

das questões aqui envolvidas” (p. 34).

Em seu voto, a Ministra Cármen Lúcia chega a citar expressamente um

argumento trazido pelos especialistas ouvidos na audiência pública como

fundamento do raciocínio que está colocando. Para refutar o argumento –

colocado por empresas interessadas na revogação da proibição de importação de

pneus – de que as empresas que reformam pneus dependeriam de matéria-

prima importada por não haver matéria-prima de qualidade no Brasil (em razão

do mau estado das rodovias brasileiras), coloca um dado trazido pelos

especialistas, segundo o qual de 30% a 40% dos pneus usados importados

seriam inservíveis para remoldagem, já que não há classificação prévia à

importação. Ou seja, grande parte do contingente importado seria propriamente

lix. Assim, a Ministra afirma que, como colocado pelo argüente da APDF, a

violação aos preceitos fundamentais da saúde e da proteção ao meio-ambiente

ocorre pelas decisões que permitem as importações, e não o contrário.148

147 De acordo com o informado pela seção de notícias do STF. Disponível em: http://www .stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=104387&caixaBusca=N e http://www.stf. jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=92427&caixaBusca=N 148 “Os Interessados insistem em que o que os leva a demandar a permissão para continuar a importação de pneus usados é a má qualidade das rodovias brasileiras, que deterioram bastante os pneus a serem remoldados. Na audiência pública realizada pelo Supremo Tribunal, especialistas informaram que os pneus usados importados não são previamente classificados antes da importação, havendo resíduo da ordem de 30% a 40% nos contêineres, que são simplesmente passivo ambiental, inservível para remoldagem. Isso apenas reforça a conclusão de afronta aos preceitos fundamentais relativos à saúde e ao meio ambiente. Ao contrário do que sustentam eles, as decisões judiciais que autorizaram as importações de pneus usados é que afrontam o art. 170 da Constituição brasileira, pois o material refugado agride o meio ambiente, causa impacto

195

Ademais, a Ministra dedica mais de 20 páginas do voto a um tópico

denominado “O pneu”, no qual discute minuciosamente a origem e constituição

do objeto, a utilização do pneu pela indústria automobilística e – o que parece

ser mais importante para a argumentação desenvolvida – os procedimentos de

reciclagem disponíveis. Neste tópico, conclui que o pneu possui grande impacto

ambiental, já que não existe nenhum método de reciclagem que exclua

consideráveis custos ambientais.

É interessante notar que, nesta exposição puramente técnica, a Ministra

deixa de citar especialistas que efetivamente participaram da audiência, apesar

de citar muitos dados técnicos e outros experts149. Não se descarta a

possibilidade de que a Ministra tenha tido acesso a esses dados na própria

audiência pública, ou ainda nas audiências reservadas que teve em gabinete. De

qualquer maneira, o modo como foi construído o voto, havendo grande destaque

para a discussão técnica, mostra que essa discussão provocou um impacto, se

não na formação do entendimento da Ministra sobre o tema, pelo menos na

fundamentação por ela usada para embasar, e legitimar, esse entendimento. O

caso dos pneus, com todas as peculiaridades acima detalhadas, é, assim, uma

boa ilustração das estratégias disponíveis à Corte Constitucional para processar

temas polêmicos e altamente técnicos, e legitimar as decisões tomadas sobre

estes.

Esse caso, em comparação com os outros em que ocorreu audiência

pública, também pode mostrar que cada audiência realizada no STF pode ser

considerada como um exemplo particular de interação, pois fatores como

convocação da audiência pública, atores participantes, interação do STF com os

argumentos recebidos na audiência e nos amici curiae se deram de forma

ambiental, contrariando o disposto no inciso VI do art. 170, bem como aos arts. 196 e 225, especialmente. Ademais, essa transferência de material inutilizável representa, por si só, afronta ao disposto na Convenção da Basiléia, da qual o Brasil é signatário.” (p. 136-137) 149 São citados, dentre outros, dados do Departamento Nacional de Trânsito – Denatran (p. 79), a obra BEUKERING, P. J. H.; JANSSEN, M. A. Trade and recycling of used tyres in Western and Eastern Europe. Resources, Conservation and Recycling, Netherlands, v. 33, 2001 (p. 80), dados da Organisation Internationale dês Constructeurs d’Automobiles – Oica (p. 80), artigo publicado pela Confagri - Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal (p. 86), estudos do Centro de Divulgação Científica e Cultural da Universidade de São Paulo e da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darci Ribeiro (p. 88), estudos do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana – Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz e outros (p. 89), estudos da Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho – Fundacentro (p. 94), estudos realizados pelos “Drs. Salvador Massano Cardoso e Carlos Ramalheira, professores do Instituto de Higiene e Medicina Social, da Faculdade de Medicina de Coimbra, Portugal” (p. 97)

196

completamente diferente. Em parte, como reflexo do próprio desenho

institucional, que depende nos dois casos, em boa medida, do ministro relator.

VI.3.3 Tempo de tramitação: diferenças que chamam a atenção Apenas para concluir este capítulo, há espaço para uma consideração

acerca da questão do tempo de processamento e julgamento das ADIs 875,

1.987, 2.727 e 3.243, que constituem o caso do Fundo de Participação dos

Estados (FPE). Como essa pesquisa demonstra, há em geral uma altíssima

incidência de casos não decididos no STF, boa parte deles resolvidos pelo decurso

do tempo, pela perda do objeto ou pela consolidação fática da situação jurídica

atacada. Por outro lado, há uma seletividade manifesta em determinados casos,

o que é fruto do processo pouco transparente de construção da pauta do

Tribunal. Nesse contexto, a não decisão ou a demora em decidir, assim como a

decisão rapidamente proferida, certamente representam uma técnica de

tratamento dos casos que não pode ser desconsiderada.

Na interação entre o Judiciário e o Legislativo, essa questão do tempo

processual ganha maior complexidade, afinal, como exigir do Congresso que

aprove uma matéria tão complexa no prazo de dois anos se a própria Corte

demorou oito anos para julgar a matéria a partir de sua inclusão em pauta? Essa

questão é explicitamente levantada pelo Min. Eros Grau em seu voto: “Por outro

lado, acho que o apelo que a Corte poderia fazer ao Legislativo também poderia

resultar num apelo a si próprio. Porque esses dois processos estão incluídos em

pauta há oito anos. De modo que é difícil cobrarmos do Legislativo com a

dificuldade que nós temos para julgar aqui.” (ADI 875, fl. 295).

Por outro lado, como procura ressaltar o Min. Gilmar Mendes, a demora

em julgar, no caso, permitiu à Corte a adoção de uma nova técnica decisória,

ancorada no recente desenvolvimento de sua jurisprudência. Portanto, a

dificuldade no julgamento dos casos relativos ao FPE com base na jurisprudência

tradicional, cuja técnica decisória se mostrava ineficaz para lidar com as

situações de omissão parcial, estaria na raiz da demora de seu julgamento: “Se

nós julgássemos procedente na tradição, envolveria a cassação, e esse é um

caso típico de que o ato normativo não pode ser simplesmente eliminado” (ADI

875, fls. 295-296).

197

Assim, longe de expressar um simples indicador de ineficiência ou

morosidade, a manipulação, por nada menos que 17 (dezessete) anos, do tempo

de processamento da questão expressa a dificuldade na relação da Corte com os

demais poderes, com o reconhecimento implícito de seus limites nessa relação e

a consequente necessidade de transformação permanente de sua jurisprudência.

Neste ponto, é interessante fazer um contraponto com o caso da

verticalização das coligações. No julgamento da ADI, o relator Ministro Gilmar

Mendes adotou o trâmite do art. 12 da Lei nº 9868/99150, sendo que o tempo de

julgamento deste caso foi realmente fora do comum: a ADI foi proposta pela

OAB e distribuída para no dia 09 de março, um dia após a edição da EC 52, e foi

julgada pelo plenário do STF em 23 de marco, a apenas 14 dias de sua

distribuição.

Se o longo tempo de julgamento do caso do FPE mostra a dificuldade da

relação entre STF e Legislativo para a solução de uma omissão legislativa sobre

uma delicada questão federativa, o caso da verticalização mostra, por outro lado,

que a relação pode ser bem direta, com o STF assumindo o papel de um órgão

de respostas rápidas quando se trata de derrubar medidas legislativas tomadas

em contrariedade a entendimento jurisprudencial estabelecido. Nessa

diferenciação de tratamentos, parece ter papel decisivo a temática em questão.

VII. Considerações finais O objetivo do presente trabalho foi o de levantar dados e produzir

informações que pudessem lançar luz e conferir maior respaldo ao debate acerca

da “judicialização da política”. A escolha do controle de constitucionalidade

exercido pelo Supremo Tribunal Federal como objeto de observação privilegiado

para investigar a interação entre Poderes pode contribuir para uma reflexão mais

aprofundada acerca da real extensão da ideia de que o Brasil se insere em um

contexto de “desequilíbrio” ou “protagonismo” do Poder Judiciário (sobre os

demais Poderes) na definição de questões políticas de importância nacional. No

presente capítulo, buscou-se fazer um apanhado geral dos resultados e

informações mais relevantes apresentadas ao longo da pesquisa.

150 Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

198

Como visto, essa interação entre STF (Poder Judiciário) e os Poderes

Legislativo e Executivo federais pode ocorrer em dois momentos distintos. O

primeiro deles é com o chamado controle preventivo de constitucionalidade, ou

seja, que se dá durante o processo legislativo, antes da edição do ato pelo Poder

competente. Verificou-se que essa forma de controle é admitido pelo STF, ainda

que não haja previsão expressa na Constituição. Esse tipo de controle é

restringido, contudo, pelo entendimento de que apenas parlamentares têm

legitimidade ativa para propor mandados de segurança que servem a tal

controle. O levantamento aponta que o controle preventivo é buscado

essencialmente por parlamentares da minoria legislativa, que recorrem ao

Judiciário tanto para assegurar seus direitos de minoria, como, e principalmente,

para reverter judicialmente decisões tomadas pela maioria (cf. IV.2.1 e 2,

supra). A despeito disso, a baixa taxa de sucesso dessas demandas indica que o

prórpio STF não considera esse um momento oportuno para exercício do controle

judicial de constitucionalidade (cf. IV.2.4, supra).

O segundo momento de interação entre os Poderes ocorre no controle

repressivo de constitucionalidade – após a edição do ato normativo. Na presente

pesquisa, foram analisadas quantitativamente apenas ações de controle

concentrado, em que o questionamento é apresentado diretamente ao STF, sem

necessidade de esgotar das vias recursas ordinárias das instâncias inferiores. A

Constituição Federal fez uma escolha clara ao elaborar o rol dos legitimados para

ajuizar essas ações de controle concentrado diretamente perante o Supremo

(art. 103, da CF). A despeito da multiplicidade de legitimados, verificou-se que

os usuários mais frequentes do controle concentrado de atos do Executivo e

Legislativo federais – com larga predominância sobre os outros legitimados –

são, nessa ordem: partidos políticos com representação no Congresso Nacional;

sindicatos; e entidades de classe. Esses atores são responsáveis, juntos, por

mais de dois terços daquilo que o STF julga em matéria de controle concentrado

de atos normativos dos demais Poderes da esfera federal (cf. V.1.2, supra).

Vale ressaltar também que a categoria de sindicatos e entidades de

classe representa, em sua esmagadora maioria, profissionais (principalmente

profissionais de carreiras públicas) e, entre as entidades representativas de

setores econômicos, o setor econômico terciário (cf. gráficos 16 e 17, supra). Em

outras palavras, os legitimados da sociedade civil para a propositura de ações de

199

controle concentrado de constitucionalidade que demandam o STF representam

grupos de interesse razoavelmente homogêneos, com predominância dos

interesses corporativos de carreiras públicas e dos setores da economia terciária.

Em razão do perfil dos maiores demandantes, também podem ser melhor

compreendidos os dados relativos aos temas mais frequentemente judicializados.

Isso porque sindicatos e entidades de classe são chamados legitimados

temáticos, haja vista que, para ajuizarem uma ação, devem demonstrar (e obter

a aceitação do Tribunal) que possuem interesse direto na questão e sua

finalidade social encontra pertinência temática no questionamento da

constitucionalidade do ato impugnado (cf. V.1.1, supra). Assim, os temas mais

judicializados podem ser interpretados como uma decorrência do perfil dos

principais atores do controle concentrado de constitucionalidade, ainda que

sejam necessários maiores estudos para se confirmar essa hipótese. As

discussões predominantes são sobre seguridade social (no grupo de ações que

questionam atos originários do Legislativo e Executivo), tributário/econômico

(Executivo), eleitoral e organização partidária (Legislativo), e servidor público

(Legislativo e Executivo).

De um modo geral, a maior parcela das demandas ajuizadas no tribunal

entre 1988 e meados de 2010 parece ser composta de dois perfis principais: (i)

partidos políticos, de um lado; e (ii) sindicatos e associações de classe, de outro,

judicializando questões relativas à seguridade social, tributário/econômico,

servidor público e eleitoral/organização partidária (este, no caso dos partidos

políticos). Conforme apresentado, esses dois atores são uma constante na

história recente do tribunal, e sofreram uma espécie de inversão em uma linha

do tempo traçada para todo o período. Enquanto o volume de demandas dos

partidos políticos diminui, o das entidades de classe aumenta na passagem dos

períodos de governo FHC e Lula (cf. V.1.2, supra).

Relativamente ao desempenho do STF, a pesquisa também trouxe dados

importantes. O primeiro deles é relativo ao uso das liminares no controle

brasileiro de constitucionalidade, especialmente, no controle de atos do

Executivo federal. Até meados de 2002, os dados permitem supor que em

grande parte dos casos de controle de atos do Executivo (especificamente, de

Medidas Provisórias), não houve julgamento de mérito por conta da reação de

200

uma das partes à decisão liminar (cf. item V.2.4, supra). Isso somente evidencia

o papel relevante que a liminar desempenhou durante o período.

Aqui, duas situações podem ser invocadas para explicar esse resultado:

(i) a concessão da liminar sinalizaria ao Executivo possíveis vícios formais ou

materiais da medida provisória questionada, que, se insanáveis, induziriam a não

reedição da MP, ou, caso contrário, provocariam a reedição da MP já com as

devidas modificações; ou ainda, (ii) na hipótese de denegação da liminar, a

reação seria do demandante que, ao vislumbrar o provável insucesso na decisão

de mérito, deixaria de aditar a inicial após a reedição da MP, restando assim

prejudicada a ação, que termina extina sem julgamento de mérito.

O papel das liminares, no entanto, parece perder força a partir de 2002.

Os dados levantados a partir desse ano indicam um considerável aumento do

número de decisões de mérito no STF, e correspondente decréscimo no volume

de decisões liminares (que até então superavam as decisões de mérito). A

hipótese, aqui, também na linha de outras pesquisas realizada sobre o assunto, é

a de que o tribunal estaria fazendo uso extensivo do artigo 12, da Lei nº

9.868/99 (Lei da ADI), que permite a conversão do julgamento da liminar em

julgamento de mérito, o que, na prática, parece ter acabado com os julgamentos

de liminar (cf. item V.2.3, supra).

Como visto, poucas são as ações que tiveram algum tipo de resposta do

tribunal, o que fez com que a pesquisa se concentrasse também na produção de

dados sobre aquilo que “ficou pelo caminho”. A maior parte das ações extintas

sem julgamento de mérito o foram em razão da perda de objeto (56%), bem

como da ilegitimidade ativa ad causam (22%). O principal motivo que leva o STF

a extinguir a ação por perda de objeto é o fato de que o dispositivo impugnado

deixou de vigorar, o que pode ser explicado por uma espécie de recuo do Poder-

autor do ato questionado. O segundo motivo mais recorrente para a extinção da

ação sem julgamento do mérito é a falta de aditamento da inicial, o que muitas

vezes pode ser atribuído exclusivamente ao demandante. Aqui, a situação parece

ser a de uma espécie de desistência tácita do demandante, ante a reedição do

ato impugnado, o que implicaria que a petição inicial deveria ser emendada para

inclusão do novo ato “reeditado”, sob pena de extinção. Essas duas situações,

conforme descrito no parágrafo acima muito provavelmente têm relação com os

201

casos envolvendo medidas provisórias nos quais há concessão ou denegação da

liminar pedida (cf. V.2.6, supra).

Em que pesem as decisões definitivas de mérito, no entanto, a

sinalização do tribunal é de que os demais Poderes têm “errado” relativamente

pouco. Dentre o universo de 877 ações questinando atos do Executivo e 458

impugnando atos do Legislativo federal, poucas são as ações que culminaram

com um julgamento definitivo de mérito. O total de ações sem resposta final

envolvendo atos do Executivo e do Legislativo federais alcança os 94% e 79%,

respectivamente. Ao mesmo tempo, é baixa a quantidade de casos que atingiram

o julgamento final de mérito por parte do tribunal: 6% e 21%, respectivamente.

Além disso, outro resultado que salta aos olhos é que, dentre todas as ações

ajuizadas, em apenas 3% e 11%, houve julgamento de mérito procedente (total

ou parcialmente), com definitiva revisão do ato normativo do Executivo ou

Legislativo federais (cf. item V.2.5, supra).

De um modo geral, esses resultados parecem revelar que o STF tem se

mostrado pouco interventivo no trabalho dos Poderes Executivo e Legislativo

federais, quer porque, ao julgar o mérito, conclui que os demais Poderes

“acertaram” ao editar um ato normativo constitucional; quer porque, por alguma

razão de ordem processual, as demandas são extintas antes mesmo de serem

julgadas pelo tribunal (como parece ser o caso das “ações sem resposta”). Tanto

para ações que questionam atos originários do Legislativo quanto para ações que

questionam atos originários do Executivo, é muito baixo o número de ações que

recebem decisão de mérito do STF, mas isso se acentua neste último grupo de

ações.

Considerando que o Poder Judiciário, ao menos no âmbito do controle

concentrado de constitucionalidade visto de uma perspectiva quantitativa, se

revela pouco interventivo, pois julga inconstitucionais poucos atos normativos, é

possível que a judicialização não possa ser encontrada numericamente, mas,

sim, apenas ao se analisarem a qualidade e o teor de suas decisões. Assim, é

possível conjecturar que a importância do STF no cenário atual não decorre da

quantidade de ações que julga, mas da maneira como decide determinados casos

vinculados a temas relevantes. A construção da “relevância” ou do caráter

paradigmático de um casos pode ser explicada por inúmeros fatores, como a

gravidade do conflito, grupos de interesse envolvidos, atenção da mídia,

202

presença de muitos casos semelhantes, possibilidade de elaboração de novos

parâmetros de interpretação e aplicação do direito para sua solução. Muitos dos

casos do STF mencionados pela literatura como representativos de um fenômeno

de “judicialização da política” apresentam esses fatores, que, como se pode

perceber, conjugam aspectos internos e externos ao próprio Tribunal.

Para investigar essa questão, foi realizada a segunda parte do presente

trabalho. Nessa etapa qualitativa da pesquisa, buscou-se identificar, pela análise

de alguns acórdãos exemplificativos, qual o impacto das decisões do STF nos

demais Poderes constituídos, procurando também investigar como o Tribunal e

os ministros reagem a esse impacto e ao argumento de que sua decisão

representaria uma violação à idéia de separação dos poderes, contida na

Constituição Federal. Aqui, a análise não se limitou apenas às ações de controle

concentrado de constitucionalidade, abrangendo também outros tipos de ações,

como mandados de segurança e recursos extraordiários.

Essa pesquisa exploratória revelou uma multiplicidade de técnicas de

julgamento empregadas pelo tribunal que, ao fugir do binômio ação

procedente/improcedente, viu-se confrontado, em diversas situações, com o

argumento da separação entre poderes, sendo levado a apontar quais os freios e

limites da sua própria atuação enquanto corte constitucional.

Dessa forma, verificou-se que o Tribunal tem inovado constantemente,

criando novas técnicas (tais como a modulação de efeitos, interpretação

conforme, decisão aditiva, julgamento extra-petita etc.) e trabalhando com

procedimentos de maneira criativa. As técnicas de julgamento são determinantes

para se aferir o “nível de interferência” do Tribunal em cada caso, pois, por meio

delas, é possível se alargar ou diminuir a competência da jurisdição

constitucional (cf. item VI.2, supra).

Por fim, a pesquisa investigou figuras processuais que, em tese,

permitiriam uma abertura do STF à sociedade civil, o que, supõe-se, poderia

conferir maior respaldo e legitimidade democrática às suas decisões, que seriam

proferidas após serem ouvidos os setores da sociedade diretamente envolvidos

com a questão constitucional.

Verificou-se, contudo, que esses procedimentos decisórios são aplicados

de maneira pouco equânime, estando muito atrelados ao critério exclusivo do

relator, que possui total prerrogativa para decidir sobre o ingresso de um amicus

203

curiae, ou admissão de um palestrante em audiência pública, por exemplo.

Interessante notar também que o instituto do amicus curiae parece estar se

consolidando, muito embora seu uso pareça apontar para uma espécie de

sobrerrepresentação de alguns atores, sendo utilizado mais como segunda via de

interação com o tribunal dos mesmos atores já legitimados para a propositura de

ações de controle concentrado de constitucionalidade.

De um modo geral, essa segunda parte da análise teve o escopo principal

de apontar para um novo campo de pesquisa em direito. Muito mais do que ser

de algum modo conclusiva, a análise qualitativa levada a cabo pretende indicar

alguns elementos que devem compor a agenda de pesquisas futuras sobre o

tema da “judicialização da política”, ao menos do ponto de vista do controle de

constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal Federal, seja analisando a

forma de construção argumentativa do tribunal, seja em relação aos mecanismos

de interação do tribunal com outros poderes ou com a sociedade civil.

A análise qualitiva e crítica do próprio processo decisório do STF tem por

objetivo alimentar um debate teórico sobre a legitimação do tribunal, quando

decide casos normalmente considerados pela literatura ou pelo senso comum

como sendo exemplificativos de um fenômeno de “judicialização da política”. Por

detrás do estudo da “judicialização da política” está um debate mais fundamental

sobre a legitimidade democrática do controle judicial da produção normativa de

poderes democraticamente eleitos. E para inserir-se nesse debate, é preciso ir

além da discussão no plano dos princípios sobre “separação dos poderes” e

iniciar uma agenda de pesquisa empírica sobre desenho institucional, processo

decisório e argumentação do tribunal. Pesquisas sob este enfoque poderão

revelar as escolhas institucionais que estão sendo feitas ou que ainda serão

feitas acerca do limite de competência entre os poderes e sua interação com a

sociedade civil.

204

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