relatório anual do observatório da cidadania - 2007

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  • 8/7/2019 Relatrio Anual do Observatrio da Cidadania - 2007

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    Observatrio da Cidadania 2007 / 9

    Os sistemas de seguridade social criados ao longo do sculoXX em todo o Ocidente para proteger grupos sociais maisvulnerveis como de pessoas idosas ou incapacitadas, dentreoutros tm sido um alvo privilegiado de ataques de neoliberaisdesde o seu surgimento, ainda na dcada de 1980. As razesalegadas variam da de esa direta do interesse de instituies

    nanceiras privadas, que sempre cobiaram o volume derecursos investido no sistema, s lgrimas de crocodiloderramadas em avor das pessoas bene cirias da seguridadesocial, que pagam o custo da ine cincia e corrupo do Estado.

    Na viso neoliberal, a seguridade social deveria ser mais umsegmento do sistema nanceiro, no qual quem pode e querinveste mais para obter mais bene cios no uturo, comoocorre com qualquer outro investimento. Neoliberais ignoram(ou ocultam) deliberadamente a natureza redistributiva dosistema, essencial desde a criao do primeiro sistema amplode seguridade social nos Estados Unidos, por iniciativa dopresidente Franklin Roosevelt.

    Este ano, as ameaas, perspectivas e alternativas para tornarrealidade o direito universal seguridade social so o temada rede de organizaes da sociedade civilObservatrio da Cidadania/Social Watch e constituem o cerne desta edio dorelatrio anual.O artigo inicial da sesso In ormes Temticos,1 de CecliaAlemany, o erece um panorama da situao da seguridadesocial no mundo, a partir das anlises, in ormaes e relatriosde pases produzidos por especialistas e organizaesparticipantes da rede. Em seguida, Antonio Tricarico alerta paraos male cios do modelo proposto pelo Banco Mundial para aspolticas de promoo social, que desloca a responsabilidadepelo risco social velhice, desemprego, doena, entre outros do mbito do Estado para o indivduo.

    Aldo Calliari e Fernando J.C. Carvalho tratam de um aspectocentral dos atuais processos de privatizao da previdnciasocial: a utilizao de recursos de poupanas previdenciriaspara investimento nos undos deprivate equity e dehedge , queconduzem operaes especulativas de alto risco, no sujeitas regulamentao e sem transparncia.

    A economia mundial paralela construda pelas elites, nosujeita s normativas territoriais e excluda do pagamento deimpostos, o tema de John Christensen, coordenador da Rede

    1 Esto aqui, impressos e traduzidos, alguns dos textos dos In ormes Temticos da ediointernacional. O restante encontra-se disponvel no CD que acompanha esta publicao.

    pela Justia Fiscal. A existncia de parasos scais estimula evaso scal, reduzindo os recursos para o investimento pbNegcios secretos corroem a democracia, contribuem paradesenvolvimento de uma cultura pblica de desrespeito s leminam a capacidade dos Estados de prover servios sociais.

    O Panorama Brasileiro desta edio traz a discusso daseguridade social para o Brasil. Um dos pontos polmicospresentes neste captulo tem a ver com a prpria di culdade dquanti car as pessoas que trabalham sem proteo social no Dependendo da metodologia e do ndice escolhidos para anpossvel encontrar nmeros que variam de 32,1 milhes (DieSeade) a mais de 40 milhes (Cepal). Seja qual or a anliseconsiderada, o cenrio desolador. Por isso, cada articulistaaponta problemas, mas, principalmente, propostas para quepossamos modi c-lo em um uturo o mais prximo possve

    Snia Fleury destaca que a consagrao, na Constituio de1988, do modelo de seguridade, que abrange a previdncia,a sade e a assistncia social, introduziu a noo de direitosociais universais como parte da condio de cidadania.A autora discute as possibilidades de universalizao daseguridade social e apresenta, para tal, uma proposta deagenda. Movimentos de mulheres organizados no FrumItinerante da Previdncia Social tambm apresentam suasdemandas para a concretizao da incluso previdenciria eproteo social das mulheres.

    Evilsio Salvador investiga as ontes de nanciamento dosistema de seguridade, a alocao dos gastos e os problemaen rentados pelo sistema, derivados das politicas scaise econmicas. Alm de desmisti car o conceito de d citprevidencirio, o autor sublinha a importncia da seguridadsocial como instrumento de desenvolvimento econmico esocial, apresentando propostas para a ampliao e consoliddos direitos seguridade.

    Partindo da anlise conceitual e histrica da seguridade, IvaBoschetti discute as lgicas do seguro e da assistnciae a sua orma de incorporao pelos diversos modelos deseguridade social na Amrica Latina e no Caribe, examinanas trans ormaes so ridas com o dilvio neoliberal quevarreu a regio nas dcadas de 1980/1990. A autora trataainda da expanso de bene cios no contributivos de naturassistencial, ocalizados em situaes de extrema pobreza,que vm sendo implementados na regio para compensar aausncia de rendimentos do trabalho e as limitaes impostaos sistemas de seguridade.

    PREFCIO

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    Observatrio da Cidadania 2007 / 10

    Finalmente, Regina Novaes introduz um tema, indito noObservatrio da Cidadania (OC ): polticas para a juventude.A partir de in ormaes preliminares de uma pesquisa,ainda em andamento, sobre a juventude, realizada em seispases da Amrica do Sul, Novaes explora as ormas departicipao sociopoltica de jovens e prope a necessidade deapro undamento das refexes sobre a centralidade do debatesobre a juventude, para se pensar o uturo das sociedadesdemocrticas e alternativas para o desenvolvimento.

    H 10 anos, oOC vem publicando, no Panorama Brasileiro,anlises das politicas pblicas e seus impactos na erradicaoda pobreza e na promoo da eqidade, refetindo as agendase preocupaes das organizaes participantes da iniciativa noBrasil, no seu trabalho de monitoramento e busca de infuncia

    sobre o processo de deciso poltica. Em maio deste ano,representantes de algumas dessas organizaes reuniram-separa uma avaliao crtica dessa trajetria e para a discussodas perspectivas de trabalho.

    Para subsidiar essa avaliao, Celia Kerstenetzky e MarceloPaixo analisaram todas as contribuies publicadas desde19972 no Panorama Brasileiro. Na avaliao de ambos, essaproduo uma amostra signi cativa do pensamento dasociedade civil sobre as polticas publicas implementadas nomarco da Constituio de 1988, em um ambiente em que astmidas polticas econmicas ... contrastam com a expansiva

    democracia recm-instalada (Kerstenetzky). Entre as principaiscontribuies para o apro undamento das anlises e insumospara a ao poltica das movimentos e organizaes sociais,destaca-se a preocupao incomum com a propagaode questes tidas como duras, ligadas aos assuntosmacroeconmicos e nanceiros no seio dos movimentossociais (Paixo). As duas avaliaes contribuem positivamentepara o processo de refexo sobre polticas sociais que oOC busca estimular.

    A atualidade dos temas tratados nesta edio no poderia sermais evidente. Por outro lado, ao chegar maturidade, oOC

    no poderia deixar de se debruar sobre si mesmo para avaliarsua trajetria e de nir novos desa os. O engajamento no debatesobre as polticas para a juventude ilustra a evoluo incessanteda refexo sobre problemas e polticas sociais.

    2 Os textos completos encontram-se no CD que acompanha esta publicao.

    OC VIRTUAl

    O CD que acompanha esta publicao contm a ntegra dasedies 2007 em espanhol e ingls, incluindo relatriosde pases, ndice de Capacidades Bsicas (ICB), ndice deEqidade de Gnero (IEG) e quadros estatsticos mostrandoavanos e retrocessos dos pases em relao a diversasmetas de desenvolvimento social. A novidade deste ano uma parte especial, com todos os artigos publicados noPanorama Brasileiro desde a primeira edio.

    Fernanda Lopes de CarvaLho

    Coordenadora da edio brasileiradoObservatrio da Cidadania/Social Watch

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    A prote o das pessoas racas e vulnerveis, idosas, muitojovens e grvidas tem sido um mandato tico (e muitas vezesreligioso) de todas as sociedades humanas da histria, sem oqual a espcie n o teria sobrevivido.

    No sculo XIX, a industrializa o e a urbaniza o mudaramdramaticamente a composi o das amlias e comunidades,destruindo as ormas tradicionais de organizar essaprote o. Ao mesmo tempo, a industrializa o teve comoconseqncias uma gera o de riqueza sem precedentes,assim como desigualdade e pobreza dramticas o quelevou a lutas sociais.

    Em 1881, o conservador chanceler alem o Otto von Bismarckdeclarou ao Parlamento alem o (Reichstag)sua convic o deque a cura dos males sociais n o deve ser buscada somentena repress o aos excessos socialdemocratas, mas na mesmamedida pela promo o do bem-estar dos trabalhadores.Posteriormente, oi aprovada uma lei de seguro de sade paraa classe trabalhadora alem , em 1883, com a introdu o doseguro nacional obrigatrio para a maioria de trabalhadoresmanuais e de colarinho branco. Em 1889, oi aprovada uma leisobre a aposentadoria de trabalhadores, art ces e aprendizes.

    Era uma idia cuja hora tinha chegado e n o somente umamanobra poltica astuta de um estadista conservador parasuperar opositores polticos. Essa rmula espalhou-serapidamente pelas ronteiras geogr cas e ideolgicas.

    Em 1885, a Noruega aprovou decreto de cobertura paraacidentes de trabalho e criou um undo estatal para ajudardoentes e ornecer auxlio- uneral. O pro essor de EconomiaPblica, Ebbe Hertzberg, utilizou, pela primeira vez, o termoestado do bem-estar social (wel are state ), em 1884.

    A Dinamarca promulgou uma lei de aposentadoria em 1891.Logo depois, a Sucia desenvolveu o primeiro plano depens o nacional universal. Na Amrica Latina, Argentina,Chile e Uruguai, estabeleceram-se sistemas de bene ciossociais no incio da dcada de 1920. Nos Estados Unidos,que en rentavam o empobrecimento dramtico causado pelaGrande Depress o de 1929, o presidente Franklin Rooseveltcriou o Comit de Segurana Econ mica e incorporourecomendaes Lei de Seguridade Social de 1935. Quandoa lei entrou em vigor, em 1940, aps outra pro unda recess oem 1937, mais da metade de trabalhadores e trabalhadoras dopas era coberta por bene cios.

    Consenso universal A noo de servios sociais universais e a proteo contros riscos sociais garantida pelo Estado atingiu um consensem precedentes entre trabalhadores(as) e seus sindicatosempregadores(as), polticos(as) da esquerda e da direita elideranas religiosas. At mesmo as companhias privadasseguros apoiavam essa noo, pois no podiam azer seglucrativos para as pessoas pobres ou para trabalhadores etrabalhadoras contra os riscos mltiplos que en rentavamEm 1948, o direito seguridade social e a um padro de vida adequado oram includos na Declarao Universal Direitos Humanos (artigos 22 e 25). Esses mesmos direitoram, posteriormente, consagrados em outros instrumenchave da Organizao das Naes Unidas (ONU), como mostra a Tabe a 1.

    A Organiza o Internacional do Trabalho (OIT) de ne aseguridade social como um conjunto de instituies, medidireitos, obrigaes e trans erncias cuja meta primria garantir o acesso aos servios de sade e sociais; proversegurana de renda para ajudar a en rentar riscos importanda vida (entre eles, perda de renda por invalidez, velhice oudesemprego) e prevenir ou amenizar a pobreza.1

    Em cada pas, a prote o social uma determinada combinde duas modalidades opostas. A primeira vincula os bene recebidos pelos indivduos s contribuies que zeram apoupanas de toda uma vida geram retornos na orma deseguro contra riscos individuais ou de um plano de pens obaseado na capitaliza o individual. A segunda modalidadbaseia na solidariedade coletiva e na justia social. o casoservios sociais universais ou da assistncia social.

    As contribuies individuais na orma de impostos n o tmrela o direta com os bene cios recebidos e, na verdade, a

    maioria de bene cirios(as) vivem na pobreza e, portanto,contriburam menos. Os servios universais e a assistnciasocial s o mecanismos de distribui o que canalizam recudas pessoas que tm mais para aquelas que mais necessitamOs impostos progressivos imposto de renda, sobre a heranou sobre os ganhos do capital tm sido componente essendas polticas redistributivas.

    1 Versite da OIT: .

    APRESENTAOPor um novo contrato social global

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    E quanto aos pases pobres?

    Depois da Segunda Guerra Mundial, os gastos comseguridade social cresceram rapidamente nos trs gruposde pases industrializados, atingindo pelo menos 10% doProduto Interno Bruto (PIB) na maioria dos pases membrosda Organiza o para a Coopera o e o DesenvolvimentoEcon mico (OCDE) e, at mesmo, superando os 20% emalguns deles (Townsend, 2007).

    Nos pases em desenvolvimento, a situa o muito di erente.A maior parte dos pases de baixa renda compromete menosde 5% do PIB com os servios sociais e bene cios pblicos

    e, alguns deles, menos de 1% a 2% do PIB. No Qunia e emZmbia, a aloca o total mal atinge 0,3%. Assim, embora arendaper capita da Frana seja 30 vezes maior que a de Zmbia,o gasto pblicoper capita em Zmbia est abaixo de US$ 5 porano,mi vezes menosque na Frana.

    Em geral, a seguridade social nos pases em desenvolvimentoest limitada ao setor moderno da economia e aos(s)trabalhadores(as) do setor ormal urbano, excluindo apopula o rural e o setor in ormal a maioria da popula o.Portanto, arranjos tradicionais e in ormais de prote o socialcumprem um papel vital.

    Temos amlias e comunidades a etadas pelos mesmosriscos que os indivduos en rentam por exemplo, noscasos de seca prolongada, confitos ou pandemias comoa do HIV/Aids que n o podem contar com seguro eprote o socioecon mica quando mais precisam. Poroutro lado, as ormas tradicionais de estruturas amiliarese comunitrias est o desaparecendo em conseqncia dasmudanas socioecon micas e da crescente urbaniza o.Como nenhuma outra orma de organiza o social substitua antiga, as mulheres s o ainda mais sobrecarregadas comresponsabilidades adicionais.

    As polticas pblicas de prote o social s o uma solu o natuO Estado pode promover incentivos apropriados e exercera necessria press o para provis o de bens pblicos. Almdisso, tem obriga o legal de proteger e promover os direitossociais, econ micos e polticos. As limitaes nanceiraspodem tornar essa tare a bastante di cil. Entretanto, o Estadon o precisa depender somente de trans erncias de renda edas ormas tradicionais da seguridade social. As polticas quepromovem os meios de subsistncia e re oram os sistemasin ormais de prote o social s o igualmente undamentais pao estabelecimento de ormas e cientes de seguridade social nopases em desenvolvimento.

    TABElA 1 Direitos seguridade socia e a um padr o de vida adequado

    Autoridade Seguridade socia Padr o de vida adequado

    Declara o Universal dos Direitos Humanos (1948)

    Artigo 22 Toda pessoa, como membro da sociedade,tem direito segurana social e realiza o, pelo es oronacional, pela coopera o internacional e de acordo com aorganiza o e recursos de cada Estado, dos direitos econ -micos, sociais e culturais indispensveis sua dignidade eao livre desenvolvimento de sua personalidade.

    Artigo 25 (1) Toda pessoa tem direito a um padr o de vidacapaz de assegurar a si e a sua amlia sade e bem-estar,incluindo alimenta o, vesturio, habita o, cuidados m-dicos, servios sociais indispensveis e direito seguranaem caso de desemprego, doena, invalidez, viuvez, velhiceou outros casos de perda de meios de subsistncia emcircunstncias ora de seu controle.

    Pacto Internacional sobre os Direitos Econ micos, Sociaise Culturais (1966; entrou em vigor em 1976)

    Artigo 9 Os Estados-parte no presente pacto reconhecemo direito de todas as pessoas segurana social, incluindoos seguros sociais.

    Artigo 11 (1) Os Estados-parte no presente pacto re-conhecem o direito de todas as pessoas a um padr o devida su ciente para si e para as suas amlias, incluindoalimenta o, vesturio e alojamento su cientes, bem comoa melhoria constante das suas condies de existncia.

    Conven o sobre os Direitos da Criana (1989)

    Artigo 26 (1) Os Estados-parte reconhecer o a todas ascrianas o direito de usu ruir da seguridade social, incluin-do seguro social, e adotar o as medidas necessrias paralograr a plena consecu o desse direito, em con ormidadecom suas legislaes nacionais.

    Artigo 27 (1) Os Estados-parte reconhecem o direito detoda criana a um padr o de vida adequado ao seu desen-volvimento sico, mental, espiritual, moral e social.Artigo 27 (3) (...) e, caso necessrio, proporcionar o as-sistncia material e programas de apoio, especialmente noque diz respeito nutri o, ao vesturio e habita o.

    Fonte: Organiza o das Naes Unidas. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov.

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    A quest o saber quanto o Estado est disposto a intervirpara o erecer prote o social s pessoas vulnerveis dasociedade. Com o passar do tempo, a maior parte dos pasesem desenvolvimento estabeleceu alguma orma de sistema

    distributivo, regido por uma variedade de polticas scais.A partir de meado da dcada de 1970, no entanto, os gastossociais dos pases em desenvolvimento comeam a seratacados pelas polticas de ajuste estrutural promovidas peloBanco Mundial e pelo Fundo Monetrio Internacional (FMI). Aseguridade social oi retratada como inimiga do crescimento,do investimento estrangeiro e do esprito empreendedor. Emconseqncia, os bene cios oram reduzidos, os sistemas depens o oram privatizados e os subsdios que uncionavamcomo mecanismo de redistribui o oram desmantelados especialmente nas reas rurais n o alcanadas pela

    seguridade social convencional ou por servios pblicosessenciais. Este relatrio apresenta numerosos exemplosdesses en menos.

    Nmeros reveladores

    Em documento recente de discuss o da OIT, Peter Townsend,pro essor de Polticas Sociais Internacionais da Escola deEconomia de Londres, escreveu:

    A alegada incompatibilidade entre gastos sociais e crescimento econmico no con rmada pela experincia. A idia que teve

    muita infuncia nos ltimos trinta anos [...] de que investi-

    mentos altos em servios sociais pblicos e seguridade sodesestimulam o crescimento e que o crescimento econmem si mesmo levar reduo da pobreza, no conta coapoio de provas convincentes da pesquisa. H mais evidnem avor da idia oposta, de que elevados gastos pblna rea social tm e eitos positivos sobre o crescime(Townsend, 2007)

    Da mesma orma, uma pesquisa sobre a ndia, realizada porPatrcia Justino para o Ncleo de Pesquisa da Pobreza daUniversidade de Sussex, revelou:

    Os gastos com servios sociais podem ter um e eito possobre a reduo da pobreza e sobre o crescimento econmnuma economia pobre [...] esses resultados questionamentendimento anterior de que as polticas de seguridade soe de proteo social podem representar uma sobrecarga nceira insustentvel para as economias pobres. No caso da os gastos com servios sociais no somente contriburam pa diminuio da pobreza, como tambm criaram condiesa promoo do crescimento econmico.(Justino, 2003)

    Entretanto, con orme demonstrado neste relatrio, nasltimas duas dcadas, houve mudanas drsticas na estruturde governana da seguridade social, incluindo a privatizatotal ou parcial e a redu o de seus bene cios em muitos pem desenvolvimento e com economias em transi o.

    O debate em torno da seguridade social ocorreu em todomundo, mas um estudo do pro essor do Departamento deEconomia Aplicada da Universidade de Valencia (EspanhaCarlos Ochando Claramunt, revelou que at o momento,nenhum pas europeu [ocidental] desmantelou o estadodo bem-estar social em busca de novas maneiras de

    nanciamento, administra o e prote o que garantissemmelhores resultados em termos de e cincia, e ccia eeqidade (Claramunt, 2005).

    Ao analisar a introdu o de parcerias pblico-privadas e degest o voltadas para o mercado no sistema de sade espanhesse estudo conclui:

    At esse momento no cou demonstrado, nem ternem empiricamente, que a introduo de novos sistemde gesto tenham melhorado a e cincia dos serviossade.(Claramunt, 2005)

    A decis o de quais direitos s o garantidos e at que ponto,implica um grande debate em cada sociedade para determinquais riscos se tornam responsabilidade coletiva e por quaisbens pblicos o Estado responsvel, independentemente dsua provis o por instituies pblicas ou privadas.

    SEGURIDADE NOS PASES DESENVOlVIDOS

    A anlise da experincia dos pases desenvolvidos agrupa-osem trs categorias amplas: o modelo liberal ou residual assim chamado porque

    o Estado somente intervm em ltima instncia, como nosEstados Unidos e no Reino Unido com a contribui o maisbaixa das pessoas, porm, com patamares relativamente maisaltos de pobreza;

    o modelo corporativista da Alemanha, da ustria e,originalmente, da maioria do mundo catlico com n asena coes o social e nos acordos tripartites entre trabalha-dores(as), empregadores(as) e Estado, e com bene ciosderivados de programas cuidadosamente regulamentados,correspondendo a di erentes setores de atividades (da vindo

    a denomina o corporativista); o modelo nrdico ou socialdemocrata originrio da Es-candinvia baseado na solidariedade, em servios universais edireitos sociais, que s o prerrogativas de cada cidad o e cidadcomo tal e n o como membro de um grupo particular.

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    A provis o de servios pelo Estado e seu nanciamento porcidad os e cidad s por meio dos impostos s o elementosbsicos da rela o entre o governo e sua cidadania.Estudos demonstram que uma base ampla de contribuintes

    nanciando servios pblicos universais tem rela o diretacom democracias que uncionam, desigualdades reduzidas eerradica o da pobreza (DAC Govnet, 2007).2

    O oposto tambm verdade, sendo mais provvel encontrarregimes autoritrios que n o prestam contas e tendem corrup o nos pases com servios pblicos limitados euma base de contribuintes estreita. Nesses casos, a receitagovernamental provm de outras ontes, como indstriasextrativas ou mesmo ajuda externa, com os governos prestandocontas aos doadores, mas n o sua cidadania.

    N o coincidncia que a redu o drstica dos bene ciosda seguridade social esteja sendo di cil ou impossvel derealizar em pases com democracias que uncionam. No casodo Uruguai, por exemplo, as re ormas induzidas pelo BancoMundial oram derrotadas em re erendo e terminaram sendointroduzidas somente verses diludas do novo modelo. Issoajuda a explicar a situa o atual do pas, com os mais baixosndices de pobreza e desigualdade da Amrica Latina a regi omais desigual do mundo.

    Por outros compromissos

    No m do sculo XX, havia evidncia esmagadora de quevrias dcadas de poltica de desenvolvimento orientadas,quase exclusivamente, para o crescimento econ micon o haviam reduzido a distncia entre os pases pobrese ricos, enquanto o processo de liberaliza o comercial edesregulamenta o nanceira conhecido como globaliza oestava, na verdade, aumentando as desigualdades entre ospases e no interior deles.

    As esperanas de um dividendo da paz depois do m daGuerra Fria n o se materializaram Por isso, a ONU articulou

    nova agenda social em uma srie de con erncias mundiais. Aigualdade entre os gneros e a erradica o da pobreza oramestabelecidas como metas para a comunidade internacional,em 1995, na Con erncia Mundial sobre a Mulher, em Pequim,e na Cpula Social em Copenhague. Em 2000, a Cpula doMilnio de niu um conjunto de metas mensurveis e comprazos de implementa o para os servios sociais essenciaise a erradica o da pobreza, conhecidas como Metas deDesenvolvimento do Milnio (MDMs).

    2 GOVNET (DAC Network on Governance) (2007). Taxation and Governance. Vers o 1.2,agosto (vers o preliminar).

    Essas metas expressavam compromisso dos governos dospases pobres e ricos de atingirem um mnimo de serviossociais que tornassem possvel a dignidade para todas aspessoas. No entanto, em geral, tais metas n o s o ormulaem termos de direitos ou prerrogativas de trabalhadores(as)ou das pessoas que vivem na pobreza. Em uma tentativade reverter o declnio dos fuxos de ajuda, oi en atizada anecessidade de alcanar resultados visveis e mais imediatosassim como a e cincia na presta o de servios e naassistncia s pessoas mais pobres entre os pobres.

    As polticas ocadas diretamente nas pessoas maisnecessitadas devem permitir uma distribui o progressivados recursos e concentrar es oros e dinheiro pblico, tantonacional como internacional, nas reas geogr cas mais

    a etadas ou em grupos espec cos que vivem na pobreza(Mkandawire, 2007). As pessoas bene cirias dos serviossociais que n o estiverem inclusas em tais categorias deverem grande medida, nanciar seus servios sociais, sejapagando por eles, seja usando seguros individuais.

    A ocaliza o essencial em situaes de emergncia e,em muitos casos, a assistncia s pessoas pobres podeser concebida como situa o de emergncia. Porm,a Comiss o Econ mica para Amrica Latina e o Caribe(2006) da ONU argumenta que essa prolongada ocaliza como poltica social predominante ou mesmo nica

    ortalece a dependncia das pessoas bene cirias da ajudgovernamental. Cria uma armadilha da pobreza que solapa motiva o para o trabalho e para desenvolver suas prpricapacidades. Alm disso, estimula o clientelismo poltico ecorrup o e solapa o princpio democrtico de desenvolvercapacidades de cidad os e cidad s para que se tornem atoraut nomos na sociedade.

    Os servios para as pessoas pobres terminam sendo serviospobres, con orme a amosa declara o de Amartya Sen,ganhador do prmio Nobel de Economia em 1998. Os serviuniversais tm mecanismos embutidos por meio dos quais as

    demandas de qualidade eitas por contribuintes de classe mpuxam para cima as pessoas pobres. Tais servios tambmestabelecem uma correla o entre prote o social e inclus osocial, pois para manter polticas de prote o social universade alta qualidade, os governos precisam omentar o empregopara arrecadar os impostos e as contribuies da seguridadesocial que dele derivam.

    Porm, n o su ciente dizer que os pases emdesenvolvimento devem seguir o mesmo caminho deredistribui o e prote o social percorrido h um sculo pelpases industrializados e, agora, ricos.

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    Otto von Bismarck nem mesmo pensava em uga de capitais,porque os capitais n o podiam se deslocar e ele podiaproteger a industrializa o de seu pas com tari as. No atualmundo globalizado, a mobiliza o nacional de recursos parapolticas sociais exige um ambiente internacional avorvel,que detenha a corrida para o undo do poo de reduzirimpostos e contribuies da seguridade social das corporaestransnacionais com a nalidade de atrair investimentos.

    Os parasos scais e os centros bancrioso shore queestimulam a sonega o scal e promovem a corrup o devemser restringidos. preciso, tambm, controlar a volatilidadedos mercados nanceiros, que ora os pases pobres a manterenormes recursos congelados, na orma de reservas, no lugarde investi-los em in ra-estrutura e capital humano.

    Alm disso, deve-se prover ajuda internacional como exigidopela Declara o Universal dos Direitos Humanos , que deveser realizada de modo previsvel, gerando prerrogativas,sem repetir, em escala internacional, a mesma armadilha dapobreza e o clientelismo da assistncia nacional ocalizada.

    As concluses das organizaes cidad s publicadas no relatrio2007 doSocial Watch/Observatrio da Cidadania demonstram, de

    orma ampla e direta, como o direito humano seguridade social violado cotidianamente, da mesma orma que o erece valiosassugestes sobre como azer desse direito uma realidade.

    extremamente necessrio realizar um novo pacto socialnacional e global para equilibrar os direitos individuais e sociais,ambos universalmente reconhecidos, e equilibrar regras edisciplinas internacionais com o espao das polticas nacionais,no qual o debate democrtico molda as prioridades de cada pas.

    Uma maioria absoluta da humanidade que vive na pobreza muito jovem ou muito velha, est doente ou incapacitada,pertence identidade de gnero ou ao grupo tnico oucultural errado e so re a nega o de direitos reconhecidosuniversalmente, em um momento da histria em que riqueza econhecimento nunca oram t o abundantes. Portanto, a quest o

    n o saber se seguridade social compatvel com globaliza o,mas se a existncia civilizada globalizada possvel sem aimplementa o do direito humano universal seguridade social.

    r oberto b issio

    Secretariado Internacional doSocial Watch

    Re ernciasCLARAMUNT, Carlos Ochando. Estado del bienestar: retos y oposiciones de re orma.QPE-

    Revista eletr nica do Departamento de Economia Aplicada da Universidade de ValenValencia, n. 9, jan./abr. 2005. Disponvel em: . Acesso em: 15 nov. 2007.

    COMISSO ECONMICA PARA A AMRICA LATINA E O CARIBE.La proteccin social de cara al uturo : acceso, nanciamiento y solidaridad. Santiago do Chile: Cepal/ONU, ev. 20193p. (LC/G.2294 SES.31/3/E). Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2007

    GOVNET (DAC Network on Governance) (2007). Taxation and Governance. Vers o (vers o preliminar)

    JUSTINO, Patricia.Social security in developing countries : myth or necessity? Evidence romIndia. Brighton: Universidade de Sussex, set. 2003. (Prus Working Paper n. 20). Dispem: . Acesso em: 10 nov. 2007.

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    Seguridade socia , de direito hu ano a uxo?

    Ceci ia A e any1 *

    O termo seguridade social tem signi cados di eren-tes nas diversas regies do mundo. Nos relatriosre erentes aos pases, autores e autoras utilizamseguridade social para se re erir n o somente apenses e aposentadorias (ou seja, previdnciatradicional no sentido restrito), como tambm sade, educa o, habita o e ao emprego. Almdisso, h uma vis o ampla da seguridade socialcomo um conjunto de servios sociais e direitosque reduzem os risco sociais de indivduos ecomunidades. Como assinala o relatrio doSocial Watch da ndia, nessa perspectiva, a seguridadesocial um tema complexo e multidimensional,embora n o por isso menos urgente.

    No plano internacional, a discuss o sobreseguridade social teve como atores-chave a Or-ganiza o Internacional do Trabalho (OIT), o setorempresarial ou empregador e os sindicatos, emintera o com os organismos espec cos (minist-rios, secretarias etc.) dos governos nacionais. Em2003, a 91 Con erncia Internacional do Trabalholanou a Campanha Mundial pela Seguridade So-cial e Cobertura para Todos. A campanha refetiaum consenso entre governos, empregadores(as) etrabalhadores(as) sobre a necessidade de ampliar acobertura da seguridade social, especialmente paraas pessoas que trabalham na economia in ormal,en atizando o papel da seguridade social no desen-volvimento econmico e social dos pases.

    Quando a seguridade social oi proposta comotema para o relatrio 2007 doSocial Watch/Ob- servatrio da Cidadania , alguns membros da redeapresentaram dvidas, temendo que o assuntos osse relevante para pases desenvolvidos e derenda mdia. Seria uma preocupa o europia,mais do que de grupos de cidad os e cidad s dospases em desenvolvimento que constituem amaioria das coalizes nacionais.

    No entanto, o entusiasmo com que membrosda rede nos pases pobres participaram da elabora- o deste relatrio e a qualidade das contribuiesnacionais demonstraram que a seguridade social uma preocupa o universal.2 A enorme desi-gualdade das situaes tambm cou clara. Maisda metade da popula o mundial est excluda dequalquer tipo de prote o da seguridade sociale grande parte da outra metade somente temcobertura parcial. Estima-se que apenas uma decada cinco pessoas no mundo tenha coberturaadequada de seguridade social (Organiza oInternacional do Trabalho, 2001a).

    As instituies que integram a redeSocial Watch/Observatrio da Cidadania identi caramproblemas derivados do envelhecimento dassociedades, assim como da crescente pobreza

    in antil. Em alguns pases, como o Uruguai, os doisenmenos ocorrem simultaneamente.Embora a seguridade social esteja consagrada

    como um dos direitos humanos, os dados queaparecem em meia centena de relatrios nacionaiscompilados nesta publica o deixam claro que, naprtica, ela um luxo para poucas pessoas.

    Na Resolu o sobre a Seguridade Social da89 Con erncia Internacional do Trabalho da OIT,em julho de 2001, a quarta conclus o esclarece:

    No existe modelo idneo nico de seguri- dade social. Ela cresce e tem uma evoluo no tempo. Existem regimes de assistncia

    social, regimes universais, regimes de seguro social e sistemas pblicos ou privados. Cada sociedade deve escolher qual a melhor orma de garantir a segurana de renda e o acesso assistncia mdica. Essa escolha refetir seus valores sociais e culturais, sua histria, suas instituies e seu nvel de desenvolvimento

    econmico. A uno prioritria do Estado acilitar, promover e estender a cobertura da

    seguridade social. ( Organiza o Internacionaldo Trabalho, 2001b)

    Esses relatrios nacionais muitos deles es-critos por organizaes da cidadania preocupadascom a justia social, mas que, tradicionalmente,n o participavam do debate sobre a seguridadesocial n o somente revelam diversidade desituaes e histrias como tambm apresentamgrandes similaridades nas rmulas aplicadas nasltimas dcadas, com muita reqncia sugeridaspor instituies nanceiras internacionais, comoo Banco Mundial.

    Quest o de de ocraciaNo momento em que o debate parece tratar somen-te de como reduzir ainda mais o papel do Estado,o relatrio nacional da Somlia prope o extremooposto. Onde n o existe o Estado, poucas pessoaspodem pagar a matrcula escolar, o atendimentomdico e demais servios sociais, diante da ausn-cia de um governo central que arrecade impostose taxas e converta essas receitas em desenvolvi-mento comunitrio e bem-estar pblico.

    Em muitos pases, a discuss o sobre aseguridade social est intrinsecamente ligadaaos es oros para a constru o de um Estadodemocrtico. Assim, o artigo sobre a regi o rabesublinha que:

    a seguridade social deve ser percebida como parte de um sistema integral de estratgias po- lticas, econmicas, sociais e culturais voltadas para proteger a segurana nacional, inclusive a segurana humana e a estabilidade poltica da sociedade. A alta de liberdade impede que cidados e cidads criem sindicatos que de endam seus direitos e a seguridade social.Somente sindicatos democraticamente eleitos,as organizaes de trabalhadores(as) e asso- ciaes pro ssionais podero reivindicar uma relevante representao dos distintos grupos de interesse. Assim, poderiam de ender a criao* Secretariado doSocial Watch.

    1 Com o apoio de Daniel Ciganda e Nicole Bidegain.

    Embora a seguridade social esteja consagrada como um dos direitos humanos, na prtica, um luxo para poucas pessoas.Somente uma de cada cinco tem cobertura adequada de seguridade social no mundo. A metade da populao mundial est excluda de qualquer tipo de proteo social e grande parte da outra metade s tem cobertura parcial.

    Em uma abordagem ampla, a seguridade social se refere ao conjunto de servios sociais e direitos que reduz riscos para indivduos e comunidades. Uma cobertura universal poderia ser o resultado de polticas orientadas para o emprego e a reduodas diversas desigualdades sociais, considerada essencial para a governana e para os sistemas democrticos. Entretanto, osfatos mostram que os governos esto transferindo as responsabilidades de seguridade social para o setor privado, fora docontrole da cidadania ou, simplesmente, abandonando essas responsabilidades, desmantelando os sistemas de proteo ea proviso de servios sociais, como sade e educao.

    2 Nota da edi o: todos os textos citados neste artigo pu-blicado noObservatrio da Cidadania/Social Watch oramincludos no CD que acompanha esta publica o.

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    de um sistema adequado de seguridade social e tambm controlar a implementao desse sistema.(Samad; ZeidanOC 2007)

    Em outra situa o de colapso da autoridadeestatal, o relatrio iraquiano conclui: desde quea violncia e a crise humanitria se trans orma-ram em parte integrante da vida cotidiana [...] aseguridade social tornou-se mais essencial doque nunca. Nas recomendaes nais, propea mobiliza o da cidadania com um chamado unidade e a ado o do dilogo como nica ormade alcanar a reconcilia o nacional com base naunidade dentro da diversidade, na n o-violncia, no

    respeito aos direitos humanos e na independncianacional, e de preservar os recursos naturais dopas do desperdcio e da corrup o.

    A mesma n ase pode ser encontrada norelatrio de Mianmar:

    Mianmar uma sociedade multitnica com diversas culturas, religies e tradies. A coexis- tncia pac ca e a garantia da seguridade social para todos(as) somente podem ser asseguradas com o respeito ao direito de autodeterminao das pessoas e um sistema de governo respon- svel, transparente e descentralizado.

    Diz o grupo local doSocial Watch :

    O direito seguridade social s ser uma realidade quando a dinmica interna, a interconexo e interao entre o Estado, as organizaes da sociedade civil e as pessoas capazes refetirem melhor as urgentes neces- sidades do povo birmans.

    A necessidade de ortalecer a institucionalidadedemocrtica n o somente um tema que surge emsituaes extremas como as anteriores. Tambmocorre em democracias consolidadas como nandia, onde o direito educa o e sade n o parecerealizvel. Na prtica, o governo tenta desobrigar-sede compromissos assumidos internacionalmente.

    O apoio popular ao sistema democrtico e prpria legitimidade das instituies pode correrriscos se os grandes problemas da desigualdadee da exclus o n o orem resolvidos (Programa dasNaes Unidas para o Desenvolvimento, 2004). Oacesso in orma o e transparncia condi onecessria para ortalecer a participa o cidad .Porm, em muitos pases, o dilogo entre atorespblicos, privados e a sociedade civil aindaincipiente e en renta obstculos e preconceitospor parte dos governos.

    Nesse sentido, o relatrio marroquinomostra que o crescimento das associaes ezsurgir uma nova gera o de atores n o-gover-namentais. As relaes entre as associaes e oEstado se desenvolvem, passando da tendncia descon ana mtua ao reconhecimento de umapossvel sinergia. De todo modo, ainda neces-srio eliminar alguns obstculos que impedema participa o da sociedade civil, alm de umambiente poltico e jurdico avorvel a maiorautonomia das organizaes da sociedade civil(OSCs) bem como o aumento de sua partici-pa o na concep o, implementa o e avalia ode decises que podem ter impactos sobre ossetores mais des avorecidos da popula o.

    O relatrio da Argentina argumenta que osproblemas da integra o social s o de direitos so-ciais e polticos ligados constru o e reprodu oda cidadania. Como conseqncia, as estratgias

    de inser o social devem ter duas abordagens:por um lado, adotar o ormato de trans erncia derecursos econmicos, sociais, polticos e culturaispara ortalecer as redes sociais das pessoas atu-almente excludas, assegurando desenvolvimentoe autonomia socioeconmica e poltica; e, poroutro, assegurar ormas poltico-institucionais degoverno e de a o estatal, acessveis e abertas spre erncias e ao controle da cidadania. Trata-se,portanto, de construir condies para uma cidada-nia baseada no respeito e no apro undamento dosdireitos individuais e sociais.

    Necessidade e direitoFernando Cardim de Carvalho prope, nestrelatrio, que a solu o real do problema da desgualdade e da previdncia social seria:

    restaurar a primazia do pleno emprego comometa social, como oi nas primeiras duas dcadas aps o m da Segunda Guerra MundiaIsso evitaria muitos problemas nanceiros dosistemas de previdncia social. Tambm exista necessidade de promover amplo debate comtodos os setores da sociedade sobre as pers- pectivas do sistema de previdncia social partorn-lo socialmente justo e economicamentesustentvel. In elizmente, o clima poltico aindes avorvel para esse debate, pois as idianeoliberais sobre as virtudes do mercado con-tinuam ortes, especialmente entre os grupo

    polticos infuentes.(CarvalhoOC 2007)A seguridade social pode ser vista como

    resultado de polticas orientadas para o emprege a redu o das desigualdades e ser de endidcomo necessria para a governana e para aprpria sobrevivncia de um sistema que, na suaausncia, n o teria apoio popular. Alm dissoa seguridade social um dos direitos humanosreconhecidos no plano internacional e, portanton o somente conveniente, como tambm legamente obrigatria.

    Na Declara o de Filadl a (1944), a Conrncia da OIT reconheceu a obriga o de estend

    as medidas de seguridade social para garantirrenda bsica a todas as pessoas que necessiteme prestar atendimento mdico abrangente.3 ADeclara o Universal dos Direitos Humanoaprovada pela Assemblia Geral das NaeUnidas em 1948, a rma, em seu artigo 22, qutoda pessoa, como integrante da sociedade,tem direito seguridade social e, no artigo 25

    az re erncia expressa assistncia mdica, aservios sociais e segurana, no caso de doenaincapacidade, viuvez, velhice e desemprego, assicomo cuidados e assistncia especiais para amaternidade e a in ncia.

    O direito seguridade social tambm est

    consagrado em um nmero signi cativo de tratados de direitos humanos tanto universais comoregionais. Em sua segunda conclus o, a Resoluda 89 Con erncia Internacional do Trabalho OIT prope:

    A seguridade social muito importante para bem-estar dos trabalhadores e trabalhadoras, desuas amlias e de toda a sociedade. um direi

    3 In ormaes detalhadas em Centro Interamericano deInvestiga o e Documenta o sobre Forma o Pro ssio(Cinter or)/OIT. Ncleos de Treinamento / Projeto Segurdade Social no Cone Sul 2003-2005.

    DADOS DA SEGURIDADEmUNDIAl1

    Na maioria dos pases europeus emtransi o (da antiga Uni o Sovitica oudo Pacto de Varsvia), a cobertura oscilade 50% a 80% da popula o. Na maiorparte dos pases desenvolvidos, atingiupraticamente 100%.

    Na Amrica Latina, a cobertura varia de10% a 80% e est em ranca estagna o. Orelatrio nacional do Paraguai a rma que78,5% da popula o n o tem qualquer se-guro e somente trs de cada dez pessoasidosas recebem aposentadoria.

    No Sudeste e no Leste da sia, a co-bertura pode variar de 10% a 100% e, emgeral, est aumentando. Nos pases menosdesenvolvidos da rica Subsaariana ou dasia Meridional, mais de 90% da popula on o tem cobertura (Ginneken, 2003).

    1 Estudo realizado pela Associa o Internacionalda Seguridade Social (AISS) e pelo Centro dePesquisa de Polticas Sociais da Universidade deLoughborough, Reino Unido, sob a dire o deSimon Roberts (ver

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    humano undamental e instrumento essencial para criar coeso social. Desse modo, contribui para garantir a paz social e a integrao social.Forma parte indispensvel da poltica social dos governos e erramenta importante para evitar e diminuir a pobreza. Pela solidariedade nacional e distribuio justa do nus, pode contribuir para a dignidade humana, a eqidade e a justia social. Tambm importante para a

    integrao poltica, a participao cidad e o desenvolvimento da democracia.

    ato que aumentou o nmero de rati caesda Conven o da OIT sobre seguridade social(Somavia, 2007a). No entanto, continua sendonecessrio ortalecer esse processo, pois h pasesque ainda n o rati caram convenes essenciais.Nesse sentido, o artigo da Tanznia convoca ogoverno para rati car as convenes da OIT sobreo desemprego C2 de 1919 e C44 de 1934 ,4recomendando, energicamente, que ele cumpra aobriga o de apresentar relatrios peridicos aosorganismos de controle dos tratados para maxi-

    mizar e acilitar o cumprimento e a implementa odos tratados internacionais que garantem o direito seguridade social.

    Entretanto, muitos governos que rati caramessas convenes est o trans erindo respon-sabilidades relativas seguridade social para osetor privado, ora do controle da cidadania, ousimplesmente abandonando e desmantelando ossistemas de seguridade social e a provis o de ser-vios sociais, como sade e educa o. O relatriode Zmbia, por exemplo, resume os compromissosassumidos, as estruturas governamentais e osinstrumentos de polticas que oram ormuladospara a seguridade social. Porm, alerta que n o hmecanismos que assegurem a implementa o dodireito seguridade social, tornando esse direitouma ilus o para a maioria das pessoas no pas.

    Em outro artigo deste relatrio, ChristianCourtis desenvolve um relato jurisprudencial,mostrando como um nmero n o desprezvel deaspectos do direito seguridade social utilizadopor tribunais e rg os internacionais de direitoshumanos, por sua interconex o com outros direi-tos e princpios.

    As experincias nacionais demonstramque o direito seguridade social, ou melhor,os direitos derivados de regimes de seguridadesocial, juntamente com os direitos trabalhistas,constituem reas nas quais a experincia deaes legais est rmemente consolidada emmbito local, tanto em pases desenvolvidos comonos em desenvolvimento. No entanto, ainda s olimitadas as perspectivas de recorrer a sistemaslegais para azer cumprir diretamente esse direitono plano internacional.

    Setor in or a : se prote oO relatrio da Romnia a rma que o setor in ormalcresceu de modo signi cativo. Como conseqn-cia, embora a totalidade da ora de trabalhoestivesse coberta pelos sistemas pblicos de segu-ridade social e representa o sindical, atualmente,um nmero alto de trabalhadores e trabalhadorasest sem prote o. Na ora de trabalho ativa dequase 10 milhes, estima-se que 1,2 milh o detrabalhadores e trabalhadoras estejam empregadosno setor in ormal n o-agrcola e, de acordo comestimativas o ciais, a ci ra total incluindo o setoragrcola muito mais alta.

    Por seu lado, o relatrio do Brasil assinalaque muitas pessoas que passaram grande partede suas vidas em atividade no mercado in ormalde trabalho, especialmente em atividades urbanas,s o duplamente prejudicadas pela exigncia decontribui o individual ao sistema de previdnciasocial. Depois de ter contribudo para a riquezado pas com custos baixos, essas pessoas n os o cobertas pelo Instituto Nacional do SeguroSocial (INSS) e, sem terem pago pelo seguro-desemprego, tambm n o podem exercer seusdireitos trabalhistas. Na velhice, essas pessoasser o a etadas uma vez mais por n o poderemdes rutar do direito previdncia social.

    Muito j oi escrito sobre a economia in ormalou n o-organizada dos setores mais des avoreci-dos. Existe, porm, outra economia n o-regula-mentada de grande escala. Essa avorecida se-gundo artigo de John Christensen neste relatrio por uma in ra-estrutura habilitadora de bancos,

    rmas jurdicas e contbeis, assemblias legislati-vas e sistemas judiciais menores e intermedirios

    nanceiros associados que se combinam para

    servir como inter ace extraterritorial (o -shore )entre as economias lcitas e as ilcitas.Tal artigo alerta sobre as economias paralelas

    dos pases mais ricos, o jogo dos parasos scaise as novas ormas de corrup o, detalhando comoesses acertos por baixo dos panos e tratamentosespeciais pem em risco as democracias e como,embora normalmente a corrup o e a sonega o

    scal sejam vistas como problemas do Sul, ospases que tm menos interesse em regular essasitua o s o os mais ricos, especialmente a Sua,os Estados Unidos e a Gr -Bretanha.

    Muitos dos responsveis pelas decises,nos pases em desenvolvimento, com en oqueeconomicista ou conservador alegam que n opode haver seguridade social sem crescimentoeconmico. O diretor geral da OIT Juan Samoviaresponde que pr o crescimento antes da distri-bui o gera disparidades que depois s o di ceisde reabsorver (Somavia, 2007b).

    No entanto, o relatrio sobre a regi o rabeprope, de orma realista, que:

    de acordo com as tendncias atuais, a pers- pectiva utura da regio parece indicar proteo menor e marginalizao maior dos desempre- gados, indigentes e trabalhadores do setor in ormal. Essas projees negativas surgem

    das persistentes limitaes dos oramentos destinados aos sistemas de seguridade social e da ine cincia nos gastos pblicos.

    Para infuenciar a de ni o de prioridadesconsiderando as restries oramentrias reaisde cada pas, as coalizes doSocial Watch Itlia eFilipinas desenvolveram oramentos alternativoscomo instrumentos para que a sociedade civilpudesse inter erir nos debates parlamentares.As polticas sociais s o prejudicadas quando asdemandas e presses est o dispersas ou a im-plementa o do governo n o coordenada. Porexemplo, no Lbano:

    apesar da aplicao de numerosos planos de seguridade social, a ine cincia dos gastos sociais se deve alta de uma estratgia social nacional clara e abrangente. Essa estratgia deve abordar a total ausncia de coordenao entre os ministrios e os atores interessados, o que conduz duplicao de es oros e ao desperd-cio de recursos.(Samad; ZeidanOC 2007)

    A ausncia de estratgias de desenvolvimentonacionais consensuais e a alta de coordena o entre rg os ou programas de governo s o problemasque aparecem em vrios relatrios nacionais.

    Na maioria dos relatrios nacionais prepara-dos pelas coalizes doSocial Watch nos pasesdo Sul, a integra o de cidad os e cidad s quetrabalham na economia in ormal ou n o-organizada aparece como a chave para que a seguridadesocial seja uma realidade para todos(as). H algu-mas experincias interessantes de es oros paraintegra o de setores da economia in ormal aosistema de seguridade social, assim como casosem que os governos reproduziram mtodos ouexperincias de iniciativas in ormais nas reas deeduca o ou de sade.

    Discriminaes mltiplas A problemtica da in ormalidade a etada podiscriminaes mltiplas que agravam a situa ode alguns grupos e os tornam mais vulnerveis.Muitas vezes, somam-se s discriminaes porgnero, idade, raa, etnia, origem, procednciageogr ca, orienta o sexual, religi o, di erende capacidades, soropositividade do HIV e con-di o de imigrante.

    As pessoas discriminadas n o podem exercerseus direitos nem viver dignamente. S o as pri-meiras que empobrecem e tornam-se vtimas dedesigualdade crescente enmeno que tambmocorre nos pases mais ricos. Segundo pesquisarealizada pelo Centro Canadense para PolticasAlternativas (que az parte do relatrio do Canad), a maioria da popula o (65%) acredita que ocrescimento econmico n o a bene cia. Muitosdisseram que s o cheque do salrio semanal ossepara da pobreza.

    De acordo com o relatrio do Nepal:

    em todo o pas as prticas discriminatrias enraizadas nas tradies esto baseadas prin- cipalmente no sistema de castas, etnias, classe

    4 A Conven o da OIT est disponvel em: . Acesso em: 1 nov. 2007.

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    rica

    Gana Enquanto a maioria de trabalhadores(as), especialmente as mulheres,trabalha na economia in ormal, somente a minoria, principalmente dosetor ormal, recebe bene cios do plano nacional de seguridade social. Orelatrio de Gana de ende que necessrio um sistema nacional di erentede seguridade social, dirigido especi camente s mulheres, voltado para osetor in ormal e para outros grupos necessitados, assegurando um mni-mo de bene cios de subsistncia s pessoas pobres e marginalizadas.

    Somlia A partir de janeiro de 1991, houve privatiza o espontnea e n o-plane-jada de empresas e servios pblicos. propor o que o pas comeoua se recuperar da perda do governo central mediante mecanismos decompensa o, iniciativas privadas comearam a atender demanda domercado. Foram estabelecidas escolas, centros universitrios, clnicas,

    hospitais, ornecimento de eletricidade e gua e outros servios. Porm,o pblico consumidor precisa pagar por esses servios que, em geral,tm preos exorbitantes. Pouca gente pode pagar a matrcula escolar, oatendimento mdico e demais servios sociais diante da ausncia de umgoverno central que arrecade impostos e taxas e converta essas receitasem desenvolvimento comunitrio e bem-estar pblicos.

    Atualmente, 43% da popula o vive abaixo da linha de pobreza ex-trema (menos de US$ 1 por dia). A Somlia jamais teve assistncia socialou cobertura institucional contra os e eitos do desemprego. Isso nunca oiuma poltica de Estado importante nem uma iniciativa ampla. No entanto,os(as) somalis sempre recorreram ao meio tradicional de apoio mtuo,especialmente por meio das associaes dos cl s. Integrantes de cl s emsitua o de indigncia cam isentos(as) de contribuir e podem ter direito assistncia com base em um undo coletivo.

    Essa assistncia social baseada nas contribuies basicamente volun-tria, mas ajuda integrantes da comunidade a sobreviverem juntos(as). Porisso, as conseqncias da guerra civil oram absorvidas com acilidade, me-diante ajuda dos cl s. Isso ruto de uma cultura secular, na qual as pessoasviviam como pastores nmades em uma natureza relativamente hostil.

    Qunia Estima-se que entre 30% e 35% de meninos e meninas que vivem emassentamentos in ormais em todo o pas n o est o integrados ao ensino

    ormal, apesar do restabelecimento da educa o primria gratuita.1 Os es oros da sociedade civil para prover educa o alternativa s

    crianas em assentamentos in ormais oram imitados pelo governo. Taisiniciativas de educa o in ormal s o sistemas mais fexveis e econmi-cos, dirigidos s crianas de rua e de assentamentos que n o podemseguir a educa o ormal, uma vez que n o podem pagar por esse custo epor outras despesas escolares.

    O programa trienal o erece ao alunado aprendizagem bsica de al a-betiza o e aritmtica, seguido de um ano de ensinamentos tcnicos bsi-cos, e desenvolvido paralelamente aos programas ormais de educa oprimria. O relatrio do Qunia tambm explica que as pessoas que j n oparticipam ativamente da economia devem se apoiar nas redes tradicio-nais de seguridade social o que, muitas vezes, signi ca dependncia totalde lhos e lhas que trabalham.

    sia

    ndia O relatrio estima que, de 399 milhes de trabalhadores e trabalhadorasexistentes no perodo 1999 2000, 371,2 milhes (quase 93% da ora detrabalho) integravam o setor in ormal, em compara o com apenas 27,8milhes (7%) no setor ormal.

    Recentemente, o governo concluiu um projeto de lei sobre a seguri-dade social para o setor in ormal. Como complemento dos dispositivos deseguridade social existentes em mbitos estadual e nacional, esse projetode lei o erece medidas de prote o social como seguro-sade, bene cio maternidade e para as pessoas aposentadas.

    O projeto de lei trata tambm da conserva o dos recursos naturaisque sustentam os meios de subsistncia de trabalhadores e trabalhadorasin ormais. A singularidade desse projeto est no ato de se basear nomarco de re erncia dos direitos e ser legalmente aplicvel.

    Entretanto, uma observa o mais atenta do projeto revela lacunas

    evidentes. Antes de tudo, a iniciativa n o respeita os princpios de n o-discrimina o e eqidade amparados pela Constitui o e pelas convenesinternacionais que a ndia rati cou, como o Pacto Internacional sobre osDireitos Econmicos, Sociais e Culturais. O projeto de lei provocar mai

    ragmenta o, pois exclui as pessoas j cobertas pelos planos existentese adota uma abordagem segmentada para a provis o de seguridade socialao distinguir os setores ormal e in ormal em vez de consolid-los.

    Nepal O relatrio desse pas explica que as pessoas que trabalham nos setoresin ormais do transporte (por exemplo, os puxadores e charretes), notransporte de ardos ou nos servios em hotis, bricas, indstrias eagricultura s o as que est o mais desprotegidas quando ocorrem circun-stncias imprevistas. As mulheres s o mais atingidas, pois n o existe um

    mecanismo protetor no setor in ormal e, como habitual, elas recebemsalrios mais baixos que os homens pelo mesmo trabalho.

    Filipinas Segundo o relatrio, vendedores(as) de rua, pessoas que trabalhamem casa e trabalhadores(as) autnomos(as) do setor agrcola, rural eoutros(as) trabalhadores(as) do setor in ormal atingem, aproximada-mente, 49% da ora de trabalho ou 15,5 milhes de pessoas. Muitasdessas pessoas n o tm prote o social adequada. Justamente porqueest o ora da economia ormal e operam ora do alcance das normas, atendimento do programa de sade e de outros programas de prote osocial continuam problemticos.

    1 Nota da edi o: equivalente primeira etapa do ensino undamental no Brasil.

    A INFORmAlIDADE DIVERSA

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    e gnero. Assim, os dalits(intocveis),janajati (naes indgenas), pessoas pobres e mulhe- res no tm oportunidades para satis azer s necessidades bsicas de alimentos, habitao,

    educao e servios de sade. Essas prticas discriminatrias so ainda mais predominantes nas reas rurais e remotas, onde so comuns as relaes de poder desiguais, a distribuio desigual da terra e da renda, assim como a ausncia de servios bsicos.

    Em muitas regies, um percentual signi ca-tivo de mulheres continua trabalhando por contaprpria. Nos pases em desenvolvimento, a maiorparte do trabalho autnomo est na economiain ormal, caracterizada por baixa remunera o,ms condies de trabalho e alta de prote o(Somavia, 2007b).

    O artigo sobre o ndice de Eqidade deGnero (IEG), escrito pela equipe de pesquisa doSocial Watch , a rma que a iniqidade baseada nognero um enmeno que transcende ronteiras,culturas, religies, naes e padres de renda.Alcanar a eqidade de gnero um desa o domundo moderno, pois, embora com mani estaesdiversas, a de asagem entre mulheres e homenscontinua existindo em todos os pases.

    Estudo recente da OIT (Galli, Lucena apudSomavia, 2007b) con irma que h muito maismulheres que homens trabalhando na economiain ormal. Mesmo quando a propor o de homense mulheres que se dedicam ao trabalho por conta

    prpria mais ou menos similar, as mulheres est oconcentradas nos trabalhos de qualidade in erior.O relatrio do Brasil destaca que as trabalha-

    doras rurais lutam, h anos, pelo reconhecimentode sua condi o de pequenas produtoras. O tra-balho que realizam no cultivo de hortas e plantasmedicinais, assim como na cria o de pequenosanimais, absolutamente undamental para asobrevivncia e o sustento de suas amlias. Aindaassim, esse trabalho invisvel e desvalorizado.

    Como resultado, essas mulheres n o tm o re-conhecimento de seus direitos como trabalhadoras.O relatrio ressalta que a situa o mais grave ade quase 6 milhes de mulheres, na maioria dasreas rurais, que n o possuem nenhum documentoe, portanto, n o tm acesso a nenhum de seusdireitos como cidad s.

    O relatrio de Honduras denuncia a situa ode violncia contra as mulheres. O governo aindan o rati cou o Protocolo Facultativo Conven osobre a Elimina o de Todas as Formas de Discri-mina o contra a Mulher (Cedaw) undamentalpara que as organizaes de mulheres e as pessoasa etadas possam apresentar denncias.

    Dados que comprovam a discrimina o so-rida por mulheres de regies des avorecidas, que

    buscam o sustento na economia in ormal como

    nica possibilidade, constam da maioria dos rela-trios nacionais dos pases em desenvolvimento.No entanto, tambm h experincias positivas. Norelatrio nacional de Bangladesh, a rma-se que:

    oram conseguidos avanos considerveis na integrao das mulheres cultura dominante no processo de desenvolvimento do pas. As mulheres cumpriram papel importante (e con- tinuam a az-lo) no xito do microcrdito, no setor de con eces, na reduo do ndice total de ecundidade, na melhoria da nutrio in antil,na maior participao na educao e na reduo das disparidades entre gneros em todas as es eras da vida. As meninas e as mulheres j conseguiram paridade na taxa bruta de matrcula escolar e na esperana de vida ao nascer.

    O artigo de Susanne Paul e Alischa Kugelaponta o paradoxo da discrimina o contra pes-soas idosas, ao mesmo tempo em que as mulheresidosas costumam ter importantes responsabilida-des com o cuidado de outras pessoas. Podem criarnetos e netas ou cuidar de crianas doentes emcomunidades a etadas pela crise do HIV/Aids. Emalguns casos, sustentam netos e netas cujos paistrabalham longe. Como nicas ontes de renda da

    amlia, possvel que essas avs n o consigamproporcionar aos(s) lhos(as) e netos(as), e atmesmo a si prprias, a alimenta o adequada e oacesso aten o mdica ou educa o.

    Nessa linha, o artigo de Robin Blackburn pro-pe a cria o de uma pens o internacional e de um

    undo de ajuda juventude, assinalando:

    o vnculo que existe habitualmente entre o direito s penses e as contribuies do trabalho no bom para as mulheres. Como as mulheres vivem alguns anos mais que os homens, a maioria das pessoas idosas constituda de mulheres.E como o trabalho domstico no remunerado das mulheres representa pouco nos sistemas de penso pblicos e nada nos planos privados e ocupacionais, mais de 75% da populao pobre e idosa constituda de mulheres. Alm disso, o trabalho das mulheres de cuidar de outros inte- grantes da amlia costuma prosseguir durante a velhice, pois elas cuidam de seus maridos,netos(as) e doentes.(BlackburnOC 2007)

    As polticas voltadas para a integra o do tra-balho in ormal economia ormal desempenhampapel vital para acelerar a redu o da pobreza, de-ter o aumento da desigualdade de renda e superara discrimina o, especialmente contra as mulheres(Somavia, 2007a). As estratgias de educa o e

    orma o que permitem reduzir a alta de quali ca- o e superar a discrimina o e exclus o tambms o cruciais para um crescimento mais rpido egerador de emprego, assim como um maior poderaquisitivo para as pessoas de baixa renda.

    migrantes, situa o de riscoVrios relatrios nacionais mostram o tratamentorecebido por imigrantes em termos de seguridadesocial. O relatrio da regi o rabe, por exemplo

    assinala que um nmero signi cativo de imigrantes(principalmente da sia Meridional e de outrospases rabes) que vivem nos pases do Gol o comsuas amlias n o recebe bene cios. Esses n

    oram estendidos ora de trabalho imigrante qurealiza a maioria dos trabalhos menos quali cados,mas que tambm ocupa propor o importante dosempregos especializados.

    O relatrio dos Estados Unidos in orma que,depois da guerra do Iraque, a alta de aten o sade talvez a quest o de poltica pblica maiscontrovertida do pas. Com rela o situa odas minorias e dos(as) imigrantes, o relatriodestaca que certos grupos s o mais atingidosque outros pela alta de cobertura de sade. Noatual sistema de aten o sade, so rem maisa ro-americanos(as), hispanos(as), pessoaspobres e mulheres.

    Sobre a Europa, o relatrio da Blgica in ormaque, em 2006, o parlamento aprovou dispositivoslegais que modi caram pro undamente a legisla o relativa s pessoas estrangeiras. A opini ounnime das organizaes da sociedade civil e dossindicatos oi que as re ormas adotadas n o podemgarantir o respeito aos direitos undamentais dasmuitas pessoas estrangeiras residentes na Blgicae n o resolvem, de nenhuma orma, as alhas da

    legisla o anterior.Por outro lado, o relatrio da Alemanhamostra que h violaes de direitos com rela o educa o e sade das pessoas re ugiadas. Emsete dos 16 estados ederados, n o h obriga ode crianas re ugiadas, cuja deporta o tenha sidotemporariamente suspensa, reqentarem a escola.De certa orma, isso tambm ocorre com lhos(as)de pessoas que solicitam asilo.

    mode os e confitoN o existe um modelo nico de seguridadesocial, mas h determinados princpios bsicos(Centro Interamericano de Investiga o e Docu-

    menta o sobre Mercado de Trabalho, 2005),acordados internacionalmente, que todos ossistemas devem possuir: bene cios seguros e n o discriminatrios; rigor e transparncia dos regimes; custos mnimos de administra o; participa o relevante dos

    interlocutores sociais; con ana da popula o; boa administra o.

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    COmBATE AO HIV/AIDSSIA, FRICA E AmRICA lATINA

    A representante da OSC Marie Stopes International, Joyce Haarbrink, comenta, neste relatrio,no artigo sobre direitos sexuais e reprodutivos, que no m da dcada de 1990 a pandemia de HIVconseguiu prender a aten o mundial. Por esse motivo, oram desviados recursos da sade e dosdireitos sexuais e reprodutivos para dar resposta ao HIV. Ainda resta muito trabalho a ser eito. preciso maximizar a e cincia da mobiliza o de recursos e conseguir uma complementaridadesinergtica entre as duas estratgias. Por seu lado, os doadores e os governos precisam assumirque os investimentos na sade e nos direitos sexuais e reprodutivos tm impacto ben co naeconomia e no conjunto da sociedade.

    mian arDe acordo com o relatrio, o Programa Conjunto das Naes Unidas sobre HIV/Aids (Unaids)in orma que os recursos disponveis para combater o HIV/Aids s o escassos em compara ocom a magnitude do problema. Isso agravado pela relutncia do Conselho de Estado paraa Paz e o Desenvolvimento em permitir o trabalho das OSCs internacionais em colabora ocom as organizaes comunitrias.As autorizaes para visitar pacientes s o di ceis de serem obtidas e o acesso aos grupos dealto risco e s pessoas vulnerveis limitado. A Unaids advertiu sobre a crescente epidemiaem Mianmar, assinalando que, em grande medida, o regime no poder a tem ignorado.

    TanzniaO relatrio assinala que o pas tem incidncia de HIV/Aids em torno de 7% (6,3% entreos homens e 7,7% entre as mulheres) na popula o adulta de 15 a 49 anos de idade. Oshabitantes urbanos tm graus de in ec o consideravelmente mais elevados (10,9%) que osrurais (5,3%). Calcula-se que 2 milhes de pessoas adultas e outros 2 milhes de r ose r s vivam com o HIV/Aids. No entanto, o nmero de r os e r s decorrente da Aidspassou de 1 milh o, em 2003, para 2 milhes, em 2005. Signi ca que o nmero atual deveser, certamente, mais alto e crescente.Para tentar solucionar esse problema, a Tanznia incorporou redes de prote o social aoPrograma de A o Econmica e Social. Um desses programas de redes de prote o social o Fundo Fiducirio Educativo Mwalimu Nyerere, utilizado para dar assistncia a r os er s na escola.

    E Sa vadorO relatrio in orma que a Aids a quarta causa de morte no pas. Em mdia, quatro pes-soas s o in ectadas diariamente e milhares ocultam sua situa o por temer o estigma e adiscrimina o.Desde 1984, a taxa de in ec o do HIV/Aids cresce. Dados recentes mostram que, no m de2006, havia registro de mais de 18.500 casos de in ec o. De acordo com a Unaids, existealta subnoti ca o, o que poderia elevar o nmero de pessoas in ectadas para algo entre 25mil e 50 mil pessoas.Com rela o ao atendimento, o Instituto Salvadorenho do Seguro Social (ISSS) atende amais de 1.280 pessoas com terapia anti-retroviral incluindo aten o mdica para trataras doenas oportunistas e assistncia gravidez para prevenir a possibilidade de in ec odurante o parto. Entretanto, n o h cumprimento adequado dos protocolos de aten o mdicavigentes, altam medicamentos ou as entregas s o tardias, assim como, recorrentemente,

    altam reativos para o teste de contagem de clulas CD4 lin citos que lideram as de esas doorganismo , expondo muitas pessoas ao surgimento de doenas oportunistas, a complicaesou, at mesmo, morte.

    Outro princpio o da igualdade entre homene mulheres como undamento e eixo da seguridasocial para um desempenho timo da sociedadereconhecendo o enorme bene cio dos cuidado

    n o remunerados proporcionados pelas mulheresespecialmente a crianas, pais e pessoas incapa-citadas (Regil, 2001).

    Na implementa o desses princpios, paraadequar a seguridade social s novas realidadesimpostas pela globaliza o, h duas grandestendncias em confito.

    Uma tendncia s o as re ormas estruturais oparadigmticas, com re ormas substanciais dosistemas, capitaliza o individual e administraprivada total ou parcial dos regimes. tambmconhecido como o modelo do chamado Consensde Washington e costuma azer parte das polticde ajuste estrutural do Banco Mundial.

    A outra tendncia s o as re ormas n o estruturais ou paramtricas, com modi caedentro dos sistemas pblicos nacionais, quese mantm como os sistemas undamentaisElas est o baseadas nos princpios clssicos dsolidariedade e organiza o estatal da seguridadsocial e s o aplicadas na maioria dos pasesespecialmente nos desenvolvidos. O exemplclssico o chamado modelo de prote o sociaeuropeu ou Europa Social.

    Nos relatrios nacionais dos grupos euro-peus doSocial Watch s o explicados detalhes dasitua o atual do modelo europeu. Por exemploa prote o social na Frana se re ere a todos omecanismos de bene cios coletivos que permites pessoas en rentarem as conseqncias nanceiras dos riscos sociais.

    H trs sistemas: seguro social para quemcontribui (prote o para a perda de renda, desemprego, doena, velhice, acidentes de trabalhoassistncia social (implementando um sistema dsolidariedade entre as pessoas, com garantia derenda mnima e de inser o); bene cios para pesoas adultas incapacitadas; e prote o universa(bene cios para a amlia). O sistema de protesocial rancs representa mais de 30% do PIB.5

    Em geral, as re ormas n o estruturais tm a

    seguintes caractersticas: s o implementadas progressivamente e com

    uma perspectiva de prazo mdio e longo. Poexemplo, o processo na Alemanha vai at2030. O relatrio da Alemanha in orma qunos ltimos meses, oram realizados grandecortes na rede de prote o social dos sistemasde seguridade social. Sem dvida, a mudanamais importante oi a eleva o da idade daposentadoria, de 65 para 67 anos;

    5 In ormaes retiradas dosite : .

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    mENINOS E mENINAS VIVENDO NA POBREZA

    UgandaO relatrio desse pas destaca um in orme, de 2005, do Centro de Pesquisa sobre PobrezaCrnica (CPRC, na sigla em ingls), que calcula que 50% das cerca de 15 milhes de crianasdo pas vivem na pobreza.O relatrio identi cou vrios atores responsveis pela pobreza e pela vulnerabilidade no pas,como seguridade social e prote o contra as crises insu cientes, m sade, HIV/Aids, rpidocrescimento demogr co, acesso limitado terra e alta de mercados. A corrup o tambmcontribui ao desviar os recursos necessrios para melhorar o bem-estar das pessoas pobres,mesmo das doentes.

    NepaO relatrio explica que, embora o governo tenha rati cado a Conven o da ONU sobre os Direi-tos da Criana, as normas jurdicas do pas e as polticas do governo n o s o su cientes paraassegurar os direitos da in ncia e da juventude. A situa o especialmente alarmante no casodas crianas. No primeiro semestre de 2004, a organiza o Child Workers in Nepal ConcernedCentre (CWIN) registrou 10.247 casos de explora o no trabalho, morte, desaparecimento, abuso,casamento orado, abuso sexual, tr co, prostitui o orada, alm de crianas em confito edelinqncia juvenil, assinalando que os casos noti cados representavam somente pequena

    ra o da real magnitude dos problemas so ridos pelas crianas do pas.Pela primeira vez na histria, a Constitui o Provisria, promulgada em 2007, consagrou osdireitos da criana na lista dos direitos humanos undamentais. Porm, ainda n o oram tomadasas medidas para que esse compromisso seja cumprido.Em 2003, o governo prometeu proporcionar educa o para todos como parte dos compromis-sos assumidos com as Metas de Desenvolvimento do Milnio (MDMs). Assim, at 2015, todasas crianas de 6 a 10 anos dever o ter acesso educa o primria gratuita e de boa qualidade,independentemente de gnero, origem tnica, religi o, necessidade especial ou lugar geogr co.No entanto, at agora, n o h indcios de medidas tomadas com o objetivo de desenvolver ain ra-estrutura e os sistemas necessrios para garantir o cumprimento das MDMs no prazo deoito anos. Alm disso, no Nepal, ainda h aproximadamente 1 milh o de crianas que trabalhame n o reqentam a escola.

    marrocosO relatrio marroquino assinala que vrios grupos vulnerveis precisam de aten o para melhorarsua situa o, em especial: crianas: calcula-se que existam 600 mil crianas trabalhadoras. H muitas crianas na rua,

    expostas a todo tipo de violncia sica e sexual, e existem cerca de 500 mil crianas namendicncia. Todas s o vtimas de racasso escolar, xodo rural e atitudes sociais avorveisao trabalho in antil;

    vivas, divorciadas e m es solteiras: os lares sob a responsabilidade de mulheres jovens tmuma tendncia maior pobreza do que as amlias che adas por homens. Os estatutos jurdicose as leis de herana contribuem para a discrimina o e a vulnerabilidade das mulheres.

    h consenso amplo entre setores sociais, comoocorre em vrios pases europeus;

    podem introduzir uma correla o melhor entrecontribui o e bene cio, por exemplo, pormeio de contas individuais nocionais6 que sur-giram na Sucia e depois oram estendidas China e Letnia; ou pelo ator previdencirio,como no Brasil.

    O Banco Mundial, outros organismos eespecialistas avorveis aos sistemas de capi-taliza o individual obrigatria azem uma sriede crticas s re ormas n o estruturais e aossistemas pblicos em geral. A seguir, algumascrticas do Banco Mundial (Centro Interamericanode Investiga o e Documenta o sobre Mercadode Trabalho, 2005): a etam o mercado de trabalho ormal; estimulam a sonega o e desestimulam a

    contribui o por atrasos, n o-declara o esubdeclara o;

    diminuem a o erta de trabalhadores(as)experientes;

    geram injustias por causa de tetos eprivilgios;

    aumentam os encargos trabalhistas e geramproblemas de nanciamento insustentveis;

    diminuem o crescimento econmico e n o gerammercado de capitais nem poupana nacional;

    aumentam a dvida implcita com trabalhado-res(as) e aposentados(as);

    n o corrigem os problemas do envelhecimentoda popula o nem da evolu o demogr ca;

    aumentam as injustias na redistribui o; impossibilitam a canaliza o de recursos para

    outras polticas sociais e produtivas.

    Muitas das argumentaes contra os sistemaspblicos ou da Europa Social destacam pontoscomo a insustentabilidade do modelo tanto pelosaspectos nanceiros como pelas conseqnciasdo envelhecimento da popula o. Na Itlia, porexemplo, um dos aspectos mais crticos est no

    ato de que, em um pas envelhecido, italianos(as

    agora pagam cada vez mais pelas pessoas idosas,sem uma mudana de gera o que possa produzirrenda su ciente para cobrir todos os gastos daseguridade social.

    Entretanto, o relatrio da Itlia argumenta quen o se deve levar em conta somente o envelhe-cimento da popula o, mas tambm as pessoasatualmente desempregadas, especialmente porquea taxa de desemprego n o est declinando. Final-mente, a aposentadoria da gera o dobaby boom,7 que envolve aproximadamente 60 mil pessoas,criar um pico de despesas em 20 anos ou mais,enquanto a previs o que as re ormas entremplenamente em vigor em 2010.

    Re ormas estruturais Antonio Tricarico, em artigo neste relatrio a respeito da posi o do Banco Mundial sobre seguridade social , recorda que desde a dcada de 1980 asre ormas estruturais promovidas pelo banco tmdeslocado, sistematicamente, o equilbrio do riscosocial das instituies pblicas para os ombrosdos indivduos. Por exemplo, o objetivo polticodo Banco Mundial de priorizar a reestrutura o eo desenvolvimento do sistema nanceiro aponta,cada vez mais, para as re ormas das instituiespblicas de seguridade social, o que implica a

    privatiza o dos sistemas de aposentadoria.Alm de o erecer apoio terico aos interessesideolgicos e nanceiros que de endem a privatiza o, o Banco Mundial tambm deu emprstimos eajuda tcnica aos pases que privatizaram sistemasde seguridade social, especialmente na Amrica Latina e no Caribe e, posteriormente, nos pases do LesteEuropeu. A situa o dos pases do Leste europeu tratada no artigo escrito pela Funda o de Pesquisade Gnero da Bulgria (BGRF) neste relatrio.

    6 Nota da tradu o: Stelle James (1998) identi ca trsvariaes principais de modelos previdencirios baseadosno sistema multipilar: o chamado modelo latino-americano,baseado em contas individuais; o modelo da OCDE, baseadoem planos de aposentadoria patrocinados por empregado-res; e o modelo sueco de contribuies de nidas nocionais.

    7 Nota da tradu o: aumento grande e sbito da taxa denatalidade, como a ocorrida nos Estados Unidos entre o mda dcada de 1940 e o incio da dcada de 1960.

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    O relatrio do Nepal explica que a indus-trializa o nepalesa oi inicialmente dirigida pelo

    Estado. No entanto, para globalizar a economianacional, o investimento e o cmbio de moedasestrangeiras, oram desregulados os setores

    nanceiro e industrial, que receberam isenes deimpostos e, em seguida, oram privatizados.

    Embora as instituies de Bretton Woods(FMI e Banco Mundial) tenham imposto polti-cas de ajuste estrutural na dcada de 1980, narealidade, a liberaliza o econmica comeouem 1992. A privatiza o de servios bsicos,como abastecimento de gua, educa o e sade,aumentou ainda mais a desigualdade ao diminuirtanto a quantidade como a qualidade dos serviospblicos de sade e educa o.

    As re ormas estruturais tm em comum amodi ca o undamental da estrutura do regimede aposentadoria e penses com a introdu o dacapitaliza o individual obrigatria administradapelo setor privado. Somente se di erenciam nograu em que se substitui o regime de reparti opela capitaliza o em contas individuais e nade ni o dos bene cios (Centro Interamericanode Investiga o e Documenta o sobre Mercadode Trabalho, 2005).

    Como mostra aTabe a 1, o Banco Mundialprope um modelo de trs pilares. O primeiropilar pblico tem o objetivo limitado de aliviar a

    pobreza na velhice e ornecer um co-seguro contranumerosos riscos. Deveria ser um pilar pequenopara dar lugar a outros pilares e ser nanciado comreceitas correntes para evitar os problemas dos

    undos previdencirios administrados pelo setorpblico. Esse modelo de pilar pode se apresentarem trs di erentes modalidades: azer parte de umprograma de bene cios voltado para as necessi-dades de pessoas pobres de todas as idades, combene cios que levem em conta as necessidades deacordo com a idade; dar garantia de pens o mnimapor meio de um pilar de poupana obrigatria;ou prover um bene cio uni orme, universal ouvinculado ao emprego.

    O segundo pilar obrigatrio de capitaliza oindividual e administra o privada poderia adotarduas modalidades: planos de poupana e planosocupacionais. Com o nanciamento total, seria

    omentada a orma o de capital e o desenvol-vimento de mercados nanceiros. Ao estimularo crescimento econmico dessa maneira, seria

    acilitado o nanciamento do pilar pblico. Narealidade, a tendncia tem sido promover os planosde poupana pessoais e tornar esse pilar o maisimportante e caracterstico do modelo.

    O terceiro pilar voluntrio de capitaliza oindividual e de administra o privada, em qualquerdas modalidades anteriores, unciona como umcomplemento voluntrio.

    O relatrio da Bulgria explica que sob adire o das instituies nanceiras internacionais,imposta pelas condies dos emprstimos, eseguindo as prticas implementadas na EuropaCentral e do Leste e na Amrica Latina, a arquite-tura do sistema de penses do pas oi estruturada

    nos trs pilares. A nova arquitetura combina aparticipa o governamental e privada, assim comoelementos obrigatrios e voluntrios.

    Em 1999, surgiram no prprio Banco Mun-dial as primeiras vozes criticando a abordagemideolgica das re ormas estruturais da seguridadesocial. O banco conceitualizou um novo critrio deprote o social, sob a denomina o de gest o dorisco social (GRS). Em 2000, o Relatrio sobreo Desenvolvimento Mundial do Banco Mundialapresentou seu novo marco de re erncia depoltica para lutar contra a pobreza (ttulo dorelatrio). Signi icativamente, por ocasi o dade ni o das MDMs na Declara o do Milnio da

    HABITAO, lONGE DO IDEAlNa Frana, mais de 3 milhes de pessoasvivem em condies indignas ou n o tmmoradia. Alm disso, estima-se que onmero de habitaes insalubres cheguea 600 mil. No relatrio da Blgica, tambmse explica que oram constatados algunsproblemas srios de acesso habita o o pas tem uma das propores de habi-taes populares mais baixas da Europa.

    As organizaes do grupo doSocial Watch Frana propem o seguinte: implementar o direito habita o de

    orma que seja aplicvel por lei, comoum direito e etivo a todas as pessoas;

    azer da habita o uma verdadeiraprioridade, da mesma orma que oemprego;

    re orar a e ccia social dos programasde ajuda para a compra de imveis,que devem continuar sob controle doEstado;

    garantir a o erta de aluguis economica-mente acessveis a toda a popula o;

    implementar um sistema universalque d segurana contra os riscos doaluguel.

    TABElA 1 mode o do Banco mundia dos pi ares de seguran a econ ica naPi ares Pilar obrigatrio administrado pelo

    setor pblicoPilar obrigatrio administradopelo setor privado

    Pilar voluntrio

    Objetivo Redistribui o e co-seguro Poupana mais co-seguro Poupana maisco-seguro

    moda idade De acordo com as necessidades mnimo garantido ou uni orme

    Plano de poupana pessoal ouplano ocupacional

    Plano de poupanapessoal ou planoocupacional

    Financia ento Financiado por impostos Totalmente nanciado, regula-mentadoTotalmente

    nanciado

    Fonte: adaptado de Centro Interamericano de Investiga o e Documenta o sobre Mercado de Trabalho (2005), extrado Averting the old age crisis: policies to protect the old and promote growth , Banco Mundial, 1994.

    ONU, o banco declarou, claramente, sua intende reconceitualizar a poltica social como gestdo risco social.

    A nova concep o de GRS tende a restringirpapel estatal na distribui o do risco, pois estimuo setor privado a maior protagonismo na o erta dinstrumentos para aliviar o risco individual. Essanovas ormas das receitas do Banco Mundiatambm s o criticadas.

    Tanto o artigo de Antonio Tricarico como artigo sobre o papel do Banco Mundial nos pasedo Leste Europeu explicam as di erentes crticque o modelo do banco tem recebido em todo omundo. A OIT tambm sistematizou essas crtice, recentemente, uma auditoria independente dpesquisa do Banco Mundial que examinou made 4 mil atividades do banco entre 1998 e 200 veri cou que, em vez das polticas serem omuladas com base em anlise equilibrada de umampla gama de pesquisas, eram, muitas vezes,

    ormuladas com base na pre erncia histrica depois, apoiadas por pesquisa seletiva e anliseparcial. (Banerjee, A.et al 2006)

    O painel que realizou a avalia o, compostde iguras acadmicas eminentes, ez crticsubstanciais maneira como a pesquisa do BancoMundial oi utilizada para azer proselitismo suas polticas muitas vezes, sem ter uma visequilibrada das evidncias e chegando a ponto deauto-re erncia atingir quase a pardia. Listamosseguir, as principais crticas apontadas ao modeldo Banco Mundial:8

    minimiza a solidariedade nacional e a solidariedade intergeracional;

    em geral, as polticas s o ormuladas com baem pre erncias histricas e, posteriormentes o apoiadas por pesquisas seletivas e anlisescom vis;

    sua cobertura limitada e os regimes privadoavorecem as categorias mais prsperas da

    popula o;

    8 Inconvenientes del modelo Banco Mundial desde laperspectiva de la OIT, citado em Centro Interamericanode Investiga o e Documenta o sobre Mercado deTrabalho (2005).

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    Tendo como modelo a re orma da seguridadesocial do Chile (1981), o Banco Mundial incluiu,em suas receitas de re ormas estruturais, acapitaliza o individual e a gest o privada porintermdio de Administradoras de Fundos dePens o (AFPs), substituindo total ou parcial-mente o sistema solidrio com administra o egarantia do Estado (Tabe a 2).

    N o importam as di erenas de imple-menta o nos 28 pases que, at o momento,adotaram as AFPs, pois a inten o que guiouessas re ormas oi a de trans erir o riscosocial das instituies estatais para as pes-soas. Nesse sistema, cada indivduo a liadopossui uma conta individual em que depositasuas contribuies previdencirias e, no mde sua vida ativa, esse capital devolvido aoa liado ou a seus herdeiros na orma de algum

    tipo de pens o.Em teoria, os undos de pens o se en-carregariam daqueles patamares de rendade aposentadoria que os programas o ciaisj n o ossem capazes de o erecer. Porm,como explica Fernando Cardim de Carvalhoneste relatrio, os undos oram propostos,principalmente, como uma orma de aumentara poupana das amlias e canaliz-las paraos mercados de ttulos pblicos e privados,convertendo-se rapidamente em mais um tipode undo de investimento.

    Aldo Caliari assinala que a utiliza o daspoupanas previdencirias em atividades

    especulativas, como os undos de capital derisco e os undos dehedge , desperta temorestanto pela instabilidade dos mercados nan-ceiros como pelos altos riscos e pela alta deregulamenta o desses undos. Alm disso, noregime das AFPs, os a liados n o participamdas decises sobre como e onde devem serinvestidas suas poupanas nem da gest ocotidiana dessas instituies. A concep o deentidade quadripartida, com a participa o doEstado, empregadores(as), trabalhadores(as) epensionistas n o az parte da lgica das AFPs.Vrios relatrios nacionais das coalizes doSocial Watch analisam as AFPs.

    mxicoO modelo bene icia trabalhadores(as) assa-lariados(as) e suas amlias, proporcionandoservios mdicos, penses e alguns bene ciossociais e econmicos contributivos. Porm, acobertura n o atende popula o desempregadanem a que trabalha no setor in ormal.

    O Relatrio Alternativo de 2006 alertouo Comit de Direitos Econmicos, Sociaise Culturais da ONU sobre a atua o dasAdministradoras de Fundos para Aposenta-

    doria (A ores) e sobre a precria situa o doInstituto Mexicano de Seguro Social (IMSS) edo Instituto de Seguridade e Servios Sociaisdos Trabalhadores do Estado (ISSSTE). Diante

    disso, o comit recomendou algumas medidasao governo, e entre elas, avaliar, em detalhe,as modi caes propostas para o sistema deaposentadoria vigente pela lei do ISSSTE, assimcomo modi caes uturas de outros sistemasde seguridade social, garantindo que essas mo-di caes n o tragam insegurana no trabalhopara os(as) uturos(as) aposentados(as) nemdiminui o do valor de suas uturas pensesque os(as) impeam de des rutar de um nvelde vida adequado.

    A re orma de 28 de maro de 2007 da Lei doISSSTE oi considerada medida regressiva, quan-do comparada com a legisla o anterior, e emconfito com a Constitui o Poltica dos EstadosUnidos Mexicanos e com dispositivos expressosna Conven o 102 da OIT cujo cumprimento obrigatrio. Contra essa re orma, centenasde milhares de servidores(as) pblicos(as) semobilizaram poltica e judicialmente.

    E Sa vadorO sistema de penses oi privatizado h dez anos.O governo repassou s AFPs os recursos das con-tribuies de trabalhadores(as). Porm, assumiuas penses das pessoas que j tinham mais de

    35 anos em 1996. Seis anos aps a privatiza o,oi implementada uma re orma para aumentar a

    idade de aposentadoria.Um dos principais problemas do sistema

    de penses a reten o ilegal das cotas deempregadores(as), que n o s o pagas ao Insti-tuto Salvadorenho do Seguro Social (ISSS). Em2007, o governo tem de pagar popula o apo-sentada cerca de US$ 345 milhes, mas n o temo dinheiro e a dvida do Estado trs vezes maiorque a receita da arrecada o de impostos.

    Para pagar as penses, o governo criouum Fundo Fiducirio de Penses, de modo queas AFPs autorizassem o Banco Multissetorialde Investimentos (BMI) a utilizar o dinheiro daspessoas que atualmente contribuem para pagaras penses da popula o j aposentada. Como ogoverno est altamente endividado, previsvel

    que ter problemas para pagar as AFPs. Assim,todo o sistema corre um risco maior e as pen-ses uturas da popula o est o em perigo.

    ParaguaiSomente trs em cada dez pessoas idosas est ocobertas pelo bene cio da aposentadoria. Em2005, o nmero de aposentados(as) e pensionistasatingia apenas 93 mil pessoas. No Paraguai, un-cionam, simultaneamente, pelo menos seis caixasde aposentadoria, sendo as maiores, entre elas, ade uncionrios(as) pblicos(as) da administra ocentralizada e o Instituto de Previdncia Social(IPS) para trabalhadores(as)