relações capitalistas no interior da escola

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    CENTRO FEDERAL DE EDUCAO TECNOLGICA DO AMAZONAS - CEFETPS-GRADUAO EM EDUCAO PROFISSIONAL E TECNOLGICA

    Alcemir CampeloCremilda Ferreira Silvino

    RELAES CAPITALISTAS NO INTERIOR DA ESCOLA

    MANAUS2006

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    RELAES CAPITALISTAS NO INTERIOR DA ESCOLA

    Alcemir Campelo1Cremilda Ferreira Silvino

    Resumo: Este texto um ensaio que trata das relaes capitalistas presentesno interior da escola. Trata-se da tentativa de estabelecer um paralelo entre odesenvolvimento do capitalismo e as conseqentes transformaes ocorridas nointerior da escola. Ser mostrado como a profisso a escola perdeu suacaracterstica tradicional, tornando-se, tambm, indstria de ensino. Nesse

    processo, em que o capital se apoderou do saber, o professor perdeudefinitivamente sua identidade passando a ser considerado apenas umproletrio do sistema. desse modo, realizando essa analogia com ocapitalismo pretende-se fazer uma reflexo sobre a atual sistemticaeducacional, visando encontrar alternativas que minimizem ou revertam ocenrio atual.

    Palavras-chave:Capitalismo na escola, educao capitalista.

    1 Introduo

    O presente trabalho tem por objetivo estabelecer um paralelo entre ostrabalhos de Antnio de Carvalho Franco2 e Nicanor Palhares S3, os quaistratam respectivamente de Capitalismo e Trabalho e do Aprofundamento dasRelaes Capitalistas no Interior da Escola. O primeiro texto apresenta deforma detalhada a evoluo dos processos produtivos e as correspondentesmodificaes nas relaes de trabalho, desde a fase artesanal at o apogeu docapitalismo monopolista. No segundo trabalho, o autor aborda as

    1Alunos do Curso de Especializao em Educao Profissional e Tecnolgica do Centro Federalde Educao Tecnolgica do AmazonasCEFET/AM

    2FRANCO, Antnio de Carvalho.A escola do trabalho e o trabalho da escola. So Paulo: Cortez: AutoresAssociados, 1988. (Coleo polmica do nosso tempo)

    3S, Nicanor Palhares. O Aprofundamento das relaes capitalistas no interior da escola. Universidade Federal deMato Grosso. Cad. Pesq. , So Paulo (57):20-29, maio 1986

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    transformaes ocorridas na educao sob a influncia do capitalismo,afetando desde a estrutura organizacional com sucessivos nveis dehierarquizao at a forma de dar aula.

    Como ser abordado a identificao de relaes capitalistas no processoeducativo, desde o professor/arteso at o professor/proletrio constituem-seem importantes pilares para uma reflexo sobre as transformaes ocorridasnas relaes pedaggicas nos ltimos anos. Transformaes estas queconseguiram transformar o saber em mais-valia e, desta forma, desvirtuando aessncia do que ser educador, do que educao.

    Portanto, ao apresentar os pontos mais importantes em cada texto,pretende-se, concomitantemente, estabelecer uma relao entre as duas

    temticas, identificando onde se imbricam e se estabelecem.

    2 Evoluo do capitalismo e sua influncia no processo educativo

    Para que possamos empreender a analogia e identificao de relaescapitalistas no processo educativo, deve-se, inicialmente, conhecer osurgimento desse fenmeno econmico e seu crescimento ao redor do mundo. Aanlise aqui pretendida ser a tentativa de se estabelecer um paralelo sobre o

    desenvolvimento dessas duas importantes temticas: capitalismo e educao.

    Durante a fase pr-capitalista, a economia era basicamente agrcola,com a proeminncia de pequenos ofcios onde figurava a presena do arteso.Esse produtor dispunha dos meios de produo como local, ferramentas ematria-prima; alm de conceber, o arteso executava, ele mesmo, todas asfases do processo produtivo no qual oficiava. Esse artfice era, ao mesmotempo, o proprietrio e o administrador do seu negcio. Outra caracterstica,era que no havia a preocupao com prazos, portanto, o arteso estabeleciaseu prprio ritmo. A analogia que se faz desse quadro com a educao a deque, tambm, inicialmente, o professor era tido como um arteso, o professor/arteso. Isso se explica no fato de que o saber da educao, a sua produo,transmisso, reproduo e consumo eram concentrados na figura do professor.O professor/arteso participava de todos os momentos do processo educativo,desde a elaborao da sua aula, na transmisso at a consumo junto ao aluno.Nesse momento, o professor era tido como a autoridade mxima, confiada aeste em virtude do seu saber erudito ou enciclopdico.

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    A princpio esse paralelo no era aceito, posto que, segundo Palhares(1986) no se considera como possvel a adoo de relaes capitalistas naescola, em todas as suas esferas . Tal assertiva dizia respeito, principalmente,ao professor, posto que nesse estgio ainda no era possvel desvincular

    atividade educativa da participao ativa do professor. Essa possibilidade irocorrer nos estgios seguintes do capitalismo.

    Na fase seguinte do capitalismo, correspondente ao perodomanufatureiro, os artesos que anteriormente era produtores independentes,

    passam a ser paulatinamente subordinados aos interesses do capital,atravs de um processo crescente de racionalizao da produo. Coma manufatura, os artesos so reunidos num mesmo local de trabalho,passando a produzir mercadorias sob as ordens e vigilncia do

    capitalista (FRANCO, 1988).

    Nesse momento os artesos perdem seus meios de produo, passandoa submeter-se aos desgnios e explorao do capital. A produo de umamercadoria, que antes dependia da fora de trabalho de um s arteso, agora subdivida em vrias etapas, em que vrios desses trabalhadores participam doprocesso, cada um com uma funo especfica. No obstante, o arteso noperde totalmente o poder sobre o seu trabalho, pois a produo ainda dependiada capacidade artesanal e da habilidade individual de cada um. Isso socorrer numa fase seguinte com a implantao das mquinas que os

    substituram. A ocorre a expropriao total da fora de trabalho dessesartfices.

    A comparao que se faz com o texto de Franco de que esse momentose identifica com o processo educativo na medida em que as instituies deensino tanto privadas quanto pblicas abrigam vrios profissionais daeducao. Ocorre sobre os professores uma dominao formal, mas no real.Palhares explica que o capital comercial no controla o sistema de produo desaber, ou melhor, no se apropria desse saber, mas apenas explora a fora detrabalho docente (1988). O que se verifica nesse estgio que mesmo tendo

    vrios professores trabalhando numa mesma escola, seu trabalho no exigecooperao sendo todos individualizados. Um outro detalhe o de que aspossibilidades de explorao do trabalho docente ficam limitadas, uma vez quepara aumentar as possibilidades de lucro, seria necessrio ampliar no s ajornada de trabalho, como tambm o nmero de alunos. Outros aspectosrelacionados com essa fase dizem respeito ao alto custo de reproduo dessafora de trabalho, onde os altos investimentos reduzem as possibilidades delucro. Alm disso, o trabalho desse profissional apresenta baixa produtividade

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    devido ao reduzido nmero de alunos que podem ser atendidos por umprofessor.

    O terceiro estgio do desenvolvimento capitalista compreende ocapitalismo monopolista atravs da concentrao e centralizao de renda nasmos de pequenos grupos de empresas. Esse momento marcado por grandestransformaes no processo produtivo com a substituio da fora de trabalhohumana pelas mquinas, juntamente com os conhecimentos tcnico-cientficospara o aumento da lucratividade, sem falar na total diviso tcnica do trabalho.Ocorre a separao do vnculo entre produtor e produto, e, por conseguinte, otrabalhador (o arteso) perde definitivamente seu poder sobre o processoprodutivo. A dominao do capital ocorre tanto sobre a mo quanto sobre ocrebro do trabalhador, impingindo a estes a execuo de tarefas sem sentido,repetitivas e degradantes (PALHARES, 1988).

    No interior da fbrica uma tarefa subdividida entre os trabalhadores eexecutada de forma parcelada, de modo que o processo como um todo j noseja mais da competncia de um s trabalhador individual (ibid, ibidem). Essaforma de distribuio permite empresa estabelecer critrios de tempo epredeterminar uma produo seriada em larga escala. Como se v essa fase docapitalismo corresponde a uma produo sistemtica baseada na mecanizaopresente tanto na utilizao das mquinas quanto da fora de trabalho. Ficapatente nessa fase que o capital molda o perfil do trabalhador ideal paraampliar as perspectivas de lucro, ou seja, ao mesmo tempo em que qualifica e

    superqualifica um minoria, produz uma maioria de desqualificados. No raro,as qualidades requeridas para preencher uma vaga no passavam dahabilidade e velocidade com que se apertava um parafuso.

    Outro diferencial dessa fase capitalista a administrao que antes eraexercida pelo proprietrio, agora passa a ser realizada pela gerncia cientficafigurando assim, dois elementos: o proprietrio e o administrador. Todos osmtodos modernos e maquinarias sofisticadas colaboram para o planejamentoe controle do processo exclusivamente pela gerncia. O gerente rene em sitoda a responsabilidade tcnica e intelectual pelo processo fabril, inclusivesobre o trabalhador. Em momento posterior, ocorre a descentralizao dasdecises da gerncia, surgindo outros profissionais intermedirios nahierarquia produtiva tais como, supervisores, tcnicos de nvel mdio,contramestres, etc. O papel destes era o de fiscalizar, verificar o cumprimentodas normas tcnicas e de rendimento e observar se o plano de produoestabelecido est sendo cumprido (ibid, ibidem). A sua atuao refere-seainda:

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    a encontrar, de um lado, mecanismos de vigiar, punir e disciplinar afora de trabalho e, de outro, formar bons trabalhadores, convenc-losde que a empresa capitalista uma comunidade, que os interessesso os mesmos, enfim, que todos fazem parte de uma grande famlia(ibid, ibidem).

    Portanto, com a introduo dos intelectuais intermedirios a pirmidedo poder, ou estado-maior da empresa apresenta trs divises: na base est agrande massa de trabalhadores, no meio os intermedirios e no topo a gernciacientfica e proprietrios. Na verdade, os profissionais medianos so agentesexecutores, na medida em que sua funo fazer cumprir as determinaes dagerncia mediante a adeso do trabalhador s condies de trabalho impostas.

    No difcil perceber como essa logstica est presente no sistema

    educacional do pas. Uma tarefa que antes era dirigido unicamente peloprofessor agora foi dividido entre inmeros profissionais que vo dospedagogos, orientadores, coordenadores, nutricionistas, psiclogos, associaesde pais e mestres, etc. Enfim, o professor tornou-se incompetente para lidarcom vrias questes que envolvem a sua aula. Para isso, existem outrosprofissionais, para isso que eles existem. At mesmo sobre a aula a serministrada, em muitos casos o professor no tem mais autonomia. No manualde muitas instituies financiadas pelo capital encontra-se a instruo de comodeve ser a aula, o que avaliar, como avaliar. Nos tempos modernos, graas tecnologia nem mesmo a presena do professor mais obrigatria, as aulaspodem gravadas em mdia ou transmitidas por teleconferncia, ou ainda, pela

    Internet.

    Por esses e tantos outros motivos a docncia passa por uma crise deidentidade sem precedentes. O saber enciclopdico que outrora era marca evirtude do professor, hoje no mais interessa ao sistema moderno, devido aoseu alto custo de manuteno e reproduo. O capital se apossou desse saber enum sistema de proletarizao da profisso, o professor passou a ser mais umempregado da escola. A disputa por uma cadeira de professor, basicamente,gira em torno de salrios, de quem paga mais e de quem aceita receber menos.Mudar esse cenrio no tarefa fcil e nem imediata. Para isso, importante o

    movimento de conscientizao por parte dos professores, quanto smodificaes sofridas no interior da escola e sua estreita relao com o capital.

    No menos importante, a discusso do papel do professor nasociedade, enquanto educador, sua profissionalidade, seus saberes. Noesquecendo de que no final de todo esse processo est o aluno. Mas para issodeve-se ter em mente: Que educao se quer dar? E para quem? No nenhuma novidade que o capital ao financiar a educao de muitos jovens e

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    adultos, na verdade os est treinando para ocuparem postos em suas linhas deproduo. Porm, a verdadeira educao que forma cidados conscientes deseus direitos e deveres, de sua responsabilidade pelo planeta e pelas pessoasesta est sendo esquecida. Portanto, lutar por essa educao com foco no ser

    humano to importante quanto falar de luta por melhores condies detrabalho e salrios mais justos. Essa deve ser a bandeira por que todos nsdevemos lutar.

    3 Consideraes finais

    inegvel o poder das grandes transformaes impulsionadas pelocapitalismo desde o seu surgimento. O capital alavancou a revoluo tcnico-cientfica, no por fins altrusticos de seus proprietrios, antes disso, visando o

    acmulo em larga escala. Verificou-se o crescimento em vrias reas como aengenharia e construo civil, e com isso novas fbricas foram criadas e novascidades vo surgindo em torno dela. Ali se estabelecem os profissionais dediversas reas para atender quela comunidade que, posteriormente, iroconsumir os produtos da fbrica. E assim caminha a humanidade. Contudo, ocapital que cria tambm destri o meio-ambiente, financia a guerra, geramilhes de desempregados seja pelo fechamento de uma fbrica, seja peladesqualificao dos trabalhadores. Provoca a excluso de parcelas da sociedadea uma vida digna com educao, moradia, alimento, transporte e sade.

    Que fazer ento? Aceitar pacificamente o discurso cnico da globalizaode a vida assim mesmo? Ao contrrio, os professores devem,primeiramente, resgatar o conceito do que ser professor, tomarem conscinciada importncia de sua profisso, como agentes responsveis que so, pelaeducao do ser humano. No estamos falando da atual educao hojepropalada, que aliena, que destri, que disjunta, que nos torna irresponsveis.Mas, de uma educao integral do ser humano, que conscientiza, propicia visocrtica, que junta, que constri, que nos torna responsveis por ns e pelosoutros. S assim, atravs dessa ideologia de educao que se vislumbra oviver terreno, democrtico, onde todos participem e no apenas que tem mais,quem pode pagar mais. Isso o que se espera da educao do futuro.

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    4 Referncias

    FRANCO, Antnio de Carvalho.A escola do trabalho e o trabalho da escola. So Paulo: Cortez:

    Autores Associados, 1988. (Coleo polmica do nosso tempo).1S, Nicanor Palhares. O Aprofundamento das relaes capitalistas no interior da escola.Universidade Federal de Mato Grosso. Cad. Pesq. , So Paulo (57):20-29, maio 1986.