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FEMPAR – FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ VIVIAN HEY WESCHER REFLEXOS DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS NA INTERPRETAÇÃO DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E NA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO CURITIBA 2008

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FEMPAR – FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ

VIVIAN HEY WESCHER

REFLEXOS DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS NA INTERPRETAÇÃO DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E NA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

CURITIBA2008

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VIVIAN HEY WESCHER

REFLEXOS DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS NA INTERPRETAÇÃO DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E NA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Especialista em Ministério Público – Estado Democrático de Direito, na área de concentração em Direito Penal, Fundação Escola do Ministério Público do Paraná - FEMPAR, Faculdades Integradas do Brasil - UniBrasil.

Orientador: Prof. Ms. Marcelo Kintzel Graciano.

CURITIBA2008

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TERMO DE APROVAÇÃO

VIVIAN HEY WESCHER

REFLEXOS DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS NA INTERPRETAÇÃO DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E NA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de

Especialista no curso de Pós-Graduação em Ministério Público - Estado

Democrático de Direito, Fundação Escola do Ministério Público do Paraná -

FEMPAR, Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil, examinada pelo

Professor Orientador Marcelo Kintzel Graciano.

_____________________________

Prof. Ms. Marcelo Kintzel Graciano

Orientador

Curitiba, (dia mês e ano da aprovação).

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DEDICATÓRIA

Mais uma vez a eles: Margarida (in memoriam),Polaca (in memoriam), Pérola e Tiaguinho.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, sobretudo.Aos meus avós maternos e à minha mãe.

Ao Prof. Marcelo Kintzel Graciano, pela sua orientação.

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho,

em especial aqueles que me auxiliaramcom sua compreensão nos momentos difíceis.

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EPÍGRAFE

Chegará o dia em que o homem conheceráo íntimo de um animal. E, nesse dia,

todo o crime contra um animal será umcrime contra a humanidade.

Leonardo Da Vinci

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SUMÁRIO

RESUMO

INTRODUÇÃO…………………………………………………………………………………….. 10

1 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, VEDAÇÃO À PENAS CRUÉIS E RESPEITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS...........................................................

11

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS......................................................................................... 111.2 A QUESTÃO DA SÍNDROME DA IMUNO DEFICIÊNCIA ADQUIRIDA (AIDS) NO

CÁRCERE……………………………………………………………………………………...12

1.3 O POLÊMICO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO.............................................. 14

2 VEDAÇÃO À PENA DE TRABALHOS FORÇADOS....................................................... 16

2.1 TRABALHO COMO DIREITO OU OBRIGAÇÃO DO APENADO?................................ 162.2 A INCIDÊNCIA DOS DIREITOS SOCIAIS DO TRABALHO PREVISTOS NO ARTIGO 7º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.......................................................

17

3 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ........................................................................................ 20

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS......................................................................................... 203.2 SUA AUSÊNCIA NA TIPIFICAÇÃO DAS FALTAS DISCIPLINARES GRAVES............ 213.3 SUA INOBSERVÂNCIA NAS HIPÓTESES DE APLICAÇÃO DO RDD......................... 22

4 DEVIDO PROCESSO LEGAL EM PROCESSOS JUDICIAIS OU ADMINISTRATIVOS 24

4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE SUA INCIDÊNCIA NA EXECUÇÃO PENAL.................... 24

5 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA....................................................................................... 26

5.1 A CONTROVERTIDA PREVISÂO DA REGRESSÃO DO REGIME EM FUNÇÃO DA ACUSAÇÃO PELA PRÁTICA DE CRIME DOLOSO..............................................………... 26

5.2 A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO RDD AOS PRESOS PROVISÓRIOS.......... 285.3 O ISOLAMENTO PREVENTIVO DO EXECUTADO FALTOSO E A INCLUSÃO

PREVENTIVA NO RDD................................................................................................ 29

5.4 EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA.......................................................................... 29

6 INVIOLABILIDADE DA INTIMIDADE, DA VIDA PRIVADA, DA HONRA E DA IMAGEM DA PESSOAS............................................................................................….. 32

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6.1 INSTALAÇÃO DE CÂMERAS DE TELEVISÃO NOS PRESÍDIOS E A QUESTÃO DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO..................................................... 32

6.2 AS REVISTAS ÍNTIMAS NOS FAMILIARES DOS PRESOS....................................... 33

7 LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA, DE CRENÇA E DA MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO.................................................……………………………………………...

34

7.1 A RESSOCIALIZAÇÃO COMO DIREITO E NÃO DEVER DO APENADO………….... 34

8 INVIOLABILIDADE DO SIGILO DE CORRESPONDÊNCIA E DAS COMUNICAÇÕES TELEGRÁFICAS………………………………………………………....

37

8.1 SUA APLICAÇÃO NA EXECUÇÃO DA PENA.…………………………………………... 37

9 DIREITO ADQUIRIDO E COISA JULGADA……………………………………………….. 39

9.1 A POLÊMICA PREVISÃO DE PERDA DOS DIAS REMIDOS………………………….. 39

10 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO…………………………………………………... 42

10.1 ATRIBUIÇÕES CONFERIDAS PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA AO

MINISTÉRIO PÚBLICO……………………………………………………………………...42

10.2 POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS ACERCA DA ATUAÇÃO MINISTERIAL NA

EXECUÇÃO PENAL……………………………………………………………………… 43

10.3ATUAÇÃO DO PARQUET NA EXECUÇÃO PENAL A PARTIR DA

HIERARQUIA DAS NORMAS E DE SUAS ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS....46

CONSIDERAÇÕES FINAIS……………………………………………………………………… 49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS……………………………………………………………. 50

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INTRODUÇÃO

O principal intuito deste trabalho é fazer uma análise constitucional e

principiológica de alguns institutos afetos à Execução Penal, sem ignorar, contudo, a

atuação que o Ministério Público deve ter dentro dessa perspectiva.

Para o desenvolvimento da pesquisa, houve a necessidade de,

primeiramente delimitar as garantias constitucionais que seriam abordadas, bem

como evidenciar que a Constituição se situa no vértice do ordenamento jurídico,

para, a partir disso, se reportar a todas as implicações decorrentes da supremacia

da Lei Fundamental na interpretação da Lei de Execução Penal.

Tendo em vista o tema do trabalho abarcar o estudo de diversas garantias

constitucionais, optou-se por realizar uma análise específica de cada uma delas, em

capítulo próprio, e, no caso de garantias intrinsecamente relacionadas, fez-se um

estudo conjunto, no mesmo capítulo, a fim de demonstrar suas características e

funções, mas principalmente sua aplicabilidade no que tange ao processo

hermenêutico dos dispositivos contidos na Lei de Execução Penal.

No capítulo final do trabalho, examinou-se a atuação do Ministério Público

preconizada na Carta Magna, a qual privilegia a defesa da ordem jurídica, do regime

democrático, e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Destarte, com base

em tais incumbências apregoadas pela Constituição, procurou-se expor que o

Promotor de Justiça deve lançar mão de todos os instrumentos processuais cabíveis

para concretizar as garantias constitucionais, especialmente por estarem elas

vinculadas às ditas incumbências ministeriais. Nessa esteira, o principal objetivo que

se perquiriu foi o de explanar que o representante do Parquet, quando da sua

atuação na seara da Execução Penal, não deve tomar assento tão-somente como

um acusador, mas sim como verdadeiro fiscal da lei, notadamente fiscal das

garantias constitucionais.

10

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1 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, VEDAÇÃO À PENAS CRUÉIS E RESPEITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Prefacialmente impende mencionar que a dignidade da pessoa humana foi

reconhecida pelo Constituinte de 1988 não como um direito ou garantia fundamental,

mas sim como um princípio fundamental, expresso no artigo 1º, inciso III, da Carta

Magna. Em virtude disso é que se pode afirmar que ela serve de esteio para os

direitos e garantias fundamentais gizados na Constituição da República.

Com efeito, assim leciona Ingo Wolfgang SARLET:

... verifica-se que o dispositivo constitucional (texto) no qual se encontra enunciada a dignidade da pessoa humana (no caso, o artigo 1º, inciso III, da Constituição de 1988), contém não apenas mais de uma norma, mas que esta(s), para além de se enquadramento na condição de princípio (e valor) fundamental, é (são) também fundamento de posições jurídico-subjetivas, isto é, norma(s) definidora(s) de direitos e garantias, mas também de deveres fundamentais.1

Outrossim, o citado doutrinador define a dignidade da pessoa humana da

seguinte forma:

... temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.2

A partir desta conceituação, constata-se que o princípio fundamental da

dignidade da pessoa humana, além de, por óbvio, relacionar-se com os demais

direitos e garantias fundamentais, guarda uma ligação mais estreita com as

garantias da vedação de penas cruéis e de respeito à integridade física e moral dos

1 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988, p. 70.

2 Ibidem, p. 60 (grifo do autor).

11

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presos. Ora, e isso não haveria de ser diferente, na medida em que a imposição de

uma pena cruel, ou o desrespeito à integridade física e moral de um segregado,

implicaria evidente afronta à dignidade humana.

Nessa esteira, é que Luiz Vicente CERNICCHIARO adverte: “... a pena, em

si mesma e na sua execução, não pode ofender a dignidade do homem. Chegar-se-

á a essa situação se o condenado for submetido física e moralmente a tratamento

degradante”.3

Destarte, convém ainda salientar a consideração que Anabela Miranda

RODRIGUES faz sobre o tema, argumentando que a dignidade humana consiste na

“...base em que deve assentar qualquer construção de direito penal que vise

defender os direitos e liberdades fundamentais do indivíduo -, o que há-de constituir

o mais forte obstáculo erguido a um direito penal defensivo que degrada o criminoso

a mero meio de obter intimidação, e, com ela, a defesa da sociedade”.4

Dentro desse contexto, passa-se a analisar adiante, dois aspectos da

Execução Penal relacionados às garantias ora examinadas, quais sejam eles: a

presença do HIV nas prisões, e o Regime Disciplinar Diferenciado.

1.2 A QUESTÃO DA SÍNDROME DA IMUNO DEFICIÊNCIA ADQUIRIDA

(AIDS) NO CÁRCERE

Em artigo desenvolvido sobre o presente tema, Thaís Prestes VERAS

demonstrou através de alguns dados estatísticos, a alarmante incidência do

HIV/Aids nas prisões brasileiras.

Em São Paulo, no biênio 1993 – 94, a incidência de casos de HIV soropositivos era de cerca de 1 para cada 6 presos (a média da população do país era de 1 : 345 habitantes). No caso de AIDS, a proporção era de 1 : 52 presos (e na população geral era de 1 : 5344). No Rio Grande do Sul, um estudo de soroprevalência, realizado no presídio de Porto Alegre, registrou que 32,70% daquela população carcerária é portadora do HIV/AIDS e que 57,10% dos reclusos com tuberculose são soropositivos. O relatório das atividades do Hospital Penitenciário de Porto Alegre, no período de 1998 a maio de 1999, registrou 120 óbitos, 18 deles tiveram como causa mortis a AIDS e 27, problemas pulmonares. Segundo

3 CERNICCHIARO, Luiz Vicente. Direito Penal na Constituição, p. 142. 4 RODRIGUES, Anabela Miranda. A Posição Jurídica do Recluso na Execução da Pena Privativa

de Liberdade: seu fundamento e âmbito, p. 76.

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informações médicas, mortes obtidas por infecções pulmonares e por broncopneumonias, em geral podem estar relacionados com a AIDS. Enquanto fora do sistema prisional houve uma diminuição na “causa mortis” pela infecção pelo HIV, no sistema prisional constatou-se um acréscimo aproximado de 50%.5

De acordo com a referida autora, os principais fatores que dão azo a

tamanha presença do HIV/Aids nas prisões, são a questão da sexualidade e da

drogadição dentro dos cárceres.

Em função disso é que ela sustenta que cabe à direção dos presídios

promover o esclarecimento aos presos e aos seus parceiros, acerca dos métodos de

prevenção de doenças sexualmente transmissíveis.6 Ademais, com relação ao

consumo de drogas nas prisões, ela ressalta que “recentemente, um comitê de

especialistas da Organização Mundial da Saúde (OMS) utilizou o termo ‘Redução de

Danos’ no sentido de prevenir as conseqüências adversas do consumo de drogas,

sem objetivar primariamente a redução desse consumo. Uma das estratégias incluía

a troca de seringas usadas por seringas estéreis”.7

Segundo a mencionada pesquisadora, os presos portadores de HIV/Aids

sofrem uma dupla estigmatização: primeiro por cumprirem uma pena privativa de

liberdade, e segundo por pertencerem a um grupo minoritário vulnerável. Todavia,

ela destaca que assim como os demais encarcerados, os portadores de HIV/Aids

igualmente devem ter assegurados seus direitos, asseverando, nessa toada, que

eventual discriminação pode caracterizar uma tortura simbólica, implicando assim,

afronta à dignidade humana.8

Ademais, não se pode deixar de ressaltar, que a prática de qualquer ato

discriminatório representaria também uma ofensa à garantia da integridade moral do

preso. E por outro lado, no caso de o Estado não promover um tratamento médico

adequado ao preso portador de HIV/Aids, pode-se perquirir, além de vilipêndio à

dignidade humana, o desrespeito à integridade física do segregado.

5 VERAS, Thaís Prestes. HIV/AIDS e Cárcere: uma leitura de sua complexidade no contexto das Ciências Criminais, p. 371-372.

6 Ibidem, p. 374. 7 Ibidem, p. 375. 8 Ibidem, p. 377.

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1.3 O POLÊMICO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO

O regime disciplinar diferenciado (RDD) foi instituído no sistema de

Execução Penal Brasileiro por meio da Lei n º 10.792/20039, sendo que desde o seu

advento tem sido criticado por padecer do vício da inconstitucionalidade.

Com previsão no artigo 52 da Lei de Execução Penal10, a doutrina crítica

vem apontando diversas notas de inconstitucionalidade nessa nova modalidade de

sanção disciplinar que fora implementada no Brasil, inconstitucionalidades estas que

serão oportunamente examinadas no presente estudo. Por ora, analisar-se-á a

relação entre o isolamento celular previsto no RDD, e as garantias constitucionais da

dignidade humana, vedação de penas cruéis e respeito à integridade física e moral

dos presos.

Consoante preconizam os incisos I a IV do artigo 52 da LEP, o RDD possui

as seguintes características: 1) prazo máximo de 360 dias, sem embargo de nova

aplicação da sanção disciplinar na hipótese de falta grave de mesma espécie,

observado o limite de 1/6 da pena aplicada; 2) cumprimento da sanção disciplinar

em cela individual; 3) visitas semanais de 2 pessoas, além de crianças, por um

período de 2 horas; 4) saída da cela para banho de sol por 2 horas diárias.

Conforme se depreende do aludido dispositivo legal, o RDD prevê um

isolamento praticamente integral do indivíduo a ele submetido, sendo esta a principal

razão pela qual se sustenta que ele viola a dignidade humana, a integridade física e

moral dos encarcerados, e se constitui na imposição de pena cruel.

De acordo com Maria Thereza Rocha de Assis MOURA, “o regime

disciplinar diferenciado representa sobrepena cruel e degradante, que avilta o ser

humano e fere a sua dignidade, infligindo-lhe castigo físico e moral, na medida em

que impõe ao preso isolamento celular absoluto de vinte e duas horas diárias

durante um ano, prorrogável até 1/6 da pena.”11

9 BRASIL. Lei nº 10.792, de 1º de dezembro de 2003. Altera a Lei 7.210, de 11 de junho de 1984 – Lei de Execução Penal e o Decreto-Lei 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 02 dezembro 2003.

10 BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 julho 1984.

11 MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis. Notas Sobre a Inconstitucionalidade da Lei 10.792/2003, que Criou o Regime Disciplinar Diferenciado na Execução Penal, p. 287.

14

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Em verdade, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

concluiu em parecer, aprovado pela Resolução 10, que o RDD “promove a

destruição emocional, física e psicológica do preso, que submetido a isolamento

demasiadamente longo pode apresentar depressão, desespero, ansiedade, raiva,

alucinações, claustrofobia e, a médio prazo, psicoses e distúrbios afetivos graves”.12

Juarez Cirino dos SANTOS, por sua vez, afirma:

O regime disciplinar diferenciado de isolamento em cela individual até 1 (um) ano – renovável por mais 1 (um) ano, até o limite de 1/6 (um sexto) da pena – é inconstitucional, por várias razões: a) constitui violação da dignidade da pessoa humana, um dos princípio fundamentais do Estado Democrático de Direito, definido no art. 1º da Constituição da República; b) representa instituição de pena cruel, expressamente excluída pelo art. 5º, XLVII, letra ‘e’ da Constituição da República…13

Para Salo de CARVALHO e Christiane Russomano FREIRE, o RDD também

Ofende os princípios básicos previstos nas Regras Mínimas para Tratamento dos Reclusos: ‘serão absolutamente proibidos como punições por faltas disciplinares os castigos corporais, a detenção em cela escura, e todas as penas cruéis, desumanas ou degradantes’(art. 31). Não por outro motivo que a 68ª Assembléia Geral da ONU propôs a abolição do isolamento celular: ‘devem empreender-se esforços tendente à abolição ou restrição do regime de isolamento, como medida disciplinar ou de castigo’ (princípio 07).14

Infere-se, porquanto, à luz de um Estado Democrático de Direito, o qual tem

como um de seus pilares a dignidade humana, e como garantias fundamentais a

exclusão de penas cruéis e o respeito à integridade física e moral dos segregados,

que o regime disciplinar diferenciado não se coaduna com a Constituição de 1988,

nem tampouco com os princípios adotados pela Organização das Nações Unidas

(ONU) para o tratamento dos reclusos, e em função disso não pode ser admitido no

Sistema de Execução Penal Brasileiro. Assim sendo, cabe aos operadores do Direito

que atuam na Execução Penal, suscitar sua inconstitucionalidade pela via difusa e

dessa maneira deixar de aplicá-lo.

12 Trecho do parecer emitido pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, aprovado pela Resolução 10, apud Ibidem, p. 288.

13 SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral, p. 530 (grifo do autor). 14 CARVALHO, Salo de.; FREIRE, Christiane Russomano. O Regime Disciplinar Diferenciado: notas

críticas à reforma do sistema punitivo brasileiro, p. 280 (grifo dos autores).

15

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2 VEDAÇÃO À PENA DE TRABALHOS FORÇADOS

2.1 TRABALHO COMO DIREITO OU OBRIGAÇÃO DO APENADO?

O tema atinente ao trabalho no cárcere é disciplinado pela LEP nos artigos

28 a 37, e também é consignado no rol de deveres do condenado, em seu artigo 39,

inciso V, bem como no rol de direitos do preso, disposto no artigo 41, inciso II.

Depreende-se dos dispositivos legais acima citados, que a LEP ora trata do

trabalho do preso como uma obrigação (vide o previsto no artigo 31, caput), ora trata

dele como um dever (vide o teor do artigo 39, inciso V), e em um terceiro momento

preconiza o trabalho e a sua remuneração como direitos do apenado (nos termos do

artigo 41, inciso II). Em virtude disso, ao operador do Direito caber fazer uma

interpretação conforme a Constituição dos referidos artigos da LEP, com o escopo

de adequá-los à garantia constitucional da proibição da pena de trabalhos forçados,

insculpida no artigo 5º, inciso XLVII, alínea “c”, da Lei Fundamental.

Com efeito, Luiz Antônio Bogo CHIES assevera:

Não sendo a pena privativa de liberdade uma pena de trabalhos forçados (em nossa legislação inclusive tal modalidade punitiva é vedada pela Constituição em seu artigo 5º, XLVII, ‘c’) como se pode imputar ao apenado a obrigatoriedade da atividade laboral? ... Mesclando disposições de obrigatoriedade, dever e direito na relação entre preso e trabalho penitenciário, mas sobretudo ao inserir no artigo 31 uma obrigação ‘condicionada’ à medida das aptidões e capacidade do preso, temos que o conteúdo da LEP, em consonância com as disposições constitucionais acerca das penas (em especial os princípios de individualização e humanização – artigo 5º, XLVI e III – bem como à vedação de penas cruéis e de intervenções degradantes da pessoa humana – artigo 5º, XLVII e III), deve ser imperativamente interpretado como atribuidor e reconhecedor do caráter prioritário de direito, e, portanto, não de dever, do trabalho penitenciário.15

Andrei Zenkner SCHMIDT igualmente enfatiza que “... em relação ao

cumprimento das penas, a Constituição vedou, em seu art. 5º, inc. XLVII, c, a pena

de trabalhos forçados, assegurando, a qualquer apenado, o direito de trabalhar, e

não o dever de fazê-lo.”16 E na seqüência, o citado autor destaca a repercussão de

15 CHIES, Luiz Antônio Bogo. Prisão: Tempo, Trabalho e Remição. Reflexões motivadas pela inconstitucionalidade do artigo 127 da LEP e outros tópicos revisitados, p. 535.

16 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Direitos, Deveres e Disciplina na Execução Penal, p. 242 (grifo do autor).

16

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tal proibição constitucional em outros temas da Execução Penal, em que a questão

do trabalho do preso também se faz presente:

Não parece possível restringir-se a liberdade de alguém pelo simples fato de haver recusa para o trabalho. Assim, p. ex. (sic), a ninguém poderá ser vedado o livramento condicional só com base no fato de ter-se recusado a trabalhar (no art. 83, inc. III, do CP); da mesma forma, a exigência do art. 114, inc. I, da LEP e do art. 36, § 1º, 1 ª parte, do CP, deve ser revista, no sentido de que o regime aberto é concedido ao apenado a fim de que, se assim desejar, desenvolva atividades laborais durante o dia, apenas devendo recolher-se ao estabelecimento prisional durante a noite (art. 36, § 1º, in fine, do CP).17

A par de tais considerações, verifica-se que o trabalho do preso previsto na

LEP deve ser interpretado como um direito daquele, e não como uma obrigação.

Vale dizer, o estabelecimento prisional deve oportunizar a atividade laboral ao

encarcerado, e não coagi-lo a trabalhar.

2.2 A INCIDÊNCIA DOS DIREITOS SOCIAIS DO TRABALHO PREVISTOS NO

ARTIGO 7º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

Tomando por base que o trabalho do preso constitui-se em um direito, e

levando em consideração que a Constituição da República em nenhum momento

exclui os segregados dos direitos sociais nela previstos, não parece desarrazoado

argüir que estes indivíduos também fazem jus às garantias que são asseguradas

aos demais trabalhadores.

Nesta perspectiva, observa-se então, que muito embora o artigo 28, § 2º da

LEP disponha que o trabalho penitenciário não se submete às regras previstas na

Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o mesmo não se pode dizer no tocante

aos direitos sociais dos trabalhadores, gizados na Constituição. Dito de outro modo.

O fato de não se aplicar a CLT ao trabalho penitenciário não equivale a afirmar que

os direitos constitucionais dos trabalhadores também não se aplicam.

Não é outro o entendimento de Luiz Vicente CERNICCHIARO:

Em havendo contrato de trabalho, o presidiário tem direito igual ao de quem execute a mesma atividade, com direito à mesma remuneração e gozo de iguais direitos, como,

17 Ibidem, p. 243.

17

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exemplificativamente, o mesmo salário, férias e 13º salário. … O presidiário, como empregado, tem os mesmos direitos de quem não seja condenado, inclusive, insista-se, ao exercício de greve. Pouco importa que o trabalho se desenvolva fora ou no interior do estabelecimento penal. É útil repetir, o que conta, na passagem, não é a qualidade de condenado, submetido à medida provisória ou de preso provisório. Fundamental é a relação de trabalho. Esta, normalmente, é desenvolvida fora do estabelecimento penal, todavia, se executada no interior, só por isso, não retira os respectivos direitos.18

Nesse contexto, alguns autores aduzem que o quantum de remuneração

previsto pela LEP em seu artigo 29, caput, no importe de no máximo 3/4 do salário

mínimo, seria inconstitucional, haja vista que a Carta Magna assegura aos

trabalhadores um salário que não seja inferior ao salário mínimo. Assim se posiciona

Juarez Cirino dos SANTOS: “sobre a remuneração do trabalho carcerário deve ser

dito o seguinte: se o salário mínimo é determinação legal delimitada pela quantidade

de bens ou serviços que o trabalhador e sua família necessitam consumir para

sobreviver, então a previsão legal de remuneração equivalente a 3/4 (três quartos)

do salário mínimo, parece inconstitucional.”19

Corrobora com o mesmo entendimento o autor Andrei Zenkner SCHMIDT:

… É manifesta a inconstitucionalidade do disposto no art. 29, caput, da LEP, ao determinar que o trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a três quartos do salário mínimo. Se o inciso IV do art. 7º da CRFB/88 determina que ninguém poderá receber menos de um salário mínimo, não parece plausível tolerarmos que o preso, ao trabalhar, poderá receber 3/4 desse salário mínimo.20

Ademais, este doutrinador ressalta o direito às férias após um período de 12

meses de trabalho ininterrupto pelo preso, direito este que já vem sendo assegurado

aos reclusos na Itália.21 Destarte, ele também destaca o direito à licença-

paternidade: “… nessas situações, se o preso estiver trabalhando, terá direito, no

regime aberto e semi-aberto, a ausentar-se de suas atribuições, durante o prazo que

a lei estabelecer, para permanecer na companhia de seu filho recém-nascido, sendo

que tal período é computado como pena e, … para fins de remição.”22

Urge salientar, outrossim, que o reconhecimento dos direitos trabalhistas aos

encarcerados pode coibir a intenção velada dos empresários em obter mão-de-obra

barata e escrava nas prisões, mormente porque se faz presente a discussão acerca

18 CERNICCHIARO, Luiz Vicente. Op. Cit., p. 135-136. 19 SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. Cit., p. 523. 20 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 235-236 (grifo do autor). 21 Ibidem, p. 236, em nota de rodapé nº 44. 22 Ibidem, p. 236.

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da privatização dos presídios, a qual igualmente tem por objetivo travestido a

transformação do cárcere em fábrica.

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3 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Genericamente, o princípio da legalidade impões a fiel observância da lei e

preceitua que esta deve ser prévia, escrita, certa, estrita e necessária. Na Execução

da Pena, entretanto, tal princípio possui um alcance maior, na medida em que

também devem ser observadas as disposições contempladas na sentença penal

condenatória (artigo 1º, LEP), sendo vedado ao juiz da Execução modificá-las em

prejuízo do executado, conforme leciona Carmen Silvia de Moraes BARROS.23

Outrossim, o princípio em comento garante ao apenado os direitos não

consignados em sentença ou pela própria Lei de Execução Penal, conforme previsto

no artigo 3º da LEP. Pode-se afirmar, então, que o princípio da legalidade é o meio

pelo qual se atinge a segurança jurídica na execução penal. Assim entende José

Eduardo GOULART:

… Para o atendimento das disposições da sentença e igualmente dos fins da própria execução da pena, é necessário que a via executória se efetive em um regime de efetivas garantias ao interesse comunitário e aos direitos individuais. Para que isto se dê é imprescindível a vinculação da execução penal à Lei e ao Direito, enquanto aspecto essencial do caráter do Estado de Direito. Apenas dentro desse quadro é que a execução penal encontra legitimidade.24

Ora, consoante referiu José Eduardo GOULART, o princípio da legalidade é

inerente ao Estado Democrático de Direito. Portanto, impossível ser inobservado ou

rejeitado em qualquer esfera do Direito, quiçá na esfera Executória da Pena, que a

todo o momento trata de restrições de direitos. Carmen de Moraes BARROS

complementa, argüindo que “o princípio da legalidade se estende aos procedimentos

administrativos e às sanções disciplinares, para que haja infração disciplinar deve

haver prévia definição legal (sic) – inadmissível a meramente administrativa contida

23 BARROS, Carmen S. de M. A Individualização da Pena na Execução Penal, p. 131. 24 GOULART, José Eduardo. Princípios Informadores do Direito da Execução Penal, p. 91-92.

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nos regimentos internos dos presídios – da tipicidade, do caráter e da duração da

sanção.”25

Na mesma esteira segue a lição de Ela Wiecko V. de CASTILHO, a qual

enfatiza que “importa também na reserva legal dos direitos e deveres, das faltas

disciplinares e sanções correspondentes, a serem estabelecidas de forma taxativa, à

semelhança da previsão de crimes e penas no Direito Penal. As restrições de

direitos ficam sob reserva legal, evitando-se o uso de conceitos de sentido aberto.”26

E José Eduardo GOULART arremata:

… O que importa fixar é que, restrições a direitos do condenado operadas a partir de limitações vagas ou imprecisas, venham elas da sentença condenatória ou da interpretação a que ela se dê, ou ainda, da errônea aplicação da própria lei de execução (sic), são ilegítimas por vulnerarem o princípio da reserva de direitos do sentenciado na execução da pena.27

Nessa toada, passa-se a analisar nos tópicos seguintes, alguns aspectos da

LEP em que o princípio em estudo fora inobservado.

3.2 SUA AUSÊNCIA NA TIPIFICAÇÃO DAS FALTAS DISCIPLINARES GRAVES

O artigo 50, inciso I, da LEP, dispõe que, “comete falta grave o condenado à

pena privativa de liberdade que: I – incitar ou participar de movimento para subverter

a ordem ou a disciplina”.

O comando legal em exame tipifica uma hipótese de falta grave na qual se

constata imprecisão no significado da expressão “subverter a ordem ou a disciplina”,

no sentido de que não há como se saber qual conduta estaria apta a subverter a

ordem ou a disciplina. Desse modo, vislumbra-se uma flagrante contrariedade ao

princípio da legalidade, o qual enuncia que não há crime, e nem pena, sem lei certa.

Adverte Andrei Zenkner SCHMIDT:

25 BARROS, Carmen S. de M. Op. Cit., p. 131. 26 CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Controle da Legalidade na Execução Penal, p. 25. 27 GOULART, José Eduardo. Op. Cit., p. 94 (grifo do autor).

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Essa polissemia legislativa,… (que se presta, na verdade, para reprimir motins injustificados), acaba por legitimar verdadeiros arbítrios punitivos que freqüentemente são verificados no curso da execução penal, como são os casos de o preso encontrar-se embriagado, entrar em greve de fome etc. (sic). Note-se que a norma estabelece, como situação de falta grave, uma capitulação legal que não é determinada e, sequer, determinável por critérios lingüísticos anteriores a qualquer fato investigado.28

O artigo 50, inciso IV, da LEP, por sua vez, preconiza que “comete falta

grave o condenado à pena privativa de liberdade que: IV – provocar acidente de

trabalho”. Contudo, o termo “acidente” equivale a dizer que se está diante de um

dano causado involuntariamente. Assim sendo, vislumbra-se violação ao princípio da

legalidade, eis que a punição seria desnecessária (não há crime, nem pena, sem lei

necessária), sendo que esta, nesse caso, prestigiaria o desvalor do resultado, e não

da ação. Ademais, fora das prisões um dano culposo configura tão-somente um

ilícito civil, com a obrigação de reparar os danos causados. Em razão disso, o que

se poderia exigir do condenado seria uma indenização, mas jamais valer-se de tal

ato para basear uma medida privativa de liberdade.29

3.3 SUA INOBSERVÂNCIA NAS HIPÓTESES DE APLICAÇÃO DO RDD

De acordo com o artigo 52 da LEP, o RDD poderá ser aplicado nas

seguintes hipóteses: 1) quando o fato previsto como crime doloso gerar subversão

da ordem ou disciplina; 2) quando o preso apresentar alto risco para a ordem e a

segurança do estabelecimento prisional ou da sociedade; 3) e quando houverem

fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em

organizações criminosas, quadrilha ou bando.

Infere-se das hipóteses apresentadas, uma evidente dubiedade na

significação das palavras empregadas pelo legislador, que culmina, em última

análise, em afronta ao princípio da legalidade, o qual impõe à lei seja certa.

Nesse sentido segue o pensamento de Juarez Cirino dos SANTOS:

28 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 255-256 (grifo do autor). 29 Ibidem, p. 256.

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… A indeterminação das hipóteses de aplicação do regime disciplinar diferenciado infringe o princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, da Constituição da República), porque subordina a aplicação da sanção disciplinar a critérios judiciais subjetivos e idiossincráticos: primeiro, é indeterminável a quantidade de alteração necessária para configurar o conceito de subversão da ordem ou da disciplina (art. 52, LEP); segundo, é indeterminável a quantidade de risco definível como alto para a ordem e segurança da prisão ou da sociedade (art. 52, § 1º, LEP); terceiro, é indefinível o conceito de fundadas suspeitas de envolvimento ou participação em organizações criminosas, quadrilha ou bando (art. 52, §2º, LEP).30

Maria Thereza Rocha de Assis MOURA explica que:

É fundamental que a análise do que seja ‘alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal’ e ‘alto risco para a sociedade’ seja feita pelo juiz da execução, já que aludidas expressões são excessivamente vagas e abertas, além do que a lei não elenca qualquer conduta prisional que possa ser mensurada como sendo de elevado risco para a ordem e a segurança do estabelecimento ou da sociedade. E, convenhamos, falar em ‘fundadas suspeitas de envolvimento ou participação’ é dizer o nada. A propósito, teria sido bom que o legislador esclarecesse se as fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organização criminosa, quadrilha ou bando deve dizer respeito à vida prisional, ou ao crime pelo qual o preso é processado ou foi condenado.31

A par do que foi aventado, observa-se outra nota de inconstitucionalidade do

RDD. Dessa vez, nas hipóteses para sua aplicação, as quais se revelam

demasiadamente imprecisas, possibilitando a prática de arbítrios que podem implicar

grave restrição de liberdade.

30 SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. Cit., p. 530 (grifo do autor). 31 MOURA, Maria Thereza R. de A. Op. Cit., p. 290-291.

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4 DEVIDO PROCESSO LEGAL EM PROCESSOS JUDICIAIS OU ADMINISTRATIVOS

4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE SUA INCIDÊNCIA NA EXECUÇÃO PENAL

Primeiramente insta consignar que o Processo de Execução Penal goza de

natureza jurisdicional (em que pese verificarem-se em algumas passagens da LEP,

resquícios de administrativização32), na medida em que a Carta Magna conferiu aos

presos quase que a totalidade de direitos33 conferidos aos demais cidadãos. Desse

modo, pode-se afirmar, pois, que a Constituição de 1988 concebeu-os como sujeitos

de direitos, o que culmina em reconhecê-los, no bojo do Processo de Execução

Penal, como sujeitos da execução, e não como meros objetos da execução.

Dentre outras decorrências da jurisdicionalização da Execução Penal, pode-

se citar como a principal delas, o devido processo legal.

Carmen BARROS enfatiza que “tendo, pois, o processo de execução penal

natureza jurisdicional, o condenado, como parte ou sujeito da relação processual, é

titular de direitos, sendo-lhe assegurado o direito a um processo de execução penal

com todas as garantias”.34 Segundo a mencionada autora, tais garantias abrangem:

“... juiz natural e imparcial, contraditório com produção de provas, ampla defesa com

assistência técnica indispensável, decisões adequadamente fundamentadas, duplo

grau de jurisdição e direito a um processo sem dilações indevidas”.35 A autora ainda

assevera que as garantias derivadas do devido processo legal devem ser

asseguradas também nos procedimentos administrativos, tendo em vista o teor do

artigo 5º, LV, da Constituição da República, e do artigo 59 da Lei de Execução

Penal.36 Sobre isso, Andrei Zenkner SCHMIDT destaca:

Mesmo para os adeptos do sistema de execução penal administrativizado, também os PADs deveriam-se sujeitar ao devido processo legal substancial, pela via dos recursos assegurados em lei. Essa é a releitura que deve ser conferida ao art. 59 da LEP, cujas

32 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 220.33 À exceção do direito à ampla liberdade, e do direito ao voto. 34 BARROS, Carmen S. de M. Op. Cit., p. 134.35 Idem (grifou-se). 36 Ibidem, p. 135.

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conseqüências, de uma maneira geral, são as seguintes: todo preso tem o direito a ser representado por advogado durante a tramitação do processo disciplinar, sendo, conseqüentemente, dever do Estado a respectiva nomeação caso não tenha ele defensor constituído; o preso, por seu advogado, possui o direito de requerer a produção de provas durante o processo; antes de proferida a decisão, é cogente a abertura de prazo para a apresentação das alegações de defesa, por escrito (esse é um recurso necessário para o controle da legalidade do processo); toda decisão há de ser fundamentada. A inobservância desses ditames acarreta a nulidade absoluta do processo disciplinar.37

O mesmo autor ainda alerta que é inadmissível se tolerar que uma

autoridade administrativa detenha competência para infligir ao executado uma

sanção disciplinar que pode implicar em restrição de liberdade, cabendo ao Juiz tão-

somente a homologação da decisão administrativa. Em verdade, ele argumenta que

os processos disciplinares devem tramitar em Juízo, nas dependências da Vara de

Execução Penal da Comarca, e não no âmbito do estabelecimento prisional. Por fim,

sugere:

… Enquanto o processo administrativo disciplinar não é deslocado da casa prisional para o fórum, devem as autoridades judiciais determinar aos responsáveis pelo estabelecimento penal que toda aplicação de punição disciplinar será requerida ao juízo da execução penal que, por sua vez, ficará responsável pelo respeito ao contraditório, ampla defesa e demais garantias constitucionais asseguradas aos presos. Trata-se de solução simples que compatibiliza a LEP com os ditames constitucionais…38

Com efeito, trata-se de medida que se afigura, acima de tudo, condizente

com um Estado Democrático de Direito.

37 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 262-263 (grifo do autor). 38 Ibidem, p. 264.

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5 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

5.1 A CONTROVERTIDA PREVISÂO DA REGRESSÃO DO REGIME EM FUNÇÃO

DA ACUSAÇÃO PELA PRÁTICA DE CRIME DOLOSO

A regressão de regime decorrente da prática de conduta definida como

crime doloso tem gerado certa celeuma entre os doutrinadores do Direito da

Execução Penal, em razão do art. 118, inciso I, 1ª parte da LEP ter sido redigido de

forma um tanto quanto simplista. A problemática reside na exigência ou não de uma

sentença condenatória com trânsito em julgado, antes de ser proferida decisão

determinando a regressão de regime ao apenado.

Segundo Renato MARCÃO, “não é necessário que o crime doloso tenha

sido objeto de sentença condenatória transitada em julgado. Não ocorre, na

hipótese, violação ao princípio da presunção de inocência ou estado de inocência”.39

Compactua da mesma opinião Haroldo Caetano da SILVA: “evidente que não

demonstra adaptação ao regime mais brando o condenado que, beneficiado com a

progressão ou mesmo iniciando a execução da pena em regime não severo, vem a

cometer crime doloso. Não se exige, nesse caso condenação pelo crime praticado.

A simples prática do crime é razão suficiente para a medida.”40

Em abono a tais entendimentos, concorre Julio Fabbrini MIRABETE, o qual

consigna que “não é necessário que o crime doloso tenha sido objeto de sentença

condenatória transitada em julgado. Quando a lei exige a condenação ou o trânsito

em julgado da sentença é ela expressa a respeito dessa circunstância, como aliás o

faz no inc. II do art. 118.”41

Entretanto, alguns doutrinadores têm manifestado entendimento diverso,

como Carmen Silvia de Moraes BARROS: “no que tange ao art. 52 da LEP, há que

se observar que, para que não seja evidentemente inconstitucional por ferir o

princípio da ´presunção de inocência´, a única interpretação que lhe pode ser dada é

39 MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal, p. 145 (grifo do autor). 40 SILVA, Haroldo Caetano. da. Manual da Execução Penal, p. 171 (grifo do autor). 41 MIRABETE, Julio F. Execução Penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 486.

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que a prática de fato previsto como crime constitui falta grave desde que haja

sentença penal condenatória transitada em julgado.”42

Maurício KUEHNE, reportando-se a uma eventual absolvição advinda do

novo crime, relata:

Quando dirigimos a Colônia Penal Agrícola Manoel Ribas, deparamo-nos com situações onde ficou constatado que as imputações eram graciosas, matéria entretanto que demandou exame de todo um contingente probatório, com sérios prejuízos aos réus. Este aspecto se encontra bem salientado no trabalho referido, desrecomendando, assim, a regressão imediata. ... A regressão, sem dúvida, só com a condenação.43

Nessa linha Simone SCHROEDER aduz:

O legislador, no art. 118 da Lei nº 7.210/84, referendou que o condenado ter ´praticado´ fato definido como crime doloso ensejaria a regressão para regime prisional pior, sustenta-se a infringência dos princípios Constitucionais, pois implicaria num pré-julgamento do réu, ao equiparar a sentença condenatória com trânsito em julgado, com os mesmo efeitos de uma prática delituosa, sem a devida instrução processual. Perquire-se da violação dos princípios do devido processo legal, ampla defesa e do contraditório, inclusive o princípio da presunção de inocência ...44

Vale mencionar também o pensamento de Ricardo Luiz da Costa TJADER,

o qual adverte que “a prática de nova infração criminosa somente gera regressão de

regime... após a existência da respectiva sentença condenatória transitada em

julgado, por respeito aos princípios constitucionais do devido processo legal e da

igualdade de todos perante a lei...”45

Depreende-se, pois, que os fundamentos nos quais se baseiam os

doutrinadores favoráveis à regressão nos termos do art. 118, I, 1ª parte, da LEP, não

se coadunam com os princípios e garantias insculpidos na Carta Magna pátria,

principalmente com o princípio da presunção de inocência. Ademais, têm como

ponto inicial uma mera interpretação literal do comando legal, em que não se leva

em consideração o sistema normativo, mas principalmente não se invoca a norma

que está no ápice do ordenamento jurídico e que jamais deve deixar de ser

42 BARROS, Carmen S. de M. Op. Cit., p. 162. 43 KUEHNE, Maurício. Lei de Execução Penal Anotada, p. 377-378. 44 SCHROEDER, Simone. Regressão de Regime: uma releitura frente aos princípios constitucionais,

p. 491. 45 TJADER, Ricardo Luiz da Costa. As Garantias Individuais e a Regressão do Regime de Pena.

Boletim Informativo do Instituto de Pesquisas Jurídicas Bonijuris, p. 1738.

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observada: a Constituição (notadamente no que diz respeito ao princípio da

presunção de inocência, trazido em seu bojo).

5.2 A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO RDD AOS PRESOS PROVISÓRIOS

Segundo reza o artigo 52 da LEP, o RDD se aplica não só aos presos

condenados, mas também aos presos provisórios, em flagrante infringência aos

ditames do princípio constitucional da presunção de inocência.

Ora, se parte da doutrina já critica severamente a possibilidade de imposição

do regime disciplinar diferenciado para os condenados, por implicar uma série de

inconstitucionalidades, quiçá no que se refere à sua aplicação aos segregados

cautelares, a qual culmina com mais uma ilegalidade, qual seja, a violação à

garantia de estado de inocência.

Nesse sentido, leciona Maria Thereza Rocha de Assis MOURA:

Não há dúvida de que submeter aquele que não foi definitivamente condenado a condições que ferem a dignidade humana, pelo prazo de 1/6 da pena que sequer foi aplicada, constitui insuportável ilegalidade, além de afrontar a garantia constitucional da não-consideração prévia de culpabilidade, inserto no art. 5º, LVII, da Constituição da República.46

Em virtude disso, defende-se uma releitura do disposto no artigo 52 da LEP,

a fim de que seu texto se amolde à garantia da presunção de inocência, por

intermédio do processo denominado “filtragem constitucional”, e, por conseguinte o

RDD deixe de ser aplicado aos presos provisórios.

46 MOURA, Maria Thereza R. de A. Op. Cit., p. 288.

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5.3 O ISOLAMENTO PREVENTIVO DO EXECUTADO FALTOSO E A INCLUSÃO

PREVENTIVA NO RDD

De acordo com a inteligência do artigo 60 da LEP, durante o procedimento

disciplinar a autoridade administrativa poderá determinar o isolamento preventivo do

executado faltoso, e, nos casos de apuração das hipóteses de RDD, o juiz da

execução poderá ordenar a inclusão preventiva do preso nessa modalidade de

sanção disciplinar. Tratam-se, em verdade, de medidas cautelares que se podem

dizer similares à prisão preventiva do processo penal de conhecimento. Em virtude

disso é que se sustenta que ambos devem obedecer a requisitos, tal como ocorre

com a prisão preventiva, principalmente para se evitar eventual vilipêndio à

presunção de inocência. Sobre isso, Andrei Zenkner SCHMIDT afirma:

… o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, inc. LVII) impede que a sanção disciplinar seja aplicada antes do término do respectivo processo. Consequentemente, também o art. 60 da LEP… deve sofrer uma releitura a partir da garantia constitucional referida, caso em que teremos de fundamentar o isolamento preventivo do faltoso em seu fundamento cautelar, nos moldes estabelecidos pela lei processual penal (art. 312 do CPP), e não como uma espécie de antecipação de tutela disciplinar. Por essa razão, e considerando-se a limitação da liberdade produzida pelo cárcere, parecem ser remotos os casos em que o isolamento cautelar torna-se necessário.47

5.4 EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA

Não obstante o artigo 105 da LEP estabelecer expressamente que a

execução da pena se inicia com a expedição da guia de recolhimento, a qual, por

seu turno, pressupõe o trânsito em julgado da sentença condenatória,

convencionou-se nos Tribunais brasileiros a admissão da chamada execução

provisória ou antecipada da pena, quando a sentença ainda não transitou em

julgado por força da interposição de recurso sem efeito suspensivo. Tal

entendimento encontra-se inclusive na Súmula nº 267 do Superior Tribunal de

47 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 263 (grifo do autor).

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Justiça, a qual enuncia que “a interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra

decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão”.

Ocorre que essa prática corriqueira de alguns Tribunais vai de encontro com

a garantia constitucional da presunção de inocência. Por esse motivo, a 6ª Turma do

Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus nº 25.310, cujo

acórdão fora publicado em 1º de fevereiro de 2005, trouxe a lume o debate em torno

da execução antecipada da pena, sendo que o ministro Nilson Naves chegou a

sugerir que a citada Súmula fosse alterada, para que a expedição do mandado de

prisão somente ocorresse caso a segregação fosse justificada pelo juiz, nos moldes

do que se dá com a prisão preventiva.48 E nessa linha vêm sendo emanadas as

decisões atuais do STJ, conforme se infere dos acórdãos referentes aos Habeas

Corpus nº 47.541, julgado em 16 de setembro de 200849, e nº 98.564, julgado em 26

de maio de 200850.

Destarte, importa consignar que tal entendimento do STJ se coaduna com as

manifestações do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria, o qual sinalizou que a

execução provisória da pena é incompatível com o texto constitucional da presunção

de inocência, consoante se denota dos julgamentos dos Habeas Corpus nº 94.95151

48 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 25.310. 6ª Turma. Rel. Min. Paulo Medina. Brasília, DF, 26 de outubro de 2004. Publicado no Diário de Justiça em 1º de fevereiro de 2005.

49 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 47.541. 5ª Turma. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. Brasília, DF, 16 de setembro de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 20 de outubro de 2008.

50 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 98.564. 6ª Turma. Rel. Min. Jane Silva. Brasília, DF, 26 de maio de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 09 de junho de 2008.

51 DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE EXPRESSAMENTE RECONHECIDO NA SENTENÇA. CONCESSÃO. 1. A despeito de mantida a condenação do paciente no julgamento do recurso de apelação, havia sido expressamente assegurado seu direito de recorrer em liberdade na sentença condenatória. Não havendo qualquer fato superveniente que ensejasse a aplicação do disposto no art. 312, do Código de Processo Penal, deveria ter sido mantido tal direito até o trânsito em julgado da condenação. 2. O título da prisão do paciente somente poderá decorrer do trânsito em julgado da sentença condenatória, não podendo se cogitar de execução provisória da sentença. 3. Registro, ainda, a existência de orientação nesta Corte no sentido de não admitir a execução provisória da pena privativa de liberdade quando houver interposição e recebimento de recurso especial e/ou recurso extraordinário (RHC 89.550/SP, rel. Min. Eros Grau, DJ 27.04.2007), ressalvada minha posição pessoal. … (Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 94.951. 2ª Turma. Rel. Min. Ellen Gracie. Brasília, DF, 07 de outubro de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 24 de outubro de 2008, grifou-se).

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e nº 85.41752, ambos pela Segunda Turma, no qual foram relatores a Ministra Ellen

Gracie e o Ministro Eros Grau, respectivamente.

Assim, verifica-se que as Cortes Superiores ajustaram o posicionamento

jurisprudencial permissivo da execução provisória da pena, à garantia constitucional

da presunção de inocência, a qual se constitui em um dos pilares de um Estado

Democrático de Direito.

52 HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA "EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA". ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O art. 637 do CPP estabelece que "[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença". A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". 2. Daí a conclusão de que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210/84, além de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP. 3. Disso resulta que a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4. A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão. 5. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados --- não do processo penal. A prestigiar-se o princípio constitucional, dizem, os tribunais [leia-se STJ e STF] serão inundados por recursos especiais e extraordinários, e subseqüentes agravos e embargos, além do que "ninguém mais será preso". Eis o que poderia ser apontado como incitação à "jurisprudência defensiva", que, no extremo, reduz a amplitude ou mesmo amputa garantias constitucionais. A comodidade, a melhor operacionalidade de funcionamento do STF não pode ser lograda a esse preço. 6. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade. É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual Ordem concedida. (Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 85.417. 2ª Turma. Rel. Min. Ellen Gracie. Rel. Min. Para o Acórdão Eros Grau. Brasília, DF, 02 de setembro de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 14 de novembro de 2008, grifou-se).

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6 INVIOLABILIDADE DA INTIMIDADE, DA VIDA PRIVADA, DA HONRA E DA IMAGEM DAS PESSOAS

6.1 INSTALAÇÃO DE CÂMERAS DE TELEVISÃO NOS PRESÍDIOS E A

QUESTÃO DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO

O discurso midiático proferido pelas autoridades públicas afetas ao sistema

prisional, que se escoram na falaciosa justificativa do “interesse social”, tem

produzido projetos que visam a instalação de câmeras de televisão nos presídios53 e

até mesmo o monitoramento eletrônico dos presos que deixam as prisões.54

Com efeito, a garantia constitucional de inviolabilidade da intimidade, da vida

privada, da honra e da imagem das pessoas, justamente por possuir status

constitucional, e para além disso, de cláusula pétrea, não sucumbe frente a essa

retórica leviana.

Nesse sentido segue a lição de Andrei Zenkner SCHMIDT:

Outra garantia constitucional que há de ser ressaltada é a prevista no inciso X do art. 5º, que se refere à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. O assunto tem especial relevância, até mesmo porque há discursos jurídicos sendo produzidos,…, no sentido da instalação de câmeras de televisão no interior dos estabelecimentos prisionais ou de monitoramento eletrônico de presos. Parece que tais medidas não podem subsistir, não só por razões éticas como, ademais, por razões jurídicas. A primeira delas é que o direito à intimidade é um direito individual, considerado cláusula pétrea pela Constituição e ínsito à dignidade da pessoa humana…, cujo efeito é a invalidação de qualquer projeto de lei que tendesse a aboli-la.55

A par disso, constata-se que todas as regulamentações estaduais que têm

admitido a instalação de câmeras nos presídios, assim como o Projeto de Lei nº

1.288/2007 que pretende implantar o sistema de rastreamento eletrônico de

53 Veja-se, por exemplo, a opinião emitida pelo Promotor de Justiça gaúcho Fábio Medina Osório, transcrita no trabalho de SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 270-271, nota de rodapé nº 30.

54 BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei nº 1.288/200. Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, para prever a utilização de equipamento rastreamento eletrônico pelo condenado nos casos em que a lei especifica. Rel. Deputado Flávio Dino.

55 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 226-228 (grifou-se).

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condenados, são flagrantemente inconstitucionais, por violarem as garantias acima

citadas.

6.2 AS REVISTAS ÍNTIMAS NOS FAMILIARES DOS PRESOS

Parece mais grave ainda do que a instalação de câmeras e monitoramento

eletrônico de condenados, a questão das revistas íntimas nos familiares que vão

semanalmente visitar os presos. Isto porque pessoas das mais diversas idades são

expostas a uma situação extremamente vexatória, conforme assevera Andrei

Zenkner SCHMIDT:

Embora o direito lesado não diga respeito, propriamente, ao preso, mas sim a seus familiares, não parece válida a exposição de pessoas ao ridículo, a pretexto de rastrear a entrada de armas ou drogas no interior dos estabelecimentos prisionais. Por certo, talvez até conseguiríamos controlar rebeliões, mas o preço pago por tal controle é deveras alto. Particularmente, prefiro tolerar duas ou três rebeliões ou fugas por ano do que expor milhares de pessoas, nesse mesmo ano, ao constrangimento de terem de se despir perante policiais ou agentes penitenciários e exporem genitálias e outras partes íntimas do corpo humano. Há outros mecanismos, menos lesivos, de controle de violência no interior dos presídios (p. ex., com o uso de detectores de metais).56

Dessa forma, tem-se que nos locais onde não existem esses equipamentos

aptos a constatar a presença de armas e drogas, não se deve proceder a revistas

íntimas, sob pena de se lesar a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem dos

familiares dos presos.

56 Ibidem, p. 228 (grifou-se).

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7 LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA, DE CRENÇA E DA MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO

7.1 A RESSOCIALIZAÇÃO COMO DIREITO E NÃO DEVER DO APENADO

O artigo 1º da Lei de Execução Penal determina que ao lado do fiel

cumprimento das disposições da sentença penal condenatória, a Execução Penal

tem como escopo a ressocialização do indivíduo. Assim é que toda a LEP é guiada

por esse prisma do discurso ressocializador. Todavia, o que se questiona é se a

imposição da ressocialização seria legítima ou não em um Estado Democrático de

Direito, pautado pelas garantias constitucionais de liberdade de consciência e de

crença (art. 5º, inciso VI), bem como da livre manifestação do pensamento (art. 5º,

inciso IV).

Com efeito, Bruno HERINGER JUNIOR frisa que “…a liberdade de

consciência corresponde a uma das heranças mais significativas do liberalismo

moderno, qual seja, a positivação do princípio da secularização, que garante a

reserva das atitudes internas, impedindo a confusão entre Direito e Moral”.57

Entretanto, o aludido autor adverte que tal garantia constitucional visa a

assegurar não só a liberdade de consciência e personalidade internas, como

também a exteriorização disso pelo indivíduo.58 E mais adiante ele conclui que “ao

tratar a pessoa humana como fim, e não como meio, como sujeito, e não como

objeto, o Estado Democrático de Direito busca proteger não apenas a sua vida

corpórea, mas também favorecer a procura pela própria felicidade”.59

A partir disso, pode-se afirmar que a liberdade de consciência e de crença, e

a livre manifestação do pensamento são garantias que guardam estreita relação

entre si, na medida em que tanto uma como outra, possuem como objetivo comum

salvaguardar a exteriorização e os valores íntimos relativos à consciência,

personalidade e opinião das pessoas.

57 HERINGER JUNIOR, Bruno. A Liberdade de Consciência na Constituição de 1988, p. 09. 58 Idem. 59 Ibidem, p. 10.

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Andrei Zenkner SCHMIDT, ao discorrer sobre elas, sintetiza que “… tais

garantias têm em mira assegurar ao indivíduo a liberdade de pensar aquilo que

melhor lhe aprouver e, a partir disso, ser uma pessoa boa ou má, educada ou não-

educada.”60

E é nesse aspecto que se verifica um conflito entre as garantias

constitucionais em exame, e a finalidade ressocializadora da Execução Penal, tendo

em vista que da leitura da LEP, depreende-se o evidente intuito de transformar o

executado em uma pessoa boa, disciplinada, bem educada, e apta a viver em

sociedade.

Em verdade, Natalia Gimenes PINZON alerta: “… questionamos a

ressocialização enquanto imposição de crenças ou convicções íntimas ao recluso,

principalmente quando essa imposição vem mascarada com determinada

concepção religiosa…”.61 Ainda de acordo com a mesma autora, o Estado não pode

ter a pretensão de querer transformar o condenado em um “bom pai de família”,

posto que isso implica violação aos seus direitos fundamentais atinentes à liberdade

de consciência e à própria dignidade humana. Entretanto, ela adverte que tal

posição não significa que o Estado deve se afastar da prestação de direitos sociais,

os quais possibilitam que o condenado não pratique mais crimes, se assim ele

desejar.62

Andrei Zenkner SCHMIDT, aponta como conclusão que:

Ao preso deve ser conferido o direito de, se assim desejar, ressocializar-se. A ninguém é dado o direito de obrigar outrem a pensar desta ou daquela maneira, mas sim, apenas, de regular condutas que sejam concretamente lesivas a interesses alheios… Disso tudo decorre que a ressocialização não é finalidade da pena, não é um dever imposto aos condenados; a ressocialização é, quando muito, um direito do apenado, ou seja, trata-se de uma série de mecanismos oferecidos pelo Estado ao criminoso, que, se assim desejar, poderá aquiescer na submissão ao programa.63

Desse modo, sustenta-se que os dispositivos da LEP que têm como norte a

imposição da ressocialização, com o flagrante objetivo de intervir na liberdade

interna do executado, devem ser interpretados conforme as garantias constitucionais

acima comentadas, sob pena de serem declarados como não recepcionados pela 60 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 215. 61 PINZON, Natalia Gimenes. O Discurso Ressocializador e o Princípio da Dignidade da Pessoa

Humana, p. 295-296. 62 Idem. 63 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 216 (grifo do autor).

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Carta Magna de 1988. Nessa perspectiva, traz-se à colação o pensamento do autor

acima citado:

A Lei de Execução Penal não pode determinar o dever de o preso ser um cidadão bom, disciplinado, obediente, urbano, respeitador, socializado, trabalhador, capaz de perceber seus erros, solidário, grato e, por fim, higiênico, mas sim o direito de ele, se assim desejar, buscar o melhor caminho para que a sua personalidade adeqúe-se a estes valores que, só por estigmatização, os presos não possuem. Nesse sentido, somente podem ser determinados deveres aos presos em situações em que uma conduta exteriorizada lese, ou detenha a potencialidade de lesar, o direito de outro preso ou de um cidadão qualquer. Não é possível sustentar-se, constitucionalmente, a legitimidade estatal de punir alguém disciplinarmente pelo fato de sua personalidade não se adequar a princípios ético-sociais.64

64 Ibidem, p. 216-217 (grifo do autor).

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8 INVIOLABILIDADE DO SIGILO DE CORRESPONDÊNCIA E DAS COMUNICAÇÕES TELEGRÁFICAS

8.1 SUA APLICAÇÃO NA EXECUÇÃO DA PENA

A Lei de Execução Penal consagra expressamente em seu artigo 41, inciso

XV, o direito de o preso manter contato com o mundo exterior por meio de

correspondência. Ocorre que rotineiramente nos presídios violam-se essas cartas,

sob a justificativa de se apurar a existência de drogas, armas, entre outros.

Todavia, faz-se necessário abolir tal prática, ou adequá-la, de tal sorte que a

garantia constitucional insculpida no art. 5º, inciso XII, qual seja, da inviolabilidade do

sigilo de correspondência e das comunicações telegráficas, fosse resguardada, tal

como os dispositivos de uma Constituição rígida o devem ser.

Com efeito, Andrei Zenkner SCHMIDT, ao se pronunciar sobre o tema,

enfatiza:

O inciso XII do art. 5º da CRFB/88 determina que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Portanto, também as correspondências enviadas e recebidas pelos presos são absolutamente invioláveis, ressaltando-se, nesse sentido, que nem por ordem judicial seria possível a quebra dessa modalidade de sigilo, até mesmo porque isso só se dá em relação às interceptações telefônicas.65

Assim sendo, verifica-se que a costumeira violação de cartas dos presos não

pode ser realizada nem mesmo em prol da busca por drogas ou armas, na medida

em que o texto constitucional somente excepciona a garantia em comento, nos

casos de interceptação telefônica, os quais necessariamente devem ser precedidos

de ordem judicial.

Entretanto, considerando-se a realidade carcerária brasileira, não se pode

ignorar que efetivamente são muitos os casos em que drogas e armas são enviadas

aos presos por meio de cartas, e que o Estado não pode se manter inerte em tais

situações. Dessa maneira é que o autor acima mencionado indica como forma de

65 Ibidem, p. 224 (grifo do autor).

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adequação do rastreamento das correspondências à garantia constitucional em

exame que “na pior das hipóteses, poderá o preso ser compelido a abrir a

correspondência na frente da autoridade competente, mas, em nenhum momento, a

esta será dado o direito de conhecer o conteúdo da mensagem”.66

Em última análise, a medida proposta se coaduna com a garantia da

inviolabilidade do sigilo das correspondências e das comunicações telegráficas, eis

que será vedado o acesso ao conteúdo das mensagens, porém propicia a

continuidade nas varreduras feitas nas cartas, com o objetivo de se evitar o envio de

drogas e armas aos segregados.

66 Idem.

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9 DIREITO ADQUIRIDO E COISA JULGADA

9.1 A POLÊMICA PREVISÃO DE PERDA DOS DIAS REMIDOS

Inicialmente urge consignar que a remição de pena, prevista na Lei de

Execução Penal em seu artigo 126, consiste no abatimento de um dia de pena para

cada três dias trabalhados pelo executado que cumpre pena em regime fechado ou

semi-aberto.

No entanto, controverso é o artigo 127 da LEP, segundo o qual o

condenado perde os dias remidos, caso seja punido pela prática de falta grave.

A crítica que se faz, é que esse dispositivo seria contrário à garantia

constitucional do direito adquirido e da coisa julgada, uma vez que mesmo após ter

efetivamente trabalhado, e algumas vezes mesmo depois de o juiz da Execução

Penal ter reconhecido os dias trabalhados e declarado a remição do período de

pena, o condenado perde o tempo remido se cometer alguma falta grave. Todavia,

em que pesem essas considerações, o Supremo Tribunal Federal é pacífico no

sentido de que não há violação ao direito adquirido, consoante pode se inferir

dosjulgamentos dos Habeas Corpus nº 94.49767 e nº 94.28968 e do agravo 67 DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. REMIÇÃO DA PENA. FALTA GRAVE. SÚMULA

VINCULANTE 9, STF. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 127, LEP. DENEGAÇÃO. 1. O tema em debate neste habeas corpus já foi objeto de consolidação da orientação desta Corte através da edição do enunciado da Súmula viculante nº 9: "O disposto no art. 127 da Lei n° 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) foi recebido pela ordem constitucional vigente, e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do art. 58". 2. Há orientação pacificada no Supremo Tribunal Federal no sentido de que o cometimento de falta grave, durante a execução da pena privativa de liberdade, implica a perda dos dias remidos pelo trabalho, inexistindo motivo para se cogitar de eventual violação a direito adquirido (HC 89.784/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, DJ 02.02.2007), bem como não há possibilidade de limitação da pena a apenas trinta dias (HC 89.528/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 13.10.2006). 3. A perda do direito ao benefício da remição dos dias trabalhados em decorrência da falta grave não atenta contra o princípio da individualização da pena (AI-ED 601.909/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 06.10.2006), bem como não viola dos princípios da isonomia e da dignidade da pessoa humana (AI-AgR 580.543/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 01.06.2007). 4. Habeas corpus denegado. (Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 94.497. 2ª Turma. Rel. Min. Ellen Gracie. Brasília, DF, 02 de setembro de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 26 de setembro de 2008, grifou-se).

68 Habeas corpus. Execução Penal. Remição de dias trabalhados. Falta grave. Discussão sobre a gravidade. Impossibilidade. Precedentes da Suprema Corte. 1. A perda dos dias remidos pelo trabalho de que trata o artigo 127 da Lei de Execuções Penais não afronta os princípios da proporcionalidade, da isonomia, da individualização da pena ou do direito adquirido. 2. Decisão impugnada que se encontra em perfeita consonância com a pacífica jurisprudência desta Suprema Corte. 3. Habeas corpus denegado. (Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 94.289. 1ª

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Regimental nº 554.30369, o que ensejou inclusive a edição da Súmula vinculante

número 970:

Contudo, Luiz Antonio Bogo CHIES salienta:

… O argumento do direito adquirido, quando vinculado exclusivamente à declaração judicial da remição para fins de reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 127 da LEP, foi um argumento frágil e provocou uma caminhada displicente com as questões de fundo da ciência e do direito de Execução Penal. Isto não significa considerar que tal argumento não possua importância no debate da inconstitucionalidade do artigo 127 da LEP, mas sim que nos falta reconhecer uma maior amplitude da noção de direito adquirido quando esta se vincula com o instituto da remição.71

E mais adiante o citado autor complementa, argumentando que o direito

adquirido não se origina com a decisão judicial que reconhece o abatimento da

pena, mas sim no momento da prestação do trabalho físico ou intelectual pelo

apenado, sendo que tal situação implica contraprestação estatal, consubstanciada

na declaração judicial de reconhecimento do trabalho prestado.72

O referido estudioso também ressalta que na medida em que a remição

representa uma relação contratual de trabalho pactuada entre o apenado e o

Estado, “… a disposição do artigo 127 da LEP é cláusula nula porque afeta o direito

do apenado-trabalhador receber parte que lhe é devida da contraprestação

inicialmente estipulada; e isto por uma circunstância estranha à relação de trabalho

e à expectativa de produtividade econômica da atividade.”73

Nessa mesma esteira é a lição de Andrei Zenkner SCHMIDT:

Turma. Rel. Min. Menezes Direito. Brasília, DF, 02 de junho de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 29 de agosto de 2008, grifou-se).

69 Agravo regimental. Execução penal. Remição de dias trabalhados. Falta grave. Limites. Precedentes. 1. A perda dos dias remidos pelo trabalho de que trata o artigo 127 da Lei de Execuções Penais não afronta os princípios da proporcionalidade, da isonomia, da individualização da pena ou do direito adquirido. 2. Não é possível afirmar que a subtração em referência deva ser limitada à mesma quantidade de dias estabelecida para a duração máxima da sanção disciplinar de isolamento, suspensão e restrição de direitos prevista no artigo 58 do mesmo diploma legal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental nº 554.303. 1ª Turma. Rel. Min. Menezes Direito. Brasília, DF, 20 de maio de 2008. Publicado no Diário de Justiça em 29 de agosto de 2008, grifou-se).

70 “O disposto no artigo 127 da Lei nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) foi recebido pela ordem constitucional vigente, e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58.”

71 CHIES, Luiz Antonio Bogo. Op. Cit., p. 544. 72 Idem. 73 Ibidem, p. 546.

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É muito comum, nos processos de execução penal, a autoridade judiciária decretar a perda dos dias remidos, embora já reconhecidos judicialmente, em razão da prática de uma falta grave durante o curso da execução. Se a execução penal tem natureza jurisdicional, como poderia, um juiz, revogar a própria sentença sem desrespeitar, ao mesmo tempo, a garantia da coisa julgada? E mais: mesmo a remição ainda não reconhecida em juízo não pode ser perdida em nome de uma falta grave praticada… Ora, o direito à remição é adquirido a cada três dias de trabalho… Tanto isso é verdade que o §3º do art. 124 da LEP afirma que o juiz irá declarar a remição, e não constituí-la… Nesse sentido, não resta a menor dúvida de que o art. 127, ao autorizar a perda dos dias remidos em razão do cometimento de falta grave, não fora recepcionado materialmente pela nossa Constituição …74

Em última análise, constata-se que o artigo 127 da LEP efetivamente

contraria as garantias constitucionais do direito adquirido e da coisa julgada, não

obstante o entendimento diametralmente oposto manifestado pelo Supremo Tribunal

Federal.

74 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 229 (grifo do autor).

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10 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

10.1 ATRIBUIÇÕES CONFERIDAS PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA AO

MINISTÉRIO PÚBLICO

O Constituinte de 1988 inseriu o Ministério Público no Título IV, que versa

sobre a organização dos Poderes, situando-o no Capítulo IV, que trata acerca das

funções essenciais à Justiça.

Em verdade, o artigo 127 da Carta Magna enumera em seu caput as

incumbências do Ministério Público, sendo elas as seguintes: defesa da ordem

jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Tais incumbências, notadamente as duas primeiras, devem ser perseguidas não só

pelos Promotores de Justiça como também pelos demais operadores do Direito, haja

vista que guardam estreito vínculo, antes de tudo, com a salvaguarda da própria

Constituição, a qual, por ser hierarquicamente superior, deve sempre ser privilegiada

no processo hermenêutico, em detrimento às normas infraconstitucionais. Nesse

contexto é que Luís Roberto BARROSO observa que, muito embora o princípio da

supremacia da Constituição não tenha um conteúdo específico e delimitado, ele

determina a prevalência de qualquer norma constitucional em detrimento das

normas ordinárias.75

Assim é que se entende que ao Promotor Público cumpre fazer assegurar

em primeiro lugar, os princípios e garantias constitucionais, visto que por serem o

norte de interpretação de todo o Sistema Jurídico76, reflexamente implicam na defesa

da ordem jurídica e do regime democrático. Com efeito, o Promotor de Justiça de

Rondônia, Alex Nunes de FIGUEIREDO enfatiza que “… pode-se afirmar, que o

legislador, ao dizer no artigo 127 da Constituição que incumbe ao Ministério Público

a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e

75 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora, p. 371.

76 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada, p. 67-68.

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individuais indisponíveis, enfim, do interesse público, que abrange todos os direitos

humanos fundamentais, elencou-o como garantidor constitucional desses direitos.”77

E pode-se dizer que tal tarefa se concretiza, principalmente, pela dita

interpretação conforme a Constituição, pela qual “… o aplicador da norma

infraconstitucional, dentre mais de uma interpretação possível, deverá buscar aquela

que a compatibilize com a Constituição, ainda que não seja a que mais obviamente

decorra de seu texto.”78

De acordo com Lenio Luiz STRECK, “… a interpretação conforme a

Constituição constitui-se em mecanismo de fundamental importância para a

constitucionalização dos textos normativos infraconstitucionais.”79

Nesta senda, depreende-se que o agente ministerial possui o dever de

realizar o processo denominado “filtragem constitucional”80 durante sua atuação,

com o escopo de resguardar os dispositivos constitucionais, e por conseqüência a

ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais

indisponíveis.

10.2 POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS ACERCA DA ATUAÇÃO MINISTERIAL NA

EXECUÇÃO PENAL

Como ponto de partida para o exame da atuação do Ministério Público na

Execução Penal, cumpre atentar inicialmente para o que preconizam os artigos 67 e

68 da LEP.

Com efeito, pode-se afirmar que o artigo 67 da aludida Lei trata do papel

fiscalizador do Parquet, enquanto o artigo 68 da mesma Lei, reporta-se à atuação de

parte propriamente dita do órgão ministerial. A partir disso, verifica-se um certo

77 FIGUEIREDO, Alex Nunes de. O Ministério Público como Garantia Constitucional dos Direitos Fundamentais: cláusulas pétreas, p. 407.

78 BARROSO, Luís Roberto. Op. Cit., p. 372. 79 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise: uma exploração hermenêutica da

construção do Direito, p. 243. 80 SCHIER, Paulo Ricardo, apud BESTER, Gisela. Direito Constitucional: fundamentos teóricos, p.

176.

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embate na doutrina no que diz respeito à qual função atribuída ao Ministério Público

deve preponderar: se de parte, ou de fiscal da lei.

Se se considerar que o papel de parte deva ser privilegiado em detrimento

ao papel de fiscal da lei, então ocorrerá que muitas vezes o Promotor de Justiça se

verá diante de situações em que deverá formular requerimentos ao Juiz da

Execução Penal mesmo que tais pedidos vão de encontro às garantias

constitucionais. Se, em contrapartida, se considerar que a função de custos legis

deve preponderar, o Promotor de Justiça estará mais vinculado à Constituição da

República, podendo inclusive, em observância aos preceitos e garantias

constitucionais, formular pedidos a favor do executado.

De acordo com Julio Fabbrini MIRABETE, “para fiscalizar, o Ministério pode

requerer e então transforma-se diretamente em parte processual, ou pode intervir.

Observa Renan Severo Teixeira da Cunha: pouco importa que para essa

fiscalização vista as roupagens de parte requerente ou de órgão interveniente;

sempre será órgão fiscalizador, com todas as conseqüências dessa atividade.”81

O doutrinador Afrânio Silva JARDIM, discorrendo acerca do tema, porém em

sede do Processo Penal, defende que “… embora parte no processo penal, sendo

responsável pela defesa da ordem jurídica e dos interesses indisponíveis da

sociedade, o Ministério Público não se limita a promover a ação penal, exercendo

função ainda mais nobre. … Deve pugnar no sentido da realização da justiça, vez

que o Estado não tem interesse em condenar um inocente.”82

Sídio Rosa de MESQUITA JUNIOR, por sua vez, frisa:

Existem três correntes que procuram dizer qual é a verdadeira posição do Ministério Público, a saber: uma quer vê-lo apenas como parte no processo penal; a segunda como representante do Poder Executivo; e a terceira como integrante do Poder de Justiça. … O Ministério Público não pode ser colocado como parte, eis que não pode ser equiparado à defesa, em face da maior importância de seu papel, sendo inadmissível a idéia de que o parquet esteja no mesmo nível da defesa. … Com base na distinção entre poder jurisdicional (poder de julgar, inerente ao Poder Judiciário) e poder estritamente judiciário (está dirigido exclusivamente à manutenção e conservação do ordenamento jurídico…), afirma-se que o Ministério Público concentra o poder de justiça. Tal distinção, que amplia a noção de jurisdição, com vista configurar um poder de justiça, não apresenta nenhuma utilidade.83

81 MIRABETE, Julio F. Op. Cit., p. 227 (grifo do autor). 82 JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Pena, p. 350-351. 83 MESQUITA JUNIOR, Sídio Rosa de. Manual de Execução Penal: teoria e prática, p. 144 (grifo do

autor).

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Na seqüência, o referido autor arremata que “para quem defende que o

Ministério Público é um órgão do Poder Executivo, posicionamento do qual

partilhamos, trata-se de órgão sui generis, dotado de prerrogativas especiais e até

certo ponto excepcionais, a fim de atuar com… eficiência na repressão ao crime”.84

O jurista Paulo Lúcio NOGUEIRA sustenta uma tríplice função do órgão

ministerial, a qual, segundo ele se desdobra em atividade jurisdicional, administrativa

e fiscalizatória.85

Eduardo M. CAVALCANTI compactua do entendimento de que o órgão

ministerial pode ser incumbido tanto da função de parte como de fiscal da lei,

principalmente tendo em vista a ausência de paridade de armas entre acusação e

defesa na Execução Penal.

… Luigi Ferrajoli … não acredita na igualdade de armas entre defesa e Ministério Público, já que a igualdade plena somente ocorreria em um sistema genuinamente acusatório, em que acusador e acusado fossem pessoas privadas. Daí a defesa do Ministério Público como fiscal da lei. Mesmo concordando com a posição … de Hugo Nigro Mazzilli, de que ser fiscal da lei não significa não ser parte e vice-versa, também não se pode olvidar da consciente aceitação da desigualdade de armas entre o acusador público e o acusado na relação processual-penal – e aqui se fala com a aplicação do contraditório. Ora, o Ministério Público, representando, o Estado acusador e tendo ao seu lado o aparato do Estado investigador, coloca-se em posição de vantagem diante do acusado. Daí porque a defesa do fiscal da lei.86

Para Hugo Nigro MAZZILLI, a defesa do regime democrático, uma das

atribuições do Ministério Público propugnada na Carta Magna de 1988, guarda

relação com o controle de constitucionalidade das leis, tanto pela sua via difusa

como pela sua via concentrada, o que vem a corroborar com a atuação primordial do

Parquet como fiscal da lei, notadamente como fiscal da Constituição, em todas as

searas do Direito, inclusive na Execução Penal.87

A partir das considerações articuladas, passa-se no tópico seguinte ao

estudo da atuação ministerial na Execução Penal, dentro da perspectiva da

hierarquia das normas e das suas atribuições conferidas no plano constitucional.

84 Idem. 85 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, p. 97. 86 CAVALCANTI, Eduardo M. O Ministério Público na Execução Penal, p. 361-362. 87 MAZZILLI, Hugo Nigro. Ministério Público e a Defesa do Regime Democrático, p. 95.

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10.3 ATUAÇÃO DO PARQUET NA EXECUÇÃO PENAL A PARTIR DA

HIERARQUIA DAS NORMAS E DE SUAS ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS

Conforme fora abordado anteriormente no presente trabalho, é sumamente

importante que o representante do Ministério Público, em sua atuação, se atente aos

princípios e garantias constitucionais, pois é a partir deles que se atenderá às

incumbências dirigidas na Lei Fundamental ao Parquet.

Dessa forma, sustenta-se que antes de atuar como parte ou como fiscal da

Lei, o membro do Ministério Público deve oficiar como verdadeiro assegurador da

Constituição, e por via de conseqüência, da sociedade como um todo, na medida em

que os dispositivos constitucionais têm como destinatários todos os cidadãos.

Ressalta-se, outrossim, que tal atuação deve ocorrer em quaisquer searas

do Direito, inclusive na Execução Penal, visto que como já fora mencionado neste

trabalho, os presos são sujeitos de direito, fazendo-se necessário, nesse contexto, o

resguardo de suas garantias, as quais, de acordo com o que se examinou nesse

estudo, são amplamente violadas não só pela Lei de Execução Penal como pelos

Tribunais.

Nessa esteira, defende-se que o Ministério Público deve zelar pela

salvaguarda das garantias de todos indistintamente, mesmo em prol dos

segregados.

Segundo André Silvani da Silva CARNEIRO,

… A missão do Ministério Público, como Defensor da Ordem Jurídica e do Regime Democrático, enquanto responsável pelo efetivo respeito aos direitos assegurados na Constituição Federal e nas leis, é muito mais abrangente e vai bem mais além do que a simples pretensão condenatória. Aliás, a vontade de condenar em nada se contrapõe a sua primordial função de fiscalizar a lei, mesmo em benefício daquele de quem se alcançou a restrição da liberdade.88

Para Cândido Furtado MAIA NETO,

O Ministério Público possui a missão de edificar os princípios reitores do direito penal humanitário, entre eles: da legalidade; da igualdade ante a lei e de tratamento perante os Tribunais; da hierarquia vertical das normas; do ônus da prova da acusação; da imparcialidade na persecutio criminis; da obrigatoriedade e da oportunidade da ação penal;

88 CARNEIRO, André Silvani da Silva. Efetividade dos Direitos Fundamentais, p. 630.

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da presunção de inocência até trânsito em julgado de sentença criminal irrecorrível; “in dubio pro reo” versus “in dúbio pro societate”; “non bis in idem”; da “ultima ratio” das ciências penais e da pena privativa de liberdade; da ampla defesa e do contraditório. O Ministério Público, na verdade, não é órgão acusante, nos sistemas democráticos, muito menos representante do Executivo ante os Tribunais, porque não defende os interesses da administração pública, mas a correta aplicação da lei, em especial, dos princípios humanitários consignados na lex fundamentalis, em nome da cidadania.89

Assim, para este autor, independentemente da função que o Parquet exerça

na Execução Penal, se de parte ou de fiscal da lei, deve o representante do

Ministério Público atuar como agente efetivador dos direitos fundamentais, dada a

hierarquia das normas no ordenamento jurídico.

De acordo com o Promotor Arthur PINTO FILHO, ao Ministério Público

incumbe realizar todos os direitos e garantias arrolados na Constituição,

especialmente em favor dos menos favorecidos. Segundo ele, em razão dessa

incumbência poder-se-ia dizer que o Ministério Público também seria um guardião

da Constituição.90 E adiante o citado estudioso destaca que a Carta Magna tem

sofrido sérios problemas de legitimidade, em decorrência de não serem assegurados

para grande parte da população, os direitos mínimos nela previstos, situação esta

que gera um questionamento acerca do próprio regime democrático, o qual é dever

do Ministério Público defender.91

Destarte, acerca da efetivação da Constituição, Gilberto Leme Marcos

GARCIA salienta:

Acreditamos que o promotor de Justiça oficiante nas execuções criminais deve reivindicar protagonismo na questão dos problemas penitenciários com os quais se depara no exercício de suas funções. É ele, por absoluto conhecimento de causa, quem mais autoridade tem para requerer perante os órgãos jurisdicionais as providências legais destinadas a fazer valer os direitos básicos dos presos assegurados por lei, sendo certo que a maioria desses problemas implica em interesses coletivos previstos em normas de ordem pública. E qual o instrumento mais adequado que o membro do “parquet” dispõe para exercer a plena atividade fiscalizatória no campo do direito penitenciário? Temos a convicção que a ação civil pública pode perfeitamente atender aos anseios do promotor criminal, no momento de cumprir tal atividade.92

E sobre as medidas a serem tomadas pelo membro do Parquet na sua

atuação durante a execução da pena, Andrei Zenkner SCHMIDT assevera que uma 89 MAIA NETO, Cândido Furtado. O Promotor de Justiça e os Direitos Humanos: acusação com

racionalidade e legalidade por um Ministério Público democrático, p. 37-38 (grifo do autor). 90 PINTO FILHO, Arthur. Constituição Classes Sociais e Ministério Público, p. 362-363.91 Ibidem, p. 366-367. 92 GARCIA, Gilberto Leme Marcos. O Ministério Público e a Questão Penitenciária: tutela desse

interesse difuso e coletivo através de ação civil pública, p. 642-643.

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das principais características do Estado Democrático de Direito é a previsão de

instrumentos processuais capazes de imporem ao Estado o respeito às garantias

individuais e sociais, sendo que o principal detentor de legitimidade desses

instrumentos é o Ministério Público, motivo pelo qual o autor defende um maior

comprometimento dos membros da instituição, para o manejo dessas medidas

processualísticas.93

E na seqüência o pesquisador arremata:

Por que não ouvimos falar em ação civil pública proposta com o fim de obrigar o Estado a fornecer, gratuitamente, medicamentos contra Aids nesse ou naquele presídio? Por que não temos notícia de uma ação civil pública proposta com o intuito de obrigar o Estado a contratar – ou, ao menos, a fazer um concurso público para tanto – assistentes sociais, psicólogas e psiquiatras para suprir as carências das Equipes de Observação Criminológicas? …Um órgão, como o Ministério Público, que tem por atribuição fundamental a “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 129, caput, da CRFB/88) não se pode dar ao luxo de ignorar o descaso estatal e social frente os direitos fundamentais dos apenados.94

Em virtude disso argumenta-se que o Promotor Público deve fazer uso dos

instrumentos processuais cabíveis para concretizar as garantias previstas na

Constituição e que se aplicam aos presos, bem como formular pedidos a favor do

executado durante a execução da pena, na medida em que ele possui como

atribuições a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses

sociais e individuais indisponíveis.

93 SCHMIDT, Andrei Zenkner. Op. Cit., p. 234. 94 Ibidem, p. 234-235 (grifo do autor).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o presente trabalho procurou-se abordar diversas máculas que rondam

o Direito da Execução Penal, as quais decorrem da não observância das garantias

constitucionais durante a interpretação da Lei de Execução Penal.

Em verdade, por ser a Constituição a norma hierarquicamente superior em

relação às demais normais, sua supremacia irradia por todo o ordenamento jurídico,

interferindo no processo hermenêutico das normas infraconstitucionais. Desse

modo, durante o processo hermenêutico o intérprete deve necessariamente

compatibilizar o texto dos dispositivos infraconstitucionais, com os valores e

conteúdo abarcados no Texto Constitucional.

Nesse contexto, verificou-se no decorrer do desenvolvimento da pesquisa,

que muitas das incoerências encontradas na LEP podem ser solucionadas durante a

interpretação do dispositivo legal, fazendo-se o seu devido cotejo e adequação com

a garantia constitucional incidente.

Outrossim, segundo se apurou no presente estudo, o Operador do Direito

que tem o dever maior de assegurar as garantias constitucionais é o Promotor de

Justiça, na medida em que suas incumbências conferidas constitucionalmente são a

defesa da ordem jurídica, do regime democrático, e dos interesses sociais e

individuais indisponíveis, incumbências estas que encontram-se estreitamente

vinculadas com a salvaguarda da própria Lei Fundamental. Nesse diapasão,

concluiu-se que o representante do Parquet não deve primar pela acusação durante

sua atuação na seara da Execução Penal, mas sim pelo seu papel de fiscal da lei,

notadamente da lei constitucional, utilizando-se dos institutos jurídicos cabíveis para

formular, inclusive, pedidos a favor do executado.

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