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i UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Economia REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA LÁCTEO MUNDIAL: UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO BRASILEIRA Vera Regina Ferreira Carvalho Tese de Doutoramento apresentada ao Instituto de Economia da UNICAMP para obtenção do título de Doutor em Ciências Econômicas área de concentração: Teoria Econômica, sob a orientação do Prof. Dr. Célio Hiratuka. Este exemplar corresponde ao original da tese defendida por Vera Regina Ferreira Carvalho em 25/07/2008 e orientada pelo Prof. Dr. Célio Hiratuka. CPG, 25 / 07 / 2008 ____________________________ Campinas, 2008

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Economia

REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA LÁCTEO MUNDIAL:

UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO BRASILEIRA

Vera Regina Ferreira Carvalho

Tese de Doutoramento apresentada ao Instituto de Economia da UNICAMP para obtenção do título de Doutor em Ciências Econômicas – área de concentração: Teoria Econômica, sob a orientação do Prof. Dr. Célio Hiratuka.

Este exemplar corresponde ao original da

tese defendida por Vera Regina Ferreira

Carvalho em 25/07/2008 e orientada pelo

Prof. Dr. Célio Hiratuka.

CPG, 25 / 07 / 2008

____________________________

Campinas, 2008

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A minha família, pelo amor, paciência e compreensão, que tornou esse trabalho possível

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[obrigado por todos os olhares]

o seu olhar

O seu olhar lá fora, O seu olhar no céu, O seu olhar demora, O seu olhar no meu,

O seu olhar, seu olhar melhora Melhora o meu.

Onde a brasa mora e devora o breu

Como a chuva molha o que se escondeu. O seu olhar, seu olhar melhora, melhora o meu.

O seu olhar agora, o seu olhar nasceu, o seu olhar me olha, o seu olhar é

seu. O seu olhar, seu olhar melhora, melhora o meu...

(Paulo Tatit e Arnaldo Antunes)

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Agradecimentos

Nada se constrói sozinho, ainda mais quando essa construção se estende

por muito tempo. Assim, agradeço a todos àqueles que de uma maneira ou de

outra, na maioria das vezes até sem saberem, ajudaram para que esse trabalho

chegasse ao fim. Aqueles que incentivaram, que me ajudaram a não desistir de

vez, quando tudo parecia tão difícil.

Agradeço primeiramente a minha filha, a Ana Carvalho Herrlein, por me

lembrar todos os dias, por meio de um sorriso, de um resmungo, de um abraço, a

alegria que é viver. Quando tudo ficava muito difícil era no seu olhar que eu

encontrava forças para continuar.

Ao amigo e companheiro Ronaldo Herrlein Jr, sem sua entrada na minha

vida, provavelmente essa tese não existiria. A Vera também seria outra. Faltam

palavras para agradecer a esse companheiro que me deu asas para voar e ainda

ficou cuidando da sogra e da avó emprestada, entre outras tantas coisas.

Obrigado sobretudo pelos momentos difíceis em que esteve ao meu lado.

Agradeço também pelo pai tão dedicado que é para a Ana, dedicação essa que

me deixou livre, em vários momentos, para que eu pudesse me dedicar a esse

trabalho. Uma presença fundamental, não só nessa tese, mas na vida que

construí para mim.

Simone Silva de Deos, qualquer escrito sobre essa amiga é pouco pra

representar a importância dela na minha trajetória. Obrigada pelas incontáveis

acolhidas em São Paulo, aqui estendo também meus agradecimentos ao Eduardo

e a querida Tereza. Quando Campinas ficava distante demais dos pampas era na

sua casa que eu encontrava aconchego. Mas sobretudo meu obrigada é por ter

me ajudado no momento mais difícil, quando pressenti a possibilidade de fraquejar

e sua mão me ajudou a sair do poço em que me encontrava. Minha eterna

gratidão.

Ao meu derradeiro orientador Célio Hiratuka, que aceitou orientar alguém

em pleno processo depressivo. Agradeço a sua disponibilidade, sua franqueza em

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nossas conversas, sua seriedade. Pela compreensão e dedicação, meu

muitíssimo obrigado. Também sou imensamente grata ao professor Luciano

Coutinho, pelo apoio, pelas conversas sobre o tema e sobretudo por acreditar

nesse trabalho.

Lembranças deixam laços para sempre. Quando nos deparamos com um

trabalho dessa natureza, muitos problemas aparecem, sem os amigos, sem os

amores, essa superação teria sido ainda mais difícil. Com um trabalho de longa

duração corremos o risco de perder alguns pelo caminho. Alguns amigos que nem

estavam mais por aqui, mas que suas presenças pretéritas ajudaram a ir em

frente. Jura, sempre a Juracy, o Tio Marcello, e o colega e amigo Dinizar Becker,

obrigado por terem feito parte da minha vida.

Um agradecimento especial ao apoio da minha mãe, sua postura perante

a vida ajudou-me, e muito, a não desistir de tudo em muitos momentos. Meu

muito obrigado ao apoio logístico das avós da Ana, nos inumeráveis finais-de-

semana que se ocupavam da pitoca para que eu pudesse avançar mais um pouco

no trabalho.

No Instituto de Economia passei momentos memoráveis, grandes aulas,

grandes conversas. Através do professor Mariano Laplane agradeço a todos os

professores que me abriram ainda mais os olhos e que brindaram, a mim e a

meus colegas, com aulas memoráveis. Agradeço através da Cida e do Alberto a

todos os funcionários que tornam o Instituto uma referência na vida da gente.

Agradeço também a Gisele, um anjo presente nesses últimos tempos, e a

Malu, que me apresentou essa amiga e tudo o mais que ela representou na minha

construção.

Obrigado também aos meus alunos, pelos diálogos possíveis, pelas

omissões de alguns momentos, pelo apoio e sobretudo pela última turma de

economia remanescente da UNIVATES que indiretamente me ajudaram a não

desistir de tudo nos momentos em que Lajeado ficava pesado demais. Também

agradeço as instituições que me financiaram, a CAPES e a UNIVATES.

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Enfim, agradeço a todos, que direta ou indiretamente, tornaram essa

caminhada possível. Por razões de tempo, e também para não cometer injustiças,

não foi possível nomear cada um deles, mas finalizo agradecendo a todos aqueles

que me apoiaram e que compreenderam que diante de situações imprevistas as

respostas, entre elas as emocionais, nem sempre são iguais.

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Índice

Introdução...................................................................................................................1 1. A produção de lácteos em escala global: aspectos cruciais e o contexto

dos blocos regionais ............................................................................................5

1.1 Panorama geral ...................................................................................................6

1.2 Aspectos da cadeia produtiva na Europa ..........................................................25

1.3 Aspectos da cadeia produtiva nos Estados Unidos da América .....................27

1.4 Aspectos da cadeia produtiva na Oceania.........................................................33

2. Indústria láctea mundial: uma análise dos principais atores.............................37

2.1 Nestlé.....................................................................................................................38

2.2 Lactalis ..................................................................................................................47

2.3 Danone ..................................................................................................................50

2.4 Dean Foods Company..........................................................................................53

2.5 Arla Foods.............................................................................................................57

2.6 Cooperativa Fonterra ...........................................................................................61

2.7 Dairy Farmers of America (DFA) .........................................................................64

2.8 Kraft Foods ...........................................................................................................67

2.9. Algumas considerações preliminares...............................................................70

3. Setor lácteo brasileiro: transformações e permanências na nova ordem econômica mundial ..............................................................................................77

3.1 Panorama produtivo primário da cadeia láctea brasileira................................79

3.2. Indústria processadora brasileira: um destaque para as mudanças

patrimoniais e a mudança de paradigma produtivo................................................84

3.3 Mudanças na perspectiva do comércio varejista e do mercado

consumidor.................................................................................................................97

3.4 Balança comercial láctea brasileira....................................................................101

3.5 Outras considerações preliminares ...................................................................103

4. Indústria láctea brasileira: uma análise dos principais atores...........................105

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4.1 Dairy Partner Américas (DPA) & Nestlé..............................................................107

4.2 Perdigão...............................................................................................................116

4.3 Itambé....................................................................................................................121

4.4 Parmalat ................................................................................................................125

4.5 Danone ..................................................................................................................129

4.6 Considerações preliminares ...............................................................................132

Conclusão...................................................................................................................135 Referências.................................................................................................................143

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Índice de figuras

Figura 01 – Desenho geral das inter-relações na cadeia produtiva láctea ...........8 Figura 02 – Distribuição da produção de leite, segundo classificação sócio-

econômica dos países..........................................................................9 Figura 03 – Comércio internacional de lácteos, em 2000 .......................................23

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Índice de gráficos

Gráfico 01 – Distribuição da produção mundial de leite por continente – 2005 ...11 Gráfico 02 - Projeção da produção de leite no mundo, segundo países-

membros e não-membros da OCDE....................................................16 Gráfico 03 – Exportações de lácteos em 2005, segundo países de origem..........20 Gráfico 04 – Principais exportadores mundiais de derivados lácteos ..................21 Gráfico 05 – Importações de lácteos, em 2004-06 e previsão para 2016...............22 Gráfico 06 – Distribuição das vendas mundiais da Nestlé, por grupo de

produtos, em 2006 ................................................................................42 Gráfico 07 – Distribuição das vendas mundiais da Nestlé, por região

produtora, em 2006...............................................................................43 Gráfico 08 – Distribuição da vendas mundiais da Danone, por grupo de

produto, em 2006 ..................................................................................51 Gráfico 09 – Distribuição das vendas mundiais de lácteos da Danone, por

região, em 2006 .....................................................................................52 Gráfico 10 – Distribuição da vendas mundiais da Arla, por grupo de produto,

em 2006..................................................................................................58 Gráfico 11 – Distribuição das vendas mundiais de lácteos da Arla Foods, por

região, em 2006 .....................................................................................59 Gráfico 12 – Distribuição do faturamento do grupo Fonterra, por região, no

ano de 2006 ...........................................................................................63 Gráfico 13 – Distribuição da vendas mundiais da DFA, por grupo de produto,

em 2006..................................................................................................66 Gráfico 14 – Distribuição da vendas mundiais da Kraft, por grupo de produto,

em 2006..................................................................................................68 Gráfico 15 – Distribuição das vendas mundiais da Kraft, por segmento de

negócio, em 2006 ..................................................................................69 Gráfico 16 - Distribuição regional da produção de leite no Brasil no ano de

2006........................................................................................................80 Gráfico 17 - Produtividade de leite do rebanho bovino no Brasil, no período

1980-2007 (litros/vaca/ano) ..................................................................81 Gráfico 18 - Evolução da produção de leite e rebanho ordenhado no Brasil -

1980/2007 (milhões litros e mil cabeças) ............................................82 Gráfico 19 - Curva de concentração para as dez maiores empresas em

captação de leite no Brasil - 2007........................................................88 Gráfico 20 – Destino do leite inspecionado no Brasil segundo produto final –

2002........................................................................................................90 Gráfico 21 – Operações de fusões e aquisições envolvendo empresas

industriais pertencentes à cadeia produtiva láctea no Brasil por ano e por tipo de operação – período 1986/2008 ..............................92

Gráfico 22 – Mercado total de leite fluído – leite longa vida X outros leites fluídos Brasil 1991/2005 .......................................................................98

Gráfico 23 – Saldo da balança comercial brasileira de lácteos de 2000-2007 em milhões de US$ ...............................................................................101

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Gráfico 24 – Composição da pauta de lácteos exportados pelo Brasil, em 2007........................................................................................................102

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Índice de quadros

Quadro 01 – Custos de produção mundial de leite (US$/litro) ...............................13 Quadro 02 – Operações de fusões e aquisições realizadas pela Nestlé, no

período 1985-2006.................................................................................41 Quadro 03 – Operações de fusões e aquisições realizadas pela Lactalis, no

período 1985-2006.................................................................................48 Quadro 04 – Operações de fusões e aquisições realizadas pela Dean Food, ......56 Quadro 05 – Operações realizadas pela Arla Food no período 1985-2006............60 Quadro 06 - Fusões e aquisições realizadas pela Parmalat no período 1989-

2002........................................................................................................93 Quadro 07 – Investimentos anunciados no Brasil a partir de 2005 para o

segmento lácteo....................................................................................95 Quadro 08 - Operações de fusões e aquisições realizadas pelo grupo Nestlé

no Brasil durante período 1989/2008 ..................................................112 Quadro 09 - Vendas de operações realizadas pelo grupo Nestlé no Brasil no

período 1989/2006.................................................................................113 Quadro 10 - Fusões e aquisições realizadas pela Perdigão no período 2005-

2008........................................................................................................117 Quadro 11 – Unidades produtoras da Parmalat em 2007 e seus respectivos

produtos ................................................................................................126 Quadro 12 – Operações realizadas pela Danone no período 1989-2002 ...............130 Quadro 13 – Vendas de ativos realizadas pela Danone no período 1989-2002 ...131

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Índice de tabelas

Tabela 01 – Distribuição da produção mundial de leite, segundo as espécies animais (em %)......................................................................................9

Tabela 02 – Produção de leite nos principais países produtores mundiais e suas participações na produção mundial, 1990 e 2005 (em mil ton) .........................................................................................................10

Tabela 03 – Produtividade em países selecionados (litros/vaca/dia) ....................12 Tabela 04 – Principais empresas de lácteos no mundo, ranqueamento

segundo o valor das vendas (somente lácteos) no ano de 2006 (em bilhões de €)...................................................................................38

Tabela 06 – Recepção de leite por parte das maiores empresasde laticínios instaladas no Brasil – 1996 – 2007 (milhões de litros) ......................96

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Índice de anexos

ANEXOS 151 Anexo A1 - Evolução da produção de leite mundial em 1.000 toneladas(1990-

2005) ....................................................................................................151 Anexo A2 – Mudança no consumo mundial per capta de leite e produtos

lácteos (kg/hab/ano)...........................................................................151 Anexo A3 - Mudanças nos padrões de consumo de alimentos conforme

evolução da renda..............................................................................152 Anexo A4 – Tendências no consumo de alimentos mundial .................................153 Anexo A5 – Produção de leite de vaca em 2005......................................................153 Anexo A6 – Produção de leite em pó nos maiores países produtores

europeus em 1.000 toneladas, no período 1995-2005.....................154 ANEXO A7 – Marcas utilizadas nos produtos de origem láctea da Nestlé ...........155 ANEXO A8– Marcas propriedade da Lactalis...........................................................156 ANEXO A9 – Marcas utilizadas pela Danone ...........................................................157 Anexo A10 – Marcas utilizadas pela Dean Foods nos produtos lácteos ..............158 ANEXO A11 - Marcas utilizadas pela Fonterra.........................................................159 ANEXO A12 - 159 ANEXO A13 – Desenho clássico da cadeia produtiva láctea .................................160 ANEXO A14 - Cadeia Produtiva do Leite – Quantificação Brasil ...........................161 ANEXO A15 - Operações de fusões e aquisições envolvendo a indústria de

laticínios brasileira no período 1985-2008 ......................................163 ANEXO A16 - Distribuição das vendas da Perdigão, por grupo de produto,

em 2006 ...............................................................................................171 Anexo A17 – Marcas exploradas pela LAEP no Brasil............................................171

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Resumo

Essa tese tem como objetivo analisar a inserção brasileira na

reestruturação do sistema lácteo global a partir das mudanças produtivas do final

do século XX. Diversas evidências apontam para uma redistribuição da produção

mundial de leite, a matéria-prima básica. Além disso, tem ocorrido um aumento do

consumo mundial per capita de lácteos e derivados e também um aumento no

número dos consumidores, expandindo-se por duas vias a demanda mundial. Na

medida que a produção de lácteos alcançou um nível técnico de produtos e

processos que permitiu superar a estreiteza territorial dos vínculos entre o

mercado consumidor e uma base produtora local da matéria-prima, novas

possibilidades estão colocadas. O mapa global da produção se altera e os

interesses das grandes empresas nas regiões onde é possível expandir a

produção condiciona novas estratégias de atuação. As transformações setoriais

que encaminham a formação de uma nova cadeia produtiva global são o objeto de

investigação do presente trabalho. Segundo este, a produção realizada no Brasil

tende a estar inserida em uma cadeia mais integrada globalmente e, portanto,

conforme uma nova divisão internacional do trabalho.

Palavras-chaves: leite; cadeia produtiva láctea – Brasil; cadeia produtiva

láctea – mundo; economia de empresas;

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Abstract

This thesis aims to analyze the Brazilian insertion in the restructuring of the

global dairy production changes from the end of the XX century. Various evidences

point to a redistribution of world production of milk, the raw material base.

Moreover, there has been an increase in world per capita consumption of milk and

derivatives and also an increase in the number of consumers, is expanding in two

ways world demand. To the extent that the production of milk reached a level of

technical products and processes that allow overcome the narrow territorial ties

between the consumer market and a local production base of raw materials, new

possibilities are raised. The global map of production changes and the interests of

large companies in regions where it is possible to expand the production determine

new strategies of action. The processing sectors that forward the formation of a

new global production chain are the subject of this research work. According to

this, the production in Brazil tends to be inserted into a chain more integrated

globally and, therefore, as a new international division of labor.

Key words: milk, milk production chain - Brazil; milk production chain - world;

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Introdução

A partir de 1988, quando da eliminação de controles quantitativos e

administrativos sobre as importações, a economia brasileira iniciou um processo

de liberalização, que se intensificou em 1990 com a abertura comercial,

integrando-se de forma mais efetiva à economia mundial. Dentro dessa lógica de

maior integração à economia global, a indústria de alimentos brasileira passou por

um processo de concentração e de desnacionalização após a abertura econômica.

As transformações experimentadas pela economia brasileira – resultantes,

sobretudo, da intensificação dos fluxos de capitais estrangeiros – estabeleceram

também novas formas de atuação dos agentes integrantes do complexo

agroindustrial de laticínios e deflagraram uma intensa mudança patrimonial na

estrutura da indústria processadora, desencadeada inicialmente pelo capital

externo. Parte significativa das mudanças patrimoniais verificadas se relacionava

diretamente com a estratégia de crescimento das principais empresas.

Assim, a estrutura produtiva brasileira transformou-se intensamente no

final do século XX, reflexo em parte das mudanças mais amplas verificadas em

escala global, em parte das especificidades da economia nacional. Tais

transformações da estrutura produtiva nacional romperam seu relativo isolamento,

inserindo-a dentro de uma lógica que passa a sofrer influência, de maneira cada

vez mais evidente, de mudanças ocorridas no cenário internacional, ainda que a

produção ainda seja fortemente orientada para o mercado interno. De uma

maneira ou de outra, todos os segmentos industriais foram afetados por essas

transformações. No entanto, no caso da indústria láctea, objeto do presente

estudo, algumas mudanças recentes no cenário mundial do setor têm acelerado

esse processo.

Diversas evidências apontam para uma redistribuição da produção

mundial de leite, a matéria-prima básica. Além disso, tem ocorrido um aumento do

consumo mundial per capita de lácteos e derivados e também um aumento no

número dos consumidores, expandindo-se por duas vias a demanda mundial.

Atualmente existe um consenso entre os analistas de que a produção de leite é

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inferior a demanda mundial. A composição das fontes de matéria-prima vem se

alterando, com o crescimento da oferta de outros tipos de leite, mas a produção de

leite de vaca continua a ser a principal fonte de matéria-prima para essa indústria.

Na medida que a produção de lácteos alcançou um nível técnico de produtos e

processos que permitiu superar a estreiteza territorial dos vínculos entre o

mercado consumidor e uma base produtora local da matéria-prima, novas

possibilidades estão colocadas. As transformações setoriais que encaminham a

formação de uma nova cadeia produtiva global respondem às condições de: (i) um

mercado consumidor em ampliação, principalmente em países emergentes, e (ii)

possibilidades de aumento da produção somente em algumas regiões (incluindo-

se o Brasil). Isso por um lado redimensiona o potencial de acumulação de capital

pelas empresas que atuam na indústria em nível mundial. Por outro, o mapa

global da produção se altera e os interesses das grandes empresas nessas

regiões onde é possível expandir a produção condiciona novas estratégias de

atuação.

Segundo as hipóteses deste trabalho, o setor está passando por uma

nova fase, em que a produção realizada no país tende a estar inserida em uma

cadeia mais integrada globalmente e, portanto, conforme a uma nova divisão

internacional do trabalho.

Assume-se aqui o papel central da grande empresa na articulação da

cadeia produtiva e admite-se que o dinamismo dessa cadeia está amplamente

determinado pelas suas ações. A hipótese enunciada desdobra-se nas seguintes

hipóteses secundárias – (i) está ampliando-se o espaço ocupado pelo capital

nacional na divisão de tarefas em nível mundial, mas, ainda assim, (ii) os agentes

econômicos de capital nacional brasileiro assumem um papel subordinado e

conseqüentemente com menores graus de liberdade.

Isso significa que a produção nacional sob controle da grande empresa

deve crescentemente inserir-se em uma lógica global de organização da

produção, independentemente da destinação de sua produção final. Portanto, um

entendimento correto dessa cadeia requer um enfoque diferenciado do geralmente

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adotado. Nesse sentido, essa tese investiga a cadeia produtiva láctea no Brasil do

ponto de vista da configuração da cadeia em termos mundiais e da atuação das

empresas enquanto players globais.

O presente estudo, portanto, compreende a economia capitalista

contemporânea segundo a tradição dos grandes autores que apontaram a

tendência inerente da acumulação capitalista em promover um revolucionamento

contínuo de suas bases técnicas, promovendo a concentração e a centralização

dos capitais. Nesse sentido, a grande empresa capitalista moderna –

compreendida como “grupo financeiro com predominância industrial” (Chesnais,

1995) e unidade de valorização de capital – destaca-se como principal agente das

transformações que periodicamente destroem as próprias estruturas estabelecidas

de produção, distribuição, circulação e consumo.

O presente trabalho está estruturado em seis partes: esta introdução mais

quatro capítulos e uma conclusão. Tendo presente a importância do contexto

global para compreensão das estratégias e desempenhos empresariais, no

Capítulo 1 é são descritos e analisados diversos aspectos relevantes das cadeias

produtivas estruturadas em três blocos econômicos ou macro-regiões (Europa,

EUA e Oceania), com destaque para o comércio internacional de produtos lácteos.

No Capítulo 2, o foco da investigação está nas empresas, os agentes que

assumem propriamente uma perspectiva global na cadeia em conformação, sendo

as principais responsáveis pela coordenação setorial estabelecida nos diversos

territórios. São analisadas oito empresas (com maior faturamento em 2006,

conforme Rabobank Internacional, 2007) que se constituem nos principais atores

globais dos blocos que se destacam na produção e comércio mundial de lácteos.

No presente trabalho, o foco das análises está nas estratégias e no desempenhos

revelados das grandes empresas, assumindo-se que sua consideração como

unidade básica de análise permite explicar em larga medida a transformação das

estruturas de produção e comércio.

No Capítulo 3 é analisada a dinâmica da cadeia produtiva do leite no

Brasil, dando destaque para as mudanças ocorridas nos distintos elos

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constitutivos desta cadeia, após as transformações mais recentes. Ainda que o

foco de nossa tese seja a indústria láctea, um entendimento mais adequado do

setor só é possível a partir de uma análise no âmbito da cadeia produtiva.

A trajetória das grandes empresas no Brasil é investigada do Capítulo 4.

Para tanto, são apresentadas de forma analítica as histórias contemporâneas das

empresas mais significativas no território brasileiro. Busca-se, assim, um

entendimento sobre os fatores desencadeadores e/ou intensificadores do

processo de transformação que afetou a indústria láctea brasileira. A

compreensão de como esses capitais nacionais se inserem na cadeia produtiva

global em conformação e sobre o papel desempenhado por eles, vale dizer, a

forma ativa ou passiva dessa inserção, é o propósito último desse capítulo.

Finalmente, na conclusão, são apresentados os resultados do estudo e a

interpretação dos movimentos da indústria láctea mundial e da inserção dos

agentes nacionais. Esses resultados servem então de base para sugestões de

políticas setoriais para a cadeia láctea no Brasil, visando uma inserção positiva da

indústria brasileira na constituição da cadeia láctea global. Pretende-se, com esse

trabalho, fornecer subsídios aos formuladores de políticas públicas e privadas,

para a tomada de decisões e para o estabelecimento suas linhas de atuação

quanto as principais transformações e tendências da cadeia produtiva do leite.

Qualquer decisão, corporativa ou de governo, necessita de uma visão sistêmica

que apóie as tomadas de decisão. Esse trabalho pretende contribuir para que se

alcance tal visão sistêmica na compreensão da cadeia produtiva láctea e nas

estratégias privadas e políticas públicas que afetam seus diferentes elos

constitutivos.

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1. A produção de lácteos em escala global:

aspectos cruciais e o contexto dos blocos regionais

Em vista da mundialização do capital e das conseqüências advindas

desse processo, com destaque para a intensificação da concorrência, as cadeias

produtivas passam a operar numa dimensão mais global, na qual os blocos

regionais desempenham papéis distintos e hierarquizados. O entendimento da

lógica imperante na cadeia láctea inicia-se pela abordagem de uma importante

mudança institucional que desencadeia o processo de conformação de uma

cadeia global no setor de lácteos. A instituição do sistema de cotas produtivas

para os países integrantes da Comunidade Européia, na década de 1980, afetou

em graus diferenciados os países produtores e provocou uma mudança de

estratégias por parte das empresas atingidas.

A Política Agrícola Comum (PAC) da União Européia constituiu-se num

mecanismo de coordenação internacional para a cadeia produtiva láctea mundial

quando, em 1982, estabeleceu o sistema de cotas de produção para os seus

países membros.1 Esse sistema acabou por impactar a produção em todas as

regiões produtoras e resultou num regime de contenção da produção na Europa.

Assim, a expansão das empresas européias passou a ser circunstanciada pela

PAC. Portanto, desde a sua instituição, em 1984, as estratégias empresariais de

crescimento e as ações das grandes empresas produtoras de leite e derivados

levaram a um novo arranjo produtivo, com um aumento gradativo da lógica global

dentro de suas decisões de expansão.

No presente capítulo, faz-se inicialmente um resgate dessa mudança

institucional e de outros aspectos relativos à produção da matéria-prima, ao

consumo de lácteos e ao comércio internacional. Posteriormente, são

apresentados os contextos regionais dos principais blocos a partir dos quais se

organiza a cadeia láctea global. O argumento é que as grandes empresas têm

1 Os países membros, quando da constituição do sistema de cotas eram Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Dinamarca, Irlanda, Reino Unido e Grécia. Efetivamente esse sistema foi colocado em prática em 1984.

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estabelecido estratégias e organizado sua atuação com vistas às condições do

mercado em escala cada vez mais global e, embora integrem suas atividades

além das fronteiras nacionais, as mesmas estão seletivamente distribuídas, de

sorte que permanecem centralizadas as atividades de pesquisa e

desenvolvimento e, portanto, a concepção de novos processos e produtos, bem

como os conceitos de marketing relacionados.

1.1 Panorama geral

A cadeia produtiva láctea guarda traços análogos com os movimentos

apresentados por diversas outras cadeias produtivas. Porém, as especificidades

do leite – inclusive o grande volume de água presente na matéria-prima principal e

a existência de subsídios à produção – conduzem a formas específicas de

relacionamento entre produtores e processadores nas diferentes regiões.2 A

produção primária, ainda que tenha um papel economicamente subordinado,

nesse caso é fundamental, pois as diferenças nos seus rendimentos físicos e

custos de produção podem ser o diferencial para inclusão de regiões produtivas

nas operações de uma produção em escala global. Devido às características

próprias do leite fluido, o primeiro tipo de processamento deve ser realizado

próximo da base produtora. A produção da matéria-prima leite está disseminada

em todo o território mundial e as formas de produção são muito díspares,

apresentando realidades muito distintas quanto a produtividade e custos. Essa

disseminação da produção relaciona-se com a importância nutritiva do leite, mas

também com o fato de ser um dos poucos produtos agropecuários que propicia

uma renda mensal ao produtor.

2 A especificidade da matéria-prima e das formas de relacionamento entre os elos da cadeia produtiva láctea implicam também um maior grau de especificidade dos ativos produtivos, pois o grau de especificidade do ativo relaciona-se com o grau de especialização de determinada transação (Williamson, 1989). Ativos com maior grau de especificidade requerem arranjos produtivos do mercado e da firma, que assegurem maior estabilidade das condições de uso desses ativos.

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7

Tanto a produção de leite quanto a indústria processadora integram a

cadeia produtiva láctea.3 Uma cadeia produtiva representa um modo específico de

organização das atividades econômicas, compostas por diferentes etapas,

concatenadas e relativamente interdependentes, a partir de uma lógica cujo

elemento principal é de hierarquia e comando (Furtado, 2003:7). A cadeia como

um todo consiste numa rede de trabalho e de processo produtivo, incluindo os

sistemas produtivos, os fornecedores de insumos e serviços, as indústrias de

processamento e de transformação, os agentes de distribuição e de

comercialização e consumidores finais (Figura 01), não apenas dentro de um

contexto nacional, mas sim internacional. Conforme essa abordagem é

necessário operar um corte vertical no sistema econômico e também considerar

os fluxos entre os agentes integrantes, assim como as relações de causalidade

entre esses e suas influências sobre os demais elos.

3 O conceito de cadeia produtiva utilizado é derivado de Gereffi (2001) que é uma rede de trabalho e de processo produtivo cujo resultado é uma mercadoria final. De acordo com essa concepção, um melhor entendimento das cadeias produtivas pressupõe, além das investigações de desempenho e características econômicas, um estudo sobre o padrão e a natureza das relações dentro de cada elo e também entre os elos. Dentro da literatura econômica, diversos conceitos congêneres são utilizados para a designação de cadeia produtiva, tendo como pontos comuns a constituição do mesmo a partir do produto final e privilegiando as relações que se estabelecem entre e dentro dos elos constitutivos de cada cadeia.

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Figura 01 – Desenho geral das inter-relações na cadeia produtiva láctea

Fonte: Relatório Perdigão (2006).

Uma compreensão da dinâmica das cadeias produtivas, sobretudo

naquelas em que a matéria-prima básica é um produto agropecuário, deve

principiar pelas questões relativas à produção primária. No caso do leite, em

decorrência das especificidades e também da importância deste insumo

agropecuário, a abordagem o setor primário deve considerar as condições

diferenciadas dos marcos regulatórios, dos custos, da produtividade, do ambiente

natural, etc.

Desde 1990 até 2005, a produção mundial expandiu-se em 22,8% (cerca

de 1,4% a.a.). No mesmo período, a produção dos países em desenvolvimento

cresceu 72,2%, alterando, significativamente e num breve período, a distribuição

mundial da produção (Figura 02).

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Figura 02 – Distribuição da produção de leite, segundo classificação sócio-econômica dos países

1990

66%

34%

países desenvolvidos países em desenvolvimento

2005

53%47%

Fonte dos dados brutos: FAOSTAT (2007)

Os dados apresentados dizem respeito à produção de diversos tipos de

leite, englobando leites de vaca, de cabra e de búfala. Com o aumento do

consumo de leite nos países asiáticos ampliou-se também a matriz produtiva

láctea, incluindo outras fontes tradicionais, além do leite de vaca. Nos países

desenvolvidos, 99% do leite produzido é de vaca, enquanto nos países em

desenvolvimento 33% do leite provêm de outros animais (búfalo, ovelhas, cabra e

camelo). Atualmente, com referência à produção mundial, 84% do leite total é de

vaca (Tabela 01).

Tabela 01 – Distribuição da produção mundial de leite, segundo as espécies animais (em %)

Espécie 1970 1980 1990 2000 2005

Vaca 91,71 90,71 88,32 84,75 84,20Búfala 5,00 5,91 8,12 11,63 12,25Cabra 1,65 1,66 1,84 2,01 1,98Ovelha 1,40 1,46 1,47 1,39 1,36Camelo 0,24 0,26 0,25 0,22 0,21

Total 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 Fonte: FAO apud Marcondes (2007)

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No ano de 2005, os principais produtores mundiais foram Índia, EUA e

Rússia (Tabela 02). A produção brasileira ocupou a oitava posição no

ranqueamento mundial.4 Nos últimos anos está ocorrendo uma mudança dentre

os principais países produtores, sendo que China, Índia, Paquistão, Brasil, Nova

Zelândia e México apresentaram taxas de crescimento acima da média,

aumentando assim a sua participação na produção mundial.

Tabela 02 – Produção de leite nos principais países produtores mundiais e suas participações na produção mundial, 1990 e 2005

(em mil ton)

Fonte dos dados brutos: FAOSTAT(2007)

As regiões que intensificaram a sua produção de leite também são

aquelas onde se verifica um maior aumento de consumo de produtos lácteos, tais

4 Caso se considere apenas a produção de leite de vaca a posição ocupada pelo Brasil é a sétima (Anexo A5).

Produção % Produção %

1990 1990 2005 2005

Índia 53.678 10% 95.619 15%

EUA 67.005 ---

13% 80.264 13%

Federação Russa --- 31.144 5%

Paquistão 14.723 3% 29.672 5%

China 7.037 1% 29.403 5%

Alemanha 31.342 6% 28.488 4%

França 26.807 5% 26.133 4%

Brasil 15.076 3% 25.468 4%

Nova Zelândia 7.509 1% 14.498 2%

Itália 11.956 2% 11.831 2%

Holanda 11.226 2% 10.532 2%

México 6.456 1% 10.338 2%

outros países 268.771 52% 246.956 39%

Mundo 521.586 100%

640.346 100%

País

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como Ásia e América Latina. Conforme será considerado adiante, nessas regiões

o aumento do consumo está associado à intensificação da urbanização e a um

incremento da renda. E também é nessas regiões que se faz possível um

incremento produtivo futuro (Gráfico 02, adiante).

Conforme se pode presumir pelos dados da Tabela 02, a produção de leite

encontra-se dispersa geograficamente (Gráfico 01). Porém, as condições de

custos e rendimentos físicos da produção são bastante distintas.

Gráfico 01 – Distribuição da produção mundial de leite por continente – 2005

África5%

Oceania4%

Américas24%

Ásia33%

Europa34%

Fonte dos dados brutos: FAOSTAT (2007)

Nossa análise dos dados internacionais, em comparação com a realidade

brasileira, chama a atenção para o baixo índice de produtividade apresentado pelo

Brasil frente a outros importantes produtores mundiais. Estas diferenças derivam

da utilização de sistemas de produção distintos e também do grau de

especialização do rebanho. Sistemas em confinamento (produção intensiva de

leite) tendem a apresentar maior produtividade, entretanto apresentam também

maiores impactos ambientais (Tabela 03). Rebanhos especializados, por sua vez,

apresentam produtividade maior.

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Tabela 03 – Produtividade em países selecionados (litros/vaca/dia)

Fonte: USDA (2007) Obs: * dados preliminares; ** previsão.

Como não poderia deixar de ser, essas disparidades nos níveis de

produtividade estão relacionadas com os diversos custos de produção

apresentados pelas diferentes regiões produtoras. Nesse aspecto, o Brasil se

destaca por apresentar custos de produção baixos, quando comparados aos

demais produtores mundiais importantes (Quadro 01).

Ano 2002 2003 2004

2005 2006* 2007**América do Norte

Canadá 7.35 7.26 7.49 7.32 7.41 7.43México 1.41 1.44 1.45 1.44 1.46 1.47Estados Unidos

8.44 8.51 8.60 8.87 9.05 9.37América do Sul

Argentina 3.95 3.98 4.63 4.52 4.79 4.95Brasil 1.45 1.49 1.53 1.59 1.64 1.69

União Européia - 25 5.21 5.39 5.45 5.63 5.68 5.89Antiga União Soviética

Rússia 2.75 2.82 2.86 3.08 3.14 3.23Ucrânia 2.82 2.84 3.20 3.25 3.36 3.45

Sul da ÁsiaÍndia 1.01 1.00 1.01 0.99 1.02 1.04

ÁsiaChina 3.80 3.91 4.14 4.05 4.05 4.10Japão 8.68 8.71 8.90 9.10 9.04 9.04

OceaniaAustrália 4.90 5.19 5.10 5.11 5.08 5.02Nova Zelândia 3.71 3.73 3.83 3.65 3.71 3.77

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Quadro 01 – Custos de produção mundial de leite (US$/litro)

Custo de Produção

Países/Regiões

< 0,18 US$ Polônia, Argentina, Paquistão, Vietnã, Austrália (oeste), Brasil (centro-oeste),

5Chile, Índia (grandes fazendas), China (norte)

0,18 - 0,23 US$ Ucrânia, Bangladesh, República Tcheca (fazendas modernas), Brasil (fazendas de custo elevado), Chile (fazendas de custo elevado), Índia

(fazendas de custo elevado), Nova Zelândia (fazendas de custo elevado)

0,23 - 0,30 US$ República Tcheca (fazenda antiga), Estados Unidos (grandes fazendas),

Peru, China (sul), Tailândia, Austrália

0,30 - 0,37 US$ Reino Unido, Irlanda, Hungria, Israel, Estados Unidos (fazendas pequenas),

Alemanha (grandes fazendas), Espanha, Dinamarca

> 0,37 US$ Suíça, Áustria, Holanda, Luxemburgo, França, Itália, Dinamarca, Suécia,

Finlândia, Noruega, Canadá, Alemanha (pequenas fazendas)

Fonte: International Farm Comparison Network (2005) in Agroanalysis (2007)

O protecionismo e a presença de subsídios produtivos são aspectos que

se vinculam à sustentação econômica de produções tão díspares e são muito

relevantes na explicação do desenho da cadeia produtiva em nível mundial. O leite

é o produto agropecuário que recebe o maior volume de subsídios em todo

mundo e as pressões para um relaxamento desse quadro regulatório são intensas

(IATRC,1998 apud Martins & Araújo, 2002). Os acordos de 1994 do GATT, a

chamada Rodada Uruguai, marcaram o início de uma abertura acelerada do

mercado mundial de lácteos e levaram a uma diminuição dos grandes superávits

de produtos lácteos gerados pelos principais países produtores europeus

(Bortoletto & Wilkinson, 1999). Uma mudança dessa ordem, no marco regulatório

que afeta diretamente o setor primário, conduziu também a uma reavaliação, por

parte de empresas processadoras sobre a sua fontes de captação e as

perspectivas de crescimento nos locais originários.

5 Um maior detalhamento sobre o custo de produção brasileiro é apresentado no capítulo 3.

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Gradativamente, a redução dos subsídios e do protecionismo explicita as

maiores diferenças de custos. Essas diferenças podem adquirir ainda maior

relevância com a extinção das práticas protecionistas, sobretudo pelos países

desenvolvidos.6 Entretanto, esse quadro de subsídios não sofrerá alterações antes

da conclusão da Rodada de Doha. De todo modo, com a redução e/ou extinção

dos subsídios, ampliam-se as possibilidades de comercialização internacional de

produtos lácteos.

Ainda com referência aos aspectos vinculados à produção leiteira, cabe

considerar que a mesma vem acompanhada de impactos ambientais, assim como

as demais produções animais. Assim, um fator que impacta mundialmente a

cadeia produtiva láctea é que os problemas ambientais derivados da pecuária

leiteira estão se ampliando nos países onde a produção de leite ocorre de forma

mais intensiva. Em tempos de agravamento do aquecimento global, as questões

ambientais acabam por restringir o crescimento da produção primária em uma

série de países e contribuem para reconfigurar a cadeia produtiva em nível

mundial.

Entre as questões ambientais, destaca-se a poluição do solo com

nitrogênio, na qual o estrume de vacas leiteiras pode adquirir uma dimensão

importante.

“Os países podem ser reunidos em quatro grupos distintos, em função do nível de risco tal como foi medido pela estimativa global de nitrogênio no solo, e da importância da gestão de estrume de vaca enquanto fonte de nitrogênio. O risco é maior na Bélgica, República Tcheca, Dinamarca, França, Alemanha, Irlanda, Japão, Países Baixos, Noruega, Portugal,

6 Diversos movimentos estão sendo realizados, no sentido de reduzir o protecionismo. Dentro dessas iniciativas destaca-se a constituição da Aliança Láctea Global (GDA) que organizou-se para fazer lobby na rodada de Doha. Essa aliança congrega empresas nacionais da Argentina, Austrália, Brasil, Chile, Nova Zelândia e Uruguai, com a finalidade é estabelecer um sistema comercial justo no âmbito do leite e seus derivados, evitando assim as distorções regulatórias atuais. Segundo a GDA “[a]s tarifas aplicadas no mercado mundial de lácteos estão entre as mais altas do mundo; [m]ercados desenvolvidos aplicam tarifas bem acima de 100%; [a] tarifa nas importações japonesas de manteiga está acima de 500%; [o] Canadá aplica tarifas entre 200% a 300% em suas importações de lácteos; [n]um mercado de 7 milhões de toneladas, as importações intracota européias de queijo giram em torno de 100 mil toneladas; [d]ecisões européias sobre subsídios à exportação têm repercussões negativas na renda dos produtores de leite das regiões onde não há subsídios (FAEP, 2005)”.

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Suíça e Reino Unido. Na Austrália, Canadá, Itália, Nova Zelândia, Espanha e Estados Unidos, o risco de poluição com nitrogênio ocasionado pelo estrume de vacas leiteiras é fraco a nível nacional, embora estudos indiquem que o risco a nível regional pode ser tão importante quanto nos países de maiores riscos. Na Áustria, Polônia, Portugal e Suécia, a estimativa global dos nutrientes é baixa, mas a contribuição das vacas leiteiras à produção total de nitrogênio é superior a 10%, enquanto na Coréia a estimativa global dos nutrientes é alta, embora o estrume das vacas leiteiras contribua em menos de 10% (OECD, 2004)”.

As atuais projeções mundiais para a produção de leite apontam para a

continuidade de um crescimento maior nos países que não integram a OECD, o

que está relacionado com os níveis de poluição gerados e com as mudanças

regulatórias que afetam subsídios e cotas de produção. As projeções para a

produção de leite, apresentadas no Brasil pelo Ministério de Agricultura, Pecuária

e Abastecimento e derivadas de estudos do Food and Agricultural Policy

Research Institute (FAPRI, 2007), são as seguintes:

“Segundo o FAPRI na próxima década a produção de leite aumentará 18,5% com a maior parte do crescimento sendo decorrentes por ganhos de produtividade por vaca. A produção mundial projetada para 2015 é de 586,80 milhões de toneladas de leite. Das 91,8 milhões de toneladas acrescidas à produção entre 2005 e 2015, 28,5% ocorrem nas Américas e 60% ocorrem na Ásia, principalmente na China e na Índia. O continente asiático segundo o FAPRI será o maior produtor de leite em 2015, com 181,4 milhões de toneladas, seguido pela Europa com 154,32 milhões de toneladas e pelos Estados Unidos, com uma produção projetada de 110,45 milhões de toneladas de leite.

Segundo o FAPRI, a Índia produzirá em 2015, 68% da produção do continente asiático. Na América do Norte, os Estados Unidos serão os maiores produtores de leite. Na América do Sul, o Brasil deverá produzir em 2015, 31,3 milhões de toneladas e a Argentina 14,0 milhões de toneladas.

Entre os derivados do leite, o queijo é o que apresenta o maior volume de produção. A produção mundial deverá aumentar de 16,5 milhões de toneladas em 2005 para 19,0 milhões em 2015. Os maiores produtores mundiais de queijo serão a Europa, 9,43 milhões de toneladas e América do Norte 4,9 milhões de toneladas. Na produção de queijo a Argentina deverá se tornar mais importante que o Brasil em 2015. Na Oceania, a Austrália e Nova Zelândia serão os grandes produtores do continente em 2015 (FAPRI) (MAPA/AGE, 2006:31)”.

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Torna-se evidente que, em face de diversas questões – como os custos

relativos de produção, as limitações legais à expansão da produção de leite e os

problemas ambientais a ela associados – o aumento da produção de leite só será

possível nos países em desenvolvimento, como o Brasil. Estudo como o

OCDE/FAO (2007) já projeta essa tendência (Gráfico 02), e também aponta para

um aumento dos preços dos lácteos e derivados em face do descompasso entre o

crescimento da demanda e da oferta, que tende a se acentuar.

Gráfico 02 - Projeção da produção de leite no mundo, segundo países-membros e não-membros da OCDE

Fonte: OCDE/FAO(2007)

No que se refere à oferta, a produção mundial apresenta tendência de

crescimento, tendo crescido, como vimos, à taxa anual de 1,4% entre 1990 e

2005, com projeção de 1,7% a.a. para a década subseqüente (Anexo A1). Ainda

que essa tendência se mantenha, essa taxa é menor que as taxas projetadas para

o crescimento do consumo nos próximos anos (Anexo A2). São muitos e diversos

os fatores que apontam para um aumento do consumo de lácteos e derivados nas

próximas décadas.

Sabe-se que um grau maior de desenvolvimento econômico repercute

diretamente no aumento consumo de lácteos e derivados. Isso ocorre, em

primeiro lugar, devido a elevada elasticidade-renda dos produtos lácteos. O

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aumento da renda per capita e outras transformações associadas ao processo de

desenvolvimento, como a crescente urbanização e a entrada da mulher no mundo

do trabalho, fazem com que os países em desenvolvimento apresentem um

grande potencial de crescimento. Assim, as previsões apontam que, nas regiões

menos desenvolvidas o incremento do consumo deverá ocorrer tanto devido à

inclusão de consumidores quanto ao incremento de renda. Nesse contexto,

destacam-se a China e a Índia, países com elevada população e cujas rendas per

capita têm crescido em níveis muito superiores aos dos países desenvolvidos.

Por outro lado, tem crescido a procura por produtos com baixo teor de

gordura e dietéticos, assim como a intensificação do consumo dos alimentos

funcionais (Anexo A3).7 O avanço científico na área de alimentos já indicaram que

os derivados do leite apresentam um elevado potencial nutracêutico.8 Estudos já

realizados comprovam que frações do leite9 podem ser eficazes em tratamentos

contra o câncer de cólon, AIDS, entre outras doenças. Essas frações

apresentaram efeito antimicrobiano e também efeito anti-viral e já existe tecnologia

para produção dessas frações em escala comercial. (Brandão, 2002; Hasler,

2001).

Nas últimas décadas, o consumo de alimentos vem apresentando

modificações mais intensas devido às mudanças nos hábitos alimentares,

motivadas por questões relacionadas à saúde e à qualidade de vida. Essa

mudanças encontram um potente vetor nas ações das grandes empresas

processadoras, que conduzem o processo de inovação de produto, transformando

em mercadorias os conhecimentos científicos sobre os derivados lácteos. Surgem

assim uma série de produtos funcionais e nutracêuticos, que estão longe de

7 Alimentos funcionais, segundo uma definição que surgiu no Japão nos anos 1980, são “alimentos similares em aparência aos alimentos convencionais, usados como parte de uma dieta normal, e que, demonstraram benefícios fisiológicos e/ou reduzem o risco de doenças crônicas, além de suas funções básicas nutricionais (Brandão, 2002)”. O leite constitui-se em um alimento funcional por natureza e cientificamente é comprovado sua atuação na imunologia passiva, na modulação do sistema imunológico, proteção contra hipertensão, proteção contra osteoporose, prevenção do câncer e prevenção de cáries. 8 Denominação utilizada para nutrientes com uso farmacêutico. Para efeitos de ilustração tem-se o soro do leite, rico em cálcio (Hasler, 2001). 9 Partículas obtidas por fracionamento das proteínas contidas no leite.

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esgotar as potencialidades nutritivas e farmacêuticas já apontadas para esses

derivados. Nesse campo, as ações das grandes empresas não se limitam à

formulação dos novos produtos (com uso de ingredientes lácteos), pois o apelo

em favor de um “consumo saudável” ocupam lugar destacado em suas estratégias

de marketing.

Os dados da FAO, utilizados no estudo de Nassar (2007), apontam para

uma substituição gradativa de cereais e amidos por carnes, lácteos, doces, frutas

e alimentos processados, com crescente incorporação dos produtos dietéticos e

funcionais (Anexo A4). Por isso, em vista da diversidade de produtos derivados do

leite e de suas propriedades, o aumento do consumo de lácteos ocorre também

nas regiões com maior grau de desenvolvimento, refletindo a incorporação de

novos produtos à dieta alimentar. No mesmo sentido, concorre o aumento mundial

da demanda por queijos, cuja contrapartida é a ampliação e diversificação da

oferta, pois as especialidades regionais na elaboração de queijos passam a ser

comercializadas no mundo todo. Devido também às propriedades dos produtos

lácteos e às mudanças de hábitos, o envelhecimento da população, seja em

escala nacional, seja em escala global, acaba por se refletir no aumento do

consumo de alimentos derivados do leite.

Além desses aspectos mais estruturais, que permitem vislumbrar

tendências expansivas de médio e longo prazo, a recente conjuntura também

reforça a percepção de uma tendência generalizada de aumento do consumo de

lácteos. Na última década, sobretudo devido à entrada de novos consumidores

asiáticos no mercado, esse passou gradativamente a apresentar insuficiência de

oferta, conduzindo a uma elevação de preços.10

Todas essas considerações, que afetam a oferta e a demanda de

produtos lácteos em escala global, vêm redefinindo as condições dos mercados

10 Por exemplo, no ano de 2006 esse mercado apresentou tendência de alta, sendo inclusive comparado ao petróleo. (i) a seca na Austrália e conseqüente redução da produção que se destina principalmente ao mercado externo; (ii) tendência de queda da produção européia, sendo que com o fim dos subsídios essa tendência se acentua; (iii) aumento do consumo de lácteos e derivados na América Latina, em função de aumento de renda real, visto que os lácteos e seus derivados apresentam uma elevada elasticidade-renda.

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lácteos nacionais e as possibilidades do comércio internacional (Figura 03). Do

total de leite produzido, entretanto, apenas 5% é objeto do comércio mundial,

sendo a parcela principal da produção consumida internamente.

Figura 03 – Mapa mundial do balanços Produção x Consumo nos mercados lácteos nacionais, 2005

Surplus countries (positive balance >2% of production)

Deficit countries (negative balance <2% of production)

Balance countries

Surplus countries (positive balance >2% of production)

Deficit countries (negative balance <2% of production)

Balance countries

Fonte: Jachnik (2006)

No comércio mundial de produtos lácteos, quatro produtos respondem por

mais de 90% dos valores transacionados: manteiga, queijo, leite em pó integral e

desnatado. Tendencialmente, esse comércio se intensifica devido às restrições

que vão se apresentando nos atuais principais países produtores, sobretudo

restrições ambientais ou redução de área destinada aos rebanhos em face da

expansão da urbanização. Entretanto, como se viu, os indicadores de

produtividade apresentados pelos países são bem diversos (Tabela 03).

No comércio internacional de produtos lácteos, os países que se

destacam pertencem à União Européia e à Oceania. Os maiores exportadores de

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lácteos são países pertencentes a esses blocos econômicos (Gráfico 03). Os

produtos exportados de maior valor adicionado provêm da Europa e os de menor

valor adicionado provêm da Oceania.

Gráfico 03 – Exportações de lácteos em 2005, segundo países de origem

EUA4%

Austrália16%

Outros15%

Europa31%

Nova Zelândia

34%

Fonte dos dados brutos: Saez (2006)

O estudo da OCDE/FAO (2007) mostra uma mudança nos principais

países exportadores. Para os próximos anos, as projeções apontam para um

aumento das exportações realizadas por países da América Latina, mais

especificamente da Argentina, que deve aumentar a sua participação no ano de

2016 (Gráfico 04). Esse estudo também identifica uma tendência de alta no preço

do leite e de seus derivados, caso se concretize a redução dos subsídios.

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Gráfico 04 – Principais exportadores mundiais de derivados lácteos

0

600

1200

1800

2400

3000

2004-2006 2016manteiga

2004-2006 2016queijo

2004-2006 2016 leiteem pó

desnatado

2004-2006 2016 leiteem póintegral

1.000 toneladas

Argentina Austrália União Européia - 27 Nova Zelândia EUA resto do mundo

Fonte:OECD/FAO(2007)

Quanto às importações, pode-se dividir os países em dois blocos, um

bloco que importa produtos com maior agregação de valor: queijos e manteigas e

outro que importa sobretudo leite em pó, muitas vezes utilizado como ingrediente

em outras formulações alimentícias.11 O maior importador de queijos e manteiga é

a Rússia (Gráfico 05). Essa tendência se mantêm para o ano de 2016. O

fornecimento desses produtos provém da União Européia e da Nova Zelândia,

principalmente. Quanto às importações de diferentes formas de leite em pó, o país

que mais se destaca é a Argélia e, na projeção das importações de leite para

2016, a China aumenta sua participação, por conta do crescimento no consumo

per capita de leite, associada com a crescente urbanização que reduz as possíveis

áreas de produção. Esse crescimento da importância da China nas importações

mundiais traz no seu bojo o crescimento da demanda de produtos lácteos mais

elaborados em alguns países em desenvolvimento, que apresentam uma classe

média crescente, que demanda alimentos mais sofisticados e processados.

Ocorre que a China exerce um controle sobre as importações dos ingredientes

11 Como forma de ilustração, no ano de 1998 os principais produtos comercializados internacionalmente foram o leite em pó (54% do total de lácteos exportados), os queijos (25%) e a manteiga (20%) (Nofal & Wilkinson, 1999).

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lácteos (produtos comoditizados, como o leite em pó desnatado e integral),

exigindo que sejam utilizados como insumos e que o processamento final ocorra

em território chinês.

Gráfico 05 – Importações de lácteos, em 2004-06 e previsão para 2016

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1000

2004-2006 2016manteiga

2004-2006 2016queijo

2004-2006 2016 leiteem pó

desnatado

2004-2006 2016 leiteem póintegral

mil tonelad

as

Rússia Argélia China Japão México Arábia Saudita

Fonte:OECD/FAO(2007)

Uma visão panorâmica do comércio mundial de lácteos pode ser

observada na Figura 03. Os volumes e os perfis dos produtos não estão

perfeitamente definidos, mas pode-se perceber o papel singular da Europa, tanto

como importadora, quanto exportadora, além da ausência da América do Sul nos

fluxos assinalados.

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Figura 03 – Comércio internacional de lácteos, em 2000

Fonte: Rabobank International (2006)

A partir dos elementos abordados, é possível observar que a

mundialização da cadeia produtiva láctea é um fenômeno bastante complexo e

incipiente, dois aspectos que dificultam a percepção mesma do fenômeno. Isso

porque o volume de lácteos objeto do comércio mundial é reduzido e o mercado

global de lácteos se apresenta como uma soma de mercados nacionais/regionais,

de diferentes dimensões, acrescidos dos mercados de exportação, que, por

enquanto, são importantes apenas para poucos países. Como se viu, essa

configuração é fortemente determinada pelas características de produção e

mesmo físicas da matéria-prima básica, que também condicionam uma necessária

proximidade geográfica das primeiras etapas do processamento. Essas condições

de produção são afetadas por circunstâncias nacionais (sócio-econômicas,

institucionais e técnicas) muito distintas na atividade primária. A evolução da

demanda global é explicada em larga medida por determinantes estabelecidos

nacionalmente, como o crescimento demográfico e o grau de urbanização, o

crescimento da renda per capita e sua distribuição, além das tradições culturais

nacionais e hábitos eventualmente em mudança. Isso tudo confere ao mercado

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global um aspecto pouco integrado, com crescimento relativamente certo, embora

lento e progressivo, em um movimento mais determinado por tendências

(evolutivas) de longo prazo do que por perturbações cíclicas ou oscilações

bruscas.

Nessas condições, a perspectiva global está nas grandes empresas

processadoras, pouco mais de uma dezena de grandes corporações, que

dominam as tecnologias de processo e desenvolvem novos produtos (mudam

hábitos e criam novas necessidades), além de concentrar expressivo poder

financeiro. Tais ativos as colocam em condições de explorar os mercados

nacionais e de exportação para seus fins de valorização. Como será possível

notar pela análise das trajetórias empresariais (Capítulo 2), isso vem ocorrendo

em grau crescente, através de operações patrimoniais, de alianças e parcerias e

de ações internacionais de comercialização, enquanto parecem inexploradas as

possibilidades já referidas de geração de novos produtos lácteos a partir de

conhecimentos científicos estabelecidos e suas prováveis respectivas tecnologias

de produção.

Após um panorama mais geral do setor em escala mundial, o estudo

prossegue a uma apresentação do contexto das cadeias produtivas lácteas nos

blocos regionais. Tendo em vista a especificidade da indústria alimentar, pela qual

a localização da empresa está fortemente relacionada com a produção da matéria-

prima, torna-se importante de investigar preliminarmente as configurações das

cadeias produtivas lácteas com referência aos territórios dos blocos econômicos

regionais, considerando, posteriormente, a atuação das grandes empresas do

setor no contexto daquelas configurações, elas mesmas sujeitas ao impacto da

atuação empresarial.

Um entendimento mais aprofundado da dinâmica internacional só se faz

possível no âmbito da cadeia produtiva. Analisar a agroindústria processadora

sem levar em consideração os segmentos à jusante e à montante dessa indústria

não permite uma avaliação correta da competitividade da cadeia produtiva, visto

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que aspectos relativos à competitividade só podem ser avaliados por meio da

análise da cadeia de suprimentos.

1.2 Aspectos da cadeia produtiva na Europa

A indústria láctea européia constitui-se num oligopólio misto. Apesar do

número expressivo de empresas atuantes no setor, três empresas são

responsáveis por mais de 80% da produção européia, operando com produtos

diferenciados e com o uso de marcas fortes. Dentre os principais players globais

com sede em países europeus destacam-se Nestlé, Lactalis e Danone, cujas

trajetórias são abordadas no capítulo seguinte.

A produção leiteira em que se apóia a indústria processadora encontra-se

disseminada em todo o território europeu e é considerada a principal atividade

agropecuária da Europa, estando sujeita a um marco regulatório comum no âmbito

da União Européia . Segundo sua participação na geração de renda agrícola, essa

produção responde por 18,4% do total. Justifica-se, dessa forma, o fato do leite

ser o produto primário mais protegido, sobre o qual recai o maior volume de

subsídios e incentivos sendo alvo de diversas políticas públicas.

Em face a disseminação da produção em território europeu, os cinco

maiores países produtores – Rússia, Alemanha, França, Ucrânia e Reino Unido –

foram responsáveis por 53% da produção de leite de vaca europeu no ano de

2005 (Embrapa Gado de Leite, 2007).

No tocante à produção industrial, a União Européia é a principal região

produtora de leite em pó – integral ou desnatado –, de queijos e de manteiga

(Anexo A6). Essa produção industrializada incorpora os subsídios dados à

produção primária, o que aumenta seu grau de competitividade. Diversos

indicativos apontam para uma mudança dessa realidade, com a suspensão

gradativa desses subsídios, incluindo-se nesse movimento de redução do

protecionismo do setor a própria instituição do sistema de cotas. A incógnita é

sobre quando essa redução irá se concretizar.

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Como afirmado na introdução desse capítulo, o sistema de cotas de

produção de leite,12 em vigor desde 1984, teve uma contribuição decisiva para as

transformações setoriais verificadas nos países integrantes da Comunidade

Econômica Européia, refletindo-se sobre os demais países e constituindo-se em

um ponto de inflexão dessa cadeia produtiva.

Até o começo dos anos 1960, a Comunidade Européia era um importador

líquido de leites e derivados. No ano de 1962 a Política Agrícola Comum (PAC) foi

instituída. O objetivo da PAC era de estabilizar os mercados e assegurar um

melhor nível de vida à população agrícola. As metas a serem alcançadas para o

setor leiteiro incluíam: retorno justo para os produtores, mercados estáveis,

garantia de oferta, preços razoáveis aos consumidores e introdução de políticas

visando incremento da produção e da produtividade. No ano de 1968 é

estruturado o mercado comum do leite na Europa e, nos anos 1970, a mesma

torna-se exportadora líquida de leite. Essa inversão foi decorrente da utilização de

subsídios, que implicou em aumento de produção. Gradativamente, a Comunidade

Européia passou a aumentar seus estoques de produtos lácteos e, igualmente,

conseqüentemente os gastos com subsídios à produção de leite.

Buscando reduzir os custos crescentes com o subsídio à produção, foi

estabelecido um sistema de cotas de produção de leite no ano de 1984. A

introdução dessa prática levou a um decréscimo quase que imediato da produção

leiteira na Europa. Com a adoção desse sistema, a concentração da produção

primária acentuou-se, devido sobretudo à saída dos pequenos produtores.13

O estabelecimento do sistema de cotas, ao restringir a oferta, objetivou a

sustentação dos preços pagos aos produtores via mercado, mantendo, dessa

12 O sistema de cotas, além de limitar a produção de leite em cada país, é individualizado, pois cada produtor tem a sua quantidade de referência individual. Cabe a cada produtor, por meio de seus compradores, identificar aos organismos responsáveis a sua situação frente à sua cota de produção. Cada produtor tem que produzir pelo menos 70% da sua cota. Quantidades produzidas inferiores implicam em penalidades para os mesmos. 13 Foram excluídos principalmente os produtores com plantel de até 10 vacas, sendo compensada essa diminuição com e aumento da produção dos maiores produtores.

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forma, o seu poder aquisitivo. De certo modo, esse sistema de contingenciamento

buscava a redução dos estoques de produtos lácteos, pois o setor lácteo estava

absorvendo parte significativa dos recursos destinados à agricultura – em torno de

10%. Os subsídios acabavam destinando-se à produção e também às

exportações, reduzindo seus preços. Com a instituição das cotas, evitou-se o

círculo vicioso de mais produção e maiores gastos com subsídios. Também

passou-se a limitar uma produção que trazia no seu bojo uma série de impactos

ambientais.

Assim, desde a implementação do sistema de cotas, inicia-se um

processo que desestimula a expansão das empresas em território europeu,

limitando-a pelas restrições à captação da matéria-prima. As posições no

ranqueamento de captação de leite das empresas então atuantes estavam

garantidas automaticamente, pois as cotas resultaram em um "engessamento" na

captação da matéria-prima. As alternativas possíveis de crescimento da produção

de lácteos foram a expansão em outros territórios ou a utilização de matéria-prima

já processada, como o leite em pó, na preparação de lácteos. Nessa trajetória de

crescimento destacaram as operações de fusões e aquisições, que asseguraram a

expansão em outros territórios, sobretudo na América Latina e na Ásia,

continentes que experimentaram um aumento do consumo per capita de leite e

derivados.

1.3 Aspectos da cadeia produtiva nos Estados Unidos da América

Como características mais marcantes da cadeia produtiva láctea norte-

americana destacam-se a elevada concentração, que perpassa todos os elos da

cadeia, a presença predominante das cooperativas de produtores na indústria

processadora, a elevada produtividade e os altos custos na produção primária, o

pequeno grau de abertura do mercado nacional de produtos lácteos e uma forte

presença dos mecanismos de regulação estatal. Os Estados Unidos são o maior

produtor mundial de leite de vaca e a trajetória do setor lácteo nesse país está

fortemente condicionada pelas ações deliberadas do Estado e dos organismos

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institucionais relacionados, que intervêm no direcionamento que é conferido ao

setor (Bailey, 2002).

As políticas públicas atuaram no sentido de direcionar e acelerar o

processo de concentração, em diversos sentidos. A concentração acentuada na

produção primária resulta da diminuição do número de propriedades envolvidas na

atividade leiteira, associada a um aumento no tamanho dessas, que absorveram

propriedades menores. Em 2001, as propriedades com mais de 200 vacas eram

responsáveis por 57% do leite produzido nos EUA, contra 36,3% em 1993 (Bailey,

2002).14 A concentração na produção primária tem também uma dimensão

espacial, pois houve um processo de especialização regional.15

A redução no número de propriedades e também a concentração espacial

são reflexos de políticas mais amplas e de programas setoriais anteriores. Parte

dessa redução pode ser explicada pelo Government Dairy Termination Program,

implementado em 1986-87, contemplando com pagamentos os produtores que

abdicassem da produção de seus rebanhos durante cinco anos. A Lei Agrícola de

1996, que objetivava a redução das regiões de comercialização de 32 para um

máximo de 10 a 14 regiões no ano de 1999, também explica parcialmente a

concentração apresentada.

Houve um movimento de concentração e centralização na produção de

leite e, conseqüentemente da captação para a indústria processadora. Isso

ocorreu de forma continuada e gradativa, resultando numa elevada produtividade

média – os EUA detêm o posto de maior produtividade leite/vaca (Tabela 01) -

assim como num aumento da oferta de leite, reflexo da maior especialização

obtida. Entretanto, esse maior rendimento, derivado de uma produção intensiva

14 Esse é uma tendência que já se verificava na segunda metade dos anos 1980, quando ocorreu uma queda no número de produtores da ordem de 22,1%. No período 1993-2001, com exceção das propriedades com plantel de vacas superior a 200 cabeças, todas as demais sofreram um decréscimo de produção. 15 No começo do século XXI, a produção está centrada em três grandes regiões - a Nordeste, a Meio-Oeste e a Oeste – caracterizadas por grandes propriedades, com número de cabeças superior à média americana. Essas regiões foram responsáveis por 76,8% da produção de leite nos EUA em 2001 (Bailey, 2002).

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em tecnologia, foi alcançado graças a constantes inversões de capital. Esses

resultados também foram estimulados pelas políticas protecionistas ao setor, que

asseguram a operação do setor com altos custos de produção,16 e, em

conseqüência, implicam elevados dispêndios governamentais.17

Atualmente os Estados Unidos adotam uma política de preços mínimos,

garantindo com isso a estabilização do preço do produto e a manutenção da renda

agrícola. Entretanto, essa conjunção de políticas acaba por aumentar o potencial

produtivo do segmento e resulta em constantes excedentes de leite. A presença

de excedentes se reflete diretamente na política americana para o setor, que

desde o início do século XX organiza a comercialização através da utilização de

instrumentos que reduzam essa geração de excedentes, tal como o Dairy

Termination Program, já mencionado. Com a política interferindo diretamente na

base produtiva, verifica-se uma diminuição dos graus de liberdade do produtor. A

manutenção dessa política implica também em expressivos gastos

governamentais com o setor de leite.

O governo também exerce sua coordenação ao estipular subsídios e cotas

de produção. Ainda que o movimento geral da economia seja na direção da

liberalização dos mercados agrícolas, não é essa a realidade nos EUA. A Lei

Agrícola Americana, de maio de 2002, manteve a prática de garantir o preço

mínimo do leite, mesmo que o governo tenha sinalizado que essa prática seria

extinta em 1999.18 Essa política de preços mínimos adotada tende, em última

instância, a provocar uma maior produção e maior formação de estoques do

produtos lácteos, sendo que em alguns anos isso realmente aconteceu. Assim,

para evitar a geração de excessos de produção sobre o consumo e maiores

16 Conforme o Quadro 01, a produção de leite de vaca nos EUA figura entre as de maiores custos em termos mundiais, superiores aos apresentados na Oceania, no Brasil e também em alguns países da Europa. 17 A análise desse parágrafo apóia-se em Bortoleto & Wilkinson (1999), assim como em Nofal & Wilkinson (1999). 18 A Lei Agrícola de maio de 2002 garante a manutenção do preço mínimo do leite em 48 estados norte-americanos no período de junho de 2002 a dezembro de 2007. “O inesperado é que a Lei Agrícola de 1996 mencionava que o preço mínimo deveria se extinguir em 31 de dezembro de 1999. Entretanto, o sistema de preços mínimos e o valor foram mantidos (Lopes, 2002:1)”.

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dispêndios com subsídios, outros instrumentos de política agrícola foram utilizados

de modo complementar, buscando um melhor escoamento da produção e

aumento de consumo.

Na medida que as políticas adotadas estimularam a produção e para que

não se verificasse um aumento dos estoques, foram desenvolvidas políticas de

promoção do consumo de lácteos – para tal foi implementado o Programa de

Promoção do Consumo do Leite (PPCL). Nos anos 1990, foram realizadas

campanhas institucionais, que destacavam a importância do consumo de leite e

que lograram reverter os problemas de saturação de mercado presentes desde os

anos 1980. As campanhas contribuíram para uma transformação no consumo,

registrando-se um aumento de aproximadamente 1,8% ao ano no consumo per

capita de lácteos no período 1990/2001 (Bailey,2002).19

Segundo as análises de Bailey (2002), as transformações que vêm

ocorrendo na base primária da cadeia láctea norte-americana devem-se aos

seguintes fatores: concentração das propriedades produtoras na busca de uma

maior competitividade e de melhores oportunidades de mercado; aumento

crescente da oferta de leite visando atender à demanda; possibilidade de

transporte do leite por longas distâncias; e alguns programas de governo

orientados para os consumidores.

Uma análise da indústria láctea dos EUA evidencia que a concentração

também está presente no elo processador da cadeia produtiva, que também se

apresenta como um oligopólio misto, recentemente reconfigurado por operações

de fusões e aquisições. Nos EUA, desde os primórdios do século XX, o

processamento do leite já era realizado predominantemente por grandes

empresas. Durante a década de 1990, houve uma redução de aproximadamente

45% no número de plantas industriais, chegando ao ápice um processo que se

iniciara na década de 1980, elevando assim o índice de concentração setorial.

19 Esse crescimento per capita não foi uniforme, pois caiu o consumo de leite fluído e aumentou sobretudo o consumo de queijos – principalmente o queijo muzzarella utilizado na confecção de pizzas.

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A intensificação da concentração técnica da produção foi decorrência das

transformações patrimoniais dos últimos anos, sobretudo das fusões e aquisições

que envolveram a Dean Food, que se transformou na maior empresa do setor nos

EUA (conforme o faturamento). Ainda na década de 1990, surgia a Dairy Farmers

of América, outra grande empresa, também resultante de operações de fusões e

aquisições. As modificações patrimoniais refletiram-se na alternância entre

empresas nos primeiros postos no faturamento da indústria láctea durante os anos

1990, reduzindo a importância que a Kraft Foods possuía, de líder inconteste no

setor.

Nas transformações patrimoniais verificadas, as cooperativas tiveram um

papel destacado, dando origem às novas gigantes da indústria láctea. A

importância do movimento cooperativo é significativa nos EUA e não é nova, pois

desde os primórdios da formação do setor as cooperativas estiveram presentes na

cadeia láctea norte-americana.20 Durante o processo de reestruturação setorial, as

cooperativas alteraram substancialmente seu grau de centralização. Assim, no

período 1992-2000, dentre as cooperativas que tinham no leite sua principal

atividade, 17% se fundiram, 17% foram dissolvidas e 4% foram incorporadas por

outras empresas. Também nesse período surgiram 32 novas cooperativas, todas

operando em larga escala (USDA, 2001).

Uma peculiaridade da cadeia láctea americana, no tocante à coordenação

entre os agentes, é que o seu sistema de organização está inteiramente baseado

em contratos formais, o que possibilita um melhor planejamento e também evita

atitudes oportunistas por parte dos fornecedores. Entre os produtores de leite,

84% estão filiados a cooperativas, possuindo contratos formais de exclusividade

na entrega do leite. A cooperativa também estabelece contrato com as empresas

processadoras. A existência desses contratos implica que o leite produzido tenha

20 “Por volta de 1900, havia 1.600 cooperativas processando laticínios nos EUA, a maioria delas no meio-oeste (Hobsbawn, 1988:61)”.

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destinação certa, sendo praticamente inexistentes as variações de oferta e

consequentemente de preços (Lopes, 2002).21

Parte das transformações verificadas no âmbito da indústria americana

pode ser interpretada como resultado de estratégias defensivas frente às

reestruturações mundiais, que ocorreram após a introdução do sistema de cotas

de produção na Comunidade Européia na década de 1990. Como será

evidenciado no próximo capítulo, esse novo marco regulatório provocou uma

reação nas estratégias de crescimento das empresas européias; as empresas

americanas, visando a manutenção das suas posições no mercado, adotaram

estratégias semelhantes.

Como se depreende das observações anteriores, o segmento lácteo norte-

americano sofre uma intensa intervenção pública, seja pela ótica da

regulamentação de preços (e mesmo de produtos), seja pelos programas de apoio

e políticas específicas para os diversos segmentos que compõem a cadeia láctea.

A diversidade e a intensidade das políticas públicas utilizadas é determinada pela

baixa competitividade apresentada pelo setor, comparativamente às condições do

setor em outros blocos econômicos onde estão sediados outros importantes

players da cadeia produtiva mundial. Apesar da elevada produtividade, o custo do

produto é maior do que na Oceania e no Brasil, é também superior a alguns

países europeus. Assim, a entrada dos produtos lácteos norte-americanos no

mercado internacional só se faz possível em face dos subsídios. Também em

decorrência dessa baixa competitividade, a prática da proteção tarifária é utilizada

nos mercados dos EUA para que a entrada de produtos externos não concorra

diretamente com os produtos americanos.

21 “Nessa cadeia de contratos existe a celebração de um outro instrumento de produção programada entre a indústria, os atacadistas e varejistas de leite nos EUA. Além disso, dentro de um sistema idêntico de contratos, entre a cooperativa e os produtores, existe uma cooperativa integrada verticalmente especializada em engarrafamento e produção de leite.Os contratos têm seus preços fixados através de uma fórmula de preços, que se referencia aos mercados de leite. Os preços de queijo e manteiga são fixados na Bolsa Nacional de Queijos e a manteiga na Bolsa Mercantil de Chicago. O sistema de fixação de preços é por leilão. Entretanto, lá nas bolsas é transacionada uma parcela muito pequena da produção. Mas é ali que se formam os preços de uma forma transparente e em termos nacionais (Lopes, 2002:4)”.

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33

Diversos fatores levaram essa cadeia produtiva voltar-se para o mercado

interno. Nesse sentido, pode-se destacar a dimensão do país, os elevados custos

na produção de leite, acompanhado do elevado dispêndio fiscal em decorrência

dos subsídios e a própria composição da demanda, predominantemente em

produtos frescos, desestimula a entrada de importações de produtos substitutos.

Apesar disso, há políticas de promoção das exportações, capitaneadas pelo

Conselho Exportador do Leite dos EUA (USDEC, 2002).

1.4 Aspectos da cadeia produtiva na Oceania

O bloco da Oceania é responsável por 4% da produção mundial de leite

(FAOSTAT, 2007). Essa região produtiva encontra-se localizada em latitude

semelhante ao Brasil, possuindo dessa forma as mesmas condições

climatológicas, uma das poucas características semelhantes às condições da

cadeia produtiva brasileira. Apesar da pequena representatividade política do

bloco, a região destaca-se no comércio internacional de produtos lácteos, pois

Austrália e Nova Zelândia são responsáveis por 50% das exportações mundiais

(Spies, 2006).

Diferentemente da grande maioria dos países, as exportações da região

não se referem a um excedente sobre as necessidades nacionais de consumo.

Atualmente, a produção láctea está orientada para o mercado externo, sobretudo

no que se refere à produção de queijos e manteiga. Na Austrália, as exportações

de produtos lácteos absorvem 50% do total do leite produzido, enquanto na Nova

Zelândia esse percentual supera os 90%. A proximidade geográfica com a

China,22 uma das mais importantes zonas de expansão no consumo de lácteos no

mundo, contribui para essa trajetória de expansão produtiva apoiada nas

exportações.

22 Segundo Rabobank International (2007), os chineses irão responder por 60% da demanda mundial de laticínios no ano de 2015. Note-se que essa estimativa parece exagerada, pois difere significativamente das previsões da FAO utilizadas no Gráfico 05.

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Buscando aumentar o poder de barganha de seus produtores, os países

da região atuam como um bloco econômico, evitando assim uma concorrência

mais direta, na esfera do comércio internacional, entre produtores de Nova

Zelândia e a Austrália. A cadeia produtiva láctea é economicamente representativa

nos dois países e existem interesses comuns, que favorecem a realização de

políticas conjuntas (por exemplo, atuam como um bloco no comércio exterior,

ofertando produtos distintos, possibilitando ganhos de sinergia ao atuarem de

forma conjunta. Dentro dessa lógica foram criadas uma série de políticas públicas

e, nos dois países, existe um tratamento diferenciado dos lácteos em relação aos

demais produtos.

Ao contrário da grande maioria dos países, a importância do leite para a

economia da Nova Zelândia é muito grande, e a cadeia produtiva láctea recebe do

governo um tratamento especial. Na Austrália, a preocupação com o setor é

semelhante, sendo o Estado responsável direto pela política de inovação. Nesse

país, 75% do leite produzido é processado por cooperativas, 42% das

propriedades que produzem leite são artificialmente irrigadas e em 61% das

propriedades a produção baseia-se no trabalho familiar (FAEP, 2006).

Esse destaque na produção láctea pode ser explicado por uma série de

razões, especialmente os baixos custos da produção primária na região23 (Quadro

01), a ausência de sazonalidade na produção (que estimula os investimentos

privados) e o elevado grau de avanço tecnológico em que se encontra a indústria

processadora, todos fatores que ampliam a competitividade dos produtos da

região.

A supressão da sazonalidade, que permite que a produção transcorra

numa constante “safra”, foi decorrência de uma reestruturação no sistema de

produção primária (Broekhuijse, 1988). A presença da sazonalidade atua como um

fator que desincentiva o investimento e os esforços no sentido de reduzir a

23 O custo reduzido do leite neozelandês está relacionado com a utilização intensiva de pasto rotacionado (Martins & Araújo, 2002).

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sazonalidade são relevantes para o desempenho do setor. A reestruturação da

produção primária na Nova Zelândia envolveu a aplicação da agricultura de

precisão na produção do pasto, principal alimento do gado leiteiro (FAEP, 2006).24

Isso resultou numa constância da produção, tornando possível um melhor

planejamento e funcionando como um incentivo para os investimentos e a

qualificação do parque industrial.

Nos arranjos produtivos da cadeia láctea, em ambos os países, os

recursos públicos são principalmente destinados para pesquisa e promoção de

exportações, e não para o pagamento de subsídios. Quando esses ocorrem, os

recursos são provenientes de um fundo formado a partir da contribuição dos

produtores e da indústria. Na Austrália, os produtores de leite e a indústria

processadora criaram a Australian Dairy Corporation (ADC), organismo

responsável pela promoção, seja interna ou externa, do leite e seus derivados

(Martins & Araújo, 2002). No caso da Nova Zelândia, destaca-se o suporte das

políticas públicas ao setor na forma agressiva de sua política de exportação, que

tratou de adaptar seus produtos aos diferentes mercados locais, garantindo sua

presença em praticamente todos os blocos econômicos, a partir dos anos 1990.

Na Nova Zelândia, a indústria está organizada predominantemente sob

comando de empresas formadas por cooperativas de produtores, que atuam

conforme os parâmetros das “novas cooperativas”, de caráter marcadamente

empresarial.25 Quatro cooperativas dividem o território, sendo que as duas

maiores foram responsáveis por 96% do processamento do leite. Essas

cooperativas, apoiadas pelo Estado, criaram a New Zealand Dairy Board, única

empresa exportadora de lácteos do país (Martins & Araújo, 2002). Essa

organização buscava suprir as deficiências de comercialização das companhias

locais e configurou um modelo específico de regulação. Segundo Martins e Araújo,

24 A chamada agricultura de precisão consiste na utilização de tecnologias avançadas para a determinação das características do solo com vista a atender as necessidades específicas de cada porção de terra, possibilitando assim um incremento da produtividade (Tschiedel & Ferreira, 2002). 25 Esse destaque já provêm de longa data, como colocado por Hobsbawn (1988), no começo do século XX as cooperativas já detinham o controle da indústria de lácteos na Nova Zelândia.

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“Esse é um interessante modelo de regulação. Diante da importância dos lácteos para a economia nacional como mecanismo de inserção na economia global, o Estado concedeu ao setor privado a possibilidade de auto-gestão. Não há, portanto, conflitos entre os grupos de pressão a serem dirimidos, o que facilita essa outorga pelo Estado.” (2002:8).

Também na Austrália as cooperativas predominam no processamento, na

sua totalidade são responsáveis por 75% do processamento de leite, sendo que

as três maiores – Murray Goulburnn, Bonlac – Fonterra e Dairy Farmers são

responsáveis por 60% da produção. O restante é processado por grandes

empresas estrangeiras, empresas nacionais e pequenos produtores atuando em

nichos específicos (Spies, 2006).

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2. Indústria láctea mundial: uma análise dos principais atores

Quando a empresa passa a atuar numa dimensão global, ela busca a

apropriação de vantagens associadas às suas diversas bases de implantação.

Movimentos recentes de expansão das grandes empresas processadoras,

sediadas sobretudo na Europa, demonstram que o Brasil pode ser um integrante

representativo dentro desse novo cenário competitivo.

Ao longo do capítulo analisa-se a trajetória das oito principais empresas,

buscando-se um maior conhecimento dos principais players mundiais. São

analisadas as estratégias que levam à constituição dessa cadeia produtiva global:

o elemento dinâmico é a grande empresa e, através da “destruição criadora”, a

cadeia produtiva vai se transformando. As empresas foram escolhidas a partir de

levantamento do Rabobank International com base no valor das vendas relativas a

produtos lácteos e derivados (ano de fiscal de 2006) e que correspondem a

empresas com faturamento na área de lácteos e derivados superior a 5.000 euros

(Tabela 04).26

26 A indústria considerada engloba, conforme IBGE (2004), os segmentos denominados: Preparação do leite, que compreende as atividades de filtração, esterilização, pasteurização, homogeneização e resfriamento de leite, incluindo o envasamento de leite, associado ao beneficiamento e exclui a produção de leite cru e o envasamento de leite por conta de terceiros; e a Fabricação de produtos do laticínio, que compreende: a produção de creme de leite, manteiga, coalhada, iogurtes, etc; a produção de bebidas achocolatadas; a produção de leite em pó, dietético, concentrado, maltado, aromatizado, gelificado, etc; a produção de queijos, inclusive inacabados e a produção de farinhas e sobremesas lácteas. Esta classe compreende também a produção de doce de leite e a obtenção de subprodutos do leite: caseína, lactose, soro e outros.

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Tabela 04 – Principais empresas de lácteos no mundo, ranqueamento segundo o valor das vendas (somente lácteos) no ano de 2006

(em bilhões de €)

Fonte: Rabobank Internacional (2007) in www.danish.dairyboard.com

2.1 Nestlé

A gênese da maior empresa de produtos lácteos no mundo, também líder

do setor de alimentos, foi uma fórmula inventada pelo químico farmacêutico Henri

Nestlé para auxiliar na cura de um bebê desnutrido, no ano de 1866 (Araújo Jr.,

2006).27 A inovação foi designada farinha láctea. Depois de abrir escritórios para

comercialização dos produtos em Londres, América do Sul e Austrália no ano de

1868, a empresa acaba por ser vendida em 1874 para a sociedade formada por

27 Nos seus primórdios, os produtos lácteos industrializados eram sinônimos de indicação médica e sua venda ocorria nas farmácias. O inventor, que durante algum tempo também foi empresário, era um estudioso na busca de soluções para o problema da desnutrição infantil.

Rank Empresas Sede Vendas

1 Nestlé Suíça 14,8 2 Lactalis França 8,

3 3 Danone França 7,9 4 Dean Foods EUA 7,4 5 Arla

Foods Suécia/Dinamarca 6,

9 6 Fonterra Nova Zelândia 6,7 7 Dairy Farmers of America EUA 6,3 8 Kraft Foods EUA 5,1 9 Unilever Reino Unido 4,4 10 Friesland Foods Holanda 4,4 11 Campin

a Holanda 3,

6 12 Parmalat

Itália 3,4 13 Bongrai

n França 3,

3 14 Meiji Daires Japão 3,3 15 Saputo Canadá 3,1 16 Morinaga Milk Industry Japão 3,0 17 Schreiber Food EUA 2,5 18 Land O´Lakes EUA 2,3 19 Müller Alemanha 2,1 20 Dairy Crest Reino Unido 2,0

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Pierre Samuel Roussy, Jules Monnerat e Gustave Marquis e outros sócios

menores. No ano de 1898 a empresa adquire a primeira planta fora da Suíça, uma

planta de leite condensado na Noruega, e em 1900 instala-se também nos

Estados Unidos. Espalhou-se pelos quatro cantos do mundo após inúmeros

processos de fusões e da implementação de alianças realizadas ainda no começo

do século XX. Em 1904, estabeleceu acordo com a Companhia Geral de

Chocolate Suíça, para adicionar o chocolate a suas linhas produtivas. Em 1905,

cessa a concorrência com a Anglo Swiss Condensed Milk (Companhia Anglo-

Suiça de Leite Condensado)28, ao ocorrer a fusão das duas companhias; a partir

desse momento a Societé Nestlé passou a ser designada apenas como Nestlé.

Nessa época passou a deter empresas operando nos EUA, Inglaterra, Alemanha,

Espanha e Austrália. Assim, pode-se perceber que, desde seus primórdios, a

atuação da empresa ocorre de forma internacionalizada.

Após um começo exitoso, a empresa sofreu impactos em face da Primeira

Guerra Mundial, quando foi obrigada a vender todo o estoque de matéria-prima

para as tropas oficiais. Se inicialmente a guerra ocasionou um problema, pois a

aquisição da matéria-prima estava obstaculizada, também abriu novas

oportunidades de mercado, avalizadas por contratos de governo. Com a

destruição da Europa e conseqüentemente de suas plantas industriais, a forma

encontrada para honrar seus contratos foi a aquisição de plantas já existentes em

outros continentes, como nos EUA. Dentro dessa lógica, ocorreu também a

aquisição da planta brasileira em Araras, São Paulo, no ano de 1921. O final da

guerra encontrou a Nestlé com mais de 40 plantas.

Ao longo de sua trajetória, o crescimento se fez constantemente presente.

Com o advento da maior liberalização do comércio internacional, esse crescimento

se intensificou. Após 1985, a Nestlé adquiriu diversas empresas, além de

participações societárias em outros empreendimentos, o que caracteriza este

período como sendo de intenso processo de aquisições, que possibilitaram o

crescimento da empresa (Quadro 02). A realização de parcerias também foi uma 28 Primeira fábrica de leite condensado do mundo, fundada em 1867.

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das características do período mais recente, e, no tocante aos produtos lácteos,

as principais ações foram dessa natureza. No período mais recente (1990-2006), a

empresa não adquiriu nenhuma empresa específica de processamento de leite,

mas sim empresas que se utilizam de lácteos como insumos de seus produtos

principais.

Na verdade, no segmento de lácteos, a prática predominante foi a

realização de parcerias com empresas cuja expertise principal é na área láctea.

Nesse sentido, destacam-se as parcerias com a Fonterra para atuação nas

Américas e com a Lactalis para atuação no mercado europeu. Em 1999, com a

Pillsbury Company, constituiu uma nova empresa para atuar no setor de sorvetes

e sobremesas congeladas nos EUA. Posteriormente, no ano de 2003, a Nestlé

Suécia, conjuntamente com a Ingman Glass constituiu uma nova empresa, a

Svenska Glasskiosken, responsável pela venda e distribuição de produtos à base

de gelados da Suécia. A Nestlé também adquiriu empresas que lhe propiciaram

entrar em outros segmentos produtivos, por exemplo, as ocorridas nos ano de

1998 e 2002 (ver Quadro 04), com as quais passou a atuar na alimentação para

animais.

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Quadro 02 – Operações de fusões e aquisições realizadas pela Nestlé, no período 1985-2006

Marca/Empresa Ano da operação

Segmento de atuação Origem do capital

CoffeMate e Friskies 1985 alimentação animal Holanda Carnation 1985 creme de leite Holanda Hills Brothers Coffe 1985 café EUA Libb´s Juicy Juice 1985 sucos EUA L.J. Minor Corporacion Inc. 1986 alimentos preparados EUA Perugia 1988 chocolates Itália Sunmark 1990 açúcar EUA Baby Ruth, Butterfinger e Pearson/ Nabisco

1990 guloseimas EUA

Drumstick Company I.K. Parker 1991 cone de sorvete EUA Perrier 1992 água mineral França Deer Park Utopa 1993 água mineral EUA Vera San Bernardo 1993 água mineral Itália Tnuva 1996 sorvetes Israel Sanpellegrino 1998 água mineral Itália Buitoni 1988 cozinha italiana Itália Spillers/Dalgety 1998 alimentação animal Reino Unido Rowntree Mackintosh 1998 chocolates Inglaterra Klim e Cremora/ Borden 1998 produtos lácteos EUA

Pillsbury 1999 alimentos congelados, gelados e enlatados

EUA

PowerBar 2000 barras nutritivas EUA Chef America 2002 alimentos congelados EUA Garoto 2002 chocolate Brasil Hem Is 2002 sorvete Finlândia Ralston Purina 2002 ração animal EUA Schöller 2002 sorvete Alemanha Dreyer´s Grand Ice Cream 2003 sorvete EUA Delta Ice Cream 2005 sorvete Grécia Erikli 2006 água mineral Turquia Uncle Tobys 2006 cereais Austrália Jenny Craig 2006 produtos dietéticos EUA Mövenpick e Dreyer´s 2006 sorvetes Suíça

Novartis Medical AG 2007 alimentação hospitalar instrumentos médicos

Suíça

Gerber 2007 alimentação infantil artigos para bebês

EUA

Fonte dos dados: Relatórios da empresa, vários anos.

Os seus principais produtos em termos de vendas são as bebidas,

seguidas dos produtos lácteos (Gráfico 06). Os segmentos em que a empresa

atua são os mais diversos, desde água até o ramo farmacêutico, em que atua com

as marcas Alcon e Galderma. Em função da grande diversificação de produtos, os

lácteos representam apenas 20% das vendas do grupo. Enquanto categoria

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específica de produtos, o segmento lácteo vem perdendo em participação dentro

do grupo. Entretanto, a matéria-prima leite está na base de uma série de outras

categorias de produtos, sendo da maior relevância para a empresa. Dessa forma,

ainda que os produtos lácteos sejam apenas uma fração dos seus produtos, a

empresa é uma das principais captadoras de leite em praticamente todos os

mercados onde atua.

Gráfico 06 – Distribuição das vendas mundiais da Nestlé, por grupo de produtos, em 2006

nutrição6%

chocolate e biscoitos

10%

comida para animais12%

diversos8%

pratos prontos18%

lácteos20%

bebidas26%

Fonte dos dados brutos: Nestlé (2007).

A diminuição da participação setor lácteo no faturamento gerado pelo

amplo leque de produtos da empresa pode ser contatado pelo dado recente, do

ano de 2001, quando as vendas de lácteos correspondiam a 27% das vendas

totais. Gradativamente a empresa vem expandindo seus campos de atuação e,

ainda que a representatividade do setor tenha diminuído em participação, a

Nestlé, dentro do setor lácteo, continua a ser líder mundial.

A sua marca principal é a Nestlé, mas possui outras diferentes em

produtos específicos. As principais marcas utilizadas nos produtos de origem

láctea são Nestlé, Nido, Nespray, Ninho, Carnation, Milkmaid, La Lechera, Moça,

Klim, Glória, Svelty, Molico, Nestlé Omega Plus, Bear Brand, Cofee-Mate; e nos

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refrigerados, Nestlé, LC1, Chamyto, La Laitière, Sveltesse, Yoco, Svelty Molico

(Anexo A9). Algumas são de abrangência mundial e outras de abrangência

regionalizada, mais ainda que essas persistam, a identidade visual das marcas é

única, remetendo sempre para uma marca mundial. As marcas principais são

responsáveis por aproximadamente 70% das vendas.

Gráfico 07 – Distribuição das vendas mundiais da Nestlé, por região produtora, em 2006

outros10%

águas10%

Ásia, Oceania e África17%

Américas34%

Europa29%

Fonte dos dados brutos: Nestlé (2007).

Como já foi dito anteriormente, na história mais recente da Nestlé,

destacam-se diversas parcerias implementadas, que objetivaram a diminuição de

custos e o aumento da market share. Isso se verificou tanto na área de lácteos,

por meio de parceria estabelecida com a Fonterra, que deu origem à Dairy

Partners of America (DPA, para atuação nas Américas), quanto na área de

cereais, com na parceria estabelecida em 1990 com a General Mills, que deu

origem a Cereal Partners Worldwilde S.A. (CPW) (Friendly, 2005). Em 2001

estabeleceu uma aliança com a Coca-Cola, que deu origem à Beverage Partners

Worldwide (BPW). Realizou também uma joint-venture com a L’Óreál, empresa

na qual possui participação acionária, para o desenvolvimento de um suplemento

nutricional com finalidade estética (denominado de Inneov).

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Em vista de sua importância para a cadeia láctea no Brasil, cabe detalhar

a operação referida, a constituição da empresa Dairy Partners of America (DPA).

Esta formou-se com 50% do capital pertencente à Nestlé e 50% pertencente à

New Zealand`s Fonterra Cooperative Group Ltda. Essa joint-venture foi realizada

em 2002 buscando aumentar a competitividade na produção de leite. Assim, a

Nestlé se associa com a Fonterra, tendo em vista as competências específicas

desenvolvidas pela empresa neozelandesa, para obter um melhor desempenho

nas atividades relacionadas com a coleta do leite fresco e a produção do leite em

pó no continente americano. No tocante à produção de leite em pó, a DPA tem

como cliente preferencial a Nestlé, o excedente é vendido a Fonterra, sendo que

os produtos da DPA têm prioridade, em relação aos produtos gerados na matriz

da Fonterra, nas vendas dessa empresa para o continente americano. A DPA

também se responsabiliza pela administração das operações que envolvem os

refrigerados lácteos e os produtos UHT, atuando na coleta do leite fresco, na

produção dos produtos, no marketing, envolvendo vendas e distribuição dos

produtos. Inicialmente a estrutura da DPA se constituiu de nove plantas, uma na

Venezuela (Fonterra), uma na Argentina (Nestlé) e sete no Brasil (Nestlé).

Outra parceria relevante da Nestlé no setor de lácteos foi a constituição,

no ano de 2006, da aliança com a Lactalis, na área de produtos frescos e

refrigerados, denominada de Lactalis Nestlé Produtos Frescos. Essa joint-venture

passou a ser responsável pela produção e comercialização dos produtos lácteos

frescos (iogurtes e sobremesas lácteas), realizando operações transferidas pela

Nestlé. A nova empresa tem 40% de seu controle acionário exercido pela Nestlé e

60% pela Lactalis. Essa joint-venture envolveu 13 unidades industriais, sendo

nove na França, três na Espanha e uma no Reino Unido. Em termos de recursos

financeiros, a aliança constituiu uma empresa com patrimônio de 1,5 bilhão de

euros. Essa parceria busca enfrentar o maior produtor de lácteos frescos mundial,

a empresa Danone, tratada a seguir. As marcas contempladas nessa parceria

foram B`A, Nestlé, La Laitiére, Yoko Bridel e Sveltesse (na França e Bélgica);

Ekabé em Luxemburgo; Sky e Munch Bunch no Reino Unido; Longa Vida e Yoggi

em Portugal; La Lechera na Espanha; Fruttolo e Mio na Itália e Hiz na Suíça.

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Essas marcas continuam sendo propriedades das empresas originárias e

possuem gestão autônoma para os produtos envolvidos na aliança.

Uma característica comum a essas duas parcerias é que, em decorrência

delas, a Nestlé deixa de atuar diretamente na produção em segmentos nos quais

não era especialmente forte.

Para o desenvolvimento de produtos e processos, a Nestlé investe em

atividades de pesquisa e desenvolvimento a partir de seu Centro de Pesquisa,

situado na Suíça, que emprega em torno de 650 pessoas, sendo 300 cientistas.

No ano de 2004, esse centro registrou 20 patentes e publicou em 268 periódicos

científicos. Todos esses gastos objetivam a conquista de inovações (de produtos e

processos), que podem sustentar lucros de caráter monopolista. No período 2000-

2004, mais de 700 produtos foram renovados ou introduzidos, sempre tendo como

foco a questão do “bem viver”. Além de oito departamentos científicos, os

pesquisadores trabalham em parceria com as principais universidades e centros

de pesquisa mundiais, integrando virtualmente suas pesquisas numa rede mais

ampla.

Ainda que as atividades de P&D estejam centralizadas no Centro de

Pesquisa na Suíça, as plantas regionalizadas têm autonomia para adaptação dos

produtos aos paladares onde se encontram situadas. Essas adaptações são

realizadas a partir de centros de pesquisa regionalizados, implicando que a cultura

da inovação esteja relativamente disseminada por toda a empresa.

Em toda sua trajetória de expansão, contata-se um processo de

diversificação da empresa e de diferenciação de produto. Freqüentemente, esses

processos tiveram como mote a busca de um melhor modo de vida, de maior bem-

estar e boa saúde em todas as fases de vida, enquanto objetivos que podem ser

alcançados através de uma certa nutrição. Em decorrência dessa opção, nas

últimas décadas a empresa tem desenvolvido uma série de produtos para as

distintas fases da vida. Segundo a perspectiva da própria empresa, ela considera

seu consumidor potencial como pessoas com renda anual igual ou superior a

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1.500 dólares, estimando que, até 2010, cerca de 1 bilhão de pessoas no mundo

passariam a ter ganhos suficientes para se qualificar como consumidores da

Nestlé.

O que se pode notar é que, ao longo dessa trajetória de crescimento, a

empresa sempre esteve comprometida com a inovação, direcionando seus

esforços de forma a produzir mercadorias com maior valor agregado e que

possam ser relacionadas com uma vida mais saudável. Além da construção de

marcas reconhecidas e de redes de distribuição, a inovação tem sido um fator

decisivo a possibilitar a liderança da Nestlé no setor.

Em sua busca pelo crescimento, essa empresa tem como objetivo

declarado ser a mais global das empresas de alimentos. Para isso trabalha numa

incessante padronização de seus produtos, com o objetivo de que o consumidor

reconheça os produtos Nestlé em qualquer lugar do mundo, revelando a

importância conferida à marca.

Em 2006, a empresa estava presente em 69 países, com 481 plantas

produtoras e 265.000 empregados, possuindo subsidiárias em mais de 100

países. Na Europa, possui atuação em 21 países, entre os quais se destacam a

França, com 40 unidades produtivas, a Alemanha com 24, a Itália com 23, o Reino

Unido com 22, a Espanha com 18 e a Suíça com 10 plantas industriais..

Gradativamente, a empresa passou a organizar a produção e a distribuição de

forma a minimizar os seus custos de transação. Nesse sentido foram montados

cinco centros mundiais de compra para a realização das compras das diferentes

unidades de forma consorciada. Durante esse processo de renovação e

adequação, que implicou a eliminação de algumas linhas não estratégicas29, a

empresa passou por uma reestruturação física, concentrar espacialmente sua

29 No ano de 1998 foram eliminados a mozzarella na Itália, os iogurtes com aditivos de sabor e o queijo no Chile, pois foram considerados produtos não estratégicos (Nestlé, 1999b).

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produção num menor número de plantas, com resultado de maior racionalização

na produção.30

Dentro de uma estratégia maior, de alcance global (sistema GLOBE); e

fundamentada no fortalecimento das marcas e na inovação, todas as áreas da

empresa têm passado por um processo de renovação dos produtos tradicionais,

através da incorporação de componentes nutricionais. No caso do leite, os

destaques são para a diferenciação de produtos, evitando o tratamento do leite

como uma simples commodity. O foco da inovação encontra-se não apenas nos

produtos – conteúdo e embalagem – mas também nos processos, passando

também a empresa a diversificar em linhas tradicionais de produção, com a marca

relativa ao leite condensado.

2.2 Lactalis

A Lactalis é um grupo empresarial especializado em lácteos, com sede na

França, que possuía, em 2006, 29.000 empregados nas suas 112 plantas

industriais, sendo 69 dessas localizadas no país-sede.31 (Anexo A10). Destaca-se

atualmente por exercer a liderança na produção de queijos especiais (queijos

finos).

A origem do grupo data de 1933, ano de fundação de uma pequena

fabriqueta de queijos por André Besnier na cidade francesa de Laval (em uma

região típica de produção leiteira), denominada “Sociéte Laitière de Laval A.

Besnier et cie”. No ano de 1961, esse empreendimento passou a ser designado

de “Sociéte Laitière Besnier” e, em 1999, transformou-se no Lactalis Group, atual

designação da empresa.

30 Na produção de leite infantil, por exemplo, diminuiu o seu número de plantas, passando de 13 plantas produtoras para 10 nas Américas. No caso da América Latina, a produção ficará concentrada na planta paulista de Ibiá. 31 Dados obtidos em www.lactalis.fr

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Ao longo de sua trajetória, essa empresa foi se expandindo alicerçada

sobretudo numa política de aquisições. Nos anos 1970, possuía apenas sete

plantas produtivas – Laval, Mayenne, Vitré, Rouez, Barbery, Conde e Athis – todas

elas queijarias. No ano de 1980, ainda exclusivamente em território francês,

contava com 27 plantas produtivas. Nos anos 1980, iniciou sua expansão em

território externo à França, com a aquisição da empresa americana Belmont em

1981. O período 1985-2006 foi marcado por uma série de fusões e aquisições,

relacionadas no Quadro 03.

Quadro 03 – Operações de fusões e aquisições realizadas pela Lactalis, no período 1985-2006

Empresa envolvida Ano da operação Segmento de atuação Origem do capital Aquisições

Bacha n.d Polônia Claudel Roustang Cia (subsidiária da Nestlé)

1985

n.d

Solaisud Mountauban (proprietária da marca Lactel)

1988 n.d França

Californian Atlantis Dairy 1989 queijos EUA Ekabe 1989 queijos Luxemburgo Grupo Bridel 1990 n.d Grupo Valmont (Valmont,, Chèvretines, Rondelé)

1991 n.d Polônia

Girod 1991 queijos Marcillat 1996 queijos França Polser 1996 n.d Polônia Cooperativa Nikolaïev 1996 n.d Ucrânia Locatelli 1997 queijos Itália D. Brough (aquisição em parceria com a cooperativa belga Walhorn Mölkerei)

1999 n.d n.d

Concord Marketing 1999 queijos EUA Simplot Dairy 1999 queijos EUA Grupo Bell 2002 n.d n.d Invernizzi (subsidiária da Kraft) 2003 queijos Itália Foodmaster Internacional 2004 Grupo El Prado Cervera 2004 leite e produtos lácteos Espanha Central Lechera Vallisoletana (Alliança Agroalimentar 3A)

2004 leite e produtos lácteos Espanha

McLelland 2005 queijos Escócia Rondele 2004 especialidades EUA Kurov 2004 queijos Polônia Cademartori (proprietária da marca Presidente)

2005 lácteos n.d

Célia 2006 n.d n.d Galbani 2006 queijo Itália

Fontes: sites diversos (relacionados na bibliografia).

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49

O resultado dessa política ativa de aquisições nos anos 1990 foi a

totalização de 112 unidades processadoras em 2006 e a propriedade sobre uma

série de marcas destacadas na área de lácteos.32 Atualmente, as principais

marcas transacionadas são Président, Bridel e Lactel. É uma empresa que atua

predominantemente na área láctea e sua principal fonte de receita são os queijos

(Anexo A11).

Além do crescimento alicerçado numa política de incorporação de

unidades pré-existentes, sua expansão também ocorre através do

estabelecimento de parcerias com diferentes empresas, visando incorporar novas

marcas, já reconhecidas, ao seu já extenso portfólio. No ano de 2005, incorporou

ao seu portfólio de marcas a Président, com distribuição em mais de 128 países e

com uma gama diversificada na área de derivados lácteos, com destaque para a

manteiga.

No final desse período, a Lactalis realizou uma joint-venture com a Nestlé,

já referida, com o objetivo de criar a segunda maior companhia de produtos

lácteos frescos do mundo. Essa aliança entrou em operação no ano de 2007 e foi

detalhada no item anterior. Diferentemente da empresa líder no setor de lácteos, a

Lactalis é uma empresa cuja expertise está nos produtos lácteos. A filosofia da

empresa é diferente daquela da líder no setor, que se constitui em uma empresa

de alimentos. No caso da Lactalis, sua atuação é focada em lácteos e mais

especificamente em lácteos frescos, destacando-se sobretudo nos produtos com

maior agregação de valor.

32 No ano de 2006 as seguintes marcas integravam o seu portfólio: André Collet, B'A, Beulet, Boule d'Or, Bridel, Bridélice, Bridelight, Chaussée aux moines, Chèvretine, Dukat Mlijecna Industrija, Finetta, Foodmaster International, Fourme de Montbrison, Fromagerie du Pont de Pierre, Galbani, Kunin, La Laitière, Lactel, Ladhuie, Lanquetot, Le Châtelain, Le Roitelet, Lepetit, Les Petits Amis, Locatelli, Louis Rigal, Marcillat, Maria Grimal, Mascarpone, McLelland, Moutain Farms, Nicolait, Péché Mignon, Pizzaiola, Pochat, Polser, Président, Raguin, Rondelé, Rouy, Saint Morgon, Salakis, Santa Lucia, Société, Sorrento, Sveltesse, Vallée, Valmont e Yoco (Anexo A4).

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50

2.3 Danone

A estrutura atual do grupo francês Danone é resultante da fusão de dois

grupos franceses, no ano de 1973: o grupo Gervais Danone e o grupo BSN,

produtor de vidros e embalagens. O embrião do Gervais Danone foi a primeira

unidade industrial voltada para a produção de iogurtes, criada em Barcelona, na

Espanha, por Issac Carrasco, no ano de 1919.33 A planta francesa para produção

de iogurtes data de 1932. O grupo BSN, fundado em 1966, originalmente

dedicava-se ao fabrico de utensílios de vidro e, a partir de 1968, também passou a

atuar no ramo de processamento de alimentos. A denominação Danone foi

adotada para designar a atual empresa somente a partir de 1994. Atualmente, as

competências centrais do grupo, que realiza produção em 150 países e emprega

mais de 88.000 funcionários, são os produtos lácteos e as águas minerais

(Danone, 2007).

No ano de 2006, a empresa foi responsável por 15,1% do mercado

mundial de lácteos frescos, participação que a coloca na liderança deste

segmento do setor lácteo. No mesmo ano, também se destacou no setor de água-

mineral, no qual foi a vice-líder mundial em vendas (Danone, 2007). Até o ano de

2006, também era líder na produção de biscoitos. Contudo, devido a uma

estratégia de centrar esforços nos segmentos que vêm apresentando um

crescimento maior e com maiores possibilidades de expansão, a Danone tem

vendido plantas e empresas envolvidas nas operações que não são escolhidas.

Em 1982, a empresa já havia se retirado da atividade de produção de vidros e

embalagens e, em 2007, foi a vez de se retirar da atividade de produção de

biscoitos.

O setor lácteo vem aumentando sua importância nas atividades da

empresa, devido a investimentos para a geração de ativos intangíveis, através de

atividades de P&D realizadas em seus centros de pesquisa. No ano de 2006, o

33 O nome Danone derivou da união do apelido de Daniel, filho de Issac, com a palavra “um” em inglês, DAN+ONE.

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setor havia sido responsável por 56,4% do total das vendas do grupo (Gráfico 08).

Em 2007, após nova reorganização, em decorrência da venda da parte relativa a

biscoitos (para a Kraft Foods) e da completa incorporação da Royal Numico,34 os

produtos lácteos passaram a ser responsáveis por 51% das vendas totais, os

produtos relativos à nutrição infantil, por 22%, e as bebidas, por 27%

Gráfico 08 – Distribuição da vendas mundiais da Danone, por grupo de produto, em 2006

produtos lácteos frescos

56%

biscoitos16%

bebidas28%

Fonte: Danone (2007)

Nos segmentos em que atua, a empresa trabalha com apenas duas

marcas principais, de utilização mundial: Danone, para os produtos lácteos e

águas minerais; Evian, usada apenas nas bebidas (Anexo A12). A marca principal

é a Danone, responsável por 40% das vendas do grupo em 2006, (Danone, 2007).

Os rendimentos da empresa encontram-se amplamente baseados na

Europa (Gráfico 09). Buscando ampliar sua inserção em todo o mundo, a Danone

acabou por estabelecer alianças em diversos países. Em sintonia com as

transformações em curso, a Danone entrou no mercado chinês em 1996, quando

34 Royal Numico é responsável pela produção, comercialização e venda de alimentos para bebês e nutrição clínica. Em setembro de 2007 foi publicada uma nota prévia sobre o processo de concentração (União Européia, 2007).

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estabeleceu parceria com a empresa chinesa, fabricante de bebidas, Wahaha.

Essa forma foi utilizada para entrar nesse mercado devido à legislação chinesa,

que possibilita a entrada de empresas estrangeiras apenas através do

estabelecimento de joint-venture.

Gráfico 09 – Distribuição das vendas mundiais de lácteos da Danone, por região, em 2006

Europa68%

América do Norte14%

resto do mundo4%

América Latina14%

Fonte: Danone (2007)

A Danone é a principal acionista da empresa japonesa Yakult Honsha. Em

2003 passou a deter 19,6% do capital da empresa, que se destaca pela produção

de bebidas com lactobacilos. No ano de 2000, a Danone havia declarado a

intenção de fusão com a empresa japonesa, o que depois acabou não se

concretizando (Invertia, 2003).

A estratégia principal da Danone está apoiada na inovação tecnológica e

conseqüentemente no lançamento de novos produtos. No caso da Danone, a

opção é por produtos com propriedades funcionais, que procurar atestar

cientificamente, e cuja venda pode se apoiar nos resultados de pesquisas

científicas. Atualmente a empresa prioriza seu desenvolvimento e sua atuação em

produtos cujas marcas procura associar aos benefícios à saúde, ainda que

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enfatize que sua produção é de alimentos e não medicamentos. O foco atual das

pesquisas está relacionado com a busca de propriedades funcionais e

nutracêuticas nos alimentos. E esse mote é explorado ad infinitum pelo marketing.

Esse diferencial só é possível com esforços sistemáticos de pesquisa e

desenvolvimento de processos e produtos, o que se materializa na rotina adotada

pela empresa de destinar 1,2% de suas receitas em P&D (US$ 240 milhões em

2006). O lançamento dos produtos da linha Corpus, Activia e Actimel (reforça o

sistema imunológico), assim como o Essencis (capacidade de nutrir a pele) foram

resultados de significativos investimentos em P&D.

A utilização de conhecimentos científicos possibilitou a Danone a

conquista da liderança no negócio de alimentos funcionais. Em 2006, a marca

Activia foi responsável por quase 2 bilhões de dólares em vendas mundiais (Valor,

2007). A política de desenvolvimento de produto encontra-se dispersa em vários

países, através de alianças com pesquisadores e universidades locais.

2.4 Dean Foods Company

Empresa sediada em Dallas, Texas, a Dean Foods é líder nacional no

processamento e distribuição de leite fresco e outros produtos lácteos, sendo

também uma das principais empresas norte-americanas no setor de alimentos e

bebidas.35

No ano de 2007, a Dean Foods esteve presente em todo o território norte-

americano, com 129 plantas indústrias localizadas em 39 dos 50 estados

americanos e em outros três países. Concentra sua atuação no território norte-

americano, sendo que menos de 1% das suas vendas são realizadas fora do

mercado nacional. Essa concentração no território norte-americano é resultante de

uma política deliberada de expansão da empresa predominantemente no seu

35 É também líder em comidas especiais industrializadas. Além da produção de alimentos, a empresa atua na área de embalagens , detendo 43% do controle acionário da principal empresa de containers de plástico rígido dos EUA, a Consolidates Container.

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território de origem (Dean Foods, 2007).36 A empresa possui um sistema de

entrega direta nas lojas, com mais de 6.000 rotas e atendendo a mais de 150 mil

compradores (postos de venda), numa rede de distribuição de costa à costa nos

EUA. Essa forma de atuação está relacionada com às especificidade dos produtos

transacionados. A Dean Foods foi responsável pela oferta de 33% do leite fluído

dos EUA e pela geração de 26.000 empregos diretos no ano de 2006. Atualmente

essa empresa é cinco vezes maior que principal concorrente na área de lácteos

(Dean Foods, 2007).

A presença da empresa como a primeira no ranking de leite e derivados

nos EUA tornou-se possível em decorrência da política de crescimento adotada

nos anos 1990, sendo o fato mais relevante a fusão com a Suiza Foods, em 2001.

A fusão entre a Dean Foods e a Suiza Foods – monitorada constantemente pelo

governo para evitar a formação de um cartel – ocorreu num período de

aproximadamente oito meses, quando a nova empresa teve de se desfazer de

onze plantas industriais, sem o quê a operação de fusão não se concretizaria.

Após a fusão, a empresa tornou-se responsável por um valor de vendas de US$

10 bilhões anuais, que pertencem aos seus membros cooperados (Dean Foods,

2007).

O foco de atuação da Dean Foods sempre esteve nos produtos lácteos,

porém tem percorrido uma trajetória de crescimento com diversificação, buscando

avançar na agregação de valor. No ano de 2002, adquiriu participação importante

na empresa líder do segmento de bebida refrigerada de leite de soja, a White

Wave. Também nesse ano, lançou, através da filial Morningstar Food, um leite

livre de lactose. Entretanto, os produtos lácteos permanecem como os principais

responsáveis pelo faturamento da empresa, correspondendo a 87% das vendas

totais no ano de 2006.

36 A expansão recente da empresa pode ser notada pelo dado do ano de 2005, quando a empresa possuía 97 plantas industriais localizadas em 34 estados norte-americanos (Dean Food, 2006).

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Na busca pela diferenciação, essa empresa tem centrado esforços na

produção de leite orgânico.37 Investe em melhorias de qualidade dos produtos e

está voltada também para os produtos orgânicos, ampliando assim o valor

adicionado, que é distribuído aos produtores primários na forma de maiores

ganhos na geração da matéria-prima. Como a maioria das empresas alimentícias,

a Dean Foods também atende ao apelo por uma vida saudável, através do

enriquecimento nutricional dos produtos.

Como pode ser observado no Quadro 04, o foco do crescimento da

empresa esteve na expansão horizontal. As operações de fusões e aquisições

realizadas por esse grupo econômico sempre contemplaram a compra de

empresas com marcas regionais importantes, de destaque no mercado norte-

americano. Ao longo de seu processo de expansão, a Dean Foods foi

gradativamente adicionando importantes marcas regionais e hoje conta com mais

de 50 marcas regionais.38 Essa foi a estratégia utilizada na busca da liderança nos

EUA. Mais do que a compra dos ativos tangíveis, as aquisições realizaram-se em

função das marcas, os ativos intangíveis. Ainda que independentemente sejam

marcas fortes, não existe uma unidade entre as marcas pertencentes à empresa

(Anexo A16). Além da produção com marcas próprias, a Dean Foods também

produz para outras marcas.

37 Sem a presença de hormônios. 38 As principais marcas próprias da empresa são Adohr Farms, Alta Dena, Barbe's, Bell/Gandy's, Berkeley Farms, Brown's Dairy, Broughton, Country Charm, Country Fresh, Creamland, Dairy Gold, Dairy Ease, Dean's, Fieldcrest, Flav-O-Rich, Gandy's, Garelick Farms, Lehigh Valley Farms, London's, Maplehurst, Mayfield, Meadow Gold, McArthur, Meadowbrook, Milk Chug, Model Dairy, Oak Farms, Poudre Valley, Price's, Purity, Reiter, Robinson, Schenkel's All Star Dairy, Schepps, Shenandoah's Pride, Louis Trauth Dairy, T.G.Lee, Tuscan, Verifine, Wengert's and West Lynn Creamery.

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Quadro 04 – Operações de fusões e aquisições realizadas pela Dean Food, no período 2002-2007

Empresa Ano da operação Segmento de atuação Capital originário

White Wave 2002 leite de soja EUA

Ross Swiss Dairies 2004 distribuição de leite EUA

Milk Products of Alabama 2004 lácteos EUA

Gilbert Dairy 2006 lácteos EUA

Friendship Dairies Inc. 2007 lácteos EUA

Fonte: Dean Food, site institucional

Sua atuação fora dos Estados Unidos é pequena. Entrou na Europa a

partir da Península Ibérica, ainda que depois tenha se desfeito dessa planta. No

Reino Unido, tem se destacado na produção de produtos orgânicos, sendo a

marca Rachel´s Organic a principal marca de leite orgânico e a terceira na área de

iogurtes orgânicos. Não possui produção na América Latina e os produtos lácteos

entram no Brasil através de importações. Devido ao objetivo estratégico de

concentrar suas operações na América do Norte, a empresa vendeu, em 2006, as

empresas Leche Celta em Portugal e na Espanha (Dean Foods, 2006). Essa

concentração das atividades nos Estados Unidos, associada às referidas

especificidades dos produtos transacionadas, implicam a utilização de transporte

diferenciado, do tipo refrigerado.39

No período subsequente à fusão com a Suiza Foods, a empresa

promoveu uma reorganização no centro de operações, extinguindo aquelas

operações coincidentes. Isto levou a uma redução de aproximadamente 200

postos de trabalho em três localidades distintas ao longo de 12 meses.

Em 2002, a Dean Foods ampliou sua parceria com a Land O’Lakes, ao

realizar acordo de licenciamento da marca para uma série de derivados lácteos,

39 Essa necessidade levou a que a empresa adquirisse, no ano de 2004, por exemplo, uma distribuidora na Califórnia (Quadro 04).

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mais especificamente de leites fluídos.40 Em 2006, a empresa registrou o quarto

ano consecutivo de crescimento de sua participação de mercado nos EUA .

2.5 Arla Foods

Cooperativa especializada na área de lácteos e derivados, sediada na

Dinamarca, a Arla Foods é resultante da fusão das empresas MD Foods, da

Dinamarca, e da Arla, da Suécia, concretizada no ano de 2000, culminando um

processo de cooperação entre as duas empresas que teve início em 1995. Como

orientação geral, a construção de alianças faz parte do ambiente institucional na

qual a empresa atua, afinal suas origens estão no movimento cooperativo.

A Arla Foods possuía no seu quadro de captação, em 2006,

aproximadamente 10.000 produtores de leite (Arla, 2007). A empresa tem

destaque entre as principais empresas lácteas em diversos países europeus e

lidera no Reino Unido. Ao longo dos anos, a empresa buscou seu crescimento

baseando-se na ampliação das cotas na captação de leite. Num ambiente

controlado, onde o crescimento possível está relacionado com ganhos de escala,

as fusões e aquisições se fazem necessárias em face da rede de fornecedores

que integram cada empresa e as relações estabelecidas entre a empresa

processadora e os fornecedores da matéria-prima passam a ter importância

capital.

No ano de 2006, a área de lácteos foi responsável por 95,7% do

faturamento da empresa, sendo o principal grupo o de produtos frescos lácteos

(Gráfico 10). Seus produtos são consumidos em boa parte do território mundial.

Entretanto, como esses produtos se apresentam com marcas diferentes em

territórios diferentes, não se estabelece uma identidade entre as distintas marcas.

40 Excetuando-se os queijos e a manteiga. Land O’Lakes é uma marca tradicional, cujo início data de 1924, devendo a sua popularidade à Minnesota Cooperative Creameries Association. Em 1945, quando do fim da II Guerra Mundial, essa empresa era a maior produtora de leite em pó dos EUA. Nos anos 1950, entrou no negócio do leite fluído. Também nesses anos associou sua marca a um modo de vida moderno. No ano de 2000, foi criada a joint-venture com a Dean Foods, denominada Land O’Lakes Farmland Feed (Land O’Lakes, 2004).

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Com isso, a unidade produtiva por trás das marcas e a consequentemente

diminuição da concorrência passam despercebidas perante o mercado

consumidor europeu.

Gráfico 10 – Distribuição da vendas mundiais da Arla, por grupo de produto, em 2006

outros produtos7%

produtos em pó12%

manteiga/pastas 12%

queijo25%

produtos frescos44%

Fonte: Arla Foods (2007)

A atuação da Arla Foods ocorre predominantemente em território europeu

(Gráfico 11). Em 2006, apenas 13% do seu faturamento proveio de plantas

localizadas fora da Europa. Entretanto, a empresa vem expandindo

gradativamente as suas fronteiras de atuação, aumentando sua inserção nos

territórios norte-americano e chinês.

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Gráfico 11 – Distribuição das vendas mundiais de lácteos da Arla Foods, por região, em 2006

EUA 5%

União Européia - outros 17%

Suécia 21%

Dinamarca 18%

Reino Unido 30%

resto do mundo8%

Fonte: Arla Food (2007)

A estratégia de crescimento da empresa esteve baseada em operações

de fusões e aquisições, na diversificação e na realização de alianças, buscando

maior agregação de valor aos seus produto. A escolha desse conjunto de

estratégias está relacionada com um provável declínio dos subsídios para

exportação na Comunidade Européia. A presença dessa ameaça reforça a

importância de aquisições de plantas em outros países. Essas diversas operações

(Quadro 05) permitiram à Arla Foods tornar-se a quinta empresa em faturamento

no ramo lácteo no ano de 2006, enquanto no ano de 1990 ocupava apenas a 15ª

posição.

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Quadro 05 – Operações realizadas pela Arla Food no período 1985-2006

Empresa envolvida Ano da operação

Segmento de atuação Origem do capital

Aquisições

Tholstrup Cheese´s Dairy n.d. queijos finos EUA

National Cheese 2005 queijos Canadá

Ingman Foods 2006 lácteos Finlândia

White Clover Dairy 2006 lácteos EUA

Fusão

Express Dairies 2003 lácteos Inglaterra

Joint-Ventures

China Mengniu Dairy Company 2006 lácteos China

Fonte: Arla Foods, site institucional.

Algumas das operações descritas no Quadro 05 originaram-se de alianças

anteriores, como por exemplo no caso da empresa White Clover Dairy, que era a

parceira responsável pela produção da marca Arla para o mercado americano,

sendo posteriormente incorporada ao grupo principal. O fechamento de plantas

produtivas e a extinção de marcas também se verificaram no período recente,

havendo redução gradativa do número de marcas trabalhadas.

A Arla Foods também centra seus esforços na produção de derivados do

leite com maior valor agregado, como no caso dos queijos e das proteínas obtidas

a partir do leite. Buscando adicionar valor aos seus produtos, a empresa

atualmente participa de um projeto mais amplo, um fundo de investimentos para

geração de alta tecnologia em nível setorial, visando desenvolvimento de

ingredientes e proteínas do leite, assim como solução para alguns problemas de

natureza ambiental, como o consumo de água e de energia na fase de produção.

Assim, como resultante das operações financiadas por esse fundo de pesquisa,

foram lançados aproximadamente 200 produtos no ano de 2006.

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2.6 Cooperativa Fonterra

Sexta empresa em vendas no segmento lácteo no ano de 2006, a

Fonterra está situada na Nova Zelândia e constitui-se na maior cooperativa láctea

da Oceania e é a segunda maior cooperativa láctea do mundo. Essa nova

cooperativa é resultado de uma série de fusões e transformações, num movimento

de concentração das então principais cooperativas (Stuart, 2002). Suas origens

provém da New Zealand Dairy Group (NZDG) e da Kiwi Cooperative Daires – duas

grandes cooperativas – e de duas menores, a Tatua Cooperative Dairy Company

Limited e Westland Co-operative Dairy Company Limited, quando em 2001 os

cooperados decidiram, por voto, em formar a Fonterra Group Cooperative.

No período 2006/07, a empresa processou 14 milhões de toneladas de

leite. A ela estão vinculados aproximadamente 11.000 produtores rurais e foi

responsável pela geração de 16.400 empregos diretos no ano de 2007 (Fonterra,

2007). Seu faturamento, em 2006, da ordem de 6,7 bilhões de dólares , equivaleu

a 6,6% da PIB neozelandês, constituindo-se na maior exportadora mundial de

laticínios. As exportações a partir da Nova Zelândia realizam-se através da New

Zealand Dairy Board (NZDB).

A Fonterra caracteriza-se por ser uma cooperativa de “novo tipo”. Ainda

que tenha os mesmos princípios das cooperativas tradicionais, a forma de

obtenção dos objetivos difere.41 Nesse novo padrão, a valorização ocorre através

das ações detidas pela cooperativa.

Em função de seu próprio tamanho e do local onde está sediada, o

processo de crescimento dessa empresa passava necessariamente por uma

expansão externa. Desde sua recente formação, essa empresa cooperativa tem

se expandido de modo a entrar nos mercados da Índia, da Austrália, da Europa e,

41 Ainda que seja uma cooperativa, a Fonterra caracteriza-se por uma atuação diferenciada, porque os produtores têm participação determinada por sua produção, diferentemente do que ocorre em uma cooperativa tradicional. Desta forma, são remunerados através do preço do leite e mais ganhos de capital. Além disso, o peso do voto do cooperado é proporcional à sua produção, cabendo-lhe um voto por tonelada de leite anual. Essa configuração rompe com a lógica cooperativa de igualdade entre os produtores.

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mais recentemente, nas Américas. No Brasil sua atuação ocorre através da DPA,

em aliança já referida com a Nestlé, para atuação nas Américas. Em alguns

países a estratégia escolhida para a expansão foi a aquisição de empresas, como

no caso do México – aquisição da Eugênia e da La Mesa, produtoras de queijo.

Na grande maioria dos países, sua atuação ocorre através do estabelecimento de

alianças estratégicas, como na Índia, segundo mercado mais populoso do mundo,

onde sua entrada deu-se através do estabelecimento de uma joint-venture com a

Britannia Industries. Nos Estados Unidos, atua junto com a Dairy Farmers of

América (DFA), na Inglaterra, com a Arla Foods. Na Austrália, está aliada com a

Bonlac Foods. No ano de 2002, a Fonterra juntamente com a Bonlac e outros

acionistas minoritários, criaram a Australasian Food Holdings, responsável por

30% do comércio internacional de lácteos.

Em vista disso, a Fonterra tem uma atuação bem distribuída

mundialmente, como pode ser observado na distribuição regional do seu

faturamento em 2006 (da ordem de 5.583 $NZ milhões), tendo no continente

asiático a principal origem (Gráfico 12). Como se indicou, a atuação regionalizada

ocorre sempre em parceira com os principais agentes locais, o que permite a

valorização do capital da empresa em todo o mundo, através de alianças que

constituem uma rede global de produção.

Através das parcerias, a empresa está associada a importantes marcas

mundiais em escala regional. Nessa inserção de mercado mundialmente

distribuída, a Fonterra atua com múltiplas marcas, algumas mais regionalizadas,

como Mainland, Meadow Fresh, Galaxy Ferndale, Nature´s Energy, Cool Change,

Sunspray, Naturalea, Tararua, Kiwi, Huttons, Brooks, Hop Tat and Hungry, Tip Top

Ice Cream, outras mais internacionalizadas, como Anchor, Fernleaf, Anlene,

Anmum, Chesdale, Peters & Brownes, Bega e Soprole. (Anexo A22).

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Gráfico 12 – Distribuição do faturamento do grupo Fonterra, por região, no ano de 2006

Oceania21%

Asia 35%

Américas24%

Resto do mundo20%

Fonte: Fonterra (2007).

De um modo geral, a Fonterra promove ações que visam o crescimento da

empresa no mercado asiático e possibilitam um melhor retorno para os acionistas

cooperados. Em 2003, adquiriu 43% da empresa líder da produção de leite em pó

na China, denominada SanLu. Em função das instituições chinesas, a nova

empresa compra leite na própria China, a fim de honrar os compromissos

contratuais assumidos.

As parcerias também são estabelecidas visando avanços tecnológicos

para posterior realização de inovações. Neste sentido, a Fonterra formou parcerias

com a U.S. Dairy Management Inc. para estudar os benefícios do soro de leite

para a saúde humana, bem como com a DFA, nos Estados Unidos (denominada

Dairy Concepts LP) para a produção de proteína concentrada do leite.

A Fonterra é especializada na área de lácteos e a maior parcela no valor

das vendas mundiais (71% em 2006) provêm dos ingredientes alimentícios para a

indústria alimentícia. O destaque nesse segmento é resultado de alianças para

atividades de P&D, como foi o caso da criação da empresa Fonterra Excipients

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GmbH & CoKG juntamente com a Campina B.V.42 Essa nova empresa adquiriu a

atividade das empresas-mãe, de produção de excipientes farmacêuticos e de

lactose de qualidade alimentar e farmacêutica, para fabrico de produtos de

química fina.

2.7 Dairy Farmers of America (DFA)

A segunda maior empresa processadora da cadeia norte-americana surgiu

em 1998, a partir da fusão das então maiores cooperativas lácteas norte-

americanas: a Associated Milk Producers Inc (AMPI), a Mid-America Dairymen Inc

(Mid-Am), a Milk Marketing Inc (MMI) e a Western Dairymen Cooperative, Inc

(WDCI). Esse processo de concentração resultou na maior cooperativa láctea

norte-americana . Em 2006, estavam vinculados a ela mais de 23.800 produtores,

fazendo-se presente em 48 estados norte-americanos (Anexo A23). O processo

como um todo, iniciou-se em 1996 e, posteriormente, mais três cooperativas

integraram-se à DFA, a Associação das Cooperativas Independentes de

Produtores de Leite (ICMPA), a Associação dos Produtores de Leite do Vale da

Virgínia e a Cooperativa Láctea da Califórnia (Cal-Gold).

A fusão foi a alternativa encontrada pelos dirigentes das principais

cooperativas, com vistas à permanência dos produtores e à defesa de seus

interesses econômicos num ambiente cada vez mais competitivo e dominado por

poucas grandes empresas multinacionais, na área de alimentos. Do ponto de vista

dos produtores de leite cooperativados, fez-se necessário adotar estratégias

semelhantes às das grandes empresas, sem as quais corriam o risco de serem

incorporados, sem manutenção de sua identidade e seus objetivos, nesse

processo. O comprometimento da indústria com as bases produtoras regionais

42 A Campina tem sua expertise na extração de ingredientes lácteos para a indústria alimentar. Tem tradição na pesquisa e desenvolvimento de produtos através da unidade de pesquisa localizada na Holanda. Além da produção de produtos alimentícios também se dedica a produtos na área de saúde, seja com produtos farmacêuticos, seja com a produção de proteínas fragmentadas.

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poderia ser colocado em xeque. Assim, as empresas pertencentes aos produtores

buscaram a ampliação, por meio da centralização, como forma de sobrevivência.

A DFA atua sobretudo nos Estados Unidos e exporta produtos de maior

valor agregado, geralmente concentrados protéicos de soro de leite e seus

derivados (Anexo A11). Constitui-se em uma líder mundial na produção de queijos

comuns.

Desde o seu surgimento até o ano de 2002, a DFA havia realizado 17

alianças estratégicas, detendo 33 plantas de processamento. A cooperativa capta

parte significativa da produção norte-americana de leite; no ano de 2004, por

exemplo, captou 30% dessa produção norte-americana (Hendrickson, 2005). Ela

foi aumentando sua participação e no ano de 2007 foi responsável pela captação

de 34% do leite norte-americano.

As marcas utilizadas pela cooperativa são Borden e Elsie – marcas

presentes no imaginário coletivo americano – que foram obtidas através de

licenciamento no ano de 1997. Dentre as suas estratégias, destaca-se a prática de

parcerias. Dentro ainda dessa lógica, estabeleceu uma parceria com a Land

O’Lakes para utilização da marca, já renomada e de origem cooperativa, em

produtos como manteigas e queijos. A escolha dessa marca deveu-se ao fato de

que a mesma já estava presente em todo o território norte-americano.

No tocante à estratégia de inovação, a DFA também criou com a Land

O’Lakes, em 2001, a joint-venture Melrose Dairy Proteins SLLCC, para extrair e

produzir comercialmente certas frações do leite. Também com vistas à inovação,

possui um Centro Técnico em Springfield, Missouri, localizado estrategicamente

no centro dos Estados Unidos. Neste centro são realizadas as atividades de

pesquisa e desenvolvimento, contando com a presença de uma usina-piloto em

escala reduzida, que permite aos cientistas a realização efetiva de todos os

processos de uma usina.

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Buscando ampliar a sua atuação dentro do território norte-americano, a

DFA estabeleceu uma aliança com a New Zealand Dairy Board, para importar

queijos neozelandeses, sob a forma de joint-venture denominada Milk Products

Holding (North America). O objetivo desta é atuar na importação de queijos

neozelandeses (tipos parmesão e romano) para a subsidiária de Wisconsin,

substituindo outras fontes de importação para seu abastecimento. A justificativa

apresentada para a realização da aliança foi a busca de conhecimentos sobre a

Nova Zelândia e sobre como desenvolver mercados de exportação.43 Por meio

dessa parceira, a DFA diversificou seus produtos e ampliou o valor agregado.

Contudo, seu faturamento continua largamente apoiado nas vendas de leite fluido

(Gráfico 13).

Gráfico 13 – Distribuição da vendas mundiais da DFA, por grupo de produto, em 2006

outros9%queijos

12%

leite fluído79%

Fonte dos dados brutos: DFA (2007).

43 “Essa joint-venture irá permitir nos familiarizarmos com a Nova Zelândia e aprender com eles como desenvolver mercados de exportação, que é um dos nossos objetivos também”. Palavras empregadas por Gary Hanman, presidente da DFA.

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2.8 Kraft Foods

A terceira maior empresa do setor lácteo no bloco da América do Norte

teve seu início nesse mesmo setor, com a Kraft Cheese, e hoje constitui-se no

braço produtor de alimentos do grupo Altria. Fundada em 1903, por James Kraft,

como um atacado para a venda de queijos, gradativamente, através da expansão

e incorporação de outras empresas, foi se transformando em uma empresa de

alimentos. O seu crescimento ocorreu baseado na diversificação e na

diferenciação dos produtos. Durante muitos anos, foi a mais importante empresa

indústrial láctea nos EUA, perdendo a liderança no ano de 2000, quando as

cooperativas passaram por um processo de concentração, que culminou com a

formação da DFA.

No ano de 1988, a empresa de alimentos foi vendida para a empresa

fumageira, Philip Morris, que assumiu 87% de seu controle acionário. No ano de

2003, a holding, acrescida por essa aquisição, passou a se designar Altria Groups,

integrado por Kraft Foods, Philip Morris International, Philip Morris EUA e Philip

Morris Companies. Embora integrando a holding Altria, a administração da

empresa de alimentos ocorre de forma autônoma, por meio de duas

denominações empresariais: Kraft Foods Incorporation, que responde pela

produção norte-americana e canadense, e Kraft Foods Internacional, que atua nas

demais áreas abrangidas. As plantas produtivas encontram-se situadas

predominantemente na América do Norte . A empresa de alimentos tem nos

produtos lácteos o terceiro grupo em importância nas suas vendas mundiais

(Gráfico 14).

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Gráfico 14 – Distribuição da vendas mundiais da Kraft, por grupo de produto, em 2006

alimentos prontos15%

snacks 29%

diversos15%

bebidas21%

queijos e lácteos 19%

Fonte dos dados brutos: Kraft (2007).

O faturamento da empresa em 2006, por grupo de produtos, encontram

bem distribuído, cabendo cerca de um quinto apenas aos produtos lácteos

(Gráfico 14). A cada grupo de produtos da empresa encontra-se associado um rol

de marcas (Anexo Ax), com menor diversidade do que a maioria das outras

empresas norte-americanas no setor de lácteos. A principal marca na área de

lácteos é a Philadelphia.

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Gráfico 15 – Distribuição das vendas mundiais da Kraft, por segmento de negócio, em 2006

Fonte dos dados brutos: Kraft (2007).

Como empresa de origem americana e sediada nos EUA, a Kraft tem 79%

das suas vendas mundiais na América do Norte (Gráfico 15) e, da mesma forma

que as demais empresas norte-americanas no setor lácteo, tem aí seu principal

mercado. Entretanto, diferentemente de seus principais concorrentes, desde os

seus anos iniciais teve uma atuação mundializada, buscando uma expansão além-

mar. No final dos anos 1920, já possuía plantas de processamento de queijo na

Inglaterra. No século XXI, encontra-se presente em mais de 150 países. Nos anos

1990, a Kraft realizou com o grupo francês Sodial uma parceria para a produção

de refrigerados lácteos “Yoplat” na Itália, seguindo uma tendência mundial de

realização de parcerias. Com essa ação, galgou o posto de terceiro maior

faturamento no mercado italiano de produtos lácteos (Tonzali, 1997).

Ao longo de sua trajetória, a inovação de produto sempre esteve presente.

Já em 1916 patenteou um queijo processado com maior durabilidade e deu início

a uma trajetória de inovações no setor. A empresa, ao longo de seu processo de

União Européia

12%

Países em desenvolvimento9%

Alimentos de

conveniência - NA19,4%

queijos e comidas prontas -

AN21%

América do Norte - petiscos e cereais18%

América do Norte - bebidas

4%

mercearia - AN 19,5%

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crescimento, foi se encaminhando para a produção de lácteos com maior valor

agregado, intensivos em tecnologia. Suas competências na área do leite dizem

respeito sobretudo à criação de sabores e aromas, à separação dos componentes

do leite e à modificação das proteínas. Através destas expertises foi concebida

uma série de produtos diferenciados, possibilitando que a empresa auferisse

lucros de monopólio. Assim como as principais empresas de outros blocos, a Kraft

centra-se no desenvolvimento de novos produtos alimentares, introduzidos

inovações originadas nos centros de pesquisa da empresa, localizados nos EUA

(produtos lácteos) e na Europa.

Sua atuação em território brasileiro ainda ocorre de forma periférica.

Entretanto, existem fortes indícios de que esse quadro irá se alterar nos próximos

anos, em decorrência de uma joint-venture estabelecida com a Sadia em 2008,

com o objetivo de produzir e comercializar os produtos com marca Philadelphia,

assim como os produtos lácteos atualmente comercializados pela Sadia – no

caso, queijos e patês de queijos. A forma assumida pela empresa foi de sociedade

anônima de capital fechado.

2.9. Algumas considerações preliminares

Uma abordagem panorâmica da cadeia produtiva láctea, centrada no elo

industrial, permite constatar que o setor lácteo passou por um processo de

reestruturação patrimonial, a exemplo do ocorrido em muitos outros setores

industriais. Essa reestruturação foi resultante das operações de fusões e

aquisições, que foram intensas no período recente, como pôde ser observado

levando-se em conta a trajetória das oito principais empresas mundiais do setor. A

tendência de concentração e centralização de capitais, inerente ao movimento

geral do capital, ganhou intensidade na cadeia láctea em decorrência de

determinadas particularidades do setor. Dentre essas, podemos destacar as

transformações de cooperativas em sociedades anônimas ou mega-cooperativas,

nos EUA e Oceania, as fusões e aquisições motivadas pelo bloqueio à expansão

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da produção de leite na Europa, bem como a falência de uma importante empresa

do setor, a Parmalat, no começo do século XXI. Os movimentos de centralização

foram realizados na busca de racionalização e reestruturação produtivas, com

vistas à maior competitividade, resultando em um aumento da internacionalização,

com intensificação das trocas e estreitamento das relações externas na cadeia

produtiva. O capital busca sua valorização nos lugares mais diferentes possíveis

e, com a ampliação da concorrência, a concentração dos capitais faz-se

necessária.

Essa é uma tendência natural do capitalismo que pode ser revertida ou

atenuada em decorrência de políticas, sejam institucionais ou públicas. Um

exemplo de transformação dessa tendência é a evolução ocorrido no setor lácteo

na Oceania, onde, sem o apoio governamental, a atividade não teria o mesmo

grau de desenvolvimento tecnológico nem poderia fazer frente às grandes

empresas produtoras da Europa ou dos EUA nos seus e em outros mercados.

A produção de leite, que se encontra na base da atividade industrial,

apresenta uma concentração geográfica determinada pela densidade demográfica

e pelo grau de desenvolvimento dos diferentes paises. Em cada bloco regional, a

captação do leite apresenta também uma concentração empresarial. A atividade

industrial também está organizada como oligopólios nos diversos blocos regionais,

mas a concentração geográfica é distinta da apresentada pela produção primária.

Nota-se que não existe uma correspondência entre os países que são os maiores

produtores de leite in natura e com os paises maiores produtores de produtos

lácteos nas suas mais diversas formas. Também as posições ocupadas pelas

grandes empresas dos distintos blocos regionais no comércio internacional não se

relacionam com a importância relativa dos países e blocos na produção primária.

Uma das diferenças destacadas entre as empresas nos diferentes blocos é a

utilização de agricultura de precisão por parte dos países com maior destaque no

comércio internacional.

As grandes empresas, de modo geral, adotam estratégias baseadas em

inovações, seja nos produtos e processos produtivos, seja na busca de novos

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mercados consumidores e novas formas de organização da produção. Nenhuma

dessas empresas mantém ou amplia seu poder econômico apoiando-se na

exploração exclusiva de vantagens inerentes aos recursos naturais de que podem

dispor. Nos países desenvolvidos, existe um redirecionamento produtivo das

empresas para aqueles produtos com maior valor agregado, pois, no que se refere

à produção de comoditties as grandes empresas dos EUA e da Europa têm

desvantagem frente aos produtos da Oceania e do Mercosul. Todas as grandes

empresas estão articuladas dentro de uma campanha mais ampla, que destaca a

busca de saúde através dos alimentos. As empresas líderes encontram-se na

ponta desse projeto, mas esse desenvolvimento tecnológico não é exclusivo das

grandes.

As características ainda fragmentárias do mercado mundial de lácteos têm

favorecido um grande número de alianças estratégicas e parcerias envolvendo as

grandes empresas e outros atores regionais. O estabelecimento de parcerias foi

uma das formas estratégicas de atuação mais adotadas pelas empresas,

propiciando acessos cruzados a mercados e tecnologias antes não disponíveis.

Parte das transformações verificadas na atividade industrial da cadeia

láctea está diretamente relacionada com modificações, estimuladas ou

espontâneas, nas preferências dos consumidores. A maior exigência dos

consumidores se materializa no aumento da demanda por produtos mais

elaborados, no incremento significativo na demanda por queijos, na busca de mais

possibilidades de escolha, mais comodidade, melhores qualidade e preço.

As empresas que se destacam também apresentam grandes

investimentos em marketing, além de grandes investimentos em pesquisa e

desenvolvimento de produtos e processos. Apesar das características em comum,

cada uma dessas grandes empresas tem nichos específicos de mercado, e, ao

longo do tempo vem mostrando maior ênfase em torno do respectivo foco,

geralmente envolvendo atividades, produtos e mercados nos quais adquiriu

competência específica e diferencial.

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O comércio internacional de produtos lácteos envolve uma gama

heterogênea de países, com diferentes capacidades e perspectivas. Mesmo na

Oceania, um bloco regional importante na conformação da cadeia produtiva láctea

e com papel destacado no comércio internacional, a principal produção é de

ingredientes lácteos, fornecendo dessa forma insumos para outras empresas

processadoras, melhor situadas na hierarquia da cadeia produtiva.

O bloco norte-americano ainda participa pouco do comércio mundial, mas

seu volume e valor de produção é considerável, em função de seu mercado

interno. Nesse mercado, as cooperativas têm papel importante na cadeia

produtiva e aquelas que se destacam entre as maiores processadoras são

aquelas que passaram por um processo de reestruturação, as cooperativas de

“novo tipo”. Nesse tipo de organização, verifica-se a aglutinação dos produtores,

que fazem valer seus interesses no controle da indústria processadora. Esta

apresenta algumas outras peculiaridades, entre as quais o fato de que a maioria

das ações das empresas são realizadas visando o mercado interno, conferindo

assim um viés local à produção. Em vista disso, as grandes empresas

processadoras são todas originárias dos Estados Unidos, com capital

predominantemente norte-americano. É certo que essas empresas passam pelo

mesmo processo de concentração que é vivenciado pelas demais grandes

empresas lácteas, sediadas principalmente na Europa. Mas mantêm como

especificidade principal serem compostas por capital norte-americano e

produzirem principalmente para o mercado interno. A entrada e atuação de

empresas multinacionais neste mercado tem uma história recente.

Um fator que influenciou as estratégias mais recentes foi a sucessão de

encaminhamentos que foram e serão realizados acerca dos subsídios à produção

de leite, produto agropecuário que, como já foi indicado, recebe a maior parcela de

subsídios. Ainda que diversos movimentos supranacionais tenham buscado a

extinção dos subsídios, o que se observa nas negociações, ano após ano, é a

manutenção dos mesmos com promessas de gradativa queda, mas que acabam

nunca se efetivando. Nos países que se utilizaram de subsídios para estimular a

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produção, observam-se quadros semelhantes em termos de oferta de leite, pois

geralmente, num segundo momento, foram necessárias outras políticas públicas

para a contenção das despesas com subsídios.

Na Europa, os ganhos das empresas que puderam contar com uma

expansão da oferta de leite dependeram diretamente da ampliação de cotas

produtivas, formalizadas ou não. Nesse contexto, ganha maior importância a

produção primária, em função do seu relativo engessamento e porque trabalha

com ciclos biológicos lentos, relativos à (re)produção animal, que não podem ser

fortemente alterados. Em face desse quadro, a tendência é que a produção

européia de leite fluído diminua sua participação mundial, cedendo espaço para

uma maior produção naqueles países onde o protecionismo não vigora.

A cadeia produtiva láctea pode ser considerada uma cadeia em escala

global, visto que os agentes produtivos coordenam as atividades de suas

empresas de forma integrada entre as suas diversas localizações (Sturgeon,

2001). Essa caracterização se faz possível em razão de diversos elementos

inerentes a uma cadeia produtiva global e que se observam nos distintos blocos.

Um primeiro elemento é o caráter de subordinação das relações econômicas,

pelas quais há uma evolução desigual do poder de compra relativo das

mercadorias envolvidas na produção e comércio de lácteos, pois os países

desenvolvidos exportam produtos de alto valor agregado, com custos minorados

por subsídios, enquanto os outros se encarregam da produção com menor valor

agregado e intensiva em recursos naturais. Um segundo elemento é que as

grandes empresas exercem o comando sobre a evolução do setor e suas ações

são responsáveis por acentuar a concentração econômica no centro, ao

privilegiar, de um modo geral, o desenvolvimento tecnológico nos países-sedes.

Por fim, observa-se no desenho inicial da cadeia produtiva global, ainda sem a

inclusão do cenário brasileiro, que existe uma determinada hierarquia de

atividades e funções, estabelecida a partir das relações desencadeadas pelas

grandes empresas processadoras, que realizam as atividades de P&D e somente

assim conseguem articular de fato uma rede com “redivisão da produção e das

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funções corporativas”.44 As funções são seletivamente centralizadas, comandadas

pelas grandes empresas industriais.

44 A conceituação vale-se das características observadas por Furtado (2003) para a definição das cadeias produtivas globalizadas

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3. Setor lácteo brasileiro: transformações e permanências na nova ordem

econômica mundial

Nos anos 1990 verificou-se uma intensa transformação nas formas

adotadas de produção dos agentes envolvidos na cadeia produtiva brasileira,

alterando significativamente o seu dinamismo, gerando uma nova configuração

setorial, ainda que os principais derivados do leite sejam os mesmos consumidos

nos anos 1980. Essa alteração está inserida num movimento mais amplo, em um

modelo de acumulação em escala mundial, considerado nos primeiros capítulos

desse trabalho. As estratégias de expansão dos principais atores mundiais foram

apresentadas no capítulo 2, sendo que no capítulo 1 haviam sido apresentadas as

principais cadeias produtivas regionais, cada qual com as suas especificidades.

O entendimento dessa configuração, de caráter mais global, é necessário

para a análise dos impactos que essas transformações trouxeram para os agentes

envolvidos, assim como a identificação das especificidades que podem permitir

aos agentes nacionais a obtenção de algum destaque no setor. Num ambiente

que tende à concentração, a adoção de padrões de conduta diferenciados pode

significar permanência e/ou crescimento, com inserção possível na lógica global

de produção, ainda que a produção esteja direcionada para o mercado interno.

Essa conduta diferenciada pode ser reflexo de ações de coordenação da cadeia

como um todo, de agentes públicos ou de ações empresariais, sejam estas de

orientação tecnológica e/ou organizacional. Ao trabalhar-se com a ótica da cadeia

produtiva tem-se como pressuposto de que cooperação entre os setores pode

levar a uma inserção mundial positiva da cadeia como um todo.

No presente capítulo são apresentadas as características que a cadeia

produtiva assume no Brasil. O ponto de referência para essa análise é o fim de um

período de regulação intensa de mercado. A análise aborda os elos integrantes

dessa cadeia e as especificidades dos mesmos, considerando com destaque o

setor responsável pelo processamento da matéria-prima. Desta forma, uma

análise mais detalhada das principais empresas que compõem a indústria láctea

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será realizada no próximo capítulo. Na quarta seção trata-se da inserção brasileira

no comércio internacional, buscando-se os elementos que possibilitem a

construção de políticas setoriais, sempre tendo presente que a competitividade

pode, e deve, ser construída.45

Assim, este capítulo tem como objetivo principal caracterizar, de forma

panorâmica, a cadeia produtiva do leite no Brasil. No capítulo subseqüente, são

analisados os desempenhos individuais, visto que esse trabalho tem como

pressuposto que a indústria é a responsável pela coordenação desse sistema

produtivo. Para atingir tal objetivo buscam-se as permanências e transformações

no período que se segue à liberalização dos preços do leite e outras mudanças

institucionais, possibilitando a construção de um panorama dessa cadeia.

Para tanto, o ponto de partida dessa construção é o desenho comumente

utilizado para a apresentação da cadeia produtiva láctea. Nessa representação, os

integrantes são os fornecedores de insumos, máquinas e equipamentos, a

pecuária leiteira, o processamento e a distribuição (Anexo A13). Na pecuária

leiteira são englobados tanto os produtores especializados – cuja principal

atividade agropecuária é a produção de leite – como os produtores não

especializados, também designados de extratores ou extrativistas. O

processamento, atividade da indústria de laticínios, é realizado por empresas

multinacionais, grupos nacionais, cooperativas (centrais e singulares) e pequenos

laticínios. Também fazem parte dessa cadeia os comerciantes importadores. Na

distribuição, encontram-se as padarias e pequenos varejos, os supermercados e

hipermercados, que são o elo de ligação do produto com o consumidor final.

Ainda que os elos permaneçam os mesmos, na seção final desse capítulo são

propostas adequações nesse desenho.

Essa cadeia se destaca por sua importância, seja econômica, seja social,

dentre os demais segmentos do agronegócio no Brasil.46 É o segmento derivado

45 A noção de competitividade empregada no presente trabalho tem origem em Coutinho & Ferraz (1994) e nos demais trabalhos derivados do Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira. 46 Em face da complexidade de setores abrangidos e da forma como são gerados os dados no Brasil, as informações relativas à cadeia produtiva possuem uma certa defasagem temporal. Os

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da agropecuária que resulta em maior multiplicador de empregos e de renda. As

atividades relacionadas com essa cadeia encontram-se presentes em todo o

território brasileiro, visto que a produção primária brasileira de leite está

disseminada de norte a sul, de leste a oeste, e conseqüentemente o

processamento também. Como já foi indicado, pelas próprias condições da

matéria-prima leite, o primeiro processamento necessita ocorrer em região

próxima da produção.

3.1 Panorama produtivo primário da cadeia láctea brasileira

A produção primária de leite gerou, no ano de 2006, o equivalente a 12,33

bilhões de reais, constituindo-se no sexto maior valor bruto da produção

agropecuária desse ano e representando 10,7% do produto total agropecuário.

(IBGE, 2007). Essa produção encontra-se disseminada em todo o território

nacional, sendo os principais estados produtores Minas Gerais, Goiás, Paraná,

Rio Grande do Sul e São Paulo.

Na divisão regional, a principal região produtora é a Sudeste, seguida da

região Sul. Observando-se a produção pelo prisma da distribuição geográfica, não

se verificaram alterações significativas das posições ocupadas pelas regiões

brasileiras ao longo do período observado. Ainda que na década de 1990 tenham

sido feitas previsões de que o Centro-Oeste tornar-se-ia a principal bacia

produtora de leite do Brasil, essa posição continua a ser ocupada pelo Sudeste

(Gráfico 16).

dados mais recentes sobre a importância da cadeia láctea datam de 2005, sendo relativos ao ano de 2004. Neste ano, segundo PENSA (2005) o setor como um todo movimentou 66,30 bilhões de dólares (Anexo A27).

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Gráfico 16 - Distribuição regional da produção de leite no Brasil no ano de 2006

Centro-Oeste15%

Norte7%

Nordeste13%

Sudeste37%

Sul28%

Fonte dos dados brutos: IBGE; Embrapa Gado Leiteiro

A pecuária nacional, depois de conviver durante muitos anos com baixos

índices de produtividade, decorrentes do atraso tecnológico em que se

encontrava, passou a investir em melhoramento genético. Assim, o rebanho

ganhou em especialização, aumentando conseqüentemente sua produtividade e

sua produção (Gráficos 17 e 18). Embora esse incremento de produtividade tenha

ocorrido, o rebanho brasileiro apresenta uma produtividade abaixo da média dos

principais países produtores (Tabela 03).

Como já tratado anteriormente, comparativamente com outros países

produtores, os custos de produção brasileiros são inferiores aos demais países

relevantes no comércio internacional (Quadro 01).

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Gráfico 17 - Produtividade de leite do rebanho bovino no Brasil,

no período 1980-2007 (litros/vaca/ano)

Fonte dos dados brutos: IBGE (2006)

Entre 1980 e 2007 a produtividade aumentou 2% ao ano, passando de

uma produtividade de 2,0 litros/vaca/dia para 3,4 litros/vaca/dia. Esses ganhos de

produtividade, verificados sobretudo a partir de 1996, foram decorrentes dos

ganhos de especialização, visto que o rebanho produtivo sofreu redução neste

período. Na verdade, essa especialização decorreu da diminuição do número de

cabeças, num ano em que o preço do boi esteve bastante elevado em relação à

média do período. O descarte, de animais com perfil misto, resultou em ganhos

consideráveis de produtividade.

Destaca-se, entretanto, que os índices de produtividade embora tenham

crescido nos últimos anos, estão muito distantes dos obtidos por outros grandes

produtores mundiais.47 Outro ponto a ser ressaltado, e que contribui para

indicadores ainda baixos de produtividade são as disparidades regionais,

47 Um comparativo com índices de produtividade de outros países está presente no capítulo 1.

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enquanto a produtividade apresentada na região sul é de 5,5 litros/vaca/dia, a da

região norte é de 1,5 litros/vaca/dia (Embrapa, 2008).

Gráfico 18 - Evolução da produção de leite e rebanho ordenhado no Brasil -

1980/2007 (milhões litros e mil cabeças)

Fonte dos dados brutos: EMBRAPA (2008)

As disparidades regionais são derivadas, sobretudo das características do

rebanho, que gradativamente vem se especializando. Essa mudança no perfil do

rebanho em parte está relacionada com a mudança na normatização, e é muito

mais conseqüência do que causa das transformações descritas anteriormente.

Antes da instituição da Normativa 51 do Ministério da Agricultura, algumas

empresas exigiam e bonificavam os produtores que entregavam matéria-prima

com características diferenciadas. A essas exigências, inicialmente realizadas por

parte das agroindústrias, somou-se uma nova legislação, regulando as condições

de fornecimento da matéria-prima por parte do produtor primário, a Instrução

Normativa n° 51, de 18 de setembro de 2002, que instituiu a obrigatoriedade da

coleta a granel. Essa legislação passa a vigorar nas regiões Sul, Sudeste e

Centro-Oeste a partir de 01.07.2005 e nas regiões Norte e Nordeste a partir de

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01.07.2008, determinando que o único meio de transporte possível para o leite é

na forma a granel, em carro-tanque isotérmico. Cessa assim o transporte realizado

em tarros. O objetivo principal consistia em “...promover a redução geral de

custos de obtenção e, principalmente, a conservação de sua qualidade até a

recepção em estabelecimento submetido a inspeção sanitária oficial".

As principais implicações da legislação, implementada a partir de 2002,

são para o pequeno produtor, não especializado, que gradativamente perdeu o

seu espaço, pois os custos que precisam incorrer para a realização da coleta a

granel muitas vezes não são suportados pelas receitas provenientes da atividade

da pecuária leiteira. Desta forma, ainda que gradativamente, o produtor não

especializado dá lugar ao produtor especializado. A contrapartida da Normativa 51

é a ampliação do setor informal.48 O produtor da matéria-prima foi conduzido a

realizar investimentos que visavam aumento de produtividade e/ou de produção

em face das demandas das empresas, que passaram a exigir qualidade e

quantidade, sob pena de excluir o produtor da cadeia produtiva.

Destaca-se também que, após a flexibilização do mercado, verificou-se a

existência de uma crise generalizada no preço do leite, que resultou na instalação

de Comissões Parlamentares de Inquérito sobre o Leite (CPIs do Leite) nos

estados de Minas Gerais, Goiás, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e

Mato Grosso do Sul. Os principais pontos denunciados nos relatórios finais foram:

discriminação de fornecedores e conseqüentemente geração de entraves por

parte dos fornecedor de bens e serviços; monopólio e imposição de preços 48 É considerado leite informal aquele leite fluído que não recebe os tratamentos fito-sanitários requeridos por normatização federal. Nesse segmento encontra-se o leite consumido diretamente nas propriedades e também aquele vendido diretamente aos consumidores. Também são considerados parte desse mercado, os derivados, sobretudo o queijo, que não passam por serviços de inspeção. Desta forma, não é mera coincidência o aumento da informalidade do setor, mas sim reflexo das exigências impostas ao produtor rural. Estimativas apontam que no final da década de 1990 o leite informal correspondia a 46,9% da produção total de leite no Brasil, registrando-se neste período um crescimento da ordem de 159% na informalidade. (Rios, 2000). Outra estimativa, realizada por Milkbizz, acerca do tamanho do setor informal para o ano de 1998 davam conta de que caso se verificasse a eliminação do leite informal e do importado “haveria” uma injeção de mais de R$ 9 bilhões anuais, o que representa uma economia de R$ 1,1 bilhão na balança comercial brasileira, além do aumento de R$ 2,0 bilhões ou mais de arrecadação de impostos.

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abusivos pela TetraPak na comercialização de embalagens de leite longa vida;

abuso de poder pelos supermercados; e formação de cartel pelas indústrias

(Rosenberg, 2004).49

Ainda que pareça contraditório, em termos de rentabilidade, pela ótica do

produtor rural, a lucratividade da atividade é a maior, quando comparada com a

obtida por outros produtos tradicionais como a soja, o milho, a cana-de-açúcar e a

recria e engorda de gado (R$ 1.500,54 hec/ano). Segundo PENSA (2005) a

pecuária leiteira supera a lucratividade da cana-de-açúcar em 3,9 vezes. Além

disso é uma das poucas atividades que propicia ao produtor uma renda mensal,

funcionando como uma espécie de salário. Outro fator de destaque é que utiliza a

mão-de-obra feminina, sobretudo nas propriedades da agricultura familiar.50 Num

mundo rural em transformação, a atividade da pecuária leiteira tem importância

crescente na sustentação econômica de inúmeras propriedades.

O vinculo estabelecido entre o produtor e a agroindústria processadora é

denominado de integração espontânea (Guimarães, 1989). Nesta fase não existe

um comprometimento formal do produtor em entregar o leite para a agroindústria,

ainda que informalmente essa responsabilidade exista.

3.2. Indústria processadora brasileira: um destaque para as mudanças

patrimoniais e a mudança de paradigma produtivo

A presença da indústria de laticínios no território brasileiro confunde-se

com o próprio desenvolvimento da atividade leiteira no país. Essa atividade

inicialmente era desenvolvida no âmbito da propriedade rural, porém, já no ano de

49 O diagnóstico de algumas CPIs apontou para a necessidade de maior presença do Estado, como restaurador do equilíbrio do mercado. 50 Na agricultura familiar onde a exclusão dos jovens, em decorrência do aumento etário das populações, é uma constante, a pecuária leiteira é uma alternativa de inclusão, sobretudo para as mulheres. Um maior detalhamento dessas questões pode ser obtido em Carvalho (2007).

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1921, a trajetória dessa indústria passa a ser dinamizada pela Nestlé, que desde

então marca presença no território brasileiro.

Durante o século XX a indústria de laticínios se caracterizou pela presença

simultânea de cooperativas, sobretudo na produção de leite fluído, empresas

nacionais e empresas internacionais, conformação até hoje presente no arranjo

setorial. No ano de 2006 a indústria de laticínios englobava 2.396 empresas,

sendo responsável por 117.820 empregos, que representaram 8,3% dos

empregos gerados da indústria alimentícia e 1,8% dos empregos gerados na

indústria de transformação (IBGE, 2007). No ano de 2005 a indústria de laticínios

ocupou a quarta posição dentre a indústria de alimentação, sendo que no biênio

1998-99 havia ocupado a primeira posição (Conejero et al, 2006).

Após um período de diversas permanências, duas transformações

caracterizam o final do século XX para o sistema lácteo: o paradigma produtivo

dominante se alterou e verificaram-se inúmeras alterações patrimoniais. Fruto

dessas mudanças, verifica-se também a transformação do leite fluido em

commodity, decorrência da disseminação do novo paradigma produtivo. A nova

tecnologia utilizada no processo de esterilização do leite possibilitou um aumento

na vida útil do produto, passando das 48 horas anteriores para o prazo de quatro

meses.51 Além do aumento da vida útil, essa tecnologia apresenta custos de

transportes menores, pois não há necessidade de refrigeração e os custos de

distribuição também são menores em relação ao tipo C, que necessita de entrega

51 O leite resultante do novo processo produtivo é mais comumente denominado de leite longa vida, de longa duração ou esterilizado. “O leite longa vida, envasado em embalagem asséptica descartável (caixinha), é um leite ultrapasteurizado e, nesse sentido, constitui um avanço na história do leite fluído brasileiro. O leite pasteurizado (todos os tipos) é resultado do processamento térmico do leite pelo processo chamado HTST (High Temperature Short Time), alta temperatura em tempo curto. Isso significa submeter o leite cru usualmente a temperaturas de 72° a 75° C por um período de 15 a 20 segundos. O mesmo conceito foi aplicado no desenvolvimento do leite longa vida. Ao HTST, acrescentou-se um U, passando o processo a se chamar UHTST (Ultra High Temperature Short Time), ultra alta temperatura em tempo curto, sendo que UHT é uma simplificação da sigla. Assim, o leite ultrapasteurizado, ou longa vida, é o resultado do processamento térmico do leite pelo processo UHT. Isso significa submeter o leite pasteurizado usualmente a temperaturas de 135° a 150° por um período de 2 a 4 segundos. Como a legislação brasileira não contemplava o leite ultrapasteurizado, por ser anterior ao desenvolvimento dessa nova tecnologia, por comodidade, o legislador resolveu erroneamente chamar o leite longa vida de leite esterilizado - e não de ultrapasteurizado” (Meireles, 1996: 224).

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diária e em pequenas quantidades. Pela ótica do consumidor, o leite esterilizado

tem sido preferido devido às questões de estocagem e perecibilidade.

Antes da disseminação da produção do leite UHT, por si só, a

perecibilidade limitava a abrangência das plantas industriais e possibilitava a

existência de pequenos laticínios de caráter regional. Ficava, desta forma,

estabelecida como que uma divisão de mercados, onde a grande empresa atuava

nos produtos mais elaborados e a pequena empresa se responsabilizava pela

produção do leite fluído com distribuição local e/ou regional. Com a adoção da

tecnologia de ultrapasteurização verificou-se então a passagem de um mercado

de abrangência local para um mercado nacional, ampliando-se os espaços da

concorrência e a diversidade de marcas disponíveis para o consumidor. Altera-se

assim o âmbito da concorrência do leite fluído, transformando-se esse espaço de

cativo do produtor local para espaço disputado sobretudo entre empresas grandes

de caráter nacional ou multinacional.

A introdução da tecnologia UHT significou mais do que a mudança de

hábitos de consumo, provocou uma transformação na coordenação da cadeia

produtiva láctea e em certa medida foi responsável pela reestruturação produtiva

ocorrida no setor. No Brasil essa tecnologia, propriedade da empresa TetraPak, foi

introduzida pela empresa Parmalat.52 Posteriormente, diversas empresas

passaram a produzir leite ultrapasteurizado. Em 2008, 31 empresas integram a

Associação Brasileira de Leite Longa Vida (ABLV). A adoção dessa nova

tecnologia acaba também por afetar a dimensão mínima da empresa, em face da

tecnologia necessária, a produção de leite esterilizado precisa se dar num patamar

mínimo para que seja viável.

52 A descoberta data de 1943, quando foi criada a embalagem, mas apenas em 1969 é que o maquinário para a produção de leite ultrapasteurizado começou a ser produzido em escala comercial, um ano após a primeira dessas máquinas começar a operar em escala industrial. A empresa detentora da tecnologia UHT também participou do movimento de centralização de capitais e em 1991 adquiriu a empresa Alfa-Laval, fornecedora de equipamentos para a produção leiteira desde a ordenha da vaca até a empresa processadora. No ano de 1993 a empresa passou a designar-se Tetra Laval, englobando as seguintes empresas: Tetra Pak, Tetra Laval Food, Alfa Laval e Alfa Laval Agri, todas essas essas controladas pela Tetra Laval Holding Finance.

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No contexto das mudanças mais amplas num período mais recente, e que

repercutiram diretamente sobre a indústria de laticínios, temos a abertura do

mercado nacional, que propiciou um fluxo intenso de capitais externos nos anos

1990, capitais estes que aumentaram os fluxos dos investimentos diretos externos

(IDE) realizados na economia brasileira. No caso da indústria de laticínios, esses

recursos foram os responsáveis diretos pela intensificação da onda de fusões e

aquisições que se verificou no setor. Estes eram provenientes, sobretudo, dos

países centrais, com especial destaque para o capital de procedência européia. O

aumento do fluxo de investimentos externos diretos foi resultante do excesso de

liquidez internacional, característico dos anos 1990, e encontrou terreno fértil em

decorrência da mudança da lei brasileira de capitais externos, que promoveu a

desregulamentação. A indústria de alimentos foi um dos segmentos que mais

recebeu esse tipo de recurso. Esse processo levou à constituição de grandes

firmas industriais, assim como condicionou a nova forma de atuação dos agentes

integrantes do complexo agroindustrial de laticínios, desencadeando novas formas

de coordenação da cadeia produtiva.

No tocante a estrutura de mercado, a indústria láctea se caracteriza por

ser um oligopólio do tipo misto. Misto pois mescla segmentos do tipo homogêneo,

tal como o de leite pasteurizado e UHT, com segmentos onde os produtos

apresentam especificidades, tal como iogurtes, mantendo entretanto a

característica da substituição entre si.

A concentração da estrutura de mercado pode ser analisada pelo CR4.

Ainda que existam mais de 2.300 empresas processadoras de leite no território

brasileiro, as quatro maiores empresas captam quase 30% do total de leite

inspecionado. As oito maiores empresas em captação são responsáveis por 35%

do leite captado em território nacional (Gráfico 19).

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Gráfico 19 - Curva de concentração para as dez maiores empresas em captação de leite no Brasil - 2007

0,00

0,05

0,10

0,15

0,20

0,25

0,30

0,35

0,40

0,45

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Fonte dos dados brutos: Embrapa Gado de Leite (2008).

Essa indústria, no desenho clássico, é composta por empresas

multinacionais, por grupos nacionais, por cooperativas e também por pequenos

laticínios. As empresas multinacionais são os grandes grupos privados

controlados por capital de origem externa, com abrangência nacional, geralmente

possuindo uma marca consolidada. Sua produção não se dá apenas na área de

lácteos, mas sim em alimentos de uma forma mais ampla. Os grupos nacionais

caracterizam-se por uma atuação mais regionalizada, com especialização em

alguns produtos lácteos. Dentre as cooperativas, temos as cooperativas singulares

ou de primeiro grau, voltadas principalmente para o consumo local em mercados

regionais, e as cooperativas centrais ou de segundo grau, que são constituídas

por um grupo de cooperativas singulares. Por fim, temos os pequenos laticínios,

de alcance regional, atuando muitas vezes de forma clandestina, sem inspeção

sanitária (Jank et al., 1999).

A inserção das cooperativas na cadeia produtiva láctea passou por

importantes mudanças na década de 1990, no começo desta, nove cooperativas

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centrais – sediadas nos estados de Mato Grosso, Goiás, Bahia, Paraná, Rio

Grande do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais -

tinham uma participação importante na produção de lácteos no Brasil. Nos anos

1980, as cooperativas lácteas eram responsáveis pela produção de 80% do leite

fluído brasileiro (Rubez, 1999). Entretanto, as modificações ocorridas ao longo da

década resultaram num quadro nada favorável para esse tipo de organização. O

resultado no final dos anos 1990 foi o fechamento das cooperativas do Mato

Grosso, Goiás e Bahia, assim como a redução significativa da Cooperativa Central

do Rio de Janeiro que passou a captar apenas 13% do que captava no início dos

anos 1990. As cooperativas do Rio Grande do Sul e do Paraná foram vendidas. A

Itambé, de Minas Gerais transformou-se em S.A., assim como a Paulista, que

além disso vendeu parte de seus ativos para a Danone (Lobato & Soares, 1999a;

Lobato & Soares, 1999b). Atualmente o papel desempenhado pelas cooperativas

é diminuto, quando comparado a importância que as mesmas desempenharam

em outros momentos. Essa diminuição da representatividade das cooperativas

decorre sobretudo por problemas de liquidez enfrentados e que resultaram em

venda de patrimônio, sendo que em várias transições o principal ativo

transacionado foi a marca construída pela cooperativa.

Uma outra forma de analisarmos a produção de leite e derivados é através

do destino do leite inspecionado brasileiro, conforme produto final apresentado no

gráfico 20, sendo que 52% da produção formal se destina para a produção de

distintos leites fluidos.

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Gráfico 20 – Destino do leite inspecionado no Brasil segundo produto final – 2002

Leite em Pó16%

Leite Cru10%

Leite Pasteurizado

7%

Outros15%

Leite Longa Vida19%

Queijos33%

Fonte dos dados brutos: Embrapa Gado de Leite (2008).

A presente indústria foi o palco de inúmeras modificações patrimoniais a

partir dos anos 1980, com mais intensidade nos anos 1990. Essas transformações

correspondem à consecução, no setor, do modo de acumulação da economia, sob

dominância financeira, com destacada importância do movimento verificado nas

grandes corporações. A especificidade setorial foi ocorrência precursora,

antecipando o movimento que ocorreu no restante da indústria. As repercussões

foram de grande monta, sendo as principais tratadas ao longo desse trabalho.

Essa análise, ainda que de forma abreviada, evidencia a redução no número de

empresas atuantes, em decorrência principalmente das operações de fusões e

aquisições verificadas.

No período compreendido entre 1985 e 2003 ocorreram 48 operações de

fusões e aquisições envolvendo empresas processadoras de leite. Essa

movimentação é entendida como parte integrante e decisiva das estratégias de

crescimento das empresas, condicionantes dos demais movimentos dessa

indústria (Gráfico 21).

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Essas operações assumiram formas distintas, sendo classificadas como

horizontais, verticais, concêntricas ou como conglomerado puro (Sato, 1997;

Faveret Filho, 1999).53 Para efeitos de classificação, consideramos fusões

horizontais aquelas fusões ocorridas dentro da mesma indústria ou segmento.

Inicialmente é esse tipo de fusão que predomina na indústria de laticínios na

década de 80. Essas operações perfizeram 85% do total das operações setoriais.

A realização desse tipo de operação resulta em economias de escala e também

economias de escopo, derivadas em parte de uma maior racionalização da

produção. Realizando esse tipo de operação, a empresa eleva o seu market-share

e também passa a atuar em regiões anteriormente não contempladas. Fusões

verticais constituem-se naquelas em que as empresas adquiridas ou fundidas

estão situadas à jusante, ou à montante da cadeia produtiva. Operações desse

tipo não se verificaram. Quando a aquisição ou fusão ocorre entre empresas com

produtos diferenciados, mas que fazem uso dos mesmos canais de distribuição,

denomina-se esse tipo como fusão concêntrica ou circular. Na indústria em tela

representaram 15% das operações. Essas operações por sua vez buscam a

diminuição dos custos de distribuição, a diversificação do risco, a aquisição de

novos conhecimentos, a ampliação de linhas de produtos e a entrada em novos

mercados. Ainda que os produtos ou serviços não sejam similares, apresentam

um certo tipo de sinergia.

53 A categorização das operações foi realizada tendo como referência a atividade central da adquirente, geralmente a atividade primeva da empresa.

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Gráfico 21 – Operações de fusões e aquisições envolvendo empresas industriais pertencentes à cadeia produtiva láctea no Brasil por ano e por tipo de operação – período 1986/200854

Fonte dos dados: Anexo A15

Todas essas operações de fusões e aquisições modificaram o panorama

da indústria de laticínios brasileira. Inicialmente essas operações caracterizaram-

se sobretudo por serem de aquisições por parte de empresas multinacionais,

predominantemente fusões do tipo horizontal conforme Gráfico 21. Liderando o

ranking em número de operações esteve a italiana Parmalat. A seguir, neste

ranqueamento, situa-se a Nestlé.

Dentro desse ambiente de intensa reestruturação patrimonial, a empresa

que mais se destacou em número as aquisições na indústria láctea, foi a

Parmalat, sendo considerada a empresa mais ativa em fusões e aquisições

(Iglesias, 2002). Durante o período de 15 anos, adquiriu ativos pertencentes à 24

empresas instaladas em território brasileiro, sendo 20 afetas ao ramo laticinista

(Quadro 06). Também apresentou destaque nas estratégias de marketing

(Carvalho, 2002).

54 Um maior detalhamento das operações de fusões e aquisições encontra-se no Anexo A15. A classificação dos tipos de operação foi feita tendo em vista a atividade principal da empresa adquirente e a atividade principal da empresa adquirida, pelo menos uma das competências era de produtos lácteos.

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Quadro 06 - Fusões e aquisições realizadas pela Parmalat no período 1989-2002

Ano da operação

Empresa adquirida (marcas adquiridas)

1989 Fiorlat

1990 Via Láctea, Laticínios Teixeira, Alimba, Lavisa

1991 AFHA, Laticínios Santa Helena, Supremo

1992 Laticínios Gogó, Planalto, Laticínios Mococa

1993 Lacesa (2 momentos de aquisição), SPAM (aquisição parcial), General Biscuits (Lu Petybon e Dunchen), Sodilac

1994 Cilpe Ltda, Laticínio Silvânia, Laticínios Ouro Preto, Bolls

1996 Laticínios Bethânia

1998 Etti, Batavo, Neugebauer

2001 Kraft Foods (Glória, Avaré, Cerqueirense, Chocoleite, Frutup, Glubby, Goly Goly, Inlegro, Manteiga Mantesoft, Pingo Avaré, Plena Forma e Toda Festa)

Fonte: sites diversos (ver bibliografia)

Sobre as operações de fusões e aquisições, de um modo geral, podemos

dizer que quando a empresa efetua fusões do tipo horizontal, passa a atuar sobre

redes de captação de leite das empresas adquiridas. As relações estabelecidas,

não passíveis de mensuração, constituem-se em um outro importante ativo obtido,

pois assegura o fornecimento sistemático de matéria-prima, indispensável para o

crescimento da empresa. Somente assim, uma empresa que não tenha uma rede

de fornecimento própria consegue se estabelecer e crescer. Em algumas vezes,

esse é o principal ativo adquirido, juntamente com a marca.

As fusões do tipo concêntricas, por sua vez, possibilitaram a migração

para novos mercados, visando a diversificação das atividades empresariais.

Dessa forma, a entrada mais intensa da Parmalat no território brasileiro é

resultado de uma política agressiva de expansão, inicialmente através da

expansão horizontal e num segundo momento via diversificação produtiva.

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Ainda acerca das operações de investimento externo direto, no final dos

anos 1990 verificou-se também a entrada das empresas denominadas de

multinacionais de caráter regional (Belik, 1999). 55 A entrada dessas empresas

deu-se predominantemente nos anos 1990, sendo que as empresas que mais se

destacaram foram: SanCor Cooperativas Unidas Ltda, Mastellones Hermanos S.A.

(La Sereníssima), Cooperativa Asociación Unión Tamberos (Milkaut) e

Cooperativa Nacional de Productores de Leche (Conaprole). Entretanto, a forma

de ingresso dessas empresas no mercado brasileiro não se deu de maneira

convencional, através da aquisição de plantas ou investimentos. As

multinacionais regionais desenvolveram atividades relativas principalmente à

comercialização (Nogueira, 1998).

Num primeiro momento as empresas expandiram as suas produções

através das fusões e aquisições (puxar o quadro pra cá), num segundo momento,

os investimentos foram os principais responsáveis pela expansão das empresas

predominante no começo do século XXI (Quadro 07).

55 Um maior detalhamento das operações de fusões e aquisições encontra-se no anexo A15.

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Quadro 07 – Investimentos anunciados no Brasil a partir de 2005 para o segmento lácteo

Empresa Investimento anunciado

Localização Capacidade produtiva (litros/dia)

Montante investido (em R$ milhões)

Nestlé Leite em pó Palmeiras das Missões (RS)

70

Cooperativa Sul-Riograndense de Laticínios

Leite em pó, leite desnatado, leite condensado

Pelotas (RS) 600.000 20

Embaré (etapa 01) Leite em pó e manteiga

Sarandi (RS) 1.000.000 237

Embaré (etapa 02) Leite em pó e manteiga

Sarandi (RS) 1.000.000 80

Elegê Leite em pó Ijuí (RS) (captação precisa crescer 60%)

15

Yolat Laticínios Carazinho(RS) n.d. n.d.

Italac Leite em pó, leite longa vida, creme de leite e achocolatados

Passo Fundo (RS) 300.000 (fase 1)

20

Laticínios Jussara Leite em pó, leite condensado e leite UHT

Minas Gerais 500.000 50

Random Queijo tipo italiano Vacaria (RS) n.d. n.d.

Aurora Leite em pó Pinhalzinho (SC) n.d. n.d.

Perdigão Leite em pó Três de Maio (RS) 600.000 65

Cosuel Leite em pó Arroio do Meio (RS) 460.000 53

Fonte: sites diversos

Os investimentos anunciados a partir de 2005 dizem respeito sobretudo a

plantas produtoras de leite em pó, inicialmente destinado a operações intra-firma,

visto que o leite é um componente importante na pauta de insumos da indústria

alimentícia. Algumas plantas estão sendo construídas objetivando o mercado

externo, que tem se expandido nos últimos tempos em face de uma série de

questões já elencadas anteriormente.

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Ao longo do século XX, a indústria de laticínios caracterizou-se pelo

convívio relativamente estável entre três grupos de empresas: um pequeno

número de empresas com predomínio do capital externo e dedicando-se ao

fabrico de produtos com elevado valor agregado; outro de empresas com capital

nacional, de origem predominantemente familiar, dedicadas a fabricação de

produtos com baixo valor agregado e de mais elevada perecibilidade, com

abrangência local e/ou regional; e por fim um grupo de cooperativas que podem

ser divididas em centrais de cooperativas e cooperativas individuais.

De um modo geral, a década de 90 caracteriza-se por abertura do mercado

nacional, valorização do câmbio, crescimento de produção e de produtividade do

rebanho leiteiro, mudanças no padrão de consumo da população, transformação

do leite fluido em commodity e, por fim, constituição de grandes firmas industriais,

concentração de mercado e concentração na captação do leite.

Embora que exista um grande número de atores nessa cadeia produtiva,

os responsáveis pela dinâmica são as empresas processadoras de grande porte

(Tabela 05). O ranqueamento das empresas, no que se refere ao volume captado

da matéria-prima básica, foi feito a partir da informação sobre volume de leite

captado pelas mesmas.56

Tabela 06 – Recepção de leite por parte das maiores empresas de laticínios instaladas no Brasil – 1996 – 2007 (milhões de litros)

Empresas 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Nestlé 1.432 1.475 1.429 1.402 1.475 1.529 1.589 1.500 1.509 1.708 1.702 1.800Elegê 560 607 603 660 760 782 711 672 718 842 898 1.324Itambé 710 761 787 830 813 883 781 750 830 1.005 1.039 1.090Parmalat 795 1.170 1.133 1.112 1.245 1.233 1.177 873 617 592 612 725

Fonte dos dados brutos: CNA/Decon/Leite Brasil/Embrapa Gado de Leite

56 No anexo A16 está apresentado o ranqueamento das dez maiores empresas em captação no ano de 2007.

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3.3 Mudanças na perspectiva do comércio varejista e do mercado

consumidor

Pela ótica do consumo, a principal alteração foi a disseminação do

consumo de leite ultrapasteurizado que trouxe modificações relevantes para a

forma de realização do comércio de lácteos. No setor varejista, a exemplo do

ocorrido nos setores industriais, também ocorreu um movimento de concentração.

Essa mudança associada com a diminuição do número de compradores dos

produtos lácteos no pequeno comércio varejista, relacionado ao aumento das

vendas realizadas via supermercados – responsáveis por 55% da comercialização

de lácteos aumenta o poder do varejo sobre a indústria processadora. O segmento

lácteo representou 15,9% do faturamento total dos supermercados no ano de

2004 (PENSA, 2005).

Devido ao acirramento da concorrência, as margens apresentadas pelo

setor varejista são cada vez menores, pressionando as empresas processadoras,

que por sua vez irão pressionar os produtores de matéria-prima. Existe uma

pressão crescente por parte dos grandes supermercados e hipermercados para o

oferecimento de “enxovais” quando da abertura de novas lojas,57 para a

participação da empresa processadora no fornecimento de bens a serem

sorteados, dentroe outros, resultante do aumento do poder do segmento varejista.

Pelo lado da demanda, observou-se uma mudança no padrão de consumo

da população, decorrente em parte das mudanças demográficas e das mudanças

comportamentais verificadas nos últimos anos. A população mundial vem

passando por um processo de envelhecimento que acaba por se refletir no

consumo de alimentos, o que foi abordado no capítulo 1.

O processo de urbanização é geralmente acompanhado de um incremento

na renda disponível e acesso a uma grande variedade de alimentos. Aumenta o

consumo de produtos com maior valor agregado, categoria em que os derivados

lácteos se inserem. A urbanização também se caracteriza por uma provisão mais

ampla de eletricidade, representando um aumento potencial do consumo da linha 57 O “enxoval” consiste na doação de produtos por parte da indústria para uma nova loja varejista.

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fria ou refrigerada. Isso é importante para o leite em função da alta perecibilidade

deste e dos seus derivados. Nesta situação os gastos domésticos são transferidos

de produtos enlatados e leite seco – que não requerem refrigeração – para uma

grande variedade de produtos que se pode encontrar hoje em dia nos

supermercados.

A redução do tamanho médio das famílias e aumento dos solteiros acabou

por gerar uma maior demanda por porções menores, assim como aumenta a

demanda por alimentos preparados, o envelhecimento da população resulta em

uma maior preocupação com produtos enriquecidos, sobretudo com cálcio. A

crescente participação das mulheres no mercado de trabalho e também o

aumento do tempo dispendido fora de casa também contribuem para mudanças

na cesta de consumo da população. (Siffert Filho & Faveret Filho, 1998).

Paralelamente, verificam-se mudanças nos hábitos de consumo, quando

há uma migração do consumo do leite pasteurizado para o leite esterilizado.

Compras passam a ser realizadas predominantemente em supermercados.

Gráfico 22 – Mercado total de leite fluído – leite longa vida X outros leites fluídos Brasil 1991/2005

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Fonte dos dados brutos: ABLV

Além da passagem de um mercado regional para um mercado nacional, o

processo de ultrapasteurização do leite representou uma transformação na

trajetória tecnológica dominante na indústria láctea e, conseqüentemente, uma

transformação no hábito de consumo do leite fluído. Gradativamente, o consumo

de leite UHT suplantou o consumo de leite pasteurizado, como pode ser

observado no Gráfico 22. De acordo com PENSA (2005) o consumo de leite fluído

no Brasil é predominantemente de leite ultrapasteurizado (71,8% do total).

Os alimentos perecíveis cederam espaço àqueles com maior vida útil e os

produtos alimentares mais elaborados aumentaram a sua participação na cesta de

consumo da população.

Não é aleatório que os fundos de investimentos estejam comprando

empresas importantes da indústria brasileira láctea, o cenário que se desenha

aponta para uma importância crescente da indústria brasileira na cadeia produtiva

global. Mas isso só será possível se a tendência de concentração se mantiver,

pois as exigências competitivas tornam a concentração necessária. A

concentração pode vir da cooperação. Empreendimentos de pequenos e médio

porte só se tornam viáveis caso atuem em nichos de mercados diferenciados.

A regulação estatal também esteve presente na normatização dos

produtos, seja enquanto matéria-prima, seja enquanto produto final.58

Das mudanças setoriais, uma das mais significativas, que afetou

diretamente essa indústria, e consequentemente a oferta, foi a suspensão do

58 Usualmente, vincula-se as definições dos tipos de leite à quantidade de gordura existente. Entretanto, a distinção entre eles decorre da forma de coleta e processamento. O leite tipo C, com participação de 91,9% no mercado de leite fluido, pode ser transportado em temperatura ambiente até a usina de beneficiamento, sendo que o nível máximo de coliformes é de 10/ml e com contagem máxima global de bactérias permitida de 150.000/ml. O leite tipo B tem esses valores máximos como sendo 2/ml e 40.000/ml, respectivamente. De forma amostral, é submetido a análises microbiológicas e físico-químicas. Quanto ao transporte até a indústria deve ser realizado em caminhão refrigerado. Já o leite do tipo A tem seu processo de pasteurização e envase na propriedade rural, ordenha automática e não de forma manual, não é admitido a presença de coliformes e o máximo admitido para a contagem global de bactérias é de 500/ml (Jank et al., 1999).

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controle e tabelamento dos preços de leite e seus derivados. O fim dessa prática,

que vigorou por 46 anos – de 1945 a 1991 -, operou como um incentivo à entrada

de novas empresas, que passaram a atuar com maiores graus de liberdade. O

tabelamento era um desestímulo à criação de novos produtos, com maior valor

agregado, visto que os preços máximos passíveis de serem praticados já haviam

sido determinados pelo governo. Com o fim do tabelamento de preços, pela ótica

da produção de matéria-prima, fez-se presente a possibilidade das empresas

adotarem pagamentos diferenciados, de acordo com as características do produto.

Essa liberalização dos preços deve ser vista como integrante de um processo

mais amplo de desregulamentação dos mercados. Após o fim do tabelamento,

verifica-se uma maior segmentação de mercado, ainda em curso. Pelo âmbito do

produtor, o fim da prática de tabelamento resultou em queda nos preços

recebidos, pois enquanto essa prática perdurou, o produtor recebia parte

significativa do preço final do varejo (até 60%). Com o fim do tabelamento, em

1986, a remuneração do produtor limita-se no máximo a 25% do preço final do

varejo (Selectus, 2002).

O governo, além de diminuir a interferência no setor pelo fim do

tabelamento do leite pasteurizado, também o fez com o arrefecimento dos

programas sociais do leite. Através dos programas sociais, o governo demandava,

no final dos anos 1990, aproximadamente 30% do total do leite do tipo C

produzido no Brasil (Alves & Fernandes Filho, 1998; Medeiros & Martins, 2000).

Outra modificação relacionada com a mudança no comportamento do

setor governo diz respeito às importações, que até 1986 eram realizadas por

organismos estatais, pois o governo atuava como um agente regulador do setor.

As importações passam a ser realizadas pela iniciativa privada, na maioria das

vezes por braços operacionais da agroindústria produtora ou diretamente pelo

setor varejista. A transferência da atividade de importação do governo para a

iniciativa privada fez com que o objetivo principal da operação passasse a ser a

busca de diferenciais de preços e/ou complementação das linhas de produção

brasileiras. Anteriormente o controle das importações estava relacionado à

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manutenção do custo de vida e as operações davam-se principalmente no período

de entressafra, na busca de estoques reguladores de preços.

3.4 Balança comercial láctea brasileira

No tocante ao comércio internacional, o Brasil mudou a sua inserção

produtiva, de importador líquido transformou-se em exportador líquido (Gráfico

23). Até os anos 1990 a balança comercial láctea era deficitária, passando então

a condição de superavitária. Ainda que essa reversão da inserção brasileira

tenha ocorrido, é necessário uma análise mais detalhada da mesma, quanto ao

tipo de produtos exportados e importados.

Gráfico 23 – Saldo da balança comercial brasileira de lácteos de 2000-2007 em milhões de US$

-400

-350

-300

-250

-200

-150

-100

-50

0

50

100

150

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Fonte: Cepea (2008a)

No gráfico 24 fica evidenciado que as exportações brasileiras são de

produtos com baixa agregação de valor. No ano de 2007 o leite em pó constitui-

se no principal produto da pauta de exportados. Sua agregação de valor é

pequena, pois o processo produtivo consiste sobretudo em retirar a água do

leite, na secagem do leite para facilitar o seu transporte e aumentar a vida útil do

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produto. Uma pauta de exportações intensiva em tecnologia deveria contemplar

ingredientes lácteos e queijos finos. Entretanto, no caso brasileiro, os itens com

maior valor agregado são os produtos que predominam na pauta de importação.

Gráfico 24 – Composição da pauta de lácteos exportados pelo Brasil, em 2007

leite fluido e cremes5%

manteiga3%

iogurtes1%

queijos9%

leite condensado

15%

leite em pó 67%

Fonte: CEPEA (2008a)

Essa mudança na balança comercial láctea brasileira também está

relacionada com o desigualdade entre os preços praticados no mercado interno

e no mercado externo. Essa diferença se acentuou nos últimos anos tornando

mais rentável a venda no mercado externo (Gráfico 25). Desta forma, é mais

rentável para os produtores nacionais exportarem, do que venderem o leite em

pó para o mercado interno.

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Gráfico 25 – Relação entre os preços do leite em pó (atacado SP x exportado)

Fonte: CEPEA (2008)

3.5 Outras considerações preliminares

O desenho clássico da cadeia láctea apresentado tem-se alterado nos

últimos tempos. Cada vez mais ocorre a exclusão dos produtores não

especializados, tendência que se acentuou com a Normativa do Ministério da

Agricultura n° 51, que impõe uma série de condições para que os produtos

cheguem ao mercado, desde o começo da cadeia produtiva. Em face da

necessidade de investimentos indispensáveis para a manutenção do fornecimento

de leite, inicialmente ocorre esta exclusão. Assim, como integrante da cadeia

produtiva láctea colocamos somente o produtor especializado.59

Outra distinção diz respeito a divisão entre as empresas, desaparecendo

a relativa à origem do capital. Na verdade, o que interessa é a dimensão desse

capital, sua abrangência. Nesse quesito a diferenciação diz respeito ao porte, as

empresas se diferenciam entre grandes empresas de abrangência nacional e

59 A informalidade existe, assim como também divergências nos dados. Estamos considerando uma tendência, com a abertura e com o grau de exigências aumentado.

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104

pequenas empresas mais regionalizadas e/ou especializadas. O papel das

cooperativas diminui, pois muitas passaram a fornecer para empresas privadas.

Mas o atributo principal que diferencia os dois grupos de empresa é a prática da

atividade de pesquisa e desenvolvimento, e conseqüentemente, da inovação. As

empresas a montante do produtor primário também têm relevância destacada.

Deter ou não tecnologia faz toda a diferença. Tradicionalmente as grandes

empresas desenvolvem as tecnologias em centros de pesquisa centralizados no

país de origem da empresa. Nas grandes empresas com capital originário e

reproduzido no país, a geração da tecnologia deu-se externamente, sendo

utilizada com base em contratos de compra. A prática de parcerias não ocorreu,

mas sem dúvida é uma possibilidade, sobretudo através da articulação com a

pesquisa universitária que carece de fontes de financiamento.

Essa destacada importância das grandes empresas é conseqüência, mas

também causa, da intensa reestruturação patrimonial que permeou a indústria

processadora integrante desse complexo após a abertura comercial brasileira.

Assim como em outros setores, a escala passa a ser importante. A modificação

patrimonial observada na agroindústria não foi um fato isolado, mas sim reflexo de

uma série de operações de reestruturação sofridas pela indústria de um modo

geral.60 Dentro desse contexto de reestruturação e também das transformações

mais amplas que afetaram o modo de produção capitalista como um todo, os

agentes envolvidos na cadeia produtiva láctea brasileira tiveram os seus papéis

alterados. Num período inicial as empresas nacionais perderam espaço em favor

das empresas multinacionais, em um momento posterior o capital nacional voltou

a ocupar um espaço.

60 Um maior detalhamento dessas operações pode ser encontrado em Laplane, Coutinho & Hiratuka (2003).

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4. Indústria láctea brasileira: uma análise dos principais atores

Uma análise mais detalhada das trajetórias individuais das principais

empresas processadoras de leite e derivados consiste no objetivo deste capítulo.

As grandes empresas são as responsáveis pela coordenação do referida cadeia

produtiva. Entender a lógica dominante é necessário para a correta tomada de

decisões. Para tanto, neste capítulo são apresentadas, de forma analítica, as

histórias contemporâneas das empresas mais significativas no território brasileiro,

focadas nas suas estratégias de expansão, visto ser esse o objetivo principal das

empresas num mercado globalizado em crescimento. A empresa que não cresce,

num mercado em expansão, diminui sua real dimensão econômica e tende a

perecer.

As empresas analisadas foram escolhidas em face da representatividade

no tocante à captação de leite e também em função da agregação de valor por

parte das mesmas. Buscou-se assim uma análise sobre os fatores

desencadeadores e/ou intensificadores do processo de transformação que afetou

a indústria láctea brasileira e as estratégias adotadas no tocante à expansão. Na

seção final do capítulo são apresentadas algumas conclusões preliminares, que

são resgatadas oportunamente na conclusão deste trabalho, com vistas a

subsidiar políticas setoriais.

As grandes empresas assumem o papel central na articulação da cadeia

produtiva láctea, conforme foi observado no capítulo segundo. São as maiores

empresas em captação e conseqüentemente possuem um grande poder de

mercado, integrando uma estrutura de mercado do tipo oligopólio misto. As

empresas detentoras de tecnologias diferenciadas de produção também

participam dessa coordenação. Por essa razão, além das empresas com captação

acima de 8% do leite inspecionado no Brasil, analisa-se também a trajetória da

Danone, importante player presente em território brasileiro.

Quando da constituição inicial da cadeia produtiva láctea no Brasil, a

coordenação já era desempenhada pela grande empresa estrangeira, no caso, a

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Nestlé. Atualmente, essa coordenação é desempenhada pela grande empresa, de

atuação internacionalizada, independente da origem do capital.

O aumento da participação das multinacionais, num primeiro momento,

refletiu em parte as transformações mais gerais ocorridas na economia capitalista

e que alteraram a lógica das estratégias implementadas. Até os anos 1970, as

estratégias dominantes das multinacionais eram de aprovisionamento, de mercado

e de produção racionalizada. Este tipo de estratégia cedeu espaço, no último

quartel do século XX, para as estratégias tecno-financeiras, que passaram a

dominar o cenário mundial em decorrência do processo de mundialização do

capital (Chesnais, 1996). Assim, a lógica financeira passou a subordinar a lógica

produtiva e as grandes empresas, apesar de atuarem a partir de bases nacionais,

buscaram a valorização de seus ativos em diversas partes do mundo. As

estratégias de internacionalização da matriz condicionam as empresas

subsidiárias, diminuindo os graus de liberdade destas na implementação de

estratégias locais diferenciadas.

Destaca-se também que as empresas de origem européia, com base

láctea, têm seu crescimento limitado na Europa, em decorrência do

estabelecimento da PAC, instituidora do sistema de cotas de produção por

países.61 Assim, modificações na política agrícola européia afetaram, ainda que de

forma indireta, a produção brasileira. Vários fatores apontam para o Brasil como

uma região atrativa para as empresas lácteas, tais como o custo de produção do

leite brasileiro, que é um dos menores do mundo. Associada à existência de

custos mais reduzidos que a média mundial, está a ausência da utilização de

subsídios. A partir dessas considerações, observa-se que o território brasileiro

reúne condições bem propícias para a instalação de empresas, seja com foco no

mercado interno ou no mercado externo. Outro fator importante é a possibilidade

de expansão, seja do rebanho ou em termos de expansão territorial. Voltada

principalmente para o mercado interno, o consumo de produtos lácteos tem se

61 Um maior detalhamento sobre a PAC foi objeto do capítulo 1, quando da apresentação da cadeia produtiva láctea na Europa.

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expandido nos últimos anos em face de ganhos de renda real verificados.

Mundialmente, como já foi indicado, a demanda encontra-se aquecida.

Com as fusões as empresas podem expandir-se para áreas novas, e além

disso, através da recombinação e reutilização de recursos, faz-se possível que as

capacitações originais da empresa "rendam" mais, ampliando as possibilidades de

diversificação.

A seguir, após uma caracterização inicial de cada empresa, reconstitui-se

alguns dos passos das trajetórias das empresas, no sentido de sua expansão,

através das principais estratégias utilizadas.

4.1 Dairy Partner Américas (DPA) & Nestlé

A primeira empresa em captação de leite no Brasil é a Dairy Partners of

Americas (DPA), que tem 50% do capital pertencente à Nestlé e os outros 50%

pertencentes à New Zealand´s Fonterra Co-operative Group Ltda. A DPA resultou,

portanto, da parceria realizada entre esses dois importantes players da cadeia

láctea produtiva mundial. Essa parceria, implementada no ano de 2002, foi

realizada no âmbito das Américas, fortalecendo a inserção da DPA no mercado

americano como um todo. Através dessa joint-venture se articularam os dois

blocos com menores custos de produção mundiais, a Nova Zelândia e o Brasil,

juntamente com a maior empresa com faturamento mundial na área de lácteos e

derivados.

O foco de atuação desta empresa é a matéria-prima, sendo sua função

coletar o leite fresco, produzir o leite em pó e administrar todas as operações

envolvendo os refrigerados e os produtos UHT, entre os quais arrola-se produção,

marketing, vendas e distribuição.

A DPA foi constituída a partir da Nestlé e Fonterra para suprir as

necessidades de leite em pó da primeira, sendo esta a sua cliente preferencial. A

comercialização do produto leite em pó no mercado brasileiro, para o consumidor

final continua a cargo da Nestlé. Quando ocorrer excedente de leite em pó, após

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as aquisições realizadas pela Nestlé, este poderá ser vendido à Fonterra. A DPA

atua apenas no mercado institucional, não tendo venda direta dos seus produtos

para o consumidor. A marca utilizada para a produção é a Nestlé.

Inicialmente, quando da constituição da joint-venture, ficou acordado que

as exportações da Fonterra para o continente americano seriam prioritariamente

realizadas por intermédio da DPA. Também passou a ser incumbência da DPA a

realização das operações intra-firma no âmbito da América Latina. Operações

antes realizadas externamente à empresa, agora passam a ser realizadas no

âmbito da firma enquanto unidade global de acumulação.

Com a formação dessa nova empresa, a Nestlé se retira do

processamento inicial da cadeia e transfere o relacionamento com os produtores

rurais para uma empresa possuidora de uma série de vantagens neste segmento,

desenvolvidas com os seus cooperados na Nova Zelândia. Transfere também as

atividades relativas à secagem do leite em pó, e deixa a cargo da parceira a

produção dos produtos com maior perecibilidade, os lácteos frescos. Nos produtos

com maior valor agregado e maior durabilidade, tais como fórmulas infantis, leites

condensados e evaporados, creme de leite em lata, queijos e manteigas, a Nestlé

mantém a sua produção. Assim, para efeitos de concentração setorial, as práticas

são analisadas conjuntamente, visto que a captação se dá por parte da DPA,

assim como parte do processamento dessa matéria-prima. Além disso as duas

empresas agem de forma coordenada e têm objetivos comuns.62

A estrutura inicial da DPA na América Latina formou-se a partir das

plantas pertencentes à Nestlé – sete plantas no Brasil e uma planta na Argentina –

e à Fonterra, uma na Venezuela. Dentro dessa estrutura inicial, seis plantas

destinavam-se ao fabrico de leite em pó e duas ao fabrico de produtos

refrigerados. Assim, atividades a cargo da DPA passam a ser realizadas nas

fábricas de leite em pó (Ituiutaba, MG e Itabuna, BA), de leite pré-condensado

(Goiânia, Rialma e Jataí, em Goiás) e nas de refrigerados (Araras / SP e Barra

62 Com base nos estudos de Penrose, adota-se aqui a idéia de que a coordenação é que dará os limites da empresa (Penrose, 2006).

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Mansa / RJ). As unidades industriais relacionadas com outros produtos lácteos, já

citados anteriormente, continuaram a integrar os ativos da Nestlé Brasil S.A.

Essa aliança estratégica resultou em ganhos advindos das competências

dos parceiros.63 A Fonterra tem sua competência central no leite em pó e seus

associados são os detentores das maiores produtividades no campo, além de

trabalharem sem sazonalidade na produção. Por isso possui o custo de produção

mais baixo do mundo64. Após a realização da parceria a empresa realizou

investimentos no Rio Grande do Sul para aumentar sua produção de leite em pó.

A constituição dessa parceria significa a implementação de uma prática já

utilizada em outras áreas pela Nestlé, que é a de buscar grandes parceiros com

competências nas suas áreas de atuação, como por exemplo as parcerias

realizadas com a General Mills - na área de cereais - e com a Coca-Cola na área

de bebidas. Representa, também, a realização de uma prática representativa

dessa nova fase do capitalismo, a realização das alianças (Dunning, 1997a;

Dunning 1997b; Haguedorn & Schakenraad, 1999). Essas parcerias ocorrem em

âmbito global e a prática de realização de acordos de cooperação, assim como a

constituição das redes são intrínsecas à fase de regulação monopolística

(Chesnais, 1996).

Todas essas operações são parte da estratégia de crescimento

empreendida pela Nestlé, empresa que se caracteriza sobretudo por ser uma

empresa produtora de alimentos - atua nas área de lácteos e derivados; sorvetes;

bebidas; chocolates e confeitos; comidas preparadas; condimentos e produtos

farmacêuticos.65 Possuía, no momento anterior a parceria, instaladas em território

63 No capítulo 2 as competências individuais foram analisadas.

64 Nas palavras de seus diretores,

"[a] aliança entre a Nestlé e a Fonterra tem por objetivo alcançar benefícios consideráveis especialmente nas áreas de vendas combinadas. A projeção de faturamento no país é de R$1 bilhão no primeiro ano de atividade. A joint-venture também buscará maior eficiência, a partir da melhor utilização das infra-estruturas; melhor aproveitamento de recursos e dos pontos de distribuição e da força de produção; sinergia de compras e de investimentos em pesquisa e desenvolvimento de produtos. (Fonte)" 65 No Brasil, o grupo suiço Nestlé tem as seguintes participações: Nestlé Brasil Ltda (SP), Indústrias Alimenticias Itacolomy S/A (Montes Claros – MG), Companhia Produtora de Alimentos Itabuna (BA), Tostines Industrial e Comercial Ltda. (SP), Perrier Vittel de Brasil Ltda. (RJ), Alcon

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brasileiro, 25 unidades produtivas, sendo 10 dedicadas aos processamento do

leite, distribuídas estas da seguinte maneira: Porto Ferreira, Araçatuba,

Araraquara e Araras (SP); Itabuna (BA); Ituiutaba, Ibiá e Montes Claros (MG);

Barra Mansa e Rio de Janeiro (RJ). Ainda na área de lácteos a empresa possui

uma unidade em Goiânia, responsável pela captação e distribuição do leite entre

as unidades processadoras e também três unidades menores que executavam

etapas intermediárias de processamento do leite – a pré-condensação - situadas

em Jataí (GO), Rialma (GO) e Teófilo Otoni (MG) (Castro, 2002).

Cabe ressaltar as operações realizadas após a constituição da DPA. A

primeira alteração patrimonial foi a venda, em 2005, da unidade industrial de Porto

Ferreira, produtora de soro de leite, para a Cargil. A unidade envolvida na

transação produzia produtos com alto valor agregado, com essa operação, a DPA

extingue a produção de soro de leite no Brasil. A empresa também realizou

investimentos em plantas produtoras de leite em pó, iniciando a produção de leite

em pó no Rio Grande do Sul, no município de Palmeiras das Missões no ano de

2008, conforme citado anteriormente.

Ainda que a empresa seja de alimentos, a área de lácteos e derivados é

uma das mais significativas: dos 476 produtos oriundos de suas linhas de

produção, 65 são produtos lácteos. Além disso, 38% dos produtos levam na sua

composição leite ou derivados. Assim, o leite constitui-se na principal matéria-

prima utilizada pela Nestlé, respondendo por 60% do total de insumos utilizados

em seus processos produtivos (Blecher, 1999).

A produção da Nestlé em território brasileiro foi precedida por

importações, a partir do ano de 1876, da farinha Láctea - utilizada por

recomendação médica. Por meio dessa inserção e do gradativo aumento de

vendas, a empresa, num momento de mercados retraídos na Europa, no ano de

1921, opta por realizar investimentos no Brasil, com a da compra de uma planta

produtora de leite condensado no município de Araras (SP), produto integrante da

Laboratorios do Brasil S.A. (SP) e Dairy Partners of America (DPA). Um maior aprofundamento sobre a trajetória da empresa foi desenvolvido no segundo capítulo, quando da análise dos principais players mundiais.

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pauta das importações do mercado brasileiro no começo do século XX. Esse

momento de expansão fora da Europa foi parte de um movimento mais amplo de

enfrentamento das dificuldades decorrentes das mudanças do primeiro pós-

guerra, visto que o crescimento inicial da empresa esteve baseado em produtos

utilizados sobretudo em períodos de guerra - leite evaporado, leite condensado

(Fredericq, 1982; Castro, 2002).

Gradativamente, a empresa estabeleceu outras unidades industriais e

construiu uma forte identidade nacional, dominando no mercado brasileiro.

Durante a quase totalidade do século XX a empresa apresentou um

comportamento tradicional, conservador. Apenas com a abertura dos mercados e

a conseqüente entrada de novos concorrentes a partir de meados dos 1980 –

novas marcas, novos fabricantes e importações, que passaram a ser realizadas

pelas empresas e não mais pelo governo – é que a Nestlé modificou sua forma de

agir. Assim, pode-se caracterizar as estratégias empreendidas pela empresa como

do tipo reativas.

Durante o período em que o mercado brasileiro estava regulado a Nestlé

liderava de forma absoluta. Possuía diferencial de preços em relação às outras

marcas concorrentes, atuando como empresa líder em diversos segmentos.66

Com a abertura dos mercados essa liderança passou a ser cobiçada, e

ameaçada, na área de lácteos pela Parmalat e na área de iogurtes e biscoitos pela

Danone. Não obstante que inúmeras ameaças tenham ocorrido, a Nestlé se

manteve no topo.

Pode-se depreender que a estratégia de crescimento da Nestlé, através

das fusões & aquisições, empreendida a partir de meados dos anos 1990, parece

sobretudo condicionada pela estratégia agressiva da então Parmalat, e ocorreu

com menor intensidade que as operações de seus concorrentes. Isso pode ser

inferido em face da defasagem de tempo em que as operações se realizam,

quando comparadas com as mudanças patrimoniais verificadas nas outras

empresas do setor e de forma comparada com as fusões e aquisições

66 Empresa líder consiste na empresa que coordena os preços (Rocha, 2002)

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empreendidas pelas rivais. Diferentemente da Parmalat, a Nestlé entra nesse

mercado secundário de empresas num momento posterior ao boom das fusões e

aquisições; num período de 19 anos adquire 9 empresas e suas respectivas

unidades industriais, como visto no Quadro 08. Num momento anterior, em 1983,

havia adquirido a ITASA, empresa sediada em Minas Gerais, produtora de leite

em pó.

Quadro 08 - Operações de fusões e aquisições realizadas pelo grupo Nestlé no Brasil durante período 1989/2008

Ano Empresa adquirida Área de atuação

1989 Ailiram (SP) biscoitos

1991 CCPL (MG) lácteos

1992 Kid`s balas e confeitos

1992 Perrier Vitel (MG) água mineral

1993 Tostines (SP) biscoitos

1993 SPAM (ES, BA, MG, GO) lácteos

2000 Emege Produtos Alimentícios S.A. massas

2001 Ralston Purina Company alimentação animal

2002 Garoto (ES)* chocolate

Fonte: Anexo A15

Obs* No ano de 2004 a operação foi contestada, sendo que o veredicto do CADE

era de que a Nestlé deveria vender a empresa, esta porém apresentou uma

proposta buscando reduzir sua participação no mercado de chocolates através da

venda de noves marcas – cinco da Nestlé e quatro da Garoto – que

representavam naquele momento 10% do mercado, entretanto até a presente data

não obteve decisão, o processo ainda se encontra em tramitação nos tribunais

(Basile & Madureira, 2007).

As aquisições realizadas não se relacionaram diretamente com produtos

lácteos e o foco do presente trabalho. Entretanto, as plantas industriais adquiridas

estavam relacionadas sobretudo com as competências centrais da empresa,

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constituindo-se em fusões horizontais. Diferentemente da Parmalat, a Nestlé não

objetivou a diversificação concêntrica em suas fusões e aquisições, até porque já

possuía uma gama de produtos consideráveis na época em que esse processo se

intensificou. De certa forma, a diversificação sempre foi uma característica da

empresa, sendo a marca um dos seus principais ativos. Desde sua fundação

sempre trabalhou em nichos de mercados distintos de seus concorrentes, atuando

sobretudo em produtos com maior agregação de valor.67

Esse período se caracterizou não só por aquisições mas também por

venda de algumas operações não centrais (Quadro 09). Em alguns casos realizou

desverticalização de suas estruturas com posterior terceirização de operações

antes próprias.

Quadro 09 - Vendas de operações realizadas pelo grupo Nestlé no Brasil no período 1989/2006

Ano Unidade vendida Compradora

2001 Kid´s68 Arcor Brasil

2000 Reimassas (Uberlândia) Emegê

2003 Processamento de cacau (Ba) PetraFoods

2005 Soro em pó Cargil

Fonte: Anexo A15

Outra estratégia de crescimento empreendida foi a realização de

investimentos em plantas já existentes, aumentando a sua capacidade produtiva e

modernizando o seu parque produtivo. Assim, o crescimento horizontal se deu

prioritariamente através da realização de investimentos, constituindo-se na

principal estratégia de crescimento utilizada. Dentro dessa lógica, em 1986 foi

inaugurada a planta industrial de Araras e em 1990 a de Teófilo Ottoni (MG). Em

1994 iniciaram-se as atividades das unidades industriais de Goiânia e de Rialma

(GO). Em 1997 foi inaugurada a planta de Camaquã (RS) e de sorvetes em

67 Uma série de pareceres do CADE permitem que se chegue a essas conclusões. 68 O alvo da operação foram as instalações e não as marcas - 7 Belo, Kid´s Leite, balas de amendoim Kid´s e Poosh -, que continuaram propriedades da Nestlé -.

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Jacarepaguá (GO). Em 2001 realiza investimentos em Araras, para reforçar a

produção de leite em pó. Em 2006 iniciou-se investimento em Palmeiras das

Missões, RS numa planta de transformação de leite em pó, que começará a

operar em 2008.

Na área de lácteos as principais modificações referem-se às relações

estabelecidas com os produtores rurais. Buscando uma maior agilidade na

realização das operações e, também, redução de seus custos de transação a

empresa passou a comprar sua matéria-prima principal através de terceiros. Essa

prática se deu anteriormente à constituição da DPA. Um exemplo dessa prática

foi a relação estabelecida com a cooperativa Centroleite - sediada em Goiás - que

intermediava operações de compra e venda entre seus associados. Esse tipo de

prática teve como objetivo a redução dos custos de transação - ao invés de

estabelecer contratos individualizados a empresa estabelece grandes contratos e

as negociações de preço também se dão de forma aglomerada. Ainda que a

parcela comprada dessa forma fosse pequena, essa prática significou uma

modificação na forma de atuação da empresa, centrando novamente os esforços

na atividade principal. O foco nas atividades centrais e o estabelecimento de

parcerias é uma tendência internacional. É dentro dessa lógica que a DPA se

constitui. A atividade de captação é a expertise principal da empresa

neozelandesa, sendo um dos motivos principais para a realização da aliança, que

permite a utilização das vantagens comparativas por parte da empresa e também

pela obtenção de benefícios recíprocos pelo uso combinado de ativos

complementares (Dunning, 1997a e 1997b).

Programas de apoio ao produtor rural também se constituem em

estratégias importantes da firma.69 Uma medida adotada foi que a empresa

passou a financiar a soja para a silagem, através da Dairy Partner Americas

(DPA). Através desses programas o agricultor obtém financiamento avalizado pela 69 Prestados inicialmente através do Serviço Nestlé ao Produtor, que passou a receber a designação de Serviço DPA ao Produtor. A empresa revela antecipadamente ao produtor o preço do leite, geralmente essa informação é disponibilizada ao produtor passados 30 dias da entrega da matéria-prima. Assim a empresa fornece um diferencial aos seus produtores.

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empresa. Gradativamente a relação com os produtores vai se adensando, rumo à

uma integração dirigida. Esses programas visam, em última instância, uma melhor

qualidade dos produtos finais. Outra meta é o aumento da produtividade. Formas

essas, ainda que indiretas, de diminuir os custos de transação da atividade láctea.

Com a mudança na legislação acerca da captação e coleta de leite

(Normativa 51 do Ministério da Agricultura) e do aumento dos investimentos que

precisam ser realizados pelos produtores rurais, a escala de produção passa a ser

um elemento ainda mais importante. Só os produtores com maior volume de

produção e com condições de realizarem investimentos, mantêm-se nesse

mercado cada vez mais excludente. São necessários recursos para a aquisição de

resfriadores e congêneres, por isso a compra só se justifica quando a produção é

elevada. A Nestlé, atuando como avalista junto a órgãos oficiais de financiamento,

propiciou aos seus produtores acesso aos recursos necessários para a

permanência na atividade.

De todas as empresas que atuam nessa área, a Nestlé é a única com

volume de captação superior a 10% da produção inspecionada do leite. No

período 1999/2002 coletou, em média, 12,33% do leite inspecionado brasileiro. No

Brasil, em números absolutos, desde 1999, tem apresentado uma tendência

ascendente, realidade diferenciada quando comparada com as outras empresas

captadoras.

A prosperidade obtida durante o longo período em que o mercado esteve

regulado e fechado foi contestada somente nos anos 1990 por empresas

menores, porém mais ágeis. Essa mudança de ambiente levou a perdas relativas

de participação da empresa em diversos segmentos, posteriormente a empresa

adotou uma série de mudanças buscando a manutenção do primeiro lugar no

ranking nacional. A aliança com a neozelandesa Fonterra é integrante das

estratégias implementadas para a manutenção de sua posição.

Com a entrada das novas marcas no mercado e também com a mudança

empreendida nos hábitos de compra do consumidor brasileiro, a Nestlé, buscando

a manutenção e também a ampliação de suas margens de participação, mudou a

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sua forma de atuação, sobretudo com redução de suas margens de lucro.

Tradicionalmente, a empresa operava com preços superiores até 20% da média

do mercado (Parecer SAE). Gradativamente a empresa vem atuando junto a

camadas com menor renda, por intermédio de um trabalho diferenciado, com

abordagem porta-a-porta.

Buscando a manutenção e ampliação de seu market-share, o lançamento

de novos produtos também foi uma das estratégias de produto adotada. Dentro

dessa lógica, chegou a lançar 95 novos produtos no ano de 1999 (Nestlé, 2003).

Seu mix produtivo atual ultrapassa a marca de 500 produtos diferenciados,

utilizando a mesma marca, já consolidada e disseminada no Brasil, para uma

gama maior de produtos.70 Esse lançamento de produtos é uma diretriz geral da

empresa, sendo gerados a partir do centro de pesquisa.

Por fim, destaca-se que, embora a empresa tenha uma forte identificação

com o Brasil, sua estratégia no país encontra-se subordinada à estratégia mundial

do grupo. A inserção da filial brasileira está determinada desde a matriz. Nota-se

que dentro da recentragem produtiva impulsionada pela matriz, a região das

Américas tem destacada participação no tocante aos lácteos.

4.2 Perdigão

Apenas recentemente, no ano de 2006, a empresa Perdigão, dentro de

uma estratégia de expansão, passou a atuar no setor lácteo. O início das

atividades da Perdigão deu-se no município de Videira, em Santa Catarina, no

ano de 1934, e a entrada no mercado lácteo ocorreu através da aquisição de

ações da Batávia S.A.,71 empresa que então ocupava o posto de 13ª em

captação no Brasil, com marca consolidada junto ao mercado consumidor. Após

70 Como exemplo pode-se citar o produto Nescau, originalmente um achocolatado em pó que posteriormente foi lançado como achocolatado em pó light, na forma longa vida, como biscoito, como cereal matinal e como chocolate - em barra, drágeas e bombom. 71 A marca Batavo já integrava o portfólio de marca da Perdigão, desde 2000, quando da aquisição das plantas relativas a produção de carnes.

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essa operação, também incorporou a Eleva, terceira em volume de leite captado

no Brasil, com destaque na produção de leite UHT.72 Essas aquisições a

colocaram como a segunda empresa em termos de captação de leite no Brasil a

partir do ano de 2007 (Quadro 10).

Quadro 10 - Fusões e aquisições realizadas pela Perdigão no período 2005-2008

Ano da

operação

Empresa adquirida Principais produtos Localização

2005 Mary Louise carnes Nova Mutum (MT)

2005 Incubatório Paraíso aves in natura Jataí (GO)

2005 Galé Agroindustrial – Grupo Vitor Priori

aves in natura Jataí (GO)

2006 Garanhuns bebidas lácteas e iogurtes

Garanhuns (PE)

2006 Fornos biscoitos Jundiaí(SP)

2006 Batavo lácteos Carambeí(PR)

2007 Plusfood nuggets, empanados, frango cozido e grelhado, hambúrgueres

Holanda, Romênia, Reino Unido

2007 Sinos dos Alpes embutidos Bom Retiro do Sul (RS)

2007 Unifrigo carnes Vale do Guaporé (MT)

2007 Eleva lácteos e carnes Teutônia (RS)

2008 Cotochés lácteos (MG)

Fonte: Elaborado pela autora a partir de pareceres da Secretaria de Acompanhamento Econômico, diversos.

72 Por sua vez, a Eleva, antiga denominação da Avipal provinha de um processo de expansão. Assim, como a Perdigão originalmente não produzia lácteos. A entrada nesse segmento ocorreu em 2004, quando da incorporação da Elegê Alimentos S.A.

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Parte das empresas adquiridas proveio da reformulação da Parmalat,

outra parcela foi de empresas familiares que tiveram dificuldades no momento da

sucessão patrimonial. Independente da origem da empresa, todas detêm marcas

consolidadas junto ao mercado consumidor.

Além das aquisições no ramo de lácteos, aumentou sua capacidade

produtiva de carnes. Uma aquisição que merece ser destacada, dentre as de outra

natureza, foi a compra da Plusfood. Esta aquisição tornou a Perdigão a primeira

empresa brasileira do setor de alimentos a ter plantas produtivas na Europa.

Através dessa aquisição a empresa está apta a produzir no continente europeu,

podendo optar por diferentes formas de produzir suas especialidades, evitando

assim possíveis restrições quanto a importações.

Essa internacionalização da produção já encontrava-se em curso. O

primeiro movimento nesse sentido foi a joint-venture estabelecida com a Sadia, no

ano de constituição da BRF Trading S.A. que resultou na abertura de um

escritório de vendas visando o mercado externo. Com a dissolução da parceria, a

Perdigão assumiu esse escritório, que se transferiu do Brasil para a Holanda, no

ano de 2002, sob a denominação de Brazilian Fine Foods (BFF). Além de cuidar

das vendas para o mercado externo, esse escritório também passou a ser

responsável pela adequação dos produtos para o mercado exterior.

A diversificação em direção ao segmento lácteo relaciona-se com as

crises advindas do setor de carnes e com os bons rendimentos e perspectivas

apresentadas pelo setor lácteo. Assim, a estratégia de expansão da Perdigão foi a

transformação de uma empresa setorial para uma multisetorial, no caso passando

de uma empresa de carnes para uma empresa de alimentos. Essa mudança de

estratégia e a decisão de crescer estão relacionadas com a passagem do controle

acionário da empresa para um grupo de fundos de pensão, a empresa só se

transforma quando sob a égide direta do capital financeiro, da entrada de uma

lógica diferenciada de acumulação.

Ainda enquanto empresa familiar a Perdigão passou por um processo

falimentar originado em problemas de crédito, parque fabril sucateado, falta de

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qualidade dos produtos, nível baixo de market share, entre outros, processo esse

que resultou na transformação societária (Uller, 2002). O processo de

transformação da empresa familiar em sociedade anônima iniciou-se em 1995,

com uma reestruturação societária e organizacional que origina, no ano de 1997 à

Perdigão S.A.. Dentro dessas modificações a única empresa operacional passou a

ser Perdigão Agroindustrial S.A., operando em quatro unidades de negócios:

Perdigão, Lácteos, Bovinos e Internacional. A empresa passou a ser controlada

por fundos de pensão. Também dentro dessa estratégia de expansão a Perdigão

foi a primeira empresa brasileira de alimentos a ter ações listadas na Bolsa de

Nova York no ano de 2000. Integrou de forma pioneira o Novo Mercado da Bolsa

de Valores de São Paulo (Bovespa) no ano de 2006, constituindo-se na primeira

empresa brasileira no setor de alimentos a integrá-lo. A expansão se viabilizou

financeiramente a partir do lançamentos de ações, que capitalizaram a empresa e

possibilitaram as aquisições. Realizou uma oferta de ações no montante de R$

800 milhões no ano de 2000. Atualmente seu controle acionário é pulverizado e

difuso, conforme Gráfico 25.

Gráfico 25 - Composição acionária da Perdigão em 2007 (%)

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Fonte: Relatório Perdigão (2008)

Independente da origem da empresa, uma constante nesse processo de

expansão foi a aquisição de marcas consolidadas, essas operações incorporaram

ao portfólio da Perdigão, as marcas Batavo, Elegê, Avipal73.

Gráfico 26 - Distribuição das vendas da Perdigão, por grupo de produto, em 2007

outros8%

lácteos10%

carnes34%

carnes processad

as48%

Fonte: Relatório Perdigão (2008)

Obs* - Para uma análise temporal entre as empresas, dados relativos à 2006 encontram-se no Anexo A29.

73 A origem da marca Batavo data de 1925, quando um grupo de imigrantes holandeses criou a Sociedade Cooperativa Holandeza de Laticínios que depois transformou-se na Cooperativa Agropecuária Batavo Ltda. Em 1954, juntando seu quadro com a Sociedade Cooperativa Castrolanda dá-se a constituição da CCLPL. O Grupo Batavo surge em 1961, quando a Cooperativa Agropecuária Arapoti funde-se com a CCLPL. Até os anos 1970 a cooperativa atuava apenas na produção de leite e derivados, e foi nessa década que passou a atuar nas áreas de avicultura e suinocultura, transformando-se num dos maiores grupos agroindustriais do país.

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Remanescentes do movimento cooperativo, capitaneada pelos fundos de

pensão, essa segunda empresa no setor lácteo é fruto da fusão remota de duas

renomadas cooperativas. Sua entrada no ramo de lácteos ocorreu através da

compra de participação da empresa Batavia S.A.. Incorporou assim ao seu

patrimônio a marca Batavo, tradicional quando se fala em iogurtes no Brasil.

Sempre ofertou produtos diferenciados e esteve associada a produtos de

qualidade. Associar ao seu portfólio de marcas uma já conhecida e respeitada

tornava a entrada em um novo setor mais facilitada. A marca já tinha criado a sua

reputação, nos mercados de iogurte representava. O mesmo ocorreu

posteriormente quando adquiriu a Eleva.

4.3 Itambé

Terceira empresa em captação de leite no Brasil, a Itambé – designação

pela qual é conhecida a Central de Produtores Rurais de Minas Gerais (CCPR) e

que se constitui na marca principal da empresa -, vem perdendo participação

relativa na última década dentre as principais processadoras lácteas brasileiras,

ainda que tenha realizado uma série de alterações com vistas a incrementar a

competitividade da empresa.74 De origem cooperativa, transformou-se em

sociedade anônima no ano de 1999. No momento da transformação patrimonial,

operava através de 32 cooperativas regionais, 72 postos de recepção e 20.155

produtores cooperados nos estados de Minas Gerais, Goiás e Distrito Federal

(Figueira, 1999). Esses produtores abasteciam 9 unidades produtivas (Gonçalves,

2000).

A transformação em sociedade anônima fez parte de uma estratégia de

expansão que contemplava investimentos no parque tecnológico. A atualização

seria possível com a entrada de recursos através de um novo parceiro. Dentro do

74 A cooperativa foi fundada em 1948 e a partir de 1956 passou a adotar a atual designação. As instalações industriais utilizadas eram arrendadas do Governo de Minas Gerais, originalmente constituíam a Usina.

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movimento cooperativista, foi uma das pioneiras no Brasil na alteração de

constituição jurídica da empresa.

A Central de Produtores Rurais de Minas Gerais (CCPR) alterou sua

constituição jurídica, na busca de uma maior competitividade. A transformação em

uma sociedade anônima controlada no ano de 1999 possibilitaria viabilizar a

emissão de ações. Essa medida foi tomada de forma a atrair recursos, através de

novos sócios - e não mais os cooperados - para a realização de investimentos que

possibilitariam a sua permanência no mercado, frente à intensificação da presença

das multinacionais, principalmente Nestlé e Parmalat, nos anos 1990. A partir

dessa mudança se tornava possível a abertura do capital da empresa, podendo

dessa forma atrair parceiros estrangeiros.

Esse não foi o primeiro movimento em busca de maior competitividade.

Essa abertura de capital ocorreu apesar das medidas anteriormente adotadas, que

visavam a modernização tecnológica. Ainda que se tenha passado quase uma

década o parceiro estratégico não se apresentou. A avaliação para a não

efetivação da estratégia foi da tomada de decisão de manter o controle da

empresa com a CCPR passando a mesma a ser uma sociedade anônima de

capital fechado.75 Outros capitais só se integrariam caso pudessem dar as

diretrizes de funcionamento, ou pudessem participar de forma pulverizada. Dessa

forma, sócios minoritários de grande monta não se apresentaram. O atraso

tecnológico não é uma questão explicativa para a não apresentação de parceiros,

visto que a cooperativa era a melhor posicionada no ranqueamento nacional e

contava, dentro de uma política de expansão anterior, com diversificação de suas

linhas de produção e fabricação de produtos com maior valor agregado.

75 Esse tipo de transformação tornou-se possível pois, a partir dos anos 1980, as cooperativas passam a ter autonomia funcional e administrativa, até então inexistente, visto que as mesmas ficavam sob a tutela do Estado. O pressuposto cooperativo básico, de que todos são iguais, tendo assim os mesmos direitos e, portanto, todos os produtores devendo receber o mesmo preço pelo produto entregue, é substituído pela diferenciação de produtor, de acordo com a produtividade apresentada. Essas mudanças institucionais conduzem à mudança da coordenação.

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Com a transformação das cooperativas em S.A. também se modifica a

coordenação entre a empresa e os produtores de leite, antes cooperados, e que,

enquanto cooperados eram também sócios da cooperativa com compromisso de

exclusividade no fornecimento da matéria-prima. Caso o cooperado não vendesse

toda a sua produção para a cooperativa, corria o risco de exclusão da cooperativa.

Essa, por sua vez, também tinha o compromisso de comprar o leite do cooperado.

Entretanto, a busca de novos parceiros estratégicos exigiu uma reorganização

anterior buscando uma maior lucratividade do negócio. Em decorrência desse

processo muitos pequenos produtores, ou menos eficientes, perderam sua

vinculação com a empresa

Seus produtos são distribuídos em todo o território nacional, tendo

participação destacada nas regiões Sudeste e Centro-Oeste. Minas Gerais e

Goiás (Lobato & Soares, 1999a). No Norte e no Nordeste se destaca sobretudo no

mercado de leite em pó.

No ano de 2007, a Itambé operava com seis plantas processadoras de

lácteos, situadas em Belo Horizonte, Guanhães, Goiânia, Sete Lagoas, Pará de

Minas e Contagem, e com centros de distribuição situados em Minas Gerais,

Distrito Federal, Ceará, Goiás, Pernambuco, São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro.

Outra parte dos investimentos desse período foi direcionada para a

aquisição de equipamentos que permitissem uma maior flexibilização do seu

parque industrial, capacitando assim a empresa para uma mudança rápida de

foco, atrelando sua atuação à reação do mercado (Figueira, 1999).

Quando da intensificação da concorrência, durante os anos 1990,

acelerou o processo de granelização, já em curso, ainda antes da obrigatoriedade

por parte da Normativa 51. A ação se deu através de investimentos que

permitiram a instalação de mecanismos de resfriamento nas fazendas. A captação

de leite a granel diminui custos de transporte para a empresa e diminui a

incidência de bactérias no leite (Lobato & Soares, 1999a). A empresa passou

também a implementar programas de incentivo para o aumento de produtividade

por parte dos cooperados, assim como de volume entregue. Isso porque uma

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melhor qualidade da matéria-prima e maiores quantidades entregues por

propriedade, corresponde a menores custos para a unidade processadora. Esses

investimentos foram seletivos, direcionados para um grupo de produtores que

trabalhava com produtividade acima da média. Posteriormente a empresa

realizou ampliações nas suas unidades produtivas visando expandir algumas

linhas de produtos.

No tocante à captação, também mudou a forma de se relacionar com os

produtores, passando a realizar operações de aquisição de leite intermediadas por

cooperativas de compra. Assim, a exemplo de outras empresas, passou a adquirir

leite através da Centroleite.

Sua diversificação produtiva deu-se dentro de uma linha mais tradicional

de produtos – não houve desenvolvimento de novos produtos e nem

diferenciação de produto. Assim, a empresa não possui um diferencial produtivo

perante os demais produtores brasileiros. Não existe nenhuma exclusividade

láctea sob a marca Itambé.

Outra forma de crescimento empreendido foi a expansão em mercados

externos, através da parceria denominada de Serlac Trading, formada em 2002

juntamente com a Cooperativa Central Agro-industrial do Paraná Ltda

(CONFEPAR), a Indústria de Laticínios Palmeira dos Ïndios S.A. (Ilpisa) e a

Embaré S.A. Esta parceria tem por finalidade viabilizar, e facilitar, a exportação de

produtos lácteos brasileiros. No mercado externo passam a utilizar-se da marca

Brazilian Dairy Board. Posteriormente, a Cooperativa Central de São Paulo (CCL)

também se associa a Serlac. A busca de mercados internacionais possibilita

novas alternativas de comercialização, fugindo dessa forma do poder cada vez

maior dos grandes players do mercado varejista.76

76 Durante o ano de 2002 a Itambé teve dificuldade de relacionamento com Pão de Açúcar e Carrefour, abandonando temporiamente o relacionamento com esses agentes.

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4.4 Parmalat

A atual empresa detentora dos direitos sobre a marca Parmalat no Brasil

pouco tem em comum com a empresa Parmalat Brasil S.A. Indústria de Alimentos,

que se constituiu em território brasileiro a partir de uma joint-venture da empresa

italiana Parmalat com a empresa Laticínios Mococa, em 1974, e que se separou

da matriz italiana no ano de 2005, dentro de um processo de recuperação da

empresa em território brasileiro. Toda essa crise afetou significativamente a

Parmalat Brasil, em decorrência sobretudo da representatividade desta dentro do

grupo econômico internacional.

No ano de 2003 a empresa encontrou em concordata após uma série de

escândalos financeiros, característicos do modo de produção capitalista

predominantemente financeiro.77

Após a reestruturação ocorrida no Brasil a marca se manteve, mas os

capitais envolvidos mudaram. Essa nova Parmalat foi adquirida, em maio de 2006,

pelo fundo de investimentos Latin America Equity Partners (LAEP)78. Hoje, a sua

relação com o controladora italiana está circunscrita a um contrato de

licenciamento para a utilização das marcas no Brasil (Parmalat e Santal) por um

período de 15 anos, marca a partir da qual a empresa se constitui e intercâmbio

de tecnologia industrial.79 Além disso é também proprietária das marcas Alimba,

Duchen, Glória, Kidlat e Especiallat – com linhas de produção ativas, e das

marcas Lacesa (Anexo A30).80 Seu relacionamento restringe a pagamento de

royaltes, tendo a administração sendo totalmente desvinculada da matriz italiana.

77 Um maior detalhamento sobre essa trajetória dessa empresa encontra-se em Carvalho (2005). 78 Fundo constituído por grupo de brasileiros em 1994. 79 Ainda que tenha passado por uma série de revezes, a marca sempre apresentou market shares consideráveis, num mercado com uma diversidade de pequenas marcas. 80 Essas marcas foram adquiridas durante o intenso processo de incorporações que passou a Parmalat nos anos 1980 e 1990. Algumas marcas são de abrangência mais regionalizada, tais como a Alimba, com representatividade na região nordeste. Algumas também regionalizadas, como no caso da Lacesa, encontram-se fora de linha de produção, ainda que permaneçam como ativos da empresa. Constituíam-se em marcas de antigos laticínios regionais.

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Na verdade, a empresa foi adquirida por um consórcio entre o grupo LAEP

e a Perdigão, numa proposta conjunta, e a Perdigão estava interessada em uma

empresa específica, a Batávia. Foi com a venda da Batávia para a Perdigão que o

Laep pôde capitalizar a empresa. Também usou parte desse recurso para saldar

as dívidas da Parmalat com os bancos, podendo assim ofertar liquidez imediata,

que tornou a proposta apresentada em vencedora.

Predominantemente láctea, visto que se constitui a partir do braço lácteo

da antiga Parmalat, a “nova” Parmalat vem buscando a diversificação dos

negócios. No seu início, 90% das receitas se relacionavam com os leites fluídos,

no ano de 2008 estes leites respondem por 50% das receitas. Na verdade a

“nova” Parmalat se constituiu para aproveitar as oportunidades que se originaram

no segmento lácteo, segundo informações dos próprios administradores.

Atualmente apresenta a seguinte conformação (Quadro 11).

Quadro 11 – Unidades produtoras da Parmalat em 2007 e seus respectivos produtos

Unidade Fabril Produtos

Carazinho (RS) Leite Lácteos

Jundiaí (SP) Sucos Chás

Jundiaí - Fornos (SP) Biscoitos

Itaperuna (RJ) Lácteos Leite UHT Leite condensado

Santa Helena de Goiás(GO) Lácteos

Garanhuns (PE) Lácteos

Ouro Preto d`Oeste (RO) Leite UHT Manteiga Lácteos

Fonte: www.parmalat .com.br

Os leites especiais sempre foram uma das especialidades da antiga

Parmalat. Inovação e variedade foram as suas características principais. Inovou

ao introduzir no mercado brasileiro o leite longa vida, no ano de 1977. Manteve

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essa característica de pioneira, através do lançamento de uma série de

especialidades, fruto de investimento sistemático em pesquisa e desenvolvimento

de produto a partir da então matriz italiana. Sua série de leites enriquecidos foi

iniciada com o lançamento do Integral com Ferros e Vitaminas, no ano de 1995 e

a partir de então lançou as seguintes variedades: leite integral com baixo teor de

lactose; leite light enriquecido com vitaminas A e E; leite semidesnatado

enriquecido com cálcio e vitaminas (C e E); (Parmalat Plus); Dietalat; Natura

Premium. Em 1999 começou a atuar no segmento de leites funcionais: Ômega 3,

Crescimento, Zymil. Foram essas mesmas variedades que garantiram 90% da

receita da nova Parmalat a partir de sua reestruturação.

A cessão temporária da marca Parmalat em iogurtes integrou a venda da

Batávia. Os capitais brasileiros estão se beneficiando da marca construída pela

empresa italiana. O que acontecerá após a cessão desse licenciamento é uma

incógnita. Durante o período de cessão a acumulação de capitais poderá render

para que posteriormente outras marcas sejam passíveis de utilização.

A nova Parmalat beneficiou-se de um forte relacionamento com os

produtores fortalecido através do então programa de relacionamentos da Parmalat

com os produtores.

Herdeira de uma bacia leiteira então assistida pelo Departamento de

Assistência ao Produtor Rural (DAPP), que realizava acompanhamento com os

produtores rurais através de um programa estruturado de apoio, independente da

relação de compra estabelecida.81 Essa ação acabava por caracterizar uma forma

diferenciada de relação com o fornecedor de sua matéria-prima principal, dando

menor possibilidade do produtor agir de forma oportunista.82

81 "A empresa escolhida para o estudo de caso destacou-se pelo enfoque intensivo no acompanhamento de seus fornecedores, sendo a única empresa a contar com uma equipe específica voltada para o desenvolvimento dos produtores de leite, independente das negociações de compra da matéria prima. Outras ações, tais como a variedade de prestação de serviços oferecidos ao fornecedor, também não são encontradas nas demais empresas do setor (Novo & Toledo, 2001:6). 82 O oportunismo é a regra nas relações entre fornecedores e laticínios (Nassar et al, 2002). Essa característica faz com que o produtor busque alternativas para obter uma maior lucratividade, fugindo aos termos previamente acordados. Assim, segundo Williamson (1985), como não é

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A incorporação do DAPP pela nova empresa trouxe consigo benefícios

diretos como uma maior produtividade do plantel leiteiro, gerando assim ganhos

de escala em decorrência da maior produção de leite por estabelecimento.

Diretamente relacionados com o aumento de escala verificam-se os ganhos

logísticos: transporte de maiores volumes por quilômetro rodado; menor preço

pago pela matéria-prima e gerenciamento dos custos dos fornecedores, um dos

grandes entraves quando se trabalha com o setor primário. Outros benefícios

também eram creditados à prática de granelização do leite, como um menor custo

de beneficiamento, visto que o leite captado já era resfriado. Essa prática também

induzia a um aumento da qualidade intrínseca da matéria-prima.

Nesse mesmo sentido de melhoria da matéria-prima, o grupo continua

atuando, agora através da Integralat, empresa pertencente ao mesmo grupo de

investidores e que passa a realizar um trabalho de integração vertical comandada

pela empresa processadora, a exemplo do que já acontece com as empresas

produtoras de carne avícola e suinícola. Assim, em junho de 2007 a Laep

constituiu a Integralat, empresa com foco na produção primária, introdutora da

prática do sistema de integração, tão característico do mercado de carnes avícola

e suinícola. Tem como meta aumentar a produtividade a partir de melhoramento

genético.

Como podemos observar no quadro 11, no ano de 2005 a empresa conta

com apenas 7 unidades processadoras, sendo que exclusiva dos produtos lácteos

apenas 5 unidades. Em 2005, esse número se reduziu para 5 empresas e para

4.400 fornecedores. Sua representatividade não se alterou profundamente, mas

os impactos causados por sua atuação agressiva disseminaram por diversos

setores, principalmente alterou a face do sistema agroindustrial leiteiro no Brasil,

atuou como uma espécie de agente revolucionário dentro da cadeia brasileira

levando a uma mudança de paradigma produtivo. Após todas essas mudanças, a

empresa já anunciou a realização de investimentos em Pernambuco objetivando

produção de leite em pó. possível identificar ex-ante os indivíduos merecedores de confiança, são feitos esforços e criadas salvaguardas para que não se verifiquem comportamentos oportunistas ex-post.

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4.5 Danone

A Danone, depois de ocupar o posto de quinta maior empresa em

captação de leite no Brasil, passou para a décima quarta posição (Fonte: Tabela

05). Essa mudança na captação está relacionada com a estratégia mundial da

empresa de recentragem produtiva (um detalhamento da performance mundial da

empresa pode ser obtido no capítulo 2).

A atuação da Danone no Brasil data de 1970, quando do estabelecimento

de uma joint-venture com a Laticínios Poços de Caldas.83 É a partir dessa

empresa que passa a ser produzido iogurte com polpa de frutas no Brasil.

Posteriormente a Danone adquiriu a empresa brasileira (Mathias, 2001).84

Inicialmente, a Danone dedicou-se à produção de produtos lácteos –

sobretudo na linha de refrigerados. Nos anos 1980 passou a atuar no segmento

de massas e nos 1990 entrou também no segmento de biscoitos. As aquisições

realizadas pela empresa se relacionaram sobretudo com essas duas últimas

competências. Aquisições na área de laticínios só foram realizadas nos anos

2000, num período subseqüente ao auge do movimento de fusões e aquisições

(Quadro 12).

83 A Laticínios Poços de Caldas iniciou suas atividades no ano de 1942 com a designação de Sociedade Laticínios Caldas Ltda. Posteriormente se transformou numa sociedade anônima, possibilitando a formação da joint-venture com a Danone. Informações sobre a história da empresa encontram-se disponíveis em www.danone.com.br 84 Desde o início sua marca foi quase que sinônimo de iogurte no Brasil e foi através dessa parceria que o iogurte com polpa de fruta passou a ser produzido em território brasileiro. Essa relação permanece no imaginário do consumidor, na pesquisa Marcas de Confiança 2008 Danone 36% das citações sobre iogurte.

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Quadro 12 – Operações realizadas pela Danone no período 1989-2002

Ano da operação

Empresa adquirida Produtos

1981 Terra Branca massas frescas

1997 Companhia Campineira de Alimentos (SP) biscoitos

2000 Aymoré (MG) biscoitos

2000 Leite Paulista (SP) refrigerados lácteos

Fonte: Quadro 01

Aumento de renda real, estabilização, entre outras mudanças ocorridas no

Brasil no começo do século XXI, fizeram com que a empresa adotasse uma

estratégia de expansão diferenciada da matriz, englobando a produção de

produtos direcionados às classes C e D, ao adquirir em 2000, parte dos negócios

da Leite Paulista, inclusive a propriedade sobre a utilização da marca para o

segmento iogurtes – Paulista, Pauli e Fruty. Depois de um tempo atuando dentro

dessa lógica, no ano de 2008, licenciou a marca para a Parmalat, retornando às

suas origens. Esse movimento da Danone no Brasil esteve relacionado

diretamente com o Plano Real e o incremento de renda real ocorrido que resultou

num aumento de 19% na quantidade consumida de iogurtes face a uma queda

nos preços da ordem de 14% (Achielsen,1998 apud Martins, 2001).

Essas estratégias se relacionam com a elevada elasticidade-renda que os

produtos lácteos frescos apresentam.85 Num momento de crescimento da

economia brasileira, a empresa apostou na expansão de consumo das camadas

mais populares através da aquisição de marca já consolidada, e mais popular no

mercado, a Paulista. Os iogurtes produzidos pela então Cooperativa Central dps

Produtores de Leite (CCLP) sempre tiveram preços inferiores aos praticados pela

Danone, direcionados a segmentos diferenciados de mercado. Assim, mesmo que

85 “Nossa intenção, agora, mais do que aumentar a fatia de mercado sobre os concorrentes, é ampliar o consumo.” Para comprovar a afirmação, Bruxelles cita dados dando conta de que, enquanto os brasileiros consomem 3 quilos de produtos lácteos frescos – iogurtes, petit suisses, sobremesas e requeijões cremosos-, na Argentina o consumo já é de 6 quilos per capita. Na França, sede da Danone, esse consumo chega a 32 quilos, segundo Bruxelles, que se dá por satisfeito com um crescimento próximo ao do país vizinho ao Brasil.

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as duas empresas fossem produtoras de iogurtes, parte significativa de suas

linhas de produção eram complementares, e não excludentes como poderia se

pensar a priori.

Ainda que atuasse em diferentes áreas, seu principal produto sempre foi a

área de produtos lácteos frescos. No ano de 2007, cessa as atividades de

produção de biscoitos, sujeito a diretriz mundial da empresa.

Abandona a produção de massas alimentícias em 1996 e a de biscoitos

no ano de 2000, ainda que tenha se tornado a maior empresa de biscoitos da

América do Sul (Quadro 13).

Quadro 13 – Vendas de ativos realizadas pela Danone no período 1989-2002

Ano da operação

Empresa adquirida Produtos

1981 Terra Branca Massas frescas

1997 Companhia Campineira de Alimentos (SP) Biscoitos

2000 Aymoré (MG) Biscoitos

2000 Leite Paulista (SP) refrigerados lácteos

Fonte: Quadro 01

Dentro de sua estratégia de expansão, a Danone diversifica seus

produtos a partir das marcas já trabalhadas pela empresa.86 Entretanto, seu

esforço principal está produção de alimentos funcionais. Toda a recentragem da

matriz ocorreu nesse sentido.

A realocação produtiva da empresa no Brasil está relacionada diretamente

com os benefícios decorrentes da “guerra fiscal”. Assim, a empresa tem

concentrado sua produção no estado de Minas Gerais em face dos programas de

estímulo oferecidos pelo Estado que estimulam a competitividade da produção

leiteira em território mineiro.

86 No ano de 2002 passa a produzir achocolatado com a marca Danete e no ano de 2003 começa a produção de leite fermentado com a marca Danoninho.

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Associada à expansão de mercado, a empresa programou a realização de

gastos em propaganda e marketing, objetivando uma melhor colocação de seus

produtos e aumento de seu market share. As ações adotadas constituíram-se em

renovação de suas linhas produtivas, sobretudo àquelas de iogurtes e do

requeijão.

4.6 Considerações preliminares

As grandes empresas de capital estrangeiro atuam predominantemente

em produtos não comoditizados. À medida que esses se tornam padronizados, os

abandonam em favor de novas áreas e/ou produtos. Percebe-se nessas empresas

a prática constante da inovação, resultante de atividades de pesquisa e

desenvolvimento de produtos e processos realizados no exterior. As atividades

dessa natureza no Brasil são do tipo adaptativas, não sendo responsáveis diretas

pela inovação.

Um outro ponto que merece destaque diz respeito à forma de

financiamento adotada por essas empresas, sobretudo as originárias em território

brasileiro. A pulverização das ações se revelou a forma mais adequada de

financiamento, vide um comparativo entre a Perdigão e a Itambé.

Independentemente da origem do capital, as empresas que se destacam

são grandes empresas que atuam tanto no mercado interno quanto no mercado

externo.

A grande maioria dessas empresas se caracterizam por serem empresas

produtoras de alimentos e não somente produtoras de leite e derivados - forma

predominante apresentada pelas empresas de capital nacional. Essa diferença em

relação à forma apresentada pelo capital nacional acaba por trazer ganhos para o

capital externo, pois, como a empresa atua em diversos produtos, faz-se possível

um compartilhamento de recursos comuns e/ou complementares, assim como

diminuem as possíveis flutuações no fluxo de caixa e diluiem-se os custos fixos, e

conseqüentemente dilui os riscos.

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Num primeiro momento, as fusões e aquisições foram protagonizadas

pelas empresas de capital estrangeiro. Após a falência da Parmalat e a

reorganização da cadeia no Brasil, as empresas nacionais, dentro de seu

processo de expansão, passaram a capitanear essas ações. Esse predomínio do

capital externo nas operações de fusões e aquisições pode ser explicado em parte

por uma saúde financeira melhor dessas empresas e em parte por maiores

facilidades de acesso à recursos financeiros.

Todas as empresas analisadas têm abrangência nacional, seja em

captação da matéria-prima, seja na colocação de sua produção. Para diversas,

essa abrangência nacional foi obtida ao longo de seu processo de expansão . As

ações adotadas pela empresa, geralmente integram uma estratégia global de

valorização do capital do grupo ao qual pertencem. Essas ações acabam por

condicionar as demais empresas e transformar o cenário no qual se encontram

inseridas.

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Conclusão

Analisar o sistema lácteo mundial é olhar para uma série de cadeias

produtivas regionais, orientadas principalmente para o mercado interno, ou

buscando crescimento externo, em caso de impossibilidade daquele tipo de

expansão, seja por limitação do mercado interno , seja por restrição da produção

primária. O espaço de valorização do capital passa a ser o mundo todo. E na

busca dessa valorização, a produção mundial de leite, a matéria-prima básica está

em movimento. O crescimento produtivo ocorre nos países em desenvolvimento, e

em alguns casos só este é possível.

Essas cadeias produtivas regionais, que experimentam um ambiente

concorrencial mais intenso, concentram-se, inclusive porque as novas tecnologias

produtivas exigem escala produtiva. Investimento em pesquisa e desenvolvimento

sistemáticos envolvem recursos significativos.

Nesse novo padrão de acumulação verificam-se maiores assimetrias nas

condições de acesso e também no custo do crédito, com condições mais seletivas

e punitivas para as empresas de pequeno e médio porte. Decorre disso a

dificuldade das pequenas e médias empresas em acumularem. Esse ambiente

seletivo é mais um fator propício para a concentração de capitais que se verifica

no período. Dentro desse contexto, a realização de fusões e aquisições foi uma

constante presente ao longo do período.

Já passados mais de vinte anos do processo de liberalização comercial

após uma análise de diversos fatores que influenciaram o comportamento do

segmento lácteo, verifica-se que a lógica da concorrência está mais globalizada no

setor. Essa globalização decorre das estratégias de expansão das empresas

líderes, que tem buscado novos locais de produção e aprovisionamento de

matérias-primas. Entretanto, em face das características apresentadas pela

matéria-prima leite as condições de produção ainda estão bastante relacionadas

com as características regionais. Assim, ainda que apontemos para a formação de

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uma cadeia produtiva, em face de estar envolvida uma matéria–prima

agropecuária, nunca se dará da mesma forma em que uma indústria cujos

insumos são provenientes do setor industrial.

A reestruturação setorial em direção a uma articulação mais global iniciou-

se com a instituição do sistema de cotas de produção na Comunidade Européia no

ano de 1984 e prosseguiu com a Rodada Uruguai, em 1994, que desencadearam

por parte das empresas européias a adoção de uma postura mais agressiva no

tocante a fusões e aquisições com vista à expansão. Esse movimento, por sua

vez, provocou uma reação nas estratégias das empresas norte-americanas, que

passaram a agir de forma semelhante, ainda que orientadas para o seu mercado

interno. Assim, em decorrência das estratégias adotadas pelas empresas

européias, a forma de crescimento predominante da empresa láctea no final do

século XX foi a incorporação de ativos já existentes. Na Europa esta era a

principal alternativa possível de ser implementada, pois outras possibilidades, em

decorrência das circunstâncias, não estavam dadas, ou necessitavam de um

longo período até ser viabilizado.

A expansão da produção na Europa está obstaculizada em face das

restrições produtivas decorrentes do sistema de cotas, embora isso não seja um

impedimento absoluto. Porém, além disso, os subsídios geram um gasto adicional

para o Estado.

Uma análise das empresas que se destacam na indústria láctea mundial

revela que essas empreenderam diferenciação de produtos através de aspectos

qualitativos, só possível com pesquisa e desenvolvimento. Essa é uma constante

nas principais empresas produtoras. Um outro elemento importante de ser

analisado, relacionado com a criação de ativos intangíveis, diz respeito à utilização

do marketing para a diferenciação do produto. As marcas são bens intangíveis,

capazes de agregar maior valor e gerar mais lucros, tornando a preocupação com

o portfólio de marcas relevante. Através da marca é possível criar diferenciação

em produtos homogêneos.

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Investimento em pesquisa e inovação possibilitam uma inserção

diferenciada e o aumento do valor agregado. Ainda que as empresas atuem de

forma internacionalizada e busquem valorização dos seus capitais em diversos

locais, a sua base nacional prevalece, e muitas vezes a empresa reflete os pontos

fracos e fortes dessa base nacional. A liderança desse processo resulta em

patentes, royalties e também a atração de empregos no topo da pirâmide salarial

da empresa. A posse das plataformas que geram conhecimento científico conduz

formas diferentes de inserção.

No período analisado também se acentuaram as alianças, culminando em

novas empresas constituídas por partes afins das líderes ou por partes dessas

empresas com destacada competência.

Se em um primeiro momento, esse processo foi impulsionado pela PAC,

pela prática de subsídios nos Estados Unidos, assim como pelo desenvolvimento

das cooperativas na Oceania, agora, existe um novo fator condicionante, que é a

incorporação de um contingente elevado de consumidores potenciais, ao mesmo

tempo em que as possibilidades de expansão da produção da matéria-prima estão

restritas. Isso significa que do ponto de vista das estratégias das empresas, estar

posicionado onde é possível atender a essa demanda é fundamental para

aproveitar esse potencial de rentabilidade. As estratégias passam a ser mais

globais, a partir do momento em que as dimensões e as possibilidades de

aproveitar o mercado mundial só está disponível para empresas que atingiram um

certo patamar de escala empresarial.

Esse processo repercute no Brasil, quando da abertura comercial, as

condições em que se encontrava o setor no Brasil levaram a um processo intenso

de desnacionalização das empresas, de uma concentração de capitais e também

de transformação do papel das cooperativas. A indústria nacional era frágil

tecnologicamente, originada em grande parte das cooperativas, e o tabelamento

dos produtos não incentivava investimentos em pesquisa e desenvolvimento por

parte das empresas brasileiras.

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Diferentemente do ocorrido nas principais cadeias produtivas macro-

regionais, vemos no Brasil uma diminuição do papel das cooperativas. Enquanto

que nos blocos onde a possibilidade de crescimento estava dada – América do

Norte e Oceania -, as cooperativas foram os principais atores na condução do

processo de concentração, no Brasil esse processo foi capitaneado pela grande

empresa privada, seja de capital nacional ou externo. Aqui as cooperativas que se

mantiveram venderam seu controle em troca de aporte de capitais. Salienta-se

que independente do formato adotado pela cooperativa, essa forma de

organização preserva uma base mais local, ainda que em alguns casos busque

crescimento externo.

Dentro desse processo de reestruturação produtiva, distintas questões

apontam para o Brasil como um destacado produtor de lácteos, pois o país ainda

apresenta baixos índices médios de produtividade e baixos custos de produção.

Tem possibilidade de intensificar a sua produção, perspectiva ausente na grande

maioria dos países produtores atuais, seja por falta de área territorial, por

problemas ambientais ou por terem uma produção elevada baseada na utilização

de subsídios, possuindo um custo social implícito. Alguns dos principais players

mundiais encontram-se em território brasileiro, sendo que, com atuação direta,

encontra-se a Nestlé, a Danone, a Fonterra e a Kraft Foods. Essas empresas

multinacionais após dominarem o processo de fusões e aquisições, estão

realizando investimentos, desta vez orientados para o mercado externo. Parte

dessa transformação pode ser explicada pela ausência de desenvolvimento

tecnológico por parte das empresas de capital nacional, seja de natureza privada

ou cooperativadas. De um modo geral, as empresas nacionais foram seguidoras

das inovações geradas a partir das matrizes das grandes empresas. Ainda que

atualmente o capital nacional tenha uma participação mais relevante, a geração de

tecnologia não ocorre por aqui.

Com a construção da DPA, nota-se que essa operação, ao invés de

diversificar opta pela concentração e especialização, seguindo a tendência de

focar nas atividades centrais verificada internacionalmente.

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Com o advento da mundialização do capital as estratégias empresariais

ganharam novas diretrizes. Os movimentos de longo prazo passaram a ser

determinados a partir das matrizes. Constitui-se, ainda que parcialmente, uma

cadeia produtiva global. No Brasil, as multinacionais européias têm o comando da

cadeia, inserindo dessa forma o Brasil na cadeia produtiva mundial. Com isso se

verifica um aprofundamento da dependência tecnológica ao desenvolvimento da

empresa multinacional, que age em torno de uma estratégia de valorização

mundial de seu capital.

Isso repercutiu nos investimentos realizados. Num primeiro momento,

esses investimentos foram realizados pelas empresas multinacionais com vistas

ao mercado interno. A empresa italiana Parmalat liderou esse processo no final do

século XX, provocando uma intensa reestruturação setorial quando entrou em

processo de liquidação, caso contrário o movimento concentrador seria maior do

que o atualmente apresentado. Nesse segundo momento, os capitais nacionais,

até em função do aumento de demanda por lácteos no mundo e da constatação

de que durante um determinado período a oferta mundial será inferior à demanda,

foram atraídos para o setor, reunidos sob a forma de fundos de investimento. Os

investimentos recentes no Brasil são orientados para o mercado externo e

preponderam as plantas destinadas a secagem de leite em pó.

Estrategicamente, a maior empresa do setor, a Nestlé, tem o Brasil como

plataforma produtiva para as Américas. A base produtiva láctea da então maior

empresa de alimentos do mundo, e que busca essa forma de atuação globalizada,

expressa pelo sistema de estão adotado (sistema GLOBE), está posicionada na

América Latina, através de uma joint-venture que envolveu assim a maior

produtora de alimentos do mundo com a empresa que desenvolveu o menor custo

de produção mundial de leite associado a elevada produtividade e ausência de

sazonalidade. A partir do território brasileiro uma grande empresa se capacita para

ampliar sua participação no mercado mundial. , De forma estratégica, a empresa

com maior faturamento no segmento de lácteos tem o Brasil como plataforma para

a produção das Américas. As atividades desenvolvidas no Brasil dizem respeito a

etapas em que a agregação de valor ainda é pequena, destacando-se a

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transformação do leite fluído em leite em pó – processo de secagem – e a

concentração do produto obtida pelo processo de leite condensado. Essas são as

principais categorias de produtos exportados.

O Brasil constitui-se em um elo dentro da cadeia produtiva global, ponto

relevante em decorrência da formação dos blocos regionais e na perspectiva de

proliferação de áreas regionais de livre comércio.

Ainda que todo esse movimento esteja em curso, as tendências indicadas

pelos principais geradores de informações apontam para a manutenção das

proporções ora vigentes na produção mundial.

Frente a todas essas colocações a presente tese indaga sobre as

conseqüências e os possíveis resultados para a cadeia produtiva brasileira.

Na relação do produtor primário com a empresa processadora pode

passar da integração espontânea para integração dirigida. Uma inserção mais

virtuosa necessita de ações realizadas ao longo da cadeia produtiva. Um elo a ser

trabalhado é o da produção primária, com potenciais de aumento de

produtividade, sendo que programas desse tipo já vem sendo adotados pelas

empresas, tais como a DPA e a Parmalat, classificadas como integração

espontânea. No ano de 2008 inicia-se, através da Integralat, a adoção de práticas

semelhantes ao sistema integrado entre agricultor e indústria avícola e suinícola,

classificada como integração dirigida. A genética principal é entregue pela

indústria ao produtor rural. Dessa forma o melhoramento genético pretendido e

necessário se fará possível. Muitas potencialidades podem ser exploradas, elas

não são excludentes entre si. Práticas desse tipo propiciaram que o Brasil se

destacasse no mercado internacional desses produtos.

Não se pode perder de vista que a lógica prevalecente é a da grande

empresa e pode-se pretender que esta multinacional tenha origem no Brasil. Só

trabalhando numa escala global faz-se possível o acesso a determinadas

tecnologias, assim como se fazem possíveis investimentos em pesquisa

tecnológica, que possibilitam a prática da inovação. Outra questão que precisa ser

levada em consideração é a criação de competências intangíveis por parte das

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empresas de capital originalmente nacionais, visto que são esses ativos

intangíveis, sobretudo os relacionados com pesquisa e desenvolvimento e criação

de marcas que possibilitam a diferenciação de produtos homogêneos. Ressalta-se

que, ainda que os capitais nacionais tenham assumido o comando de algumas

empresas, essas mantêm sua dependência em relação à marca e tecnologia. Por

exemplo, a Laep Investiments continua a utilizar-se da marca e das tecnologias

geradas pela empresa italiana.

Em face do exposto, blocos com inserção positiva decorrem sobretudo da

utilização de políticas setoriais. Estas são capitaneadas pelo Estado ou por

organismos representativos dos produtores. No Brasil, a coordenação da cadeia

produtiva está a cargo da indústria processadora.

Seguindo o exemplo do ocorrido em outros segmentos agropecuários, a

relação dos produtores tende a se transformar, passando de um etapa em que se

verifica uma integração espontânea entre produtor e indústria, para uma etapa de

integração dirigida.

Espaços se abrem para a realização de parcerias envolvendo os

geradores de ciência e tecnologia e o capital produtivo. Pesquisas mundiais

apontam para a possibilidade de geração de produtos com diversos componentes

obtidos a partir do leite, sendo que uma série considerável destes com elevado

valor agregado. Atualmente esse produtos com maior valor agregado ainda são

importados. Só a dimensão do mercado interno brasileiro já dá esse destaque.

Inovação como atividade rotineira e/ou como resultado de parcerias

público-privado e universidade-empresa. Independente do mercado a que se

destine, a agregação de tecnologia é importante, pois é responsável por um preço

unitário médio elevado em relação a produção de commodities. Através da

cooperação também é possível o acesso a inovação. Caso não se abra um novo

paradigma, acirra-se a concorrência dentro do modo de produzir vigente, o

esgotamento do ciclo do produto ocorre em velocidades cada vez maiores,

verifica-se uma redução das margens de lucro. Só a inovação é capaz de retardar

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essa realidade. Se associada com a redução dos custos, sejam de produção ou

de transação, implicam melhores retornos financeiros para a atividade.

A questão do financiamento é primordial para uma inserção virtuosa da

produção brasileira. Parte das transformações introduzidas foram financiadas com

capitais oriundos ou avalizados pela indústria produtora de bens de capital. Parte

foram recursos através de bancos de desenvolvimentos. As empresas

multinacionais constituídas externamente, sob a forma de sociedades anônimas,

tem um acesso mais facilitado aos recursos. Diferentemente das empresas de

capital nacional, as empresas pertencentes a grandes grupos econômicos se

beneficiam de instituições nos países de origem.

Mais cedo ou mais tarde, essa cadeia global irá intensificar os fluxos de

comércio, tendendo a uma reorganização das atividades. Por todas as razões

apresentadas, tais como a possibilidade de aumento de produtividade do rebanho

leiteiro, o Brasil tem condições de assumir um papel de destaque, caso supere

uma série de entraves e parta para a produção com maior valor agregado, que

incorpora necessariamente produtos intensivos em ciência e tecnologia. Um

desafio que se coloca é a produção de alimentos com maior valor agregado e a

extração de componentes do leite a serem utilizados como ingredientes na

indústria alimentícia. Para que a inserção ocorra dessa maneira são necessários

investimentos em pesquisa que resultem em capacidade produtiva. Movimento de

algumas grandes empresas, em território brasileiro, indicam que o Brasil pode vir a

cumprir papel semelhante ao desempenhado pela Oceania, com elevada

representatividade dentro da cadeia produtiva global. O papel desempenhado pelo

Brasil dependerá das atitudes adotadas pelos empresários, investimentos

realizados em tecnologias e conhecimento implicarão em maior lucratividade. Para

que essa inserção virtuosa se concretize, é imperiosa a necessidade de

desenvolver grandes empresas nacionais, pois as mesmas precisam de escala

produtiva e/ou alto valor agregado para que a prática da atividade inovativa possa

ser desenvolvida regularmente.

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151

ANEXOS

Anexo A1 - Evolução da produção de leite mundial em 1.000 toneladas(1990-

2005)

0

100000

200000

300000

400000

500000

600000

700000

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

Fonte: FAOSTAT(2007)

Anexo A2 – Mudança no consumo mundial per capta de leite e produtos lácteos

(kg/hab/ano)

77 78

92100

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

1979-81 1997-99 2030 2050

Fonte dos dados brutos: FAO apud Contini et al(2006)

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Anexo A3 - Mudanças nos padrões de consumo de alimentos conforme evolução

da renda

Fonte: Rabobank Ásia 2005 apud Nassar(2007)

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153

Anexo A4 – Tendências no consumo de alimentos mundial

Fonte: FAO(2006) apud Nassar(2007)

Anexo A5 – Produção de leite de vaca em 2005

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Anexo A6 – Produção de leite em pó nos maiores países produtores europeus em

1.000 toneladas, no período 1995-2005.

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

França Alemanha Dinamarca

Fonte: EUROSTAT(2007)

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155

ANEXO A7 – Marcas utilizadas nos produtos de origem láctea da Nestlé

Fonte: Coley(2005)

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ANEXO A8– Marcas propriedade da Lactalis

Fonte: www.lactalis.com

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157

ANEXO A9 – Marcas utilizadas pela Danone

Fonte: Danone(2007)

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158

Anexo A10 – Marcas utilizadas pela Dean Foods nos produtos lácteos

Fonte: Dean Foods (2007)

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ANEXO A11 - Marcas utilizadas pela Fonterra

ANEXO A12 -

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160

ANEXO A13 – Desenho clássico da cadeia produtiva láctea

Fonte: elaborado pela autora a partir de Jank & Galan (1999)

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161

ANEXO A14 - Cadeia Produtiva do Leite – Quantificação Brasil

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162

Fonte: PENSA, 2005

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163

ANEXO A15 - Operações de fusões e aquisições envolvendo a indústria de laticínios brasileira no período 1985-2008

Ano da operação Grupo

adquirente

Empresa adquirida Localização Competência central

– Produto(s)

principal(is)

Principais marcas

transacionadas

unidades

produtivas

envolvidas

Tipo de operação

em relação à

competência

central da

adquirente

Aquisições

1986 Gessy Lever Anderson Clayton São Paulo queijos Luna + Dana n.d. concêntrica

1987 Bongrain Laticínios Skandia Minas Gerais queijos finos Skandia 1 horizontal

1988 Bongrain Laticínios Campo Lindo Minas Gerais queijos finos Campo Lindo 1 horizontal

1989 Bongrain Aiuruoca Minas Gerais queijos horizontal

1989 Nestlé Ailiram Marília - SP biscoitos Ailiram n.d horizontal

1989 Parmalat Fiorlat São Paulo manteiga e queijos horizontal

1990 Parmalat Alimba Bahia leite fluído Alimba 1 planta horizontal

1990 Parmalat Laticínios Teixeira São Paulo leite fluído - pasteurizado

3 plantas horizontal

1990 Parmalat Lavisa Bahia leite fluído, queijo, manteiga e iogurte

horizontal

1990 Parmalat Via Láctea São Paulo leite fluído Via Láctea 1 planta horizontal

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1990 Vigor Laticínios Flor de Nata São Paulo leite pasteurizado Flor de Nata horizontal

1991 Gessy Lever Laticínios Rex Minas Gerais queijos tradicionais Rex n.d. horizontal

1991 Nestlé CCPL Teófilo Ottoni

(MG)

horizontal

1991 Parmalat AFHA Rio de Janeiro

leite pasteurizado + queijo, manteiga

AFHA 1 planta horizontal

1991 Parmalat Laticínios Santa Helena

Minas Gerais leite pasteurizado + queijo

horizontal

1991 Parmalat Supremo Minas Gerais leite pasteurizado + queijo

horizontal

1992 Cia Goiana de

Laticínios

Laticínios Gogó Goiás horizontal

1992 Parmalat Laticínios Gogó Goiás leite, queijo 1 planta horizontal

1992 Parmalat Laticínios Mococa Goiás leite em pó Rede de captação de leite

horizontal

1992 Parmalat Planalto Rio de Janeiro

horizontal

1993 Nestlé Confiança São Paulo biscoitos Tostines 1 fábrica horizontal

1993 Nestlé Sociedade Produtora

de Alimentos

Manhuaçu (SPAM)

Nova

Venécia

(ES),

Medeiros

Neto (BA),

leite em pó horizontal

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Nanuque

(MG), Rialma

(GO)

1993 Parmalat Lacesa Porto Alegre, Carazinho, Lajeado (RS), Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro

leite, queijos, requeijão, doce de leite (laticiínios em geral)

Lacesa e Yoplat 3 plantas horizontal

1993 Parmalat SPAM (parte) Rio de Janeiro

Leite + manteiga Manteiga Nino + Leite Toda Vida

3 fábricas horizontal

1993 Parmalat General Biscuits do Brasil

São Paulo massas + biscoitos Lu Petybon e Dunchen

concêntrica

1994 Parmalat Companhia Industrial de Leite de Pernambuco Ltda (Cilpe)

Pernambuco leite em pó + manteiga

- 2 plantas horizontal

1994 Parmalat Laticínio Silvânia Goiás leite horizontal

1994 Parmalat Laticínios Ouro Preto Rondônia leite pasteurizado + queijo

1 planta horizontal

1994 Parmalat Bolls Bahia suco de frutas

(laranja concentrado)

Bolls 1 planta concêntrica

1995 Avipal CCGL Rio Grande

do Sul

laticínios Elegê concêntrica

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1995 Fleischmann-Royal

Avaré

São Paulo concêntrica

1995 Milkaut Ivoti Rio Grande

do Sul e

Santa

Catarina

leite Ivoti 1 fábrica horizontal

1996 Fleischmann-Royal

Gumz Irmãos S.A.

Jaraguá do Sul (SC)

leite UHT e pasteurizado, creme de leite e iogurte

Fazenda Santana, Chocoleite e Iogurte Mercy

Participação acionária

horizontal

1996 Mastellone (La

Sereníssima) Naturalat São Paulo leite Leitesol 93% das ações horizontal

1996 Parmalat Laticínios Bethânia Ceará leite, manteiga,

queijo e iogurte

Betânia 8 plantas horizontal

1997 Bongrain Gessy Lever Minduri (MG)

Carrancas (MG)

queijos Luna e Rex 2 plantas horizontal

1997 Danone Companhia Campineira de Alimentos

Campinas

(SP)

biscoitos Triunfo concêntrica

1998 Parmalat Batavo Paraná laticínios, carne de aves e suinos

Batavo horizontal

1998 Parmalat Etti São Paulo derivados de tomate e conservas alimentícias

Etti 2 plantas concêntrica

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1998

Kerry

Nestlé Três Corações (MG)

leite em pó

1998 Parmalat Neugebauer Rio Grande do Sul

chocolates + guloseimas

Neugebauer concêntrica

1999 Dairy Brás Imbaúba Laticínios Mato Grosso do Sul – São Bernardo do Campo

horizontal

1999 Molfino Queijo Minas Recife queijo Queijo Minas horizontal

1999 Royal Numico Mococa São Paulo leite em pó – leite condensado e farináceos

Mococa 2 horizontal

1999 Vigor Refino de Óleos Brasil (ROB)

São Caetano do Sul (PR)

óleos + margarinas ROB 2 concêntrica

1999

Kerry

Siber SP PR ingredientes para sorvetes

2

2000 Danone Aymoré Minas Gerais biscoitos Aymoré concêntrica

2000 Danone Leite Paulista São Paulo refrigerados lácteos Paulista horizontal

2000 New Zealand

Dairy Board Vigor Leco 51% das ações horizontal

2001 Laticínios

Morrinhos

Nestlé Uruaçu leite em pó ativo não

transacionado

1 horizontal

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2001 Parmalat Fleischmann & Royal (ativos lácteos)

Cerqueira César (SP)

Itaperuna (RJ)

Jaraguá do Sul (SC)

ativos lácteos Glória, Avaré, Cerqueirense, Chocoleite, Frutup, Mantesoft, Pingo Avaré, Plena Forma, Toda Festa, Glubby, Goly Goly, Integro, Manteg

horizontal

2002 Companhia

Brasileira de

Laticínios -

CBL

Parmalat Morada Nova

(CE)

horizontal

2002 Kremon Parmalat Cerqueira c

César (SP)

Avaré 1 concêntrica

2002 Leitbom Nestlé Uruaçu (GO) leite em pó _ 1 Horizontal

2003 Kremon Royal Numico Mococa (SP) leite condensado Mococa 1 horizontal

2004 Avipal Eleva concêntrica

2007 Bom Gosto Da Matta Minas Gerais leite longa vida

queijos

DaMatta 3 horizontal

2007 Eleva CCL Itumbiara(GO

)

1 horizontal

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2007 Bom Gosto Nutrilat Fazenda

Vilanova

(RS)

leite longa vida

leite em pó

horizontal

2007

(controle

compartilhado da

gestão)

Bertin Vigor concêntrica

2007 Perdigão Avipal/Eleva horizontal

2008 Bom Gosto Laticínios Santa Rita Muriaé (MG) sucos prontos Tillli concêntrica

2008 GP

Investimentos

Laticínios Morrinhos Goiânia (GO) Leitbom 7 concêntrica

2008 Parmalat Danone Poços de Caldas

e licenciamento

Paulista

1

(arrendamento)

horizontal

2008 Bom Gosto Coorlac Erechim (RS) Coorlac horizontal

2008 Ind. Alimentos

Nilza

Montelac leite em pó concêntrica

2008 Perdigão Cotochés Rio Casca

Sabará

Miradouro

Leite longa vida

Leite em pó

Requeijão

Cotochés 2 horizontal

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Muriaé

Aiuruoca

Queijo

Leite condensado

Creme de leite

Queijos

Achocolatados

Manteiga

Iogurte

Petit-suisse

Bebidas lácteas

Fonte: elaborado pela autora a partir de informações de imprensa especializada.

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ANEXO A16 - Distribuição das vendas da Perdigão, por grupo de produto, em

2006

carnes41%

lácteos6%

outros7%

carnes processad

as46%

Anexo A17 – Marcas exploradas pela LAEP no Brasil.

Fonte: www.parmalat.com.br