recebido em: 12/04/2014 – aprovado em: 27/05/2014 ... · 12 de fevereiro de 1998 e dá outras...

11
ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014 3783 UTILIZAÇÃO DO GESSO DE ENTULHO NA PRODUÇÃO DE CIMENTO Evaldo de Melo Ferreira 1 e Karla Alcione da Silva Cruvinel 2 1 Especialista. Mestrando, Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás, Goiânia, Brasil. E-mail: [email protected] 2 Mestre, Docente na Escola de Engenharia Civil da Universidade Federal de Goiás, Goiânia, Brasil Recebido em: 12/04/2014 – Aprovado em: 27/05/2014 – Publicado em: 01/07/2014 RESUMO Em considerável expansão durante a última década, a indústria da construção civil é um dos principais constituintes do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, apontada por alguns cientistas políticos como termômetro da economia nacional. Resultante de suas atividades, resíduos sólidos considerados inertes são gerados em grande quantidade, sendo as chamadas áreas de bota-fora, uma das alternativas de descarte feito por pequenos e grandes geradores deste tipo de material. Entre os instrumentos legais que tratam do assunto estão a Lei Nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, altera a Lei Nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 e dá outras providências, e a Resolução Nº 307, de 5 de julho de 2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), que estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil. No país, diversos estudos estão em andamento em centros de pesquisa espalhados pelo território nacional. Estes possuem como foco, o desenvolvimento de técnicas de reciclagem e reaproveitamento do entulho. O presente estudo é constituído basicamente pela revisão de trabalhos científicos que abordam as técnicas e métodos para reciclagem e reaproveitamento de Resíduos de Construção e Demolição (RCD), podendo desta maneira, conhecer o estado da arte relacionado a estes aspectos. O texto também apresenta uma proposta de reaproveitamento do gesso proveniente de demolições em substituição à gipsita utilizada na produção de cimento portland. PALAVRAS-CHAVE: Ciências Ambientais; Construção Civil; Saneamento Ambiental. USE OF PLASTER OF WASTE IN CEMENT PRODUCTION ABSTRACT In considerable expansion over the last decade, the construction industry is a major constituent of Brazilian Gross Domestic Product (GDP), considered by some political scientists as a thermometer of the national economy. Resulting from their activities, considered inert solid waste are generated in large quantities, and the calls of send- off areas, an alternative disposal made by small and large generators of this type of material. Among the legal instruments dealing with the subject are Law Nº. 12.305, of August 2, 2010, establishing the National Policy on Solid Waste, amending Law Nº. 9,605, of February 12, 1998 and other measures, and Resolution Nº. 307 of July 5, 2002 of the National Council of Environment (CONAMA), which establishes guidelines, criteria and procedures for the management of construction waste. In

Upload: duonghanh

Post on 10-Nov-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3783

UTILIZAÇÃO DO GESSO DE ENTULHO NA PRODUÇÃO DE CIMEN TO

Evaldo de Melo Ferreira1 e Karla Alcione da Silva Cruvinel2

1Especialista. Mestrando, Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás,

Goiânia, Brasil. E-mail: [email protected] 2Mestre, Docente na Escola de Engenharia Civil da Universidade Federal de Goiás,

Goiânia, Brasil

Recebido em: 12/04/2014 – Aprovado em: 27/05/2014 – Publicado em: 01/07/2014

RESUMO Em considerável expansão durante a última década, a indústria da construção civil é um dos principais constituintes do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, apontada por alguns cientistas políticos como termômetro da economia nacional. Resultante de suas atividades, resíduos sólidos considerados inertes são gerados em grande quantidade, sendo as chamadas áreas de bota-fora, uma das alternativas de descarte feito por pequenos e grandes geradores deste tipo de material. Entre os instrumentos legais que tratam do assunto estão a Lei Nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, altera a Lei Nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 e dá outras providências, e a Resolução Nº 307, de 5 de julho de 2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), que estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil. No país, diversos estudos estão em andamento em centros de pesquisa espalhados pelo território nacional. Estes possuem como foco, o desenvolvimento de técnicas de reciclagem e reaproveitamento do entulho. O presente estudo é constituído basicamente pela revisão de trabalhos científicos que abordam as técnicas e métodos para reciclagem e reaproveitamento de Resíduos de Construção e Demolição (RCD), podendo desta maneira, conhecer o estado da arte relacionado a estes aspectos. O texto também apresenta uma proposta de reaproveitamento do gesso proveniente de demolições em substituição à gipsita utilizada na produção de cimento portland. PALAVRAS-CHAVE: Ciências Ambientais; Construção Civil; Saneamento Ambiental.

USE OF PLASTER OF WASTE IN CEMENT PRODUCTION

ABSTRACT In considerable expansion over the last decade, the construction industry is a major constituent of Brazilian Gross Domestic Product (GDP), considered by some political scientists as a thermometer of the national economy. Resulting from their activities, considered inert solid waste are generated in large quantities, and the calls of send-off areas, an alternative disposal made by small and large generators of this type of material. Among the legal instruments dealing with the subject are Law Nº. 12.305, of August 2, 2010, establishing the National Policy on Solid Waste, amending Law Nº. 9,605, of February 12, 1998 and other measures, and Resolution Nº. 307 of July 5, 2002 of the National Council of Environment (CONAMA), which establishes guidelines, criteria and procedures for the management of construction waste. In

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3784

Brazil, several studies are in progress in research centers around the country. These have focused on the development of techniques for recycling and reuse of rubble. This study is basically constituted by reviewing scientific papers that discuss the techniques and methods for recycling and reuse of construction and demolition waste (CDW), and may in this way, knowing the state of the art related to these aspects. The text also presents a proposal for reuse of gypsum in demolitions in lieu of gypsum used in the production of portland cement. KEYWORDS: Construction; Environmental Sanitation; Environmental Sciences.

INTRODUÇÃO A indústria construtiva é um dos principais agentes promotores do

desenvolvimento econômico do Brasil. Em anos anteriores a atual crise econômica internacional, como em 2005, sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro foi de quinze por cento, gerando cerca de quatro milhões de empregos diretos e três indiretos para cada direto (SOUZA, 2005). No Brasil, geograficamente, essa indústria é predominante nas regiões Sudeste e Sul, representada por pequenas e microempresas que contratam trabalhadores de pouca qualificação formal. A extensa e complexa cadeia produtiva da construção civil exerce forte alavancagem econômica nos setores que lhe servem de fornecedores de insumos, sendo importante indutora do crescimento para essa atividade, por exemplo, (RODRIGUES et al., 2013).

Resultante desta cadeia produtiva surge os Resíduos de Construção e Demolição (RCD), ou também conhecidos como entulho de obra. De acordo com ANGULO et al., (2011, p. 300):

As empresas privadas de construção, que são grandes geradoras desse resíduo, devem desenvolver projetos de gerenciamento específicos, por exemplo, triagem em canteiros de obras, incluindo o uso de transportadores cadastrados e de áreas licenciadas para manejo e reciclagem. O poder público deve oferecer uma rede de coleta e destinação ambientalmente correta para os pequenos geradores, responsáveis por reformas e autoconstruções e incapazes de implementar autogestão.

Entre os resíduos sólidos urbanos, os resíduos provenientes de construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil têm apresentado um aumento de volume considerável (SCREMIN et al., 2014). A geração destes materiais é intensificada ainda mais pelos indicativos de crescimento da produção, despertando a preocupação de ambientalistas e da comunidade em geral, em vista de um cenário ainda mais perigoso e danoso ao meio ambiente e à saúde da população (FARIAS FILHO et al., 2011). Com a Resolução Nº 307 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), estendeu-se a responsabilidade do gerador sobre a gestão e transporte de RCDs até seu destino final, tendo como falha, não estabelecer critérios para diferenciar o gerador de pequeno e grande porte (PUCCI, 2006). Esse instrumento legal define como resíduos da construção civil:

Os provenientes de construções, reformas, reparos e demolições de obra de construção civil, e os resultantes da preparação e da escavação de terrenos, tais como: tijolos, blocos cerâmicos, concreto em geral, solos, rochas, metais, resinas, colas, tintas, madeiras e compensados, forros, argamassa, gesso, telhas, pavimento asfáltico,

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3785

vidros, plásticos, tubulações, fiação elétrica etc., comumente chamados de entulhos de obras, caliças ou metralha (CONAMA, 2002).

SOUZA et al., (2008, p. 206) dizem que: “os resíduos de construção e demolição são constituídos de restos de argamassa e concreto, materiais cerâmicos, metais, plásticos, madeiras, papéis e vidros”. A composição dos RCDs depende, essencialmente, da natureza dos processos construtivos e, consequentemente, dos materiais empregados (ULSEN et al., 2010).

Os resíduos de construção possuem uma considerável heterogeneidade em termos de sua composição (MOTTA & FERNANDES, 2003). A maior fração destes é formada por material não mineral, sendo estes, madeira, papel, plásticos, metais e matéria orgânica (ZORDAN, 1997). Sua quantidade varia de 54% a 70% dos resíduos sólidos urbanos de cidades como Rio de Janeiro e Belo Horizonte, representando uma geração per capita entre 0,4 e 0,76 t/hab./ano (MOTTA & FERNANDES, 2003).

É possível a verificação de um número significativo de despejos ilegais de entulho (MÁLIA et al., 2011). De acordo com MOREIRA (2010, p. 8): “esses resíduos, quando depositados clandestinamente em terrenos baldios e taludes de cursos de água, provocam impactos ao meio ambiente possibilitando propagação de vetores de contaminação [...]”. Diante de todos estes problemas gerados pela má gestão dos inservíveis provenientes das atividades de construção, torna-se então necessário o desenvolvimento de técnicas e métodos para reciclagem e reaproveitamento de RCDs.

Entre outras, algumas das pesquisas desenvolvidas sobre o tema são, “Estudo da durabilidade de argamassas alternativas contendo resíduos”; “Tijolos prensados de solo-cimento confeccionados com resíduos de concreto”; “Avaliação do uso de agregados reciclados de resíduos de construção e demolição em concreto estrutural” e “Aplicação de entulhos em estruturas de solo reforçado”.

A Resolução CONAMA 307 classifica os RCDs em quatro classes. Sendo a Classe A os de construção, demolição, reformas e reparos de pavimentação e de outras obras de infraestrutura, inclusive solos provenientes de terraplanagem e de processo de fabricação e/ou demolição de peças pré-moldadas em concreto (blocos, tubos, meios-fios etc.). A Classe B são os resíduos recicláveis para outras destinações, tais como plásticos e papel/papelão. A Classe C são os resíduos para os quais não foram desenvolvidas tecnologias ou aplicações economicamente viáveis que permitam a sua reciclagem/recuperação, tais como os produtos oriundos do gesso, sendo a Classe D os resíduos perigosos oriundos do processo de construção, tais como tintas e solventes.

Este trabalho tem como objetivo principal, analisar certas técnicas e métodos de reciclagem e reutilização dos resíduos de construção, trazendo também uma proposta para o reaproveitamento do gesso proveniente de demolições em substituição à gipsita utilizada na produção de cimento portland.

GESTÃO AMBIENTALMENTE ADEQUADA DE RCDS

A gestão de resíduos deve ter como objetivo a promoção da sustentabilidade econômica das operações, preservando o meio natural, a qualidade de vida da população e contribuindo para a solução dos aspectos sociais envolvidos com a questão. As medidas preventivas em se tratando da questão ambiental, devem se antecipar e impedir ou minorar a ocorrência dos fatores de degradação (BRAGA et

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3786

al., 2005), sendo o gerenciamento as ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos (BRASIL, 2010).

Os RCDs devem ser tratados e depositados de acordo com a legislação, sendo de responsabilidade dos municípios a solução para os pequenos volumes de RCDs, que geralmente são dispostos em locais inapropriados. Quanto aos grandes volumes, devem ser definidas e licenciadas áreas para o manejo dos resíduos, cadastrando e formalizando a presença dos transportadores dos resíduos e fiscalizando as responsabilidades dos geradores, inclusive quanto ao desenvolvimento de projetos de gerenciamento.

ACONDICIONAMENTO DE RCDS

Para cada tipo de entulho classificado pela legislação existe um recipiente indicado para o acondicionamento de resíduos. Pode-se dividir a cadeia logística dos materiais resultantes do processo construtivo em dois extremos, sendo estes, interno (Figura 1) e externo a obra.

(a) (b) FIGURA 1: Restos de concreto (a) e sobras de madeira (b) resultantes de

formas utilizadas no molde de escadas, em construção vertical residencial no Setor Oeste, Goiânia, GO.

FONTE: Arquivo pessoal (2010).

O acondicionamento do entulho depende de diversos fatores, dentre os principais se destacam a classe do material gerado, o dimensionamento da construção/empreendimento, o volume gerado e o destino que será dado ao material. Pode-se utilizar para acondicionar os resíduos gerados, recipientes como, bags (Figura 2), baias (Figura 3), bombonas (Figura 4) e caçambas estacionárias (Figura 5), por exemplo.

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3787

FIGURA 2: Bags utilizados no acondicionamento de resíduos de construção e demolição.

FONTE: Adaptado de PUCCI (2006).

FIGURA 3: Baias utilizadas no acondicionamento de resíduos de construção e demolição.

FONTE: Adaptado de PUCCI (2006).

FIGURA 4: Bombonas utilizadas no acondicionamento de resíduos de construção e demolição.

FONTE: Adaptado de PUCCI (2006).

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3788

FIGURA 5: Caçambas estacionárias utilizadas em unidade de recebimento de pequenos volumes – URPV Barão.

FONTE: Adaptado de SINDUSCON-MG (2005).

COLETA E DISPOSIÇÃO FINAL DE RCDS A coleta dos RCDs deve ser feita por empresas especializadas, com

transportes adequados, como poliguindaste e caçambas estacionárias. Em algumas situações o transportador privado é um dos principais agentes causadores da disposição irregular dos RCDs.

Sendo que quando depositados em vias e ruas públicas próximas da região de geração, os custos com transporte e com a disposição regular são minimizados, transferindo-os à sociedade já que os mesmos deverão ser coletados pelo serviço público de coleta. Dessa forma, o transportador consegue oferecer aos clientes um serviço mais barato do que outros que possuem suas áreas de disposição licenciadas. Com a Resolução CONAMA N° 307, as preocupações com a disposição final dos resíduos aumentam, sendo proibido o encaminhamento dos resíduos da construção civil para aterros sanitários comuns. Uma das maiores preocupações com o crescimento dos RCDs são as disposições irregulares em vias públicas, terrenos baldios e outros. Estas disposições causam comprometimento da qualidade do ambiente e da paisagem local, da drenagem superficial com a obstrução de córregos e consequentemente o surgimento de enchentes.

RECICLAGEM A reciclagem de resíduos é uma alternativa para economizar os recursos

naturais utilizados como matéria-prima na construção civil, além de uma possibilidade de redução nos custos de construção e do volume final dos resíduos a serem dispostos (LIMA & CABRAL, 2013). Entre os materiais que podem ser utilizados para reciclagem, podemos citar os Classe A que são os resíduos compostos de materiais à base de concreto e argamassa sem a presença de impurezas, tais como gesso, terra, metais, papel, vidro, plástico, madeira madura, matéria orgânica. Destinam-se à preparação de argamassa e concreto não estrutural.

A Classe B são os resíduos de composição à base de produtos cerâmicos, em que se admite a presença de pequenas porções de terra, concreto e argamassa, sem a presença de impurezas. Destinam-se à base e sub-base de pavimentação,

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3789

drenos, camadas drenantes, rip-rap e servem como material de preenchimento de valas.

Segundo PUCCI (2006): As etapas podem ser divididas em níveis estratégicos e táticos, por exemplo, no primeiro o processo de redução, passa por etapas do projeto como estrutura, instalações elétricas e hidráulicas, alvenaria e acabamentos. No segundo nos métodos construtivos onde devem ocorrer mudanças em todas as etapas da construção, estrutura, alvenaria, instalações e acabamentos. O objetivo principal dessas alterações deve ser a diminuição na geração de resíduos, influindo na economia com os materiais utilizados.

Um dos avanços no tocante à reciclagem de resíduos de construção e demolição no país é decorrente da publicação pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), em 2004, de normas especificas relativas à sua gestão e seu emprego (GRUBBA, 2009). A reciclagem de resíduos deve necessariamente iniciar-se na própria obra, com a retirada e recolhimento do material de demolição por etapas e separação, de acordo com suas classes (A, B, C, D) (BAPTISTA JUNIOR & ROMANEL, 2013).

Técnicas para o processamento de resíduos estão sendo desenvolvidas para melhor uso desses materiais. Uma das técnicas desenvolvidas para processamento de menor impacto ambiental de RCDs é a separação óptica, onde não requer uso intensivo de energia, nem de água. Os equipamentos de separação óptica são compostos de um alimentador vibratório, que distribui partículas sobre transportadores de correia e as conduzem até os sensores, para registro das imagens (ANGULO et al., 2013).

UTILIZAÇÃO DO GESSO EM SUBSTITUIÇÃO À GIPSSITA A primeira fase da pesquisa consistiu em um levantamento bibliográfico,

visando um maior entendimento sobre o problema, bem como buscar identificar as principais aplicações e destinações dadas para os resíduos da construção civil.

Nos estudos e textos encontrados, diversas opções para a reciclagem destes materiais foram encontradas. Estas são o “Estudo da durabilidade de argamassas alternativas contendo resíduos”, “Tijolos prensados de solo-cimento confeccionados com resíduos de concreto”, “Avaliação do uso de agregados reciclados de resíduos de construção e demolição em concreto estrutural” e “Aplicação de entulhos em estruturas de solo reforçado”.

Para a proposta de aproveitamento do gesso proveniente de demolições, em substituição à gipsita utilizada na fabricação de cimento, não foram realizados testes ou ensaios laboratoriais, sendo feito buscas em bibliografia que apontem a viabilidade de futuros trabalhos.

O gesso é um dos materiais mais importantes na construção civil. Sua produção ocorre com a utilização da gipsita (também denominada por pedra de gesso), composto basicamente de sulfato de cálcio di-hidratado CaSO4.

A maleabilidade do gesso faz da argamassa deste ligante um bom material para a execução de acabamentos em paredes, tetos e também na fabricação de placas Drywall; outra importante característica é a sua propriedade de aderência.

Constitui-se como um bom isolante térmico e acústico devido ao fato de ter uma baixa condutividade térmica e um elevado coeficiente de absorção acústica. Além do baixo coeficiente de condutibilidade térmica possui ainda a característica de liberar água quando exposto ao calor do fogo (calcinação a 160°C).

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3790

Na arquitetura e decoração o gesso pode ser aplicado como sanca, moldura, barrado, rodapé, rebaixamento de teto e como contorno em volta de batentes de portas e janelas. É também aplicado direto na parede de bloco de tijolo sem as etapas do chapisco, reboco, massa fina e massa corrida, sendo conhecido popularmente como "gesso liso".

Quando aplicado direto na parede, fica com um acabamento fino semelhante ao da massa corrida. O gesso também é utilizado como piso protetor de porcelanatos, granitos e outros pisos sensíveis, como por exemplo, a utilização de estopa, lona plástica e gesso por cima para trafego pesado e médio.

No processo de fabricação do cimento portland, é adicionado na forma de Gipsita e possui o papel de ligante entre os agregados. A reutilização dos resíduos de gesso na fabricação de cimento é feita na fase final de moagem do clínquer (em substituição à gipsita "in natura") para retardar a pega do cimento.

O gesso (CaSO4 · 2 H2O) é adicionado em quantidades geralmente inferiores a 3% da massa de clínquer. Sem esta adição, o tempo de pega do cimento seria de poucos minutos, inviabilizando o uso. Devido a isto, o gesso é uma adição obrigatória, presente desde os primeiros tipos de cimento portland.

Uma das opções de reuso deste material é a substituição do gesso virgem pelo gesso proveniente de outros usos. Em cidades como São Paulo existem projetos sobre o assunto. O material é destinado a pontos de coleta que recebem o gesso a granel, concentram o material em uma baia e semanalmente a carga é destinada a algumas cimenteiras, explica o diretor de uma empresa privada especialista na gestão de resíduos sólidos urbanos.

No caso do gesso acartonado, as aparas também podem ser recebidas para reutilização em meio à massa de gipsita, que é utilizada na produção das placas acartonadas. Esta é uma boa alternativa para a questão do gesso em Goiânia e em outros Estados. Sua utilização diminuiria a presença do mesmo entre o entulho. Apesar de direcionarmos o foco para este material, existem outros que precisam ser reaproveitados, como é o caso do Isopor.

A proposta de estudo apontada no trabalho é uma boa alternativa para a questão de materiais como o gesso, sendo este o problema de pequenas e grandes obras. Os RCDs transformados em agregados sejam quais forem as aplicações, são uteis em diferentes etapas de alguns processos construtivos. Segundo VEIGA (2007, p. 85):

O agregado reciclado tem diversas aplicações, sendo as mais usuais: blocos de concreto não estrutural para vedação, base e sub-base para obras de pavimentação, artefatos para utilização em guias e sarjetas, regularização e cascalhamento de ruas de terra, obras de drenagem, execução de contrapiso, contenção de encostas com sacaria de entulho-cimento, calçadas, pavimentação para tráfego leve, recuperação de sistema viário, entre outras.

As pesquisas sobre durabilidade de materiais alternativos ainda são incipientes, podendo se destacar os resíduos da construção civil na forma de agregados para uso em concretos, argamassas e compósitos com fibras vegetais (FARIAS FILHO, 2011). Em estudos da produção de tijolos solo-cimento com a adição de resíduos de construção, pode-se concluir que a adição dos resíduos de concreto promoveu condições favoráveis para a utilização do solo em estudo reduzindo, de forma substancial, a sua retração na secagem, tornando-o plenamente indicado para a confecção dos tijolos (SOUZA et al., 2008).

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3791

Segundo MOREIRA (2010, p. 75): “A metodologia de mistura de concreto pode ser considerada um fator relevante à aplicação de agregados de RCD reciclados em concretos”. Conhecer as técnicas para o tratamento adequado dos resíduos de construção é importante a todos aqueles que de uma forma ou outra contribuem para o aumento na produção destes.

Na construção de solos reforçados, por exemplo, pode-se utilizar RCDs. Estes solos possibilitam a construção simples e rápida de estruturas com inclinações acentuadas, não exigindo mão-de-obra cara e especializada e equipamentos caros, necessitando de pouco espaço em frente à estrutura para a operação de construção, permitindo maior tolerância com a deformação do solo de fundação, e possui diversas possibilidades para o acabamento da face (SANTOS, 2007).

Com o desenvolvimento de novas formas de redução da produção e após a geração existir um descarte adequado, é possível diminuir este quantitativo. Além de medidas como o reaproveitamento algo abordado durante a pesquisa, é necessário a criação e implantação de um aterro para resíduos inertes.

O aterro de resíduos de construção e demolição é caracterizado segundo a Resolução Conama 307 como: “A área, o local destinado à disposição final e ao beneficiamento destes materiais”. Algo que necessita de planejamento e investimento por parte da prefeitura.

Estratégias podem ser criadas para auxiliar nesta implantação, como descontos em impostos destinados a empresas que destinam corretamente estes materiais. Ao circularmos pelas ruas de Goiânia encontramos com facilidade os chamados entulhos, seja em calçadas, lotes vagos e outros. Com medidas consistentes as quais possuem foco na preservação ambiental, todos poderão ganhar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A gestão ambiental de resíduos sólidos é algo cada vez mais necessário, sendo a parceria entre os diversos setores da sociedade, importante para a concretização disto. As técnicas e métodos analisados para reciclagem e reaproveitamento de RCDs são boas opções para a resolução de parte dos problemas ambientais em que os entulhos estão envolvidos.

A utilização do gesso em substituição à gipsita virgem utilizada na produção de cimento portland constitui-se como uma saída para a redução deste material no meio ambiente, e também, em ganhos monetários para as construtoras e empresas cimenteiras. Para estudos futuros, recomenda-se a realização de ensaios laboratoriais com o foco de avaliar propriedades como o potencial calorífico do gesso, algo importante para sua utilização na produção de cimentos.

REFERÊNCIAS

ANGULO, S. C; TEIXEIRA, C. E; CASTRO, A. L; NOGUEIRA, T. P. Resíduos de construção e demolição: avaliação de métodos de quantificação. Engenharia Sanitária e Ambiental , Rio de Janeiro, v. 16, n. 3, p. 229-306, jul./set. 2011. ______; JOHN, V. M; ULSEN, C; KAHN, H; MUELLER, A. Separação óptica do material cerâmico dos agregados mistos de resíduos de construção e demolição. Ambiente Construído , Porto Alegre, v. 13, n. 2, p. 61-73, abr./jun. 2013. BAPTISTA JUNIOR, J. V & ROMANEL, C. Sustentabilidade na indústria da construção: uma logística para reciclagem dos resíduos de pequenas obras. urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana , Curitiba, v. 5, n. 2, p. 27-37, jul./dez. 2013.

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3792

BRAGA, B; HESPANHOL, I; CONEJO, J. G. L; MIERZWA, J. C; BARROS, M. T. L; SPENCER, M; PORTO, M; NUCCI, N; JULIANO, N; EIGER, S. Introdução à Engenharia Ambiental . 2.ed. São Paulo: Prentice Hall, 2005. 318p. BRASIL. Política Nacional de Resíduos Sólidos. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de f evereiro de 1998; e dá outras providências . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em: 01 abr. 2014. CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente (2002). Resolução Nº 307, de 5 de julho de 2002 . Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação. Publicada no Diário Oficial da União em 17/07/2012. FARIAS FILHO, J; MENEZES, R. R; FERREIRA, H. S; SANTANTA, L. N. L; NEVES, G. A; FERREIRA, H. C. Estudo da durabilidade de argamassas alternativas contendo resíduos. Cerâmica , São Paulo, v. 57, n. 344, p. 395-403, out./dez. 2011. GRUBBA, D. C. R. P. Estudo do comportamento mecânico de um agregado reciclado de concreto para utilização na construção rodoviária . 2009. 163p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil: Transportes) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. LIMA, A. S & CABRAL, A. E. B. Caracterização e classificação dos resíduos de construção civil da cidade de Fortaleza (CE). Engenharia Sanitária e Ambiental , Rio de Janeiro, vol. 18, n. 2, p. 169-176, abr./jun. 2013. MÁLIA, M; BRITO, J; BRAVO, M. Indicadores de resíduos de construção e demolição para construções residenciais novas. Ambiente Construído , Porto Alegre, v. 11, n. 03, 117-130, jul./set. 2011. MOREIRA, L. H. H. Avaliação da influência da origem e do tratamento d os agregados reciclados de resíduos de construção e de molição no desempenho mecânico do concreto estrutural . 2010. 92p. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo. MOTTA, L. M. G; FERNADES, C. Utilização de Resíduo Sólido da Construção Civil em Pavimentação Urbana . 12ª Reunião de Pavimentação Urbana, ABPv, Aracaju, Sergipe. 2003. PUCCI, R. B. Logística de resíduos da construção civil atendendo a Resolução CONAMA 307 . 2006. 137p. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Sistemas Logísticos) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo. RODRIGUES, A; ROJO, C. A; BERTOLINI, G. R. F. Formulação de estratégias competitivas por meio de análise de cenários na construção civil. Production , São Paulo, v. 23, n. 2, p. 269-282, abr./jun. 2013.

ENCICLOPÉDIA BIOSFERA , Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.10, n.18; p. 2014

3793

SANTOS, E. C. G. Aplicação de resíduos de construção e demolição rec iclados (RCD-R) em estruturas de solo reforçado . 2007. 168p. Dissertação (Mestrado em Geotecnia) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. SCREMIN, L. B; CASTILHOS JUNIOR, A. B; ROCHA, J. C. Sistema de apoio ao gerenciamento de resíduos de construção e demolição para municípios de pequeno porte. Engenharia Sanitária e Ambiental , Rio de Janeiro, v. 19, n. 2, p. 203-206, abr./jun. 2014. SINDUSCON-MG – Sindicato da Construção Civil de Minas Gerais. Gerenciamento de resíduos sólidos da construção civil . 2. ed. Belo Horizonte: SINDUSCON-MG, 2005. 70 p. SOUZA, M. I. B; SEGANTINI, A. S; PEREIRA, J. A. Tijolos prensados de solo-cimento confeccionados com resíduos de concreto. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental , Campina Grande, v. 12, n. 2, p. 205-212, mar./abr. 2008. SOUZA, U. E. L. Como reduzir perdas nos canteiros . São Paulo: PINI, 2005. 200 p. ULSEN, C; KAHN, H; ANGULO, S. C; JOHN, V. M. Composição química de agregados mistos de resíduos de construção e demolição do Estado de São Paulo. Rem: Revista Escola de Minas , Ouro Preto, v. 63, n. 2, 339-346, jun. 2010. VEIGA, R. M. Subsídios para elaboração de plano de gerenciamento de resíduos da construção e demolição . 2005. 212p. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Planejamento Territorial) – Departamento de Ciências Econômicas, Universidade Católica de Goiás. ZORDAN, S. E. A utilização do entulho como agregado na confecção do concreto . Campinas. 1997. 140p. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Engenharia Civil, UNICAMP. Disponível em [http://www.reciclagem.pcc.usp.br/entulho_ind_ccivil.htm]. Acesso em: 02 jul. 2013.