quarenta passos ate o campo

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O primeiro livro de poesias do poeta Vitor Corleone Moreira da Silva, escrito na cidade mineira de Belo Horizonte no ano de 2001.

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Page 1: QUARENTA PASSOS ATE O CAMPO

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“É muito gratificante o reino das palavras! Aqui é possível criar e modificar

A todo instante o meu mundo artístico. Há voz nos objetos inanimados E inércia aos meus pesadelos

Aqui nada é tão distante E há um poderio nas ações tão significante

Bastando apenas criar os próprios donos das ações.”

Vitor Corleone Moreira da Silva

Essa é a primeira vez que eu escrevo algo! Sinto a magia das palavras contagiar todo o meu ser!

É diferente das poesias que eu leio, dos vários autores, Dessa vez eu que escrevi e criei cada verso.

A arte nos dá infinitas possibilidades E moldar as coisas é muito especial,

Tanto quanto visualizar algo que já está moldado! Nesses últimos dias estou me sentindo realizado!

Escrevi a maioria dessas poesias depois de ter viajado para o interior. Era bom quando eu caminhava no mato!

Era bom e havia realização quando eu parava para escrever E ficava observando as paisagens maravilhosas do campo!

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Então por um breve momento eu interrompo minha caminhada e fico pensando seriamente sobre mim: será que eu estou fazendo a coisa certa? Será que estou no rumo certo da minha vida? Não sei a resposta, e justamente por não saber é que guardo esse punhadinho de receio em minhas mãos, e levo comigo. Retornando a caminhar, vou pra longe

deixando o rastro da minha presença em cada metro quadrado de areia que amortece o peso do meu corpo. Ontem me senti tão triste ao relembrar os fatos que ocorreram comigo nos últimos dias da minha existência! Todo mundo se sente assim quando uma coisa dá errado. São tantas coisas que desejamos e muitas delas se perdem pelos caminhos da história. São muitas as marcas que a vida deixa em nós! O céu está claro e repleto de estrelas! Isso me faz recordar o charme daquela estrela que por um tempo me fez feliz com seu brilho, e num instante de repente se apagou. Sim, ela mesma, anos atrás. Às vezes imagino como as coisas mais simples se tornam tão importantes com o passar dos meses. Essa vida é complicada demais! Por que será que a saudade magoa tanto assim? Minhas mais doces lembranças estão escritas de forma oculta ou abertamente em alguns poemas que ando escrevendo nesses dias, e como se eu fosse um pedaço de cada habitante da terra, transcrevo não por sorte mas por experiência de vida, o mesmo sentimento que sentem sobre os dias do passado. E nesses dias ando meio doente de amor pelos fatos dos últimos acontecimentos. Às vezes fico recordando com tristeza meus antigos amores, quando eu era mais jovem ainda do que sou hoje, e apenas olhar era possível, e eu jamais havia dito nada... é a vida! Ensina muito, é bom o ensinamento. Quando algum colega de classe lê alguma de minhas poesias fico perguntando sobre o que achou, e quando alguém diz algo que eu mesmo pensava sobre a poesia me sinto feliz! Flores rubras que perfumam nossos jardins a cada primavera que se passa, colorindo a vista de nossos olhos incertos que promovem receio aos dias que virão. Cada perfume tão diferente é como o que sentimos a cada momento. Tamanha é a expectativa! Bem, talvez ansiedade que banha a alma como óleo de amêndoas ao corpo que termina de se bronzear no verão ensolarado das praias nativas do Brasil.

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A vida deve ser vivida com alegria pelos bons acontecimentos e não com receio pelo que ainda não deu certo, nem pelas lembranças dos momentos ruins. Eu sei, e deveria agir assim, essa viagem vai ajudar. Não devemos ficar de cabeça baixa. Um coração alegre favorece muito à realização dos sonhos! Viver com alegria é viver bem! Nossa vida não é perfeita e errar é humano! Onde eu deixar cravado um passo, podem ter certeza que estará ali a minha história!

O que nos custa sonhar um pouco mais do que de costume? Tem sempre alguém que quer nos ver sérios e compenetrados nos assuntos mais estressantes da vida. É bom dar um basta nisso tudo, tirar uma folga dessa chatice toda!

Se queremos ser felizes, temos que olhar o mundo lá fora... temos que ganhá-lo! Sorrir de felicidade com os obstáculos superados. A vida é bela! Devemos viver!

E olhando para o céu vejo como são maravilhosas as estrelas que estão brilhando! A lua hoje está convidando para um bom namoro em um banco de praça! Se bem que praças não me trazem lembranças muito boas afinal recentemente terminei meu namoro com uma garota, e nós ficávamos namorando num banquinho de praça lá no bairro, quase todos os dias.

Os jardins floridos têm o encanto da flor do jasmim, maravilhas, comuns nessa época do ano.

Se algum dia uma pessoa ler essas palavras, talvez nelas sinta a magia que estou sentindo. Uma sensação que faz o coração bater forte, claro que estou cansado de caminhar, mas as batidas são por outros motivos também.

Uma porta dourada à minha frente, logo após um corredor cheio de balões coloridos e ao fim uma bambinela vermelha – pra ser feliz basta sonhar – que guarda para mim uma coisa muito importante: meu destino!

E então – nascemos para amar – por um breve momento eu paro de andar novamente e volto a pensar enquanto observo da serra o horizonte cheio de luzes da cidade, longe, cada vez mais longe, eu vim de lá!

Às vezes tudo o que queremos é uma coisa tão simples, isso mostra como é fácil sorrir e ser feliz. Temos que aprender a olhar pra frente e esquecer as mágoas do passado.

Todo mundo nasceu pra ser feliz. De hoje em diante, estou fazendo isso. Por isso resolvi fazer essa viagem, não é justo ficar preso a uma coisa que jamais será verdade, algo que já se perdeu no tempo.

Belo Horizonte, 27 de Dezembro de 2001

Vitor Corleone Moreira da Silva

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QUARENTA PASSOS ATÉ O CAMPO Os que eu contei foram quarenta Em cada um, um novo cismar Quarenta foram os novos olhares E cada um me fez sonhar Foram quarenta os que eu contei Na estrada seguida repleta de arvoredo Em cada passo uma dor deixei E em cada suspiro um segredo Contei quarenta piscar de olhos E as quarenta despedidas Dez beijos, trinta apertos de mãos Em ambos olhos vinte vidas Quarenta vezes nasceu o sol Quarenta vezes vi estrelas E foram tantos pensamentos Como os montes e os riachos E nos vales por onde passei Em cada um plantei um encanto E foram quarenta os que eu contei Quarenta passos até o campo 23/06/2001 Quando falo em quarenta passos, não me refiro a uma trajetória ou

uma caminhada, e sim obstáculos passados na vida. Eu desvendo a saudade como despedida e alegria como novidade. Novidade talvez nem mesmo esperada pelo personagem poético.

Minha linguagem poética está em desenvolvimento ainda. Eu comecei a escrever a poucos meses e tenho mais facilidade para escrever músicas porque nas músicas existe mais sentimentalidade do que na poesia moderna. Em música nós podemos chorar mais e sermos mais sentimentais!

Esse é um poema que eu acho muito bonito, mas tudo que é bonito fica feio um dia. Sei que daqui a alguns anos quando eu estiver mais adaptado a escrever não deva gostar tanto dessa poesia, mas não me importo muito com isso. Sei que irá demorar algum tempo para que alguém leia essa letra, e até lá, não estarei mais por aqui, eu já terei chegado ao meu campo.

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A PRAÇA DA LIBERDADE Quando estou aqui Nos jardins do meu devaneio Liberto minha efusão! Hodiernos de mais emoção Me fazem esquecer o passado - nas asas da liberdade voar - Do qual ontem fui prisioneiro. Nas asas abertas da liberdade Corto asas de saudade brava, Desmancho o vinco em minha face. A viveza em mim renasce! O vento beija meus pensamentos! Os sonhos abraçam a realidade! O perdão namora com o ressentimento, Aqui na Praça da Liberdade! Hodiernos são mais emocionantes! Nas asas da liberdade eu vou! Tórrido o sol lá no azulado E os grilos festejando no mato E nas flores que cobrem o jardim. - me sinto feliz de verdade - As gotas na fonte saltando! Distante ficou o passado, Meu eu aprisionado. Meninos nos cantos brincando, Aqui na Praça da Liberdade. 06/07/2001

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A MULHER DE PANO Quem não conhece Aquela mulher de pano Suspensa por fios de nylon? Sem forças para ficar de pé Desengonçada se deita no chão, Só se levanta de sua posição imóvel Se alguém puxa a corda de nylon. É um fantoche! É um fantoche Aquela mulher de pano Com corpo feito de algodão! Trabalha fazendo teatro. Aparece na televisão. É notícia sempre no rádio. Quem é que não conhece Aquela mulher de pano? Seu penteado é arrogante Revela sua vaidade, O vento ela acha que é seu. Acha que os homens de pano São todos iguais, Mas não conhece nenhum deles Porque ela é apenas um fantoche. Não tem liberdade de ações. Quando acaba o espetáculo, Ela é guardada em uma caixa sombria Feita de madeira e purpurina. 06/07/2001

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REI DO MAR Abalaram a solidão do rei das águas E a silente quietude do mar se desfigurou Mareia Com seu cedro agitou as ondas Fez de pérola a sereia Fez da ostra um general Fez dos peixes soldados reais Impôs leis sobre as baleias Nos cardumes de corais Decretou as leis do reino Liberdade abaixo do nível do mar Cada um tem sua função Todos por mim e ái de vós Ficou tão abalado o rei das águas Das águas do oceano Que seu reino se rebelou A sereia foi embora Foi também o general Os soldados e as baleias E o mar ficou deserto E o rei ficou sozinho Fez de plebe a quietude Fez de rainha a solidão No seu trono se sentou o rei Do mar 15/07/2001

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CANARINHO Meu amor pediu uma prova Prova do meu grande amor E disse que vai me deixar Se dessa vez não gostar Coração desesperou Disse: quero algo belo Que me lembre seu carinho Se me gosta, dê um esmero Se me ama, um canarinho Coração desesperou Quero o mais belo e fofinho Pra lembrar do seu amor Pra lembrar do seu carinho Quero o mais cantador Pra todo dia Com seu canto despertar Coração desesperou Eu saí a procurar Pelo Mercado Central Um dourado canarinho Um canário cantador Presente do meu amor Pro meu bem que tanto adoro Não achei o que queria Os canários são tão tristes Amontoados em gaiolas sujas E voltei a lamentar Pelas ruas, nessas ruas Sem saber se eu procuro Ou invento uma desculpa Outra vez pro meu amor 25/08/2001

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ALMA O amor quando acaba Deixa a alma reclamando os bons momentos Deixa as vozes lamentando os sentimentos O corpo dolorido volta e meia chora As lágrimas que se derramam num crisol Veste amarrotada, voz descontente Coração em pedaços, alegria ausente E a vida lamenta o sorriso de outrora A vida lamenta o beijo apaixonado A vida reclama o sonho inacabado A vida persegue o rastro que ficou A vida esbraveja os sonhos que sonhou E como um barco vai A alma segue errante Levada por ventos, tanto tempo e só Um rio de lágrimas seca e vira pó Então chega ao ouvido o som de um violino O corpo relembra o abraço gostoso E o beijo Só quer um sorriso, esse é seu desejo Mas cai na angústia às notas de um bocejo O corpo percebe que estava dormindo A alma retorna a chorar de dor Alma quer amor Alma quer amar Quê acontece com uma alma que sofre Alma quis amar, alma quis amor Quê acontece com uma alma chorosa Já morreu de amor A alma 23/03/2002

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O CHORO DA ESTRELA O mais brilhante dos astros eu vi E a coroei rainha do céu Um dia chorando a estrela surgiu Pingando até lágrimas em meu papel Seu brilho piscava e foi se apagando Não virou supernova e sumiu a estrela Nos dias seguintes ficava pensando Por que se apagou a estrela no céu Minha roupa branca ao fim do dia amassada Lembrou-me o brilho daquela estrela Senti seu choro nas gotas de orvalho E na noite, queria revê-la Chorando em silêncio apagou-se o astro E não vi mais no céu a rainha surgir A coroada hoje só nas lembranças Do mais lindo astro que eu já vi 01/07/2001 Eu gosto de ficar olhando para o céu de noite e vê-lo coberto de

estrelas, que presenteiam a nossa vida com uma explosão inerte de brilho e magia! Os segredos do universo são excitantes!

Certa vez, quando eu era bem pequeno, escolhi uma estrela para mim, sabe, brincadeiras de criança. Era incrível, pois eu imaginava meus bonecos de plástico voando até ela nas brincadeiras no quintal antes da janta ficar pronta, ou antes, de alguém mandar tomar banho.

Era uma estrela alva e ligeiramente parecia se tornar azul. Durante algum tempo tive essa mania de que a estrela era minha e recordava aquele pedaço do céu. Meu mundo desabou um dia quando descobri que a estrela bonita, a minha estrela, era na verdade um planeta do sistema solar. Na época eu tinha medo de extra-terrestre por causa de alguns filmes, então eu não quis mais o planeta para mim e resolvi brincar de outra coisa.

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GARRINCHA Eu sou fã De alguém que outrora brilhou Seus dribles na história deixou Duas vezes herói do Brasil Garrincha Pesadelo de qualquer zagueiro É o nosso Aladim brasileiro Ele foi jogador nota mil Quando ele entrava no estádio O povo todo aplaudia E jogava com alegria É assim que se deve jogar Mané Ele foi o demônio da copa O gênio das pernas tortas A mão que eu não pude apertar Lá na ponta um menino a brincar O Garrincha pra mim é o maior Os seus lances aprendi de cor Ele foi o maior dos ponteiros O estádio a se incendiar O que ele fez não tem outro que faça O Garrincha é o rei da pirraça O Garrincha é herói brasileiro 01/07/2001

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CACHO DE UVAS Vinte e cinco delírios Em um só cacho de uvas Em cada um, um suspiro Em cada arrogância Uma nova delícia O líquido tão doce Como mel nos lábios A semente em busca da terra E a embriaguez provocada pelas uvas Fizeram sorrir vinte e cinco vezes O cacho quase desnudo Colorido de puro rubor E o sabor daquelas uvas Fizeram sonhar vinte e cinco vezes Em cada mordida Um novo desejo Em cada semente Uma nova jornada de existência E cada uva que se acabava Em meus lábios Era como um jato de água fria Acordando-me do sono gostoso Do sonho tolo de ventura Conseqüência dos meus delírios Os vinte e cinco contidos Os vinte e cinco embalados Em um só cacho de uvas 04/07/2001

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OS CABELUDOS Nos dias da rebeldia demente Cada um seguiu o caminho que quis Cada um mais louco em seu brado feliz Como a chama sublime de um sol reluzente Cada um mais liberto em suas ações E a lei era fraca contra os imponentes O rap e o mito eram expressões Como código Morse em quartos silentes Foi assim que surgiram os cabeludos Homens e motos, poemas e vestes Cada normal que passava nos testes Do grupo rebelde virava soldado No grupo rebelde não havia mudos E os carecas eram inimigos mortais E os cabeludos, tatuagens demais Mandavam nas ruas, cidades e estados Aquele que tinha o couro desnudo Deixava crescer a barba e o bigode Então se transformava em um cabeludo Entrar sem ter pêlos pelo corpo pode Existe até hoje o grupo de black Em menor número outros cabeludos São poucos mas grandes os poucos de hoje E a rebeldia morreu no passado Aquele passado rebelde e imponente Era o reinado dos cabeludos Mas reina hoje a droga no mundo da gente Mudança e revolta. Os idos são mudos Quando os novos armaram tocaia E os cabeludos cortaram os pêlos E não cresceram outros cabeludos Nem de peruca. Ficaram mudos Se um cabeludo era traiçoeiro Honra e lealdade não se via no espelho Do resto do grupo era afastado

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Não fazia mais parte dos cabeludos Todos tinham tatuagens Motos cromadas, roupas de ferro Não suportavam os famintos berros Havia de ser só os fartos rugidos Os seus feitos na história – mensagens De estar onde estiver, ser bom em tudo Como foram os cabeludos E ter ideais cheios de coragem Se o mundo é outro e união é careta Como isolamento de astros reluzentes Faça chama de sol não deixe vencer Aqueles que não tem mais nada com a gente Nos dias de nova rebeldia 08/07/2001

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LUANA, APRENDIZ DE RAINHA Já cresceu Luana Aprendiz de rainha Aprendeu a ser sozinha Menina, aprendiz de mulher Ordenou-me a rainha Que eu desviasse o olhar Que não me pusesse a pensar Em seu caminhar pelo reino E como se eu fosse de pedra passou E a rua ficou cheirosa Luana, aprendiz de maldosa Rainha, aprendiz de estrela Pensamentos de criança São estrelas no mundo da aprendiz É o que sua atitude nos diz Luana, aprendiz de orgulhosa Quando ela passa a palmeira aplaude E as casas ficam silentes Tem olhos tão veementes Luana, aprendiz de rainha 02/07/2001 A Luana é mimada demais, e tão bonita! Eu até gosto da Viviane

ainda, mas não tenho nada com nenhuma das duas, infelizmente, só olho mesmo. A Luana é muito esnobe, arrogante, metida, etc. mas me deixa doido de vontade de dar um beijo. Não consegui, mas claro, sou só um garoto e nem me arrisquei a tentar, ela nunca falou com ninguém aqui da rua da avó.

A Luana quis assumir muito cedo responsabilidades de mulher e se esqueceu de ser criança. Responsabilidades que pertenceriam a uma mulher adulta. Essa sua vontade desesperada de ser precoce a coroou como a adolescente mais adulta que eu já vi, tanto aqui, quanto na escola ou até mesmo no bairro que eu moro. Às vezes nem sei se o que eu sinto é vontade de beijá-la ou de dividir a pena que eu sinto por ela não saber o que é brincar e se divertir como nós, como qualquer garoto e garota.

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CONHAQUE, SABOR DE LEMBRANÇA Cansado de provar do vinho O vinho, sabor de esperança Um dia provei do conhaque Conhaque, sabor de lembrança Conhaque, sabor de lembrança Lembrou-me o que fui no passado Aquele menino calado Aquela triste criança O mundo desvairadamente Os dias eram um ataque Saudade, sabor de conhaque Marcas no passado da gente Lembrei de alguns doces momentos E tristes da infante verdade Maldade, correias, lamentos Conhaque, sabor de saudade E quando se passa o efeito (Me torno de novo sensato) Revolta, infância perdida Conhaque, sabor de saudade A vida hoje não tem coragem Os dias eram um ataque (Me torno de novo insensato) Refúgio, sabor de conhaque 06/07/2001 Houve uma época em minha vida que passei a consumir mais álcool

do que de costume, talvez entregue ao vício. Tentando esquecer certas repressões e carências familiares a qualquer custo, um custo alto demais. Parecia que a bebida acompanhava a montanha-russa do Dólar americano! Preços altos que tornavam amargo qualquer Cortesano.

A primeira vez que bebi conhaque eu fiquei um pouco bêbado, não me lembro de ter dado nenhum escândalo em público, mas os olhos ficaram bem avermelhados e o hálito muito ruim.

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HARÉM DO SULTÃO Tantas belas Nenhuma tem na face o ciúme Todas exalando perfume No harém do sultão Sem nome, sem passado e sem vida Trancadas no harém sem saída Se dizendo mulheres amadas Tantas são Cobertas por jóias de ouro Por seda, por peles e couro Prata, rubi e esmeralda No harém do sultão fechado Não podem conhecer a rua Nem sabem o que é a lua Desconhecem a liberdade Tentação É o olhar inocente que têm E não podem olhar pra ninguém Por causa do ciúme do sultão Tanto sim Para cada noiva um diferente casamento Em cada uma o mesmo indumento Em cada beijo uma reza e uma vela Quanto mais esposas, maior o orgulho Pensa o sultão Quanto mais noivas maior a emoção Mais corpos, mais sensações de prazer As belas no quarto fechado Que podem fazer de suas vidas Em linha as noivas despidas Para o sultão escolher Há sempre entre elas a ingrata Que pretende fugir algum dia Que não quer ser somente alegria No harém do sultão Todas elas sabem quem é Mas nenhuma ousa contar

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Esperam pra ver no que dá Se uma pode, todas poderão O sultão é um gordo baixinho Não é bonito nem é elegante Mas possui os diamantes Faz de todos, seus servos reais Suas noivas são sempre compradas Nenhuma tem amor verdadeiro Cada rosto é um prisioneiro No harém do sultão 07/07/2001

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O MUNDO DOS CANTOS Bordei uma folha de papel Escrevi um verso sem rima Simples, pequeno Por um simples pincel O deixei sobre a mesa jogado Aberto o papel bordado Deixei o meu mundo calado E fui para o mundo dos cantos Deixei a solidão e quietude Na mala somente o que pude Nas mãos o meu violão Parti para o mundo dos cantos Aquele papel bordado Resumiu num adeus meu passado Será algum dia encontrado Já terei partido No mundo dos cantos cheguei Com outras pessoas cantei A blague foi lá que aprendi Na história meus versos deixei Lá não lembrava do silêncio Nem da vida sem canto Na mala não trouxe pranto Na mão nem coube o espanto Somente um violão O nascimento do dia é aventura Até mesmo as rochas cantam Quando a brisa soa Nas cachoeiras melodia pura Quando rolam as águas No mundo dos cantos Em cada momento uma nova canção Até mesmo no vôo de um manto Das mãos da morena No amor e nos prazeres santos A liberdade é acalanto Tocado rente ao sol poente

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Tudo que foi o passado Começou a vir na lembrança Embora gostoso cantar Nos ventos, poesias deixei Ao recitar Lembrei do meu verso sem rima Bordado e na mesa aberto Pelo tempo encoberto Num momento tão perto Voejando na recordação Um dia deu saudade Dos desenhos e das poesias Silenciosas no meu quarto Parti Nos ventos o eco deixei Voltei para um mundo calado Feliz foi o retorno Ao ver que o papel bordado Nem lido, nem visto ou rasgado Por ninguém foi encontrado Pra ninguém sou importante Mas sou bom no que eu faço Nos escritos ou nos traços No refrão e melodias Então dei mais valor à vida E separei os meus mundos Em um as festas e vinhos Em outro a arte e a vida 09/07/2001

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LAVADEIRA Lavadeira lava roupa Põe a roupa pra secar Põe a roupa no varal Prende com o pregador Lavadeira tira a roupa Tira a roupa do varal Põe a roupa pra passar Passa passa lavadeira E a roupa ficou cheirosa Lavadeira lava roupa E a roupa ficou bonita Lavadeira que passou Lavadeira lava roupa Do menino e da menina Do marido e da mulher Lava lava lavadeira E a roupa ficou limpa E a roupa ficou perfumada A roupa está guardada Lavadeira que guardou 10/07/2001

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QUEIJO COM GOIABADA Eu amo aquela mulher Eu amo bem mais que tudo Sem ela eu odeio o mundo Sem ela não gosto de mim Com ela por perto sorrio Sem ela o plástico se quebra Sem ela o vidro é rasgado O papel e a madeira derretem Sem ela perto de mim Sem ela por perto eu choro Mas com ela eu sou feliz O céu é bem mais azul Até a ferida melhora Com ela perto de mim 05/07/2001

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O HOMEM DO LIXO Minhas vontades, São como o vazio do inconseqüente Caminhando ao redor do nada. Um desvario, flecha tão afiada! O martelo tocando o prego Querendo esmagar seu vulto. Como um cometa voando livre no espaço Sou livre mortal destemido! Minhas tristezas Apagam distantes estrelas. Sou apenas incompreendido, Hoje em dia isso é normal. Os pesadelos que me acordam na madrugada, Quase sempre são torpedos De coisas que deixam triste, Atingindo meu coração. Como flecha tão afiada as horas passam E os parafusos são arrancados do esconderijo Pela ferramenta de metal. Tudo se modifica ao meu redor. Somente eu sou o mesmo desavisado. Meus desvarios São como carros sobre o asfalto, Caminhando de súbito ao vazio, Querendo passar ainda pelo sinal verde. 05/07/2001

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A BELA DO MANGABEIRAS A bela do Mangabeiras Tem olhos azuis penetrantes Luzes, puro diamante Que maltratam os castanhos meus Seu vestido é branco e bordado Tem o céu aos seus pés e o vento Tanto pisa nos meus pensamentos E num suspiro diz adeus O vento é seu escravo E de sua beleza Sou Seguindo seus passos eu vou Fugindo da realidade A bela do Mangabeiras Tem em cada sorriso um sentimento Em cada borda do seu indumento Um doce delírio e uma doce saudade Tem lábios da cor do morango E tem medidas perfeitas Suspiros são como seitas Reverenciando a lua Sou dela como o céu e o vento A bela do Mangabeiras Com os seus azuis penetrantes Agora bem mais do que antes É dona dos meus pensamentos 07/07/2001

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VIAGEM PELO CALENDÁRIO Não percebo mas o tempo passa Morosos dias pelo calendário Dictério é o conto dentro do diário Nele se excita mais meu pensamento O desvario no passar das horas É um risco torto de caneta no dia Espelho de dor ou de alegria Reflete as páginas do sentimento Não percebo mas os dias morrem E sempre existe um novo alvor No passo das horas onde eu for Nem dou importância para o calendário Mas na consciência de firme conchavo Passo a computar o passo do tempo Nele se excita mais meu pensamento Como sobre o dia o risco mercenário E sempre lembrando por onde eu for Das viagens feitas nos dias Do contorno das selvas e das serranias Riscados nas páginas da minha história E com o passar dos meses vão se apagando Os primeiros dias que risquei Não eram fortes os riscos que dei Naquela folhinha E hoje só existem na minha memória

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RIO DE LÁGRIMAS Chorei na mais alta montanha Até formar um imenso rio Para levar embora o vazio Que enchia minha vida de nada Chorei na distante montanha Os pingos formaram um leito Espelhavam a dor do meu peito Ferido por flecha afiada E assim nada mais me falta Se já derramei o vazio Naquela montanha alta As ilusões ficaram distantes Depois do outono o estio Em tudo ser melhor que antes 04/07/2001

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A PLATÉIA DE TRIGO Olá! Platéia que me aclama Nessa miscelânea que é meu ato Sou somente o louco que ao morto chama Sou somente o grilo sobre o verde mato Assombroso é o crânio que trago comigo Ser ou não ser é a régia questão Sob seus olhares platéia de trigo Faço o simples ato ganhar emoção Platéia de trigo que me faz plausível Em meu plácido ato sempre autorizado Sob sua crítica do mais alto nível Fico até sem jeito em ser tão aclamado Minha fantasia feita de algodão Encontra o luxo do puro cetim E no texto o louco vem na contramão E cantando alegre em meio ao motim Meu ato teatral é um puro chiste Uma nova loucura é um novo perigo Mesmo a cena pobre em que o ato consiste Sou sempre aplaudido platéia de trigo Termino meu ato e como de costume Agradeço a platéia que me aclama Então vou embora com os vaga-lumes Pois outra platéia de trigo nos chama 02/07/2001

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FLERTE Meu rosto é como O capim malvado que surgiu no campo Conheceu a rosa e a cobriu de encanto Que morreu cortado e a deixou chorando Nem minhas lembranças apagam o espanto Sou como andorinha de asa quebrada O papel rasgado da carta fechada Como boi errante que vai caminhando Nem verso ou canto devolve a esperança Aos olhos tão mortos de uma triste bela Deixei em pedaços o coração dela E a luz de seus olhos vi se apagando Deixei em pedaços o coração dela Cada ruga é marca de um dia chorado Nem mesmo assim me sinto culpado Porque não sabia que estava amando Como capim que morreu no campo Só arrependo em ter visto morrer A rosa das ruas tentando dizer Que era uma rosa doente e murchando Faltava amor para sobreviver A rosa carente que vivia sofrendo Que pelos caminhos foi se desfazendo Morreu um dia e me deixou chamando Meu corpo é como O capim malvado, filho e irmão do mato Que morreu no campo quando foi cortado E deixou nos cantos a rosa chorando 05/07/2001

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CISCO NOS OLHOS Esse cisco que fechou meus olhos Veio guiado pelas mãos do destino Nos braços do vento sorrindo E encontrou os olhos meus Os que antes viam beldades Os meus dois que viam montes Poentes e auroras no horizonte Às belas visões deram adeus Por tempos olhando uma folha em branco Aos olhos o cisco fechos Na face uma lágrima rolou E cego por tempos vivi - e quase um riso acordou minha dor - Não vi o sorriso da morena Só dois passos, uma cantilena Não tinha mais motivos para rir Num assopro de pura esperança O cisco se foi dos meus olhos Voltei a enxergar entre os molhos O brinco que a vida perdeu Revi os montes tão belos E a mágica cética do poente Tanto o lírio como o alvor nascente São valentes como os olhos meus Cisco que fechou os olhos Tinha nome Desespero 03/07/2001

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AMOR PLATÔNICO Muito mais bonita que a lua cheia A sua boca é como sol do estio Rubor dos seios, seu olhar é frio Inspeciona as ondas escondendo a areia Ái de mim que fui amar Aquela moça tem tanto charme Parece uma estrela brilhando no céu A flor do jasmim que tem perfume e mel Rubor dos seios, seu sorriso é doce E quero ela pra mim Como eu gosto dessa moça Imaginem como eu gosto Devem saber do infinito Aquilo que sinto por ela Dá vontade de sonhar Antes mesmo de dormir Sou um garoto apaixonado Imaginem como eu quero Longe dela tanto espero Vida, que vem do seu riso Amor, ela é o meu paraíso Rubor dos seios, o seu beijo é bom O seu corpo é como o mar, e que mar Como eu gosto de amar (até nas letras das palavras) Hei de ser o seu amor pra sempre Ái de mim, vai ser só de adolescente 23/01/2002

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O POMBO DA PRAÇA SETE Uma chuva que levantou poeira dourada Iluminou o céu de minha cidade Era tarde, chovia demais Jogado no canto feito um traste velho Vi o pobre bicho coberto de receios, arrulhos O peguei nos braços e levei embora Era tarde, chovia demais Com o passar das horas A caixa onde o coloquei Foi ficando cada vez menor Para aquele pombo das ruas Que por algum motivo ficou fraco Ou talvez não achou esconderijo Era dia, não chovia mais Eu vi o pombo ir embora depois de tomar café Revoou, voou Deixando uma pena na caixa A caixa estava aquecida E a pena era um bilhete de adeus Já era dia, não chovia mais Em arrulho aflito voltou para a praça A praça onde mora No meio dos carros e poluição O pombo voava junto com outros Anunciou seu retorno à sua casa Com um som de gratidão pela vida continuada Talvez por saudade de casa Ou talvez alívio, ou talvez nada disso Um simples arrulho ecoou no ar 17/07/2001

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A RAINHA E O PLEBEU Doce, doce Viviane doce Ah! Quem me dera fosse O sol do triste dia meu No poente, pai da tardezinha Lembro minha doce rainha Lamenta o coração plebeu É triste o albor da alvorada Porque trás a lembrança da amada Do mundo eu tenho ciúme Bela, bela Viviane bela Linda flor da primavera Guardadora do melhor perfume Meiga, meiga Viviane meiga Se ela é pão quero ser a manteiga Se ela é rima quero ser poesia Ela é rainha e eu sou plebeu Mas quero ter nos braços meus E ser feliz ao menos um dia É triste mantê-la na mente Num suspiro sentir ausente Num piscar o adeus do tempo É uma flecha na lembrança minha Sou plebeu dessa linda rainha Que reina nos meus pensamentos 18/06/2001 Viviane foi um pedaço de minha adolescência que marcou muito!

Era uma garota tão especial que lembro do seu rosto até hoje. Era mais velha que eu, acho que um ano, tinha a pele clara, cabelos lisos, bem negros, com mechas tingidas de loiro na parte frontal. Era baixinha e tinha os traços do rosto bem finos, um jeito meigo de menina, tanta beleza!

Eu não tinha experiência com mulheres, na verdade tudo isso aconteceu anos atrás, entre 1995 e 1997. Depois disso ela foi estudar em outra escola, lá no Abgar Renault, acho que é assim que se escreve. Então depois de vê-la algumas vezes saindo daquela escola, nunca mais a vi.

Uma vez fiquei imaginando como seria roubar um beijo dela, que tanto quis naqueles dias. Na verdade ela foi o grande amor da minha

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adolescência, mas eu nunca dei sequer um beijo, só olhares tímidos, só. Por vezes até pensei que ela poderia ter aparecido na minha vida uns dois anos depois. Quando eu me mudei de escola eu era somente um garoto da quarta série, não sabia muito dessas coisas de beijo ou namoro, oras, onze anos.

Saudosos dias de adolescência, o início da adolescência! Depois tudo que eu pude guardar da Viviane foram alguns versinhos e sua fisionomia. Sei que jamais haverá no mundo uma mecha dourada tão bela quanto a que ela possuía! Nem a natureza nem a ciência podem moldar uma maravilha tão perfeita assim!

Ela deixou uma forte cicatriz em meus pensamentos! Grande parte da minha solidão ao escrever, e que pretendo consumir com o passar do tempo, vem do vazio que ela deixou em mim, talvez até mais que isso.

Quando eu tinha comprado a minha bicicleta, eu gostava de passear na orla da Lagoa da Pampulha nos sábados. Eu sempre passava pela rua onde ela morava, na Palestina, mas só pude vê-la duas vezes. Ela deveria estar indo trabalhar.

Hoje nem tenho mais notícias dela, já não a vejo há uns cinco anos, mas desejo que esteja bem e feliz onde quer que esteja, e que sua vida seja completa com a felicidade que naquele tempo sonhei em oferecer mas...

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NAVEGANTE DOS MARES Sou somente um marinheiro tolo Vagando só neste mar sombrio Se tivesse asas recortava os ares Se tivesse escamas recortava o rio Minha tolice é viver sozinho Convivendo só nesse mar de sonho Se tivesse nave recortava o espaço Se fosse de vento recortava o sonho Minha vida é viver vagando Solitário nesse mar silente Se fosse a lua recortava a noite Se eu fosse o sonho recortava a mente O meu barco vaga comigo Noites e dias por onde eu for Se eu fosse o brado recortava o medo Se eu fosse o sol desvendava o alvor Mas sou somente o marinheiro O solitário navegante dos mares (o meu nem águas tem) Se tivesse asas recortava o vento E se fosse a brisa recortava os vales 05/07/2001

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MISTERIOSA Quem é essa mulher que me olha E rebola Com a brisa Tem no olhar uma luz Que aos meus dois seduz Traz ao corpo a vontade De amor De amizade Ái de mim Quem é essa mulher tão bonita Diz quem é Estou querendo saber Cada dia quero mais o seu beijo É razão de meu maior desejo Coração não ignora Ao contrário se enche De paixão Corpo chora Sem lágrimas, só de saudade Diz quem é essa senhora Ái de mim Coração se agita Bate forte Quero amor dessa menina Que tomou meu coração Que não se cansa de viver essa ilusão 06/03/2002

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A PIPA DE GEORGETOWN Eu fiz uma pipa vermelha Contornada de azul anil Empinei a pipa no espaço E bem alto a pipa subiu Bem mais alto quis empinar E para o espaço a pipa rumou A pipa no alto sumiu E somente barbante restou Não pôde agüentar a corda Então percebi num momento Dizendo adeus ela foi-se Rodando nas asas do vento Como peixe escapou do anzol Desertora fugiu do Brasil Caiu em Georgetown Minha pipa vermelha e anil Coroada foi por criança Um presente vindo do céu Varetas e cola e laços Em tão colorido papel Um dia soltaram a pipa E a vi lá no céu estrangeiro Soberana luz rubra no espaço Mas de espírito azul, brasileiro No espaço reinou até então Pelo bico da águia foi cortada Minha pipa queria ser livre Mas viveu toda a vida amarrada 03/07/2001

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PLANTADOR O galo estava cantando Apressei em levantar do meu leito Não poderia perder a hora Vou embora Outra vez lá pro campo Semear o arroz na terra Com as mãos, a esperança e a enxada Se não chover nasce nada Morrerá a plantação Como no mês passado morreu o trigo Com meu santo sempre brigo Esbravejo na oração Mas esperançoso sigo adiante Sem lembrar do fracasso de antes E do sono que deixo em meu leito Ou do galo cantando bem cedo Abro a porteira, e passo O vira-lata é meu companheiro Tristes vemos o cajueiro Sem um fruto ou folha vivendo Nós dois atravessamos o pasto Boiada magra nele pastando O vira-lata vai na frente saltando Atrás da borboleta que voa No fim do dia à luz do poente Voltamos ao pobre casebre Eu levando a velha enxada E o cão, um faminto latido Há um ano que não chove 10/08/2001

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OS MARES DE MINHA TERRA Olhei os mares de minha terra Dessa muralha distante das praias, Dessa montanha distante das saias Que cobrem os biquínis das moças. Nos mares vi o azul do céu E meus olhos ficaram azuis. No sopé dessa montanha a luz Do corpo bronzeado das morenas. Olhei as ilhas de minha terra, Olhei-as, tão distante delas, Cruzadas pelas altas velas Dos barcos lá no mar azul. Dessa muralha distante dos mares Sentir vir no vento a maresia, E o perfume bom de fim do dia Subiu a montanha escalando. No topo dessa montanha Vi a noite nos mares de minha terra. Fiz sombra no dia que se encerra E nos mares formou minha sombra. 04/07/2001

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A LUZ DO LAMPIÃO Já era tarde quando retornei A casa adormecia em completa escuridão Fiz menção de acender as luzes Mas num clima de puro descontentamento Por causa de emprego de novo Deixei as luzes apagadas E acendi somente o lampião Todas as minhas células deitaram Sobre a cama que rugiu com o desabamento Procurei pegar no sono Mas me pus a pensar Somente minhas células dormiram Deixando os pensamentos acesos A luz despertou fantasia Libertou fantasmas do lampião Fiz menção de adormecer, sonhar Mas a luz me acordava sempre Somente meu corpo dormia Minha alma e minha mente não Até que se apagou repentinamente E também me deixou adormecer Esquecimento O corpo despertou do sono Forças não Já havia ausência Só as células haviam dormido 08/07/2001

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FORRÓ NA ROÇA Estou afim de me mudar Descobrir o mundo afora Assassinar minhas tristezas E a solidão que me apavora Dessas ruas vou embora Para os campos sertanejos Lembranças serão lampejos Da vida que vivo agora Quero ver forró na roça E o casamento na quadrilha Esquecer as faces nos jornais E a ‘urbanidade’ que humilha Vou rabiscar o arranha-céu Com a pena das lembranças Quero esquecer as águas turvas E rumar para águas mansas Quero ver forró na roça Sem lembranças da cidade Que a seringueira consuma o rabisco O qual me faz sentir saudade No forró alegremente Vou viver dias contentes Pensamentos serão verdades Verdades nos olhos meus Mas se um dia der vontade De seguir novos caminhos - sou errante - vou sozinho Sigo, e digo adeus 13/07/2001

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SODOMA Saudações ao rei de Sodoma O reino do latrocínio Cidade que vive no coma Amaldiçoado domínio Morada dos larápios Sodoma, a cidade do caos Sodoma, a cidade sem leis Sem adjetivos pátrios Sodoma, o reino do medo É quem exporta a cocaína Sodoma, a cidade do rei Importadora de maldade Pelos meninos e meninas A cidade das tensões Sodoma, a cidade da maconha O reino da crueldade Ao rei de Sodoma Saudações Em Sodoma você compra tudo Vende o seu corpo E por um preço generoso a sua alma Em Sodoma o profeta é cego e mudo Não existe ensinamento Dentro das muralhas de Sodoma Sodoma é o reino do prazer Sodoma, os portais da injustiça Sodoma, a cidade do esquecimento Um vazio inconseqüente no mapa Cidade, a Sodoma que mata Ao rei de Sodoma, o dia Se é que sabe o que é clarão Sodoma, reino da rebeldia Onde a voz dos homens é ouro Sodoma, cidade dos ingratos Cidade, a Sodoma dos larápios Sodoma, abrigo para os loucos Eu nunca vi a flor de Sodoma

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Sodoma, a cidade que vive no coma Em Sodoma tudo tem seu preço Se você tem dinheiro tem vidas Cidade, a Sodoma das perdidas Sodoma, o reino do horror Sodoma, a cidade dos injustos O reino onde os homens são comprados Sodoma, a pocilga do planeta Terra O reino onde se compra o amor Cidade, casa dos infortunados Amaldiçoado domínio O reino, a Sodoma do assassínio Dizem que há obra de arte em Sodoma Mas não dá para apreciar A Sodoma, o reino e a cidade do coma Sodoma, sem sol e sem luar 09/07/2001

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POEMA DE TODOS OS AMORES Eu escrevi um dia Um poema de todos os amores Nele estavam todos os desejos Toda a felicidade a dois E também todas as dores O poema de todos os amores Tinha versos rimando com mel Decassílabos que imitavam beijos As estrofes pareciam abraços Recitadas coloriam o céu Cada verso tão bonito Era um novo prazer Cada sílaba provocava o fogo Cada letra era um beijo molhado Cada morte um renascer Eu escrevi um dia Um poema como outro qualquer Um poema de todos os amores Íntimo, lido por muitos De um homem para uma mulher Não sei por que era tão doce O poema de todos os amores Incitava todo mundo a amar Privava dos desencontros Mas fiquei sozinho Eu escrevi um dia Um poema mágico Nem magia soube explicar Com ele várias guerras acabaram E os amantes voltaram a amar Um dia o papel dourado Onde escrevi o poema sábio Negado por quem importava Foi levado pelo vento Caindo das minhas mãos

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Tentei escrever novas rimas Inspirar nas flores Mudar o modo de amar Tentei proclamar a saudade Mas nada inspirava mais Que esperar a aceitação Eu escrevi um dia Belo, tanto quanto um hino Uma alabarda que furou corações Flechou amores Fez reconciliar Grito de alegria que calou as dores Dos velhos, dos moços e dos meninos E levado pelo vento Não voltará as palavras Aquele poema bonito Que fez todos amarem E eu continuar infeliz Poema de sonhos somente Hoje mora no fundo do mar 03/07/2001

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O FIO DE CABELO LOURO Um fio de cabelo dourado Trouxe-me lembrança e saudade Pois hoje encontrei no bolso De um casaco que não uso há muito tempo Tentei não pensar no passado Tentei desfazer do dourado Tentei deixar tudo de lado Infelizmente não consegui O fio de cabelo era dela A mesma das mechas douradas Aquela que é minha inspiração A curva das minhas estradas Tentei não lembrar dela Lancei pela janela Tentei pensar em outras coisas Infelizmente não consegui E o vento, malvado e insolente Trouxe o dourado de volta Então não resisti em lembrar Também, não conseguiria No dourado o mesmo perfume Do alegre alecrim do campo E da brisa nos jardins florido Da terra recém molhada Do corpo lavado com sabonete O mesmo cheiro De esperança e de passado O aroma gelado De saudade e de tristeza Esse louro brilhava demais Tornando mais difícil para mim Distanciar os olhos O mesmo louro Lembrou-me dos passos dela O mesmo louro Lembrou-me do seu sorriso

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Se não bastasse tudo isso Lembrou-me do seu olhar Por tempos me perseguiu Essa lembrança No fio de cabelo daquela garota Tentei não pensar no passado Tentei desfazer do dourado Tentei deixar tudo de lado Infelizmente não consegui 07/07/2001

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BOLINHAS DE SABÃO Nos campos aqui nos vales Vejo borboletas voando E o canto da natureza Trinca-ferro e sabiá cantando E também me emociona Brincar com os meus amigos Lá bem pertinho do rio As bolinhas de sabão Risonhas Auriverde, rubra, anil São bolinhas que cruzam o campo Tão brilhantes quanto o beija-flor São perfumes de sabão cheiroso Recheadas de amor Em volta de uma rosa branca Onde a borboleta azul descansa Passa colorida bolinha Criação de uma criança Vejo o azulão voando É azul a bolinha que o segue Para ser livre como esta bolinha Basta que à brincadeira se entregue As borboletas voando nos campos São espelhos das belas bolinhas Lá na frente uma toda amarela Envergonhada e voando sozinha Faço uma bolinha bela e colorida E o vento leva embora Atravessa os galhos da árvore Onde o famoso joão-de-barro mora Sempre uma bolinha tem mais cor que outra Nestes campos, perto dos vales E cada uma é um desejo Que voa longe e recorta os ares

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Quando uma bolinha estoura Tocando o mato ou no ar voando Nasce uma flor perfumada E o sabiá fica cantando E o canto do trinca-ferro E o canto do sabiá São privilégios do campo Dos homens que vivem por lá É este o bem que emociona Cura para a depressão Brincar como as crianças brincam Fazer bolinhas de sabão No campo, pertinho dos vales Com o dia já se acabando Vejo o que sobrou da festa Uma solitária bolinha voando 03/07/2001

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DA PAIXÃO Por amor a uma mulher Desisti de muitos sonhos Por amor a uma mulher Ciúme forte despertei Doentio e sem cura Só por esse amor vivi Por amor a uma mulher Me entreguei E então de amor por ela Eu morri 13/12/2001

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PODERES Eles se apegam aos bens materiais Beijam objetos de ouro Tesouros ilusórios nada mais Esquecem da humildade E dos verdadeiros tesouros São comprados por jóias brilhantes E seguem caminhos errados Tornam-se amantes da luxúria Errantes nas veredas da verdade Aprisionados pelo poderio Levados pela intenção de ganhar Pela pretensão de vencer Sempre em busca de mais poder Fazem a alma chorar Com o muito que tendem a perder Eles se apegam aos bens materiais Abraçam esmeralda e diamante Tesouros Sonham com os tais Bens irrisórios Poderes a mais Que os aprisionam e os fazem de amantes 29/04/2001

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O BRASILEIRO E OS GRINGOS Foi em uma roda de cerveja comum, Sete amigos batendo um papo muito tranqüilo! Aquele bar estilo “copo sujo” que está sempre vazio... Um francês, um americano, um japonês, Um alemão, um inglês e um brasileiro... Ah, e tinha um escocês de kilt. Um tirando onda com a cara do outro. Cada um falando sobre a sua terra. Cada um contando a sua história. O dono do bar observava de longe. O francês pra lá de Bagdá: - meu país tem melhor perfume! Meu país matou Mururoa. Meu país tem mulher elegante! Meu país tem povo culto! Meu país tem Torre Eifel, Alta e grande até o céu E tem Zinedine Zidane... O americano rebateu: - mas meu país tem Hollywood E meu país tem velho oeste. Teve a guerra da Secessão, E hoje tem muita paz! Meu país tem foguete. Meu país tem crocodilo. Meu país tem San Francisco, Arizona e Nova York. Meu país tem basquetebol, Tem monte Rush more E tem Mike Tyson. Naquela descontração total No início de uma nova rodada O japonês soltou a fala: - meu país tem caratê. Meu país tem trem-bala né. Povo japonês é o mais inteligente! Meu país tem Tókio.

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Tem praia com telhado. Tem robô igual gente né? O alemão após virar o copo Replicou com o japonês: - Alemanha fez Adolf Ritler. Alemanha é industrial. Tem florestas de pedra. Alemanha é tri-campeã. Alemanha tem muito dinheiro. - garçom! Mais uma rodada aqui pra gente! - Inglaterra tem relógio Big Bang. Titanic é de Liverpool. Beatles é made in England. Inglaterra tem praças e parques. Meu país tem história de guerra. Meu pais tem a guarda da rainha. - garçom! Mais uma rodada aqui pra gente! - mas em compensação... O Brasil é o país do carnaval! O Brasil é o país do futebol... Brasil tetra-campeão. Se não bastasse tudo isso É a terra do rei Pelé E onde nasceu o demônio da copa Vossa malandragem Mane Garrincha. Meu país tem praia cheia de mulher. Meu país é o Brasil da capoeira. Terra do Caprichoso e do Garantido. Tem o Pão-de Açúcar e Corcovado. Tem floresta amazônica. Tem o chupa cabras. Tem o ET de Varginha. Tem o saci-pererê. Tem parte de Fox do Iguaçu. Meu país tem São Paulo, Um país dentro do outro, Grande centro industrial, Engarrafamento...

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Se não bastasse tudo isso São Paulo é a terra da garoa. - garçom! Mais uma rodada pra gente! Essas palavras eram como sinos para o dono do bar. Todos viram Que o brasileiro contou mais vantagem Então foi todo mundo pra cima dele. Fizeram logo uma aposta E o brasileiro topou. Se eles dissessem Algum coisa que no Brasil não tivesse O brasileiro pagaria a conta, E se tudo que eles dissessem Tivesse no Brasil Eles pagariam... - garçom! Mais uma rodada pra gente! - no meu país tem grande guerra! - o Brasil tem domingão no estádio. - meu país tem Mister M. - meu país tem Nicolau (lalau) dos Santos Neto. - meu país tem time de futebol milionário. - o Brasil exporta jogador pra lá e são eles que ganham os milhões. - garçom! Mais uma rodada pra gente! O escocês permanecia o tempo todo no seu canto E só dizia essas palavras... Os gringos gastando sua munição, Pediram ajuda para o escocês: - e você? Não diz nada? - é, fala alguma coisa. - não disse nada o tempo todo. - só quer saber de beber. - dá uma ajuda. O escocês com os olhos virados Levantou-se, pisou forte no chão... E caiu logo em seguida. Olhou para o brasileiro e disse: - no Brasil não tem homem de saia.

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- ahá! Boa! Obrigado amigo escocês! Quando o escocês se levantou disse: - garçom! Traz a saideira que o amigo aqui vai pagar. Nisso o alemão completou: - traz rodada dupla que o nosso amigo brasileiro está pagando. Risos, todos riram... O brasileiro já se dava por vencido... Aspirava ao gosto trágico da derrota Mas de longe o dono do bar Vendo que estavam gastando barbaridade Correu até a cozinha e disse para a cozinheira: - tira a roupa. Ela era um verdadeiro canhão E logo fez o que ele pediu Achando que seria dessa vez. - obrigado! Passa pra cá. -garçom! Que houve com essa bebida? - prontinho rapazes! O tira-gosto é por conta da casa. O espanto foi geral na mesa. O brasileiro já preparado para pagar Guardou rapidamente a carteira. O escocês chamou o dono do bar De gostosas. O japonês ficou com olho arregalado. O brasileiro disse: - tem também. Terminando aquela rodada O brasileiro disse: - garçom! Mais uma rodada pra gente, Aproveita e traz a conta Que meus companheiros estão pagando. Em uma virada de copo o brasileiro Esvaziou o copo e saiu caminhando sorridente

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Após se despedir dos amigos. O dono do bar Tinha nos olhos uma expressão incontestável de felicidade Parecia bêbado também Olhava a grande quantidade de garrafas de cerveja Ficou imaginando coisas, Ficou sonhando acordado... E os gringos conversavam: - xi rapazes, eu esqueci a carteira. - calma! Nós te emprestamos, Depois você nos paga. - puxa! - que foi? - eu também esqueci a minha. - puxa! Eu também. - nem olhem para mim, Como eu ia guardar no kilt? Aproveitando a distração Da cozinheira limpando os talheres E o dono do bar Olhando com cara de besta Os primeiros três saíram de fininho... Os outros três pelo outro lado, Mesmo cambaleando. Depois de um tempo veio a cozinheira. Viu a mesa cheia de garrafas, Pensou que o dinheiro estava lá. Mas só estava a conta. Correu até a esquina Mas não encontrou ninguém. Então voltando pensou em contar ao patrão Que levaram um calote a nível internacional Quando ele despertasse de seu sono acordado. 06/07/2001

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CARTOMANTE Venha aqui garotinha Deixe-me ler sua mão Deixe-me ver seu destino Traçado no seu coração Por sua menor moeda Posso ver o seu destino Qual o nome do menino Que vai vir te namorar Venha aqui garotinha Não tenha medo da verdade Ela é sua companheira Não tema a realidade Por sua mínima atenção E alguns minutos do seu dia Posso ver o seu futuro E ter a sua companhia Venha aqui garotinha Deixe-me ler sua mão Deixe-me ver seu destino Traçado no seu coração 03/05/2001

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FLORA Flora, flora, flora, ora... Que floresce no meu coração Flora, flora, flora, flora É o meu vergel de paixão Flora, flora, flora, ora... Rubra flora que belezas revela Flora verde, branca flora Que em meu coração martela Flora, flora, flora, ora... Rosa flora, pura, libidinosa Flora, flora, flora, flora De encantos, maravilhosa Flora, flora, flora, flor Flora roxa, flora anil Flora, flor, florida em cor Que faz meu coração febril Flora, flora, flora, amada Vergel de bom perfume e cor Flora, das abelhas namorada... Flora, que me lembra meu amor 30/04/2001

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TERRA É onde adormece a flor alva de louros cachos cujo perfume conta a

história das virgens calêndulas. A mata e o trigo como um verde albino, insultam o orvalho da palmeira silvestre. Quando o joão-de-barro chora, ignora também o palmeirense roble.

É de onde partiu jangada rumo ao mar de cortesia, jandaia voou sobre o coqueiro. Na regata sinos doces anunciavam a visita das estrelas do Cruzeiro-do-sul. Nos galões litros de vinho e nas águas letras de saudade. Conta história o pescador.

Deita-se sobre a terra o riso como chuva sobre o clamor do povo e molha a terra semeada de moedas, quais crescerão como árvores de tesouro. Faz tremerem ventos beijo dos sorrateiros namorados no véu de ouro, qual molhado e açucarado pelas carícias do plenilúnio. Mexe com as emoções do povo a arte como póstero grande momento e como turvas águas passadas.

Meu bebê que nasceu ontem já cultua a cerimônia local, que em ginga, ritmo e som, faz lembrar a água-viva do mar. Já pensa em servir ao Exército o rebento, e quer comprar uma motocicleta.

É onde desabrocha a rubra flor de louros olhos cujos lábios são rubor quando beijados. Mais que história a terra traz o aeronauta orvalho que escapou de um tombo ao se agarrar em seus braços cor de mata. Até o sonho e a realidade caminham juntos, por que então seriam separados o amor e paz?

A palmeira ri ao pueril insulto da mata e do trigo, como um velhote acha graça de uma criança esbravejando.

Nada se compara à cortesia do mar, que levou para o horizonte os navegantes. Mesmo a lua e as estrelas não foram o bastante para impedir que os piratas se matassem de tanto beber do álcool incendiário.

É onde rui aos poucos a milenar construção de pedra. Nada se compara ao esbravejo do fumacê cortador do campo. Acho minha rua a melhor do bairro, meu bairro o melhor da cidade,

minha cidade a melhor do estado, meu estado o melhor do país e meu país o melhor do mundo.

É onde rola a bola e rola um beijo, mesmo fúnebre e sem ter carícia, mesmo rouco sem ter amor.

Nada se compara ao capitalismo que levou para longe o bem-querer e trouxe para perto o bem lucrar.

É rico o som da bateria no morro, mesmo tolo em um simples amor de carnaval, qual desejo carnal é pelo próprio homem e vale a pena. Se o carnaval tem várias cores, tem o samba o verde e o rosa.

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É onde vai morrendo aos poucos o vermelho braço atlântico, que segura o esverdeado buquê que leva o nome nativo de minha terra. As brasas não ficarão, e o que é brasil será apenas nome.

Mesmo uma briga ou uma festa recolhem observações curiosas. Observa-se de soslaio para não agravar.

Todo quintal de terra tem sua moitinha de arbusto e seu formigueiro de cortadeiras. Mesmo que a terra arde, sem água, no campo nordeste, tem por povo um seresteiro e seu jumento magro que não prova de um mato verde há vários meses, como conseqüência do estio dourado.

É onde sorri a rosa mulata de alvos brincos, cuja formosura lembra a carnavalesca festa nativa do povo. Toda a história é contada pelos livros, mas não narram as páginas o caso, que é vivência de cada homem e se conta numa prova em qualquer lugar, em qualquer hora, bastando para isso uma saudação e o encontro com os amigos.

Mesmo o berço de ouro não oferece total segurança para seu pupilo, o qual necessita crescer como um guerreiro ou comediante, ou para enfrentar as dificuldades, ou rir delas.

Mesmo a mais comprida das saias não é o bastante para reprimir a libido, qual me mata quando caminha, moça que é dona do traje.

Não acreditamos na palavra alheia sem provas concretas. É de onde partiu Dumont rumo aos céus, o navegante. Até o céu é

um rio, pois também excita a cortês liberdade. Na cultura muitos mitos e muitos gritos pela estrada. Nada se

compara à solidão do caminhoneiro. Muitos bandidos de terra à beira da estrada. Triste rodovia onde morreu o burrico atropelado!

É onde ama a loura rosa aos loucos lírios que em desejo se comparam à força das águas silvestres lavando o oceano. Se uma paixão ardeu, arde ferida ou brilha um forte riso de amor.

Abraça o sonho do homem um choro perdido no meio da madrugada que o leva a sofrer por algum tempo em sua vida campineira. Carpinteiro também dorme, mesmo sobre o pobre colchão que o protege.

Meu bebê que nasceu ontem já aprendeu a pilotar avião. Quer comprar um barraco na favela e sair à procura de liberdade, bem longe das asas protetoras do pai.

Nada se compara ao gostoso aroma do grão torrado que minha terra exporta em grande escala. Até um sino de som doce não é mais gostoso que o mel gelado da cana.

Precede a próxima hora um brinde em taças de apurado cristal ou humilde caneca de barro, mas precede.

Na cultura muitos mitos e muitos gritos pelas calçadas. Nada se compara à solidão dos mendigos e excluídos. Muitos bandidos de petróleo à beira das ruas. Triste alameda onde morreu o vira-lata atropelado.

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É onde cada um parece tolo, talvez por não serem conhecidos, chegados. Acho minha família a melhor do mundo, a família dos meus vizinhos a segunda melhor, a família de meus conterrâneos a terceira melhor, as famílias da América do sul as melhores do mundo.

É onde rui aos poucos a milenar construção de pedra. Na cultura muitos mitos e muitos gritos em todas as casas. Nada se

compara à algazarra da festa ou da briga. Eles se dedicam a tudo. Muitos bandidos de sentimento e muitos fantasmas do cotidiano

fúnebre e cinza que o tempo leva embora enterrado na insatisfeita e irrealizada lembrança.

Triste berço onde morreu o último gole de veneno que matou a moça. Era o campo e lá amar não se permitia, só a vontade paterna.

Mesmo os que são tristes dão risada um dia em seu sobrado, casebre miserável!

Nada se compara ao esbravejo do fumacê cortador da cidade! Quando ele passa as crianças olham da janela do coletivo. É bonito!

É onde cortam as narinas do pulmão do mundo. Braço forte da palmeira, que dá nome à livre donzela sobre o puro-sangue, amazona.

É onde não faltam pães – graças a Deus – mas sobram bocas famintas pelos cantos – graças ao homem – a elite se farta com os melhores frutos.

É onde os ismos denominam cada mania tola apadrinhada por sua época.

Nada se compara à cortesia das flores que atraem com delicioso perfume e beleza. É onde adormece junto à roseira, a flor alva de louros cachos cujo perfume conta a história das calêndulas nubentes e desposadas. A mata e o trigo, como um cinza albino choram como o joão-de-barro chora. Mesmo a pródiga natureza não reitera em mesma hora o bem perdido nas cinzas da avareza. O palito de fósforo era madeira na árvore ignorada e foi usado para matar sua genitora real, palmeira.

É cortês o luar da praia e o sol ardente bronzeador de musas deslumbrantes. Mesmo o rio é frio como a noite e mesmo a noite fria como o mel da cana-de-acúcar.

Nada se compara à frieza e cafagestagem da corrupção que o rege. Mesmo um que é bom não é bastante contra uma legião de canalhas.

Lá salta e sorri na mata após o fogo o mico-leão-dourado, que é somente um cisco na paisagem verde que renasce depois das cinzas. Uma pena que morreram muitos, nascem poucos e sobrevivem menos.

Flui na terra como doces gotas de petróleo a água azulada que mata a sede ou deveria, pois se perde nos caminhos das artérias da terra sob o campo nordeste. Algo que causa pavor no povo: o clarão ensolarado da aurora, sem um mísero milímetro cúbico de água respingando como choro de nuvem do céu.

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Na cidade alta a triste alegria dos drogados quando acaba o dinheiro. Meu bebê que nasceu ontem já ganhou o prêmio Nobel dos loucos e

já publicou seu primeiro livro de insultos. Chora o candeeiro ao som da quinta canção da seresta de Pedro

Leopoldo. Ao sonho do homem um choro perdido que o leva a sofrer por algum

tempo em sua vida campineira. Carpinteiro também dorme, mesmo sobre o pobre colchão que o protege.

É onde ama a loura rosa aos loucos lírios que em desejo se equiparam à felicidade assassina da latrodectus, cujo pai destino deu-lhe o nome de viúva-negra. Se uma paixão roubou as vestes sagradas da sanidade, faz mal não, isso é normal.

É onde sorri a rosa mulata de alvos brincos, cuja formosura lembra a carnavalesca viagem à praia carioca e lá se escuta o enredo da Mangueira.

Nada se compara à cortesia dos bosques onde residem o lobo-guará e o uirapuru!

É onde vai morrendo aos poucos o vermelho braço atlântico, que segura o esverdeado buquê que leva o nome nativo de minha terra.

Na cultura muitos mitos! Nas estradas, gritos! Lá no morro a droga! Na seresta a prosa! E o seresteiro sofrendo no campo nordeste. Cai com certo receio, dente-de-leite do menino, o qual é jogado

sobre a laje de sua casa. Meu bebê que nasceu ontem se casará no mês que vem. É o orgulho

de mim, rebento que nasceu sem ser infante. Puerícia é chorosa demais! Sou suspeito pra falar sobre tudo que já falei. Acho minha rua a

melhor do bairro, o meu bairro o melhor da cidade, a minha cidade a melhor do estado, meu estado o melhor do país e meu país o melhor do mundo.

É onde rui aos poucos a milenar construção de pedra. Alegria! Tristeza! Rebeldia! Malvadeza! Na cidade alta a triste alegria dos drogados quando acaba a droga. Precede a próxima hora um brinde em taças de apurado cristal ou

humilde caneca, mas precede. É onde o eco das vozes faz a pedra oca da montanha cantar e gritar. Cai geada na serra do sul onde as pessoas provam chimarrão. Todas as flores de seu território são felizes, levam as coloridas e

perfumadas o nome de flora.

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Nada se compara ao excessivo patriotismo de seus escribas, que não são pelo papiro. Levam ao topo da montanha em grandeza mesmo um grão de problema, ou festa pródiga, sendo estes nacionais.

É onde adormece a flor alva de louros cachos cujo perfume conta a história das diversas calêndulas em meu país Brasil.

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QUARENTA PASSOS ATÉ O CAMPO 2001 Belo Horizonte, Minas Gerais