qualific guillherme a souza prado uff mar 2015

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PARECER O texto de GUILHERME AUGUSTO SOUZA PRADO, intitulado “Qlínica (sic) com Quê? Acontecimento, Arte e Subjetividade”, apresentado como requisito para Qualificação junto ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), sob orientação do Prof. Dra Leonardo Pinto de Almeida, tem caráter de monólogo e, portanto, baixo teor acadêmico. Esse fato se torna evidente, já de saída, pelo modo desconexo dos subtítulos, que não perfazem um conjunto onde se desenharia uma tese. Os conceitos são baldados através de associações livres que não demonstram seus elos. Os autores convocados para sustentar os problemas comparecem como meros figurantes cujas ideias, aparentemente sob domínio, são amalgamadas de forma aleatória, característica de uma paráfrase privativa. A redação é quase um fluxo de consciência com poucas características partilháveis. Na “Apresentação”, talvez nos únicos parágrafos onde se observa uma requerida linearidade pela qual a tese seria atestada, temos o tripé que supostamente a organizaria: loucura-arte-clínica. Desses três elementos, a loucura foi a que recebeu maior atenção, nas 67 páginas do texto, embora o tecido conceitual deixe a desejar. Essa fraqueza, se não resolvida, deixa o conceito de loucura um tanto indefinido, redundando em alguma mistificação. A respeito do segundo elemento do tripé, a arte, por que a mesma teria acesso ou expressaria os devires intensivos da loucura? Não se sabe através do texto o que são devires

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PARECER O texto de GUILHERME AUGUSTO SOUZA PRADO, intitulado Qlnica (sic) com Qu? Acontecimento, Arte e Subjetividade, apresentado como requisito para Qualificao junto ao Programa de Ps-Graduao em Psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), sob orientao do Prof. Dra Leonardo Pinto de Almeida, tem carter de monlogo e, portanto, baixo teor acadmico. Esse fato se torna evidente, j de sada, pelo modo desconexo dos subttulos, que no perfazem um conjunto onde se desenharia uma tese. Os conceitos so baldados atravs de associaes livres que no demonstram seus elos. Os autores convocados para sustentar os problemas comparecem como meros figurantes cujas ideias, aparentemente sob domnio, so amalgamadas de forma aleatria, caracterstica de uma parfrase privativa. A redao quase um fluxo de conscincia com poucas caractersticas partilhveis.Na Apresentao, talvez nos nicos pargrafos onde se observa uma requerida linearidade pela qual a tese seria atestada, temos o trip que supostamente a organizaria: loucura-arte-clnica.Desses trs elementos, a loucura foi a que recebeu maior ateno, nas 67 pginas do texto, embora o tecido conceitual deixe a desejar. Essa fraqueza, se no resolvida, deixa o conceito de loucura um tanto indefinido, redundando em alguma mistificao. A respeito do segundo elemento do trip, a arte, por que a mesma teria acesso ou expressaria os devires intensivos da loucura? No se sabe atravs do texto o que so devires intensivos, apesar de sua repetio incessante. Como no se define o que intensidade, loucura no pode ser vinculada a este termo, nem se explica porque a arte teria a prerrogativa de acess-la. Afinal, de que arte se fala aqui: esttica ou tcnica? Neste caso, a lacuna explicativa tende a estetizar a loucura e o acesso clnico a mesma.O terceiro elemento, a clnica, definido genericamente como manejo de foras intensivas. Mas, como se poderia manejar foras intensivas? Alm de no sabermos o que so foras intensivas, expresso sempre recorrente, propiciatria - tende-se a entender a clnica como uma atividade da ordem da prtica manejo mas o que se discute a respeito dela em todo o texto to somente a questo da escritura e do significante, no sua tcnica. Sendo assim, a pretenso da tese redefinir o trabalho clnico na verdade dependente de um argumento filosofante.Em seguida, a fim de aduzir os aspectos at aqui comentados, farei observaes sobre cada parte do texto, seguindo seus subttulos.1) Apresentao texto sem contornos, magmtico, conceitualmente dispersivo (vide por ex. segundo pargrafo p. 10, que junta Deleuze e Derrida sem qualquer cuidado terminolgico), com pargrafos que raiam o esotrico (vide por exemplo segundo pargrafo p. 3; terceiro pargrafo p. 8). A Apresentao, afinal, no cumpre a esperada funo que de enunciar o problema, a tese e os captulos que preenchem sua resoluo.2) A loucura dentro da razo e a loucura como fora da razo o balizamento dessa parte pelo menos o que prevalece em meio livre associao de ideias - Foucault (experincia trgica) e de Deleuze (Fora) apresenta costuras pouco elaboradas para dar conta de definio de loucura digna de uma tese de doutorado.3) O fora e seus atravessamentos o problema do fora ainda permanece como definidor de loucura, mas sua resoluo conceitual insuficiente (vide associao canhestra e coloquial entre fora e fora de si; pargrafos confusos: segundo e terceiro da p. 23 e terceiro da p. 25). Nesta parte, tambm, os dados empricos (suposta experincia clnica no Caps Lokonaboa) irrompem de forma abrupta, sem que se tenha estabelecido a funo desses exemplos: campo de anlise ou mera ilustrao?; alm de que sua validade documental e arquivista pode ser questionada.4) o niilismo branco no exterior das formas e das foras continua apegado aos mesmos slogans e metforas do fora presentes no subttulo anterior, revistos sobre uma leitura desordenada de Foucault, como o entende Deleuze, cortando abruptamente para um caso do Caps guisa de ilustrao e anlise que no se consumam, novamente denunciando o estatuto indefinido dos dados empricos no texto; pargrafos esotricos: segundo p. 31, terceiro p. 32, primeiro p. 34.5) Sentido e escrita: os estados da alma e o inarticulado subttulo altamente heterogneo, dando continuidade problemtica do fora (loucura), emparelhado com a exterioridade da escritura (Derrida) e a exterioridade do significante (Lacan). Desse amlgama sem definio conceitual passa de forma inadvertida ao sentido como acontecimento segundo Deleuze (Lgica do Sentido). O texto no parece dar-se conta, em sua superficialidade associativa, das grandes dimenses que separam esses conceitos e dos enormes andaimes que seriam necessrios para colocar cada um de p.6) Criao de sentidos e de possveis: o acontecimento permanecendo na lide fusionista e amalgmica, agora mais afeito ao Anti-dipo de Deleuze e Guattari, trata do carter semitico da produo desejante, do papel do agenciamento e procura fazer tudo convergir para certa identidade entre o ato clnico e o ato de criao. Os contedos so apresentados de forma extempornea, sem a pacincia da exposio e dos encaixes lineares. 7) Por fim, para voltar ao conjunto, principalmente nos dois ltimos subttulos a questo da loucura fica em suspenso, relegada a um subtexto que por ventura seria retrospectivamente iluminado.

Concluindo: o texto no foi escrito para ser lido, no h ainda interlocutor. Do ponto de vista do que se espera de um texto de tese a ser qualificado, no se pode ter uma ideia razovel, mesmo que em pequena escala, do produto final. Pode ser que o candidato tenha reais condies de retirar o trabalho desse estgio, mas h um risco evidente de isso no acontecer, em que pese o prazo para a defesa.

UNESP/FCL/Assis 26/03/2015

Hlio Rebello Cardoso Jr