psik_entrando na linguagem

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    Entrando na linguagemEntering in the languagehttp://pepsic.homolog.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1415-71282003000200002&script=sci_arttext

    Telma Corra da Nbrega Queiroz**Psiquiatra, psicanalista, doutora em Psicologia pela Universidade de Paris XIII, professora de PsicologiaMdica da UFPB, membro do Frum Psicanaltico de Joo Pessoa e do Grupo Psicanlise e Pediatria deRecife e Joo Pessoa.

    RESUMO

    A linguagem sobrevm da necessidade de conservar o objeto alm da satisfao danecessidade, sendo, portanto, resultado da atividade pulsional. Nesse processo, o objetoda pulso invocante e o da pulso alimentar se substituem um ao outro. A articulao da

    psicolingstica com a psicanlise ajuda a compreender melhor como isso acontece namedida em que uma observa os comportamentos e a outra supe desejos subjacentes a

    esses comportamentos, revelando que todos os comportamentos do beb so o reflexode sua atividade pulsional e de sua entrada progressiva na linguagem. A palavra faz comque os objetos perdurem e que possam ser reconhecidos.

    Palavras-chave: Pulso, Seio, Voz, Desejo, Psicolingstica, Palavra.

    ABSTRACT

    Language arises from the need to maintain the object beyond necessity, thus beingconsequence of drive activity. In this process, the object of the invoking drive and thenourishing drive replaces one another. The articulation of psycholinguistics with

    psychoanalysis helps to understand how this takes place, since the first observesbehaviors and the latter supposes underlying desires to these behaviors, unveiling thatall the baby's behavior is reflection of its drive activity and of its gradual ingress intolanguage. The word allows objects to last and to be recognized.

    Keywords: Drive, Breast, Voice, Desire, Psycholinguistics, Word.

    Quando Lacan nos diz no Seminrio II (1954-5) que todos os objetos no soinfinitamente durveis, que eles podem desaparecer, e que a nomeao que faz comque perdurem e possam ser reconhecidos, ele nos mostra assim que a linguagemsobrevm da necessidade de conservar o objeto alm da satisfao da necessidade, poisde outra maneira ele desapareceria para sempre. Procurar o objeto da falta e tentarrestaurar a perda original a prpria atividade da pulso, e essa atividade que est naorigem da linguagem. A construo da pulso j em si uma construo de linguagem _eu-sujeito/verbo/objeto-mundo externo _, os tempos verbais que exprimem suaatividade conjugam-se sob a forma direta ou reflexiva, a pulso nos introduz nosomente s palavras, mas tambm gramtica. A palavra, portanto, no mais que uma

    atividade da pulso oral, assim como a suco, a mordida e a deglutio, pois a pulso

    http://pepsic.homolog.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1415-71282003000200002&script=sci_arttexthttp://pepsic.homolog.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1415-71282003000200002&script=sci_arttexthttp://pepsic.homolog.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1415-71282003000200002&script=sci_arttexthttp://pepsic.homolog.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1415-71282003000200002&script=sci_arttext
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    oral tem a particularidade de reunir no mesmo rgo, na mesma fonte que a boca, duasfunes diferentes, a funo alimentar e a palavra.

    A pulso constri-se em cima da funo orgnica. Mas desde o incio as necessidades eas funes so regidas pelo significante. A demanda do Outro direciona

    progressivamente a libido da criana para as zonas ergenas, a boca sendo a primeiradelas, a que predomina durante o primeiro ano de vida. O corpo e suas funes soprogressivamente aspirados e subordinados demanda do Outro, o Outro que tambmo lugar do significante.

    Como se manifesta a pulso? A pulso manifesta-se por uma tenso que surge dadescontinuidade inaugurada pelo nascimento. Essa tenso aparece, sobretudo, nofuncionamento dos orifcios, lugares ergenos que fazem com que o essencial doinvestimento dirija-se para a relao oral, ou seja, para a relao ao seio. Freud (1905)chamou esse primeiro momento de fase oral.

    Nesse momento, a permanncia da presena humana e a constncia do rosto so de umaimportncia fundamental para o surgimento da representao e do pensamento, sem oque a criana jamais poderia falar. O ritmo da amamentao introduz a criana naausncia e na falta, ritmo que tambm o jogo de presena/ausncia, que por sua vezfaz sobrevir a representao. A criana comea a falar procurando reproduzir esse ritmo.Essa capacidade de reproduzir estruturas rtmicas seria, alis, condio prvia para aentrada na linguagem, pois o beb se introduz primeiro na msica, no ritmo, nafreqncia e na melodia da palavra antes de chegar ao sentido.

    Freud (1895) descreveu o processo de entrada na linguagem e no simblico, no Projetode psicologia para neurlogos, partindo da construo de um aparelho muitocomplicado, o aparelho psquico, que montado em cima do conceito de pulso, sendoa primeira inscrio fundadora determinada pela primeira experincia de satisfao noseio.

    Por que a atividade pulsional procura conservar o objeto alm da satisfao danecessidade? Freud nos diz, em O mal-estar na civilizao (1929), que a felicidade e aharmonia que os homens procuram, porque alguma coisa lhes falta que os impede deserem felizes. A felicidade seria em princpio reencontrar o objeto que preencheria afalta, o que constitui ao mesmo tempo um paradoxo, pois no mais sentir a falta seria amorte, nada mais teramos a procurar, nada mais se produziria. A felicidade e a

    harmonia so apenas um mito, jamais encontramos o objeto que preenche a falta. Somosassim condenados a procurar objetos substitutivos que nunca nos satisfazeminteiramente, e, entre esses objetos, nos confrontamos com os fonemas e as palavras quenos permitem investir o mundo. As palavras, a fala, so uma maneira encontrada peloshomens de fazerem perdurar o objeto perdido alm de sua ausncia, as palavrassubstituem o seio quando este se perde. Melanie Klein (1952) nos diz que o fato de falare tambm o de andar e o de ficar em p so maneiras de os homens ultrapassarem a

    posio depressiva e compensarem a perda do objeto, to difcil de suportar.

    Mas as palavras s preenchem essa funo quando reenviam a uma experinciasensorial que foi acompanhada por palavras. o que nos diz Franoise Dolto em seu

    livro A imagem inconsciente do corpo (1984). As palavras com as quais pensamos efalamos, as palavras que esto na origem de nossa linguagem so as palavras que

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    acompanharam as imagens do corpo no contato com outrem, palavras que simbolizam,portanto, uma experincia sensorial, o que nos faz compreender como as palavras fazemdurar a presena do Outro em sua ausncia. Para Grard Pommier (1998), a aspirao

    pela ausncia de ser que impele o sujeito a querer falar, a jubilar e a gozar de suapalavra. O sujeito procura encontrar seu ser graas ao amor, graas presena do Outro,

    e a palavra serve para isso, para procurar o Outro, para fazer voltar o Outro ausente. aausncia de ser que faz com que os homens queiram conservar os objetos alm danecessidade, e isso que constitui a atividade pulsional.

    Enfim, podemos dizer que os homens procuram suprir a ausncia de ser pelo amor doOutro, que o amor idealmente o que poderia trazer-lhes a felicidade, e que alinguagem seria apenas uma maneira de pedir o amor do Outro e de procurar afelicidade, uma maneira tambm de fazer durar a presena do outro e de substituir o

    primeiro objeto da experincia de satisfao, o seio, o objeto da nostalgia, que traria denovo o sentimento ocenico. A linguagem j em si mesma demanda de amor e

    presentificao do Outro, so as palavras que nos permitem suportar a perda, com

    palavras que a criana preenche a boca esvaziada do seio.

    Embora a pulso coabite com a funo desde o incio, vamos, no entanto, para guardar aclareza de nossa exposio, passar da funo pulso, e da pulso linguagem. Como aamamentao, a linguagem tambm uma atividade que s surge na intersubjetividade,e nesse processo um e outro dos parceiros implicados se confundem, se pem um nolugar do outro, se transitivam, se renem e se separam.

    Mas uma criana s pode falar se ela est mergulhada num banho de linguagem desde avida intra-uterina. A criana est desde as origens, mergulhada no grande Outro, ela aspirada pelo Outro, lugar da linguagem e lugar do simblico, ela aspirada por essemeio Outro que est presente, sobretudo, nos momentos de cuidados, nos momentos deamamentao. Outro que num primeiro tempo a me, o leite, o seio, de quem a criana totalmente dependente para sua sobrevivncia. Essa dependncia do Outro devido

    prematurao do nascimento prpria do ser humano, Freud chamou Hilflosigkeit (1925-6), o desamparo, o que em termos lacanianos podemos exprimir como falta a ser.

    O meio sonoro intra-uterino constitudo por rudos biolgicos fetais e maternos, mastambm por numerosos rudos externos que chegam at o feto, entre os quais, as vozes.Desde antes do nascimento e mesmo depois, a voz de uma importncia fundamentalna construo do sujeito. Ela o objeto da pulso invocante, incorporada da mesma

    maneira que o alimento, a voz tambm desencadeia movimentos de suco. A pulsoinvocante, diz Alain-Didier Weill (1998), o que impele o corpo a se arrancar de suamaterialidade pesante e que nos pe em movimento para um ponto terceiro, para ogrande Outro, em direo entrada na linguagem e submisso s leis da fala.

    A voz suporte da diferena, pois, nos diz Denis Vasse (1977), nela se encontra amarca particular do sujeito. Mas a voz tambm o suporte da palavra que parte de umsujeito se dirigindo para o Outro e da demanda que ela transmite. a voz da me ou do

    pai, que profere o nome prprio, e tambm pela voz que o sujeito referido ao desejodo Outro. Segundo Franoise Dolto (1984), o recm-nascido s se pode desenvolvernum corpo se ele est em relao com uma voz de homem e de mulher, quer dizer,

    preciso que haja uma outra voz associada com a voz de sua me. O pai aquele que

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    barra a me, que encarna a lei da proibio do incesto e que exerce um poderdinamizante sobre ela.

    A voz mostra-nos ainda que o sujeito ultrapassa seus limites corporais, ela funciona decerta maneira como os tentculos de um polvo que avanam no espao e tocam no

    corpo do outro em todos os seus pontos, ela indica a presena distncia. Podemoscompar-la com a lamnula, o rgo da libido, ela mesmo constituinte desse rgoassim como o seio, o que mostra que o verdadeiro limite do ser do organismo vai bemmais longe do que o corpo. Da mesma maneira que o seio, a voz ectopia de umindivduo sobre outro, portanto, tambm se presta ao corte. Ela tem, alis, o mesmo

    poder erotizante.

    A tenso pulsional, a fome, faz reproduzir no imaginrio do beb, as imagens dosencontros precedentes com a lembrana dos sons desses encontros. A voz da me ,

    portanto, reproduzida na simultaneidade da imagem. Uma das percepes, entre asimultaneidade, uma cor, um som que se repete, a imitao de um movimento, a

    alucinao de um odor, uma palavra que acompanha a imagem do corpo restabeleceimaginariamente o cenrio do encontro com o objeto primordial que est ausente. Uma

    palavra pode assim reativar o trao mnsico inconsciente inscrito no aparelho psquico ereproduzir imaginariamente a experincia de satisfao no somente do seio, mastambm da voz, do olhar e do cheiro. Pela introduo do imaginrio, a lembrana daexperincia passada toma corpo. Esse imaginrio , de sada, marcado pelo simblico,

    pois a reproduo compreende as imagens sonoras das palavras. a prpria voz, ou asimagens sonoras reproduzidas que vo permitir criana esperar o momento dasatisfao e renunciar ao objeto, o que, por sua vez, o levar a fazer lalaes, a pensar ea falar. Por seus sons, ela acredita ouvir novamente sua me, ela a v em imagens,reproduzindo ativamente assim a experincia de satisfao.

    Na voz que fala podemos distinguir o som e o sentido. O som a melodia com o ritmo, a msica da linguagem. Mas a emisso da palavra e dos sons acompanha-se, almdisso, de gestos no somente na pessoa que fala, mas provoca tambm movimentos nocorpo daquele que escuta, da mesma maneira que a prpria msica. Tanto para o feto,quanto para o beb, a voz constitui um estmulo pulsional, que tem um efeitodiretamente no corpo, produzindo variaes dos ritmos fisiolgicos, modificaes datenso muscular, atividades motoras, notadamente atividade de suco, elevao dotnus e aumento da vigilncia, nisso em que se v como a voz toca diretamente o corpo.

    Ningum ignora, alis, os efeitos da palavra e dos sons no corpo dos adultos e das

    crianas. Foi procurando ouvir novamente a voz do outro em sua ausncia que o serhumano inventou os instrumentos musicais, assim como os meios de comunicao distncia. Sabe-se que a msica produz modificaes dinamognicas no corpo,modificaes que so devidas cadncia, ao ritmo e melodia. A msica , sobretudo,o resultado do esforo para reproduzir a voz humana, a voz do outro, a voz da me, queera escutada na simultaneidade do seio. Seus efeitos no corpo do prprio adulto soconhecidos h muito tempo e constituem o fundamento das terapias musicais. Ela agesobre o sistema nervoso e muscular, com elevao ou diminuio do tnus, produo deenergia motora ou abaixamento de tenso, conforme o tipo de msica.

    De um ponto de vista antomo-fisiolgico, as duas atividades do ouvido explicam a

    intimidade do som com os gestos, os movimentos e o ritmo. A primeira a atividadevestibular, que assegura a esttica e a cintica, assim como a posio relativa de cada

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    um dos membros; a outra, a atividade coclear, que diferencia os sons em suas alturastonais, suas qualidades espectrais, em suma, suas composies freqenciais. a ccleaque percebe os sons, enquanto o vestbulo retifica a posio, determinando averticalidade do conjunto do corpo. Considera-se que a msica prepara de certa forma ocorpo e o sistema nervoso para a linguagem, e a linguagem que o esculpe pela

    construo da imagem inconsciente do corpo. E, se essa msica vem da voz que fala nosmomentos de cuidados, ela transmite, alm disso, o desejo e a demanda do Outro, o quefaz com que, mais tarde, a msica sozinha possa trazer a nostalgia que no somente doseio e da voz, mas, sobretudo, do desejo e do encontro com o Outro. A emoo musicalseria assim, de certa maneira, reatualizao da emoo sexual dos encontros primordiaisrecalcados, trazendo memria outras representaes que viriam se superpor da vozda me, percebida no passado na simultaneidade do seio e de seus substitutossucessivos, ao mesmo tempo em que a emoo sentida corporalmente naquelemomento. Se "a msica, essa infortunada, constrangida a se desenvolver no tempo"(Freud, 1910, p. 21; nossa traduo), como a descreve Leonardo da Vinci (citado por J.-B. Pontalis no prefcio de Un souvenir d'enfance de Lonard de Vinci), nos introduz

    sucessividade, a reao corporal entretanto simultnea ao som. Ela provoca, porexemplo, simultaneamente um gesto, um movimento, a alterao de um ritmo corporal,ou um passo de dana, como nos lembra Alain-Didier Weill (1998). A harmonia, poroutro lado, ou seja, a maneira pela qual os sons combinam-se em acordes, nos reenvia simultaneidade. A melodia e o ritmo, em seu desenrolar no tempo, nos introduzem sucessividade, embora no ainda ao sentido, pois no preciso esperar a ltima palavra

    para compreender, o efeito simultneo. A msica a nica linguagem, nos diz Alain-Didier Weill (1998), que permite o encontro imediato, absoluto.

    Essa primeira etapa na construo da subjetividade lembra-nos o cinema mudo, que,com efeito, no era inteiramente mudo, era cinema musical, pois o filme era sempreacompanhado por uma msica que sugeria o sentido dos movimentos que sedesenrolavam na tela, a msica era assim puro significante, que podia se prender aossignificados de cada um. As msicas que acompanhavam as cenas sugeriam dilogos,

    perseguies, com acelerao ou lentificao dos movimentos, gravidade ou acuidadedos sons, agressividade ou doura da interpretao, deixando perceber as intenes, aalegria, a tristeza, o amor, o dio, o terror, o suspense, as interrogaes, as surpresas,dos personagens de um filme. A linguagem musical continua, alis, a ter um papelmuito importante nos filmes falantes.

    A msica da fala da me, da palavra da me, com suas inflexes, suas entonaes, suas

    modulaes variadas, seus silncios, suas escanses e seus ritmos, constitui o que sechama a prosdia. A me tem uma maneira particular de falar criana, uma prosdiaparticular que se convencionou chamar o "manhs", na ausncia do que a criana correo risco de ficar aqum de todo discurso. como se a ausncia dessa prosdia implicasseque no haveria endereamento para a criana, que ela no seria reconhecida comosujeito de desejo. Alm disso, em sua maneira de falar, como a msica do cinema mudo,a me pode transmitir suas emoes, seu ardor, seu tdio, sua alegria, sua angstia,manifestaes que, para um outro adulto, podem ser mascaradas pelo jogo dassignificaes, pelo fato de que a voz tomada na linguagem, mas que so, assimmesmo, absorvidas pelo beb, pelo lactente. Pela sua maneira de falar, nos diz Alain-Didier Weill, a me transmite seus dilemas e a soluo que d a esses dilemas. Se, por

    acaso, a me est deprimida, a musicalidade de sua palavra sofre, sua cadeia sonoratorna-se montona, sem entonao, sem melodia, o que pode ter efeitos desestruturantes

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    no feto e no beb. Segundo Marie-Christine Laznik (1998), a prosdia materna lembra ochiste, ou seja, tem uma estrutura interrogativa que ao mesmo tempo manifestao desurpresa, reenviando a uma terceira pessoa. Atravs dessa estrutura prosdica, a metransmitiria sua falta criana. A ausncia dessa estrutura prosdica na palavra delaestaria na origem do autismo.

    O som da voz da me, portanto, faz o beb entrar em ressonncia com ela, suscita atroca, o encontro, o dilogo e a comunicao. A voz da me transmite uma palavra queintroduz a criana pouco a pouco no mundo simblico, no jogo de substituies e dasnomeaes: dedo, chupeta, brinquedo, mamadeira, alimento, palavra. Dolto (1984) nosdiz que os sons emitidos pela me, chegando aos ouvidos da criana, estabelecem zonasergenas, ao mesmo tempo em que as palavras tomam corpo. Corpo que antes de tudoseu prprio corpo acoplado, num primeiro tempo ao corpo materno. assim que asfunes do corpo so pouco a pouco aspiradas pelo significante. Essa substituio dame por outros objetos institui na criana a capacidade de metaforizao, metfora que antes de tudo a do lao com o corpo de sua me. As palavras s tomam sentido ao

    tomarem corpo, metabolizadas nessa relao entre me e filho, o que nos mostra comoas duas funes da boca, a de comer e a de falar, se telescopam. Como o objeto da

    pulso alimentar, o seio, e o da pulso invocante, a voz, so intercambiveis. A vozmaterna e o seio so incorporados na suco no-nutritiva, assim como o leite na suconutritiva. Wallon (1983) nos diz que as primeiras excitaes exteroceptivas capazes desuscitar na criana reaes significativas parecem ser excitaes auditivas, e ele cita asenhora Ch. Blher, que, nos anos 30, j tinha constatado que a voz humana era ligada vontade de mamar.

    Do lado da criana, nos diz Denis Vasse (1977), a voz sobrevm quando o umbigo sefecha, com o grito, primeiro som proferido pela voz do beb, grito que uma reao deangstia s perturbaes da economia libidinal, grito que corta o silncio, mas que setorna, segundo Freud (1895), o precursor da lingua gem. Depois desse primeiro grito,que acompanha a entrada em jogo da respirao, tambm pelo grito que o beb vai

    procurar acalmar sua tenso, o que a me vai interpretar como demanda, como apelo aoOutro, introduzindo dessa maneira a criana na comunicao significante. A linguagemsobrevm, portanto, para o beb, desse investimento como sentido para a me, pelo fatode que ela vem, ela lhe traz o seio quando ele grita ou chora. O prprio fato de trazer oseio, em si, j d sentido aos gritos e ao choro. Em seguida, qualquer som da criana ame vai interpretar como apelo, como demanda e vai signific-lo criana. Se essainterpretao falta, o grito no pode se transformar em palavra, ele pode se manter puro

    grito, ou ser interpretado simplesmente como manifestao de hostilidade. Outrasmanifestaes no recm-nascido fora o grito, tais como certas expresses mmicas, osorriso, estirar a lngua para o adulto, seriam tambm troca significante desde uma idademuito precoce. Segundo Dolto (1984), o desejo de comunicao sutil (no alimentar)

    precede a necessidade de comunicao substancial (pelo alimento). Mas pelo grito epelos sons que sobrevm com as modificaes corporais que podemos ver de maneiraclara como o beb entra na linguagem. Essas modificaes corporais trazidas pelanecessidade so tomadas pelo Outro como mensagens. Pela palavra do Outro o bebrecebe suas mensagens de volta, o que implica ser reconhecido como sujeito de desejo.Por seus gritos, seus choros, seus sons reconhecidos como demanda de amor peloOutro, a criana procura preencher sua falta a ser, primeiro na relao com o seio e,

    quando este vem a faltar, por intermedirio da palavra.

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    A entrada da criana na linguagem pode ser mais bem compreendida se fizermos umaarticulao entre a psicanlise, que procura supor desejos subjacentes aoscomportamentos, e a psicolingstica, que descreve comportamentos de linguagem a

    partir da observao. Os dois campos so complementares, e essa articulao vem nosmostrar como o comportamento do beb no mais que o reflexo de sua atividade

    mental e de sua entrada gradativa na linguagem.

    A partir das pesquisas psicolingsticas, sabemos que o feto ouve desde os 3 meses, queele ouve as vozes do pai e da me, fazendo desde cedo a distino entre voz feminina evoz masculina, entre som grave e som agudo, e que ele capaz de discriminar certasseqncias sonoras. Alm disso, ele parece ter uma memria que conserva o trao decertos estmulos alm do nascimento, como mostraram algumas experincias feitas comcanes desde os 5 meses de gravidez. Parece ainda que ele reconhece quando nosdirigimos a ele, o que Marie-Claire Busnel (1998) explica pelo fato de que a me ficamais emocionada, e sua prosdia diferente de quando se dirige a outra pessoa. Todasessas capacidades se complexificam com o nascimento. Muito cedo o lactente mostra

    uma preferncia pela voz materna e mesmo pela lngua materna. A voz da me, por suarepetio, vem marcar o ouvido do beb com palavras, frases, canes, cujo sentido o

    beb no compreende da mesma maneira que o adulto. Sua compreenso primeiramente, se seguimos Dolto, a da imagem do corpo oral. Graas repetio,progressivamente, a sensao auditiva referida cadeia de significantes, que antes detudo percepo de um som, torna-se em seguida a percepo de um discurso, ou seja, avoz prende-se na alucinao e depois na representao, ao mesmo tempo em que odiscurso da criana estrutura-se progressivamente desde o grito s lalaes, ao balbucio,s palavras e s frases. No seminrio sobre A relao de objeto (1956-7), Lacan afirmaque a criana entende muito mais a estrutura da palavra do adulto, antes de perceber osentido, e que isso seria uma primeira forma de supereu. Essa percepo da estruturaantes da percepo do sentido bem confirmada pela observao dos psicolingistas,como veremos em seguida.

    A mensagem sonora da me , num primeiro tempo, um enigma para o beb. Elepergunta-se o que que ela quer dele, ele procura identificar-se a uma demanda que nosabe bem o que , isso o "che vuoi", o beb procura identificar o que falta sua me.O enigma a primeira forma de demanda. Se inicialmente a reao da criana simultnea voz da me, aos poucos, no ser mais simultnea. Ela vai procurar ocuparos intervalos do discurso dela, vai tentar preencher seu vazio. Essa questo, o que quea me deseja, ele vai se pr, entretanto, durante muito tempo. o que vai se manifestar

    nos porqus interminveis da criana. O che vuoi transforma-se mais tarde em "quelugar e que importncia tenho para meus pais". Procurando identificar o que falta me,a criana supe que o que ela deseja o falo e procura, ento, identificar-se a seu falo.

    em torno dos 2 meses, que o beb comea a sair de sua passividade, de sua reaocorporal simultnea voz da me e comea a fazer sons mais aperfeioados que o grito,do tipo vocalizaes e jogos vocais, tais como as lalaes e o gorjear, procurandoalucinar a voz da me quando esta se afasta. Esses sons so, primeiramente, puramsica, pura melodia, puro jogo de gozo, que a criana pode produzir tambm emresposta demanda da me. Quando est sozinha em seu bero, ela presentifica a mecom esses sons, acreditando repetir fonemas que ouviu dela. Dolto (1984) afirma que

    to precoce esse desejo de ouvir de novo a voz da me, que muito rapidamente a crianatorna-se incapaz de pronunciar os fonemas que no pertencem a sua lngua materna _

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    efeito da dominncia do princpio do prazer _, quando podia no incio pronunciar osfonemas de todas as lnguas. Lacan nos fala do puro jogo da palavra no lugar do Outrono seminrio sobre A angstia (1962-3), quando evoca o monlogo hipnopmpico dolactente, dizendo que, embora toda funo de comunicao esteja excluda, asconseqncias desse jogo so a constituio da voz e do sujeito. Lacan pe a voz em

    relao com o vazio do Outro e o desejo do Outro, relao que se faz no modelo daantomo-fisiologia do aparelho auditivo, ou seja, o rgo da audio um vazio cujaestrutura determina os sons que nele ressoam vindos do exterior. A voz ressoa no novazio do caracol, mas no vazio do Outro, e ela s pode ressoar se toma corpo na relaoentre a me e a criana.

    Vemos assim que a voz, a palavra, a lngua so tambm instrumentos de gozo, e queisso particularmente visvel durante o primeiro ano. O ser humano desde sempre seentretm com a lngua e com a voz, assim como com o seio, uma relao de naturezaertica, a voz e a lngua podem ser objetos ora de amor, ora de dio, ora objetos degozo. Assim acontece na fase do gorjear, das lalaes e depois do balbucio, o registro

    do Eu prazer. Somente depois a palavra adquire valor utilitrio para comunicarmensagens. Num primeiro momento, a linguagem puro gozo, pura msica, essa que o

    beb escuta de sua me, assim como seu jogo com as sonoridades, que se tornar emseguida jogo com o sentido, sempre em obedincia ao princpio de prazer. Podemosobservar a sobrevivncia desse jogo com os sons no adulto, nas vocalizaes, no cantosem palavras, ou na dessemantizao da palavra, como acontece particularmente napera e na msica lrica em geral, em que o som puro prazer, jogo de vertigem, jogode gozo, dominncia absoluta do princpio de prazer. Talvez possamos dizer a mesmacoisa da fuga de idias do manaco. A msica pura anterior ao sentido, ela est fora dahistria, reenvia s origens e, portanto, aos mitos das origens. No por nada que Freud

    pe em relao msica e mitos endopsquicos na Carta 78 a Fliess (1897).

    Essa estrutura que, segundo Lacan, a criana percebe na sonoridade da voz da me,Alain-Didier Weill (1998) nos diz que no pode ser outra seno a estrutura musical, aestrutura harmnica com uma chave, uma tonalidade dominante, uma tnica e um ritmo,mas articulada tambm estrutura fonemtica de uma lngua particular, a lnguamaterna. Por essa estrutura, a emisso dos sons segue certas leis, as leis da harmonia, asleis da lngua, o que faz com que eles no possam ser ditos de qualquer jeito, nem emqualquer ordem. Ao mesmo tempo, na maneira como se combinam _ por exemplo, quetipo de acorde se constri na combinao da voz da me com a voz do pai, consonante,dissonante, ou no h acorde possvel? _ e se seguem com sua melodia, seu ritmo e suas

    modulaes, se tambm por assonncias, consonncias ou dissonncias, ns vimosque a me transmite seus conflitos e seus dilemas, assim como a soluo que d a essesdilemas.

    As crianas percebem essa estrutura porque so capazes de registrar as freqnciasdesde a vida intra-uterina. Essa aptido precoce nos bebs, que faz com que possamdiscriminar os sons das lnguas faladas, chamada pelos psicolingistas de percepocategorial. Eles so sensveis s variaes de durao, de altura e de intensidade queorganizam a cadeia falada em unidades prosdicas e em unidades funcionaisrecorrentes, como frases e sintagmas, o que faz com que memorizem a organizaomeldica da palavra ainda na vida fetal. assim que um beb de 4 meses e meio

    consegue detectar as fronteiras de frases em todas as lnguas, porque sensvel sdiferentes tonalidades, s modulaes, repetio das cadncias e dos ritmos. Ele perde

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    rapidamente essa capacidade e s retm em seguida os ndices que so pertinentes sualngua. Entre 4 e 6 meses ele elimina do tratamento os ndices que no so pertinentes aum grupamento funcional de sua lngua, como a frase, por exemplo, e s retm osndices que so teis para os grupamentos funcionais de sua lngua. por essa aptido,em que a palavra no tomada como uma onda contnua, que o beb reconhece

    progressivamente as pausas, as paradas e os grupamentos que marcam o fim das frases,o fim dos sintagmas e a diferena entre as palavras, em todas as lnguas.

    O caminho para o sentido que, quando a criana produz um som, a me, assim comofaz com o grito, investe-o de sentido, investe-o falicamente, ela ouve mais que o som,ela interpreta-o e responde a ele. Sua capacidade de iluso antecipatria a faz supor seufilho sujeito bem antes que ele fale, bem antes da diviso subjetiva. Isso faz com quefale no lugar da criana, dando sentido a seus comportamentos, enunciando o desejodela em seu lugar, caracterizando o que Winnicott chamou de preocupao materna

    primria (1956). assim que a voz prende-se na alucinao e em seguida narepresentao. Pelas lalaes, os bebs tentam reenviar me a organizao meldica

    que percebem nela. Logo reproduzem os dilogos sozinhos e pouco a pouco se tornaminterlocutores, dialogando com ela, quando se situam ento como ativos no dilogo. isso que os psicolingistas chamaram de "protoconversaes", turn talking, que seobservam entre 2 e 3 meses. As protoconversaes so atividades rtmicas partilhadas,descritas como a troca de expresses entre a me e a criana, do rosto, da voz, do olhare dos movimentos, trocas que ocorrem num certo ritmo. A criana d a impresso decompreender muito bem o que a me diz e age como se assim fosse. Ela faz muitoesforo para se exprimir, com movimentos da lngua e da boca procurando pronunciaras slabas com movimentos sincronizados palavra do outro. como se todo o corpodo beb entrasse na linguagem, no ritmo da palavra do adulto, tudo se tornasincronizado entre ele e o Outro, e todos os seus movimentos exprimem sua atividadeemocional interior que est em relao com a emoo do Outro. A criana responde frase da me com sons que se assemelham melodia de sua frase, de maneira rtmica,adaptando-se ao ritmo e freqncia da me ou do pai, revelando assim uma espcie dediviso primitiva entre demanda e resposta demanda, diviso esta anterior Spaltung.Ao mesmo tempo, ela revela assim uma certa capacidade de espera da satisfao. Essaentrada no ritmo do adulto v-se no somente no nvel da linguagem. Poder-se-ia talvezdizer que a entrada no ritmo da linguagem o reflexo do ritmo de amamentao e de

    presena-ausncia. O ritmo da criana harmoniza-se com o ritmo do adulto e com oritmo do meio que a cerca, essa organizao invadindo de certa maneira toda a vida do

    beb.

    O fato que em torno dos 3 meses, as mes referem freqentemente que s entocomeam a poder dormir um pouco mais noite e a terem pequenos momentos paraelas.

    Esse comportamento tambm ntido quando se v o beb participar das canescantadas pela me. Os movimentos de seu corpo so tomados pela cano e entram emsincronia com as estruturas rtmicas da palavra cantada pelo adulto. Os gestos da crianarevelam os movimentos da voz da me. A mesma coisa passa-se nas protoconversaes,tudo tomado na linguagem, todas as formas de expresso, quer sejam os sons ou osmovimentos do corpo. O que se pode observar nas protoconversaes que a reao

    voz no mais simultnea. Aqui a criana espera o silncio da me para responder e fazsilncio em seguida para deixar a me se manifestar, o que nos mostra de maneira clara

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    como ela aspirada pelo Outro, como ela tomada na linguagem desde seus primeirosdias, como seu corpo tomado na demanda do Outro e como ela comea a fazer sons nosilncio do Outro em sua tendncia a preencher seu vazio.

    O balbucio que um incio de pronunciao de slabas tendo formas de slabas da

    lngua adulta, instala-se no final do turn talking. Vimos que em torno de 4 a 6 meses acriana perde a capacidade de perceber os grupamentos funcionais que no pertencem sua lngua, excluindo do simblico o que vem se constituir no Real. Entre 6 e 8 mesessurge uma linguagem modulada que no segue ainda as regras gramaticais, as palavrasno so ainda reconhecveis, mas a criana torna-se capaz de manipular pessoas distncia, pois a me reconhece em seus sons a inteno do desejo. Por seus sons, ela

    pode fazer voltar o outro quando tem vontade. Isso acontece ao mesmo tempo em que acriana comea a brincar de deixar cair os objetos, o que nos leva a concluir que elautiliza a linguagem nesse momento como o fort-da, como um jogo com o qual manipulaas pessoas como brinquedos, afastando-as e fazendo-as voltar. Aos 7-8 meses elasconseguem distinguir uma palavra, mas sem compreend-las, discriminando as formas

    verbais recorrentes na palavra que ouve. nesse momento que comea a reconhecer demaneira prevalente seu nome.

    O balbucio ainda gozo, mas j gozo voclico consonntico formando as primeirasslabas oposicionais, sem ser ainda designao de alguma coisa. A designao dascoisas sobrevm depois, com o julgamento de existncia e a fase do espelho, momentoem que as palavras so postas em relao com as coisas, com os objetos. No balbucio hintroduo da consoante, que corta a continuidade das vogais, articulando-as e fazendosobrevir a silabizao dupla, papai, mame, coc, e finalmente a nomeao dos outrosobjetos. Dolto (1984) nos diz que o duplo ritmo, o fato de que a criana duplica-sequando a me est presente, e desduplica-se quando ela se vai, que explica essasilabizao dupla das primeiras palavras que a criana pronuncia. As primeiras palavrasso repetitivas de duas slabas, correspondentes ao sentimento de existir da criana,conjuntamente com sua me, desdobramento de suas sensaes. Isso correspondetambm ao ritmo de dois tempos que predomina nessa poca, o ritmo da

    presena/ausncia e do sentimento diferente de suas sensaes quando a criana estcom ou sem a me. Dolto (1984) nos diz ainda que essas palavras vocalizadas so talvezobjetos transicionais sonoros, que a criana guarda na memria, antes que se tornemverdadeiras palavras. Lacan lembra-nos no seminrio sobre A angstia (1962-3) queessas primeiras palavras, papai e mame, so articuladas no nvel labial, que os lbiosso a imagem do corte que induz o fantasma do seio como seccionado, o que lembra o

    corte institudo pela articulao significante. Jos Roberto de Almeida Correia, emartigo intitulado "O tema do duplo pode esclarecer sobre o autismo e a linguagem?,"observou que os autistas, quando comeam a falar, no fazem essa silabizao duplacomo as outras crianas, o que nos faz pensar que isso tambm metfora da alienaono Outro, que no ocorre no autista. O autista desmamado de sada, nos diz Marie-Christine Laznik, em seu livro Rumo palavra, sem jamais se alienar no Outro.

    Enfim, essa silabizao dupla, e essa duplicao das sensaes, podemos dizer que tambm atividade negativante. Atividade negativante, que, paradoxalmente, podemosdizer positiva, na medida em que ao mesmo tempo em que corta, ela age no sentido deestabelecer ligaes, portanto, no sentido das pulses de vida. Mas a introduo da

    consoante indica, alm do mais, que alguma coisa comea a escapar do gozo voclico.O corte introduzido pela consoante em si mesmo um passo para a separao, para o

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    gozo flico, nessa poca que a criana comea a gostar de partilhar um objeto com osoutros, um objeto torna-se significante dela diante dos outros, do qual ela comea a

    perceber o mesmo sentido que as outras pessoas. Ela entra no pacto que constitui anomeao, que faz com que dois sujeitos, ao mesmo tempo, concordem em reconhecero mesmo objeto. a abertura para a significao flica. Lacan nos diz no Seminrio II

    (1954-5) que, se os sujeitos no se entendem sobre esse reconhecimento, no h mundoque possa se manter um instante.

    Em torno de 9 meses, portanto, o beb comea a se dar conta de que as palavras tm umsentido. Aos 10-12 meses, ele s discriminar os sons que fazem sentido em sua prprialngua e comear a dizer suas primeiras palavras. A escuta focaliza-se da por dianteno somente nas unidades funcionais prosdicas e meldicas da lngua, mas, sobretudo,na procura de um sentido. O comportamento de apontar com o dedo que sobrevmnesse momento bem indicativo da procura do sentido. A criana parece pedir ora o

    prprio objeto, ora perguntar o sentido desse objeto, ela quer saber o que cada objetoque v. Se a me compreende esse gesto apenas como pedido do objeto, no

    compreendendo sua procura de sentido, a criana corre o risco de ter um atraso dalinguagem. Essa apreenso do sentido o que os psicolingistas chamam acompreenso simblica, que se manifesta no fato de que as crianas respondam aoadulto de maneira adequada. E, a, a criana entra numa temporalidade diferente, pois

    preciso esperar a ltima palavra da frase para poder responder. o efeito nachtrglich.A criana entra na histria, entra na narrativa, na diacronia propriamente dita. Isso querdizer tambm que comea a se submeter ao princpio da realidade. Estamos agora noregistro do Eu realidade, que, ao inverso do Eu prazer, obedece s regras de ligaes.Entre 18 e 20 meses, h um crescimento do vocabulrio, a criana comea a levar emconta as regras de pronncia e os princpios gramaticais da lngua, e comea a aplicaressas regras. Isso acontece sempre nessa dialtica entre pulso de vida e pulso demorte. Efeito da Bejahung e do Eros, efeito das pulses de vida, que funcionam nosentido da unificao e da articulao entre os elementos separados, para estabeleceruma relao entre eles. Efeito tambm da fase do espelho, com sua tendncia a ligar e aunir. Mas tambm efeito das pulses de destruio que introduzem o corte. Assim,afirma Jean-Jacques Rassial (em seminrio de DEA na Universidade de Paris XIII, em1998), o balbucio torna-se lngua sob o efeito das leis de concatenao e de reunio, aomesmo tempo em que h excluso, Austossung, de algumas produes fonemticas queno pertencem lngua materna, efeito da pulso de destruio. Esse autor consideraque as produes ecollicas devem ser compreendidas como produo fonemticaforacluda, expulsa no Real. Esse tipo de foracluso efetua-se no somente no psictico,

    mas tambm no neurtico, que pode tambm expulsar sinais de percepo que no irose constituir em significantes. Em conseqncia disso, o adulto ter dificuldades emaprender uma lngua estrangeira, pois, na lngua estrangeira, deve reencontrar produesfonemticas que estiveram sua disposio na poca do balbucio e das lalaes, masque foram expulsas como no pertencentes lngua materna. Essa foracluso acontece

    porque a criana identifica no nvel da onda sonora produzida uma certa freqncia queno aquela que deseja ouvir, no aquela que faz voltar sua me.

    Quando a dimenso do sentido sobrevm que houve a diviso originria que faz adviro sujeito, a Spaltung entre discurso consciente e discurso inconsciente. Essa divisomanifesta-se no discurso em sujeito do enunciado e sujeito da enunciao. A criana sai

    do gozo incestuoso, do gozo proibido do seio e das lalaes, para entrar no gozopermitido, gozo flico. Segundo Lacan (1948), somente um sujeito pode compreender

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    um sentido, de maneira que todo fenmeno de sentido implicaria um sujeito. Dolto(1984) afirma, por seu lado, que a compreenso de uma palavra diferente segundo afase em que est. Por exemplo, se a criana est no momento da imagem de base oral,ela s compreende as palavras que concernem aos prazeres da boca e de corpocarregado. A compreenso de uma palavra depende para ela ao mesmo tempo do

    esquema corporal de cada um e da constituio da imagem do corpo ligada s trocasvivas que acompanharam a aquisio dessa palavra. E, embora Dolto (1984) nos digaque a palavra tem um sentido simblico em si mesmo, pois rene alm do espao e dotempo seres humanos na comunicao, ela afirma que aquele que no tem esquemacorporal ou imagem do corpo correspondente palavra emitida ouve a palavra semcompreender o sentido, por no ter uma relao corporal que permita. Lembramos que,

    para adquirir sentido, as palavras devem tomar corpo e serem metabolizadas numaimagem do corpo relacional. Sem isso, a criana ter dificuldade em compreender osentido. As palavras tomam corpo na fase do espelho, quando so associadas s coisas.

    No nos podemos impedir de lembrar aqui uma criana psictica de 2 anos e meio quepronunciava somente duas ou trs palavras, e a palavra que pronunciava mais

    freqentemente era uma que tinha ouvido de um vendedor que passava diariamentediante de sua casa, de quem jamais tinha visto o rosto. Era, portanto, uma voz que vinhado alm, sem nenhuma relao a um corpo, essa criana no podendo, evidentemente,compreender o sentido.

    Dolto (1984) nos diz que a castrao oral decisiva para a compreenso das palavras,pois ela considera que somente a partir dessa castrao que a significao das palavraster um outro alcance. Ela confirma assim mais uma vez como o corpo est em questono sentido das palavras e como a zona ergena proibida o lugar em que o sentido deveadvir. finalmente pela castrao oral que a criana entra definitivamente nasignificao flica. Ela se introduz na relao com outras pessoas, da por diante poderaceitar a assistncia de outras pessoas que no a me, se naturalmente essas pessoasestiverem em boas relaes com ela.

    A angstia do oitavo ms descrita por Spitz compreendida tambm como atividadenegativante da linguagem contempornea do desmame, antes da pronunciao do no na

    palavra. A criana diz no a um rosto diferente dos rostos que conhece. um nomotor, ainda no verbal, pois ela d as costas para o estrangeiro e chora, mas se volta

    para a pessoa que conhece. Negao e afirmao, atividade de simbolizao ao mesmotempo. O que angustia a criana, nos diz Claude Trevarten (1998), no o medo de sercomido ou de ser morto pelo estranho, o que a criana sente como perigoso justamente

    o fato de no compreender o sentido da presena estrangeira. Para Franoise Dolto, aangstia do oitavo ms no uma passagem fatal nem necessria, ela sobrevm nascrianas que no foram suficientemente carregadas em direo do que as atrai, e a quemo adulto no mediatiza suficientemente no espao os objetos que v e que deseja tocar.Isso daria criana um sentimento de impotncia, pois ela no liga o estrangeiro slembranas anteriores. Se no pode ligar o estranho s lembranas anteriores, no

    poder evidentemente compreender o sentido. De fato, tudo outro, tudo estrangeiropara o recm-nascido, nada tem sentido at que a me d sentido com sua interpretaoe com suas palavras, fazendo a ligao do novo com as experincias passadas. porisso que, quando a criana comea a falar, fala do lugar da me que antes falava em seulugar, sua frase fala de seu desejo, mas como se fosse dito por um outro, pela me, o

    verbo na terceira pessoa. somente mais tarde, que se d a inverso pronominal, e quea criana fala de si na primeira pessoa do verbo.

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    Depois do desmame, portanto, a boca esvaziada do seio d lugar a uma outra forma decomunicao. O prazer da boca desloca-se progressivamente para a pronncia das

    palavras e para o conhecimento de outros objetos que se constituem primeiramentecomo objetos mamizados (objetos que so associados pela criana presena da me),

    as prprias palavras se constituem como objetos mamizados. Dolto (1984) nos diz quea castrao oral simbolgena, na medida em que a assimilao da lngua materna s sefaz depois do desmame.

    Essa linguagem de gozo, nos diz Lacan (1975) na "Conferncia de Genebra sobre osintoma", intervm sob a forma de alngua, primeira marca do ser falante. Se a lngua condio do inconsciente, a alngua a lngua particular e nica para cada ser falante. Aalngua sobrevm para o ser por meio de cortes, escanses, pontuaes, que instauram

    para sempre o equvoco. A alngua a lngua do inconsciente de cada um, ela estruturao falasser, e constitui o substrato em que o sujeito estrutura suas experincias. O falasserconstitui-se como marcado pelo significante e pela castrao e, portanto, incapaz de

    dizer tudo.

    Tomando a cadeia significante, podemos dizer que S1 ainda no comunicao nemsentido. So as lalaes, o balbucio, alngua, puro gozo que se articula com o objetovoz. Esse gozo se tornar sentido, jouis-sens, articulado com um outro significante, oS2, que desloca o gozo do puro som para o sentido, momento em que o simblicoadvm pela metfora paterna. Isso se d por meio da negao, que transforma S1 em S2

    para que haja acesso cadeia significante consciente, pois para o inconsciente no hnegao. A Verneinung implica desdobramento, implica negao. Se h foracluso donome do pai, as pulses ficam separadas, desarticuladas, a negao no pode seinscrever na linguagem, haver portanto carncia de nexo, de ligaes, o que semanifesta na proliferao imaginria do psictico. Sua linguagem ser difcil de serentendida pelos outros. Para que a negao inscreva-se na linguagem, preciso que as

    palavras ditas pela me venham inibir a alucinao primitiva, tornando possvel aatividade negativante.

    Podemos ainda fazer observar que a articulao entre esses dois momentos, o primeiromomento, em que a linguagem no tem sentido, as palavras no tm nexo, nem ligao,e o segundo momento, em que o sentido advm, as palavras ligam e articulam-se entresi, esse momento de virada dado pelo espelho, que, segundo Lacan, o que estrutura

    tudo o que existe no homem de sem ligao, de fragmentado, de anrquico, e queestabelece a relao das palavras com as percepes.

    A nomeao dos objetos estrutura a percepo e organiza as sensaes. No texto"Agressividade em psicanlise", Lacan (1948) afirma que o narcisismo que advm peloespelho revela o mais profundo sentimento das latncias da semntica. Essa virada d-seento a partir do reconhecimento do sujeito no espelho, e em toda percepo o homemse reconhecer sempre em um ponto qualquer ou em vrios pontos. Pela nomeao dosobjetos, o homem os faz subsistir no tempo. Eles duram alm de seu desaparecimentono espao. O nome o tempo do objeto, afirma ainda Lacan (1954-5) no Seminrio II.

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