psicossomática 02

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AN02FREV001/REV 4.0 26 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação CURSO DE PSICOSSOMÁTICA Aluno: EaD - Educação a Distância Portal Educação

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PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação

CURSO DE

PSICOSSOMÁTICA

Aluno:

EaD - Educação a Distância Portal Educação

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CURSO DE

PSICOSSOMÁTICA

MÓDULO II

Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou distribuição do mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências Bibliográficas.

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MÓDULO II

3 O DESENVOLVIMENTO DO CONCEITO DE PSICOSSOMÁTICA II

(CONTINUAÇÃO)

Em virtude do desenvolvimento da psicanálise, até o final da década de

1940, grande parte dos pesquisadores de psicossomática baseou seus estudos

nesta abordagem. Um dos exemplos de grande destaque foi a formação da Escola

de Chicago, por Franz Alexander e Thomas French.

Alexander foi influenciado pela abordagem psicanalítica e da psicologia da

Gestalt, além dos estudos da neurologia e da endocrinologia. O diretor da Escola de

Chicago desenvolveu a ideia de especificidade da doença, o que significa que uma

resposta fisiológica a um estímulo emocional varia conforme a natureza do estado

emocional que a desencadeou. Nesse sentido, haveria uma especificidade orgânica

influenciada por uma força psicológica propulsora, o que levaria cada doença a

corresponder a um quadro emocional ou a um tipo de personalidade. Alexander

delineou sete doenças, que ficaram conhecidas mais tarde como psicossomáticas,

mas na sua concepção toda doença é psicossomática, visto que fatores emocionais

influenciam todos os processos do organismo, por meio das vias nervosas e

humorais (ALEXANDER, 1923/1989).

Considerado por muitos estudiosos como seguidor de um modelo linear,

causal e redutivista, Alexander realizou descrições e análises clínicas bastante

significativas, que contribuíram de modo expressivo para a área da psicossomática.

A partir dos trabalhos realizados por Spitz, em 1950, contatou-se a influência

que a ausência da figura materna exercia no plano da psicopatologia, e verificou-se

que essa ou outras ausências são sentidas no psiquismo, aumentando a disposição

do indivíduo à doença.

Outra importante instituição dentro dos preceitos psicanalíticos que merece

destaque é a Escola Psicossomática de Paris, criada em 1962. Representada por

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Pierre Marty, Michel M´Uzam e Christian David, com a finalidade de formar

psicossomaticistas, promover a pesquisa e fornecer atendimento clínico. Estes

estudiosos partiam do pressuposto de que os pacientes psicossomáticos

apresentavam as seguintes características:

I) Escassa dificuldade de simbolizar;

II) Sonham pouco ou seus sonhos são demasiadamente concretos;

III) Pouca elaboração psíquica;

IV) Pensamento tipo operatório aprisionado no concreto;

V) Atitudes pragmáticas (baseadas na prática).

Desse modo, considera-se que este paciente tinha pouca ligação com seu

inconsciente, despontando em uma incapacidade de simbolizar, tornando-se

vulnerável a qualquer estresse e, como consequência, seu organismo poderia reagir

com uma doença somática. Conforme Ramos (2006), para esses estudiosos, as

doenças orgânicas necessitam de sentido e quando não há significado simbólico, há

uma incompatibilidade entre doenças psíquicas e orgânicas.

O objetivo inicial desses teóricos era compreender as patologias somáticas

cuja dinâmica não correspondiam ao modelo da conversão histérica, utilizando o

conceito psicanalítico de neurose atual. Entretanto, gradualmente foi se

desenvolvendo um corpo clínico e teórico que considera a sintomatologia a partir da

ideia de que um menor grau de atividade mental corresponde a uma maior

vulnerabilidade somática. Diante de um traumatismo, por exemplo, um indivíduo que

apresenta uma atividade mental pouco desenvolvida não teria recursos mentais

suficientes para lidar com o excesso de estimulação, então haveria uma

desorganização psíquica que passaria a atingir as funções somáticas, menos

evoluídas.

Em 1970, surge a Escola de Boston sob os cuidados de dois psicanalistas

americanos: Sífneos e Nehemiah, que desenvolvem uma opinião semelhante a dos

pesquisadores da escola francesa. Para Sífneos e Nehemiah (1970), os pacientes

psicossomáticos eram alexitímicos, ou seja, incapazes de nomear ou expressar

sentimentos em razão da incapacidade de reconhecê-los. Dessa maneira, por meio

de observações, estes autores consideraram que os pacientes com doenças

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psicossomáticas, apresentavam uma desordem específica nas suas funções afetivas

e simbólicas, acarretando uma forma de se comunicar confusa e improdutiva.

Apesar do importante estudo realizado pelos autores, sua aceitação tem sido

restrita, já que contraria a maioria das observações clínicas feitas por diversos

profissionais. Santos e Otelo (1992), por exemplo, citam que na prática veem-se

manifestações psicossomáticas em histéricos, obsessivos e psicóticos, sendo que os

sintomas psicossomáticos possuem cadeias associativas significativas tanto nos

neuróticos quanto nos delírios psicóticos.

Ramos (2006) acredita que a questão da conceituação psicanalítica no

estudo da psicossomática implica em trabalhar com o símbolo apenas no plano

verbal, isto é, abstrato. Na visão da autora, a Escola Psicossomática de Paris, ao

considerar que as somatizações não possuem significação simbólica, sinalizando

apenas uma disfunção, perde contato com o trabalho com o inconsciente e cria uma

dificuldade técnica. Neste contexto, Marty (1990) apresenta aos psicanalistas um

trabalho terapêutico com técnicas de relaxamento para pacientes com tendência a

somatizar.

Segundo McDougall (1986,1989), os pacientes alexitímicos são normopatas,

o que quer dizer que para se adaptar usam uma normalidade falsa, não

verdadeiramente afetiva. Para esta psicanalista, grande parte dos pacientes

orgânicos não se enquadra nesta categoria.

Nota-se que muitos conceitos e concepções sobre a psicossomática foram

desenvolvidos sem que se criasse um corpo coerente que reunisse ou possibilitasse

um nexo entre a teoria e a prática terapêutica.

Mello Filho et al. (1992) aponta que três fases foram de suma importância

para a evolução da psicossomática:

I) Fase inicial ou psicanalista → refere-se à origem inconsciente das

enfermidades, além das teorias da regressão e sobre os benefícios secundários do

adoecer, entre outros.

II) Fase intermediária ou behaviorista → que se distingue das demais

pelo estímulo à pesquisa em homens e animais com o intuito de enquadrar os

achados à cientificidade exata e dando estímulo aos estudos sobre estresse.

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III) Fase atual ou multidisciplinar → que pretende dar foco ao social e à

visão da psicossomática como uma atividade fundamentalmente de interação e de

interconexão entre vários profissionais de saúde.

Atualmente, não encontramos uma teoria abrangente ou unificadora. Os

modelos vigentes ainda seguem predominantemente o paradigma biomédico. Sendo

assim, o conceito de psicossomatização, todavia, se encontra atrelado a este

paradigma, o qual pode ser resumido da seguinte maneira: o organismo funciona

como uma máquina que deve ser analisada e reduzida em pequenas partes. Psique

e corpo mantêm uma relação causalista e determinista, sendo possível separá-las

de forma objetiva. Saúde é considerada como ausência de doença, a qual é

explicada como um mau funcionamento de mecanismos biológicos e ou

psicológicos.

4 A PSICOSSOMÁTICA NOS DIAS ATUAIS

Em contrapartida, com o progresso da Medicina Molecular, da

Neurobiologia, da Genética e da aplicação da teoria quântica na Biologia o modo de

ver a relação corpo-mente está sendo continuamente ampliado, promovendo uma

nova reflexão sobre saúde e doença.

Impulsionado pelo desenvolvimento de várias áreas científicas, como a

Física, Química, Biologia e Psicologia, a visão de mundo está se aproximando

paulatinamente de um princípio mais holístico, termo que designa como descrito por

Weil (1990), a totalidade em que o universo seria um conjunto em constante

formação abrigando diferentes níveis como: ideológico, biológico e psicológico que

se influenciam mutuamente.

Atualmente, no campo da psicossomática encontramos algumas publicações

que buscam integrá-la em uma nova definição. Para Lipowiski (1984, p. 167):

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Psicossomática é um termo que se refere à inseparabilidade e interdependência dos aspectos psicológicos e biológicos da humanidade. Essa conotação pode ser chamada de holística, na medida em que ela implica uma visão de ser humano como uma totalidade, um complexo mente-corpo imerso num ambiente social.

Na ótica de Capra (1982), uma abordagem de embasamento holístico na

saúde, no tratamento e na cura está de acordo com pensamentos e paradigmas

mais tradicionais, bem como é coerente com as teorias científicas modernas.

Se na Medicina e na Psicologia, até pouco tempo o conceito de

psicossomática era empregado para se referir a uma doença sem um diagnóstico

claramente orgânico, seu uso atual foi modificado. Hoje, o termo diz respeito a uma

interdependência fundamental entre mente e corpo em todos os estágios que

contemplem a doença e a saúde. Considera-se um reducionismo e mesmo uma

ingenuidade tratar uma doença como de origem apenas psicológica ou puramente

orgânica. Há, portanto, uma tendência a considerar qualquer enfermidade como

psicossomática, visto que elas envolvem e inter-relação entre corpo e mente na

origem, desenvolvimento, tratamento e cura.

LeShan (1992), um importante pesquisador da área, principalmente da

relação da psicossomática com o câncer, descreveu três princípios que apoiam a

Medicina psicossomática atual:

I) O indivíduo existe em muitos níveis ou domínios, todos de similar

importância. Dividir o ser humano em corpo, mente e espírito é mais

comum no Ocidente.

II) Cada pessoa é um ser único e deve ser tratado como tal.

III) Aquele que está doente deve ser encorajado a ter autonomia no processo

de cura.

Com base nestes três princípios, os profissionais da área da saúde podem

favorecer a criação de um ambiente em que despontem as capacidades do indivíduo

de se autocurar. Por outro lado, esses princípios podem produzir uma

supervalorização dos processos que ocorrem no sistema imunológico, criando

novamente um recorte quando fora de uma concepção biopsicossocial.

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Em vista de todos os pontos aqui levantados, nota-se que uma nova síntese

faz-se necessária. Ao reaver antigos conceitos, práticas, técnicas e métodos, o

modelo holístico procura integrá-los no mundo contemporâneo.

5 PSICOSSOMÁTICA: UMA DEFINIÇÃO

Para Riechelmann (1998), a psicossomática está inserida em dois campos, o

filosófico, pois envolve uma visão de ser humano, com um modo de defini-lo, e o

científico, visto que considera como objeto os mecanismos de interação entre as

dimensões mentais, corporais e sociais da pessoa. A integração biopsicossocial,

como afirma o autor, é objeto da Ciência Psicossomática.

Há ainda, a Psicossomática enquanto atuação profissional, que busca o

trabalho com os aspectos subjetivos e objetivos do paciente. Ressalta-se neste

sentido que ela se difere da postura clássica da Psicologia, a qual foca seu trabalho

nas questões subjetivas e diferencia-se igualmente da Medicina, que comumente

considera os fatos objetivos, palpáveis e mensuráveis.

O profissional que trabalha com a Psicossomática, portanto, deve estar

atento às vertentes objetivas e subjetivas do paciente ao mesmo tempo, sem

priorizar nenhuma delas em detrimento da outra. Enquanto prática clínica,

encontramos na Psicossomática um conjunto teórico que se aproxima dos

conteúdos das disciplinas como: Psicologia Médica e Psicologia Hospitalar.

Riechelmann (1998) afirma que a Psicossomática não é, e nem pretende

ser, uma medicina alternativa, afinal a prática médica alternativa possui

pressupostos teóricos diferentes dos princípios teóricos da ciência convencional. O

autor enfatiza que a Psicossomática se baseia em princípios teóricos que estão

inseridos na dita ciência convencional. Ao compreender que a Medicina nasceu da

Psicossomática, e não o contrário. Assim, a Psicossomática nada mais é que a

Medicina convencional resgatando a sua origem.

Como já mencionado, Hipócrates, o “pai da Medicina”, apesar de não dar

muito valor à fala dos pacientes, considerava, ao descrever uma doença como a

úlcera, por exemplo, esta ser frequente em pessoas que possuíam uma herança

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familiar semelhante, as quais faziam uso do álcool, manifestando-se principalmente

nos períodos em que as mesmas estavam sofrendo com “turbulência da alma” e,

além disto, estavam influenciadas por ventos úmidos do noroeste. Tais concepções

a respeito de uma enfermidade mostram que Hipócrates buscava integrar os mais

diferentes aspectos como: psicológicos, químicos, biológicos e até meteorológicos.

Assim, no princípio, a medicina era psicossomática, mas em virtude das já citadas

influências que sofrera sucessivamente distanciaram-se de sua origem.

Atualmente, a Psicossomática dentro da sociedade científica, representa um

foco de visão holística, que leva em conta tanto o avanço tecnológico da Medicina

moderna e suas especializações quanto àquilo que há de mais humano nas

profissões de saúde. Mais adiante explicaremos melhor o termo holismo.

6 A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA DIMENSÃO SOCIAL NA PSICOSSOMÁTICA

Como mencionado por França e Rodrigues (2007), o ser humano pode ser

considerado um animal social que está atrelado a um meio cultural humano. Nota-se

que desde o princípio de seu desenvolvimento há uma busca pela adaptação, para

conseguir se sobressair ao seu meio sociocultural (aqui entendido como um meio

dirigido por normas, regras, conceitos econômicos, políticos, legais, religiosos,

científicos, artísticos, morais, costumes e atitudes, entre outros fatores que

constituem uma comunidade, nação ou civilização).

O primeiro grupo em que o indivíduo começa a interagir é, geralmente, o

familiar, onde ele progressivamente passa a significar as coisas que lhe rodeiam,

além de encontrar entendimento e ser entendido por aqueles com os quais convive

em uma constante interação. De maneira gradual, essas interações vão se

ampliando, estendendo para relações sociais, como por exemplo: para vizinhos,

primos, amigos da escola, professores, grupos que frequenta, entre outros.

Primeiramente, a família é a responsável por situar o seu novo membro em

uma determinada posição social por meio dos grupos sociais nos quais insere a

criança e, estes, provavelmente, influenciarão suas demais escolhas sociais em

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curto, médio e longo prazo, como escolas, clubes, grupos de jovens e demais

organizações culturais futuramente.

É importante deixar clara a importância das características de personalidade,

que em parte são herdadas e em parte são constituídas pela assimilação das

experiências com o seu meio, bem como o conjunto de regras e costumes

assimilados influenciam de maneira direta o comportamento da pessoa no seu

grupo. Assim, em qualquer grupo no qual ela se insira, haverá um condicionamento,

um ensinamento e uma educação que procura uma adaptação às normas e aos

valores predominantes dos pais, avós, irmãos, amigos, professores e mais adiante:

chefes, líderes, costumes culturais, entre outros.

Para França e Rodrigues (2007), esta forma de aprendizado ocorre até o fim

da vida, em experiências ininterruptas que reforçam certas atitudes e padrões

comportamentais por meio de gratificações ou pela inibição ou supressão destas

mesmas atitudes e padrões comportamentais por punições e frustrações. Os autores

enfatizam que há figuras-chave como pais, professores, líderes formais e informais

que cumprem um importante papel, ao ensinar aquele indivíduo a agir como elas,

não só naquele momento, mas também no futuro.

Nesse sentido, as experiências serão incorporadas pela pessoa e passarão

a fazer parte dela, da sua personalidade. Todavia, grande parte desse processo é

inconsciente, então:

► potencial genético + personalidade das figuras-chave =

comportamento do ser humano.

Dessa forma, o ser humano é considerado um ser social e histórico e suas

ações não podem ser consideradas isoladamente. Como cada acontecimento social

ocorre em função de padrões de comportamento que são determinados pela

personalidade das pessoas que estão envolvidas pelas regras culturais e hábitos

previamente assimilados e que determinam o que deve ou não ser feito ou realizado.

Dessa maneira, como a Psicossomática parte do pressuposto que a saúde e

a doença são estados que resultam de um equilíbrio harmônico ou uma desarmonia

(desregulação) dos campos biológico, psicológico e social. Esta última dimensão

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adquiri fundamental importância ao influenciar as demais, já que favorecerá ou não

as atitudes do indivíduo, a percepção de suas possibilidades, modo de se relacionar,

forma de ver o mundo, processos mentais, atividades psíquicas, processos afetivos,

maneira de lidar com o corpo, entre outras.

Um conceito importante a ser trabalhado na área da Psicossomática é o do

holismo, do qual holístico provém. O termo origina-se da palavra grega “holos”, que

significa todo. Introduzida por Smuts, no ano de 1926, a expressão designa a

natureza biopsicossocial do homem, incluindo aspectos da saúde e doença, sendo

que o estudo, a pesquisa e o tratamento devem, sempre, levar em consideração a

pessoa em sua totalidade e não as partes isoladas. Como já vimos, essa noção é

tão antiga quanto a Medicina. Em uma passagem do diálogo de Platão chamado

Charmides, ele argumenta que:

A cura de muitas doenças é desconhecida para os médicos de Hellas (nome que se dava ao atual país da Grécia), porque eles desprezam o todo, que deve também ser estudado, porque a parte nunca pode estar bem, a menos que o todo esteja bem.

Esta afirmação mostra que a Medicina, desde o princípio, luta com o

problema mente-corpo e que alguns estudiosos, como o filósofo Platão, propunham-

se a olhar o indivíduo de forma integral. Entretanto, esta tarefa não tem sido fácil em

razão da visão biomédica ainda em voga no mundo ocidental.

Por meio da Psicossomática pode-se averiguar e encontrar caminhos para a

prática na promoção de saúde mais voltada para o paciente. Afinal, como apontam

França e Rodrigues (2007), não chegam para a consulta um fígado, um estômago

ou um coração, mas sim uma pessoa, que está em sofrimento, que pode estar

sendo expresso por seus órgãos. Neste sentido, constantemente, seu adoecimento

está relacionado com a sua condição e modo de vida (dimensão social). Nas

palavras dos autores: “no corpo humano estão as marcas de sua história, de seu

esforço, de suas perdas e de suas vitórias. Assim o ser humano é seu corpo e não

apenas tem um corpo” (FRANÇA E RODRIGUES, p.87).

Qualquer pessoa no transcorrer de seu desenvolvimento, constrói e

estrutura modos de ser e reagir às mais diferentes solicitações as quais é impelido a

agir (tanto no nível mental como corpóreo) com o sentido de manter seu organismo

equilibrado.

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A pessoa é o resultado das inúmeras experiências a que foi submetida no

decorrer de sua história. Ao reagir às diversas situações da vida, estas provocam

marcas e modificam o corpo. O intuito da abordagem Psicossomática é compreender

os processos de adoecimento como uma resposta do ser humano que vive em

sociedade e é parte ativa de uma microestrutura familiar, que está dentro de uma

macroestrutura social e cultural, situada em um determinado ambiente físico e que

procura dar um significado (variando a maneira conforme a pessoa) a sua existência

no mundo. Observe o diagrama abaixo:

FIGURA 10 - REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO SER HUMANO

IMERSO NA MICROESTRUTURA FAMILIAR E NA MACROESTRUTURA

SOCIOECONÔMICA-CULTURAL

FONTE: Sampaio, Galasso, Ribeiro. Reproduzido do livro Stress e Trabalho, uma abordagem Psicossomática.

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7 REFERENCIAIS TEÓRICOS EM PSICOSSOMÁTICA

Primeiramente, é importante ressaltar que o conceito mais amplo de

Psicossomática implica na existência de um referencial teórico que estude o

psiquismo. Sendo assim, pode ser psicodinâmico, comportamental, existencial,

analítico, entre outros. Além de uma abordagem psicológica, há a necessidade de

um referencial teórico que estude a dinâmica grupal e social do indivíduo, que pode

ser sociológico, antropológico, cultural, entre outros.

Ao juntar uma teoria que estude o corpo, outra que estude a mente, mais

uma que leve em consideração o estudo do grupo, há uma visão psicossomática. A

partir disto, começa-se a ter particularizações, ou seja, várias composições de

referenciais possíveis. Com uma teoria para o fato biológico, outra para o psicológico

e outra para o social, tem-se uma concepção de Psicossomática montada.

Independente do referencial teórico é de fundamental importância para

aquele que quer atuar em Psicossomática que este obtenha conhecimento sobre a

anamnese biográfica (a história de vida) do sujeito que está tratando. Nela devem

estar inclusos alguns itens como:

Antecedentes pessoais: aquilo que sabe a respeito do histórico familiar e

sobre a sua gestação.

Condições de nascimento.

Alimentação: o que, como e onde se alimenta e se houve ou não mudanças.

Sono: qual é o padrão de horas e a qualidade do sono.

Desenvolvimento Neuropsicomotor.

Escolaridade.

Religiosidade: como lida com questões que transcendem a ele.

Doenças: investigar desde a infância, se são agudas ou crônicas e o quanto

afetam a qualidade de vida do indivíduo.

Sexualidade.

Sociabilidade.

Cuidados pessoais, entre outros.

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A proposta da Psicossomática é um exercício de integração dos mais

variados referenciais teóricos com a meta de atingir um objetivo maior que é a

compreensão do ser humano. Entretanto, esta compreensão não está simplesmente

em somar pedaços, mas sim em entender o organismo como um sistema que

funciona de forma integrada e dinâmica, com movimentos que se transformam

ininterruptamente. Todos os dados citados devem ser compreendidos junto com os

motivos que levaram o paciente a buscar uma consulta. De acordo com a

Psicossomática, o ser humano deve ser compreendido como o resultado da

intersecção entre corpo (dimensão biológica), mente (dimensão psicológica) e meio

externo com seus aspectos socioculturais e físicos. Observe o diagrama abaixo:

FIGURA 11 - ALTERAÇÃO DO CORPO, DOS PROCESSOS MENTAIS E

DO MEIO EXTERNO

FONTE: Sampaio, Galasso, Ribeiro. Reproduzido do livro Stress e Trabalho, uma abordagem Psicossomática.

8 ATUAÇÃO PROFISSIONAL EM PSICOSSOMÁTICA

Ao se aprofundar nos estudos sobre Psicossomática, com suas concepções

biopsicossociais e modo holístico de se abordar as dimensões de saúde e doença é

muito comum achar que o profissional que trabalha nesta abordagem é capaz de

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resolver todos os tipos de problemas. Entretanto, como destaca Riechelmann

(1998), a Psicossomática não pressupõe que o profissional tenha um conhecimento

de todas as especialidades. Segundo o autor, é importante entender que há dois

procedimentos básicos em qualquer profissão ligada à saúde: o de compreender/

diagnosticar e o de intervir/proceder. Neste sentido, a Psicossomática é, antes de

tudo, algo que amplia a habilidade do procedimento que envolve a compreensão e o

diagnóstico. Consequentemente irá ocorrer uma ampliação na capacidade da

intervenção enquanto profissional, porém não no nível que concerne à tecnologia

especializada. Ou seja, o profissional que compreende seu paciente de modo mais

holístico, no momento de intervir, continua apenas habilitado na especialidade em

que foi treinado.

É importante ressaltar que na hora de compreender um paciente, o

profissional precisa estar atento ao que ele precisa, qual é a sua real demanda,

buscando enxergá-lo como um todo, pois a pessoa adoecida está imersa em um

contexto. Somente assim e tecnicamente preparado na especialidade, pode-se

intervir com maior clareza.

O profissional que atua em Psicossomática necessita saber seus limites

técnicos e éticos no momento de atuar, providenciando encaminhamento para

outros profissionais que darão conta daquilo em que ele não é especialista.

Riechelmann (1998, p. 26) acredita que há uma “vocação multiprofissional e

interdisciplinar do trabalho psicossomático”, visto que o diálogo e a interação com as

demais especialidades são importantíssimas quando foca-se em uma compreensão

mais holística.

Quanto ao mercado de trabalho, pode-se dizer que lentamente tem surgido

um espaço maior para a Psicossomática, já que na prática os profissionais da área

de saúde e administradores hospitalares (por meio da diminuição de custos)

observaram que, quando é oferecido um tratamento para esta abordagem, aumenta-

se o grau de resolução das enfermidades.

Riechelmann (1998) expõe que ao se calcular o número de consultas que

são necessárias entre um determinado diagnóstico e o término de um tratamento,

observa-se que o profissional que trabalha psicossomaticamente chega a um

diagnóstico e estabelece um tratamento terapêutico que possibilita alcançar

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resultados práticos com um número menor de consultas. Além disto, o autor

comenta:

Por ser mais demorada, a consulta na linha da Psicossomática deve ser melhor remunerada pelas empresas de convênio médico do que a consulta tradicional; mesmo assim, a despesa para quem paga a conta acaba sendo menor, em função do reduzido número de consultas, exames de laboratório e exames de imagem (RIECHELMANN, 1998, p.32).

Ou seja, o atendimento que trata do paciente psicossomaticamente colabora

tanto para uma maior eficiência no diagnóstico da pessoa enferma quanto para

aliviar seu quadro de somatização. O resultado é uma maior satisfação do paciente

desde os primeiros atendimentos, já que as suas demandas implícitas e subjetivas

são detectadas e passam a receber um cuidado profissional.

Na década de 1990, uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da

Saúde, abrangendo os cinco continentes, avaliou o grau de comprometimento

emocional envolvido na patologia de pacientes que procuravam hospitais gerais e

prontos-socorros. Na América do Sul, o local escolhido para a realização da

pesquisa foi o Rio de Janeiro. Os pacientes buscavam apenas uma consulta médica

convencional, não possuindo a priori qualquer ideia a respeito de questões

emocionais que pudessem estar envolvidas na sua patologia. O resultado da

pesquisa mostrou que 30% na média mundial e 40% dos entrevistados no Rio de

Janeiro eram pacientes somatizados. São, portanto, pacientes que passaram por

diversos departamentos hospitalares, realizaram vários exames a acabavam

apresentando resultado normal em suas avaliações laboratoriais, radiológicas,

ultrassonográficas e clínicas.

Dentro deste panorama, observa-se que um terço dos pacientes que

buscam tratamento em hospitais gerais e prontos-socorros, somatizam e, este

mesmo número realiza um alto número de consultas e exames, além de,

provavelmente serem operados de forma abusiva. Com isso, há uma despesa com

procedimentos médicos que pode vir a superar o total de despesas dos outros dois

terços, já que cada paciente somatizado repete os mesmos procedimentos médicos

várias vezes.

Paralelamente, é importante ressaltar que a formação dos profissionais da

área da saúde, muitas vezes, tem que priorizar em atender de acordo com as

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necessidades do mercado, ou seja, realizar consultas rápidas e exames laboratoriais

para garantir seu sustento.

Os profissionais que trabalham com psicossomática são, então, vistos pelo

mercado como uma alternativa de aumento de resolução com barateamento de

custos para a prática médica. Entretanto, a psicossomática ao ser vista como uma

prática “fast-food”, principalmente, pelas empresas médicas, pode vir a prejudicar o

profissional da área, que acaba recebendo propostas de trabalho que incluem fazer

um diagnóstico rápido e sendo mal remunerado por isso. Além de afetar os

pacientes em grande escala em função de um atendimento deficitário pelo

profissional insatisfeito.

Riechelmann (1998) cita que um profissional de psicossomática, com o

decorrer dos anos, desenvolve uma fácil compreensão dos conteúdos emocionais

que ocultam por trás das queixas físicas. O problema não é o tempo externo de

quanto dura a consulta, mas sim o tempo interno do profissional ► o espaço dentro

dele que está aberto e disponível para receber a pessoa do paciente, que envolve

sua percepção e sensibilidade durante a consulta para captar do paciente conteúdos

emocionais que estão escondidos pelas queixas físicas. Tal tempo interno resulta de

um treinamento e de uma habilitação em Psicossomática e é importantíssima na

atuação de profissionais da área da Psicologia e Psiquiatria.

9 A FORMAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MEDICINA

PSICOSSOMÁTICA E REFLEXÕES SOBRE A ÁREA DE ATUAÇÃO EM

PSICOSSOMÁTICA

Foi fundada em 11 de setembro de 1965, pela iniciativa de uma comissão

organizadora formada por profissionais de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande

do Sul, entre eles: Abram J. Eksterman (RJ), Danilo Perestrello (RJ), Helláido

Franscisco Capisano (SP), José Fernandes Pontes (SP), Milton Pecis Abramovich

(RS), Oswaldo Arantes Pereira (RS), Precila Pinheiro (RS) e Wilhelm Kenzler (SP).

Em seus dez primeiros anos, a presidência desta associação foi ocupada

por Danilo Perestrello, autor de um dos livros mais usados como referência na área

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da Psicossomática no Brasil, chamado “A Medicina da Pessoa”, o qual é altamente

recomendado para todos aqueles que estão interessados em tomar contato com o

tema e se aprofundar em seu estudo.

Segundo Riechelman (1998), o desenvolvimento da ABMP se deu em

virtude dos seguintes objetivos:

Difundir a visão psicossomática de ser humano.

Divulgar o processo de saúde e doença como forma de humanizar o

atendimento médico no Brasil.

Apoiar, desenvolver, facilitar e divulgar pesquisas na área da medicina

psicossomática.

A associação hoje se caracteriza por uma atuação multiprofissional,

contando com: médicos de quase todas as especialidades, psicólogos com

diferentes abordagens, enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas,

fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, entre outros.

Segundo Mello Filho (2003), a história da ABMP pode ser considerada

vitoriosa, entretanto como grande parte das organizações institucionais enfrentou

crises, dificuldades e passou por fases de pouca produção. Tais fatos repercutiram

em críticas e reflexões sobre o seu desenvolvimento, bem como seus acertos e

erros.

Como já mencionado, a ABMP foi fundada por renomadas figuras da área

médica advindas de Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, que se juntaram a

importantes figuras de outros Estados, como Minas Gerais e Pernambuco, entre

outros. Para Mello Filho (2003), Perestrello e Eksterman e Capisano e Miller foram

as grandes personalidades que incentivaram o movimento da Psicossomática no

Brasil, permitindo criar a Associação. Refere que a capacidade organizacional de

Eksterman permitiu à Psicossomática tornar-se uma entidade física. Pouco depois

da sua fundação, o próprio autor entrou para a ABMP. Dessa forma, considera-se

que Psicossomática nasceu sob a base de uma amizade.

Vale ressaltar que, em São Paulo, surgiu outro grupo muito ativo com os

mesmos objetivos, liderado por Fernandes Pontes, que atua em clínica geral e é

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Professor de Medicina. É interessante assinalar que todos os profissionais que

compunham ambos os grupos eram professores de Medicina e/ou psicanalistas.

Conforme Mello Filho (2003), o primeiro problema que se apresentou foi a

dificuldade na relação entre os dois grupos de São Paulo, situação esta que

começou a melhorar após o Congresso no Rio de Janeiro, em 1982. Após este

evento, o movimento se estruturou nas duas grandes capitais e, em seguida, em

Porto Alegre com mais intensidade.

A ABMP, em virtude da formação dos profissionais que a compunham,

iniciou-se sob a influência da Psicanálise, inspirada pelas concepções

(anteriormente mencionadas) de Freud sobre a histeria de conversão.

Enfatiza-se que o movimento de divulgação dos estudos da Psicossomática

foi iniciado na Psicanálise, pois na época somente esta possuía e propunha uma

compreensão mais global da doença, além de fornecer instrumentos como a

psicoterapia para a prática clínica.

Ainda hoje, as teorias psicanalíticas continuam em voga na psicossomática

institucional, como é o caso da Escola de Psicossomática de Paris (IPSO).

Mello Filho (2003) aponta que com a finalidade de combater uma visão

fortemente psicanalista que “rotulava” pacientes que apresentavam determinadas

doenças, como por exemplo, pessoas com doenças musculoesqueléticas eram

arrogantes, o autor e o Dr. Abram e J. Eksterman, para evitar o efeito negativo que

estas ideias poderiam ter nos psicólogos, opuseram-se à divulgação de palestras,

congressos e outros eventos provindos do Dr. Chiozza, de Buenos Aires, que era o

principal promotor destas concepções.

Outras abordagens também merecem destaque pela sua difusão, entre elas

a Psicossomática Junguiana, a qual tem como precursora a Dra. Denise Gimenez

Ramos, no Brasil. Segundo Ferreira (2004), a Dra. Denise desenvolveu e introduziu

no país um estudo de modelo psicológico em que os fenômenos devem ser

observados como totalidades dinâmicas, evolucionárias e criativas dentro de uma

concepção entre a problemática psique-corpo, situando-a no modelo científico-

holístico da Psicossomática Junguiana.

O próprio Mello Filho (2003) cita que o objetivo maior do movimento da

Psicossomática é conquistar cada vez mais médicos em todo o mundo. Acredita-se

que os estudos das teorias psicossomáticas funcionavam como uma espécie de

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complemento do curso médico, possibilitando uma formação integral do médico,

visto que os cursos de medicina dominados ainda permeados por uma visão

fortemente biomédica não ofereciam. Dentro das próprias universidades surgiram as

disciplinas de Psicologia Médica para auxiliar a questão.

Observa-se que, antes da década de 1980, os médicos eram seguidos

tradicionalmente pelos psicólogos e enfermeiras. Os demais profissionais de saúde,

não existiam como uma classe atuante no movimento; os dentistas e assistentes

sociais, apesar de serem categorias organizadas funcionavam tradicionalmente

apenas como apêndices médicos.

Apesar da abertura para estudos que tentavam reintegrar a ideia de mente-

corpo, todavia na medida em que a classe médica foi sendo sucateada pela

previdência, Ministério da Saúde ou rede conveniada, não houve mais interesse em

se melhorar a relação médico-paciente (uma das propostas da Psicossomática),

passando o profissional a atender em consultas com duração de apenas dez

minutos. Desse modo, poucos profissionais trabalhavam dentro de uma perspectiva

psicossomática.

Mello Filho (2003) relata que já teve grupos com 40 pessoas na UFRJ, na

década de 60, possui dificuldades para formar turmas que possuam interesse em se

aperfeiçoar na área da Psicossomática. Destaca que os enfermeiros estão

procurando cada vez mais estudar o tema. Para ele, os enfermeiros estão se

afirmando como classe, libertando-se do domínio que os acorrentava aos médicos,

estão a cada dia mais tratando seus pacientes como pessoas globais e interessados

pelos aspectos psicológicos de suas práticas. Atualmente, percebemos este

movimento pelo alto número de pesquisas realizadas pela classe que envolvam

temas relacionados com a Psicologia.

Quanto aos psicólogos, Mello Filho (2003) coloca que a maioria ingressou na

Sociedade de Psicologia Hospitalar, criada ao perceberem que tinham diante de si

uma imensa casuística de pacientes psicossomáticos ou somatopsíquicos para

tratar. A área da Psicologia Hospitalar tem crescido rapidamente, promovendo

diversos cursos e congressos pelo Brasil, além de programas científicos de

qualidade.

Há um imenso campo em comum entre a Medicina e a Psicologia, sendo

necessária uma abertura de diálogo entre ambas como entidades com muitos

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pontos de intersecção. Além dos outros campos profissionais que ainda não se

organizaram como entidades psicossomáticas, mas que podem colaborar

imensamente com o movimento, como os enfermeiros, assistentes sociais,

odontólogos, fisioterapeutas e fonoaudiólogos. Somente desta forma, irá se

concretizar o ideal de transformar o movimento em verdadeira prática interdisciplinar.

Mello Filho (2003) salienta que para o fato de que, de modo geral,

profissionais como ele, que são altamente atuantes na área da Psicossomática,

considerados por muitos como líderes, possuem personalidades narcísicas atuando

dentro de um movimento no qual o narcisismo só atrapalha. No seu ponto de vista,

todos que atuam nesta área precisam desenvolver muito senso de fraternidade e

humildade para realizarem suas intenções com sucesso. Neste sentido, todos os

psicossomaticistas devem procurar sempre refletir sobre os erros e acertos de suas

condutas, reconhecendo e modificando os erros e aprendendo com os acertos, para

que estes surjam também em outras circunstâncias. Acima de tudo, reconhecer o

quanto se aprende com os pacientes e com os alunos, que têm muito a contribuir

com uma visão abrangente sobre os assuntos.

Mello Filho (2003) discorre também sobre a estrutura da ABMP. Explica que

para facilitar a gestão, há um deslocamento da sede nacional para a cidade do

presidente eleito, que funciona em consonância com o esqueleto que a sustenta, as

regionais. De um modo geral, o presidente é aquele que mais se destaca, eleito por

aclamação. Esse compõe uma diretoria com representantes dos vários Estados e

com uma parte administrativa formada por nomes locais. A eleição é realizada

bianualmente, na vigência de um congresso nacional que representa o ponto

técnico-científico mais alto do movimento. A maioria dos presidentes foram médicos,

pois as demais categorias estão ainda pouco representadas na ABMP, com exceção

dos psicólogos.

A princípio, o movimento organizava-se somente por meio da Diretoria

Nacional, mas com sua expansão, houve necessidade da fundação de seções

regionais que possibilitassem a construção de sedes extras nos diversos Estados e

cidades do Brasil. Além do Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, as primeiras

regionais fundadas foram em Salvador e Presidente Prudente, por Abram

Eksterman.

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Na presidência de Mello Filho, as regionais de Belém do Pará, São Luiz,

Recife, Vitória, Londrina e Goiânia foram extintas. Frente à presidência da Regional

do Recife, Samuel Hulak, organizou uma rede de regionais por todo o nordeste,

abrangendo Fortaleza, João Pessoa, Maceió, Aracaju e Natal esta última por um

trabalho realizado por José Roberto Siqueira de Castro. Hulak também organizou o

primeiro grande Congresso Nacional da ABMP em 1998, no Recife.

Outra poderosa seção regional está localizada em Minas Gerais, em Belo

Horizonte, gerada à custa da liderança de Geraldo Caldeira. Lá, ocorre um

importante curso de formação em psicossomática e Caldeira tem um importante livro

publicado sobre nossa matéria. Minas Gerais tem ainda duas outras regionais, a Sul

Mineira, dirigida por Cacilda Maciel, com sede em Itajubá e a de Barbacena, sob a

liderança de Sebastião Vidigal.

A fundação de regionais depende imensamente da capacidade de liderança

de um profissional de saúde em determinada cidade, de sua possibilidade de

aglutinar pessoas e de organizar um ideário científico que mantenha estas pessoas

unidas e em contínua participação. De modo frequente, há um núcleo dirigente em

torno de cinco pessoas que organiza e sustenta o movimento. Este flutua muito em

torno da vida pessoal do presidente e do núcleo dirigente, sendo vulnerável às crises

e mudanças desse contexto. Possivelmente, estas são as maiores dificuldades que

o movimento vem enfrentando, as flutuações das regionais. Em contrapartida, a

direção nacional flutua com menos intensidade, pois seus membros, segundo Mello

Filho (2003) são mais preparados para lidar com as contingências pessoais, grupais

e ideológicas do movimento.

Um dos principais problemas apontados pelo autor é a dificuldade de

comunicação entre a sede nacional e as regionais. Menciona que no que se refere

ao convívio institucional, há três entidades coirmãs: a Psicologia, a Psiquiatria e a

Psicanálise. Com a Psicologia hospitalar, acredita que as carreiras são atualmente

paralelas e precisa apenas haver mais interpretação. Já a Psiquiatria criou

recentemente a chamada Interconsulta Psiquiátrica, fazendo com que alguns nomes

da ABMP migrassem para exclusivamente esta área. Quanto à Psicanálise, parece

que ainda há uma maior distância, visto que, na maioria das vezes, não reconhece a

amplitude do movimento psicossomático. É preciso haver um real debate sobre esta

situação de “irmãos” distantes num mesmo espaço contíguo. A fim de diminuir esta

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distância, foi criado o Conselho de ex-presidentes, órgão consultivo da Diretoria

Nacional que opina em todas as decisões importantes, desde a escolha de nomes

até nos impasses institucionais, e durante as eleições. Antes da criação do Conselho

de ex-presidentes, assim que um presidente terminava sua gestão, esta permanecia

em uma espécie de limbo, ou seja, ficava meio dentro, meio fora do movimento.

Hoje, não há mais nomes “aposentados” no movimento, pois há a ideia de

aproveitar a experiência, a sapiência e a criatividade destes. A cada dois anos são

realizados congressos intercalados com encontros de regionais em diferentes

localidades do Brasil com o intuito de promover disseminação do movimento.

Não há como negar como o movimento de psicossomática pulverizou-se

entre os psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, enfermeiros, homeopatas,

acupunturistas, terapeutas corporais, entre outros.

Contudo, a divulgação e a disseminação do movimento, continua na maior

parte por meio dos livros publicados por médicos como: “A Medicina da Pessoa”, de

Danilo Perestrello; “Concepção Psicossomática e Psicossomática Hoje”, de Júlio

Mello Filho e “Psicossomática: Teoria e Prática”, de Geraldo Caldeira.

Os congressos realizados pela ABMP têm como foco apresentar temas a

serem esmiuçados e temas secundários, que abrangem os principais tópicos da

psicossomática na atualidade. Uma parte importante de cada congresso é dedicada

à apresentação de temas livres.

Mello Filho (2003) situa que em virtude da preocupação com a questão da

divulgação do movimento e com a ideologia predominante na Associação já há

muitos anos os dirigentes têm se reunido para discutir este problema. Para

sancionar a dificuldade, foi então constituída uma comissão presidida por Eugênio

Campos, que elaborou uma proposta de criação de um Curso Básico Nuclear (CBN).

O curso é oferecido às regionais, privilegiando o modelo interdisciplinar como

ideologia e prática. O ensino de psicossomática é feito basicamente por meio do

estudo de casos clínicos, privilegiando as dimensões biológica, psicológica e social,

por meio da atuação de um médico, um psicólogo e um assistente social.

Outro tema que tem sido muito debatido nos últimos anos é o nome do

movimento, as designações propostas no debate são: Associação Brasileira de

Psicossomática e Associação Brasileira de Medicina Psicossomática e Psicologia

Médica. No primeiro objetivava-se excluir o nome Medicina para facilitar as relações

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com outras áreas. E, no segundo, adicionar Psicologia Médica, considerada um

importantíssimo campo de atividades. Contudo, foi decidido que a mesma

nomenclatura seria mantida. A justificativa foi continuar mantendo a já conhecida

identidade. Assim, apesar de ainda ser uma entidade pequena, o movimento

difundido pela ABMP vem caminhando com diretorias comprometidas, dinâmicas e

empreendedoras na área da Psicossomática.

FIM DO MÓDULO II