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PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação
CURSO DE
PSICOSSOMÁTICA
Aluno:
EaD - Educação a Distância Portal Educação
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CURSO DE
PSICOSSOMÁTICA
MÓDULO II
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MÓDULO II
3 O DESENVOLVIMENTO DO CONCEITO DE PSICOSSOMÁTICA II
(CONTINUAÇÃO)
Em virtude do desenvolvimento da psicanálise, até o final da década de
1940, grande parte dos pesquisadores de psicossomática baseou seus estudos
nesta abordagem. Um dos exemplos de grande destaque foi a formação da Escola
de Chicago, por Franz Alexander e Thomas French.
Alexander foi influenciado pela abordagem psicanalítica e da psicologia da
Gestalt, além dos estudos da neurologia e da endocrinologia. O diretor da Escola de
Chicago desenvolveu a ideia de especificidade da doença, o que significa que uma
resposta fisiológica a um estímulo emocional varia conforme a natureza do estado
emocional que a desencadeou. Nesse sentido, haveria uma especificidade orgânica
influenciada por uma força psicológica propulsora, o que levaria cada doença a
corresponder a um quadro emocional ou a um tipo de personalidade. Alexander
delineou sete doenças, que ficaram conhecidas mais tarde como psicossomáticas,
mas na sua concepção toda doença é psicossomática, visto que fatores emocionais
influenciam todos os processos do organismo, por meio das vias nervosas e
humorais (ALEXANDER, 1923/1989).
Considerado por muitos estudiosos como seguidor de um modelo linear,
causal e redutivista, Alexander realizou descrições e análises clínicas bastante
significativas, que contribuíram de modo expressivo para a área da psicossomática.
A partir dos trabalhos realizados por Spitz, em 1950, contatou-se a influência
que a ausência da figura materna exercia no plano da psicopatologia, e verificou-se
que essa ou outras ausências são sentidas no psiquismo, aumentando a disposição
do indivíduo à doença.
Outra importante instituição dentro dos preceitos psicanalíticos que merece
destaque é a Escola Psicossomática de Paris, criada em 1962. Representada por
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Pierre Marty, Michel M´Uzam e Christian David, com a finalidade de formar
psicossomaticistas, promover a pesquisa e fornecer atendimento clínico. Estes
estudiosos partiam do pressuposto de que os pacientes psicossomáticos
apresentavam as seguintes características:
I) Escassa dificuldade de simbolizar;
II) Sonham pouco ou seus sonhos são demasiadamente concretos;
III) Pouca elaboração psíquica;
IV) Pensamento tipo operatório aprisionado no concreto;
V) Atitudes pragmáticas (baseadas na prática).
Desse modo, considera-se que este paciente tinha pouca ligação com seu
inconsciente, despontando em uma incapacidade de simbolizar, tornando-se
vulnerável a qualquer estresse e, como consequência, seu organismo poderia reagir
com uma doença somática. Conforme Ramos (2006), para esses estudiosos, as
doenças orgânicas necessitam de sentido e quando não há significado simbólico, há
uma incompatibilidade entre doenças psíquicas e orgânicas.
O objetivo inicial desses teóricos era compreender as patologias somáticas
cuja dinâmica não correspondiam ao modelo da conversão histérica, utilizando o
conceito psicanalítico de neurose atual. Entretanto, gradualmente foi se
desenvolvendo um corpo clínico e teórico que considera a sintomatologia a partir da
ideia de que um menor grau de atividade mental corresponde a uma maior
vulnerabilidade somática. Diante de um traumatismo, por exemplo, um indivíduo que
apresenta uma atividade mental pouco desenvolvida não teria recursos mentais
suficientes para lidar com o excesso de estimulação, então haveria uma
desorganização psíquica que passaria a atingir as funções somáticas, menos
evoluídas.
Em 1970, surge a Escola de Boston sob os cuidados de dois psicanalistas
americanos: Sífneos e Nehemiah, que desenvolvem uma opinião semelhante a dos
pesquisadores da escola francesa. Para Sífneos e Nehemiah (1970), os pacientes
psicossomáticos eram alexitímicos, ou seja, incapazes de nomear ou expressar
sentimentos em razão da incapacidade de reconhecê-los. Dessa maneira, por meio
de observações, estes autores consideraram que os pacientes com doenças
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psicossomáticas, apresentavam uma desordem específica nas suas funções afetivas
e simbólicas, acarretando uma forma de se comunicar confusa e improdutiva.
Apesar do importante estudo realizado pelos autores, sua aceitação tem sido
restrita, já que contraria a maioria das observações clínicas feitas por diversos
profissionais. Santos e Otelo (1992), por exemplo, citam que na prática veem-se
manifestações psicossomáticas em histéricos, obsessivos e psicóticos, sendo que os
sintomas psicossomáticos possuem cadeias associativas significativas tanto nos
neuróticos quanto nos delírios psicóticos.
Ramos (2006) acredita que a questão da conceituação psicanalítica no
estudo da psicossomática implica em trabalhar com o símbolo apenas no plano
verbal, isto é, abstrato. Na visão da autora, a Escola Psicossomática de Paris, ao
considerar que as somatizações não possuem significação simbólica, sinalizando
apenas uma disfunção, perde contato com o trabalho com o inconsciente e cria uma
dificuldade técnica. Neste contexto, Marty (1990) apresenta aos psicanalistas um
trabalho terapêutico com técnicas de relaxamento para pacientes com tendência a
somatizar.
Segundo McDougall (1986,1989), os pacientes alexitímicos são normopatas,
o que quer dizer que para se adaptar usam uma normalidade falsa, não
verdadeiramente afetiva. Para esta psicanalista, grande parte dos pacientes
orgânicos não se enquadra nesta categoria.
Nota-se que muitos conceitos e concepções sobre a psicossomática foram
desenvolvidos sem que se criasse um corpo coerente que reunisse ou possibilitasse
um nexo entre a teoria e a prática terapêutica.
Mello Filho et al. (1992) aponta que três fases foram de suma importância
para a evolução da psicossomática:
I) Fase inicial ou psicanalista → refere-se à origem inconsciente das
enfermidades, além das teorias da regressão e sobre os benefícios secundários do
adoecer, entre outros.
II) Fase intermediária ou behaviorista → que se distingue das demais
pelo estímulo à pesquisa em homens e animais com o intuito de enquadrar os
achados à cientificidade exata e dando estímulo aos estudos sobre estresse.
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III) Fase atual ou multidisciplinar → que pretende dar foco ao social e à
visão da psicossomática como uma atividade fundamentalmente de interação e de
interconexão entre vários profissionais de saúde.
Atualmente, não encontramos uma teoria abrangente ou unificadora. Os
modelos vigentes ainda seguem predominantemente o paradigma biomédico. Sendo
assim, o conceito de psicossomatização, todavia, se encontra atrelado a este
paradigma, o qual pode ser resumido da seguinte maneira: o organismo funciona
como uma máquina que deve ser analisada e reduzida em pequenas partes. Psique
e corpo mantêm uma relação causalista e determinista, sendo possível separá-las
de forma objetiva. Saúde é considerada como ausência de doença, a qual é
explicada como um mau funcionamento de mecanismos biológicos e ou
psicológicos.
4 A PSICOSSOMÁTICA NOS DIAS ATUAIS
Em contrapartida, com o progresso da Medicina Molecular, da
Neurobiologia, da Genética e da aplicação da teoria quântica na Biologia o modo de
ver a relação corpo-mente está sendo continuamente ampliado, promovendo uma
nova reflexão sobre saúde e doença.
Impulsionado pelo desenvolvimento de várias áreas científicas, como a
Física, Química, Biologia e Psicologia, a visão de mundo está se aproximando
paulatinamente de um princípio mais holístico, termo que designa como descrito por
Weil (1990), a totalidade em que o universo seria um conjunto em constante
formação abrigando diferentes níveis como: ideológico, biológico e psicológico que
se influenciam mutuamente.
Atualmente, no campo da psicossomática encontramos algumas publicações
que buscam integrá-la em uma nova definição. Para Lipowiski (1984, p. 167):
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Psicossomática é um termo que se refere à inseparabilidade e interdependência dos aspectos psicológicos e biológicos da humanidade. Essa conotação pode ser chamada de holística, na medida em que ela implica uma visão de ser humano como uma totalidade, um complexo mente-corpo imerso num ambiente social.
Na ótica de Capra (1982), uma abordagem de embasamento holístico na
saúde, no tratamento e na cura está de acordo com pensamentos e paradigmas
mais tradicionais, bem como é coerente com as teorias científicas modernas.
Se na Medicina e na Psicologia, até pouco tempo o conceito de
psicossomática era empregado para se referir a uma doença sem um diagnóstico
claramente orgânico, seu uso atual foi modificado. Hoje, o termo diz respeito a uma
interdependência fundamental entre mente e corpo em todos os estágios que
contemplem a doença e a saúde. Considera-se um reducionismo e mesmo uma
ingenuidade tratar uma doença como de origem apenas psicológica ou puramente
orgânica. Há, portanto, uma tendência a considerar qualquer enfermidade como
psicossomática, visto que elas envolvem e inter-relação entre corpo e mente na
origem, desenvolvimento, tratamento e cura.
LeShan (1992), um importante pesquisador da área, principalmente da
relação da psicossomática com o câncer, descreveu três princípios que apoiam a
Medicina psicossomática atual:
I) O indivíduo existe em muitos níveis ou domínios, todos de similar
importância. Dividir o ser humano em corpo, mente e espírito é mais
comum no Ocidente.
II) Cada pessoa é um ser único e deve ser tratado como tal.
III) Aquele que está doente deve ser encorajado a ter autonomia no processo
de cura.
Com base nestes três princípios, os profissionais da área da saúde podem
favorecer a criação de um ambiente em que despontem as capacidades do indivíduo
de se autocurar. Por outro lado, esses princípios podem produzir uma
supervalorização dos processos que ocorrem no sistema imunológico, criando
novamente um recorte quando fora de uma concepção biopsicossocial.
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Em vista de todos os pontos aqui levantados, nota-se que uma nova síntese
faz-se necessária. Ao reaver antigos conceitos, práticas, técnicas e métodos, o
modelo holístico procura integrá-los no mundo contemporâneo.
5 PSICOSSOMÁTICA: UMA DEFINIÇÃO
Para Riechelmann (1998), a psicossomática está inserida em dois campos, o
filosófico, pois envolve uma visão de ser humano, com um modo de defini-lo, e o
científico, visto que considera como objeto os mecanismos de interação entre as
dimensões mentais, corporais e sociais da pessoa. A integração biopsicossocial,
como afirma o autor, é objeto da Ciência Psicossomática.
Há ainda, a Psicossomática enquanto atuação profissional, que busca o
trabalho com os aspectos subjetivos e objetivos do paciente. Ressalta-se neste
sentido que ela se difere da postura clássica da Psicologia, a qual foca seu trabalho
nas questões subjetivas e diferencia-se igualmente da Medicina, que comumente
considera os fatos objetivos, palpáveis e mensuráveis.
O profissional que trabalha com a Psicossomática, portanto, deve estar
atento às vertentes objetivas e subjetivas do paciente ao mesmo tempo, sem
priorizar nenhuma delas em detrimento da outra. Enquanto prática clínica,
encontramos na Psicossomática um conjunto teórico que se aproxima dos
conteúdos das disciplinas como: Psicologia Médica e Psicologia Hospitalar.
Riechelmann (1998) afirma que a Psicossomática não é, e nem pretende
ser, uma medicina alternativa, afinal a prática médica alternativa possui
pressupostos teóricos diferentes dos princípios teóricos da ciência convencional. O
autor enfatiza que a Psicossomática se baseia em princípios teóricos que estão
inseridos na dita ciência convencional. Ao compreender que a Medicina nasceu da
Psicossomática, e não o contrário. Assim, a Psicossomática nada mais é que a
Medicina convencional resgatando a sua origem.
Como já mencionado, Hipócrates, o “pai da Medicina”, apesar de não dar
muito valor à fala dos pacientes, considerava, ao descrever uma doença como a
úlcera, por exemplo, esta ser frequente em pessoas que possuíam uma herança
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familiar semelhante, as quais faziam uso do álcool, manifestando-se principalmente
nos períodos em que as mesmas estavam sofrendo com “turbulência da alma” e,
além disto, estavam influenciadas por ventos úmidos do noroeste. Tais concepções
a respeito de uma enfermidade mostram que Hipócrates buscava integrar os mais
diferentes aspectos como: psicológicos, químicos, biológicos e até meteorológicos.
Assim, no princípio, a medicina era psicossomática, mas em virtude das já citadas
influências que sofrera sucessivamente distanciaram-se de sua origem.
Atualmente, a Psicossomática dentro da sociedade científica, representa um
foco de visão holística, que leva em conta tanto o avanço tecnológico da Medicina
moderna e suas especializações quanto àquilo que há de mais humano nas
profissões de saúde. Mais adiante explicaremos melhor o termo holismo.
6 A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA DIMENSÃO SOCIAL NA PSICOSSOMÁTICA
Como mencionado por França e Rodrigues (2007), o ser humano pode ser
considerado um animal social que está atrelado a um meio cultural humano. Nota-se
que desde o princípio de seu desenvolvimento há uma busca pela adaptação, para
conseguir se sobressair ao seu meio sociocultural (aqui entendido como um meio
dirigido por normas, regras, conceitos econômicos, políticos, legais, religiosos,
científicos, artísticos, morais, costumes e atitudes, entre outros fatores que
constituem uma comunidade, nação ou civilização).
O primeiro grupo em que o indivíduo começa a interagir é, geralmente, o
familiar, onde ele progressivamente passa a significar as coisas que lhe rodeiam,
além de encontrar entendimento e ser entendido por aqueles com os quais convive
em uma constante interação. De maneira gradual, essas interações vão se
ampliando, estendendo para relações sociais, como por exemplo: para vizinhos,
primos, amigos da escola, professores, grupos que frequenta, entre outros.
Primeiramente, a família é a responsável por situar o seu novo membro em
uma determinada posição social por meio dos grupos sociais nos quais insere a
criança e, estes, provavelmente, influenciarão suas demais escolhas sociais em
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curto, médio e longo prazo, como escolas, clubes, grupos de jovens e demais
organizações culturais futuramente.
É importante deixar clara a importância das características de personalidade,
que em parte são herdadas e em parte são constituídas pela assimilação das
experiências com o seu meio, bem como o conjunto de regras e costumes
assimilados influenciam de maneira direta o comportamento da pessoa no seu
grupo. Assim, em qualquer grupo no qual ela se insira, haverá um condicionamento,
um ensinamento e uma educação que procura uma adaptação às normas e aos
valores predominantes dos pais, avós, irmãos, amigos, professores e mais adiante:
chefes, líderes, costumes culturais, entre outros.
Para França e Rodrigues (2007), esta forma de aprendizado ocorre até o fim
da vida, em experiências ininterruptas que reforçam certas atitudes e padrões
comportamentais por meio de gratificações ou pela inibição ou supressão destas
mesmas atitudes e padrões comportamentais por punições e frustrações. Os autores
enfatizam que há figuras-chave como pais, professores, líderes formais e informais
que cumprem um importante papel, ao ensinar aquele indivíduo a agir como elas,
não só naquele momento, mas também no futuro.
Nesse sentido, as experiências serão incorporadas pela pessoa e passarão
a fazer parte dela, da sua personalidade. Todavia, grande parte desse processo é
inconsciente, então:
► potencial genético + personalidade das figuras-chave =
comportamento do ser humano.
Dessa forma, o ser humano é considerado um ser social e histórico e suas
ações não podem ser consideradas isoladamente. Como cada acontecimento social
ocorre em função de padrões de comportamento que são determinados pela
personalidade das pessoas que estão envolvidas pelas regras culturais e hábitos
previamente assimilados e que determinam o que deve ou não ser feito ou realizado.
Dessa maneira, como a Psicossomática parte do pressuposto que a saúde e
a doença são estados que resultam de um equilíbrio harmônico ou uma desarmonia
(desregulação) dos campos biológico, psicológico e social. Esta última dimensão
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adquiri fundamental importância ao influenciar as demais, já que favorecerá ou não
as atitudes do indivíduo, a percepção de suas possibilidades, modo de se relacionar,
forma de ver o mundo, processos mentais, atividades psíquicas, processos afetivos,
maneira de lidar com o corpo, entre outras.
Um conceito importante a ser trabalhado na área da Psicossomática é o do
holismo, do qual holístico provém. O termo origina-se da palavra grega “holos”, que
significa todo. Introduzida por Smuts, no ano de 1926, a expressão designa a
natureza biopsicossocial do homem, incluindo aspectos da saúde e doença, sendo
que o estudo, a pesquisa e o tratamento devem, sempre, levar em consideração a
pessoa em sua totalidade e não as partes isoladas. Como já vimos, essa noção é
tão antiga quanto a Medicina. Em uma passagem do diálogo de Platão chamado
Charmides, ele argumenta que:
A cura de muitas doenças é desconhecida para os médicos de Hellas (nome que se dava ao atual país da Grécia), porque eles desprezam o todo, que deve também ser estudado, porque a parte nunca pode estar bem, a menos que o todo esteja bem.
Esta afirmação mostra que a Medicina, desde o princípio, luta com o
problema mente-corpo e que alguns estudiosos, como o filósofo Platão, propunham-
se a olhar o indivíduo de forma integral. Entretanto, esta tarefa não tem sido fácil em
razão da visão biomédica ainda em voga no mundo ocidental.
Por meio da Psicossomática pode-se averiguar e encontrar caminhos para a
prática na promoção de saúde mais voltada para o paciente. Afinal, como apontam
França e Rodrigues (2007), não chegam para a consulta um fígado, um estômago
ou um coração, mas sim uma pessoa, que está em sofrimento, que pode estar
sendo expresso por seus órgãos. Neste sentido, constantemente, seu adoecimento
está relacionado com a sua condição e modo de vida (dimensão social). Nas
palavras dos autores: “no corpo humano estão as marcas de sua história, de seu
esforço, de suas perdas e de suas vitórias. Assim o ser humano é seu corpo e não
apenas tem um corpo” (FRANÇA E RODRIGUES, p.87).
Qualquer pessoa no transcorrer de seu desenvolvimento, constrói e
estrutura modos de ser e reagir às mais diferentes solicitações as quais é impelido a
agir (tanto no nível mental como corpóreo) com o sentido de manter seu organismo
equilibrado.
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A pessoa é o resultado das inúmeras experiências a que foi submetida no
decorrer de sua história. Ao reagir às diversas situações da vida, estas provocam
marcas e modificam o corpo. O intuito da abordagem Psicossomática é compreender
os processos de adoecimento como uma resposta do ser humano que vive em
sociedade e é parte ativa de uma microestrutura familiar, que está dentro de uma
macroestrutura social e cultural, situada em um determinado ambiente físico e que
procura dar um significado (variando a maneira conforme a pessoa) a sua existência
no mundo. Observe o diagrama abaixo:
FIGURA 10 - REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO SER HUMANO
IMERSO NA MICROESTRUTURA FAMILIAR E NA MACROESTRUTURA
SOCIOECONÔMICA-CULTURAL
FONTE: Sampaio, Galasso, Ribeiro. Reproduzido do livro Stress e Trabalho, uma abordagem Psicossomática.
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7 REFERENCIAIS TEÓRICOS EM PSICOSSOMÁTICA
Primeiramente, é importante ressaltar que o conceito mais amplo de
Psicossomática implica na existência de um referencial teórico que estude o
psiquismo. Sendo assim, pode ser psicodinâmico, comportamental, existencial,
analítico, entre outros. Além de uma abordagem psicológica, há a necessidade de
um referencial teórico que estude a dinâmica grupal e social do indivíduo, que pode
ser sociológico, antropológico, cultural, entre outros.
Ao juntar uma teoria que estude o corpo, outra que estude a mente, mais
uma que leve em consideração o estudo do grupo, há uma visão psicossomática. A
partir disto, começa-se a ter particularizações, ou seja, várias composições de
referenciais possíveis. Com uma teoria para o fato biológico, outra para o psicológico
e outra para o social, tem-se uma concepção de Psicossomática montada.
Independente do referencial teórico é de fundamental importância para
aquele que quer atuar em Psicossomática que este obtenha conhecimento sobre a
anamnese biográfica (a história de vida) do sujeito que está tratando. Nela devem
estar inclusos alguns itens como:
Antecedentes pessoais: aquilo que sabe a respeito do histórico familiar e
sobre a sua gestação.
Condições de nascimento.
Alimentação: o que, como e onde se alimenta e se houve ou não mudanças.
Sono: qual é o padrão de horas e a qualidade do sono.
Desenvolvimento Neuropsicomotor.
Escolaridade.
Religiosidade: como lida com questões que transcendem a ele.
Doenças: investigar desde a infância, se são agudas ou crônicas e o quanto
afetam a qualidade de vida do indivíduo.
Sexualidade.
Sociabilidade.
Cuidados pessoais, entre outros.
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A proposta da Psicossomática é um exercício de integração dos mais
variados referenciais teóricos com a meta de atingir um objetivo maior que é a
compreensão do ser humano. Entretanto, esta compreensão não está simplesmente
em somar pedaços, mas sim em entender o organismo como um sistema que
funciona de forma integrada e dinâmica, com movimentos que se transformam
ininterruptamente. Todos os dados citados devem ser compreendidos junto com os
motivos que levaram o paciente a buscar uma consulta. De acordo com a
Psicossomática, o ser humano deve ser compreendido como o resultado da
intersecção entre corpo (dimensão biológica), mente (dimensão psicológica) e meio
externo com seus aspectos socioculturais e físicos. Observe o diagrama abaixo:
FIGURA 11 - ALTERAÇÃO DO CORPO, DOS PROCESSOS MENTAIS E
DO MEIO EXTERNO
FONTE: Sampaio, Galasso, Ribeiro. Reproduzido do livro Stress e Trabalho, uma abordagem Psicossomática.
8 ATUAÇÃO PROFISSIONAL EM PSICOSSOMÁTICA
Ao se aprofundar nos estudos sobre Psicossomática, com suas concepções
biopsicossociais e modo holístico de se abordar as dimensões de saúde e doença é
muito comum achar que o profissional que trabalha nesta abordagem é capaz de
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resolver todos os tipos de problemas. Entretanto, como destaca Riechelmann
(1998), a Psicossomática não pressupõe que o profissional tenha um conhecimento
de todas as especialidades. Segundo o autor, é importante entender que há dois
procedimentos básicos em qualquer profissão ligada à saúde: o de compreender/
diagnosticar e o de intervir/proceder. Neste sentido, a Psicossomática é, antes de
tudo, algo que amplia a habilidade do procedimento que envolve a compreensão e o
diagnóstico. Consequentemente irá ocorrer uma ampliação na capacidade da
intervenção enquanto profissional, porém não no nível que concerne à tecnologia
especializada. Ou seja, o profissional que compreende seu paciente de modo mais
holístico, no momento de intervir, continua apenas habilitado na especialidade em
que foi treinado.
É importante ressaltar que na hora de compreender um paciente, o
profissional precisa estar atento ao que ele precisa, qual é a sua real demanda,
buscando enxergá-lo como um todo, pois a pessoa adoecida está imersa em um
contexto. Somente assim e tecnicamente preparado na especialidade, pode-se
intervir com maior clareza.
O profissional que atua em Psicossomática necessita saber seus limites
técnicos e éticos no momento de atuar, providenciando encaminhamento para
outros profissionais que darão conta daquilo em que ele não é especialista.
Riechelmann (1998, p. 26) acredita que há uma “vocação multiprofissional e
interdisciplinar do trabalho psicossomático”, visto que o diálogo e a interação com as
demais especialidades são importantíssimas quando foca-se em uma compreensão
mais holística.
Quanto ao mercado de trabalho, pode-se dizer que lentamente tem surgido
um espaço maior para a Psicossomática, já que na prática os profissionais da área
de saúde e administradores hospitalares (por meio da diminuição de custos)
observaram que, quando é oferecido um tratamento para esta abordagem, aumenta-
se o grau de resolução das enfermidades.
Riechelmann (1998) expõe que ao se calcular o número de consultas que
são necessárias entre um determinado diagnóstico e o término de um tratamento,
observa-se que o profissional que trabalha psicossomaticamente chega a um
diagnóstico e estabelece um tratamento terapêutico que possibilita alcançar
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resultados práticos com um número menor de consultas. Além disto, o autor
comenta:
Por ser mais demorada, a consulta na linha da Psicossomática deve ser melhor remunerada pelas empresas de convênio médico do que a consulta tradicional; mesmo assim, a despesa para quem paga a conta acaba sendo menor, em função do reduzido número de consultas, exames de laboratório e exames de imagem (RIECHELMANN, 1998, p.32).
Ou seja, o atendimento que trata do paciente psicossomaticamente colabora
tanto para uma maior eficiência no diagnóstico da pessoa enferma quanto para
aliviar seu quadro de somatização. O resultado é uma maior satisfação do paciente
desde os primeiros atendimentos, já que as suas demandas implícitas e subjetivas
são detectadas e passam a receber um cuidado profissional.
Na década de 1990, uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da
Saúde, abrangendo os cinco continentes, avaliou o grau de comprometimento
emocional envolvido na patologia de pacientes que procuravam hospitais gerais e
prontos-socorros. Na América do Sul, o local escolhido para a realização da
pesquisa foi o Rio de Janeiro. Os pacientes buscavam apenas uma consulta médica
convencional, não possuindo a priori qualquer ideia a respeito de questões
emocionais que pudessem estar envolvidas na sua patologia. O resultado da
pesquisa mostrou que 30% na média mundial e 40% dos entrevistados no Rio de
Janeiro eram pacientes somatizados. São, portanto, pacientes que passaram por
diversos departamentos hospitalares, realizaram vários exames a acabavam
apresentando resultado normal em suas avaliações laboratoriais, radiológicas,
ultrassonográficas e clínicas.
Dentro deste panorama, observa-se que um terço dos pacientes que
buscam tratamento em hospitais gerais e prontos-socorros, somatizam e, este
mesmo número realiza um alto número de consultas e exames, além de,
provavelmente serem operados de forma abusiva. Com isso, há uma despesa com
procedimentos médicos que pode vir a superar o total de despesas dos outros dois
terços, já que cada paciente somatizado repete os mesmos procedimentos médicos
várias vezes.
Paralelamente, é importante ressaltar que a formação dos profissionais da
área da saúde, muitas vezes, tem que priorizar em atender de acordo com as
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necessidades do mercado, ou seja, realizar consultas rápidas e exames laboratoriais
para garantir seu sustento.
Os profissionais que trabalham com psicossomática são, então, vistos pelo
mercado como uma alternativa de aumento de resolução com barateamento de
custos para a prática médica. Entretanto, a psicossomática ao ser vista como uma
prática “fast-food”, principalmente, pelas empresas médicas, pode vir a prejudicar o
profissional da área, que acaba recebendo propostas de trabalho que incluem fazer
um diagnóstico rápido e sendo mal remunerado por isso. Além de afetar os
pacientes em grande escala em função de um atendimento deficitário pelo
profissional insatisfeito.
Riechelmann (1998) cita que um profissional de psicossomática, com o
decorrer dos anos, desenvolve uma fácil compreensão dos conteúdos emocionais
que ocultam por trás das queixas físicas. O problema não é o tempo externo de
quanto dura a consulta, mas sim o tempo interno do profissional ► o espaço dentro
dele que está aberto e disponível para receber a pessoa do paciente, que envolve
sua percepção e sensibilidade durante a consulta para captar do paciente conteúdos
emocionais que estão escondidos pelas queixas físicas. Tal tempo interno resulta de
um treinamento e de uma habilitação em Psicossomática e é importantíssima na
atuação de profissionais da área da Psicologia e Psiquiatria.
9 A FORMAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MEDICINA
PSICOSSOMÁTICA E REFLEXÕES SOBRE A ÁREA DE ATUAÇÃO EM
PSICOSSOMÁTICA
Foi fundada em 11 de setembro de 1965, pela iniciativa de uma comissão
organizadora formada por profissionais de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande
do Sul, entre eles: Abram J. Eksterman (RJ), Danilo Perestrello (RJ), Helláido
Franscisco Capisano (SP), José Fernandes Pontes (SP), Milton Pecis Abramovich
(RS), Oswaldo Arantes Pereira (RS), Precila Pinheiro (RS) e Wilhelm Kenzler (SP).
Em seus dez primeiros anos, a presidência desta associação foi ocupada
por Danilo Perestrello, autor de um dos livros mais usados como referência na área
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da Psicossomática no Brasil, chamado “A Medicina da Pessoa”, o qual é altamente
recomendado para todos aqueles que estão interessados em tomar contato com o
tema e se aprofundar em seu estudo.
Segundo Riechelman (1998), o desenvolvimento da ABMP se deu em
virtude dos seguintes objetivos:
Difundir a visão psicossomática de ser humano.
Divulgar o processo de saúde e doença como forma de humanizar o
atendimento médico no Brasil.
Apoiar, desenvolver, facilitar e divulgar pesquisas na área da medicina
psicossomática.
A associação hoje se caracteriza por uma atuação multiprofissional,
contando com: médicos de quase todas as especialidades, psicólogos com
diferentes abordagens, enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas,
fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, entre outros.
Segundo Mello Filho (2003), a história da ABMP pode ser considerada
vitoriosa, entretanto como grande parte das organizações institucionais enfrentou
crises, dificuldades e passou por fases de pouca produção. Tais fatos repercutiram
em críticas e reflexões sobre o seu desenvolvimento, bem como seus acertos e
erros.
Como já mencionado, a ABMP foi fundada por renomadas figuras da área
médica advindas de Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, que se juntaram a
importantes figuras de outros Estados, como Minas Gerais e Pernambuco, entre
outros. Para Mello Filho (2003), Perestrello e Eksterman e Capisano e Miller foram
as grandes personalidades que incentivaram o movimento da Psicossomática no
Brasil, permitindo criar a Associação. Refere que a capacidade organizacional de
Eksterman permitiu à Psicossomática tornar-se uma entidade física. Pouco depois
da sua fundação, o próprio autor entrou para a ABMP. Dessa forma, considera-se
que Psicossomática nasceu sob a base de uma amizade.
Vale ressaltar que, em São Paulo, surgiu outro grupo muito ativo com os
mesmos objetivos, liderado por Fernandes Pontes, que atua em clínica geral e é
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Professor de Medicina. É interessante assinalar que todos os profissionais que
compunham ambos os grupos eram professores de Medicina e/ou psicanalistas.
Conforme Mello Filho (2003), o primeiro problema que se apresentou foi a
dificuldade na relação entre os dois grupos de São Paulo, situação esta que
começou a melhorar após o Congresso no Rio de Janeiro, em 1982. Após este
evento, o movimento se estruturou nas duas grandes capitais e, em seguida, em
Porto Alegre com mais intensidade.
A ABMP, em virtude da formação dos profissionais que a compunham,
iniciou-se sob a influência da Psicanálise, inspirada pelas concepções
(anteriormente mencionadas) de Freud sobre a histeria de conversão.
Enfatiza-se que o movimento de divulgação dos estudos da Psicossomática
foi iniciado na Psicanálise, pois na época somente esta possuía e propunha uma
compreensão mais global da doença, além de fornecer instrumentos como a
psicoterapia para a prática clínica.
Ainda hoje, as teorias psicanalíticas continuam em voga na psicossomática
institucional, como é o caso da Escola de Psicossomática de Paris (IPSO).
Mello Filho (2003) aponta que com a finalidade de combater uma visão
fortemente psicanalista que “rotulava” pacientes que apresentavam determinadas
doenças, como por exemplo, pessoas com doenças musculoesqueléticas eram
arrogantes, o autor e o Dr. Abram e J. Eksterman, para evitar o efeito negativo que
estas ideias poderiam ter nos psicólogos, opuseram-se à divulgação de palestras,
congressos e outros eventos provindos do Dr. Chiozza, de Buenos Aires, que era o
principal promotor destas concepções.
Outras abordagens também merecem destaque pela sua difusão, entre elas
a Psicossomática Junguiana, a qual tem como precursora a Dra. Denise Gimenez
Ramos, no Brasil. Segundo Ferreira (2004), a Dra. Denise desenvolveu e introduziu
no país um estudo de modelo psicológico em que os fenômenos devem ser
observados como totalidades dinâmicas, evolucionárias e criativas dentro de uma
concepção entre a problemática psique-corpo, situando-a no modelo científico-
holístico da Psicossomática Junguiana.
O próprio Mello Filho (2003) cita que o objetivo maior do movimento da
Psicossomática é conquistar cada vez mais médicos em todo o mundo. Acredita-se
que os estudos das teorias psicossomáticas funcionavam como uma espécie de
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complemento do curso médico, possibilitando uma formação integral do médico,
visto que os cursos de medicina dominados ainda permeados por uma visão
fortemente biomédica não ofereciam. Dentro das próprias universidades surgiram as
disciplinas de Psicologia Médica para auxiliar a questão.
Observa-se que, antes da década de 1980, os médicos eram seguidos
tradicionalmente pelos psicólogos e enfermeiras. Os demais profissionais de saúde,
não existiam como uma classe atuante no movimento; os dentistas e assistentes
sociais, apesar de serem categorias organizadas funcionavam tradicionalmente
apenas como apêndices médicos.
Apesar da abertura para estudos que tentavam reintegrar a ideia de mente-
corpo, todavia na medida em que a classe médica foi sendo sucateada pela
previdência, Ministério da Saúde ou rede conveniada, não houve mais interesse em
se melhorar a relação médico-paciente (uma das propostas da Psicossomática),
passando o profissional a atender em consultas com duração de apenas dez
minutos. Desse modo, poucos profissionais trabalhavam dentro de uma perspectiva
psicossomática.
Mello Filho (2003) relata que já teve grupos com 40 pessoas na UFRJ, na
década de 60, possui dificuldades para formar turmas que possuam interesse em se
aperfeiçoar na área da Psicossomática. Destaca que os enfermeiros estão
procurando cada vez mais estudar o tema. Para ele, os enfermeiros estão se
afirmando como classe, libertando-se do domínio que os acorrentava aos médicos,
estão a cada dia mais tratando seus pacientes como pessoas globais e interessados
pelos aspectos psicológicos de suas práticas. Atualmente, percebemos este
movimento pelo alto número de pesquisas realizadas pela classe que envolvam
temas relacionados com a Psicologia.
Quanto aos psicólogos, Mello Filho (2003) coloca que a maioria ingressou na
Sociedade de Psicologia Hospitalar, criada ao perceberem que tinham diante de si
uma imensa casuística de pacientes psicossomáticos ou somatopsíquicos para
tratar. A área da Psicologia Hospitalar tem crescido rapidamente, promovendo
diversos cursos e congressos pelo Brasil, além de programas científicos de
qualidade.
Há um imenso campo em comum entre a Medicina e a Psicologia, sendo
necessária uma abertura de diálogo entre ambas como entidades com muitos
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pontos de intersecção. Além dos outros campos profissionais que ainda não se
organizaram como entidades psicossomáticas, mas que podem colaborar
imensamente com o movimento, como os enfermeiros, assistentes sociais,
odontólogos, fisioterapeutas e fonoaudiólogos. Somente desta forma, irá se
concretizar o ideal de transformar o movimento em verdadeira prática interdisciplinar.
Mello Filho (2003) salienta que para o fato de que, de modo geral,
profissionais como ele, que são altamente atuantes na área da Psicossomática,
considerados por muitos como líderes, possuem personalidades narcísicas atuando
dentro de um movimento no qual o narcisismo só atrapalha. No seu ponto de vista,
todos que atuam nesta área precisam desenvolver muito senso de fraternidade e
humildade para realizarem suas intenções com sucesso. Neste sentido, todos os
psicossomaticistas devem procurar sempre refletir sobre os erros e acertos de suas
condutas, reconhecendo e modificando os erros e aprendendo com os acertos, para
que estes surjam também em outras circunstâncias. Acima de tudo, reconhecer o
quanto se aprende com os pacientes e com os alunos, que têm muito a contribuir
com uma visão abrangente sobre os assuntos.
Mello Filho (2003) discorre também sobre a estrutura da ABMP. Explica que
para facilitar a gestão, há um deslocamento da sede nacional para a cidade do
presidente eleito, que funciona em consonância com o esqueleto que a sustenta, as
regionais. De um modo geral, o presidente é aquele que mais se destaca, eleito por
aclamação. Esse compõe uma diretoria com representantes dos vários Estados e
com uma parte administrativa formada por nomes locais. A eleição é realizada
bianualmente, na vigência de um congresso nacional que representa o ponto
técnico-científico mais alto do movimento. A maioria dos presidentes foram médicos,
pois as demais categorias estão ainda pouco representadas na ABMP, com exceção
dos psicólogos.
A princípio, o movimento organizava-se somente por meio da Diretoria
Nacional, mas com sua expansão, houve necessidade da fundação de seções
regionais que possibilitassem a construção de sedes extras nos diversos Estados e
cidades do Brasil. Além do Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, as primeiras
regionais fundadas foram em Salvador e Presidente Prudente, por Abram
Eksterman.
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Na presidência de Mello Filho, as regionais de Belém do Pará, São Luiz,
Recife, Vitória, Londrina e Goiânia foram extintas. Frente à presidência da Regional
do Recife, Samuel Hulak, organizou uma rede de regionais por todo o nordeste,
abrangendo Fortaleza, João Pessoa, Maceió, Aracaju e Natal esta última por um
trabalho realizado por José Roberto Siqueira de Castro. Hulak também organizou o
primeiro grande Congresso Nacional da ABMP em 1998, no Recife.
Outra poderosa seção regional está localizada em Minas Gerais, em Belo
Horizonte, gerada à custa da liderança de Geraldo Caldeira. Lá, ocorre um
importante curso de formação em psicossomática e Caldeira tem um importante livro
publicado sobre nossa matéria. Minas Gerais tem ainda duas outras regionais, a Sul
Mineira, dirigida por Cacilda Maciel, com sede em Itajubá e a de Barbacena, sob a
liderança de Sebastião Vidigal.
A fundação de regionais depende imensamente da capacidade de liderança
de um profissional de saúde em determinada cidade, de sua possibilidade de
aglutinar pessoas e de organizar um ideário científico que mantenha estas pessoas
unidas e em contínua participação. De modo frequente, há um núcleo dirigente em
torno de cinco pessoas que organiza e sustenta o movimento. Este flutua muito em
torno da vida pessoal do presidente e do núcleo dirigente, sendo vulnerável às crises
e mudanças desse contexto. Possivelmente, estas são as maiores dificuldades que
o movimento vem enfrentando, as flutuações das regionais. Em contrapartida, a
direção nacional flutua com menos intensidade, pois seus membros, segundo Mello
Filho (2003) são mais preparados para lidar com as contingências pessoais, grupais
e ideológicas do movimento.
Um dos principais problemas apontados pelo autor é a dificuldade de
comunicação entre a sede nacional e as regionais. Menciona que no que se refere
ao convívio institucional, há três entidades coirmãs: a Psicologia, a Psiquiatria e a
Psicanálise. Com a Psicologia hospitalar, acredita que as carreiras são atualmente
paralelas e precisa apenas haver mais interpretação. Já a Psiquiatria criou
recentemente a chamada Interconsulta Psiquiátrica, fazendo com que alguns nomes
da ABMP migrassem para exclusivamente esta área. Quanto à Psicanálise, parece
que ainda há uma maior distância, visto que, na maioria das vezes, não reconhece a
amplitude do movimento psicossomático. É preciso haver um real debate sobre esta
situação de “irmãos” distantes num mesmo espaço contíguo. A fim de diminuir esta
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distância, foi criado o Conselho de ex-presidentes, órgão consultivo da Diretoria
Nacional que opina em todas as decisões importantes, desde a escolha de nomes
até nos impasses institucionais, e durante as eleições. Antes da criação do Conselho
de ex-presidentes, assim que um presidente terminava sua gestão, esta permanecia
em uma espécie de limbo, ou seja, ficava meio dentro, meio fora do movimento.
Hoje, não há mais nomes “aposentados” no movimento, pois há a ideia de
aproveitar a experiência, a sapiência e a criatividade destes. A cada dois anos são
realizados congressos intercalados com encontros de regionais em diferentes
localidades do Brasil com o intuito de promover disseminação do movimento.
Não há como negar como o movimento de psicossomática pulverizou-se
entre os psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, enfermeiros, homeopatas,
acupunturistas, terapeutas corporais, entre outros.
Contudo, a divulgação e a disseminação do movimento, continua na maior
parte por meio dos livros publicados por médicos como: “A Medicina da Pessoa”, de
Danilo Perestrello; “Concepção Psicossomática e Psicossomática Hoje”, de Júlio
Mello Filho e “Psicossomática: Teoria e Prática”, de Geraldo Caldeira.
Os congressos realizados pela ABMP têm como foco apresentar temas a
serem esmiuçados e temas secundários, que abrangem os principais tópicos da
psicossomática na atualidade. Uma parte importante de cada congresso é dedicada
à apresentação de temas livres.
Mello Filho (2003) situa que em virtude da preocupação com a questão da
divulgação do movimento e com a ideologia predominante na Associação já há
muitos anos os dirigentes têm se reunido para discutir este problema. Para
sancionar a dificuldade, foi então constituída uma comissão presidida por Eugênio
Campos, que elaborou uma proposta de criação de um Curso Básico Nuclear (CBN).
O curso é oferecido às regionais, privilegiando o modelo interdisciplinar como
ideologia e prática. O ensino de psicossomática é feito basicamente por meio do
estudo de casos clínicos, privilegiando as dimensões biológica, psicológica e social,
por meio da atuação de um médico, um psicólogo e um assistente social.
Outro tema que tem sido muito debatido nos últimos anos é o nome do
movimento, as designações propostas no debate são: Associação Brasileira de
Psicossomática e Associação Brasileira de Medicina Psicossomática e Psicologia
Médica. No primeiro objetivava-se excluir o nome Medicina para facilitar as relações
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com outras áreas. E, no segundo, adicionar Psicologia Médica, considerada um
importantíssimo campo de atividades. Contudo, foi decidido que a mesma
nomenclatura seria mantida. A justificativa foi continuar mantendo a já conhecida
identidade. Assim, apesar de ainda ser uma entidade pequena, o movimento
difundido pela ABMP vem caminhando com diretorias comprometidas, dinâmicas e
empreendedoras na área da Psicossomática.
FIM DO MÓDULO II