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1 UFRRJ INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E SOCIEDADE MONOGRAFIA “Relato da Experiência de Implantação da Rota Turística Municipal do Verde e das Águas” GILMAR DEPONTI 2002

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UFRRJ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E

SOCIEDADE

MONOGRAFIA

“Relato da Experiência de Implantação da Rota

Turística Municipal do Verde e das Águas”

GILMAR DEPONTI 2002

2

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO,

AGRICULTURA E SOCIEDADE

RELATO DA EXPERIÊNCIA DE IMPLEMENTAÇÃO DA ROTA

TURÍSTICA MUNICIPAL DO VERDE E DAS ÁGUAS

GILMAR DEPONTI

Sob a Orientação da Professora

Maria José Carneiro

Monografia submetida como requisito

parcial para obtenção do diploma de

Pós-graduação Lato Sensu em Desenvolvimento,

Agricultura e Sociedade

Seropédica, RJ

Novembro de 2002

3

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E

SOCIEDADE

GILMAR DEPONTI

Monografia submetida ao Curso de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e

Sociedade como requisito parcial para obtenção do diploma de Pós-graduação Lato Sensu

em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade

MONOGRAFIA APROVADA EM 29/11/2002 (Data da defesa)

Maria José Carneiro (Ph.D. ) CPDA/UFRRJ

(Orientador)

Nelson Giordano Delgado (Ph.D.) CPDA/UFRRJ

Silvana de Paula (Ph.D.) CPDA/UFRRJ

Nora Beatriz Presno Amodeo (Ph.D.) REDCAPA

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RESUMO

DEPONTI,Gilmar.Relato da Experiência de Implantação da Rota Turística Municipal

do Verde e das Águas, Nova Esperança do Sul- RS. Seropédica: UFRRJ, 2002.

43p. (Monografia, Pós-graduação lato sensu em Desenvolvimento, Agricultura e

Sociedade).

Este trabalho foi realizado no município de Nova Esperança do Sul – RS, tomando como

base as ações relativas à implantação da Rota Turística Municipal do Verde e das Águas,

transcorridas entre os anos de 1997 e 2002. Trata-se de uma rota turística rural em fase de

organização, que estando inserida nesta tendência de crescimento do setor, envolve diversas

famílias de agricultores familiares do município, bem como diversos outros atores sociais.

O objetivo do trabalho foi levantar as idéias convergentes, os conflitos, os pontos

favoráveis e os entraves relativos a este processo de construção coletivo da Rota, bem como

as disputas e os conflitos de interesse, procurando caracterizar o município com seus

principais segmentos econômicos, a região onde está inserido o município com seus

problemas conjunturais e os agricultores familiares como os principais atores e

beneficiários deste processo, apresentando seus produtos tradicionais e os novos produtos e

serviços que estão passando a gerar ou prestar, na condição de agricultores típicos,

dupativos ou pluriativos ligados ao turismo. Foram apresentados os principais pontos

turísticos do município e suas potencialidades relacionados com o ambiente cultural

existente, e mediante a descrição do processo de implantação da Rota, tanto a nível

municipal, quanto a nível regional, com o relato de algumas ações dos atores sociais para

a promoção do desenvolvimento da atividade turística e enfocando a postura dos

agricultores familiares frente à questão do resgate da cultura e da preservação do

patrimônio. Com base na interpretação da realidade local e à luz da bibliografia consultada,

foram apresentados ao final do trabalho alguns encaminhamentos para ações e estudos

futuros em relação ao papel que a extensão rural deve assumir diante desta realidade; as

modificações nas relações das famílias rurais envolvidas com o turismo; as necessidades de

mudança na postura dos municípios integrantes do consórcio de municípios, do qual faz

parte Nova Esperança do Sul; as atitudes relativas a preservação do ambiente natural,

cultural e em relação ao patrimônio arquitetônico; a necessidade de realização de ações de

embelezamento da paisagem; as potencialidades que o turismo apresenta para promover o

resgate da cultura dos imigrantes italianos do município. O trabalho finaliza com algumas

considerações a respeito da possibilidade de uso da informática e Internet como meio de

baixo custo para a divulgação da Rota para outras esferas além do contexto local e regional.

Palavras chave: turismo rural, pluriatividade, agricultura familiar.

5

ÍNDICE

CAPÍTULOS Pg.

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................06

2 OBJETIVOS.....................................................................................................................08

3 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO.........................................................................09

4 O MUNICÍPIO E A METADE SUL................................................................................11

5 CARACTERIZAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR DO MUNICÍPIO.................12

6 OS ATRATIVOS TURÍSTICOS......................................................................................16

7 O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DA ROTA DO VERDE E DAS ÁGUAS............21

8 JUSTIFICATIVA..............................................................................................................35

9 METODOLOGIA.............................................................................................................36

10 ENCAMINHAMENTOS PARA AÇÕES E ESTUDOS FUTUROS............................37

11 CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................41

6

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho relata o processo de implantação da Rota Turística Municipal

do Verde e das Águas, empreendido no município de Nova Esperança do Sul, o qual foi

emancipado politicamente em 13 de abril de 1988 e está localizado na Região Centro-oeste

do Rio Grande do Sul.

Este processo, em curso desde o ano de 1997, é fruto da ação conjunta de algumas

entidades com atuação local, ou seja, O consórcio intermunicipal de turismo, a Prefeitura

Municipal de Nova Esperança do Sul, a EMATER-RS, a Universidade Regional Integrada

(URI - Campus Santiago), agricultores familiares, empreendedores e outras pessoas da

comunidade, os quais vem procurando popularizar o assunto “turismo” e desenvolver o

setor.

A partir do ano 2001 esta iniciativa passou a ter uma formatação mais objetiva,

passando a ser denominada Rota Turística do Verde e das Águas, esta, por sua vez, está

inserida na Rota Turística Regional Caminho das Origens, que envolve cerca de uma

dezena de municípios da Microrregião.

Meu interesse em estudar este assunto, advém do fato de que na atividade de

extensão rural que desenvolvo como funcionário da ASCAR/EMATER-RS, acompanho

este processo de construção desde o seu início. Acredito fortemente que o turismo será um

dos grandes promotores do desenvolvimento municipal e micro-regional dentro de poucos

anos, assim como já acontece em outras partes do mundo. Além disso, por ser natural do

município e nele ter voltado a residir, tenho grande preocupação com o desenvolvimento

econômico, social e cultural da população local, a qual conheço muito bem e com a qual me

identifico.

Até o presente, a Rota do Verde e das Águas não possui produtos turísticos prontos,

suficientemente acabados para serem usufruídos pelos visitantes. Vale já registrar que a

maioria de seus atrativos de grande potencial turístico estão localizados no meio rural, em

um município eminentemente marcado pela agricultura familiar.

1.1 Turismo – O fenômeno das últimas décadas

Embora o turismo seja uma atividade milenar, que para muitos países

historicamente vem configurando-se como um segmento da economia capaz de gerar

grandes ingressos de recursos e proporcionar melhoria da qualidade de vida da população, a

fase mais intensa de sua expansão no Brasil tem se dado nos últimos anos.

O turismo no Brasil, segundo dados trazidos por Dib (2002, p. 231), vem crescendo

a uma taxa média de 3,5% ao ano. O setor emprega no Brasil uma em cada onze pessoas da

população economicamente ativa (...). Calcula-se que cada US$ 15.000 gastos por turistas

representa a criação de um novo posto de trabalho. O turismo interno no Brasil é de 11% da

população, bem inferior ao da Europa e Estados Unidos que é de 25%.

Já em relação ao segmento do turismo que se dá em ambiente rural, Bricalli, Fucks e

Almeida (2002, p. 184), citando outros autores (SILVA, VILARINHO e DALE, 1998),

comentam: “A partir da década de 1980 registrou-se, no Brasil, o crescimento de atividades

internas às propriedades, não relacionadas à produção, mas que geram ocupações

complementares às atividades agrícolas as quais continuam sendo praticadas, em maior ou

7

menor intensidade nas propriedades. As mesmas constituem parte de um processo de

agregação de serviços aos produtos agrícolas e de produção de bens não materiais”.

Estas atividades acima citadas pelos autores, se relaciona com o fenômeno da

multifuncionalidade no meio rural, conforme descrito por Maluf (2002, p. 08): “A noção de

multifuncionalidade rompe com o enfoque setorial e amplia o campo das funções sociais

atribuídas a agricultura, que deixa de ser entendida apenas como produtora de bens

agrícolas. Ela se torna responsável pela conservação dos recursos naturais (água, solo,

biodiversidade e outros) e do patrimônio natural (paisagens), e pela qualidade dos

alimentos. Além disso a unidade de produção agrícola pode oferecer novos bens mercantis

como é o caso do agroturismo e da prestação de serviços especializados a terceiros.

Menciona-se ainda a crescente valorização da manufatura dos produtos tidos como caseiros

e artesanais”.

Nesta conjuntura o turismo rural, que é foco deste trabalho, assume uma grande

importância em nosso meio, e espera-se que evolua a ponto de se tornar tão expressivo

quanto já é na Europa. Naquele continente, Segundo Verbole (2002, p. 118), citando outros

autores (ROBERTS e HALL, 2001) “Nota-se que o turismo rural está se tornando um

turismo de massa”. Comenta ainda que uma pesquisa do Instituto Euro Barometer, indica

que 23% dos turistas europeus escolhem o meio rural como seu destino a cada ano.

8

2 OBJETIVOS

Com o presente trabalho pretendo relatar o processo de implantação da Rota

Turística Municipal do Verde e das Águas, analisando este processo internamente, já que

dele participo desde o seu início, e pelo fato de ainda estar em curso, restando muito do

caminho a ser trilhado.

Pretendo aqui levantar as idéias convergentes das entidades que trabalham no

programa, as negociações ocorridas, bem como os conflitos de interesse, as disputas e os

entraves que estão provocando atraso na consolidação da rota, levando em conta que já

transcorreram cinco anos desde o início dos trabalhos, e considerando-se que estamos nos

referindo a um local que possui potencial turístico bastante forte.

Procurarei enfocar também as oportunidades para a agricultura familiar do

município de Nova Esperança do Sul, mediante a pluriatividade e multifuncionalidade da

agricultura que surgem em decorrência do turismo, as ações e reações destes agricultores

frente ao programa, procurando trazer subsídios para futuras metodologias de trabalho que

possam provocar um maior envolvimento destes agricultores com o tema, buscando ainda

auxiliar no traçado de caminhos para a expansão da pluriatividade associada ao turismo

Além disso, pretendo com o presente trabalho contribuir para a sistematização de

informações necessárias ao processo de motivação e preparação do ambiente físico e sócio-

cultural para o desenvolvimento do turismo, com base na consulta, análise e discussão de

diversos trabalhos bibliográficos sobre o tema, os quais abordam conceitos e experiências

em diversos outros locais que apresentam características correlatas com o ambiente em

estudo.

9

3 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO

Procurando identificar as principais aptidões deste município com vistas ao

desenvolvimento econômico e rumando para a sustentabilidade, os três principais

segmentos de atividades atualmente em foco são: a agropecuária, o turismo e a indústria do

couro e coureiro calçadista. A seguir apresento uma breve caracterização destes três

segmentos que no município são intimamente relacionados:

3.1 A agropecuária

Esta atividade é bastante intensiva no município, desenvolvida na maioria em

pequenas e raramente em médias propriedades rurais. Contudo, neste quadro, é visível que

no município há uma absoluta predominância de minifúndios, que adotam sistemas de

produção embasados no modelo tecnológico na Revolução Verde (SCHULTZ,1964).

Igualmente claro é que estes minifúndios vêm há muitos anos sofrendo um grave processo

de empobrecimento, de difícil reversão até o momento, embora procurem acompanhar a

maioria das inovações tecnológicas dos últimos anos, tais como, o sistema de plantio direto

e as tecnologias a ele associadas, em termos de mecanização, controle de pragas, controle

de inços e utilização de insumos tidos como modernos, para a recuperação da fertilidade do

solo.

Pela importância que a agropecuária tem para a contextualização da realidade sobre

a qual estamos falando, voltaremos a tratar sobre ela mais adiante, com maior

profundidade.

3.2 A indústria do couro e coureiro calçadista

É uma atividade tradicional do município o qual foi colonizado predominantemente

por imigrantes Italianos a partir de 1890. Sabe-se da história local que este ramo industrial

surgiu poucos anos após a chegada destes moradores, através de uma pequena fábrica de

botas de couro da Família Frizzo, a qual posteriormente evoluiu para uma pequena unidade

de curtimento e acabamento de couros, favorecendo o surgimento de diversas outras

microempresas. O produto inicialmente fabricado pela indústria pioneira foi a bota de

gaúcho, mas atualmente, por exigências do mercado, passou a fabricar sapatos femininos e

assentos para automóveis. Já as demais empresas de pequeno porte existentes fabricam

botas de couro, chinelos de couro, selas para montaria, cintos, cinturões (guaiacas) e mais

recentemente artesanato em couro, roupas de couro e outros produtos fabricados em escala

semi-industrial ou de forma artesanal. Atualmente a maior empresa exporta seus produtos

com facilidade para E.U.A, Oriente e Europa, já as demais empresas dirigem sua produção

para o mercado local, regional e às vezes para outros estados, porém enfrentam

normalmente problemas de baixa demanda.

Todo este envolvimento com o setor coureiro calçadista faz com que atualmente o

município seja conhecido na micro-região como “A Capital da Bota”. Mas atualmente a

produção de bota masculina se reduziu drasticamente, permanecendo em operação no

mercado apenas cerca de três microempresas, que mesmo assim enfrentam problemas de

baixa demanda. Isto ocorre por que o perfil do consumidor mudou, passando a necessitar

daqueles outros produtos acima citados, deixando de lado a bota, que certamente teve

10

declínio de demanda por ser um produto muito regional (do gaúcho e de poucas outras

regiões do país) e sazonal, já que preferencialmente é comercializada durante o inverno.

Por volta do ano de 1995 e 1996, este setor industrial, teve uma séria crise de

mercado que provocou muitas demissões na principal empresa da cidade. Após este

período, quando o Governo voltou a permitir flutuação na cotação do dólar, o setor voltou

a crescer com grande intensidade, de maneira que atualmente a empresa Braspelco –

Unidade Frizzo, única que tornou-se grande e exportadora, mas que teve origem na

primeira unidade industrial que existiu no município, atrai toda a mão-de-obra disponível

no município, principalmente da cidade, mas também do meio rural, de forma que no

município embora os salários pagos sejam modestos, não há desemprego, pelo contrário, o

município tornou-se importador de mão-de-obra de outros municípios.

Explicando melhor como se dá este processo de super ocupação da mão-de-obra,

vejamos o caso dos agricultores familiares que moram em diversas localidades do próprio

município. Estes utilizam-se do transporte oferecido pela empresa para cumprir sua jornada

de trabalho, normalmente das 6 horas às 14 horas e posteriormente retornam as suas

atividades rurais, enquadrando-se tipicamente como agricultores familiares pluriativos, que

lançam mão desta estratégia de reprodução social, fugindo da marginalização provocada

pelo modelo tecnológico excludente adotado.

Já os trabalhadores de outros municípios da micro-região, principalmente dos quatro

mais próximos, que não possuem tradição industrial, também valem-se desta modalidade de

transporte coletivo rodoviário para continuarem residindo em seus municípios de origem e

diariamente trabalharem nesta indústria, sejam eles do meio urbano ou rural, sujeitando-se a

este cansativo deslocamento diário porque a cidade de Nova Esperança do Sul não

consegue oferecer moradias para alugar e vender conforme a demanda.

É necessário considerar que hoje as lideranças locais se preocupam com o fato de

uma parcela significativa da população rural, bem como, grande parte da população total

economicamente ativa do município depender exclusivamente do setor industrial. Segundo

o último senso populacional, o município possui apenas 4.010 habitantes (Fonte IBGE, ano

2000) e sua maior indústria emprega cerca de 1.500 pessoas, moradoras no meio urbano e

rural do município, com uma parcela significativa vinda diariamente de municípios

vizinhos. Este temor advém da possibilidade de haver uma nova crise nas exportações de

produtos de couro, que poderia ocasionar sérios riscos para toda a população local.

Este cenário faz com que se busque com insistência alternativas de novas atividades

para proporcionar maior estabilidade e manutenção do emprego. Dentre estas atividades, a

principal cogitada é o turismo, mais especificamente o turismo rural.

3.3 O turismo

Esta atividade desponta como uma atividade potencial, já que no meio rural do

município existem cerca de dez pontos com atrativos que são: gruta, cascatas, casas de

pedra, igreja de pedra, agroindústria, camping, balneários e fábrica artesanal de roupas de

couro. São mantidos pelos descendentes de imigrantes diversos traços da cultura italiana, na

maioria destes locais, principalmente nas características da gastronomia, arquitetura e

outros costumes. Já na cidade, são fortes atrativos turísticos os próprios produtos da

indústria coureiro calçadista citados anteriormente, raros nesta região do Estado, porém

bastante procurados mesmo sem uma desejável articulação com os empreendimentos

turísticos que demoram a se consolidar.

11

4 O MUNICÍPIO E A METADE SUL

O município de Nova Esperança do Sul está inserido em uma região tida com

atrasada do ponto de vista econômico, social e cultural, trata-se da “Metade Sul” do Rio

Grande do Sul. Este aspecto traz diversas conseqüências sobre a realidade do município e

por este motivo faremos neste trabalho algumas abordagens sobre o tema. A seguir daremos

o início a esta discussão que depois deverá ser aprofundada.

Conforme dados apresentados em Nova Esperança do Sul durante o Fórum de

Desenvolvimento Integrado e Sustentável da Mesorregião Metade Sul, ocorrido em 02 de

outubro de 2002, a Metade Sul apresenta algumas características bastante particulares em

relação a parte Norte do Estado. Estas informações, conforme apresentadas no evento

citado, ajudam a melhor entender as características da região, as quais apresento

resumidamente a seguir:

- Perda do dinamismo da economia regional (redução do PIB industrial);

- Economia baseada principalmente no setor primário;

- Presença expressiva de grandes propriedades e pequena diversidade da produção

(predominância da pecuária de corte extensiva, refletindo um modelo que se

perpetua desde a época da distribuição das sesmarias);

- Baixa capacidade de absorção e retenção de mão-de-obra, gerando êxodo rural e

migração regional;

- Dificuldade histórica de articulação coletiva, seja através de associações ou de

atividades comunitárias;

- Sistema cultural baseado no individualismo e na ausência do

empreendedorismo;

- Parcela significativa da população do meio rural e urbano vivendo em condições

precária de moradias e saneamento básico.

Pode-se acrescentar ainda que a paisagem predominante no espaço rural da região

da Metade Sul é de campo nativo em uma topografia levemente ondulada, onde existem

imóveis rurais na maioria extensos, porém pouco produtivos, a ponto de seus proprietários

(e agregados, quando existirem) enfrentarem sérias dificuldades financeiras.

Estas características regionais se refletem significativamente em Nova Esperança do

Sul, embora o município possua aspectos que o diferenciam da região que o compreende,

tais como:

- A colonização italiana;

- As estrutura fundiária das propriedades rurais (minifúndio);

- A diversificação das atividades agropecuárias;

- A topografia inclinada;

- A industrialização na cidade.

Entretanto, no que se refere aos aspectos do individualismo e baixo nível de

empreendedorismo, pode ser percebida a grande influência da região, sobretudo em relação

aos agricultores familiares e aos pequenos empresários urbanos. Percebe-se claramente uma

falta de motivação das pessoas para participar das discussões e decisões de interesse

coletivo, inclusive no que se refere aos interesses dos integrantes da Rota Turística em

estudo.

12

5 CARACTERIZAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR DO MUNICÍPIO

Além do que já foi apresentado no item 3.1, para uma melhor compreensão da

realidade, apresenta-se a seguir mais informações sobre a agricultura familiar do município,

que serve como o principal cenário para o desenvolvimento da atividade de turismo rural:

O sistema de produção adotado pelos agricultores familiares, mesmo em

minifúndios, paradoxalmente ainda é bastante baseado na produção de “commodities”, ou

seja, soja, arroz, milho, bovinos de corte e produção de leite. A estrutura fundiária do

município é composta por uma maioria de imóveis que possuem área de aproximadamente

um módulo fiscal, ou seja, 22 hectares. A seguir é apresentada a estrutura fundiária do

município, por classes de área das propriedades:

Tabela 1: Adaptado do Censo Agropecuário, IBGE/DEAGRO, 23/07/97. Dados do

município de Nova Esperança do Sul – RS.

Classes de Área das Propriedades Nº de Propriedades Rurais Somatório das Áreas

Menos de 1 Ha 3 1,08

De 1 a menos de 2 Ha 5 7,00

De 2 a menos de 5 Ha 13 41,15

De 5 a menos de 10 Ha 24 178,80

De 10 a menos de 20 Ha 85 1247,98

De 20 a menos de 50 Ha 139 4385,11

De 50 a menos de 100 Ha 68 4402,32

De 100 a menos de 200 Ha 31 4079,60

De 200 a menos de 500 Ha 9 2245,73

De 500 a menos de 1000 Ha - -

Abordaremos mais adiante a forma como ainda “ecoa” a Revolução Verde entre os

agricultores do município, no capítulo que trata sobre os estraves ao desenvolvimento do

turismo no município.

Por hora faremos uma rápida abordagem sobre as principais atividades

agropecuárias desenvolvidas pela maioria dos agricultores familiares do município,

inclusive por aqueles que estão envolvidos com o turismo rural:

5.1 Os principais produtos

5.1.1 Soja, arroz e milho São produtos vendidos na forma de grãos na Cooperativa local, sem antes serem

transformados visando agregação de valor. Em relação ao milho, boa parte da sua produção

não se destina à comercialização e sim ao consumo nas propriedades, para alimentação dos

animais domésticos e da família. Já o arroz somente é cultivado na parte sul do município

que apresenta características topográficas e de solo favoráveis ao seu cultivo.

13

5.1.2 Bovinos de corte São vendidos predominantemente na forma de cargas de animais vivos, aos

representantes de abatedouros situados em distantes municípios. Porém uma parcela

significativa de bovinos é vendida também na forma de animais vivos, a “abatedouros”

locais não legalizados. Neste caso esta venda que também não provoca agregação de

valores aos agricultores, destinando-se a atender o consumo local de carne para as classes

mais humildes da população urbana (principalmente operários da indústria do couro), que

não possuem recursos para adquirir carne inspecionada, devido ao custo elevado,

5.1.3 Produção de leite O leite é vendido “in natura” às distantes indústrias de laticínios. Esta atividade

possui no município alguns períodos de expansão, seguidos de períodos de retração, devido

a queda dos preços pagos aos produtores pelo leite “in natura”.

Diversos outros produtos de subsistência, e inclusive estes quatro anteriormente

citados que se destinam a comercialização, são produzido em pequena escala nas unidades

familiares. Nas condições da atual conjuntura, esta pequena escala de produção ocasiona

uma crescente inviabilização econômica de muitas propriedades rurais de Nova Esperança

do Sul, a ponto da produção agropecuária não conseguir prover dignamente as respectivas

famílias rurais em termos de geração de renda.

Estes fatores motivam os agricultores a buscarem na pluriatividade melhores

possibilidades de ocupação e remuneração da mão de obra familiar. Neste contexto é que

há uma tendência de expansão da agroindústria familiar e do turismo rural.

5.2 A tipificação dos agricultores familiares

5.2.1 Os agricultores duplativos

Um número significativo de agricultores do município já vivem da duplatividade,

ou seja, realizam atividades de agricultura em tempo parcial e trabalham também na

indústria do couro. Estima-se que cerca de 10 a 15% do total de agricultores do município

já são duplativos. São normalmente os agricultores mais carentes, menos estruturados para

a produção agrícola, pouco hábeis do ponto de vista da capacidade de determinação para o

trabalho e gerenciamento da propriedade, além de residirem em regiões do município com

solos agrícolas de má qualidade. Esta duplatividade permite que continuem produzindo

vários produtos para a alimentação da família, não necessitando pagar por exemplo aluguel,

IPTU e água na cidade. Eles conseguem manter suas residências rurais em condições de

habitabilidade, bem como, cercas e outras construções afins. Alguns deles até conseguem

melhorar o padrão destas benfeitorias, visto que retiram recursos do emprego para

investirem na propriedade, o mesmo vale para a produção agrícola, que com o auxílio de

recursos vindos do emprego, conseguem investir mais em fertilizantes e outros insumos e

terminam por obter melhores índices de produtividade em suas lavouras.

5.2.2 Os agricultores típicos

A maior parte dos agricultores do município ocupam-se de atividades tipicamente

agrícolas. São justamente estas famílias que estão enfrentando diretamente o grande

problema de baixa remuneração de sua atividade.

14

Estes agricultores apresentam grande persistência na agricultura, sendo

relativamente mais estruturados em termos de equipamentos, máquinas de pequeno porte,

solos de média a boa qualidade, e razoável capacidade de determinação para o trabalho e

gerenciamento das atividades (tal como na compra de insumos e máquinas, na venda da

produção, na boa utilização do espaço agrícola, etc). Estes agricultores, apesar de todas as

frustrações de safras nas estiagens, frustração com os preços dos seus produtos e

principalmente a frustração de se verem gradativamente num processo de descapitalização,

não se deixam levar pela tentação dos empregos oferecidos na indústria, com salário todo o

mês, cesta de alimentação básica e direitos trabalhistas. Para estes, mais importante é o

forte significado social e cultural associado a manutenção da identidade de agricultor, como

forma de inserção na sociedade, que está além do significado meramente econômico,

confirmando o que alguns autores afirmam em termos de que a lógica da agricultura

familiar difere em muito da lógica capitalista.

5.2.3 Os agricultores pluriativos envolvidos com o turismo rural

Estão efetivamente envolvidos com o processo de desenvolvimento da Rota

Turística Municipal aqueles proprietários de imóveis rurais que estão em fase de adequação

para o turismo. Tratam-se de pequenos agricultores com propriedade média em torno de 20

hectares por família, que na maioria não estão conseguindo sustento satisfatório nas

atividades agropecuárias.

Sobre a relação entre local onde se desenvolve o turismo e as pessoas inseridas

neste ambiente, Silva e Almeida (2002, p. 54) comentam: “... o turismo assume as

características da comunidade, que por sua vez precisa adaptar-se a ele, (...) É preciso

cuidado para harmonizar os interesses (...), em que a atividade turística assume o local e as

pessoas como atrativo”.

No caso em estudo ocorre este fato citado pelos autores, por este motivo farei a

seguir breves comentários sobre alguns destes agricultores envolvidos:

Existe na Rota uma gruta que é propriedade da Mitra Diocesana (Igreja Católica),

porém uma família de pequenos agricultores é que toma conta do local, sem que haja

comprometimento sobre a possibilidade de desenvolverem as atividades agrícolas normais.

As cascatas existentes nas proximidades da gruta estão em propriedade rural de

outra família que possui uma forte tradição na agropecuária, mas que possui uma

disponibilidade de terras bem maior que a média do município.

O restaurante próximo à Gruta é administrado por um jovem rural que preferiu

desligar-se da atividade militar e voltar para o meio rural para se dedicar as este

empreendimento em uma porção das terras de sua família, aproveitando-se da proximidade

da gruta. Como existe sazonalidade no fluxo de turistas, no inverno trabalha na indústria

coureiro calcadista e administra um restaurante situado na cidade.

A fabricação de roupas em couro é desenvolvida pela mesma família que possui o

restaurante, só que pela mãe do proprietário do restaurante, que se assessora de mais duas

vizinhas para o corte e costura de peças de couro, principalmente no inverno, ajudando

também no restaurante durante o verão. A residência fixa da família é uma casa de pedra de

enorme valor arquitetônico e histórico.

A Agroindústria está sendo construída por quatro famílias associadas, assim

caracterizadas: duas famílias são de agricultores típicos que inclusive são fornecedores de

produtos agroindustriais, frutas e verduras para a feira do produtor, a outra família tem o

homem empregado em tempo parcial em um clube social da localidade, o qual divide seu

15

tempo com as atividades de agricultura e pecuária leiteira. A quarta família integrante do

grupo tem o chefe da família que além de agricultor passou, nos últimos anos, a exercer

atividades na Prefeitura Municipal.

Dos dois balneários até então estruturados, um pertence a um pequeno agro-

pecuarista familiar, que tem como atividade principal a pecuária de corte, já que suas terras

não são adequadas para o cultivo agrícola. Nos finais de semana alguns membros da família

passam também a cuidar do camping e balneário e de um pequeno ponto de venda de

bebidas e outros produtos. O outro balneário é mantido por um pequeno agricultor já idoso

e aposentado. No verão, durante a semana, o local é cuidado apenas por esta pessoa, porém

nos finais de semana, quando se torna mais intenso o movimento de visitantes, ele recebe o

auxílio de filhos e netos para o trabalho.

16

6 OS ATRATIVOS TURÍSTICOS

Pode-se dizer que os motivos que atualmente trazem os turistas ao município são

principalmente a Gruta e os produtos da indústria do couro. Ter clareza sobre a importância

disto é importante pois segundo Alves (2002, p. 76) “uma identidade local forte, pode

reforçar a imagem e singularidade, tanto dos produtos turísticos quanto dos outros produtos

locais”. Até o presente, os empreendedores ainda não se adaptaram à crescente

movimentação de pessoas pela Rota Municipal, assim, são os turistas que muitas vezes

“descobrem” estes dois principais motivos turísticos, e quando chegam ao município não

são acolhidos convenientemente com os diversos serviços que demandariam. Isto provoca a

impossibilidade uma maior permanência dos visitantes, inclusive para conhecerem todos os

atrativos da Rota.

Felizmente a população local começa a despertar sobre as possibilidades que

existem para o turismo motivar o desenvolvimento da pluriatividade no meio rural, e que

estas novas possibilidades de ocupação produtiva das pessoas podem se tornar fator

fundamental para o desenvolvimento sustentável, tornando possível a preservação do

patrimônio natural, histórico e cultural local e promovendo uma maior socialização no

processo de geração de riquezas.

Conforme Alves, citando outros autores (SCHNEIDER E FIALHO, 2000, p. 32) “a

região para ser turística não necessita ter atrativos naturais extraordinários, requerendo

porém aspectos culturais bem desenvolvidos, possibilitando oferecer aos visitantes uma

arquitetura apreciável, uma gastronomia característica e a conservação por parte da

população de seus hábitos e costumes”. Felizmente A Rota do Verde e das Águas possui

algo mais do que os autores consideram essencial, pois seus atrativos turísticos apresentam

características bastante diferenciadas, graças a seus atributos naturais, culturais e

arquitetônicos.

Apresento a seguir uma descrição e uma análise dos principais locais que possuem

atrativos e estão inseridos na Rota Turística do Verde e das Águas, ou que poderão passar a

integrá-la. Faço aqui uma analise em termos dos requisitos que estes atrativos já oferecem

aos turistas ou que poderão vir a ser oferecidos:

6.1 A Gruta Subterrânea Nossa Senhora de Fátima

Localizada na localidade rural de Linha Um, é dotada de beleza e raridade por ter

sido formada pela natureza em rocha arenítica. Possui marcas do tempo deixadas ao longo

de 200.000.000 de anos, época em que se formaram as rochas que lhe deram origem.

Ela é considerada a maior da América Latina em espaço interno por ser capaz de

abrigar grande número de pessoas ao mesmo tempo. Possui uma área física de

aproximadamente 3.200 metros quadrados e situa-se a aproximadamente 12 metros abaixo

da superfície. Apesar disso, este local de incalculável importância para o turismo, é ainda

um ilustre desconhecido no plano nacional e no plano estadual, já que ainda não está

inserido nos pacotes de viagens comercializados pelas agências que atuam no mercado.

Mesmo assim, espontaneamente o local se transformou em destino de romeiros nas

quatro últimas décadas, para um evento anual – A Festa e Romaria à Nossa Senhora de

Fátima, atraindo em cada evento cerca de 6.000 pessoas, originárias de vários município da

região e até mesmo dos países vizinhos como Uruguai e Argentina, mediante excursões

17

habituais, aproveitando-se da proximidade geográfica. Estas tradicionais romarias ocorrem

sempre no último domingo do mês de janeiro de cada ano, sendo a manifestação de um

turismo tipicamente religioso.

Além dos romeiros, a gruta fica aberta a visitação de outros turistas em tempo

integral, recebendo cerca de 50.000 visitas por ano, consubstanciando diferentes

modalidades de turismo como, o científico, o ecológico, o de aventura e o de eventos. Os

tipos científico e ecológico são realizados por iniciativa de professores universitários da

área da geografia e geologia, principalmente da Universidade Federal de Santa Maria

(UFSM), Universidade Regional Integrada (URI – Campus Santiago) e Universidade de

São Borja, oportunizando a algumas turmas de alunos a identificação “in loco” de aspectos

da formação de rochas, fendilhamento, erosão, bem como visualização de espécimes

vegetais em trilhas rústicas em meio a mata nativa, muito adequadas a realização de

caminhadas.

O turismo de aventura também lá ocorre devido ao fato de que nas proximidades

desta gruta existem duas cascatas que oferecem paredões rochosos adequados a prática do

rappel.

O turismo de eventos se deu mediante a realização consecutiva de três festivais de

música nativista gaúcha, chamado “Festival Nativista, Ecológico e Turístico Gruta em

Canto”, realizados nos anos de 1997, 1998 e 1999, os quais contribuíram para que a Gruta

saísse do completo anonimato, mas que na prática constituíram-se em ações isolada, sem

possibilidade de terem continuidade devido aos custos elevados para o poder público

municipal, que promovia o evento.

Hoje seguramente pode-se dizer que a existência desta Gruta na Rota é o principal

motivo para se falar em desenvolvimento do turismo no município. Por sua importância

faço a seguir um complemento na sua descrição:

A Gruta possui três possibilidades de entradas, sendo duas através de túneis

naturais e uma através de escadarias construídas, possui ao centro um grande salão coberto

por rocha que é o local onde ocorrem as missas por ocasião das romarias, e nas suas

extremidades possui dois grandes orifícios circulares por onde entra a iluminação natural e

onde é possível visualizar detalhes de processos geológicos nos seus paredões.

Pelo fato da gruta ter sido formada naturalmente por processos de erosão

diferencial da rocha sedimentar do tipo arenito pouco consolidado, trata-se de um

patrimônio natural de rara beleza e de incalculável valor científico, porém por sua

constituição rochosa trata-se de um ambiente que sofre um processo contínuo e dinâmico

de transformações, devido a incessante ação da erosão hídrica, de forma que é possível

identificar em curtíssimo espaço de tempo, do ponto de vista geológico (meses ou anos), o

desprendimento e desabamento de pequenas placas de rochas, fazendo com que sua

paisagem interna vá mudando progressivamente. Isto nos faz entender que trata-se de um

patrimônio natural extremamente frágil e que merece ser muito bem preservado.

6.2 A indústria e artesanato de couro

Pode-se dizer que a indústria e o artesanato de couro é o segundo mais forte apelo

turístico da rota municipal. Ocorre que na região e até em muitos locais do País, Nova

Esperança do Sul ainda hoje é identificado por um produto de excelente qualidade; as Botas

Frizzo. Hoje a fabrica original deixou de fabricá-las e tornou-se a Braspelco Unidade

Frizzo, porém outras micro-empresas continuam a produzir botas utilizando processo de

18

produção semelhante, inclusive aprendido por ex-funcionários da antiga indústria que se

transformaram em pequenos empresários.

Além da tradicional bota de couro, hoje os visitantes da rota fazem questão de

adquirir no ponto de vendas, os novos modelos de calçado de couro que são produzidos

atualmente pela maior indústria da cidade, especialmente pelos baixos preços praticados

para calçados femininos de boa qualidade, que se tornam disponíveis em número reduzido

de peças por serem os excedentes de grandes pedidos efetuados por clientes internacionais.

Logo após os calçados vem o interesse pelos artigos de montaria fabricados em três

selaria existentes na cidade, que vendem seus produtos localmente e também fora do

Estado, possuindo clientes tradicionais. Estas micro-empresas fabricam selas, bastos e

acessórios de montaria.

Existe também uma fábrica artesanal de roupas de couro, cujas atividades são

desenvolvidas por mulheres pluriativas do meio rural, tendo bom fluxo de clientes por

situar-se na rota turística.

Outros produtos de artesanato em couro também começam a ser fabricados e

oferecidos aos turistas, tais como, porta-cuias, mini-selas, chaveiros, lembranças, etc, mas

este tipo de produção ainda é urbana. Os agricultores ainda não despertaram

suficientemente para esta atividade que pode ser bastante rentável e não requer

equipamentos sofisticados para a produção.

Não existe ainda na cidade ou ao longo das rodovias que compõem a rota, um

estabelecimento em que seja possível encontrar os diversos produtos da indústria e do

artesanato em couro dificultando aos turistas sua localização e aquisição.

6.3 As cascatas e trilhas

Existem duas cascatas de grande beleza natural a cerca de cento e cinqüenta metros

de distância da Gruta Subterrânea Nossa Senhora de Fátima. Estes três temas (a gruta e as

duas cascatas) localizados extremamente próximos entre si, representam o maior e melhor

conjunto de atrativos da Rota Turística Municipal. Estas duas cascatas possuem quedas

d‟água de 30 metros e apresentam vistosos paredões de rocha arenítica. Unindo a gruta e as

duas cascatas existem trilhas rústicas em meio a mata nativa, onde os visitantes podem

visualizar a vegetação típica do local, alguns pássaros, répteis e outros animais de pequeno

porte.

Estas trilhas foram construídas por remoção e empilhamento de rochas do próprio

local, mas para que possibilitem a realização de caminhadas com segurança, necessitam de

melhorias em alguns locais perigosos para os turistas, desde que nestas melhorias sejam

mantidas suas características rústicas.

6.4 A agroindústria

A agroindústria denominada “Da Gruta – Doces e Conservas” foi instalada junto a

Rota Turística Municipal com o objetivo de agregar valor a produção de frutas e hortaliças

de quatro famílias rurais associadas. Este grupo informal de agricultores obteve

financiamento do Governo do Estado através do Programa de Agroindústria Familiar. O

grupo pretende passar a oferecer aos turistas produtos feitos de forma artesanal, porém

dentro dos padrões de qualidade exigidos. Esta agroindústria também passará a oferecer

lanches e café colonial aos turistas, principalmente nos meses de maior fluxo de visitantes,

ou seja, no verão.

19

Diversas outras famílias, embora não possuam local construído e equipado

especialmente para a produção agroindustrial, tradicionalmente produzem vários produtos

coloniais, na maioria relacionados com a gastronomia italiana, tais como queijo, vinho,

salame, açúcar mascavo, melado, aguardente, rapadura, massas, panificação, etc. Estas

famílias precisam continuamente ser trabalhadas pela extensão rural e pelo programa de

desenvolvimento do turismo, visando o aperfeiçoamento na higiene e apresentação dos

produtos, mantendo as características originais, para que se torne possível oferecê-los

regularmente aos turistas. Esta produção colonial deverá gerar renda considerável para

algumas famílias pluriativas, com possibilidade de expandir esta oportunidade para um

grande número de famílias rurais integrantes da rota.

Em relação a agroindústria e sua inserção no turismo rural, temos o desejo de que

aconteça nesta rota algo como cita Cristóvão (2002, p. 104) relatando uma experiência

Européia: “... houve uma resposta criativa à necessidade de reinventar ou inventar valores

locais, que originou o (re)aparecimento de licores, compotas de frutas, doçarias e

artesanato, muitas vezes combinando a sabedoria antiga com a tecnologia, imagem ou

embalagem modernas”.

6.5 As casas de pedra

Na época da colonização do que hoje é o município de Nova Esperança do Sul, a

partir do ano 1890, os imigrantes italianos encontraram abundância de rochas areníticas

adequadas à extração para a construção de casas. Evidentemente que na época, mais

abundante que a pedra ainda era a madeira nativa, porém diversas famílias, levando em

conta a maior durabilidade, optaram por edificarem artesanalmente suas casas utilizando-se

de rochas areníticas, assentadas apenas sobre barro amassado. São remanescentes desta

época somente cerca de meia dúzia destas casas de pedra no município, as demais estão em

ruínas ou já desapareceram. Estas remanescentes são na maioria ainda habitadas e em bom

estado de conservação, onde vivem as famílias Ferrari, Cogo, Lovato, Munareto, Scalcon.

Estas casas guardam traços importantes da forma de construir dos imigrantes, tendo um

imenso valor histórico e cultural. Em uma delas atualmente funciona a fábrica de roupas de

couro no meio rural.

6.6 A igreja de pedra

Existe na localidade de Linha Um a Capela São Caetano, integralmente construída

de rochas arenítica, com a mesma técnica de construção das casas de pedra, porém esta

igreja é construída em estilo espanhol. Este fato aconteceu porque na época de finalização

da construção da estrada de ferro que tangencia o município, se incorporaram ao local de

colonização italiana algumas famílias de origem espanhola dispensadas do serviço de

construção da estrada de ferro. Como estes espanhóis eram hábeis em termos de

construções em pedra, coordenaram o trabalho dos imigrantes italianos na construção de

sua igreja, imprimindo a ela traços típicos da arquitetura espanhola, que hoje representa um

patrimônio de grande valor histórico. Além disto, ela está localizada a pouco mais de 1

quilômetro de distância da Gruta Subterrânea Nossa Senhora de Fátima, sendo portanto de

fácil acesso para os turistas.

Esta gruta sofreu uma pequena reforma na parte superior das paredes laterais que

lhe provocou uma pequena descaracterização, necessitando assim de uma urgente

restauração.

20

6.7 A beleza cênica – As paisagens

Como o município situa-se em uma região montanhosa e com bons remanescentes

de formações vegetais nativas, o simples fato de percorrê-lo já possibilita ao visitante

apreciar paisagens de grande beleza, especialmente na divisa com o município de Jaguari,

onde existe um lugar denominado “Empedrado”, que um calçamento rústico construído

também por imigrantes espanhóis, para facilitar o deslocamento de veículos de tração

animal alguns anos após a colonização da localidade.

6.8 O clima frio do sul do país

Assim como a serra gaúcha é famosa nacionalmente pelo seu clima frio e topografia

montanhosa, Nova Esperança do Sul e a microrregião possuem também estes requisitos

muito apreciados pelos turistas, com exceção da ocorrência de neve, que trata-se de um

fenômeno raríssimo no município.

6.9 Os Aspectos Culturais Expressos na Cultura Italiano e Gaúcha

O município preserva parte dos costumes dos imigrantes italianos e também cultua

as tradições gaúchas. Estes dois ícones culturais possuem grande força para serem

apresentados como atrativos turísticos, principalmente pelas famílias rurais pluriativas que

podem passar a demonstrar estes traços culturais, bem como prestar serviços relacionados a

estas identidades culturais.

Como a cultura italiana dos imigrantes, embora em processo de degradação, é um

traço autêntico da população local, pensando-se no desenvolvimento do turismo, há

necessidade de estabelecer estratégias que provoquem o resgate cultural, pois este aspecto é

um dos diferenciais da Rota. Conforme Verbole (2002, p. 126), citando outras fontes

(Herald Tribune, fevereiro de 2002), “na Itália os turistas rurais estão interessados na

gastronomia local e vitivinicultura. Viajando pela Itália, percebe-se que „a comida caseira

da nona e o sentir-se membro da família‟ são dois conceitos fortemente associados com o

agroturismo na Itália”.

6.10 Os campings e balneários

O município situa-se numa região montanhosa, porém cercada por município cuja

paisagem predominante são os campos. Na região são muito raros os balneários naturais,

tendo em vista que todos os rios das proximidades são de pequeno porte. Outro fator é que

o município situa-se a mais de 600 Km das praias de mar.

Esta situação faz com que algumas famílias rurais do município comecem a

estruturar campings e balneários para oferecerem inicialmente a população local e também

a turistas vindos de outros municípios.

21

7 O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DA ROTA DO VERDE E DAS ÁGUAS

O município possui boas potencialidades para o desenvolvimento sustentável a

partir do crescimento da atividade de turismo rural. Para isso podemos destacar algumas

características que lhe são favoráveis, tais como:

- As suas belezas naturais já descritas, combinado com o espírito empreendedor da

população, que mesmo tendo pequena disponibilidade de recursos para investimentos

turísticos, possui uma cultura voltada ao trabalho, como verdadeiros descendentes de

italianos que são;

- A motivação crescente de um número significativo de agricultores familiares a

tornarem-se pluriativos, envolvendo-se também em atividades não agrícolas dentro e fora

de suas propriedades rurais, como por exemplo, instalação de agroindústrias familiares,

criação de estabelecimentos de gastronomia e hotelaria. Já os jovens rurais podem ocupar-

se da prestação de serviços na condição de guias de ecoturismo em trilhas ecológicas, ou

oferecendo serviços para diversos tipos de passeios (à cavalo, em bondinhos, em carretas,

em trens, etc).

Apesar destas características do município, e de possuir fortes atrativos e muitas

potencialidades, com um já razoável número de visitantes à Rota, os turistas, como foi

mencionado anteriormente, ainda não recebem o tratamento adequado e não lhes são

oferecidos os serviços e a infra-estrutura compatíveis com suas necessidades.

Este somatório de fatores motivou algumas lideranças municipais e micro-regionais

a iniciarem um programa visando o desenvolvimento da atividade turística que transcorreu

nos últimos cinco anos, cujo relato apresento a seguir.

7.1 A constituição da rota regional e municipal

O início do processo de discussão sobre o assunto turismo começou a se dar

regionalmente, através de reuniões de prefeitos e secretários municipais, e em um segundo

momento através de diagnósticos feitos pelo programa PRODER (Programa de

Desenvolvimento e Renda) em vários dos municípios vizinhos a Nova Esperança do Sul.

O nível de discussões foi evoluindo até que os municípios criaram o PRODETUR

(Programa de Desenvolvimento do Turismo), constituído pelas cidades (gaúchas)

geograficamente extremas São Pedro do Sul e São Miguel das Missões, tendo Santiago

como a cidade geograficamente central.

Na época todos entendiam que a região, apesar de ser possuidora de bons atrativos

turísticos, estes eram pouco conhecidos, tendo-se como exemplo os Sítios Paleantológicos

de São Pedro do Sul e Mata, a Gruta Subterrânea de Nova Esperança do Sul e as Ruínas

Jesuíticas de São Miguel das Missões.

No entendimento destas lideranças, se fazia necessário desenhar uma rota,

geograficamente lógica para os turistas transitarem pela região, tendo acesso aos produtos e

serviços inerentes a atividade.

No ano de 2001 o PRODETUR passou a denominar-se Consórcio Intermunicipal da

Rota Turística Caminho das Origens, visto que já havia sido definida a logomarca da rota

regional como “Caminho das Origens”.

Para o estudo desta logomarca foram consultados historiadores da URI – Santiago,

que a partir de estudos identificaram ter sido nesta região que surgiu a figura do gaúcho, a

22

qual posteriormente disseminou-se pelo Estado do Rio Grande do Sul, e hoje identifica o

este Estado no restante do Brasil e no mundo. Esta figura do gaúcho toma expressão a partir

dos costumes levados por indivíduos mestiços de índios Minuano, com Portugueses e

Espanhóis que já haviam colonizado a região na época. Esta mistura de sangues, com forte

influência indígena teria dado este perfil ao gaúcho, de tendência nômade, que prefere a

liberdade de pensamento e a amplidão do pampa, sendo pouco afeto à aglutinar-se,

possuindo muitas habilidades nas lides campeiras e nas lutas, tendo sempre como aliado o

cavalo de montaria.

No decorrer das discussões, a URI consolidou-se como entidade a prestar assessoria

às atividades da diretoria do consórcio, que com técnicas de metodologias participativas

trouxe a tona o entendimento de que se fazia necessário cada município inventariar seu

patrimônio turístico, mapeá-lo e definir estratégias para a criação de produtos turísticos.

Neste mapeamento cada município deveria criar sua rota interna. E desta maneira

surgiu em Nova Esperança do Sul a Rota do Verde e das Águas, cuja implantação é objeto

deste estudo.

7.2 Os atores sociais envolvidos

Pode-se considerar como envolvidos na estruturação da Rota Turística do Verde e

das Águas, diversos segmentos da sociedade tais como: os agricultores familiares em geral,

os agricultores detentores de áreas ou atrativos turísticos, os empresários e

microempresários, os artesãos, a Prefeitura, a EMATER, os Monitores do PNMT

(Programa Nacional de Municipalização para o Turismo), os condutores de turismo, os

conselheiros municipais de turismo, o Consórcio Intermunicipal Caminho das Origens, a

URI-Campus Santiago e outros.

De todos estes parceiros citados, que têm relação com o desenvolvimento da Rota

Municipal, destaca-se a importância da participação de todo e qualquer empreendedor que

tem ou vier a ter relação ou interesse na atividade de turismo sustentável.

Como a maioria dos pontos com potencial turístico se situam no meio rural, a

intenção é que um número máximo possível de agricultores venham a se tornar estes

empreendedores, e não o simples fato de se tornarem, juntamente com suas propriedades

rurais, meros componentes da paisagem a ser apreciada pelos turistas.

Desta forma, os lucros advindos desta atividade reverterão para todas as pessoas que

se dispuserem (ou que já estão se dispondo) a desenvolver atividades turísticas. A intenção

dos segmentos envolvidos é que a população local seja a transformadora da realidade atual

para uma realidade turística, ao mesmo tempo em que vai se tornando beneficiária das

melhorias decorrentes, em termos de remuneração e em termos de evolução cultural e

sócio-ambiental. Quando se fala em população local, entenda-se, população do município,

especialmente agricultores familiares que já estão se envolvendo com a atividade ou que

poderão vir a se envolver.

Faz-se necessário a ação da população local no sentido de aproveitar as

oportunidades que o turismo oferece, antes que pessoas ou empresas turísticas vindas de

fora apropriem-se dos atrativos turísticos locais. Este desenvolvimento de origem exógena

que ocorreu em muitos outros locais turísticos, segundo os coordenadores, não traria os

desejáveis benefícios para a população local.

23

7.3 As viagens de estudo promovidas pelo consórcio

Muitas pessoas participantes há vários anos das discussões sobre a implantação da

Rota Regional, conheciam apenas através de mapas ou apenas de nome boa parte dos

atrativos turísticos constantes nas diversas rotas municipais que compõem o Consórcio

Intermunicipal Caminho das Origens. Evidentemente, esta falta de conhecimento

prejudicava o processo de planejamento e a execução de diversas ações. Algumas também

desconheciam outras experiências de rotas de turismo rural.

Estes motivos levaram a diretoria do Consórcio e o SEBRAE-RS a promoverem nos

dias 01 e 02 de agosto do ano de 1998 uma excursão à Rota Caminhos de Pedra do

Município de Bento Gonçalves – RS, pela identidade cultural com a etnia italiana.

Já em 27 e 28 de novembro de 2001, outra excursão aconteceu, dentro da própria

Rota Caminho das Origens, quando foram visitados os principais atrativos turísticos de

cada município componente. Estiveram nesta excursão as lideranças destes municípios que

possuem relação com o turismo, ou seja, prefeitos, secretários municipais, técnicos da

EMATER, empreendedores (entre eles agricultores), agências de turismo, artesãos,

proprietários de bares, hotéis, restaurantes, etc. Esta excursão foi bastante proveitosa para

os integrantes do consórcio adquirirem uma visão global da rota e registrarem em uma ficha

de avaliação sobre os locais visitados, os pontos fortes, pontos a melhorar e potencialidades

existentes. Este processo serviu também para identificar comparativamente o atrativos

turísticos mais fortes existentes na rota regional.

Outra excursão foi promovida já em 18 e 19 de março de 2002 pela diretoria do

consórcio, desta vez para uma rota turística de outra região do Estado, ou seja, a “Rota

Romântica”. Iniciou-se a visitação pelos municípios de Dois Irmãos e Ivoti, e encerrou-se

nos municípios de Nova Petrópolis, Gramado e Canela (Estes últimos fazem parte da Rota

Romântica e ao mesmo tempo da Rota das Hortências).

Este roteiro de trabalho realizada pelos participantes desta terceira excursão,

permitiu que exercitassem o olho clínico sobre as formas de desenvolver o turismo, em uma

região bem mais evoluída turisticamente, por já ter um histórico de cerca de meio século

com a atividade, uma rede social bem mais evoluída e uma situação econômica bem mais

favorável aos investimentos.

7.4 As oficinas do PNMT

Como ainda temos no município uma comunidade que necessita elevar

significativamente o nível de consciência em relação ao turismo. Um dos caminhos

escolhidos pelas lideranças do setor foi a realização de eventos utilizando a metodologia de

oficinas.

A metodologia de oficina é bastante apropriada para o trabalho com adultos, em que

existe a figura de um ou mais moderadores, que propõem perguntas sobre o tema em

questão (neste caso o turismo), com uso de painéis e tarjetas. Já os participantes,

normalmente trabalhando em sub-grupos, elaboram respostas escritas e posteriormente

realizam exposições orais para a plenária sobre questões discutidas. Finalmente o(s)

moderador(es) identifica(m) idéias convergentes e faz(em) as complementações necessárias

ao melhor entendimento do grupo sobre o assunto.

Inicialmente foram promovidas a nível de consórcio intermunicipal, nas

dependências da Universidade Regional Integrada (URI – Campus de Santiago), duas

oficinas de capacitação para voluntários de todos os municípios do consórcio, que após

24

treinados assumiram a condição de “Monitores do Turismo”, reconhecidos pela

EMBRATUR.

De Nova Esperança do Sul foram treinados no ano de 2002, oito monitores que

passaram a trabalhar voluntariamente ao lado do Executivo, Legislativo e Conselho para a

promoção do desenvolvimento do turismo a nível de município.

Após cada oficina de capacitação estes monitores, coordenados pela Secretaria

Municipal de Turismo, planejaram e realizaram diversas oficinas com diferentes setores da

sociedade. A série de cinco oficinas de primeira fase realizada visou a conscientização,

motivação e comprometimento da comunidade para com o desenvolvimento do turismo. Os

grupos trabalhados individualmente foram: - Os empreendedores do turismo (entre os quais

participaram diversos agricultores), professores das escolas municipais e estaduais, grupo

de terceira idade, grupos de EPC (Encontro de Pais com Cristo – movimento religioso

ligado a Igreja Católica) e vereadores. Além destas cinco oficinas realizadas com os setores

mais representativos da sociedade, os monitores do turismo promoveram com os alunos do

1º e 2º graus uma gincana cultural e turística, com tarefas ligadas ao resgate da cultura e

história, bem como a valorização dos atributos turísticos do município.

Estes principais segmentos da sociedade estão sendo trabalhados com o objetivo de

inserir a rota municipal no contexto do mercado do turismo nacional, através do

reconhecimento futuro do município pela EMBRATUR (Empresa Brasileira de Turismo)

como município turístico. Para que isso aconteça, até o final deste ano de 2002 haverão

ainda mais duas séries de oficinas, ou seja, de segunda fase e de terceira fase, em que os

monitores trabalharão com representantes dos cinco grupos anteriormente mencionados. Na

fase I, como já mencionado, as oficinas tiveram o objetivo de sensibilização de toda a

comunidade municipal; na fase II o objetivo é constituir o Conselho e o Fundo Municipal

de Turismo; e na fase III a oficina tem o objetivo de elaborar de forma participativa e

compartilhada o Plano Municipal de Turismo.

Nestas oficinas de primeira fase as pessoas participantes discutiram diversos

assuntos relacionados aos desenvolvimento do turismo sustentável e fizeram projeções para

o futuro, bem como iniciaram o traçado de metas, para a realização de ações concretas.

Alguns destes assuntos foram aproveitados neste trabalho.

7.5 A comunidade e o turismo

O turismo é uma atividade diferente de muitas outras, já que se faz necessário o

cliente deslocar-se até o local turístico para poder usufruir de seus produtos e serviços.

Durante uma viagem turística e após a chegada no destino, as pessoas necessitam adquirir

produtos e serviços dos mais diversos setores. Justamente este é o principal ponto

interessante do turismo, que faz com que um conjunto muito complexo de atividades possa

dele se beneficiar.

Infelizmente esta realidade está demorando a ser entendida pela comunidade local,

haja visto o número modesto de participantes das oficinas do Programa Nacional de

Municipalização para o Turismo – PNMT, realizadas para a conscientização da

comunidade, entretanto estas oficinas estão promovendo a mudança desta situação para que

deixe de ser um entrave no desenvolvimento natural desta atividade, a qual requer um nível

elevado de conscientização.

Outro aspecto importante é o fato de que as estruturas e os serviços que começam a

ser organizadas ou que futuramente o serão com o objetivo de servirem aos turistas,

certamente estarão colocados primeiramente à disposição da população local, que é

25

extremamente carente de oportunidades de lazer, tornando-se um importante fator para a

melhoria da qualidade de vida.

7.6 As fontes de financiamento

Pode-se dizer que a principal fonte de recursos que possibilitam investimentos em

turismo rural, é atualmente o PRONAF-Agregar, o qual pode ser acessado através da rede

bancária (Banco do Brasil e SICREDI, por exemplo). No ano de 2002 foram elaborados

pela EMATER local, três planos de crédito desta linha de financiamento para agricultores

familiares fazerem investimentos em suas propriedades rurais visando o turismo, os quais já

obtiveram aprovação bancária e liberação de recursos.

Este fato é uma evidência de que a fonte oficial de financiamento (o PRONAF)

começa a reconhecer a pluriatividade como fundamental para a unidade familiar, a ponto de

também merecer aplicação de recursos, embora não sendo para a tradicional produção de

alimentos. Com isso não chegamos ainda ao que alguns autores (MALUF, 2002)

considerariam como ideal, que seria o financiamento da propriedade rural como um todo e

não apenas de atividades isoladas, mas este fato já mostra uma certa evolução neste sentido,

pois os agricultores familiares em vez de estarem utilizando recursos oficiais para sua

lavouras, criações ou aquisição de maquinas, poderão agora investir em agroindústrias,

estruturas rurais para hospedagem de turistas, balneários e restaurantes para turismo rural.

Inclusive, estas duas últimas finalidades citadas foram objeto dos investimentos realizados

pelos agricultores locais.

O Programa Estadual de Agroindústria Familiar é outra boa possibilidade de

obtenção de recursos para investimentos na atividade agroindustrial, que pode ou não estar

relacionada ao turismo rural. Este programa é coordenado pela Secretaria da Agricultura e

Abastecimento do Estado, que opera através do BANRISUL, mediante projetos elaborados

pela EMATER-RS, tanto para investimentos grupais como para apenas uma família rural.

Esta linha de financiamento foi acessada no ano de 2001 por quatro familiar rurais

associadas e os recursos foram empregados na instalação de uma unidade de processamento

de frutas e hortaliças.

Outra possibilidade de auxílio financeiro que os agricultores poderão acessar em

breve são os recursos do Fundo Municipal de Desenvolvimento do Turismo, mantido pela

Prefeitura, vinculado a Secretaria Municipal de Turismo e coordenado pelo Conselho

Municipal de Turismo. Até o momento tanto o Fundo quanto o Conselho estão em fase de

constituição, de forma que nenhum investimento foi realizado a partir desta fonte.

Ainda é importante citar mais uma forma importante e direta de auxílio aos

agricultores nos empreendimentos turísticos, são os serviços da Secretaria Municipal de

Obras, para suprir necessidades de agricultores familiares em pequenas melhorias da infra-

estrutura para o turismo rural.

7.7 Os agricultores familiares O papel dos agricultores familiares no desenvolvimento desta Rota Turística

Municipal é central, na realidade, é nas propriedades rurais que estão surgindo os

investimentos em infra-estrutura turística.

No que depender do rumo dado ao processo de desenvolvimento da atividade até o

momento, evidencia-se um modelo de desenvolvimento que tem como base a comunidade

local e não os investimentos vindos de fora, reduzindo-se o risco de deixar a população

local excluída do processo de desenvolvimento e de seus benefícios. Entende-se que deve

26

ser a população local a geradora e posteriormente a beneficiária deste processo de

desenvolvimento de todo o setor turístico rural, já que estamos estudando um ambiente

rural que precisa e busca alternativas para a viabilização econômica e social da agricultura

familiar.

A importância que se dá ao turismo rural é o fato de que ele poderá vir a ser

motivador para o desenvolvimento da pluriatividade junto aos agricultores familiares na

Rota do Verde e das Águas, abrindo boas oportunidades de negócios para estas pessoas, e

para o município como um todo, levando-se em conta a rede social que estes agricultores

integram, possibilitando que futuramente a Rota Turística e conseqüentemente o município

passe a desfrutar da posição de destaque merecida junto ao mercado do turismo, tendo em

vista seus valiosos e exclusivos atrativos potenciais.

Quanto a comercialização de produtos da agricultura familiar, está sendo priorizada

a comercialização direta do produtor ao turista, principalmente para aquelas famílias que

ficam ao longo das rodovias que compõem a rota municipal. Como exemplo disto temos

uma agroindústria constituída por um grupo informal de quatro famílias rurais (cuja marca

é: “Da Gruta – Doces e Conservas”) que está iniciando suas atividades em um ponto

estratégico da Rota, junto ao local onde está projetado funcionar o principal ponto de

informações turísticas do município. Este grupo de famílias, como já mencionado, elaborou

projeto na EMATER e buscou recursos junto ao Programa Estadual de Agroindústria

Familiar para construir um prédio e adquirir os equipamentos destinados à produção.

Os principais motivos que estão fazendo com que algumas famílias rurais passem a

se envolver com o turismo são: a possibilidade de aumento da renda familiar, de ocupação

dos jovens em atividades nas propriedades rurais ou perto delas, a preservação dos valores

culturais da população rural local, a melhoria das opções de lazer que antes de servirem aos

turistas poderão ser usufruídas pelos moradores locais.

Como abordado anteriormente, existe no município o tipo de agricultor familiar que

preza pela manutenção de sua condição de agricultor como fator de inserção e identidade

sócio-cultural, esta parcela de agricultores, apesar das dificuldades extremas que enfrentam,

não se deixaram atrair, por enquanto, pelos empregos oferecidos na indústria do couro

(duplatividade, já citada). Felizmente o turismo rural e a pluriatividade a ele associada

valorizam a profissão de agricultor e promovem a preservação de suas tradições e valores

culturais, resgatando a auto-estima da população rural, sendo assim de mais fácil aceitação

perante estes agricultores como nova atividade, mesmo entre agricultores que tenham um

forte perfil sócio-cultural ligado a produção de alimentos em suas propriedades rurais,

conforme anteriormente referido, sendo portanto o turismo uma atividade com maior

afinidade que a opção de trabalhar na indústria do couro, por exemplo.

Silva e Almeida (2002, p. 182) referindo-se a uma Rota Turística de um município

da Serra Gaúcha (Bento Gonçalves) comentam algo que muito bem se aplica ao nosso caso:

“(...) as pessoas mais dispostas a se arriscar por buscarem mudanças, são também aquelas

com maiores dificuldades. São aquelas que carecem de mais ajuda para estruturarem-se,

não só no setor financeiro quanto psíquica e socialmente”. Este aspecto é possível de ser

observado também na Rota do Verde e das Águas, em que aqueles agricultores familiares

mais capitalizados e consolidados preferem prosseguir nas atividades típicas da

agropecuária, já aqueles mais carentes, pouco estruturados em termos de máquinas e

instalações e proprietários de pequenas frações de terras agricultáveis, são mais

interessados em apostar no turismo rural como complemento da renda da família. Estes

27

vêem o programa relativo a rota de turismo com bons olhos e acreditam que obterão

sucesso ao se dedicarem a atividade.

É aceitável que existam diferentes formas de percepção sobre uma mesma realidade,

como em todo o processo, existem os que não acreditam e ficam alheios à evolução do

programa. Porém todos, crentes ou descrentes nas potencialidades do turismo, reconhecem

no patrimônio natural do município algo que tem sua peculiaridade e grande valor

diferencial, inerente ao local.

Para aqueles que acreditam no desenvolvimento da rota e nos benefícios que poderá

trazer para sua localidade e suas famílias, imaginam que isto ainda está muito longe de

acontecer, como se a ação deles próprios não pudesse antecipar este futuro distante que

vislumbram.

7.7.1 Os agricultores e o resgate da cultura

Pode-se dizer com segurança que predomina ainda uma certa passividade por parte

dos agricultores familiares em relação a manutenção do patrimônio cultural. Exceção a isso

é a existência de um coral de músicas italianas (dialeto) integrado por agricultores, na

maioria idosos, que eventualmente se apresentam em eventos, tais como o “Incontro

d‟Italiani”. Além do coral, este próprio evento, embora urbano, pode ser classificado como

uma das mais fortes ações para o resgate da cultura local, sua peculiaridade é o resgate da

música, da dança e da culinária que, como em toda a festa típica italiana, oferece aos

participantes uma mesa diversificada e farta. O Incontro d‟Italiani já aconteceu por duas

vezes no município, por iniciativa do poder público municipal, mas em ambas as ocasiões

foi realizado integralmente pelo trabalho voluntário e gratuito da comunidade local.

Outro exemplo de evento nesta mesma linha, ocorreu, por iniciativa da Secretaria

Municipal de Turismo e monitores do PNMT (Programa Nacional de Municipalização para

o Turismo), uma gincana cultural que envolveu estudantes e comunidade em tarefas

predominantemente relacionadas à etnia e à história da imigração.

Apesar das primeiras iniciativas, os traços remanescentes da cultura dos imigrantes

italianos não estão sendo resgatados da forma que seria desejável para o desenvolvimento

do turismo, talvez até mesmo porque ainda é pequeno o contato direto que esta população

local tem com os turistas, os quais, com outros olhos, sabem melhor valorizar estes

aspectos e podem provocar o despertar da população local para o que de exclusivo e bom

possuem, sem dar o devido valor. Este ponto de vista é reforçado por Silva e Almeida

(2002, p. 55, que comentam: “... a admiração dos visitantes em contato com a cultura local

eleva a auto-estima dos habitantes, estejam eles envolvidos ou não com o turismo”. Nesta

mesma linha também comentam Bricalli, Fucks e Almeida (2002, p. 183) que o turismo

rural “... além dos benefícios econômicos para as famílias, através do complemento de

renda, está sendo capaz de revalorizar o espaço rural, substituindo o conceito (ou

preconceito) de atrasado, por novos valores que refletem de forma mais real as

características do campo”.

Abordamos anteriormente que o município tem uma cultura voltada ao trabalho,

típica da etnia Italiana, para aprofundarmos esta discussão tomamos como base as

considerações de Silva e Almeida (2002, p. 193) que se reportando à Serra Gaúcha

afirmam: “O trabalho na agricultura marcou a etnia italiana no Brasil como forma de vencer

a natureza para garantir a sobrevivência”.

Infelizmente pela grande distância do município (cerca de 700 Km) da Serra

Gaúcha, na qual o progresso gerado sustenta um certo sentimento de superioridade dos

28

descendentes de italianos perante as demais etnias, em Nova Esperança do Sul, embora

provavelmente 90 % da população possua sobrenome de origem italiana, infelizmente está

restando muito pouco do autentico perfil da cultura italiana, do saber fazer bons vinhos, do

saber fabricar embutidos, da conservação da língua, etc., pois houve uma grande influência

de outras etnias (principalmente portuguesa, espanhola, indígena, a miscigenação destas

entre si e inclusive com a italiana) que habitam as mesmas localidades rurais e os

municípios próximos. Mesmo que nos municípios vizinhos haja um contexto sócio-

econômico diferente, conforme já abordado.

Este contato com outras culturas provocou mudanças significativas nas atitudes da

população. Em uma situação semelhante, Silva e Almeida (2002, p. 199) analisam que sem

a identidade mantida pelas tradições, a comunidade corre o risco de ser absorvida pelo

“outro”, perdendo a peculiaridade que forma seu atrativo. Pode-se dizer que no nosso

ambiente de estudo, o “outro”, ou seja, a inter-relação com as outras etnias coexistentes no

local produziu um distanciamento da cultura italiana, haja visto que, comparando-se com os

imigrantes italianos da serra gaúcha, mesmo o município possuindo uma topografia

predominantemente serrana e estrutura de propriedades rurais minifundiárias, com perfil

agrícola, os descendentes de imigrantes italianos locais já são visivelmente diferentes do da

serra gaúcha.

Outro aspecto importante é que o município, embora tenha um perfil bem peculiar

que o diferencia, situa-se na região que hoje é chamada de “Metade Sul do Estado do Rio

Grande do Sul”, que é tida como pobre (geradora de baixo PIB), carente de

empreendimentos e culturalmente atrasada. Sobre isso comentamos anteriormente quando

contextualizamos a região em que se situa o município.

7.7.2 Os agricultores e a preservação do patrimônio

Se em relação à preservação da cultura algumas ações isoladas já ocorrem, em

relação à conservação do ambiente natural não se tem notícias de manifestações por parte

da população.

Considerando que dentro da concepção de desenvolvimento sustentável do turismo,

não existe outra forma de explorar o turismo sem que seja assegurada a preservação do

meio ambiente, e sendo os atrativos naturais o destaque da rota municipal, há que se elevar

o nível de conscientização da comunidade quanto a este patrimônio.

Para melhor esclarecer sobre a vastidão dos elementos envolvidos na questão

turística, vejamos o que aborda Cristóvão (2002, p. 82): “... quando falamos de recursos

rurais, falamos de um amplo espectro de elementos, que inclui antigos, atuais e novos

produtos agrícolas e agroindustriais (alimentares e não alimentares), paisagens, fauna e

flora, rios, montanhas e vales, caça e pesca, rochas e minerais, águas minero-medicinais,

patrimônio arqueológico e histórico, arquitetura popular, tradições culturais, artesanato,

gastronomia, linhas férreas, solares e casas rurais, miradouros, parques e reservas naturais,

feiras, festas e romarias, música, teatro e poesia popular”. Pela ótica deste autor, quando

falamos em preservação ambiental em espaço rural, estamos falando em uma enorme gama

de aspectos interligados a este ambiente, do qual não podem ser dissociados.

Pode-se dizer também que o desenvolvimento do turismo deverá criar um „clima‟

favorável para a preservação do ambiente natural. E para isso é fundamental a colaboração

de todos os agricultores envolvidos ou não com as atividades ligadas ao turismo, pelo

menos no âmbito da microbacia hidrográfica.

29

Deverão ser muito bem delimitadas e regulamentadas as ações de ocupação do

espaço rural para que a agropecuária possa coexistir com o turismo rural, e vice-versa,

dentro da lógica da complementariedade de atividades (pluriatividade) para as famílias

rurais, com o mínimo possível de agressão ao ambiente.

Para ponderar esta questão, vejamos o comentário de Magro (2002, p. 143): “...

devemos tomar cuidado para não sermos extremamente restritivos no manejo de uma

propriedade rural particular, que cumpra de maneira adequada a legislação ambiental e que

tem como objetivo principal o uso indireto dos recursos naturais para melhorar os

rendimentos financeiros da família. Apesar do primeiro objetivo parecer mais nobre, o

segundo também é legítimo e deve ser reconhecido”.

Isto precisa ser muito bem entendido, pois no nosso caso a remuneração dos

agricultores pela manutenção do patrimônio natural e cultural certamente virá somente a

partir das próprias atividades inerentes ao turismo. Já que na realidade brasileira, e

principalmente desta região, não se vislumbra, num curto espaço de tempo, a possibilidade

dos agricultores serem remunerados pelo simples fatos de serem “jardineiros da paisagem”,

como acontece com os agricultores Europeus por exemplo.

7.8 Os pontos favoráveis ao processo de desenvolvimento da rota

Já discutimos diversos pontos favoráveis ao desenvolvimento da Rota Municipal de

Turismo, entretanto antes de serem citados os entraves ao processo, cabe relembrar alguns

deles citando-os brevemente, conforme segue:

- A formatação da Rota Regional Caminho das Origens, com todas as suas

limitações pode ser considerada um dos principais fatores favoráveis ao

desenvolvimento do turismo no âmbito do município;

- A parceria dos atores sociais que conduzem o processo de desenvolvimento da

rota;

- O pioneirismo dos agricultores familiares que começam a apostar no turismo;

- A força dos atrativos turísticos e do elemento étnico existentes na rota;

- A importância do PNMT (Programa Nacional de Municipalização para o

Turismo) que está em andamento e vem servindo para a conscientização da

comunidade, comprometimento das pessoas, ordenamento e planejamento das

ações;

- A importância do Conselho Municipal e do Fundo Municipal para o

Desenvolvimento do Turismo, os quais estão em processo de formatação .

7.9 Os entraves ao processo

Pelo tempo que já se trabalha a questão do desenvolvimento do turismo no

município (cinco anos) e pela força dos atrativos da Rota Turística, esta atividade já deveria

estar num estágio de desenvolvimento bem mais avançado, com uma desejável

transformação da realidade. Acredita-se que ocorre esta demora no processo, por diversos

motivos e pelas dificuldades existentes, mas principalmente pela existência de interesses

divergentes por parte dos diversos atores envolvidos.

7.9.1 As posições dos atores envolvidos

7.9.1.1 A Mitra Diocesana

A Mitra Diocesana, entidade vinculada à Igreja Católica, é proprietária da área rural

onde se localiza o principal atrativo turístico do município, que é a Gruta Subterrânea

30

Nossa Senhora de Fátima. Seu interesse é que este local permaneça apenas como um local

disponível para a romaria que acontece apenas uma vez por ano e também para fiéis que a

visitam esporadicamente ao longo do ano, individualmente ou em excursões, para

pagamento de promessas ou para oração. Muito pouco da renda da Festa Romaria anual e

da cobrança de ingressos dos visitantes reverte para investimentos em infra-estrutura,

melhoria dos serviços oferecidos aos turistas, ou campanhas de preservação do local. Mais

grave ainda é a visão do pároco local que vê este importante ponto turístico simplesmente

como uma propriedade particular da Mitra Diocesana, não tendo a compreensão de que se a

cooperação triunfasse muitas famílias rurais vizinhas, que inclusive são fiéis católicos,

poderiam ser beneficiados com a organização do local para tornar-se mais atrativo aos

turistas.

7.9.1.2 Os agricultores familiares

Os agricultores familiares envolvidos com o turismo rural desejam que a Prefeitura

faça os investimentos públicos necessários para o turismo, tais como melhorias de estradas,

sinalização, divulgação. Querem também a ajuda da Prefeitura para seus investimentos

privados, tais como, redes de luz, açudes, estrutura para camping e para hospedagem, etc. O

argumento destes agricultores é que por serem pioneiros locais da atividade de turismo,

poderão sofrer frustrações decorrentes de estarem se lançando rumo ao desconhecido, além

disso, não possuem recursos próprios para investir ou capacidade de pagamento para

assumir empréstimos bancários de grande valor. Desta maneira pleiteiam parte dos recursos

para investimentos à fundo perdido. Este tipo de assunto normalmente vem à tona por

ocasião das reuniões promovidas pela Secretaria Municipal de Turismo, com a participação

dos agricultores envolvidos na atividade.

7.9.1.3 A Prefeitura Municipal

Para este órgão público é importante dar apoio ao turismo, o qual é vista com tão

bons olhos por todos que pensam estrategicamente no desenvolvimento sustentável do

município, porém a postura da atual administração municipal, cujo Prefeito até o final do

ano de 2002 é também o presidente do Consórcio Intermunicipal da Rota Caminho das

Origens, é de apenas fazer os investimentos públicos, raramente ajudando em ações de

cunho particular (dentro das propriedades rurais). Justificando esta postura pelo

envolvimento típicas de uma Prefeitura com todas as outras atividades municipais. Desta

maneira muitas ações para o turismo demoram para acontecer, mais do que seria desejável.

Isto entrava o trabalho da Secretaria Municipal de Turismo, muito dependente dos trabalhos

da Secretaria Municipal de Obras, provocando insatisfação por parte dos poucos

agricultores mais motivados com o turismo, pelo atraso no andamento das ações

programadas nas reuniões.

7.9.1.4 A EMATER/RS Para esta entidade prestadora de serviços de assistência técnica e extensão rural, os

agricultores deveriam buscar mais apoio na linha oficial de financiamento, o PRONAF

(Programa Nacional de Apoio a Agricultura Familiar) tendo em vista que a pequena taxa de

juros associada (3% ao ano) poderia tornar viável economicamente os investimentos

necessários ao turismo rural e trazer uma evolução considerável na renda das famílias e na

melhoria das condições de vida. Até o presente, apenas sete famílias estão com planos de

31

crédito encaminhados visando investimentos em gastronomia e estruturação de campings e

balneários.

É importante mencionar que foi a EMATER/RS e a Secretaria Municipal de

Turismo as primeiras entidades a identificarem um grupo de agricultores ligados ao turismo

e a planejar com este grupo informal algumas ações visando o desenvolvimento do turismo,

para que posteriormente projetos específicos em cada propriedade rural fossem elaborados

para a organização da infra-estrutura turística necessária.

Entretanto tem sido grande a demanda por serviços diversificados para a equipe

local da EMATER que é composta apenas por dois técnicos, de modo que há pequena

disponibilidade de tempo para a dedicação na elaboração de projetos e na adequação das

condições para o desenvolvimento do turismo rural nas propriedades rurais.

7.9.1.5 Os empresários

A maioria dos micro-empresários ligados a indústria coureiro e coureiro-calçadista

não vislumbram ainda o turismo como uma atividade que possa incrementar

significativamente seu volume de vendas e reduzir a sazonalidade na demanda por produtos

de couro (exemplo botas). Como exemplo desta postura ainda apática dos empresários,

temos o fato de que na FEICONES - Feira Industrial e Comercial de Nova Esperança do

Sul, o mais importante evento promovido para estimular o setor no município, poucos são

os empresários que se apresentam para expor seus produtos, embora saibam que nesta

ocasião pessoas de diversas cidades da região se voltam para o município atraídos pelos

produtos das indústrias do couro.

7.9.1.6 A rota regional

Passaremos agora a tratar sobre a rota regional “Caminha das Origens”, na qual a

rota municipal “Do Verde e das Água” está inserida.

Pode-se dizer com segurança que a articulação dos municípios em torno de uma rota

regional potencializa o processo de planejamento e de coordenação das ações deste

segmento, que é novo na região e ainda pouco desenvolvido, entretanto nestes anos estão

surgindo dificuldades para a realização de ações conjuntas, as quais atrapalham a obtenção

dos resultados propostos para a entidade, estas dificuldades e diferenças serão abordadas a

seguir, mediante um relato e análise de alguns fatos transcorridos desde o início do

processo de aglutinação dos municípios em torno da idéia do turismo.

Na forma de pensar dos organizadores da rota regional, era importante a aglutinação

de municípios que tivessem atrativos turísticos fortes, por isso pensou-se a necessidade da

rota possuir em um extremo, as Ruínas Jesuíticas de São Miguel das Missões - RS e no

outro extremo as madeiras petrificadas do município de Mata – RS, além disto ter em sua

parte central a Gruta de Nova Esperança do Sul, os traços da etnia italiana deste mesmo

município, bem como do município de Jaguari – RS, complementando com a estrutura

hoteleira da cidade de Santiago - RS, que inclusive é a maior cidade da rota. Entre as

extremidades e o centro da rota, a existência de vários outros atrativos nos municípios

intermediários, para compor um roteiro capaz de satisfazer os diferentes tipos de turistas.

Pode-se considerar correta esta forma de estruturar a rota e reforçaremos esta

opinião abrindo-se aqui um espaço para uma citação de Verbole (2002, p. 124) que vem de

encontro ao que vínhamos abordando “... os turistas não devem ser considerados um grupo

homogêneo. Eles se diferenciam na sua motivação, expectativa, exigências, experiências e

apreciação dos locais turísticos”. Esta mesma autora, citando outro autor (COHLEN, 1979),

32

descreve ainda que existem cinco tipos de turistas os quais neste momento apenas me

limitarei a citá-los, que são: o turista recreacional, o diversificado, o experiente, o

experimental e o existencial.

Voltando-se a abordar sobre a constituição da rota regional, para ser possível

contemplar toda esta diversidade de atrativos existentes nos vários municípios, resultou

num roteiro geograficamente extenso, já que com exceção de Nova Esperança do Sul, todos

os demais municípios são territorialmente grandes.

Esta exagerada amplitude da Rota Regional está certamente provocando

dificuldades na sua operacionalização, que começa pelo fator distância; passando pela

dificuldade de articulação entre os municípios; agravada pela pluralidade excessiva de

interesses (as vezes antagônicos); dificuldade de desenvolver atividades coletivas que

promovam o desenvolvimento do turismo (devido a existência de diversos tipos de

atrativos); e ainda a diferença cultural das etnias que ocorrem nos vários municípios da rota

regional (principalmente nos aspectos da carência de iniciativas empreendedoras e no fraco

associativismo, conforme já abordado).

Outro entrave ao desenvolvimento do turismo na região que pode ser considerado

provavelmente o mais grave, é o fato de os municípios dos dois extremos da rota fazerem

parte da Rota Caminho das Origens, e também integrarem a Rota das Missões Jesuíticas

(São Miguel das Missões e São Luiz Gonzaga), bem como a Rota Paleantológica (Mata e

São Pedro do Sul), desta maneira, em algumas ocasiões estes municípios trabalham para o

desenvolvimento de uma rota e logo depois passam a se envolver com a outra.

Neste ponto, faz-se oportuno abrimos um parêntese para fazermos um paralelo com

as rotas bem consolidadas existentes há vários anos na Serra Gaúcha, nas quais a identidade

cultural, a valorização coletiva da cultura e a capacidade de administração, garantem seu

sucesso, visto que atraem pessoas de todo o Estado, País e exterior, para participarem de

seus eventos e visitarem seus pontos turísticos.

7.9.2 O eco da Revolução Verde

Outro entrave ao desenvolvimento do turismo rural, principalmente na Rota

Municipal, que merece ser elencado e analisado com profundidade, é a questão do apego

dos agricultores familiares às atividades tipicamente agropecuárias.

Voltando a fazer um paralelo com a Serra Gaúcha, sabe-se que naquela região o

processo de modernização da agricultura, conhecido como “Revolução Verde”, teve menor

impacto sobre os colonos, ou seja, os agricultores familiares, principalmente devido ao

impedimento da topografia para a utilização da mecanização nas lavouras e pelo pequeno

porte das propriedades rurais, isto fez com que na Serra tenham sido preservadas técnicas

tradicionais de produção e de agroindustrialização caseira de alimentos.

Já no município de nosso estudo, as propriedades rurais apresentam topografia e

qualidade do solo que permitem, em algumas porções, a mecanização das lavouras, além

disso as áreas destas propriedades não são tão reduzidas quanto na Serra, pois sua média

fica em torno de um módulo rural, ou seja, cerca de 22 hectares. Estes aspectos

possibilitaram a estes agricultores buscarem financiamento bancário para a aquisição de

máquinas, de insumos agrícolas (corretivos, adubos e agrotóxicos) e de outros componentes

que faziam parte do “pacote tecnológico da Revolução Verde”.

Este movimento provocou no município, com em diversas outras partes do país e do

mundo um acelerado processo de êxodo rural, já que as máquinas substituíam o trabalho de

muitas pessoas da família, as culturas de subsistência típicas da pequena propriedade, tais

33

como milho, vitivinicultura, fumo, cana-de-açúcar e pecuária de leite cederam espaço as

lavouras comerciais de soja e trigo e posteriormente soja e aveia para o engorde de bovinos

de corte. Juntamente com a redução destes cultivos tradicionais, foi radicalmente reduzida a

fabricação caseira de produtos agroindustriais, tais como o vinho, melado, açúcar mascavo,

rapadura, erva-mate, queijo, embutidos e outros.

Era muito mais lógico naquela época (década de 1970 e década de 1980) a máxima

dedicação do trabalho e a imobilização do capital para as culturas comerciais. Os recursos

abundantes para a “modernização da agricultura” oferecidos a juros subsidiados pelo

Governo Federal, neste época do milagre econômico brasileiro, fizeram com que os

agricultores conseguissem no período uma razoável ascensão econômica, especialmente na

década de 1970, pois conseguiram adquirir maquinário (tratores, implementos,

colheitadeiras, caminhões), automóveis e até mesmo conseguiram comprar um pouco mais

de terras.

Esta pujança fez com que muitos pequenos agricultores passassem a pensar que

seria possível a sustentação da família e de seus novos hábitos de consumo apenas com a

produção de grãos, verificava-se também que os agricultores mais jovens por serem mais

hábeis no trabalho com as máquinas, conquistavam mais facilmente a autonomia para a

gestão das propriedade rurais até então conduzidas pelos pais ou avós. Estes “novos”

agricultores desvalorizavam os cultivos tradicionais e de subsistência, bem como outras

práticas, que passavam então a ser prioritariamente conduzidos pelos mais idosos da família

rural (pais, mães, avós). Descrevo com segurança esta situação pois esta experiência deu-se

inclusive dentro da minha família e de várias famílias vizinhas, moradoras no município de

Nova Esperança do Sul.

Hoje, com a relativa falência do modelo agrícola daquele pacote tecnológico, do

qual poucos se beneficiaram efetivamente, e com a volta da valorização dos aspectos

tradicionais, pode-se dizer que foram aqueles idosos, infelizmente poucos deles ainda

vivos, tidos como resistentes na época, os responsáveis pela preservação do “saber fazer”

de diversos produtos coloniais (agroindustriais), os quais hoje entendemos o quanto é

importante seu resgate.

Porém a mentalidade das pessoas não muda abruptamente, muitos pequenos

agricultores já iniciaram o processo de mudança, mas outros embora atualmente muitíssimo

descapitalizados, continuam esperando a volta dos bons tempos da década de 1970 sem

buscar alternativas, e como continuam raciocinado como se fossem produtores de grãos em

grande escala, reclamam da baixa remuneração da soja e da pecuária de corte, porém não

abrem mão destes produtos, resistindo à conciliação deste tipo de produção com a busca de

outras alternativas que estão surgindo, ou seja, o turismo rural, a fruticultura, a

agroindústria e a olericultura, que certamente seriam mais adequadas ao seu perfil.

7.9.3 A localização geográfica

Pode ser considerado um estrave ao desenvolvimento da Rota Municipal o fato da

cidade de Nova Esperança do Sul estar afastado da BR 287 cerca de doze quilômetros e

estar ligada a esta apenas por uma via asfaltada bastante estreita e sinuosa que dificulta o

tráfego de veículos. Estes fatores fazem com que as pessoas que transitam pela BR

apresentem resistência para desviar o percurso e percorrer a Rota Turística Municipal, até

mesmo por que ainda não existe um serviço de informações turísticas que chame a atenção

dos viajantes sobre a existência da rota e inclusive sobre a existência da cidade, além disso

não inexiste uma sinalização turística que poderia amenizar a desvantagem de localização.

34

Cabe citar que a BR 287 era bastante utilizada por turistas Argentinos que se deslocavam

com destino às praias do litoral Gaúcho e Catarinense, fato que se reduziu drasticamente

nos últimos dois anos em função da crise daquele país, mas que futuramente poderá voltar a

acontecer quando a crise vier a ser superada.

35

8 JUSTIFICATIVA

Acredito ser possível afirmar que a bibliografia sobre a pluriatividade trata

normalmente de experiências consolidadas, ou seja, aborda a prática da diversidade de

ocupações não agrícolas por parte de agricultores familiares em casos já implementados.

Assim, avalio que o relato de uma experiência cuja implantação esteja em

andamento possa demonstrar, com riqueza de detalhes, o processo de transformação e de

construção de uma nova realidade que tem obrigatoriamente vínculo estreito com a questão

da pluriatividade no meio rural.

36

9 METODOLOGIA

Para a consecução deste trabalho, houve a consulta dos seguintes materiais: - a

bibliografia sobre a pluriatividade, o material escrito disponível em atas e relatos do

Consórcio Intermunicipal Caminho das Origens, bem como as ações desenvolvidas no

âmbito do PNMT (Programa Nacional de Municipalização para o Turismo), de forma que

estes dois últimos contam a história da Rota do Verde e das Águas nestes últimos cinco

anos. Além disso, foram incorporadas experiências pessoais acumuladas pelo

acompanhamento de perto de todo este processo.

37

10 ENCAMINHAMENTOS PARA AÇÕES E ESTUDOS FUTUROS

10.1 A extensão rural e o turismo

Diante de todos estes elementos levantados sobre o ambiente em que está inserida a

Rota Turística do Verde e das Águas, cabe agora tecer algumas considerações sobre o papel

da extensão rural e dos coordenadores da rota para a promoção do desenvolvimento do

turismo neste ambiente tão favorável ao desenvolvimento da atividade, do ponto de vista

dos atributos naturais, culturais e arquitetônicos, porém relativamente desfavorável do

ponto de vista do tecido social existente.

Conforme Bricalli, Fucks e Almeida (2002, p. 186) “... as famílias rurais envolvidas

na atividade turística precisam ser orientadas para realizar uma atividade de qualidade e

sem amadorismo”. Ainda segundo estes autores, “os extensionistas rurais, irão

desempenhar significativo papel social junto às comunidades agrícolas enquanto agentes

mediadores, que interagem com as famílias, apreendendo a sua realidade e construindo

conjuntamente as soluções possíveis a partir das necessidades levantadas”. Esta visão sobre

o papel da extensão rural neste processo de desenvolvimento do turismo vem de encontro à

missão da EMATER/RS, visto que nos últimos anos a empresa vem se adaptando a uma

nova realidade de não só dedicar-se às questões relativas ao repasse de tecnologias para os

agricultores produzirem alimentos, e sim a busca de uma visão sistêmica da propriedade e

da família rural, numa preocupação constante com a evolução social, econômico e cultural

das pessoas e com a preservação do meio ambiente e da saúde, tanto dos agricultores,

quanto dos consumidores. Nesta perspectiva, a entidade oficial prestadora de assistência

técnica e extensão rural do Estado, a EMATER/RS, cujo público são os agricultores

familiares, deve envolver-se intensamente com o desenvolvimento do turismo rural, uma

vez que atualmente vêm sendo desmistificadas as questões relativas a produção agrícola e

não agrícola em espaço rural.

Estes mesmos autores (p. 182) comentam, “os serviços de extensão rural precisam

encontrar uma nova forma de atuação perante as famílias que trabalham com o turismo

rural, já que estas não desenvolvem apenas atividades agrícolas”. Prosseguindo na

discussão, estes autores (p.185) abordam: “... a atividade turística é encarada como uma

oportunidade a mais para efetuar a comercialização dos produtos agropecuários da

propriedade, o que acaba sendo viabilizado através de instalações como um pequeno ponto

de venda ou restaurante. Trazendo vantagens tanto para produtor quanto para consumidor

em termos de preços”.

Em relação ao turismo, a extensão rural deve manter sempre uma ação no sentido de

promover a capacitação das famílias rurais para o resgate das habilidades deste público para

que fabrique de forma autêntica seus produtos coloniais (agroindustriais), porém utilizando-

se de técnicas de higiene e de conservação que dêem ao consumidor (turista) confiabilidade

sobre a qualidade dos produtos.

Outra possibilidade de apoio da extensão rural é na elaboração de planos de crédito

visando obtenção de recursos para investimentos em estruturas e equipamentos destinados

ao desenvolvimento das atividades vinculadas ao turismo rural, bem como na orientação

sobre a correta aplicação dos recursos e na adequação das estruturas existentes, primando

pela preservação da identidade local.

38

10.2 O turismo no âmbito da família rural

Pensando as questões de gênero no âmbito da família rural. Dentro da nossa

sociedade patriarcal, muitos aspectos têm apresentado evolução nos últimos anos, mas a

maioria da sociedade ainda reproduz (inconscientemente as vezes) os papéis

tradicionalmente tidos como normais, onde cabe ao homem o papel do provedor,

responsável por trazer o dinheiro para casa e administrar os bens da família, deixando para

a mulher aquelas atividades relacionadas ao cuidado com os filhos, a administração da casa

e a preocupação com a preparação dos alimentos.

Fazendo-se uma análise das famílias rurais envolvidas na Rota do Verde e das

Águas, e tomando como base aquelas reflexões anteriormente levantadas em relação ao

grande apego dos agricultores locais ao cultivo da soja, à luz das reflexões levantadas por

Silva e Almeida (2002, p. 180-190) sobre os aspectos da família nos tempos do turismo,

podemos perceber que entre os agricultores homens, é marcante a preocupação em

desenvolverem trabalhos que tenham status de atividade produtiva, mesmo que em alguns

casos seja minimamente produtiva, como é o caso da soja em nossos dias na pequena

propriedade.

Normalmente tem sido os homens que participam das reuniões e dos eventos de

capacitação da Rota Municipal e talvez seja este um equívoco de estratégia cometido pelos

coordenadores do processo, pois os homens estão encontrando dificuldades de acreditar que

o turismo rural possa gerar futuramente renda suficiente que justifique uma maior

dedicação de seu tempo e de seus investimentos.

É provável que se passarem a ser envolvidas mais as mulheres neste processo, estas,

a medida que forem se ocupando das atividades de produção de alimentos e prestação de

serviços aos turistas, passarão a contribuir significativamente com o ingresso de renda na

propriedade rural, e com isso certamente motivarão os homens a somarem-se a elas assim

que perceberem ser o turismo rural uma atividade lucrativa e que muito bem se insere na

família, sem grandes prejuízos de continuidade das outras atividades até então

desenvolvidas.

Para isso há necessidade da família rural superar o sentimento de inferioridade em

relação aos urbanos com os quais passarão a conviver diariamente, sentimento este fruto de

todo o processo de desvalorização das pessoas e dos aspectos relacionados ao meio rural,

que ocorreu nas últimas décadas, mas que está sendo revertido gradativamente. Neste ponto

é fundamental a participação dos jovens rurais no turismo conforme abordam estes mesmos

autores (p. 187), “Os filhos terão condições de fazer a transição para se igualarem ao

ambiente urbano, deixando para trás o sentimento de inferioridade pela falta de estudo e a

insegurança empresarial. Mas também recebem o patrimônio e os valores sociais que os

tornam os legítimos representantes da tradição explorada turisticamente. Representam a

ligação entre o tradicional e o profissionalismo”.

Também os idosos têm possibilidade de encontrar papel de destaque em relação ao

turismo, pois muitas vezes os filhos casados permanecem habitando a mesma casa de

origem, de forma que alguns destes “nonos” permanecem ainda com o status de chefes da

unidade familiar, sendo fundamentais para a preservação da memória e pelo saber fazer

tradicional, principalmente das receitas utilizadas na fabricação dos produtos coloniais (da

agroindústria familiar), que são matérias-prima do turismo. Ainda estes autores (p. 188)

comentam: “Grande parte da valorização cultural (...) baseia-se nas lembranças dos idosos,

que também participam intensamente da vida da família e da comunidade em atividades

sócio-culturais e econômicas”.

39

Como o que se deseja para estas famílias é que permaneçam autênticos na sua

condição de agricultores, porém auto-valorizadas e valorizadas convenientemente pelos

outros, de maneira que aconteça aquilo que se constata em Bento Gonçalves – RS, que tão

bem se identifica com nossos propósitos, conforme os mesmos autores (p. 194): “O

trabalho rural continua paralelo ao artesanal em quase todas as famílias. O marido continua

na roça e a esposa produzindo para vender nos pontos que recebem turistas. Vai chegar ao

ponto em que a agricultura vai produzir para o turismo”.

10.3 O Consórcio e a necessidade de uma nova postura

Complementando a discussão levantada anteriormente sobre os problemas

enfrentados pelo Consórcio Intermunicipal da Rota Caminho das Origens, que resultam em

entrave ao desenvolvimento local do turismo. Os elementos trazidos para a discussão

possibilitam que sejam feitas sugestões sobre algumas medidas que poderiam trazer

melhorias ao processo. Parece-nos óbvio que, como alguns municípios dos extremos da rota

acabam por participar de outras rotas turísticas, que seja proposto a eles uma definição

sobre esta situação dúbia, já que sua atitude provoca prejuízos a todos os integrantes do

Consórcio. Levando-se em consideração o aspecto de dimensão talvez exagerada da rota, é

provável que com a saída de alguns municípios seja possível melhorar a identidade da rota

e estreitar as relações entre os municípios membros para a realização de ações conjuntas.

10.4 A preocupação com a preservação

Levando em conta que com o crescimento do número de visitações à Rota crescerão

também os riscos de degradação dos recursos naturais, embora este fenômeno já ocorra em

pequena escala, futuramente haverá necessidade de serem realizados estudados sobre o que

alguns autores chamam de “capacidade de carga” sobre um determinado produto turístico.

Sobre isso Magro (2002, p. 152) faz referência a uma metodologia chamada VIM (Manejo

de Impacto da Visitação), que se dedica a estudar os reflexos das visitações turísticas sobe a

perda da vegetação, a erosão do solo, a presença de lixo, a contaminação da água, os

incêndios e a modificação no comportamento animal, tendo por objetivo prover diversos

tipos de informações para auxiliar a complicada tarefa de controlar ou eliminar impactos

indesejáveis. Esta mesma autora (p. 149) analisa que: “... enquanto a pesquisa pode

proporcionar informações variadas para orientação, definições finais da capacidade de

carga recreacional devem ter uma natureza administrativa. Estudos ecológicos podem

mostrar como as comunidades biológicas vão mudar com o uso, mas alguém deve decidir

quanta mudança é aceitável”.

Analisando estas questões levantadas e trazendo para a nossa realidade de

preservação da Gruta, da Igreja de Pedra e das Casas de Pedra, sabe-se que não estão sendo

conservadas adequadamente, e inclusive existem algumas edificações antigas abandonadas

e sem perspectivas de reconstrução. Detalhando-se melhor a questão da Gruta este lugar é

aberto permanentemente à visitação pública a qualquer horário do dia e da noite, sem a

presença de guardas e com atendimento ainda precário de guias turísticos. Esta situação

está infelizmente permitindo atitudes depredatórias por parte de visitantes não

conscientizados, que fazem inscrições nas paredes, acendem fogueiras em locais impróprios

e circulam de automóveis e ônibus em locais que potencialmente podem provocar ou

facilitar o processo de desprendimento de placas rochosas.

Com base nesta breve problematização quanto ao que acontece nesta gruta, percebe-

se que são necessárias ações imediatas para a preservação do local e a melhor preparação

40

para o recebimento de turistas. É urgente a necessidade de implantação de ações restritivas

ao acesso à gruta para impedir a entrada de veículos nos arredores da gruta e restringir o

acesso de turistas em horários impróprios, manutenção de guias turísticos permanentemente

a disposição dos visitantes, e restrição a novas construções nas proximidades e no interior

da gruta.

10.5 A preocupação com o embelezamento da paisagem

Ao se percorrer a cidade e a área rural do município, facilmente percebe-se que a

população tem muito a melhorar em termos de promover o embelezamento das residências

e de suas propriedades, principalmente ao longo das rodovias que servem à Rota. Este

embelezamento que começa a acontecer deve ser muito bem estimulado, mediante

campanhas de plantio de flores seguindo critérios paisagísticos e também pelo cuidado com

a pintura e com a limpeza nas proximidades das residências, conservando suas

características originais. Mas ainda é difícil para as pessoas entenderem que é através da

soma da ação de cada um que se terá um conjunto mais atrativo e harmônico do ponto de

vista turístico.

10.6 O turismo como promotor do resgate da cultura

Analisando o relativo processo de aculturação da população envolvida com a Rota

em estudo, serve como alento as considerações de Albuquerque (2002, p. 191 – Anais) que

entende o turismo como “uma atividade mais bem colocada para assegurar a revitalização

do tecido econômico rural, sendo tanto mais forte quanto conseguir endogeneizar os

recursos, a história, as tradições e a cultura de cada região”. E para reforçar esta visão sobre

a importância do turismo para o resgate cultural, Silva e Almeida (2002, p. 52-53)

comentam que “os valores da imigração italiana são mantidos pelo turismo por meio da

manutenção da propriedade familiar e da identidade cultural, traduzida em artesanato,

alimentação e língua”. Desta maneira, deseja-se que o turismo promova um intenso

processo de resgate dos valores culturais, já que sem ele estes valores seriam rapidamente

perdidos.

41

11 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

É fato que o município não se localiza na região preferencialmente visitada pelos

turistas da Capital do Estado e de outros Estados, ou seja, de locais com maior efetivo de

população. Enquanto esta situação não se alterar, a Rota Municipal terá que trabalhar

inicialmente para melhor atrair os turistas das cidades mais próximas.

Para a superação do relativo problema de localização geográfica da Rota do Verde e

das Águas, a qual ainda é difícil de ser “descoberta” e visitada, torna-se necessário utilizar a

grande evolução dos processos de comunicação ocorrida com a possibilidade do uso da

Internet, desta maneira torna-se fácil a divulgação dos atrativos turísticos para o mundo

inteiro.

Nesta perspectiva, faz-se necessário a elaboração de página para a Internet, “CD

Room” e outros meios de divulgação ligados à informática, que tornam-se de baixo custo e

apresentam capacidade enorme de dispersão.

Isto é de grande importância pois os atrativos de naturezas científica, a arquitetura,

as belezas naturais e os aspectos culturais desta Rota altamente peculiar, certamente

interessam a vários tipos de turistas de todo o mundo.

42

12 REFERÊNCIAS:

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desenvolvimento local. In: CONGRESSO INTERNACIONAL SOBRE TURISMO

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