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PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL INCLUSIVA ROMANINI, Anicoli (1); MARTINS, Marcele Salles(2). (1) Professora Mestre na Área de Infraestrutura e Meio Ambiente, Escola de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade Meridional IMED. [email protected] (2) Mestre em Engenharia pela Universidade de Passo Fundo; Arquiteta e Urbanista com especialização na área de Gestão Urbana e Desenvolvimento Municipal pela Universidade de Passo Fundo. RESUMO No Brasil, a arquitetura inclusiva chegou apenas na década de 1980, quando ocorreram transformações nas legislações e normas técnicas. Atualmente, a acessibilidade está presente em diversos locais como: vias públicas, áreas de convívio pessoal e social, transporte coletivo, mobiliário urbano e em edificações públicas. Assim, pouco a pouco, uma rede articulada e acessível começa a ser delineada. Da mesma forma, o acesso à moradia digna e dotada de habitabilidade configura um dos mais importantes direitos do cidadão, e trata-se de um desejo intrínseco do ser humano. É uma condição básica para a promoção de sua dignidade, o que faz dela um importante fator de estabilidade social e política. As edificações nem sempre correspondem às reais necessidades dos moradores. Assim, promover a inclusão social sustentável em habitação de interesse social é uma tarefa não apenas técnica, pois depende, acima de tudo, de mudanças de atitudes, de compromisso e de paradigmas de que as comunidades mais carentes também podem e devem ter acesso a oportunidades de uma arquitetura acessível e igualitária, com pleno acesso aos recursos da sociedade. Essa premissa fomenta as pesquisas desenvolvidas pelo Núcleo de Estudo e Pesquisa em Edificações Sustentáveis da Faculdade Meridional (IMED), que propôs um projeto de habitação de interesse social acessível. Esse projeto foi desenvolvido a partir dos princípios da arquitetura inclusiva, para atender uma parcela de portadores de

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PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL

INCLUSIVA

ROMANINI, Anicoli (1); MARTINS, Marcele Salles(2).

(1) Professora Mestre na Área de Infraestrutura e Meio Ambiente, Escola de

Arquitetura e Urbanismo da Faculdade Meridional – IMED.

[email protected]

(2) Mestre em Engenharia pela Universidade de Passo Fundo; Arquiteta e Urbanista

com especialização na área de Gestão Urbana e Desenvolvimento Municipal pela

Universidade de Passo Fundo.

RESUMO

No Brasil, a arquitetura inclusiva chegou apenas na década de 1980, quando

ocorreram transformações nas legislações e normas técnicas. Atualmente, a

acessibilidade está presente em diversos locais como: vias públicas, áreas de

convívio pessoal e social, transporte coletivo, mobiliário urbano e em

edificações públicas. Assim, pouco a pouco, uma rede articulada e acessível

começa a ser delineada. Da mesma forma, o acesso à moradia digna e dotada

de habitabilidade configura um dos mais importantes direitos do cidadão, e

trata-se de um desejo intrínseco do ser humano. É uma condição básica para a

promoção de sua dignidade, o que faz dela um importante fator de estabilidade

social e política. As edificações nem sempre correspondem às reais

necessidades dos moradores. Assim, promover a inclusão social sustentável

em habitação de interesse social é uma tarefa não apenas técnica, pois

depende, acima de tudo, de mudanças de atitudes, de compromisso e de

paradigmas de que as comunidades mais carentes também podem e devem ter

acesso a oportunidades de uma arquitetura acessível e igualitária, com pleno

acesso aos recursos da sociedade. Essa premissa fomenta as pesquisas

desenvolvidas pelo Núcleo de Estudo e Pesquisa em Edificações Sustentáveis

da Faculdade Meridional (IMED), que propôs um projeto de habitação de

interesse social acessível. Esse projeto foi desenvolvido a partir dos princípios

da arquitetura inclusiva, para atender uma parcela de portadores de

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necessidades especiais que residirão no Loteamento Canaã, que prevê a

construção de 210 casas a serem erguidas no bairro São José, em Passo

Fundo, RS.

Palavras-chaves: Acessibilidade; Arquitetura inclusiva; Habitação de Interesse

Social.

ABSTRACT

In Brazil, inclusive architecture arrived only in the 1980s, when changes

occurred in the legislation and technical standards. Currently, accessibility is

present in varied places such as: public roads, personal and social hubs, public

transportation, areas equipped with urban furniture and public buildings. Thus,

in a gradual manner, an articulated and accessible network begins to be

outlined. Likewise, the access to decent housing and provided with housing

quality represents one of the most important rights of citizens, and it is an

intrinsic human desire. This is a basic condition for the promotion of their

dignity, turning it into an important factor of social and political stability.

Buildings do not always correspond to the real needs of the residents.

Therefore, to promote sustainable social inclusion in social housing is not only a

technical task, it depends, above all, changes in attitudes, commitment and

paradigms that poorer communities can and should have access to

opportunities for an accessible and egalitarian architecture, with full access to

the resources of society.This assumption is at the base of the research

developed by the Center for Study and Research in Sustainable Buildings at

Faculdade Meridonal (IMED), that proposed a sustainable social housing

project. This project was developed from the principles of inclusive architecture

to meet a portion of handicapped users who live in the Canaan Residential

Condominium, which includes construction of 210 dwellings to be erected in the

São José neighborhood in Passo Fundo, RS.

Keywords: Accessibility; Inclusive Architecture; Social Housing.

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1 INTRODUÇÃO

O princípio da arquitetura inclusiva teve seu início diretamente ligado à

Segunda Guerra Mundial, onde veteranos de guerra, mutilados, não

conseguiam exercer mais funções do dia-a-dia. Deste modo, as barreiras

arquitetônicas e os desconfortos das edificações ficaram evidentes para

portares de necessidades especiais. Após o fim da Segunda Guerra, surge à

primeira padronização de acessibilidade nos Estados Unidos, cuja evolução

derivou o conceito de Design Universal, ou seja, produtos e ambientes que

pudessem ser usados por todas as pessoas.

No Brasil, a arquitetura inclusiva chegou apenas na década de 80, através de

adequações nas legislações e normas técnicas. Atualmente, a acessibilidade

está presente em diversos locais como: vias públicas, áreas de convívio

pessoal e social, transportes coletivos, mobiliários urbanos e em edificações

públicas. Assim, pouco a pouco, uma rede articulada e acessível começa a ser

delineada.

Segundo estatísticas do Censo Demográfico de 2010 (IBGE), próximo de 46

milhões de brasileiros, ou seja, cerca de 24% da população, declaram-se com

algum tipo de deficiência (mental, motora, visual e auditiva). Sabe-se que a

habitação é um direito básico de cidadania, para que esse direito seja garantido

é necessário implementar soluções construtivas e tecnológicas em prol dos

portadores de necessidades especiais.

Diante do exposto, o presente trabalho busca apresentar um projeto de

habitação de interesse social inclusivo para atender uma parcela de portadores

de necessidades especiais que residirão no Loteamento Canaã, em Passo

Fundo, RS.

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2 A DEFICIÊNCIA E A ARQUITETURA INCLUSIVA

2.1 A DEFICIÊNCIA

Considera-se Pessoa Portadora de Deficiência (PPD) aquela que apresenta,

em caráter permanente, perdas ou reduções de sua estrutura, ou função

anatômica, fisiológica, psicológica ou mental, que gere incapacidade para

certas atividades, dentro do padrão considerado normal para o ser humano

(IBC, 2012). Além disso, é de extrema importância entender e compreender a

natureza desses problemas fisiológicos que atingem os indivíduos, bem como

suas dificuldades diárias, para assim tornar essas pessoas cada dia mais

independentes e inclusas em qualquer forma seja cultural, social e/ou

ambiental.

Segundo Dischinger (2012), as deficiências são organizadas em quatro grupos

distintos:

Deficiências Físico-Motoras: São aquelas que alteram a capacidade de

motricidade geral que as impossibilitam na realização de qualquer

movimento, são causadas por fatores genéticos, fatores virais, entre

outros. Por exemplo, uma pessoa que sofreu um trauma medular, pode

apresentar entre outros problemas, a paraplegia ou tetraplegia

dependendo da região em que a medula foi afetada.

Deficiências Sensoriais: São as deficiências que se caracterizam pelo

não funcionamento (total ou parcial) de algum dos cinco sentidos, que

impossibilitam a percepção do indivíduo, gerando dificuldade em

perceber diferentes tipos de informação ambiental. Adota-se aqui a

classificação proposta por Gibson (1966) dos sistemas perceptivos em:

orientação, háptico, visual, auditivo e paladar-olfato. No Brasil as

alterações nos sistemas de orientação, háptico e paladar-olfato não são

classificados legalmente como deficiência.

Deficiências Cognitivas: É a deficiência referente à dificuldade ou falta

de compreensão e recebimento de informações recebidas, ela pode

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dificultar o aprendizado e aplicação do entendimento, a comunicação

com outras pessoas, ainda dificultando a concentração na execução de

tarefas mesmo as mais simples. Muitas vezes o indivíduo necessita da

ajuda de outras pessoas no auxilio das atividades e até de convívio

social. A exclusão dessas pessoas da sociedade acaba dificultando

ainda mais o seu desenvolvimento intelectual e social.

Deficiências Múltiplas: É quando o individuo mostrar-se com duas ou

mais deficiências, sejam deficiências intelectuais e físicas, ou ambas

combinadas. Elas podem estar associadas a uma deficiência sensorial e

físico-motora. O ambiente para pessoas de deficiências múltiplas deve

atender os requisitos necessários para cada tipo, integrado, mas

procurando evitar conflitos.

2.2 ARQUITETURA INCLUSIVA

Em 1987, o arquiteto criador da terminologia Universal Design (Desenho

Universal) Ron Mace (1941-1998), era cadeirante e respirava com uso de

aparelho. Mace acreditava que não se tratava do nascimento de uma nova

ciência ou estilo, mas sim de uma percepção de aprimorar as coisas que se

projeta, tornando-as utilizáveis para todos. Mace, na década de 90, juntamente

com arquitetos, criou um grupo para defender seus ideais, no qual

estabeleceram os sete princípios do desenho universal (NASSRALLAH, 2010).

Hoje estes conceitos são utilizados mundialmente, adotados para qualquer

programa de acessibilidade plena. De acordo com Mace (1987) são eles:

Equitativo/Igualitário: ambientes, objetos e produtos que podem ser

usados por pessoas com diferentes capacidades, tornando todos os

espaços iguais;

Uso flexível/Adaptável: planejar produtos que atendam pessoas com

habilidades distintas, sendo adaptáveis a diferentes formas de uso;

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Uso simples e intuitivo: de simples entendimento, compreensível para

qualquer pessoa independente de sua idade, conhecimento, habilidade

de linguagem ou nível de concentração;

Informação de fácil percepção: quando a informação necessária é

comunicada de modo que atenda as necessidades do receptador;

Tolerância ao erro/Seguro: previsto para minimizar riscos e possíveis

consequências de ações eventuais ou não propositadas;

Esforço físico mínimo: para ter seu uso eficaz, com comodidade e o

mínimo de fadiga;

Dimensionamento de espaços para acesso e uso abrangente: que

determina dimensões e espaços adequados para o acesso, alcance,

manipulação e uso, independente das dimensões de um corpo, da

postura ou mobilidade do usuário.

A compreensão destes princípios é definitiva para a mudança de paradigma na

arquitetura e no urbanismo, pois leva experiências e metodologias voltadas à

democratização dos ambientes públicos e privados para todos os usuários.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) criou a primeira norma

referente à acessibilidade em 1985. Hoje, após duas revisões, a NBR 9050

(2004) apresenta os parâmetros básicos a serem seguidos sem restrições ou

alterações, independente da destinação do espaço, às condições de

acessibilidade. Alguns exemplos destas aplicações são: altura de comandos de

janelas, interruptores, tomadas, vãos de portas, inclinações e larguras de

rampas, dimensionamento de sanitários, entre outros.

O governo federal propõe algumas ações que visam à acessibilidade, como a

implantação de casas inclusivas, através de residências especializadas para

jovens e adultos com deficiência. Outra ação busca garantir a acessibilidade ao

Programa Minha Casa, Minha Vida, distribuindo 25 mil kits de adaptação para

moradias já construídas (Figura 1).

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Figura 1. Exemplo da utilização do Desenho Universal em uma unidade habitacional

Fonte: Governo do Estado de São Paulo (2009)

Uma unidade habitacional inclusiva deve dispor de espaços adequados a todas

as necessidades, assim como acessos e espaços bem dimensionados, que

proporcionem conforto, segurança e bem-estar aos moradores. Para tanto, o

projeto deve considerar as dimensões de área de manobra e do módulo de

referência, além de possibilitar flexibilidade de acesso ao mobiliário e

aberturas, permitindo que todos os movimentos e deslocamentos internos

sejam realizados de forma independente pelo morador/portador de

necessidades especiais (Figura 2).

Figura 2. Os cômodos devem ter dimensões e forma que permitam uma área de manobra de

no mínimo 180º, e disposição dos mobiliários com no mínimo 80 cm de distância entre eles.

Fonte: Governo do Estado de São Paulo (2010, p.58 a 63)

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De acordo com a Figura 3, é mínimo o incremento de área das edificações para

que esta se torne acessível:

Figura 3. Áreas médias das edificações, segundo a tipologia arquitetônica adotada

Fonte: Governo do Estado de São Paulo (2010, p.86 a 87)

3 MÉTODO EMPREGADO

A metodologia empregada para o presente trabalho consta da aplicação de um

questionário semi-estruturado, dividido em duas etapas, as futuras famílias do

loteamento. A primeira aborda aspectos socioeconômicos, com questões

abertas e fechadas e a segunda aspectos urbanos, melhorias de ampliação da

habitação, implantação de equipamentos comunitários, tipologia habitacional e

sustentabilidade, por meio da técnica de preferência declarada (PD).

A amostra consiste em 210 famílias cadastradas pelo Grupo de Mulheres

Unidos Venceremos que foram beneficiadas no Programa do Governo Federal,

Minha Casa Minha Vida - Entidades. As entrevistas foram aplicadas ao

responsável beneficiado no Programa, num encontro proporcionado pelo Grupo

de Mulheres juntamente com o Núcleo de Estudo e Pesquisa em Edificações

Sustentáveis – NEPES da Faculdade IMED. Na oportunidade, foram

entrevistados pelos acadêmicos da Escola de Arquitetura e Urbanismo,

voluntários da pesquisa Arquitetura Sustentável de Interesse Social em

andamento do NEPES, 150 responsáveis.

A primeira parte do questionário consta de onze questões, sendo sete fechadas

e três abertas. As questões fechadas referem-se ao sexo, escolaridade, estado

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civil, quantidade de pessoas que irão residir na futura moradia, se o

respondente tem filhos, renda familiar e se algum membro da família possui

algum tipo de necessidade especial. As questões abertas se relacionam com a

atividade profissional exercida pelo respondente, o bairro que reside

atualmente e os beneficiados foram questionados a respeito do porquê querem

morar no loteamento Canaã.

No segundo momento, foi realizada a entrevista semi-estruturada por meio da

técnica de preferência declarada (PD). Esta metodologia consiste em

apresentar um conjunto de opções aos entrevistados, com alternativas

possíveis para que uma seja escolhida, as escolhas iram identificar os atributos

preferidos ou de maior importância (BRANDLI; HEINECK, 2005). Tendo em

vista o contexto de aplicação, decidiu-se pelo desenvolvimento de cartões

ilustrados como instrumento de coleta de atributos preferenciais. Foram

apresentados sete cartões aos entrevistados, onde os mesmos os escolhiam

por grau de preferência ou prioridade. O estudo do PD disponibiliza resultados

com maior probabilidade de ocorrência, ou seja, é um resultado em potencial.

O mesmo, segundo Brandli; Heineck (2005) é dividido em três etapas: a

primeira etapa se refere a estruturação para identificação dos atributos mais

relevantes a serem incorporados na pesquisa de campo. A segunda etapa é a

aplicação com pré-teste e a terceira: análise e interpretação de dados.

Uma das desvantagens desta técnica é de que os respondentes realizam

escolhas hipotéticas no momento da entrevista e de que as mesmas poderiam

ser divergentes em situações reais (BRANDLI; HEINECK, 2005). Dentro dos

diversos cenários apresentados aos entrevistados, este artigo apresentará,

especificamente, o perfil socioeconômico da comunidade entrevistada.

4 PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL

INCLUSIVA

O conceito de construção sustentável engloba segundo Araújo (2011), “uma

visão multidisciplinar e complexa”, pois ele foi pensado e elaborado não como

um modelo para resolver problemas isolados de uma geração determinada, e

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sim como uma forma de “intervir no meio ambiente, preservando-o em escala

evolutiva”, buscando soluções para os principais problemas e atendendo as

necessidades de todos.

A partir deste conceito de construção sustentável é que será pensado e

concebido o novo loteamento que atenderá as famílias que ocuparão as

habitações de interesse social.

Este novo loteamento, denominado Canaã, está inserido na malha urbana do

município de Passo Fundo/RS, possuindo uma área de 49.000m², demarcada

no Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado como Zona Especial de

Interesse Social (ZEIS).

A implantação do loteamento é uma iniciativa de um grupo de mulheres,

denominado, Grupo de Mulheres Unidos Venceremos, uma entidade não

governamental que desenvolve projetos sociais no bairro Leonardo Ilha, a mais

de dez anos. A partir desta iniciativa, foram contratados os projetos de

infraestrutura do loteamento, bem como os projetos arquitetônico e

complementares das futuras residências. Os projetos mencionados foram

encaminhados à Caixa Econômica Federal, agência financiadora do Programa

Minha Casa Minha Vida, na modalidade Entidades, os quais já encontram-se

aprovados. Este projeto é pioneiro no Brasil e até então não existe histórico de

aprovação anterior dentro desta modalidade.

Conforme o levantamento dos dados obtidos pelo questionário aplicado, alguns

itens foram considerados mais relevantes para análise e apresentação do perfil

da população beneficiada. De acordo com a pesquisa, 8% dos respondentes

possuem familiar com algum tipo de deficiência.

A partir do projeto arquitetônico que contempla sala, cozinha, dois dormitórios e

banheiro, distribuídos em 54,66m² (Figura 4), foram desenvolvidas adequações

no projeto, seguindo as premissas da arquitetura sustentável e inclusiva.

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Figura 4. Projeto embrião

Fonte: Autores, 2013.

Com a crescente demanda por unidades habitacionais de interesse social,

dentro do programa de governo Minha Casa Minha Vida, as intervenções

propostas no projeto visam corroborar com a inserção de projetos habitacionais

inclusivos na implantação de loteamentos financiados pelo Programa.

As habitações inclusivas sofreram adição de área em todos os compartimentos,

para permitir melhor circulação do portador de necessidades especiais. Esse

acrescimo foi de 14,83m², ou 21%, totalizando 69,49m² de área construída. A

implantação acontece nas divisas do lote, considerando lotes de 10mx20m

(Figura 5). A Figura 6 ilustra a implantação das residências no loteamento,

intercalando habitações-embrião e habitações inclusivas.

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Figura 5. Projeto inclusivo

Fonte: Autores, 2013.

Figura 6. Implantação no loteamento

Fonte: Autores, 2013.

Segundo Després (1991, apud Brandão e Heineck, 2003), os estudos de

tipologia e morfologia examinam tipicamente as transformações espaciais ao

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longo dos anos em termos de morfologia e características funcionais, as

transformações de espaços domésticos e as práticas de subdivisão de terrenos,

resultando na definição (ou classificação) de tipos e gerações diferentes de

edifícios e de arranjos domésticos, além dos princípios de projeto que governam

essas formas e layouts. Reis e Lay (2002) verificaram aumentos em três

tipologias analisadas (blocos de apartamentos, casas unifamiliares térreas

isoladas e em fita, e sobrados), sendo os mais significativos localizados no tipo

arquitetônico casa.

Tramontano (1995 e 2000) enfatiza conceitos de flexibilidade e adaptabilidade

quando discute mudanças tanto no processo de projeto como no programa de

necessidades do espaço doméstico. Para Tramontano, uma das principais

razões das modificações feitas pelos usuários das HIS, além da falta de

acabamentos na entrega e das áreas reduzidas, é a inadequação do desenho

interno às necessidades originadas em novas composições familiares.

De acordo com Reis (2002), alterações espaciais realizadas pelos moradores

são ações positivas que refletem oportunidades de apropriação do espaço

doméstico. Para o autor, alterações ocorridas nas habitações podem manifestar

mudanças nas necessidades dos usuários em função de mudanças no tamanho

da família, necessidades de demarcação e identificação de território, entre

outros. Reis enfatiza a importância de se identificar as causas das intervenções,

já que alterar pode não ser o real desejo e necessidade dos moradores.

5 CONCLUSÕES

A pesquisa demonstrou a importância da compreensão das dimensões sociais e

econômicas de uma determinada população para entender a sua realidade,

suas demandas e a forma na qual o processo de projeto deverá ser embasado.

A partir da análise dos dados provenientes das respostas dadas pelos

entrevistados, percebe-se claramente a importância da inserção de um projeto

inclusivo para atender de forma eficaz os futuros usuários que possuem

deficiência.

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De acordo com os tópicos apresentados no presente artigo, se percebe que os

avanços tecnológicos têm mudado a forma de como os portadores de

necessidades especiais interagem com o mundo, uma vez que a tecnologia está

mais preparada para atender e solucionar as mais diversificadas necessidades,

além disso, as leis e normas apresentam os parâmetros básicos a serem

seguidos.

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