projeto agroecologia em rede tecendo fios de uma agricultura e educação no e para o campo
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O Projeto Agroecologia em Rede durante dois anos (2010 e 2011) realizou acompanhamento técnico e formações para famílias agricultoras de Tianguá e Viçosa do Ceará com o objetivo que elas dêem continuidade capacitando outras. Dessa articulação está se consolidando uma Escola Família Agrícola para a organização e valorização da agricultura, da identidade camponesa e dos saberes agroecológicos.TRANSCRIPT
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Ano 8 • nº1388
Janeiro/2014
Projeto Agroecologia em Rede tecendo fios de uma agricultura e educação no e para o campo
«Cultura e produção, Sujeitos da
cultura, A nossa agricultura, Pro bem da
população...» Gilvan Santos
É com o objetivo de valorizar a
importância da agricultura, que nos
municípios de Tianguá e Viçosa do Ceará,
um projeto denominado Agroecologia em
Rede vem tecendo saberes entre famílias
rurais na realização de capacitações
voltadas para a produção agroecológica
sustentável, organização coletiva e
comercialização, por meio de estudos
teóricos e atividades práticas.
Essa iniciativa surgiu no ano final do
ano de 2009, quando os Sindicatos de
Trabalhadoras/es Rurais – STTR's desses
dois municípios discutiam a situação das
famílias que recebem tecnologias sociais de convivência com o Semiárido, e, o que acontece a
partir do momento que as instituições e governos fazem a entrega encerrando sua
responsabilidade.
Fizeram um levantamento e
avaliaram que em muitos casos o uso não
estava sendo adequado, talvez por falta de
conhecimentos, pois, mesmo tendo
passado por cursos de formação durante o
processo de recebimento da tecnologia, o
tempo é insuficiente para que haja uma
aprendizagem satisfatória.
Nesse sentido, o projeto foi criado
para desenvolver um processo formativo e
de assistência, desempenhando o
importante papel de dar continuidade às
discussões, ampliar conhecimentos e
estimular a aplicação dos saberes na
prática, «uma coisa é você participar de um
encontro e ver um vídeo e aí você perceber
Tianguá
Falando de conquistas
Na opinião do agricultor Jorgiel, da comunidade Bom Jesus em Tianguá «antes de existir
esse projeto de agroecologia em rede a gente tinha dificuldade com questão de assistência
técnica, com o projeto veio fortalecer essa assistência e também ajudar a produção, a questão
também da comercialização ajudou um pouco, a expandir também o nosso produto, ficar mais
visado, porque teve toda uma articulação entre os dois sindicatos, pra tá ajudando, pra tá
consolidando isso que a gente já tinha e ajudou bastante».
Desse modo, houve a realização de duas grandes feiras uma em Viçosa e outra em Tianguá,
onde as famílias tiveram a possibilidade de expor e comercializar aquilo que produziam para a
população.
Teve também, em Março de 2011 o lançamento de uma cartilha com onze dicas de receitas
de defensivos naturais, que reuniam saberes técnicos e também populares das/os próprias/os
agricultoras/es.
Entre essas e outras conquistas obtidas, pode se considerar como mais relevante a Escola
Família Agrícola Chico Antonio Bié que está se tornando realidade na Serra da Ibiapaba. Embora já
fosse idealizada antes mesmo do Projeto Agroecologia em Rede, só se tornou possível através
dele quando, no momento em que se fazia o diagnóstico, as famílias demandaram uma educação
adequada a vida no campo e coerente com a realidade.
Como Chico esclarece, «logo no primeiro ano do projeto notou-se claramente a insatisfação
de algumas famílias com a educação recebida pelos filhos na escola convencional. Aí rumamos
para outra dimensão que foi lutar pela fundação de uma Escola Família Agrícola na Região da
Ibiapaba. Em dois anos de luta conseguimos formar a Associação Escola Família Agrícola da
Região da Ibiapaba - AEFARI, com esse público vindo do projeto agroecologia em rede».
Assim, o projeto que começou com o objetivo de fortalecer a produção agroecológica,
ousou ir mais longe e criar uma escola alternativa para que as/os filhas/os tenham a oportunidade
de aprender todas as disciplinas do ensino convencional inter-relacionada com sua vivência,
cuidando da terra, plantas e animais de forma sustentável, reafirmando sua identidade
camponesa e valorizando o trabalho agrícola. A previsão para início das aulas é dia 10 de março de
2014.
Realização Patrocínio
Articulação Semiárido Brasileiro – CearáBoletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
alguma coisa, e outra coisa é você ter um acompanhamento, você vai tirando as dúvidas, e você vai
percebendo a mudança», destaca o agricultor João Jovem da comunidade Areia Branca em
Tianguá.
Assim, ele ficava disponível quinze dias por mês, sendo uma semana em Tianguá e outra
em Viçosa, mas nos momentos de formação e aulas de campo, as famílias dos dois municípios
eram reunidas no mesmo espaço, «nossa metodologia de trabalho era em visitas coletivas na
dinâmica teórica e prática. As experiências acompanhadas eram os quintais produtivos das
cisternas-calçadão do p1+2, sistemas agroflorestais e mandalas», explica Chico.
As ações eram planejadas no início do ano, e, tendo em vista que demandavam altas
despesas, os sindicatos procuraram apoio em instituições parceiras como a EMATER-CE (Empresa
de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará), a ESPAF (Escola de Formação Política e
Cidadania) e o Instituto Agropolos.
Esse último contribuiu com
as capacitações fornecendo
m a t e r i a l d i d á t i c o e
disponibilizando facilitadores/as,
«nós tivemos capacitação em
cooperativismo, associativismo,
comercialização, defensivos
orgânicos...», lembra Manoel
Vicente, diretor do STTR de
Tianguá.
Os sindicatos, por sua vez,
articulavam o local para acontecer
as formações e a alimentação que
e r a f o r n e c i d a p e l a s / o s
próprias/os agricultoras/es
participantes. As outras atividades
eram as aulas de campo e os
intercâmbios intermunicipais
onde as famílias de Tianguá e de
Viçosa conheciam as experiências
umas das outras, obedecendo a um roteiro e calendário preparados anteriormente.
Nessas trocas de conhecimentos, algumas descobriram que já exerciam práticas
agroecológicas, mas não sabiam do que se tratava realmente, como diz João Jovem, «a gente já
tinha mais ou menos uma noção de trabalhar, no sentido de não queimar, no sentido de florescer
perto da casa que era muito quente [...] quando a gente começou participar das reuniões,
começou a perceber que estava no caminho certo e que aquilo que a gente tava comprando para se
alimentar, poderia estar fazendo em casa: o cheiro verde, o plantio de macaxeira [...]».
Vale citar que as atividades eram direcionadas às famílias, mas também mobilizava as
comunidades em mutirões, tornando o projeto conhecido e sensibilizando outras pessoas a se
interessar pelos saberes ali partilhados. Contudo, uma dificuldade que se apresentou foi o fato de
que muitas quiseram e não puderam participar por não ter terra própria e autonomia para
produzir.
Preparando para a continuidade
O projeto iniciou com 16 famílias em Tianguá, 35 em Viçosa do Ceará e com o tempo
algumas desistiram e outras foram aderindo. Nesse contexto, as capacitações visavam prepará-
las para um novo modelo de produção agrícola, mas também, para dar continuidade multiplican-
do os conhecimentos e capacitando outras.
João Jovem afirma que, «na maioria
das coisas, na questão de poda, na questão
de adubação, daqueles defensivos
orgânicos, eu acho que a gente tá super
preparado para enfrentar o trabalho e
preparar mais pessoas». Manoel do Vale,
do Assentamento Nova Esperança enfatiza,
«eu já faço isso e a mulher hoje conversa
com as companheiras dela e as
companheiras já estão mudando».
Entretanto, no aspecto produtivo o
projeto tem sofrido uma paralisação em
conseqüência da estiagem dos dois
últimos anos em que a produção foi
mínima ou inexistente e poucas famílias se
mantiveram produzindo, pelo menos para
o próprio consumo, é o caso de Manoel do
Vale que diz, «com todo fracasso a gente às
vezes tira um cachinho de banana, tira umas
laranjinha, limão a goiaba também tem uns
pés que a gente sempre tira e faz o suco da
goiaba, tem a manga também, tem dois pés
de acerola que dá muita acerola também».
Isso em muito se deve à influência
positiva do projeto nas estratégias de
aproveitamento da água e cobertura do solo,
«se não tivesse orientação, a gente não tinha
a consciência e talvez não tinha conseguido
manter um pouco de produção», confirma
Antonio Feitosa do Assentamento Nova
Esperança.
Assim, é aguardando a chegada da
estação chuvosa que as «famílias
continuam participando das ações do
sindicato e a gente continua sabendo como
está a situação da área», ressalta Manoel
Vicente.
E, a articulação em rede permanece e
se organiza também na luta por uma escola
e uma educação que discuta, valorize o
meio rural e a realidade agrícola, para que
os saberes agroecológicos sejam ensinados
às/aos filhas/os dessas e de outras famílias
rurais.