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Marcelo Pereira Santiago PROJECT FINANCE ANÁLISE COMPARATIVA DE FINANCIAMENTO DE PROJETOS Dissertação apresentada à Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais para obtenção do título de Mestre em Engenharia de Produção Belo Horizonte 2002

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Marcelo Pereira Santiago

PROJECT FINANCE

ANÁLISE COMPARATIVA DE FINANCIAMENTO DE PROJETOS

Dissertação apresentada à Escola de Engenharia da

Universidade Federal de Minas Gerais para obtenção do

título de Mestre em Engenharia de Produção

Belo Horizonte

2002

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Marcelo Pereira Santiago

PROJECT FINANCE

ANÁLISE COMPARATIVA DE FINANCIAMENTO DE PROJETOS

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em

Engenharia de Produção da Escola de Engenharia da

Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito

parcial à obtenção do título de Mestre em Engenharia de

Produção

Área de Concentração: Economia Industrial

Orientador: Professor Carlos Anibal Nogueira da Costa

Departamento de Engenharia de Produção

Escola de Engenharia - UFMG

Escola de Engenharia - Departamento de Engenharia de Produção

Universidade Federal de Minas Gerais

Belo Horizonte - Minas Gerais

2002

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Para meus pais e para Bia e Mariana

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AGRADECIMENTOS

Foram muitas as pessoas que contribuíram para a realização dessa jornada. Gostaria

de dedicar-lhes umas breves palavras que expressam minha gratidão.

Elisa Reis foi a grande incentivadora do Mestrado e proporcionou-me inúmeras

orientações acadêmicas e profissionais. O Professor Antônio Sérgio iniciou-me no

fascinante mundo da ciência. Gostaria de destacar a colaboração de Érico Torres,

diretor de qualidade e sistemas da Andrade Gutierrez Construção Pesada, que me

abriu as portas para o estudo da rodovia Presidente Dutra e familiarizou-me com os

meandros do tema no início de minha carreira. O Professor Carlos Anibal foi não só

um orientador e motivador de valor inestimável, mas também um amigo nos momentos

difíceis que a elaboração de uma dissertação comporta. Antonio Campello, gerente de

programas da Embraer, tornou possível a pesquisa de campo na Embraer. As

discussões que mantive com Paulo Cesar Lucas, engenheiro administrador de

programas da Embraer, em torno do financiamento do ERJ-145, ajudaram-me a

esclarecer e aprofundar várias questões ao longo da dissertação. Minha tarefa tornou-

se menos árdua pelo apoio que recebi da diretora financeira da Embraer, Cynthia

Benedetto, que me facilitou valiosas informações sobre o caso acima mencionado. Do

mesmo modo, o Diretor Paulo Guedes e os gerentes de projetos José Antônio e Pedro

Bernardes, da Andrade Gutierrez Concessões, contribuíram para enriquecer meu

trabalho, fornecendo-me informações importantes sobre o projeto da rodovia

Presidente Dutra. Tania Quintaneiro foi responsável pela revisão final do trabalho.

Sou grato a meus ex-colegas da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG e da

Andrade Gutierrez, a meus companheiros atuais na Embraer e aos professores do

Departamento de Engenharia de Produção da UFMG, que apesar de não estarem

diretamente envolvidos com o tema relativo a financiamento de projetos, tornaram meu

aprendizado uma experiência prazerosa.

Agradecimentos especiais a Leonardo, Henrique, Lúcio, Beatriz, aos meus queridos

avós e a todos meus familiares, pessoas importantes na minha vida. Cada um à s ua

maneira contribuiu para a superação desse desafio.

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SUMÁRIO

Lista de Ilustrações......................................................................................................... 23

Lista de figuras ........................................................................................................... 23

Lista de gráficos.......................................................................................................... 24

Lista de fórmulas ........................................................................................................ 24

Lista de tabelas ........................................................................................................... 25

Lista de Abreviaturas e Siglas ........................................................................................ 27

Resumo........................................................................................................................... 29

Abstract........................................................................................................................... 30

1 Introdução.................................................................................................................... 15

1.1 Justificativa ........................................................................................................... 15

1.2 Delimitação do objeto de estudo.......................................................................... 16

1.3 Pergunta, hipótese e objetivos da pesquisa........................................................ 17

1.4 Metodologia .......................................................................................................... 18

1.5 Limitações da pesquisa........................................................................................ 21

1.6 Organização do trabalho ...................................................................................... 22

2 Decisão de Financiamento.......................................................................................... 24

2.1 Decisão de Investimento ...................................................................................... 24

2.2 Modalidades de financiamento de projetos ......................................................... 28

2.3 O que é Corporate Finance.................................................................................. 30

2.4 O que é Project Finance....................................................................................... 31

2.5 Fontes de recursos............................................................................................... 34

2.6 Análise de viabilidade do projeto ......................................................................... 44

2.7 Arranjos de garantia ............................................................................................. 50

2.8 Estrutura jurídica................................................................................................... 55

2.9 Plano de financiamento ........................................................................................ 57

3 O projeto de concessão da rodovia Presidente Dutra ................................................ 63

3.1 O segmento rodoviário e o programa de concessões do Brasil.......................... 63

3.2 O projeto ............................................................................................................... 67

3.3 Histórico................................................................................................................ 74

3.4 Arquitetura financeira: Project Finance................................................................ 75

3.5 Análise de viabilidade do projeto ......................................................................... 77

3.6 Arranjos de garantia ............................................................................................. 82

3.7 Estrutura jurídica e organização .......................................................................... 85

3.8 Arranjos financeiros .............................................................................................. 87

4 O projeto da aeronave regional ERJ-145 ................................................................. 100

4.1 A indústria aeronáutica regional norte-americana ............................................. 100

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4.2 O projeto ............................................................................................................. 108

4.3 Histórico.............................................................................................................. 111

4.4 Arquitetura financeira: as parcerias de risco (risk-sharing) ............................... 114

4.5 Análise de viabilidade do projeto ....................................................................... 118

4.6 Arranjos de garantia ........................................................................................... 121

4.7 Estrutura jurídica e organização ........................................................................ 122

4.8 Arranjos financeiros ............................................................................................ 124

5 Análise Comparativa ................................................................................................. 134

5.1 Organização ....................................................................................................... 134

5.2 Controle e monitoramento .................................................................................. 135

5.3 Alocação de risco............................................................................................... 135

5.4 Flexibilidade financeira ....................................................................................... 136

5.5 Fluxo de caixa líquido......................................................................................... 136

5.6 Agency costs ...................................................................................................... 137

5.7 Estrutura dos contratos de dívida ...................................................................... 138

5.8 Capacidade de endividamento........................................................................... 138

5.9 Insolvência .......................................................................................................... 139

5.10 Características comuns.................................................................................... 139

6 Conclusão.................................................................................................................. 141

6.1 O financiamento como fator crítico de sucesso................................................. 141

6.2 Vantagens e desvantagens para os sponsors................................................... 143

6.3 Projetos candidatos ............................................................................................ 144

6.4 Perspectivas para financiamento de projetos .................................................... 145

6.5 Considerações finais e trabalhos futuros ........................................................... 146

7 Referências Bibliográficas ......................................................................................... 149

7.1 Informações extraídas das redes de comunicação eletrônica.......................... 152

8 Glossário de Termos Técnicos e Financeiros........................................................... 153

9 Anexos ....................................................................................................................... 157

9.1 ANEXO A - Web sites com informações sobre Project Finance....................... 157

9.2 ANEXO B - Exemplos de projetos internacionais .............................................. 158

9.3 ANEXO C - Exemplos de projetos brasileiros ................................................... 159

9.4 ANEXO D - Veículos equivalentes a serem pedagiados por ano ..................... 160

9.5 ANEXO E - Demonstração da receita de pedágio............................................. 161

9.6 ANEXO F - Demonstrativo do resultado contábil .............................................. 162

9.7 ANEXO G - Demonstrativo do resultado financeiro .......................................... 163

9.8 ANEXO H - Família de jatos regionais da plataforma ERJ-145........................ 164

9.9 ANEXO I - Parceiros de risco do EMBRAER 170/190 ...................................... 165

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Corporate Finance x Project Finance: captação de recursos ................... 29

FIGURA 2 - Elementos básicos do financiamento de projetos ..................................... 30

FIGURA 3 - Mapa da rodovia Presidente Dutra ............................................................ 71

FIGURA 4 - Ciclo de vida de um projeto de construção................................................ 73

FIGURA 5 - Modelo de Project Finance da Nova Dutra ................................................ 76

FIGURA 6 - Etapas de complementação da Nova Dutra .............................................. 84

FIGURA 7 - Fluxo de recursos da Nova Dutra .............................................................. 91

FIGURA 8 - Presença de jatos regionais nos EUA em janeiro/1995 .......................... 102

FIGURA 9 - Presença de jatos regionais nos EUA em janeiro/2002 .......................... 102

FIGURA 10 - Família de aeronaves derivadas do ERJ-145 x ciclo de vida................ 110

FIGURA 11 - Parceiros de risco x pacotes do ERJ-145.............................................. 117

FIGURA 12 - Modelo de parcerias de risco ERJ-145.................................................. 118

FIGURA 13 - Estrutura hierárquica da documentação do ERJ-145............................ 123

FIGURA 14 - Captação de recursos Nova Dutra......................................................... 134

FIGURA 15 - Captação de recursos ERJ-145............................................................. 135

FIGURA 16 - Família de jatos regionais derivados do ERJ-145 ................................. 164

FIGURA 17 - Parceiros de risco x pacotes do EMBRAER 170/190............................ 165

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 - Investimentos no setor de transportes 2000-2004 (US$ bilhões). ......... 67

GRÁFICO 2 - Acionistas controladores da CCR........................................................... 68

GRÁFICO 3 - Investimentos previstos no período das concessões da CCR............... 69

GRÁFICO 4 - Fluxo de caixa projetado do projeto da Nova Dutra ............................... 95

GRÁFICO 5 - Capacidade ASK no mercado da aviação regional .............................. 100

GRÁFICO 6 - Crescimento RPM EUA x jatos regionais em serviço........................... 103

GRÁFICO 7 - Evolução do mercado EUA de aviação comercial................................ 104

GRÁFICO 8 - Evolução do mercado EUA de aviação comercial - 2001 .................... 105

GRÁFICO 9 - RPM das companhias aéreas norte-americanas.................................. 105

GRÁFICO 10 - Entregas de aeronaves 2001-2010 no mercado EUA........................ 107

GRÁFICO 11 - Acionistas controladores da Embraer ................................................. 112

GRÁFICO 12 - Evolução da cadência de produção do ERJ-145................................ 131

GRÁFICO 13 - Demanda de aviões comerciais e serviço de suporte........................ 132

GRÁFICO 14 - Recolhimento de Impostos e Contribuições Sociais........................... 133

LISTA DE FÓRMULAS

1. Fórmula de fluxo de caixa descontado (DCF) ......................................................... 25

2. Fórmula de custo médio ponderado de capital (WACC)......................................... 27

3. Fórmula de valor presente líquido (NPV) ................................................................. 27

4. Fórmula de taxa interna de retorno (IRR) ................................................................ 28

5. Fórmula de índice de cobertura de juros ................................................................. 61

6. Fórmula de índice de cobertura de serviço de dívida (DSCR)................................ 62

7. Fórmula de conteúdo nacional ............................................................................... 127

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LISTA DE TABELAS

1. Etapas do processo de investigação científica........................................................ 19

2. Condições financeiras do PROEX Financiamento. ................................................. 41

3. Condições financeiras do PROEX Equalização ...................................................... 42

4. Condições financeiras do FINAME .......................................................................... 43

5. Principais riscos de um projeto e causas fundamentais.......................................... 48

6. Riscos, responsabilidade e instrumentos de mitigação (proteção)......................... 50

7. Participação das estruturas de garantia no financiamento de projetos .................. 54

8. Índice de pavimentação das rodovias brasileiras.................................................... 64

9. Volume diário médio de tráfego em 1994 ................................................................ 79

10. Crescimento projetado do volume de tráfego por praça de pedágio ...................... 80

11. Seguros contratados pela Nova Dutra ..................................................................... 83

12. Plano financeiro Nova Dutra .................................................................................... 88

13. Origens e usos dos recursos da Nova Dutra ........................................................... 89

14. Processo de montagem do plano de financiamento Nova Dutra ............................ 90

15. Cronograma de amortização dos títulos da Nova Dutra ......................................... 93

16. Custo da dívida ......................................................................................................... 93

17. Projeção de receita................................................................................................... 94

18. Projeção do demonstrativo do resultado contábil Nova Dutra ................................ 96

19. Projeção do demonstrativo do resultado financeiro Nova Dutra ............................. 97

20. Valor da tarifa de pedágio segundo categoria do veículo ....................................... 98

21. Descrição dos custos operacionais da Nova Dutra ................................................. 99

22. Critérios de seleção dos parceiros de risco........................................................... 115

23. Plano financeiro do ERJ-145.................................................................................. 125

24. Carteira de pedidos ERJ-145................................................................................. 130

25. Projeção (estimativa) de vendas ERJ-145............................................................. 131

26. Composição do faturamento da Embraer na década de 90.................................. 133

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27. Projetos internacionais financiados por Project Finance....................................... 158

28. Projetos brasileiros financiados por Project Finance............................................. 159

29. Projeção de veículos a serem pedagiados ............................................................ 160

30. Projeção de receita................................................................................................. 161

31. Projeção anual demonstrativo do resultado contábil............................................. 162

32. Projeção anual demonstrativo do resultado financeiro.......................................... 163

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABCR - Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias

ASK - Aircraft Seat Kilometers (nº de assentos de aeronaves x km)

ATA - Air Transport Association (Associação de Transporte Aéreo)

BID - Banco Inter- Americano de Desenvolvimento

BIRD - Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento

BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BOT - Build, Operate and Transfer (construir, operar e transferir)

CAPM - Capital Asset Pricing Model (modelo de precificação de ativos de

capital)

CCR - Companhia de Concessões Rodoviárias S.A.

CTA - Centro Técnico Aeroespacial

DCF - Discount Cash Flow (fluxo de caixa descontado)

DSCR - Debt Service Credit Ratio (índice de cobertura de serviço da dívida)

EBIT - Earning Before Interest and Taxes (lucro antes do pagamento de juros e

imposto de renda)

EBITDA - Earning Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization (lucro

antes do pagamento de juros, imposto de renda, depreciação e

amortização)

EBRD - European Investment Bank for Reconstruction and Development (Banco

Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento)

EDC - Export Development Corporation (Corporação de Desenvolvimento às

Exportações)

EGP&P - Enron Global Power & Pipelines

ERJ - Embraer Regional Jet (jato regional da Embraer)

FAA - Federal Aviation Administration (Administração Federal da Aviação dos

EUA)

FAB - Força Aérea Brasileira

FGV - Fundação Getúlio Vargas

FHC - Fernando Henrique Cardoso

FINAME - Programa de Financiamento do BNDES

FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos

FOB - Free on Board

HLR - High Level Requirements (requisitos de alto nível)

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IBTTA - International Bridge, Tunnel and Turnpike Association (Associação

Internacional de Pontes, Túneis e Estradas)

ICSID - International Centre for the Settlement of Investment Disputes (Centro

Internacional para Resolução de Disputas de Investimentos)

IDA - International Development Association (Associação de Desenvolvimento

Internacional)

IFC - International Finance Corporation (Corporação Internacional de

Finanças)

IIC - Inter-American Investment Corporation (Corporação de Investimento

Inter-Americano)

IRR - Internal Rate of Return (taxa interna de retorno)

JAA - Joint Aviation Authorities (Autoridades Conjuntas de Aviação de países

europeus)

JBIC - Japan Bank for International Cooperation (Banco Japonês para

Cooperação Internacional)

LIBOR - London Interbank Offer Rate (taxa interbancária oferecida em Londres)

MIF - Multilateral Investment Fund (Fundo de Investimento Multilateral)

MIGA - Multilateral Investment Guarantee Agency (Agência Multilateral de

Garantia de Investimentos)

MIT - Massachusetts Institute of Technology (Instituto de Tecnologia de

Massachusetts)

MOT - Maitain, Operate and Transfer (manter, operar e transferir)

NPV - Net Present Value (valor presente líquido)

OMC - Organização Mundial do Comércio

PEIAB - Programa de Expansão da Indústria Aeroespacial Brasileira

PROCOFE - Programa de Concessões de Rodovias Federais

PROEX - Programa de Financiamento às Exportações do Governo Brasileiro

RAA - Regional Airline Association (Associação das Companhias Aéreas

Regionais)

RPM - Revenue Passenger Mile (receita passageiro por milha)

SIVAM - Sistema de Vigilância da Amazônia

SOW - Statement of Work (escopo do trabalho)

SPC - Special Purpose Company (empresa de propósito específico)

TJLP - Taxa de Juros de Longo Prazo

WACC - Weighted Average Cost of Capital (custo médio ponderado de capital)

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RESUMO

Este trabalho analisa decisões de financiamento para desenvolvimento de projetos.

O problema de como financiar e empreender um projeto é examinado sob a ótica dos

patrocinadores e no âmbito de dois setores distintos — aeroespacial e infra-estrutura,

através de estudos de caso de projetos já concluídos e em fase de geração de receita.

Para avaliar empiricamente o financiamento, dois projetos brasileiros foram modelados: o de concessão da rodovia Presidente Dutra, que aplicou o Project

Finance, e o da aeronave regional ERJ-145, que utilizou o método convencional de

financiamento, ainda que tenha empregado alguns instrumentos típicos de Project

Finance. O plano de financiamento dos projetos é analisado comparativamente nos

seus principais aspectos: arquitetura financeira, análise de viabilidade, instrumentos de

atenuação de riscos, arranjos de garantia, estrutura jurídica da empresa

empreendedora e arranjos financeiros.

No Brasil, o estudo do financiamento do desenvolvimento de produtos e projetos

ganha relevância adicional. A competição internacional apresenta graves

estrangulamentos, muitos dos quais relacionados ao alto custo dos financiamentos

disponíveis para projetos brasileiros. Dentro desse contexto, este estudo espera

contribuir para a elaboração, análise e tomada de decisões que se apresentam no

processo de planejamento financeiro, desde as fases iniciais do ciclo de vida de um

projeto. Entre as conclusões da dissertação, destacam-se cinco:

a) apesar de utilizarem técnicas diferentes, os planos de financiamento dos projetos

estudados obtiveram êxito;

b) as vantagens e desvantagens de cada técnica de financiamento devem ser

cuidadosamente avaliadas para que seja determinada a mais eficiente em termos

de riscos e retornos;

c) independentemente da técnica selecionada para o empreendimento de um projeto,

o financiamento requer a elaboração de um plano ad hoc;

d) a engenharia financeira é tão crítica para o sucesso de um projeto quanto as

técnicas tradicionais de engenharia, podendo representar um grande diferencial

competitivo para os investimentos;

e) a engenharia financeira não pode ser dissociada do processo de desenvolvimento

de produtos.

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ABSTRACT

This study analyses financing decisions on project development. Through the use of

case studies, it discusses the question of how to finance and develop a project from the

perspective of the sponsors, in two different sectors - aerospace and infrastructure.

To empirically evaluate the financing process, two Brazilian projects are modeled: the concession of President Dutra turnpike, based on Project Finance, and the

regional aircraft ERJ-145, financed through the conventional method although

resorting to some of the typical Project Finance tools. Comparing the two projects the

study focuses on the following aspects: finance architecture, viability analysis, risk

abatement tools, guarantee arrangements, juridical structure of the project developer,

and finance arrangements.

The analysis of product and project development financing is particularly relevant in the

Brazilian case due to the fact that international competition poses the risk of serious

losses, many of which related to the high cost of available financing resources. Taking

that into account, the study may hopefully contribute to the formulation, analysis and

decision making of the finance planning process since the early life cycle phases of a

project.

From the two case studies five major conclusions emerge:

a) while using different techniques both projects financing were successful;

b) the advantages and disadvantages of each financing technique, taking into

account risks and returns must be carefully evaluated in order to determine the

most efficient one;

c) apart from the selected technique for the project development, the financing

process requires ad-hoc plan;

d) the finance engineering dimension is as important as the traditional engineering

techniques for the project’s success, and may constitute a major competitive

investment advantage;

e) the finance engineering may not be dissociated from the product development

process.

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INTRODUÇÃO 15

1 INTRODUÇÃO

1.1 JUSTIFICATIVA

Desenvolver novos produtos e empreender projetos são fatores imprescindíveis para o

sucesso de uma empresa. Esse processo engloba atividades de análise de mercado e

financeira, planejamento do produto, engenharia do produto, engenharia de processos

e produção (Clark & Fujimoto, 1991).

O objeto de estudo da pesquisa é a solução financeira com o objetivo de alavancar

recursos para o desenvolvimento. Sem capital que atenda às necessidades de

crescimento da empresa, não é possível desenvolver novos produtos e serviços,

particularmente em setores de alta tecnologia. A solução definida irá influenciar

diretamente os riscos e retornos de um projeto. A engenharia financeira é tão crítica

para o sucesso de um projeto quanto as formas tradicionais de engenharia.

Portanto, não basta possuir o melhor produto ou tecnologia se uma empresa não

conseguir financiar seu desenvolvimento, construção e operação em condições

semelhantes às dos concorrentes. A formulação de um pacote de financiamento de

um projeto complexo é similar, em dificuldades e desafios, a um projeto de

engenharia, e representa um grande diferencial competitivo para muitos setores.

No Brasil, o estudo do financiamento do desenvolvimento de produtos e projetos

ganha relevância adicional. A competição internacional apresenta graves

estrangulamentos, muitos dos quais relacionados ao alto custo dos financiamentos

disponíveis para projetos brasileiros. A prática de uma taxa básica de juros elevada

(como mecanismo de controle da inflação e atração do capital externo) e a exagerada

tributação do sistema financeiro, associados à debilidade do mercado de capitais do

país como fonte de financiamento às empresas 1, penalizam o poder de competição de

projetos.

1 Especialmente a ausência de investimentos de capital de risco e de instrumentos de apoio ás empresas e projetos emergentes no seu processo de capitalização e abertura de capital.

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PROJECT FINANCE 16

Torna-se, portanto, indispensável a apresentação de novas perspectivas e a

formulação de opções para o financiamento de investimentos em novos projetos. Isto

passa necessariamente pela reformulação da política industrial e por um amplo

conhecimento das alternativas de financiamento de projetos disponíveis. As vantagens

e desvantagens de cada alternativa devem ser cuidadosamente avaliadas para que

seja determinada a técnica mais vantajosa para a lucratividade do projeto.

Dentro desse contexto, o presente estudo espera contribuir para a elaboração, análise

e tomada de decisões que se apresentam no processo de planejamento financeiro,

desde as fases iniciais do ciclo de vida de um projeto, que muitas vezes são

dissociadas do processo de desenvolvimento de um produto. Por sua abrangência e

interdisciplinaridade, a engenharia de produção é um fórum adequado para promover

a integração das decisões financeiras aos estudos tradicionais do desenvolvimento de

produto. O financiamento de projetos é um dos pilares de sustentação de um novo

ciclo de desenvolvimento e condição para a viabilidade técnica e comercial dos

projetos brasileiros.

1.2 DELIMITAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

As decisões financeiras podem ser categorizadas em três áreas (Damodaran, 1997):

as relacionadas à alocação de recursos (as decisões de investimento), as que

abrangem o financiamento desses investimentos (as decisões de estrutura de capital),

e as que determinam a parte do caixa, decorrente do investimento, que deve ser

reinvestida ou retirada do negócio (as decisões de dividendos).

O tema central deste trabalho é a análise das decisões de financiamento. Os conceitos

básicos das decisões de investimentos serão apresentados a fim de contextualizar o

fluxo financeiro relativo a um projeto. As decisões de dividendos serão tratadas

juntamente com a montagem do plano de financiamento.

A dissertação estuda duas técnicas de financiamento distintas para projetos de grande

porte sob a ótica dos principais patrocinadores do empreendimento2 (Sponsors ou

2 A operação de financiamento pode ser analisada de diferentes ângulos: financiadores, investidores, patrocinadores, fornecedores de fatores de produção, seguradoras, agências governamentais, usuários e compradores dos serviços e produtos do projeto. O trabalho não tem a pretensão de analisar todas essas partes envolvidas em um projeto.

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INTRODUÇÃO 17

Project Developers), ou seja, do ponto de vista da empresa ou consórcio que

desenvolve, manufatura e opera o projeto, responsável pela viabilização do

empreendimento.

O problema de como financiar e empreender um projeto é analisado no âmbito de dois

setores distintos – infra-estrutura e aeroespacial, em projetos já concluídos e em fase

de geração de receita. Para avaliar empiricamente estas técnicas, dois projetos

brasileiros foram modelados: o de concessão de uma rodovia, que aplicou o Project

Finance3 e o de uma aeronave, que utilizou o método convencional de financiamento.

1.3 PERGUNTA, HIPÓTESE E OBJETIVOS DA PESQUISA

A dissertação analisa o problema relativo ao financiamento de investimentos a partir

da questão que se coloca a uma empresa no momento em que decide investir em um

projeto: ela deve primeiramente formar uma empresa de propósito específico (Special

Purpose Company - SPC) para empreender o projeto – modalidade Project Finance,

ou deverá empreendê-lo como parte de sua carteira geral de ativos e financiá-lo com

base em seu crédito geral – modalidade Corporate Finance4? Essa é a pergunta que a

dissertação pretende responder.

O Project Finance vem sendo apontado como tecnologia financeira de ponta. No

entanto, financiamentos baseados nos seus princípios já foram estruturados há

séculos atrás. Através dessa técnica, a estrutura de empréstimo é garantida com base

na receita a ser gerada pelo projeto. Ele é considerado o principal alavancador de

investimentos em infra-estrutura, principalmente em países em desenvolvimento.

O Corporate Finance é o financiamento direto convencional, baseado na capacidade

de endividamento da empresa. O fluxo de caixa da empresa, e não do projeto, será

utilizado para servir sua dívida.

A hipótese da pesquisa é que cada projeto requer uma estrutura de financiamento

adequada às suas características. A melhor estr utura para o projeto será aquela que

3 O termo Project Financing também pode ser utilizado para designar essa operação de financiamento. 4 Alguns autores também denominam esse financiamento como Company Financing.

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PROJECT FINANCE 18

resultar em uma alocação mais eficiente de riscos e retornos. Os principais objetivos

desse trabalho são:

a) entender o que é o Project Finance e suas características;

b) apresentar as diferenças entre o Project Finance e o Corporate Finance através da

análise de dois estudos de caso;

c) apresentar as vantagens e as desvantagens de cada modalidade;

d) indicar, brevemente, quando decidir-se pela aplicação do Project Finance ou do

Corporate Finance;

e) refletir sobre o cenário futuro no campo de financiamentos de projetos.

1.4 METODOLOGIA

A metodologia do processo de investigação foi a pesquisa descritiva a qual, segundo

Cervo & Bervian (1983), observa, registra, analisa e correlaciona os fatos ou

fenômenos sem, no entanto, manipulá-los. Ela é adequada quando um determinado

assunto já está razoavelmente estabelecido na literatura, porém necessita de um

maior aprofundamento (Dane, 1990). Essa estratégia metodológica mostrou-se a mais

adequada para que os objetivos propostos sejam alcançados.

Para a exploração dos dados foi realizada uma pesquisa de campo. Esta consistiu na

observação direta da ocorrência de eventos, o que possibilitou aprofundar o

conhecimento. O método utilizado na pesquisa foi o estudo de caso, meio para se

testar teorias, que permite a confirmação ou não dos resultados de outros estudos

(Bryman, 1989). Ele pode ser utilizado para descrever, explicar, avaliar e explorar

situações. A investigação dedicou-se à observação -participativa e à descrição da

estruturação dos financiamentos de dois projetos brasileiros: o de concessão da

rodovia Presidente Dutra e o da aeronave regional ERJ-1455. O pesquisador não

realizou qualquer interferência no processo.

5 Embraer Regional Jet.

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INTRODUÇÃO 19

O processo de investigação foi dividido em seis fases, conforme ilustra a TAB. 1.

TABELA 1

Etapas do processo de investigação científica

1. Delimitação Teórico-Conceitual

Definição do tema de estudo

Revisão Bibliográfica

Identificação do problema central, hipótese e objetivos

2. Delimitação do objeto de estudo

Escopo

Definição dos critérios da análise comparativa

3. Escolha dos métodos e técnicas

4. Pesquisa de Campo

Estudo de Caso Presidente Dutra

Estudo de Caso ERJ-145

5. Formulação dos Resultados

Etapas

6. Análise Comparativa

1.4.1 Delimitação teórico-conceitual

O financiamento de projetos foi definido como tema de estudo. Nesta fase, iniciou-se a

revisão bibliográfica, que se estendeu ao longo de toda a pesquisa. Decidiu-se, então,

aprofundar o Project Finance e compará-lo com o Corporate Finance. Após a

maturidade da pesquisa bibliográfica, estabeleceu-se como problema central o

processo decisório acerca da escolha da técnica para financiar projetos. A principal

hipótese do trabalho é que cada projeto requer uma determinada estrutura de

financiamento. Os objetivos do estudo foram estabelecidos.

1.4.2 Delimitação do objeto de estudo

Nesta etapa foram traçados os limites da realidade a ser investigada. Foram definidos

os critérios para a análise comparativa dos projetos estudados, e os dados relevantes

a serem obtidos na pesquisa de campo. A análise dos planos de financiamento foi

realizada a partir da estrutura proposta por Finnerty (1999). Os critérios de

comparação são: organização, controle e monitoramento, alocação de risco,

flexibilidade financeira, fluxo de caixa líquido, agency costs, estrutura dos contratos de

dívida, capacidade de endividamento e insolvência.

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PROJECT FINANCE 20

1.4.3 Escolha de métodos e técnicas

Os métodos e técnicas de coleta de dados primários para a pesquisa foram a

aplicação de questionários abertos e a realização de entrevistas semi-estruturadas.

Paralelamente, buscou-se complementar a análise dos planos de financiamentos com

dados e informações produzidos por instituições econômicas, jornais, revistas e

relatórios especializados, utilizados como fontes secundárias. Outra importante fonte

de dados foram as demonstrações financeiras e balaços patrimoniais, bem como

documentos internos das empresas empreendedoras dos projetos.

1.4.4 Pesquisa de campo

A pesquisa de campo levantou as principais características de cada um dos

parâmetros comparativos através do estudo de dois casos. Foram selecionados

projetos de grande porte que utilizaram técnicas de financiamento distintas, entraram

em operação no mesmo período (mesmo cenário econômico) e que se encontram em

fase de geração de receita (possibilita avaliar o sucesso do plano). Essa etapa da

pesquisa foi a mais sensível, dado o caráter confidencial das operações de

financiamento, especialmente dos projetos da indústria aeroespacial.

O pesquisador atuou na empresa empreendedora do projeto de infra-estrutura

(pesquisa de campo em um dos sponsors do projeto) e na empresa líder do projeto

aeroespacial. Primeiramente foram aplicados questionários com perguntas abertas

aos gerentes financeiros responsáveis pela estruturação dos financiamentos de cada

um dos projetos-caso. Eles se encarregaram de solicitar contribuições de outras

pessoas, já que a engenharia financeira de um projeto envolve diferentes disciplinas e

processos empresariais. Os questionários foram elaborados previamente para modelar

as especificidades de cada um dos casos e permitir a exploração dos critérios de

comparação.

Após a aplicação dos questionários, foram realizadas entrevistas não-dirigidas para

enriquecer o conteúdo das informações obtidas, aumentar o conhecimento do quadro

de referência e esclarecer dúvidas. Nesse momento, foram entrevistados gerentes e

diretores — financeiros, de projeto, de suprimentos, de administração de contratos, e

de desenvolvimento de produto. O condicionamento das respostas e interpretações

pessoais do entrevistador e entrevistado foram evitados.

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INTRODUÇÃO 21

1.4.5 Formulação dos resultados

Os dados e informações obtidos foram processados para modelar cada uma das

operações de financiamento. Antes da apresentação dos planos de financiamento, o

trabalho analisa o contexto setorial e competitivo dos projetos, suas características e

seu histórico.

O plano de financiamento dos projetos é analisado nos seus principais aspectos:

arquitetura financeira, análise de viabilidade e instrumentos de atenuação de riscos,

arranjos de garantia, estrutura jurídica e organização da empresa empreendedora, e

arranjos financeiros.

A oportunidade de vivenciar profissionalmente os dois projetos possibilitou ao

pesquisador uma exploração profunda dos resultados, viabilizando a análise do plano

de financiamento em vários de seus aspectos.

O projeto de infra-estrutura teve os arranjos financeiros explorados em maior

profundidade. Em função da política de segurança de informação da empresa

empreendedora do projeto ERJ-145, a exploração desse caso ateve-se aos aspectos

conceituais e qualitativos.

1.4.6 Análise comparativa

Os projetos foram comparados segundo os critérios estabelecidos (1.4.2), com o apoio

dos elementos explicativos disponíveis na literatura. Algumas características comuns

também serão apontadas.

1.5 LIMITAÇÕES DA PESQUISA

Uma limitação do presente estudo é o fato de ter como base apenas dois projetos para

realizar as análises das técnicas de financiamento. O Project Finance e o Corporate

Finance possuem uma grande quantidade de componentes e variações e não é

objetivo dessa pesquisa analisar todas essas variâncias. Desta forma, não se pretende

generalizar características, vantagens e desvantagens, e aplicabilidade, tampouco

tomar como verdade constatações particulares de cada um dos projetos estudados.

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PROJECT FINANCE 22

O exame comparativo de projetos de setores distintos e com características

particulares não possibilita extrair conclusões de caráter universalizante a respeito das

técnicas. O sucesso do financiamento no caso da Rodovia Presidente Dutra

contrapõe-se ao fracasso de Project Finance do projeto Eurotunnel (Moreira, 1999).

O trabalho também não objetivou discutir o nível ótimo de financiamento de dívida

para um projeto, a estruturação do contrato de divida, a melhor relação de recursos

próprios e de terceiros6, longo prazo e curto prazo, taxa fixa ou flutuante, simples ou

conversível, dentre outras importantes questões relativas ao financiamento de

investimentos7. Seu escopo central foi a análise da adequação de se empreender um

projeto através de uma entidade jurídica independente ou com base no crédito geral

da empresa.

Finalmente, para um estudo completo da operação de financiamento de um projeto,

este deve ser analisado sob a ótica de todos os stakeholders (partes envolvidas). Este

trabalho restringiu-se a analisar a arquitetura financeira do ponto de vista dos sponsors

dos projetos. Os financiadores, investidores, fornecedores de fatores de produção,

seguradoras, agências governamentais, usuários e compradores dos serviços e

produtos dos projetos não se incluem no escopo desse trabalho.

1.6 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

A exposição a seguir está organizada em cinco partes:

a) o capítulo 2 trata das decisões de investimento, apresentando a técnica utilizada

para alocar os recursos nos projetos mais lucrativos, e fornece um quadro teórico

das decisões de financiamento. O conhecimento da literatura básica sobre as

técnicas de Corporate Finance é sintetizado. A operação de Project Finance é

estudada, enfocando-se os principais aspectos envolvidos em sua estruturação:

fontes de recursos, análise de viabilidade, arranjos de garantia, estrutura jurídica e

o plano de financiamento;

6 Williamson, Oliver E. (1988). 7 Damodaran (1997) trata dessas questões.

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INTRODUÇÃO 23

b) o capítulo 3 expõe o estudo de caso do projeto de concessão da rodovia

Presidente Dutra. A estruturação do Project Finance e os resultados alcançados

pelo projeto são descritos;

c) o capítulo 4 apresenta o estudo de caso do projeto da aeronave regional ERJ-145.

A técnica Corporate Finance (e mais especificamente o modelo de parcerias de

risco) é modelada para a estruturação do financiamento desse projeto;

d) o capítulo 5 proporciona uma análise comparativa dos resultados das duas

operações de financiamento dos projetos estudados, apresentando suas distinções

principais e algumas semelhanças. Os resultados são discutidos e avaliados

criticamente;

e) o capítulo 6 apresenta as conclusões. Primeiro, é enfatizado o sucesso dos planos

de financiamento de cada projeto, apesar de utilizarem técnicas diferentes. As

vantagens, desvantagens e os projetos candidatos a cada técnica serão

apreciados. O autor, então, manifesta sua avaliação sobre os resultados obtidos e

algumas idéias finais relativas à direção que o financiamento de projetos

demonstra estar seguindo. Por fim, são feitas considerações gerais e perspectivas

de desenvolvimento futuro do tema.

As fórmulas apresentadas no trabalho não são demonstradas. Embora o entendimento

dos conceitos e fundamentos matemáticos para se chegar às equações seja relevante,

não é objetivo dessa dissertação explicitá-los. As técnicas utilizadas para

demonstração dos arranjos financeiros de um projeto são amplamente conhecidas e

envolvem cálculos demorados. Além do mais, vários recursos estão disponíveis para

facilitar os cálculos, como a utilização de calculadoras, de tabelas financeiras e de

softwares computacionais. Uma outra convenção adotada no trabalho foi a utilização

de denominações em inglês para alguns termos, especialmente os financeiros.

Traduzi-los poderia empobrecer o sentido original destas expressões, que são

bastante usuais no mercado.

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PROJECT FINANCE 24

2 DECISÃO DE FINANCIAMENTO

2.1 DECISÃO DE INVESTIMENTO

Decisões de investimento podem envolver o desenvolvimento de um novo produto, a

entrada em um novo mercado, o estabelecimento de uma fábrica, a modernização do

sistema de produção, a construção de uma unidade independente de geração de

energia ou a aquisição de outras empresas. Porém, os recursos da firma são escassos

e devem ser, geralmente, alocados entre necessidades concorrentes. Assim, a

consideração de em que projetos investir torna-se muito relevante nas decisões

financeiras empresariais.

É importante destacar que a avaliação de projetos deve ser feita com base em seu

fluxo de caixa e não no seu lucro. Finnerty (1999:108) considera essa distinção crítica:

“... em última análise, é caixa, não lucro, que é necessária para atender às obrigações financeiras de uma empresa. A falha em gerar caixa suficiente pode levar uma empresa a pagar taxas de penalidades ou até mesmo levar uma empresa de outra forma saudável à bancarrota, e apenas o fluxo de caixa pode ser pago aos patrocinadores, quer de imediato, quer através de reinvestimento e posterior distribuição.”

Evidentemente, a decisão de investir está baseada na lucratividade dos projetos

propostos, indicada através da análise do fluxo de caixa descontado. O objetivo dessa

avaliação é encontrar os projetos mais lucrativos para se investir. Essa técnica irá

avaliar os fluxos de caixa futuros esperados em relação ao montante do investimento

inicial, verificando se o projeto vale mais para os patrocinadores do que custa, ou seja,

se ele possui um valor presente líquido positivo. A taxa de retorno obtida será, então,

comparada com uma taxa de retorno mínima considerada aceitável (hurdle rate) frente

aos riscos que a empresa estará assumindo ao empreender o projeto.

A análise do fluxo de caixa descontado é crucial na determinação da viabilidade

econômica de um projeto proposto e na adequabilidade das taxas de retorno dos

provedores de capital. Os fluxos de caixa do projeto são descontados a uma taxa

especificada, que recebe as denominações: taxa de desconto, custo de capital, custo

de oportunidade ou taxa mínima de atratividade. O conceito de fluxo de caixa

descontado é expresso pela fórmula:

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 25

nn

nr

CFDCF

)1( +=

Fórmula de fluxo de caixa descontado (DCF)

DCF: Discount Cash Flow (fluxo de caixa descontado)

CFn: Fluxo de caixa no período n

r: taxa de desconto

n: prazo

O valor de projetos de investimento é avaliado em três etapas básicas (Emery &

Finnerty, 1997). O primeiro passo é a estimativa dos fluxos de caixa futuros

incrementais líquidos. Os fluxos de caixas em bases incrementais são o saldo da

diferença entre as saídas e as entradas de caixa futuras8. Os custos históricos9 (sunk

costs) são irrelevantes para a análise. O termo líquido significa que os fluxos de caixa

futuros esperados devem ser medidos após o pagamento de impostos. Os impostos

representam custos do negócio e, por isso, devem ser subtraídos dos fluxos de caixa

operacionais brutos.

Finnerty (1999) também levanta algumas considerações fiscais importantes para

maximizar o retorno de um projeto. Segundo o autor, três variáveis impactam nos

impostos incorridos para uma empresa: as receitas, as despesas e como e quando

aquelas receitas e despesas são declaradas para fins de tributação (momento em que

um fluxo de caixa é reconhecido para fins fiscais).

Com relação aos fluxos de receita, o valor presente dos impostos recolhidos será

menor quanto mais tarde for efetivamente realizado o pagamento. Da mesma forma,

devido ao valor no tempo do dinheiro, a empresa terá que pagar menos tributos

quanto mais cedo ocorrer o lançamento das despesas.

As despesas de depreciação (desgaste de máquinas, prédios, veículos e

computadores), exaustão (consumo de uma reserva de petróleo) e amortização

(patente, pesquisa e desenvolvimento), por exemplo, impactam significativamente o

8 O timing de um fluxo de caixa afeta seu valor, devido ao valor do dinheiro no tempo. Por convenção, presume-se que os fluxos de caixa ocorram no final de cada período de tempo (modalidade END), a não ser que explicitamente determinado o contrário. 9 Custos passados são despesas já incorridas, como por exemplo estudos de viabilidade, pesquisa e desenvolvimento.

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PROJECT FINANCE 26

cronograma de pagamentos de impostos pela empresa, já que são deduzidas da

receita ao se calcular a receita tributável. O tratamento fiscal para essas despesas

surge quando os ativos são capitalizados. O custo do ativo é alocado a dois ou mais

períodos de tempo no futuro e seu custo total não é imediatamente reconhecido.

Ao contrário disso, as outras despesas são reconhecidas e lançadas, para fins fiscais,

inteiramente no momento do dispêndio, sem qualquer consequência fiscal

subsequente. A empresa terá uma nítida vantagem se lançar o ativo como despesa,

em vez de capitalizá-lo10, ou realizar uma depreciação a mais acelerada possível.

O segundo passo é avaliar o risco e estimar o custo de capital (taxa mínima de

atratividade do projeto) para o desconto do fluxo de caixa futuro. Essa taxa consiste

estabelecimento do retorno mínimo, ou a taxa de retorno exigida, para que um

investimento seja aceitável e compense seus riscos. Segundo Finnerty (1999),

“Uma taxa de retorno exigida pode ser considerada como custo de oportunidade. Investidores exigirão uma taxa de retorno pelo menos igual ao percentual de retorno que conseguiriam na oportunidade de investimento que mais se assemelha ao projeto.”

Caso não exista um investimento com características de risco similares para

comparação, o mercado dispõe de uma técnica para avaliar o custo de capital do

projeto. O mercado se baseia no cálculo do custo médio ponderado de capital

(Weighted Average Cost of Capital - WACC). Ele pode ser representado como o custo

médio ponderado dos elementos de qualquer pacote de financiamento elaborado para

o projeto, com diferentes estruturas de capital: capital ordinário e de terceiros, dívida

de longo e curto prazo, ações preferenciais e ordinárias, dentre outras. A taxa de

retorno exigida pelos patrocinadores e credores depende do grau de alavancagem de

sua estrutura de financiamento. Quanto maior o risco de inadimplência, maior a taxa

de retorno exigida. A fórmula abaixo demonstra o cálculo do WACC.

10 A depreciação dos ativos das empresas é regulamentada por uma legislação tributária, que determina que ativos devem ser capitalizados e sob quais alíquotas.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 27

( ) ( ) de rrWACC πθθ −+−= 11

Fórmula de custo médio ponderado de capital (WACC)

re = Taxa de retorno exigida para o capital11

rd = Taxa de retorno sobre o endividamento

(1 - θ)re = Custo de capital líquido

θ = Razão de financiamento de dívida em relação ao investimento total do projeto

(valor presente) (1 - π)rd ≅ Custo da dívida líquido

A última etapa da avaliação é o cálculo do valor presente líquido (Net Present Value -

NPV) ou a taxa interna de retorno (Internal Rate of Return - IRR). O NPV de um

projeto de investimento de capital é a diferença entre o que o projeto vale e o que ele

custa. Ele será igual ao valor presente das entradas de caixa menos o valor presente

do investimento:

∑= +

=n

nn

n

r

CFNPV

0 )1(

Fórmula de valor presente líquido (NPV)

CFt = Fluxo de caixa do período t

r = taxa de desconto

n = vida útil do projeto

Se o projeto tiver um valor presente líquido maior do que seu custo, NPV positivo, vale

a pena empreendê-lo. Caso contrário, para NPV menor do que zero, rejeita-se o

projeto. Para NPV maior ou igual a zero, o projeto remunera a empresa a uma taxa

igual ou maior que o WACC.

11 Para estimar o custo de capital do projeto (re) utiliza-se o modelo de formação de preços de ativos de capital (Capital Asset Pricing Model - CAPM).

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PROJECT FINANCE 28

A IRR é a taxa de retorno esperada do projeto. Ela é a taxa de desconto que anula o

NPV. A IRR é, assim, a taxa que faz com que a igualdade abaixo seja verificada:

0)1(0

=+∑

=

n

nn

n

IRR

CF

Fórmula de taxa interna de retorno (IRR)

O critério de decisão da IRR é: empreenda o projeto se a IRR for maior que o WACC.

Isto garante à empresa uma rentabilidade maior do que o custo dos recursos alocados

ao investimento.

2.2 MODALIDADES DE FINANCIAMENTO DE PROJETOS

Após a decisão de em qual projeto investir, baseada na análise do fluxo de caixa

descontado, a empresa se depara com a necessidade de tomar a decisão de financiar

e empreender o projeto12, incorporando-o como entidade jurídica separada (Project

Finance) ou com base no seu crédito geral (Corporate Finance). A escolha primária

será aquela técnica que propiciar o menor custo de capital para as empresas

patrocinadoras.

No Corporate Finance, a captação de recursos será feita para empresa e as

obrigações financeiras estarão no nível corporativo. Já no Project Finance, o

financiamento será elaborado para o projeto, que existe como uma entidade

juridicamente separada das empresas-patrocinadoras. As considerações financeiras

serão contabilizadas projeto a projeto. Essas duas modalidades de financiamento

estão esquematizadas na FIG. 1.

12 O processo de análise financeira de um projeto não é sequencial. A decisão de investir pode preceder a estruturação do financiamento como também a disponibilidade de recursos e a estruturação do financiamento pode motivar a decisão de investir.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 29

Empresa

Projeto Projeto

Empresa

Corporate Finance Project Finance

Financiadores

Empréstimo

Empréstimo

RecursosPróprios

PatrimônioLíquido

RecursosPróprios

Empresa

Projeto Projeto

Empresa

Corporate Finance Project Finance

Financiadores

Empréstimo

Empréstimo

RecursosPróprios

PatrimônioLíquido

RecursosPróprios

FIGURA 1 - Corporate Finance x Project Finance: captação de recursos

FONTE: Samii, 200113.

Segundo o PMBOK (2000)14, projetos são empreendimentos temporários para criação

de produtos ou serviços únicos. Todo projeto possui um início e um fim bem definidos

e seu resultado é diferente, de alguma forma, dos demais. O ciclo de vida de um

projeto se divide tipicamente em três grandes fases: desenvolvimento, construção e

operação. A FIG. 2 representa as relações entre os stakeholders no financiamento de

um projeto.

13 Figura adaptada das notas de aula do curso “Construction Finance” do Massachusetts Institute of Technology - MIT: http://web.mit.edu/1.45/www/ 14 PMBOK guide - A Guide to the Project Management Body of Knowledge.

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PROJECT FINANCE 30

Investidores deCapital

Investidores /Patrocinadores

Credores

Fornecedores Compradores

Matérias-Primas

Contrato (s) defornecimento

Recursos de Empréstimos

Pagamento daDívida

Recursos De Capital

Retorno aosInvestidores

Acordos de deficiências de Caixa e outrasFormas de suporte de crédito

Contrato (s) de Compra

Produção

Empresa ou Projeto

Investidores deCapital

Investidores /Patrocinadores

Credores

Fornecedores Compradores

Matérias-Primas

Contrato (s) defornecimento

Recursos de Empréstimos

Pagamento daDívida

Recursos De Capital

Retorno aosInvestidores

Acordos de deficiências de Caixa e outrasFormas de suporte de crédito

Contrato (s) de Compra

Produção

Investidores deCapital

Investidores /Patrocinadores

Credores

Fornecedores Compradores

Matérias-Primas

Contrato (s) defornecimento

Recursos de Empréstimos

Pagamento daDívida

Recursos De Capital

Retorno aosInvestidores

Acordos de deficiências de Caixa e outrasFormas de suporte de crédito

Contrato (s) de Compra

Produção

Empresa ou Projeto

Investidores deCapital

Investidores /Patrocinadores

Credores

Fornecedores Compradores

Matérias-Primas

Contrato (s) defornecimento

Recursos de Empréstimos

Pagamento daDívida

Recursos De Capital

Retorno aosInvestidores

Acordos de deficiências de Caixa e outrasFormas de suporte de crédito

Contrato (s) de Compra

Produção

FIGURA 2 - Elementos básicos do financiamento de projetos

FONTE: Finnerty, 1999:3 (Adaptado).

2.3 O QUE É CORPORATE FINANCE

O Corporate Finance é o financiamento direto convencional. Sua principal

característica é que a análise da capacidade de pagamento para concessão do

crédito, a avaliação de risco e a estruturação das garantias à operação recaem

principalmente sobre a empresa, e não sobre o projeto. Nesse caso, os empréstimos

concedidos à empresa, geralmente atre lados a algum tipo de fiança ou hipoteca,

podem ser aplicados “nos projetos que a empresa desejar”. Nessa modalidade, os

financiadores da empresa “... contam com o total da carteira de ativos da mesma para

a geração de fluxo de caixa para o serviço se seus empréstimos. Os ativos e seu

financiamento são integrados às carteiras de ativos e passivos da empresa.” (Finnerty,

1999:2). O principal foco é a saúde financeira da firma, apesar do projeto também ser

analisado sob a perspectiva do retorno para a corporação.

As garantias do Corporate Finance são reais (como hipoteca e caução de ações),

envolvendo o compromisso dos controladores da entidade jurídica e, algumas vezes,

das pessoas físicas e seus familiares (Moreira, 1999). Outros ativos pertencentes aos

sponsors também são incorporados indiretamente como garantias.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 31

Uma das diferenças entre as duas operações é que o Corporate Finance lida com

empresas já estabelecidas, com risco de crédito conhecido15. No Project Finance,

alguns projetos partem do zero (projetos greenfield), o que corresponde à montagem

de um projeto novo a partir de uma empresa nova.

2.4 O QUE É PROJECT FINANCE16

Inicialmente, o termo Project Finance era utilizado para descrever todos os tipos e

modos de financiamentos de projetos, com e sem estruturas de garantias (Nevitt &

Fabozzi, 1995). Recentemente, essa operação passou a designar somente a

estruturação de financiamento garantida principalmente pelo fluxo de caixa e ativos de

um projeto específico.

Project Finance é um método de financiamento de um empreendimento baseado no

fluxo de caixa esperado do projeto (Beidleman et al., 1990). O fluxo de caixa é o

principal suporte creditício do financiamento. Com base nesse conceito, em uma

operação de Project Finance, a ênfase recai sobre o projeto. De acordo com a

definição proposta por Finnerty (1999:2), Project Finance é:

“... a captação de recursos para financiar um projeto de investimento de capital economicamente separável, no qual os provedores de recursos vêem o fluxo de caixa vindo do projeto como fonte primária de recursos para atender ao serviço de seus empréstimos e fornecer o retorno sobre o capital investido no projeto.”

A estruturação dessa modalidade de financiamento é bastante complexa e envolve

uma imensa gama de negociações e acordos, não só entre os sponsors e credores,

como também com todos os stakeholders: financiadores, investidores, patrocinadores,

fornecedores de fatores de produção, seguradoras, agências governamentais,

usuários e compradores dos serviços e produtos do projeto. O resultado dessas

negociações gera uma estrutura de compartilhamento de riscos e garantias que são

expressos em diversos arranjos jurídicos, sendo essa estrutura uma de suas principais

características. Segundo Monteiro Filha & Castro (2000:112),

15 Rocha. Bancos dividem riscos em projetos. Jornal Valor Econômico. 16 Para maiores informações sobre Project Finance ver lista de web sites no ANEXO A.

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PROJECT FINANCE 32

“Diferentemente do Corporate Finance, no qual o projeto a ser financiado é apresentado já estruturado aos financiadores, no Project Finance os financiadores têm maior poder de barganha. A atenuação de riscos, típica de um Project Finance, depende em cada projeto das negociações levadas a cabo entre os participantes do empreendimento. Nesse sentido, sua estruturação é mais demorada do que no tipo Corporate Finance.”

Nessa operação cria-se uma entidade jurídica distinta para gerenciar o

empreendimento, uma SPC. Essa empresa tem prazo de vida determinado, sendo

uma entidade jurídica e economicamente separada de seus patrocinadores,

proprietária dos ativos17 e passivos do projeto.

O fluxo de caixa futuro é utilizado como base para financiar o investimento. O

financiamento pode envolver a emissão de títulos patrimoniais e títulos de dívida, que

serão amortizados concomitantemente às receitas derivadas das operações do

projeto, ou seja, com base no plano de produção. A alavancagem financeira do Project

Finance pode alcançar um alto nível de dívida, reduzindo a necessidade de capital

próprio.

Em 2000 foram investidos mundialmente US$145 bilhões para financiamentos via

Project Finance. Entre o primeiro trimestre de 1987 e o terceiro trimestre de 1989 esse

montante era de apenas US$23 bilhões, destinados a 168 projetos, segundo Chen,

Kensinger & Martin, (citado por Finnerty, 1999)18. A América Latina recebeu cerca de

US$14 bilhões de empréstimos, quase o dobro dos US$8,5 bilhões em 1999. Desse

total, 95% foram direcionados para os setores de energia, telecomunicações e óleo e

gás. Sozinho, o Brasil canalizou 70% do total19. Esse grande aumento no volume de

recursos destinados a financiamento via Project Finance é fruto, dentre outros fatores,

de uma maior eficiência na alocação de retornos e riscos do que da estrutura do

financiamento convencional para projetos de infra-estrutura e outros de grande

escala20.

17 Em alguns casos a SPC não detém a propriedade dos ativos, como nos projetos de concessões de rodovias brasileiras. 18 CHEN, Andrew H., KESINGER, John W., MARTIN, John D., “Project Financing as a Means of Preserving Financial Flexibility”, Paper de Trabalho da Universidade do Texas, 1989. 19 Mouteira. Recursos de Project Finance migram para AL. Jornal Valor Econômico. 20 O maior fluxo de investimentos na década de 90 também influenciou o aumento de recursos, assim como a estratégia de diversificação de riscos dos investidores.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 33

2.4.1 Perspectiva histórica

Apesar do Project Finance ser identificado, muitas vezes, como um método inovador

para captação de recursos, o financiamento por projeto já é estruturado há algum

tempo na história21. Uma das primeiras constatações de uma operação similar ao que

denominamos hoje de Project Finance ocorreu no século XIII. A Coroa Britânica

negociou, com um dos principais bancos da época, um empréstimo para explorar as

minas de prata da região de Devon, na Inglaterra, por um período de um ano. O banco

assumiu integralmente o custo de operação das minas e os riscos relativos ao volume

e qualidade da prata que poderia ser extraída. O empréstimo foi pago com a produção

das minas (Finnerty, 1999).

Durante o período feudal, era comum conceder empréstimos a serem pagos com a

produção. A própria estrutura de arrendamento de terras já continha alguns conceitos

de Project Finance. As terras arrendadas pelos senhores feudais a uma determinada

classe de servos22 eram pagas com uma parcela de sua produção, de forma muito

semelhante ao que fazem, hoje, os nossos meeiros (Huberman, 1936)23. No início do

século XX, uma grande precursora das operações de Project Finance foi a indústria de

exploração de petróleo. Neste caso, os bancos aceitaram o risco da não-existência de

reservas de óleo suficiente para pagamento do empréstimo24.

Em anos recentes, os altos custos de desenvolvimento de projetos intensivos de

capital criaram uma grande demanda por novas fontes de financiamento, além das

tradicionais. A crise financeira do Estado e sua incapacidade de realizar os

investimentos necessários em infra-estrutura, especialmente nos países do Terceiro

Mundo, tornou o Project Finance uma resposta para as necessidades crescentes de

financiamento (Beidelman et al., 1990). O aumento da utilização de Project Finance

também é função da escalada dos custos de captação do financiamento direto

convencional (Wynant, 1980).

21 Para maiores informações sobre a história do Project Finance, Kensinger & Martin (1988). 22 Esses servos eram denominados Vilãos e gozavam de mais privilégios econômicos e pessoais do que o restante de sua classe. 23 Segundo o orientador desta dissertação, durante o mercantilismo, a construção de navios piratas também era financiada com operações que utilizavam diversas características de Project Finance. 24 Relatório de publicação restrita de uma consultoria norte-americana.

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PROJECT FINANCE 34

Desde então, uma grande variedade de projetos vem sendo financiada por essa

técnica como alternativa eficaz ao financiamento direto. O Project Finance já é

utilizado em projetos de recursos naturais de grande escala, como oleodutos,

gasodutos, refinarias, instalações de geração de energia elétrica, hidrelétricas, minas e

instalações de processamento de minério. Outros grandes projetos intensivos de

capital já se beneficiaram dessa operação, como o Eurodisneyland, o túnel sob o

Canal da Mancha (Eurotunnel), o canal de Suez, o sistema de purificação e de

fornecimento de água da Grande Buenos Aires (Águas Argentinas)25, projetos de trens

de alta velocidade, instalações fabris e portos26.

2.5 FONTES DE RECURSOS

Até a década de 80, os empréstimos de bancos comerciais foram a principal fonte de

endividamento a longo prazo para projetos de grande porte. O desenvolvimento do

mercado de swaps27 de taxas de juros foi decisivo para os tomadores reduzirem o

risco de pagamento (Finnerty, 1999), especialmente em decorrência do regime de

flutuação do câmbio. Com a grande demanda por projetos de infra-estrutura e com a

política de privatização adotada por muitos países na década de 90, os bancos

comerciais expandiram a disponibilidade de recursos para Project Finance e passaram

a fornecer serviços de consultoria28. A atuação dos órgãos multilaterais, como o Banco

Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, também se tornou mais

efetiva, conjugando fontes de capital públicas e privadas, principalmente para financiar

projetos de infra-estrutura.

O pacote de financiamento de um projeto deve ser elaborado sob medida e, para isso,

utiliza-se de várias fontes de recursos. Dependendo do momento e do projeto, uma

determinada fonte de financiamento poderá oferecer recursos em condições mais

atraentes. Novos instrumentos financeiros, como swaps de moedas e de taxas de

juros, aumentaram a gama de alternativas de financiamento disponíveis para um

projeto (Finnerty, 1999). A engenharia financeira de projetos requer o exame de todas

25 Para maiores informações deste projeto ver Moreira, 1999. 26 Para exemplos de projetos internacionais e brasileiros, consultar TAB. 27, ANEXO B e TAB. 28, ANEXO C, respectivamente. Para outros exemplos ver Directory of Innovative Financing (1995) e Moody’s Project Finance Sourcebook (2000). 27 A troca de uma dívida, moeda ou taxa de juros por outra. 28 Financial Advisor.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 35

as alternativas de dívida e capital para que se possa montar um plano de

financiamento otimizado.

O capital inicial do projeto é, geralmente, fornecido pelos patrocinadores, e em alguns

casos também é complementado pelos compradores de produção do projeto (Finnerty,

1999). O projeto também poderá captar recursos através do investimento de

instituições financeiras. Algumas das principais fontes de recursos disponíveis para um

projeto de investimento são apresentadas a seguir.

2.5.1 Capital

Os investidores de capital e patrocinadores do projeto são responsáveis por organizar,

capitalizar, gerir, controlar e encerrar o empreendimento. Além dos riscos financeiros e

de negócios que esses investidores assumem usualmente, eles também serão

responsáveis por garantias de contribuições adicionais nos casos de custos

excedentes na construção do projeto (cost overun) ou de fracasso do projeto. De

acordo com Finnerty (1999),

“Os investidores de capital de um projeto normalmente são aqueles que se beneficiarão diretamente da operação do projeto: os compradores da produção do projeto, os proprietários de reservas de quaisquer recursos naturais que o projeto venha a utilizar e seus fornecedores de produtos e serviços essenciais, inclusive empresas de engenharia.”

Um outro importante candidato a investidor de capital são os fundos de investimento29,

que permitem que investidores sofisticados reúnam seus recursos. Além de se

beneficiarem da diversificação de seus ativos, eles também realizam economias

decorrentes do compartilhamento de informações e de responsabilidade pelo controle

de seus investimentos conjuntos (Finnerty, 1999). O investimento conjunto de

patrocinadores e investidores torna-se mais barato do que se fosse feito

separadamente, principalmente em mercados emergentes como o Brasil, onde as

informações tendem a ser mais difíceis e dispendiosas de serem obtidas.

29 Um exemplo de um fundo de investimento é o Latin American Power Fund (Fundo de Energia Elétrica Latino-Americano).

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PROJECT FINANCE 36

Da mesma forma que os fundos de investimento, é cada vez maior a participação de

Veículos de Capital Conjunto (Pooled Equity Vehicles)30. Segundo Finnerty (1999:156),

“um veículo de capital conjunto é uma empresa separada formada por uma empresa

operadora existente para ser proprietária e gerente de determinados tipos de projetos

específicos.” Nesse caso, os investidores beneficiam-se da experiência dos

patrocinadores na avaliação, seleção, construção e operação de uma determinada

classe de projetos.

2.5.2 Mercado de dívida a longo prazo e de dívida de taxa fixa

Os mercados de capitais norte-americano, europeu e japonês são bastante

desenvolvidos para financiamentos a longo prazo de projetos industriais. Dentro desse

mercado, as companhias de seguros e os fundos de pensão têm sido,

tradicionalmente, as mais importantes fontes de recursos de endividamento para

projetos de grande porte. Geralmente esses credores fornecem empréstimos a taxas

fixas, após a conclusão do projeto para o financiamento permanente31. Segundo

Finnerty (1999),

“Devido à natureza de seus negócios, companhias de seguros de vida têm um fluxo de caixa anual relativamente assegurado, que estão dispostos a comprometer, sob determinadas circunstâncias, para saque alguns anos futuros. O endividamento do projeto é tipicamente vendido às companhias de seguros de vida através de colocações privadas. Os fundos de pensão públicos consistem primariamente em fundos de aposentadoria de funcionários dos governos estaduais e locais. Por manterem, de modo geral, uma alta proporção de títulos de renda fixa em suas carteiras, representam uma importante fonte potencial de recursos de longo prazo para um Project Finance.”

2.5.3 Empréstimos de bancos comerciais

Segundo Finnerty (1999), quatro tipos alternativos de facilidades de crédito bancário

podem ser negociadas para o financiamento de um projeto: crédito rotativo,

empréstimo a prazo, carta de comprometimento de crédito32 (Standby Letter of Credit)

30 Um exemplo é a Enron Global Power & Pipelines L.L.C (EGP&P). Outro exemplo é a Companhia de Concessões Rodoviárias S.A. Um dos projetos dessa associação brasileira será fruto do estudo de caso de Project Finance da dissertação. 31 Financiamento para operação do projeto. 32 Uma carta emitida pelo banco do comprador para o fornecedor externo, afirmando que o banco garantirá o pagamento de uma dada fatura, se todas as cláusulas contratuais forem cumpridas.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 37

e empréstimo-ponte. Muitas vezes os bancos comerciais ou consórcios de bancos

também negociam uma facilidade de crédito compreensivo, abrangendo todas as

necessidades de empréstimos do projeto, podendo envolver mais de uma das

alternativas anteriores. Uma facilidade de crédito compreensivo pode oferecer uma

maior flexibilidade financeira ao projeto e ao próprio banco.

Os bancos comerciais trabalham, tipicamente, com financiamentos a taxa flutuante,

para o financiamento da fase de construção do projeto. Eles têm desempenhado um

papel ativo em financiamento de projetos, demonstrando capacidade de avaliar

complexos créditos e, muitas vezes, disposição para assumir não somente os riscos

de crédito, como também riscos operacionais, como o de conclusão33.

2.5.4 Créditos de fornecedores

Outra fonte que pode ser utilizada para crédito são os fornecedores de equipamentos

do projeto34. Os patrocinadores do projeto freqüentemente buscam financiar a compra

dos equipamentos, principalmente durante a fase de construção. Alguns projetos

também adotam o modelo de co-desenvolvimento, no qual fornecedores e

fabricante(s) desenvolvem conjuntamente o produto, compartilhando riscos e

investimentos em pesquisa e desenvolvimento35. Nesse modelo, os fornecedores são

uma importante fonte de crédito complementar.

2.5.5 Bancos multilaterais de desenvolvimento

Os bancos multilaterais têm entre suas prioridades, o suporte financeiro e profissional

para o desenvolvimento econômico e social dos países em desenvolvimento36. Esta

denominação (bancos multilaterais de desenvolvimento) aplica-se, tipicamente, ao

Banco Mundial e a quatro bancos regionais de desenvolvimento: o Banco de

Desenvolvimento Africano, o Banco de Desenvolvimento Asiático, o Banco Europeu

para Reconstrução e Desenvolvimento - EBRD e o Banco Inter-Americano de

Desenvolvimento - BID. O Banco Mundial e os bancos regionais de desenvolvimento

33 Os riscos envolvidos em um projeto serão estudados no sub-capítulo 2.6. 34 Geralmente o crédito de fornecedores é associado a algum tipo de assistência governamental. 35 O projeto da aeronave que será apresentado mais adiante adotou esse modelo. 36 Informações obtidas no web site do Banco Mundial, http://www.worldbank.org.

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PROJECT FINANCE 38

representam uma atraente fonte de financiamento de longo prazo para projetos de

grande porte, principalmente no setor de infra-estrutura.

O Banco Mundial37 (World Bank Group) abrange cinco instituições que desempenham

um papel no financiamento de projetos. As três principais são:

a) Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD)

Empréstimos do BIRD são destinados à promoção do desenvolvimento econômico,

em vez de comercial. Geralmente são destinados para países menos desenvolvidos e

complementados com o financiamento de outros órgãos multinacionais ou bancos

regionais de desenvolvimento.

b) International Finance Corporation - IFC

A IFC procura estimular o crescimento econômico nos países em desenvolvimento

promovendo investimentos do setor privado. Concede empréstimos, realiza

investimentos de capital e negocia financiamento adicional junto a terceiros.

c) Multilateral Investment Guarantee Agency – MIGA (Agência Multilateral de

Garantia de Investimentos) foi criada para segurar investimentos de capital em

países em desenvolvimento contra riscos políticos — como quebra de contrato,

comoções civis, expropriação ou guerra.

Fundado em 1959, o BID é o maior e mais antigo banco regional, e tem o objetivo de

acelerar o desenvolvimento social e econômico da América Latina e Caribe38. Os

representantes originais da instituição incluíam 19 países latinos e caribenhos, mais os

EUA. Logo em seguida, oito outros países, incluindo o Canadá, juntaram-se ao banco.

Entre 1976 e 1993, 18 países não-americanos também se associaram, totalizando,

hoje, 46 nações membros.

As principais funções do banco são: utilizar o seu capital próprio para financiar o

desenvolvimento dos países membros; suplementar o investimento privado quando o

37 Além do BIRD, IFC e MIGA, o Banco Mundial é formado pelas instituições IDA (International Development Association) e o ICSID (International Centre for the Settlement of Investment Disputes). 38 Informações obtidas no web site do BID, http://www.iadb.org.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 39

capital privado não está disponível em termos e condições razoáveis; e prover

assistência técnica para a preparação, financiamento e implementação de projetos. O

BID também é formado por mais duas instituições:

a) Inter-American Investment Corporation (IIC): busca promover o desenvolvimento

econômico da região, financiando empreendimentos privados de pequena e média

escala;

b) Multilateral Investment Fund (MIF): busca promover investimentos e estimular o

setor privado.

2.5.6 Mercado de capitais local

Gitman (1997:36) define mercado de capitais como “uma relação financeira criada por

instituições e condições que permitem aos fornecedores e aos tomadores de fundos

de longo prazo realizar transações.” Os fundos de longo prazo incluem títulos emitidos

por empresas e governos, que são transacionados através das bolsas de valores. Os

mercados mundiais de capitais tornaram-se mais estreitamente integrados com a

intensificação da internacionalização econômica.

Segundo Finnerty (1999:181), o levantamento de recursos localmente pode diminuir a

exposição de um projeto a riscos políticos. “Qualquer evento que possa prejudicar a

lucratividade do projeto afetará os credores e investidores locais. Essa perspectiva

tende a oferecer um desincentivo para que o governo local empreenda ações

adversas.”

2.5.7 Mercado internacional de capitais

O mercado internacional de capitais é o mercado de títulos de médio e longo prazo e

ações que opera fora dos mercados de capitais nacionais do mundo (Finnerty, 1999).

O maior mercado internacional de capitais é o Eurobônus. Nesse mercado, empresas

e governos emitem títulos de dívida e os vendem a investidores internacionais.

Segundo Gitman (1997:39), “as empresas e os governos emissores apreciam o

mercado de eurobônus porque este lhes permite atingir um maior grupo de

investidores que aquele, que, geralmente, estaria disponível no mercado local, e

porque a competição mantém suas taxas atrativamente baixas.” O mercado

internacional de ações permitiu às empresas a venda de grandes blocos de

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PROJECT FINANCE 40

participações acionárias, simultaneamente, em diferentes países, diversificando a

base de investidores e a captação de um maior montante de capital.

2.5.8 Assistência governamental

A assistência governamental tem desempenhado um papel fundamental para o

financiamento de projetos. Os termos e os custos dos financiamentos e das garantias

são muitos atrativos. Recursos são fornecidos a taxas de juros e períodos de

amortização melhores do que o mercado teria condições de fornecer (Wynant, 1980).

O apoio governamental é efetivado basicamente através de créditos à exportação e

garantias de empréstimos.

Para o crédito à expor tação, os países desenvolvidos, em sua maioria, criaram bancos

de exportação e importação de equipamentos. A finalidade desses bancos é promover

a exportação de equipamentos nacionais através do financiamento do crédito. Os

créditos fornecidos podem tomar a forma de crédito ao comprador (buyer credit) ou

crédito ao fornecedor (supplier credit).

Um importante órgão de crédito à exportação é o Export -Import Bank dos EUA

(Eximbank). Um empréstimo do Eximbank normalmente cobre de 30 a 55% do custo

dos equipamentos. Financiamentos e garantias a empréstimos também podem ser

obtidos por agências governamentais de outros países, como o Export Insurance

Division e o Japan Bank for International Cooperation (JBIC) no Japão, o Export Credit

Guarantee Department na Inglaterra (Wynant, 1980) e os programas de financiamento

às exportações do governo canadense, a Canada Account e a Export Development

Corporation (EDC).

Nos últimos anos, o financiamento de crédito à exportação tem sido foco de disputas

comerciais na Organização Mundial do Comércio - OMC (World Trade Organization’s -

WTO) e de debates entre as nações industrializadas de todo o mundo. Muitas vezes

os limites entre o apoio governamental legal e a utilização de barreiras comerciais e

subsídios são muito tênues, tornando a competição desigual. O debate torna-se mais

polêmico quando analisamos as desigualdades econômicas e sociais entre os países

ricos e pobres.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 41

O Brasil possui dois programas de financiamento às exportações: o PROEX, para

crédito ao comprador, e o FINAME, para crédito ao fornecedor nacional. O PROEX39 é

o Programa de Financiamento às Exportações do governo brasileiro. Ele possui duas

modalidades: financiamento e equalização. O PROEX financiamento consiste no

financiamento ao exportador de bens e serviços brasileiros, realizados exclusivamente

pelo Banco do Brasil, com recursos do Tesouro Nacional. Para o desembolso do

financiamento é necessário que a empresa esteja em dia com suas obrigações fiscais

e não tenha dívidas ativas com a União. A TAB. 2 resume as condições financeiras

dessa modalidade.

TABELA 2

Condições financeiras do PROEX Financiamento.

Prazo Máximo 10 anos*

Percentual Máximo Financiável 85% do valor da exportação**

Taxa de Juros As praticadas no mercado internacional

Forma de Pagamento Parcelas semestrais, iguais e sucessivas***

Garantias Aval, fiança, carta de crédito ou seguro de crédito à exportação

Moeda de Pagamento Dólar norte-americano ou outra moeda de livre conversibilidade

Condições Financeiras PROEX Financiamento

FONTE: http://www.bb.com.br (2002).

NOTA: (*) os prazos são definidos de acordo com o valor agregado da

mercadoria ou a complexidade do serviço prestado e podem ser dilatados em

função do valor unitário da mercadoria; (**) se o índice de nacionalização do

bem for inferior a 60% implicará em redução do percentual financiável; (***)

nas operações de curto prazo admite-se pagamento único no final.

A modalidade equalização consiste no crédito ao exportador ou importador de bens e

serviços brasileiros, concedido por instituições financeiras no país ou no exterior,

através da qual o PROEX assume parte dos encargos financeiros, tornando-os

39 Informações obtidas no web site do Banco do Brasil, http://www.bb.com.br.

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PROJECT FINANCE 42

compatíveis com os praticados no mercado internacional. A TAB. 3 resume as

condições financeiras dessa modalidade.

TABELA 3

Condições financeiras do PROEX Equalização

Beneficiários Instituições financeiras de crédito que provêem os recursos do financiamento

Percentual Máximo Financiável 100%

Pagamento de Juros Semestral*

Prazo Máximo de Equalização 10 anos**

Percentual Máximo Equalizável 85% do valor exportado

Forma de Pagamento Emissão de notas do Tesouro Nacional

Demais Condições de Crédito Livremente negociadas

Condições Financeiras PROEX Equalização

FONTE: http://www.bb.com.br (2002).

NOTA: (*) vencimento da primeira parcela 6 meses após o embarque da

mercadoria; (**) os prazos são definidos de acordo com o valor agregado da

mercadoria ou a complexidade do serviço prestado e podem ser dilatados em

função do valor unitário da mercadoria. O prazo de equalização será sempre

limitado ao prazo do financiamento pactuado com o agente financeiro.

O FINAME40 é o Programa de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social - BNDES, sem limite de valor, para aquisição de máquinas e

equipamentos novos, de fabricação nacional, credenciados pelo banco e para capital

de giro associado, através de instituições financeiras credenciadas. A TAB. 4 resume

as condições financeiras dessa modalidade.

40 Informações obtidas no web site do BNDES, http://www.bndes.gov.br.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 43

TABELA 4

Condições financeiras do FINAME

Taxa de JurosCusto Financeiro + Spread Básico + Spread do Agente

Prazo Total Definido em função da capacidade de pagamento do empreendimento e da empresa

Nível Máximo de Participação 90%

Garantias Negociadas entre a instituição financeira e o cliente

Condições Financeiras FINAME

FONTE: http://www.bndes.gov.br (2002).

NOTA: Spread: a diferença entre o preço que um banco de investimento paga

por um título e o seu preço de venda.

Outro catalisador de financiamento a projetos são os bancos de desenvolvimento. O

que atua no Brasil é o BNDES. O BNDES é uma empresa pública federal vinculada ao

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior que tem como objetivo

financiar a longo prazo os empreendimentos que contribuam para o desenvolvimento

do país. Objetiva, também, o fortalecimento da estrutura de capital das empresas

privadas e desenvolvimento do mercado de capitais, a comercialização de máquinas e

equipamentos e o financiamento à exportação 41.

Em infra-estrutura, o BNDES viabiliza investimentos buscando dividir a participação e

o risco das operações com outros agentes econômicos. Para isso, vem intensificando

as parcerias com organismos multilaterais de crédito e com bancos nacionais e

estrangeiros, através da estruturação de operações sob a modalidade Corporate

Finance e Project Finance42. Bancos estaduais de desenvolvimento também fornecem

assistência ao financiamento, englobando projetos de pequeno e médio porte, como o

Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG)43.

41 http://www.bndes.gov.br. 42 http://www.bndes.gov.br. 43 http://www.bdmg-mg.gov.br.

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PROJECT FINANCE 44

Cabe ressaltar, também no caso brasileiro, a importante assistência da Financiadora

de Estudos e Projetos - FINEP, empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência e

Tecnologia, que tem como objetivo promover o desenvolvimento tecnológico e a

inovação no país44. A FINEP é a principal agência do governo federal para o

financiamento ao desenvolvimento da ciência e tecnologia do Brasil, apoiando todo o

ciclo de vida de um projeto. Uma de suas linhas de atuação é o financiamento de

serviços de engenharia consultiva (pré-investimento do projeto), como planos diretores

e estudos setoriais; estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental;

levantamento de dados; projetos básico e executivo. A instituição busca criar um

ambiente de negócios favorável ao investimento em P&D, buscando reduzir o custo e

simplificar o acesso aos recursos financeiros e à informação.

2.6 ANÁLISE DE VIABILIDADE DO PROJETO

A captação de recursos para um projeto é função de três variáveis: viabilidade técnica;

viabilidade econômica; e capacidade de obtenção de crédito. Todas essas variáveis,

por sua vez, são influenciadas pelos diversos riscos envolvidos no projeto. O

patrocinador deve assegurar de que os riscos envolvidos são conhecidos, estão

mitigados e compartilhados entre as partes envolvidas, garantindo a realização do

fluxo de caixa e taxa de retorno projetados. São esses elementos do plano de

financiamento que irão convencer, ou não, os credores e investidores prospectivos a

colocarem dinheiro no projeto, definindo o custo dos recursos (custo de capital da

dívida).

2.6.1 Viabilidade técnica

Quanto aos aspectos técnicos do projeto, as principais preocupações dos credores

são as garantias de que ele atenderá ao cronograma proposto, será construído dentro

do orçamento previsto e irá gerar produção de acordo com a capacidade projetada.

Antes das fases de construção e operação, é requerido um extenso trabalho de

definições do projeto que inclui ensaios, revisões, testes e simulações capazes de

comprovar a efetividade das tecnologias propostas. Os potenciais impactos ambientais

sob a construção e operação do projeto também devem ser previstos. Condições

44 Informações obtidas no web site da FINEP, http://www.finep.gov.br.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 45

climáticas extremas, como a construção e operação de um oleoduto em regiões

polares, ou a operação de uma instalação petrolífera em mares gelados, devem ser

contempladas e simuladas pela engenharia. A não-identificação desses riscos poderá

acarretar em dispendiosas mudanças futuras, impactando os custos e prazos

planejados, e em última análise, o fluxo de caixa projetado.

Geralmente, são contratados consultores de engenharia independentes para ajudar na

elaboração do projeto e na avaliação de sua solução técnica. A análise dos processos

tecnológicos é especialmente relevante quando o projeto envolve tecnologias

desconhecidas, alto volume de produção e condições ambientais adversas. Incertezas

tecnológicas têm grandes impactos nas exigências de financiamento e no retorno

esperados. É aconselhável também a inclusão de um fator de contingência nas

estimativas de custo de construção tendo em vista cobrir eventuais erros de projeto,

custos não-previstos e flutuações nas taxas de juros. Apesar de esse fator ser

relacionado às incertezas envolvidas em cada projeto, Finnerty (1999) acredita que,

para grandes projetos já finalizados, esse fator fica em torno de 10% dos custos

diretos. Na fase de estudos preliminares e orçamentação inicial, fatores de

contingência maiores são necessários, já que, à medida que caminhamos à jusante do

ciclo de vida do projeto, as incertezas são decrescentes.

Um planejamento do projeto também deve ser elaborado de forma integrada,

contemplando toda a sua fase de desenvolvimento, construção e operação. A

cadência de produção deve ser planejada, de modo que as instalações sejam capazes

de absorver uma expansão futura da demanda. O plano deve ser constantemente

retroalimentado com as informações das atividades efetivamente realizadas, incluindo

os desembolsos de capital. São controlados os custos de matérias-primas, mão-de-

obra, despesas administrativas, impostos, royalties e despesas de manutenção.

2.6.2 Viabilidade econômica

Na esfera econômica, a principal questão é se o valor presente líquido esperado do

projeto é positivo. No momento da concessão do crédito, os provedores de recursos

financeiros irão avaliar também a atratividade do projeto segundo a taxa de retorno

sobre o capital investido. A avaliação buscará identificar a capacidade do projeto de

atender ao serviço dos empréstimos, mesmo em face de acontecimentos adversos,

como: desvalorização da moeda; insuficiência de matérias-primas; aumento no custo

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PROJECT FINANCE 46

de construção (cost overun); atrasos no cronograma de construção ou no início das

operações; aumentos nas taxas de juros; ou flutuações nos níveis de produção, de

preços e de custos operacionais (Finnerty, 1999).

A viabilidade econômica dependerá principalmente da viabilidade de comercialização

(preço e volume) da produção do projeto. Geralmente são contratadas empresas

especializadas para realizar estudos de mercado, já que muitos projetos não possuem

histórico de crédito até que se atinja um determinado período de operação. Finnerty

(1999:35) descreve os objetivos desse estudo:

“Para avaliar a capacidade de comercialização, os patrocinadores providenciam um estudo das condições projetadas de oferta e demanda ao longo da vida esperada do projeto. O estudo de marketing é projetado para confirmar que, sob um conjunto de suposições econômicas razoáveis, a demanda será suficiente para absorver a produção planejada do projeto a um nível de preços que cobrirá o custo total de produção, possibilitará que o projeto atenda ao serviço de sua divida, e irá gerar uma taxa de retorno que seja aceitável para os investidores.”

As estimativas de custos operacionais e de capital devem ser reajustadas

periodicamente, geralmente corrigidas pela inflação do período. Estes custos irão

determinar os preços da produção do projeto. A precisão dessas projeções é

importante para avaliar os potenciais impactos na comercialização do projeto em

decorrência de mudanças nas taxas de inflação, assim como a sensibilidade da

lucratividade e da taxa de retorno do projeto sob diferentes contingências.

2.6.3 Capacidade de obtenção de crédito

A quantidade de divida em que um projeto pode incorrer depende da capacidade do

fluxo de caixa do projeto de gerar receita para pagar os custos operacionais, servir sua

divida pontualmente e fornecer retorno sobre o investimento financeiro, mesmo sob

condições adversas.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 47

A capacidade de crédito de um projeto é função de cinco fontes de garantias:

a) ativos: em projetos de recursos naturais eles serão muito importantes para

fundamentar a obtenção de financiamento. Muitas vezes as reservas são utilizadas

como garantias dos empréstimos, que serão amortizados de acordo com o plano

de produção e venda dos recursos naturais. Esse tipo de financiamento é muito

comum nos setores de petróleo e gás;

b) lucratividade esperada: é com base na taxa de retorno que os credores irão se

convencer da robustez econômica para amortização das dividas;

c) percentual de valor em risco do capital próprio dos patrocinadores nos ativos do

projeto: quanto maior for essa relação, menor será o índice da divida sob o total do

patrimônio e, portanto, menor o risco para os credores, já que a dívida tem

preferência sob o capital próprio em caso de falência;

d) suporte indireto de crédito de terceiros: muitas vezes é necessário que

patrocinadores ou outras partes capazes de se beneficiar com o projeto ofereçam

um suporte complementar de crédito, visando minimizar o risco de inadimplência;

e) risco de crédito de cada patrocinador: mais recentemente, as agências

rankeadoras de crédito45 passaram a analisar, diretamente para o Project Finance,

os riscos que cada projeto envolve. Isso possibilita aos credores avaliar o risco e a

taxa de retorno esperada de seu investimento. O risco de cada uma das firmas

patrocinadoras, juntamente com os do projeto, que foram assumidos pelos

credores, irão influenciar na taxa a ser cobrada no financiamento (Monteiro Filha &

Castro, 2000).

2.6.4 Riscos e instrumentos atenuantes

Os acontecimentos adversos potenciais constituem os riscos de um projeto. Segundo

a definição do PMBOK46 (2000:127), o “risco de um projeto é uma condição ou evento

incerto que, se ocorrer, tem um efeito positivo ou negativo em um objetivo do projeto.

O risco tem uma causa e, se ocorrer, uma conseqüência.” Um projeto está sujeito a

diversos riscos financeiros e de negócios. O tipo e o grau de risco de um Project

45 Esses ratings são classificações de qualidade de crédito / títulos de dívida de projetos, empresas e países. As duas principais agências são a Standard & Poor’s e a Moody’s Investors Service. 46 Inglês.

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PROJECT FINANCE 48

Finance também é distinto para cada projeto, indústria ou setor. A TAB. 5 caracteriza

os principais riscos envolvidos em um projeto e suas causas fundamentais.

TABELA 5

Principais riscos de um projeto e causas fundamentais

Riscos Descrição Causa

Conclusão Projeto não venha a ser concluído - O projeto deixa de ser lucrativo- Inviabilidade técnica

TecnológicoTecnologia não apresenta desempenho de acordo com as especificações ou se torna prematuramente obsoleta

- Tecnologia desconhecida- Falhas no projeto- Tecnologia em rápida evolução- Novos produtos concorrentes

Fornecimento de matéria-prima

Indisponibilidade de fatores de produção durante a vida do projeto

- Erros nos estudos do dimensionamento das reservas naturais

EconômicoDemanda pelos produtos e serviços do projeto não seja suficiente para gerar a receita projetada

- Declínio do preço final da produção- Aumento no custo de uma matéria-prima- Mau dimensionamento dos custos de produção

FinanceiroTaxas de juros crescentes podem por em perigo a capacidade do projeto atender o serviço de sua divida

- Instabilidade econômica- Risco inflacionário

Cambial ou de Moeda

Fluxo de receita e/ou custos e denominado em mais de uma moeda ou em moedas diferentes

- Mudanças nas taxas de câmbio

Político

Possibilidades de autoridades políticas do anfitrião interferirem no desenvolvimento pontual e/ou na viabilidade econômica

- Tributação excessiva- Restrições legais onerosas- Expropriação

AmbientalEfeitos sobre o meio ambiente possam causar atrasos ao desenvolvimento ou torne necessário um oneroso reprojeto

- Mudanças na regulamentação ambiental- Lobbies agressivos e desafios legais montados por grupos de ambientalistas- Descaso ou mau dimensionamento dos impactos ambientais

De força maiorEvento que possa prejudicar, ou impedir, a operação por um período de tempo prolongado após a conclusão do projeto

- Catastrófica falha técnica- Greve- Incêndio, terremoto, maremotos, guerras, etc

FONTE: Baseado em Finnerty, 1999:40-47.

Os riscos devem ser identificados, mitigados e alocados entre as diversas partes

envolvidas no empreendimento (proprietários do projeto, compradores de produção do

projeto, fornecedores de matérias-primas, órgão governamental responsável) através

de instrumentos atenuantes que podem assumir a forma de garantias, como

dispositivos contratuais, seguros e suportes de crédito suplementar.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 49

Bieldman et al. (1990) também qualificam os tipos de riscos envolvidos em cada uma

das fases do projeto (TAB. 6). Os principais riscos da fase de desenvolvimento são os

riscos tecnológicos e o de crédito. Nessa fase, são realizados estudos técnicos e

ambientais e, devido ao baixo nível de informações (incertezas), os bancos de

investimento e comerciais costumam relutar em prover recursos para o projeto. A fonte

básica de financiamento é o capital dos sponsors e fornecedores. O custo de capital

da dívida nessa etapa é mais alto que nas outras duas fases do projeto.

Na fase de construção, os riscos estão associados aos atrasos do cronograma de

obras, que poderão impactar o fluxo de receita e o cronograma de pagamento da

dívida e ameaçar a conclusão do projeto. Os principais riscos dessa fase são os de

conclusão, de cost overrun47, de desempenho dos sponsors e político.

Uma vez que o projeto foi concluído, inicia-se a fase de operação. A negociação de

financiamentos torna-se mais fácil, já que as incertezas diminuíram e alguns riscos

desapareceram. Contudo, alguns ainda permanecem enquanto outros surgem, como

cost overrun, desempenho dos sponsors, riscos de liability, riscos financeiros e

econômicos.

Cada um dos riscos deverá ser alocado ao stakeholder adequado através de arranjos

de garantias. A relação com os fornecedores e compradores, por exemplo, é

formalizada em contratos de longo prazo, visando a minimização dos riscos de

fornecimento de fatores de produção e de compra dos serviços e produtos do projeto,

o que poderia impactar negativamente a realização do fluxo de caixa projetado. O

fornecedor do equipamento deverá garantir o seu desempenho operacional; o

construtor a construção; as seguradoras os riscos de liability, e assim por diante. A

TAB. 6 mostra que os sponsors estão diretamente expostos a quase todos os riscos

do empreendimento.

47 Incertezas nas estimativas de custo das obras a serem realizadas.

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PROJECT FINANCE 50

TABELA 6

Riscos, responsabilidade e instrumentos de mitigação (proteção)

Fase do Projeto / RiscosResponsabilidade

dos riscosExemplos de Instrumentos

de Mitigação (proteção)

Desenvolvimento

Tecnológico Sponsors Capital próprio

Crédito Bancos e sponsors Cartas de crédito

Construção

Conclusão Empreiteiras, fornecedores e sponsors

Contratos Turnkey, seguros

Cost overrun Sponsors e empreiteiras Contratos a preços fixos

Desempenho SponsorsGarantias de complementação e performance

Político SponsorsIsenção de taxa e Joint-Venture com parceiros públicos

Operação

Desempenho Empresa operadora Garantias de performance

Cost overrun Sponsors Contratos a preço fixo

Liability Governo e seguradoras Contratos de seguros

Financeiros Sponsors e usuários Cláusulas para re-equilíbrio do contrato

Econômicos Sponsors e usuários Cláusulas para re-equilíbrio do contrato

FONTE: Bieldman et al., 1990:49 (Adaptado).

2.7 ARRANJOS DE GARANTIA

Os arranjos de garantia são os instrumentos que irão atenuar os riscos e distribuí-los

entre os stakeholders. No Project Finance, esses arranjos são fundamentais, já que os

patrocinadores do projeto tipicamente não dão garantia do pagamento da dívida do

projeto, de forma que partes com credibilidade creditícia devem fornecer suporte

através de instrumentos contratuais adequados.

A alocação dos vários tipos de riscos para os stakeholders que possuem melhores

condições de assumi-los é o ingrediente-chave que torna o Project Finance bem-

sucedido em projetos de grande porte (Beidelman et al., 1990). Isto é feito através dos

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 51

arranjos de garantia. Finnerty (1999) aponta alguns fatores que influenciam a escolha

dos arranjos de um determinado projeto:

a) tipo de instalações envolvido;

b) natureza da transação de compra;

c) partes do contrato;

d) riscos inerentes ao projeto.

A principal função dos arranjos de garantia no Project Finance é isolar os investidores

passivos48 de todos os riscos não-creditícios associados ao projeto. Eles querem estar

seguros e protegidos contra as adversidades do projeto. Para os riscos assumidos, os

credores irão exigir retornos atrativos o suficiente para compensá-los. De acordo com

Finnerty (1999:51),

‘Os investidores passivos geralmente fornecem a maior parte do capital de um projeto. De modo geral, esses investidores, que incluem investidores em ações assim como credores, estão interessados apenas em receber um retorno sobre seu investimento financeiro. Normalmente estão preparados para assumir certos riscos de crédito, mas se mostram extremamente relutantes em assumir riscos operacionais significativos, ou outros riscos não baseados na capacidade de a entidade-projeto cumprir com seus compromissos financeiros.”

Os riscos identificados da operação são distribuídos através de disposições

contratuais entre as várias partes envolvidas no projeto: patrocinadores, fornecedores

de equipamentos e de matéria-prima, compradores da produção, seguradoras e

governo anfitrião. Porém, os seus interesses muitas vezes são divergentes. Para a

distribuição dos riscos, Finnerty (1999:53) lembra que:

“A disposição e a capacidade das várias partes de assumirem riscos relacionados ao projeto dependerão dos benefícios que cada um espera obter do projeto, da capacidade financeira e objetivos comerciais de cada um, e da probabilidade percebida de que os que assumirem riscos de projeto serão plenamente compensados por fazê-lo. (...) A avaliação dos credores quanto à adequação de qualquer garantia oferecida provavelmente será fortemente influenciada pelos aspectos econômicos do projeto. Se estes aspectos econômicos forem suficientemente fortes para que muitos dos riscos normais de negócios pareçam extremamente remotos, os credores poderão estar dispostos a assumir certos tipos de risco que de outra forma evitariam.”

48 Os investidores de capital passivos recebem contribuições em dinheiro provenientes daquilo que sobra depois que a empresa-projeto tiver pagado o serviço da dívida daquele ano. Esses investidores também recebem sua parcela dos benefícios fiscais decorrentes da propriedade do projeto, e mais uma participação no valor residual.

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PROJECT FINANCE 52

Os credores irão exigir basicamente dois tipos de garantias: uma relativa à conclusão

do projeto49 e a outra referente ao pagamento pontual dos serviços da divida uma

vez que aquele seja concluído. Dispositivos contratuais serão elaborados para garantir as condições impostas pelos credores. Os arranjos de garantia relativos à conclusão

tomam a forma de obrigações que asseguram que o projeto seja concluído. Caso

contrário, os patrocinadores ou outras partes envolvidas são obrigados a quitar

integralmente a dívida.

Os principais arranjos de garantia relativos ao serviço da dívida são os contratos de

compra e venda da produção e os acordos de fornecimento:

a) contratos de compra e venda da produção (contratos off-take): são firmados com

os compradores dos produtos e serviços do projeto e buscam assegurar o fluxo de

receita do projeto para o pagamento dos custos operacionais e da dívida. Um

exemplo é o contrato take-or-pay, que obriga o comprador a pagar pela produção

do projeto, mesmo sem recebê-la;

b) acordos de fornecimento: fornecedores de insumos para o projeto proporcionam

suporte creditício através do compromisso em suprir as necessidades de fatores

de produção do projeto, garantindo sua operação.

Arranjos complementares podem ser elaborados, em um cenário de maiores

incertezas, como por exemplo, um acordo de deficiência de caixa, assegurando uma

reserva mínima de caixa para pagamento das dívidas (conta reserva). A

complementação do fluxo de caixa em caso de insuficiência de receitas para

pagamento da dívida também é passível de ser exigida e, em caso extremo de

inadimplência, para alguns financiamentos, os credores possuem a alternativa de

tomar posse dos ativos do projeto e vendê-los. Esses arranjos podem vigorar após a

conclusão comercial do projeto ou o término dos contratos de compra e venda.

Uma outra forma de fortalecer a força do crédito de um projeto é através de seguros.

De acordo com Finnerty (1999:62)

“Os credores geralmente exigem que sejam contratados seguros para protegê-los de certos riscos de força maior. Os seguros proverão recursos para a

49 A conclusão é geralmente definida em termos de conclusão comercial. Segundo Finnerty (1999:54), “A conclusão comercial ocorre quando a construção de praticamente todos os elementos do projeto estiver terminada e for obtido um certificado de um engenheiro.”

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 53

restauração do projeto em casos de força maior, assegurando, assim, que o projeto permaneça como entidade operacional viável. A proteção do seguro é especialmente importante quando a capacidade das partes obrigadas a pagar a dívida do projeto em bases aceleradas for duvidosa.”

2.7.1 Modelos de estrutura de garantias

Quanto à estrutura de garantias para concessão do empréstimo, o financiam ento de

um projeto admite três tipos básicos de variações: non recourse, limited recourse e full

recourse50:

a) non recourse: os financiadores não possuem direito de regresso. As únicas

garantias dadas ao financiador são o fluxo de caixa do projeto. Segundo Monteiro

Filha & Castro (2000:110) “... o financiador, em caso de insucesso, não tem

alternativa para reaver o montante do financiamento concedido que não seja

através da receita auferida com o projeto.”;

b) limited recourse: os financiadores possuem direito limitado de regresso das

dívidas. Os títulos da dívida e patrimoniais são apenas parcialmente vinculados ao

retorno e valor do projeto. Neste caso, os patrocinadores do projeto fornecem os

meios que os obrigam a complementar o fluxo de caixa do investimento sob

determinadas circunstâncias. É um sistema intermediário entre o full recourse e o

non recourse;

c) full recourse: o projeto é um empreendimento dentro da empresa, onde todos os

ativos, patrimoniais e receitas da empresa estão sujeitos à garantia. Norma lmente,

a concessão de crédito é feita pelos bancos comerciais e os principais riscos

residem nos sponsors. A dívida dessa modalidade deve ser exposta nos seus

balanços (on-balance-sheet).

Nos modelos non recourse e limited recourse, os instrumentos de atenuação de riscos

são amplamente utilizados, principalmente através de contratos de compra de matéria-

prima e contratos de venda de longo prazo (contratos off-take). Nesses dois casos, o

risco do projeto é o próprio empreendimento51. O full recourse é o instrumento

tradicional de garantias do Corporate Finance, onde os instrumentos de mitigação de

riscos normalmente não são utilizados (Monteiro Filha & Castro, 2000).

50 Essa estrutura também é chamada recourse finance. 51 Project Finance, Relatório Banco Alfa de Investimentos.

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PROJECT FINANCE 54

O termo Project Finance utilizado neste estudo refere-se apenas às estruturas non

recourse e limited recourse52, ou seja, provê a independência de cada projeto e a

proteção dos bens dos sponsors e acionistas quanto à maioria das dificuldades do

empreendimento.

Howcroft & Fadhley (1998) realizaram uma pesquisa buscando identificar a

importância dos vários tipos de estrutura de financiamentos de projetos (TAB. 7). A

amostra consiste de 28 bancos baseados principalmente na Grã-Bretanha, incluindo-

se os maiores grupos bancários internacionais. Os financiamentos de projetos através

de estruturas full recourse, ainda representam uma parcela considerável do total de

financiamentos realizados pelos bancos (21%), demonstrando que o Corporate

Finance ainda é uma modalidade bastante usual. O non recourse representa apenas

7% do total. Devido ao elevado risco de crédito dessa estrutura, financiamentos desse

tipo são mais raros. As estruturas restantes da TAB. 7 são do tipo limited recourse,

modalidade mais usual de Project Finance (72%).

TABELA 7

Participação das estruturas de garantia no financiamento de projetos

TIPOS DE ESTRUTURAS DE PROJECT FINANCE PARTICIPAÇÃO NO MERCADO (%)

Non recourse 7

Garantia referente a compromissos dos sponsors 14

Acordo em caso de déficit de caixa 15

Garantia de pré-completion 21

Full recourse 21

Mistura de garantias (limited finance ) 22

Total 100 FONTE: Howcroft & Fadhley (1998).

NOTA: a) pesquisa com bancos baseados na Grã-Bretanha; b) número de bancos da

amostra: 28; c) completion: conclusão física do projeto (Project’s Technical

Completion).

É uma ocorrência comum que se utilize de mais de uma estrutura de garantia de

recursos ao longo do ciclo de vida de um projeto. Para a fase de construção, devido

aos maiores riscos, o limited recourse é mais comumente estruturado. Após a

conclusão do projeto, o non recourse passa também a ser uma modalidade usual.

52 Essa definição é a mesma adotada pelo Institute of International Project Finance - http://www.members.aol.com/projectfin/intro.html.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 55

2.8 ESTRUTURA JURÍDICA53

A escolha da estrutura jurídica tem implicações na disponibilidade de recursos, no

custo de financiamento e nos arranjos fiscais do projeto (Finnerty, 1999). A estrutura

também será o meio de alocar os benefícios econômicos do projeto de forma

congruente à alocação de seus riscos. Existem diversas estruturas jurídicas para um

Project Finance. Os patrocinadores devem selecionar aquela que melhor se enquadra

às características do projeto. Segundo Finnerty (1999:67),

“A estrutura jurídica adequada a um projeto depende de uma variedade de fatores de negócios, jurídicos, contábeis, fiscais e regulatórios, incluindo (1) o número de participantes e os objetivos de negócios de cada um; (2) o custo de capital e o padrão de lucro previsto para o projeto; (3) as exigências das entidades regulamentadoras; (4) os instrumentos de dívida e a situação fiscal dos participantes; e (5) as jurisdições políticas em que o projeto irá operar.”

Quanto às formas de organização empresarial, o projeto poderá assumir quatro

configurações legais básicas54: interesse comum indivisível; corporações; parceiras; e

empresas de responsabilidade limitada.

Na forma organizacional de interesse comum indivisível, os projetos são de

propriedade direta dos participantes na qualidade de condôminos. Os benefícios e os

riscos do projeto são distribuídos em proporção direta ao percentual da propriedade. A

propriedade compreende a totalidade dos ativos do projeto. Cada um dos participantes

é responsável por levantar sua parte das necessidades de financiamento externo do

projeto. A estrutura de propriedade em condomínio será mais vantajosa quando seus

patrocinadores conseguirem alavancar, de forma independente, capital para o projeto

a um custo mais baixo que conseguiriam no financiamento atrelado ao projeto como

um todo. Isso ocorrerá quando empresas patrocinadoras possuírem força creditícia55,

conseguindo taxas mais baixas para o financiamento. No entanto, em outras

circunstâncias, essa organização pode não ser a mais adequada.

53 As considerações contábeis e fiscais não serão aprofundadas por terem grandes variações e especificidades em diferentes países. 54 As estruturas jurídicas apresentadas são baseadas no ambiente legal norte-americano. Não constitui objetivo desse estudo apresentar as características detalhadas de cada uma dessas formas legais. A finalidade é ressaltar que o Project Finance possui variações quanto à sua forma de organização empresarial, identificar algumas propriedades básicas, pontos fortes e fracos de cada uma e destacar a importância da seleção legal de um projeto para a otimização do seu financiamento. 55 Créditos de classificação mais alta.

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PROJECT FINANCE 56

Com relação às considerações contábeis, os patrocinadores devem registrar dívidas

relativas ao projeto em seus balanços, assim como a parte proporcional nos ativos,

receitas e despesas operacionais do projeto em seus demonstrativos financeiros

(Finnerty, 1999). Essa forma organizacional não estabelece uma pessoa jurídica

independente como proprietária do projeto.

A estrutura legal mais usual para um projeto é a corporação. Uma nova firma é criada

para construir, operar e ser proprietária do projeto. Nesse caso, a corporação,

normalmente pertencente aos patrocinadores, financiará o projeto através de

contribuições de capital das empresas-proprietárias e poderá também emitir títulos

preferenciais da dívida, títulos de dívida secundária, ações preferenciais ou títulos

conversíveis. As principais vantagens da forma de organização corporativa são

relacionadas à limitação de responsabilidade e à existência de um veículo emissor.

Nesta estrutura, os patrocinadores poderão ficar livres da inclusão dos ativos e

passivos do projeto em seus balanços. A limitação dessa organização consiste da

possibilidade de perda de alguns benefícios fiscais56 e algumas restrições de

investimento por parte dos patrocinadores na corporação-projeto (Finnerty, 1999).

A terceira configuração de organização do projeto são as parcerias, muito comuns na

estruturação de projetos em joint venture. Nessa estrutura, cada patrocinador do

projeto é um parceiro. A parceria contrata seu próprio quadro operacional, providencia

uma estrutura gerencial e poderá emitir títulos para financiar a construção. Uma de

suas principais vantagens é a ampla utilização de benefícios fiscais57.

Finalmente, a última estrutura legal possível para um projeto é a empresa de

responsabilidade limitada. Consiste de uma entidade jurídica distinta e Finnerty (1999)

aponta três vantagens dessa organização com relação às outras alternativas de

organização: (a) os proprietários desfrutam de responsabilidade limitada — não têm

responsabilidade pelas obrigações da empresa além do valor de suas contribuições de

capital à empresa; (b) a empresa de responsabilidade limitada poderá se enquadrar no

tratamento fiscal de parceria — o lucro flui para os proprietários da empresa sem

tributação do imposto de renda no nível da empresa; (c) não há limitações quanto ao

56 Por ser uma entidade tributável independente, na ausência de consolidação fiscal por parte dos patrocinadores a corporação-projeto tem seus lucros expostos a dois níveis de tributação (“bitributação” dos lucros do projeto). 57 As parcerias também são entidades independentes para fins fiscais, mas estão livres da “bitributação” (com exceção de certas parcerias que possuem ações negociadas em bolsa).

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 57

número ou tipo de proprietários — em contraste com sociedades limitadas, todos os

proprietários podem participar ativamente na gerência da empresa sem risco de perda

da limitação de sua responsabilidade.

No Brasil, o projeto pode assumir as diversas formas de sociedade prevista em lei,

sendo que as mais comuns são as sociedades por quotas de responsabilidade

limitada e a sociedade anônima. Monteiro Filha & Castro (2000:113) chamam a

atenção que no caso brasileiro, “não há uma lei específica para Project Finance, mas

existem normas que contemplam determinados aspectos da sua estrutura, aplicando-

se assim os dispositivos da legislação comum aos demais financiamentos.”

2.9 PLANO DE FINANCIAMENTO

Muitas vezes, o estabelecimento de um plano ótimo de financiamento envolve trade-

offs e escolhas que podem sacrificar alguns objetivos em detrimento de outros.

Finnerty (1999) apresenta seis objetivos principais para o Plano:

a) assegurar a disponibilidade de recursos financeiros suficientes à conclusão do

projeto;

b) assegurar os recursos necessários ao menor custo possível;

c) minimizar a exposição de crédito dos patrocinadores ao projeto;

d) estabelecer uma política de dividendos que maximize a taxa de retorno sobre o

capital dos patrocinadores do projeto, sujeita às limitações impostas por credores e

ao fluxo de caixa gerado pelo projeto;

e) maximizar o valor dos benefícios fiscais decorrentes da propriedade aos quais o

projeto dará margem;

f) alcançar um tratamento regulamentário o mais benéfico possível.

O planejamento de um financiamento para um projeto inicia-se com a estimativa das

necessidades totais de recursos. Esse montante será igual a soma das seguintes

contas:

a) juros sobre a dívida do projeto durante a fase de construção;

b) taxas e despesas gerais para elaboração do Project Finance;

c) custo total das instalações para a conclusão do projeto;

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PROJECT FINANCE 58

d) dinheiro necessário para cobrir a folha de pagamento e outras despesas

operacionais antes da conclusão do projeto;

e) investimento inicial em capital de giro.

Uma margem de segurança deve ser adicionada ao montante estimado final,

buscando proteger o projeto dos riscos operacionais, como por exemplo, custos

excedentes (cost overrun). Quanto maior o risco e incertezas do projeto, maior deverá

ser a margem. A necessidade de recursos poderá diminuir, de acordo com Finnerty

(1999:88), “à medida que as receitas de caixa são geradas pela operação parcial do

projeto durante o período de construção. Estas receitas podem ser obtidas quando o

projeto é completado em fases e inicia operações antes da fase final ter sido

terminada.”

Após o levantamento da projeção de capital necessário, inicia-se a fase de prospecção

de fontes de recursos e pré-comprometimento com o financiamento. A construção do

projeto não poderá iniciar até que os patrocinadores estejam convencidos da

disponibilidade de recursos, para que também possam comprometer-se com as

empresas que realizarão a construção. Os compromissos de empréstimos com os

credores de longo prazo ajudam no compromisso dos financiadores da construção.

Um plano de financiamento para um projeto inclui arranjos tanto para o financiamento

da construção quanto para o ciclo de vida de operação (financiamento permanente ou

de longo prazo). O financiamento para construção poderá ser captado pela empresa-

projeto basicamente de duas fontes:

a) recursos de empréstimos bancários: empréstimos diretamente através de bancos

comerciais ou através da emissão de notas promissórias de curto prazo;

b) empréstimos diretos pelos patrocinadores: captação por parte dos patrocinadores,

diretamente junto aos bancos, da parcela de financiamento que lhes corresponde e

que será emprestada como capital para a empresa-projeto. A empresa-projeto

pagaria os empréstimos dos patrocinadores com a receita decorrente do

financiamento a longo prazo. Segundo Finnerty (1999:93), esta alternativa “torna

os patrocinadores diretamente responsáveis por todo o risco de conclusão – a não

ser que consigam realizar contratos de construção de obra completa (turnkey),

para transferir o risco às empresas responsáveis pela construção do projeto.”

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 59

O financiamento de longo prazo (permanente)58 pode ser efetivado através de três

formas básicas:

a) empréstimos bancários: a utilização dos empréstimos no financiamento a longo

prazo requer que os patrocinadores do projeto busquem instrumentos atenuantes

do risco financeiro59. Como esses empréstimos estão sujeitos a taxa de juros

flutuantes, os patrocinadores geralmente providenciam swaps ou caps (tetos) de

taxas de juros;

b) colocações privadas: captações que permitem o endividamento a taxas fixas. São

realizadas junto a instituições financeiras, como seguradoras e fundos de pensão

(Finnerty, 1999);

c) equity kickers: oferta de participação acionária do projeto em troca do crédito. Esse

recurso pode expandir o mercado para a dívida do projeto, reduzindo os

componentes iniciais de custo fixo do financiamento. Os credores aceitam

dispositivos menos restritivos e suporte creditício menos exigente. Em

contrapartida, eles exigirão um incentivo de capital60 para compensá-los do risco

adicional que estarão assumindo.

De acordo com Finnerty (1999), a dívida que um projeto poderá assumir dependerá da

lucratividade e dos riscos operacionais esperados; da adequabilidade das

composições de garantia; e da capacidade de obtenção de crédito dos parceiros

obrigados sob tais condições. Quanto mais vulneráveis forem essas condições para os

credores e investidores de capital, menor será o índice de endividamento sobre o

capital máximo viável. Nesse momento começa a ser estudada a estrutura de capital

do projeto, a proporção possível de capital de terceiros e próprios, bem como a

necessidade e a conveniência61 de buscar investidores externos de capital.

Uma outra consideração importante em relação ao financiamento é a elaboração do

plano de saques da linha de crédito (Drawdowns). De modo geral, Finnerty (1999:90)

afirma que “a programação de saques parcelados de recursos de longo prazo deverá

58 Quanto mais extenso for o período de construção do projeto, mais difícil será convencer os credores a comprometer seus recursos a longo prazo, dificultando a elaboração de um financiamento do projeto antes da sua conclusão. 59 Se o projeto for financiado somente por capital, ele terá somente riscos operacionais. 60 Maior taxa de retorno esperada, através de participação direta no capital, pagamento de royalties sobre receita bruta ou líquida ou pagamentos contingentes únicos ou multianuais. 61 Um suporte creditício, por exemplo, poderá ser negociado em troca de uma participação de capital na empresa-projeto

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PROJECT FINANCE 60

ser casada com o cronograma de despesas da construção. Este casamento

minimizará o armazenamento de recursos excedentes e/ou a necessidade de

financiamentos-ponte de curto prazo.”

Os credores normalmente impõem exigências quanto ao perfil de saques das parcelas

do empréstimo. Alguns credores exigem que os patrocinadores e os investidores de

capital (quando houver) integralizem parte de seus capitais antes do primeiro saque

dos recursos da dívida, ou que a dívida e o capital sejam sacados concomitantemente,

demonstrando aos credores um compromisso financeiro para com o projeto desde a

sua concepção (Finnerty, 1999). O vencimento da dívida do projeto também não

poderá exceder sua vida econômica útil esperada e os bancos credores raramente

mostram-se dispostos a emprestar por períodos que ultrapassem em 10 anos a data

prevista para a conclusão do projeto62.

O fluxo de caixa terá um importante efeito sobre o mix de empréstimos bancários e

endividamento fixo de longo prazo. Seu padrão que irá determinar os tipos de títulos

que serão utilizados no financiamento. Como regra geral, os recursos da dívida serão

programados para serem amortizados em consonância às receitas derivadas das

operações do projeto, minimizando a exposição do projeto ao risco de

refinanciamento.

Outro ponto a ser estudado é o perfil das receitas e custos do projeto. Quando as

receitas e os custos operacionais estiverem em moedas diferentes, a captação dos

recursos deve ser multimoeda, atrelando uma parte significativa da dívida à moeda

geradora de receita e a outra parte, na moeda necessária para o capital de giro do

projeto. Isso minimizará a exposição do projeto ao risco cambial.

62 Existem algumas exceções para projetos no setor de infra-estrutura, tipicamente de longa duração.

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DECISÃO DE FINANCIAMENTO 61

2.9.1 Estimativa da capacidade de obtenção de recursos de um projeto

Finnerty (1999:95) descreve a capacidade de obtenção de recursos de um projeto

como “o montante da dívida que um projeto possa efetivamente servir durante o

período de amortização de sua dívida.” Para estimar essa capacidade, os bancos

credores testam a capacidade do projeto em servir sua dívida em bases anuais63,

basicamente através de dois índices: o de cobertura de juros e o de cobertura de

serviço de divida64. Quanto maiores os índices, maior será a capacidade da empresa

para liquidar suas obrigações fixas. No entanto, índices de coberturas mais altos

poderão indicar uma subutilização das obrigações fixas, o que pode resultar,

desnecessariamente, em riscos e retornos baixos. Alternativamente, quanto mais

baixos forem os índices de cobertura do projeto, mais risco65 será atribuído ao projeto.

Se um projeto não for capaz de satisfazer suas obrigações, ele ficará inadimplente e

seus credores poderão exigir pagamentos imediatos.

a) índice de cobertura de juros

Esse índice mede a capacidade do projeto de cobrir seus encargos de juros

(acordados contratualmente). Esse índice é calculado da seguinte maneira:

jurosemanualdespesa

EBITrendadeimpostodoejurosdosanteslucrojurosdecoberturadeÍndice

)(=

Fórmula de índice de cobertura de juros

Um índice de cobertura de juros abaixo de 1,00 indicaria que um projeto não pode

cobrir totalmente seus encargos de juros a partir da receita operacional.

63 Os bancos também mensuram o valor máximo de endividamento que um projeto suportará, considerando saques periódicos do empréstimo e um saque total imediatamente antes da conclusão do projeto (quando for o caso). 64 Esse índice também é chamado de índice de cobertura de pagamentos fixos. 65 O termo “risco” aqui se refere à capacidade do projeto para pagar suas obrigações fixas (risco de crédito).

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PROJECT FINANCE 62

b) índice de cobertura de serviço de dívida

O índice de cobertura de serviço de dívida (Debt Service Credit Ratio - DSCR) é uma

métrica mais abrangente, por englobar todas as obrigações do pagamento do serviço

da dívida, tais como juros dos empréstimos e principal e pagamentos de aluguéis. A

grande distinção em relação ao índice de cobertura de juros é a inclusão do principal

(além dos juros), das despesas de depreciação e amortização. Os pagamentos do

principal não são dedutíveis do imposto de renda. A fórmula de cálculo de DSCR é:

ndadepostodeAlíquota

incipaldeoAmortizaçãAluguéisJuros

AluguéisEBITDADSCR

ReIm1Pr

−++

+=

Fórmula de índice de cobertura de serviço de dívida (DSCR)

EBITDA explicita lucro antes do pagamento de juros, imposto de renda, depreciação e

amortização.

De maneira semelhante ao índice de cobertura de juros, quando a cobertura do

serviço de dívida cair para menos de 1,00, o projeto não poderá servir totalmente sua

dívida a partir de seu fluxo de caixa, e terá que tomar recursos ou buscar aportes de

capital para cobrir a falta. Segundo Finnerty (1999),

“O índice de cobertura de serviço de dívida é especialmente útil na projeção do cronograma de amortização da dívida do projeto. Por exemplo, a exigência de não permitir que o índice de cobertura de serviço da dívida jamais caia para menos de, digamos, 1,10, indicaria quanto do fluxo de caixa estaria disponível para amortização do principal após a realização dos pagamentos de juros (e aluguéis) exigidos.”

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 63

3 O PROJETO DE CONCESSÃO DA RODOVIA PRESIDENTE DUTRA

3.1 O SEGMENTO RODOVIÁRIO66 E O PROGRAMA DE CONCESSÕES DO BRASIL

O ciclo rodoviário brasileiro só se iniciou no final da República Velha, a partir do lema

“governar é abrir estradas", cunhado em 1927 pelo presidente Washington Luís. Em

1940, os investimentos em rodovias foram alavancados através da criação do imposto

único sobre combustíveis e lubrificantes e, em 1945, pelo Fundo Rodoviário Nacional,

iniciando uma grande concentração desse modal na matriz de transportes brasileira67.

Em 1953 é criada a Petrobrás, e em 1956 é instalada a indústria automobilística

brasileira.

A estabilização econômica obtida pelo governo Castelo Branco (1964-1967) criou

condições para a obtenção de financiamentos externos para infra-estrutura, em

especial para a ampliação e pavimentação da rede rodoviária. A partir da crise de

financiamento do Estado brasileiro na virada da década de 70 e a extinção do Fundo

Rodoviário Nacional (1988), o crescimento do modal rodoviário começou a apresentar

sinais de estagnação.

Desde então, as condições de infra-estrutura (não somente a rodoviária) passaram a

limitar a competitividade brasileira, especialmente após o processo de abertura de

mercado na década de 90. Barat (1999) aponta os principais problemas da infra-

estrutura nacional nesse período:

a) deterioração acelerada das instalações fixas;

b) declínio da qualidade dos serviços;

c) colapso do suporte de financiamento público;

d) esgarçamento da base institucional, inclusive com a perda da capacidade de

planejamento governamental e de formulação de políticas de longo prazo.

66 Reis, “Análise Setorial Rodovias”, Panorama Setorial, Gazeta Mercantil (1998). 67 Atualmente, o modal rodoviário é o predominante na matriz de transportes do Brasil: 58% das cargas são transportadas por rodovias (http://www.novadutra.com.br).

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PROJECT FINANCE 64

Atualmente o déficit de investimentos em rodovias brasileiras é muito grande. A malha

nacional possui a extensão de 1.585,9 mil km, sendo que somente cerca de 9% estão

pavimentados68. A grande maioria das rodovias é estadual (80%), no entanto são os

trechos federais os que apresentam o maior índice de pavimentação. Cerca de 76%

das vias federais são pavimentadas (TAB. 8).

TABELA 8

Índice de pavimentação das rodovias brasileiras.

Malha Extensão TotalExtensão

PavimentadaÍndice de

Pavimentação

Federal 67,5 51,4 76%

Estadual 199,1 81,9 41%

Municipal 1319,3 14,9 1%

TOTAL 1585,9 148,2 9%

Rodovias (mil/km)

FONTE: Reis (1998).

NOTA: Dados de 1995.

Esse déficit é fruto da carência de recursos financeiros e da dificuldade de obtenção

de crédito suficiente para financiar todos os projetos de infra-estrutura rodoviária. Para

tanto, o Estado brasileiro vem buscando atrair financiamento do setor privado. Na

década de 90, o governo Fernando Henrique Cardoso - FHC implementou o Programa

de Concessões de Rodovias Federais – PROCOFE. Através desse programa, o

governo passou a priorizar os trechos rodoviários que já haviam sido “pedagiados”

pelo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem – DNER69 (Barat, 1999). O

programa prevê a concessão de 23.000 km de rodovias federais e estaduais. Desde

1996, 7,4 mil km dessas rodovias passaram à administração da iniciativa privada 70

(apenas 0,4% de toda a malha brasileira). Segundo a Associação Internacional de

Pontes, Túneis e Rodovias (International Bridge, Tunnel and Turnpike Association -

IBTTA), as estradas pedagiadas sob a iniciativa privada são as melhores rodovias em

termos de construção, conservação e segurança em todo o mundo71.

68 Reis, “Análise Setorial Rodovias”, Panorama Setorial, Gazeta Mercantil, 1998. 69 Instituição com frequentes acusações de corrupção. 70 Atualmente, o país possui 39 projetos de concessões de estradas em operação. 71 http://www.ibtta.org.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 65

A administração de rodovias através do sistema de concessão privada era uma

novidade para os brasileiros até bem pouco tempo atrás. Historicamente, o setor

sempre foi de responsabilidade exclusiva do Poder Público. Diferente da privatização,

segundo a qual um bem público é vendido e transferido em caráter definitivo para uma

ou mais empresas privadas, a concessão implica na transferência por tempo

determinado, após o qual o bem volta a ser responsabilidade do poder público. Uma

rodovia concedida continua sendo um patrimônio público, embora sob a

responsabilidade da iniciativa privada durante o período em que vigora a concessão.

Dessa forma, a concessão não envolve alienação de ativos72.

O órgão concedente e regulador da malha rodoviária de responsabilidade federal é o

Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes – DNIT. O DNIT substituiu73

o DNER, que iniciou o processo de concessão e que estava ligado ao Ministério dos

Transportes. O DNIT fornece o projeto básico dos trechos concedidos através do

Programa de Exploração Rodoviária. Também monitora a construção e regulamenta a

operação das estradas pedagiadas.

Cada concessão especifica o prazo, as exigências relacionadas à expansão e

manutenção da estrada, o pedágio para cada categoria de veículo74 e as normas

operacionais. Ao expirar a concessão, o direito de operar a estrada e de receber a

receita de pedágio reverte para o governo.

A primeira estrutura rodoviária concedida sob esse regime no Brasil foi a ponte Rio-

Niterói75. Naquela época, os mecanismos desse tipo de relação entre o setor privado e

o público ainda eram desconhecidos da maior parte da população e representavam

uma incógnita para os próprios envolvidos: o governo federal, criador e gestor do

PROCOFE, e as empresas interessadas. Hoje, o país já possui vários corredores

concedidos.

A outorga de uma concessão de estrada no Brasil é condicionada à existência de uma

rota de transporte concorrente não pedagiada76. As rotas de transporte concorrente

72 Por esse motivo o termo concessão é muito mais apropriado do que privatização. 73 Janeiro de 2002. 74 Classificação dos diferentes tipos de veículos baseada no número de eixos. 75 Junho/1995. Esse projeto foi financiado por Project Finance com recursos do BNDES. 76 Decreto lei 791/69.

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PROJECT FINANCE 66

são todas as outras rodovias (pavimentadas ou não) que permitem ao usuário chegar

ao seu destino. As rotas concorrentes não precisam ser necessariamente iguais à rota

concessionada. Elas somente devem possibilitar ao usuário realizar seu percurso sem

pagar pedágio.

Porém, esse decreto-lei vem provocando muitos debates entre o governo e as

concessionárias. Algumas vias, como o sistema Castelo Branco (SP), estão sendo

boicotadas pelos usuários que utilizam vias alternativas para fugir dos pedágios,

impactando no fluxo de caixa projetado e trazendo prejuízos para as

concessionárias77.

Muitos países, como Espanha, Itália e França, adotam a política de privatizar a

construção e exploração de obras e serviços em suas rodovias. A maior parte dos

países utiliza o chamado modelo Build, Operate and Transfer - BOT78, ou seja, cabe à

concessionária construir a rodovia, operá-la por um determinado período e, no final,

transferi-la ao poder público (projetos greenfield). No caso da Argentina e do Brasil, no

entanto, estão sendo firmadas concessões envolvendo apenas a recuperação e

melhoria imediata de rodovias já existentes (modelo Maintain Operate and Transfer -

MOT). A concessão das rodovias deverá contribuir para elevar os investimentos neste

modal nos próximos anos. Segundo a Associação Brasileira da Infra-estrutura e

Indústrias de Base - ABDIB (2000), o setor de transportes deverá absorver

investimentos da ordem de US$50,4 bilhões até 2004. O segmento rodoviário

receberá metade desses investimentos (GRAF. 1).

77 Carvalho. Concessionárias de olho na AL: Administradoras de rodovias buscam parceiros para atuar no exterior. Jornal Valor Econômico. 78 Reis, “Análise Setorial Rodovias”, Panorama Setorial, Gazeta Mercantil (1998).

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 67

25,183

16,017

4,053 3,843

10,142

50%

82%90%

98% 100% 100%

0

5

10

15

20

25

30

RODOVIÁRIO FERROVIÁRIO PORTOVIÁRIO DUTOVIÁRIO AEROPORTUÁRIO MULTIMODAL0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Investimentos Acumulado

GRÁFICO 1 - Investimentos no setor de transportes 2000-2004 (US$ bilhões).

FONTE: INFRA - Programa de Demanda por Infra-Estrutura. Relatório 14, 2000:28

(Adaptado) e Programa qüinqüenal de obras e serviços de engenharia da INFRAERO

(s.d).

3.2 O PROJETO79

Nesse projeto, o governo brasileiro outorgou uma concessão a uma entidade privada

para reformar e operar uma estrada pedagiada: a rodovia Presidente Dutra. A rodovia

foi a segunda concessão rodoviária brasileira. O consórcio detentor da concessão é a

Concessionária da Rodovia Presidente Dutra S.A, cujo nome fantasia é Nova Dutra.

Os patrocinadores dessa empresa de propósito específico são as empresas Andrade

Gutierrez, Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht e Serveng-Civilsan, que também vêm

participando de outras concessões de serviços públicos de infra-estrutura80.

A atuação dessas empresas no segmento de concessões rodoviárias dá-se através da

CCR - Companhia de Concessões Rodoviárias S.A.. Fundada em 1999, a CCR é a

terceira maior concessionária de rodovias do mundo e a líder no Brasil, com mais de

79 Informações complementares desse projeto podem ser obtidas no web site: http://www.novadutra.com.br. 80 A Andrade Gutierrez possui participação na Companhia de Saneamento do Paraná – Sanepar, na Companhia de Administração de Terminais Urbanos e Centros Comerciais – Comtec, em Uberlândia e na Barcas S.A., empresa responsável pelo transporte de passageiros na Baía de Guanabara (http://www.andradegutierrez.com.br).

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PROJECT FINANCE 68

1,2 mil km de estradas sob sua concessão81, detendo cerca de 16% da malha

rodoviária brasileira concedida. A empresa reúne as construtoras82 Camargo Corrêa,

Andrade Gutierrez, Norberto Odebrecht, Serveng-Civilsan, SVE participações (Servix e

Via Engenharia) e a portuguesa Brisa Auto-estradas S.A83. O GRAF. 2 mostra a atual

composição acionária da CCR.

Brisa17%

Andrade Gutierrez17%

Camargo Corrêa17%

Serveng-Civilsan12%

Minoritários12%

SVE5%

BNDESpar3%

Odebrecht17%

GRÁFICO 2 - Acionistas controladores da CCR

NOTA: Base maio/2002.

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

A estratégia da CCR é entrar em licitações de rodovias já existentes. Atualmente, a

holding CCR controla um portfólio de cinco concessionárias de rodovias concentradas

nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná: Lote cinco do Anel de Integração

do Paraná (PR), Rodovias RJ-124 e RJ-106 (RJ), Ponte Rio-Niterói (RJ), Rodovia

Presidente Dutra (SP) e Sistema Anhanguera-Bandeirantes (SP)84. Antes da criação

da CCR, as concessões eram contratadas pelas empresas que hoje são acionistas da

CCR. Com prazos de duração entre 20 e 25 anos, esse conjunto de concessões já

81 Carvalho. Concessionárias de olho na AL: Administradoras de rodovias buscam parceiros para atuar no exterior. Jornal Valor Econômico. 82 As acionistas da CCR são as maiores empreiteiras brasileiras. 83 A Brisa é o único operador de pedágio eletrônico de Portugal. 84 Nomes das SPC’s, respectivamente: Rodonorte S.A., Via Lagos S.A., Ponte S.A., Nova Dutra S.A., Autoban S.A..

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 69

absorveu investimentos superiores a R$1,6 bilhão nos últimos seis anos. De acordo

com a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), ao longo do

período de concessão, a Nova Dutra investirá R$845,7 milhões (base março/2002),

constituindo o terceiro maior investimento da CCR85 (GRAF. 3).

Em R$ milhões

1.180,4

845,7

114,0

150,0

1.120,0

0,0 500,0 1.000,0 1.500,0 2.000,0

Autoban (SP)316 Km

Nova Dutra (SP)402,4 Km

Ponte S.A (RJ)23,3 Km

Via Lagos (RJ)60 Km

Rodonorte (PR)480 Km

GRÁFICO 3 - Investimentos previstos no período das concessões da CCR

FONTE: Carvalho, 2002:B1.

Consórcios formados pelas empresas acionistas da CCR participaram das licitações

dessas estradas e, após a conquista do contrato, criaram as SPC's86. A empresa

também estuda as licitações de concessões de rodovias em outros países da América

Latina, como Chile, Venezuela, México e Argentina. A entrada nesses mercados

acontecerá a partir de 2003 através de parcerias locais87.

A rodovia Presidente Dutra88 interliga São Paulo ao Rio de Janeiro, os dois maiores

centros urbanos brasileiros, e atravessa cidades de grande importância nacional. Ela é

85 Carvalho. Concessionárias de olho na AL: Administradoras de rodovias buscam parceiros para atuar no exterior. Jornal Valor Econômico. 86 As concessionárias de rodovias se constituem em SPC's apenas quando da assinatura dos contratos de concessão. 87 Empresas que conheçam profundamente as regras nacionais são essenciais para a mitigação de riscos, redução de custos legais e de transação. 88 BR-116 Rio de Janeiro – São Paulo.

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PROJECT FINANCE 70

a principal via de ligação entre as regiões Sul e Nordeste do Brasil, além de abrigar

grandes indústrias89. A concessão consiste na exploração da rodovia, por meio de um

sistema de cobrança de pedágios, pelo período de 25 anos. Caso o contrato não seja

renovado após esse período, a estrada voltará para a administração do governo

federal, detentor legal dos ativos do projeto.

A rodovia possui hoje duas pistas, com extensão de 407 km, cinco praças de pedágio,

seis postos de pesagem de veículos e treze postos da Polícia Rodoviária Federal. A

FIG. 3 mostra o mapa da rodovia e a localização das praças de pedágio existentes:

Parateí (Norte e Sul), Jacareí, Moreira César, Itatiaia e Viúva Graça. As praças já

haviam sido estabelecidas na administração pública, com exceção da praça de

Jacareí, que foi construída pela concessionária e entrou em operação em setembro de

200190.

89 A rodovia Presidente Dutra é uma das estradas de maior densidade de tráfego do país. 90 A praça de Jacareí foi construída para ampliar a base de cobrança devido ao volume de carros que transitam no trecho entre São José dos Campos e Jacareí. A ampliação da praça possibilitou reduzir os preços das tarifas, solicitação do Ministério dos Transportes. O patamar de receitas da rodovia não se alterou.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 71

FIGURA 3 - Mapa da rodovia Presidente Dutra

FONTE: http://www.novadutra.com.br (2002)

A tecnologia de cobrança dos pedágios é similar às praticadas no exterior, apesar de o

nível de cobrança automatizada (tag91) e semi-automatizada (cartão) ser mais baixo do

que os praticados nos países desenvolvidos. Investimentos vêm sendo realizados para

aumentar a automatização da cobrança.

O perfil da demanda da estrada é comercial: 80% dos usuários utilizam-na por razões

de trabalho e somente 20% por lazer. A maioria dos motoristas usa o trecho completo

da rodovia: 39% dos usuários percorrem com maior freqüência o trecho entre as

cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, 8% trafegam entre São Paulo e Volta

91 Etiqueta que é fixada no pára-brisa dos veículos. O usuário paga uma taxa de adesão e de administração e tem debitado na sua conta ou no cartão de crédito o valor correspondente ao número de vezes que utilizou o sistema.

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PROJECT FINANCE 72

Redonda e 5% entre São Paulo e São José dos Campos. A distância total entre as

duas capitais é percorrida com maior freqüência por 52% dos motoristas de ônibus,

45% dos caminhoneiros e por 20% dos motoristas de automóveis. Em 2000, o

corredor apresentou uma média mensal de 2.900.000 veículos/mês, dos quais 54%

foram veículos leves e 46% pesados.

No edital de licitação, o programa de exploração rodoviária incluía o projeto básico das

obras. Os principais investimentos previstos foram para a recuperação geral da

rodovia:

a) modernização geral da rodovia;

b) recuperação de todo o pavimento;

c) nova sinalização e novas defensas e barreiras;

d) recuperação de 284 viadutos e pontes;

e) construção de 38 km de novas vias marginais92 para desafogar o tráfego nas

regiões de São Paulo, São José dos Campos e Rio de Janeiro;

f) nova pista na Serra de Araras.

Além desses investimentos, a concessionária deve prestar serviços aos usuários,

colocando cabines telefônicas, serviços gratuitos de emergência de socorro médico e

mecânico, carros de reboque à disposição do usuário e equipes de apreensão de

animais na pista. O contrato envolve, ainda, outros serviços, como a implantação de

sistemas de arrecadação, pesagem, comunicação e controle de tráfego; conservação

periódica da rodovia, incluindo limpeza, tapa buracos, manutenção extraordinária da

rodovia (pavimentos) e distribuição de informativos periódicos de ações da

Concessionária e de conscientização dos usuários quanto à segurança da rodovia.

92 Ampliado para 80 km na última revisão do plano de investimentos.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 73

A FIG. 4 ilustra o ciclo de vida de um projeto de construção. Segundo a Sociedade dos

Engenheiros e Arquitetos da Suíça (SIA), um projeto de construção pode ser dividido

em seis fases:

a) fase 1, planejamento estratégico;

b) fase 2, estudos preliminares;

c) fase 3, projeto de engenharia;

d) fase 4, concorrência (licitação dos projetos de infra-estrutura);

e) fase 5, construção;

f) fase 6, operação do projeto.

CICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE CONSTRUÇÃO

1 2 3 4 656

PLANEJAMENTOESTRATÉGICO

ESTUDOSPRELIMINARES

PROJETO DEENGENHARIA

CONCORRÊNCIA OPERAÇÕES(NOVAS)

CONSTRUÇÃOOPERAÇÕES(EXISTENTES)

CICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE CONSTRUÇÃO

1 2 3 4 656

PLANEJAMENTOESTRATÉGICO

ESTUDOSPRELIMINARES

PROJETO DEENGENHARIA

CONCORRÊNCIA OPERAÇÕES(NOVAS)

CONSTRUÇÃOOPERAÇÕES(EXISTENTES)

CICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE CONSTRUÇÃO

1 2 3 4 656

PLANEJAMENTOESTRATÉGICO

ESTUDOSPRELIMINARES

PROJETO DEENGENHARIA

CONCORRÊNCIA OPERAÇÕES(NOVAS)

CONSTRUÇÃOOPERAÇÕES(EXISTENTES)

CICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE CONSTRUÇÃO

1 2 3 4 656

PLANEJAMENTOESTRATÉGICO

ESTUDOSPRELIMINARES

PROJETO DEENGENHARIA

CONCORRÊNCIA OPERAÇÕES(NOVAS)

CONSTRUÇÃOOPERAÇÕES(EXISTENTES)

FIGURA 4 - Ciclo de vida de um projeto de construção

FONTE: Swoboda, 1999 & SIA93, 1999 (adaptado).

A fase de operação possui duas naturezas distintas: operações novas (projetos

greenfields) e operações de projetos já existentes, que são geralmente contratados

pelo modelo MOT. As quatro fases iniciais correspondem ao desenvolvimento do

projeto. Como já foi dito anteriormente, o projeto não percorreu as fases de

desenvolvimento e construção de uma nova rodovia. A estrada já existia e a

concessão envolveu apenas serviços de recuperação, melhoria e administração do

corredor. Portanto, a Nova Dutra encontra-se na última fase, a de operação de um

projeto já existente.

93 Modelo suíço LM95.

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PROJECT FINANCE 74

3.3 HISTÓRICO

Em 1951, o Presidente Eurico Gaspar Dutra inaugurava a então nova ligação Rio de

Janeiro/São Paulo, que acabou recebendo seu nome. A nova estrada permitiu reduzir

a distância rodoviária entre as duas capitais em mais de 100 km em relação à estrada

velha, que havia sido inaugurada em 1928. Em 1967, as obras de duplicação do

corredor foram concluídas. Durante o período de 1972 a 1988 houve cobrança de

pedágio pelo governo federal.

Quando foi assumida pela Nova Dutra, a rodovia estava em péssimas condições de

conservação e eram altos os índices de acidentes. A obsolescência do corredor

passou a representar um entrave para o desenvolvimento econômico da região e do

próprio país, devido à importância da rodovia no modal rodoviário nacional.

A primeira etapa do processo de licitação ocorreu em 1993. Nessa fase foi realizada

uma pré-qualificação técnica, legal, financeira e fiscal de vinte licitantes. Cinco

concorrentes foram eliminados. Na segunda etapa, em 1994, dos 15 grupos pré-

qualificados, 11 apresentaram propostas técnicas, incluindo as soluções de

engenharia sugeridas para a recuperação e modernização da rodovia. Cinco grupos

foram qualificados para a fase seguinte.

A terceira e última etapa da licitação foi a fase de proposta de preço e aconteceu em

1995. Quatro empresas concorreram à concessão: Construtora Queiroz Galvão S.A,

Consórcio OAS/Techint, Construtora Triunfo Ltda., Consórcio Camargo Corrêa S.A. e

Andrade Gutierrez S.A.. O critério de julgamento da licitação foi a conjugação da

menor tarifa de pedágio, o atendimento a um programa de investimentos e o melhor

programa de prestação de serviços aos usuários.

O consórcio Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez saiu vencedor, e o contrato de

concessão foi assinado em 31 de outubro de 1995. Após a assinatura, foi criada a

SPC, já com a participação da Construtora Norberto Odebrecht e da Serveng Civilsan.

A partir desse momento iniciou-se o trabalho de montagem do Project Finance, com a

prospecção dos outros stakeholders.

A transferência do controle e entrada em operação da Nova Dutra ocorreu em 1º de

março de 1996. Após a transferência, a Nova Dutra realizou serviços e obras

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 75

emergenciais durante o período de seis meses. Foram reformadas as quatro praças

de pedágio existentes que estavam desativadas. A reativação da cobrança dos

pedágios aconteceu em agosto de 1996, juntamente com o primeiro reajuste da tarifa

de pedágio estabelecida em contrato. Em agosto de 1997 ocorreu o segundo reajuste

da tarifa de pedágio e a primeira antecipação de parte do cronograma de obras para

restabelecer o equilíbrio do contrato.

3.4 ARQUITETURA FINANCEIRA: PROJECT FINANCE

O consórcio vencedor da concessão da rodovia Presidente Dutra chegou a analisar a

utilização Corporate Finance para financiar o projeto. Mas a técnica logo foi

descartada por não se mostrar adequada às caracterís ticas do projeto. O fato de o

projeto necessitar de mais de US$300 milhões de recursos de dívida iria elevar o

exigível a longo prazo dos sponsors, dificultando a alavancagem financeira futura para

outros investimentos. O direito de regresso da dívida na modalidade Corporate

Finance (full recourse) também foi considerado um risco e um custo financeiro

elevado, que os patrocinadores não estavam dispostos a correr.

Atualmente, a CCR já possui um amplo conhecimento nessa técnica de financiamento.

Todos os seus projetos foram financiados por Project Finance. A opção pelo

financiamento via Project Finance mostrou-se mais atrativa, especialmente em função

de alguns fatores:

a) os recursos necessários eram elevados e um financiamento em bases

convencionais limitaria a capacidade dos acionistas da SPC em realizar outros

investimentos, uma vez que seus balanços estariam comprometidos;

b) o risco do projeto foi distribuído entre os vários participantes do projeto;

c) as responsabilidades dos acionistas em relação ao empréstimo limitam-se, a partir

de certo momento da concessão, à sua participação no capital integralizado no

projeto;

d) os financiamentos obtidos pelas empresas que participam do capital do

empreendimento não oneram, a partir de certo momento da concessão, seus

balanços (off-balance-sheet)94;

94 As obrigações não aparecem como dever no balanço patrimonial dos sponsors.

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PROJECT FINANCE 76

e) os credores só têm o direito de executar a SPC e seus ativos, mas não seus

acionistas (após a complementação total do projeto - Project’s Completion95).

Os stakeholders do Project Finance da Nova Dutra, bem como o tipo de relação de

cada um com a SPC estão ilustrados na FIG. 5. Os acionistas (sponsors) da SPC,

como já foi dito anteriormente, são as empresas Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa,

Norberto Odebrecht e Serveng Civilsan. Cada uma dessas empresas detém 25% de

participação acionária na Nova Dutra. As obras na rodovia não são, necessariamente,

realizadas pelas construtoras acionistas da SPC. Os construtores são contratados pelo

critério de menor preço. O regime de execução das obras na Dutra é por preços

unitários através de contratos de gerenciamento. O poder concedente representado

pela figura é o DNIT.

PODERCONCEDENTE

FINANCIADORESLOCAIS E

INTERNACIONAIS

FORNECEDORESDE

EQUIPAMENTOS

OPERADOR /CONSULTORES

CONSTRUTORES

SEGURADORESACIONISTAS(SPONSORS)

USUÁRIOS

CONCESSIONÁRIA- SPC -

TRUSTEE

FINANCIAMENTO

EQUIPAMENTOS SERVIÇOSTRUSTEE

CAPITAL SEGUROSPATRIMONIAIS

PERFORMANCEBONDS

SERVIÇOS DE OPERAÇÃO /MANUTENÇÃO / CONSULTORIA

OBRAS

CONTRATO DECONCESSÃOSERVIÇOS

TARIFA

DESEMPENHO /ASSUNÇÃO DERISCOS

CONTRATOS DE OPERAÇÃO / CONSULTORIA

CONTRATOS DECONSTRUÇÃO

REPAGAMENTOPRINC +JUROS

CONTRATOS DEFORNECIMENTO

CONTRATOSERVIÇOS DIVIDENDOS

PRÊMIOS PRÊMIOS

PERFORMANCEBONDS

PODERCONCEDENTE

FINANCIADORESLOCAIS E

INTERNACIONAIS

FORNECEDORESDE

EQUIPAMENTOS

OPERADOR /CONSULTORES

CONSTRUTORES

SEGURADORESACIONISTAS(SPONSORS)

USUÁRIOS

CONCESSIONÁRIA- SPC -

TRUSTEE

FINANCIAMENTO

EQUIPAMENTOS SERVIÇOSTRUSTEE

CAPITAL SEGUROSPATRIMONIAIS

PERFORMANCEBONDS

SERVIÇOS DE OPERAÇÃO /MANUTENÇÃO / CONSULTORIA

OBRAS

CONTRATO DECONCESSÃOSERVIÇOS

TARIFA

DESEMPENHO /ASSUNÇÃO DERISCOS

CONTRATOS DE OPERAÇÃO / CONSULTORIA

CONTRATOS DECONSTRUÇÃO

REPAGAMENTOPRINC +JUROS

CONTRATOS DEFORNECIMENTO

CONTRATOSERVIÇOS DIVIDENDOS

PRÊMIOS PRÊMIOS

PERFORMANCEBONDS

FIGURA 5 - Modelo de Project Finance da Nova Dutra

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões

95 Superadas as fases de conclusão das obras e complementação financeira do projeto.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 77

3.5 ANÁLISE DE VIABILIDADE DO PROJETO

A concessão da Via Dutra foi uma das primeiras lançadas no Brasil, quando o modelo

e a legislação aplicáveis às concessões ainda não estavam devidamente

consolidados. Independentemente disso, alguns dos grupos que hoje compõem a

CCR decidiram preparar-se para a “onda” de concessões do setor público, que já se

consolidava no exterior. O fato das empresas do consórcio possuírem amplo

conhecimento da legislação brasileira e serem oriundos do setor de construção

pesada96 também foi importante no processo de mitigação de riscos e apresentação

de uma proposta técnica e economicamente competitiva. Outra importante vantagem

do consórcio vencedor foi o estabelecimento prévio de contatos com o mercado

financeiro e com as agências multilaterais. Assim, quando as licitações foram

iniciadas, boa parte do mercado potencialmente financiador do projeto já conhecia a

estratégia do grupo de acionistas e as alternativas de financiamento já haviam sido

estudadas.

Os grupos acionistas da CCR visitaram concessões rodoviárias no exterior e

estabeleceram contratos de transferência de tecnologia com operadoras

internacionais, que assessoraram o consórcio nos estudos de rodovias desde muito

antes de as licitações serem lançadas.

A solidez dos grupos empresariais que hoje compõem a CCR foi um fator favorável

para assegurar maior capacidade de obtenção de crédito. A concessão da Via Dutra é

um empreendimento de grande porte, com investimentos elevados e, portanto, com

elevadas necessidades de suporte dos acionistas da concessionária quanto a aportes

de capital e à obtenção de fi nanciamentos.

Uma firma de engenharia independente foi contratada pelo consórcio vencedor para

avaliar a manutenção do corredor antes da licitação. Em um primeiro momento, essa

foi uma necessidade dos próprios acionistas, a fim de dar suporte à elaboraçã o da

proposta para a licitação. Logo após, os credores solicitaram que fosse feita uma

avaliação de manutenção, antes mesmo da contratação do financiamento, durante o

processo de aprovação do Project Finance e elaboração das atividades (due

diligence).

96 Atualmente, esses grupos diversificaram seus negócios e atuam nos setores petroquímico, telecomunicações, empreendimentos imobiliários, energia, cimento, dentre outros.

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PROJECT FINANCE 78

A fiscalização independente continua acontecendo. Empresas contratadas pelo DNIT

e o corpo técnico do próprio órgão atuam na estrada diariamente. Além dessa

fiscalização, representantes dos credores visitam a concessionária periodicamente,

verificando o estado geral de conservação da rodovia e o estágio do cronograma de

investimentos. Para a caracterização do Project’s Technical Completion (momento em

que as obras previstas no plano de exploração da rodovia são concluídas, com a

certificação do DNIT) foi realizada uma fiscalização detalhada. Um outro tipo de

avaliação é o nível de satisfação dos usuários. A Nova Dutra disponibiliza livros de

reclamações e sugestões e realiza pesquisas de opinião uma vez por ano.

O fato de a rodovia ter sido pedagiada no passado, com postos permanentes de

contagem de tráfego do DNER, permitiu uma análise técnica bastante acurada do

risco de demanda, aumentando a confiabilidade das projeções do fluxo de caixa. Um

documento do histórico operacional da via foi disposto na licitação, contendo a

evolução do seu estado de conservação e o histórico de intervenções físicas ocorridas

ao longo do tempo.

Os riscos de maior impacto nos resultados da concessão são os econômicos, de

construção, político, financeiro e de força maior. A Nova Dutra buscou atenuar todos

eles adotando instrumentos de mitigação e arranjos de garantias97:

a) risco econômico (tráfego e receita)

O risco de tráfego é causado pela dificuldade de se estimar com precisão o tráfego

futuro das rodovias. O risco de receita é inteiramente da concessionária. O governo

não garantiu um nível mínimo de receita proveniente dos pedágios. Como a rodovia

Dutra foi construída há vários anos, e portanto já possuía um tráfego estabelecido98, os

riscos de tráfego e de receita foram reduzidos consideravelmente.

Outro fator de mitigação desses riscos foi a utilização de estudos de tráfego. Para a

elaboração das propostas técnica e comercial e elaboração do Project Finance, foram

contratadas diversas empresas especializadas, nacionais e estrangeiras. Esses

estudos calcularam, em 1994, o tráfego diário da estrada e o perfil da demanda,

97 Os arranjos de garantia desse projeto serão vistos em maior profundidade no sub-capítulo seguinte. 98 Em projetos greenfields, o risco de tráfego é maior, já que não existe um histórico da rodovia.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 79

simulando, assim, as receitas que poderiam ser auferidas com as praças de pedágio99

(TAB. 9).

TABELA 9

Volume diário médio de tráfego em 1994

Estudos Viúva Graça Itatiaia Moreira César Parateí Total

Volume de Tráfego 19.120 16.965 24.910 27.354 88.349

Automóveis 11.427 6.208 12.756 11.989 42.380

Caminhões 6.589 9.850 10.793 13.719 40.951

Ônibus 1.104 907 1.361 1.646 5.018

Percentuais de Tráfego 100% 100% 100% 100% 100%

Automóveis 59,8% 36,6% 51,2% 43,8% 48,0%

Caminhões 34,5% 58,1% 43,3% 50,2% 46,4%

Ônibus 5,8% 5,3% 5,5% 6,0% 5,7%

Percentuais de Receita 100% 100% 100% 100% 100%

Automóveis 31,2% 13,9% 23,6% 18,2% 21,0%

Caminhões 61,8% 81,5% 70,8% 76,0% 73,2%

Ônibus 7,0% 4,6% 5,6% 5,8% 5,8% FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: a) volume diário médio: número médio de veículos que atravessam diariamente

a praça de pedágio; b) ano base do estudo: 1994.

A partir das correlações múltiplas entre os dados históricos de tráfego, de crescimento

demográfico, do PIB e dos preços dos combustíveis100, o consórcio pode projetar o

crescimento e a receita associada para cada uma das praças de pedágio ao longo da

concessão. As projeções incluíram fatores como efeito fuga e efeito qualidade. O

efeito fuga consiste da diminuição do tráfego por efeito do aumento da cobrança de

pedágio101. Ao contrário, o efeito qualidade gera um aumento de tráfego devido à

melhoria das condições da estrada, levando à realocação de tráfego ou captação de

demanda reprimida. O estudo também levou em consideração a origem e destino do

tráfego, as rotas alternativas potenciais de fuga, a competição com outros modais e a

sazonalidade da demanda.

99 Com exceção da Praça de Jacareí, que naquela época não existia. 100 Foram contratados três estudos que se basearam em diferentes metodologias. 101 Introdução de novas praças de pedágio ou incremento da tarifa.

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PROJECT FINANCE 80

Esses estudos serviram de base para a elaboração do fluxo de caixa do projeto. A

TAB. 10 mostra o crescimento projetado de tráfego das praças de pedágio ao longo

dos 25 anos de concessão. As taxas de crescimento são maiores nos primeiros anos

de operação da estrada.

TABELA 10

Crescimento projetado do volume de tráfego por praça de pedágio

Ano

Autos Caminhões Autos Caminhões Autos Caminhões Autos Caminhões

1 3.7% 3.8% 3.5% 4.5% 4.2% 4.4% 4.4% 4.4%

5 3.2% 3.2% 2.9% 3.9% 3.4% 3.7% 3.5% 3.8%

10 2.0% 2.7% 2.1% 3.3% 2.8% 3.2% 2.7% 3.2%

15 1.6% 1.9% 1.8% 2.6% 2.2% 2.4% 2.3% 2.7%

20 1.1% 1.5% 1.0% 2.0% 1.4% 1.9% 1.5% 1.9%

25 0.5% 0.9% 0.4% 1.4% 0.8% 1.5% 0.8% 1.3%

TOTAL 65.1% 74.5% 60.6% 103.2% 79.3% 97.4% 94.4% 98.5%

ANUAL 2.4% 2.6% 2.3% 3.3% 2.8% 3.2% 2.9% 3.2%

Viúva Graça Itatiaia Moreira César Parateí

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: crescimento real do tráfego, desconsiderando os efeitos fuga e qualidade.

As projeções de tráfego indicam que as praças de pedágio Moreira César e Itatiaia

serão as de maior tráfego, ao longo dos 25 anos de concessão, com respectivamente

680 e 627 milhões de veículos equivalentes102 (TAB. 29, ANEXO D).

Consequentemente, essas serão as praças com maior arrecadação de receita

proveniente dos pedágios, respondendo por cerca de 55% do total da receita

projetada.

b) risco de construção

O risco de construção, ou cost overrun, nasce da incerteza das estimativas dos custos

das obras a serem realizadas, tendo em vista a longa duração e difícil detalhamento

das mesmas. No caso da Dutra, a maioria das obras é de melhoria e manutenção, o

que reduz consideravelmente este risco. Outro fator mitigador do risco de construção é

a larga experiência dos sponsors na área de construção de rodovias. Também existem

coberturas de seguros que atenuam ainda mais tais riscos.

102 Número de veículos em determinada categoria multiplicado por seu respectivo multiplicador de tarifa (TAB. 20).

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 81

c) risco político

O risco político origina-se na possibilidade de mudança unilateral dos termos da

concessão por parte do poder concedente, como a expropriação ou a revogação do

contrato. Esse risco também estava relacionado a possíveis alterações da política de

concessões brasileira (por exemplo: a não-efetivação de uma isenção fiscal prometida

ou a criação de novos impostos). Nesses casos, tanto a Lei das Concessões como os

contratos em si especificam as devidas formas de compensação do investidor.

d) risco financeiro

O risco financeiro vem de três fontes: taxa de juros, inflação e desvalorização cambial.

O risco referente à alta das taxas de juros é neutralizado com a obtenção de

financiamento de longo prazo, o que reduz o risco de disparidade entre receitas e

despesas financeiras. O de inflação é mitigado pelo reajuste das tarifas, cuja fórmula

paramétrica inclui índices setoriais de inflação103. O risco de uma desvalorização

cambial afeta os empréstimos denominados em dólares, referentes ao IFC. Porém, o

impacto de uma desvalorização cambial é diluído ao longo de vários anos devido ao

perfil de amortização das dívidas contratadas. O contrato descrimina os direitos da

concessionária quanto ao reequilíbrio econômico-financeiro.

e) risco de força maior

O risco de força maior inclui catástrofes naturais, como incêndios, que são cobertos

pelas apólices de seguros contratadas pelas concessionárias, segundo as normas dos

editais.

Empresas estrangeiras não participaram da licitação. Os riscos político e financeiro

(moeda) foram considerados altos por consórcios internacionais. O risco moeda da

Nova Dutra envolvia principalmente o de o real se desvalorizar, como de fato ocorreu

em janeiro de 1999.

103 Esses índices setoriais serão apresentados no plano de financiamento do projeto.

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PROJECT FINANCE 82

3.6 ARRANJOS DE GARANTIA

Para limitar a exposição dos detentores dos títulos aos riscos do projeto, um pacote de

garantias e seguros foi elaborado, contendo as seguintes garantias:

a) securitização das receitas da concessionária;

b) caução das ações dos acionistas (exceto ações da Camargo Corrêa104);

c) hipoteca dos equipamentos comprados;

d) cessão da indenização por rescisão contratual;

e) garantia de pagamento da deficiência na indenização por rescisão contratual;

f) conta reserva;

g) cessão das indenizações por sinistros (seguros).

As estruturas de garantias estão formalizadas em contratos e também cobertas por

seguros. Quatro instrumentos contratuais especificam os eventos de bloqueio do

projeto:

a) Share Pledge Agreement: caução de todas as ações na companhia105 para garantir

o repagamento do empréstimo e de seus encargos. Nesse bloqueio, os

financiadores poderão vender ações no mercado ou tornar-se acionistas da SPC;

b) Project Funds e Share Retention Agreement: estabelecem as responsabilidades

dos acionistas e o mecanismo de utilização das receitas da concessionária. 100%

das ações da Nova Dutra foram retidas até a complementação do projeto e, a partir

de então, estão sujeitas a um índice de retenção de 51%;

c) Termination Compensation Assignment Agreement: estabelece a cessão, em favor

dos financiadores, de toda e qualquer indenização que venha a ser paga à

concessionária ou a seus acionistas, decorrente da rescisão antecipada do

contrato de concessão;

d) Termination Compensation Deficiency Guarantee Agreement: estabelece a

responsabilidade dos acionistas em prover aos financiadores fundos necessários à

cobertura de eventuais saldos devedores remanescentes dos financiamentos, após

a aplicação de indenização em situações específicas.

104 As ações da Camargo Corrêa não foram incluídas na caução das ações porque ela foi a líder do consórcio na licitação. 105 Exceto as ações da Camargo Corrêa.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 83

O projeto também está coberto por diversos seguros, exigidos pelo edital. A

concessionária faz uma provisão anual com recursos do fluxo de caixa operacional

para o pagamento dos prêmios dos seguros e o custo de contratação é renovado

anualmente. A TAB. 11 mostra as apólices de seguros contratadas pela Nova Dutra,

que totalizam quase R$60 milhões:

TABELA 11

Seguros contratados pela Nova Dutra

SEGURO / GARANTIA R$ MILHÕES

Garantia Performance Bond 10,0

Seguro All Risks de construção e Seguro de máquinas e equipamentos de obra 21,0

Seguro de danos patrimoniais e Seguro de quebra de máquinas 12,0

Seguro de lucros cessantes 12,7

Seguro de responsabilidade civil 4,0

Total 59,7

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez

Concessões.

NOTA: a) base maio/1995; b) o performance bond foi feito para o antigo

DNER, buscando garantir o bom cumprimento das obrigações do contrato

de concessão.

Até o Project́ s Completion é vedada a distribuição de dividendos para os sponsors. A

complementação financeira (Project´s Financial Completion) está atrelada aos

resultados financeiros apresentados pela concessionária, que deve atingir lucro líquido

de US$16,5 milhões em dois trimestres consecutivos. A Nova Dutra alcançou em 2000

a complementação total do projeto, conforme mostra a FIG. 6.

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PROJECT FINANCE 84

Financial

Completion

Technical

Completion

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Project´s

CompletionStart-up Financial

Completion

Technical

Completion

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Project´s

Completion

Financial

Completion

Technical

Completion

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Project´s

CompletionStart-up Financial

Completion

Technical

Completion

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Project´s

Completion

FIGURA 6 - Etapas de complementação da Nova Dutra

NOTA: Financial Completion: lucro líquido de US$ 16,5 milhões em dois trimestres

consecutivos; Technical Completion: conclusão das obras do programa de exploração

da rodovia; Project´s Completion: Financial Completion e Technical Completion

efetivados e certificação do DNIT e credores.

Após o atendimento do Project’s Completion, a distribuição de dividendos será

bloqueada caso ocorra alguma das seguintes situações ao se apurarem os resultados

do exercício:

a) índice de cobertura de serviço de dívida (DSCR) < 1.3;

b) dívida de longo prazo sobre o capital (Long Term Debt/Equity Ratio)106 > 1,5;

c) índice de liquidez corrente107 < 0,8.

Os patrocinadores recebem seu retorno na forma de dividendos pagos pelo fluxo de

caixa excedente do projeto (após o pagamento do serviço da dívida). Caso o projeto

satisfaça essas restrições, os dividendos poderão ser pagos até o limite de lucros

acumulados ou o caixa disponível na concessionária, prevalecendo o que for menor.

Os benefícios financeiros do projeto são distribuídos de maneira proporcional à

participação acionária de cada patrocinador na Nova Dutra.

Com relação ao direito de regresso da dívida, existem dois períodos distintos. Até a

complementação total do projeto, ou seja, superadas as fases de Project’s Technical

Completion e Project’s Financial Completion, o direito de regresso é limitado (limited

recourse). Nesse período, em caso de inadimplência, não existe qualquer ativo que

possa ser executado pelos credores, já que a estrada é propriedade do governo

brasileiro. Após Project’s Completion, não existe direito de regresso aos

patrocinadores (non recourse).

106 Índice exigível a longo prazo-patrimônio líquido (exigível a longo prazo dividido pelo patrimônio líquido. 107 Ativo circulante menos passivo circulante.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 85

Caso a Nova Dutra fique inadimplente, o contrato de financiamento restringe a

distribuição de dividendos. A cláusula de obrigações de não-fazer (Negative

Covenants) trata desse evento:

“Na Hipótese de Inadimplemento em Potencial tiver ocorrido e perdurar, não pagará qualquer dividendo nem efetuará qualquer distribuição a seu capital social nem comprará, resgatará ou por outra forma adquirirá quaisquer ações da Sociedade ou qualquer opção referente às mesmas.”

Se o tráfego efetivo exceder certos níveis especificados, vindo a gerar receitas extras,

não haverá pagamentos adicionais ou redução do prazo da concessão. Mas o contrato

de concessão prevê, caso esse fato ocorra, a realização de investimentos adicionais

na rodovia, de forma que os usuários sejam beneficiados. Por outro lado, o contrato

prevê, sob determinadas circunstâncias, como o não-atendimento de níveis mínimos

de tráfego, a prorrogação do prazo de concessão para recompor o equilíbrio

econômico e financeiro do projeto.

3.7 ESTRUTURA JURÍDICA E ORGANIZAÇÃO

Quanto à qualidade dos contratantes e regime jurídico, a Nova Dutra foi contratada

através de um contrato de concessão de serviço público precedida de obra pública

entre a União, por intermédio do DNER (extinto) e da Concessionária, nos termos do

art. 175 da Constituição Federal, pela Lei Federal nº 8666 de 21 de julho de 1993 e

suas alterações, e pela Lei Federal nº 8987 de 13 de fevereiro de 1995. A licitação da

rodovia Presidente Dutra foi do tipo “menor tarifa”108.

A má gestão da estrada pode remover a Nova Dutra da concessão. A legislação e o

contrato prevêem a rescisão do contrato por caducidade, caso ocorra a inadimplência

comprovada da concessionária. Há, também, a possibilidade de intervenção do DNIT

na concessão para sanar deficiências e inadimplências recuperáveis da

concessionária. Em qualquer um desses casos, a lei prevê o amplo direito de defesa

da concessionária. Nos casos de extinção, encampação e caducidade, a

concessionária terá direito a indenizações nos termos da legislação vigente. Se houver

encampação, a indenização deve ser paga previamente à remoção da concessionária,

108 Ganhou a concessionária que ofereceu a menor tarifa para o usuário.

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PROJECT FINANCE 86

mediante previsão orçamentária, sendo também previamente aprovada pelo

legislativo.

O reequilíbrio do contrato poderá ser efetivado para recompor a condição inicial do

mesmo109. Os eventos que podem provocar tal revisão são:

a) mudanças nos impostos incidentes sobre a receita;

b) mudanças nas obrigações previstas no programa de administração da rodovia;

c) eventos de força maior e/ou atos administrativos;

d) variação nos custos de desapropriação;

e) alteração unilateral do contrato de concessão pelo Governo;

f) obtenção imprevista de receitas acessórias com a exploração da Rodovia;

g) modificações estruturais nos preços relativos dos fatores de produção.

Alguns aditamentos com relação às condições iniciais do contrato de concessão já

foram realizados. Inicialmente, o Programa de Exploração Rodoviária do edital não

previa alguns investimentos que se tornaram necessários (e exigidos pelo poder

concedente) ao longo da concessão. Para restabelecer o reequilíbrio econômico

financeiro do contrato, foram alterados o cronograma de obras e realizados pequenos

ajustes nos valores de tarifa. O contrato especifica, também, os eventos de

terminação:

a) advento do termo contratual;

b) expropriação unilateral por parte do Poder Concedente, por motivos de interesse

público;

c) incapacidade da Concessionária em cumprir com as obrigações assumidas no

Contrato de Concessão;

d) incapacidade do Poder Concedente em cumprir com as obrigações assumidas no

Contrato de Concessão;

e) rescisão por mútuo acordo entre as partes;

f) insolvência / falência da Concessionária.

A administração da Nova Dutra é exercida por um Conselho de Administração,

composto por até onze membros, todos acionistas, eleitos pela Assembléia Geral, com

mandato de um ano, podendo ser reeleitos. As decisões do Conselho de

109 Lei Federal nº 8666, artigos 58 e 65.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 87

Administração são executadas pela Diretoria da empresa, composta por, no mínimo,

quatro membros, acionistas ou não, eleitos pelo Conselho, com mandato de um ano. A

Diretoria é formada pelo Diretor Presidente e pelos Diretores Administrador Financeiro,

de Operações e de Obras.

Os serviços de operação e manutenção da rodovia são terceirizados. A empresa

contratada é responsável pela operação e manutenção da Via Dutra, pela cobrança do

pedágio, pelo pagamento de impostos ao governo, pela realização de depósitos

semanais na conta geral de receitas e pela preparação dos diversos relatórios de

desempenho. A operadora recebe honorários mensais.

3.8 ARRANJOS FINANCEIROS

As fontes de recursos tradicionais no financiamento de projetos de infra-estrutura são:

a) financiamento governamental, através de subsídios, cessões, empréstimos ou

garantias;

b) fornecedores, principalmente empreiteiras e fornecedores de equipamentos;

c) agências bilaterais e multilaterais de crédito, através de subsídios e empréstimos;

d) instrumentos de crédito bancário;

e) colocações privadas de títulos junto a investidores institucionais.

No caso da Nova Dutra, os recursos necessários para a execução dos investimentos

foram oriundos de aportes dos acionistas, fornecedores de equipamentos, assistência

governamental (BNDES) e de um banco multilateral de desenvolvimento (IFC110). Os

empréstimos do IFC foram denominados em dólar norte-americano, enquanto o

restante da dívida foi denominado em real. Além dessas fontes de recursos, durante o

período de montagem do plano financeiro (1995-1997) foram utilizados empréstimos-

ponte (crédito bancário) até a finalização da montagem do financiamento (data do

primeiro desembolso do plano). Não foram emitidos títulos patrimoniais e títulos da

dívida para financiar o projeto. Os recursos foram tomados com base no fluxo de caixa

projetado da operação da concessão.

110 O projeto foi o primeiro Project Finance no Brasil financiado através de organismos multilaterais.

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PROJECT FINANCE 88

O valor total do plano financeiro foi de US$525,5 milhões, para cobrir os investimentos

necessários para recuperação e modernização da rodovia nos cinco primeiros anos111.

As empresas acionistas da Nova Dutra contribuíram com 20% de capital próprio112 e

outros 21% de recursos provenientes do caixa do projeto, totalizando 41% de recursos

de capital. Os outros 59% são recursos provenientes de terceiros, incluindo recursos

provenientes do BNDES (33%), do IFC (22%) e crédito dos fornecedores (5%). O

financiamento da dívida foi equivalente a 60% das necessidades totais de capital do

projeto. O plano financeiro do projeto está ilustrado na TAB. 12.

TABELA 12

Plano financeiro Nova Dutra

FONTES DE RECURSOS US$ MILHÕES %

CAPITAL

Recursos próprios sponsors 105.1 20

Andrade Gutierrez 26.3 25

Camargo Corrêa 26.3 25

Norberto Odebrecht 26.3 25

Serveng Civilsan 26.3 25

Geração de caixa do projeto 108.1 21

Total Capital 213.2 41

DÍVIDA

BNDES 171 33

IFC - Porção "A" 35 7

IFC - Porção "B" 79.5 15

Suppliers Credit 26.8 5

Total Dívida 312.3 59

Total Financiamento Projeto 525.5 100 FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez.

NOTA: Base março/1995; IFC - Porção “A”: 1º desembolso, após o

Financial Completion; IFC - Porção “B”: 2º desembolso.

111 O investimento total previsto ao longo do período de concessão é de US$802 milhões (base março/1995). Informações da apresentação do projeto de concessão da rodovia Presidente Dutra para o XV Congresso da Associação Brasileira de Analistas de Mercado de Capitais – ABAMEC, 1998. 112 Esse foi o capital próprio mínimo exigido no edital.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 89

Do total do financiamento do projeto, 77% foram para a recuperação geral da rodovia

(US$402,5). O restante, 23% (US$123 milhões), foi aplicado nos demais investimentos

para operação da rodovia, como a implantação dos serviços de atendimento aos

usuários; dos sistemas de monitoração da rodovia e dos equipamentos e sistemas de

arrecadação, pesagem, comunicação e controle de tráfego. A TAB. 13 apresenta

maiores detalhes sobre a origem e o uso dos recursos no projeto. Os recursos foram

aplicados na compra de equipamentos, financiamento ao capital de giro e obras civis.

TABELA 13

Origens e usos dos recursos da Nova Dutra

OBJETO VALOR DO BEM TIPO DE VALOR TOTAL TAXA DE PRAZO DE PRAZO DE

DO FINANCIADO AGENTE DO EMPRÉSTIMO JUROS CARÊNCIA AMORTIZAÇÃO

FINANCIAMENTO (R$ x 1,00) FINANCIADOR (R$ x 1,00) (%) (ANOS) (ANOS)

Equipamentos 42.735.791 Fornecedores 36.325.423 12% O 5

Bancos (Tranche 1) 15.480.000 16% 1 2

Bancos (Tranche 2) 9.030.000 16% 1 2

Obras Civis 101.770.441 BNDES e/ou IFC 81.416.353 11% 3 7

Obras Civis 76.770.238 BNDES e/ou IFC 49.900.655 11% 3 7

Obras Civis 52.741.696 BNDES e/ou IFC 8.400.000 11% 3 7

Obras Civis 91.965.571 BNDES e/ou IFC 47.585.000 11% 3 7

Obras Civis 91.965.571 BNDES e/ou IFC 47.355.000 11% 3 7

Capital de Giro e Obras Civis

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: base de preços maio/1995; tranche: parcela do empréstimo-ponte.

O custo de capital de terceiros foi de 11% para obras civis, de 16% para capital de giro

e de 12% para equipamentos113 (TAB.13) . O custo de capital próprio foi variável, já

que cada acionista possuía seu próprio custo, não havendo um custo médio do

consórcio. A dívida contraída é contabilizada no balanço da SPC e nos balanços

consolidados dos patrocinadores, mantidas as respectivas participações na SPC. Os

auditores independentes ressalvam, nos balanços consolidados, que a dívida se dá

através de instrumento de Project Finance, indicando também o seu direito regresso.

A montagem do financiamento foi de responsabilidade dos sponsors do projeto e o

modelo e as fontes de recursos foram apresentados ao poder concedente na entrega

da proposta para a concorrência. Os bancos Garantia e Lahman Brothers prestaram

consultoria (financial advisors) para montagem do financiamento, contribuindo nas

discussões legais e na estruturação dos arranjos contratuais.

113 Dados de proposta.

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PROJECT FINANCE 90

As negociações e a estruturação dos contratos foi longa. A montagem completa do

Project Finance levou quase dois anos. A TAB. 14 relaciona as principais etapas da

estruturação do plano de financiamento, com suas respectivas datas.

TABELA 14

Processo de montagem do plano de financiamento Nova Dutra

Etapas Data

Apresentação do projeto ao BNDES Nov-95

Visita técnica inicial do IFC Jan-96

Transferência do controle da rodovia Mar-96

Processo de “Due Dilligence” Mar-96

Aprovação em 1º nível – IFC Jun-96

Enquadramento BNDES Jun-96

Início da cobrança de pedágio Ago/96

1º Contrato com o BNDES( Garantias Corporativas ) Ago/96

1º Desembolso BNDES Set/96

Negociação do “term Sheet” Jul/96-Nov/96

“Road Shows” Nov-96

Negociação dos Contratos “Project Finance” Fev/97-Jun/97

Assinatura dos Contratos Ago/97

1º desembolso ( BNDES- IFC ) Set/97 FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: term Sheet: contrato de financiamento; Road Shows : apresentações a

potenciais investidores para captação de recursos.

Serviços de trustee114 foram contratados pela Nova Dutra para cobrir as exigibilidades

e fluxos operacionais do projeto, conforme ilustra o fluxo de recursos financeiros do

projeto representados na FIG. 7. A instituição encarregada da conta bancária da

empresa recebe os recursos provenientes de receitas e indenizações de seguros e

deposita em uma conta geral de receita. Depois, essa conta é distribuída em quatro

outras contas: desembolsos operacionais, desembolsos financeiros, reserva do

serviço da dívida e conta investimentos (nessa seqüência):

114 Serviços de administração da conta bancária de uma empresa, suportados pelo pacote de garantias do projeto.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 91

a) conta desembolsos operacionais: é destinada para pagar despesas administrativas

e operacionais da estrada, incluindo o pagamento de tributos. Receitas são

dedicadas para a manutenção e operação da rodovia;

b) conta desembolsos financeiros: paga o serviço da dívida junto ao IFC, BNDES e

fornecedores;

c) conta de reserva para pagamento do serviço da dívida: está disponível para o

pagamento da dívida de forma pontual, caso a conta geral de receitas não tenha

saldo suficiente para cobrir um pagamento de serviço da dívida programado

(eventuais perdas relacionadas com o índice de cobertura do serviço da dívida).

Essa conta é em dólares norte-americanos, e seu nível mínimo é US$2 milhões

por trimestre115. À medida que o fundo de reserva para serviço da dívida cai abaixo

desse mínimo, reais da conta geral devem ser convertidos para dólares e

remetidos para o fundo de reserva. A conta reserva é uma garantia de liquidez

para os credores de curto prazo e também um mecanismo de hedge cambial116;

d) conta investimentos: poderá incorporar novo aporte de capital e de novos

financiamentos. As sobras de caixa retornarão para a conta de receitas, para

utilização na cobertura de eventuais deficiências futuras.

CONTA DERECEITAS

•RECEITAS•INDENIZAÇÕES DE SEGUROS

CONTA DE DESEMBOLSOSOPERACIONAIS

•OPERAÇÃO / MANUTENÇÃO•TRIBUTOS•SEGUROS•DNER

CONTA DEDESEMBOLSOSFINANCEIROS

•IFC / BNDES•FORNECEDORES

CONTA RESERVADO SERVIÇO

DA DÍVIDA

• US$ 2 MILHÕES/TRIMESTRE

CONTA DEINVESTIMENTOS

•EXECUÇÃO DOSINVESTIMENTOS

•EMPRÉSTIMOS- PONTE

•CAPITAL •FINANCIAMENTOS

CONTA DERECEITAS

•RECEITAS•INDENIZAÇÕES DE SEGUROS

CONTA DE DESEMBOLSOSOPERACIONAIS

•OPERAÇÃO / MANUTENÇÃO•TRIBUTOS•SEGUROS•DNER / DNIT

CONTA DEDESEMBOLSOSFINANCEIROS

•IFC / BNDES•

CONTA RESERVADO SERVIÇO

DA DÍVIDA

CONTA DEINVESTIMENTOS

•EXECUÇÃO DOSINVESTIMENTOS

•EMPRÉSTIMOS- PONTE

•CAPITAL •FINANCIAMENTOS

CONTA DERECEITAS

•RECEITAS•INDENIZAÇÕES DE SEGUROS

CONTA DE DESEMBOLSOSOPERACIONAIS

•OPERAÇÃO / MANUTENÇÃO•TRIBUTOS•SEGUROS•DNER

CONTA DEDESEMBOLSOSFINANCEIROS

•IFC / BNDES•FORNECEDORES

CONTA RESERVADO SERVIÇO

DA DÍVIDA

• US$ 2 MILHÕES/TRIMESTRE

CONTA DEINVESTIMENTOS

•EXECUÇÃO DOSINVESTIMENTOS

•EMPRÉSTIMOS- PONTE

•CAPITAL •FINANCIAMENTOS

CONTA DERECEITAS

•RECEITAS•INDENIZAÇÕES DE SEGUROS

CONTA DE DESEMBOLSOSOPERACIONAIS

•OPERAÇÃO / MANUTENÇÃO•TRIBUTOS•SEGUROS•DNER / DNIT

CONTA DEDESEMBOLSOSFINANCEIROS

•IFC / BNDES•

CONTA RESERVADO SERVIÇO

DA DÍVIDA

CONTA DEINVESTIMENTOS

•EXECUÇÃO DOSINVESTIMENTOS

•EMPRÉSTIMOS- PONTE

•CAPITAL •FINANCIAMENTOS

FIGURA 7 - Fluxo de recursos da Nova Dutra

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões

115 Esse saldo foi definido pelos credores. 116 Operação que procura proteger o pagamento (em reais) de um compromisso em dólar do impacto da desvalorização futura.

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PROJECT FINANCE 92

A capacidade de endividamento do projeto foi medida pelo Índice de Cobertura do

Serviço da Dívida. Tal índice deve ser maior que 1,3 no período de pagamento do

serviço da dívida.

Os credores exigiram demonstrações contábeis e financeiras dos sponsors, capazes

de demonstrar a capacidade do projeto em cumprir com os aportes e obrigações

necessárias ao plano de investimento. O nível de transparência exigido pelos credores

em relação ao projeto é alto. Os bancos exigem relatórios de acompanhamento de

tráfego de veículos, resultados operacionais e financeiros e acompanhamento do

cronograma de investimentos. Os principais indicadores econômicos analisados são o

índice de cobertura do serviço da dívida, o índice de liquidez corrente117 e o índice

exigível a longo prazo-patrimônio líquido118. O DNIT recebe também relatórios

operacionais periódicos.

Os benefícios sociais e a contribuição para o desenvolvimento econômico da região e

do país foram avaliados, já que o projeto contou com recursos do governo, através do

BNDES, e de um banco multilateral de desenvolvimento, o IFC. Ambos possuem a

missão de financiar empreendimentos que gerem benefícios para a sociedade. A

transferência da operação e da administração da rodovia à Nova Dutra criou novos

empregos e grande parte da mão-de-obra foi contratada em cidades que margeiam a

estrada. Essa orientação também tem sido dada à contratação de fornecedores. Hoje,

os trabalhos da empresa mantêm mais de 3 mil empregos, gerados pela própria Nova

Dutra e pelas construtoras contratadas. O projeto contribui também para a geração de

receita tributária adicional.

A estrutura de amortização da dívida levou em conta a variabilidade do fluxo de receita

proveniente do pedágio. A dívida do BNDES foi parcelada em quatro empréstimos

com diferentes prazos de carência: 18, 36, 60 e 84 meses. A TAB. 15 resume as

principais características de amortização da dívida do financiamento e a TAB. 16 o seu

custo.

117 Mede a capacidade do projeto para satisfazer suas obrigações de curto prazo. 118 Indica a relação entre os recursos de longo prazo fornecidos por credores e os recursos fornecidos pelos sponsors. É usado para medir o grau de alavancagem financeira do projeto.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 93

TABELA 15

Cronograma de amortização dos títulos da Nova Dutra

MODALIDADEVALOR

(US$ MILHÕES)PRAZO TOTAL

(ANOS)PRAZO CARÊNCIA

(ANOS)PRAZO AMORT.

(ANOS)

BNDES – A 47,75 10 1,5 8,5

BNDES – B 68,57 10 3 7

BNDES – C 31,98 10 5 5

BNDES – D 22,82 10 7 3

IFC – A LOAN 35,00 13 4 9

IFC – B LOAN 79,50 9 4 5

SUPPLIERS’ 26,88 9 2 7

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez Concessões.

TABELA 16

Custo da dívida

MODALIDADE JUROSSPREAD

(BP's)COMISSÕES

FLATCOMISSÕES

COMPROMISSO

BNDES - Todos TJLP 550 - 1,2% a. a.

IFC – ‘A’ Loan Libor 375 1,0% 0,5% a. a.

IFC – ‘B’ Loan Libor 350 2,0% 0,5% a. a.

Suppliers’ Credit Libor 100 0,75% 0,5% a. a.

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: TJLP: Taxa de juros de longo prazo119; LIBOR: London Interbank Offer Rate.

O projeto gera receitas acessórias, como as advindas da exploração de áreas de

serviço ao longo da estrada e multas por excesso de peso dos veículos. No entanto, a

maior parte da receita do projeto é proveniente do volume de tráfego da rodovia. A

grande participação de veículos pesados no volume de tráfego da via Dutra faz com

que a receita seja impactada pelo nível de atividade econômica brasileira, havendo

uma relação direta com o PIB, o crescimento da população e os preços dos

combustíveis. Os veículos pesados participam com 80% da receita total da rodovia. A

119 Custo básico dos financiamentos concedidos pelo BNDES. O valor da TJLP é fixado periodicamente pelo Banco Central do Brasil.

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PROJECT FINANCE 94

receita prevista para o prazo total da concessão (25 anos) é de aproximadamente

US$6 bilhões (TAB. 17). Em valores presentes, esse montante equivale a R$10

bilhões.

TABELA 17

Projeção de receita

ANOPREVISÃO RECEITA

US$ MILHÕES

1 80

2 170

10 229

25 308

TOTAL ACUMULADO

6.000

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade

Gutierrez Concessões.

NOTA: a) base março/1995; b) para a demonstração completa da

receita de pedágio ver TAB. 30, ANEXO E.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 95

O NPV do projeto é R$214 milhões120, o payback121 é de oito anos e a IRR é de

27%122. As projeções financeiras e os estudos de tráfego elaborados para as

propostas tomaram como base o ano projeto como o período de 12 meses a contar da

data do início da operação do projeto (março/1996). O GRAF. 4 é o fluxo de caixa

projetado do projeto. A TAB. 18 e 19 apresentam as projeções dos resultados contábil

e financeiro, respectivamente.

(40,000,000)

(20,000,000)

0

20,000,000

40,000,000

60,000,000

80,000,000

100,000,000

120,000,000

140,000,000

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25

Ano

Cap

ital (

R$)

Fluxo de Caixa Incremental Líquido

GRÁFICO 4 - Fluxo de caixa projetado do projeto da Nova Dutra

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade Gutierrez Concessões.

120 Taxa de desconto (r): 12% a.a. 121 Tempo que o negócio leva para retornar o investimento inicial feito. 122 Fonte: CCR.

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PROJECT FINANCE 96

TABELA 18

Projeção do demonstrativo do resultado contábil Nova Dutra

ESPECIFICAÇÃO

1. RECEITA BRUTA (1.1 + 1.2 + 1.3 ) 5.727.405.052

1.1 - Receitas de Pedágio (Quadro 4) 5.707.335.494 1.2 - Outras Rec. Operac. (Quadro 5) 0 1.3 - Receitas Financeiras (Quadro 6) 20.069.558

2. RECEITA LÍQUIDA ( 1 - 2.1 ) 5.276.525.548

2.1 - Tributos 450.879.504

2.507.204.397

3.1 - Custos Operacionais (Quadro 11) 1.839.856.150 3.2 - Seguros 34.704.667 3.3 - Juros s/ Empréstimos - Obras Civis 166.323.255 3.4 - Juros s/ Empréstimos - Equipamentos 11.647.852 3.5 - Depreciação - Invest. - O.Civis e Equip. 716.789.228 4. IMPOSTO SOBRE LUCRO (4.1+4.2+4.3) 1.033.452.582

4.1 - Imposto de Renda 574.443.733

4.2 - Adicional de Imposto de Renda 229.281.902

4.3 - Contribuição Social 229.726.948

5. LUCRO LÍQUIDO APÓS I.R. (3 - 4) 1.473.751.814

3. LUCRO LÍQUIDO ANTES DO I.R. [2 - (3.1 + 3.2 + 3.3 + 3.4 3.5)]

TOTAIS 25 ANOS

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade

Gutierrez Concessões.

NOTA: a) base de preços maio/1995; b) para demonstrativo

anual ver TAB. 31, ANEXO F.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 97

TABELA 19

Projeção do demonstrativo do resultado financeiro Nova Dutra

ESPECIFICAÇÃO

1. FONTES ( 1.1 + 1.2 ) 2.486.033.472

2.190.541.042

1.1.1 - Lucro Líquido Após I.R. 1.473.751.814

1.1.2 - Depreciação 716.789.228

1.2 - EMPRÉSTIMOS ( Liberações) 295.492.430

2. USOS ( 2.1 + 2.2 ) 1.012.281.658

716.789.228

2.2 - AMORTIZAÇÕES DE EMPRÉSTIMOS 295.492.430

3. CAPITAL ( 1 - 2 ) 1.473.751.814

4. TAXA INTERNA DE RETORNO 26,89%

1.1 - GERAÇÃO OPERACIONAL DE CAIXA (1.1.1 + 1.1.2)

2.1 INVESTIMENTOS (Obras Civis e Equipamentos)

TOTAIS 25 ANOS

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade

Gutierrez Concessões.

NOTA: a) base de preços maio/1995; b) para demonstrativo

anual ver TAB. 32, ANEXO G.

O reajuste da tarifa do pedágio é feito todos os anos por uma fórmula paramétrica,

baseada em quatro índices de custo de construção divulgados pela Fundação Getúlio

Vargas (FGV). Até o quinto ano do contrato — período em que ocorreu a conclusão e

recebimento definitivo das obras de recuperação da rodovia, excetuadas as obras de

artes especiais — os índices setoriais para o reajuste da tarifa foram:

a) 14% da variação do índice de Terraplanagem;

b) 34% da variação do índice de Pavimentação;

c) 32% da variação do índice de Obras de Artes Especiais;

d) 20% da variação do índice de Serviços de Consultoria.

(IRR)

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PROJECT FINANCE 98

A partir do quinto ano do contrato, a ponderação dos parâmetros da fórmula de

reajuste foi alterada. Essa modificação reflete o término do programa principal de

investimentos na rodovia previsto no edital (recuperação geral da rodovia), que são os

investimentos mais significativos da concessão. A partir de então, as obras passam a

ser de melhorias e de expansão da rodovia e as seguintes proporções passaram a

vigorar:

a) 20% da variação do índice de Terraplanagem;

b) 16% da variação do índice de Pavimentação;

c) 13% da variação do índice de Obras de Artes Especiais;

d) 51% da variação do índice de Serviços de Consultoria.

O valor da tarifa básica, em base de preços de 1995, é R$2,39 (US$2,46). Existem

dez categorias de veículos, baseadas no número de eixos, e cada uma possui um

multiplicador123. A TAB. 20 mostra o valor da tarifa de pedágio segundo a categoria do

veículo.

TABELA 20

Valor da tarifa de pedágio segundo categoria do veículo

1 1 2,39

2 2 4,78

3 3 7,17

4 3 7,17

5 4 9,56

6 4 9,56

7 5 11,95

8 6 14,34

9 0,5 1,20

10 ISENTO -

CATEGORIA DE VEÍCULO

MULTIPLICADOR DA TARIFA

VALOR EM R$ x 1,00

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: base de preços maio/1995; tarifa básica:

categoria 1 (veículos de dois eixos. Exemplo:

motocicletas e automóveis).

123 Fator multiplicativo, aplicado à tarifa básica de pedágio, para se obter a tarifa para os veículos de diferentes categorias.

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RODOVIA PRESIDENTE DUTRA 99

Os custos operacionais totalizam R$3 bilhões ou US$3,4 bilhões, incluindo impostos

sobre faturamento e renda. Os impostos são pagos pela concessionária de acordo

com a legislação vigente. O projeto não obteve benefícios fiscais do estado ou União.

Os maiores componentes do custo operacional são os custos relacionados à operação

da rodovia (75%), sendo o mais alto deles o sistema de atendimento aos usuários

(49%). A TAB. 21 apresenta a descrição dos custos operacionais do projeto.

TABELA 21

Descrição dos custos operacionais da Nova Dutra

CUSTOS OPERACIONAIS % DO TOTAL

Manutenção da rodovia 19.0

Monitoração da rodovia 1.5

Operação da rodovia 75.0

Administração 21.0

Sistema de Atendimento ao Usuário 49.0

Fiscalização da Concessão 5.0

Conservação da rodovia 4.5

Total 100 FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Andrade

Gutierrez Concessões.

NOTA: base: março/1995.

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PROJECT FINANCE 100

4 O PROJETO DA AERONAVE REGIONAL ERJ-145

4.1 A INDÚSTRIA AERONÁUTICA REGIONAL NORTE-AMERICANA124

Os principais mercados da indústria aeronáutica regional125 são o norte-americano e o

europeu. Estes são responsáveis por cerca de 80% da oferta mundial de assentos por

km (índice ASK - Aircraft Seat Kilometers) de aeronaves regionais (GRAF. 5).

América do Norte55%

Europa26%

África e Oriente Médio3%

América Latina e Caribe

6%

Ásia / Pacífico8%

China2%

GRÁFICO 5 - Capacidade ASK no mercado da aviação regional

NOTA: a) base 2002; b) aeronaves com capacidade para até 120

assentos; c) frotas em serviço de jatos e turboélices; d) capacidade

total ASK: 8.664.

FONTE: Embraer.

A aviação regional norte-americana consolidou seu importante papel no sistema de

transporte aéreo nacional no final da década de 70, quando ocorreu a

desregulamentação do setor. Desde então, ela vem apresentando um crescimento

expressivo em número de passageiros (aproximadamente 10% ao ano).

124 A análise da indústria é restrita ao mercado norte-americano em função da importância deste na indústria mundial e pelo fato dele ser o maior comprador do ERJ-145 (68% dos pedidos de compra dessa aeronave foram de companhias aéreas norte-americanas). No entanto, devido a sua representatividade, não constitui um erro extrapolar essa análise para toda a indústria mundial, considerando as devidas proporções de cada mercado.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 101

A história de sucesso da aviação regional apresenta três fases bem distintas126. A

primeira, a dos turboélices, veio logo após a desregulamentação, na primeira metade

da década de 80. Mais de 200 companhias aéreas prestavam serviços de curto

alcance (aproximadamente 140 milhas), com turboélices de pequena capacidade (15

assentos em média), para pequenas e médias cidades.

A segunda fase, a de consolidação dos hubs127, começou em meados de 1980, sendo

estendida até a primeira metade da década de 90. As companhias aéreas regionais

estabeleceram-se e consolidaram suas posições, fornecendo conexões para as

companhias major128. Em 1995, o número de companhias em operação caiu pela

metade em relação à década de 80 (cerca d e 124 empresas). O tamanho médio das

aeronaves aumentou para 25 assentos com a chegada dos novos turboélices, com

capacidade de 30-50 assentos, e as companhias aéreas passaram a voar em rotas de

maior alcance (cerca de 223 milhas em média).

Atualmente, a aviação está na fase dos jatos regionais. A partir da segunda metade da

década de 90, os turboélices passaram a ser substituídos por jatos de alta

produtividade, revolucionando a indústria. O mercado de áreas restritas foi expandido

e, com isso, geraram-se novas rotas, a capacidade dos aviões foi adaptada à

demanda, fortaleceram-se os hubs, reduziu-se o tempo de viagem, a freqüência dos

vôos foi aumentada e ampliaram-se as redes. As características de operação também

foram alteradas. Em 2000, o alcance das rotas cresceu, atingindo 300 milhas, o

tamanho médio das aeronaves aumentou para 32 assentos e a consolidação das

companhias continua em curso. Hoje o setor conta com 94 companhias aéreas para

servir um mercado em constante crescimento. A FIG. 8 e 9 ilustra o a presença da

aviação regional nos EUA. Em apenas cinco anos, as aeronaves regionais passaram a

servir todos estados norte-americanos e suas principais localidades.

125 Jatos com capacidade para menos de 100 assentos. 126 Departamento de análise de mercado da Embraer. 127 Aeroportos que concentram as operações de aviação de uma determinada região geográfica. 128 Companhias que operam com grande volume de passageiros, em rotas internacionais, geralmente através de jatos com capacidade para mais de 120 assentos.

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PROJECT FINANCE 102

FIGURA 8 - Presença de jatos regionais nos EUA em janeiro/1995

FONTE: Embraer

FIGURA 9 - Presença de jatos regionais nos EUA em janeiro/2002

FONTE: Embraer

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 103

O GRAF. 6 compara o crescimento da receita-passageiro-milha (Revenue Passenger

Mile - RPM129) das companhias aéreas regionais norte-americanas com o número de

jatos regionais em serviço. Em 1997, menos de 200 jatos regionais estavam em

operação, comparados com cerca de 600 em 2000. A taxa de crescimento RPM foi de

20% no ano 2000.

0%

5%

10%

15%

20%

25%

1997 1998 1999 2000

RP

M G

row

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ate

0

100

200

300

400

500

600

Nu

mb

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Ser

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RPM Growth Rate Jets in serviceTaxa de crescimento RPM Jatos em serviço

Taxa

de

cres

cim

ento

RP

M

Núm

ero

de ja

tos

em s

ervi

ço

GRÁFICO 6 - Crescimento RPM EUA x jatos regionais em serviço

FONTE: Embraer.

Se a taxa de crescimento RPM das aeronaves regionais for analisada ao longo das

duas últimas décadas, será constatado que ela sempre se manteve acima da taxa de

crescimento RPM dos aviões major, conforme ilustra o GRAF. 7.

129 Ao contrário do índice ASK, que mede a oferta, o índice RPM representa a demanda. Este índice não considera a capacidade ociosa das aeronaves.

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PROJECT FINANCE 104

Major

Regional

-5%

0 %

5 %

1 0 %

1 5 %

2 0 %

2 5 %

3 0 %

3 5 %

4 0 %

1981 82 83 84 1985 86 87 88 89 1990 91 92 93 94 1995 96 97 98 99 2000

Cre

sc

ime

nto

RP

M

GRÁFICO 7 - Evolução do mercado EUA de aviação comercial

FONTE: Regional Airline Association - RAA e Air Transport Association - ATA. Dados

obtidos na pesquisa de campo na Embraer.

Durante as recessões econômicas ocorridas ao longo da história, as companhias

regionais foram menos afetadas em função da operação de jatos de menor

capacidade. O GRAF. 8 mostra o impacto do atentado terrorista de 11 de setembro de

2001 nos EUA na taxa de crescimento RPM das companhias aéreas norte-

americanas. As companhias major, que operam jatos com maior capacidade, foram

mais afetadas que as companhias regionais, bem como vêm se recuperando mais

lentamente do ambiente recessivo estabelecido no setor de aviação após os

atentados.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 105

Major

Regional

-40%

-30%

-20%

-10%

0%

1 0 %

2 0 %

Jan-01 Feb Mar Apr May Jun-01 Jul Aug Sep Oct Nov Dec/2001

Cre

sc

ime

nto

RP

M

GRÁFICO 8 - Evolução do mercado EUA de aviação comercial - 2001

FONTE: RAA e ATA. Dados obtidos na pesquisa de campo na Embraer.

O crescimento anual médio durante a década de 90 foi de 13%. Tudo indica que a

demanda por aeronaves regionais continuará satisfatória no futuro. O departamento de

análise de mercado da Embraer projeta uma taxa de crescimento RPM de 9% ao ano

até 2010 (GRAF. 9).

0

1 0

2 0

3 0

4 0

5 0

6 0

7 0

19901992

19941996

19982000

20022004

20062008

2010

Re

ve

nu

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Mil

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Average Annual Growth1990-2000: 13%

Forecast2001-2010: 9%

0

1 0

2 0

3 0

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19901992

19941996

19982000

20022004

20062008

2010

Re

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s)

Average Annual Growth1990-2000: 13%

Forecast2001-2010: 9%

GRÁFICO 9 - RPM das companhias aéreas norte-americanas

FONTE: Embraer.

Crescimento médio anual

1990-2000: 13%

Projeção

2001-2010: 9%

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PROJECT FINANCE 106

Desde 1980, o número de companhias aéreas regionais vem decrescendo

significativamente (de 214 para 94). Inicialmente essas empresas estabeleceram

alianças com as operadoras majors, mas depois passaram a ser compradas por elas,

produzindo um pequeno número de megaoperadoras regionais. As cinco maiores

companhias regionais dos Estados Unidos foram responsáveis por aproximadamente

60% dos passageiros transportados em 2000 por esse segmento, em comparação

com apenas 46% 10 anos atrás.

Os jatos modificaram o papel tradicional das companhias regionais através da

ampliação da sua área de atuação. Novas e longas rotas foram criadas, oferecendo

alternativas aos hubs congestionados. A preferência dos passageiros pelos jatos

regionais e a flexibilidade operacional (habilidade para explorar mercados de curta,

média e longa distâncias) dessas aeronaves estão levando as principais empresas

aéreas norte-americanas a se estruturar para operar frotas formadas inteiramente por

jatos130. Segundo dados fornecidos pela Embraer, em 1999 e 2000, 91% do total de

pedidos de compra de aviões regionais, em todo o mundo, foram de jatos regionais.

Nos próximos 10 anos, a demanda por jatos continuará alta e os turboélices serão

responsáveis por somente 5% do total das entregas, estimadas em 2.475 aviões

(GRAF. 10).

130 Os turboélices remanescentes tendem a se concentrar em nichos de mercados secundários, operando serviços de curta distância.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 107

30-60 Jet55%61-90 Jet

11%

91-120 Jet29%

Turboprop5%

Turboélices

30-60 Jet55%61-90 Jet

11%

91-120 Jet29%

Turboprop5%

Turboélices

GRÁFICO 10 - Entregas de aeronaves 2001-2010 no mercado EUA

NOTA: Segmentação dos jatos por capacidade de assentos.

FONTE: Embraer

A existência de scope clauses é o aspecto mais controverso, que definirá o futuro das

companhias aéreas regionais norte-americanas. As scope clauses são restrições

impostas por sindicatos de pilotos para a operação de frota de jatos entre 70 e 110

assentos. As restrições dos sindicatos reduzem o potencial de vendas dessas

aeronaves no curto prazo. Contudo, as companhias vêm buscando estabelecer

acordos para flexibilizar essas limitações no médio e longo prazo.

Nº de Assentos

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PROJECT FINANCE 108

4.2 O PROJETO131

O ERJ-145 é um projeto de desenvolvimento, fabricação, comercialização e pós-venda

de um avião da Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Embraer. Fundada pelo

governo brasileiro em 1969, a Embraer é a quarta maior fabricante de aeronaves

comerciais do mundo, detém a liderança mundial na fabricação de jatos regionais e é

a maior exportadora brasileira. Atualmente, a empresa desenvolve mais de 17 projetos

simultaneamente132 e emprega mais de 11.000 funcionários, contribuindo para a

geração de mais de 3.000 empregos indiretos.

O ERJ-145 é um jato pressurizado para transporte regional, com capacidade para

cinqüenta lugares, e tem como principais características o alto desempenho e os

baixos custos de aquisição e operação. Os concorrentes diretos do ERJ-145 são o jato

canadense CRJ-200133 e o turboélice sueco SAAB-2000134. O ERJ-145 tem valor

básico de referência da ordem de US$14,8 milhões, 20% mais barato que o seu

concorrente direto, CRJ-200, que custa US$18,6 milhões135.

O avião é composto de 19.518 peças e componentes, e seu desenvolvimento

completo absorveu dois milhões de horas de trabalho em aproximadamente quatro

anos136. O projeto empregou um contingente de 2.300 pessoas (incluindo os

funcionários dos parceiros), das quais 350 estiveram diretamente envolvidas na

Embraer (Bernardes, 2000). Seu plano de negócios (Business Plan) foi elaborado para

um período de 10 anos de produção. O jato foi concebido para uma vida econômica de

60.000 ciclos de vôo ou 60.000 horas de vôo (o que ocorrer primeiro), o que

131 Para informações técnicas do projeto, ver Jane´s “All the World´s Aircraft” (1999). 132 Antes do lançamento do ERJ-145, a Embraer desenvolvia somente seis projetos simultaneamente. 133 Projeto da Canadair Regional Jet, do grupo Bombardier. A fabricante canadense é a 3ª maior do mundo, depois da Boeing e da Airbus. 134 A concorrência com o SAAB diminuiu muito devido à preferência das companhias aéreas pelos jatos. Hoje o principal concorrente do ERJ-145 é o avião canadense. 135 Cabe já antecipar que um dos critérios de compra são as condições de financiamento. Essa diferença pode aumentar ainda mais com a utilização do PROEX para financiar as importações das companhias aéreas estrangeiras a taxas de juros mais baixas. Wheatley. Embraer: The Sky´s the Limit. Business Week . 136 Após a fase de definições iniciais (anteprojeto).

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 109

corresponde aproximadamente a 24 anos de operação137. Desde sua entrada em

operação, já foram entregues quase 400 unidades a empresas aéreas de todo o

mundo.

Disponível nas versões alcance estendido (Extended Range - ER), longo alcance

(Long Range - LR) e, em breve, extra-longo alcance (Extra Long Range - XR), o

projeto ganhou a dimensão de família de aviões e, a partir de sua plataforma, novas

aeronaves foram desenvolvidas com base no conceito de comunalidade, permitindo a

redução de custos de desenvolvimento138. Para a aviação regional, foram derivados os

jatos ERJ-135 e o ERJ-140139, para 37 e 44 assentos respectivamente140. O projeto

também derivou novos produtos na aviação corporativa e militar. Para o mercado

corporativo e de transporte governamental, o ERJ-135 deu origem ao projeto do jato

Legacy, disponível em duas versões, a Executive e a Corporate Shuttle. A Executive

possui acomodações para 10 a 15 passageiros e a Shuttle para até 19 passageiros.

Na aviação militar, três jatos resultaram da plataforma do ERJ-145: o EMB 145

AEW&C (Airborne Early Warning and Control), aeronave de alerta aéreo antecipado, o

EMB 145 RS (Remote Sensing), aeronave para missões de vigilância territorial e

proteção ambiental e o EMB 145 MP/ASW, aeronave de patrulhamento marítimo e de

guerra anti-submarino141.

A FIG. 10 relaciona as aeronaves da família ERJ-145 com o ciclo de vida do projeto.

Cinco fases constituem o projeto de desenvolvimento de uma aeronave da Embraer:

a) fase 1, definições iniciais: os requisitos de alto nível são identificados e é definida a

configuração básica do produto;

b) fase 2, definição conjunta: refinamento e validação da configuração inicialmente

escolhida, detalhando-se o projeto, montagem e interfaces;

137 Uma companhia aérea regional típica realiza cerca de 2.500 ciclos de vôo ao ano com uma aeronave. 138 A comunalidade de uma frota também é bastante desejada pelos clientes, já que possibilita redução de custos com peças de reposição, manutenção, treinamento de técnicos, pilotos e tripulantes. 139 O ERJ-135 possui um grau de comunalidade em relação ao ERJ-145 da ordem de 90%. O ERJ-140 possui 98% de comunalidade com o ERJ-135 e o ERJ-145. 140 Para fotos da família regional, ver FIG. 12, ANEXO H. 141 A Força Aérea Brasileira - FAB encomendou ao Sistema de Vigilância da Amazônia - SIVAM, cinco unidades do EMB 145 AEW&C e três do EMB 145 RS. A força aérea grega e o governo mexicano também encomendaram essas aeronaves.

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PROJECT FINANCE 110

c) fase 3, detalhamento do projeto: desenvolvimento dos modelos geométricos,

roteiros, ferramental, manuais e catálogos. Nessa fase também ocorrem a

construção de protótipos, a campanha de ensaios e a certificação da aeronave;

d) fase 4, produção seriada: o ERJ-145 encontra-se nesta fase, etapa em que as

aeronaves estão sendo fabricadas, vendidas e entregues. Nessa fase a Embraer

dá suporte aos clientes e eventualmente efetua mudanças de projeto;

e) fase 5, phase-out: o projeto termina quando a empresa deixa de fabricar a

aeronave, mas continua fabricando peças de reposição e dando suporte à frota em

operação.

CICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE UMA AERONAVE

1 2 3 4 5

DEFINIÇÕESINICIAIS

DEFINIÇÃOCONJUNTA

PROJETODETALHADO

E CERTIFICAÇÃO

PRODUÇÃOSERIADA

PHASE-OUT

ERJ-145 XR

ERJ-140

ERJ-145LR e EREMB-145 AEW&C

AGS e MP/ASW

ERJ-135

LEGACY

CICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE UMA AERONAVECICLO DE VIDA DE UM PROJETO DE UMA AERONAVE

1 2 3 4 5

DEFINIÇÕESINICIAIS

DEFINIÇÃOCONJUNTA

PROJETODETALHADO

E CERTIFICAÇÃO

PRODUÇÃOSERIADA

PHASE-OUT

ERJ-145 XRERJ-145 XR

ERJ-140ERJ-140

ERJ-145LR e ERERJ-145LR e EREMB-145 AEW&C

AGS e MP/ASWEMB-145 AEW&CAGS e MP/ASW

ERJ-135ERJ-135

LEGACYLEGACY

FIGURA 10 - Família de aeronaves derivadas do ERJ-145 x ciclo de vida

FONTE: Embraer. Base abril/2002.

Se considerarmos todo o ciclo de vida do projeto, este terá a duração de quase 40

anos (quatro anos de desenvolvimento142, 10 anos de fabricação e 24 anos de suporte

à frota de jatos em operação). Considerando -se somente o período de geração de

receita, ou seja, sem contar sua fase de desenvolvimento, o projeto terá um ciclo de

vida de aproximadamente 34 anos, já que mesmo na fase de phase-out, quando é

encerrada a construção das aeronaves, o projeto continuará gerando receitas de

suporte aos clientes.

142 Sem considerar as interrupções de projeto.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 111

4.3 HISTÓRICO143

No final da década de 80, a Embraer iniciou estudos visando produzir uma aeronave

que apresentasse custo de operação similar ao dos turboélices, porém com uma

performance superior. A empresa usou como ponto de partida a plataforma básica do

turboélice EMB-120 Brasília144, avião de trinta lugares, que teria sua fuselagem

alongada para quarenta passageiros. Assim, o ERJ-145 foi concebido e anunciado

oficialmente em meados de 1989, durante o Salão Aeronáutico de Le Burget (França).

Nesse momento a configuração do avião já era de cinqüenta assentos.

A estratégia-chave do desenvolvimento foi a comunalidade145. Buscou-se empregar ao

máximo os componentes utilizados pelo Brasília, objetivando-se, assim, reduzir os

custos de desenvolvimento da aeronave. Sua fuselagem resultou do Brasília, e várias

peças do turboélice, já em produção, foram utilizadas, assim como ferramentais e

gabaritos de montagem. A estratégia de comunalidade, juntamente com o know-how

tecnológico acumulado de outro turboélice, o CBA 123146, permitiu uma redução de

custos de desenvolvimento da ordem de 40%. (Bernardes, 2000).

Em 1990, o projeto foi interrompido, dado o agravamento da crise financeira da

empresa. Então, somente em julho de 1992 as fases de testes e modificações do

projeto foram completadas. As parcerias formadas com grandes fornecedores da

indústria aeronáutica em 1992 e 1993 deram um novo impulso ao projeto. Em

dezembro de 1994, a Embraer foi privatizada. O grupo Bozano Simonsen e os fundos

Sistel e Previ adquiriram 60% da empresa, em parte iguais. Alguns anos depois147, um

consórcio francês formado pelas empresas Dassault Aviation, Thales, EADS e

Snecma, adquiriram outros 20%. O governo brasileiro ainda detém 1,45% das ações,

e o restante é pulverizado em bolsas (GRAF. 11).

143 Para informações complementares desse projeto, ver Bernardes (2000: 19). 144 Líder de vendas na sua categoria com mais de quatrocentas unidades vendidas. 145 A indústria automobilística japonesa foi precursora dessa estratégia. 146 Aeronave para o mercado de transporte regional desenvolvida em conjunto com a Argentina. 147 1999.

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PROJECT FINANCE 112

Grupo Bozano, Simonsen

19%

Fundo Sistel20%

Fundo Previ20%

Consórcio Francês

20%

Governo Brasileiro2%

Outros19%

GRÁFICO 11 - Acionistas controladores da Embraer

FONTE: Embraer. Base junho/2001

A empresa vinha acumulando prejuízos, e sua sobrevivência passou a estar

diretamente ligada ao sucesso do ERJ-145. Em 1995, sob o controle da nova

administração, o projeto é retomado e priorizado, acelerando-se seu desenvolvimento.

A primeira grande venda de ERJ-145 foi para a empresa norte-americana Continental

Express, em 1996, durante a feira de Farnborough, na Inglaterra, quando foram

vendidos duzentos ERJ-145, sendo vinte e cinco pedidos firmes. Nesse mesmo ano, a

Embraer e a Bombardier começaram a travar uma intensa disputa comercial na OMC.

A fabricante concorrente, através do governo canadense, abriu processo na OMC para

questionar a legalidade dos subsídios fornecidos pelo governo brasileiro às

exportações da Embraer. A Canadair Bombardier apresentou queixa a respeito da

modalidade de equalização de taxas de juros dos financiamentos concedidos pelo

PROEX. As operações de venda com suporte do PROEX foram consideradas

ilegais148, e a OMC determinou que o Brasil modificasse o programa para acabar com

os subsídios, autorizando o Canadá a impor retaliações no valor de US$224 milhões

ao ano.

148 Segundo relatório de uma consultoria americana (Dwyer, 1998), para uma compra típica de um ERJ-145 no valor de US$15,3 milhões, o programa brasileiro de financiamento à exportação resultaria em pagamentos de subsídios na ordem de US$2,5 milhões (NPV).

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 113

A homologação, pelo FAA - Federal Aviation Administration, para a operação do ERJ-

145, deu-se em 16 de dezembro de 1996149, certificando-o para operar na América do

Norte. Em seguida, ele foi certificado pelo JAA - Joint Aviation Authorities para operar

no continente europeu. Com o lançamento e a primeira entrega da aeronave regional

em 1996150, a Embraer passou a disputar o mercado de jatos regionais, recuperando

prestígio, credibilidade e estabilidade financeira.

Em 1997, no Salão Aeronáutico de Le Burget, a Embraer conquistou o maior contrato

da sua história, quando venceu a aeronave CRJ-200 na concorrência para

fornecimento de 67 jatos para a companhia aérea regional norte-americana American

Eagle, subsidiária da American Airlines. O contrato também previa o fornecimento de

peças de reposição e serviços de assistência técnica, resultando em um negócio da

ordem de US$3,3 bilhões para um plano de produção de sete anos. O preço

competitivo e a operação de financiamento com o apoio do BNDES151 foram decisivos

para que o ERJ-145 conquistasse esse contrato, garantindo assim a sobrevivência da

empresa.

Nesse ano, foi a vez de o Itamaraty questionar o programa canadense de apoio ao

financiamento de aeronaves da Bombardier152. O Brasil acusou o governo do Canadá

de ser sócio em uma empresa criada especialmente para conceder financiamentos

para a própria Bombardier. No início de 2002, a OMC anunciou uma decisão favorável

à fabricante brasileira de jatos, onde conclui que o Cana dá desrespeitara as regras

internacionais de comércio em pelo menos cinco operações de venda153 da

Bombardier. De acordo com as contas do governo do Brasil, o prejuízo da Embraer

chegara a US$4 bilhões, o que lhe daria o direito de pedir retaliações nesse valor.

Seis anos depois do início das acusações entre os dois países, a disputa na OMC

continua sem solução. Vitórias e derrotas foram anunciadas, a disputa comercial não

foi resolvida e nem se extinguiu a desconfiança dos dois países de que existem

privilégios que tornam desleal a competição entre a Embraer e a Bombardier pelo

149 O CRJ-200 entrou em operação em 1993 e o Saab 2000 em 1994. 150 1a entrega do ERJ-135 em 1999 e 1a entrega do ERJ-140 em 2001. 151 PROEX Equalização: crédito ao importador (buyer credit) da mercadoria. Até então, esse foi o maior financiamento dessa modalidade já aprovado em toda a história do BNDES. 152 Canada Account e EDC. 153 Três vendas para Comair (EUA), uma para a Air Wisconsin (EUA) e uma para Air Nostrum (Espanha).

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PROJECT FINANCE 114

mercado de aviação regional154. As retaliações passíveis de serem impostas não

compensariam as duas empresas pelas perdas e ainda prejudicariam outros

exportadores canadenses e brasileiros.

4.4 ARQUITETURA FINANCEIRA: AS PARCERIAS DE RISCO (RISK-SHARING)

Quanto aos aspectos tecnológicos, o projeto não apresentava maiores problemas.

Tudo indicava que a Embraer estava preparada para empreendê-lo e fabricá-lo em

suas instalações de acordo com a capacidade planejada. Porém, a situação

econômico-financeira da empresa durante a primeira metade da década de 90 tornou-

se o principal obstáculo para o seu desenvolvimento. A Embraer encontrava-se

endividada e desorganizada internamente. Sua estrutura de capital estava muito

alavancada e não havia recursos próprios suficientes para viabilizar o projeto, cujo

custo estimado era de US$300 milhões. O fato de a empresa ser estatal também

impedia naquele momento a obtenção de crédito junto ao BNDES. A solução criativa

para a situação foi a formação de um modelo de desenvolvimento através de parcerias

de risco155. Através dele, a Embraer assumiu a liderança e integração do projeto e

prospectou, na indústria aeronáutica mundial, empresas que se interessassem em

participar do projeto.

A metodologia de seleção dos parceiros foi baseada na análise de requisitos de

projeto. Várias empresas foram convidadas a emitir propostas. As propostas enviadas

foram avaliadas segundo diversos critérios ponderados, conforme ilustra a TAB. 22. O

processo de seleção contou com auditorias nas instalações de cada parceiro em

potencial. Conceito no mercado, histórico de desempenho, situação financeira,

competitividade comercial e visão dos clientes a respeito da empresa também

contaram pontos para a seleção da proposta vencedora.

154 Abott. Brasil e Canadá voltam à estaca zero. Jornal Valor Econômico. 155 Apesar da decisão de se formar um modelo de desenvolvimento através de parcerias de risco também conter considerações acerca de capacitação tecnológica, a decisão foi primariamente financeira.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 115

TABELA 22

Critérios de seleção dos parceiros de risco

Avaliação Requisitos

Técnica Atendimento aos requisitos técnicos

Atendimento ao peso meta X Kg

Know-how para desenvolvimento de projeto

Recursos de engenharia e softwares

Recursos para ensaios estruturais

Manufatura Atendimento aos requisitos de processo produtivo

Capacitação industrial

Concepção do produto

Processos e tecnologia de manufatura

Inovação tecnológica e conteúdo da proposta

Serviço ao Cliente Custo de manutenção

Confiabilidade

Treinamento

Engenharia de suporte

Suporte de material

Qualidade Certificação sistema de qualidade

Adequação e aprovação do sistema de qualidade

Experiência em projeto similar

Experiência em controle de processo

Acordo bilateral com o CTA

Qualidade de interface

Financeira Funding*

Material para certificação*

Recorrente*

Fluxo líquido*

Empréstimo*

Preço médio ponderado**

Termo de pagamento**

Condições de entrega**

Preço ajustado**

Financiamento de vendas**

Retorno do empréstimo** FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Embraer.

NOTA: (*) valor presente das contribuições em US$; (**) ajuste

nos preços para pagamento em US$.

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PROJECT FINANCE 116

Nesse modelo, cada parceiro ficou encarregado de investir nos custos de

desenvolvimento de seus produtos e sistemas (pacotes), sem a garantia de que a

Embraer iria comprar uma quantidade mínima de unidades capaz de assegurar a

amortização do investimento e a taxa de retorno esperada. Eles absorveram todos os

custos associados ao desenvolvimento (custos não-recorrentes), para amortizá-lo no

futuro mediante as entregas dos shipsets (peças, segmentos, componentes e

sistemas), na fase de produção seriada156, momento em que também serão

contabilizados os custos diretos de fabricação (custos recorrentes). O parceiro

também deveria contribuir com os custos de desenvolvimento do projeto assumidos

pela própria Embraer e com o plano de financiamento de vendas do projeto157. Em

troca, o parceiro é contemplado com um contrato de exclusividade para o projeto, o

que lhe possibilita não apenas realizar um planejamento industrial a longo prazo,

obtendo insumos a preços menores, mas também otimizar seus processos graças à

maior escala de produção. Ele também passa a receber a transferência de tecnologias

aeronáuticas da Embraer ainda não-dominadas por sua engenharia. Isso reverte para

a Embraer sob a forma de custos mais baixos para os materiais adquiridos,

permitindo-lhe oferecer ao mercado aviões com condições comerciais mais

competitivas.

Assim, quatro empresas estrangeiras juntaram-se à Embraer para desenvolver

conjuntamente o projeto através do regime de parcerias de risco. A empresa

espanhola Gamesa ficou responsável pela produção das asas, naceles do motor

(espaço fechado no avião destinado ao motor), carenagens da junção asa-fuselagem

e as portas do trem de pouso principal. A Sonaca, empresa sediada na Bélgica,

comprometeu-se com a fabricação das portas de bagagem, serviço e principal,

localizadas na fuselagem, além de uma seção dianteira da fuselagem e outra traseira

e os dois pilones (estrutura que faz a junção do motor à asa). A empresa chilena

Enaer passou a produzir o conjunto de empenagem horizontal, profundor e a

empenagem vertical. O interior da cabine de passageiros e compartimento de

bagagem foi desenvolvido e fabricado pela C&D Aerospace, dos Estados Unidos158.

156 Suprimentos adota parceria industrial. Revista Bandeirante. 157 No financiamento de vendas, os parceiros poderiam vir a conceder descontos específicos para determinados clientes e até mesmo participar na estruturação dos pacotes de financiamento e garantias. 158 A C&D é uma especialista mundial em projetos, desenvolvimento e fabricação de componentes para cabines de aeronaves comerciais, fornecedora de grandes empresas do setor de aviação, como a Boeing.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 117

Além dos quatro parceiros de risco, o projeto ERJ-145 possui cerca de 350

fornecedores. A FIG. 11 relaciona os pacotes e responsabilidades de cada parceiro.

FIGURA 11 - Parceiros de risco x pacotes do ERJ-145

1) C&D (EUA): interior (cabine de passageiros, compartimento de bagagem); 2)

Gamesa (Espanha): asas, portas do trem de pouso; 3) Sonaca (Bélgica): fuselagem

central I, fuselagem traseira, pilones, porta de bagagem; 4) Enaer (Chile):

estabilizadores vertical e horizontal, profundor.

FONTE: Embraer, 2002.

O financiamento do projeto ERJ-145 foi do tipo Corporate Finance, baseado no crédito

geral da Embraer. O projeto não possui vida própria e está vinculado à carteira geral

de ativos da empresa. Devido às suas características e objetivos, a empresa não

chegou a estudar a possibilidade de formar uma SPC para empreender o projeto.

Portanto, a modalidade Project Finance não foi avaliada como alternativa ao Corporate

Finance.

Os stakeholders do financiamento do ERJ-145, bem como o tipo de relação de cada

um com a Embraer estão ilustrados na FIG. 12. A Embraer é a empresa-líder do

projeto, e juntamente com os parceiros de risco constituem os sponsors do projeto. Os

credores são o BNDES e os parceiros de risco. Uma empresa de leasing e 25

companhias aéreas de 17 países formam a carteira de clientes do ERJ-145 e vários

1

2 3

4

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PROJECT FINANCE 118

fornecedores são responsáveis pelo fornecimento de matéria-prima para a fabricação

do avião159.

Ativos Embraer e ERJ-145

Investidores deCapital

Embraer

Investidores /Patrocinadores

Embraer e Parceirosde Risco

CredoresBNDES e Parceiros

de Risco

Fornecedores eParceiros

Ind. Aeronáutica

CompradoresCia. Aéreas e

Empresas de Leasing

Matérias-Primas

Contrato (s) defornecimento

Recursos de Empréstimos

Pagamento daDívida

Recursos De Capital

Retorno aosInvestidores

Acordos de deficiências de Caixa e outrasFormas de suporte de crédito

Contrato (s) de Compra

Produção

Ativos Embraer e ERJ-145

Investidores deCapital

Embraer

Investidores /Patrocinadores

Embraer e Parceirosde Risco

CredoresBNDES e Parceiros

de Risco

Fornecedores eParceiros

Ind. Aeronáutica

CompradoresCia. Aéreas e

Empresas de Leasing

Matérias-Primas

Contrato (s) defornecimento

Recursos de Empréstimos

Pagamento daDívida

Recursos De Capital

Retorno aosInvestidores

Acordos de deficiências de Caixa e outrasFormas de suporte de crédito

Contrato (s) de Compra

Produção

FIGURA 12 - Modelo de parcerias de risco ERJ-145

4.5 ANÁLISE DE VIABILIDADE DO PROJETO

Apesar de o ERJ-145 ser o primeiro avião comercial a jato da Embraer, ele era um

projeto tecnicamente viável e não envolvia a aplicação de tecnologias desconhecidas

para a Embraer160. O projeto herdou o know-how tecnológico do Brasília e do CBA-123

e foi direcionado pelo conceito “back to basics”, ou seja, somente foram utilizadas

tecnologias que agregavam valor para os clientes, incorporando-se funcionalidades

básicas e buscando-se aproximar o custo operacional da aeronave ao dos turboélices.

159 Cabe ressaltar também o papel das autoridades certificadoras, como o Centro Técnico Aeroespacial - CTA (Brasil), o FAA (EUA) e o JAA (Europa). Esses órgãos homologam as aeronaves (civil e militar), além de atuar como normalizadores e auditores da qualidade da indústria. 160 Mesmo a alta tecnologia relacionada à aviônica (processo de desenvolvimento e fabricação de sistemas para controle de aviões), à integração de sistemas e do motor à aeronave era amplamente dominada pelos fornecedores e parceiros do projeto.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 119

Para mitigar ainda mais o risco tecnológico, antes da produção em série e operação,

um extenso trabalho de desenvolvimento integrado do produto foi realizado,

contemplando ensaios, testes e simulações capazes de comprovar a efetividade das

tecnologias propostas. Foram realizadas simulações com o apoio de ferramentas

computacionais161, utilizaram-se simuladores de vôo para treinamento e refinamento

do projeto, maquetes (mock-up) eletrônicas, vários ensaios em solo e em vôo com a

utilização de quatro protótipos e ensaios em túnel de vento162. O desenvolvimento

integrado do produto aplicou, ainda, os conceitos da engenharia simultânea,

buscando-se minimizar as modificações futuras de projeto, oriundas de problemas de

produção e manutenção.

Durante o desenvolvimento do ERJ-145 foi realizada uma campanha de vendas do

jato junto às companhias aéreas de todo o mundo para prospectar um clien te de

lançamento (launch customer) potencial. Freqüentemente, um launch customer

(comprador da produção inicial do projeto) investe capital no projeto, adiantando uma

parcela do valor comprado. No entanto, o ERJ-145 não possuía um launch customer,

mas somente cartas de intenção. Isso representava um grande risco econômico e de

mercado para o projeto. O primeiro contrato só foi assinado no final de 1996, com a

empresa norte-americana Continental Express, quando a aeronave já estava

praticamente certificada.

A capacidade de obtenção de crédito foi determinada em função da análise financeira

da Embraer e não do projeto isoladamente. No modelo de parcerias de risco, os

parceiros assumem juntamente com a Embraer o risco de mercado do projeto, ou seja,

o de recuperar seus custos não-recorrentes em um número mínimo de aviões a serem

vendidos. No caso do projeto ERJ-145, o ponto de equilíbrio (break-even-point)

operacional é de 400 unidades163, e foi superado com folga. A utilização das parcerias

reduziu o risco da Embraer de não amortizar o investimento, já que o valor investido foi

menor. Já os parceiros passaram a assumir o risco econômico do projeto juntamente

com a Embraer.

161 Um exemplo é a tecnologia CFD (Computerized Fluid Dynamics), que simula o escoamento de ar em torno do avião. 162 Foram aplicados testes no túnel aerodinâmico da Boeing Technologies, nos Estados Unidos. 163 Número de aeronaves necessárias para amortizar os custos operacionais, incluindo os custos de desenvolvimento.

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PROJECT FINANCE 120

Apesar de os credores do projeto terem realizado uma análise minuciosa dos riscos do

projeto, a avaliação destes para a concessão do crédito recaiu sobre a Embraer, por

se tratar de um financiamento do tipo Corporate Finance. No entanto, naquela época,

a empresa e o projeto ERJ-145 fundiram-se devido à relevância que o projeto ganhou

dentro da carteira de projetos em desenvolvimento e da própria sobrevivência da

Embraer. Um outro risco envolvido era a falta de experiência da Gamesa, parceiro

responsável pela asa164.

A entrada da empresa só foi efetivada devido aos recursos que injetaria no

desenvolvimento do projeto. A empresa espanhola, com a ajuda do governo basco, foi

responsável pela maior parte do funding dos parceiros no projeto. Para atenuar esse

risco tecnológico, a Embraer, que já dominava a tecnologia de projeto e construção da

asa, enviou para a Gamesa um time de projetistas e engenheiros para apoiar e

transferir o conhecimento técnico165. Esse grupo esteve envolvido durante todo o

desenvolvimento da aeronave.

Para minimizar os riscos de fornecimento de fatores de produção (basicamente peças,

segmentos, componentes e sistemas) e o cancelamento de ordens de compra, a

relação com os fornecedores, especialmente os parceiros, e as companhias aéreas é

formalizada em contratos de longo prazo. Isso possibilitou à Embraer aumentar o

índice de previsibilidade do fluxo de caixa projetado do projeto.

O risco cambial é inerente a qualquer empresa internacional. No caso do ERJ-145, as

receitas e os custos operacionais do projeto são designados em moedas diferentes.

Mais de 50% do avião é constituído de matéria-prima importada e 98% de sua carteira

de pedidos é formada por companhias aéreas estrangeiras. Essa diferença de moeda

americana no fluxo de caixa cria um mecanismo de hedge cambial natural de suas

operações, minimizando esse risco. No entanto, para se proteger ainda mais, a

captação de recursos foi multimoeda. O financiamento do BNDES foi em reais e os

recursos provenientes dos parceiros foram em dólares norte-americanos.

A receita do projeto é impactada por diversos fatores econômicos e regulatórios que

afetam o volume de passageiros transportados pelas companhias áreas e, em

164 A divisão aeronáutica da Gamesa foi criada para atender ao projeto ERJ-145. 165 Os contratos especificam o direito da Embraer de colocar residentes na matriz dos parceiros.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 121

consequência, a demanda por jatos regionais. Um desses fatores é o PIB. No entanto,

essas empresas são menos afetadas nos períodos de recessão econômica, já que

operam aviões de menor capacidade. Historicamente, as companhias aéreas regionais

norte-americanas vêm crescendo três vezes mais que o PIB nacional166.

Uma outra força que impacta a demanda do ERJ-145 são os preços de combustível de

aviação. O combustível é um custo que as companhias aéreas não têm como

controlar. Por essa razão, o aumento da cotação do barril de petróleo aumenta os

custos de operação dos jatos, reduzindo a demanda de passageiros e, dessa forma,

forçando a postergação de ampliação da frota de jatos pelas empresas. No entanto, o

ERJ-145 emprega tecnologia de ponta, caracterizando-se como um jato de baixo

consumo de combustível.

4.6 ARRANJOS DE GARANTIA

Assim como a capacidade para obtenção de crédito e a avaliação de riscos, a

estruturação de garantias à operação foi constituída para a empresa e não para o

projeto. O BNDES pediu garantia hipotecária sobre os ativos da Embraer. O banco é

um credor preferencial já que possui garantias reais em caso de dissolução da

sociedade. Para os parceiros, a única garantia fornecida foi a exclusividade de

fornecimento para produção em série. Nenhum tipo de fiança foi concedido para

obtenção do crédito.

A dívida junto ao BNDES foi integral (full recourse) e junto aos parceiros foi sem

nenhum direito de regresso (non recourse) após a certificação da aeronave. Caso o

projeto não fosse certificado, a Embraer se responsabilizava apenas por devolver as

contribuições dadas para seu custo não-recorrente. Para alguns fornecedores, os

contratos foram elaborados com base em um lote mínimo de compra de seus

segmentos ou sistemas.

A Embraer também se protegeu contra eventuais cancelamentos ou postergações de

pedidos de compra. Ela recebe aproximadamente 15% do valor das aeronaves

166 Departamento de previsão de mercado da Embraer.

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PROJECT FINANCE 122

compradas no momento que os pedidos entram em linha de produção167. Caso esses

pedidos sejam cancelados ou postergados, a Embraer não ressarcirá seus clientes168.

4.7 ESTRUTURA JURÍDICA E ORGANIZAÇÃO

O relacionamento entre os parceiros foi discriminado em contratos detalhados. O

contrato descreve o objeto do acordo com os parceiros, as condições comerciais, os

aspectos relativos à garantia da qualidade, os procedimentos operacionais que

deverão ser cumpridos e as cláusulas de suspensão, terminação, mudanças,

reivindicações, inclusive as condições em que a exclusividade no fornecimento do seu

produto poderá ser rompida169. As responsabilidades dos parceiros também estão

descritas: as condições de participação no funding, projeto e desenvolvimento do seu

pacote, fabricação, fornecimento de material para os protótipos, condições de

fornecimento de material para as aeronaves de série (preço e forma de pagamento),

participação na campanha de vendas e suporte ao pós-venda. Para cada fase do

desenvolvimento do projeto é especificado o deliverable, isto é: o que deverá ser

entregue.

Os contratos formalizados são de longo prazo, negociados mediante o apoio das

diferentes áreas da Embraer (engenharia, produção, qualidade, suporte ao cliente,

financeiro e jurídico). Quanto à qualidade dos contratantes e regime jurídico, o s

contratos firmados com os parceiros foram de direito privado e, quanto ao regime de

execução, foram estabelecidos contratos por preços unitários sujeitos à correção

anual.

Com relação às coberturas de seguros (lucros cessantes, de responsabilidade civil e

contra riscos físicos), cada parceiro contratou sua apólice de riscos patrimoniais, de

acordo com sua política de gerenciamento de riscos. A única cobertura exigida para

todos é a de responsabilidade civil. É feita uma provisão anual para o pagamento dos

prêmios dos seguros com recursos do fluxo de caixa operacional.

167 Esse adiantamento é um procedimento padrão nas indústrias de bens de capital. Atualmente, o ciclo de produção do ERJ-145 é de aproximadamente quatro meses. 168 Departamento de análise de corretora brasileira. 169 Os contratos prevêem sanções, caso ocorra o descumprimento de obrigações contratuais de alguma das partes, variáveis de acordo com a cláusula não-cumprida. Mas se a causa da cisão for a inexistência de mercado para o ERJ-145, não há penalidades.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 123

Com relação aos aspectos organizacionais, a Embraer designou administradores de

contratos para cada um dos parceiros. Essas pessoas são responsáveis por dominar

amplamente os contratos, controlando revisões e aditamentos, trabalhando de

maneira integrada com os engenheiros de desenvolvimento do produto, de produção,

de qualidade, de configuração e engenheiros de suporte ao cliente, garantindo o

cumprimento de prazos, custos e requisitos contratualmente acordados. Para integrar

os diversos processos empresariais envolvidos no empreendimento foi formalizado um

grupo diretivo do Programa ERJ-145, que realiza reuniões periódicas. Para direcionar

o desenvolvimento do produto foram realizadas várias reuniões com clientes em

potencial, pilotos e técnicos de operação e manutenção de aeronaves.

A FIG. 13 ilustra a estrutura hierárquica das relações contratuais do projeto. O contrato

especifica, para cada fornecedor ou parceiro, os requisitos de alto nível – HLR (High

Level Requirements) que irão compor o statement of work - SOW, documento que

descreve claramente o trabalho a ser realizado em cada pacote de trabalho (escopo

do trabalho). A partir do SOW, os parceiros e fornecedores elaboraram suas propostas

técnica e comercial. Os parceiros e fornecedores escolhidos receberam, então, o

detalhamento dos requisitos e dados de engenharia que estão descritos na

especificação técnica.

HLR

SOW

Proposta Técnica

Proposta Comercial

Especificação Técnica

Precedência

Contrato

HLR

SOW

Proposta Técnica

Proposta Comercial

Especificação Técnica

Precedência

Contrato

FIGURA 13 - Estrutura hierárquica da documentação do ERJ-145

FONTE: Embraer, 2002.

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PROJECT FINANCE 124

4.8 ARRANJOS FINANCEIROS

A obtenção do crédito para o desenvolvimento do projeto não foi fácil. A Embraer

estava recém-privatizada, atravessava um profundo processo de reestruturação

interna, e passava por dificuldades financeiras. O projeto contou com três fontes

credoras: BNDES, parceiros e recursos próprios da Embraer. A entrada do BNDES no

plano de financiamento aconteceu após a privatização, quando também a Embraer

aumentou o aporte de capital através da entrada de novos acionistas e da emissão

privada de ações. Em 1997, os acionistas controladores da Embraer integralizaram um

aumento de capital, em caixa, de US$520 milhões170. Esses recursos foram decisivos

para impulsionar o ERJ-145. Não foram emitidos títulos patrimoniais e de dívida para

financiar o projeto. O mercado de capitais também não foi utilizado para captação de

recursos.

O crédito dos parceiros foi especificamente para o projeto. A fonte primária e única

para servir a dívida da Embraer junto às empresas parceiras é o fluxo de ca ixa do

ERJ-145. Caso as vendas não tivessem sido bem-sucedidas, todos iriam arcar com o

prejuízo relativo à parcela do investimento que não fora amortizada. Para o BNDES, o

financiamento considerou a totalidade da carteira de ativos da Embraer para geração

de fluxo de caixa e pagamento dos serviços da dívida.

Embora o projeto estivesse orçado inicialmente em US$300 milhões (Ghemawat &

Herrero, 2000), foram investidos US$380 milhões171. Desse total, 31% foram arcados

pela Embraer, 30% pelo BNDES e os 39% restantes foram desembolsados pelos

parceiros de risco, dos quais cerca de 30% foram destinados para contribuir com o

custo de desenvolvimento da Embraer (TAB. 23). O financiamento da dívida foi

equivalente a 70% das necessidades totais de capital do projeto.

170 Assumpção. A estrela-guia. Revista Forbes Brasil. Esses recursos não foram direcionados somente para o ERJ-145. 171 Condições econômicas de 1996.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 125

TABELA 23

Plano financeiro do ERJ-145

FONTES DE RECURSOS US$ MILHÕES %

Parceiros

Custo não recorrente 105,6 28

Contribuições p/ custo não recorrente Embraer 43 11

Total Parceiros 148,6 39

Embraer (recursos próprios) 116,4 31BNDES 115 30

Total Projeto 380 100 FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Embraer.

NOTA: condições econômicas de 1996.

A Embraer foi responsável pela montagem do plano de financiamento do projeto. Ela

não contratou nenhuma consultoria ou banco para estruturação da operação, que

começou no início da década de 90 com as negociações dos contratos com os

parceiros de risco, a análise de propostas, a elaboração do fluxo de caixa e a

estruturação de alternativas de financiamento. O financiamento já foi apresentado

estruturado junto ao BNDES e parceiros. As parcerias foram constituídas em 1992 e

1993 e a negociação e seleção dos parceiros de risco estendeu-se por quase um ano.

Já a negociação do empréstimo junto ao BNDES ocorreu em 1995 e durou

aproximadamente seis meses.

A estrutura de amortização da dívida não levou em conta a variabilidade do fluxo de

receita específica da venda do ERJ-145, pois foi baseada no fluxo de caixa da

empresa como um todo172. Não foi criado nenhum fundo de reserva para serviço da

dívida já que o único financiamento ao qual está associado um fluxo de pagamento é o

do BNDES, que foi tomado em moeda brasileira. O pagamento de juros do

empréstimo do BNDES foi trimestral durante o período de carência, que teve a

duração de 36 meses. Após a carência, os juros vêm sendo pagos mensalmente, com

previsão de amortização total do serviço da dívida em outubro de 2005. A taxa de

172 No entanto, o peso que o ERJ-145 tem no faturamento da empresa é muito grande. Assim, desde a certificação da aeronave, o perfil das receitas da empresa vem acompanhando o perfil de receitas do projeto. Em 2001, os jatos regionais da família ERJ-145 foram responsáveis por 85% das receitas da Embraer.

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PROJECT FINANCE 126

juros cobrada pelo BNDES foi flutuante, definida pela TJLP mais spread173. Não foi

realizado nenhum swap ou cap174 de taxa de juros.

O custo não-recorrente do projeto é consolidado nas demonstrações contábeis na

conta diferido. Este inclui remuneração dos engenheiros envolvidos no

desenvolvimento da cada nova aeronave, serviços de suporte, mão-de-obra produtiva,

ferramental, material e mão-de-obra direta alocados para construção de protótipos de

aeronaves. Também estão incluídos os custos com ensaios de protótipos de

subseqüentes mudanças de desenho175. A amortização do diferido é efetuada com

base na quantidade de aeronaves que se estima produzir, segundo cada projeto, a

partir da ocasião em que os benefícios começam a ser gerados, sendo os montantes

apropriados ao custo de produção. No caso de projetos paralisados ou daqueles cuja

realização é considerada improvável, os gastos diferidos são baixados ou reduzidos

ao valor líquido estimado de recuperação.

Por ser um financiamento direto, vinculado à empresa e não ao projeto, os recursos

dos parceiros e do BNDES podiam migrar para outros projetos da Embraer. Os fluxos

de caixa dos diferentes projetos da Embraer se misturam. Além desses credores, o

Banco do Brasil participa através do PROEX Equalização176 das operações de

financiamento às vendas para as companhias aéreas e empresas de leasing

estrangeiras177.

Para enquadramento ao FINAME, o BNDES exigiu, em contrapartida, um índice

mínimo de 35% de nacionalização da aeronave. O ERJ-145 atingiu com folga essa

meta, e hoje apresenta um conteúdo nacional da aeronave de 45,5%, que é calculado

de acordo com a fórmula abaixo:

173 A diferença entre o preço que um banco de investimento paga por um título e o seu preço de venda. 174 Técnicas para minimizar os efeitos de flutuação das taxas de juros. 175 Embraer, Relatório Anual 2000. 176 O PROEX Financiamento somente é estruturado para a aviação militar da Embraer. 177 Somente as companhias aéreas de outros países são elegíveis para participar do PROEX.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 127

∑ FOBportadosItensdoseço

FOBERJVendadeeço

ImPr145Pr

Fórmula de conteúdo nacional

a) FOB: free on board, b) o preço de venda da aeronave é formado pela soma dos

seguintes itens: custo não recorrente amortizado (diferido), horas de fabricação da

aeronave, material e segmentos de parceiros (curva ABC), sub-contrato, custo de

gerenciamento do projeto, impostos e margem bruta.

FONTE: Embraer.

Apesar de o projeto não alcançar o índice de nacionalização exigido (60%) para o

percentual máximo (100%) de uma operação do PROEX Equalização, o Banco do

Brasil abriu uma concessão especial para a Embraer, e hoje as exportações de venda

do ERJ-145 podem financiar até 100% do preço da aeronave.

Uma grande desvantagem que a Embraer sofre, associada ao baixo índice de

nacionalização do seu produto, é a distância entre a base de fornecedores no exterior

e os locais de suas operações industriais no Brasil. Isso acarreta custos elevados de

frete para transporte de insumos, bem como alto empate de capital em estoques para

cobrir os tempos de viagem e incertezas associadas. Dessa forma, em busca de

aumentar o conteúdo nacional do ERJ-145 e de outras aeronaves178, a Embraer tem

investido em um projeto de nacionalização de sua cadeia de suprimentos através do

Programa de Expansão da Indústria Aeroespacial Brasileira - PEIAB. O PEIAB é um

projeto proposto como parte da política industrial da Embraer que objetiva o

desenvolvimento do parque aeronáutico brasileiro, a melhoria da competitividade por

meio da redução de ciclos e dos custos de fabricação dos parceiros e fornecedores179,

o aumento do conteúdo nacional das aeronaves e a exploração das alternativas de

“outsourcing"180.

Dos quatro parceiros de risco do ERJ-145, três já se instalaram no Brasil ou realizaram

alianças com empresas nacionais. A C&D Aerospace inaugurou recentemente, em

Jacareí (SP), sua subsidiária C&D Brasil Ltda., que é sua primeira unidade na América

178 Silveira. Kawasaki vai montar asas de jatos no Brasil. Gazeta Mercantil. 179 O maior componente do custo industrial do ERJ-145 é os materiais importados. 180 A estratégia da empresa é focar na pesquisa e desenvolvimento, montagem de segmentos, montagem final e integração de sistemas e produtos, terceirizando a fabricação e montagem de conjuntos, subconjuntos e peças.

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PROJECT FINANCE 128

Latina, criando 86 postos de trabalho181. A meta da empresa norte-americana é atingir

o índice de 20% de conteúdo nacional do interior fornecido para o ERJ-145, a partir do

segundo ano de operação. A Sonaca assinou um contrato com uma empresa

brasileira para montagem final de seus segmentos do ERJ-145. Paralelamente, a

empresa belga criou, em 2000, sua própria subsidiária no Brasil, a Sobraer, para

realizar a junção dos pilones na fuselagem fornecida para o projeto ERJ-145 e, com

isso, gerou 65 empregos diretos. Já a Gamesa Aeronáutica realizou parcerias com

fornecedores brasileiros para compra de material, serviços e fornecimento de

compostos para aeronaves da Embraer.

Além dos parceiros de risco do ERJ-145, outros importantes fornecedores da cadeia

de suprimentos da Embraer também já se instalaram no Brasil ou fizeram parcerias

com indústrias nacionais para desenvolvimento e fabricação de segmentos e de

sistemas das aeronaves da Embraer: a Parker Hannifin182, fabricante de controles de

vôo, sistema de combustível e sistema hidráulico; a Hamilton Sundstrand, que produz

o sistema de geração elétrica (APU), o cone de cauda e o sistema de gerenciamento

de ar; a General Electric Aircraft Engines, que fabrica o motor e a nacele; a Latecoere,

fabricante de fuselagens e portas; a Pilkington, fabricante das janelas; a Goodyear,

fornecedora dos pneus aeronáuticos; a Figeac Aero, indústria de painéis de

revestimento e nervuras de asas; e a Liebherr183, fabricante de trem de pouso, dentre

outros fornecedores internacionais.

O PEIAB aumentou os lucros e exportações da Embraer184, contribuindo com a criação

de postos de trabalho no Brasil, a transferência de tecnologia, o desenvolvimento

econômico da região e o alcance de metas de superávit da balança comercial

brasileira. O PEIAB tem o apoio do Governo Federal, além de estar também

perfeitamente alinhado com o Governo Estadual de São Paulo, que criou o Pólo

Industrial, Tecnológico, Aeronáutico e Aeroespacial de Gavião Peixoto, no interior do

181 C&D Aerospace terá unidade em Jacareí (s.a.). Gazeta Mercantil. 182 Cabrini. Um centro exclusivo para a Embraer e Jacareí sedia grupo latino-americano da Parker Hannifin. Gazeta Mercantil. 183 A Embraer aliou-se à Liebherr e criou, em 2000, a ELEB – Embraer Liebherr Equipamentos dos Brasil S.A., gerando 450 empregos diretos. A Liebherr possui 40% de participação na empresa. Para maiores informações ver “A rara especialidade da ELEB”, Revista Bandeirante. 184 Através da racionalização de investimentos em infra-estrutura produtiva, diminuição do percentual de movimentação de material (material handling), aumento do giro do estoque, diminuição do ciclo de produção.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 129

estado. Ao todo, a instalação de filiais dos parceiros e fornecedores na região do Vale

do Paraíba criou 586 empregos diretos185.

O lançamento do ERJ-145 ocorreu após a venda, por seu principal concorrente, o

CRJ-200 da Bombardier, de 110 aviões e a entrega de 85. Apesar do preço mais

competitivo e da superioridade técnica em muitos requisitos, o ERJ-145 perdeu

algumas concorrências internacionais disputadas com a Bombardier devido à baixa

competitividade das condições de financiamento oferecidas pela Embraer. A

precariedade de agências ou instituições financiadoras brasileiras levou à perda de

vendas importantes.

O mercado da indústria aeronáutica nunca foi uma concorrência perfeita. A indústria

sempre contou com forte apoio governamental e é tratada como um segmento

industrial estratégico de um país. As concorrentes da Embraer têm acesso a melhores

condições de financiamento e garantia de crédito, aumentando a competitividade de

desenvolvimento de novos produtos e de operações de venda de aeronaves. No

entanto, esse projeto foi uma grande lição para a Embraer e o Governo brasileiro. A

partir do seu lançamento, a Embraer e o BNDES passaram a construir uma parceria

histórica na elaboração de modalidades mais ativas às vendas no mercado externo

(Bernardes, 2000), as quais acabaram se estendendo para a exportação de outros

produtos brasileiros.

Estudos de mercado foram realizados para se projetar o fluxo de caixa do projeto.

Identificou-se a demanda pela aeronave e a participação da Embraer no mercado de

35 a 50 assentos. No entanto, na montagem do fluxo de caixa e retorno do projeto, a

participação da Embraer no mercado regional de aeronaves com capacidade para 50

lugares foi subestimada, gerando uma previsão de receita e payback conservadores. A

Embraer previa a venda de 400 aeronaves ao longo de 10 anos de produção. Nos

primeiros cinco anos já foram vendidos 571 ERJ-145 e foram formalizadas mais 269

opções de compra, totalizando uma carteira de 840 aeronaves (TAB. 24).

185 Dados contabilizados pela Embraer (inclui ELEB).

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PROJECT FINANCE 130

TABELA 24

Carteira de pedidos ERJ-145

PAÍS CLIENTES PEDIDOS FIRMES

OPÇÕES TOTAL ENTREGAS REALIZADAS

Áustria Rheintalflug 4 4 8 3Brasil Rio-Sul 16 0 16 16China Sichuan 5 0 5 5Inglaterra Manx 23 3 26 21

British Midland 11 5 16 9Brymon 7 14 21 7

França Regional 17 0 17 14Flandre Air 7 10 17 3Proteus 11 4 15 8

Alemanha Cirrus 1 0 1 1Grécia Axon 4 2 6 3Guadaloupe Air Caraibes 2 0 2 2Itália Alitalia 8 13 21 8Holanda Klm Exel 3 2 5 3Luxemburgo Luxair 9 2 11 9Moldova Air Moldova 2 2 4 0Polônia Lot Polish 16 0 16 13Portugal Portugalia 8 0 8 8Suécia Skyways 4 11 15 4Suiça Crossair 25 15 40 19EUA Continental 245 100 345 111

American Eagle 56 17 73 56Wexford 38 20 58 38Transtates 12 0 12 12Mesa 36 45 81 25Gatx 1 0 1 1

T O T A L 571 269 840 399 FONTE: Embraer

NOTA: a) base Jan/2002.

Tudo indica que o projeto venderá mais de 1.000 unidades. Projeções realizadas por

especialistas da indústria e corretoras projetam vendas de mais 246 aeronaves até

2008 (TAB. 25). A estimativa atual de vendas é, portanto, quase três vezes maior que

o plano de produção projetado no plano de negócios do projeto.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 131

TABELA 25

Projeção (estimativa) de vendas ERJ-145.

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

82 68 52 20 12 8 4

FONTE: Departamento de Análise de corretora brasileira – fev. 2002186

A evolução da cadência de produção do projeto vem crescendo de forma significativa,

demonstrando o sucesso de vendas do projeto e a capacidade de manufatura da

fabricante brasileira. No final de 2001, a Embraer alcançou uma cadência de produção

de 18 aeronaves ao mês (GRAF.13), a maior de toda a indústria aeronáutica regional.

O lead-time de fabricação de um ERJ-145, que era de 12 meses em 1995, caiu para 5

meses em 2000 (Ghemawat & Herrero, 2000).

0

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

Fev/97 Ago/97 Fev/98 Ago/98 Fev/99 Ago/99 Fev/00 Ago/00 Fev/01 Ago/01

Tempo

Aer

on

aves

/ M

ês

Cadência de Produção

GRÁFICO 12 - Evolução da cadência de produção do ERJ-145

FONTE: Dados obtidos da pesquisa de campo na Embraer

186 Essas informações não são oficiais e não foram confirmadas pela Embraer.

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PROJECT FINANCE 132

A maior parte da receita do projeto é gerada pela venda das aeronaves. Porém, uma

parcela crescente e importante será também obtida com os serviços de pós-venda. Os

serviços de suporte ao cliente compreendem todos os aspectos da operação do avião:

suportes técnico e no campo, logístico e de material, e serviços de manutenção. A

Embraer estabeleceu centros de reposição de peças para suportar os clientes do ERJ-

145 em localidades estratégicas: Austrália, China, Cingapura, Estados Unidos e

França.

Um estudo realizado pela Boeing mostra o potencial do mercado mundial de serviços

de suporte à aviação comercial. Segundo análise da fabricante norte -americana, a

demanda desse mercado irá gerar negócios da ordem de US$2,7 trilhões até 2019

(GRAF. 14).

GRÁFICO 13 - Demanda de aviões comerciais e serviço de suporte

NOTA: a) US$ bilhões; b) inclui aviação major e regional mundial.

FONTE: Boeing Market Outlook187, 2000

O sucesso de vendas do ERJ-145 posicionou a Embraer como a maior exportadora

brasileira há três anos consecutivos (1999, 2000 e 2001). Com o projeto, a fabricante

187 http://www.boeing.com.

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AERONAVE REGIONAL ERJ-145 133

brasileira conquistou o mercado externo, mudando o perfil de suas vendas e ganhando

status de multinacional. A TAB. 26 mostra a mudança do faturamento da empresa

após o lançamento do ERJ-145. Em 1999, as vendas para o mercado externo

representaram 95% da receita da empresa, contra apenas 37% em 1990. No exercício

de 2000 e de 2001, a Embraer exportou o montante de US$2.700 milhões e de

US$2.897 milhões respectivamente, o equivalente a 98% das receitas totais dos anos

correspondentes.

TABELA 26

Composição do faturamento da Embraer na década de 90

90 91 92 93 94 95 96 97 98 99

Mercado Externo (%) 37 32 32 38 40 39 35 84 89 95

Mercado Interno (%) 63 68 68 62 60 61 65 16 11 5

FONTE: Ghemawat & Herrero, 2000:16 (Adaptado).

Embora não tenham sido concedidos benefícios fiscais para o desenvolvimento do

projeto, a Embraer, por ser uma empresa exportadora, é elegível para pagar menos

ICMS. O projeto também contribui para que o pagamento de contribuições sociais e

taxas municipais, estaduais e federais crescesse de forma exponencial (GRAF. 14).

739

90 103137

160

361

0

100

200

300

400

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

GRÁFICO 14 - Recolhimento de Impostos e Contribuições Sociais

NOTA: R$ milhões.

FONTE: Relatório Anual da Embraer, 2000:37.

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PROJECT FINANCE 134

5 ANÁLISE COMPARATIVA

Os dois projetos estudados poderiam ser analisados comparativamente frente aos

mais variados aspectos abordados nessa dissertação. Porém, tomando como base os

critérios propostos por Finnerty (1999), foram selecionadas nove características de um

financiamento de projeto para que fosse efetuado o cotejo.

5.1 ORGANIZAÇÃO

O projeto da rodovia Presidente Dutra está organizado em um modelo de parceria

público-privada. A Nova Dutra, detentora da concessão, é uma sociedade anônima de

capital fechado e uma empresa subsidiária integral da Holding CCR, um veículo de

capital conjunto que administra concessões de projetos rodoviários. Assim como o

projeto, a Nova Dutra possui uma vida finita (25 anos). Os ativos e o fluxo de caixa da

rodovia são segregados dos outros projetos de concessão da CCR. Apesar de o

financiamento ter como base o projeto, a CCR também poderá captar recursos e

realizar aporte de capital próprio ao mesmo (FIG. 14). A holding poderá alcançar maior

economia de escala com seu portfólio de projetos, contribuindo para elevar seu

potencial de captação de recursos nos mercados financeiros e de capitais188.

Autoban (SP) Nova Dutra (SP) Ponte S.A. (RJ) Via Lagos (RJ) Rodonorte (PR)

CCRNovos financiamentos

Project Finance

Autoban (SP) Nova Dutra (SP) Ponte S.A. (RJ) Via Lagos (RJ) Rodonorte (PR)

CCR

Autoban (SP) Nova Dutra (SP) Ponte S.A. (RJ) Via Lagos (RJ) Rodonorte (PR)

CCRNovos financiamentos

Project Finance

FIGURA 14 - Captação de recursos Nova Dutra

O projeto ERJ-145 não constituiu uma entidade jurídica independente. Ele está

vinculado ao portfólio de projetos da Embraer, empresa-líder do projeto, organizada de

forma corporativa. A Embraer é uma sociedade anônima de capital aberto e não

possui uma vida limitada, embora o projeto tenha um prazo-limite de existência. O

188 No início de 2002, a CCR fez uma distribuição pública primária de ações ordinárias no Brasil.

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ANÁLISE COMPARATIVA 135

fluxo de caixa e ativos do projeto misturam-se com os demais projetos da empresa. O

financiamento teve como base a corporação (FIG. 15).

ERJ-145 ERJ 170/190 Legacy AEW&C Outros

EmbraerCorporate Finance

ERJ-145 ERJ 170/190 Legacy AEW&C Outros

Embraer

ERJ-145 ERJ 170/190 Legacy AEW&C Outros

EmbraerCorporate Finance

FIGURA 15 - Captação de recursos ERJ-145

5.2 CONTROLE E MONITORAMENTO

A administração da Nova Dutra está sujeita a um maior monitoramento do que uma

corporação típica. Os credores e o poder concedente exigem transparência, portanto

ela é obrigada a emitir diversos relatórios de acompanhamento e o projeto é

fiscalizado periodicamente. Os arranjos contratuais que governam as dívidas e o

contrato de concessão contêm compromissos e disposições que facilitam o controle.

Ao contrário do projeto da rodovia Dutra, a mistura de ativos e fluxos de caixa do ERJ-

145 com outros projetos da Embraer dificulta um maior monitoramento pelos

investidores. O conselho de administrativo monitora a performance da corporação em

nome dos acionistas. O nível de transparência dos parceiros e do BNDES em relação

ao projeto é baixo e, assim como os parceiros não possuem acesso às informações

financeiras específicas do projeto, o BNDES tampouco recebe informações

privilegiadas (como margem bruta e custo de material), porém, fez auditorias

periódicas do uso dos recursos fornecidos para a Embraer empreender o projeto. Após

o total desembolso, uma auditoria final foi realizada.

5.3 ALOCAÇÃO DE RISCO

No projeto Dutra, os credores possuem direito de regresso limitado até que se cumpra

o Project’s Completion e nenhum direito de regresso após essa fase. A exposição

financeira dos credores é específica do projeto, embora arranjos suplementares de

suporte creditício possam compensar, em parte, a exposição ao risco. A estrutura de

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PROJECT FINANCE 136

contratos busca redistribuir os riscos, alocando-os para os stakeholders que possuem

melhores condições de assumi-los.

Já no caso ERJ-145, o BNDES possui direito de regresso junto à Embraer enquanto

os parceiros de risco, após a certificação da aeronave, não. Os riscos da Embraer são

diversificados nos seus 17 projetos. Alguns foram transferidos a terceiros através da

contratação de seguros, de hedging e outros serviços financeiros. Assim como no

projeto da rodovia, a estruturação de parcerias possibilitou a distribuição dos riscos em

maior número de partes envolvidas no projeto.

5.4 FLEXIBILIDADE FINANCEIRA

O financiamento da Nova Dutra envolveu um grande volume de informações e altos

custos de transação e contratação (despesas legais referentes à elaboração da

estrutura, pesquisa e gerenciamento de questões fiscais e jurídicas, e preparação de

documentação de propriedade, de empréstimos e de outros contratos). Os arranjos

financeiros são complexos e a montagem do plano levou quase dois anos para ser

finalizada. A flexibilidade financeira do projeto era limitada, já que a captação de

recursos estava vinculada somente ao fluxo de caixa do projeto. Porém, com a criação

da CCR, essa flexibilidade aumentou muito.

O financiamento do ERJ-145 foi elaborado mais rapidamente, embora tenha sido mais

complexo do que os planos típicos de Corporate Finance. A estruturação da dívida do

BNDES levou seis meses e a montagem do financiamento dos parceiros, quase um

ano. A flexibilidade financeira do ERJ-145 é maior do que o projeto da rodovia, já que

recursos da venda de outras aeronaves da Embraer puderam ser utilizados para

financiar o projeto, evitando a disciplina do mercado de capitais.

5.5 FLUXO DE CAIXA LÍQUIDO

A administração da Nova Dutra possui pouca liberdade com relação à alocação do

fluxo de caixa líquido entre dividendos e reinvestimento. Os diversos contratos,

arranjos de garantia e trustee tornam quase automática essa distribuição. A entidade-

projeto distribui os fluxos de caixa do projeto diretamente para os credores e

investidores de capital do projeto, que possuem direito preferencial. A política de

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ANÁLISE COMPARATIVA 137

dividendos é especificada contratualmente. Os cenários e adversidades do projeto

foram estudados exaustivamente, e o fluxo de caixa realizado confirma o projetado.

A alocação do fluxo de caixa líquido do projeto ERJ-145 entre dividendos e

reinvestimento é uma decisão do Conselho de Administração da empresa. Os fluxos

de caixa misturam-se e depois são alocados de acordo com a política corporativa de

risco e retorno. As análises de participação de mercado da aeronave foram

conservadoras, gerando uma subestimação no fluxo de caixa projetado. Os custos e

condições de captação poderiam ter sido melhores, caso as projeções refletissem a

atual participação da aeronave no mercado regional da aviação.

5.6 AGENCY COSTS189

Os agency costs do fluxo de caixa líquido do projeto da Via Dutra são reduzidos, já

que os investidores possuem grande poder de barganha e mecanismos de controle

nessa estrutura de financiamento. O fluxo de caixa livre vai direto para as decisões

dos investidores. O projeto possui uma política de remuneração variável em função

dos resultados pactuados e obtidos na operação da concessão. Os incentivos à

gerência são atrelados ao desempenho do projeto.

Em contraste com o projeto da rodovia Dutra, a modalidade de financiamento do ERJ-

145 expõe os investidores de capital aos agency costs. Estes custos são mais

elevados do que para o Project Finance. O fluxo de caixa vai para a tesouraria da

empresa e as decisões de dividendos serão baseadas na política corporativa. A

Embraer também possui uma política, para os seus projetos, de participação nos

lucros e resultados. Dessa forma, os incentivos à gerência do ERJ -145 são específicos

do projeto. A empresa também vem estudando um projeto de estrutura por unidades

de negócio, o que tornará mais direta a vinculação dos resultados do projeto à

remuneração variável dos gerentes. Nesse modelo, a Embraer se estruturaria em

cinco unidades: aviação comercial, aviação corporativa, aviação de defesa, serviços

ao cliente, e unidade industrial (esta última, um centro de serviços para as outras

unidades). Essa nova organização facilitaria ainda mais a distribuição de incentivos e

benefícios para a gerência do ERJ-145.

189 Custos incorridos pelos acionistas para evitar ou minimizar a possibilidade de os administradores colocarem seus objetivos pessoais à frente dos objetivos da empresa.

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PROJECT FINANCE 138

5.7 ESTRUTURA DOS CONTRATOS DE DÍVIDA

Credores da Via Dutra valem-se do fluxo de caixa do projeto como fonte primária de

pagamento do serviço da dívida. Os contratos de dívida foram elaborados sob medida

para as características específicas do projeto.

No projeto ERJ-145, os credores valem-se de toda a carteira de ativos da Embraer

para o serviço da dívida. Além disso, a dívida do BNDES foi hipotecada. Os contratos

com os parceiros somente garantiriam a dívida caso o projeto não fosse certificado.

Diante desse evento, a fabricante brasileira seria obrigada a devolver o crédito

concedido para seus próprios custos não recorrentes. Assim como no projeto da Nova

Dutra, a relação com fornecedores e compradores, no caso as companhias aéreas,

também está discriminada em contratos de longo prazo.

5.8 CAPACIDADE DE ENDIVIDAMENTO

A capacidade de endividamento dos patrocinadores da Nova Dutra foi expandida com

o modelo de Project Finance. A concessionária alcançou uma alavancagem maior em

relação ao financiamento Corporate Finance (que foi) simulado190. A alavancagem foi

determinada em função da estrutura de capital de giro do projeto, e alcançou a

proporção de 60:40 de recursos de terceiros e próprios.

Apesar de ter sido financiado por Corporate Finance, a estrutura de capital do ERJ-

145 foi bastante alavancada, com cerca de 70% de capital de terceiros. O suporte

creditício a risco dos parceiros do projeto (39%) foi decisivo para se alcançar tal

relação. Contudo, a estrutura do projeto possui influência relativa na capacidade de

obtenção de crédito. O impacto da alavancagem sobre a taxa de retorno exigida foi

determinado mais pela estrutura de capital da empresa como um todo.

190 Cabe ressaltar que uma alavancagem muito elevada no balanço das empresas patrocinadoras poderia limitar investimentos em outros projetos.

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ANÁLISE COMPARATIVA 139

5.9 INSOLVÊNCIA191

A estrutura de passivos do projeto Dutra é menos complexa e o número de partes

reivindicadoras é pequeno. O custo de resolução de possíveis apuros financeiros é

menor. Mas as chances dos credores recuperarem seu principal são mais limitadas

caso ocorram problemas graves no projeto, já que a dívida não poderá ser

compensada com recursos de outros projetos, se não com os da própria estrada

pedagiada (excetuando-se os ativos, que são propriedade do governo brasileiro). O

projeto pode ser isolado da possível insolvência de um patrocinador.

Por sua vez, a estrutura de passivo da Embraer é complexa e talvez gere um maior

custo na resolução de apuros financeiros. Todavia, no caso de fracasso do projeto, os

credores têm o benefício de todo o portfólio de projetos da firma. Dificuldades do

projeto poderão drenar recursos dos “bons” projetos da Embraer.

5.10 CARACTERÍSTICAS COMUNS

Alguns aspectos coincidentes foram observados nos financiamentos dos dois projetos:

a) projetos de grande porte, com mesma ordem de grandeza do investimento

(US$380 milhões e US$525 milhões);

b) entrada em operação em 1996;

c) projetos em fase de operação (geração de receita);

d) longos períodos de geração de receita-fase de operação (25 anos da rodovia e 34

anos da aeronave);

e) assistência governamental, através de recursos do BNDES (parceria entre o

Estado e o mercado);

f) participação de crédito dos fornecedores;

g) empréstimos com pagamento em produção192;

h) sem direito de regresso a partir de uma determinada fase do projeto193 (Project‘s

Completion para a Nova Dutra e Certificação para o ERJ-145);

i) planos de financiamento aderentes às características do projeto;

191 Situação em que a empresa é incapaz de pagar suas obrigações em seu vencimento. 192 Rodovia Presidente Dutra todo o financiamento e ERJ-145 dívida com parceiros. 193 No caso do ERJ-145, somente para o crédito dos parceiros de risco.

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PROJECT FINANCE 140

j) capacidade dos sponsors de negociar com as comunidades financeiras nacional e

internacional e com os organismos governamentais;

k) alinhamento de interesses e distribuição dos benefícios para todos os

stakeholders;

l) distribuição dos riscos entre os stakeholders;

m) contratos de longo prazo com fornecedores e compradores;

n) associação de empresas que geraram sinergias positivas, agregando valor ao

projeto em forma de tecnologia, know-how, aporte financeiro, capacidade

operacional e garantias (no caso da Nova Dutra ocorreu a associação das três

maiores empreiteiras do Brasil, e no ERJ-145, a de grandes fornecedores mundiais

da cadeia produtiva aeronáutica).

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CONCLUSÃO 141

6 CONCLUSÃO

6.1 O FINANCIAMENTO COMO FATOR CRÍTICO DE SUCESSO

Apesar de utilizarem técnicas diferentes para financiar o investimento, os planos de

financiamento dos projetos estudados obtiveram êxito, contribuindo para o alcance dos

resultados dos projetos.

6.1.1 Rodovia Presidente Dutra

O plano de Project Finance foi bem sucedido. O projeto já alcançou o Project’s

Technical Completion e o Project’s Financial Completion, portanto, a complementação

total do projeto. A taxa interna de retorno é a maior do portfólio da CCR e o seu NPV é

o segundo, e o projeto participa com cerca de 40% do faturamento total da holding.

No caso da concessão de rodovias, a legislação brasileira encorajou a participação do

setor privado no financiamento e operação de estradas pedagiadas. Foi criado um

ambiente jurídico-institucional favorável para a implementação das parcerias público-

privadas194. A legislação brasileira estabeleceu bases para obrigações contratuais de

longo prazo suficientemente fortes para suportar a aplicação de operações de Project

Finance. O sucesso deste projeto foi muito importante para encorajar novas

concessões, contribuindo para a redução do déficit de investimentos em infra-estrutura

rodoviária.

6.1.2 Aeronave regional ERJ-145

A estruturação do financiamento também foi bem-sucedida, e recentemente o modelo

de parcerias de risco foi estruturado para o projeto da nova família de aeronaves da

Embraer, o Embraer 170/190195, que conta com 16 parceiros de risco de sete

diferentes países (FIG. 13, ANEXO I).

194 Contudo, em outros setores, como o de saneamento e o das termelétricas, o ambiente legal ainda é incerto, desencorajando e retardando a participação da iniciativa privada. 195 Jatos de 70 a 110 assentos.

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PROJECT FINANCE 142

A formação das parcerias de risco para empreender o projeto foi um fato inédito na

empresa e na própria indústria196. Esse modelo minimizou a necessidade de capital de

giro para desenvolvimento e para a fabricação das aeronaves, e sua grande vantagem

deve-se ao fato dos parceiros estarem dedicados ao sucesso do projeto e não

somente a fornecer peças e componentes. Os parceiros empenham-se em produzir

seus bens em prazos menores, por preços mais competitivos e com padrões de

qualidade superiores (Bernardes, 2000). Com o crescimento das vendas, os parceiros

passaram a crescer e lucrar também, compartilhando com a empresa o sucesso do

projeto.

Reconhecida por sua excelência técnica, a Embraer só poderia viabilizar o projeto

ERJ-145 através da solução criativa do modelo de parcerias de risco. O plano de

financiamento foi decisivo para o sucesso do projeto. Sem os recursos dos parceiros a

Embraer provavelmente não teria como lançar a aeronave em 1996, ou até mesmo

como financiar o investimento necessário para viabilizar o desenvolvimento do projeto,

perdendo a grande oportunidade de demanda (“janela” de mercado) por jatos

regionais naquele período. Bernardes (2000:319) enfatiza a importância desse modelo

na indústria aeronáutica:

“Se há anos os projetos multinacionais de desenvolvimento e produção de aeronaves eram exceção e não eram vistos com ‘bons olhos” pela ótica de gestão estatal com forte ênfase estratégico-militar, em razão da troca de segredos industriais, hoje esses arranjos empresariais e institucionais tornaram-se regra para quem almeja sobreviver no ramo, por causa dos custos crescentes e ciclos longos de pesquisa e desenvolvimento que acompanha toda a trajetória de concepção e produção de um novo avião, e ainda da grande incerteza e longo prazo de retorno dos investimentos realizados.”

O BNDES e o Banco do Brasil, assim como os parceiros, foram decisivos para o

sucesso do plano de financiamento. Através do FINAME e do PROEX, a Embraer

conseguiu alavancar recursos para cobrir os custos de desenvolvimento e suportar as

operações de vendas junto aos clientes externos. O PROEX possibilitou a concessão

de prazos para as companhias aéreas comprarem o ERJ-145, porém com

recebimento à vista pela Embraer, sem qualquer taxa de administração para

concessão do crédito. O programa brasileiro também disponibilizou taxas de juros

menores para as companhias aéreas comprarem os jatos. Dessa forma, eliminou a

196 Até 1988, a Embraer financiava seus projetos principalmente através de recursos próprios. Ela contava com recursos de incentivo fiscal que dava direito às empresas e pessoas físicas a destinarem 1% do seu imposto devido para o desenvolvimento da indústria aeronáutica em troca da participação acionária da empresa. A Embraer chegou a ter 250.000 acionistas.

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CONCLUSÃO 143

necessidade de intermediários e facilitou o crédito para os clientes com menor

capacidade financeira, aumentando a competitividade da empresa nas licitações

internacionais.

Apesar do financiamento do projeto ERJ-145 ter sido um modelo Corporate Finance,

ele não foi tão convencional assim. De uma certa forma, esse modelo incorporou

alguns conceitos importantes do Project Finance:

a) uma parcela dos recursos, a parte proveniente dos parceiros de risco, está sendo

“paga com a produção”;

b) os parceiros não possuem direito de regresso após a certificação da aeronave;

c) os riscos financeiros e operacionais são compartilhados entre os parceiros;

d) estruturação de contratos a longo prazo com fornecedores e clientes;

e) expansão da capacidade de obtenção de crédito (alavancagem financeira).

6.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS PARA OS SPONSORS

6.2.1 Project Finance

As duas principais vantagens do Project Finance são a expansão da capacidade de

obtenção de crédito e os mecanismos de distribuição de riscos entre os stakeholders.

Muitas vezes, a SPC possui uma situação creditícia melhor que a de seus acionistas,

tornando essa técnica atrativa para as empresas patrocinadoras.

Projetos economicamente fortes podem estruturar-se de maneira mais alavancada. A

dívida de um projeto pode chegar a 80% de seu capital total (debt/equity), e algumas

vezes até a 100%. Mesmo com essa elevada alavancagem, por ser um financiamento

off-balance-sheet, a dívida contraída não afetará a capacidade de endividamento dos

sponsors, já que o débito poderá ser contabilizado no balanço da SPC. Além disso, o

risco de exposição do sponsor é limitado ao seu investimento de capital no projeto

(geralmente atrelado à conclusão do proj eto).

Alguns projetos possuem riscos tão grandes que não seria prudente que uma única

parte os assumisse sozinha. O Project Finance permite o compartilhamento de riscos

operacionais e financeiros entre as várias partes interessadas, e o faz de forma mais

flexível que o financiamento com base no crédito geral dos patrocinadores.

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PROJECT FINANCE 144

Todavia, o Project Finance nem sempre é forma mais barata de financiar um projeto.

Os custos de transação197 entre os stakeholders são elevados. O esforço analítico

necessário para desenvolver um plano de Project Finance é demorado e oneroso e

requer extensiva análise de viabilidade e estudos financeiros. Outra desvantagem é

que nem sempre os ambientes legal e institucional em que os projetos estão inseridos

estão suficientemente estáveis para o empreendimento. Isso pode aumentar em muito

os riscos políticos que os sponsors deverão assumir.

6.2.2 Corporate Finance

O financiamento Corporate Finance pode ser rapidamente montado, e o projeto possui

menores custos de transação de suas relações contratuais. A flexibilidade financeira

para um projeto que não seja economicamente forte é maior que no Project Finance,

já que seus patrocinadores poderão tirar vantagem de uma situação positiva da

empresa como um todo e de recursos gerados por outros projetos. Contudo, nessa

modalidade, a estrutura de capital é determinante para obtenção do crédito, o que

pode limitar a capacidade de endividamento do projeto caso a empresa não apresente

uma boa saúde financeira nos seus balanços. Uma carga adicional de endividamento

poderá fazer com que os índices de endividamento e de cobertura levem a custos de

juros mais elevados.

6.3 PROJETOS CANDIDATOS

Os candidatos ideais a um Project Finance seriam os projetos de investimento que (a)

tenham condições de funcionar como unidades econômicas independentes; (b)

possam ser concluídos com certeza absoluta; (c) quando concluídos, sejam

comprovadamente mais lucrativos do que seu custo de realização (projetos

economicamente fortes); (d) possuam disponibilidade dos fatores de produção

(basicamente recursos naturais e matérias-primas) e uma demanda conhecida,

garantindo um fluxo financeiro previsível (Finnerty, 1999).

197 Custos de negociação e conclusão de contratos e relacionamento entre firmas.

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CONCLUSÃO 145

O Project Finance é mais apropriado para projetos com elevada necessidade de

capital, altos e complexos riscos198 e, conseqüentemente, para projetos que não

consigam levantar fundos suficientes através do método tradicional, Corporate Finance

(Beidleman et al., 1990).

Os projetos financiados por essa técnica são de grande porte e de longa maturação,

possibilitando a geração de receitas por um dilatado período de tempo. Os projetos de

infra-estrutura são os maiores candidatos a financiamento por essa modalidade. Estes

envolvem grandes montantes de investimento, exigindo estruturas mais alavancadas,

e possibilitam um fluxo regular de receitas a longo prazo (baixo risco mercadológico).

Projetos com pequenos fluxos de caixa ou grandes incertezas associadas não são

indicados para serem financiados por Project Finance. Nesse caso, o Corporate

Finance seria mais adequado. Nesta categoria incluem-se os projetos que não têm

condições de manter os elevados custos transacionais de uma estrutura de Project

Finance.

Projetos de desenvolvimento de um novo produto cuja demanda futura não seja

possível prever são tipicamente financiados através do crédito geral do seu

patrocinador. Os projetos para os quais o Corporate Finance é mais adequado são de

setores e tamanhos diversificados.

6.4 PERSPECTIVAS PARA FINANCIAMENTO DE PROJETOS

O desenvolvimento colaborativo, através de parcerias de risco, bem como as soluções

de Project Finance (ou suas variações) serão cada vez mais correntes no

desenvolvimento de novos produtos, principalmente de projetos que envolvam um

montante substancial a ser financiado.

Outro fenômeno em curso é a incorporação de conceitos de Project Finance ao

financiamento direto. Vários de seus instrumentos e mecanismos são cada vez mais

estruturados no Corporate Finance, a fim de se obter um maior controle e

gerenciamento dos riscos (Moreira, 1999). O financiamento do ERJ-145 permite a

198 Frequentemente, os riscos associados a um projeto são tão grandes que seria inviável ou imprudente que uma única parte os assumisse sozinha. O Project Finance permite o compartilhamento de riscos operacionais e financeiros entre os stakeholders.

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PROJECT FINANCE 146

constatação desse fato, já que a estruturação do seu financiamento utilizou vários

conceitos de Project Finance.

Excetuando-se a criação de uma entidade juridicamente independente, as

características dessas duas técnicas tendem a mesclar-se, na medida em que a

estruturação ótima de um projeto tem que considerar todos os mecanismos

disponíveis para uma maior alocação de risco e retorno. Experiências ousadas de

empreendimentos de novos projetos, como a implantação do modelo de parcerias de

risco no desenvolvimento de aeronaves regionais da Embraer e a implantação da

fábrica-consórcio da Volkswagen no Rio de Janeiro são respostas às dificuldades

impostas pela competição internacional. Essas soluções podem constituir alternativas

ao Project Finance e ao Corporate Finance puros.

A estruturação de Project Finance na indústria aeroespacial ainda é incipiente. A

Boeing Capital expandiu seus serviços financeiros, incluindo a estruturação de Project

Finance para suportar os projetos de defesa e espacial199. Porém, ainda não existem

estudos divulgados dessa modalidade para desenvolvimento de aviões comerciais. A

Embraer não utiliza o Project Finance puro, especificamente, para viabilizar seus

projetos. Sua única experiência foi com o desenvolvimento de um caça militar, durante

a gestão estatal. Esse projeto foi viabilizado através de uma variação do Project

Finance, desenvolvido em parceria com o governo e empresas italianas. Enquanto

isso, a Embraer tem apostado nas parcerias de risco para o desenvolvimento de suas

aeronaves, modelo que vem sendo estruturado com sucesso em outros projetos da

empresa.

6.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E TRABALHOS FUTUROS

O estudo de casos específicos de financiamento de projetos é especialmente

relevante em função da pouca maturidade de sua literatura, especialmente a

modalidade Project Finance. O tema ainda é pouco explorado, e os estudos existentes

ou enfocam a operação sob a ótica das instituições financeiras e credores do projeto,

ou estão inseridos dentro de livros-manuais financeiros que não abordam de maneira

interdisciplinar o assunto. A área engloba diferentes aspectos – jurídicos, sociológicos,

financeiros, fiscais e de engenharia – devendo ser necessariamente tratada como um

199 http://www.boeing.com.

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CONCLUSÃO 147

processo interdisciplinar. O caráter multidisciplinar da engenharia da produção torna-a

um fórum apropriado para estudar o tema.

O desenvolvimento de um produto ou projeto é tradicionalmente tratado pela

engenharia de produção sem que se considerem importantes questões relativas ao

financiamento do investimento. Este trabalho busca contribuir para tratar o processo

de desenvolvimento de produtos de forma mais abrangente, incorporando a

engenharia financeira ao longo de todo o ciclo de vida de um empreendimento. Deve

existir uma adequação recíproca do projeto de engenharia e gestão do

desenvolvimento do produto com seu modelo de financiamento. O estudo dos projetos

apresentados nesta dissertação deixa clara a importância do financiamento como

vantagem competitiva de um produto ou serviço.

A resposta para a questão que se coloca à pesquisa não é simples nem única.

Independentemente da técnica selecionada para o empreendimento de um projeto, o

financiamento requer a elaboração de um plano ad hoc. A operação a ser escolhida

será aquela de maior congruência com as características particulares de um projeto.

Além do mais, sabe-se que outras questões estratégicas estão envolvidas em uma

decisão de financiamento, e não somente aspectos puramente financeiros. O

empreendimento de um Project Finance, por exemplo, acarreta na desvinculação do

projeto da empresa que o patrocina. Essa não é uma opção estratégica válida para o

desenvolvimento de muitos produtos e projetos.

O desenvolvimento crescente de novos serviços financeiros e a criatividade de

instituições e profissionais de finanças faz surgir, a todo o momento, novas alternativas

para financiar produtos e empreender projetos. As inovações advindas com o Project

Finance e as parcerias do Estado com a iniciativa privada são decisivas para a

efetivação de projetos em países sem condições para captar recursos necessários

para o desenvolvimento econômico e social. A adversidade do cenário financeiro

mundial exige que as empresas busquem formas imaginativas de captação de

recursos.

O pesquisador acredita na possibilidade de estender essa investigação a projetos de

pequeno e médio porte. As dificuldades desses projetos são ainda maiores, vide o

menor acesso ao conhecimento e linhas de financiamento disponíveis. Alguns autores

acreditam que o Project Finance não seria a modalidade mais adequada para esses

projetos, devido às suas características intrínsecas. Mas ainda não existem estudos

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PROJECT FINANCE 148

suficientemente conclusivos para constatar tal hipótese. Finnerty (1999) chama a

atenção para a ampla utilização do Project Finance em projetos de porte médio e de

baixo risco, como projetos de co-geração. Hoje, essa operação vem sendo aplicada

em projetos de tamanho e tipo diversificado.

Seria interessante estudar os benefícios da aplicação de Project Finance (ou no

mínimo de alguns de seus conceitos) para desenvolvimento de produtos de outros

setores, que não à infra -estrutura. As características dessa técnica ainda estão

bastantes aderentes a esses projetos, mas as possibilidades são enormes. A indústria

aeroespacial, por desenvolver projetos de alto risco, intensivos de capital e de longa

maturação, é candidata a tal experiência.

O estudo de financiamentos de projetos que fracassaram seria um outro tema de

pesquisa bastante oportuno. A partir da avaliação em maior profundidade das causas

do insucesso, poderíamos inferir se a modalidade escolhida para empreender o

projeto foi a mais aderente às suas características ou se houve falhas na montagem

do plano.

Outra possibilidade seria fazer uma análise completa de um projeto, considerando a

estruturação do ponto de vista de todos os stakeholders, e não somente de seus

sponsors. O NPV da Nova Dutra foi bastante satisfatório para seus acionistas. Mas

será que o NPV social (benefício social esperado menos custo social esperado) da

Nova Dutra foi positivo? E os usuários? Estarão satisfeitos com a administração

privada? Os parceiros de risco do ERJ-145 lucraram com o projeto? As companhias

aéreas sentem-se compensadas pela performance da aeronave? O BNDES recebeu

pontualmente o serviço da dívida? Os retornos obtidos pelas seguradoras

compensaram os riscos assumidos? Nessa abordagem, o plano também seria

analisado sob o ângulo dos fornecedores, credores, governo e seguradoras, além dos

sponsors.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 149

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PROJECT FINANCE 152

7.1 INFORMAÇÕES EXTRAÍDAS DAS REDES DE COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

http://web.mit.edu/1.45/www

http://www.andradegutierrez.com.br

http://www.bb.com.br

http://www.bdmg-mg.gov.br

http://www.bndes.gov.br

http://www.boeing.com

http://www.embraer.com.br

http://www.finep.gov.br

http://www.iadb.org

http://www.ibtta.org

http://www.members.aol.com/projectfin/intro.html

http://www.novadutra.com.br

http://www.standardpoor.com

http://www.worldbank.org

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GLOSSÁRIO DE TERMOS TÉCNICOS E FINANCEIROS 153

8 GLOSSÁRIO DE TERMOS TÉCNICOS E FINANCEIROS

Agency costs: custos incorridos pelos acionistas para evitar ou minimizar a

possibilidade de os administradores colocarem seus objetivos pessoais à frente

dos objetivos da empresa. Refletem direitos conflitantes de acionistas e

credores ao fluxo de caixa e aos ativos da empresa.

Alavancagem financeira: aumento de dívida em relação ao total de capital de uma

empresa. Aumento do risco e retorno ocasionado pelo uso de financiamento. Amortização da dívida: redução do serviço da dívida, geralmente de acordo com um

plano de reembolso acordado. Ano projeto: período de 12 meses a contar da data do início da operação do projeto.

Break even point operacional: nível de vendas necessário para cobrir todos os

custos operacionais. Buyer credit: arranjo de financiamento em que um banco do país do fornecedor

concede crédito para o comprador ou a um banco do país do importador da

mercadoria.

Cap: técnica empregada nos arranjos de hedge para minimizar os efeitos de

flutuação das taxas de juros. Capital de giro: medida de liquidez calculada subtraindo-se o passivo circulante do

ativo circulante. Carta de crédito: carta emitida pelo banco do comprador para o fornecedor externo,

afirmando que o banco garantirá o pagamento de uma dada fatura, se todas as

cláusulas contratuais forem cumpridas. Contrato off-take: contratos de venda garantida por um período longo. Geralmente

firmam acordos para venda mínima de lotes dos produtos de um projeto, com

um preço previamente acordado.

Contrato take-or-pay: contrato entre um comprador e um vendedor que obriga o

comprador a pagar uma quantia mínima em dinheiro por um produto ou serviço,

mesmo que o produto não seja entregue ou o serviço não seja fornecido. Esta

modalidade contratual é usada, na maioria das vezes, no setor de serviços

públicos, para financiamento de usinas geradoras de energia elétrica.

Cost overrun: desvios orçamentários e custos excedentes na construção do projeto.

Covenant: instrumento de atenuação de riscos que descreve as obrigações de fazer

e não fazer. Esses acordos descrevem as sanções, penalidades e demais

eventos.

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PROJECT FINANCE 154

Custos de transação: custos de negociação e conclusão de contratos e

relacionamento entre firmas.

Depreciação: redução do valor de um ativo ao longo do tempo.

Drawdown: plano de saques da linha de crédito.

Due diligence: planejamento detalhado das atividades do projeto e análise das

consequências das decisões financeiras. Efeito fuga: diminuição do tráfego por efeito do aumento da cobrança de pedágio.

Efeito qualidade: aumento de tráfego devido à melhoria das condições da rodovia,

levando à realocação de tráfego ou captação de demanda reprimida.

Equity kicker: incentivo de capital. É uma oferta de uma parte da propriedade em um

negócio que envolve empréstimos.

Financial advisor: assessor financeiro na montagem do financiamento.

Fluxo de caixa incremental líquido: diferença entre os recebimentos e pagamentos

de uma empresa, descontados os impostos, num dado período de tempo.

Free on board: o vendedor assume todas as responsabilidades e custos a partir de

um determinado estágio da entrega da mercadoria, incluindo transporte,

carregamento e seguros. Hedge cambial: operação que procura proteger o pagamento (em reais) de um

compromisso em dólar do impacto da desvalorização futura.

Hubs: aeroportos que concentram as operações de aviação de uma determinada

região geográfica ou companhia aérea.

Hurdle rate: taxa de retorno mínima aceitável para investir recursos em um projeto.

Índice de cobertura de juros: mede a capacidade da empresa para efetuar

pagamento de juros contratuais. Índice de cobertura de serviço da dívida: mede a capacidade da empresa para

satisfazer todas as obrigações de pagamentos fixos. Índice exigível a longo prazo-patrimônio líquido: indica a relação entre os recursos

de longo prazo fornecidos por credores e os recursos fornecidos pelos

sponsors. É usado para medir o grau de alavancagem financeira do projeto.

Índice de liquidez corrente: mede a capacidade do projeto para satisfazer suas

obrigações de curto prazo. Insolvência técnica: ocorre quando uma empresa é incapaz de pagar suas

obrigações em seu vencimento.

Major: companhias que operam com grande volume de passageiros, em rotas

internacionais, geralmente através de jatos com capacidade para mais de 120

assentos.

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GLOSSÁRIO DE TERMOS TÉCNICOS E FINANCEIROS 155

Margem bruta: mede a porcentagem de cada unidade monetária de venda que

restou, após a empresa ter pagado seus produtos.

Milha náutica: 1,9 km.

Multiplicador da tarifa: fator multiplicativo, aplicado à tarifa básica de pedágio, para

se obter a tarifa para os veículos de diferentes categorias.

Off-balance-sheet: uma obrigação corporativa que não aparece como dever no

balanço patrimonial da empresa.

On-balance-sheet: uma obrigação corporativa que aparece como dever no balanço

patrimonial da empresa. Organização: estrutura legal de uma empresa.

Outsourcing: terceirização de etapas da cadeia de valor de uma empresa.

Payback: tempo que o negócio leva para retornar o investimento inicial feito. Quanto

menor o payback, mais atraente o projeto.

Performance bond: um bônus ou garantia dada por um banco, de uma percentagem

específica do valor do contrato, em favor da empresa-projeto em nome de um

contratado ou fornecedor. Pagamento com a produção: estrutura de financiamento em que o serviço da dívida

é amortizado com pagamentos periódicos, através das receitas advindas da

produção.

Project’s completion: complementação total do projeto (superadas as fases de

complementação técnica e financeira).

Project’s financial completion: complementação financeira do projeto (atrelada aos

resultados financeiros).

Project’s technical completion: complementação técnica do projeto (conclusão

física).

Companhias Regionais: companhias que operam com menor volume de

passageiros, geralmente através de jatos com capacidade para menos de 70

assentos.

Royalty: uma participação da produção ou receita reservada para o concessor da

licença.

Scope clauses: restrições impostas por sindicatos de pilotos norte-americanos para

operação de jatos entre 70 e 110 assentos.

Serviço da dívida: o pagamento programado de prestações de juros, taxas,

comissões e principal, de acordo com um plano de financiamento.

Sponsors: patrocinadores principais do empreendimento.

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PROJECT FINANCE 156

Spread: a diferença entre o preço que um banco de investimento paga por um título e

o seu preço de venda.

Stakeholders: partes envolvidas no projeto.

Swap: troca de uma dívida, moeda ou taxa de juros por outra.

Trustee: encarregado da administração da conta.

Turnkey: contrato para a construção de um projeto e instalação de todas unidades,

onde o contratado irá entregá-lo no momento em que ele estiver pronto para

imediata operação.

Valor residual: valor total de caixa recebido e/ou despendido no término do projeto.

Veículo equivalente: número de veículos em determinada categoria multiplicado por

seu respectivo multiplicador de tarifa.

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ANEXOS 157

9 ANEXOS

9.1 ANEXO A - WEB SITES COM INFORMAÇÕES SOBRE PROJECT FINANCE

a) Institute of International Project Financing: informações gerais;

http://members.aol.com/ProjectFin/intro.html

b) Loan Pricing Corporation: informações de empréstimos de Project Finance;

http://www.loanpricing.com/products.html

c) PRS Group: análises de riscos políticos e de países;

http://www.prsgroup.com/

d) International Investor Magazine: rankeamento de riscos de países;

http://www.institutionalinvestor.com/

e) CapitalDATA Ltd: informações específicas de projeto.

http://www.capitaldata.com/

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PROJECT FINANCE 158

9.2 ANEXO B - EXEMPLOS DE PROJETOS INTERNACIONAIS

TABELA 27

Projetos internacionais financiados por Project Finance

Projeto Descrição País

Geotérmico Coso Extração de energia do interior da Terra na forma de vapor Estados Unidos

Minério de Ferro Hamersley Extração de minério de ferro Austrália

Campo Petrolífero Hibernia Produção de petróleo Estados Unidos

Energia Paiton Geração de energia elétrica Indonésia

Mineração Lornex Extração de cobre-molibdênio Canadá

Craqueamento Pembroke Craqueamento para refinarias País de Gales

Veio de Carvão Pittsburgh Exploração de carvão mineral Estados Unidos

Alumina Queensland Exploração e processamento de bauxita Austrália

Mineração Reserve Mineração de taconita e transformação em pellets

Estados Unidos

Sistema de Dutos Trans-Alasca (TAPS)

Transporte de petróleo cru e gás natural liquefeito Estados Unidos

FONTE: Finnerty, 1999:317

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ANEXOS 159

9.3 ANEXO C - EXEMPLOS DE PROJETOS BRASILEIROS

TABELA 28

Projetos brasileiros financiados por Project Finance

Projeto Descrição Estado

Ponte Rio-Niterói Rodovia pedagiada Rio de Janeiro

Campo Petrolífero Marlim Produção de petróleo Rio de Janeiro

Gasoduto Brasil-Bolívia Transporte de gás naturalSão Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul

Central Termelétrica Iguatemi

Geração de gás natural Bahia

Fábrica de Celulose Guaíba

Expansão da capacidade de fabricação de celulose Rio Grande do Sul

Usina de Cana Brava Geração de energia elétrica Tocantins

Usina Dona Francisca Geração de energia elétrica Rio Grande do Sul

Termelétrica Fortaleza Geração de energia elétrica Rio Grande do Norte

Rio Polímeros Produção de polietileno Rio de Janeiro

Empresa Catarinense de Transmissão de Energia

Linha de transmissão Sul-Nordeste

FONTE: Moody’s Project Finance Sourcebook (2000), Andrade Gutierrez Concessões,

BNDES200e Gazeta Mercantil201.

200 Informações obtidas no web site do BNDES, http://www.bndes.gov.br. 201 Moglia. Klabin investirá US$450 milhões na Riocell; Tachinardi. Iniciativa privada recebe apoio; Manso. Petros acha rentável aplicar em térmicas; Severo. Pólo gás-químico sai do papel e Saraiva. Linha de transmissão terá recursos do BNDES. Gazeta Mercantil.

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PROJECT FINANCE 160

9.4 ANEXO D - VEÍCULOS EQUIVALENTES A SEREM PEDAGIADOS POR ANO

TABELA 29

Projeção de veículos a serem pedagiados

1 6.553.759 8.245.899 9.012.581 7.435.964 31.248.203

2 13.790.795 17.368.160 18.997.520 15.679.670 65.836.145

3 14.506.560 18.276.280 19.985.210 16.504.570 69.272.620

4 15.256.270 19.174.910 20.974.725 17.339.690 72.745.595

5 16.030.800 20.110.040 21.992.710 18.182.475 76.316.025

6 16.634.145 20.846.610 22.773.810 18.842.395 79.096.960

7 17.252.455 21.582.815 23.553.085 19.505.600 81.893.955

8 17.888.285 22.317.195 24.326.155 20.160.045 84.691.680

9 18.536.160 23.042.450 25.091.560 20.813.030 87.483.200

10 19.201.555 23.770.260 25.868.280 21.461.635 90.301.730

11 19.851.255 24.472.520 26.599.010 22.087.975 93.010.760

12 20.511.175 25.167.845 27.328.645 22.708.110 95.715.775

13 21.151.750 25.842.000 28.042.950 23.309.265 98.345.965

14 21.793.785 26.521.265 28.752.145 23.908.960 100.976.155

15 22.413.920 27.181.915 29.437.615 24.465.950 103.499.400

16 23.012.885 27.808.255 30.098.995 25.011.625 105.931.760

17 23.586.300 28.426.565 30.736.650 25.548.905 108.298.420

18 24.160.080 29.032.830 31.360.070 26.067.570 110.620.550

19 24.714.880 29.619.385 31.944.435 26.572.000 112.850.700

20 25.270.410 30.177.835 32.510.550 27.066.940 115.025.735

21 25.799.660 30.699.785 33.059.510 27.561.150 117.120.105

22 26.306.280 31.201.295 33.578.175 28.022.510 119.108.260

23 26.758.150 31.681.270 34.063.625 28.468.540 120.971.585

24 27.195.420 32.149.565 34.537.030 28.842.300 122.724.315

25 28.163.400 32.565.300 34.994.740 29.197.445 124.920.885

TOTAL 516.340.134 627.282.249 679.619.781 564.764.319 2.388.006.483

TOTALANO VIÚVA GRAÇA ITATIAIA MOREIRA CESAR PARATEÍ

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: a) veículo equivalente: número de veículos em determinada categoria

multiplicado por seu respectivo multiplicador de tarifa (TAB. 20); b) fluxo bidirecional.

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ANEXOS 161

9.5 ANEXO E - DEMONSTRAÇÃO DA RECEITA DE PEDÁGIO.

TABELA 30

Projeção de receita

1 31.248.203 74.683.205,17

2 65.836.145 157.348.386,55

3 69.272.620 165.561.561,80

4 72.745.595 173.861.972,05

5 76.316.025 182.395.299,75

6 79.096.960 189.041.734,40

7 81.893.955 195.726.552,45

8 84.691.680 202.413.115,20

9 87.483.200 209.084.848,00

10 90.301.730 215.821.134,70

11 93.010.760 222.295.716,40

12 95.715.775 228.760.702,25

13 98.345.965 235.046.856,35

14 100.976.155 241.333.010,45

15 103.499.400 247.363.566,00

16 105.931.760 253.176.906,40

17 108.298.420 258.833.223,80

18 110.620.550 264.383.114,50

19 112.850.700 269.713.173,00

20 115.025.735 274.911.506,65

21 117.120.105 279.917.050,95

22 119.108.260 284.668.741,40

23 120.971.585 289.122.088,15

24 122.724.315 293.311.112,85

25 124.920.885 298.560.915,15

TOTAL 2.388.006.483 5.707.335.494,37

ANO VEÍCULOS EQUIVALENTES (1)

RECEITA BRUTA R$ x 1,00 (2)

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: a) base de preços maio/1995; b) (1) veículos equivalentes a

serem pedagiados por ano (bidirecional); c) (2) coluna (1) x tarifa básica

(R$2,39).

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PROJECT FINANCE 162

9.6 ANEXO F - DEMONSTRATIVO DO RESULTADO CONTÁBIL

TABELA 31

Projeção anual demonstrativo do resultado contábil

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: a) base de preços maio/1995 (R$ x 1,00).

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ANEXOS 163

9.7 ANEXO G - DEMONSTRATIVO DO RESULTADO FINANCEIRO

TABELA 32

Projeção anual demonstrativo do resultado financeiro

FONTE: Andrade Gutierrez Concessões.

NOTA: base de preços maio/1995 (R$ x 1,00)

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PROJECT FINANCE 164

9.8 ANEXO H - FAMÍLIA DE JATOS REGIONAIS DA PLATAFORMA ERJ-145

5050

4444

3737

AssentosAssentos

AeronavesAeronaves

ERJERJ--135135

ERJERJ--140140

ERJERJ--1451455050

4444

3737

AssentosAssentos

AeronavesAeronaves

ERJERJ--135135

ERJERJ--140140

ERJERJ--145145

FIGURA 16 - Família de jatos regionais derivados do ERJ-145

FONTE: Embraer, 2002

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ANEXOS 165

9.9 ANEXO I - PARCEIROS DE RISCO DO EMBRAER 170/190

SONACA S.A.SONACA S.A.SONACA S.A.SONACA S.A.SONACA S.A.SONACA S.A.

GE Aeronave EnginesGE Aeronave EnginesGE Aeronave Engines

FIGURA 17 - Parceiros de risco x pacotes do EMBRAER 170/190

FONTE: Embraer, 2002