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FACULDADE DE SÃO BENTO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM FILOSOFIA MESTRADO ACADÊMICO VITÓRIA GAMBALE Apontamentos sobre a ética nicomaqueia de Aristóteles São Paulo 2016

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FACULDADE DE SÃO BENTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM FILOSOFIA

MESTRADO ACADÊMICO

VITÓRIA GAMBALE

Apontamentos sobre a ética nicomaqueia de Aristóteles

São Paulo

2016

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VITÓRIA GAMBALE

Apontamentos sobre a ética nicomaqueia de Aristóteles

Dissertação apresentada na Faculdade de São Bento, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Filosofia, linha de pesquisa em Ética e Política.

Data da Aprovação: 21/11/2016 Banca Examinadora:

Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva Faculdade de São Bento

Prof. Dr. José Carlos Bruni Faculdade de São Bento

Profª. Drª. Gabriela Bal

Faculdade de São Bento

São Paulo

2016

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Ética, mera questão de estética?

Será que numa sociedade tão quantificada pelo mercado

existe espaço para valores qualitativos da ética? Diante

da impunidade de políticos comprovadamente antiéticos,

há esperança de que bens infinitos, como acentuava o

professor Milton Santos, tenham prevalência sobre bens

finitos? Ou seria a ética uma mera questão de estética,

emoldurando a mulher de César, ainda que ela não

seja honesta?

Frei Betto

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RESUMO

A ética pertence essencialmente ao mesmo campo da política e é nela que se constitui a abordagem do presente trabalho. Os textos: o bem objetivo final, akrasia, eudaimonia, deliberação da razão prática, o aprender a ser bom, os métodos da ética, a permanência da felicidade, virtude e razão, a doutrina do meio termo, Aristóteles e a educação e a comunidade política e o bem supremo nos remetem à conduta do indivíduo humano. O principal e importante para Aristóteles era o agir de forma virtuosa e nos tornar boas pessoas. Além de vários fatores, acentua que a idade madura traz o benefício da compreensão, da experiência e de certa forma uma desintoxicação da supremacia dos desejos e proporciona assim uma deliberação reta. Ele observa também a importância do intermediário, pois o excesso ou deficiência não levam ao caminho da boa ação e resultam na distância do homem daquilo que é certo. As leis e constituições boas proporcionam às pessoas viverem de forma decente, educada e feliz e finalmente, para Aristóteles a vida sumamente feliz só é alcançada quando ocorre a participação do líder (devidamente educado, instruído e conhecedor das legislações) que aplica seus conhecimentos no interesse da política de sua cidade. Palavras-chave: Aristóteles, ética, bem, Nicômaco, , virtude, felicidade, polis.

ABSTRACT Ethics belongs essentially to the same field of politics and it is in it that the approach of the present work is constituted. The texts: the final objective good, akrasia, eudaimonia, deliberation of practical reason, learning to be good, methods of ethics, permanence of happiness, virtue and reason, the doctrine of the middle ground, Aristotle and education and community Politics and the supreme good refer us to the conduct of the human individual. The main and important thing for Aristotle was to act virtuously and to become good people. In addition to several factors, he emphasizes that mature age brings the benefit of understanding, of experience, and in a sense a detoxification of the supremacy of desires, and thus provides straightforward deliberation. He also notes the importance of the intermediary, because excess or deficiency does not lead to the path of good action and results in man's distance from what is right. Good laws and constitutions allow people to live in a decent, educated and happy way, and finally, for Aristotle, extremely happy life is only achieved when the leader (properly educated, knowledgeable and knowledgeable) takes part who applies his knowledge to the interest Of the politics of his city. Key words: Aristotle, ethics, passion, Nicomachean, virtue, happiness, polis.

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SUMÁRIO

1. O BEM – OBJETIVO FINAL....................................................................................5

2. A AKRASIA EM ARISTÓTELES.............................................................................9

3. A EUDAIMONIA ....................................................................................................16

4. DELIBERAÇÃO DA RAZÃO PRÁTICA ................................................................20

5. APRENDER A SER BOM SEGUNDO ARISTÓTELES ........................................25

6. ARISTÓTELES E OS MÉTODOS DA ÉTICA .......................................................31

7. A PERMANÊNCIA DA FELICIDADE......................................................................36

8. VIRTUDE E RAZÃO...............................................................................................42

9. POR UMA LEITURA DIALÉTICA .........................................................................46

10. A DOUTRINA ARISTOTÉLICA DO MEIO TERMO ............................................51

11. ARISTÓTELES E A EDUCAÇÃO .......................................................................61

12. A COMUNIDADE POLÍTICA E O BEM SUPREMO ............................................65

CONCLUSÃO ............................................................................................................75

BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................81

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1

INTRODUÇÃO

Dos atenienses mais conhecidos, Aristóteles foi o escolhido para esta

abordagem sobre Ética. É interessante observar o roteiro utilizado pelo filósofo, pois

leva-nos a pensar numa exposição metódica como explicitado no Discurso do

Método de Descartes, visto que em toda a leitura realizada percebe-se que há várias

divisões, ordenamento de pensamentos, graduação de complexidade e a

demonstração visível de racionalidade nas suas observações.

Nossa pretensão é tentar expor aspectos da Ética de Aristóteles de uma

maneira resumida e simples, mas que remeta, a quem fizer a leitura, a pensar no

comportamento atual e a uma reflexão pessoal de como nos relacionamos com a

Ética. Aristóteles é uma referência obrigatória sobre o pensamento político, como

também o Estado, o direito e as relações nas comunidades; um clássico, com a

demonstração escrita sobre seu pensamento com base na Antiguidade grega que,

incansável, permite fazer uma reflexão devida para um debate contemporâneo.

Ainda que a tecnologia nos dê a sensação de que vivemos no melhor dos

mundos ou no melhor momento, sentimos a falta de noções éticas. Vivemos numa

sociedade moderna, materialista, onde o tradicional é questionável, onde é presente

a corrupção viciosa em especial no poder político; vivemos numa sociedade que

gera conteúdos superficiais. Nos trabalhos deixados por Aristóteles pode-se

perceber o cuidado que deveria ser aplicado na administração do Estado, ao propor,

inclusive, um Estado perfeito onde pudesse ser garantido o direito de todos.

Desde a nossa infância até o início da vida adulta, construímos dentro do

nosso saber comum a informação da necessidade de nos sairmos bem, no sentido

de vivacidade, da argúcia e de sagacidade e não há uma reflexão moral de como

formamos essa base e como as alcançamos. É muito difícil uma decisão acertada,

há um embate frequente entre a inteligência X influências X paixões e só nos damos

conta dele no momento do agir, quando nos deparamos com as nossas sensações e

com a nossa razão prática. O exercício da virtude se faz com a superação da

fraqueza moral.

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Ainda que os Deuses na Antiguidade tivessem influência profunda, não se

identifica essa intervenção nos textos apresentados. Por outro lado, ainda que a

retórica pudesse ser utilizada para fins injustos, é dito textualmente que os sofistas

dessa época eram homens honrados. Portanto, ainda que houvesse transgressões

na Antiguidade, as observações ora colocadas demonstram que existia, de maneira

geral, a responsabilidade de ter comportamentos virtuosos, que não havia espaço

para a presença constante da necessidade da coação e muito menos se utilizavam

da desculpa do poder dos deuses para atos falhos, bem como da penalização de

uma forma restrita – somente para os que estivessem fora desse comportamento

adequado.

Podemos ainda dizer que a alma permanece enferma quando na nossa vida

cotidiana a ética não está presente. Compreender a estrutura da ética nos levará

não só a deliberar bem, como a acentuar nos homens a tarefa do agir bem e nos

tornar verdadeiros cidadãos e influenciar a comunidade onde se vive.

O ser virtuoso precisa ouvir e obedecer à razão, e esta deve estar acima dos

sentimentos de prazer e de dor e deve ter em mente os benefícios e as finalidades

dos demais indivíduos envolvidos. Somado a isso é importante a presença de

amigos, familiares e a participação no Estado como outras formas de sociabilidade

para o viver bem. O alcance do bem supremo ocorre com o exercer do papel social

e político alcançado com o pertencer a pólis.

Ainda na vertente da virtude temos que falar sobre a felicidade, visto que para

Aristóteles a felicidade é vulnerável enquanto que a virtude é permanente. É na

adversidade que a virtude se mostra, quando existente. A virtude fornece a

serenidade para passar por situações de sofrimento, flagelos ou fatalidades.

Aristóteles acrescenta a fortuna à felicidade no sentido de que a prosperidade

material não torna o homem mais feliz, mas a prosperidade material proporciona a

multiplicação de ações virtuosas e também proporciona ao virtuoso a característica

da estabilidade. Para Aristóteles a pessoa só pode ser considerada feliz se nada

falta ou nada pode lhe ser acrescentado, bem como só pode ser avaliado se o

homem foi ou não feliz após a morte, ou seja, é preciso verificar como foi a vida

dessa pessoa. Se nada de desfavorável aconteceu então essa pessoa pode ser

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considerada feliz. Só uma vida completa poderá dizer ou considerar se o homem foi

feliz ou infeliz.

Na direção da felicidade está a Política de Aristóteles, onde a educação

desenvolve as condições necessárias para a promoção de uma cidade perfeita e um

cidadão feliz. Para essa educação, é necessário tempo para a estimulação e tempo

para transformar em hábito a virtude. O projeto educacional colocado por Aristóteles

demonstra a intervenção do Estado desde o casamento até a vida adulta do

cidadão, orientando cada momento com a finalidade de alcançar um bom governo,

com vista ao interesse geral e a infundir no cidadão conceitos e a prática da virtude,

assegurando normalidade e progresso das cidades.

Para Aristóteles há uma organização em andamento, mesmo antes do

nascimento da criança. É importante a formação intelectual além do treinamento

militar, visto que no momento de paz é necessária a habilidade da vivência em

sociedade, e somente através da educação os cidadãos podem usufruir e

compartilhar coletivamente a moderação e a tenacidade.

Com relação às crianças Aristóteles faz um traçado onde até os cinco anos

ele não aconselha a encaminhá-las aos estudos, mas, ao exercício do corpo de

forma a evitar a indolência corporal. Aconselha também um controle de natalidade,

pois cidades muito povoadas geram insatisfações que ocasionam um desequilíbrio

nas cidades. Aos mais jovens não é permitida a participação em espetáculos

dioníacos, pois se participassem estariam expostos a excessos, inclusive ao vinho.

Somente a idade adulta poderia imunizá-los dos efeitos insalubres, demonstrando,

portanto, que a negligência na educação causaria um grande mal à cidade.

E àqueles que impõem um rigor e práticas impiedosas às crianças e

proporciona a elas a ignorância do conhecimento, na realidade estão preparando

esses futuros adultos a meros trabalhadores braçais e úteis apenas para uma única

tarefa. Para Aristóteles pais muito jovens não vão transmitir a segurança na

formação. As mulheres devem se casar por volta dos 18 anos e os homens aos 37.

A restrição à natalidade vai proporcionar uma cidade bem educada e de fácil

governabilidade, pois o excesso de moradores não é compatível com uma cidade

feliz.

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Para Aristóteles há uma fluência que inicia antes da concepção e termina com

a participação na Pólis e é, por meio desse planejamento e organização que a ética

se desenvolve, modelando no homem o ser e pensar ético. Portanto, neste trabalho

está concentrada uma breve exibição de discussões que podem também ser

contemporâneas sobre o pensamento ético de Aristóteles. Para ele, eram visíveis as

imperfeições humanas e isso gerava problemas de conduta e de caráter. A

visibilidade realista de Aristóteles permitiu elaborar várias pesquisas e observações

em todos os campos e permitiu há mais de dois mil anos o conhecimento da

abrangência atordoante de suas obras em todas as áreas do empreendimento

humano.

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1. O BEM - O OBJETIVO FINAL

Toda pessoa tem um fim ou objetivo único que se propõe a alcançar. O bem

para o diretor de uma ópera é o drama bem encenado acompanhado de uma

magistral orquestra sinfônica. Não se trata apenas de uma apresentação, mas de ir

além da melhor apresentação, de tal modo que as pessoas tenham gravado em sua

memória as cenas executadas e ao final os aplausos sejam extensos, demonstrando

todo o seu louvor e fervor ao espetáculo apresentado.

E assim é o ser humano, ele se propõe a fazer que sua vida seja reta, seja a

melhor, de maneira que, o bem final seja suficiente por si mesmo. Aristóteles se

prende na observação que deve haver um objeto que seja desejado por si mesmo.

Há pessoas que têm oportunidade de estabelecer para si um objetivo e a partir disso

focam a organização e planejamento nessa direção. Esse objetivo pode ser a honra,

como também pode ser a fama, riqueza ou cultura. Mas se com toda essa noção e

visão ela não se move adequadamente nessa direção é um sinal que lhe falta

lucidez, misturado talvez com imaturidade.

Nessa trajetória, vamos passar a falar de desejos. Muitas vezes os desejos

são difíceis de serem alcançados e outras vezes através dele se chega a outros.

Quando se fala em desejo tem-se como correspondência a felicidade. O desejo vem

representar que a felicidade não é um ato puro, mas em potência, e o desejo é a

ligação que existe para se alcançar o bem final. Aristóteles acredita que se há mais

de um objeto, o último será o que buscamos. Nessa colocação há duas vertentes a

se pensar: que a felicidade não é um fim de segunda ordem e que se se

conquistasse apenas um de seus objetos o custo da perda dos outros seria alto

demais.

Para Aristóteles havia coisas desejáveis por si mesmas e que estariam

situadas num grau superior ao que poderia ser desejável apenas como útil: o que

leva a formular o fim supremo como dominante e não como inclusivo. Um plano de

vida é um fim dominante, assim como a contemplação na vida de um filósofo. O bem

supremo como dominante é representado através da administração da família e a

participação do Estado, pois ao homem é necessário a participação social, ou seja, é

muito bom que José seja feliz, mas é muito melhor se José, Pedro, Laura e Ricardo

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estejam também felizes. O dominante é a máxima felicidade, acompanhada pelo

maior número de pessoas – a felicidade também se realiza através da felicidade

alheia. Há, portanto, uma subordinação entre o inclusivo e dominante, onde A é o

ser humano, e B o Estado. Esta relação leva A a construir um ambiente favorável

para que racionalmente pratique não só a virtude moral, mas pratique a mais perfeita

porque somente isso leva a identificar o humano em um ser verdadeiramente feliz. A

pessoa B vê o ser verdadeiramente feliz como dominante, e isso o ajuda na medida

que vai de encontro com a sua vocação que é o superior e mais perfeito, presente

no alcance da felicidade da cidade através de seus cidadãos .

Aristóteles parte do princípio que o processo começa pela concepção de um

fim e a partir desse início é que se abre o caminho, invertendo a ordem para

identificação dos meios. O ser humano não tem um único interesse, há um leque de

alvos a ser decidido por ele que vai levá-lo a um caminho cujo resultado será a

resposta de como ele pretende viver. A decisão pelos diversos alvos tem o papel

inclusivo. Assim, quando ele passa a perseguir especificamente e apaixonadamente

determinados alvos, então podemos considerá-los como dominante para este

cidadão.

Aristóteles fala também do “homem virtuoso”, que pode ser na realidade, um

egoísta calculador, ou ainda ele é um prudente somado ao autointeresse. Pode-se

dizer que uma pessoa será considerada egoísta se não demonstrar qualquer

interesse pelo bem estar de quem quer que seja e que não faça parte de seu círculo

pessoal. Estabelecemos aqui a diferença na interpretação do que vem a ser o

egoísmo, visto que ele pode representar ações negativas, como também pode

representar ações positivas: é representado positivamente na medida que ele

corresponde à motivação humana. Uma pessoa voltada com fim exclusivo às suas

realizações não pode ser criticada e muito menos ser vista de forma negativa. Ainda

que ocorram as mais diversas sensações e estas poderão nem sempre serem

aceitas como decorrentes, o desejo as move para essa direção e não há críticas a

isso, mas a compreensão de que o homem existe de forma individual; ele vai,

gradualmente, se socializando e internalizando as amizades, famílias e a cidade de

tal forma que esse egoísmo, apontado inicialmente, será levado a um grau de

simples referência na motivação humana e direcionada não só ao bem estar

individual, mas da família, amigos e da cidade.

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Finalizando os elementos contidos sobre o bem final para o homem, pode-se

dizer que o homem sempre tem algum plano e ainda que tenha um número grande

de desejos, ele tem um propósito ligado ao que julga ser melhor para si e de acordo

com a sua forma de viver.

Outro elemento entrelaçado ao bem final na ética é o plano a ser perseguido.

Ainda que para Aristóteles o indivíduo possa preferir um breve período de intenso

prazer a uma longa temporada de magro deleite, essa explicação não se fortifica,

pois no período de uma vida inteira pode haver, em algum momento, o viver de um

imenso prazer e ainda a realização de atividades dentro da mais perfeita virtude.

A felicidade de acordo com Aristóteles nem sempre está sob o controle do

homem, muitos eventos acontecem. Quando estes são positivos levam sem esforço

o homem à felicidade, porém se o contrário acontece, o homem pode mostrar uma

nobreza se o suportar resignadamente. O homem sábio e bom saberá passar pelos

infortúnios, tirando o melhor que essa situação negativa possa proporcionar.

Portanto, o valor do homem não consiste somente na conquista, mas em superar os

percalços que estão fora de seu controle e de seu planejamento.

Para Aristóteles, o fim último leva à felicidade, essa felicidade é identificada

com o viver bem e fazer o bem, a virtude pertence ao homem melhor, o bem é a

máxima realização que o homem quer atingir, embora particular, ao mesmo tempo

ele transcende o individual e se realiza com o bem maior desejado por todos.

Quanto mais ético e virtuoso o homem for, mais feliz ele se tornará e como Deus é o

princípio e o fim de toda ação e os deuses são plenamente felizes, pois nada lhe

falta, e uma vez que o humano recebe esses reflexos da felicidade perfeita, ele se

move através de seus desejos e habilidades para alcançar essa concepção.

Assim, as ações virtuosas são absolutamente agradáveis, nobres e

boas pela sua própria natureza e não há a necessidade de acréscimo para

aumentar a sua grandiosidade. A felicidade é escolhida por si própria não em

função de outra coisa, bem como ela é o mais excelso e melhor dentre todas

as coisas; ela não pode ser obtida através da aprendizagem, por treinamento

ou de providência divina, ela é uma atividade virtuosa e reside em nós; é

alcançada por todos os humanos que não estejam impedidos de exercer

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ações virtuosas e para sua existência é necessário uma vida completa. Se o

homem for verdadeiramente feliz ele o será durante toda uma vida porque

estará sempre empenhado em realizar ações virtuosas, e mesmo em

condições adversas ele será virtuoso pela nobreza e grandeza de sua alma.

O Bem Supremo é o ponto final e para isso é preciso toda uma vida

humana, acrescida de uma ordenação a esse último fim. Muitas vezes ao que

é chamado de fim, são na verdade meios para alguma outra coisa. Há vários

tipos de fim, mas o fim mais importante são os desejados por si mesmo e

nunca desejado por conta de outro fim e, portanto, este é o absolutamente

mais perfeito. O Bem Supremo também é o mais desejado porque através

dele o homem com seu alcance multiplica-o nas relações que ele se encontra.

Por fim, a doutrina de Aristóteles do bem final é a capacidade que o ser

humano tem de refletir a respeito de seus desejos e escolher um caminho

satisfatório para sua vida e o que não lhe pode ser tirado é essa vontade ou

essa disposição para esse alcance que é representado como o respeito

próprio, entendido como um princípio de dever.

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2. A AKRASIA EM ARISTÓTELES

“Fazer o que se sabe ser errado é o que se chama de akrasia”.1 Denominada

também como incontinência, indicando também estado de submissão, quer pela ira

quer pelo prazer. A akrasia felizmente ocorre de vez em quando. Para Aristóteles o

indivíduo sabe o que é errado, mas quando tomado pela paixão esta o arrasta e o

envolve na ignorância.

Assim Aristóteles quer dizer que o acrático sabe que seu ato é errado no

sentido de que ele possui esse conhecimento, porém comete o ato porque não está

nesse momento usando esse conhecimento intelectual que existe no indivíduo, pois

no momento da ação ele não o utiliza. Aristóteles mostra quatro soluções que

considera correta e que atenua e justifica esse lapso:

1. Há diferença entre o tempo que se credita um conhecimento e que não

usamos e o tempo que possuímos e usamos. Exemplo: a língua árabe só possui

três vogais e 22 consoantes e a escrita é feita da direita para a esquerda. Antes

dessa informação ser exposta, os ouvintes não possuíam esse conhecimento e

assim que termina essa exposição, os ouvintes tanto possuem o conhecimento

quanto o utilizam, porque isso já está em sua mente, porém, ainda que ele saiba,

não significa que ele estará sempre pensando nisso e que isto estará sempre

presente em sua mente.

2. A relação entre a premissa universal e a premissa individual. Exemplo:

Todas as melodias inspiradas em bebês são agradáveis. Aristóteles parte do

princípio que o homem ao utilizar um silogismo universal, poderá, em uma ação,

incorrer numa informação falsa ou ainda em algo proibido, não revelado nesse

silogismo, ainda que a premissa universal muitas vezes possua dois termos – como

no exemplo melodia e bebês ele usa apenas uma parte, o que não lhe permite

alcançar o que o silogismo prescreve.

1 ROBINSON, R. Aristote et L’Acrasie. Publicado originalmente em francês na Revue Philosophique, v 145, 1955. In: ZINGANO, 2010, p. 65.

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3. Possuir, mas não usar, o que equivale dizer que durante o ato, o acrático

possui o conhecimento de uma forma superficial e não profunda decorrendo daí algo

falho e, portanto, errado.

4. Conhecido o silogismo é necessário o agir, o ato é necessário e precisa ser

verificado se o agente tem a habilidade e se este não está impedido de agir.

Aristóteles não comenta sobre o que fará um homem se possuir o silogismo

plenamente atualizado em sua mente, e nem mesmo divulga se essa hipótese é

possível.

Muitos homens praticam a akrasia porque são arrastados por uma paixão. O

homem têm consciência daquilo que é errado e nesse preciso momento fica apático

e a razão não prevalece. Há momentos em que a razão não consegue persuadir o

homem, então os impulsos são mais fortes e estes prevalecem perante a razão.

Nesse momento ocorre não a ignorância mas, o que prevalece é a sensação que o

prazeroso é bom e se ele é bom não há porque ser combatido. Pode também ser

citado aqui o exemplo de Adão e Eva (desconsiderando a religião e se atendo tão

somente à história): afirmar que ambos foram acráticos, visto que era sabido por

ambos que não podiam comer do fruto proibido da árvore da ciência e o que mais

chama a atenção é que Adão e Eva possuíam a perfeição e mesmo com a natureza

da perfeição a impressão que se tem é a de que foram levados pela concepção de

que aquilo deveria ser bom.

Está presente aqui um confronto entre a razão e o instinto e é isso que

Aristóteles quer provar com a akrasia. A razão e o desejo brigam entre si e para

aquele que possui discernimento, que é capaz de ponderar e refletir chegará a

imaginar o depois e com isso estará configurada a presença da razão e o

distanciamento da akrasia. Mas se o contrário acontece, é observado que o homem

só consegue verificar o imediato e a sua natureza animal preponderará para a

decisão em favor do desejo. A dificuldade para o homem está em estabelecer nesse

momento o que é bom e o que é mau. Em qualquer das decisões e para os menos

experientes, qualquer ação estará representada pelo bem. A razão não é capaz de

entrever no desejo o mau.

De um lado pode-se afirmar que o homem é responsável pelos seus atos, por

outro lado não se pode negar a sua natureza imperfeita. Há momentos também que

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o homem não tem conhecimento do que faz. Isto acontece no momento de ira ou de

embriaguez. Não há como ter discernimento e autocontrole nesses momentos, muito

menos aparece aqui o combate entre a consciência e o desejo, simplesmente a ira e

a embriaguez vencem e se sobrepõem a qualquer ordenamento.

Aristóteles defende também a ideia de Sócrates de que o conhecimento que

um homem possui não pode escravizá-lo, ou seja, o conhecimento lidera e governa

o homem, mas o conhecimento não torna inconsistente outra ideia, daí se concluir

que algumas vezes a akrasia acontece. O homem não pode aceitar tudo como

regra, que pode até valer para mais de uma vez, mas, isso não significa que sempre

será assim. O tempo é dinâmico e por isso não se pode admitir que nada mude, que

tudo permaneça constante. Aristóteles quer apenas demonstrar que não há

inconsistência em Sócrates, mas que também deve ser incluído que algumas vezes

o que parece ser constante também se move ou ainda podem ocorrer variações.

Para o comentador Richard Robinson, a akrasia que não precisa ser

explicada é aquela que no momento do ato, o homem não tem totalmente a noção

do erro. Para ele o que precisa ser explicado é quando um homem age de modo

errado e no momento desse ato ele sabe que está errado. O que precisa ser

explicado é o que Aristóteles não consegue explicar, ou seja, quando o homem age

de modo errado e este tem a consciência desse ato falho:

[...] na minha interpretação parece que o único tipo de akrasia que precisa de explicação é precisamente o único tipo que Aristóteles não explica, pois na minha interpretação as quatro soluções não afirmam senão que o acrático, no momento de seu ato, não tem totalmente em mente todas as partes do silogismo que o deve governar2

Ainda de acordo com o Richard Robinson (1955) a alma humana não está

apta a realizar duas coisas ao mesmo tempo e durante o tempo que prevalece essa

paixão ele não pode lembrar-se do que caracteriza o erro. Richard Robinson

concorda com Aristóteles que durante a crise da paixão o acrático é como um

bêbado que não tem consciência do que fala.

2 Ibidem, p. 73.

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Ainda quanto à akrasia, Aristóteles não comenta como se processa a luta

moral, como se dá a luta entre um desejo e um princípio moral. A intensão de

Aristóteles era analisar como se pode agir contra aquilo que se sabe ser errado ou

contra os próprios princípios.

Aristóteles afirma também que há dois tipos funcionais de acráticos: os

impetuosos e os fracos.

O acrático fraco delibera e atualiza a totalidade do silogismo prático, mas sua paixão, quando se torna forte, retira de sua mente por um momento uma parte do silogismo e durante esse momento o acrático comete o ato.3

De acordo com o comentador Richard Robinson, o que acontece é que o

acrático fraco delibera e sabe do silogismo, bem como o atualiza, porém ele também

é subjugado pela paixão que retira momentaneamente de sua mente o silogismo.

Quanto ao acrático impetuoso, neste caso não existe o tempo para deliberar,

ele não reflete e não funciona o mecanismo da concepção do errado. Ele é acrático

porque tem conhecimento do princípio moral existente.

No livro VII Aristóteles se refere ao acolástico. Pois bem, o acolástico não

possui nenhum princípio e não se sabe se o mesmo se arrepende das ações

praticadas. Ele é simplesmente arrebatado pelo desejo. Para o acolástico a

interpretação das suas ações é que não há limites. Para Aristóteles não se pode

discutir racionalmente princípios morais, nem se pode ensiná-los. O único instrutor

moral é o hábito. O homem que pratica ações injustas sabe que se tornarão

injustas. O que talvez o homem não perceba é que ao se tornar injusto ele se afasta

do caráter que o fará feliz.

Para Aristóteles as ações são ditas voluntárias, não-voluntárias ou

involuntárias. Quanto às voluntárias, Aristóteles afirma que o homem é responsável

pela ação que executa e que na maior parte das vezes agimos voluntariamente e

que consequentemente não podemos passar essa responsabilidade para outra

pessoa. Não há como ignorar que o caráter dos homens é o resultado de suas

3 ROBINSON, R. Aristote et L’Acrasie. Publicado originalmente em francês na Revue Philosophique, v

145, 1955. In: ZINGANO, 2010, p. 78.

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ações. O exercício adequado das ações leva o homem à prática da virtude que

resulta no encontro da felicidade. Quando praticamos uma ação involuntária, muitas

vezes permanecemos inconscientes dessa prática. Para Aristóteles, quando se

pratica um ato involuntário, ele é acompanhado de arrependimento ou aflição. Mas

há também um outro tipo de ato involuntário cujo autor nem sabe disso. Aristóteles

dá o exemplo de um médico que por engano dá um remédio errado a seu paciente e

que nunca toma conhecimento desse erro. Para verificar se um ato é voluntário ou

involuntário deve ser verificada a correspondência ou não entre o resultado da ação

e o fim visado pelo agente.

O que faz com que a ação seja um ato involuntário é a ignorância sobre as

circunstâncias particulares. Ex: Falar de coisas secretas sem saber que eram

secretas. Além da ignorância deve haver o arrependimento para que o ato seja

classificado como involuntário. A ignorância pode ser o limite aceitável para se

determinar que o resultado da ação seja involuntária. Para Aristóteles um homem

que bebe água sem saber que está envenenada e o homicídio premeditado

cometido por um tirano têm ambos um tipo de ignorância que contribuiu para ação

de cada um.

Para Aristóteles, não basta alcançar o fim, ele deve corresponder ao desejo

cuja satisfação é o objeto máximo alcançado. Para Sócrates a ação do homem

incontinente é resultado de uma oscilação de crença de valores que ele possuía

naquele momento e que, portanto, a ação desse incontinente é a ignorância,

enquanto para Aristóteles a ação do incontinente deriva do desejo apetitivo. Para o

incontinente de Sócrates há o arrependimento e a decepção pela ação escolhida,

pois por um instante ele achou que seria a melhor opção; enquanto para Aristóteles

isso não é verdadeiro. Para Aristóteles o incontinente age sim achando ser o melhor

caminho, mas o que lhe move são os desejos, acompanhado do intelecto prático.

Não há uma deliberação reflexiva, agem de acordo com seu interesse e a curto

prazo.

Segundo Aristóteles, o ato feito por ignorância é sempre voluntário, não há

arrependimento e muito menos negligência. Faz distinção ainda em agir por

ignorância e agir em estado de ignorância. Ainda de acordo com Aristóteles o

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homem que age ignorando se o resultado será vantajoso, age em estado de

ignorância, mas não por ignorância.

Aristóteles admite que a akrasia seja condição em determinados indivíduos e

que outros não sofrem jamais de akrasia.

A investigação de Aristóteles estaria concentrada em observar como no

indivíduo o estado de caráter (opinião correta sobre uma ação) acontece. É

intrigante para Aristóteles que o homem cometa um ato conhecido como incorreto,

pois o conhecimento é forte e dominante.

Ele acreditava, como Sócrates, que o conhecimento é mais forte do que qualquer outra coisa na mente do homem. Quando o conhecimento está presente, pensava Sócrates, é terrível que algo outro possa dominá-lo e arrastá-lo de um lado para outro como escravo.4

Para Aristóteles a causa da existência da akrasia está ligada à satisfação do

seu desejo apetitivo. O que move o homem são os seus desejos intelectuais ou

apetitivos e o que vai determinar a ação são os fins práticos. É interessante para o

homem alcançar o seu objeto de desejo pelo meio mais prático e pelo prazo mais

curto.

O acrático, para Aristóteles, se encontra num estado de ignorância, onde o

dominante é seu apetite, e por ser um ser mais fraco é arrastado pelo apetitivo. A

akrasia, porém, e felizmente, é um estado que acontece para uma minoria.

Para Sócrates os prazeres têm um poder forte e ele é capaz de enfeitiçar o

homem, assim como de alterar algumas convicções. O desejo não é capaz de

alterar as convicções construídas no fundamento do conhecimento. Para Aristóteles

o indivíduo acrático não faz uso da razão e assim ele fica sob a influência somente

do apetitivo.

A akrasia é um estado de falha, onde o conhecimento está num momento de

inatividade em razão da primazia do apetite e a preocupação de Aristóteles está em

demonstrar tão somente que alguns são capazes de usar o conhecimento e outros

4 ROBINSON, R. Aristote et L’Acrasie. Publicado originalmente em francês na Revue Philosophique, v

145, 1955. In: ZINGANO, 2010, p. 79.

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não, e que, portanto, o conhecimento não dá imunidade ao indivíduo, estando o

conhecimento no indivíduo em potência e não em ato.

Para Richard Robinson a akrasia tem relação direta com as resoluções do

homem, ou seja:

Ofereço por ora apenas um pensamento que, se verdadeiro, deve nos ajudar um pouco a entender a akrasia. É o pensamento de que princípios morais não são descobertas, mas resoluções. Quando adotamos um princípio moral, não estamos decidindo como o mundo é, mas como agiremos.5

Em Aristóteles aquilo que é fundamentado no conhecimento não pode ser

alterado. A falta de convicção pode levar o desejo a dominar o homem e somado a

sua imperfeição conduzirá então, alguns, no caminho da Akrasia.

5 Ibidem., p. 80.

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3. A EUDAIMONIA

Preliminarmente é necessário falar sobre os termos “inclusivo” e “dominante”.

O inclusivo remete a um objetivo simples, singular enquanto que o dominante leva à

percepção de que num grupo um é superior, ou então que no grupo um se

sobressai. Acrescentando o termo “fim” para o inclusivo e o dominante temos que

para o fim inclusivo originalmente este possui dois ou mais valores ou mesmo dois

ou mais bens, enquanto que o fim dominante consiste no entendimento de uma

única atividade ou apenas um bem ou um único valor que é perseguido, ou seja

apenas um bem é nobre. E assim a eudaimonia para Aristóteles é classificada não

só como um fim dominante como ela concorre na percepção de ser uma só

atividade.

A eudaimonia reúne o que há de mais desejável com o caráter de dignidade

da própria escolha e que ela, sendo absolutamente final, não depende de acréscimo

para seu melhor.

[...] A eudaimonia, sendo absolutamente final genuinamente autossuficiente, é mais desejável do que qualquer outra coisa, pois inclui tudo o que é desejável em si mesmo. Ela é a melhor, e melhor do que tudo mais, não como bacon é melhor que ovos ... é, com efeito, o melhor café da manhã sem qualificação.6

Para melhor exemplificar essa conclusão temos o café da manhã. Se à mesa

temos café, leite, pão, manteiga, geleia e queijo, temos um bom café da manhã, mas

se na mesa além do café, leite, pão, manteiga geleia e queijo for acrescentado

chocolate, bolos de diversos tipos, iogurtes, frutas, sucos, cereais, frios, omelete,

salsicha, tapioca, gelatina e salgados, teremos então o melhor café da manhã, onde

nada falta e onde nada mais lhe pode ser acrescentado.

Como Aristóteles não acredita que se possa renunciar à eudaimonia por

algum outro objetivo, vem daí que a felicidade não pode ser a eudaimonia, visto que

se pode obter vantagens com ela e poderia também o resultado ser algo que ao final

não fosse virtuoso. Portanto, a eudaimonia é o agir bem e não o resultado da ação.

6 ACRILL, J, Aristotle on Eudaimonia. Publicado originalmente nos Proceedings of the British Academy, vol LX, 1974. In: ZINGANO,.2010, p.111.

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Para Aristóteles, a eudaimonia se resume a uma vida plena e perfeitamente

satisfatória, ou ainda, a uma atividade de uma vida completa segundo a virtude

completa. A conclusão é que talvez o próprio Aristóteles tenha consciência do quanto

é difícil o entendimento do “inclusivo” e o comentador J. Acrill sugere que é muito

melhor utilizar a expressão fim último do que “partes de um todo”. O bem ou o fim de

algo reside no produto dessa atividade. É na função do homem que se encontra o

bem e por isso o homem deve ter ações boas com relação aos outros, resultando na

atividade da alma em consonância com a virtude e somente os que agem bem são os

que podem conquistar e alcançar as coisas boas e nobres da vida.

Fica ainda uma pergunta: o que faz com que ações virtuosas sejam

virtuosas? Ainda que não haja uma resposta conclusiva à pergunta, Aristóteles vê

que as ações moralmente boas emanam dos bons estados de caráter e estes são

determinantes. Então todos são bons porque são saudáveis e essas ações são

balanceadas pelo homem, se transformam materialmente em um círculo de virtudes,

pois o homem bom faz o que faz porque é nobre e porque é a coisa correta a se

fazer. Para o homem bom não haveria outro caminho ou outra proposta. A

eudaimonia é o alvo a ser atingido pelo homem e para alcançá-la é necessária a

obediência a algumas condições. Ainda de acordo com Aristóteles, as virtudes

podem ser morais ou éticas e intelectuais ou dianoéticas. As virtudes morais ou

éticas são as relacionadas às emoções e são adquiridas pelo hábito, ou seja é

praticando atos justos que nos tornamos justos. Quanto às virtudes intelectuais ou

dianoéticas, estão presentes na parte racional da alma adquiridas pela

aprendizagem e que requer tempo e experiência e que portanto são mais comuns

aos velhos do que nos jovens. A função principal da virtude é a deliberação.

A eudaimonia é o termo utilizado para o bem mais elevado, e para sua

existência é necessário, em primeiro lugar, um fim e, em segundo lugar, deve ser

autossuficiente onde nada lhe possa mais ser acrescentado. O fim aqui é

representado por aquilo que está acabado, mas para se chegar a esse fim é

necessário antes a honra, o prazer e a inteligência.

Aristóteles procura um argumento para a existência da eudaimonia e fica

evidente que ela reside na função que é própria do homem. Essa função própria não

está relacionada à sua vida cotidiana ou à execução de tarefas, ou muito menos a

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vida sensitiva que é partilhada com os animais em geral, ela está acima de todas

essas funções, assim, chega-se à conclusão que a função do homem é uma

atividade da alma, que corresponde à vida prática da parte racional do homem.

É então a eudaimonia uma atividade pensante ligada à virtude que lhe é

própria e conduz o homem a praticar ações retas e condizentes de maneira

permanente e constante, e quando isso ocorre significa que a vida alcançou o seu

fim último, sem que isso possa ser associado à morte, mas representando o alcance

da excelência. A eudaimonia não pode estar subordinada a nada além dela própria.

Para se identificar o fim último são necessários critérios: o primeiro critério

identificável é o da perfeição, ou seja, o fim último deve ser sempre desejado por si

mesmo, se ocorrer outros supostos fins melhores, então não seria o melhor – ele

deve ocupar nesse processo a posição máxima de desejo; o segundo critério seria a

autossuficiência, representando que não há carência de nada.

Aristóteles fala também sobre a tensão que há entre o discurso acerca das

coisas ditas e o momento do seu acontecimento. É nessa tensão que surgirá a

verdade. Para Aristóteles o bem supremo consiste na habitualidade do seu uso. A

eudaimonia é uma excelência, o fim final e onde se alcança a excelência do viva

bem, aja bem e prospere. As ações justas dão prazer a aqueles que apreciam a

justiça e assim é com a virtude, ela dá prazer a quem ama a virtude.

Para a existência do bem supremo é necessário os bens exteriores, ou seja,

um bom nascimento, uma boa família, beleza pessoal etc., e estas não têm relação

com as virtudes e não são capazes de trazer a felicidade, todavia elas possibilitam

as condições materiais para o agir virtuoso. A eudaimonia não acontece por obra

divina ou do acaso ou por outro acontecimento. Para se chegar a ela é necessário o

esforço do homem. Ela deriva do estudo e também da prática que junto à virtude

vão significar que ela pode ser adquirida por qualquer pessoa. A eudaimonia é

composta, portanto, pela virtude e bens exteriores.

A virtude é suficiente para aguentar qualquer infortúnio, mas os bens

exteriores estão fora de controle do homem, podendo mudar a sua configuração a

qualquer momento. Quando Aristóteles afirma que só pode dizer que uma pessoa é

feliz ao final de sua vida, quer dizer que a avaliação dessa pessoa deve ser

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realizada na maturidade, pois só aí é que se pode ter a precisão da qualidade de

vida alcançada.

A virtude é a essência da eudaimonia, é ligada à natureza do homem, e os

bens exteriores têm a sua origem no acaso. A eudaimonia proporciona ao homem

uma aproximação com o Divino. Imita Deus o homem na qualidade de bom e sábio,

proporcionando a este homem uma elevação maior que os demais. A distância

entre o homem e Deus (Divino) é o lugar onde o homem se encontra e este mundo

nem sempre vai lhe fornecer os meios adequados para a melhor das ações.

Se o mundo apresentar ao homem as condições adequadas ele exercerá a

função que é de sua natureza. A realidade humana está concentrada no que pode

ou não pode ser, portanto nem sempre o homem conseguirá alcançar a eudaimonia.

A única maneira que o homem tem para se libertar do círculo dos fins que se

transformam em meios, de forma sucessiva é a admissão que há um fim último de

toda ação humana e ele é procurado por si mesmo e por mais nada e toda ação

resultante da escolha racional seria executada em função da felicidade daquele que

a pratica. A eudaimonia é o conceito central da Ética a Nicômaco. A eudaimonia é o

fim de toda ação humana, visto que não é possível encontrar nenhum objetivo

superior ou maior e, portanto, ela é o limite até onde o homem pode chegar,

chamada de o fim mais perfeito porque ela não é desejada por outro.

É nessa submissão da sua condição humana que podem aparecer os

monstros e aberrações e onde são suscetíveis até os virtuosos. A divindade é um

referencial para o homem. A eudaimonia tem um papel de origem e fim para o

alcance do bem supremo pelo homem. A Eudaimonia é desejada por ela mesma, e

não por causa de outro fim, e como não é possível procurar algo que seja melhor

podemos afirmar que ela é autossuficiente.

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4. DELIBERAÇÃO DA RAZÃO PRÁTICA

A deliberação tem relação com a prévia escolha que tem relação direta com o

autocontrole. As ações de quem tem autocontrole não passam pelo crivo do desejo e

não se pode escolher aquilo que não depende de nós; só temos acesso àquilo que está

ao nosso alcance, então a prévia escolha decorre de coisas que podemos controlar.

A dificuldade está em escolher evitar um mal ou escolher suportar um mal

maior ou manter-se firme em uma resolução que pode resultar em algo penoso ou

vil. Se uma ação é forçada, ou seja, onde o agente não participa da ação e o

princípio não está nele pode-se afirmar que é um ato involuntário e todo ato

involuntário cuja origem foi de uma ação forçada esse ato é acompanhado de

tristeza e dor. Assim, de acordo com Aristóteles toda escolha deliberada pressupõe

que o agente realiza um ato voluntário. O voluntário corresponde à escolha

deliberada e atos decorrentes. A escolha deliberada nos revela o caráter do agente.

A escolha deliberada é estudada por ser mais própria à virtude.

Não se pode também confundir a escolha deliberada com o apetite. O apetite é

comum às crianças, animais irracionais e ao homem, enquanto que a escolha

deliberada pertence somente ao homem. Os animais irracionais não possuem a parte

racional e as crianças pela pouca idade não têm desenvolvida em si a racionalidade

para que possam ter o entendimento e a responsabilidade da escolha deliberada. Ainda

quanto ao homem há que se falar do incontinente que segue seu apetite guiando-se

pelo prazer, por não possuir uma disposição correta para escolher deliberadamente.

Igualmente também não se confunde a escolha deliberada com o impulso, pois são

atos súbitos onde não há tempo para ocorrer uma escolha deliberada.

O continente, por sua vez, age de acordo com a sua boa disposição, bem

como tem o mesmo apetite do incontinente com a diferença que usa a parte racional

calculista e, com isso, fica perceptível que a escolha deliberada necessita do uso da

razão prática e sem ela não pode existir tal escolha. Não se pode também confundir

escolha deliberada com querer. O querer refere-se a qualquer coisa, enquanto que

a escolha deliberada não. Podemos querer muitas coisas, inclusive coisas

impossíveis, coisas que não estão sob o nosso poder. A escolha deliberada só é

possível com o que está ao nosso alcance realizar, portanto, possíveis de se

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realizar. A escolha deliberada nos apresenta o fim desejado e escolhemos todos os

fins que servirão como meios para este fim desejado.

Também não se pode confundir opinião com escolha deliberada, visto que a

opinião pode dizer a respeito de coisas eternas e impossíveis e pode, ainda,

representar opiniões sobre coisas que não estão em nosso poder realizar, sobretudo

porque a opinião pode ser verdadeira ou falsa, enquanto que a escolha deliberada

pode ser boa ou má. O que se pode afirmar é que as opiniões são importantes para

a escolha deliberada: as opiniões impulsionam o homem a agir.

Portanto, a escolha deliberada é acompanhada de pensamento e reflexão, bem

como necessita de um tempo prévio para que o agente delibere. Sugere com isso que

o agente tem uma gama de opções onde a escolha é realizada através da preferência,

fazendo o percurso do raciocínio lógico, através de uma revisão das circunstâncias,

relacionando com as possibilidades, prudência e a intensidade para o agir.

Tanto a escolha como a deliberação são meios que levam ou dirigem a um

fim e nesse fim estará revelado o caráter. A escolha está baseada nos princípios do

bem e do mal. Escolhemos e deixamos de escolher em razão do resultado estar

ligado ao bem ou ao mal. A deliberação não pode ser utilizada para coisas

inconstantes e que não estão sob nosso alcance, e para aquilo que não há como

empregar nossas ações. Para Aristóteles, se o fim for resultado de um único meio,

vai considerar que o resultado será alcançado, e se tiver múltiplos meios será

considerado o que melhor produzirá um fim e de modo mais fácil.

Ainda para ele, o ser humano também é capaz de deliberar quanto à sua

profissão ou outro desejo particular. Na verdade, o que fica difícil deliberar é quando

um desejo é generalizado ou vago, ou mesmo quando não é específico e quando

não tem um fim prático, portanto a razão não consegue deliberar.

Para.Ross (1925), a Razão Prática está relacionada às coisas humanas e

está na razão justamente a boa deliberação.

A razão prática, diferentemente da razão teórica, diz respeito às coisas humanas e às coisas a respeito das quais é possível deliberar; pois dizemos que a atividade típica do homem dotado de razão prática é sobretudo esta, a boa deliberação (...) Aquele que delibera bem em geral é aquele capaz de visar as melhores dentre aquelas coisas que são alcançáveis pela ação, por meio do cálculo prático. A razão prática não diz respeito somente aos universais – ela

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deve reconhecer também aquilo que é [específico a uma situação] particular. “É por isso que alguns, especialmente aqueles que possuem experiência, mesmo não conhecendo os universais, são mais práticos do que aqueles que os conhecem”.7

É importante perceber que não deliberamos acerca de fins, mas a deliberação

acontece para a determinação do meio, que na sequência leva para o caminho do

fim a se alcançar. Um médico não delibera a cura de um paciente, mas deve

escolher um caminho a fim de que possa assegurar o restabelecimento de seu

paciente e a consequente cura e, se isso ocorrer, então terá ao final alcançado um

bem, mas se a cura não tiver sido alcançada funcionará como uma deliberação

errada e o resultado da ação do médico será o mal decorrente da continuidade da

doença e pela incapacidade de escolher o método correto.

A pessoa que tem a capacidade mais refinada da boa deliberação, ela

consegue alcançar os melhores resultados em razão do cálculo prático e aqueles

que têm experiência são mais práticos do que aqueles que têm somente

conhecimento universais.

A conclusão que chega o comentador David Wiggins (1975-76) é que há de

fato uma busca não pelos meios, mas para uma melhor especificação, quando esta

estiver mais bem delineada; e se esta só aparecer, mas não for delineada, vai levar

a ocorrência da busca incessante e se lançar novamente por outra busca, por outra

deliberação, por outros meios, em um número grande de vezes, e essa sequência

de deliberações leva a um movimento estéril.

Até que a especificação esteja determinada, não há espaço para a busca por meios. Quando a especificação estiver delineada, a deliberação meios fins pode começar, mas dificuldades que podem aparecer no decorrer desta deliberação meios-fins podem me lançar de volta, um número finito de vezes, ao problema da busca por uma especificação melhor, ou mais praticável, do fim. E toda a dificuldade e o interesse da questão estão na busca por especificações adequadas, e não na sequência, ou sequências, de deliberações meios fins técnicas.8

7 ROSS, W.D. (trad.) Nicomachean Ethics em: The Works of Aristotle Translated into English, v. 9. Oxford, l925. In: ZINGANO, 2010, p. 136. 8 WIGGINS, D. Deliberation and Pratictical Reason. Publicado originalmente nos Proceedings of the Aristotelian Society, v.76. 1975-76, p. 29-51. In: ZINGANO, 2010. p. 137.

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Para David Wiggins (1975-76) a reflexão e a razão são o ponto de partida e o

desejo só é estabelecido porque buscamos o bem. A deliberação prática não pode

ser reduzida a regra ou princípios e também não pode ser mensurada. Acontece por

sua vez de acordo com cada situação e de maneira apropriada a ela. No exemplo

de um jogo de cartas há um grande número de jogadas possíveis, de qualquer forma

o que o jogador busca é a maximização de pontos e é esse o fim perseguido.

Mas com relação às coisas humanas, apesar de alguma semelhança, não há

como maximizar os resultados com antecedência. O que primeiro acontece não é

pelo pensamento das probabilidades, mas sim “O que devo fazer?” Ainda que a

resposta passe pela reflexão da prática e da moral, paixões e interesses podem ter

um caráter mais elevado e dentro do silogismo prático, o que é menor pode ter um

caráter de maior.

Pode ocorrer ainda que tudo esteja claro para o “agente”, a situação

apresentada, o interesse relevante, mas o agente pode não gostar do silogismo prático,

como também pode recuar do próprio interesse ao perceber alguma consequência no

percurso não favorável, e pode recomeçar o processo novamente. Portanto, não é

verdadeiro afirmar que aquele que deseja um fim deve desejar igualmente os meios.

Enquanto os cidadãos são capazes de refletir o que é melhor e pode ser

alcançado através de um planejamento, o mesmo não pode ser deliberado pelas

agências públicas, há por parte da administração uma inabilidade crônica e por isso

o ódio racional da burocracia e da participação pública no planejamento.

Pode ainda ser afirmado que a pessoa investida de sabedoria prática é aquela

que consegue juntar o maior número de interesses, consegue o melhor discernimento

e, na medida certam delibera para alcançar a situação particular. Dessa forma, a

previsibilidade não é importante, mas são relevantes o processo decisório reescrito e as

novas situações que fornecerão o cenário renovado de situações passadas.

Para a construção e deliberação é necessária a sabedoria prática que diz

respeito ao último, ao particular e ao específico. É ela que traz os elementos de uma

resposta a uma pergunta posta. Para se alcançar essa sabedoria prática e

discernimento há que se falar da razão intuitiva que tem por objeto o que é mais

particular, que pode ser encontrado na premissa menor de um silogismo prático. É

através desta situação particular que se obterá a compreensão para se chegar ao fim.

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Também fica compreendido que o período de vida traz um poder em relação

à razão intuitiva, logo, significa que a experiência fornece a capacidade de enxergar

as coisas de forma correta, sendo que as opiniões dos mais idosos e experientes

são, com frequência, as melhores respostas ao problema.

Ainda que existam divergências quanto ao significado da palavra aisthêsis

(avaliações situacional ou explicações que deixam de operar), Aristóteles fornece

esquema conceitual que pode ser aplicado aos casos particulares e estabelece uma

união entre os interesses do agente e da visão que o mesmo tem sobre o mundo e

da visão de como as coisas são.

É necessário perceber o entrelaçamento que há entre o desejo e a razão, na

medida em que a razão para o bem agir depende de um desejo educado e o desejo

depende da razão para educá-lo – sendo o resultado da boa educação do desejo a

busca na direção de um objeto que seja de fato bom. Para ter competência no

julgamento do que é bom é necessário uma educação prévia, como também habituar a

desejar o que é moralmente bom, passando o homem de um estado de formação de

caráter para um estado virtuoso, conseguindo interpretar com autonomia e domínio o

bom fim, como os bons meios. Educar o desejo é tornar-se moralmente virtuoso.

Não há nada mágico, muito menos uma teoria científica, não há nada

imediatista ou de fácil caminho, o que há é o pensar, educar, sentir, compreender e

deliberar. Está na razão a capacidade de discriminar corretamente as circunstâncias

particulares de modo a encontrar o termo e a ação desejada. A razão prepara o

homem com a capacidade para ver o melhor, dominar os afetos, de modo a produzir

uma regularidade de padrão e a julgar o que é bom de fato e a empreender com

exatidão e justiça as decisões e julgamentos, indicando que através da boa

deliberação se promove o rigor, se reflete o benéfico sobre a coisa certa e no tempo

certo e na forma correta.

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5. APRENDER A SER BOM SEGUNDO ARISTÓTELES

A resposta de Sócrates à pergunta – a virtude pode ser ensinada, ou pode ser

adquirida mediante prática, ou se advém por natureza do homem ou de outra forma

–, foi que o primeiro passo é conhecer a virtude, visto não ser possível ter virtude

sem ter informações ou noção sobre ela. A construção da virtude é realizada, ao que

parece, de forma gradual e, progressivamente levará o homem ao entendimento

necessário para ser bom.

Aristóteles caminha em busca do ponto de partida e quer ser claro em suas

especificações. Ele entende que o ponto de partida está em coisas que são

familiares e em outras que, mesmo sendo familiares, são sem qualificação. E

quando ele chega ao ponto de partida “o que” ele entende que a pessoa possui ou

tem facilidade em adquirir o conhecimento e por isso é importante ter sido criado em

bons hábitos, pois o ponto de partida estará norteado em princípios nobres justos.

Quem tem o saber do “que” possui a resposta ao “porque”. O familiar está

relacionado com a criação nos bons hábitos, o familiar da criação vai produzir o

conhecimento particular, vai caminhando desta forma para o conhecimento das

coisas nobres e justas. O fim então se origina no resultado que é assim ou que é de

outra forma.

Aristóteles diz que o nobre e o justo não admitem formulações precisas em

regras ou preceitos tradicionais. Aristóteles fala também em percepção educada,

atrelada ao saber a respeito de ações específicas, pois nela estaria concentrada a

informação necessária para a condução à felicidade e o bem humano. É também

uma habilidade natural do ser a internalização de coisas particulares. Mas tudo isso

é inválido se o ser não foi criado em ambiente de bons hábitos.

A felicidade ou bem humano em Aristóteles aparece como uma definição do

“que” particular. Por outro lado, já se sabe que os bons hábitos são um pré-requisito

para a apreensão do “que” e nesta fase deve ser acrescentado à habitualidade que

dá ênfase à apreensão do “que”. O entendimento do porquê corrige e aperfeiçoa o

conhecimento do quê.

Pela interpretação, percebe-se que apesar de a indução, percepção e intuição

estarem lado a lado com a habitualidade elas não têm ligação com o nobre e o justo,

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mas sim aprendendo a fazer coisas nobres e justas, assim, habituando-nos neste

exercício das coisas justas e temperantes. A prática possui poderes cognitivos e

esta soma nos torna nobres e justos. Por tudo isso se pode afirmar que o hábito faz

com que o homem internalize os conhecimentos adquiridos e nos leve ao ponto de

partida.

De novo voltamos à informação de que é necessária uma boa criação para

ensinar o que é nobre e justo, bem como para nos guiar. Temos então presente

outro ponto, outra discussão: quem melhor faz isso, os pais ou a comunidade?

Como se desenvolve o saber do que é verdadeiro? O começo se desenvolve

através da confiança de algo aprendido e após descobrirmos, por conta própria, ser

verdadeiro. O desenvolver do saber verdadeiro acontece quando o guardamos no

coração. Uma instrução oferecida pelos pais, mestre ou comunidade pode ser

executada pelo aprendiz: mas como aprender o que é nobre e justo?

Argumentos não são suficientes para a execução da nobreza e bondade,

principalmente quando se sabe da existência de paixões, pois estas só podem ser

controladas por meio da punição, não da razão. Existe ainda o argumento de que

nos tornamos bons por natureza somente por causas divinas e presente somente

nos afortunados. O estudante de Aristóteles é alguém que já ama o que é nobre e

isso lhe é prazeroso; outros, não tão bem criados, não possuem esta riqueza de

amor. Aquele que já ama tem a familiaridade com a virtude e possui receptividade

com as instruções.

Quando não se vive em boa criação, não é fácil remover determinados

comportamentos e perfil que já fazem parte de seu caráter. A dissuasão não tem

poder em quem vive sob a dominação das paixões. Argumentos não são capazes

de impor força para remoção daquilo que é indigno. O homem que, portanto, não

controla seus desejos e se deixa ser levado é incontinente e a razão não se

estabelece nesse ser.

Aristóteles insiste na capacidade de que “regozijar-se e odiar com a nobreza”

provém da habituação. Sustenta que o hábito é a segunda natureza. Outra

colocação importante é que não se aprende a ter prazer, ou seja, o “experimentar”

vai trazer o conhecimento do que seja o prazer. O experimentar vem acrescido do

que se sentiu naquele momento.

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Pode-se ter prazer também em decorrência não da situação em si, mas do

que ela originou após. Ex: [...] ter prazer com uma viagem ao exterior por causa das

fotografias tiradas [...] 9

Existe também o prazer imoderado acarretando a perversão. Aristóteles

afirma que o prazer apropriado é encontrado no aprender a ter prazer. É tornar um

hábito as ações virtuosas. Que a correta educação é encontrada quando temos uma

satisfação adequada perante determinada situação, e quando algo terrível acontece

não se sofre, mas antes enfrenta-se para combatê-la. Para isso ocorrer, é

necessário que desde muito cedo o aprendiz tenha sido criado nesse ambiente de

ensinamento.

Ter ou não ter prazer é o teste de ter ou não ter virtude, visto que só o

homem corajoso se mantém no posto em situação terrível, uma vez que nesse

momento não há o alívio de segurança, muito pelo contrário, a pessoa nesse posto é

sabedora de que algo ruim está para acontecer. O que são ações virtuosas, em

todos os casos será respondido que são escolhidas e realizadas porque são nobres

e para alguns porque são justas, corajosas, temperantes, etc.

Para que essas ações sejam prazerosas e guardadas no coração há

necessidade de aprender por nós mesmos a amá-las, ou seja, o aprendiz tem o

conhecimento do que é justo por ele mesmo, o aprendiz possui o “quê” e do

aprendizado por experiência própria decorre não só a prática, como o tempo fornece

a qualificação da habituação que leva à capacidade de sabê-la nobre e apreciá-la

com a razão através da sua própria existência.

Os jovens estão mais propensos a cometer erros justamente por conta da

idade e por uma inclinação em viver em função das paixões do momento. O jovem

tem por objetivo realizar ações nobres, porém, nesse ínterim, em função justamente

do momento e com a adição do que lhe atrai, por vezes faz coisas vis, ignóbeis, o

que após gera vergonha da sua própria conduta, ou seja, ele sabe que não praticou

coisas nobres, mas dada a força da paixão desvia-se do caminho justo e do nobre –

daí a necessidade da sabedoria prática para reforçar e evitar esses erros. A pessoa

9 BURNYEAT, M, Aristotle on Learning to be Good. Publicado originalmente em A. Rotary, Essays on Aristotle’s Ethics, University of California Press 1980, p. 69-92. In: ZINGANO, 2010., p. 165.

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bem criada tem a capacidade de perceber e evitar esses erros, bem como é com a

punição que também se evita os erros.

É aceito pelo indivíduo aquilo que conhece e isso o auxilia no discernimento e

de forma aprofundada no julgamento correto. Para ser um bom juiz o ingrediente

fundamental é uma educação completa. Aqueles que não possuem autocontrole e

são guiados tão somente pelo desejo, independente da cronologia, são incapazes

de um julgamento correto. Pudor e medo da desonra são a semivirtude do aprendiz,

não cabendo, portanto, tal sentimento a pessoa mais velha.

Aqueles que são menos afortunados a única maneira de se obter um

comportamento adequado é através do medo da punição. Para esses, tanto faz o

ato, não possuem qualquer razão para viver pelas ações nobres e justas. Diferente

daqueles bem criados, que são receptivos, com a moral estando em conexão com a

sabedoria prática que lhe permite evitar ou desviar de praticar erros. Aqueles

dotados do senso de vergonha corresponderão melhor às coisas corretas. Aquele

que não o possui, a única coisa que o deterá será a punição.

A visão de que o ser humano possui uma base fisiológica é de grande

importância, pois ela é movida pelo prazer e este pode ser devidamente treinado, de

modo a se tornar apropriado se for utilizado com grau de moderação. Outro ponto

abordado também por Aristóteles é o fato de o ser humano ser por natureza um

animal social e que a amizade está dentro do que se considera nobre.

A virtude para Aristóteles é um esforço para aprender, para adquirir e para

controlar. O hábito está ligado ao costume e mediante a habituação atingimos o

caráter, decorrendo o controle de nossa índole. No vício fica estabelecido o mau

hábito e a fraqueza.

A sequência da direção do bem é representada, primeiro pelo aparecimento

da deliberação, que promoverá a formação do desejo que levará a decisão para uma

ação que será baseada na escolha. O homem acrático tem um conhecimento do

bem, porém, é levado a fazer outra coisa, ele é influenciado de tal forma pelo

corpóreo que está associado ao prazer que para ele o prazer tem um instante mais

forte e dominante em relação ao bem. O acrático persegue algo que é sabido

reprovável e que exerce uma atração predominante nesse homem.

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O acrático age de forma contrária ao conhecimento que possui. Ainda que ele

tenha o conhecimento e tem a capacidade de raciocinar, esses elementos não

dominam a opinião que aliado à história das pessoas imaturas resultam na ação

segundo o que é aprazível em certo momento. Pode-se também explicar a akrasia

como servos precipitados, que antes de ouvir tudo já saem correndo e erram no pedido.

No exemplo do silogismo “desrespeitos e injustiças devem ser combatidos, fui

desrespeitado/injustiçado, devo, pois, vingar-me”10. O que certamente fica claro na

akrasia diante do silogismo supra é que para Aristóteles a parte irascível não se

detém para ouvir ou refletir, mas que deve ser melhor esperar e investigar esse

aparente malfeito.

Burnyet avalia que além da nossa criação, os apetites corpóreos estão em nós

como parte de nossa herança, assim também a semente da acrácia está em nós.

Se, pois, essas respostas avaliativas estão em nós como resultado de nossa criação e os apetites corpóreos estão em nós como parte de nossa herança natural enquanto seres humanos, as sementes da acrasia estão conosco quando adentramos a sala de aula de Aristóteles.11

De acordo ainda com Burnyeat o que precisa ser explicado, não é porque

certas pessoas caem na tentação, mas porque outras não caem. Por que a maioria

de nós é desencaminhada com certa facilidade? Qual a composição das pessoas

continentes? Onde está centrada a virtude plena?

O que exige explicação é antes como certas pessoas adquirem a continência ou, ainda melhor, a virtude plena do que por que a maioria dentre nós é suscetível a desencaminhar-se em decorrência de apetites corpóreos ou respostas avaliativas não racionais. Não acidental que Aristóteles conceda tanto espaço para o acrático enquanto tipo de pessoa quanto para as ações acráticas isoladas, sendo característico que meça a suscetibilidade à incontinência por comparação com o homem normal.12

A impressão que o comentador tem é que a incontinência está relacionada ao

homem normal, daí porque Aristóteles dá tanto espaço para o acrático.

10 BURNYEAT, M, Aristotle on Learning to be Good. Publicado originalmente em A. Rotary, Essays on Aristotle’s Ethics, University of California Press 1980, p. 69-92. In: ZINGANO, 2010., p.176. 11 Ibidem, p. 177. 12 Ibidem, p. 178.

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Para Aristóteles, são três os objetivos de persecução e três de fuga: o nobre, o

vantajoso e o prazeroso e; seus contrários: o ignóbil, o detrativo e o doloroso. O que é

prazeroso cresce conosco desde a infância e não é possível desvincular esse

sentimento de nós. Então como é esse ser virtuoso? Para Aristóteles, a condição

adicional é um caráter firme e imutável onde encontra prazer naquilo que sabe ser bom.

O homem tem em harmonia as três categorias e por isso nada o seduzirá a

não ser a ação temperante ou corajosa, portanto é totalmente compreensível que o

homem dotado de virtude e sabedoria prática não tenha a mínima chance de ser

acrático.

Para Aristóteles, o ideal a se atingir é a formação do cidadão bom, virtuoso e

justo indo de encontro com a felicidade. É o homem em excelência, natural da vida

que leva e que resulta em uma vida completa. A excelência ética requer experiência

e tempo, produto da aprendizagem e do hábito. O mesmo fator que produz a

excelência pode produzir o oposto, as virtudes podem ser destruídas por excesso ou

por defeito. A virtude só é produzida por atos contínuos de virtudes. Para o homem

bom ser virtuoso não basta conhecer o bem, é preciso possuir esse bem e procurar

ser bom. Aristóteles não defendia a existência de uma elite ou muito menos que

haveria um número limitado provido de virtudes e com características do homem

bom. Aristóteles concorda com Platão e parte do princípio que o homem bom deve

nascer com uma característica natural virtuosa, ou seja, ele já nasce com uma

predisposição para o bem, porém ele só estará completo através da educação

baseada nos hábitos, pelas leis da cidade e fundados na experiência e

aprendizagem, assim estará completo o ciclo da excelência trazendo o homem mais

perto do divino.

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6. ARISTÓTELES E OS MÉTODOS DA ÉTICA

Desejamos saber o que é bom, mas como saber? Como identificar se

determinadas proposições estão certas ou erradas? Queremos, portanto, saber

identificar o que é falho e quais concepções podem ser aceitas. Investigar significa nos

aproximar da verdade e com o resultado nos assegurar que as proposições aceitas são

verdadeiras e este questionamento aprimora o nosso desenvolvimento intelectual.

O método de acordo com Aristóteles possui três componentes:

1. estabelecer

2. percorrer as aporias

3. provar

Os componentes 1 e 3 não são expressões sinônimas, embora sejam

utilizadas para designar a mesma classe de itens. Estabelecer representa crenças

ou opiniões de algum tipo, “coisas que parecem ser o caso” e, ainda, levantamento

das opiniões a cerca de um assunto ou tema. Então o primeiro componente do

método de Aristóteles é reunir as opiniões a cerca do tema em questão. De quem

vai ser apreciada a questão? Quem é essa pessoa? Quem são as pessoas dotadas

desse monopólio do saber? Aparece aqui então as endoxa (opiniões reputáveis)

aquilo que aparece à maioria dos sábios. A qualificação do estabelecer estará

balizada por aqueles que têm uma reputação reconhecida por serem sábios.

O segundo componente seria um percorrer as aporias (não ter um caminho para)

que se reveste na apreciação geral das aporias ou das dificuldades encontradas pela

investigação. Pode-se dizer que no percorrer as aporias possuem um conflito entre si.

Esse segundo método pressupõe que sempre será descoberto inconsistências – ele

leva a imprecisões. Nesse processo, através das provas se descobrirão insuficiências.

Na endoxa reside inicialmente uma dificuldade intelectual, pois ao examinar um

determinado assunto percebem-se discordâncias e nessa travessia deve-se atentar a

todos os conflitos originários que existem no exame das endoxas.

Entramos então no terceiro componente “a prova”, onde se determina a solução

ou resolução do problema. Precisa haver um filtro nas provas e ela se faz através do

abandono de algumas e na preservação de outras. A verdade, pois estará concentrada

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nas provas preservadas. O método das provas para Aristóteles é compreendido como

um método do Senso Comum e que passa pelas crenças populares.

Os contra em relação à prova fica muito evidente pelo comentador Jonathan

Barnes quando este coloca três questões de ataque ao pré-estabelecimento do

senso comum. Ele admite que seja possível outros pontos de partida, que também

existem verdades ainda não sonhadas e, por fim, que é muito pobre considerar que

respostas às novas questões éticas já estão em nosso poder e sendo imutáveis não

precisam passar, portanto, pelo processo intelectual.

Quanto “à prova”, no que exatamente ela consiste? Parece que nas

traduções há certa divergência quanto ao que exatamente ela representa. Alguns

concluíram que representa “provável”, “plausível” ou “crível”. Estudiosos modernos

chegam à conclusão que a tradução correta é “opiniões recebidas” ou “opiniões

aceitas”.

Qual é o critério para se aceitar essas opiniões? Nós temos crenças e a

propomos e a valorizamos para que sejam recebidas. Avalizamos também através

de ações nas quais é mostrado o prazer, que temos e que isso é julgado como um

bem. É na análise lingüística que ocorrerá os esclarecimentos sobre crenças do

senso comum. O senso comum é resultado de todas as crenças, sustentadas por

todos ou pela maioria dos homens. No “provar” estarão inclusas as crenças da

minoria, as opiniões dos sábios, especialistas e estudiosos cujas crenças estariam

em desacordo com o senso comum.

Aristóteles exclui considerações de homens insensatos, doentes e crianças

por serem opiniões peculiares e, de acordo com estudiosos, porque a missão aqui é

armazenar dados e não transformar mentes.

Aristóteles fala que o homem tem uma sede natural da verdade e ela tem que

ser refinada pela experiência. Não dá para afirmar que tudo que o homem acredita

seja verdade, mas boa parte o é, resultando assim dizer que o argumento mostra

que a prova tende a ser verdade, em detrimento de a verdade não ter a tendência a

ser a prova.

Na verdade, queremos descobrir coisas, saber a verdade, identificar as falhas

nas concepções e atitudes cotidianas. A preocupação de Aristóteles não é o

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convencimento por meio de uma audiência seleta, mas de mostrar que qualquer

mudança que façamos em nossa crença prática será positiva se forem decorrentes

de investigação. É uma tentativa de um caminho acertado, uma forma de lidar com

as questões práticas e nos tornar assim pessoas sábias.

Para Aristóteles, se as endoxas permanecem e são sustentáveis aos testes

então foram aprovadas. A palavra doxa significa opiniões de certo tipo, enquanto

endoxa significa opiniões reputáveis, e os sábios são considerados pessoas

reputáveis. Se uma opinião estiver de acordo com um sábio e se estiverem

presentes outras pessoas, ainda que em maioria ou ainda em pequeno grupo, então

ela estará de acordo e será qualificada como endoxa.

A primeira coisa a se fazer, de acordo com Aristóteles, é investigar o que

parece ser o caso a todos e atentar também para as opiniões daqueles que

anteriormente investigaram a matéria. Ao que tudo indica quando a mente se abre é

capaz de encontrar a verdade a partir de opiniões, porque derivam delas o início

para a atenção da nossa mente.

É importante frisar que se um número considerável de adultos normais tem

experiência em determinado assunto, um estudante pode considerar a hipótese de

haver verdade numa informação. É possível que, embora as investigações sejam

realizadas por filósofos e estes na ânsia de difundirem o que consideram verdades,

muitas vezes percam a habilidade em dizer coisas com propriedade. Assim,

Aristóteles recomenda, para aquele que estuda, não se basear somente nos

especialistas, mas acrescentar opiniões de pessoas comuns, decorrendo daí uma

abertura contra qualquer distorção e assim respeitando também o próprio método.

A endoxa é um método geral e destaca a observação para qualquer opinião,

assim como de especialistas. Para resolver dificuldades é necessário submeter cada

opinião, ver o que conflita e analisar as razões para ver o que tem procedência ou

não. O problema está para o estudante, pois quem dá a opinião, o faz com

convicção, de tal forma que na apresentação nada parece errado ou conflituoso. Só

há uma análise bem feita se o estudante não estiver confortável, ou seja, se houver

uma investigação demasiada forte para induzi-lo na apresentação perfeita.

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Muitas vezes, o que parece verdadeiro não é daí ocorrer que nem todas as

endoxas sejam aprovadas no exame. Não importa a maneira como as palavras

demonstram as endoxas, o que importa é o reconhecimento da verdade das endoxas.

Além da aceitação do argumento e sua defesa e o posicionamento firme

sobre sua verdade, é importante também ter um argumento forte e aceitável para a

opinião que está sendo rejeitada. Deve-se encontrar uma explicação que promova

o aceitar a fundamentação dada pelo que foi rejeitado.

Em função do contato contínuo, é pouco provável que aconteça um erro ou

distorção e, se isso ocorrer, é sinal de que algo está acontecendo com seu juízo,

alterando assim a visão da verdade. O fato de haver equívocos de argumentos não

significa que quem os deu mudará a sua ideia após a exposição dos enganos. Pode

haver resistência e teimosia, porém a função do estudante de acordo com

Aristóteles não é a tarefa do convencimento, mas a análise e a justa verdade do

argumento apresentado.

O objetivo do método de Aristóteles é provar que não é só aparentemente que

a prova apresentada não deixa dúvidas e que não há elementos controversos.

Aristóteles também afirma que devemos começar pelo conhecido, que a nossa

partida é pelo que é familiar. O segundo ponto de partida será com base na direção

daquilo que já nos deu o princípio, a sustentação para a outra parte da investigação,

vamos para o outro ponto no sentido de chegar à trajetória final.

É preciso ainda nesse trajeto desvendar as aporias. Para Aristóteles, o

estudante deve inverter a direção para testar a investigação, pois aquilo que não

está muito bem compreendido poderá ter um entendimento mais apurado, dando

maior amplitude à verificação, dissolvendo qualquer discordância do que foi

efetivamente investigado.

O método de Aristóteles exige que os estudantes analisem determinado assunto com a mente aberta e façam justiça aos diferentes pontos de vista, mas isso não significa que devam convencer quem quer que tenha alguma opinião sobre o assunto ou, inclusive, que esses outros sejam persuadíveis.13

13 KRAUT, 2009, p 84.

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A proposta de Aristóteles é fazer com que o aluno seja imparcial na análise e

no resultado de sua investigação, deve também não se utilizar do artifício da

persuasão, pois aquilo que é demonstrável e verdadeiro não carece de imposição.

Então, só após tudo ser analisado e todo o assunto ser investigado e revisto, poderá

se chegar a um termo final e é nesse momento que o aluno pode dizer que tem o

conhecimento no sentido estrito.

Aristóteles também fala em teste, ou seja, não basta ter chegado à

conclusão reputável de uma determinada proposição, tanto pela participação da

opinião de sábios como pela maioria, é necessária a ratificação através do teste da

experiência, visto que tem importância aquilo que é demonstrável. Uma teoria ética

deve corresponder ao que experimentamos na vida, se elas estiverem em

consonância com nossas experiências e percepções do cotidiano podemos então

julgá-la como verdadeira.

A prova é a recompensa de toda a investigação: ela transforma a

possibilidade aparente em proposição que merece confiança, porque através de

todo o processo consegue ser provada, constituindo e se revestindo da verdade

provada. Ainda dentro do método de Aristóteles, para se chegar à sustentação

definitiva, o estudante deve evitar dois extremos:

1. a recusa a considerar o que se mostra como plausível porque ninguém antes teve aquele pensamento; 2. a recusa de considerar a ideia de outra pessoa porque tal ideia não parece ter de início, nenhuma plausibilidade.14

Para usar o método é necessário um ingrediente muito importante que é ter

sido bem educado nos bons hábitos desde o início de sua vida. Só assim serão

capazes de utilizar o método com sucesso. O olhar e sentimento dos que foram bem

educados são capazes de perceber as diferenças, bem como examinar com

sabedoria argumentos ambíguos e excluir aquilo que não for procedente.

A par de tudo isso é entendido que o método existe não para a concordância

do resultado da investigação, mas para assegurar uma confiabilidade no resultado

reconhecido como verdadeiro.

14 Ibidem, p. 92.

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7. A PERMANÊNCIA DA FELICIDADE

Aristóteles reconhece que o objetivo da vida é a felicidade e por esse

pensamento é que escolhemos honra, prazer, dinheiro, amigos, conhecimento e

família porque acreditamos que através deles seremos felizes. A excelência no

homem pode ser encontrada no intelecto e justamente por conta dele é que o

homem se torna superior e governa outras formas de vida. O intelecto tem uma

função importante para o homem e a evolução dessa faculdade o leva à realização

da felicidade na medida em que ele a usa para harmonizar e exercer o domínio

sobre seus instintos. Nessa sequência vem o resultado do agir de acordo com a

razão e que ao longo vai representar na produção da perfeita felicidade.

A felicidade também não pode ser confundida com divertimento, com uma

distração que provoca um bem estar passageiro e que por algum tempo desvia o

homem das coisas sérias. A felicidade está relacionada com a plenitude da vida

humana relacionada também com Deus, divinizando a razão, pois aquele que é

imperfeito não possui esse atributo. A felicidade só é encontrada em um ser perfeito

e absoluto. Para Aristóteles, os Deuses são seres felizes, pois nada lhes falta e

sendo assim o homem utiliza a sua razão para estar próximo do Divino e poder

experimentar parte na participação da sua infinitude.

Temos que possuir, também, num grau razoável, bens materiais: a pobreza nos torna avarentos e ávidos; enquanto que os bens nos livram de preocupações e mesquinharias. E essa liberdade é a fonte da tranquilidade e encanto aristocráticos.15

É reconhecido por Aristóteles a importância dos bens materiais e essa

referência também se apresenta nos comentários T. Irwin. O autor faz referência a

uma passagem bíblica (Jó 1:9-11) onde satã desafia Deus quanto à fidelidade de Jó,

acreditando que se dele tudo for tirado não mais o seguirá.

Satã respondeu ao Senhor: “Acaso Jó teme a Deus a troco de nada”? Porventura não o cercaste de proteção, a ele, sua família e suas posses? Abençoaste a obra de suas mãos e aumentaste seus

15 DURANT, Will. The story of Aristoteles philosophy, tradução MariaTheresa Miranda, p. 79.

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rebanhos sobre a terra. Estende, no entanto, a tua mão, toca tudo o que ele tem – e ele lançar-te-á maldições ao rosto. 16

Ainda Irwin, afirma querer demonstrar a correspondência existente entre a

felicidade e a virtude, caso algo venha a ocorrer durante a vida de uma pessoa que

a transtorne ou lhe tire por um período os bens materiais ou aquilo que lhe é

importante, então esta pessoa não poderá ser considerada feliz, mas sim infeliz em

face de algo desfavorável a que foi submetida, bem como quer demonstrar a

permanência da virtude e que esta não pode ser tirada de quem a possui e mostrar

que a virtude é permanente.

Aristóteles se vê na responsabilidade de explicar e argumentar quanto à

felicidade. Ele afirma ser a felicidade vulnerável, pois infortúnios acontecem no

decorrer da vida. Isso acontece porque [...] nenhuma das funções humanas possui

permanência.17 A permanência está presente na virtude, pois esta é duradoura e

valiosa gerando a estabilidade e assim faz o ser humano ser feliz e mesmo com as

reviravoltas da sorte, o duradouro e valioso estará sobreposto.

É na adversidade que a virtude resplandece, ela traz a serenidade para

entender e passar pelos infortúnios e assim ver emergir a grandeza da alma e é de

se supor ainda, que este em vida não foi infeliz, pois é bem aventurado e incapaz de

praticar ações odiosas. Ele cita o exemplo de Príamo no fim da vida, ou seja, ele na

juventude teve glórias. Como rei de Tróia acumulou poder e riquezas, porém na sua

velhice teve que lidar com a morte do filho mais velho e antes que a infelicidade o

destruísse por completo conseguiu resgatar o corpo do filho para que pudesse ter

um enterro de acordo com a tradição de seu povo.

A partir dessa ilustração, Aristóteles quer dizer que se apenas parte da vida

está bem e outra não, não se pode assinalar aí a concepção de felicidade. Ele em

uma das passagens afirma que para sermos felizes, devemos cultivar e praticar as

virtudes. Mas adianta que a felicidade é vulnerável e não se pode afirmar que a

virtude por si só vai garantir a felicidade.

16 IRWIN, T, Permanent Happiness: Aristotle and Solon. Publicado originalmente em Oxford Studies in Ancient Philosophy, v, 3 1985, p. 84-124. In: ZINGANO, 2010, p. 208. 17 BINI, 2014, p. 68.

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Os gregos esperavam que, independente do infortúnio, a virtude estivesse

presente no ser, porém é fato para nós que a virtude nem sempre promove a

felicidade. Há uma passagem onde um [...] rico e bem sucedido Creso oferece a

Sólon um tour guiado de seu palácio e seus tesouros, pedindo a seguir que Sólon18

diga quem julga ser o mais próspero dos homens.19

No pensamento desse rico homem, ele seria o mais rico de todos em função

da grandiosidade de sua fortuna, porém Sólon o contraria e afirma que varias

pessoas que ele citou, apesar de mortas, menos ricas e ilustres, são prósperas, pois

não estão mais sujeitas a problemas quanto à sua fortuna. E como Creso ainda está

vivo, não sabe se até à sua morte ocorrerá algum problema com sua fortuna. Sólon

consegue ver que Creso é feliz, mas que sua vida ainda está incompleta. Sólon

acredita que a felicidade não é apenas de um dia ou dois, mas sim de toda uma

vida.

Aristóteles descreve a felicidade como:

1- Atingir o bem com virtude

2- Autosuficiência de vida

3- A vida mais prazerosa com segurança

4- Prosperidade de posses e corpos com o poder de protegê-los e

usá-los na ação.

“Existe um antagonismo [...] a felicidade requer a fortuna e a fortuna é instável

[...]”.20 Outro antagonismo estaria presente no maleável e no inflexível. Para os

gregos o inflexível é admirável enquanto que o maleável concentra uma pessoa

previsível que tudo organiza de tal forma que sua passagem é realizada sem perdas.

Aquele que faz sempre tudo certo, não sai um milímetro fora do lugar é quem não

causa prejuízo, não tem sucesso entre os gregos. Aristóteles, por outro lado,

concorda em parte com Sólon quando diz que a felicidade depende da fortuna.

18 SÓLON (638 a.C. – 558 a.C.) foi um estadista, legislador e poeta grego, um dos Sete Sábios da Grécia, acabou com a transmissão de poder hereditário e abriu o acesso aos altos cargos do governo para (quase) toda a população ateniense. Dedicou a vida a construir uma sociedade mais justa e igualitária. Tanto que os historiadores o consideram o pai da democracia ateniense. 19 IRWIN, T, Permanent Happiness: Aristotle and Solon. Publicado originalmente em Oxford Studies in Ancient Philosophy vv. 3 1985, p. 84-124. In: ZINGANO 2010, p. 209. 20 Ibidem, p. 211.

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Sólon descreveu bem a felicidade ao dizer que em sua opinião eram felizes aqueles que possuindo bens externos em quantidade moderada, haviam realizado os atos mais nobres e vivido comedidamente.21

A felicidade deve ser completa e autossuficiente para uma vida digna e

carente de nada e se não há carência de nada, nada mais há que ser acrescentado.

“O [...] autossuficiente aquilo que por si só torna a vida desejável e destituída

de qualquer carência [...]”22 e a função do ser humano é a sua participação,

conjugando a atividade da alma com a razão. Um homem só pode ser chamado de

bom quando ele executa essa conjugação de acordo com a excelência. Isso mostra

que ser um ator é diferente de ser um bom ator, pois um bom ator é o que há de

melhor e mais completo.

Aristóteles acrescenta que além dos bens genuínos (fortuna) tem que ter a

abrangência que nada mais é que a presença da família, dos amigos e dos

concidadãos. Ele rejeita a concepção de Sócrates que basta a virtude e somente

ela é suficiente para se ter a felicidade. Aristóteles quer representar a felicidade

completa, através da virtude, da fortuna, dos familiares e de amigos.

Aristóteles divide os bens exteriores e eles podem ser instrumental e não

instrumental. No instrumental estariam os amigos, riqueza e poder político e no não

instrumental estaria a honra. A existência dos dois é fundamental, visto que os

primeiros são de natureza cooperativa e interior e no segundo, a falta interfere na

felicidade. Salienta Aristóteles que não há felicidade completa caso haja ausência

desses bens e parte da felicidade encontra-se no uso correto desses bens.

Quanto à amizade, Aristóteles as classifica em duas categorias: as que são

duráveis e as que são acidentais. As acidentais são aquelas amizades úteis e

aprazíveis por um período de tempo, visto que a pessoa não permanece sempre

como é; neste caso amamos o amigo não por ele mesmo, mas tão somente por

aquilo que pode nos dar de útil sendo que o amor ao final se transforma e se torna

frio e portanto são facilmente desfeitas as amizades. A amizade verdadeira é durável

e ocorre entre virtuosos e consiste numa reciprocidade. O homem é amado pelo que

21 BINI, 2014,, p. 381. 22 ibidem, p.. 58.

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ele é em si mesmo. Isso também acontece porque em sociedade é mais fácil

conviver com pessoas amigas do que com estranhos. As grandes amizades exigem

duração e intensidade.

Voltando um pouco a falar sobre riqueza e amizade, há que se destacar que é

próprio do homem virtuoso beneficiar, fazer o bem e para isso ele precisa de

pessoas para fazer o benefício. Contudo a amizade deve ter um rol pequeno visto

que é impossível ser amigo de muitas pessoas. A amizade exige igualdade, pois se

assim não for este alicerce será vacilante, na medida que quando há gratidão

significará que um é credor e o outro é devedor e ninguém gosta de ser devedor.

É sugerido por Aristóteles que uma pessoa de estrutura social muito inferior,

solitário ou mesmo sem filhos, estaria longe da felicidade e mesmo alguém que

tenha amigos, porém ruins, falecidos ou ainda filhos ruins estaria em circunstâncias

piores. São bens que fazem da vida um ciclo completo, nada faltando, nada a ser

acrescentado. Assim “[...] parece que a felicidade exige a prosperidade material,

sendo esta a razão de alguns indivíduos identificá-la como ‘boa sorte’”.23

Em outro ponto Aristóteles discorda de Sólon quando este diz que a felicidade

depende de condições exteriores ao agente. O pensamento contrário a isso é que as

atividades virtuosas que nos dão a felicidade estão em nosso poder e são difíceis de

serem subtraídas, assim, na passagem bíblica sobre Jó o Senhor não tira a integridade

de Jó, só os bens exteriores Jó é o único que podia manter a sua integridade.

Aristóteles tenta conciliar bens exteriores e felicidade, na medida em que a última

inclui a primeira. A fortuna pode refletir na felicidade de duas formas. A fortuna tornando

mais feliz a pessoa feliz e a perda privando a pessoa feliz de sua felicidade, mas não

chega a torná-la infeliz. É difícil para Aristóteles explicar como a adição e subtração de

bens pode tornar uma pessoa mais ou menos feliz sem que ele deixe de ser feliz.

O seguinte exemplo esclarece melhor a sua pontuação quanto à felicidade e

bens: se uma pessoa é virtuosa e também rica o bastante para apresentar ações

magnificentes e praticá-las de forma contínua e sempre no mesmo grau, caso

receba uma grande herança será possível essa pessoa realizar um maior número de

23 Ibidem, 2014, p. 64.

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ações magnificentes, demonstrando assim que embora possua mais bens ela

continua a ser boa e virtuosa, deixando claro que essa grande fortuna não produz

mais felicidade, que não acrescenta mais felicidade do que ela já possuía, apenas

multiplica-lhe as ações virtuosas.

Porém os efeitos da má fortuna são graves. Para Aristóteles há uma grande

diferença entre uma pessoa ter felicidade e parte da felicidade, para outra que não

possui parte alguma da felicidade.

Para ele a pessoa que não possui parte alguma da felicidade não é virtuosa e

a pessoa não virtuosa resulta em infeliz e afirma que a virtude combina com

qualquer componente porque ela é um bem dominante. É claro também que a

estabilidade é um princípio do virtuoso e a inflexibilidade não dá abertura a

mudanças ou variações ao caráter do virtuoso.

O maleável, na verdade, vive mais em função da fortuna e de suas variações

do que da virtude. Aristóteles concorda com Sólon quando este afirma que se deve

chamar de feliz apenas a pessoa morta. Aristóteles define a felicidade como

completa e conquistada durante a sua vida.

Uma criança que ainda está iniciando a vida não possui a felicidade completa e

muito menos há a noção do tipo correto de ações que deve perseguir. Aristóteles

sugere o que acredita ser o tempo completo, o tempo de uma vida, que é longo e

suficiente.

No exemplo de Jó, ele consegue restabelecer sua posição, pois ainda vive

outros 140 anos. Portanto é verificável que após perder, ele teve tempo suficiente

para recobrar a sua felicidade, o que foi diferente de Príamo, que possuiu por longo

tempo – em quase uma vida completa –, a felicidade, porém na velhice a perde e

não tem tempo de recuperá-la.

Feliz é, portanto, aquele que tem uma vida boa e agradável conforme a

virtude, vive uma vida intelectual, dirige bem a vida, se dedica à prática de ações

virtuosas, além de viver as virtudes dentro da polis. É necessário ainda muito

exercício e muita prática da virtude e uma vida completa. Para Aristóteles, a

felicidade é impermanente, ela pode ir como também pode vir. Aristóteles termina

concordando com Platão quanto à dominância da virtude e não a sua suficiência.

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8. VIRTUDE E RAZÃO

Aristóteles vê a felicidade como atividade da alma transpirando razão e

virtude. É no que há de melhor, nas práticas do homem, que se encontra a

felicidade. Uma pessoa sábia trilha o caminho da razão prática, deixando de lado a

fortuna e as circunstâncias exteriores.

A princípio se tem em mente que o conhecimento do significado da virtude é o

bastante para que ela esteja presente em nossas ações. Além de ser um caminho

curto e errado, ele somente, é insuficiente. O importante, na verdade é a sua

presença através da prática, esse hábito faz com que as pessoas sejam

influenciadas por essa essência a ponto de transformá-las em boas pessoas. A

virtude não se ensina e a força da natureza só está presente em alguns afortunados

através da graça divina. A escolha de ações cujo resultado depende do acaso não

será escolhida para aquele que pretende atingir com sucesso o fim perseguido.

Portanto, o objetivo de uma pessoa virtuosa é praticar ações virtuosas. Aristóteles

afirma que uma pessoa virtuosa “praticamente não se arrepende” (1166 a 29). 24

É o objetivo da vida do homem alcançar a felicidade, para isso será

necessário viver racionalmente, o que significa viver segundo a virtude. A virtude

está ligada à decisão e consiste em agir de acordo com a justa medida. A excelência

é encontrada no meio termo, que não é uma medida matemática, mas o equilíbrio

perfeito entre os apetites e a razão.

A ideia de Irwin (1985) é concentrar que na pessoa virtuosa o dominante é o

agir racionalmente, característica primaria e essencial na natureza humana e que lhe

dá a sustentação da virtude na felicidade. A pessoa que é virtuosa não se desvia de

seu caminho, tem a rigidez com a realização de seu objetivo. O ser justo nem

sempre corresponde a um resultado antecipado. Quanto mais maleável e flexível é o

caráter do ser, mais ele se sabota, e também o fim a perseguir.

O hábito é um fator determinante e importante para a apreensão da virtude:

se não houver o hábito o homem estará propenso a tentar uma escolha na base da

24 IRWIN, T, 1985 Permanent Happiness: Aristotle and Solon. Publicado originalmente em Oxford Studies in Ancient Philosophy , v. 3, 1985, p. 84-124. In: ZINGANO,.2010, p.230.

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sorte e não na base da razão e o resultado tanto pode ser de acerto como pode ser

de erro. A segurança para uma boa escolha só será alcançada através do hábito.

Fazer uma ou duas escolhas certas dentre muitas escolhas erradas não basta. Se as escolhas erradas são em número muito maior do que as escolhas certas, você persistirá na direção errada – irá para longe da felicidade, e não para perto dela. É por isso que Aristóteles enfatiza a ideia do hábito.25

A juventude não ajuda na produção da virtude, pois a vida moderada não é

um atributo perseguido, a presença da paixão é dominante e a razão translúcida se

transforma em algo denso e obscuro. A virtude, portanto, só é alcançada com hábito

de praticar boas ações e com o tempo, na medida em que se vai constituindo a

personalidade do homem e ajustando este para resultados corretos e justos.

O agir voluntariamente, entendido como virtude não pode ser concebido na perspectiva dos desejos, das intenções ou das decisões improvisadas e momentâneas. É preciso agir com razoável conhecimento das circunstâncias para, assim, poder decidir adequadamente e, a partir desse desejo deliberado, poder agir de modo correto e justo. O desejo corretamente orientado é fruto da prática habitual das virtudes morais, que, desde o nascimento, vão constituindo nossas personalidades na medida em que somos educados e que fazemos nossas escolhas e ações ao longo da vida. O hábito de praticar boas ações vai constituindo nosso caráter moral que, por sua vez, deverá expressar sob as orientações da razão as escolhas e respostas emocionais corretas e justas para alcançar uma vida boa e feliz.26

Há que se mencionar que quando adulto, ainda que se tenha disciplina e

consolidado hábitos da virtude, ainda assim são necessárias as leis para que, de uma

maneira geral, e para a vida toda, as mesmas possam combater e agir através da

punição nos momentos onde a razão e a nobreza de conduta não puderem atuar

continuamente.

A maleabilidade não assegura os interesses futuros uma vez que a

maleabilidade interfere na persistência futura. A pessoa maleável não se destrói,

ocorre que essa pessoa muda suas escolhas. Materializando essa maleabilidade,

pode-se usar a dissolução de amizades. A minha amizade existe em função do

25 ADLER, J M., 2014,. p. 108. 26 SANGALI; STEFANI, 2012, p. 63.

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caráter virtuoso desta, mas se de alguma forma não vejo mais esse caráter, a

pessoa deixa de ser aquele amigo que era para mim. É claro também que a

flexibilidade é aceitável para a pessoa que tenha mau caráter, pois se ela abandona

esse procedimento ela está adicionando uma melhoria à sua personalidade.

Para Aristóteles, a alma é racional como também não racional. Na não

racional estaria alocada a parte vegetativa e a apetitiva, enquanto que na parte

racional estaria o intelecto, o pensamento racional. A vegetativa não obedece à

razão e a apetitiva obedece de certo modo à razão, na medida em que esta regula

as paixões, fazendo com que seja obedecida.

O virtuoso possui amigos, percebe a honra e a boa reputação e ainda recebe e

oferece dinheiro e, por mais que os bens exteriores representem um valor de grande

relevância na vida de um indivíduo, ele não o tem como principal valor, não o

supervaloriza. Para o virtuoso os bens possuem um grau moderado de importância.

Ao analisar um otimista e um pessimista onde ambos possuem fortuna, o

otimista usará os bens exteriores e será mais feliz que o pessimista, visto que este

não usa sua fortuna com medo de perdê-la. A essência do otimista é o objeto de

Aristóteles, pois a virtude com otimismo permite usar bem a fortuna e a superar a má

fortuna quando ela ocorre sem que o otimista se considere um perdedor. Ele

enfrentará com serenidade a má fortuna. Então a sustentação para preparação e

enfrentamento tanto da boa como da má fortuna se realizará através da

racionalidade prática e da estabilidade dominante. Aristóteles também inclui como

bem a família, os amigos e os concidadãos.

Ele mostra que os erros são evitados no caminho da virtude. A pessoa virtuosa

evita preocupar-se com os bens exteriores, bem como em ter uma visão pessimista

com relação a eles – o virtuoso age acertadamente em situações que se apresentam.

Para Aristóteles, as virtudes éticas se aprendem da mesma forma como se aprende

uma profissão: a virtude é comparada a uma apólice, ou seja, somos reembolsadas

em circunstâncias desfavoráveis e desnecessária em circunstâncias favoráveis.

A pessoa inflexível possui coragem, força para suportar a perda de bens

exteriores. Para Aristóteles, a pessoa virtuosa adotará a postura correta diante de

uma situação desfavorável porque é nobre e magnânima. Essa pessoa magnânima

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significa que se preocupa com a comunidade, ela utiliza de suas posses para com a

comunidade e valoriza os bens exteriores para utilizá-los nas ocasiões corretas.

A pessoa persegue seus objetivos e estes são dominantes, por isso sua

felicidade permanece mesmo que o resultado seja o fracasso. A pessoa magnânima

persegue o bem, portanto não se abate quando se depara com a má fortuna. O

contrário só resulta em egoísmo, em excesso nas valorizações dos bens exteriores,

prejudica os amigos e enganam-se uns aos outros. Quem se preocupa com a

opinião alheia está propenso a fazer algo tolo ou perigoso, encontrando aqui o

caráter maleável. A inflexibilidade defendida por Aristóteles é a realizada com

justiça, com um senso apurado de seu valor, que não desonra e muito menos se

apega só com a honra ou com o bem exterior.

A virtude é dominante e ela traz o poder da subordinação de tudo o que dela

decorre. A inflexibilidade só é boa se ela estiver associada às coisas corretas. Apesar

das críticas, Aristóteles associa felicidade com a virtude, ele pega uma carona na

concepção de Sólon para demonstrar que o acaso não determina se somos ou não

felizes, que ser inflexível é correto se estivermos relacionando a coisas corretas, que a

felicidade pode ser instável, mas seu componente dominante é estável e, por fim, que

a pessoa virtuosa tem um compromisso com a virtude justificado no bem e no grau

correto.

Para Aristóteles, a finalidade do homem é encontrar a felicidade. Para que o

homem a alcance é necessário viver racionalmente, o que implica viver segundo a

virtude que, por sua vez, é encontrada entre os opostos, isto é, entre deficiência e

excesso. Que a virtude não é inata no homem e onde há excesso ou vício não existe

virtude e esta se instala no homem através da educação, hábito e prática, sendo

atualizada pelo hábito de praticar ações boas – o hábito formador do caráter que

resulta no controle das paixões. Não se pode esquecer que somos responsáveis por

nossas ações e que na parte mais elevada da alma encontram-se as virtudes da

razão. Ela nos dá a capacidade de deliberar bem, de calcular bem de modo a

encontrar os meios necessários e adequados para alcançar um bom fim e também

são necessários uma boa família e viver numa boa sociedade, sendo que viver

numa boa sociedade significa que esta trata de modo justo os indivíduos e seus

membros.

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9. POR UMA LEITURA DIALÉTICA

O debate principal aqui é saber qual foi o método utilizado na ética de

Aristotélica, se foi o método dialético ou científico ou se seria ainda os “endoxa”,

opiniões comuns tanto da maioria como dos mais respeitáveis que ajudaram a

construir os princípios que nortearam os argumentos de Aristóteles.

Essa questão divide vários intérpretes em dois campos opostos. Para

intérpretes como John Burnet e Georges Rodier e outros autores, o método seria

dialético visto que ele recai inteiramente sobre os endoxa. Para os autores W.F.R.

Hardie ou Terence Irwin, defendem o método científico, baseado nas investigações.

[...] W.F.R. Hardie ou Terence Irwin, que se incluem na corrente aberta por Stewart e Susemihl, defende exatamente a ideia inversa: o método das investigações éticas seria o mesmo ou de qualquer forma muito semelhante aos de outras investigações; a exemplo do que ocorre na Física ou no de Anima, as numerosas e longas discussões de tipo dialético seriam substituídas por considerações de tipo científico.27

Na defesa da interpretação científica está o livro Ética a Nicômaco onde

encontra-se descrita a base de uma ética universal, e que não se refere à cultura

grega ou de uma época. Porém, fica evidente para os estudiosos que também é

válida a importância dos “endoxa”.

Na ética a Nicômaco há numerosas passagens que falam a respeito do

método. Inicia-se pela apreciação dos fatos tal como são e expõe os problemas para

provar a melhor das opiniões comuns que afligem a alma – ou pelo menos tentar

restringir nas mais importantes dessas opiniões –, e se puderem resolver os

problemas e manter as opiniões comuns então a prova se realizará.

Pierre Destrée (2002) nisso se baseia, no capítulo 6, do primeiro livro da Ética

a Nicômaco, pois para ele este livro fornece como conceito central a definição da

felicidade para Aristóteles, bem como a filosofia prática de Aristóteles.

27 DESTRÉE, P Comment Démontrer le Propre de l’Homme – Pour une Lecture Dialectique de EN I 6. Publicado originalmente em G. Romeyer Dherbey e G. Aubry L’Excellence de La Vie, Vrin 2002, p. 39-61. In: ZINGANO, 2010,,p.380.

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[...] esse capítulo é evidentemente crucial na economia da obra inteira, porque ele nos fornece a definição aristotélica à felicidade, que é o conceito central, e mesmo fundamental, da filosofia prática de Aristóteles. Mas também pela razão que esse capítulo é considerado um dos maiores instrumentos de prova de interpretação ‘científica’ do método da filosofia prática de Aristóteles.28

Destrée procura no Princípio da Não Contradição a demonstração de um

princípio que se origina de outro, que um princípio último validado não pode aceitar a

validade de um princípio contrário. Trata-se de uma lei contra a contradição. Ela está

ligada ao bom senso sobre as realidades que devemos pensar. Ela nos diz que não

devemos responder a uma questão – sim e não – ao mesmo tempo. Uma coisa

qualquer não pode existir e não existir, ao mesmo tempo. Ou ela existe ou ela não

existe. Para Aristóteles essa lei é evidente.

Esse princípio vai demonstrar ao final que o homem de alguma maneira

acaba formatando uma opinião que lhe serve como convicção. A defesa do filósofo

passa pelo esclarecimento do pensamento desorganizado e atrapalhado, recusando

opiniões comuns e doutrinas filosóficas não alinhadas com o esclarecimento.

Destrée (2002) vai analisar especificamente o capítulo 6 da Ética a Nicômaco

onde extrairá três pontos que na sua apreciação são os mais importantes.

- O próprio capítulo

- A maneira como Aristóteles aborda seu argumento

- A maneira de se argumentar sobre a “Função do Homem”.

Para Destrée há uma continuidade progressiva nos capítulos 3 a 5 cujo

método utilizado é o dialético, e ao chegar no capítulo 6 este já utilizaria o método

científico.

A estratégia de Aristóteles seria utilizar como final para seu argumento, para

dar carga de verdade ou de falsidade o senso comum. O seu método está dirigido

para uma opinião ou desejo que a princípio nos seja essencial para se confrontar

com outras de nossas opiniões ou desejos.

28 Ibidem, p.382.

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No capítulo 3, ainda por Destrée, foram apresentadas resposta à questão

formulada sobre “o que é felicidade?”. Na resposta 1, encontra-se a das pessoas

vulgares, onde a felicidade estará no prazer, na vida dedicada à satisfação do prazer ao

qual é criticada, pois essa resposta leva à conclusão da escravidão e na não diferença

da pessoa e do animal. Na resposta 2, encontramos a que informa que a felicidade é

encontrada na busca de honras. Com efeito, essa visão vai de encontro aos homens

políticos, onde também aparecem as críticas, visto que a honra é um efeito.

Essas duas concepções não encontram identificação com a nossa impressão

quanto à felicidade. Tanto a honra como a riqueza são um meio cujo fim seria outro.

Então ainda aqui não temos a reposta do que esperamos da felicidade.

Na busca pela argumentação, Aristóteles se vale de outros livros, ele faz

várias objeções e o que ele deixa claro é que sua busca passa pelo praticável, por

aquilo que o homem pode realizar. Para Platão suas investigações são teóricas e

para Aristóteles pouco importa saber o que é a felicidade, o que para ele tem valor e

importância é como tornar-se efetivamente feliz.

A crítica de Aristóteles em Platão não resulta do fato de que a identificação do

que é a felicidade esteja fora de foco e que não seja importante, mas que ele

também deveria conter a prática, ou seja, iniciar o ponto de partida onde está

localizada a perspectiva de que todos os homens desejam ser felizes.

Outro ponto que Destrée quer que seja entendido é que a busca pela

felicidade não é pela felicidade geral, mas particularmente, a felicidade do homem.

O critério da felicidade passa pela escolha ou por uma decisão que termina na

finalidade. Para Aristóteles a felicidade aparece como algo perfeito e autossuficiente,

sendo o fim de nossas ações. O bem supremo é a felicidade, mas qual é a definição

de felicidade. Aristóteles se propõe a responder, mas o melhor método é retomar um

argumento familiar.

Para isso Aristóteles utiliza-se do método de ensinar ao ouvinte sem

apresentar coisa nova e, dessa forma, ele faz comparações para assegurar sem

objeções as nossas opiniões. No exemplo: a fabricação de calçado é para o

sapateiro assim como a visão é para o olho, o uso da razão pelo homem é igual para

ambos os casos. Aristóteles quer demonstrar que o homem também possui um

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“ergon” o que significa para algumas traduções a correspondência de “função” para

Aristóteles, que em palavras se traduzem como a atividade que revela o “bem”.

Para Aristóteles, uma mão de pedra ou de outro material sólido tem a mesma

estrutura visual de mão, mas não pode executar nenhuma tarefa. Na verdade o

“ergon do homem é a energia da alma segundo o logos” (1098a7).29 A compreensão

do “ergon” passa pela dúvida se ele é uma função, tarefa ou atividade essencial de

um ser e se pode ser naturalista ou metafísica. A impressão que se tem é que

quando se fala de função ou atividade essencial, a interpretação pode ser

naturalista.

Por outro lado, quando Santo Tomás expõe a expressão “a natureza não faz

nada em vão”, atribui através do oculto que Deus é que deu ao homem uma função.

Mas de uma forma ou de outra, Aristóteles não defende, apenas as utiliza de forma

metafórica. A finalidade, portanto, da argumentação é uma resposta para o jogo de

palavras que leva a interpretar o que é essa atividade essencial.

Em torno dessa reflexão vem a pergunta de Aristóteles para que o ouvinte

possa ser provocado. “O homem teria nascido para dormir e não ter nenhuma

atividade a realizar?”30.

Então ainda permanece a pergunta: “Qual é a característica essencial do

homem”? O que ela pode ser?

Poderia ser o simplesmente viver, mas isso não é característica só do

homem, é também dos vegetais. Seria a vida sensitiva? Também não, pois esse

atributo também é verificado nos animais. Onde então estaria esse próprio do

homem? Estaria onde a vida se apresenta com certa atividade interior pertencente à

alma, exposta na razão.

Para chegar a isso, Aristóteles induz o ouvinte a formular sua própria

resposta, a partir de um diálogo daquilo que já é de seu conhecimento e

obscuramente todo mundo pensa. Ele volta ao argumento para que paralelamente

seja absorvido onde está a resposta, ou seja, que uma vida explicitamente vivida só

29 Idem, p.398. 30 Ibidem, p. 400.

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no prazer se torna bestial, pois o que todos os homens buscam é uma vida própria

da espécie humana.

Aristóteles utiliza o método de reflexão por meio de respostas às questões de

forma a ser absorvida ou eliminar aquilo que não nos satisfaçam aparecendo aqui a

figura também do método dialético como uma artimanha para talvez constatar a

veracidade da sua teoria.

Parece, talvez, que Aristóteles quisesse apresentar de forma distinta as três

formas de vida.

. viver comum aos vegetais

. sensitivo como os animais

. atividade da alma que é próprio do homem

O homem é, portanto, o único a ter e ser o logos (reflexão). Essa capacidade

de racionalização é o determinante do homem e sem ela seria impossível adicionar

qualquer descoberta, compreensão e reflexão sobre tudo que cerca o homem.

Então fica claro que assim como o escultor exerce uma atividade que é própria de

seu ofício e pode ser apreciada por todos é onde também reside o bem ou o

sucesso. A felicidade também é uma atividade onde o foco de seu ofício seria o

logos e essa vida bem sucedida seria também apreciada por todos.

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10. A DOUTRINA ARISTOTÉLICA DO MEIO TERMO

A ética da virtude proclamada por Aristóteles é a mais atraente em relação a

outros filósofos. Para falar sobre a virtude temos que iniciar com a dor e o prazer. A

apresentação do prazer se faz a partir da infância. Estaria longe do mediano se a

abstinência o incomodasse ou se se aproveitasse de maneira desregrada. Como

afirma Edson Bini (2014) “Ademais, se as virtudes têm a ver com ações e paixões e

toda paixão e toda ação são acompanhadas por prazer e dor”31, a virtude tem

relação direta com a dor e o prazer e com o moderado.

A virtude é entendida como uma qualidade humana no sentido de agir da

melhor forma quanto ao prazer e às dores. A Ética da virtude agrada mais a teoria da

ética moderna, ela se aproxima mais do senso comum, como no exemplo que o bem

precisa ser prazeroso e que a virtude não cria barreiras contra o efeito de atos

desastrosos.

Aristóteles relaciona o conceito de virtude com a conquista de uma vida

melhor e próspera e coloca que a virtude é um processo que se inicia na formação e

se estabelece no caráter da pessoa. Para Aristóteles, a virtude é um ponto médio

entre dois vícios correlatos e que gera embate entre teóricos que o criticam e outros

que com classe o ignoram.

É intenção do comentador Cristof Rapp destacar algumas características para

tornar a doutrina do meio termo mais aceitável. “[...] vou sublinhar algumas

características da definição aristotélica da virtude ética que permitem uma leitura

mais benevolente da doutrina do meio termo.”32

Espera-se muito da doutrina do meio e com frequência a reação é de

frustração. Na Ética Nicomaquea, o primeiro livro examina a felicidade e no segundo

livro aparece o meio termo, onde é analisada a virtude ética. O terceiro e quarto

livro abordam as virtudes particulares. Curiosamente essa sequência vai se repetir

na Etica Eudemia, ou seja, o primeiro capítulo introduz uma definição de felicidade

31 BINI, 2014, p. 86. 32 RAPP. C. What Use is Aristotle’s Doctrine of the Mean? Publicado originalmente em B. Reis, The Virtuous Life in Grrek Ethics, Cambridge University Press 2006, p. 99-126. In: ZINGANO, 2010, p.406.

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depois vai para a virtude ética, só que para abordá-la de forma geral há uma

discussão abundante de cada virtude particular.

Na Ética Eudemia ”[...] a felicidade (eudaimonia) é caracterizada como a

atividade de uma vida completa em concordância com a virtude completa.”33 Para

Aristóteles a investigação da palavra-chave “virtude” é essencial para um melhor

entendimento sobre a felicidade.

A virtude (aretê) vem indicar que somente a boa (em vez de cada) atividade

da alma deve ser associada à felicidade, quer dizer, portanto, um estado de

excelência. Há também diferença de virtude no plural e singular. No plural referindo-

se a traços de personalidade e no singular significando o excelente estado da alma.

Esta abordagem é necessária para se compreender a ligação entre elas.

A virtude também pode ser ética e pode ser intelectual. Dentro dessa divisão

Aristóteles associa as virtudes intelectuais com a parte da alma que possui razão e a

virtude ética àquela que não possui razão em si mesma, mas que reage ao comando

da razão.

A virtude ética se apresenta nas ações executadas, ou seja, através de atos

justos, do poder de valoração no sentido de méritos e qualidades, enquanto que a

virtude intelectual é decorrente da virtude moral. O ponto da questão é definir o bom

estado da parte não racional, ao que Aristóteles leva a entender que se ela obedece

o que a razão comanda, significa então que ela está em bom estado.

Para assegurar a resposta quanto à obediência temos que entender a

doutrina do meio, pois ela contribuirá para a solução da questão. Em termos

conceituais muitas coisas com relação ao seu montante podem ter excesso,

deficiência ou meio termo; o núcleo da doutrina do meio termo para Aristóteles

implica em que o que é bom ou correto não deve ser nem muito, nem pouco, daí

fazer uma analogia com o provérbio onde “pessoas costumam dizer que o que é

bem acabado não é possível nem acrescentar e nem retirar algo” (EM 2.6. 1106b9-

33 Ibidem, p. 407.

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11).34 Aristóteles resume-a em o excesso e deficiência como malograr e o

intermediário como acertar.

A atração por tudo àquilo que o homem pode participar é muito grande. A

busca por sempre mais é constante, o homem pode querer mais do que ele precisa,

e mais do que ele precisa na verdade não lhe faz bem. Pode também acontecer o

contrário, ele não se sente estimulado a buscar nada e essa falta de pretensão

também não lhe faz bem.

O homem que tem medo e o que se entrega a todo o prazer são pessoas que

desconhecem o que é bom e o que seria uma ação virtuosa. Para Aristóteles, o

homem bom trabalha retamente com o excelente, o benéfico e o agradável, bem

como sabe do vergonhoso, do prejudicial e do doloroso. Aquele que está longe do

bom, erra sobre todos esses termos, visto que o que rege a sua direção e está

aprofundado em si é o desejo do prazer.

O correto e o bom não podem ser colocados através de uma regra geral, visto

que as virtudes éticas estão embasadas em atos contínuos, o meio termo não significa

uma decisão, nem uma técnica, significa portanto, exatidão, bondade e retidão.

O meio termo evita diversas falhas, ou seja, ser muito ou ser pouco. Ele dá

como exemplo a força física, que pode ser destruída pelo treinamento excessivo ou

deficiente se não for praticada.

De qualquer forma, aconteça o que acontecer, fica claro que o estado mediano é louvável, pois é ele que nos conduz à ira com as pessoas devidas pelas coisas devidas da maneira devida e assim por diante, ao passo que todas as formas de excesso e deficiência são censuráveis.35

Aristóteles observa que o excesso e deficiência podem destruir nossas

faculdades físicas e psíquicas. Excesso e deficiência são a marca do vício e na

mediania encontra-se a marca da virtude.

34 RAPP. C. What Use is Aristotle’s Doctrine of the Mean? Publicado originalmente em B. Reis, The Virtuous Life in Grrek Ethics, Cambridge University Press 2006, p. 99-126. In: ZINGANO, 2010, p. 412. 35 BINI, 2014, p. 167.

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54

Os maus hábitos levam o homem a fazer escolhas erradas e cada vez que se

faz uma escolha errada leva o homem para uma caminhada na direção oposta, e

quando se escolhe a direção certa o homem leva a cabo o fim último de viver uma

vida boa. Aqueles que regularmente fazem escolhas erradas ocasionam também

injustiças e prejudicarão outras pessoas e a sociedade. Portanto a pessoa virtuosa é

aquela que faz escolhas certas regularmente, não há a presença do mais nem do

menos e de forma repetida e regularmente ela acerta ainda que não

necessariamente todas às vezes.

Outra formulação argumentada é a de que quem foge de toda (geral) situação

perigosa se torna covarde, e quem evita todo (geral) tipo de prazer é insensato. Isso

só acontece porque os impulsos não racionais interferem no julgamento correto,

impedindo de observar que para tudo há um grau, e essa medida pode acarretar o

perigo ou prazer e que deficiências ou excessos desviam para longe do bom ou do

correto. Esse mesmo desvio ocorre com a virtude, ou seja, ela pode ser destruída

pelo excesso ou deficiência ou ainda, o excesso ou deficiência não geram virtudes.

A doutrina do meio termo não foi trazida por Aristóteles para ser uma regra

geral, visto que para ele regras e enunciados gerais não podem a todo momento

determinar o que é bom ou correto. A doutrina do meio termo, na verdade,

estabelece enunciados que funcionam mais de uma vez e não como regra geral.

Ainda quanto ao meio termo há que se fazer duas distinções o meio termo

relativo ao objeto em si e ao meio termo relativo a nós. No meio termo relativo ao

objeto é fácil observar as extremidades e ainda pode também ser quantificado

aritmeticamente. O mesmo não pode ser aplicado e dito quanto ao meio termo

relativo a nós.

Certamente, um treinador de cavalos, responsável pela escolha da sua dieta, não escolherá uma única e a mesma dieta para todos, mas sim uma para o velho Bucéfalo, outra para o jovem e agitado Pégaso e outra para Xantipa que está prenhe e, ainda, diferentemente no inverno e no verão, de acordo com a quantidade de exercícios que eles realizam, etc. 36

36 KRAUT, 2009, p. 101.

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55

Um professor de educação física, que trabalha com exercícios físicos para

tratamento da saúde, vai desenvolver um treinamento específico de acordo com as

condições físicas e idade do seu cliente. Assim, para uma pessoa de 25 anos o

treinamento será desenvolvido com base no aspecto da potência que a idade

oferece e para uma pessoa de oitenta anos o treinamento será desenvolvido de

acordo com os movimentos possíveis e com uma dinâmica menos frequente de

modo a deixar o treinamento agradável, eficiente e leve. Esse mesmo treinamento

também vai variar em relação ao gênero, demonstrando assim que a mediania não é

a mesma para todos e consequente não é uma única coisa.

A mediania relativa a nós não produz um bom produto, um bom vaso ou um

bom cavalo de corrida, no contexto da ética, envolve a excelência, agir e sentir bem

– é a mediania relativa a circunstâncias relevantes, bem como ela pode ser uma

coisa para mim e outra para outra pessoa. A mediania relativa a nós é dirigida aos

bens humanos e cujo alvo é agir e sentir nas ocasiões certas, em relação às coisas

certas, pelas razões certas, em relação às pessoas certas.

O meio relativo a nós pressupõe o uso e conjugação da razão (logos) e do

conhecimento prático do homem (phronimos). Mas isso ainda não é suficiente para

Aristóteles, pois ainda coloca a participação de um sábio para a finalização de uma

boa ação. Percebe-se assim que a presença de uma pessoa virtuosa, de qualidades

incontestáveis e que por si só é particular, chegará à resposta ao procedimento

correto, aniquilando, portanto, a aplicação de qualquer regra ou premissa.

Isso na realidade traz um problema, o meio termo nem sempre poderá ser

usado. Aristóteles dá o exemplo que a inveja, assassinato e adultério não há muito

nem pouco, o ato em si é completamente reprovável. Comentadores conseguem sair

pela tangente, justificando que a virtude sendo continua, pode ser divisível daí a

existência do parâmetro do meio termo.

Há uma distinção a se perceber, ou seja, que a virtude está entre dois vícios

enquanto que a emoção e ação por ser quantitativo o ponto correto é o ponto médio

cuja linha demonstra que não há excessos ou deficiências. A virtude não é divisível,

bem como ela é desejável e boa. Concluindo, daí, que quando Aristóteles se refere

ao meio termo refere-se às emoções e ações e não a virtudes e vícios.

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Na Retórica em 3.2, Aristóteles procura explicar o que vem a ser a virtude da

prosa. Ela deve ser clara, nobre e admirável. Essas características são importantes

no sentido de darem mais sustentação a um discurso. O discurso deve ser admirável

porque assim o orador despertará a atenção para sua fala e através da nobreza

soará o discurso mais agradável e a clareza final tornará o discurso mais facilmente

inteligível. O discurso deve então apresentar um meio termo, pois ele não pode ser

banal demais e nobre demais – é o que o autor chama de “virtude de estilo”.

Um discurso muito nobre vai combinar neologismo, metáforas,

estrangeirismos, epítetos, deixando o discurso muito complexo, perdendo a clareza

na compreensão. A nobreza pode ser um obstáculo para a clareza, bem como pode

deixar irritados os ouvintes e ainda passar a imagem de uma oratória artificial,

demonstrando assim uma falha de estilo.

Portanto, os excessos prejudicam e inviabilizam a audiência e desestimulam a

apreciação pela arte da eloquência e da narrativa profunda, bem como, pode

também atrapalhar tão somente uma palavra como pode prejudicar o estilo, ou

também quando uma palavra estiver qualitativamente errada pode virar

quantitativamente por ser uma palavra errada demais.

Ainda dentro da doutrina do meio termo deve-se falar sobre muitas ações que

dentro da mediania chegam à virtude. No caso da Lei ela proíbe vícios e também

ordena virtudes. A justiça é chamada de a virtude perfeita. A lei proíbe vários vícios

particulares e, por outro lado, ordena as várias virtudes particulares.

O juiz restaura a igualdade através da punição, ou seja, se o indivíduo sofreu

algum dano, ele está numa situação de menos ou de perda, de outro lado o agressor

encontra-se pelo seu fazer no mais e ou no estado de ganho. Nessa linha imaginária

o igual vem atender a mediania, assim como atende a justiça correta e o juiz sendo

o mediador para a realização do justo.

Infringir a lei é usar de excesso e sofrer uma injustiça é a deficiência. A

virtude ética também, analogamente a virtude de estilo apresenta a questão de

excesso e de deficiência, porém, as falhas aparecem na qualidade e não na

quantidade, ou seja, no fato de apresentar equivocadamente uma reação ou emoção

com um caráter de deficiência ou de excesso.

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O autor dá como exemplo ter ira quando a emoção deveria ser contrária. O

mesmo também ocorre para vícios tais como assassinato, roubo, inveja,

malevolência e adultério. No caso do adultério o autor explica que é o tipo de ação

que sempre acontece com a pessoa errada, na hora errada, deixando claro aqui um

excesso na direção da falha.

Exemplos de excesso, deficiência e mediania:

Desregramento/insensível-moderação

Prodigalidade/mesquinhez-generosidade

Bufão/rude-espirituoso

Bajulador/obsequioso-amistoso

A princípio, as falhas quantitativas e qualitativas são facilmente identificáveis

e fáceis se forem analisadas de forma sintética, porém, numa análise mais

elaborada a estruturação nos oferece um resultado não tão exato.

Muitas vezes explodimos por um fato sutil, em outra oportunidade explodimos

com a pessoa errada e ainda em outras ocasiões fazemos isso com muitas pessoas,

o que nos torna pessoas reprováveis. Nessa linha, o entendimento que se supõe é

que essas explosões estão orientadas para uma ou várias pessoas, ou ainda, para

um caso, designando uma dimensão, supondo uma medida em termos quantitativos.

Num sentido mais profundo podemos indagar qual o grau que pode ser

estabelecido para “demais”, o que é essa explosão excessiva? Outro detalhe:

quantas ocasiões ou quantas pessoas são necessárias para se avaliar o excesso?

Em que momento deixou de ser moderado? E se essa pessoa passa por insulto com

frequência, não estaria justificada a sua explosão?

Para julgar alguém é necessário ter todos os elementos que envolvem a

situação e a pessoa. Chega-se então a conclusão que para se avaliar a deficiência

ou excesso quantitativo depende da qualidade atribuída às falhas.

Assim como comer maçãs demais, evidencia um excesso a um padrão de

comportamento correto, o mesmo acontece com falhas qualitativas. Nenhuma

quantidade pode definir o certo ou o errado, só é possível uma relação se já há uma

definição padrão do bom ou do certo em determinada situação.

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O meio termo a nós deve colocar à vista o modo certo a se conduzir, ou ainda, a

exata verificação do movimento, certificando-se do que é correto, de forma a evitar ou

desviar-se do excesso e da deficiência. Ainda na abordagem sobre virtudes Aristóteles

introduz os “parâmetros” isso por que existem falhas no agir e como fazer para acertar.

Esse pensar sobre as falhas é contemplado quando abordamos o fato de que de algum

modo, em muitas ocasiões, não acertam a maneira de tratar um assunto, como também

muitas vezes se erra no tratar de forma adequada com a pessoa certa e a excelência

está em justamente aplicar o ponto intermediário certo.

Por exemplo, tanto o medo, quanto a confiança, o apetite, a raiva, a pena e, em geral, o prazer e a dor podem ser sentido muito ou muito pouco e, em ambos os casos, não da maneira correta, mas senti-los nos momentos certos, com referência aos objetos certos, em relação às pessoas certas, com o intento certo e do modo correto, é o que é intermediário e melhor, e isso é característicos da excelência.37

Aqui o parâmetro vai significar a maneira correta de agir, ou seja, como ter o

medo na medida certa e na hora certa. O parâmetro é um ponto para se avaliar o muito

e o muito pouco, não no sentido aritmético, mas na qualidade dos sentimentos

expressados.

O parâmetro veio para ajudar o conceito do meio termo. É demonstrável também

até aqui que sempre há dois modos de falhar, ou pelo excesso ou pela deficiência.

Será que se uma pessoa tiver raiva – por exemplo, trinta vezes por mês, no seu

local de trabalho, é melhor que ter raiva quarenta vezes? Será que o local de trabalho é

um lugar propício para fomentar esse sentimento? O parâmetro vai filtrar tão somente

se as nossas reações foram corretas, ainda que, para mais ou para menos, essa

escala do mais ou do menos é que dará qualidade à reação das nossas emoções.

A virtude está representada pelo “meio” e esse meio não é o mesmo para todos,

essa eleição do meio está relacionada com nós, determinada pela razão. A virtude vai

se caracterizar quando se irritar, se compadecer, se desejar, sentir prazer e sentir dor

no momento adequado, em relação às coisas certas e com as pessoas corretas.

37 ROSS, W.D. (trad.) Nicomachean Ethics em: The Works of Aristotle Translated into English, v. 9. Oxford, l925. In: ZINGANO, 2010, p. 433.

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Outra correspondência a se falar é sobre o grau de responsabilidade de

nossos atos. Para Aristóteles, a única ignorância que nos absolve de

responsabilidade é a ignorância acerca de alguma coisa material, por exemplo:

acreditar que as balas da arma eram de festim, quando eram balas de verdade.

Se para o fim desejado os meios forem eleitos e deliberados de acordo com

ele, significa que os meios têm relação com a virtude, logo a virtude depende de

nós, assim como o vício também depende de nós.

Aristóteles não dá exemplos de pessoas erradas, mas pela leitura consegue se

pensar em exemplos de excesso e deficiência. O meio termo pode ser exemplificado

como um círculo onde o meio é o alvo desejado. O centro de um alvo é circular e

podemos inferir que é difícil de acertar o meio, enquanto que errar é muito fácil. Há

muitas maneiras de errar, enquanto há apenas uma maneira de acertar.

“O morrer para escapar da pobreza, do amor ou de algo doloroso, como

reconheceu Aristóteles é sinal de covardia e não de valor. Assim, pois, é condição

necessária para que uma ação seja valorosa que se cometa pelo excelente”38; em

outras palavras, deve-se ter uma ação baseada em meios e fins corretos, visto que o

virtuoso tem suas ações baseadas no que tem valor moral e intelectual.

Muitas coisas que fazemos são reprováveis, quer por excesso ou por

deficiência, porém há que se observar que o meio termo não se pode medir ou ser

determinado aritmeticamente entre o excesso e a deficiência. É através do número de

reações deficientes ou excessivas que podemos representar graficamente em escala.

O virtuoso para alcançar esse status deverá atingir nas circunstâncias e

questões relevantes o ponto médio para as suas ações. O que interessa, portanto, é

a quantidade de reações inapropriadas, pois elas distanciam as pessoas do meio

termo que, em consequência, ficam longe do bom, do que é certo.

Ainda dentro do resultado de excesso ou deficiência, encontramos os

“parâmetros” onde, por meio de nossas reações, pode ser verificado se os impulsos

38 “El morir para escapar de la pobreza, del amor o de algo doloroso, como añade Aristóteles um poco más adelante, es señal de cobardia, y no de valor. Así pues, es condición necessária de que uma accín sea valerosa el que se cometa “por lo excelente” GONZÁLES ARAMBURO (trad), Introducción a la ética griega, p. 188.

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da nossa alma não racional estiverem em consonância com a nossa razão,

correspondendo às ações boas ou corretas ou, ainda, o contrário.

É certo que a virtude é o ponto mediano entre as paixões e as ações e para

achar a mediana há que se passar por vezes pelo excesso e por vezes pela

deficiência, pois só assim atinge-se o conhecimento do estado mediano e do bem.

É intrigante para Rosalind Hursthouse39 que a paixão sendo inata no homem,

como pode este receber as virtudes. Ela acha a resposta no hábito e que desde

criança devemos ser educadas para nos deleitarmos e sofrer por coisas certas. É

desde pequena que devemos fazer nas crianças os ajustes necessários de modo a

demonstrar que algumas coisas fazem mal e são perigosas, que outras são gostosas

e boas e através desse senso vamos nos alegrar e sofrer pelas coisas certas.

Esse ajuste vai se transformando aos poucos em ensinamento onde desde os

primeiros dias deve-se aplicar as palavras relevantes às variadas situações.

Engana-se quem acha que a técnica de adestramento de animais é a mesma que se

utiliza para o homem. Na verdade, nas palavras está o início da reflexão, é um

treinamento a base do pensamento e da fala, nomeando palavras e circunstâncias

específicas para a virtude. O resultado disso é o despertar das virtudes em potencial

existente no ser humano, cujo despertar será provocado pelo experimentar contínuo

das palavras nas variadas situações, encorajando as pessoas a pensar em si

mesmas como potencialmente boas e a praticar as virtudes, desenvolvendo assim

as suas disposições naturais para a virtude.

39 Rosalind Hursthouse, filósofa, nascida na Inglaterra,

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11. ARISTÓTELES E A EDUCAÇÃO

No Liceu, Aristóteles dedicava-se ao estudo e sistematização de seus cursos.

A maior parte de seus escritos era utilizada nas suas aulas. A Filosofia era uma

atividade especificamente oral. Aristóteles acreditava que o filósofo deveria focar a

sua vida em estudos e não em política, decorrendo daí a visão de que só os homens

políticos teriam a possibilidade da transformação da cidade e dos homens,

originando assim o objetivo de preparar o homem para uma conduta ética e para a

prática da virtude.

Para a saúde do Estado a educação entra como parte importante e

necessária ao regime.

É indubitável, portanto, como ele próprio menciona que o legislador deve ocupar-se seriamente da educação dos jovens, pois quando isso não ocorre provoca danos nas cidades, uma espécie de patologia ou de desgaste para o regime. Será preciso, com toda certeza que a educação e a formação do cidadão sejam conformes à moral, caráter que convém a todo o regime, pois é desse modo somente que o regime fica garantido e estabelecido desde o início.40

A educação promove a segurança necessária ao regime. A saúde aqui

referenciada está ligada à unidade orgânica da comunidade política. Na Grécia

antiga, a educação era um componente imprescindível para a política, visto que é

por meio da educação que o homem pode querer e realizar o bem estar comum,

com vista a uma cidade perfeita e um cidadão feliz e só aquele que é capaz de

legislar deve contribuir para a educação. Funciona como um círculo, pois o que

legisla também foi no passado um aluno.

Aristóteles percebe que os homens têm necessidade e anseiam por uma

instrução correta e por alguém que seja o timoneiro desse conhecimento, de modo a

conduzi-los, e que se dediquem durante uma vida toda. A autoridade paterna não

impõe o caráter e deferência da obediência, somente a Lei tem esse poder e em

sendo esta uma norma escrita, aqueles que estão sob seu escudo sabem que ela só

prescreve o que é justo e não há como atacá-la.

40 HOURDAKIS, 2001, p.28.

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Para o filósofo, é um grande erro considerar a guerra e a dominação como fim

do Estado; na verdade, para o filósofo o que realmente tem importância é a paz e o

tempo livre, desenvolvendo nos homens a oportunidade para cultivarem suas

virtudes políticas e morais.

Entre as funções do legislador está à ocupação da educação dos jovens,

estabelecer leis que ajudem a propagar a educação da moral e a vida política no

Estado. O Estado também participa desde a procriação até a maioridade, imprimindo

um cuidado com a alimentação de gestantes e dos bebês, habituando no tempo

devido a criança a se movimentar e na adolescência tomar parte da leitura e das

ciências e na maioridade até os 35 anos prestar serviço militar.

Para se ensinar a virtude, o adequado inicialmente é por meio do hábito, visto

a matéria não ser constituída de saber teórico. Na verdade, é um rol de costumes

que deve ser exercitado nas gerações mais jovens, com a finalidade de que na vida

adulta possam ter apreendido, através da repetição e do exercício, a conduta

adequada e sendo instruído para a virtude, correspondendo à vida digna e feliz.

Para Aristóteles, o processo educacional está fundamentado na organização

política da Polis, por isso a participação do Estado começa desde a gestação e vai

até a vida adulta. O homem, por sua vez, é integrante da cidade e necessita da

cidade para suas funções por ser uma sociedade patriarcal – a mulher e as crianças

são subordinadas ao homem e este está subordinado à cidade. Assim a organização

da cidade deve estar fundamentada e erguida sob à da felicidade.

A Constituição, no entender de Aristóteles, assegurava a vida feliz do cidadão

e que além da formação militar era importante a formação intelectual, pois quando

há paz na cidade não se saberá o que fazer com ela e mesmo a intelectualidade

contribui na preparação para a guerra. E ainda de acordo com o filósofo, em uma

Constituição é fundamental que existam capítulos sobre liberdade, riqueza,

educação e nobreza.

A sociedade é composta de homens que mandam e homens que obedecem,

é importante observar que em função de necessidade pode haver uma troca de

função e é a educação que vai responder por essa divisão. O Legislador vai se

ocupar também do casamento com vista a um resultado positivo para a prole. A

idade ideal então para o casamento corresponde a 18 anos para mulheres e 37 para

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homens, assim a união se dará no momento máximo do vigor de ambos, e os dois

terão o tempo suficiente para educar a família.

O Estado determina que a mulher grávida seja bem alimentada e para as

crianças disformes deverá ser proibida a alimentação, bem como deverá a criança

ser abandonada. É dever também limitar o número de nascimento. O aborto deverá

ser provocado antes que o feto receba animação. Essa prática seria utilizada para

os casos onde os costumes não permitem o abandono.

Quanto às crianças, estas são observadas desde o início da vida. É

importante a supervisão dos exercícios físicos, bem como deve ser fiscalizado o que

se conta às crianças. Os inspetores existem para isso, cuidando dos jogos e

passatempos, bem como cuidam para que nessa fase passem o mais tempo

possível em casa com a família. As conversas obscenas devem ser totalmente

banidas.

A educação dos jovens é um dos principais alvos e cuidado do legislador.

[...] a escrita e o desenho deverão ser ensinados aos jovens, pois, por um lado, são úteis e prestam serviços em numerosas necessidades vitais e, por outro lado, podem ajudar as crianças a adquirir também outros conhecimentos. Em paralelo, o ensino do desenho deverá tender, talvez mais ainda do que qualquer outra coisa, a sensibilizá-los enquanto homens e a torná-los capazes de apreciar o belo, tanto na natureza como na arte. Por outro lado, o fim do ensino da ginástica deverá ser cultivar a coragem.41

A educação deve ser única para todos e não pode ser delegada. É preciso

também além da aprendizagem dos elementos essenciais que se conheça música,

literatura, desenho e ginástica. A literatura vai proporcionar a ampliação de muitos

outros conhecimentos e o desenho vai assegurar a evitar erros e enganar-se nas

compras e vendas de imóveis, bem como vai proporcionar uma visão melhorada

sobre a beleza dos corpos. Assim é colocado como importante a formação de

hábitos antes da prevalência da razão e o corpo antes do espírito. A música é uma

das coisas mais agradáveis que existem, tanto tocada quanto acompanhada de

canto, por isso, deve estar presente, de algum modo, na vida dos jovens e servem à

catarse e ao relaxamento. A ginástica deve ser estimulante para o desenvolvimento

físico e da coragem, bem como prepará-los para a guerra, quando for necessário.

41 Ibidem, p. 38-39.

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Deve-se tomar cuidado com pinturas e espetáculos na formação dos jovens.

Os jovens não devem ter permissão para assistir espetáculos e participar de mesas

e beber vinho puro. Essas apreciações devem ser difundidas quando alcançarem

uma idade mais avançada visto que na fase madura estarão imunizados contra os

efeitos negativos que esses eventos possam provocar.

A educação é fundamental e o legislador deve se empenhar nesse encargo e,

se houver negligência, o grande perdedor serão o legislador e as cidades, gerando

um grande mal sem volta. A educação deve ser um encargo público. É a pura

educação pública onde realmente o Estado se ocupa do processo de formação. É

dever também se preocupar com excessos na educação.

Assim compete ao Estado a educação visando o bem comum e a formação

moral dos cidadãos e somente um processo de educação pode fazer do indivíduo

um excelente político.

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12. A COMUNIDADE POLÍTICA E O BEM SUPREMO

O sumo bem humano que trata da felicidade exposto na Ética Nicomaqueia é

abordado no sentido de demonstrar que o percurso é longo e passa pelo estudo da

contemplação da liderança política, das virtudes, das amizades e do prazer.

Aristóteles afirma ainda que sua obra só estará completa quando o seu leitor ou

ouvinte tiver conhecimento dela e/ou a usufrua no campo do poder político, de modo

a exercer a sua participação efetiva no Estado.

O que vai corresponder e ser demonstrado na Política são as preocupações do

filósofo com as coisas humanas. A ideia inicial de felicidade dá o subsídio necessário

para se pensar sobre as coisas humanas. A partir dela pode ser pesquisado uma

atividade que venha a determinar o fim último da existência do homem, e o que dá

sentido à vida do homem é encontrar dentro de suas variadas atividades um fim último:

é essa a mesma tarefa do projeto de todo político, uma meta última para a sua cidade.

Há uma analogia pois a busca do indivíduo está baseada na ordenação para o fim

último que do mesmo modo serve para a cidade, sai do individual para o coletivo.

É por meio da política que os indivíduos juntos vão desenvolver um sentido

para a dinâmica da cidade habitada, na medida que o bem do particular deve estar

subordinado à coletividade e cujo bem de todos completam uma cidade justa.

Ainda no campo da política, Aristóteles afirma ser necessário a elaboração de

boas leis e boas constituições. Essa associação parece ser necessária para facilitar a

administração de uma cidade e conjugar um esforço para que todo esse conjunto de

leis possa gerar um equilíbrio nos interesses distintos e proporcionar uma vida feliz.

Reforça ainda que há necessidade do conhecimento das leis e da

constituição, pois sem elas estaremos paralisados e incapacitados de agir,

decorrendo daí um bloqueio e, portanto, não podendo participar de acordo com as

virtudes. Para chegar ao núcleo, ou seja, o que é o sumo bem humano, “a atividade

feliz”, deve-se passar pelo político. Essa orientação política é a finalidade do estudo

de John M Cooper (2010).

Para Aristóteles, o principal não está no conhecimento teórico ou contemplativo,

mas que o importante é agir de forma virtuosa. O principal é nos tornar boas pessoas,

mas como isso se dá é o que deve ser investigado. O objetivo no estudo político não

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está concentrado no conhecimento, mas em como agir. A sabedoria prática é o início do

movimento para o “tornar bom” e que, adicionado aos estudos filosóficos sobre a ética,

permite uma passagem acertada para tornar-se uma boa pessoa de forma plena. Um

estudo através de outra área não possibilitaria o alcance da felicidade humana.

Aristóteles dá ênfase à participação da Filosofia para se alcançar as boas ações.

O comprometimento e motivação são os pontos importantes para se chegar ao que é

bom. Não ocorre, segundo Aristóteles, de modo casual a atração pela atividade virtuosa

ou ainda, por simples curiosidade, ou mesmo por simples e despretensioso querer

entender. O ser humano é movido, é atraído nessa direção porque já há nele implícito

bons hábitos de sentimentos decorrentes da criação e da educação escolar.

Esses hábitos são contínuos pela criação e educação transporta o ser

humano a querer um refinamento e uma melhor qualificação, decorrendo desse

hábito a procura por conhecimento e a aproximação com a filosofia de modo a

adquirir a sabedoria prática, daí que quando empenhados nesses conhecimentos é

possível prestar atenção às informações da razão e da filosofia.

Outro fator importante neste momento é a idade: um jovem, por conta da própria

idade é movido ou se deixa levar na maior parte desse período pela paixão. Aquele

que foi bem criado é capaz de repudiar essa emoção, contrário aos que não o foram,

pois não conseguem evitar tal comportamento diante do precário conhecimento ou do

conhecimento insuficiente. O ajuste de sentimentos não faz parte do entendimento

desses jovens cujas boas práticas não foram disseminadas no princípio da criação.

Mas essa direção para o correto, o racional, o bem, vão muito além do

treinamento infantil das virtudes, do conhecimento e da filosofia, deve ser agregado

o fator adulto. De acordo com o John M Cooper (2010), é necessário verificar, no

sentido exato, que as ações virtuosas só serão alcançadas quando o jovem se

tornar um jovem adulto, pois a maturidade vai concentrar o que de alguma forma

estava disperso, trazendo à superfície a experiência e a reflexão que o

conhecimento pode alcançar.

Após todos os degraus alcançados o “querer” do homem possui uma direção

apoiada na razão fruto da sua educação, treinamento, conhecimento e maturidade.

Portanto, a partir daí não é possível mais uma ação ser baseada no instintivo e nas

paixões: será decorrente e tão somente na razão prática. Aristóteles afirma que todo

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aquele que se dedica à filosofia com o fim de aprender a respeito da ética já é um

jovem adulto basicamente decente.

É possível acreditar que após toda esta leitura sobre ética, estaremos em

plena faculdade dela, ou que estamos impregnados de ética, mas na verdade o

entender não significa que já nos tornamos desde então éticos ou pessoas investida

de todo o caráter e virtudes.

Falta ainda a cobertura final, para que a ética seja efetiva em nossas vidas.

Será que neste caminho, ainda é necessário ser estudado mais alguma coisa? Ou

que exista algo mais que se possa ser acrescentado? Aristóteles para e retrocede,

vai percorrer o caminho não daqueles que já estão ingressos nestes estudos, vai

parar na maioria das pessoas comuns, ou seja, como torná-las pessoas descentes.

Os discursos, embora recebidos, não são suficientes para motivação Apesar

da força das palavras, elas por si só não são suficientes para um enraizamento e

para lidar com a população são necessárias leis para impor e para guiá-las. Daí a

necessidade dos estudiosos em investir, pesquisar, para além da filosofia, passarem

a estudar as Leis, a fim de melhorar a vida dessas pessoas de forma a atingir com

abrangência toda uma comunidade.

Se já temos o treinamento infantil, através da criação, o conhecimento, da

Filosofia, Leis, Constituição e do ser adulto, então para finalizar todo o estudo da

ética, qual o ingrediente que falta? Faltam o ele e o nós: ele representado pelos

ensinamentos de Aristóteles que somado aos nossos esforços no aprendizado, em

conjunto, devem ser aplicados a ajudar as pessoas comuns para que se não

totalmente, estejam pelo menos próximos à “ética”, vivam e compreendam o que é

viver bem e descentemente, para que como comunidade seja incluída ao menos nas

boas práticas de se viver em uma cidade.

“Segundo Bodéüs, Aristóteles dava essas lições a ambiciosos aspirantes à

liderança política em suas respectivas cidades...” 42. Aqui e em muitas passagens

há que se perguntar se todo esse ensinamento tinha realmente por finalidade uma

ética e onde estaria presente o bem humano, ou se na verdade era conveniente

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esse ensinamento para se adestrar a população de forma a preservá-la de qualquer

interferência danosa, não só à liberdade dos filósofos como dos que comandavam a

política.

Leis boas e Constituição cordata fazem com que as pessoas vivam de forma

descente, educadas e felizes. A Lei é necessária, pois através dela é que se praticam

os hábitos descentes, só através do medo e da imposição de penalidades esse objetivo

é alcançado. A vergonha e humilhação, por assim dizer, não são sentimentos capazes

de bloquear uma ação nociva. A função da formação de um jovem cabe ao pai, porém,

para que este jovem ande na linha é preciso mais que persuasão. De acordo com

Aristóteles os pais são odiados pelos filhos, porque estes freiam seus impulsos e para

não parecerem simplesmente arbitrários, terão que se amparar nas leis, para que essa

visão de dominação se transforme num saber, baseados em boas razões.

Portanto, mesmo que os jovens possuam uma boa criação, tenham aprendido

desde criança bons hábitos é necessária a punição através das leis, para na idade

adulta manter o que foi desenvolvido. Outro ponto é que as Leis e Constituições não

podem ser qualquer legislação elas precisam ser boas, de forma a proporcionar o

bem para toda a cidade.

Hábitos familiares são importantes e influenciam, mas, somado a isso, além

do efeito familiar são necessários e apropriados à edição de leis e constituições para

que se produza um sistema

Para isso somente as boas leis produzirão uma boa administração pública e

essas leis serão elaboradas para produzirem efeitos de forma geral e não particular,

com precisão e de forma a alcançar o estabelecimento de ações boas e preservação

do Estado.

Aristóteles propõe o sumo bem não individual, mas coletivo de forma a

abranger toda a população e cidades. Ainda pode-se afirmar que quem tem a

pretensão de modificar a vida de sua comunidade, das pessoas que nela habitam,

42 BODÉÜS, apud COOPER, Political Community and the Highest Good. Texto inédito; versão inglesa a ser publicada em J. Lennox e R Bolton, Being, Nature, and Life – Essays in Honor of Allan Gotthelf, Cambridge University Press (2010). In: ZINGANO, 2010, p. 451.

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deve ter em mente que é necessário conhecer muito bem as leis sob as quais estão

sendo regidas e ainda conhecer os princípios da política.

Mais uma vez há que se ressaltar que o propósito de Aristóteles na Ética, é

iniciar os bem dotados e bem criados no conhecimento político não só para simples

conhecimento, pois ainda não conseguiram alcançar seu objetivo, mas inserindo-o

também através da prática.

Então para se alcançar o sumo bem as etapas estariam completadas, quer

através dos princípios gerais, quer da ética e política. Aqui também vai significar que

foi atingido o segundo objetivo do estudo da ética, a participação do líder no interesse

da política de sua cidade, então se fecha aqui o ciclo da vida sumamente feliz.

Mas isso não quer dizer que o cidadão que não participa da política não viva

uma vida feliz, na realidade com o acréscimo do exercício político ele vai ser mais

plenamente realizado. Portanto, o governo que busca uma vida virtuosa, ou mesmo

o ouvinte, ou ainda os estudiosos de Aristóteles devem, além do exercício das

virtudes práticas, continuar seus estudos voltados às Leis e a Constituição, pois ele

viverá a virtude na sua mais ampla concepção. Viverá então a segunda vida.

Ainda no campo da Política, Aristóteles fala sobre a comunidade. Na

“Política”, Aristóteles inicia afirmando que a Polis, por ser uma comunidade, que tem

por si e que rege todas as que estão inseridas, tem por objetivo, por finalidade,

algum bem. Eles têm algo em comum, é compartilhado com um grupo de pessoas

de forma conjunta e não individualmente.

Explica também que na Polis se desenvolve três comunidades:

1- As do senhor e escravos

2- De pais e filhos

3- Povoado

É importante verificar que esse “algum bem” não é um bem qualquer e muito

menos realizado de forma individual; é realizado de forma que cada membro dessa

comunidade realize o que quiser e por conta própria; é realizado individualmente, por

meio da lógica com a participação individual dos membros, porém, com vistas à

comunidade e nela pensando com a característica contínua de existência.

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É importante perceber que a Polis não é só formada pelos indivíduos, mas

pelas terras, prédios, animais, tesouro público, instituições, área comercial, exército

etc. e que essa estrutura resultava na cidade e tudo isso era “comum” a todas as

pessoas que nela habitavam.

Tem também importância a estrutura do senhor e escravo. É um pressuposto

que muitas dessas relações foram perversivas, um lado defeituoso, mas existente

nas comunidades. Para Aristóteles, o escravo é um instrumento de trabalho, seria

como uma ferramenta em uso. Mas para esse instrumento ser usado, requer a

regência do senhor, ser humano mais bem dotado intelectualmente e que sem ele

não seria possível desenvolver o trabalho, bem como, o escravo perderia o foco.

O escravo é uma propriedade do senhor, além de servir como instrumento

vivo e que ainda precisa ser dirigido na sua vida pessoal. Naquele período, havia

uma relação preestabelecida das competências do escravo que não passavam de:

varrer o chão, arar a terra, preparar a refeição e muitas vezes ainda ajudavam na

criação dos filhos das famílias.

Mas não significa que o senhor não fizesse esses serviços, ou seja, ele varria

o chão através de seu escravo. Mas onde estaria aqui o bem? O bem estaria apenas

para o senhor e de maneira indireta para o escravo usufruir, na medida em que o

seu subdesenvolvimento participa da superioridade do saber do seu senhor.

Passando para a comunidade – marido, mulher e filhos, sendo que as

atividades são realizadas por todos. O homem e a mulher têm um compromisso com

a procriação, por isso formam um casal. As atividades desempenhadas são as

sexuais (são parceiros no casamento), criação e educação dos filhos, onde a criação

e educação podem ser exercidas apenas por um de cada vez e em conjunto.

As atividades cotidianas também são realizadas em conjunto, ou seja, as

refeições, jogos, conversas e outras e com a dose de virtudes morais, pois é ela que

pode concluir para a vida humana ser bem vivida. É um bem atingido e comum a

todos.

Aristóteles também fala da comunidade-povoado, onde está presente a

necessidade do dia a dia, formado por algumas famílias. O que é presente no

povoado é um comum a todos, através de cultos locais, conversas, festas, troca

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recíproca de produtos excedentes, resultando inclusive numa interação, propiciando

uma gama e variedade de produtos disponíveis.

Aqui percebe-se que o bem comum é mais abrangente e não fica restrito a

família de uma casa, mas de outras, provendo inclusive o sustento de outras famílias

que habitam o povoado. Por fim chega-se à Comunidade da “Polis”, onde o viver

bem é uma vida governada onde está presente a posse das virtudes humanas por

todos os cidadãos. Essa união de certo número de povoados se traduz nas relações

comerciais, com instituições religiosas, culturais numa dimensão muito maior, onde

comparado com o povoado que por si já é mais rico, a vida na Polis será ainda mais.

A sensação que se tem sobre a virtude é como o entrelaçamento de fios de

fibra, onde no primeiro estaria a família, correspondendo ao filho criado, as refeições

são realizadas e demais afazeres, que em conjunto com as demais atividades

preparam para o bem comum, com um objetivo maior, aparecendo aqui o povoado,

que seria mais um fio, que finalmente chegará à Polis, outro fio de fibra, como

resultado de uma vida virtuosa da comunidade como um todo, representando esse

processo final no tecido fabricado e pronto.

No livro I da Política é abordado que a Comunidade Polis regula todas as

outras comunidades, ou seja, a vida em família é praticada através da educação nas

virtudes que não se detêm nos bens, mas numa vida que começa na família e se

estende na comunidade. A visão é para que as crianças aprendam uma vida

descente e que isso se estenda para a comunidade, pois se todos se comportarem

dessa forma todos serão beneficiados, procurando um bem comum maior em

oposição a uma virtude isolada. Todos participam desse bem maior.

A maioria dos discípulos de Aristóteles tem a pretensão, além do

conhecimento da ética, também de se tornar um líder político de sua comunidade e

uma das proposições de um monarca é o de melhorar a vida das pessoas que

habitam a comunidade.

A característica para ser plenamente virtuoso pressupõe ações virtuosas

individuais que devem ser apreciados pelos demais. Essa vida completa de virtude e

comum na comunidade é necessária, mas para se alcançar essa adequação é

imprescindível o conhecimento, estudar e conhecer as verdades das constituições e

legislações.

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O exercício de se praticar o conhecimento político leva o líder político a querer

mais essa prática, isso gera, através de sua percepção um resultado maior e mais

bem acabado que é para o bem de uma cidade, o que significa uma vida virtuosa

absolutamente perfeita da virtude prática.

Aristóteles percebe também uma tendência humana em agir com vista ao

prazer imediato e que mesmo os bons hábitos podem incorrer em um erro.

Poderão ocorrer escolhas erradas e ações não virtuosas e é aí que a comunidade

pode ajudar. Ora, se a pessoa possui uma boa criação, boa educação e ainda

incorre em algum erro, a vida na comunidade pode ajudar na correção e a realizar

um reforço nas atividades virtuosas e pode inclusive expandi-las.

A vida não seria voltada para si, para a satisfação da própria felicidade, mas

viveria inclusive um compartilhar ético com a comunidade. Para Aristóteles o “...

impulso corrompe os governantes, mesmo os melhores”43 ou seja, o homem por

mais bem preparado que esteja é corruptível e também é passível de erros. Mesmo

o melhor líder, dentro da melhor comunidade está vulnerável e pode ser levado pelo

apetite ou pelo impulso a um agir não virtuoso.

A Lei vem para esse freio, visto que ela evita a corrupção, ela por si é uma

representação de algo já visto e estudado e que após sua edição fica caracterizada

pela inexistência de qualquer influência de vontade, e ainda, ela não se sujeita ao

comando puro e simples do homem. Para sua existência pressupõe anterioridade e

uma profunda pesquisa e após sua publicação fica impedida de manipulação através

da vontade. A lei assegura à comunidade da Polis uma vida segura e plenamente

virtuosa.

Naquilo que há de comum, aparece uma segunda categoria de cidadãos,

aqueles que não são políticos e muito menos filósofos contemplativos, que

classificados como cidadãos decentes, cidadão com conhecimento em ética e

política, ainda ouvintes de Aristóteles eram aspirantes a líderes.

A vontade de entender não basta, elas devem possuir as virtudes de caráter e

aspirarem não ser líder político, mas tornarem-se filósofos, devem possuir ainda um

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interesse grande em melhorar a si mesmo e um grande amor pelo belo. Aquele que

busca seu aprimoramento com afinco torna-se mais seguro, constante e,

independente do nível de virtude que vivam, suas vidas são mais completas.

Os filósofos não usam seu conhecimento prático na direção da vida da

comunidade, mas de certa forma eles promovem através de seus estudos e de suas

atividades teóricas um avanço para o caminho, para o exercício dos líderes políticos.

O uso do conhecimento dos filósofos garante uma abrangência prática a ser

realizada pelos líderes políticos, que se distribui na Polis.

Então a massa cresce e se espalha com uniformidade e a soma de todos os

virtuosos através da prática compartilhada garante à Polis um bem comum. O

princípio da política é edificar o homem bom e a boa Polis. A perfeição de uma

cidade de acordo com Aristóteles estaria também no território que ocupa e seria bom

para o Estado, ainda que não possa isso ser controlado por ele, que o solo do

território fosse fértil, que estivesse instalado em uma região geográfica favorável,

bem como possuísse uma população mediana, através da limitação de seus

cidadãos para o equilíbrio do Estado. Possuir “ ... o socorro da boa fortuna ...”44para

que todos esses elementos sejam encontrados e o Estado, sem dificuldades, possa

fazer presente a felicidade.

A cidade perfeita ainda necessitaria do regime político perfeito e para isso

vigorar é necessário que aquele que produz, que trabalha, que proporciona os

recursos necessários à cidade deva ficar subordinado à autoridade justa dos que

não trabalham e que as autoridades, deveriam antes passar por um aprendizado de

justiça e da defesa militar não com fins da guerra, mas com a finalidade de defesa e

de comando do território, pois antes teriam aprendido a obedecer.

Para Aristóteles a república seria um regime político justo, mas não seria o

melhor regime, na medida em que ele entende que como aquele que produz

também teria deveres políticos, em razão dessas funções serem heterogêneas tal

associação não proporcionaria uma boa combinação, os interesses e julgamento

43 COOPER, J, Political Community and the Highest Good. Texto inédito; versão inglesa a ser publicada em J. Lennox e R Bolton, Being, Nature, and Life – Essays in Honor of Allan Gotthelf, Cambridge University Press (no prelo, 2010). In: ZINGANO, 2010, p. 484. 44 BODÉÜS, 2007, p.. 104.

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estariam prejudicados em função que este ao mesmo tempo seria governante e

governado. A aristocracia proporciona o desmembramento dessas funções,

dividindo entre cidadãos formados para cultivar uma inteligência própria para

produzir bens e cidadãos formados com inteligência para decidir o que é bom para

os habitantes do território. A cidade no regime aristocrático, portanto, proporcionaria

garantia de interesses para a maioria.

E por fim a educação é vista pela aristocracia como elemento chave de toda a

política, sendo que a política não disciplina ninguém, somente a ética tem esse

poder, a política mostra a necessidade da educação, através do cuidado do corpo

como início da aprendizagem, partindo para a lapidação do caráter e o refrigério do

apetite irracional, bem como demonstra a necessidade dos conhecimentos de saúde

e higiene e que para a felicidade de todos, cabe principalmente à política o dever de

ser intervencionista.

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CONCLUSÃO

O homem, no fundo de sua alma tem o desejo e busca no período de sua vida

um sentido, é uma tendência presente em si que o leva a buscar um fim e esse fim é

decisivo e último. Toda uma vida de conhecimento e de trabalho visa algum bem,

decorrendo assim o pensamento de que esse bem não pode ser qualquer bem. A

honra poderia até a princípio ser esse bem, mas a honra só é obtida através do

reconhecimento e esse reconhecimento nem sempre poderá ocorrer e ele depende

da relação com o outro.

A felicidade poderia também ser encontrada no dinheiro, visto que a sua

posse é muito boa e ele é muito útil, mas ele também possui instabilidade e

vulnerabilidade, e, em não sendo duradouro também está longe de ser um bem

supremo. Esse bem é muito mais que isso, ele é desejável em si mesmo e nunca

dependente de outra coisa, ele é altamente suficiente e não dá para querer outro em

seu lugar e, portanto, esse fim é a eudaimonia, ou seja, o bem viver.

A virtude não é da natureza do homem, mas ela é lapidada pela

habitualidade, que recorrente se transforma em uma prática que não se pode mais

ser apartada do homem bom, porque esse é o seu caminho e para se tratar de

qualquer assunto e principalmente o político há que ser possuidor de um bom

caráter e está aqui o princípio de tudo, tratar do caráter do homem para que este

possa agir corretamente para se chegar ao mais elevado bem. Tanto os fins como

os meios vão demonstrar sobre que bases foram realizadas as escolhas, ou seja, se

o sujeito for um homem virtuoso seus meios e fins estarão inclinados para a direção

do agir correto e esse agir está relacionado com a deliberação.

Aqueles que têm a capacidade mais refinada da boa deliberação, conseguem

alcançar melhores resultados, e essa boa deliberação está relacionada à sabedoria e

à experiência que lhe impõem a capacidade de enxergar as coisas na sua melhor

formatação, sem erros, resultando então nas melhores opiniões, proporcionadas pelas

pessoas mais experientes e estas corresponderão às mais idosas..

Mas, até se chegar a esse refinamento o ser passa pelo domínio das paixões

e sua ações nem sempre podem ser aplaudidas ou aprovadas, muitas vezes

passam pela censura, às vezes também são até perdoadas, mas é importante

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perceber que o homem traz em si o imperfeito que aliado muitas vezes a pouca

idade e pouca informação ou visão, suas ações são cometidas à revelia do que se

sabe ser certo.

A ignorância deve ser levada em consideração e utilizada como limite

aceitável para determinar o resultado de uma ação involuntária, mas ela não é única,

muitas vezes também além do desejo, o homem é propenso – a fim de alcançar o

seu objetivo –, a ir pelo caminho mais fácil e pelo prazo mais curto.

Enfim, o que nos parece é que o indivíduo tem presente em si o estado da

imperfeição, porém aquele que convictamente tem em seu caráter o conhecimento

não terá em seu currículo o estado de falha e, portanto, não será corrompido,

permanecendo inalteradas suas convicções.

Não é possível afirmar que tudo em que se acredite seja verdade, e muito

menos que as questões ditas como verdadeiras não possam passar por

modificações. Qual é o critério para aceitar as opiniões? Qual é o caminho para nos

tornar pessoas sábias? A ânsia na credibilidade de verdades resulta na perda da

visão e no pensar com propriedade; o método recomendado por Aristóteles é na

observação de qualquer opinião: investigar profundamente até que o resultado dê

força e induza o estudioso na apresentação perfeita.

Deve-se começar pelo que é familiar e depois fazer uma trajetória inversa. É

necessário também o teste além da conclusão reputável, quer por meio da

participação de sábios, como também pela maioria. Se a experimentamos na vida,

se estiver em consonância com nossas experiências e com o nosso cotidiano pode-

se então corresponder a uma apresentação verdadeira. Mas, se quem estiver no

caminho da busca da verdade não tiver sido educado nos bons hábitos, desde o

início da vida, não terá a capacidade de utilizar bem o método e não será capaz de

perceber a diferença e argumentos ambíguos.

O método existe para assegurar a confiança do resultado que se alcançou,

bem como indicar o que é verdadeiro. Uma pessoa sábia trilha o caminho reto e

para a realização da felicidade é importante cultivar e praticar a virtude.

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No decorrer da vida, a probabilidade de sermos atropelados por

acontecimentos desfavoráveis é grande, ocasionando daí à conclusão que a

felicidade é um fim vulnerável.

A felicidade é um bem desejado por todos e considerado como o bem

supremo. Se ela é tão desejada qual será o meio que se emprega para se atingir a

felicidade? Será que em todas as ações estão concentradas o meio reto, o meio

bom ou o meio para o agir bem, ou, até quanto a opinião alheia nos influencia a

ponto de nos desviar do meio reto.

Interfere diretamente na felicidade a ausência dos bens exteriores

representados por amigos, família, beleza, riqueza, poder político e honra, bem

como necessitamos deles para o nosso bem estar físico, sem eles haveria uma

interrupção em nossas atividades e constituiria em um empecilho para obtenção da

eudaimonia. Somente a conjugação dos bens exteriores com a virtude podem nos

levar a felicidade completa. Para Aristóteles a felicidade só pode ser atribuída

quando se trata de uma vida inteira, ou seja, se só em parte de uma vida a felicidade

se faz presente, não se poderá auferir a felicidade na vida da pessoa. Aristóteles

demonstra também que quando se utiliza os bens externos de forma moderada e

vive comedidamente e durante a sua existência realiza atos nobres, então este

poderá ser apresentado como uma pessoa feliz.

Mas Aristóteles adverte que a felicidade é vulnerável, ela pode acontecer

como pode ser perdida, enquanto que a virtude não se pode subtrair da pessoa que

a tem. Se a pessoa é virtuosa e rica, com certeza saberá utilizar sua riqueza da

melhor forma possível e, em sendo uma pessoa virtuosa, a riqueza jamais lhe

acrescentará mais felicidade, mas proporcionará a felicidade pela multiplicação de

ações virtuosas.

A virtude concentra a força do hábito e da experiência, bem como é uma

disposição de caráter da alma que, conjugada com a deliberação, está sempre

voltada ao que é reto e a um fim bom, que ligado também ao racional e ao desejo

impõe ao homem o atributo da escolha. Uma pessoa virtuosa não se desvia de seu

caminho, tem a rigidez e o inflexível no seu ser, bem como diante de uma situação

negativa, não se deixa abalar, pois a razão o ajudará a adotar a posição firme e

correta para o bem agir.

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A virtude é o alicerce para o homem que se depara com o fracasso. Da

virtude emana uma força capaz de fazer com que o homem atravesse obstáculos

com o fim de modificar tal situação.

A virtude é um processo e para seu aprimoramento serão vivenciados os

extremos que correspondem à deficiência e o excesso e o eixo que corresponderá à

boa e correta ação será praticado através do mediano. Excesso e deficiência são as

marcas do vício, enquanto que na mediana se encontra a virtude, bem como o

excesso ou deficiência desviam o homem do excelente, do benéfico e do agradável.

Quem se arrasta pelo vergonhoso, pelo prejudicial e pelo doloroso optou pelo

caminho do vício. Essa mesma observação pode ser levada para a Lei, pois ela

proíbe vícios e ordena virtudes. A injustiça revela o desrespeito à Lei. Ao juiz cabe o

reestabelecimento da igualdade através da punição onde o agredido encontra-se

numa situação de menos e o agressor numa situação de mais e assim o juiz realiza a

mediação através do justo. A doutrina do meio termo vem demonstrar que no decorrer

da vida o homem passará pelo excesso e pela deficiência e é através dessa

passagem que o homem tomará contato com o mediano e se aproximará do bem.

O homem sumamente feliz o é porque se conduz pelos princípios verdadeiros

e por desejos retos e sabe que é de sua responsabilidade o bem agir. Dentro desse

contexto pode-se afirmar que o homem estuda a ética com o fim único de ser

efetivamente ético e isso o levará a alcançar uma vida boa e feliz.

Esse bem máximo de realização que o homem quer atingir se constitui na

potencialização da ética e esta o aproxima de Deus, pois Deus é o que há de

superior. O bem não se contrapõe à felicidade e a razão permite ao homem

distinguir o que é bom e o que é mau.

A ética é tipicamente humana e ela é desejada por todos e no sentido mais

amplo ela é uma atividade realizada pelo homem em relação à sociedade; tem o fim

de defender e restituir a dignidade ao homem, mulher, criança, pobres, doentes e

outros que participam da sua comunidade, restituindo a estes, portanto, a vida feliz. O

objetivo é esse, ou seja, o de atingir o estado mais elevado e belo que a vida pode

oferecer.

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Enfim o “tornar bom” se realiza de acordo com a soma da sabedoria prática,

do estudo da filosofia, de uma educação apropriada que se inicia na infância, com

amigos, família, riqueza, maturidade e habitualidade, mas se o homem não possuir o

conhecimento das Leis e da Constituição e, ainda que as conheça e não as aplica

na melhoria da sua comunidade ele não chegará a concluir as etapas e, portanto,

não alcançará a vida sumamente feliz e não conseguirá impedir as ações má

qualificadas e injustas.

Aristóteles também elabora um sistema de educação e tem como norte a

busca da felicidade. Nesse sistema, qualidades são esperadas, tanto dos cidadãos

quanto das organizações das cidades, e no entendimento do filósofo o ser humano

está subordinado à cidade, bem como as mulheres e crianças ao homem. A cidade

deverá comportar também os artífices, religiosos agricultores e juristas. A visão

daquela época estava concentrada na vida feliz e esta só poderia ser alcançada por

aqueles que estivessem longe dos trabalhos manuais.

Somente um processo de educação poderia fazer do indivíduo um excelente

político. O cuidado com a educação se principia com o casamento e as disciplinas

de gramática, ginástica, música e desenho deveriam fazer parte do currículo, visto

que a gramática auxiliaria nos negócios, a música no relaxamento e prazer, a

ginástica seria útil para a saúde e para o ganho de força e o desenho seria

importante nas construções e em outras artes. Aí vem a grande pergunta: Qual é a

melhor forma de governo? Entre os estudos de mais de cento e cinquenta e oito

constituições e regimes, o resultado está concentrado naquele que garante justiça a

todos e possa decidir o que é humanamente bom.

Aristóteles pensa no sistema como uma engrenagem que só roda a partir da

boa educação familiar e da educação pública, como um processo de formação de

cidadania, e que termina com a formação do governante que ali está para

proporcionar o equilíbrio de interesses e oferecer uma vida feliz para os habitantes

da cidade.

Portanto, em tudo que se faz há uma finalidade e o homem feliz é aquele que

age de maneira sábia, visando mais que uma simples ação, visando à abrangência

para que o resultado seja incontestavelmente o melhor. A ética é um exercício

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contínuo e eterno, um empenho constante no aprimoramento da alma humana e

quanto mais se exercitar a ética e a virtude, mais feliz o homem se torna.

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