produÇÃo legislativa e preferÊncias eleitorais na …americo.usal.es/oir/legislatina/papers/ricci...

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Introdução Como as comissões permanentes afetam as escolhas legislativas do Congresso brasileiro? Mui- tos cientistas políticos têm observado que, nos parlamentos modernos, o elemento organizacional mais comum a ser encontrado são as comissões permanentes (Strom, 1998, p. 55), uma área abun- dante e ainda promissora nos estudos legislativos. O interesse dos estudiosos é facilmente entendido. De fato, ao constituírem-se em grupos menores do que o plenário, as comissões favorecem a partici- pação de grupos organizados, facilitam o trabalho de coleta e distribuição de informações, diminuem os custos de decisão, abrem espaço para a partici- pação mais ativa das minorias, propiciam ambien- te de negociação e consenso e permitem que os representantes possam atingir seus objetivos – se- jam eles a realização de determinada política pú- blica, a vocalização de grupos de interesse, sejam sua própria reeleição. A evidência, baseada na simples observação, mostra que as comissões per- manentes com funções legislativas integram a es- trutura organizacional da maioria dos parlamentos. Na Europa, o número médio de comissões perma- nentes varia entre dez e vinte por parlamento (Mattson e Strom, 1995). 1 A Câmara dos Deputados do Congresso bra- sileiro não se diferencia dos demais nesse aspec- to, e conta com dezenove comissões permanen- * Uma versão anterior deste trabalho foi apresentada no encontro anual da Anpocs, Caxambu, 2003, Grupo de trabalho “Estudos Legislativos”. Agradecemos aos co- mentários dos participantes desse grupo, bem como a Marcos José Mendes, pela gentileza de compartilhar parte de seu banco de dados sobre municípios, e a Ri- cardo Pereira e Letícia Teixeira, pela assistência na ali- mentação parcial de dados no SPSS. Artigo recebido em outubro/2003 Aprovado em abril/2004 PRODUÇÃO LEGISLATIVA E PREFERÊNCIAS ELEITORAIS NA COMISSÃO DE AGRICULTURA E POLÍTICA RURAL DA CÂMARA DOS DEPUTADOS * Paolo Ricci e Leany Barreiro Lemos RBCS Vol. 19 nº. 55 junho/2004

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Introdução

Como as comissões permanentes afetam asescolhas legislativas do Congresso brasileiro? Mui-tos cientistas políticos têm observado que, nosparlamentos modernos, o elemento organizacionalmais comum a ser encontrado são as comissõespermanentes (Strom, 1998, p. 55), uma área abun-dante e ainda promissora nos estudos legislativos.O interesse dos estudiosos é facilmente entendido.

De fato, ao constituírem-se em grupos menores doque o plenário, as comissões favorecem a partici-pação de grupos organizados, facilitam o trabalhode coleta e distribuição de informações, diminuemos custos de decisão, abrem espaço para a partici-pação mais ativa das minorias, propiciam ambien-te de negociação e consenso e permitem que osrepresentantes possam atingir seus objetivos – se-jam eles a realização de determinada política pú-blica, a vocalização de grupos de interesse, sejamsua própria reeleição. A evidência, baseada nasimples observação, mostra que as comissões per-manentes com funções legislativas integram a es-trutura organizacional da maioria dos parlamentos.Na Europa, o número médio de comissões perma-nentes varia entre dez e vinte por parlamento(Mattson e Strom, 1995).1

A Câmara dos Deputados do Congresso bra-sileiro não se diferencia dos demais nesse aspec-to, e conta com dezenove comissões permanen-

* Uma versão anterior deste trabalho foi apresentada noencontro anual da Anpocs, Caxambu, 2003, Grupo detrabalho “Estudos Legislativos”. Agradecemos aos co-mentários dos participantes desse grupo, bem como aMarcos José Mendes, pela gentileza de compartilharparte de seu banco de dados sobre municípios, e a Ri-cardo Pereira e Letícia Teixeira, pela assistência na ali-mentação parcial de dados no SPSS.

Artigo recebido em outubro/2003Aprovado em abril/2004

PRODUÇÃO LEGISLATIVA E PREFERÊNCIAS ELEITORAIS NA COMISSÃO DE AGRICULTURA E POLÍTICA RURAL DA CÂMARA DOS DEPUTADOS*

Paolo Ricci e Leany Barreiro Lemos

RBCS Vol. 19 nº. 55 junho/2004

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tes. A implicação imediata é a de que a organiza-ção dos trabalhos internos no Congresso Nacionalconstitui-se uma ótima linha de pesquisa, capaznão só de mostrar o formato da dinâmica internados trabalhos parlamentares, mas também de de-talhar o processo de tomada de decisão em umâmbito restrito e que favorece as interações face aface. Entretanto, observa-se uma escassez de estu-dos sobre as comissões brasileiras, seja em termosde estudo de caso, seja como ausência de uma li-nha de pesquisa mais ampla que tenha como focoprincipal o estudo do processo legislativo, assimcomo este se dá no interior delas.

O objetivo deste artigo é contribuir para oavanço nessa área. Em particular, o trabalho bus-ca caracterizar o tipo de processo legislativo den-tro das comissões em dois níveis. Em primeiro lu-gar, o formato do processo legislativo, isto é,como, em função da agenda decisória brasileira, aspropostas de lei tramitam no Congresso brasileiro.O segundo objetivo insere-se numa discussão teó-rica já bem estruturada no contexto norte-america-no, mas ainda pouco desenvolvida para o casobrasileiro, que supõe testar se as comissões atuamsegundo o modelo distributivo ou o informacio-nal, e traçar evidências empíricas.

Nosso estudo focaliza a Comissão de Agri-cultura e Política Rural dos Deputados (CAPR). Aescolha de uma comissão determinada parte daidéia de que precisamos, em primeiro lugar, limi-tar a análise em vista da enorme quantidade depropostas legislativas apresentadas por ano noCongresso brasileiro.2 Um segundo argumento,mais relevante, enfatiza o fato de que as propos-tas de áreas diferentes podem ter comportamen-tos legislativos igualmente diferenciados. O casoitaliano tem mostrado, por exemplo, que algumascomissões são mais ativas do que outras em ter-mos de propostas analisadas e no tempo de tra-mitação (Capano e Giuliani, 2001). O mesmo foidemonstrado para o Senado brasileiro, em que asComissões de Constituição, Justiça e Cidadania ede Assuntos Econômicos demonstram ser maisativas do que as demais (Lemos, 2002). Quanto aocaso em questão, vale apenas lembrar que a di-mensão agrícola é uma componente essencial domundo socioeconômico brasileiro, envolvido por

polêmicas e interesses organizados segundo dife-rentes lógicas. Nesse sentido, a forma pela qual sedá a relação entre o mundo político e os setoresagrícolas no Congresso torna-se uma questão re-levante a ser estudada.

Primeiramente, analisaremos a literatura quefirma posição no desempenho das comissões bra-sileiras. Em seguida, nossos esforços serão volta-dos para o estudo da totalidade das propostas en-caminhadas à CAPR nas últimas três legislaturas,que correspondem ao período de 1991 a 2003. Se-rão analisados fatores concernentes à iniciativa le-gislativa das propostas dos deputados, o tipo detramitação dos projetos e suas áreas temáticas,seja em função da legislatura na qual foram apre-sentadas, seja tendo em conta o diferente perfilpolítico dos proponentes. Ao abordar duas ques-tões clássicas no estudo legislativo – distributivis-mo e informacionismo –, serão utilizados dadosreferentes ao reduto eleitoral dos titulares da co-missão e à sua profissão.

Perspectivas e hipóteses sobre o desempenhodas comissões permanentes brasileiras

Quando o foco é o estudo do processo legis-lativo, sob uma perspectiva neoinstitucionalista, épossível destacar duas tendências analíticas domi-nantes. A primeira põe em evidência os condicio-namentos internos que a arena parlamentar propor-ciona aos políticos nas diversas fases do processolegislativo. Nessa linha, vários autores têm investi-gado o poder de agenda e a influência que as co-missões permanentes têm sobre o resultado final.3

A segunda abordagem tem o foco analítico maisvoltado para o estudo do estilo decisório dos ato-res políticos. A idéia central dessa orientação é ade que as comissões podem se tornar instrumen-tos organizacionais que viabilizam o objetivo pri-mário dos políticos: a reeleição. Nesse sentido,quando as comissões permitem a troca de influên-cia entre os políticos sobre os direitos acerca dasmatérias de suas competências (Weingast e Mars-hall, 1988), é que se efetiva um dos modelos, dis-tributivo ou informacional. O primeiro trabalhacom a perspectiva de que as comissões são arenas

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de maximização eleitoral, ou núcleos cooperativospara as trocas legislativas (logrolling). Já a aborda-gem informacional admite que as comissões sejamagentes facilitadores dos “ganhos de especializa-ção”, fundamentais para a coleta e a distribuiçãode informações aos congressistas, e para aproxi-mar as políticas de seus resultados desejáveis, pos-sibilitando, assim, a reeleição (Khrebiel, 1991).4

Se os termos da discussão forem esses,como se comporta o Congresso brasileiro? Seriamas comissões permanentes no Brasil tão relevan-tes quanto as do congresso norte-americano ou asdo parlamento italiano?5 Seria possível concluirque seus membros atuam numa ou noutra pers-pectiva – informacional ou distributiva?

Para responder a essas perguntas é precisoter em mente que o desempenho legislativo dascomissões permanentes depende de seus poderesformais. Digamos que as comissões possuam am-plos poderes positivos, como no caso desfrutamas comissões permanentes brasileiras.6 De fato,além da iniciativa legislativa, da possibilidade demodificar propostas e de gozar de amplos recur-sos informacionais,7 as comissões podem ter, deacordo com o regimento interno e a Constituiçãode 1988, poderes terminativos. Essa prerrogativainstitucional segue a lógica da organização dostrabalhos internos do parlamento italiano, em queas comissões podem examinar e aprovar definiti-vamente um projeto de lei sem que ele passe peloplenário. Do ponto de vista do processo decisó-rio, a questão é: Quem controla o tempo de tra-mitação das propostas nas comissões? Sobretudo,poderia um projeto que tramita de maneira termi-nativa numa comissão ser debatido no plenário?No caso brasileiro, sabemos que o pedido de ur-gência garante ao Executivo um controle elevadosobre a agenda legislativa. Estudos recentes têmenfatizado o fato de que é por meio desse instru-mento que o Executivo consegue aprovar maisdepressa seus projetos prioritários (Figueiredo eLimongi, 1999). Da mesma forma, também as pro-postas de deputados que tramitam em regime deurgência têm mais chance de sucesso (AmorimNeto e Santos, 2002; Ricci, 2003).

Ao analisar todas as implicações desse tipode regra decisória, o debate sobre as comissões

brasileiras é quase unívoco em atribuir-lhes umpapel secundário. Devido à prerrogativa exclusi-va do presidente para apresentar propostas emalguns temas específicos e para editar medidasprovisórias, mecanismos associados a poderesinstitucionais conferidos ao Colégio de Líderes,como a possibilidade de utilizar instrumentos queaceleram a aprovação de proposições de seu in-teresse, os parlamentares estariam impedidos deexercer, por meio do sistema de comissões, umpapel mais efetivo no processo legislativo. Assim,as comissões teriam um papel apenas secundário– ou negativo – de frustrar a vontade da maioria,arquivando projetos (Bernardes, 1996; Pessanha,1997; Figueiredo e Limongi, 1995, 1996). Não ésurpreendente, portanto, que, com base nessacrença, haja uma orientação analítica que desva-loriza o problema inerente ao estudo da análisedo processo legislativo na forma como este ocor-re dentro das comissões.

Uma outra interpretação tem a hipótese deque as comissões funcionariam como centros de a-gregação das tendências paroquialistas dos deputa-dos brasileiros. Para quem acentua a componenterelativa à arena eleitoral, e não a parlamentar, é aestrutura da competição eleitoral que determina ocomportamento do deputado e, conseqüentemen-te, o tipo de projeto que ele tende a apresentar. Emparticular, dado um sistema eleitoral fortementecentrado sobre as características do candidato, aprodução legislativa ordinária é, sobretudo, umprocedimento para processar quaisquer demandasprovenientes dos próprios eleitores; e isso significa-ria, em última instância, o domínio da prática paro-quialista (Ames, 1995a, 1995b). Entretanto, o focona organização dos trabalhos internos ao Congres-so Nacional, evidencia como o investimento em po-líticas paroquiais não tem fundamento empírico (Fi-gueiredo e Limongi, 1999; Lemos, 2001; AmorimNeto e Santos, 2002; Ricci, 2003). No mérito dos es-tudos que analisam o formato da organização dostrabalhos na arena parlamentar, foi observado queo processo decisório brasileiro é tão centralizado –no Executivo e/ou por meio das lideranças partidá-rias – que desestimularia o envolvimento em ques-tões paroquiais por meio da legislação ordinária viacomissões permanentes.8

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Apesar dessas considerações, todas baseadasem evidências empíricas, ainda permanecem osdois problemas básicos que o paradigma neoinsti-tucionalista proporciona: o da agenda decisória eo do estilo decisório. Sobretudo – eis o ponto –não temos uma clara definição do papel exercidopelas comissões permanentes. De fato, seriam elascentros de agregação de preferências capazes deinfluenciar, modificar ou bloquear as propostasdos deputados brasileiros?

Do ponto de vista da agenda, mesmo numcontexto de um processo decisório altamente cen-tralizado, acreditamos ser questionável a orienta-ção da literatura que defende um papel secundá-rio das comissões. E isso em virtude da existênciade fortes indícios de que a dinâmica do law-ma-king brasileiro atribui um papel relevante à atua-ção das comissões como centros decisórios. Emprimeiro lugar, estipula-se que algumas comissõessejam mais relevantes do que outras. Ribeiral(1998), em estudo de caso, acentua o caráter dife-renciado do sistema de comissões, em que algu-mas seriam mais disputadas como arena política econsideradas mais relevantes para a condução doprocesso legislativo do que outras. Demonstraque a Comissão de Constituição, Justiça e Reda-ção (CCJR) da Câmara dos Deputados exerce seupoder terminativo, é extremamente produtiva e,apesar da grande rotatividade, favorece a especia-lização interna, além de se configurar como umimportante veto player institucional, num espaçoonde “os lobbies internos têm maior poder de bar-ganha partidária” (Idem, p. 77). Sem entrar nomérito da questão relativa à qualidade das pro-postas apresentadas9, o fato de termos um alto ín-dice de projetos de deputados indica um argu-mento analítico puramente lógico. O problema ésaber o que acontece com esses projetos e, sobre-tudo, mostrar o desempenho das comissões noexame das propostas legislativas.

Quanto ao estilo decisório, num sistema quecentraliza a prática legislativa e, em vista disso,que desfavorece as práticas paroquialistas, restaconsiderar qual seria a lógica de ocupação de car-gos no interior das comissões. Dentro do espíritoda tese distributiva, que supõe a existência de umaconexão eleitoral clara e definida, é oportuno, por

exemplo, observar se o tipo de reduto eleitoral dodeputado pode explicar a ocupação de cargos detitulares na CAPR. Mais precisamente, a hipótese aser testada diz respeito à idéia de que os titularestêm redutos eleitorais rurais consistentes e, portan-to, preferem ser nomeados titulares na CAPR emvez de assumirem outras comissões. Mesmo queisso não signifique, como visto, a apresentação depropostas paroquiais, pode apontar para uma esco-lha do deputado voltada à manutenção dos laçoscom seu eleitorado. Por outro lado, sob uma pers-pectiva informacional, em que as comissões perma-nentes “desempenhariam, alternativamente, o papelde gerar informação e reduzir incertezas” (Pereira eMuller, 2000, p. 61), interessante é verificar se os ti-tulares da CAPR escolhem-na por causa da profis-são exercida antes do ingresso na Câmara dos De-putados. O fato de isso ocorrer evidencia apropensão à especialização que os deputados tême, ao mesmo tempo, mostra que as comissões de-senvolvem um papel relevante segundo a perspec-tiva informacional.

A sessão seguinte analisará o aspecto daagenda decisória da CAPR, em seguida o mode-lo informacional e o distributivo serão objeto deinvestigação.

Os projetos de lei despachados à CAPR:análise dos dados

A primeira constatação remete à quantidadede propostas do Executivo em relação às do Le-gislativo.10 Ao analisar os dados relativos à inicia-tiva legislativa em matéria agrícola (Tabela 1),evidencia-se a escassez das propostas oriundasdo governo. Para o período em exame, desconsi-derando-se os tratados internacionais, que sãoapenas ratificações, as propostas vindas do go-verno somam apenas 31, enquanto os projetosapresentados pelos deputados atingem o númerode 482. Em termos meramente quantitativos, issoé um sinal inequívoco de que é o Congresso Na-cional que exerce o papel principal no âmbitodos debates de temas agrícolas. Entretanto, aoobservar o resultado final das propostas, verifica-se que quinze das propostas do Executivo foramtransformadas em normas jurídicas. Isso ocorreu

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somente em catorze projetos apresentados pordeputados.

O que explica tal resultado é o uso do pedi-do de urgência, elemento previsto na organizaçãodos trabalhos internos da Câmara dos Deputados.Uma análise mais detida das propostas apresenta-das e aprovadas confirma que, somente em casodo interesse das lideranças partidárias – por meiodas quais se manifesta formalmente o pedido deurgência –, os projetos têm chance concreta de setornar lei (Amorim Neto e Santos, 2002; Ricci,2003). Mais precisamente, dos catorze projetos delei bem-sucedidos, cinco foram aprovados recor-rendo ao instrumento da urgência. Para as propos-tas do Executivo, em todas as quinze proposiçõesas lideranças serviram-se da urgência para acelerara tramitação e facilitar a aprovação final das nor-mas. Nenhum dos projetos de lei arquivados rece-beu a apresentação de um pedido de urgência.

Esses projetos surgem em elevado número,conforme ainda a Tabela 1, e o arquivamento éuma constante em todas as legislaturas. Dos 432projetos arquivados, deve-se observar que 33,6%tramitaram em legislaturas diferentes antes de se-rem arquivados, isto é, trata-se de projetos arqui-vados ao final de cada legislatura, mas imediata-mente desarquivados, nos termos do art. 105,

parágrafo único do regimento interno. Não é raroque sejam definitivamente arquivados na legislatu-ra sucessiva. O fato de termos estabelecido comodata final da pesquisa o dia 31 de janeiro de 2003,concluindo portanto a coleta dos dados no últimodia da 52ª legislatura, significa que os projetos de-sarquivados no início da legislatura atual não fo-ram incluídos. Ou seja, o percentual de 33,6% deprojetos que tramitam em mais de uma legislatu-ra deve ser interpretado como valor abaixo doefetivo.11

Como entender o valor referente a 482 pro-postas despachadas à Comissão de Agricultura? Épossível afirmar que se trata de um número subs-tancial? A comparação com as outras comissõesdo Congresso Nacional é problemática, já quenão há estudos recentes nessa matéria. Em traba-lho pioneiro sobre a organização e o funciona-mento do Congresso, Figueiredo e Limongi infor-mam que, no período de 1989 a 1995, o volumede projetos distribuídos entre as diferentes comis-sões revela que a Comissão de Agricultura ocu-pou a penúltima posição, à frente apenas da Co-missão de Minas e Energia (Figueiredo e Limongi,1996). Com um levantamento detalhado das pro-postas encaminhadas à comissão de Trabalho, Ad-ministração e Serviço Público (CTASP), Diniz mos-

LEGISLATURA PROJETOS DE LEI DO EXECUTIVO PROJETOS DE LEI DO LEGISLATIVO

DE ORIGEM ARQUIVADOS SANCIONADOS OUTROS** TOTAL ARQUIVADOS SANCIONADOS OUTROS* TOTAL

50 (1991-1995) 1 6 7 14 126 5 9 140

(7,1) (42,9) (50) (100) (90) (3,6) (6,4) (100)

51 (1995-1999) 0 3 2 5 155 6 4 165

(60) (40) (100) (93,9) (3,6) (2,4) (100)

52 (1999-2003) 0 6 6 12 151 3 23 177

(53,8) (46,2) (100) (85,3) (1,7) (13) (100)

TOTAL 1 15 15 31 432 14 36 482

(3,1) (50) (46,9) (100) (89,6) (2,9) (7,5) (100)

Tabela 1 Projetos de Lei por Legislatura e Situação Final (1991-2003)

N e (%)

*Projetos de lei vetados ou ainda tramitando até dia 31/1/2003.

**Projetos de lei ainda tramitando, prejudicados ou retirados até dia 31/1/2003.

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do Prodasen.

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tra que em apenas quatro anos, entre 1989 e 1993,a agenda de propostas apresentadas a essa comis-são chega a 1.144 (Diniz, 1999). É claro, portanto,que, além do baixo número de aprovação daspropostas, pode-se dizer que as temáticas ligadasà área da agricultura canalizam um menor interes-se dos deputados.12 A que se deve isso?

Uma resposta mais precisa será dada na se-gunda parte deste artigo, quando estabelecermosa relação entre distribuição dos votos e ocupaçãode cargos de titulares na comissão. Algumas con-siderações podem, contudo, ser apresentadas nes-se momento. De acordo com os dados da Tabela1, observa-se que há um leve e progressivo au-mento das propostas despachadas à Comissão deAgricultura, que passam de 140 a 165 e, enfim, a177, numa média mensal de 2,9% para a 50ª legis-latura e 3,4 e 3,7% para as sucessivas. Em termosabsolutos, isso sinaliza um incremento do interes-se na temática ao longo dos anos. A dinâmicadesse aumento está demonstrada na Tabela 2.

Observando os dados nela apresentados,nota-se que grande parte do incremento é devidoao aumento mais ou menos constante das inicia-tivas legislativas de alguns partidos (como PSDB,PFL, PDT e PT). Atente-se para o dado que agru-pa os partidos da área do governo e os de oposi-ção. Nas 51ª e 52ª legislaturas, PSDB, PMDB, PFL,

PPB e PTB apresentaram conjuntamente 63,6% e75,1% das propostas. Esses partidos têm prepon-derância na origem das propostas, mas é relevan-te o fato de que, entre os partidos oposicionistas,o PT e o PDT foram os que mais projetos apre-sentaram, embora se deva ressaltar que na 52ª le-gislatura, à diminuição de propostas do PT – quepassa de 34 para 20 projetos –, há um crescimen-to de propostas apresentadas pelo PPE.

Importa agora esclarecer que os númerosabsolutos, e mesmo as percentagens, não levamem conta o fato de que os partidos têm bancadasquantitativamente muitos diferentes entre si. Paraisso, foi aplicado o Índice de Atividade Legislati-va (IAL), que traduz o número de propostas legis-lativas apresentadas por partido.13 Dessa forma,fica evidente que, ao levar em conta a bancada,os partidos mais envolvidos com propostas legis-lativas da área agrícola são os de esquerda.

Até aqui temos um quadro analítico das ini-ciativas legislativas e dos atores partidários que asapresentam. Há referências freqüentes na literaturasobre o Congresso Nacional de que ele está cons-tantemente comprometido com questões locais: aestratégia básica dos políticos em busca da reelei-ção é a de se posicionarem em favor de políticasparoquialistas (Ames, 1995a, 1995b). Outros estu-dos, que ressaltam o elevado grau de centralização

Tabela 2Projetos de Lei por Legislatura e Partido Político

(1991-2003) (N, % e IAL)

LEGISLATURA PPE* PT PDT PSDB PMDB PTB PFL PDS PPD* TOTAL

50 (1991-1995) 1 10 11 13 38 10 16 13 28 140

(0,7%) (7,1%) (7,9%) (9,3%) (27,1%) (7,1%) (11,5%) (9,3%) (20%) (100%)

IAL 0,04 0,28 0,26 0,25 0,30 0,26 0,16 0,2 0,31 0,24

51 (1995-1999) 8 34 11 25 31 5 21 27 3 165

(4,8%) (20,6%) (6,7%) (15,1%) (18,8%) (3,1%) (12,7%) (16,4%) (1,8%) (100%)

IAL 0,24 0,63 0,33 0,28 0,26 0,16 0,18 0,31 0,17 0,28

52 (1999-2003) 24 20 14 27 30 10 31 15 5 176

(13,6%) (11,4%) (8%) (15,3%) (17,1%) (5,7%) (17,6%) (8,5%) (2,8%) (100%)

IAL 0,62 0,3 0,56 0,26 0,27 0,28 0,26 0,27 0,17 0,30

TOTAL 33 64 36 65 99 25 68 55 36 481**

(6,9%) (13,3%) (7,5%) (13,5%) (20,6%) (5,2%) (14,1%) (11,4%) (7,5%) (100%)

IAL 0,34 0,41 0,36 0,26 0,28 0,24 0,2 0,26 0,26 0,27

*PPE inclui PCdoB, PPS, PSB e PV, PMN; PPD inclui PL, PP, PRN, Prona, PSD, PSL, PST e PTR.

**1 missing.

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do Prodasen.

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do processo decisório no Congresso, têm mostra-do que essa imagem não corresponde à realidade,já que a maioria das normas sancionadas é de cu-nho nacional (Figueiredo e Limongi, 1998; Lemos,2001; Amorim Neto e Santos, 2002; Ricci, 2003).14

Dando destaque para a arena eleitoral, Ricci(2003) enfatizou o fato de que, em virtude das am-plas circunscrições, a melhor forma de sinalizarpara os próprios eleitores não passa pelo envolvi-mento em questões locais, mas, mais precisamen-te, pelas propostas que favorecem determinadascategorias de interesses espalhados sobre o terri-tório nacional.

A análise do conteúdo dos projetos de lei, di-ferenciados por legislatura e por partido políticodo proponente, permite confirmar esse último ar-gumento. A Tabela 3 analisa a evolução do conteú-do das propostas parlamentares nas três legislatu-ras em exame. Todos os 482 projetos foramclassificados em nove categorias, às quais foi acres-centada uma categoria residual denominada “ou-tros” (alguns exemplos são mencionados no Apên-dice). Em termos gerais, isto é, agrupando as três

legislaturas, é possível observar que não existeuma categoria dominante. Algumas temáticas apre-sentam, em média, percentuais maiores – como acategoria da reforma agrária, as políticas setoriaisde cunho nacional, os créditos rurais, as normassobre importação/exportação, a ocupação do solorural –, mas sem se destacar das demais.

Do ponto de vista da evolução da iniciativalegislativa para as categorias supracitadas, os da-dos revelam valores quase idênticos em todas aslegislaturas, salvo para duas categorias: a da refor-ma agrária e a do crédito rural. Para a primeira, ocrescimento significativo das propostas se dá na51ª legislatura, enquanto a segunda apresentauma relativa diminuição.

Antes de enfrentar o problema do ponto devista do espectro político dos proponentes, éoportuno levar em conta o dado que aponta parao pouco interesse em temas relativos ao associa-tivismo e sindicalismo, à regulamentação de pro-fissões e às políticas setoriais de cunho local.15 Osdados informam que a configuração de atitudesdistributivas setoriais é significativa, já que, agru-

Tabela 3 Conteúdo dos Projetos Encaminhados à Comissão de Agricultura por Legislatura

ÁREAS TEMÁTICASLEGISLATURA

1991-1995 1995-1999 1999-2003 TOTAL

Reforma agrária, assentamento e

identificação de áreas desertificadas 5 18,8 16,4 13,9

Políticas setoriais de cunho nacional 14,3 13,3 12,4 13,3

Políticas setoriais de cunho local 10,7 1,8 9,6 7,3

Crédito rural, fundos de apoio à agricultura,

indenizações e benefícios fiscais 20 15,8 13,5 16,2

Associativismo e cooperativismo 2,9 1,8 1,7 2,1

Normas sobre importação/exportação,

comercialização de produtos e estocagem 18,6 15,8 15,8 16,6

Ocupação do solo rural (habitação) e

ordenamento do território 15 14,5 15,8 15,1

Direitos gerais dos trabalhadores rurais 5,7 12,7 8,5 9,1

Regulamentação de profissões e benefícios

para categorias profissionais 2,9 1,8 2,3 2,3

Outras áreas 5 3,7 4 4,1

TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0

N. 140 165 177 482

*Ver exemplos no Apêndice.

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do Prodasen.

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pando a segunda e terceira categoria, chega-se a20,6% do total nas três legislaturas. Vale notar queas categorias de cunho nacional – admitindo, masnão concedendo, que tudo que for setorial é dis-tributivo – são superiores às de políticas locais.Assim, confirma-se mais uma vez a teoria de queno processo legislativo os deputados trabalham,quando envolvidos em questões setoriais, paraproblemáticas abrangentes.

De que forma os partidos políticos são respon-sáveis por essa evolução? Ao considerarmos os da-dos da Tabela 4, nota-se como o PMDB participa nadeterminação de todas as áreas temáticas apontadasanteriormente como majoritárias. O fato de que issoocorra também para o PFL, PSDB e o PPB pode serinterpretado como um grau de consonância entreessas forças políticas que, não por acaso, convergi-ram na coalizão de governo naquele momento. Nes-ses termos, mesmo com tênues diferenças entre si,16

pudemos descrever as iniciativas legislativas preva-lecentes nos partidos da área do governo. Em con-seqüência, é significativo o dado associado às pro-postas relativas à reforma agrária que, nas trêslegislaturas consideradas, provêem 77,6% das vezesdo PMDB, PFL, PPB e PSDB, isto é. de deputados

que, a partir da 50ª legislatura, formam a coalizão degoverno. O principal partido de oposição à época,o PT, apresentou seis projetos, voltando sua atençãopara a categoria das normas relativas à importa-ção/exportação (a maioria, propostas de fixação detarifas com vistas à proteção de produtos brasileirose de regulamentação do comércio de produtosagrotóxicos) e da ocupação do solo rural, referentesà fixação do Imposto Territorial Rural e ao ordena-mento geral do território. Cabe, por fim, ressaltarque as propostas de cunho local, e que aparecemno debate como as práticas destinadas a manter ouestabelecer o vínculo entre deputado e eleitor, vêemdo PFL e do PPS. São forças políticas altamente en-volvidas, com oito projetos cada. Entretanto, os par-tidos não convergem de forma homogênea paraesse tipo de proposta. Ao analisar os dados, desta-ca-se o fato de que doze projetos – todos voltadosà criação de distritos agropecuários – são de inicia-tiva de apenas um deputado (Marcio Bittar, do PPS)e de um senador (Romero Jucá, do PFL). Isso tornaevidente que a ação paroquialista é minoritária e de-pende da ação esporádica de alguns políticos.

O quadro assim apresentado desfruta de umaanálise que nos ajuda a identificar as preferências

ÁREAS TEMÁTICAS PPE PT PDT PSDB PMDB PTB PFL PDS/PPR/PPB PPD TOTAL

Reforma agrária, assentamento

e identificação de áreas desertificadas 6,1 9,4 11,1 20 19,2 4 13,2 20 5,6 13,9

Políticas setoriais de cunho nacional 12,1 4,7 19,4 15,4 15,1 8 11,8 14,6 19,4 13,3

Políticas setoriais de cunho local 24,2 7,8 0 3,1 5,1 8 11,8 1,8 11,1 7,3

Crédito rural, fundos de apoio à agricul-

tura, indenizações e benefícios fiscais6,1 14,1 13,9 18,5 18,2 12 17,6 18,2 19,4 16,2

Associativismo e cooperativismo 0 3,1 5,6 1,5 1 0 4,4 0 2,8 2,1

Normas sobre importação/exportação,

comercialização de produtos e estocagem21,2 21,9 19,4 4,6 16,2 16 19,1 14,6 19,4 16,4

Ocupação do solo rural (habitação) e

ordenamento do território18,2 20,3 8,3 16,9 13,1 24 11,8 16,3 11,1 15,2

Direitos gerais dos trabalhadores rurais 9,1 12,5 16,7 13,8 3 20 5,9 7,3 5,6 9,1

Regulamentação de profissões e benefí-

cios para categorias profissionais0 3,1 2,8 3,1 3 0 2,9 3,6 0 2,3

Outras áreas 3 3,1 2,8 3,1 6,1 8 1,5 3,6 5,6 4,2

TOTAL 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100

N. (33) (64) (36) (65) (99) (25) (68) (55) (36) (481)

Tabela 4Conteúdo dos Projetos de Lei por Partido Político (1991-2003)

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do Prodasen.

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PRODUÇÃO LEGISLATIVA E PREFERÊNCIAS ELEITORAIS… 115

decisórias das forças políticas com as propostas de-dicadas a temáticas agrícolas. Não se deve esque-cer que a literatura política sobre as comissões –especialmente a norte-americana – postula a exis-tência de um interesse individual do deputadoquanto ao envolvimento no processo decisório.Às vezes em detrimento da orientação partidária,essa perspectiva afirma que a estratégia do depu-tado pode ser apresentar projetos de lei com basena própria experiência pessoal ou para atender adeterminados grupos de interesse. Nesse últimocaso, tendo em vista os dados que apontam paraa falta do envolvimento dos deputados brasileirosem questões locais, o peso da iniciativa legislativadestinar-se-ia a grupos setoriais amplos e distribuí-dos sobre o território nacional.

De forma geral, podemos entender essaquestão observando a relação entre o proponen-te e a respectiva ocupação de cargos na Comissãode Agricultura. Dos 454 projetos apresentados pordeputados federais, 63% foram propostos por titu-lares/suplentes dessa Comissão, ou que já tinhamexercido esse papel. A implicação é óbvia: o com-portamento legislativo em geral pode ser maisbem compreendido quando se investiga o desem-penho dos titulares da comissão, suas preferên-cias e seus interesses específicos. Essa é a justifi-cativa que nos levou a destinar ao estudo dostitulares da comissão uma sessão à parte.

Antes disso, é oportuno aprofundar-se noexame das iniciativas legislativas. Trata-se de com-

preender qual é o desempenho da Comissão deAgricultura ao longo do processo decisório. O pri-meiro aspecto a ser considerado remete ao tipo deorganização dos trabalhos parlamentares: 92,5%das propostas encaminhadas à Comissão de Agri-cultura são despachadas com poderes terminati-vos, o que revela uma elevada descentralização doprocesso decisório. E isso ocorreu nas três legisla-turas consideradas, sem grandes variações na taxade descentralização. Quando nos deparamos comesse dado, de imediato assume força a associaçãocom as experiências norte-americana e italiana, nasquais as comissões permanentes gozam de umaproeminência absoluta na organização dos traba-lhos legislativos (Lees e Shaw, 1979). A prática le-gislativa brasileira mostra, contudo, que os fortespoderes formais das comissões encontram muitosobstáculos na própria dinâmica interna ao proces-so decisório. A Tabela 5 aponta nessa direção.

A primeira constatação é a de que a Comis-são de Agricultura, quando as propostas nela in-gressam, tende a examinar, elaborar e aprovar umparecer final. De fato, são “apenas” 142 – 34,3%do total – os projetos que, entrando na comissão,acabam por serem arquivados, sem que seja apre-sentado ou votado qualquer parecer. Quanto àdemora na decisão, na maior parte das vezes oparecer é dado e votado na mesma legislatura.Dos 272 projetos, cujos pareceres foram votadose aprovados, apenas 21,7% são analisados pelacomissão em legislaturas diferentes. O que acaba-

TIME DA APRECIAÇÃO SITUAÇÃO DOS PROJETOS ENCAMINHADOS À COMISSÃO

Com parecer do Com parecer do relator, Sem parecer do relator Sem entrada na Total

relator votado mas não votado ou ainda sem relator comissão

50ª legislatura 48 12 6 15 81

(1991-1995)

51ª legislatura 59 36 13 9 117

(1995-1999)

52ª legislatura 106 16 37 28 187

(1999-2003)

Legislaturas diferentes 59 10 12 8 89

TOTAL 272 74 68 60 474*

Tabela 5Situação dos Projetos Encaminhados à CAPR, Segundo a Legislatura em que Foram Apreciados

*Foram excluídos sete projetos que receberam parecer oral no plenário; 1 missing.

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do Prodasen.

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116 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

mos de especificar dá margem à idéia de três ti-pos de decisão que afetam os projetos despacha-dos à cada comissão.

O primeiro tipo corresponde, na verdade, àinexistência de decisão, devido a fatores externosà comissão e ao fato de que há propostas que nun-ca chegam a nela ingressar, embora devessem for-malmente, já que são designadas pela Mesa Dire-tora. No banco de dados, são sessenta os projetosque se encontram nesta condição. A explicaçãoestá na múltipla distribuição: os projetos, na Câma-ra dos Deputados, são em geral distribuídos a vá-rias comissões pertinentes, além da Comissão deConstituição, Justiça e Redação. De fato, a CAPR éa segunda comissão na ordem de despacho esta-belecida pela Mesa em 83,3% das vezes. Para osprojetos que chegam a entrar na comissão, estataxa cai para 16,9%. Essa forma organizacional criauma série de pontos de veto dentro da instituição.

O segundo tipo de decisão refere-se àquelesprojetos que entram na comissão mas que aca-bam por ser arquivados sem que seja decididoseu mérito. A partir dos 142 projetos nessa cate-goria, é possível avançar algumas hipóteses inter-pretativas. Em primeiro lugar, é fundamental dis-tinguir o poder de veto do parlamentar individual– que apresenta o parecer –, do poder de veto dopresidente da comissão – que não distribui o pro-jeto ou não o inseri na agenda de deliberação.Trata-se, em ambos os casos, do poder da não-de-cisão, fato que pode ser atribuído a um conjuntode fatores, como, por exemplo, a falta de consen-so quanto ao tema ou à sua pequena importânciaem relação aos demais, que o tornaria uma pro-posta marginal. Mesmo assim, vale notar que oscasos em que o projeto foi “guardado” pela co-missão são sempre inferiores ao terceiro tipo dedecisão, a saber, quando os projetos são analisa-dos e apreciados de forma conclusiva. Descritiva-mente, os dados parecem apontar por uma preva-lência deste terceiro tipo que, em síntese, espelhaa capacidade de chegar a um acordo final quantoàs propostas que tramitam na comissão.

Os dados referentes à Tabela 5 podem, emúltima instância, demonstrar o papel ativo daCAPR, o que contradiria a idéia de que as comis-sões exercem um papel de veto sobre as propos-

tas legislativas (Figueiredo e Limongi, 1996; Ricci,2003). Mas que tipo de parecer final é aprovado?Ter um parecer aprovado significa a aprovação dalei? Para os 272 casos em que a comissão chega aexpressar um voto final, em 94 vezes o pareceraprovado é contrário no mérito. Ou seja, agrupan-do os pareceres contrários e as 142 propostas blo-queadas em comissão, chega-se a 236 projetos emque a CAPR ou não decide, ou decide negativa-mente. Isso representa 57% das propostas exami-nadas pela comissão, confirmando o perfil das co-missões como instância de veto.

Observa-se, de forma conclusiva, que 85,3%dos 272 projetos que receberam um parecer finalda Comissão de Agricultura e, portanto, seguirama tramitação ideal, não tendo sido anteriormentevetado em nenhuma outra comissão, foram suces-sivamente arquivados antes de serem debatidosno plenário da Câmara dos Deputados (232 proje-tos). Para os demais, doze ainda tramitavam emoutras comissões da Câmara no momento do fe-chamento do banco de dados e sete esperavampor decisão do plenário. Apenas 21 terminaram atramitação na Câmara e foram despachados ao Se-nado, dos quais três foram arquivados, nove trans-formados em norma jurídica, cinco vetados total-mente pelo presidente e os quatro restantes aindaencontravam-se na segunda Casa no momento dofechamento desta pesquisa. Sob essa perspectiva,é patente que, para o sucesso de um projeto, ocusto de tramitação tem o efeito de diminuir signi-ficativamente as expectativas de seu sucesso.

Ocupação de cargo na Comissão de Agri-cultura: aquisição de expertise e conexãoeleitoral

Feitas essas considerações sobre a tramitaçãodas propostas na CAPR, no que diz respeito à pro-dução legislativa vis à vis o Executivo, o conteúdodas propostas e a classificação por partidos políti-cos, passamos à analise da composição da CAPRsegundo o histórico profissional e o desempenhoeleitoral dos membros em municípios rurais.

Essa análise, como anteriormente assinalado,terá como foco as vertentes informacional e distri-

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PRODUÇÃO LEGISLATIVA E PREFERÊNCIAS ELEITORAIS… 117

butiva. No primeiro caso, regras privilegiadas,como as closed rules e gate-keeping power, garan-tem que as comissões tenham maior acesso às in-formações e possam se especializar. A especializa-ção dos parlamentares é fundamental para tornaro processo eficiente (aproximando as políticas dosresultados desejados) e, assim, possibilitar o alcan-ce do objetivo final – a reeleição. As comissõestêm um papel preponderante na coleta das infor-mações necessárias ao andamento legislativo e nadistribuição dessas informações entre os congres-sistas, diminuindo os custos da decisão para to-dos. A formulação dessa vertente está atada a doispostulados fundamentais: a decisão majoritária ea incerteza quanto aos resultados das políticas, oque leva os parlamentares a agirem de forma a evi-tar riscos (Khrebiel, 1991).17 Na vertente distributi-va, o fator preponderante é a conexão eleitoral.Uma vez que os legisladores estão sujeitos a elei-ções periódicas, e o espaço eleitoral é o geográfi-co, a “conexão eleitoral” significa que todo mem-bro do Congresso tem forte incentivo para atenderaos interesses específicos dos eleitores de sua re-gião (Weingast e Marshall, 1988).

A primeira parte da análise, portanto, verifi-ca se representantes com laços profissionais naárea agrícola anteriores à vida parlamentar bus-cam fazer parte da CAPR. É preciso salientar quetodas as informações foram retiradas do repertó-rio biográfico dos próprios parlamentares. Isso di-

ficulta a classificação, já que o critério de atribuiçãode um parlamentar numa dada categoria profissio-nal se dá por autodesignação. Para tentar identifi-car não somente os que têm um vínculo strictusensu, mas também todos os que de alguma formaestão profissionalmente vinculados à agriculturaou ao meio rural, acrescentamos à análise os cri-térios da ocupação de cargos públicos e da mili-tância sindical na área. No caso em questão, de1991 a 2003, 298 deputados ingressaram na co-missão como titulares.18

De acordo com a Tabela 6, o teste informa-cional do expertise dos parlamentares quanto aoseu histórico profissional demonstrou-se válido,confirmando o fato de que a especialização temimpacto significativo na nomeação (Santos, 2002).A porcentagem, na comissão, de deputados daárea de agricultura segue uma média de 61,6%.Ela permaneceu constante para as três legislaturasconsideradas, sendo de 62,3% para a Legislaturade 1991 a 1995; 58,7%, para a de 1995 a 1999; e64,6%, para o período de 1999 a 2003.19 A Tabela6 mostra a divisão dos membros da comissão se-gundo o partido político. Ficam visíveis, então, osdois partidos que designaram proporcionalmentemais membros profissionais para a CAPR, na árearespectiva de especialização: o PFL (quatro vezeso número de parlamentares que não são profis-sionais da agricultura) e o PT (uma vez e meia onúmero de parlamentares que não têm experiên-

Tabela 6Titulares da CAPR por Partidos e Profissão (1991-2003)

*4 missing.

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do Prodasen e repertórios biográficos dos deputados.

PARTIDO POLÍTICO PROFISSÃO AGRÍCOLA (n) PROFISSÃO NÃO-AGRÍCOLA (n) TOTAL (n)

PPE 3 7 10

PT 14 9 23

PDT 11 3 14

PSDB 15 22 37

PMDB 37 27 64

PTB 13 9 22

PFL 40 10 50

PDS/PPR/PPB 31 16 47

PPD 17 10 27

Total 181 113 294*

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118 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

cia anterior na agricultura). Isso certamente nãoquer dizer que ambos tenham o mesmo perfil,mas que são partidos que canalizam para essa co-missão seus especialistas. O único partido a termais representantes sem o background agrícolafoi o PSDB.20

Quanto ao teste distributivo, o propósito aquifoi verificar se os parlamentares que buscaramcompor a CAPR vêm de municípios rurais, partin-do da premissa de que, para se reeleger, o deputa-do sempre buscará o contato com seus eleitores. Omunicípio rural é importante? O voto rural tempeso significativo na distribuição dos votos totaisdos deputados titulares da CAPR? A partir dessasquestões centrais, orientamos a investigação nosentido de reunir dados capazes de permitir a de-finição das problemáticas em discussão.

Em primeiro lugar, concentrando a investiga-ção sobre as eleições de 1994 e de 1998, obser-vou-se que os 155 titulares da CAPR no períodoem questão obtiveram votos em 32.21921 municí-pios, alcançando um total de 7.228.402 votos. Doponto de vista empírico, esses números levantamum problema operacional. Para resolver a ques-tão, basta refletir sobre a relevância dos votos emcada município: Teriam eles a mesma importânciano que diz respeito à quantidade de votos? A lite-ratura é unânime em apontar, no caso brasileiro,para a concentração de votos em poucos municí-pios, que se tornariam cidades-chave na lógica dacompetição eleitoral (Ames, 2001; Samuels, 2003).Sendo essas as condições de funcionamento dadinâmica eleitoral, decidimos desconsiderar os ca-sos nos quais os deputados conseguiram poucosvotos, concentrando o estudo sobre as cidadesmais relevantes. Dois critérios foram utilizados:(1) os votos computados para cada deputado nãopoderiam ser inferiores a 80% do total; e (2) in-clusão obrigatória dos municípios que computa-vam um limite mínimo de trezentos votos. O totalde registros de municípios passou então para5.002, 15,5% do total. Nessa porcentagem de mu-nicípios, os titulares somaram 6.263.463 votos, oque representa 86,7% do total. Fato que confirma,em síntese, o voto concentrado dos parlamenta-res. Devemos, ainda, ressaltar que dos 5.002 mu-nicípios, não foi possível levantar dados sobre

doze. Portanto, os dados apresentados referem-sea 4.990 casos.

O segundo problema operacional remete aoproblema da qualificação dos municípios nos quaisos deputados obtiveram votos de forma significati-va. Classificamos os 4.990 municípios de acordocom a população residente, segundo dados doIBGE (ano-base 1996). Foram adotadas três catego-rias: (1) município rural, quando a população ruralera superior a 50%; (2) município intermediário,quando a população rural estava entre 33,3% e49,9%; e (3) município urbano, quando a popula-ção rural era inferior a 33,3% do total.

Antes de passar ao exame dos dados, é ne-cessária uma reflexão sobre o critério aqui esco-lhido para conceber e entender de forma corretaa relação entre deputado e reduto eleitoral. Otipo de município (rural/urbano) seria um crité-rio satisfatório? Antes de tudo, esta escolha partiudo reconhecimento de que outros critérios –como as atividades econômicas por município eo número de empregados por setor – não apre-sentam dados em todos os municípios. Deve-seressaltar, ainda, que o conceito de propriedadefamiliar é um dos itens considerados para estimaro público potencial da reforma agrária. A legisla-ção que regulamenta a criação do Banco da Ter-ra segue esta lógica, de modo que os agricultoresproprietários de imóveis, cuja área não alcance adimensão da propriedade familiar, constituem umamaneira de definir o público prioritário (Gasquese Conceição, 2000). Portanto, as diferenças entreos números de domicílio é uma estratégia válidapara caracterizar a importância do voto rural nosistema eleitoral brasileiro.

O estudo da performance dos titulares daCAPR nas eleições de 1994 e de 1998 revelou-semuito interessante. A Tabela 7 apresenta os da-dos sobre o tipo de município que “alimentou”eleitoralmente os membros da comissão. Os mu-nicípios de perfil urbano somaram 42,9% (2.141)e, portanto, têm uma participação maior no en-vio de parlamentares. Os membros dessa comis-são não são todos, nem em sua maioria, oriundosde bases eleitorais rurais, tampouco procedem debases urbanas, já que, do ponto de vista estri-to,existe uma distribuição. Mas pode-se dizer

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PRODUÇÃO LEGISLATIVA E PREFERÊNCIAS ELEITORAIS… 119

que, proporcionalmente à distribuição populacio-

nal brasileira, os municípios rurais têm sim um

peso maior na CAPR do que no total dos repre-

sentantes da Câmara. Somando-se ainda municí-

pios rurais e intermediários, tem-se uma ampla

maioria de 57,1%.

Quanto ao perfil regional, a Tabela 7 mostra

que as regiões Norte, Nordeste e Sul têm uma

grande participação de municípios rurais, embora

com diferenças: na bancada nordestina, a partici-

pação de bases eleitorais rurais chega a ser duas

vezes a de municípios urbanos e, na bancada su-

Tabela 7Reduto Eleitoral dos Titulares da CAPR por Tipo de Município e Estado (1994-1998)

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do IBGE de 1996 e do TSE para as eleições de 1994 e 1998.

ESTADO DEPUTADOS

MUNICÍPIOS

CONSIDERADOS

(N)

MUNICÍPIOS URBANOS

(%)

MUNICÍPIOS

INTERMEDIÁRIOS

(%)

MUNICÍPIOS

RURAIS (%)

Alagoas 2 60 25 26,7 48,3

Bahia 11 382 22,5 17 60,5

Ceará 4 145 25,5 26,9 47,6

Maranhão 4 94 17 20,2 62,8

Piauí 5 253 19,8 25,7 54,5

Paraíba 6 173 21,4 26 52,6

Pernambuco 5 119 39,5 22,7 37,8

Rio Grande do Norte 3 80 43,7 32,5 23,8

Sergipe 7 145 26,2 30,3 43,5

Região Nordeste 47 1451 24,9 23,8 51,3

Acre 7 41 19,5 34,2 46,3

Amapá 1 2 100 0 0

Pará 7 146 30,8 18,5 50,7

Rondônia 4 51 27,5 23,5 49

Roraima 4 17 35,3 23,5 41,2

Tocantins 8 197 45,2 24,9 29,9

Região Norte 31 454 36,1 23,3 40,6

Goiás 6 204 70,1 22,1 7,8

Mato Grosso 4 95 61,1 21 17,9

Mato Grosso do Sul 4 89 74,2 17,9 7,9

Região Centro-Oeste 14 388 68,8 20,9 10,3

Espírito Santo 4 79 50,6 24,1 25,3

Minas Gerais 18 536 61 20,2 18,8

São Paulo 5 284 88 8,8 3,2

Rio de Janeiro 1 7 85,7 14,3 0

Região Sudeste 28 906 68,8 16,9 14,3

Paraná 14 554 48 21,5 30,5

Rio Grande do Sul 15 869 38,7 13,8 47,5

Santa Catarina 6 368 33,7 16 50,3

Região Sul 35 1.791 40,6 16,6 42,8

TOTAL BRASIL 155 4.990 42,9 19,7 37,4

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120 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

lista e nortista, a proporção de municípios rurais e

urbanos tende a ser equilibrada. É preciso enfatizar

que, no Nordeste, nos estados da Bahia, Maranhão,

Paraíba e Piauí, a categoria “município rural” é nu-

mericamente superior à dos “urbanos” e “interme-

diários”, quando considerados em conjunto. Para

os demais estados – Alagoas, Ceará, Pernambuco,

Rio Grande do Norte e Sergipe – os municípios ru-

rais são significativos, mas os intermediários tam-

bém têm relevância. Destaca-se o Rio Grande do

Norte por ter, em comparação aos demais estados

da região, votos significativos em municípios urba-

nos. Quanto ao Sul, é importante enfatizar que o

baixo número de municípios intermediários se dá

graças a Santa Catarina e Rio Grande do Sul, esta-

dos onde os deputados se concentram em cidades

Tabela 8Reduto Eleitoral dos Titulares da CAPR Segundo a Votação Obtida nos Municípios,

por Tipo de Município e por Estado (1994 e 1998)

Fonte: Elaboração dos autores a partir dos dados do IBGE de 1996 e do TSE para as eleições de 1994 e 1998.

ESTADO DEPUTADOS VOTOS CONSIDERADOS

VOTOS

EM MUNICÍPIOS

URBANOS

VOTOS

EM MUNICÍPIOS

INTERMEDIÁRIOS

VOTOS

EM MUNICÍPIOS

RURAIS

Alagoas 2 99.672 41,5 20 38,5

Bahia 11 568.343 35 13 52

Ceará 4 225.801 38,9 22,3 38,8

Maranhão 4 178.282 40,1 10,5 49,4

Piauí 5 299.779 30,8 28,5 40,7

Paraíba 6 220.195 34,5 23,2 42,3

Pernambuco 5 238.094 51,2 17,4 31,4

Rio Grande do Norte 3 131.774 69,1 18,6 12,3

Sergipe 7 207.292 31,3 22,8 45,9

Região Nordeste 47 2.169.232 39 19 42

Acre 7 48.147 55,8 29,2 15

Amapá 1 3.918 100 0 0

Pará 7 242.548 48 16 36

Rondônia 4 61.697 52,8 18,5 28,7

Roraima 4 22.838 75,1 9,8 15,1

Tocantins 8 163.522 56,5 20,6 22,9

Região Norte 31 542.670 53,3 18,4 28,3

Goiás 6 257.784 84,7 9,4 5,9

Mato Grosso 4 167.005 81,6 7,9 10,5

Mato Grosso do Sul 4 159.164 85,7 11 3,3

Região Centro-Oeste 14 583.953 84,1 9,4 6,5

Espírito Santo 4 160.625 64,1 21,2 14,7

Minas Gerais 18 808.396 74,2 14 11,8

São Paulo 5 277.279 94,9 2,4 2,7

Rio de Janeiro 1 21.789 97,5 2,5 0

Região Sudeste 28 1.268.089 75,1 12,2 12,7

Paraná 14 679.955 60,4 16,5 23,1

Rio Grande do Sul 15 705.704 60,5 10,6 28,9

Santa Catarina 6 303.711 51 14,3 34,7

Região Sul 35 1.689.370 58,8 13,7 27,5

TOTAL BRASIL 155 6.253.314 57,1 15,2 27,7

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urbanas ou rurais. No Centro-Oeste e no Sudeste, aocorrência dos tipos intermediário e rural é muitoinferior à de municípios urbanos, apontando parauma maior distribuição populacional nas áreas ur-banas. A região Norte apresenta um quadro bastan-te similar ao Nordeste, apesar da prevalência demunicípios rurais no Pará e de o peso da categoriaurbana ser maior.

Até o momento referimo-nos apenas aos da-dos dos municípios. Mas vale lembrar que a dinâ-mica do sistema eleitoral brasileiro prevê distritoscom magnitude médio-alta. E, em particular nosdistritos com magnitude elevada, a competitivida-de será maior, seja em termos de número de can-didatos, seja em termos de número de votos a se-rem obtidos para alcançar o quociente eleitoral. Apartir dessa consideração, é licito pensar que opeso competitivo dos municípios rurais é menoronde a magnitude for maior e a população se con-centrar em centros urbanos grandes. Nesse senti-do, basta olhar para os dados relativos ao tamanhopopulacional dos municípios em exame. Dos1.865 municípios classificados como rurais, é mui-to significativa a porcentagem (50%) dos que têmpopulação inferior a 10 mil habitantes, enquantoentre os 2.141 municípios urbanos, o peso das ci-dades pequenas é de apenas 14,6%. Por que ocandidato deveria gastar tempo, energia e recur-sos pessoais em vários municípios rurais quandopoderia se concentrar unicamente em uma gran-de área urbana? Evidentemente precisamos anali-sar quanto e em que proporção o voto em cida-des rurais é significativo.

Pode-se observar na Tabela 8 os votos pormunicípios, ou seja, a participação de votos oriun-dos de municípios rurais, intermediários e urbanosna composição da CAPR, durante as eleições de1994 e 1998. Esses dados demonstram que, embo-ra os municípios urbanos representem 42,9% douniverso de municípios representados na CAPR,os votos equivalentes chegam a 57,1% do total(3.571.431, num total de 6.253.314). Assim, o pesoeleitoral dos municípios urbanos, em número devotos, é mais significativo do que a representaçãodos municípios pela população. Isso se explicaparcialmente pela demografia brasileira, com apopulação concentrada em cidades. Com o atual

sistema, é também mais barato buscar votos nascidades do que no campo, em virtude, como as-sinalado anteriormente, do tamanho do distrito eda competitividade.

A distribuição regional do voto mantém apredominância do rural no Nordeste, embora nãona mesma proporção que o tipo de município. Defato, se agruparmos as categorias urbano e inter-mediário, a Bahia surge como o único caso emque a categoria rural consegue concentrar maisvotos (52% dos totais). Entretanto, vale salientarque, se para Alagoas, Ceará, Maranhão, Paraíba,Piauí e Sergipe os votos obtidos em cidades ruraispermanecem significativos (respectivamente, 38,5%,38,8%, 49,4%, 42,3%, 40,7%, e 45,9%), para Per-nambuco e Rio Grande do Norte a votação estácircunscrita nos centros urbanos (51,2% e 69,1%,respectivamente). As regiões Norte e Sul, queapresentaram um equilíbrio entre municípios ru-rais e urbanos, passam a ter um contingente de vo-tos bem mais significativo na área urbana. Osvotos urbanos representam 60,4%, 60,5% e 51%,respectivamente, para Paraná, Rio Grande do Sule Santa Catarina. Na região Norte, apenas o Parátem votos urbanos inferiores às outras duas cate-gorias. Sempre com base nos dados da Tabela 8,vemos como as regiões Centro-Oeste e Sudesteconfirmam a tendência da concentração dos votosem municípios urbanos.

Dessa forma, é possível apontar para o me-nor peso dos municípios rurais quando a análise érestrita ao exame dos votos dos titulares. Num sis-tema eleitoral altamente competitivo, caracterizadopor grandes distritos e por uma população majori-tariamente urbana, o peso eleitoral dos municípiosrurais tornou-se menos relevante. Posto nesses ter-mos, a questão distributiva se torna menos impor-tante para a titularidade da comissão. Poderíamosentão afirmar que o teste informacional é o maissignificativo? Para responder a essa pergunta, vol-temos nossa análise para as duas explicações rela-tivas à titularidade.

De modo descritivo, o teste informacional eo distributivo revelam que há quatro tipos de titu-lares na Comissão de Agricultura. O primeiro é oque poderíamos chamar de “titular de área” (tipoA), já que combina uma profissão ligada ao setor

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agrícola com uma concentração de votos em áreasrurais. Dos 155 deputados titulares em exame, 37adequavam-se a essa categoria. O segundo tipo éo “titular distributivista” (tipo B), que não tem pro-fissão específica de área, mas possui acima de umterço de votos em cidades rurais. Para o períodoem exame, eles são apenas 15. O terceiro tipo re-presenta o “titular por especialização” (tipo C). Aocontrário do anterior, ele tem profissão ligada aomundo rural, sem gozar de votos relevantes nosmunicípios rurais. Trata-se do tipo mais represen-tativo, incluindo 63 titulares da comissão. Final-mente, o quarto tipo refere-se ao “titular sem inte-resses manifestos” (tipo D). Para os quarenta casosem questão, nem a profissão nem o reduto ruralsão características explicativas da presença dos de-putados na Comissão de Agricultura. O fato de osdeputados com profissão constituírem maioria ede os chamados distributivistas comporem umaminoria sinaliza para a fragilidade da hipótese dis-tributiva em relação à informacional, pelo menospara o caso da Comissão de Agricultura.

Devemos, contudo, nos deter sobre essaquestão, afinal o tipo A, que agrupa 37 titulares,esconde os dois modelos de comportamento dodeputado ao relacionar concomitantemente a par-ticipação na CAPR com a profissão e o reduto ru-ral. Para analisar esse aspecto, decidimos fazerum teste a partir do grau de rotatividade que a co-missão apresenta. Poderíamos explicar a perma-nência do titular na comissão, por uma legislatu-ra inteira, a partir de sua profissão e/ou de seureduto eleitoral?

O teste foi feito adotando o procedimentoestatístico da regressão logística. A variável de-pendente era a permanência ou não do deputadona comissão para o período de uma legislatura.As variáveis independentes foram o tipo de pro-fissão do titular e seu reduto eleitoral. No primei-

ro caso, a variável apresentava-se como ter ounão ter profissão ligada ao setor agrícola; no se-gundo, optou-se por dicotomizar a variável, dife-renciando entre deputados com votos significati-vos em municípios rurais (acima de 33,3% dosvotos totais) e deputados sem votos significativosem municípios rurais (abaixo de 33,3%). A Tabe-la 9 evidencia os resultados obtidos da análiseunivariada, demonstrando que apenas a profissãoestá associada à permanência do deputado na co-missão.22 Em particular, titulares com profissões naárea têm 6,9 mais chances de permanecer do queos que não têm profissão na área. O tipo de re-duto eleitoral não é estatisticamente significativo[IC95% = 0,890; 3,576], de forma que é possívelconsiderar apenas o fator profissão como preditorda menor rotatividade dos titulares.

Mas somente com base neste teste seria pos-sível afirmar a eficiência explicativa do modelo in-formacional? Em primeiro lugar, é importante sa-lientar que a rotatividade dos membros ésignificativa, mesmo entre os deputados que têmprofissão na área agrícola. Para os 155 titulares emexame, dos cem que tinham profissões na área,54% não permaneceram durante uma legislaturainteira. Embora a porcentagem seja mais baixa emrelação aos que têm redutos eleitorais (a porcen-tagem dos que deixam a comissão aumenta para57,7%), é claro que esse fato desfavorece a teoriainformacional, uma vez que os parlamentares têma especialização prejudicada quando não perma-necem na comissão. Entretanto, no caso da CAPR,há casos de rotatividade cíclica: os parlamentaressaem da comissão e depois retornam a ela. Assim,o problema é saber por que esses deputadossaem da comissão. Duas hipóteses podem serapresentadas: ou o partido, por meio das lideran-ças, tende a enfraquecer a permanência dos pró-prios membros por períodos prolongados, fortale-

Tabela 9Análise Univariada da Rotatividade dos Titulares em Relação a Profissão e Reduto

Variável Coeficiente ORbruta IC 95% (ORb) p (X?)Profissão 1,940 6,957 [2,732; 17,711] 0,000

Reduto eleitoral 0,579 1,784 [0,890; 3,576] 0,103

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cendo seu papel como centro distribuidor de pri-vilégios, ou os deputados decidem sair para de-fender propostas e projetos inerentes a outras te-máticas que tramitam em outras comissões. Umadinâmica desse tipo, se confirmada, demonstraria,para ambas as hipóteses, a insuficiência do mode-lo informacional, já que aponta para a importân-cia do aspecto político-partidário ou para a exis-tência de diferentes formas de expertise políticodo parlamentar.

Em segundo lugar, a grande rotatividade foimarcante no primeiro governo FHC, quando ape-nas catorze titulares, do total de 88, permaneceramna comissão durante toda a legislatura. Entretanto,no segundo governo FHC, a rotatividade foi me-nor, com 38 dos 63 titulares permanecendo até ofim da legislatura. É importante ressaltar que,como não se adota no Brasil o princípio da senio-ridade e as comissões funcionam num sistema es-tratificado, a intensa rotatividade dos parlamenta-res pode ser explicada a partir da segundalegislatura de cada mandato, quando o parlamen-tar ganha um “passe” para outra comissão maisimportante. Sendo assim, considerando que a de-cisão final a respeito da ocupação de cargos numacomissão é dos líderes partidários, a dimensãopartidária torna-se mais relevante do que a esferainformacional. E o fato de ter havido um aumentoda permanência dos deputados na comissão no se-gundo mandato de FHC pode estar ligado não aoaumento do prestígio interno da comissão dentrodo sistema – evidenciado no baixo número depropostas legislativas –, mas numa estratégia daslideranças de partido.

Vale, contudo, observar que as comissõespodem ser representativas do plenário ou ter pre-ferências extremas. Essa avaliação pode ser feitamediante um estudo comparado do backgroundprofissional do plenário com o background de to-das as comissões.23 Esse expertise prévio é relevan-te para os trabalhos das comissões e causa impac-to no processo legislativo, pois os parlamentarestrazem consigo suas redes de apoio, de financia-mento de campanha, de interlocução, as quaispassam a ser um canal privilegiado de informaçãodentro da comissão. Aspectos como os tipos, ospedidos e os propósitos das audiências públicas

realizadas poderiam ajudar a iluminar os traba-lhos das comissões e o papel da especializaçãoprévia e posterior na coleta e distribuição de in-formações aos congressistas.

Essa discussão não pretende de forma algu-ma ser exaustiva. Tentamos apenas destacar comoé extremamente duvidoso que o sistema de co-missões possa ser concebido e entendido comouma aplicação do mero modelo informacional.Para o caso em questão, acreditamos que, alémda dimensão partidária, seja necessário analisar adinâmica da arena eleitoral. Num contexto alta-mente competitivo, em distritos amplos e hetero-gêneos, o deputado com votos em municípios ru-rais deve transferir sua atenção para votos emáreas urbanas, mais povoadas e onde há interes-ses diferentes. Desse modo talvez seja possívelexplicar a grande rotatividade dos membros, as-sim como o fato de ela ser cíclica.

Conclusão

Com este trabalho, buscamos três objetivosbásicos. Primeiro, assinalar a importância de ana-lisar as comissões quando se trata de entender adinâmica do legislativo. Embora a área de estudoslegislativos venha-se firmando, existe ainda umlongo caminho a ser percorrido para a compreen-são de como operam as diversas instâncias inter-nas do Legislativo e de quanto isso influencia aqualidade da legislação produzida, do controle doExecutivo e dos gastos governamentais.

Ao lado desse objetivo maior, apresentaram-se dois de natureza analítica, formulados a partirdo estudo de caso da Comissão de Agricultura ePolítica Rural da Câmara dos Deputados. O pri-meiro era caracterizar o processo legislativo nascomissões, seja na forma – como as comissõesexercem seus poderes e privilégios, especialmen-te o gatekeeping –, seja no conteúdo – propostasapresentadas segundo a área especifica –, seja apreferência dos partidos políticos na produção le-gislativa, seja, ainda, o timing da apreciação daspropostas legislativas, o qual, na realidade, acabasendo o timing de quem detém o poder de desig-nar (presidente da comissão) ou responder à de-

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signação (o relator). O segundo objetivo era iden-tificar se as comissões estariam compostas por pre-ference outliers e se os titulares das comissões ti-nham redutos eleitorais com estreitos laços nacomissão. No primeiro caso, tratava-se de uma hi-pótese observada na teoria informacional; no se-gundo, na teoria distributiva.

Os dados coletados e processados viabiliza-ram algumas conclusões interessantes seguindocada um dos objetivos, algumas delas já anuncia-das na literatura existente sobre o Legislativo bra-sileiro. Quanto ao exame da produção legislativa,após o estudo dos dados referentes a três legisla-turas, não resta dúvida de que a Comissão de Agri-cultura exerce um papel ativo, se levarmos emconta o número de projetos por ela apreciados.Quanto ao tipo de tomada de decisão, gostaríamosde enfatizar o papel de veto que a comissão exer-ce. Dois dados apontam nessa direção: projetosbloqueados e tipo de parecer. Em primeiro lugar,o tipo de decisão que implica o bloqueio de umprojeto na comissão pode ser interpretado comouma decisão do presidente de não relatá-lo ou,ainda, de não apreciá-lo. Isso significa, do pontode vista prático, o envio do projeto para um rela-tor que irá mantê-lo até o final da legislatura. Essahipótese, que deverá ser investigada com mais ri-gor, baseia-se na idéia de que o processo legisla-tivo encontra vínculos e limites significativos nointenso poder que exerce o presidente de comis-são. De outro lado, a apresentação de parecerescontrários é também bastante significativa, o quedemonstra a capacidade de auto-seleção da Co-missão de Agricultura. De modo geral, é possíveldizer que o número limitado de projetos que che-gam a ser apreciados em plenário e, menos ainda,os que seguem para o Senado e se tornam leideve-se ainda que parcialmente ao custo de trami-tação, no qual as comissões representariam o fatormais relevante. Levando-se em conta que os pro-jetos de lei na Câmara passam pelo exame de maisde duas comissões, e que a maioria delas os exa-minam terminativamente, basta um parecer nega-tivo de uma única comissão para inviabilizar o su-cesso das propostas legislativas.

Para cumprir o segundo propósito deste es-tudo, focalizamos a análise sobre a lógica de ocu-

pação de cargos de titulares na Comissão de Agri-cultura – do expertise parlamentar e da conexãoeleitoral. Demonstrou-se que os parlamentaresque compõem a CAPR têm um elevado nível deespecialização, o que repercute na aquisição e nadistribuição de informações. Comprovou-se aindaque os municípios onde esses parlamentares con-centram votos são na maioria rurais e intermediá-rios, mas, em contrapartida, que a maior parte dosvotos são urbanos. Isso ficou ainda mais patentequando passamos a discutir em conjunto os as-pectos informacional e distributivo. Ao chamarematenção para a grande rotatividade dos membros,os dados evidenciaram que somente a profissãopode explicar a permanência dos deputados nacomissão durante uma legislatura inteira. Issonão quer dizer que não haja representação rural,mas apenas que ela não é majoritária, em decor-rência tanto da concentração populacional nas ci-dades, como ao fato de que, pelo tamanho dodistrito e da intensa competitividade, aos parla-mentares convém buscar votos em municípiosurbanos de ampla dimensão. Isso parece apontarpara o fato de que os deputados titulares da Co-missão de Agricultura têm interesses diversos;fato que pode explicar as taxas elevadas de rota-tividade cíclica.

Em síntese, a investigação da conexão eleito-ral unicamente como função da relação entre po-líticos e cidadãos (eleitores) não contempla toda acomplexidade do processo legislativo, já que a re-presentação se faz não só do ponto de vista geo-gráfico, mas também dos interesses organizados.Assim, grupos de interesse – sindicatos, associa-ções ruralistas etc. – podem ter influência em di-versos tipos de município, viabilizando ou dificul-tando campanhas. A nosso ver, com relação aesse argumento, tornar-se-ia mais interessantepara o estudo da dinâmica legislativa brasileiraobter uma perspectiva analítica focada sobre osgrupos de interesse, as atividades de lobby e a in-fluência dos setores organizados da sociedade.Em outras palavras, para além da relação diretaentre deputados e eleitores, é preciso considerara policy community, a issue network ou os iron-triangles.

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NOTAS

1 Vale lembrar que há notáveis exceções, como osparlamentos do Reino Unido e da Irlanda, onde nãohá registro de comissões permanentes com funçõeslegislativas. No Reino Unido, quando um deputadoapresenta um projeto de lei, institui-se uma comis-são ad hoc para o exame da proposta. O commit-tee, assim constituído, tem como objetivo emendare/ou refinar a proposta de lei, mas não modificá-laem seus fundamentos, uma vez que o debate é an-terior à entrada na comissão e se dá no plenário. NaIrlanda, ocorre o mesmo (ver De Vergottini, 1993).Essa prática é completamente distinta da norte-ame-ricana, em que as comissões são o centro do pro-cesso legislativo (Oleszek, 2001), e também da bra-sileira, em que as comissões têm amplos poderesde legislar, e a discussão das matérias legislativas éanterior ao debate em plenário (Lemos, 2002).

2 Os projetos de lei ordinária introduzidos na Câmarados Deputados passam das mil unidades por ano.

3 Não se trata aqui de retomar essa linha de análise.Basta lembrar que, para os Estados Unidos, as refe-rências obrigatórias são os trabalhos de Shepsle(1979; 1986a; 1986b). Para o caso italiano, os textosde Di Palma (1977), que analisam o período relati-vo à Primeira República, e de Capano e Giuliani(2001), para o contexto atual.

4 A outra vertente clássica dos estudos legislativos éa partidária, em que as comissões funcionariam basi-camente como cartéis do partido majoritário, ex-cluindo as minorias, e em que os membros coope-ram para atingir objetivos também partidários.Expoentes contemporâneos dessa vertente são Cox eMcCubbins (1993). Além dessas três linhas de análi-se, pode-se adicionar a teoria da rivalidade bicame-ral, de Diermeier e Myerson (1999), segundo a qualquanto mais pontos de veto na estrutura constitu-cional de governo, mais obstáculos uma câmara irácriar dentro de sua própria estrutura organizacional(Groseclose e King, 2001). De qualquer maneira,não trataremos neste estudo diretamente da primei-ra vertente, tampouco abordaremos a questão doarranjo institucional bicameral.

5 Há consenso na literatura em atribuir às comissõespermanentes norte-americanas e italianas amplos po-deres decisórios que, em ultima instância, são a com-ponente essencial para o sucesso das normas de cu-nho local. É preciso lembrar que a função legislativa

das comissões permanentes italianas foi dominantenas primeiras legislaturas, quando cerca de 70% dosprojetos de lei eram aprovados em comissão, sempassar pelo plenário (Di Palma, 1977). A partir dosmeados da década de 1970, houve uma diminuiçãoconsiderável desse percentual, que se manteve, noentanto, superior a 50% até 1992, para então declinarsucessivamente a taxas inferiores a 20% (Capano eGiuliani, 2001). Para a importância das comissõesnos Estados Unidos, ver Deering e Smith (1987).

6 Na literatura corrente, costuma-se distinguir entrepoderes negativos ou positivos (Krehbiel, 1988).São negativos quando à comissão não é permitidaou é dificultada qualquer mudança do status quo.São positivos quando, contrariamente, a comissãopode alterar o conteúdo das propostas segundosuas preferências.

7 Em particular, as comissões podem organizar ativi-dades como audiências públicas, simpósios, pai-néis, além de requisitar informações do Executivo eo auxílio de órgãos formais como o Tribunal deContas da União.

8 As evidências da falta de paroquialismo surgemtambém quando o foco analítico passa a ser o estu-do do processo orçamentário e, em particular, dasemendas dos deputados. No exame do orçamentoexecutado, Figueiredo e Limongi (2002) mostramque o local de aplicação privilegiado pelos deputa-dos não é o município onde, em tese, haveria inte-resse individual na distribuição de benefícios locais,mas o estado. Outros autores afirmam que apenasas emendas efetivamente executadas, e não asemendas individuais na Lei Orçamentária, são rele-vantes para confirmar a hipótese da reeleição (Pe-reira e Rennó, 2001).

9 Da mesma forma que nascem propostas com o ob-jetivo manifesto de mudar o status quo, é possível,em maior escala, encontrar projetos sem pretensãoalguma desse tipo e que respondem, apenas, a umdesejo de sinalização do deputado para seus eleito-res. Essas propostas aparecem geralmente na litera-tura como “propostas-bandeira”.

10 Foram excluídas todas as propostas retiradas peloproponente, os projetos apensados, os anexados eos prejudicados, salvo, nesses casos, a comissão játer concluído o exame do projeto.

11 É preciso reconhecer que a prática do desarquiva-mento não tem suscitado nenhum interesse entre os

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estudiosos. Investigações futuras deveriam aprofun-dar o fenômeno e entender a lógica do desarquiva-mento que, em termos percentuais, é significativa.

12 Dos 482 projetos despachados à CAPR, 28 tiveramsua origem no senado.

13 Esse índice é a divisão entre o número de propostase o número de deputados de um determinado par-tido. Considerando as elevadas taxas de migraçãopartidária, para o cálculo da bancada de cada parti-do foi necessário estabelecer uma média de parla-mentares entre os que estavam inscritos no dia daposse e aqueles do último dia da legislatura. Parauma aplicação do IAL e os problemas inerentes aoseu cálculo, ver o trabalho de Lemos (2001).

14 Entretanto, para sustentar a vertente dos autoresque procuram demonstrar a relação entre deputa-dos e eleitores, Amorin Neto e Santos afirmam queo paroquialismo dos deputados não passaria pelasnormas ordinárias, mas apenas pelas questões se-cundárias relativas à concessão de serviços de rádioe televisão.

15 A diferença entre políticas setoriais de cunho locale as de abrangência nacional é definida pela ampli-tude territorial do tipo de custo-benefício que a po-lítica acarreta. Para uma discussão sobre os tipos delei, ver Ricci (2002).

16 O PSDB distancia-se dos seus aliados e não trata detemas relativos a normas sobre importação/expor-tação e comercialização, preferindo a dos direitosgerais.

17 Pereira e Mueller (2000) apresentam um teste em-pírico da teoria informacional aplicado à Câmarados Deputados, incluindo o Executivo como atordominante.

18 A proporção partidária é definida constitucional eregimentalmente, de forma que não há como bus-car os preference outliers por partido político. En-tretanto, levando em conta a distribuição por esta-dos, a preferência torna-se patente: sete estadostêm mais de 50% da representação na comissão, noperíodo estudado. Minas Gerais teve 34 represen-tantes, seguido de 29 do Rio Grande do Sul, 24 doParaná, 18 da Bahia, 17 de Tocantins, 16 de Goiáse 15 de Santa Catarina. Todos, claramente, com for-tes interesses agrícolas.

19 Foram incluídas as seguintes profissões da área deagricultura: produtor rural, agropecuarista, pecuaris-

ta, médico-veterinário, extensionista rural, agricultor,engenheiro agrônomo, fazendeiro, técnico agrícola,empresário rural, lavrador, citricultor, trabalhador ru-ral, administrador rural e técnico de lacticínios.

20 Esse dado pode estar vinculado ao perfil dos com-ponentes de cada partido, suas agendas e históriapolítica, tema do qual não trataremos neste artigo.

21 É evidente que esse número seja o somatório demunicípios onde houve registro de voto para cadadeputado individual, e, assim, excede em muito onúmero real de municípios brasileiros. Assim, sãomais de 30 mil municípios-referência, porque levamem conta os históricos individuais.

22 Foi feita a análise multivariada para observar possí-veis alterações nos dados univariados. Entretanto, aintrodução da variável “reduto eleitoral” não ajustouos valores da variável “profissão” (? = 1,910; ORbru-ta = 6,752; IC = [2,643; 17,247]).

23 Nesse sentido, Santos et al. (2000) abordam a questãodo background (2003) desenvolveram um estudo dascarreiras focado no Senado brasileiro na década de1990, no qual demonstram uma ultra-especializaçãoda Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania(CCJ) em relação ao plenário, embora não demons-trem o mesmo em relação.

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128 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

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PRODUÇÃO LEGISLATIVA E PREFERÊNCIAS ELEITORAIS… 129

Apêndice (exemplos de tipos de projetos por áreas temáticas)

ÁREAS TEMÁTICAS EXEMPLOS DE PROJETOS DE LEI

Reforma agrária, assentamento PL 11/91 – Dispõe sobre a regulamentação de dispositivose identificação de áreas constitucionais relativos à reforma agrária.desertificadas PL 1968/91 – Institui o sistema nacional de cadastro de trabalhador

rural sem-terra.PL 111/95 – Identifica áreas desertificadas para exploração.

Políticas setoriais de cunho PL 4323/93 – Dispõe que planos de safra e pluriannuais considerarãonacional tipo de produto.

PL 44/95 – Dispõe sobre criação do programa de reestruturaçãoda agropecuária.PL 1905/96 – Dispõe sobre contratos de parceria agrícola, pecuária,agroindústria, extrativa.

Políticas setoriais de cunho local PL 2570/00 – Dispõe sobre regulamentação da atividade pesqueira noestuário da Lagoa dos Patos.PLS 132/97 – Cria distrito agropecuário no município de S. C. do Anauá (RR).PL 6058/02 – Cancelamento de dívidas de crédito rural para produtores nasafra de 2001/2002 nos municípios do sul do país que decretaram situaçãode emergência.

Crédito rural, fundos de apoio à PL 6000/01 – Dispõe sobre a concessão de subvenção econômica nasagricultura, indenizações e operações de crédito rural.benefícios fiscais PL 3031/01 – Institui o programa de seguro agrícola.

PL 3466/97 – Reduz débito aos mutuários crédito rural quando saldo devedorcontiver cobrança de valores indevidos.

Associativismo e cooperativismo PL 1630/96 – Altera lei que define política nacional de cooperativismo.PL 215/95 – Estabelece regras de contribuição à previdência dos associadosàs cooperativas de produção agropecuária.

Normas sobre PL 2768/91 – Dispõe sobre a política de preços mínimos paraimportação/exportação, produtos agrícolas.comercialização de produtos PLS 75/92 – Proíbe a exportação de madeira bruta.e estocagem PL 905/95 – Dispõe sobre processo de abate de animais destinados

ao consumo.

Ocupação do solo rural PL 2997/92 – Dispõe sobre cultivares de ciclo anual nas faixas de domínio que(habitação) e ordenamento margeiam as rodovias.do território PL 4479/94 – Institui normas para preservação e reconstituição do patrimônio

florestal brasileiro.

PL 2515/95 – Altera lei sobre imposto sobre propriedade territorial rural.Direitos gerais dos PL 523/99 – Caracteriza trabalhador rural e empresário ou empregador rural,trabalhadores rurais quando proprietário de imóvel não superior a quatro módulos rurais.

PL 2634/00 – Dispõe sobre atividade de curta duração em propriedades rurais.

Regulamentação de profissões e PL 5601/01 – Equipara pequeno agricultor familiar ao assentado debenefícios para categorias reforma agrária.profissionais PL 4495/98 – Dispõe sobre promoção e fiscalização da defesa sanitária animal

quando da realização de rodeios.PL 30/95 – Assegura a pescadores profissionais aposentados direitos decontinuar exercer profissão.

Outras áreas PL 96/95 – Dispõe sobre a veiculação no rádio e TV de informações queestimulem a formação de hortas domésticas.PL 2625/96 – Dispõe sobre o arquivo zootécnico nacional dosanimais domésticos de interesse econômico.PLS 73/99 – Dispõe sobre registro genealógico de cães.

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RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS

PRODUÇÃO LEGISLATIVA EPREFERÊNCIAS ELEITORAIS NACOMISSÃO DE AGRICULTURA EPOLÍTICA RURAL DA CÂMARADOS DEPUTADOS

Paolo Ricci e Leany Barreiro Lemos

Palavras-chaveProcesso legislativo; Comissão deagricultura; Conexão eleitoral;Congresso brasileiro.

Esse artigo estuda a função legislati-va da Comissão de Agricultura e Po-lítica Rural, assim como a nomeaçãodos membros desta comissão. Pri-meiramente, analisou-se o processolegislativo, com respeito ao tempode tramitação, tipos de parecer, par-tidos proponentes e conteúdo daspropostas. Observou-se que os pro-jetos são examinados pela comissão,mas há um número significativo depareceres negativos aprovados. Emseguida, verificou-se se os membrosda comissão têm reduto eleitoral emáreas rurais ou não. Os dados suge-rem que eles não provêm de muni-cípios rurais, e que a tese informa-cional explica melhor a lógica denomeação dos membros do que atese distributiva.

LEGISLATIVE OUTPUT ANDELECTORAL PREFERENCES ATTHE CHAMBER OF DEPUTIESCOMMITTEE FOR AGRICULTUREAND RURAL POLICY

Paolo Ricci and Leany Barreiro Lemos

Key wordsLegislative process; Agriculturalcommittee; Electoral connection;Brazilian Congress.

The purpose of this article is to in-vestigate the legislative performanceof the Agriculture Committee andthe logics behind its members` ap-pointments. In the first part it analy-ses the legislative process with re-gards to time, Committee reports,party initiative, and content of bills.Committees generally debate onbills, but it is significant the numberof rejection reports. In the secondpart it analyzed whether the com-mittee members are supported byvoters from rural areas or not. Thedata suggests that they do not comefrom agricultural towns and that theinformational theory explains the lo-gics of nomination better than thedistributional theory.

PRODUCTION LÉGISLATIVE ETPRÉFÉRENCES ÉLECTORALES ÀLA COMMISSION D’AGRICULTUREET DE POLITIQUE RURALE DELA CHAMBRE DES DÉPUTÉS

Paolo Ricci et Leany Barreiro Lemos

Mots-clésProcessus législatif; Commissiond’agriculture; Connexion électorale;Congrès brésilien.

Cet article étudie la fonction législati-ve de la Commission d’Agriculture etde Politique Rurale, ainsi que la no-mination des membres de cette com-mission. Nous avons, tout d’abord,analysé le processus législatif, en res-pectant le temps de renvoi aux com-missions, les genres d’avis, de quelspartis partent les propositions et leurcontenu. Nous avons, ainsi, observéque les projets sont examinés par lacommission, mais il existe un nombresignificatif d’avis contraires approu-vés. Ensuite, nous avons examiné siles membres de la commission ont unréduit électoral dans des zones rura-les ou pas. Les données suggèrentqu’ils ne sont pas issus de communesrurales et que la thèse information-nelle explique mieux la logique de lanomination des membres que la thè-se distributive.