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RESUMO A mitilicultura é a modalidade de maricultura mais difundida no Estado de São Paulo, principalmente na região do litoral norte, sendo praticada quase que na totalidade por comunidades tradicionais e famílias de pescadores. Um dos maiores entraves à expansão sustentável dessa atividade é a obtenção de mexilhões jovens (sementes) para suprir os cultivos. Até poucos anos atrás, a totalidade das sementes era proveniente da extração a partir dos estoques naturais. Mas a crescente demanda por sementes e, consequentemente, a drástica redução dos estoques, tornou necessária a realização de pesquisas com vistas a aumentar a captação das pós-larvas de mexilhões, que são abundantes na água do mar, em estruturas chamadas de “coletores de sementes”, onde as pós-larvas se fixam e crescem até atingirem o comprimento de dois a quatro centímetros, podendo então ser transplantadas ou semeadas nas redes de crescimento final. O presente trabalho mostra o desenvolvimento de técnicas de produção de sementes em coletores por uma comunidade de maricultores estabelecida na Praia da Cocanha, município de Caraguatatuba, litoral norte de São Paulo. Os resultados mostram que o uso dos coletores pode ser capaz de suprir em grande parte os cultivos locais com sementes, reduzindo bastante a extração da mesma a partir dos bancos naturais. A produção de sementes pelos próprios maricultores aumenta em muito a sustentabilidade ambiental dos cultivos e pode contribuir para a redução dos custos de produção da atividade. Palavras-chave: Perna perna, mitilicultura, coletores, ciclo reprodutivo, pós-larvas, sustentabilidade. PRODUÇÃO DE MEXILHÕES JOVENS (SEMENTES) POR MARICULTORES DA PRAIA DA COCANHA, CARAGUATATUBA (SP) 2 3 4 5 Helcio Luis de Almeida Marques , Isabella Cristina Antunes da Costa Bordon , José Luiz Alves , Aline Maria Zigiotto de Medeiros 1 Os autores agradecem ao Álvaro e aos produtores e pescadores da MAPEC. À bióloga Renata Dorat e à acadêmica de Biologia Paula Rosa do Prado, estagiárias voluntárias da MAPEC. 2 Eng. Agr., Doutor, Pesquisador Científico, APTA - Instituto de Pesca, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Aqüicultura, [email protected]; 3 Bióloga, Mestranda do Programa de Pós-graduação do Instituto de Pesca – APTA; 4 Acadêmico de Biologia, Centro Universitário Módulo, Caraguatatuba, SP e produtor, membro da Associação dos Maricultores e Pescadores da Praia da Cocanha, Caraguatatuba, SP; 5 Bióloga, Estagiária Voluntária da Associação dos Maricultores e Pescadores da Praia da Cocanha, Caraguatatuba, SP. Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Dezembro de 2008 www.apta.sp.gov.br 87 1

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Page 1: PRODUÇÃO DE MEXILHÕES JOVENS (SEMENTES) POR

RESUMO

A mitilicultura é a modalidade de maricultura mais difundida no Estado de São Paulo, principalmente na região do litoral norte, sendo praticada quase que na totalidade por comunidades tradicionais e famílias de pescadores. Um dos maiores entraves à expansão sustentável dessa atividade é a obtenção de mexilhões jovens (sementes) para suprir os cultivos. Até poucos anos atrás, a totalidade das sementes era proveniente da extração a partir dos estoques naturais. Mas a crescente demanda por sementes e, consequentemente, a drástica redução dos estoques, tornou necessária a realização de pesquisas com vistas a aumentar a captação das pós-larvas de mexilhões, que são abundantes na água do mar, em estruturas chamadas de “coletores de sementes”, onde as pós-larvas se fixam e crescem até atingirem o comprimento de dois a quatro centímetros, podendo então ser transplantadas ou semeadas nas redes de crescimento final. O presente trabalho mostra o desenvolvimento de técnicas de produção de sementes em coletores por uma comunidade de maricultores estabelecida na Praia da Cocanha, município de Caraguatatuba, litoral norte de São Paulo. Os resultados mostram que o uso dos coletores pode ser capaz de suprir em grande parte os cultivos locais com sementes, reduzindo bastante a extração da mesma a partir dos bancos naturais. A produção de sementes pelos próprios maricultores aumenta em muito a sustentabilidade ambiental dos cultivos e pode contribuir para a redução dos custos de produção da atividade.

Palavras-chave: Perna perna, mitilicultura, coletores, ciclo reprodutivo, pós-larvas, sustentabilidade.

PRODUÇÃO DE MEXILHÕES JOVENS (SEMENTES) POR MARICULTORES DA PRAIA DA COCANHA, CARAGUATATUBA (SP)

2 3 4 5Helcio Luis de Almeida Marques , Isabella Cristina Antunes da Costa Bordon , José Luiz Alves , Aline Maria Zigiotto de Medeiros

1Os autores agradecem ao Álvaro e aos produtores e pescadores da MAPEC. À bióloga Renata Dorat e à acadêmica de Biologia Paula Rosa do Prado, estagiárias voluntárias da MAPEC. 2Eng. Agr., Doutor, Pesquisador Científico, APTA - Instituto de Pesca, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Aqüicultura, [email protected];3Bióloga, Mestranda do Programa de Pós-graduação do Instituto de Pesca – APTA;4Acadêmico de Biologia, Centro Universitário Módulo, Caraguatatuba, SP e produtor, membro da Associação dos Maricultores e Pescadores da Praia da Cocanha, Caraguatatuba, SP;5Bióloga, Estagiária Voluntária da Associação dos Maricultores e Pescadores da Praia da Cocanha, Caraguatatuba, SP.

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INTRODUÇÃO

A criação de mexilhões ou mitilicultura é realizada de forma industrial em diversos países europeus e asiáticos desde o século XIX. Todavia é uma atividade muito recente no Brasil, sendo praticada de forma comercial desde os anos 80. Os mexilhões são moluscos bivalves marinhos que vivem aderidos a substratos consolidados, tendo nos costões rochosos seu habitat principal. A espécie Perna perna cultivada no Brasil é a que apresenta crescimento mais rápido entre os mexilhões cultivados em todo o mundo. Esse fato, aliado ao seu sabor agradável e à sua rusticidade, estimulou a expansão do cultivo principalmente no Estado de Santa Catarina, que produziu em 2005 12.234 toneladas, correspondente a 96% da produção brasileira que é de 12.775 toneladas (SEAP, 2008).

No Estado de São Paulo, a mitilicultura é praticada de forma semiartesanal, principalmente na região do litoral norte, por famílias de pescadores e comunidades tradicionais. A expansão da atividade na região deu-se principalmente no final da década de 90, sendo que em 2001 existiam 44 fazendas em produção (Fagundes et al., 2004), número que permanece mais ou menos o mesmo até hoje. No entanto, fatores de ordem legal têm provocado a estagnação da atividade, já que a ausência de regulamentação das leis que regem a aquicultura em águas públicas causa uma morosidade grande na tramitação dos processos de regularização dos cultivos e, consequentemente, do acesso dos produtores a benefícios como crédito bancário, seguro e proteção legal contra roubos e depredações, fazendo com que muitos desistam da atividade. Se por um lado esses fatores prejudicam a expansão dos cultivos, por outro permitem que os mesmos sejam conduzidos de forma harmoniosa com as demais atividades econômicas da região, principalmente a pesca e o turismo, impactando de forma pouco significativa o ambiente onde se desenvolvem, devido ao seu pequeno porte.

Além dos aspectos legais, as dificuldades técnicas também têm prejudicado a expansão da mitilicultura, sendo a maior delas a obtenção de mexilhões jovens ou sementes cultivadas por sete a nove meses até atingirem o comprimento comercial (cinco a oito centimetros). Até poucos anos atrás a totalidade das sementes utilizadas nos cultivos era proveniente da extração a partir dos bancos naturais da espécie, localizados em costões rochosos, mas a crescente demanda por sementes ocasionou uma forte redução dos estoques naturais, tornando necessária a criação de instrumentos legais para regulamentar a

extração. Essa legislação, todavia, tem se mostrado insuficiente para permitir a recuperação dos estoques, colocando em risco a continuidade da mitilicultura.

Na tentativa de contribuir para amenizar essa situação, o Instituto de Pesca iniciou, em 2003, um projeto de pesquisa destinado a viabilizar a produção de sementes de mexilhões a partir da captação das larvas que ocorrem na água do mar em estruturas denominadas “coletores artificiais de sementes”. As larvas dos mexilhões são abundantes no ambiente marinho, sendo originadas da união dos gametas masculinos e femininos que são liberados na água do mar pelos animais adultos. As larvas vivem livremente na água até a sua metamorfose, quando então se transformam em pós-larvas e se fixam em substratos consolidados. Apenas uma porcentagem muito pequena dessas pós-larvas sobrevive por meio da fixação; as demais, se não encontrarem um substrato adequado, acabam morrendo. Assim, os coletores artificiais nada mais são do que substratos favoráveis à fixação das pós-larvas, os quais são lançados ao mar com o objetivo de aumentar a porcentagem de sobrevivência das mesmas, permitindo o crescimento das pós-larvas até atingirem o comprimento de dois a quatro centímetros, quando então passam a ser chamadas de “sementes”. Estas são então semeadas, ou transplantadas para redes tubulares, onde permanecerão até atingir o comprimento comercial.

Em maio de 2007, o Instituto de Pesca estabeleceu uma parceria com a MAPEC -Associação dos Pescadores e Maricultores da Praia da Cocanha, Caraguatatuba (SP), sendo que atualmente está sendo firmado um termo de cooperação entre as duas instituições para a realização de pesquisas no local. A mitilicultura na Praia da Cocanha teve início em 1989, por meio de um projeto de capacitação para essa atividade, desenvolvido pela Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo, com assessoria do próprio Instituto de Pesca. A MAPEC foi fundada em 2000, contando hoje com cerca de 40 associados entre pescadores e maricultores, todos membros da comunidade local. Atualmente, a Praia da Cocanha é o maior polo produtor de mexilhões do Estado de São Paulo, com cerca de 30 toneladas/ano (MAPEC, comunicação pessoal), mas essa produção varia muito de ano para ano, pois são poucos os produtores que se dedicam à mitilicultura de forma continuada. A grande maioria intercala períodos produtivos com períodos de paralisação de suas atividades.

Dessa forma, o presente trabalho tem o objetivo de apresentar os primeiros resultados das ações realizadas pelo Instituto de Pesca junto à MAPEC, no sentido de difundir e estimular o uso de coletores de sementes pelos produtores da Associação.

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DISCUSSÃO

a) Localização

Os trabalhos estão sendo desenvolvidos na Praia da Cocanha, mais precisamente em duas áreas de cultivo situadas na Ilha da Cocanha e Ilhote da Cocanha, no litoral norte do município de Caraguatatuba, SP (Figuras 1 e 2), utilizando-se para tal a estrutura existente na MAPEC em termos de instalações físicas e de embarcações (Figura 3) e também os espinhéis dos produtores, que são as estruturas flutuantes em que são suspensas as redes de cultivo e os coletores de sementes (Figuras 4 e 5).

Figura 1. Litoral do município de Caraguatatuba: Praia da Cocanha Fonte: Imagem LANDSAT, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Escala: 1: 50.000

Figura 2. Região da Praia da Cocanha: fazenda onde estão sendo desenvolvidos os trabalhos, próxima à Ilha da Cocanha Fonte: Image, 2008 Digital Globe. Escala: 1:10.000.

Figura 3. Sede da MAPEC na Praia da Cocanha, Caraguatatuba, SP Foto: Isabella Bordon.

Figura 4. Aspecto de um dos espinhéis onde são cultivados mexilhões na Ilha da Cocanha Foto: Arquivo de José Luiz Alves.

Figura 5. Mexilhões produzidos na Cocanha, prontos para a comercialização. Foto: Arquivo de José Luiz Alves.

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b) Monitoramento local do ciclo reprodutivo dos mexilhões

Nos primeiros contatos com os maricultores, constatou-se que o maior problema era a falta de sementes para suprir os cultivos e a inconstância da captação de sementes nos coletores por eles elaborados. Sendo assim, optou-se por iniciar os trabalhos pela realização de pesquisas sobre a captação de sementes no local e, ao mesmo tempo, repassar gradativamente à comunidade os resultados obtidos, no intento de estimular os produtores a adotar os procedimentos necessários para incrementar a produção de sementes.

Quinzenalmente os produtores coletam 30 mexilhões adultos (maiores que cinco centímetros de comprimento), que são limpos de todas as incrustações das conchas, abertos e separados de acordo com o sexo e o estádio de desenvolvimento das gônadas. A separação nesses estádios seguiu a classificação de Lunetta (1969) para mexilhões maduros sexualmente, quais sejam:

Estádio III-A Mexilhões com as gônadas espessas, totalmente preenchidas com gametas, com a cor característica de cada sexo (branco leitoso para os machos e vermelho-tijolo para as fêmeas) (Figura 6).

Estádio III-B Mexilhões com as gônadas totalmente vazias, sendo impossível identificar o sexo dos animais.

Estádio III-C Mexilhões com as gônadas em desenvolvimento, ainda parcialmente vazias, mas sendo possível identificar o sexo dos animais (Figura 6).

Pesca (Oliveira et al., 2003; Novais et al., 2005) e modificados de acordo com sugestões dos próprios membros da comunidade em função da grande experiência que os mesmos possuem.

Um dos modelos consiste em descartes das redes utilizadas no cultivo de mexilhões, que após alguns anos de uso não servem mais para esse fim. Essas redes são então trançadas, formando cordas com três a quatro centímetros de diâmetro e de comprimento variável. São posicionadas horizontalmente na superfície do mar, amarradas pelas duas extremidades aos cabos de dois espinhéis. Outro modelo testado são cordas de polietileno de dois centímetros de diâmetro na qual se prendem, a cada 15 cm, pedaços da mesma corda desfiados, formando um chumaço de filamentos. Esses coletores reúnem as características favoráveis à captação das pós-larvas logo após a metamorfose, que preferem substratos filamentosos para a primeira fixação (Bayne, 1964) e também características favoráveis à manutenção das pós-larvas fixadas até atingirem o tamanho de sementes, que é a presença de rugosidades que favorecem a aderência dos filamentos produzidos pelos mexilhões para sua fixação, chamados de “bisso” (Figura 7).

Figura 6. Mexilhões abertos para visualização do estádio de desenvolvimento das gônadas. Foto: Isabella Bordon.

c) Definição de modelos de coletores mais favoráveis à captação de sementes

Estão sendo testados alguns modelos de coletores de sementes com base em resultados de pesquisas anteriores desenvolvidas pelo Instituto de

Figura 7 Modelos de coletores de sementes utilizados no presente trabalho. Foto: Isabella Bordon.

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O s c o l e t o r e s s ã o l a n ç a d o s à á g u a quinzenalmente. Nas épocas em que ocorrem as maiores liberações de gametas pelos mexilhões adultos, ou seja, nos meses de agosto a dezembro, os lançamentos são semanais. Cerca de cinco meses após o lançamento, se a captação foi eficiente, é possível obter cerca de um quilo de sementes (mexilhões de 2 a 4 cm) por metro linear de coletor lançado (Figuras 8 e 9).

Os dados ainda estão sendo coletados, mas verifica-se uma tendência dos coletores captarem mais sementes quando são lançados próximo ao período de ocorrência de picos reprodutivos, o que sugere a eficiência do método de monitoramento local do ciclo de reprodução como ferramenta auxiliar para otimizar a produção de sementes.

Figura 11. Redes de cultivo já semeadas, prontas para serem levadas de volta ao mar. Foto: Arquivo de José Luiz Alves.

Figura 10. Sementes retiradas dos coletores, prontas para serem semeadas. Foto: Arquivo de José Luiz Alves

Figura 8. Aspecto de um coletor com boa captação de sementes. Foto: Arquivo de Helcio L.A. Marques

Figura 9. Posicionamento horizontal do coletor, em relação à superfície da água. Foto: Arquivo de Helcio L A Marques

d) Coleta de dados das principais variáveis da água do mar

T o d o s o s e x p e r i m e n t o s e s t ã o s e n d o acompanhados do monitoramento em campo das principais variáveis da água do mar, quais sejam: temperatura, salinidade e transparência. No laboratório são determinados a produtividade primária (estimada pelo teor de clorofila a) e o teor de matéria orgânica particulada. Esses dados são úteis para conhecer a dinâmica da qualidade da água local, principalmente em termos de alimentação para os mexilhões, já que estes se alimentam de fitoplâncton e da matéria orgânica em suspensão na água do mar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O número de mexilhões pertencentes ao Estádio III-B em cada amostragem está sendo plotado em gráficos visando a determinar períodos em que ocorre a liberação dos gametas de forma mais intensa, ou seja, os picos reprodutivos do mexilhão (Figura 7).

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Figura 12. Número de mexilhões pertencentes ao Estádio III-B em cada amostragem, configurando os picos reprodutivos de mexilhão com as respectivas datas de ocorrência.

Pesquisas anteriores mostraram que os mexilhões no Brasil se reproduzem ao longo de todo o ano, mas com picos reprodutivos ocorrendo principalmente na primavera, verão e outono (Marques et al., 1991). Todavia, essa informação sempre foi repassada aos produtores de forma generalista, sem considerar o fato de que a época de ocorrência dos picos pode variar de ano para ano e de local para local. O monitoramento local do ciclo reprodutivo vem corrigir esse erro de informação, pois assim os produtores podem conhecer com precisão os períodos em que ocorrem os picos reprodutivos dos mexilhões nos seus cultivos. Essa precisão é importante, pois tem sido verificado que, para apresentarem maior eficiência de captação, os coletores devem ser lançados na água aproximadamente na mesma época em que ocorre a liberação dos gametas (Ferreira & Magalhães, 2004).

Esse monitoramento mostrou ser um método muito simples para determinar o momento propício para o lançamento dos coletores. Com pouco tempo de treinamento verificou-se que os produtores aprenderam a distinguir os diferentes estádios de desenvolvimento das gônadas e a elaborar os gráficos que mostram os picos reprodutivos dos mexilhões.

Os resultados alcançados até o momento mostram que ações simples, como o monitoramento local do ciclo reprodutivo, podem ser incorporadas ao dia-a-dia dos produtores e realizadas rotineiramente por eles desde que sejam treinados para tal. A realização de pesquisas científicas na comunidade produtora tem se mostrado uma forma bastante eficiente de repassar informações e difundir técnicas, já que os produtores acompanham o dia-a-dia das pesquisas e os resultados que surgem, diferentemente do que acontece quando os mesmos resultados são apresentados na forma de uma palestra ou dia de campo. O fato de os produtores participarem da execução das pesquisas é altamente estimulante e aumenta a confiança dos mesmos nas técnicas que se desejam incorporar à rotina da comunidade.

Por outro lado, para a pesquisa científica os resultados da parceria também são estimulantes. Além da oportunidade de obter dados científicos, os pesquisadores, principalmente os mais jovens, como os alunos de pós-graduação, têm a oportunidade de conviver com o cotidiano da atividade produtiva, conhecer de perto a realidade da maricultura e compartilhar com os produtores os problemas e os desafios do dia-a-dia, adquirindo uma experiência que certamente será muito útil para a vida profissional.

No caso específico da MAPEC, já nos primeiros meses da parceria foi constatada uma ótima receptividade dos produtores aos métodos e ações propostas. Isso resultou em um incremento significativo no uso de coletores de sementes pelos produtores em relação aos anos anteriores. Nos anos de 2005 e 2006, a captação de sementes em coletores era esporádica e realizada apenas por uma minoria dos produtores, não chegando a 30% do total necessário para suprir a demanda, sendo os restantes 70% extraídos de bancos naturais das proximidades. Na safra de 2007 - 2008, essa situação se inverteu: os coletores captaram cerca de 70% das sementes utilizadas pelos produtores em seus cultivos, havendo casos em que chegaram a produzir 100% das sementes necessárias.

Ao final do primeiro ano de monitoramento do ciclo reprodutivo, pretende-se elaborar uma cartilha que possa orientar outros produtores a detectar os picos reprodutivos dos mexilhões em cultivo nas suas comunidades e a confeccionar seus coletores de sementes.

A produção de sementes de mexilhões pelos

próprios produtores é uma prática que aumenta em

muito a sustentabilidade da mitilicultura. Além de não

agredir os bancos naturais, torna possível a

continuidade indefinida dos cultivos que, de outra

forma, estariam sujeitos à disponibilidade dos estoques

naturais existentes. Do ponto de vista econômico, o uso

de coletores torna-se bastante favorável, uma vez que

reduz os custos com transporte das sementes, a perda

de parte das mesmas por mortalidade devido ao

estresse da extração, além de propiciar sementes mais

saudáveis e com maior potencial de crescimento,

conferindo maior rentabilidade aos empreendimentos.

REFERÊNCIAS

BAYNE, B.L. 1964. Primary and secondary settlement in Mytilus edulis L. (Mollusca). Journal of Animal Ecology 33: 513-523

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FAGUNDES, L.; GELLI, V.C.; OTANI, M.N.; VICENTE, M.C.M.; FREDO, C.E. 2004. Perfil sócio-econômico dos mitilicultores do litoral paulista. Informações Econômicas 34, n.5: 47-59.

FERREIRA, J.F.; MAGALHÃES, A.R.M. 2004. Cultivo de mexilhões. In: POLI, CR (org). Aquicultura: experiências brasi le iras . Editora Multitarefa, Florianópolis. Cap. 7, p. 82-89.

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NOVAIS, A.B.G.; RODRIGUES, V.C.S.; GELLI, V.C.; ROMA, R.P.C.R.; MARQUES, H.L.A. 2005. Captação de sementes de mexilhões Perna perna (LINNAEUS, 1758) em um novo modelo de coletor artificial. In: ENCONTRO BRASILEIRO DE MALACOLOGIA, 19. Anais ... Rio de Janeiro: SBM. p. 401.

OLIVEIRA, E.M.; MARQUES, H.L.A.; GELLI, V.C.; LOMBARDI, J.V.; RODRIGUES, V.C.R.; CONTIN, E.R. 2003. Eficiência da captação de sementes por diferentes modelos de coletores artificiais em Ubatuba (SP). In: ENCONTRO BRASILEIRO DE MALACOLOGIA, 18. Anais ... Rio de Janeiro: SBM. p. 279.

SEAP - Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca 2008. Estatística da Aquicultura e Pesca no Brasil Ano 2005. D i s p o n í v e l e m http://200.198.202.145/seap/Dados_estatisticos/boletim2005a(tabela).pdf. Acessado em 27 de junho de 2007

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