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Proacute-Reitoria de Graduaccedilatildeo Curso de Psicologia
Trabalho de Conclusatildeo de Curso
MODELO PENAL EM FOCO ARTICULACcedilAtildeO DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO COMPORTAMENTO COMO POSSIBILIDADE DE UMA NOVA POLIacuteTICA CRIMINAL
Orientador MscFlaacutevia Bascunnatilden Timm Co-orientador Drordf Alessandra Rocha Albuquerque
Brasiacutelia 2012
Proacute-Reitoria de Graduaccedilatildeo Curso de Psicologia
Trabalho de Conclusatildeo de Curso
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA
CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO COMPORTAMENTO
Autor Laianny Bueno dos Santos Orientador Msc Flaacutevia Bascunntildeam Timm
Co-orietadora Drordf Alessandra Rocha Albuquerque
Brasiacutelia - DF
2011
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
Artigo apresentado ao curso de graduaccedilatildeo em
Psicologia da Universidade Catoacutelica de
Brasiacutelia como requisito parcial para obtenccedilatildeo
do Tiacutetulo de Psicoacutelogo
Orientador Msc Flaacutevia Bascunnatilden Timm
Co-orientador Drordf Alessandra Rocha
Albuquerque
Brasiacutelia
2012
Trabalho de conclusatildeo de curso de autoria de Laianny Bueno dos Santos intitulado
Fracasso do modelo punitivo e coercitivo aplicado ao sistema penal contribuiccedilotildees da
criminologia criacutetica e da anaacutelise do comportamento apresentado como requisito parcial
para conclusatildeo da graduaccedilatildeo em Psicologia defendida e aprovada em 19062012 pela banca
examinadora assinada por
_______________________________________
Professora Msc Flaacutevia Bascuntildean Timm
Orientadora
Curso de Psicologia - UCB
___________________________________
Professora Dra Alessandra Albuquerque
Co-orientadora
Curso de Psicologia ndash UCB
___________________________________
Professor Msc Andreacute Luis de Almeida Martins
Examinador
Curso de Psicologia - UCB
Brasiacutelia
2012
Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que
enquanto esteve ao meu lado neste mundo me
passou ensinamentos que carregarei para toda
a vida e foi um exemplo para eu me tornar a
pessoa que sou hoje
e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com
amor e dedicaccedilatildeo compreender o
comportamento humano em todas as suas
minuacutecias e nos mais variados contextos que a
vida estabelece
AGRADECIMENTOS
Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco
Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e
findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou
indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida
Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas
A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a
trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-
orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao
professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca
examinadora
A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio
dispensados em todos os momentos em que eu precisei
As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e
dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a
pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida
As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo
incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes
A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido
de uma verdadeira amizade
As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram
o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio
Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso
por todos os momentos que passamos durantes esses anos
Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho
mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria
Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot
hoje fieacuteis amigos
Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a
dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho
ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo
mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se
melhorarmos nossa compreensatildeo do
comportamento humanordquo (Skinner)
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
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condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
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O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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LAIANNY BUENO DOS SANTOS
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
Artigo apresentado ao curso de graduaccedilatildeo em
Psicologia da Universidade Catoacutelica de
Brasiacutelia como requisito parcial para obtenccedilatildeo
do Tiacutetulo de Psicoacutelogo
Orientador Msc Flaacutevia Bascunnatilden Timm
Co-orientador Drordf Alessandra Rocha
Albuquerque
Brasiacutelia
2012
Trabalho de conclusatildeo de curso de autoria de Laianny Bueno dos Santos intitulado
Fracasso do modelo punitivo e coercitivo aplicado ao sistema penal contribuiccedilotildees da
criminologia criacutetica e da anaacutelise do comportamento apresentado como requisito parcial
para conclusatildeo da graduaccedilatildeo em Psicologia defendida e aprovada em 19062012 pela banca
examinadora assinada por
_______________________________________
Professora Msc Flaacutevia Bascuntildean Timm
Orientadora
Curso de Psicologia - UCB
___________________________________
Professora Dra Alessandra Albuquerque
Co-orientadora
Curso de Psicologia ndash UCB
___________________________________
Professor Msc Andreacute Luis de Almeida Martins
Examinador
Curso de Psicologia - UCB
Brasiacutelia
2012
Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que
enquanto esteve ao meu lado neste mundo me
passou ensinamentos que carregarei para toda
a vida e foi um exemplo para eu me tornar a
pessoa que sou hoje
e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com
amor e dedicaccedilatildeo compreender o
comportamento humano em todas as suas
minuacutecias e nos mais variados contextos que a
vida estabelece
AGRADECIMENTOS
Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco
Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e
findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou
indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida
Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas
A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a
trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-
orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao
professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca
examinadora
A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio
dispensados em todos os momentos em que eu precisei
As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e
dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a
pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida
As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo
incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes
A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido
de uma verdadeira amizade
As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram
o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio
Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso
por todos os momentos que passamos durantes esses anos
Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho
mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria
Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot
hoje fieacuteis amigos
Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a
dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho
ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo
mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se
melhorarmos nossa compreensatildeo do
comportamento humanordquo (Skinner)
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
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metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
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A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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Trabalho de conclusatildeo de curso de autoria de Laianny Bueno dos Santos intitulado
Fracasso do modelo punitivo e coercitivo aplicado ao sistema penal contribuiccedilotildees da
criminologia criacutetica e da anaacutelise do comportamento apresentado como requisito parcial
para conclusatildeo da graduaccedilatildeo em Psicologia defendida e aprovada em 19062012 pela banca
examinadora assinada por
_______________________________________
Professora Msc Flaacutevia Bascuntildean Timm
Orientadora
Curso de Psicologia - UCB
___________________________________
Professora Dra Alessandra Albuquerque
Co-orientadora
Curso de Psicologia ndash UCB
___________________________________
Professor Msc Andreacute Luis de Almeida Martins
Examinador
Curso de Psicologia - UCB
Brasiacutelia
2012
Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que
enquanto esteve ao meu lado neste mundo me
passou ensinamentos que carregarei para toda
a vida e foi um exemplo para eu me tornar a
pessoa que sou hoje
e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com
amor e dedicaccedilatildeo compreender o
comportamento humano em todas as suas
minuacutecias e nos mais variados contextos que a
vida estabelece
AGRADECIMENTOS
Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco
Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e
findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou
indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida
Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas
A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a
trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-
orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao
professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca
examinadora
A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio
dispensados em todos os momentos em que eu precisei
As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e
dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a
pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida
As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo
incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes
A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido
de uma verdadeira amizade
As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram
o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio
Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso
por todos os momentos que passamos durantes esses anos
Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho
mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria
Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot
hoje fieacuteis amigos
Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a
dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho
ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo
mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se
melhorarmos nossa compreensatildeo do
comportamento humanordquo (Skinner)
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que
enquanto esteve ao meu lado neste mundo me
passou ensinamentos que carregarei para toda
a vida e foi um exemplo para eu me tornar a
pessoa que sou hoje
e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com
amor e dedicaccedilatildeo compreender o
comportamento humano em todas as suas
minuacutecias e nos mais variados contextos que a
vida estabelece
AGRADECIMENTOS
Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco
Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e
findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou
indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida
Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas
A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a
trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-
orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao
professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca
examinadora
A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio
dispensados em todos os momentos em que eu precisei
As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e
dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a
pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida
As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo
incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes
A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido
de uma verdadeira amizade
As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram
o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio
Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso
por todos os momentos que passamos durantes esses anos
Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho
mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria
Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot
hoje fieacuteis amigos
Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a
dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho
ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo
mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se
melhorarmos nossa compreensatildeo do
comportamento humanordquo (Skinner)
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
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foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
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abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
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A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
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consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
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condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
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O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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AGRADECIMENTOS
Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco
Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e
findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou
indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida
Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas
A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a
trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-
orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao
professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca
examinadora
A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio
dispensados em todos os momentos em que eu precisei
As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e
dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a
pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida
As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo
incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes
A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido
de uma verdadeira amizade
As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram
o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio
Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso
por todos os momentos que passamos durantes esses anos
Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho
mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria
Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot
hoje fieacuteis amigos
Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a
dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho
ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo
mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se
melhorarmos nossa compreensatildeo do
comportamento humanordquo (Skinner)
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-79722011000100022gt
Acesso em 10 fev 2012
XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um
debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008
Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-
49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012
ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo
mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se
melhorarmos nossa compreensatildeo do
comportamento humanordquo (Skinner)
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
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O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 8
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10
21 Escola claacutessica do direito penal 11
22 Escola Positivista 11
23 Criminologia criacutetica 12
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32
8
FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um
debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008
Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-
49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012
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FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA
PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO
COMPORTAMENTO
LAIANNY BUENO DOS SANTOS
Resumo
O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo
punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo
acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do
direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa
bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da
Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as
puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida
privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do
modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir
dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas
concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de
seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de
recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A
articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente
e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das
contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento
Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia
1 INTRODUCcedilAtildeO
Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas
abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda
agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei
a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me
mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da
criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da
Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via
satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais
Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de
sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-
probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do
behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs
niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo
para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que
o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner
entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o
ambiente e retroagem sobre o mesmo
A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os
seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de
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foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
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abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
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A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
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consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
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condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
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O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
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nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
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behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
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vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
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Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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9
foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando
desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do
modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no
plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica
privilegiado
Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de
causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo
etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em
oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o
sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do
crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e
GOMES 2010)
O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um
crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema
Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros
elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo
social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela
psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo
e adestrador de corpos tem sido eficaz
Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico
na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo
atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a
coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se
apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se
ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de
levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da
manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do
comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as
contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia
sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente
Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e
efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas
econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A
criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo
validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a
construccedilatildeo de um novo saber
O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o
auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os
princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por
uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de
metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a
partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do
que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela
sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as
puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da
agressividade
Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a
1 Departamento Penitenciaacuterio
10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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10
abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como
histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se
referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma
apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e
Sidman
2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA
O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades
Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens
quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute
nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e
subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)
Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute
seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo
natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase
encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais
consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave
viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das
XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo
Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob
penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela
aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos
de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)
Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior
desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a
figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo
antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de
aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA
2002)
Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da
burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o
liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural
conhecido como iluminismo
Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o
pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se
contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal
das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)
Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado
ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo
Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou
menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo
de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia
poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs
(BARATTA 2002 p33)
11
A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
12
consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-79722011000100022gt
Acesso em 10 fev 2012
XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um
debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008
Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-
49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012
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A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma
teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este
escritor
aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que
fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da
legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem
de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente
entre outros (CAPELA 2002 p 6)
Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia
criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as
transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica
21 Escola claacutessica do direito penal
Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri
Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias
iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)
Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal
racionalista e humanista do iluminismo
Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o
proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal
Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo
natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e
da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era
diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal
(BARATTA 2002 p 31)
O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado
como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato
delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que
pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a
gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo
do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo
essencial nem o criteacuterio para sua medida
22 Escola Positivista
Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso
cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)
aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia
cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e
iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na
Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso
Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)
Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o
criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso
Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas
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consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
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condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
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O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
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nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
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behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
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vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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PRUDEcircNCIO Maria Regina Andrade Leis e metacontingecircncias anaacutelise do controle do
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consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se
necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e
coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como
ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p
275)
Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota
um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade
e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista
(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a
causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)
Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um
indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e
obrigaccedilotildees
Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou
bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o
indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de
periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em
ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na
totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era
conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da
qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)
Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar
mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para
isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute
nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma
reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias
e dos limitesrdquo (p26)
Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde
os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo
Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como
uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de
uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem
social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil
23 Criminologia criacutetica
Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o
paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do
labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a
criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal
Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling
approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica
(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle
social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que
tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as
2 Teoria do Etiquetamento Social
13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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13
condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status
de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos
sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e
institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)
Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia
criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que
a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca
como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa
experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua
construccedilatildeo
Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em
uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da
esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling
approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo
simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram
acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso
correto do mesmo enfoque
A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling
approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse
positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)
Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo
aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga
como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a
favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001
p32)
A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por
sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se
presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do
paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova
perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais
que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os
mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo
criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo
Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e
elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica
das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais
tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que
partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma
anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal
na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma
e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma
bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA
2002 p 197)
Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo
pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema
punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade
14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
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O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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14
Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do
Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema
para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia
Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as
teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio
Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute
discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a
medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do
ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos
agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior
problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade
A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e
desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado
pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e
higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades
laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o
confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como
nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o
questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a
criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma
sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida
para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo
que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento
desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e
inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a
seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da
mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal
Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o
patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena
depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho
formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo
de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente
contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os
teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos
interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o
modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo
funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia
Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical
uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade
O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo
mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias
sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo
3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL
15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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15
O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal
entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos
primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica
O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P
Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo
Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta
ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel
cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta
proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo
metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma
postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica
Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3
expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com
raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no
estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida
por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo
Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do
comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo
fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais
eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o
comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um
estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como
pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo
nosso p 8)
Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se
reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que
o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento
Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido
pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma
suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus
estudos sobre a criminalidade
O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das
interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em
entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se
observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de
adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de
comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos
O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do
comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais
amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)
Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud
Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a
aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria
chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do
Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo
seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e
3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos
16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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16
nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical
eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do
Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo
ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma
topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado
interaccedilatildeo
A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-
se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a
articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn
(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave
Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do
comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos
que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S
Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de
anaacutelise de praacuteticas culturais
Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos
processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e
cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das
espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a
histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute
compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem
e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)
Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento
individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto
da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute
insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como
mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o
ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)
Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo
que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento
continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos
sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo
comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao
ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos
antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo
31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo
O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate
na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo
radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os
descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas
tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se
alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull
Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores
tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner
outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de
Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos
17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
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O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
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O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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17
behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez
que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos
O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para
identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na
psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser
usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais
teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de
perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de
problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus
objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)
Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo
skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos
(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o
ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na
modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute
mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo
ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo
de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos
adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita
as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando
que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da
interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela
comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto
Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito
em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a
combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a
lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p
146)
O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as
condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o
comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo
relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno
isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o
comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o
indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu
ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio
comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as
interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios
mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas
histoacuterica
Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo
que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema
prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo
poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos
adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como
ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no
ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De
fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que
vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma
18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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18
vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o
crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais
O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que
natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual
Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem
resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o
comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de
controle social
32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical
Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos
com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma
breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual
O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada
por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de
seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por
pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo
(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia
comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo
humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira
versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901
A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com
clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos
ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a
pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia
ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do
comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na
probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo
do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)
O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de
mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como
afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do
comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do
selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o
advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel
da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner
quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos
de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)
Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o
organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais
(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees
(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a
resposta e que eacute este por ele produzido
No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees
invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior
grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se
mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees
19
comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos
reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo
e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um
contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)
Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)
afirmam que este modelo
supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres
vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados
considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo
sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste
caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das
mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em
relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)
Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a
cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute
responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como
tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo
estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na
suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e
por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as
contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na
espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura
Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute
responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e
seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que
vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo
mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de
forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os
trecircs niacuteveis conjuntamente
Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do
Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por
suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos
selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que
aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a
comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na
cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de
anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute
selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir
corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse
comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural
Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado
Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma
praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute
afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com
um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos
inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem
sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do
comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a
puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva
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Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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20
Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em
situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute
articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a
sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente
sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento
de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era
uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo
produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram
importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo
tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal
de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a
evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia
maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse
conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a
uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste
trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a
puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social
uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados
Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo
qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo
mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma
praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as
expectativas de controle social e aos interesses de quem controla
O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas
culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos
selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com
Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela
anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o
grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud
Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o
comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o
seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo
esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras
continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma
sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura
e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo
da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais
transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a
medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico
encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes
Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem
satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os
reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo
reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores
sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas
de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que
incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras
e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente
reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar
como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem
21
como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo
Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto
e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila
estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao
enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos
adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia
nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas
violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar
praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja
comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e
replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias
A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento
do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo
puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura
capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a
delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault
(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees
para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir
comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia
Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no
acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo
castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento
essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de
comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos
de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute
transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo
tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo
estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo
modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e
coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento
da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos
proacuteximos capiacutetulos
Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de
Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como
certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-
afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo
racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e
filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa
transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das
funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se
que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia
na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de
um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais
Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees
necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee
uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes
desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar
uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na
concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um
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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
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O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
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O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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22
evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de
outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel
ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente
natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte
de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)
O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do
comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem
exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um
comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por
exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para
que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de
poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como
outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem
e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo
33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical
O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a
investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a
proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou
melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta
anos antesrdquo (p189)
Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada
que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do
comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo
skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e
estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)
De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo
e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e
uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o
comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e
ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no
proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner
podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e
centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim
sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se
estabelece no mundo
A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes
desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo
Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma
busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos
relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder
como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de
controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do
apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas
aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a
desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica
23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
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Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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23
O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o
conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De
acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)
uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio
ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a
ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as
consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as
bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)
Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros
e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -
(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa
ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de
comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode
ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto
psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo
acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano
com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos
dos apenados
Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz
modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas
consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e
outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer
Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um
comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da
adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo
Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente
aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente
denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo
da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente
desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta
consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir
comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos
evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do
comportamento a medida que sua pena eacute reduzida
O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel
designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma
distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a
probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um
estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode
diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a
probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador
do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a
probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)
As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute
que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a
puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e
Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou
seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo
(p64)
24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
25
penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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24
O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a
probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir
comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais
imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de
efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais
eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido
emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os
efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo
controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre
seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o
contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os
controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute
mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os
controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que
os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas
entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o
tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho
de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que
agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou
a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de
contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados
durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e
frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor
Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais
humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O
contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em
um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)
O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo
os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo
punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute
sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a
ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes
4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN
A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave
criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade
correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um
aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o
indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)
Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova
perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo
desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees
criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo
apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento
Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os
seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias
fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua
recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em
sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na
submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e
interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras
riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas
meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos
saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder
justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)
No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de
detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como
aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987
p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute
submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade
verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder
disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que
leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e
reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos
como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)
De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas
para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos
o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o
modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o
modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina
o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute
preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento
disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o
penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)
Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria
torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o
sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que
vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou
verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a
teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem
seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)
Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista
como natural
Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de
condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um
cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal
ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos
reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)
Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o
conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas
quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo
fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos
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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
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41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
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Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
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metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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26
outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o
termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem
Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito
de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada
um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e
completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida
de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e
manipulaccedilatildeo de variaacutereis
Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental
adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua
principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu
poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se
configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre
os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)
O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo
vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente
Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar
fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um
panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais
deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali
passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o
que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos
Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo
importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta
questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal
coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao
sistema e brutalidade para os que o operam
Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa
boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem
ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel
por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir
mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)
Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para
incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo
(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e
completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para
ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)
Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila
puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de
reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam
Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para
49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-
se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o
sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade
Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua
utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito
submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo
modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda
maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera
27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
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27
Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da
utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de
conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de
sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar
correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio
que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que
reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do
comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao
ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)
Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um
projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento
positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por
leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades
mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos
cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da
prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades
dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial
do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento
dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se
engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas
altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo
poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam
juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja
Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola
como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os
creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na
verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados
apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam
no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)
Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas
habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis
a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais
de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de
trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os
estudantes que em breve estariam completando suas penas a
habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se
bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se
evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus
creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia
que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)
Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos
reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos
deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei
Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o
controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias
muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado
possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu
28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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sociais esboccedilando uma proposta para a identificaccedilatildeo de contingecircncias entrelaccediladas e
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28
41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural
A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do
Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade
como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica
e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro
Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de
contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do
Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua
vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum
Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que
foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma
consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de
anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento
operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta
interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado
eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta
seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e
empurrar inserir e virar uma chave etc
A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees
funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua
proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum
de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia
Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de
reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios
comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da
poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios
operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os
trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los
e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais
carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os
funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de
produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia
de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais
parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)
O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para
Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o
surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de
natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de
metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia
eacute
() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em
todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais
variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es
especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que
podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das
praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute
o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O
nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de
sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e
seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo
(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
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PRUDEcircNCIO Maria Regina Andrade Leis e metacontingecircncias anaacutelise do controle do
Estatuto da Crianccedila e do Adolescente sobre praacuteticas juriacutedicas em processos de infraccedilatildeo de
adolescentes do Distrito Federal 2006 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) - Curso de Psicologia
Universidade de Brasiacutelia Brasiacutelia 2006
SIDMAN Murray Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees Satildeo Paulo Editorial Psi 1995
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1998
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Comportamental e Cognitiva Satildeo Paulo v IX n 1 p129-137 2007 Disponiacutevel em
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SKINNER B F Sobre o behaviorismo Satildeo Paulo Cultrix 1995
TEIXEIRA Rafaella Ribeiro Carandiru Anaacutelise da coerccedilatildeo no sistema prisional 2008
134 f Monografia (Bacharel) - Curso de Psicologia Faculdade de Ciecircncias Humanas e
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nalpdfgt Acesso em 09 jun 2012
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Sociedade Um Novo Foco de Estudo Psicologia Reflexatildeo e Criacutetica Brasiacutelia v 17 n 1
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TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de Ontem e de Hoje Psicologia Reflexatildeo
e Criacutetica Porto Alegre v 24 n 1 p186-194 2011 Disponiacutevel em
lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-79722011000100022gt
Acesso em 10 fev 2012
XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um
debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008
Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-
49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012
29
Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o
entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007
p186)
Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees
de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes
(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)
Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias
comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural
e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees
metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema
receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e
assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias
comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais
entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos
seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e
TODOROV 2007 p 187)
O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para
Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento
individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar
ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)
Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O
produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor
seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute
somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador
(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente
externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que
cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de
reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo
coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas
que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos
desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do
sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo
sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo
relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O
produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em
questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o
entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e
coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da
sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)
O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo
fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o
ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem
consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo
Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e
para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986
Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da
30
metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do
Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
orgacircnicas da sauacutede
Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que
diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro
5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre
periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade
da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor
forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa
novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
32
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ANDERY M A P A MICHELETTO N SEacuteRIO T M A P A anaacutelise de fenocircmenos
sociais esboccedilando uma proposta para a identificaccedilatildeo de contingecircncias entrelaccediladas e
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CRUZ R N CILLO E N P Do Mecanicismo ao Selecionismo Uma Breve
Contextualizaccedilatildeo da Transiccedilatildeo do Behaviorismo Radical Psicologia Teoria e Pesquisa
Brasiacutelia vol 24 n 3 p 375-385 2008 Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrpdfptpv24n3v24n3a15pdf gt Acesso em 16 mar 2012
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Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis
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diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de
macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de
metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas
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Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas
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da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade
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novamente um crime
Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo
cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e
Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo
penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-
estar da sociedade
Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como
suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo
(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem
imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade
aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam
implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o
indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida
A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a
apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -
teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises
sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento
infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e
predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se
deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo
considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como
alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido
com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido
agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos
Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo
que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo
mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social
que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute
Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo
transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo
31
A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
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A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no
acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um
conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido
de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente
Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees
comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados
ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais
atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos
culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social
Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia
no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma
sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande
engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou
seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por
fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema
de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes
contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo
favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas
Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of
critical criminology and analysis of behavior
Abstract
The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model
adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in
academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and
practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this
paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the
failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a
sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the
phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human
behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was
anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the
model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the
concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of
these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the
possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of
Behavior Analysis
Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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