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Pró-Reitoria de Graduação Curso de Psicologia Trabalho de Conclusão de Curso MODELO PENAL EM FOCO: ARTICULAÇÃO DA CRIMINOLOGIA CRÍTICA E DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO COMO POSSIBILIDADE DE UMA NOVA POLÍTICA CRIMINAL Orientador: Msc.Flávia Bascunnãn Timm Co-orientador: Drª. Alessandra Rocha Albuquerque Brasília 2012 Pró-Reitoria de Graduação Curso de Psicologia Trabalho de Conclusão de Curso FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA PENAL: CONTRIBUIÇÕES DA CRIMINOLOGIA CRÍTICA E DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO Autor: Laianny Bueno dos Santos Orientador: Msc. Flávia Bascunñam Timm Co-orietadora: Drª. Alessandra Rocha Albuquerque Brasília - DF 2011

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Proacute-Reitoria de Graduaccedilatildeo Curso de Psicologia

Trabalho de Conclusatildeo de Curso

MODELO PENAL EM FOCO ARTICULACcedilAtildeO DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO COMPORTAMENTO COMO POSSIBILIDADE DE UMA NOVA POLIacuteTICA CRIMINAL

Orientador MscFlaacutevia Bascunnatilden Timm Co-orientador Drordf Alessandra Rocha Albuquerque

Brasiacutelia 2012

Proacute-Reitoria de Graduaccedilatildeo Curso de Psicologia

Trabalho de Conclusatildeo de Curso

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA

CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO COMPORTAMENTO

Autor Laianny Bueno dos Santos Orientador Msc Flaacutevia Bascunntildeam Timm

Co-orietadora Drordf Alessandra Rocha Albuquerque

Brasiacutelia - DF

2011

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

Artigo apresentado ao curso de graduaccedilatildeo em

Psicologia da Universidade Catoacutelica de

Brasiacutelia como requisito parcial para obtenccedilatildeo

do Tiacutetulo de Psicoacutelogo

Orientador Msc Flaacutevia Bascunnatilden Timm

Co-orientador Drordf Alessandra Rocha

Albuquerque

Brasiacutelia

2012

Trabalho de conclusatildeo de curso de autoria de Laianny Bueno dos Santos intitulado

Fracasso do modelo punitivo e coercitivo aplicado ao sistema penal contribuiccedilotildees da

criminologia criacutetica e da anaacutelise do comportamento apresentado como requisito parcial

para conclusatildeo da graduaccedilatildeo em Psicologia defendida e aprovada em 19062012 pela banca

examinadora assinada por

_______________________________________

Professora Msc Flaacutevia Bascuntildean Timm

Orientadora

Curso de Psicologia - UCB

___________________________________

Professora Dra Alessandra Albuquerque

Co-orientadora

Curso de Psicologia ndash UCB

___________________________________

Professor Msc Andreacute Luis de Almeida Martins

Examinador

Curso de Psicologia - UCB

Brasiacutelia

2012

Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que

enquanto esteve ao meu lado neste mundo me

passou ensinamentos que carregarei para toda

a vida e foi um exemplo para eu me tornar a

pessoa que sou hoje

e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com

amor e dedicaccedilatildeo compreender o

comportamento humano em todas as suas

minuacutecias e nos mais variados contextos que a

vida estabelece

AGRADECIMENTOS

Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco

Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e

findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou

indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida

Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas

A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a

trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-

orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao

professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca

examinadora

A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio

dispensados em todos os momentos em que eu precisei

As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e

dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a

pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida

As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo

incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes

A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido

de uma verdadeira amizade

As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram

o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio

Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso

por todos os momentos que passamos durantes esses anos

Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho

mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria

Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot

hoje fieacuteis amigos

Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a

dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho

ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo

mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se

melhorarmos nossa compreensatildeo do

comportamento humanordquo (Skinner)

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

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LAIANNY BUENO DOS SANTOS

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

Artigo apresentado ao curso de graduaccedilatildeo em

Psicologia da Universidade Catoacutelica de

Brasiacutelia como requisito parcial para obtenccedilatildeo

do Tiacutetulo de Psicoacutelogo

Orientador Msc Flaacutevia Bascunnatilden Timm

Co-orientador Drordf Alessandra Rocha

Albuquerque

Brasiacutelia

2012

Trabalho de conclusatildeo de curso de autoria de Laianny Bueno dos Santos intitulado

Fracasso do modelo punitivo e coercitivo aplicado ao sistema penal contribuiccedilotildees da

criminologia criacutetica e da anaacutelise do comportamento apresentado como requisito parcial

para conclusatildeo da graduaccedilatildeo em Psicologia defendida e aprovada em 19062012 pela banca

examinadora assinada por

_______________________________________

Professora Msc Flaacutevia Bascuntildean Timm

Orientadora

Curso de Psicologia - UCB

___________________________________

Professora Dra Alessandra Albuquerque

Co-orientadora

Curso de Psicologia ndash UCB

___________________________________

Professor Msc Andreacute Luis de Almeida Martins

Examinador

Curso de Psicologia - UCB

Brasiacutelia

2012

Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que

enquanto esteve ao meu lado neste mundo me

passou ensinamentos que carregarei para toda

a vida e foi um exemplo para eu me tornar a

pessoa que sou hoje

e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com

amor e dedicaccedilatildeo compreender o

comportamento humano em todas as suas

minuacutecias e nos mais variados contextos que a

vida estabelece

AGRADECIMENTOS

Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco

Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e

findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou

indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida

Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas

A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a

trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-

orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao

professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca

examinadora

A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio

dispensados em todos os momentos em que eu precisei

As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e

dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a

pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida

As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo

incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes

A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido

de uma verdadeira amizade

As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram

o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio

Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso

por todos os momentos que passamos durantes esses anos

Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho

mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria

Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot

hoje fieacuteis amigos

Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a

dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho

ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo

mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se

melhorarmos nossa compreensatildeo do

comportamento humanordquo (Skinner)

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

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metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

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Trabalho de conclusatildeo de curso de autoria de Laianny Bueno dos Santos intitulado

Fracasso do modelo punitivo e coercitivo aplicado ao sistema penal contribuiccedilotildees da

criminologia criacutetica e da anaacutelise do comportamento apresentado como requisito parcial

para conclusatildeo da graduaccedilatildeo em Psicologia defendida e aprovada em 19062012 pela banca

examinadora assinada por

_______________________________________

Professora Msc Flaacutevia Bascuntildean Timm

Orientadora

Curso de Psicologia - UCB

___________________________________

Professora Dra Alessandra Albuquerque

Co-orientadora

Curso de Psicologia ndash UCB

___________________________________

Professor Msc Andreacute Luis de Almeida Martins

Examinador

Curso de Psicologia - UCB

Brasiacutelia

2012

Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que

enquanto esteve ao meu lado neste mundo me

passou ensinamentos que carregarei para toda

a vida e foi um exemplo para eu me tornar a

pessoa que sou hoje

e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com

amor e dedicaccedilatildeo compreender o

comportamento humano em todas as suas

minuacutecias e nos mais variados contextos que a

vida estabelece

AGRADECIMENTOS

Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco

Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e

findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou

indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida

Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas

A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a

trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-

orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao

professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca

examinadora

A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio

dispensados em todos os momentos em que eu precisei

As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e

dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a

pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida

As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo

incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes

A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido

de uma verdadeira amizade

As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram

o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio

Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso

por todos os momentos que passamos durantes esses anos

Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho

mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria

Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot

hoje fieacuteis amigos

Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a

dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho

ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo

mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se

melhorarmos nossa compreensatildeo do

comportamento humanordquo (Skinner)

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

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O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

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O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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Dedico agrave minha matildee Elis Norminia que

enquanto esteve ao meu lado neste mundo me

passou ensinamentos que carregarei para toda

a vida e foi um exemplo para eu me tornar a

pessoa que sou hoje

e tambeacutem agravequeles que se propotildeem com

amor e dedicaccedilatildeo compreender o

comportamento humano em todas as suas

minuacutecias e nos mais variados contextos que a

vida estabelece

AGRADECIMENTOS

Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco

Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e

findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou

indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida

Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas

A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a

trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-

orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao

professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca

examinadora

A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio

dispensados em todos os momentos em que eu precisei

As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e

dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a

pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida

As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo

incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes

A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido

de uma verdadeira amizade

As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram

o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio

Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso

por todos os momentos que passamos durantes esses anos

Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho

mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria

Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot

hoje fieacuteis amigos

Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a

dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho

ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo

mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se

melhorarmos nossa compreensatildeo do

comportamento humanordquo (Skinner)

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

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AGRADECIMENTOS

Durante os uacuteltimos anos de minha vida me dediquei agrave Psicologia com muito afinco

Quando olho para traacutes relembro todo o percurso acadecircmico que se iniciou no Tocantins e

findou-se aqui em Brasiacutelia Essa trajetoacuteria foi marcada por pessoas que direta ou

indiretamente contribuiacuteram para mais esta conquista em minha vida

Primeiramente agradeccedilo ao Pai Supremo essa forccedila maior que rege nossas vidas

A minha orientadora Msc Flaacutevia Timm por aceitar esse desafio e ter me auxiliado a

trilhar esse caminho com cobranccedilas exigecircncias e confianccedila em meu potencial A minha co-

orientadora Drordf Alessandra Albuquerque pelo apoio paciecircncia e disponibilidade Ao

professor Msc Andreacute Luiacutes por ter aceitado o convite de participar de minha banca

examinadora

A minha famiacutelia minha base de sustentaccedilatildeo e forccedila de vida pelo amor e apoio

dispensados em todos os momentos em que eu precisei

As minhas matildees Elis Regina Diacutedima Divina e Domingas Bueno por todo o amor e

dedicaccedilatildeo para comigo por terem sido peccedilas fundamentais para que eu tenha me tornado a

pessoa que hoje eu sou Devo-lhes minha vida

As irmatildes de coraccedilatildeo Lidyane Anaacutedilla Poliana e Marina pelo companheirismo zelo

incentivo e por tornarem os meus dias mais felizes

A amiga de infacircncia Emanuela Catatildeo pelo apoio carinho e por me mostrar o sentido

de uma verdadeira amizade

As amigas especiais Mayara Resende Acircngela Costa e Mayra Almeida que iniciaram

o curso comigo no Tocantins e ainda me acompanham com muito carinho e apoio

Aos amigos que me acolheram quando vim para Brasiacutelia e que eu fiz durante o curso

por todos os momentos que passamos durantes esses anos

Agraves amizades de Juliana Fernandes e Tatiane Dias pessoas com quem compartilho

mais que a vida acadecircmica e que se tornaram parte de minha histoacuteria

Aos colegas aspirantes agrave analistas do comportamento Glecircnio Moreira e Ivan Grebot

hoje fieacuteis amigos

Meus agradecimentos sinceros pela compreensatildeo e carinho nos momentos em que a

dedicaccedilatildeo aos estudos foi exclusiva e por contribuiacuterem para a realizaccedilatildeo deste trabalho

ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo

mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se

melhorarmos nossa compreensatildeo do

comportamento humanordquo (Skinner)

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de Ontem e de Hoje Psicologia Reflexatildeo

e Criacutetica Porto Alegre v 24 n 1 p186-194 2011 Disponiacutevel em

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Acesso em 10 fev 2012

XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um

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Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-

49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012

ldquoOs maiores problemas enfrentados hoje pelo

mundo soacute poderatildeo ser resolvidos se

melhorarmos nossa compreensatildeo do

comportamento humanordquo (Skinner)

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 8

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA 10

21 Escola claacutessica do direito penal 11

22 Escola Positivista 11

23 Criminologia criacutetica 12

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL 14

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo 16

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical 18

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical 22

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN 24

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural 28

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 30

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 32

8

FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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e Criacutetica Porto Alegre v 24 n 1 p186-194 2011 Disponiacutevel em

lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-79722011000100022gt

Acesso em 10 fev 2012

XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um

debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008

Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-

49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012

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FRACASSO DO MODELO PUNITIVO E COERCITIVO APLICADO AO SISTEMA

PENAL CONTRIBUICcedilOtildeES DA CRIMINOLOGIA CRIacuteTICA E DA ANAacuteLISE DO

COMPORTAMENTO

LAIANNY BUENO DOS SANTOS

Resumo

O elevado iacutendice de encarceramento no Brasil evidencia a urgecircncia de se repensar o modelo

punitivo adotado pelo sistema penal Eacute uma questatildeo social que jaacute estaacute em debate no ciacuterculo

acadecircmico e preocupa natildeo apenas antropoacutelogos socioacutelogos e estudantes e profissionais do

direito mas tambeacutem a psicologia Utilizando-se do meacutetodo qualitativo de pesquisa

bibliograacutefica o presente trabalho pretende debater com auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e da

Anaacutelise do Comportamento o fracasso do modelo punitivo no sistema penal uma vez que as

puniccedilotildees acabam produzindo uma sobrepena para agravequelesas que estatildeo cumprindo medida

privativa de liberdade A Criminologia Criacutetica estuda o fenocircmeno da criminalidade a partir do

modelo da puniccedilatildeo e a Anaacutelise do Comportamento estuda o comportamento humano a partir

dos processos de interaccedilatildeo e seleccedilatildeo O desenvolvimento desse trabalho ancorou-se nas

concepccedilotildees criacuteticas de Foucault aos meios punitivos e coercitivos adotados pelo modelo de

seguranccedila puacuteblica e de Sidman que tambeacutem compartilha dessa criacutetica agrave coerccedilatildeo aleacutem de

recorrer ao conceito de metacontingecircncia como unidade de anaacutelise em acircmbito social A

articulaccedilatildeo destas perspectivas insere no cenaacuterio penal uma criacutetica ao modelo punitivo vigente

e levanta a possibilidade de uma proposta de uma anaacutelise criacutetica deste modelo a partir das

contribuiccedilotildees da Anaacutelise do Comportamento

Palavras-chave Criminologia criacutetica Anaacutelise do comportamento Metacontingecircncia

1 INTRODUCcedilAtildeO

Ao ter contato com o behaviorismo radical e com o estudo da criminologia em suas

abordagens teoacutericas durante pesquisas acadecircmicas conheci a visatildeo critica-negativa atribuiacuteda

agrave Anaacutelise do Comportamento pelos criminoacutelogos criacuteticos ao mesmo tempo em que visualizei

a possibilidade do encontro destes dois saberes Logo surgiram indagaccedilotildees que me

mobilizaram para esta pesquisa haacute possibilidade de articulaccedilatildeo entre os estudos da

criminologia criacutetica e a teoria do comportamento proposta por Skinner Existem autores da

Anaacutelise do Comportamento que estudam o sistema penal O modelo punitivo eacute uma via

satisfatoacuteria para adequar o comportamento do apenado agraves exigecircncias sociais

Skinner propotildee uma versatildeo do behaviorismo ndash behaviorismo radical ndash que apesar de

sofrer influecircncias do positivismo evolucionismo bioloacutegico determinismo materialiacutestico-

probabiliacutestico ndash natildeo em sua forma linear como propotildee a versatildeo de Watson outro expoente do

behaviorismo o metodoloacutegico- amplia enfatizando que processos seletivos se datildeo em trecircs

niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e cultural Baseia-se nos pressupostos do interacionismo

para sugerir uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista ou seja adota uma visatildeo de que

o comportamento soacute tem sentido inserido num contexto A partir deste conceito Skinner

entende que o comportamento que opera no meio produz consequecircncias que alteram o

ambiente e retroagem sobre o mesmo

A criminalidade eacute uma questatildeo social que atravessa a histoacuteria das relaccedilotildees entre os

seres humanos seus estudos sofreram transformaccedilotildees em suas concepccedilotildees e definiccedilotildees de

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foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

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abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

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A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

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consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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9

foco de estudo A ineficiecircncia da legitimidade do crime e da criminalidade denunciando

desse modo o fracasso dos objetivos ideoloacutegicos de repressatildeo deu passagem agrave ruptura do

modelo tradicional da criminologia e ascensatildeo da criminologia criacutetica poreacutem somente no

plano acadecircmico criacutetico pois a repressatildeo continua sendo o modelo de seguranccedila puacuteblica

privilegiado

Na criminologia tradicional a criminalidade eacute estudada pelo meacutetodo positivista de

causas bioloacutegicas psicoloacutegicas e ambientais e a investigaccedilatildeo eacute efetuada com base no meacutetodo

etioloacutegico de determinaccedilotildees causais A criminologia criacutetica por sua vez se desenvolve em

oposiccedilatildeo ao modelo tradicional lanccedilando olhar para o processo da criminalizaccedilatildeo e para o

sistema de justiccedila criminal utilizando-se do meacutetodo interacionista de construccedilatildeo social do

crime e da criminalidade refuta o determinismo social e o evolucionismo (MOLINA e

GOMES 2010)

O iacutendice de encarceramento no Brasil chega a cerca de 514 mil pessoas com um

crescimento estimado de 471 desde 1990 segundo uacuteltimos dados do InfoPen (Sistema

Integrado de Informaccedilotildees Penitenciaacuterias) - banco informativo do DEPEN1 Estes nuacutemeros

elevados evidenciam a urgecircncia de se repensar o modelo penal e de refletir sobre a construccedilatildeo

social poliacutetica e econocircmica desse sujeito nomeado e identificado como criminoso pela

psiquiatria O modelo prisional instaurado no paiacutes baseado num poder disciplinar coercitivo

e adestrador de corpos tem sido eficaz

Foucault (1987) critica os meios punitivos e coercitivos adotados pelo poder puacuteblico

na repressatildeo da delinquumlecircncia e Sidman (1995) compartilha dessa criacutetica ao uso da coerccedilatildeo

atentando-se agraves consequumlecircncias que a mesma pode gerar sobre um indiviacuteduo e considerando a

coerccedilatildeo como possiacutevel fonte de agressatildeo e retaliaccedilatildeo A ciecircncia criminoloacutegica criacutetica se

apropria da interdisciplinaridade uma vez que satildeo muitas as disciplinas cientiacuteficas que se

ocupam do crime acumulando deste modo saberes especializados sobre o delito aleacutem de

levar em consideraccedilatildeo as variaacuteveis poliacuteticas econocircmicas e histoacutericas que atuam em funccedilatildeo da

manutenccedilatildeo do poder e se intersectam com a expressatildeo desse fenocircmeno A ciecircncia do

comportamento tem uma concepccedilatildeo de comportamento interacionista considerando que as

contingecircncias do meio ndash econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash podem exercer influecircncia

sobre o sujeito tal qual o comportamento do sujeito exerce sobre o ambiente

Percebe-se assim que o homem natildeo estaacute inserido em uma relaccedilatildeo linear de causa e

efeito mas sim num contexto que dispotildee de variaacuteveis ndash culturais sociais histoacutericas

econocircmicas poliacuteticas - que atuam diretamente na interaccedilatildeo indiviacuteduo-ambiente A

criminologia considera estas variaacuteveis e a anaacutelise do comportamento propotildee esta interaccedilatildeo

validando a atuaccedilatildeo do contexto logo o diaacutelogo eacute possiacutevel tanto quanto necessaacuterio para a

construccedilatildeo de um novo saber

O objetivo geral deste trabalho eacute debater sobre o fracasso do modelo penal com o

auxiacutelio da Criminologia Criacutetica e Anaacutelise do Comportamento e para isso seraacute apresentado os

princiacutepios baacutesicos das formulaccedilotildees de Skinner as concepccedilotildees criacuteticas de Foucault e por

uacuteltimo de Sidman sobre o modelo coercitivo Ainda seraacute feita uma exposiccedilatildeo do conceito de

metacontingecircncia com intuito de apontar para possiacuteveis anaacutelises do modelo punitivo penal a

partir da Anaacutelise do Comportamento A interseccedilatildeo com a Criminologia Criacutetica natildeo mais eacute do

que um ponto de apoio para explicar o quanto as penas as puniccedilotildees tatildeo aclamadas pela

sociedade natildeo eacute a melhor via para a pretendida Reintegraccedilatildeo Social do preso uma vez que as

puniccedilotildees utilizadas no sistema penal como evidencia Sidman corroboram para o aumento da

agressividade

Para a realizaccedilatildeo deste estudo utilizou-se de levantamento de dados atraveacutes da

pesquisa bibliograacutefica recorrendo-se dessa forma agrave bibliografia jaacute publicada Empregou-se a

1 Departamento Penitenciaacuterio

10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

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O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

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nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

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behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

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vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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10

abordagem qualitativa priorizando as caracteriacutesticas do trabalho que se apresenta como

histoacuterico exploratoacuterio e de anaacutelise teoacuterica Este trabalho eacute composto por trecircs capiacutetulos que se

referem a breves percursos histoacutericos da criminologia do behaviorismo radical e uma

apreciaccedilatildeo da prisatildeo e coerccedilatildeo como modelo de seguranccedila puacuteblica sob a oacutetica de Foucault e

Sidman

2 BREVE PERCURSO HISTOacuteRICO DA CRIMINOLOGIA

O homem desde os primoacuterdios da humanidade organiza-se em grupos ou sociedades

Nesta interaccedilatildeo social o homem em busca de sua conservaccedilatildeo e de proteccedilatildeo de seus bens

quando se via lesado respondia aos atos que o feriam com uma defesa como reaccedilatildeo agrave accedilatildeo Eacute

nesse ambiente que se constata o periacuteodo das vinganccedilas que se prolonga ateacute o seacuteculo XVIII e

subdivide-se em vinganccedila privada vinganccedila divina e vinganccedila puacuteblica (CAPELA 2002)

Na fase da vinganccedila privada quando cometido o crime a viacutetima e muitas vezes ateacute

seus parentes e grupos sociais reagia agrave ofensa A vinganccedila privada constituiacutea uma reaccedilatildeo

natural e instintiva e constitui-se uma das formas de puniccedilatildeo adotada pelos povos Esta fase

encontrou duas regulamentaccedilotildees o taliatildeo e a composiccedilatildeo (DUARTE 1999) as quais

consistiam em aplicar no ofensor na mesma proporccedilatildeo o mesmo mal que ele causou agrave

viacutetima Adotou-se o Coacutedigo de Hamurabi (Babilocircnia) a Biacuteblia Sagrada (Ecircxodos) e a Lei das

XII Taacutebuas (Roma) ordenaccedilotildees que seguiram o instituto do taliatildeo

Na fase da vinganccedila divina os princiacutepios teocraacuteticos eacute que delineavam as condutas sob

penas de castigo Nesta fase a viacutetimas satildeo as divindades e os agentes responsaacuteveis pela

aplicaccedilatildeo da puniccedilatildeo que por sua vez eram crueacuteis e severas satildeo os sacerdotes Os preceitos

de cunho religioso ou moral tornavam-se leis em vigor (CAPELA 2002 DUARTE 1999)

Jaacute na fase da vinganccedila puacuteblica com uma sociedade mais organizada e maior

desenvolvimento poliacutetico aprimoram-se as regras de justiccedila penal Neste contexto surge a

figura da autoridade puacuteblica (rei priacutencipe regente) que assume o lugar de agente de puniccedilatildeo

antes ocupado pelo sacerdote e impotildee as sanccedilotildees Eis que o Estado toma para si a tarefa de

aplicaccedilatildeo das penas antes cumprida por terceiros e com vistas agrave intimidaccedilatildeo (CAPELA

2002)

Seguindo para os seacuteculos XVII e XVIII assinalados pela crescente importacircncia da

burguesia classe social que fomentou o desenvolvimento do capitalismo emerge-se o

liberalismo burguecircs um sistema de ideacuteias que ganhou forma no movimento cultural

conhecido como iluminismo

Os pensadores iluministas em seus escritos ldquofundamentaram uma nova ideologia o

pensamento moderno que repercutiria ateacute mesmo na aplicaccedilatildeo da justiccedila agrave arbitrariedade se

contrapocircs a razatildeo agrave determinaccedilatildeo caprichosa dos delitos e das penas se pocircs a fixaccedilatildeo legal

das condutas delitivas e das penas (DUARTE 1999)

Imbuiacutedo dos pensamentos iluministas Cesare Beccaria publicou em 1764 o tratado

ldquoDei Delitti e Delle Penerdquo

Este tratado eacute como haacute muito a criacutetica amplamente demonstrou

menos a obra original de uma genial personalidade do que a expressatildeo

de todo um movimento de pensamento em que conflui toda filosofia

poliacutetica do iluminismo europeu e especialmente o francecircs

(BARATTA 2002 p33)

11

A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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23 ago 2011

TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de Ontem e de Hoje Psicologia Reflexatildeo

e Criacutetica Porto Alegre v 24 n 1 p186-194 2011 Disponiacutevel em

lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-79722011000100022gt

Acesso em 10 fev 2012

XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um

debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008

Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-

49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012

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A publicaccedilatildeo desta obra implicou na formulaccedilatildeo pragmaacutetica de pressupostos de uma

teoria juriacutedica do delito e da pena e representou uma evoluccedilatildeo do regime punitivo Este

escritor

aleacutem de propugnar pelo fim da pena de morte defendia ideacuteias que

fundamentam o que chamamos hoje em dia de princiacutepios da

legalidade da presunccedilatildeo da inocecircncia que o propoacutesito da pena aleacutem

de intimidar o cidadatildeo seria tambeacutem o de recuperar o delinquumlente

entre outros (CAPELA 2002 p 6)

Para Capela (2002) eacute a partir deste momento que o ser humano toma consciecircncia

criacutetica do problema penal como problema filosoacutefico e juriacutedico que eacute Inicia-se desse modo as

transformaccedilotildees ditadas pela Escola Claacutessica

21 Escola claacutessica do direito penal

Os pensadores desta escola dos quais cita-se Beccaria Romagnosi Filangieri

Pagano Rossi Carmignani Carrara Pessina Bentham Feuerbach adotaram as ideologias

iluministas jaacute expostas no periacuteodo anterior o das vinganccedilas ofensivas (CAPELA 2002)

Para Molina e Gomes (2010) a criminologia claacutessica assumiu um legado liberal

racionalista e humanista do iluminismo

Eacute na escola claacutessica que surge a primeira organizaccedilatildeo do conceito de culpado o

proacuteprio indiviacuteduo visto como sujeito livre para escolher entre o bem e o mal

Como comportamento o delito surgia da livre vontade do indiviacuteduo

natildeo de causas patoloacutegicas e por isso do ponto de vista da liberdade e

da responsabilidade moral pelas proacuteprias accedilotildees o delinquumlente natildeo era

diferente segundo a Escola Claacutessica do indiviacuteduo normal

(BARATTA 2002 p 31)

O crime foco de estudo desta escola eacute concebido como um ldquofato individual isolado

como mera infraccedilatildeo agrave leirdquo (MOLINA e GOMES 2010 p 166) Atribui-se a origem do ato

delitivo a uma decisatildeo ldquolivrerdquo do seu autor incompatiacutevel com outros fatorescausas que

pudessem implicar em seu comportamento A pena era determinada proporcionalmente com a

gravidade do delito e sua funccedilatildeo era essencialmente de defesa social a emenda a reeducaccedilatildeo

do condenado pode ser um resultado acessoacuterio e desejaacutevel da pena mas natildeo sua funccedilatildeo

essencial nem o criteacuterio para sua medida

22 Escola Positivista

Agrave luz do enfraquecimento do poder da Igreja e do Rei fortalecimento do discurso

cientiacutefico e em contraposiccedilatildeo agrave Escola Claacutessica surge a Escola Positivista Baratta (2002)

aponta a criminologia positivista como a primeira fase de desenvolvimento da criminologia

cuja referecircncia apoacuteia-se nas teorias desenvolvidas na Europa entre o final do seacuteculo XIX e

iniacutecio do seacuteculo XX Escola Socioloacutegica Francesa (Gabriel Tarde) Escola Social na

Alemanha (Franz von Liszt) e especialmente agrave Escola Positiva na Itaacutelia (Cesare Lombroso

Enrico Ferri Raffaele Garoacutefalo)

Nesta escola desloca-se o foco do crime adotado pelos pensadores claacutessicos para o

criminoso ou seja o foco passa a ser o indiviacuteduo que comete o crime a figura do criminoso

Essa inversatildeo de objeto de anaacutelise decorre do fato de que os pensadores positivistas

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consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

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condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

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O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

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nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

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behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

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vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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12

consideravam que o delinquumlente revelava uma personalidade perigosa e assim fazia-se

necessaacuterio o uso de uma defesa social ldquoproteger a sociedade do mal produzido por ele e

coibir novos delitos latentesrdquo (XAVIER 2008 p 275) e para isso justificavam a pena como

ldquomeio de defesa social e com fins socialmente uacuteteisrdquo (PAULA 2007 apud XAVIER 2008 p

275)

Como jaacute afirma Baratta (2002) o modelo positivista dessa etapa da criminologia adota

um paradigma etioloacutegico e o correcionalismo isto eacute estuda as causasfatores da criminalidade

e segue uma intervenccedilatildeo corretiva sobre o sujeito criminoso respectivamente Para Batista

(2009) ldquoo paradigma etioloacutegico iraacute concluir atraveacutes da legitimaccedilatildeo do discurso meacutedico que a

causalidade criminal estaraacute reduzida agrave figura do autor do delitordquo (p 26)

Os estudos debruccedilam sobre a tipologia e a concepccedilatildeo do criminoso visto como um

indiviacuteduo que tem responsabilidades porque vive em sociedade e se faz sujeito de direitos e

obrigaccedilotildees

Concebia-se o delito como um fato que decorre de fatores sociais fiacutesicos ou

bioloacutegicos ou seja acreditava-se em fatores internos eou externos que estimulavam o

indiviacuteduo para o crime Em consequecircncia o criminoso era punido de acordo com o grau de

periculosidade e conforme a gravidade do delito A compreensatildeo do delito implicava em

ldquoencontrar todo o complexo das causas na totalidade bioloacutegica e psicoloacutegica do indiviacuteduo e na

totalidade social que determina a vida do indiviacuteduordquo (BARATTA 2002 p 38) O delito era

conduzido a ldquouma concepccedilatildeo determinista da realidade em que o homem estaacute inserido e da

qual todo seu comportamento eacute no fim das contas expressatildeordquo (idem p 39)

Segundo Batista (2009) ldquoo criminoso agora biologicamente ontoloacutegico vai demandar

mais pena mais poder punitivo indeterminado corrigir a natureza demanda tempordquo e para

isso ldquoa sociedade disciplinar cria a sua rede de prisotildees manicocircmios internatos e asilos Eacute

nesse momento que o pensamento criminoloacutegico daacute o seu grande salto para a frente com uma

reflexatildeo bdquocientiacutefica‟ autocircnoma do discurso juriacutedico e por isso sem o embaraccedilo das garantias

e dos limitesrdquo (p26)

Nessa perspectiva cientiacutefica presencia-se a ascensatildeo das prisotildees e manicocircmios onde

os indiviacuteduos perdem sua individualidade e passa a viver de acordo com regras impostas pelo

Estado o qual deteacutem o monopoacutelio Foucault (1987) aponta a penalidade de coerccedilatildeo como

uma maneira de tornar os indiviacuteduos submissos e afirma que a prisatildeo eacute uma maneira de

uniformizaccedilatildeo da penalidade Nesse modelo o corpo do condenado passa a ser um bem

social objeto de apropriaccedilatildeo coletiva e uacutetil

23 Criminologia criacutetica

Ao longo do seacuteculo XX sobretudo a partir dos anos 1960 (XAVIER 2008) o

paradigma positivo entra num processo de desconstruccedilatildeo com a introduccedilatildeo das teorias do

labelling approach2 as quais partem da consideraccedilatildeo de que natildeo se pode compreender a

criminalidade se natildeo se estuda a accedilatildeo do sistema penal

Essa mudanccedila de paradigma determina-se atraveacutes da introduccedilatildeo do labelling

approach o qual adveio de influecircncia de correntes socioloacutegicas de origem fenomenoloacutegica

(como interacionismo simboacutelico e etnometodoloacutegico) na sociologia do desvio e do controle

social (BARATTA 2002) Assim consolida-se o paradigma da ldquoreaccedilatildeo socialrdquo que

tendenciou o deslocamento das causas do comportamento criminoso para as

2 Teoria do Etiquetamento Social

13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

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Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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13

condiccedilotildees a partir das quais as bdquoetiquetas da criminalidade‟ e o status

de criminoso satildeo atribuiacutedos a certos comportamentos e a certos

sujeitos assim como para o funcionamento da reaccedilatildeo social informal e

institucional (processo de criminalizaccedilatildeo) (BARATTA 2002 p 211)

Segundo Baratta (2002) os representantes do labelling approach vecircem a consciecircncia

criacutetica como o que distingue a criminologia tradicional da nova sociologia criminal sendo que

a concepccedilatildeo desta uacuteltimatem como objeto de esutdo a realidade social que natildeo se coloca

como preacute-constituiacuteda agrave experiecircncia cognoscitiva e praacutetica mas eacute construiacuteda dentro dessa

experiecircncia mediante os processos de interaccedilatildeo que a caracterizam criticamente em sua

construccedilatildeo

Baratta (2002) afirma poreacutem que ldquoa simples introduccedilatildeo do labelling approach em

uma teoria da criminalidade natildeo eacute suficiente para qualificar esta uacuteltimardquo (p 211) A criacutetica da

esquerda denunciou limitaccedilotildees teoacutericas e praacuteticas relacionadas ao emprego do labelling

approach ldquono interior de contextos teoacutericos subjetivistas e idealistas (como o interacionismo

simboacutelico e a etnometodologia)rdquo (p 211) Os principais resultados dessa criacutetica foram

acolhidos pela criminologia criacutetica que os utilizou para ulterior desenvolvimento para uso

correto do mesmo enfoque

A criminologia criacutetica apropria-se dos ideais difundidos das teorias do labelling

approach e provoca uma revoluccedilatildeo que permitiu agrave criminologia ldquosuperar o impasse

positivistardquo (BATISTA 2001 p 32)

Ao contraacuterio da Criminologia Tradicional a Criminologia Criacutetica natildeo

aceita qual a priori inquestionaacutevel o coacutedigo penal mas investiga

como por quecirc e para quem (em ambas as direccedilotildees contra quem e a

favor de quem) se elaborou este coacutedigo e natildeo outro (BATISTA 2001

p32)

A criminologia criacutetica de acordo com Baratta (2002) se distingue da tradicional por

sua nova forma de definir o objeto e os termos mesmos da questatildeo criminal O que se

presencia eacute uma mudanccedila de paradigmas ndash revoluccedilotildees cientiacuteficas uma conversatildeo do

paradigma etioloacutegico para sinocircnimo de ciecircncia das causas da criminalidade Nesta nova

perspectiva o enfoque teoacuterico volta-se para as condiccedilotildees objetivas estruturais e funcionais

que estatildeo na gecircnese dos fenocircmenos do desvio e o interesse cognoscitivo volta-se para os

mecanismos sociais e institucionais dos quais as definiccedilotildees de desvio e de criminalidade satildeo

criadas e aplicadas e realizados os processos de criminalizaccedilatildeo

Construir uma teoria materialiacutestica (econocircmico-poliacutetica) do desvio

dos comportamentos socialmente negativos e da criminalizaccedilatildeo e

elaborar as linhas de uma poliacutetica criminal alternativa de uma poliacutetica

das classes subalternas no setor do desvio estas satildeo as principais

tarefas que incubem aos representantes da criminologia criacutetica que

partem de um enfoque materialista e estatildeo convencidos de que soacute uma

anaacutelise radical dos mecanismos e das funccedilotildees reais do sistema penal

na sociedade tardo-capitalista pode permitir uma estrateacutegia autocircnoma

e alternativa soacute setor do controle social do desvio ou seja uma

bdquopoliacutetica criminal‟ das classes atualmente subordinadas (BARATTA

2002 p 197)

Eacute uma anaacutelise radical na medida em que tira o foco do comportamento do indiviacuteduo

pois natildeo eacute apenas uma questatildeo pessoal ou de sua personalidade e passa a analisar o sistema

punitivo ndash forccedilas econocircmicas poliacuteticas sociais culturais ndash para entender a criminalidade

14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

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O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

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behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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14

Nesta perspectiva podemos utilizar as criacuteticas de Sidman (1995) - teoacuterico da Anaacutelise do

Comportamento- sobre o uso de coerccedilatildeo como instrumento corretivo dentro desse sistema

para questionar as funccedilotildees reais do sistema penal e eficaacutecia do mesmo A Criminologia

Criacutetica demonstra que a pretendida correccedilatildeo dos atos desviantes natildeo funciona uma vez que as

teacutecnicas aplicadas intramuros satildeo apenas de cunho punitivo coercitivo e exploratoacuterio

Sidman (1995) aponta para o fracasso do modelo coercitivo no sistema penal que seraacute

discutido no capiacutetulo 4 e suas contribuiccedilotildees auxiliam para o aprofundamento do tema a

medida em que podemos identificar a eficaacutecia do modelo coercitivo para a perpetuaccedilatildeo do

ciclo dos comportamentos inadequados ou seja para a modelagem de comportamentos

agressivos de raiva entre outros elementos que contribuem para a reincidecircncia penal maior

problema da execuccedilatildeo da pena da atualidade

A vida no caacutercere marcada por formas de relacionamentos coercitivos punitivos e

desumanos contribuem para a reincidecircncia penal Atualmente o retrado das prisotildees eacute marcado

pela super lotaccedilatildeo instalaccedilotildees precaacuterias falta de suprimentos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e

higiene repressatildeo violecircncias traacutefico de drogas ausecircncia de oportunidades de atividades

laborais esportivas e ateacute mesmo luacutedicas entre outros Estudos evidenciam que o

confinamento produz impactos na vida do apenado sobretudo em seu comportamento como

nos evidencia Sidman A partir dessa breve contextualizaccedilatildeo e articulaccedilatildeo surgiu o

questionamento seraacute que eacute por meio do isolamento do indiviacuteduo desviante dito perigoso a

criminalidade seraacute contida O retrato do sistema penal atual natildeo se configuraria como uma

sobrepena uma vez que a sociedade conclama para que se decirc o miacutenimo de condiccedilotildees de vida

para agravequeles que cometerem um crime Seraacute que eacute dando o miacutenimo que alcanccedilaremos aquilo

que pretendemos a convivecircncia paciacutefica entre os seres humanos Seraacute que o tratamento

desumano natildeo funciona como uma estrateacutegia de perpetuaccedilatildeo do comportamento agressivo e

inadequado contribuindo para a criminalizaccedilatildeo A Criminologia Critica aponta para a

seletividade do sistema penal e revela a cor e a classe do caacutercere negra e pobre Estudos da

mesma aacuterea tambeacutem identificam as contribuiccedilotildees burguesas e higienistas no Coacutedigo Penal

Brasileiro de 1940 que diferencia a pena por tipificaccedilatildeo criminal aos que atentam contra o

patrimocircnio maior severidade no tempo da pena e os que atentam contra pessoas a pena

depende inclusive da escolaridade e haacutebitos de vida Aos pobres que natildeo tem trabalho

formal que possuem escolaridade abaixo da baacutesica estes pagaratildeo com o corpo maior tempo

de privaccedilatildeo de liberdade e em condiccedilotildees mais precaacuterias Seraacute que esse sistema estaacute realmente

contribuindo para a proteccedilatildeo da sociedade e correccedilatildeo do ato delituoso como pretenderem os

teoacutericos que contribuiacuteram para institucionalizaccedilatildeo e legalidade do modelo penal Por que nos

interessa tanto o modelo punitivo Segundo a Criminologia Criacutetica aprendemos a valorizar o

modelo punitivo a partir das teorias que as fundamentaram o problema eacute que elas natildeo

funcionam e este trabalho versaraacute sobre essa ineficiecircncia

Antes de aprofundar o debate seraacute apresentado o histoacuterico do behaviorismo radical

uma vez que este modelo teoacuterico eacute amplamente combatido pelas teorias criacuteticas da atualidade

O behaviorismo eacute criticado pelo seu pragmatismo e ecircnfase no comportamento do indiacuteviduo

mas a criacutetica esquece que o behaviorismo radical natildeo elimina a anaacutelise das contingecircncias

sociais e culturais e por isso se faz necessaacuteria essa contextualizaccedilatildeo

3 HISTOacuteRIA DO BEHAVIORISMO RADICAL

15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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15

O Behaviorismo visto como filosofia de uma ciecircncia do comportamento ainda eacute mal

entendido na contemporaneidade Pode-se pensar que esta confusatildeo eacute atribuiacuteda agrave histoacuteria dos

primoacuterdios dessa corrente cientiacutefica

O primeiro behaviorista expliacutecito foi John B Watson que inspirado nas obras de I P

Pavlov publicou em 1913 um artigo intitulado ldquoPsicologia como os behavioristas a vecircemrdquo

Nesta obra postula o comportamento como objeto de estudo da Psicologia propondo a esta

ciecircncia a consistecircncia buscada pelos psicoacutelogos da eacutepoca um objeto observaacutevel mensuraacutevel

cujos experimentos poderiam ser reproduzidos em diferentes condiccedilotildees e sujeitos Esta

proposta de comportamentalismo que posteriormente denominou-se de behaviorismo

metodoloacutegico foi influenciada pelo positivismo loacutegico corrente filosoacutefica que adotava uma

postura radicalmente empirista e anti-metafiacutesica

Em 1945 B F Skinner no artigo The operational analysis of psychological terms3

expocircs o behaviorismo radical que surgiu em oposiccedilatildeo ao behaviorismo metodoloacutegico e com

raiacutezes fincadas nos estudos de Thorndike Este uacuteltimo introduziu o meacutetodo experimental no

estudo do comportamento animal explicando-o como conexatildeo estiacutemulo-resposta fortalecida

por seus efeitos O adjetivo radical associado ao behaviorismo proposto por Skinner segundo

Matos e Tomanari (2002) estaacute associado agrave negaccedilatildeo do psiquismo como causa do

comportamento Skinner nega radicalmente a existecircncia de algo que natildeo existe no espaccedilo

fiacutesico e aceita radicalmente os fenocircmenos comportamentais

eacute radical na medida em que nega ao psiquismo a funccedilatildeo de explicar o

comportamento embora natildeo negue a possibilidade de por meio de um

estudo da linguagem estudar eventos encobertos tais como

pensamento e as emoccedilotildees soacute acessiacuteveis ao proacuteprio sujeito (grifo

nosso p 8)

Skinner (1995) ao negar o psiquismo denuncia por outro lado que o indiviacuteduo natildeo se

reduz agrave sua subjetividade intra psiacutequica mas que eacute consequecircncia de uma seacuterie de eventos que

o envolve como as variaacuteveis culturais e sociais que tambeacutem modelam o seu comportamento

Skinner de alguma forma critica o subjetivismo e psicologismo tatildeo amplamente difundido

pelas teorias psicoloacutegicas do seacuteculo XIX e XX e estas contribuiacuteram para essencializar uma

suposta essecircncia do indiviacuteduo perigoso criminoso como nos aponta Foucault nos seus

estudos sobre a criminalidade

O meacutetodo proposto por essa versatildeo do behaviorismo baseia-se na descriccedilatildeo das

interaccedilotildees entre o organismo e o meio ambiente sendo que sua preocupaccedilatildeo estava em

entender as relaccedilotildees funcionais do comportamento e natildeo as causais como Watson Como se

observa as duas correntes behavioristas representadas por Watson e Skinner apesar de

adotarem o comportamento como objeto de estudo distinguem-se em suas concepccedilotildees de

comportamento influecircncias e pressupostos filosoacuteficos

O behaviorismo radical foi definido por Skinner como a filosofia de sua ciecircncia do

comportamento o que pressupotildee que seja uma subaacuterea especiacutefica dentro de um arranjo mais

amplo4 dessa ciecircncia chamada de Anaacutelise do Comportamento (CARVALHO NETO 2002)

Para os diversos saberes behavioristas de tradiccedilatildeo skinneriana Tourinho (1999 apud

Carvalho Neto 2002) propotildee uma reorganizaccedilatildeo terminoloacutegica Com vistas para a estrutura a

aacuterea ampla seria denominada Anaacutelise do Comportamento O braccedilo teoacuterico-filosoacutefico seria

chamado de behaviorismo radical o braccedilo empiacuterico de Anaacutelise Experimental do

Comportamento e o braccedilo referente agrave criaccedilatildeo e administraccedilatildeo de recursos de intervenccedilatildeo

seria Anaacutelise Aplicada do Comportamento Estas subaacutereas estariam inter-relacionadas e

3 Traduccedilatildeo A anaacutelise operacional de termos psicoloacutegicos

16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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16

nenhuma das trecircs existiria de forma autocircnoma Assim entende-se que o behaviorismo radical

eacute concebido como filosofia da ciecircncia do comportamento denominada Anaacutelise do

Comportamento que adota como objeto de estudo as interaccedilotildees organismo-ambiente (externo

ndash fiacutesico social ndash e interno ndash histoacuterico bioloacutegico) e natildeo o comportamento como uma

topografia desprovido de contexto Nesta perspectiva o comportamento eacute considerado

interaccedilatildeo

A Anaacutelise do Comportamento de modo semelhante aos estudos antropoloacutegicos volta-

se para a influecircncia da cultura sobre as organizaccedilotildees sociais e tambeacutem tem buscado a

articulaccedilatildeo entre comportamento e cultura Muitos analistas do comportamento como Glenn

(1986) Andery Micheletto e Seacuterio (2005) Todorov (2004) Dittrich (2008) igualmente agrave

Skinner (1998) buscam a compreensatildeo e integraccedilatildeo da evoluccedilatildeo da cultura e evoluccedilatildeo do

comportamento individual Tal preocupaccedilatildeo tem gerado desde a deacutecada de 1980 trabalhos

que integram as aacutereas de estudo da Psicologia e Antropologia com destaque agrave Sigrid S

Glenn que introduziu o conceito de metacontingecircncia estabelecendo-a como uma unidade de

anaacutelise de praacuteticas culturais

Nesta perspectiva o comportamento humano tem sido compreendido a partir dos

processos de interaccedilatildeo e de seleccedilatildeo que se datildeo em trecircs niacuteveis filogeneacutetico ontogeneacutetico e

cultural ou seja o comportamento eacute produto da interaccedilatildeo entre histoacuteria da evoluccedilatildeo das

espeacutecies histoacuteria de aprendizagem de um indiviacuteduo ao longo de sua trajetoacuteria de vida e a

histoacuteria cultural do grupo ao qual o indiviacuteduo pertence respectivamente Esta triacuteade eacute

compreendida atraveacutes do modelo causal de seleccedilatildeo por consequecircncia e explica a modelagem

e manutenccedilatildeo do comportamento do indiviacuteduo e a evoluccedilatildeo das culturas (SKINNER 2007)

Este conceito evidencia que o behaviorismo radical natildeo se volta apenas para o comportamento

individual mas lanccedila o olhar para o indiviacuteduo como um todo o comportamento como produto

da accedilatildeo integrada e contiacutenua de contingecircncias filogeneacuteticas ontogeneacuteticas e culturais isto eacute

insere em suas anaacutelises variaacuteveis histoacutericas sociais culturais O comportamento eacute visto como

mateacuteria-prima da cultura e entendido como ldquorelaccedilatildeo indissoluacutevel e bidirecional entre o que o

ser humano faz e as circunstacircncias sob as quais ele o fazrdquo (DITTRICH 2008 p 252)

Baseando em Skinner (19531978 apud Martins 2009) que afirma que ldquoeacute sempre o indiviacuteduo

que se comporta individual eou coletivamenterdquo (p 10) entende-se que o comportamento

continua sendo foco de estudo para analistas do comportamento interessados em fenocircmenos

sociais Nesse sentido vale salientar que o comportamento social eacute definido como ldquoo

comportamento de duas ou mais pessoas em relaccedilatildeo a outra ou em conjunto em relaccedilatildeo ao

ambiente comumrdquo (Skinner 1998 p 325) o que implica que podem surgir estiacutemulos

antecedentes e consequumlentes por parte do outro jaacute que trata-se de uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo

31 O roacutetulo ldquoBehaviorismordquo

O behaviorismo radical ainda sofre com severas criacuteticas no acircmbito do moderno debate

na filosofia da ciecircncia onde verificam-se erros de interpretaccedilatildeo que levam o behaviorismo

radical e a anaacutelise do comportamento a serem relacionados a tradiccedilotildees filosoacuteficas que natildeo os

descreve adequadamente ou seja o sistema de Skinner ainda eacute localizado nas mesmas

tradiccedilotildees das vaacuterias versotildees do behaviorismo e de seus antecessores das quais citam-se

alguns representantes Ivan P Pavlov John B Watson Edward C Tolman Clark L Hull

Na tentativa de traccedilar uma linha de desenvolvimento do behaviorismo muitos autores

tentam puxar uma linha contiacutenua desde Pavlov passando por Watson ateacute chegar a Skinner

outros apresentam a psicologia operante de Skinner como um desenvolvimento do trabalho de

Pavlov outros ainda sugerem uma descontinuidade entre os primeiros e os uacuteltimos

17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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17

behavioristas Eacute nesse sentido que o behaviorismo skinneriano enfrenta problema uma vez

que natildeo existe um continnum no pensamento destes principais teoacutericos

O roacutetulo Behaviorismo eacute somente uacutetil em um contexto histoacuterico para

identificar a extrema mudanccedila metodoloacutegica que ocorreu na

psicologia durante primeira parte deste seacuteculo Mas natildeo deve ser

usado para insinuar uma continuidade de pensamento dos principais

teoacutericos da equipe porque quando seus trabalhos satildeo examinados de

perto torna-se claro que estavam preocupados com diferentes tipos de

problemas e oferecem diferentes tipos de explicaccedilotildees para seus

objetos de estudo (CHIESA 2006 p 146)

Eacute possiacutevel pontuar premissas que destacam algumas distinccedilotildees entre a tradiccedilatildeo

skinneriana do behaviorismo e as demais Chiesa (2006) considera os seguintes aspectos

(a) seu objeto de estudo eacute a relaccedilatildeo muacutetua entre comportamento e o

ambiente enfatizando o papel dos acontecimentos ambientais na

modelagem e manutenccedilatildeo do comportamento (b) o sistema natildeo eacute

mecanicista e natildeo apela para eventos mediadores tais como cogniccedilatildeo

ou o sistema nervoso (c) o comportamento complexo eacute uma funccedilatildeo

de contingecircncias complexas ao inveacutes de uma funccedilatildeo seja de reflexos

adquiridos ou de estados internos do organismo (d) o sistema rejeita

as interpretaccedilotildees dualistas dos acontecimentos privados argumentando

que a nossa consciecircncia dos acontecimentos privados eacute um produto da

interaccedilatildeo social isto eacute da modelagem dos termos linguumliacutesticos pela

comunidade verbal Especialmente em relaccedilatildeo a este ponto

Blackmam (1991) argumenta que o behaviorismo radical tem muito

em comum com alguns aspectos da Psicologia Social e que a

combinaccedilatildeo das suas preocupaccedilotildees sociais e bioloacutegicas preenche a

lacuna que vem dividindo tradicionalmente essas duas disciplinas (p

146)

O foco do behaviorismo radical eacute a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo que se comporta as

condiccedilotildees do ambiente onde ocorre o comportamento e as suas consequecircncias ou seja o

comportamento em seu contexto Trata-se de uma ciecircncia que se orienta por uma visatildeo

relacional de seu objeto de estudo e natildeo separa a pessoa em comportamento e sistema interno

isto eacute natildeo haacute um compromisso com uma concepccedilatildeo causal que requer elos para explicar o

comportamento mas sim uma preocupaccedilatildeo em explicar como se daacute a interaccedilatildeo entre o

indiviacuteduo e o ambiente qual o efeito das consequecircncias produzidas pelo indiviacuteduo em seu

ambiente e o efeito que o ambiente exerce para manutenccedilatildeo e modelagem do repertoacuterio

comportamental (CHIESA 2006) Vale ressaltar que o behaviorismo radical rejeita as

interpretaccedilotildees mecanicistas e se recusa a descrever o comportamento segundo princiacutepios

mecacircnicos a sua relaccedilatildeo com outras tradiccedilotildees que compartilham este roacutetulo eacute apenas

histoacuterica

Podemos aqui voltar nosso olhar para como se estabelece a relaccedilatildeo entre o indiviacuteduo

que comete o crime e o ambiente coercitivo e punitivo ao qual eacute submetido no atual sistema

prisional brasileiro Qual eacute o efeito que esse ambiente exerce sobre o apenado Natildeo

poderiacuteamos apontar que a teacutecnica de controle aversivo tende a gerar comportamentos

adaptativos a ela tal como agressividade aleacutem de alguns subprodutos emocionais como

ansiedade medo rigidez intelectual E esses comportamentos retroagem de que maneira no

ambiente social Satildeo de fato os efeitos esperados pelo modelo penal e pela sociedade De

fato esse ambiente coercitivo e punitivo tem gerado efeitos colaterais no indiviacuteduo preso que

vatildeo de encontro agrave ideologia penal de correccedilatildeo e reeducaccedilatildeo e aos anseios da sociedade uma

18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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18

vez que presenciamos cada vez mais episoacutedios de rebeldia e violecircncia dentro das prisotildees e o

crescente nuacutemero de reincidecircncias criminais

O behaviorismo radical auxilia o estudo da criminalidade e das penas agrave medida em que

natildeo particulariza o indiviacuteduo isto eacute natildeo limita sua anaacutelise no comportamento individual

Aleacutem disso evidencia o fracasso do meacutetodos coercitivos e punitivos pois apesar de terem

resultados pontuais e imediatos a longo prazo satildeo fadados ao fracasso por natildeo obter o

comportamento desejado pela presenccedila dos efeitos colaterais e por ser mais uma forma de

controle social

32 Remontando as raiacutezes do behaviorismo radical

Para uma compreensatildeo do behaviorismo radical em sua gecircnese e em seus contrapontos

com outros autores que tambeacutem discorreram sobre o behaviorismo faz-se necessaacuteria uma

breve contextualizaccedilatildeo de seu desenvolvimento histoacuterico metodoloacutegico e conceitual

O behaviorismo eacute apontado como uma escola de pensamento da Psicologia inaugurada

por Watson com seu manifesto de 1913 poreacutem mais de uma deacutecada antes da publicaccedilatildeo de

seu manifesto o ldquocomportamento animal jaacute era estudado experimentalmente por

pesquisadores que se ocupavam de questotildees entatildeo consideradas afeitas ao campo psicoloacutegicordquo

(TOURINHO 2011 p 187) Cita-se um dos mais notoacuterios exemplos da psicologia

comportamental Edward Lee Thorndike que estudou a aprendizagem em humanos e natildeo

humanos e formulou a lei do efeito cuja versatildeo final apareceu em 1911 mas uma primeira

versatildeo formal jaacute aprecia em um texto no ano de 1901

A seleccedilatildeo do comportamento pelas consequumlecircncias aparece com

clareza na versatildeo final da lei do efeito publicada em 1911 dois anos

ainda antes do manifesto watsoniano No lugar de ater-se a

pormenores da topografia da resposta as propriedades como latecircncia

ou forccedila da resposta a lei do efeito sugeria que o cientista do

comportamento deveria voltar sua atenccedilatildeo para mudanccedilas na

probabilidade da resposta como funccedilatildeo de mudanccedilas na ldquosatisfaccedilatildeordquo

do organismo produzida por sua accedilatildeo (TOURINHO 2011 p 187)

O desenvolvimento de aparatos experimentais para o uso de medidas objetivas de

mudanccedilas comportamentais foi antecipado nas pesquisas de Thorndike A lei do efeito como

afirma Tourinho (2011) tambeacutem ldquoantecipava uma das principais realizaccedilotildees da ciecircncia do

comportamento ao longo do seacuteculo XX a superaccedilatildeo do mecanicismo e a elaboraccedilatildeo do

selecionismo como modo causal explicativo do comportamentordquo (p 187) Percebe-se entatildeo o

advento do modo causal selecionista na ciecircncia do comportamento Ressalva-se que o papel

da seleccedilatildeo por consequecircncia soacute vem receber tratamento expliacutecito nos trabalhos de Skinner

quase meio seacuteculo apoacutes Thorndike ter iniciado sua carreira tratando aprendizagem em termos

de seleccedilatildeo (CATANIA 1999 apud TOURINHO 2011 p 187)

Diferente do modo causal mecanicista ndash que conduz o cientista psicoacutelogo a olhar o

organismo como um ser reativo e aos eventos que participam de relaccedilotildees comportamentais

(estiacutemulos e respostas) como entidades reais e anteriores ao contexto das relaccedilotildees

(TOURINHO 2011 p 188) - o modo causal selecionista propotildee que o ambiente afeta a

resposta e que eacute este por ele produzido

No modo causal selecionista portanto natildeo eacute possiacutevel falar de relaccedilotildees

invariaacuteveis (o probabilismo implica variabilidade em menor ou maior

grau) relaccedilotildees lineares (estiacutemulos e respostas determinam-se

mutuamente) ou de entidades preacute-existentes ao contexto de relaccedilotildees

19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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19

comportamentais Respostas e estiacutemulos (incluindo estiacutemulos

reforccediladores ou punidores) satildeo funccedilotildees que ocorrecircncias do organismo

e do ambiente adquirem e definem-se apenas mutuamente em um

contexto de relaccedilatildeo organismo-ambiente (TOURINHO 2011 p 188)

Sobre o modelo de seleccedilatildeo por consequecircncias Borges e Cassas (cols) (2012)

afirmam que este modelo

supotildee que os seres vivos e os eventos que satildeo caracteriacutesticos dos seres

vivos ndash como o comportamento ndash soacute podem ser explicados

considerando-se que tais fenocircmenos tecircm muacuteltiplas ldquocausasrdquo que satildeo

sempre histoacutericas e inter-relacionadas E que tratar de ldquocausasrdquo neste

caso significa tratar da constituiccedilatildeo histoacuterica do fenocircmeno e das

mudanccedilas de probabilidade do fenocircmeno de nosso interesse em

relaccedilatildeo a um universo de fenocircmenos possiacuteveis (p80)

Skinner formula trecircs niacuteveis de seleccedilatildeo por consequecircncia a filogenia a ontogenia e a

cultura O primeiro caracteriza-se pelas contingecircncias de sobrevivecircncia da espeacutecie e eacute

responsaacutevel pelo desenvolvimento de aspectos anatocircmicos fisioloacutegicos e neuroloacutegicos como

tambeacutem pelo surgimento e evoluccedilatildeo de uma seacuterie de padrotildees comportamentais O segundo

estaacute relacionado agrave histoacuteria de reforccedilamento do indiviacuteduo sua caracteriacutestica baacutesica implica na

suscetibilidade do organismo agraves consequecircncias de sua accedilatildeo acarretando respostas uacutenicas e

por conseguinte repertoacuterios comportamentais singulares No terceiro estatildeo presentes as

contingecircncias sociais cujo papel fundamental do surgimento do comportamento verbal na

espeacutecie humana possibilita a transmissatildeo de praacuteticas que garantem a sobrevivecircncia da cultura

Ao contraacuterio dos dois primeiros niacuteveis no terceiro o efeito sobre o indiviacuteduo natildeo eacute

responsaacutevel pela sua evoluccedilatildeo mas sim o efeito sobre o grupo o que possibilita a variaccedilatildeo e

seleccedilatildeo de praacuteticas culturais (CRUZ e CILLO 2008 p 383) ou seja deve-se considerar que

vaacuterios indiviacuteduos fazem parte do ambiente e exercem controle entre si as contingecircncias satildeo

mantidas pelo ambiente social Ressalva-se que este modelo natildeo pode ser visualizado de

forma fragmentada pelo contraacuterio soacute pode ser considerado levando-se em consideraccedilatildeo os

trecircs niacuteveis conjuntamente

Quando falamos em seleccedilatildeo por consequecircncias no acircmbito da Anaacutelise do

Comportamento referimo-nos ao comportamento dos indiviacuteduos que satildeo selecionados por

suas consequumlecircncias Considerando o niacuteveis de seleccedilatildeo jaacute citados temos os comportamentos

selecionados filogeneticamente como aqueles comuns a todos os indiviacuteduos como os que

aprendemos como reflexos inatos No niacutevel ontogeneacutetico a seleccedilatildeo corresponde a

comportamentos de cada indiviacuteduo e a unidade de anaacutelise neste niacutevel eacute a contingecircncia Na

cultura as praacuteticas culturais que satildeo selecionadas por suas consequecircncias e sua unidade de

anaacutelise eacute a metacontingecircncia conceito que seraacute discutido no capiacutetulo 4 Se o comportamento eacute

selecionado por suas consequumlecircncias podemos pensar como o comportamento de punir

corresponde agrave espeacutecie humana como as contingecircncias individuais reforccedilaram esse

comportamento de punir e de que maneira vem caminhando junto com a evoluccedilatildeo cultural

Primeiro partiremos da seguinte questatildeo por que o comportamento de punir foi selecionado

Pelo fato de que desde os primoacuterdios essa ideologia de puniccedilatildeo como sinocircnima de uma

praacutetica corretiva vem sendo reforccedilada como algo bom na sociedade na sociedade pois estaacute

afastando o indiviacuteduo perigoso do meio social Podemos articular esse comportamento com

um repertoacuterio anteriormente aprendido o de que a puniccedilatildeo corrige comportamentos

inadequados ou ateacute mesmo modela comportamentos adequados No entanto a puniccedilatildeo nem

sempre alcanccedila esse objetivo produzindo consequecircncias indesejaacuteveis como a repeticcedilatildeo do

comportamento punitivo pelo alvo da puniccedilatildeo Por que isso acontece Sidman afirma que a

puniccedilatildeo pode produzir efeitos colaterais e um deles eacute a raiva

20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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20

Outro caminho possiacutevel para compreender esse modelo de comportamento em

situaccedilatildeo de prisatildeo que tambeacutem se refere ao repertoacuterio de aprendizagem mas que estaacute

articulado com a ideia de que a privaccedilatildeo da liberdade e a puniccedilatildeo intramuros defenderatildeo a

sociedade de pessoas potencialmente perigosas A Criminologia Criacutetica discute criticamente

sobre essa questatildeo e evidecircncia que esse conhecimento difundido estaacute ancorado no pensamento

de reformistas iluministas do seacuteculo XIX que sinalizaram que a privaccedilatildeo da liberdade jaacute era

uma pena e que os supliacutecios da Idade Meacutedia natildeo seriam mais necessaacuterios e ainda que natildeo

produziam o efeito pretendido que era do controle da criminalidade Os reformistas foram

importantes mas o conhecimento sobre as praacuteticas que deveriam ser inseridas na prisatildeo

tambeacutem se desenvolveu e eacute aqui que se inserem as contribuiccedilotildees da Antropologia Criminal

de Cesare Lombroso e a Psiquiatrizaccedilatildeo da Justiccedila este uacuteltimo apontado por Foucault como a

evoluccedilatildeo da construccedilatildeo do indiviacuteduo criminoso no Ocidente como se existisse uma essecircncia

maacute irrecuperaacutevel um louco delinquente Ainda hoje podemos perceber o efeito desse

conhecimento na sociedade e as consequecircncias destes pois o modelo punitivo acaba sendo a

uacutenica saiacuteda viaacutevel para controle da criminalidade e a suposta correccedilatildeo do delinquente Neste

trabalho natildeo discutiremos sobre a ineficaacutecia do sistema penal mas evidenciaremos como a

puniccedilatildeo dentro do sistema penal natildeo eacute uma boa estrateacutegia de recuperaccedilatildeo ou reinserccedilatildeo social

uma vez que pode produzir efeitos colaterais indesejados

Entatildeo chegamos a um impasse por um lado o modelo penal cumpre com seu objetivo

qual seja de tirar a pessoa do conviacutevio social jaacute que este oferece ldquorisco para a sociedaderdquo

mas e os propoacutesitos de reinserccedilatildeo reeducaccedilatildeo como ficam Natildeo seria este modelo penal uma

praacutetica que vem sendo transmitida pelas culturas ao longo da histoacuteria uma vez que atende as

expectativas de controle social e aos interesses de quem controla

O mecanismo de seleccedilatildeo figura como fator importante tambeacutem na evoluccedilatildeo de praacuteticas

culturais uma vez que os processos de comportamentos em grupo tambeacutem satildeo produtos

selecionados em razatildeo de serem mais reforccediladoras para o grupo De acordo com

Skinner (2003) apud Teixeira (2008 p 34) ldquopode-se analisar o comportamento do grupo pela

anaacutelise dos mesmos processos e princiacutepios referentes ao comportamento individualrdquo jaacute que o

grupo eacute forma-se em virtude do comportamento de seus membros Skinner (2006) apud

Teixeira (2008) propotildee que o processo chamado de imitaccedilatildeo tem modelado e mantido o

comportamento social Por exemplo nos primoacuterdios de sua histoacuteria a puniccedilatildeo cumpriu com o

seu papel de ldquolivrarrdquo a sociedade do perigo manter distante e isolado os ditos perigosos e logo

esse comportamento de punir foi imitado (e ainda eacute) para que em ocasiotildees futuras

continuassem mantendo a ldquoordem socialrdquo Na evoluccedilatildeo cultural o conjunto de traccedilos que uma

sociedade possui eacute chamado de traccedilos culturais os quais constituem os replicadores da cultura

e agrave medida que satildeo transmitidos suas frequumlecircncias podem aumentar ou diminuir dependendo

da frequumlecircncia que satildeo aprendidos (BAUM 1999) Esse conjunto de traccedilos culturais

transmitidos pela sociedade funciona como replicadores de um sistema punitivo penal e a

medida que satildeo reproduzidos aumentam a frequecircncia da difusatildeo do seu caraacuteter ideoloacutegico

encoberto que eacute punir com maior severidade possiacutevel os desviantes

Baum (1999) defende a o argumento de que os traccedilos que possibilitam a aprendizagem

satildeo selecionados e aponta os traccedilos com estas caracteriacutesticas tais como a imitaccedilatildeo e os

reforccediladores sociais Um organismo que imita o outro e produz como resultado um estiacutemulo

reforccedilador o que corrobora para que a aprendizagem ocorra rapidamente Reforccediladores

sociais permitem que a aprendizagem ocorra de forma raacutepida porque introduzem as praacuteticas

de ensino e instruccedilatildeo Percebe-se a imitaccedilatildeo e educaccedilatildeo como replicadores culturais que

incluem aleacutem das praacuteticas natildeo verbais as praacuteticas verbais as quais satildeo uacuteteis porque satildeo regras

e fornecem estiacutemulos discriminativos que induzem comportamentos que satildeo socialmente

reforccedilados Neste ponto eacute que se insere a criacutetica de como o modelo pedagoacutegico tanto o escolar

como os conhecimentos difundidos na cultura sobre crime e criminoso funcionam tambeacutem

21

como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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como instrumentos de perpetuaccedilatildeo do modelo punitivo coercitivo e ateacute mesmo vingativo

Nas escolas desde a mais tenra idade educadoresas reforccedilam que o ato desviante eacute incorreto

e que devem ser corrigidos com muita severidade Essa forma de influecircncia social por ameaccedila

estaacute relacionada com a expectativa de modelar comportamentos adequados ou seja ao

enunciar que o comportamento inadequado seraacute punido pretende-se modelar comportamentos

adequados No entanto essa realidade teoacuterica natildeo e concretiza na praacutetica O tema violecircncia

nas escolas eacute cada vez mais frequente e o modelo penal eacute um retrato da continuidade dessas

violecircncias em diferentes etapas do desenvolvimento humano A questatildeo eacute como identificar

praacuteticas verbais e natildeo-verbais que corroboram para modelar exatamente o contraacuterio ou seja

comportamentos inadequados do ponto de vista legal e social O que estaacute sendo enunciado e

replicado que funciona como uma pedagogia da agressatildeo das violecircncias

A anaacutelise da cultura no comportamento se torna fundamental para o aprofundamento

do debate pois natildeo basta informar que um comportamento desviante seraacute punido e ateacute mesmo

puni-lo com toda a legitimidade do sistema penal precisamos discutir como a cultura

capitalista individualista vingativa produz consequecircncias indesejaacuteveis tais como a

delinquecircncia Se existem cadeias eacute porque existem atos desviantes isso afirmou Foucault

(Microfiacutesica do Poder Sobre as Prisotildees) O foco desse trabalho natildeo eacute estudar as motivaccedilotildees

para os atos desviantes mas evidenciar que o modelo coercitivo ao inveacutes de corrigir

comportamentos inadequados contribui para o aumento de sua frequecircncia

Baseando-se nesta percepccedilatildeo pode-se pensar no caminho histoacuterico da puniccedilatildeo no

acircmbito penal a partir do final do seacuteculo XVIII O meacutetodo punitivo assumiu uma relaccedilatildeo

castigo-corpo de submissatildeo coaccedilatildeo privaccedilatildeo e vigilacircncia e adotou a prisatildeo como instrumento

essencial de puniccedilatildeo Esse modelo ainda vigente contribui para a frequecircncia de

comportamentos indesejados como o aumento do crime da criminalidade e diferentes tipos

de violecircncia Podemos entatildeo pensar no controle dos desvios como um traccedilo cultural que eacute

transmitido por meio de regras em prol da ldquodisciplinardquo e ldquoreeducaccedilatildeordquo e que natildeo estaacute sendo

tatildeo eficaz jaacute que a frequecircncia de comportamentos inadequados do ponto de vista criminal natildeo

estaacute recuando Quais satildeo os traccedilos culturais que estatildeo sendo perpetuados e que estatildeo

modelando esse tipo de comportamento social Nossa hipoacutetese eacute de que o modelo punitivo e

coercitivo difundido socialmente entre os haacutebitos e costumes sociais contribui para o aumento

da frequecircncia de comportamentos indesejaacuteveis desenvolvimento que seraacute apresentando nos

proacuteximos capiacutetulos

Retomando as anaacutelises sobre as raiacutezes do behaviorismo radical reintero que apesar de

Skinner ter iniciado seus trabalhos em solo mecanicista - caracterizado por aspectos como

certeza absoluta relaccedilotildees de necessidade e determinismo riacutegido (CRUZ amp CILLO 2008)-

afastou-se cedo dessa posiccedilatildeo e aproximou-se do selecionismo e interacionismo O modelo

racionalista e mecanicista comeccedilou a perder forccedila como modelo predominante da ciecircncia e

filosofia no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do seacuteculo XX e dentre os responsaacuteveis por essa

transiccedilatildeo cita-se Ernst Mach que em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito propotildee uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das

funccedilotildees que estes desempenham uns sobre os outros (CRUZ amp CILLO 2008) Ressalva-se

que se destacou Ernst Mach por este ter sido citado por Skinner como importante influecircncia

na formulaccedilatildeo de seu sistema explicativo uma vez que culmina em sua obra a formulaccedilatildeo de

um de seus conceitos mais importantes a noccedilatildeo de relaccedilotildees funcionais

Em vez de explicar os fenocircmenos da natureza como relaccedilotildees

necessaacuterias entre uma causa e um efeito Mach (18931960) propotildee

uma descriccedilatildeo dos eventos em termos das funccedilotildees que estes

desempenham uns sobre os outros O conceito de funccedilatildeo ira expressar

uma concepccedilatildeo relacional que natildeo tem um fim em si mesma Na

concepccedilatildeo de Mach (18931960) natildeo eacute necessaacuterio dizer que um

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evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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22

evento causa outro mas simplesmente que os eventos satildeo funccedilatildeo de

outros eventos dessa forma um evento influencia a provaacutevel

ocorrecircncia de outros eventos Isso significa que o evento antecedente

natildeo age mais como uma forccedila inicial como a causa mas como parte

de uma cadeia de eventos (CRUZ amp CILLO 2008 p 377)

O que se pretende dizer eacute que natildeo existe uma unicausalidade uma relaccedilatildeo linear do

comportamento mas sim uma relaccedilatildeo de interaccedilatildeo na qual determinados eventos podem

exercer influecircncia na ocorrecircncia de outros eventos isto eacute os eventos antecedentes de um

comportamento natildeo satildeo a causa mas uma das peccedilas da relaccedilatildeo com os demais eventos Por

exemplo natildeo podemos afirmar que a condiccedilatildeo social de determinada pessoa seja a causa para

que a mesma insira-se na criminalidade mas podemos pensar em fatores como as relaccedilotildees de

poder do sistema capitalista a educaccedilatildeo a cultura os estigmas e rotulaccedilotildees penais como

outros eventos que fazem parte de uma mesma contingecircncia ou seja variaacuteveis que interagem

e podem influenciar a provaacutevel ocorrecircncia de dado comportamento ou manutenccedilatildeo do mesmo

33 Definiccedilotildees do behaviorismo radical

O sistema skinneriano comeccedila a assumir seus contornos definitivos com a

investigaccedilatildeo de relaccedilotildees operantes no final da deacutecada de 30 Tourinho (2001) afirma que a

proposiccedilatildeo do operante ldquorestaurava o interesse pelas consequumlecircncias do comportamento ou

melhor o reconhecimento de suas funccedilotildees causais como assinaladas por Thorndike quarenta

anos antesrdquo (p189)

Eacute com Skinner que o selecionismo como modo causal tem uma elaboraccedilatildeo refinada

que articula a relaccedilatildeo entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do

comportamento operando ora na mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees opostas Esta elaboraccedilatildeo

skinneriana afasta o mecanicismo e assinala a variabilidade e dependecircncia entre respostas e

estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutesticos da determinaccedilatildeo das primeiras (TOURINHO 2011)

De acordo com Cruz e Cillo (2008) Skinner ldquopretende lidar com a proacutepria observaccedilatildeo

e descriccedilatildeo do comportamento por meio da anaacutelise de uma parte do ambiente o estiacutemulo e

uma parte do comportamento a resposta do organismordquo (p 378) isto eacute verifica-se o

comportamento do indiviacuteduo quais as variaacuteveis o levaram a comportar-se daquela maneira e

ainda o efeito daquele comportamento no ambiente e o efeito deste ambiente modificado no

proacuteprio comportamento Olhando para essa dinacircmica de estudo proposta por Skinner

podemos estender essa filosofia do comportamento humano a debates de temas amplos e

centrais no acircmbito social uma vez que natildeo haacute delimitado um aspecto a ser estudado mas sim

sugerida uma visatildeo interacionista de comportamento humano atraveacutes do qual o indiviacuteduo se

estabelece no mundo

A ferramenta de estudo dos analistas do comportamento eacute a anaacutelise funcional Atraveacutes

desta eacute possiacutevel encontrar as relaccedilotildees estabelecidas entre o indiviacuteduo e o ambiente Segundo

Medeiros e Moreira (2007) analisar funcionalmente um comportamento implica em uma

busca da funccedilatildeo do comportamento e natildeo de sua estrutura ou forma Assim sendo podemos

relacionar a funccedilatildeo do comportamento desviante com os interesses ideologicos do poder

como aponta a criminologia criacutetica que utilizam os modelos teoacutericos para produzir praacuteticas de

controle e vigilacircncia que em nada contribuem para o processo de reintegraccedilatildeo social do

apenado O modelo coercitivo amplamente utilizado nas prisotildees e a severa puniccedilatildeo apenas

aumentam a frequumlecircncia de comportamentos agressivos A anaacutelise funcional auxilia-nos a

desvelar o que a teoria natildeo alcanccedila que satildeo os efeitos de sua utilizaccedilatildeo teacutecnica na praacutetica

23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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23

O instrumento conceitual principal adotado para a realizaccedilatildeo de anaacutelises funcionais eacute o

conceito de contingecircncia introduzido por Skinner em 1938 e tema central de sua obra De

acordo com Skinner (1975) apud Costa e Marinho (2002)

uma formulaccedilatildeo das interaccedilotildees entre um organismo e o seu meio

ambiente para ser adequada deve sempre especificar trecircs coisas 1) a

ocasiatildeo na qual ocorreu a resposta 2) a proacutepria resposta e 3) as

consequecircncias reforccediladoras As relaccedilotildees entre eles constituem as

bdquocontingecircncias de reforccedilo‟ (p45)

Essa relaccedilatildeo de contingecircncia pode ser formulada da seguinte forma segundo Medeiros

e Moreira (2007 p 148) ldquouma resposta - R produziraacute um determinado estiacutemulo consequumlente -

(Sc) na presenccedila da ocasiatildeo Sardquo De forma esquemaacutetica apresenta-se da seguinte maneira Sa

ndash R Sc Por exemplo sob um estiacutemulo (Sa) da prisatildeo a resposta (R) de um apenado de

comportar-se adequadamente (de acordo com o comportamento socialmente desejado) pode

ser reforccedilada se o estiacutemulo consequente (Sc) for o acesso agrave assistecircncia humanizada tanto

psicoloacutegica meacutedica odontoloacutegica laboral luacutedica esportiva educativa bem como de amplo

acesso as poliacuteticas e benefiacutecios socioassistencias ou seja se for tratado como um humano

com dignidade e sem preconceitos essa repeticcedilatildeo poderia se inverter para alguns ou muitos

dos apenados

Skinner propotildee o termo comportamento operante e o define como aquele que produz

modificaccedilotildees no ambiente e eacute afetado por elas Tais modificaccedilotildees satildeo denominadas

consequecircncias Existem alguns tipos de consequecircncias do comportamento que aumentam e

outras que diminuem a probabilidade de o comportamento voltar a ocorrer

Quando um tipo de consequecircncia do comportamento aumenta a probabilidade de um

comportamento voltar a ocorrer chamamos de reforccedilo Se o reforccedilo acontece atraveacutes da

adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador no ambiente denomina-se reforccedilo positivo

Por exemplo quando damos ordens e somos atendidos as chances de ordenarmos novamente

aumentam Se o reforccedilo ocorre atraveacutes da remoccedilatildeo de um estiacutemulo aversivo do ambiente

denomina-se reforccedilo negativo (MEDEIROS e MOREIRA 2007) Por exemplo sob ocasiatildeo

da prisatildeo um indiviacuteduo que cometeu um crime emite um comportamento que eacute socialmente

desejado e tem sua pena diminuiacuteda em decorrecircncia do bom comportamento esta

consequumlecircncia de diminuiccedilatildeo de pena pode aumentar a probabilidade deste indiviacuteduo emitir

comportamentos similares de bom comportamento novamente na mesma ocasiatildeo Estudos

evidenciam que a inserccedilatildeo em um emprego ou escola aumentam a frequecircncia do

comportamento a medida que sua pena eacute reduzida

O tipo de consequecircncia do comportamento que torna sua ocorrecircncia menos provaacutevel

designa-se puniccedilatildeo e a distinccedilatildeo entre puniccedilatildeo negativa e puniccedilatildeo positiva incide na mesma

distinccedilatildeo feita com relaccedilatildeo ao reforccedilo (negativo ou positivo) a puniccedilatildeo positiva diminui a

probabilidade de o comportamento ocorrer novamente pela adiccedilatildeoapresentaccedilatildeo de um

estiacutemulo aversivo (punitivo) ao ambiente (ultrapassar o sinal vermelho e ser multado pode

diminuir as chances de uma nova infraccedilatildeo agrave esta regra) e a puniccedilatildeo negativa diminui a

probabilidade de o comportamento novamente ocorrer pela retirada de um estiacutemulo reforccedilador

do ambiente (dirigir embriagado e perder a carteira de motorista pode diminuir a

probabilidade de dirigir novamente embriagado) (MEDEIROS e MOREIRA 2007)

As consequecircncias do comportamento satildeo controladoras do proacuteprio comportamento jaacute

que tornam sua ocorrecircncia mais ou menos provaacutevel No entanto o reforccedilo negativo e a

puniccedilatildeo (negativa ou positiva) exercem controle aversivo pois de acordo com Medeiros e

Moreira (2007) ldquoeacute aversivo porque o indiviacuteduo se comporta para que algo natildeo aconteccedila ou

seja para subtrair um estiacutemulo do ambiente ou para fazer com que ele nem mesmo ocorrardquo

(p64)

24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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24

O controle aversivo eacute uma forma legiacutetima e eficiente de aumentar ou diminuir a

probabilidade de emissatildeo do comportamento entretanto apesar da facilidade de punir

comportamentos indesejados ou inadequados e dos mesmos produzirem efeitos mais

imediatos do que reforccedilar positivamente comportamentos adequados possuem uma seacuterie de

efeitos colaterais que tornam seu uso desaconselhado por vaacuterios autores comportamentais

eliciaccedilatildeo de respostas emocionais supressatildeo de outros comportamentos aleacutem do punido

emissatildeo de respostas incompatiacuteveis ao comportamento punido e o contracontrole Dentre os

efeitos citados talvez o mais indesejado seja o de contracontrole onde o organismo

controlado emite uma nova resposta que impede que o controlador mantenha controle sobre

seu comportamento Sobre esse assunto Sidman (1995) afirma que cada vez mais o

contracontrole ganha refinamento e em alguns momentos eacute difiacutecil dizer quem satildeo os

controladores os guardas ou os prisioneiros Ele segue dizendo que a violecircncia fiacutesica eacute

mantida em vigor mais por acordos natildeo-escritos do que por trancas Os apenados que satildeo os

controlados emitem respostas de ameaccedilas aos carceraacuterios e guardas - os controladores- que

os impedem de manter o controle sobre eles O acordo eacute o seguinte ldquobdquovocecirc manteacutem as drogas

entrando e noacutes manteremos tudo em paz‟ bdquomeus amigos laacute fora cuidaratildeo de sua mulher e o

tipo de cuidado dependeraacute do que eles souberem de mim Garanta que eu tenha um trabalho

de escritoacuterio com acesso ao telefone‟rdquo (p 225) Ainda afirma que

agrave medida que as demandas dos prisioneiros tornam-se irrazoaacuteveis ou

a repressatildeo torna-se insuportaacutevel uma rebeliatildeo torna-se a teacutecnica de

contracontrole escolhida A violecircncia indescritiacutevel de ambos os lados

durante uma rebeliatildeo assegura aos prisioneiros divulgaccedilatildeo e

frequentemente muda o equiliacutebrio de poder mais uma vez a seu favor

Inerentemente coercitivas prisotildees transformam mesmo o mais

humano dos guardas em um bruto ndash aos olhos dos prisioneiros O

contracontrole inevitaacutevel transforma o mais gentil dos prisioneiros em

um monstro ndash aos olhos dos guardas (p 226)

O que se percebe eacute que apesar dos efeitos pontuais e imediatos do controle aversivo

os efeitos adversos que surgem nos fazem repensar a utilizaccedilatildeo e real eficaacutecia deste meacutetodo

punitivo adotado pelo sistema penal Podemos inferir que este controle aversivo daacute

sustentaccedilatildeo a outras formas de controle e vigilacircncia e desse modo fica evidente a

ineficiecircncia dos preceitos teoacutericos construiacutedos como eficientes e eficazes

4 PRISAtildeO E COERCcedilAtildeO SOB A OacuteTICA DE FOUCAULT E SIDMAN

A repressatildeo continua sendo modelo de seguranccedila puacuteblica com raiacutezes fincadas agrave

criminologia tradicional O sistema prisional ainda traz uma concepccedilatildeo de sujeito e sociedade

correlata a uma concepccedilatildeo de poder e dominaccedilatildeo A prisatildeo permanece figurando como um

aparelho corretivo fundamentado na privaccedilatildeo de liberdade com objetivo de ldquotransformarrdquo o

indiviacuteduo atraveacutes de uma disciplina incessante (FOUCAULT 1987)

Olhando para este panorama visualiza-se com facilidade a distacircncia da nova

perspectiva criacutetica da criminologia Com o intuito de contribuir entatildeo para uma aproximaccedilatildeo

desta nova perspectiva que jaacute rompeu com o modelo tradicional somam-se agraves concepccedilotildees

criacuteticas de Foucault (1987) discussotildees importantes sobre mateacuterias como coerccedilatildeo e puniccedilatildeo

apresentadas por Sidman (1995) representante da Anaacutelise do Comportamento

Foucault (1987) em seu livro Vigiar e Punir traccedila um caminho histoacuterico desde os

seacuteculos passados ateacute os tempos modernos apresentando cada eacutepoca com suas proacuteprias leis

25

penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

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penais e os mais variados meacutetodos de puniccedilatildeo os quais vatildeo desde os supliacutecios ndash vivecircncias

fiacutesicas de sofrimento - ateacute os ideais ldquohumanitaacuteriosrdquo com vistas agrave transformaccedilatildeo do sujeito sua

recuperaccedilatildeo e reintegraccedilatildeo na sociedade Se na Idade Meacutedia a pena constituiacutea-se em

sofrimento fiacutesico essa relaccedilatildeo castigo-corpo passa por transformaccedilotildees que implicam na

submissatildeo do corpo do condenado a um sistema de coaccedilatildeo privaccedilatildeo obrigaccedilotildees e

interdiccedilotildees a manipulaccedilatildeo do corpo passa a ser feita agrave distacircncia de acordo com regras

riacutegidas Haacute entatildeo a substituiccedilatildeo do carrasco (que infligia os supliacutecios) pelos guardas

meacutedicos psiquiatras capelatildees psicoacutelogos e educadores isso porque os diversos

saberesdiscursos cientiacuteficos se entrelaccedilam e confere aos mecanismos de puniccedilatildeo poder

justificaacutevel sobre os indiviacuteduos (FOUCAULT 1987)

No fim do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX se daacute passagem a uma penalidade de

detenccedilatildeo e a prisatildeo surge como peccedila essencial no conjunto das puniccedilotildees criada como

aparelho para tornar o indiviacuteduo doacutecil e uacutetil para ldquodomesticar os corposrdquo (FOUCALT 1987

p 197) A detenccedilatildeo eacute desse modo legitimada dentro do sistema legal e o detento eacute

submetido ao poder disciplinar do governo que aleacutem de tirar o tempo e a liberdade

verticaliza a comunicaccedilatildeo hierarquicamente para obediecircncia ordem e disciplina Esse poder

disciplinar opera massacrando o detento uma vez que eacute pautado numa concepccedilatildeo de pena que

leve agrave reflexatildeo e mudanccedila por meio de meacutetodos de vigilacircncia controle observaccedilatildeo e

reparaccedilatildeo desse indiviacuteduo atraveacutes de sua eliminaccedilatildeo do conviacutevio social jaacute que satildeo vistos

como risco agrave ordem social (FOUCAULT 1987)

De acordo com Foucault (1987) o aparelho carceraacuterio recorre a trecircs grandes esquemas

para realizar a transformaccedilatildeo nos indiviacuteduos

o esquema poliacutetico-moral do isolamento individual e da hierarquia o

modelo econocircmico da forca aplicada a um trabalho obrigatoacuterio o

modelo teacutecnico-meacutedico da cura e da normalizaccedilatildeo A cela a oficina

o hospital A margem pela qual a prisatildeo excede a detenccedilatildeo eacute

preenchida de fato por teacutecnicas de tipo disciplinar E esse suplemento

disciplinar em relaccedilatildeo ao juriacutedico eacute a isso em suma que se chama o

penitenciaacuterio (FOUCAULT 1987 p 208 grifo nosso)

Para alcanccedilar esse objetivo de transformaccedilatildeo e reeducaccedilatildeo a operaccedilatildeo penitenciaacuteria

torna a prisatildeo um ambiente coercitivo apesar de que a coerccedilatildeo vem imbricada em todo o

sistema prisional e poder disciplinar exercido A este respeito Sidman (1995) afirma que

vivemos em um mundo coercitivo que ldquocoaccedilatildeo puniccedilatildeo ndash ameaccedila de puniccedilatildeo ou de perda ou

verbalizaccedilotildees sobre o que temos que fazer para fugir de ou evitar puniccedilatildeo ou perda ndash eacute a

teacutecnica predominantemente para nos levar a bdquocomportar-nos‟rdquo (p 33) e que ldquoa coerccedilatildeo tem

seus iniacutecios em nossas interaccedilotildees com o ambiente fiacutesicordquo (p 35)

Sidman (1995) propotildee a existecircncia de uma aceitaccedilatildeo geral da coerccedilatildeo social jaacute vista

como natural

Punimos crianccedilas e criminosos na esperanccedila de impedir repeticcedilotildees de

condutas inaceitaacuteveis Nosso coacutedigo legal eacute na sua maior parte um

cataacutelogo de penalidades para todo o tipo de infraccedilatildeo civil e criminal

ele define conduta desejaacutevel principalmente de forma que possamos

reconhecer e punir desvios (SIDMAN 1995 p 40)

Para ele ldquoeacute a ausecircncia de coerccedilatildeo que daacute significado agrave liberdaderdquo (p 42) entatildeo o

conceito de liberdade seria desnecessaacuterio se a sociedade pudesse eliminar as condiccedilotildees pelas

quais sempre se busca a liberdade Por exemplo liberdade de imprensa natildeo faria sentido natildeo

fosse pela existecircncia ou ameaccedila de censura Se natildeo houvesse a tentativa de controlar uns aos

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outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

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Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

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metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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26

outros atraveacutes de ameaccedilas de puniccedilatildeo privaccedilatildeo restriccedilatildeo e perda seriam todos livres e o

termo liberdade natildeo teria adentrado nossa linguagem

Skinner (1998) em sua obra Ciecircncia e Comportamento Humano apresenta o conceito

de agecircncias controladoras definindo como ldquoo grupo que exerce um controle eacutetico sobre cada

um de seus membros atraveacutes principalmente de seu poder de reforccedilar ou punirrdquo (p 363) e

completa dizendo que ldquoo poder deriva do nuacutemero e da importacircncia de outras pessoas na vida

de cada membrordquo (p 363) Essas agecircncias controladoras operam atraveacutes da coerccedilatildeo e

manipulaccedilatildeo de variaacutereis

Citam-se o governo e a lei como agecircncias controladoras A agecircncia governamental

adota a distinccedilatildeo de legal e ilegal e satildeo definidos de acordo com o poder da agecircncia atua

principalmente atraveacutes do poder de punir e daacute ecircnfase sobre o ldquoerradordquo o governo utiliza seu

poder para restringir comportamentos que ameaccedilam membros do grupo A lei tambeacutem se

configura como uma agecircncia ela especifica o comportamento em termos de seus efeitos sobre

os outros bem como suas consequecircncias (SKINNER 1998)

O controle exercido pelas agecircncias controladoras gera alguns subprodutos natildeo

vantajosos para o controlador principalmente onde o controle eacute excessivo ou inconsistente

Skinner (1998) faz apontamentos de alguns subprodutos do controle dos quais se pode citar

fuga revolta resistecircncia passiva medo ansiedade ira e raiva Natildeo eacute difiacutecil buscar um

panorama que saliente estes subprodutos basta pensar no sistema prisional que cada vez mais

deixa marcas de coerccedilatildeo e de controle nos sujeitos que ali se encontram ou que por ali

passaram Saem das prisotildees muitas vezes revoltados agressivos e tantas vezes reincidentes o

que vem de encontro com a ideologia de reeducaccedilatildeo e reinserccedilatildeo destes indiviacuteduos

Sidman (1995) em seu livro Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees traz uma discussatildeo

importante sobre o quanto a coerccedilatildeo estaacute presente nos segmentos da sociedade e levanta

questionamentos sobre a funcionalidade ou natildeo da puniccedilatildeo Para ele um coacutedigo legal

coercitivo gera subterfuacutegio desobediecircncia e ateacute retaliaccedilatildeo para os que estatildeo submetidos ao

sistema e brutalidade para os que o operam

Raramente invocamos justiccedila como uma razatildeo para dar alguma coisa

boa para algueacutem que tenha se comportado bem Algueacutem que obteacutem

ldquoapenas sobremesardquo natildeo recebeu algo doce como um retorno razoaacutevel

por bom comportamento Ao contraacuterio recebeu uma puniccedilatildeo por agir

mal Justiccedila passou a significar puniccedilatildeo (SIDMAN 1995 p 81)

Segundo Sidman (1995) a puniccedilatildeo natildeo precisa ser necessariamente dolorosa para

incitar agressatildeo como efeito colateral Ele acredita que ldquopuniccedilatildeo e privaccedilatildeo levam a agressatildeordquo

(p 221) que a ldquocoerccedilatildeo induz mais do que apenas o ato agressivo em si mesmordquo (p 221) e

completa afirmando que ldquodepois de ser punido um sujeito faraacute qualquer coisa que possa para

ter acesso a outro sujeito que ele possa atacarrdquo (p 221)

Pensa-se desse modo mais uma vez na ineficaacutecia do sistema instituiacutedo na seguranccedila

puacuteblica O encarceramento a privaccedilatildeo a coerccedilatildeo impede pessoas de cometer crimes ou de

reincidir Natildeo eacute o que se tem vivenciado tampouco o que os dados estatiacutesticos apontam

Segundo o Mapa da Violecircncia 2012 o Brasil passou de 13910 homiciacutedios em 1980 para

49932 em 2010 um aumento de 259 equivalente a 44 de crescimento ao ano Verifica-

se pois um padratildeo crescente de violecircncia homicida no Brasil o que nos leva a pensar que o

sistema tal como estaacute estabelecido natildeo inibe nem previne a criminalidade

Sidman (1998) deixa claro que o sistema como estaacute proposto atualmente peca em sua

utilizaccedilatildeo de meacutetodos coercitivos-punitivos que a justiccedila natildeo estaacute restaurando o sujeito

submetido ao sistema prisional pelo contraacuterio jogam-no no antigo cenaacuterio sem um novo

modelo de comportamento e pior estigmatizados como criminosos sujeitos a restriccedilotildees ainda

maiores Esse ambiente natildeo pode produzir efeitos contraacuterios aos que se espera

27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

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27

Para uma possiacutevel mudanccedila de cenaacuterio Sidman (1998) acredita na possibilidade da

utilizaccedilatildeo do reforccedilamento positivo para ensinar aos infratores formas mais acessiacutevel de

conduta poderiam ser preparados antes de sair da prisatildeo para novas opccedilotildees e meios legais de

sobrevivecircncia Aponta o reforccedilamento positivo como um caminho pelo qual poderia realizar

correccedilotildees verdadeiras e se instituiacutedo antes do indiviacuteduo cometer infraccedilotildees pode ser um meio

que custa menos de que sustentar o sistema-padratildeo de controle coercitivo Vale ressaltar que

reforccedilamento positivo refere-se a um procedimento no qual aumenta-se a probabilidade do

comportamento voltar a ocorrer pela apresentaccedilatildeoadiccedilatildeo de um estiacutemulo reforccedilador ao

ambiente (MEDEIROS amp MOREIRA 2007)

Para ilustrar que natildeo eacute apenas uma teoria impraticaacutevel Sidman (1998) descreve um

projeto que foi realizado nos Estados Unidos que mostrou a eficaacutecia de um reforccedilamento

positivo bem elaborado O projeto proporcionou cursos para os prisioneiros comeccedilando por

leitura baacutesica escrita conversaccedilatildeo caacutelculo e memoacuteria e entatildeo prosseguiu para habilidades

mais avanccediladas que empregavam esses preacute-requisitos Natildeo forccedilaram ningueacutem a participar dos

cursos e natildeo atribuiacuteram puniccedilatildeo para os que preferissem continuar na rotina habitual da

prisatildeo Inicialmente foi preciso utilizar reforccediladores artificiais ateacute que as novas habilidades

dos alunos os colocassem em contato com as consequecircncias mais naturais Um aspecto crucial

do sistema entra em cena um reforccedilamento positivo pela aprendizagem Para o engajamento

dos prisioneiros o projeto pagava-os para aprender o que tornou possiacutevel aos que se

engajaram a obtenccedilatildeo de algumas coisas que do contraacuterio natildeo estavam disponiacuteveis As notas

altas tambeacutem os beneficiavam com um espaccedilo privativo Depois de conseguirem esse espaccedilo

poderiam obter creacuteditos caso continuassem mostrando aprendizado em seus cursos Podiam

juntar e usar os creacuteditos como dinheiro em uma loja

Pagar os estudantes por aprender simplesmente estabeleceu a escola

como um outro trabalho que estava disponiacutevel para os detentos Os

creacuteditos a loja o espaccedilo privativa e outros privileacutegios eram na

verdade parte do programa escolar ndash o trabalho ndash e eram desfrutados

apenas durante as horas de escola ndash enquanto os prisioneiros estavam

no trabalho (SIDMAN 1998 p 264)

Novos reforccediladores foram criados atraveacutes das propriedades privativas As novas

habilidades criavam tambeacutem potencial para mais reforccediladores A loja tornava-os acessiacuteveis

a habilidade de escrever cartas tornou artigos de papelaria e materiais

de escrita em bens uacuteteis a habilidade para enfrentar uma entrevista de

trabalho tornou determinados tipos de roupas desejaacuteveis para os

estudantes que em breve estariam completando suas penas a

habilidade de leitura gerou um novo prazer e os livros tornaram-se

bens desejaacuteveis [] o valor da aprendizagem por si soacute tornou-se

evidente e os estudantes por fim passaram a utilizar alguns de seus

creacuteditos para pagar os cursos que eles solicitavam ndash uma exigecircncia

que teriam fora dali (SIDMAN 1998 p 265)

Ao sair da prisatildeo os estudantes estavam aptos a realizar coisas que tornavam novos

reforccediladores disponiacuteveis afinal seu mundo havia se expandido O projeto permitiu que aos

deixar a prisatildeo os jovens ingressassem em novos ambientes sem entrar em conflito com a lei

Apesar de natildeo haver garantias de que as antigas contingecircncias natildeo assumissem novamente o

controle agora eles tinham uma chance de fazer algo diferente Segundo as evidecircncias

muitos investiram em novas oportunidades que a abordagem natildeo-punitiva havia tornado

possiacutevel e o retorno agrave prisatildeo reduziu

28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

ANDERY M A P A MICHELETTO N SEacuteRIO T M A P A anaacutelise de fenocircmenos

sociais esboccedilando uma proposta para a identificaccedilatildeo de contingecircncias entrelaccediladas e

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Acesso em 10 fev 2012

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debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008

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28

41 Metacontingecircncia um conceito para anaacutelise em niacutevel cultural

A metacontingecircncia eacute um conceito recentemente introduzido na Anaacutelise do

Comportamento para compreensatildeo de praacuteticas culturais e sociais Pensando na criminalidade

como um fenocircmeno social considera-se este novo conceito como possiacutevel proposta de criacutetica

e de novas perspectivas ao modelo penal brasileiro

Para falar sobre metacontingecircncia eacute necessaacuterio que antes se faccedila uma distinccedilatildeo de

contingecircncia Esta uacuteltima refere-se a unidade miacutenima de estudo para a Anaacutelise do

Comportamento e descreve a relaccedilatildeo entre organismo-ambiente A metacontingecircncia por sua

vez eacute a relaccedilatildeo entre uma classe de operantes e uma consequecircncia cultural comum

Um operante eacute um grupo de respostas de topografias variaacuteveis que

foi agrupado numa classe funcional porque produzem uma

consequumlecircncia comum A contingecircncia de reforccedilamento eacute a unidade de

anaacutelise que descreve as relaccedilotildees funcionais entre comportamento

operante e o ambiente com o qual o organismo que se comporta

interage []Um exemplo de classe de operantes frequumlentemente dado

eacute o grupo de respostas que historicamente leva a abrir uma porta

seus membros incluiriam bater chamar algueacutem virar a maccedilaneta e

empurrar inserir e virar uma chave etc

A metacontingecircncia eacute a unidade de anaacutelise que descreve as relaccedilotildees

funcionais entre uma classe de operantes cada operante tendo sua

proacutepria consequumlecircncia uacutenica e imediata e uma consequumlecircncia comum

de longo prazo para todos os operantes da metacontingecircncia

Metacontingecircncias devem ser mediadas por contingecircncias de

reforccedilamento socialmente arranjadas Tome como exemplo os vaacuterios

comportamentos na produccedilatildeo da consequumlecircncia atrasada de reduccedilatildeo da

poluiccedilatildeo do ar Os engenheiros precisam se engajar em vaacuterios

operantes envolvidos no projeto de conversores cataliacuteticos os

trabalhadores de linha de montagem precisam aprender a construiacute-los

e a integraacute-los aos carros os consumidores precisam comprar tais

carros e abastececirc-los com combustiacuteveis menos poluentes os

funcionaacuterios das refinarias precisam desenvolver e usar o processo de

produccedilatildeo da gasolina menos poluente A probabilidade de ocorrecircncia

de todos esses operantes sem a mediaccedilatildeo de contingecircncias sociais

parece ser pequena (GLENN 1986 p 2)

O conceito apresentado acima foi o primeiro proposto por Glenn em 1986 Para

Martone e Todorov (2007 p 185) ldquoessa primeira formulaccedilatildeo do conceito estimulou o

surgimento de alguns trabalhos descritivos cujo objetivo foi analisar contingecircncias sociais de

natureza mais amplardquo Seguindo um percurso de reformulaccedilotildees do conceito de

metacontingecircncia Glenn em 1988 faz a primeira reformulaccedilatildeo e afirma que metacontingecircncia

eacute

() a unidade de anaacutelise que circunscreve uma praacutetica cultural em

todas as suas variaccedilotildees e o efeito agregado de todas as atuais

variaccedilotildees Os efeitos das praacuteticas culturais devem claro ser es

especificados empiricamente Por exemplo o nuacutemero de crianccedilas que

podem ler com um certo niacutevel de proficiecircncia eacute o resultado das

praacuteticas educacionais A quantidade de leite disponiacutevel para se beber eacute

o resultado de praacuteticas de criaccedilatildeo e das faacutebricas de laticiacutenios O

nuacutemero de crianccedilas nascidas eacute o resultado das praacuteticas de controle de

sexo e nascimento A relaccedilatildeo funcional entre as praacuteticas culturais e

seus produtos retroage agraves culturas por meio do processo de seleccedilatildeo

(GLENN 1988 apud MARTONE e TODOROV 2007 p186)

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

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paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

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Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

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Contextualizaccedilatildeo da Transiccedilatildeo do Behaviorismo Radical Psicologia Teoria e Pesquisa

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PRUDEcircNCIO Maria Regina Andrade Leis e metacontingecircncias anaacutelise do controle do

Estatuto da Crianccedila e do Adolescente sobre praacuteticas juriacutedicas em processos de infraccedilatildeo de

adolescentes do Distrito Federal 2006 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) - Curso de Psicologia

Universidade de Brasiacutelia Brasiacutelia 2006

SIDMAN Murray Coerccedilatildeo e suas implicaccedilotildees Satildeo Paulo Editorial Psi 1995

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SKINNER B F Seleccedilatildeo por consequecircncias Revista Brasileira de Terapia

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34

lthttpwwwbfskinnerorgBFSkinnerBrazil_filesSelecao_por_consequenciaspdfgt Acesso

em 23 ago 2011

SKINNER B F Sobre o behaviorismo Satildeo Paulo Cultrix 1995

TEIXEIRA Rafaella Ribeiro Carandiru Anaacutelise da coerccedilatildeo no sistema prisional 2008

134 f Monografia (Bacharel) - Curso de Psicologia Faculdade de Ciecircncias Humanas e

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nalpdfgt Acesso em 09 jun 2012

TODOROV Joatildeo Claudio MOREIRA Maiacutesa Anaacutelise Experimental do Comportamento e

Sociedade Um Novo Foco de Estudo Psicologia Reflexatildeo e Criacutetica Brasiacutelia v 17 n 1

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23 ago 2011

TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de Ontem e de Hoje Psicologia Reflexatildeo

e Criacutetica Porto Alegre v 24 n 1 p186-194 2011 Disponiacutevel em

lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-79722011000100022gt

Acesso em 10 fev 2012

XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um

debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008

Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrscielophppid=S1414-

49802008000200013ampscript=sci_arttextgt Acesso em 10 fev 2012

29

Nesta proposta enfatiza-se a ldquoaccedilatildeo seletiva do ambiente externo sobre o

entrelaccedilamento possibilitando a recorrecircncia da relaccedilatildeo entre um conjunto de contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas e seu efeito agregadordquo (MARTONE e TODOROV 2007

p186)

Na segunda complementaccedilatildeo do conceito de metacontingecircncia enfatiza-se as funccedilotildees

de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaccedilamento de contingecircncias operantes

(GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e TODOROV 2007)

Metacontingecircncias satildeo relaccedilotildees entre contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas e um ambiente selecionador Juntamente agraves contingecircncias

comportamentais metacontingecircncias respondem pela seleccedilatildeo cultural

e pela mudanccedila evolucionaacuteria em organizaccedilotildees Em organizaccedilotildees

metacontingecircncias apresentam trecircs componentes contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas um produto agregado e um sistema

receptor O sistema receptor eacute o recipiente do produto agregado e

assim funciona como o ambiente selecionador das contingecircncias

comportamentais entrelaccediladas As contingecircncias comportamentais

entrelaccediladas cessaratildeo sua recorrecircncia se natildeo houver demanda pelos

seus produtos (GLENN e MALOTT 2004 apud MARTONE e

TODOROV 2007 p 187)

O elemento que as autoras adicionam nesta complementaccedilatildeo eacute o sistema receptor Para

Martone e Todorov (2007) assim como ocorre com o reforccedilamento do comportamento

individual ldquoambiente externo agraves contingecircncias fornece consequumlecircncias que poderatildeo selecionar

ou natildeo o conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas em questatildeordquo (p 187)

Para ilustrar o conceito acima descrito tomemos como exemplo o modelo punitivo O

produto agregado agraves contingecircncias entrelaccediladas seria a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e o sistema receptor

seria a sociedade e as autoridades detentoras de poder O modelo punitivo sobreviveraacute

somente se a puniccedilatildeo e coerccedilatildeo suprirem as exigecircncias necessaacuterias ao ambiente selecionador

(sociedade Estado) O produto agregado (puniccedilatildeo) pode ser modificado caso o ambiente

externo se modifique (a visatildeo equivocada da sociedade de que para corrigir os indiviacuteduos que

cometem crime se deve punir mais severamente o sistema penal adotar o processo de

reforccedilamento positivo para reinserccedilatildeo social do apenado etc) Construir um modelo

coercitivo e punitivo refere-se a um conjunto de contingecircncias comportamentais entrelaccediladas

que envolvem o comportamento de muitas pessoas educadores que reforccedilam que atos

desviantes devem ser corrigidos com muita severidade o Estado que institui as poliacuteticas do

sistema penal a poliacutecia e os carceraacuterios que exercem seu papel de ldquoproteger a sociedaderdquo

sempre com forccedila punitiva e violenta Neste caso os comportamentos dos indiviacuteduos estatildeo

relacionados uns aos outros e organizados em contingecircncias comportamentais entrelaccediladas O

produto agregado destas contingecircncias eacute a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo A linhagem cultural em

questatildeo pode ser observada quando da continuidade temporal da relaccedilatildeo entre 1) o

entrelaccedilamento de todos os comportamentos envolvidos na constituiccedilatildeo do modelo punitivo e

coercitivo 2) o produto agregado a proacutepria puniccedilatildeo e coerccedilatildeo e 3) o comportamento da

sociedade (avaliando positivamente esse modelo reforccedilando-o no sistema penal)

O que podemos perceber eacute que a recorrecircncia desta metacontingecircncia soacute ocorre pelo

fato de haver demanda do produto agregado por parte das sistema receptor ou seja o

ambiente externo ndash neste caso a sociedade e autoridade detentoras de poder- fornecem

consequumlecircncias que selecionam o conjunto de contingecircncias entrelaccediladas em questatildeo

Atualmente os analistas do comportamento se dedicam a estudos neste contexto e

para isso vem utilizando este conceito introduzido recentemente por Sigrid Glenn em 1986

Todorov e Moreira (2004) analisaram a Constituiccedilatildeo Brasileira sob o ponto de vista da

30

metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

ANDERY M A P A MICHELETTO N SEacuteRIO T M A P A anaacutelise de fenocircmenos

sociais esboccedilando uma proposta para a identificaccedilatildeo de contingecircncias entrelaccediladas e

metacontigecircncias Revista Brasileira De Anaacutelise Do Comportamento Brasiacutelia v 1 n 2

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CRUZ R N CILLO E N P Do Mecanicismo ao Selecionismo Uma Breve

Contextualizaccedilatildeo da Transiccedilatildeo do Behaviorismo Radical Psicologia Teoria e Pesquisa

Brasiacutelia vol 24 n 3 p 375-385 2008 Disponiacutevel em lthttp httpwwwscielobrpdfptpv24n3v24n3a15pdf gt Acesso em 16 mar 2012

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Acesso em 10 fev 2012

XAVIER Arnaldo A construccedilatildeo do conceito de criminoso na sociedade capitalista um

debate para o Serviccedilo Social Revista Kataacutelysis Florianoacutepolis v 11 n 2 p 274-282 2008

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metacontingecircncia Prudecircncio (2006) dedicou-se agrave anaacutelise do Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente sob a mesma perspectiva Martins (2009) tratou sobre metacontingecircncias nas leis

orgacircnicas da sauacutede

Existe ainda uma terceira complementaccedilatildeo que ocorre no ano de 2006 que

diferenciara processos seletivos que ocorrem em niacutevel individual (relaccedilotildees de

macrocontingecircncia) de processos seletivos que ocorrem em niacutevel cultural (relaccedilotildees de

metacontingecircncia) No entanto este trabalho toma o conceito de metacontingecircncia apenas

para apontar possiacuteveis anaacutelises para melhorias do modelo penal brasileiro

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Estudar a criminalidade pelo vieacutes penal evidencia o alinhamento entre as expectativas

sociais e as teorias que fundamentam as leis uma vez que esses saberes difundidos sobre

periculosidade e defesa social contribuiacuteram para maior adesatildeo das massas para a legitimidade

da truculecircncia do Estado seja pela via policial seja no cumprimento de pena A sociedade

natildeo estranha a precariedade do sistema punitivo pelo contraacuterio ela acredita que a melhor

forma de tratar um desviante eacute castigando-o e que isso faraacute com que ele natildeo cometa

novamente um crime

Empreguei a histoacuteria do Behaviorismo e a ecircnfase nas contingecircncias sobretudo

cultural como uma das vias de interlocuccedilatildeo entre a Anaacutelise do Comportamento e

Criminologia Criacutetica Utilizei esses saberes para evidenciar o fracasso do modelo punitivo

penal uma vez que existe uma internalizaccedilatildeo desse modelo como algo positivo para o bem-

estar da sociedade

Apresentei os princiacutepios baacutesicos da Anaacutelise do Comportamento e demonstrei como

suas concepccedilotildees vatildeo de encontro do modelo punitivo penal O reforccedilo negativo e a puniccedilatildeo

(positiva e negativa) figuram como controle aversivo e satildeo teacutecnicas que apesar de serem

imediatas tendem a gerar comportamentos adaptativos a ela como eacute o caso da agressividade

aleacutem de subprodutos emocionais como ansiedade medo rigidez intelectual que acabam

implicando nas relaccedilotildees sociais Aleacutem disso a puniccedilatildeo quando severa faz com que o

indiviacuteduo natildeo consiga mais enxergar outros modos de obter reforccediladores na vida

A coerccedilatildeo administrada pela retirada de reforccediladores positivos ou com a

apresentaccedilatildeo de reforccediladores negativos e pela puniccedilatildeo eacute um conceito criticado por Sidman -

teoacuterico analista do comportamento - e tambeacutem alvo das criacuteticas de Foucault em suas anaacutelises

sobre o modelo penal Sidman evidencia que o modelo coercitivo natildeo inibe comportamento

infracional natildeo impede a criminalidade e a violecircncia pelo contraacuterio incita efeitos colaterais e

predisposiccedilatildeo para contra-atacar Submetidos agrave coerccedilatildeo as pessoas soacute aprendem o que natildeo se

deve fazer aprendem o que eacute errado e como fugir das consequumlecircncias ruins de fazer algo

considerado errado na cultura atual Partindo destas premissas Sidman (1995) propotildee como

alternativa para coerccedilatildeo o controle por reforccedilamento positivo que apesar de ser confundido

com chantagem e estabelecer controle a longo prazo garante uma aprendizagem eficaz devido

agrave ausecircncia de efeitos colaterais aversivos

Ainda partindo da compreensatildeo de comportamento a partir dos processos de seleccedilatildeo

que a Anaacutelise do Comportamento adota podemos entender como esse modelo punitivo

mesmo fadado ao fracasso atravessa geraccedilotildees pois aleacutem de ser uma forma de controle social

que atende as expectativas da sociedade e dos interesses de controle das massas como discute

Foucault e criminoacutelogos criacuteticos satildeo traccedilos culturais selecionados (pois satildeo reforccedilados) e satildeo

transmitidos de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo

31

A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

ANDERY M A P A MICHELETTO N SEacuteRIO T M A P A anaacutelise de fenocircmenos

sociais esboccedilando uma proposta para a identificaccedilatildeo de contingecircncias entrelaccediladas e

metacontigecircncias Revista Brasileira De Anaacutelise Do Comportamento Brasiacutelia v 1 n 2

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fev 2012

CARVALHO NETO Marcus Bentes de Anaacutelise do comportamento behaviorismo radical

anaacutelise experimental do comportamento e anaacutelise aplicada do comportamento Interaccedilatildeo em

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A Anaacutelise do Comportamento oferece um conceito capaz de aprofundar a discussatildeo no

acircmbito de praacuteticas culturais a metacontingecircncia Este conceito nos leva a pensar sobre um

conjunto de contingecircncias que se entrelaccedilam e produzem um produto agregado que eacute seguido

de um ambiente selecionador externo que possibilita que esse entrelaccedilamento seja recorrente

Dessa forma podemos utilizaacute-lo como instrumento para descrever as relaccedilotildees

comportamentais que envolvem comportamentos de muitos indiviacuteduos os resultados

ambientais da interaccedilatildeo desses indiviacuteduos e a transmissatildeo de padrotildees comportamentais

atraveacutes do tempo A partir desse conceito aumenta as chances de se elaborar planejamentos

culturais mais adequados e eficazes do ponto de vista social

Tanto a leitura da Criminologia Criacutetica quanto da Anaacutelise do Comportamento auxilia

no desenvolvimento do argumento de que a puniccedilatildeo e a coerccedilatildeo produzem na verdade uma

sobrepena muito desejada pela sociedade mas que na realidade soacute faz funcionar a grande

engrenagem da criminalidade seletiva A sobrepena eacute justamente uma pena aleacutem da pena ou

seja da privaccedilatildeo da liberdade marcada por coerccedilotildees e condiccedilotildees subumanas nas prisotildees Por

fim acredito que a Psicologia pode avanccedilar nessa discussatildeo a partir da inserccedilatildeo do esquema

de reforccedilamento positivo como meio alternativo e mais eficaz para o modelo punitivo Antes

contudo eacute preciso orientar a sociedade sobre os efeitos colaterais da coerccedilatildeo que natildeo satildeo

favoraacuteveis para a proteccedilatildeo social pretendidas

Failure of punitive model and coercive applied to criminal system contributions of

critical criminology and analysis of behavior

Abstract

The high incarceration rate in Brazil highlights the urgent need to rethink the penalty model

adopted by the criminal justice system Its a social issue that is already being debated in

academic circles and is concerned not only anthropologists sociologists and students and

practitioners but also psychology Using the qualitative method of literature review this

paper intends to discuss with the aid of Criminology and Critical Analysis of Behavior the

failure of the penal system penalty model since the end punishments for those producing a

sobrepena those are serving a custodial sentence The Critical Criminology studies the

phenomenon of crime from the model of punishment and behavior analysis studies human

behavior from the processes of interaction and selection The development of this work was

anchored in the critical insights of Foucault to punitive and coercive methods adopted by the

model of public safety and Sidman who also shares this critique of coercion and use the

concept of metacontingency as the unit of analysis in the social sphere The articulation of

these perspectives enters the scene a criminal penalty model the critical current and raises the

possibility of a proposal for a critical analysis of this model based on the contributions of

Behavior Analysis

Key-words Critical criminology Behaviour Analysis Metacontingency

32

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

ANDERY M A P A MICHELETTO N SEacuteRIO T M A P A anaacutelise de fenocircmenos

sociais esboccedilando uma proposta para a identificaccedilatildeo de contingecircncias entrelaccediladas e

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