privatização pra que(m)? - cartilha da denem (2009)

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    Privatizao pra que(m)?

    NDICE

    1. A SADE NO PODE PAGAR POR ESTA CRISE

    1.1. Esta uma crise econmica1.2. O Papel da especulao Financeira

    1.3. O Papel dos governos1.4. Quem paga o preo da crise? ou, o que ns, estudantes, temos a ver comisso?

    2. A ASSISTNCIA SADE NOS DIAS ATUAIS

    2.1. Determinao social da doena2.2. A Assistncia Sade na contemporaneidade

    3. O SISTEMA NICO DE SADE

    3.1. Consideraes Iniciais3.2. Neoliberalismo e SUS3.3. SUS e o financiamento3.4. SUS e os Hospitais3.5. SUS e os Hospitais Universitrios3.6. SUS e os Modelos de Gesto

    3.6.1. O arcabouo terico a partir das necessidades do capital3.6.2.Organizaes Sociais (OSs)3.6.3.Fundaes Estatais de Direito Privado (FEDP)

    3.7. SUS e os Planos de Sade: Quem paga a conta?

    4. CONSIDERAES FINAIS E APONTAMENTOS

    LOGIAS E ANALOGIAS

    No Brasil a Sade vai bemMas o doente ainda vai mal

    Qual o segredo profundoDesta cincia original?

    banal: certamenteNo o paciente

    Que acumula capital.

    Antonio Carlos de Brito

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    Privatizao pra que(m)?

    1. A Sade no pode pagar por esta crise!

    1.1. Esta uma crise econmica

    A crise atual do Capitalismo tem deixadomuita gente confusa e tirando concluses

    superficiais sobre os acontecimentos. Algunsdizem que uma crise financeira, outros queseria uma crise de confiana e de crdito, eoutros emendam dizendo que a crise dos pasesdesenvolvidos e que por aqui chega apenas umamarolinha. O fato que, para entender arealidade, precisamos de um pouco mais deesforo e olhar para alm da superfcie dos fatos.

    Esta uma crise do sistema capitalista,uma crise que, apesar das suas especificidades, tpica do modo de produo capitalista e que

    ocorre em decorrncia da prpria dinmica dosistema. No um problema de credibilidade, ouporque algum emprestou dinheiro a quem nopodia pagar, ou porque existem banqueiros demau-carter que nos levam todos a sofrer.Pensar assim acreditar que as crises existempor causa do carter das pessoas e que o sistemacapitalista, caracterizado pelas relaes deexplorao, no tem nada de ruim, desde queseja gerenciado por pessoas boas.

    Em primeiro lugar, importante lembrarcomo ocorre a produo sob o regime deacumulao do capital. Toda produo de valor,riqueza, parte do trabalho. So os trabalhadoresprodutivos, nas mais diferentes empresas que,em seu conjunto, produzem absolutamente todaa riqueza. Mas essa riqueza no apropriada pelaclasse trabalhadora, ela serve para aumentarmais capital. Esse processo demonstra que ocapital s existe por causa do trabalho. Noentanto, como os capitalistas competem entre si,para produzir mais e vender mais, eles investemem novas tecnologias e compram mquinas cada vez mais modernas que eliminam postos detrabalho. Assim o capital vai matando quem oalimenta. Ao reduzir a quantidade de trabalhoempregada, ocorre uma tendncia reduo dataxa de lucro das empresas em geral. Essa acontradio central do capitalismo.

    1.2. O papel da especulao financeira

    Para fugir deste destino, quando esta

    tendncia de queda da taxa de lucro aparece,uma parcela dos capitalistas comea a transferirparte cada vez maior do seu capital para omercado financeiro, para tentar absorver valores

    criados na esfera produtiva por meio de juros eespeculao. No incio, todo mundo achainteressante, mas esse mercado financeirocomea a aumentar tanto o seu valor que esteno tem mais correspondncia com o valor realcriado pelos trabalhadores na esfera produtiva.A comeam a se manifestar os sintomas da crise.

    Os chamados ativos financeiros, que sevalorizaram ficticiamente na especulao, sedepreciam seus preos vo caindo, na medidaem que aqueles especuladores que os compraramcomeam a vender, para tentar realizar os ganhosespeculativos, at que as prprias empresasprodutivas, que tambm especulam no mercadofinanceiro, se vem em dificuldades de caixa para

    pagar seus compromissos e continuar investindo.Neste momento, a crise se instala de vez. Osinvestimentos param, as empresas comeam aquerer reduzir os custos, algumas quebram e, seno houver organizao e luta, normalmente ostrabalhadores, a imensa maioria da populao,pagam a conta.

    1.3. O papel dos governos

    Os governos tambm esto envolvidos

    neste processo de acumulao de capital. OEstado tem dvida pblica e, para continuargerenciando esta dvida, aumenta-se cada vezmais a carga tributria, que paga,majoritariamente, pelos trabalhadores para opagamento dos juros, enquanto a retirada dedireitos, a precarizao e as privatizaesavanam na Educao, na Sade, na Previdncia,caracterizando aquilo que se convencionoudenominar de polticas neoliberais. Importanteressaltar neste contexto o papel da Desvinculaodas Receitas da Unio (DRU), instrumentocriado pelo governo FHC e perpetuado pelogoverno Lula, que retira 20% de tudo que arrecadado pelo Estado e deveria ser investidonas polticas sociais de carter universalizante,para justamente arcar com os juros da dvidapblica.

    Alm disso, como todos podem conferirna grande mdia, os Bancos Centrais e osgovernos do mundo todo e do Brasil, j gastaramcentenas de bilhes de dlares para salvar

    empresas e bancos. No nos enganemos, esteEstado, com ou sem bolsa-famlia, ainda serve auma minoria da populao.

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    Privatizao pra que(m)?

    1.4. A Crise mundial

    Como dissemos, o sistema capitalistaentra em crise porque no seu modo de agir huma contradio que no ser resolvida: aproduo coletiva do valor pelo trabalho e a suaapropriao privada pelo capital. Agora importante ressaltar porque a crise ocorreu nestemomento.

    Depois de dcadas de avano dainternacionalizao da produo ou daglobalizao o mundo inteiro participa doprocesso de produo de valor. Uma empresacapitalista sueca, ou norte-americana, produzuma parte do produto na Sucia, outra noMxico, outra no Brasil, e vende no mundo todo. Assim, pela produo, o capitalismo ligou o

    mundo todo no mesmo processo de acumulao.Tambm a especulao financeira foiglobalizada, j que se pode aplicar no mercadofinanceiro mundial 24 horas por dia basta terdinheiro. Esse conjunto de fatores ligou todas aspontas do processo de produo e fez com que acrise, que comeou no EUA, rapidamenteatingisse todo o mundo.

    1.5. Quem paga o preo da Crise? ou oque ns, estudantes, temos a ver com

    isso?Normalmente, quando acontecem crises

    como esta os capitalistas buscam se salvar. Essasalvao pode se dar atravs das fuses dasempresas, ou seja, com a centralizao de capital;

    pode se dar com a estatizao de empresas e atransferncia de recursos pblicos para ascorporaes e os bancos, ou seja, a socializaodos prejuzos; mas pode se dar principalmenteconvencendo os trabalhadores de que elesprecisam fazer sua parte para que todospossamos sair desta crise. Este ltimo

    instrumento j est em operao no Brasil,quando o governo Lula j acena com apossibilidade de um novo pacto social.

    As conseqncias deste processo ser oavano das privatizaes na Educao, Sade ePrevidncia, antes direitos garantidos peloEstado com financiamento pblico, hoje novosespaos para o capital se valorizar. Ser o avanoda precarizao dos servios pblicos comoEducao, Sade e Previdncia, materializando

    servios qualitativamente diferentes para osdiferentes segmentos da sociedade. Quem podeconsumir tem acesso a uma boa educao, uma boa assistncia Sade. Quem no podeconsumir tem acesso a uma educao pobre, e auma assistncia Sade pobre cesta bsicapara a sade, que no garante acessibilidade aservios de alta densidade tecnolgica. Tudo issonuma conjuntura de reduo dos direitostrabalhistas, de flexibilizao das relaes detrabalho, de reduo de salrios, de aumento dodesemprego etc. Qual o impacto desta realidadena sade e na doena da populao? Numapopulao brasileira em que 60 dos 100 milhesde trabalhadores esto em situao deinformalidade? Numa populao mundial emque um tero das pessoas est fora da esfera daproduo e fora da esfera do consumo?

    A SADE NO PODE PAGAR POR ESTA CRISE

    2. A Assistncia Sade nos dias atuais

    2.1. Determinao social da doena

    Para responder s indagaes acima,devemos nos ater por um momento no debate dadeterminao do processo sade-doena e dasnecessidades dos grupos humanos. Devemosentender que toda necessidade nos gruposhumanos determinada objetivamente e seexpressa de maneira subjetiva, j que todanecessidade subjetiva s pode ser construda apartir de uma necessidade concreta epossibilidades historicamente construdas.

    Se entendermos a sade como a condioque permita a realizao do humano, ou odesenvolvimento mximo de seu potencial, deacordo com as possibilidades sociais dadas pelodesenvolvimento dos meios de produo, asnecessidades sero entendidas como um patamaruniversal a partir do qual cada um poder sedesenvolver. Por outro lado, numa sociedademarcada pelas relaes de explorao, que no

    permite o acesso igualitrio aos produtos dacivilizao, como conhecimento, novastecnologias, educao, assistncia sade,moradia, alimentao etc., necessidade de sade

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    Privatizao pra que(m)?

    pode ser entendida apenas como ateno restritaa determinadas situaes que impeam a livreexplorao de alguns, ou mera satisfao dasensao de abandono, falta de carinho.

    Para ilustrar a determinao em ltimainstncia sobre o processo sade-doena do

    modo como a sociedade se organiza paraproduzir e reproduzir seus meios de subsistncia,podemos citar a Peste Negra, que dizimou maisde um tero da populao europia durante oFeudalismo. Naquele perodo histrico, comrestritas trocas comerciais e a populao vivendonos feudos, toda produo alimentar eraestocada nos mesmos, criando condiessatisfatrias para a reproduo de roedores, vetordo patgeno. Ou podemos analisar a tuberculosecomo epidemia durante o incio do processo de

    industrializao. Obviamente o bacilo datuberculose percorreu a humanidade ao longo dasua histria, mas somente com as condiesgeradas pelo processo de industrializao, asaber, jornadas de trabalho de 18 horas, inserodas crianas no processo produtivo, condies demoradia precrias, sem iluminao e midas,que o bacilo encontrou condies de sereproduzir e superar a barreira imunolgica dostrabalhadores.

    Podemos tambm analisar em queperodo histrico a expectativa de vida dapopulao dos pases centrais praticamentedobrou. Certamente foi durante o Capitalismo,mas em um momento histrico especfico,caracterizado por conquistas dos trabalhadores, eexpresso no Estado de Bem Estar Social, em queos produtos da civilizao minimamente foramuniversalizados. Para finalizar, poderamosanalisar em que perodo histrico existe maiorqueda da mortalidade infantil nos pasescentrais, se foi na criao da vacina contra

    poliomielite, ou se quando os trabalhadoresconquistaram o direito licena-maternidade.Para espanto de alguns, o maior ndice de quedada mortalidade infantil, mesmo somando asquedas relativas s demais vacinas hojeobrigatrias para o lactente, se d quando astrabalhadoras conquistam a licensa-maternidade.

    O fato que nos dias de hoje existemcondies objetivas, dadas pelo desenvolvimento

    dos meios de produo, para o desenvolvimentomximo do potencial de cada um, mas estapossibilidade limitada pelas necessidades dasclasses dominantes. Hoje temos mquinascapazes de perfurar rochas e que no exponhamos trabalhadores de forma intensa inalao dapoeira de slica. Mas por uma questo

    econmica, na abertura de tneis, estradas eminerao, persistem os processos primitivos,expondo os trabalhadores a leses irreversveisnos pulmes. Sabe-se, ainda, atravs de estudos,que o exame clnico da mama, ou mesmo o auto-exame, no tem impacto nos ndices demortalidade e sobrevida das pacientes comcncer de mama, por detectar ndulos emestgios avanados. Sabe-se tambm que oexame que tem impacto na sobrevida destasmulheres a mamografia. Porm, no Brasil,

    cerca de 90% dos mamgrafos encontram-se disposio daqueles que podem consumi-lo,daqueles que podem pag-lo. E apenas 10% dosmamgrafos encontram-se disponveis paraaqueles que dependem do Estado.

    2.2. A Assistncia Sade nacontemporaneidade

    Como vimos, o direito sobrevivncia esua possibilidade de realizao so socialmente

    determinados conforme o modo de produo, ograu de desenvolvimento das foras produtivas, ainsero dos diferentes grupos no processo deproduo em cada momento histrico e peloacirramento da luta de classes. Num momentohistrico como o que vivemos, marcado peloimenso desenvolvimento das foras produtivas,diante do qual, mantendo-se as relaes deexplorao, grande parte dos trabalhadorestorna-se dispensvel o capital mata quem oalimenta, ao eliminar os trabalhadores e inserirmquinas - constitui-se, assim, uma grandemassa de sobrantes, em que a possibilidade derealizao da sobrevivncia deste grupo estseriamente ameaada.

    A expresso deste iderio se d nadefinio, pelo Banco Mundial, daquilo que seriaa cesta bsica para a sade, a que deveria terdireito aquela parcela da populao que notivesse qualquer possibilidade de consumirlivremente os servios de sade.

    3. O Sistema nico de Sade (SUS)

    3.1. Consideraes iniciais

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    Privatizao pra que(m)?

    O SUS , sem dvida, produto deconquistas histricas, mas nos cabem aquialgumas consideraes sobre este processo.Sabemos que as principais bandeiras cravadas naConstituio Federal de 1988, comouniversalidade e integralidade na assistncia Sade foram gestadas dentro daquilo que se

    convencionou chamar de movimento da ReformaSanitria. Obviamente seria minimalista dizerque este movimento foi homogneo na defesa deseus contedos, suas bandeiras e suas prticaspolticas. Seria ingenuidade, todavia, pensar queno houve um projeto hegemnico, que venceuna defesa de suas bandeiras e sua prtica poltica.

    Este projeto hegemnico se caracterizouprincipalmente pela centralidade da lutainstitucional, que tem suas limitaes, j que,

    apesar de garantir no papel a universalidade e aintegralidade na assistncia Sade, a realidadeque temos a de um Sistema de Sade paraquem pode consumir. E outro Sistema de Sadeseletivo para aquela poro da sociedadesobrante, os trabalhadores desempregados, malremunerados, superexplorados, terceirizados.Isto, pois, avanos ou retrocessos nauniversalizao dos produtos da civilizaodependem da correlao de foras emdeterminada sociedade.

    Pudemos observar que a correlao deforas na formulao de um Sistema de Sadeque seja universal e integral encontra-sedesfavorvel para os trabalhadores. Como citadoacima, nos encontramos num perodo histricocaracterizado pela globalizao, ou seja, pelainternacionalizao da produo e das finanas,alm de um desenvolvimento das forasprodutivas (novas tecnologias, mquinas etc.)que no podem se desenvolver plenamente, poisno existiria uma demanda solvel, no existiria

    possibilidade de consumir tudo aquilo que podeser produzido.

    Em outras palavras, atualmente temos umprocesso em que cada vez mais e mais ostrabalhadores so retirados do processoprodutivo com a incorporao de novastecnologias, resultando numa dificuldade degerar valor na esfera da produo; em que as 63mil corporaes possuem 690 mil filiaisespalhadas pelos pases perifricos como o

    Brasil, local em que tem a possibilidade de seutilizar das melhores disponibilidades dematrias-primas, facilidades creditais e fiscais,precarizao do trabalho e um movimento

    sindical desestruturado; em que a especulao,as taxas de juros, os swaps, bnus e derivativosem geral se hipertrofiam, na expectativa fictciade gerar valor; em que temos a formao dosblocos econmicos como expresso de uma novapartilha econmica do mundo; em que temos osorganismos multilaterais, como a Organizao

    Mundial do Comrcio (OMC), o FundoMonetrio Internacional (FMI) e o BancoMundial, como instrumentos de interessesestratgicos do capital. Para finalizar, temosforas produtivas suficientes para universalizaros produtos da civilizao para o conjunto dasociedade, mas um tero da mesma no tempossibilidades de trabalho ou de consumo, sendoque pela primeira vez na histria universal aeconomia declara que a maioria dos sereshumanos desnecessria e descartvel, pois, na

    economia contempornea, o trabalho no criariqueza, os empregos no do lucro, osdesempregados so dejetos inteis einaproveitveis.

    3.2. Neoliberalismo e o SUS

    Os reflexos destas transformaeseconmicas e do trabalho vo atingir os outrossetores da sociedade, dentro daquilo que seconvencionou denominar neoliberalismo. A crise

    do Capitalismo passa a ser explicada, pelosneoliberais, pelo excesso de gastos do Estado,pelo poder excessivo dos trabalhadores e peloselevados salrios, que inviabilizariam ocrescimento da economia. Preconiza-se, assim,um Estado menos interventor, que reduzasubstancialmente os gastos sociais ao mnimonecessrio para viabilizar a aceitao social danova situao. Um Estado forte apenas pararomper o poder dos trabalhadores e no controledo dinheiro, indicando as medidas deestabilidade monetria como meta suprema dos

    governos. Para tal, a receita neoliberal passou apreconizar abertamente a conteno dos gastoscom bem-estar, a restaurao da taxa naturalde desemprego (exrcito de reserva) e a reduodos impostos sobre os rendimentos mais altos,alm das privatizaes.

    Sistematizando o conhecimento, devemosentender: a) gastos sociais mnimos eestabilidade monetria, como sendo o uso doexcedente econmico pelo Estado, obtido pelos

    impostos pagos pelos trabalhadores, para manteras altas taxas de juros da dvida pblica,retirando assim investimentos na Educao,Sade, Previdncia, Moradia etc., precarizando o

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    setor pblico, e elaborando o discurso daineficcia do Estado; b) flexibilizao eprecarizao das relaes de trabalho, comosendo a possibilidade do aumento da exploraodos trabalhadores; c) privatizaes como sendo aabertura de novos espaos pra valorizar odinheiro, como a Educao, a Sade, a

    Previdncia, as rodovias, as empresas estataisetc.

    Com o argumento da necessidade deequilibrar as contas pblicas, os sucessivosgovernos aps a redemocratizao do pas (queredemocratizao!!!), tem sistematicamenteadotado medidas no sentido de reduzir asdespesas da mquina administrativa do Estado,levando a um sucateamento e amputaoinconseqente de servios e organizaes

    pblicas, ao mesmo tempo em que aumenta ovolume de recursos destinados ao pagamento de juros, de encargos e do principal da dvidaexterna e interna.

    No campo da sade, parece que se querreabilitar, a partir dos pressupostos elucidadosacima, para os pobres, um modelo de ateno sade com centralidade absoluta na atenobsica, com o que devemos concordar, desde queisto no signifique o impedimento do acesso aosprocedimentos mais complexos sempre quenecessrios. Negar populao, que custeia osistema atravs dos impostos, o acesso a estesprocedimentos to nefasto quanto submeter osistema ao consumo irracional dos mesmos,atendendo voracidade do capital. Concentrar-sena ateno primria no equvoco tcnico, opo poltica oposta construo de sistemasuniversais e integrais. Uma opo poltica queafirma que para alguns suficiente o mnimo, omenos sofisticado, o elementar, o primrio, ocomum, o geral ou o arcaico e para os outros, os

    mais privilegiados, os que tm acesso riquezamaterial e podem pagar pelos servios de sade,estes podero usufruir do avano cientfico etecnolgico, da sofisticao, da qualificao, daespecializao e do moderno.

    A dicotomia entre preveno x cura,ateno primria x ateno terciria,simplificao x sofisticao, no leva emconsiderao o quadro sanitrio nacional. Se, deum lado somos campees em doenas

    infectocontagiosas como a tuberculose, ahansenase, a leptospirose, etc. onde a preveno fundamental, por outro lado, as principaiscausas de morte, incluindo os ricos e os pobres,

    so o enfarte, o derrame, a pneumonia, abronquite, as neoplasias, etc. doenas que exigemo uso de tecnologia mais onerosa, de intervenocurativa e de tratamentos mais sofisticados. Opressuposto de que as doenasinfectocontagiosas predominam na populaopobre e as crnico-degenerativas nos estratos

    mais ricos falso e leva aes equivocadas. Asduas categorias de doenas atingempredominantemente os mais pobres, at porqueso a maioria e os mais vulnerveis. Por isto, umpacote de cesta bsica para a Sade, comoprope o Banco Mundial, no do conta destarealidade.

    No final, quem pode pagar convnio nemsempre est satisfeito, sofre uma srie derestries e no tem assistncia ampla, exceto a

    custos altos. E o restante da populao, semcondies financeiras, ficar merc de umaassistncia sade gratuita restrita assistncia bsica (primria), sujeito a filas maiores queaquelas j existentes, seja pela falta de vagas paraconsultas ambulatoriais e/ou internaes, sejapela falta de funcionrios amedrontados com aviolncia nas regies dos postos de sade, almde desmotivados com os salrios e condies detrabalho. Por sua vez, os diagnsticos, estaromais atrasados que o habitual, interferindo notratamento e prognstico das doenas. Tudo istoacontecendo em escalas cada vez maioresenquanto, por lei (1988), todos os indivduos tmigual direito sade, garantido pelo Estado.

    No pretendemos fazer apologia daassistncia predominantemente hospitalar,porm, nas condies materiais em que asociedade se encontra, equivocada sua reduoabrupta e isolada, sem o respaldo de mudanasna estrutura econmica da sociedade. Ademais,as unidades bsicas so insuficientes perto do

    crescimento urbanopopulacional com o qualcrescem rpida e assustadoramente as mscondies de vida. Onde poderia haver umtrabalho integrado dos profissionais da sadecom a comunidade, atravs de visitasdomiciliares, controles de epidemias,acompanhamento de pacientes com tuberculoseou hansenase, preveno de doenas da infncia,incentivo ao aleitamento materno, etc., hoje seencontra um servio ruim ou a ausncia dele: ouforam fechados, ou tornaram-se pronto

    atendimento, ou faltam profissionais.Os programas de demisses voluntrias,

    ms condies de trabalho e baixos salrios

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    com sade pouco mais de 3%, j nos pasescentrais, este valor chega a12% do PIB (dados doConselho Nacional de Sade e do Ministrio daSade).

    Em geral, o dinheiro destinado sadeno chega, integralmente, aos servios pblicos,

    como observamos com a questo da CPMF. Almdisso, pode-se dizer, que o endividamentoexterno foi exponenciado nos anos 90, pois advida externa brasileira evoluiu de um total de64 bilhes de dlares em 1980, para 145,66 bilhes em 1994, no incio do Plano Real,chegando hoje a cerca de 250 bilhes. Nooramento de 2000, a sade foi contempladacom 5,99% do oramento, ao passo que parapagar a dvida externa (juros, encargos eamortizaes) previu-se cerca de 45% do

    Oramento federal (dados do Senado Federal).

    MAIS VERBA PBLICA PARA A SADECONTRA A DRU

    PELA APROVAO DA EC 29

    3.4. SUS e os Hospitais

    A insero, hoje, no modelo neoliberalimplica muito mais em no estar inserido, isto, em estar desempregado, que por sua vez

    implica na falta de poder de compra mnimo paraserem mantidas condies de existncia, ousubsistncia, ou sobrevivncia, algo que no estocorrendo. O Estado mnimo neoliberal deixaque a readequao do trabalho resolva-se sob ainfluncia da mo invisvel.

    Os governos neoliberais procuramdesempenhar seu papel mnimo e ideolgico,em particular na rea da sade que o setor quenos interessa, fazendo desmanchar-se aestrutura hospitalar construda ao longo dosculo XX, dividindo-a e/ou entregando-a asiniciativas privadas, seguindo o modelopreconizado, defendido e implantado desde adcada de 80 nos EUA e Inglaterra.

    Antes de esmiuar como este processo sedesenvolveu em um pas perifrico como o Brasil,devemos entender que a assistncia sade, emuma sociedade caracterizada por relaes deexplorao, permite realizar o lucro da indstriafarmacutica e de aparelhos hospitalares, da

    explorao da fora de trabalho em sade nosservios de sade, como os hospitais, e de criar oespao de mercado para os seguros e planos desade.

    Podemos observar que nos momentosiniciais de estruturao de uma formao socialcapitalista, o Capital repassa ao Estado aresponsabilidade por reproduzir a infra-estruturanecessria para a produo. Desde o provimentode energia, a instalao das redes virias, dos

    meios de comunicao etc., at a reproduo dafora de trabalho. Os recursos para esta tarefaque assume o Estado so originrios todos daexplorao do trabalhador e so transferidos viaimpostos pagos, parte pelos trabalhadores. Umavez estabilizada esta reproduo, passa a tornar-se interessante para o capital, que, ento, buscaretir-la do jugo do Estado.

    Para exemplificar o exposto acima, vamosanalisar como se estruturou a rede de hospitais

    privados no pas e os ataques que os serviospblicos vm sofrendo com a implantao daspolticas neoliberais. A rede hospitalar privada,desde 1945, sempre foi superior rede estatal.Em 1945, a porcentagem de leitos privadosrepresentava 55% dos leitos totais, enquanto em1975, os leitos privados passam a representarquase 68% dos leitos totais. Atualmente, o setorprivado ocupa quase 71% dos leitos totais.

    Convm ressaltar que a expanso da redehospitalar privada, principalmente durante osgovernos militares, ocorreu financiada comrecursos pblicos, atravs da criao dosdenominados Plano de Pronta Ao (PPA) e doFundo de Apoio ao Desenvolvimento Social(FAS). Como primeira constatao, podemossistematizar da seguinte maneira: a redehospitalar no pas predominantemente privada,fruto de um processo histrico de privatizao, efoi estruturada hegemonicamente comfinanciamento pblico, pago pelos trabalhadores.

    Cabe agora analisar a forma como asredes hospitalares privadas relacionam-se com oEstado. Esta relao pode se dar atravs daprestao de servios das redes privadas aopaciente que incapacitado de consumir osprodutos da assistncia sade. Isto ocorreprincipalmente com aquelas empresas mdico-hospitalares chamadas segmento de baixatecnologia, que no conseguiram se modernizarpara disputar o consumo daqueles pacientes quepodem pagar, diretamente ou atravs dos planos

    de sade. A maior expresso disso seriam asSantas Casas de Misericrdia.

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    Privatizao pra que(m)?

    Esta situao traz uma srie deproblemticas na universalizao da assistncia Sade. Estas empresas mdicas, para obteremseus lucros, dependem substancialmente dosrecursos pblicos repassados pelo Estado para asade, atravs das polticas de sade. Numexemplo drstico desta situao, poderamos

    citar a cidade de Natal, que passa por uma crisesem precedentes na Sade e que cerca de 70%dos recursos pblicos destinados Sade domunicpio destinam-se a este tipo de empresamdica.

    Numa conjuntura de implantao daspolticas neoliberais, em que os recursos pblicospara as polticas sociais, em especial a sade, socada vez menores, podemos imaginar aqualidade dos servios de sade nestes hospitais

    privados. Alm disso, estas empresas mdico-hospitalares definem os procedimentos queprestaro ao Estado, dando prefernciaobviamente queles procedimentos maisrentveis. Com isso, aquela parcela da populaocorrespondente a 80%, incapaz de consumirassistncia Sade, diretamente ou atravs dosplanos de sade, sofre srias restries de acessoaos servios de sade secundrios e tercirios,limitando-se seu acesso cesta bsica para asade.

    Enquanto isso, aquelas empresas mdico-hospitalares que se modernizaram, centralizandocapital, denominadas segmento de altatecnologia, se incorporam cada vez mais SadeSuplementar, prestando servios queles quepodem pagar. Poderamos exemplificar comomodelo o Hospital Srio Libans, em So Paulo Analisamos acima, de maneira superficial, omovimento das empresas mdico-hospitalaresat os dias atuais. Cabe agora analisar maisprofundamente o papel do Estado neste

    processo.

    A reforma do sistema hospitalar e aestruturao de um Sistema focalizado tm seupice nas mudanas propostas pelo Ministrio da Administrao e Reforma do Estado (MARE -1995), seguindo as cartilhas impostas pelosorganismos multilaterais como o FMI e o BM.Desde ento, para resolver o problema daprocura por servios hospitalares, o Ministrioda Sade recomendava a prtica de consrcios

    intermunicipais e interestaduais e atransformao de hospitais estatais emorganizaes sociais, isto , entidades pblicasno estatais de direito privado, com autorizao

    legislativa para celebrar contratos de gesto como poder executivo e assim participar dooramento.

    Uma tendncia atual dos hospitaispblicos, atravs do governo Lula, atransformao em fundaes estatais de direito

    privado, possibilitando autonomiaadministrativa e financeira. Temos um processo,portanto, de privatizao da rede hospitalarestatal que ainda sobrou. Uma privatizao frutodas necessidades de abrir novos espaos paravalorizar o capital.

    Assim, o mau gerenciamento e a falta derecursos criam possibilidades do governotransferir, em parceria ou no, asresponsabilidades com a sade pblica s

    organizaes sociais entidades privadas- ous fundaes estatais de direito privado, quepassam a assumir a direo e determinar osrecursos para sade. No plano ideolgico, estasprivatizaes so justificadas pela ineficcia dopblico e a necessidade de novos modelos degesto.

    O discurso neoliberal defende, como jcolocado, a autoregulao do mercado atravs dacompetitividade, da boa administrao(managed care), e reutiliza o princpio liberal doindividualismo como fundamento para aconstruo de uma nova sociedade maiscompetitiva, sob argumento de que oautoritarismo estatal tornou a sociedadepassiva e habituada com a improdutividade dogoverno. Portanto, uma sociedade que tambmtem culpa e onde os pobres so culpados pelapobreza; os desempregados pelo desemprego; oscorruptos pela corrupo; os favelados pelaviolncia urbana; os sem terras pela violncia nocampo; os pais pelo mau rendimento escolar dos

    filhos; os professores pela pssima qualidade dosservios educacionais.

    A reduo do papel do Estado naprestao de servios pblicos, em qualqueresfera da sociedade, respalda-se, segundo seustericos e dirigentes, na necessidade detransformar as instituies estatais emorganizaes mais competitivas e, portanto, quesigam as leis de mercado. Entretanto, comoequacionar assistncia sade e lucro?

    Modelos como do governo de Tatcher(Inglaterra) que implantaram um modo deassistncia pblica - denominado quango:

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

    11/2019

    Privatizao pra que(m)?

    quasi autnomas non- governamentalorganizations -, tm servido de referncia ou,guia, para os governantes, inclusive brasileiros.Hoje so mais de 5.000 destas organizaes, cujareceita da ordem de 70 bilhes de dlares, ondeos quangocratas so geralmente nomeados porinteresses polticos ou amizade, no se sentem

    servidores pblicos e, as quango, so menossujeitas ao controle externo. Com isso, os problemas de nepotismo, uso de interessespessoais, m gesto, inadequada aplicao derecursos e, mesmo a corrupo, se mantm.

    Uma das primeiras conseqncias daspolticas brasileiras de privatizao no setor dasade pblica (polticas de parceria - dcada de90), nos nveis estadual e municipal, e emparticular na capital paulista foi o

    superfaturamento. As cooperativas privadas ouas organizaes sociais- tambm privadas -,tinham possibilidade de comprar medicamentossem licitao pblica, superfaturar despesas eescapar da fiscalizao dos conselhos de sade.

    O resultado j se sabe: desmonte dasredes hospitalares estatais e a submisso daassistncia terciria lgica de acumulao docapital. Segundo dados do IBGE (1999), houveuma reduo de leitos para internaes no Brasilentre 1992-1999 de 27%: de 544.357 baixou para484.945. Segundo a recomendao da OMS, quehabitualmente no seguida pelo Banco Mundialnaquilo que no interessa ao mercado, devehaver 4 leitos /1000 habitantes. Portanto, umdficit de mais de 100 mil leitos no Brasil. Umapoltica que chega aos limites da crueldade: querprivatizar at a dor e fazer da doena e dosofrimento humanos um negcio lucrativo

    Desta forma, o Sistema de Sadeconsolida-se como um sistema caracterizado pelo

    estabelecimento de um pacote de benefciospadro (cesta bsica para a sade); limitaodo acesso servios de ateno terciria para80% da populao; controle da oferta de serviospblicos em funo dos custos; adoo de formasde co-pagamentos; favorecimento iniciativaprivada; incentivo concorrncia na prestao deservios ambulatoriais e hospitalares,envolvendo indistintamente os setores pblico eprivado e; do papel regulador do Estado, com odeslocamento de atribuies para entidades de

    direito privado. Favorece-se assim a acumulaode capital por um segmento da populaorestrito, e a falta de acesso quilo que j foi

    produzido pela humanidade na assistncia sade para a maioria da populao.

    3.5. SUS e os Hospitais Universitrios

    Os Hospitais Universitrios cumprem umimportante papel na assistncia Sade dapopulao, na Educao em Sade e na produode conhecimentos, j que est diretamenterelacionado Universidade. So alvo, como osoutros setores estatais, das polticas deprecarizao dos servios pblicos e deprivatizao dos direitos sociais, transformadosem mercadorias para quem pode consumir.

    A realidade dos Hospitais Universitrios,portanto, no difere da realidade da assistncia Sade no pas. O resultado deste processo

    culmina naquilo que conhecemos como crisedos hospitais universitrios, que tem mobilizadoestudantes e trabalhadores na defesa daqualidade e da administrao pblica, com ofinanciamento adequado para os processoseducacionais (diante da falta de docentes,preceptores e locais adequados para a Educao),assistncia Sade e produo de conhecimentonestes hospitais.

    A privatizao deste setor tem-se dado

    principalmente atravs da terceirizao dagesto, com as Fundaes Privadas de DireitoPrivado, ditas Fundaes de Apoio. Estasempresas abrem possibilidade, atravs da gestodos recursos pblicos, de criar novos espaospara se valorizar o capital, precarizam as relaesde trabalho, alm de abrir condies para aapropriao privada dos conhecimentosproduzidos no interior da Universidade Pblica,que corresponde a 80% do conhecimentoproduzido em nossa sociedade. Um vasto campopara as corporaes ligadas produo de

    medicamentos, alimentos, vacinas e etc. Almdisso, as fundaes cobram uma taxa paraadministrar os recursos pblicos, quecorresponde a aproximadamente 9% do total queadministra.

    No caso do Hospital das Clnicas ligado Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto daUSP, gerido pela fundao FAEPA, que recebe doestado de So Paulo e do governo federalaproximadamente o montante de recursos que o

    municpio de Ribeiro Preto arrecada, podemosimaginar o montante de dinheiro que fica retidonestas empresas.

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

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    Privatizao pra que(m)?

    essencial analisarmos maisprecisamente o que vem ocorrendo nos HospitaisUniversitrios. Para isso, vamos utilizar comocampo de estudo o complexo Hospitalar ligadoao campus de So Paulo da USP (HC-USP) e aocampus de Ribeiro Preto da USP (HCRP-USP),geridos atravs deste modelo fundacional. Os

    complexos hospitalares das Clnicas,patrimnio pblico construdo historicamentecom recursos pblicos, provindo dostrabalhadores, atende anualmente milhes depessoas. Em 1996 foram 931 mil consultasambulatoriais, 30 mil cirurgias, 57 milinternaes no HC-USP, enquanto em 2007foram 600 mil consultas, 33 mil internaes noHCRP-USP.

    Entretanto, no bojo das medidas

    neoliberais, est o atendimento desigual sade,privilegiando os que podem pagar (convnios eparticulares). Em geral, nos servios pblicos desade existem placas indicando: pacientes SUSe pacientes Particulares e Convnios. E oprivilgio vai mais alm: h prioridade noatendimento de quem paga (fura-fila), e atexclusividade nos quartos de internao.

    Os dirigentes mdicos ou no - afirmamque o mercado dita as regras do jogo, emborana constituio de 1988 conste que a assistncia sade no SUS deva ser prestada com igualdade,sem preconceitos e privilgios de qualquerespcie. Uma das afirmaes contraditriasdesses dirigentes refere-se privatizao comoinstrumento para aumentar a receita. Mas umaanlise minuciosa mostra claramente quanto sopequenos os recursos provenientes dosconvnios de planos de sade ou de outrasempresas privadas: em 1995 o Hospital dasClnicas (H. C. USP) recebeu 238 milhes dereais, enquanto os convnios ou outras empresas

    pagaram pelos servios prestados, 1,17 milhode reais, o que corresponde a 98% de verbaspblicas no HC-USP. Dados de 2007 do HCRP-USP mostram tendncia semelhante, sendo que97,5% das receitas provem das verbas pblicas,entretanto, o privilgio no atendimento dopaciente particular ou conveniado.

    Pode-se afirmar, assim, que nenhumamudana efetiva foi adotada para impedir oprogressivo desmanche da assistncia sade

    gratuita universal, igualitria. Sabe-se, ainda,que os Hospitais Universitrios possuem papelprivilegiado na assistncia Sade de altadensidade tecnolgica, que necessitam de

    assistncia mais demorada, como ostransplantes, pacientes com cncer,medicamentos excepcionais, pacientes com Aidsetc. Estes procedimentos pouco interessam aosetor privado, como os planos de sade, j queso pouco rentveis. Assim, toda populaoacaba por usar os servios destes hospitais com

    financiamento pblico, podendo ou noconsumir um plano de sade. Sabidamente, hdcadas, o respaldo qualidade da assistncia sade vem da integrao entre ensino-pesquisa eassistncia de vrias reas.

    Outras colocaes importantes a seremfeitas, do papel que as Fundaes possuem nosHospitais Universitrios, dizem respeito quebrado regime de dedicao integral docncia e pesquisa (RDIDP) nas Universidades Pblicas, j

    que permitem que os docentes deixem de sededicar carreira acadmica exclusivamentepara se dedicar aos atendimentos particulares eaos convnios. Alm disso, podemos pontuar apossibilidade de organizao de cursos pagospor parte destas Fundaes, que utilizam oprestgio destas instituies pblicas junto sociedade, o corpo docente das mesmas, o espaopblico, e o conhecimento produzidocoletivamente com financiamento pblico, parapromover cursos pagos de aprimoramentoprofissional, especializaes nas diversas reasda sade etc.

    O que hoje ocorre com o HC-USP e com oHCRP-USP resultado da contnua implantaodo conjunto de polticas neoliberais (anti-sociais) em curso desde a dcada de 70 eavalizada pelos sucessivos governos. Trata-se,mais uma vez, de um novo governo apenas comuma roupagem diferente, isto , ele mantmuma linha de ao que radicalmente a mesma,com desemprego, alterao nas leis trabalhistas e

    do direito aposentadoria, - interferentes diretosno poder aquisitivo dos trabalhadores. Como jressaltado, o financiamento para os HospitaisUniversitrios segue a mesma tendncia dofinanciamento para a assistncia Sade emgeral.

    Ademais, quando o lucro no o esperadopelas empresas, sabemos quem paga a conta coma socializao dos prejuzos. Foi o que aconteceucom a Fundao que se apoiava no HC-USP,

    Fundao Zerbini, cuja dvida socializada com ostrabalhadores chegava a 200 milhes de reais em2006, ano em que estas informaes chegaramat a grande mdia.

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

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    Privatizao pra que(m)?

    POR UMA GESTO 100% PBLICA DOSHOSPITAIS UNIVERSITRIOS

    3.6. SUS e os Modelos de Gesto

    a) O arcabouo terico a partir dasnecessidades do Capital

    Um importante marco que sistematiza aforma como se daria a implementao doneoliberalismo no Brasil o Plano Diretor daReforma do Aparelho do Estado, formulado porBresser Pereira, que estava frente do Ministrioda Administrao Federal e Reforma do Estado(MARE), seguindo as diretrizes dos organismosmultilaterais, e foi aprovado em 1995 pelo entopresidente da repblica, Fernando Henrique

    Cardoso.

    De modo geral, o Plano Diretor pregava:(1) o ajustamento fiscal duradouro; (2) reformaseconmicas orientadas para o mercado, que,acompanhadas de uma poltica industrial etecnolgica, garantam a concorrncia interna ecriem as condies para o enfrentamento dacompetio internacional; (3) a reforma daprevidncia social; (4) a inovao dosinstrumentos de poltica social, proporcionando

    maior abrangncia e promovendo melhorqualidade para os servios sociais; e (5) areforma do aparelho do Estado, com vistas aaumentar sua governana, ou seja, suacapacidade de implementar de forma eficientepolticas pblicas.

    Os chamados setores no exclusivos oque mais chama a ateno, pois a principalcaracterizao que se faz de que esses setoresso de responsabilidade pblica, mas nonecessariamente estatal. H uma diferenciaoentre os conceitos de pblico e estatal. Com isso,abre-se a possibilidade do processo deterceirizao, um processo de transferncia dasresponsabilidades do Estado para o setor privadono que tange s reas no exclusivas, que emgeral so as reas sociais.

    b) Organizaes Sociais (OSs)

    O processo de terceirizao daadministrao pblica uma das principais

    diretrizes no que tange implantao daspolticas neoliberais na estrutura do Estado. Uma vez que no mbito institucional-legal no possvel uma privatizao stricto sensu, com

    transferncia de propriedade para o setorprivado, h pelo menos a transferncia daresponsabilidade administrativa, sendo que ofinanciamento continua sendo pblico.

    O instrumento, pelo qual se utilizam osgovernos para implementar o processo de

    privatizao, surge por meio dessas OrganizaesSociais. Segundo o Plano Diretor da Reforma doEstado entende-se por organizaes sociais asentidades de direito privado que, por iniciativado Poder Executivo, obtm autorizaolegislativa para celebrar contrato de gesto comesse poder, e assim ter direito dotaooramentria.

    As Organizaes Sociais estoregulamentadas pela Lei Federal n 9.637, de 15

    de maro de 1998, em conjunto com a aprovaodo Plano Nacional de Publicizao. No Estado deSo Paulo a Lei Complementar n 846, de 04 de junho de 1998, qualifica as entidades comoOrganizaes Sociais. Estava criado o arcabouo jurdico necessrio para a implementao dasOSs e para o avano do processo de terceirizaono Brasil. Isto se afirma na medida em que,quando analisamos o oramento do Estadodestinado sade, especificamente em relao assistncia ambulatorial e hospitalar, destaca-seo montante atualmente destinado sOrganizaes Sociais de Sade (OSS), que atingea ordem de grandeza de um bilho de reais degasto para o ano de 2006.

    No mbito federal, a legislao que cuidadas Organizaes Sociais (Lei n 9.637, de 15 demaro de 1998) sofre questionamento quanto sua constitucionalidade, por meio de Ao Diretade Inconstitucionalidade proposta em27/11/1998 (ADIN 1923), pendente dejulgamento no Supremo Tribunal Federal.

    A participao popular outra diretrizconstitucional para a execuo das aes eservios de sade, sendo conhecida de modogeral como Controle Social, tendo nos Conselhosde Sade (Nacional, Estaduais e Municipais) osrgos do controle. Em relao s OSs, ambostm atualmente posio contrria sua utilizaopara a gesto da sade. Segue a deliberaonmero 001 de 10 de Maro de 2005 doConselho Nacional de Sade (ntegra no anexo,

    documento n 01):a) Posicionar-se contrrio

    terceirizao da gerncia e da gesto de servios e

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    Privatizao pra que(m)?

    de pessoal do setor sade, assim como, daadministrao gerenciada de aes e servios, aexemplo das Organizaes Sociais (OS), dasOrganizaes da Sociedade Civil de InteressePblico (OSCIPs) ou outros mecanismos comobjetivo idntico, e ainda, a toda e qualqueriniciativa que atente contra os princpios e

    diretrizes do Sistema nico de Sade (SUS).b) Estabelecer o prazo de 12 (doze)

    meses, a partir desta data, para que os rgos degesto do Sistema nico de Sade (SUS) adotemmedidas para o cumprimento do estabelecido noitem .a. desta Deliberao.

    No estado de So Paulo temos umlaboratrio para estudar os impactos das OSs, jque sucessivos governos tm implementado umapoltica ofensiva de privatizao do patrimnio

    pblico. Somando-se o ajuste fiscal parapagamento da dvida pblica e o arrocho daspolticas sociais temos um trip que sustenta apoltica dos governos no ltimo perodo,caracterizada pela entrega do patrimnio pblicopara o capital privado.

    O mais importante processo detransferncia de responsabilidades para o setorprivado no Estado de So Paulo, no que tange sade, a entrega da gesto de hospitais pblicos

    para as OSs. Mas o governo estadual temlanado mo de outra estratgia para entregar asresponsabilidades do Estado com sade para osetor privado: inmeros hospitais pblicos sobadministrao direta tiveram diversos serviosque exerciam terceirizados. Desde os serviosmenos complexos, como segurana e limpeza, atservios mais complexos, como a radiologia e oatendimento mdico, esto sendo prestados porempresas terceirizadas nos hospitais.

    Vrios estados (Tocantins, Rio de Janeiro,

    Bahia e Roraima) tambm passaram a transferirservios de sade a entidades terceirizadas taiscomo cooperativas, associaes, entidadesfilantrpicas sem fins lucrativos (ou com finslucrativos), entidades civis de prestao deservios, etc. Assim, por meio de contratos degesto ou termos de parcerias, transferiu-seservios diversos ou unidades de servios desade pblicos a entidade civil, entregando-lhe oprprio estadual ou municipal, bens mveis eimveis, recursos humanos e financeiros, dando-

    lhe autonomia de gerncia para contratar,comprar sem licitao, outorgando-lhe verdadeiro mandato para gerenciamento,execuo e prestao de servios pblicos de

    sade4, sem se preservar a legislao sobre aadministrao pblica e os princpios e diretrizesdo Sistema nico de Sade

    Ainda, h a questo trabalhista que nopode ser afastada, na medida em que as questesatinentes terceirizao, dentro das

    Organizaes Sociais, ocasionam graves prejuzoss condies de trabalho, caracterizados pordesvio de funo, sobrecarga de servios e altarotatividade quanto s empresas terceirizadas.

    A terceirizao tambm implica umprocesso de precarizao do trabalho, uma vezque as funes desempenhadas por servidorespblicos sero desempenhadas por profissionaiscontratados por empresas privadas, que possuemmenos direitos trabalhistas em relao ao

    funcionrio pblico. A longo prazo isso podeinclusive acarretar diminuio da qualidade doservio prestado por conta das condies maisprecrias sob os quais os trabalhadoresterceirizados so obrigados a trabalhar.

    As terceirizaes tambm no estosubmetidas a algumas regras da administraopblica como a lei de licitaes. Essesmecanismos podem facilitar o desvio dosrecursos pblicos, que foi o teor de uma srie dedenncias recebidas sobre os processos deterceirizao nos hospitais da administraodireta: superfaturamento de contratos, prestaode servio aqum do contratado, favorecimentoindividual, dentre outros.

    Para finalizar, cabem algumassistematizaes das conseqncias das OSs:Transferncia de "poupana pblica" ao setorprivado lucrativo; Repasse de patrimnio, bens,servios, servidores e dotao oramentriapblicos a empresas de Direito Privado;

    Desregulamentao do Sistema Pblico decompra de bens e servios (Lei 8.666/Lei dasLicitaes); Os Servidores Pblicos continuaro vinculados aos seus rgos de origem, masintegraro a um "Quadro em Extino"; Fim doRegime Jurdico nico (praticamente nohavero mais servidores pblicos nos ServiosSociais Competitivos). O regime de contrato detrabalho ser o da C.L.T; Fim do ConcursoPblico no acesso aos Cargos Pblicos;Desprofissionalizao dos Servios e dos

    Servidores Pblicos; Flexibilizao do contratode trabalho, das conquistas trabalhistas,inclusive da organizao sindical.

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    Privatizao pra que(m)?

    CONTRA OS MODELOS PRIVATIZANTESDE GESTO

    c) Fundaes Estatais de Direito Privado

    Aparentemente movido pela necessidadede resolver a situao jurdica ilegal de alguns

    hospitais do Rio de Janeiro e do Rio Grande doSul, o governo federal, atravs do Ministrio doPlanejamento, Oramento e Gesto - MPOG e doMinistrio da Sade - MS elaborou projeto de leiinstituindo fundaes estatais de direito privado,cuja origem remonta ao decreto-lei 200 daditadura militar e emenda constitucional 19 de1998.

    Na apresentao do documento, oSecretrio de Gesto Walter Correia da Silva

    informa sobre a natureza do trabalho e a pocade seu incio: ... a SEGES deu incio em 2005 auma srie de estudos e anlises crticas sobre asatuais formas jurdico-institucionais daadministrao pblica, com o objetivo de proporajustamentos que conduzam a um arcabouolegal mais consistente e afinado com os novosparadigmas e desafios impostos gesto pblicasem, contudo, fugir dos limites estabelecidos peloordenamento do direito pblico brasileiro. Nessecontexto que nasce o Projeto Fundao Estatal da necessidade imperativa de, a luz dasdisposies constitucionais, produzir direitonovo para dotar o Governo de agilidade eefetividade no atendimento das demandas sociaisdo Pas

    Aparentemente, j que este projeto surgeno MPOG algum tempo depois do BancoMundial elaborar novo relatrio sobre aassistncia Sade no pas. Neste relatriotnhamos os principais apontamentos: 1.Desenvolver e introduzir arranjos

    organizacionais que dem s unidades de gestonveis crescentes de autonomia e autoridadedecisria sobre a gesto dos recursos, e aomesmo tempo responsabilizando-as pelo seudesempenho. Porm, a velocidade em que talautonomia pode ser concedida deve ser calibradacom a capacidade demonstrada de cada unidade,e a capacidade do rgo central (por exemplo, asecretaria de sade) de monitorar e controlar seudesempenho. 2. Aplicar mecanismos parafortalecer a responsabilizao dos gestores, como

    contratos de gesto que foram os gerentes afocar em objetivos especficos e resultadosmensurveis. Esse instrumento poderia servircomo um mecanismo bsico para o

    planejamento, o monitoramento e a avaliao emambos os casos. 4. Consolidar as transfernciasfederais e vincular aumentos de recursos melhora no desempenho, desta formarecompensando o bom desempenho epenalizando o desempenho ruim (dada aimportncia do nvel mnimo de atendimento

    para todos, o desempenho ruim no significarianecessariamente uma reduo automtica dosrecursos). 6. Fortalecer e profissionalizar acapacidade gerencial.

    Desde a apresentao v-se o uso deargumento similar ao que fundamentou a contra-reforma estatal gerenciada por Bresser Pereira:novos paradigmas, novos desafios, agilidade eefetividade para induzir mudanas em algo quefunciona de modo ruim ou insatisfatrio. Mas, no

    caso de uma reforma do Estado, a avaliao doinsatisfatrio no apenas e to somente decarter tcnico porque sempre atender asdemandas da classe que a tornou umanecessidade. Dito de modo diverso, uma reformado Estado pode operar na direo de aumentaros direitos da fora de trabalho ou podeaprofundar as exigncias de acumulao docapital e, neste caso, ser uma contra-reforma doEstado por afetar os interesses e direitos da forade trabalho.

    Todavia, quando o capital imprime sualgica para a totalidade da vida social tambm oEstado tem de ser contra-reformado para que asinstituies e as polticas sociais que garantem osdireitos dos trabalhadores se transmutem emnegcios que promovero lucratividade para ocapital.

    O MPOG adota as concepes de BresserPereira e do BM sobre a natureza das funes doEstado, para o qual o Estado atua de forma

    concorrente com a iniciativa privada nas reas dasade, sade, educao, cultura, esporte epesquisa. O fetiche do mercado atinge o seu picequando ao Estado se quer reservar o papel deconcorrente dos servios privados e se elege algica empresarial convm, lembrarmos, a dolucro! para definir eficcia e eficincia na aoestatal que, na consecuo de polticas sociais,opera com lgica inteiramente diversa ao daempresa privada.

    As polticas sociais procuram viabilizar obem-estar da maioria que no pode encontr-lono mercado porque ali somente alguns poderoter o lucro e a proteo social como mercadoria

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    Privatizao pra que(m)?

    na forma de servios privados de educao,sade, previdncia, lazer, etc. Aos que vendem eaos que sequer conseguem vender sua fora detrabalho por no encontrarem empregos, a nicaproteo social aquela oriunda da ao doEstado pela via das polticas sociais.

    O projeto das FEDP avana naprecarizao das relaes de trabalho, j que ovnculo da CLT abre vrias possibilidades dentroda lgica da iniciativa privada: aumentar a idadee o tempo de servio requeridos para aaposentadoria, restrio dos tetos deaposentadorias, ou seja, possvel fixaraposentadorias inferiores aos vencimentos dostrabalhadores da ativa, e os insatisfeitos quecomplementem sua aposentadoria capitalizando-se (este bem o termo) com a previdncia

    privada. O substitutivo do deputado Pepe Vargas claro: 5 do artigo 2: facultado fundaoestatal de direito privado instituir, nos termos dalei, regime de previdncia complementar. Aquiest subjacente novamente a ofensiva do governocontra os direitos previdencirios. A imposiodo vnculo pela CLT orientada pela concepoda previdncia como deficitria, a ser sustentadaapenas pela contribuio dos prpriostrabalhadores e no de outras fontes. Abandona-se o conceito da seguridade social solidria e ostrabalhadores so vistos apenas como recursoshumanos, a exemplo do que acontece nasempresas privadas, nas quais todos os recursos,inclusive os trabalhadores, so mercadorias paraa produo de mercadorias.

    O projeto de lei permite que cadafundao, como ente autnomo, tenha seu planoprprio plano de cargos, carreiras e salrios. Alm da segmentao da base sindical e dafragilizao da organizao dos trabalhadores,para os gestores tambm um problema

    administrar pessoal cujos salrios sodiferenciados para a mesma funo.

    A Fundao Estatal estar vincula aorgo ou entidade para qual finalidade foi criada,submetendo-se esfera de governo que a criou:Poder Federal, Estadual ou Municipal. A FEDP a personificao de um patrimnio pblicosegundo as regras do direito privado para prestarservio de interesse social. H, portanto,transferncia de patrimnio pblico para pessoa

    jurdica de direito privado. Ocorre ainda,transferncia de recursos pblicos por meio deContrato de Gesto, sendo que a fundao

    poder obter recursos a partir da prestao deservios em sua rea de atuao.

    Como a FEDP no compem o OramentoGeral da Unio, no obedece Lei de ExecuoOramentria. Ou seja, a receita pblica querecebe pode ser utilizada da maneira que bem

    entender sua administrao, no havendodestinao definida. Ademais, as FundaesEstatais devem obedecer Lei de Licitaes. Noentanto, a licitao na Fundao Estatal no sed da mesma forma que na AdministraoDireta, havendo regimento prprio para alicitao nas Fundaes Estatais, podendo cadauma ter regimento diferente.

    O estatuto jurdico das fundaes estataisde direito privado impede que seja exercido o

    controle pblico da forma plena. Vejamos: OConselho Curador (ou de Administrao) orgo de direo superior, controle e fiscalizaoda Fundao Estatal. rgo colegiado, comrepresentao majoritria do governo, sendopresidido pelo titular do rgo. Conta entre seusmembros com a participao de representantesda sociedade civil e dos empregados. Seusmembros podem ou no ser remunerados, deacordo com o que dispuser a lei ou os estatutos.

    Esta possibilidade de remunerao dosintegrantes deste Conselho Curador no apareceno projeto de lei do deputado federal Pepe Vargas. Mas no vedada. Passa em silncio.Trata-se de um mecanismo que pode ser usadocomo eficiente cooptao de lideranas, comoest sendo demonstrado pelos exemplos emvigncia.

    A Diretoria Executiva responsvel pelagesto tcnica, financeira, patrimonial,administrativa e assistencial da Fundao. Seus

    membros so ocupantes de cargos de confiana.O Conselho Fiscal rgo de controle interno,responsvel pela fiscalizao da gestoeconmico-financeira. O Conselho ConsultivoSocial tem carter consultivo, subordinado aoConselho Curador. Constitudo porrepresentantes da sociedade civil, a includosusurios e outras pessoas fsicas ou jurdicas cominteresse nos servios da entidade.

    Tanto o Conselho Nacional de Sade

    quanto a XIII Conferncia Nacional de Sadeforam contrrios ao projeto da FEDP, e mesmoassim o ministro Temporo deu declaraes de

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

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    Privatizao pra que(m)?

    que ir em frente e disse que a Conferncia apenas consultiva e no deliberativa.

    CONTRA AS FUNDAES ESTATAIS DEDIREITO PRIVADO

    3.7. SUS e os PLANOS DE SADE:QUEM PAGA A CONTA?

    Os planos de sade consolidam umSistema de Sade desigual para os diferentessegmentos da sociedade, juntamente com aprecarizao dos servios pblicos, asterceirizaes e a privatizao dos direitossociais. Ou seja, aqueles que podem consumirestes servios, que hoje representa 20% dapopulao, pagam; aqueles que no podemconsumir estes servios no tm acesso. Alm

    disso, os planos de sade representam umimportante segmento capaz de gerar lucro, que sua prioridade para sobreviver na concorrnciaentre as grandes empresas de sade.

    Para dimensionar o exposto acima,elencamos dados que constam no estudopromovido pelo CREMESP e IDEC, denominadoPlanos de Sade: nove anos aps a lei9.656/1998, mostra que os gastos familiaresdiretos com sade, somado o gasto com os planos

    de sade, atingiram o percentual de 56,16% dosgastos com sade nos anos de 2002 e 2003 emrelao ao total de gastos com sade no pas. Osgastos pblicos, que incluem todo atendimentorealizado pelo SUS, que deveria ser universal,no ultrapassam os gastos com o setor privado,representando apenas 43,85% dos gastos totaiscom a sade.

    Uma anlise mais minuciosa nos mostraque todos pagam para que alguns possamconsumir. Segundo dados do Ministrio doPlanejamento (2006), no ano de 2005, o Estadodeixou de arrecadar atravs de dedues erenncia fiscal o equivalente a quase 3 bilhes dereais, que representa quase 7% do montante dedinheiro movimentado pelos planos de sade.Isso sem contar os mais 1 bilho de reais,tambm em 2005, que o Estado deixou dearrecadar, tambm atravs de dedues erenncia fiscal, daquelas empresas mdicas de baixa tecnologia, chamadas eufemisticamentehospitais filantrpicos (Santas Casas de

    Misericrdia).

    Entretanto, h de se considerar que nemtudo so rosas para aqueles que consomem os

    planos de Sade. Objetivando o lucro, estasempresas impem uma srie de restries naassistncia sade, colocando em riso asobrevivncia do paciente e prejudicando ostrabalhadores em sade. Como caso drstico,usaremos o exemplo do documentrio Sicko,escrito e dirigido pelo cineasta Michel Moore,

    que retrata a situao do Sistema de Sade nosEUA, em que a sade consolida-se, atravs dosplanos de sade, como espao essencial deacumulao de capital:

    Meu nome Linda Pino. Estou aqui, primeiramente, hoje para fazer umaconfisso pblica. Na primavera de 1987,como uma mdica, eu neguei a um homemuma operao necessria para salvar suavida e isso que causou sua morte.

    Nenhuma pessoa e nenhum grupo meculparam por isso, porque, de fato, o que eufiz foi salvar US$500.000,00. E ainda, poreste ato em particular, garantiu minhareputao como uma boa diretora mdica eassegurou meu contnuo avano no campodo plano de sade.

    Eu deixei de ganhar uns centavos dedlares por semana como uma revisoramdica, para ter uma renda de 6 dgitoscomo uma mdica executiva. E eu tinha umobjetivo principal que era usar meuconhecimento mdico para o benefcio financeiro da organizao em que eutrabalhava.

    E me diziam repetitivamente que euno estava negando cuidado, eu estavanegando pagamento. Eu sei como os planosde sade machucam e matam pacientes. Ento estou aqui para dizer sobre otrabalho sujo dos planos de sade e eu souassombrada pelos milhares de papel noqual eu escrevi em uma palavra mortal:

    NEGADO.Obrigada.

    No Brasil, observamos que a tendnciados planos de sade segue a mesma lgica.Podemos perceber esta tendncia com algunsdados objetivos, como o fato dos planoscoletivos, mais precarizados que os planosindividuais, pois possuem um intermedirio nocontrato (uma empresa a intermediria dostrabalhadores), crescem substancialmente e hoje

    representam quase 80% dos planos de sade. Oscontratos coletivos so omissos em relao demisso e aposentadoria dos trabalhadores,alm de ser omisso em relao resciso

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

    18/2020

    Privatizao pra que(m)?

    unilateral dos contratos e a reajustes. Na tabelade preos de 2007 da Medial Sade, amensalidade do plano individual mais completo de R$767,75, enquanto no plano coletivo caipara R$351,17. Os planos coletivos sofrem menorcontrole regulatrio por parte da agnciareguladora da sade suplementar, a Agncia

    Nacional de Sade (ANS).

    Grande parte dos contratos firmados comos planos de sade, principalmente aquelesanteriores lei 9.656/1998, que representamquase 37% dos contratos, trazem clusulas deinmeras doenas, por meio de conceitos vagos,como doenas crnico-degenerativas, doenaspreexistentes, doenas infecto-contagiosas etc.Segundo estudo da Faculdade de Medicina daUSP, as doenas mais excludas so, nesta

    ordem: cncer, doenas cardiovasculares, Aids,meningite, acidentes e causas externas, cirroseheptica, insuficincia renal, hrnia, diabetes edoenas congnitas. J os insumos mais negadosso: transplantes, quimioterapia, radioterapia,rteses e prtese, implantes, hemodilise,oxigenoterapia, fisioterapia etc.

    Alm destas restries de cobertura, queinterferem no trabalho em sade, temos oaumento do custo dos planos de sade de acordocom a faixa etria do paciente, e a fragmentaoda assistncia, que oferece cinco tipos diferentesde planos, de acordo com a capacidade deconsumir dos trabalhadores. Os planos de sade,ademais, aumentam a precarizao do trabalhoem sade, criando critrios de produtividade eatrelando-a aos salrios, que obviamente no secorrelacionam com a qualidade da assistnciaprestada.

    O trabalho em Sade em nossa sociedade,portanto, historicamente determinado; no se

    pode separ-lo da processualidade histrica.Aps a Segunda Guerra Mundial evidencia-se adiviso do trabalho mdico, atrelado aoacelerado desenvolvimento da cincia e datecnologia. Estes novos proletariado dosservios no s se submetem ao assalariamento,mas a um assalariamento que no acompanha orendimento do capital; ao contrrio, os salriosdos prestadores de servios, da mesma forma queos demais trabalhadores, perde seu valor real, nacontra-mo da valorizao do capital.

    Pensando em termos dos profissionais desade brasileiros, um estudo recente de revelaque, para garantir um bom padro de vida, estestrabalhadores mantm diversos vnculosempregatcios, ligados tanto iniciativa pblicaquanto privada. So, de fato, trabalhadores

    assalariados, e ao que tudo indica, esto seproletarizando, da mesma forma que outrastantas categorias profissionais dos nossostempos.

    Para finalizar, cabe tecer algumasconsideraes sobre a ANS, responsvel pelaregulao da sade suplementar. O arcabouoterico da criao destas agncias tambm seencontra no Plano Diretor de Reforma do Estado,alinhado com o preconizado pelos organismos

    multilaterais, ou seja, com as grandescorporaes: o Estado possua em sua estruturasetores estratgicos e exclusivos, que deveriamser de controle estatal; setores no exclusivos,que so de dever do Estado, mas que podem sercompartilhados com a iniciativa privada; e ossetores para produo para o mercado, quedeveriam ser privatizados.

    Os servios estratgicos e exclusivos eramassim chamados, pois o principal usurio oprprio Estado. No so atividades lucrativas e,por isto, o Governo defendia mant-los com oEstado, na forma de propriedade estatal, embora,para estes servios defendesse o que chamou demodelo de gesto gerencial, como as agnciasautnomas, servios sociais autnomos, com oobjetivo de assegurar-lhes a flexibilizao dasrelaes de trabalho e dos controles da sociedadesobre as polticas pblicas. Para este setor, oGoverno props a transformao/qualificaodos rgos Pblicos em Agncias Executivas.

    Os processos histricos e a realidade dodia-a-dia nos mostram a impossibilidade deregular, de limitar, os processos de acumulaode capital. E os processos histricos e a realidadedo dia-a-dia tambm nos ensinam que somentecom organizao e mobilizao os trabalhadorese estudantes conseguiram barrar a retirada dedireitos e serem propositivos na universalizaodos produtos historicamente produzidos pelahumanidade.

    4. Consideraes Finais e Apontamentos

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

    19/2019

    Privatizao pra que(m)?

    Constatamos que o perodo em que asdoenas puderam ser conhecidas cientificamente e continuam podendo, inclusive com maiorriqueza de detalhes! - de forma cada vez maisprofunda, inseparvel daquele em que atecnologia desenvolveu-se a partir das cinciasnaturais e, por sua vez, alcanou a medicina

    determinando seu desenvolvimento.

    Constatamos tambm que apesar doimenso desenvolvimento das foras produtivas, aquase totalidade da populao, os trabalhadores,no possui o acesso igualitrio aos produtos dacivilizao, como conhecimento, novastecnologias, educao, assistncia sade,moradia, alimentao etc. Isto pelas limitaescausadas pelas relaes de explorao quecaracterizam nossa sociedade, em o trabalho

    coletivo mas a apropriao dos produtos destetrabalho privada.

    Ademais, temos um tero da populaomundial sem possibilidades de trabalho ou deconsumo, sendo que pela primeira vez na histriauniversal a economia declara que a maioria dosseres humanos desnecessria e descartvel,pois, na economia contempornea, o trabalhono cria riqueza, os empregos no do lucro, osdesempregados so dejetos inteis einaproveitveis. Um tero a estimativapopulacional de anmicos crnicos no mundo.

    Nesta nova conjuntura, as polticas sociaisuniversalizantes, como ocorreram durante oEstado de Bem Estar Social nos pases centrais,cedem espao para as polticas sociais focalizadasdurante os Estados Neoliberais em todo mundo,transformando direitos como sade, educao eprevidncia, em mercadorias acessveis queles

    que podem consumir, garantindo assim novosespaos para valorizao do capital.

    No Brasil, esta situao consolida-se apartir da dcada de 1990, com a permeabilidadedos planos de sade, a precarizao e osubfinanciamento dos setores pblicos, como aassistncia primria Sade e a assistnciaterciria Sade. Com o desmanche da redehospitalar pblica e sua conseqente privatizaoe terceirizao, atravs dos novos modelos de

    gesto (Fundaes de Apoio, OrganizaesSociais, FEDP etc), alm da retirada dos direitostrabalhistas.

    Uma realidade difcil, que exigeorganizao, mobilizao e resistncia frente retirada de direitos historicamente conquistados.Organizao e mobilizao sabendo aonde sequer chegar: produo e socializao deconhecimentos; assistncia conjunta primria eterciria para todos; campanhas de educao epreveno para todos. PARA TODOS, osprodutos historicamente produzidos pelahumanidade.

  • 8/14/2019 Privatizao pra que(m)? - Cartilha da DENEM (2009)

    20/20

    Privatizao pra que(m)?

    O que ser que ns, estudantes, temos a ver com isso?

    A SADE NO PODE PAGAR POR ESTA CRISE

    MAIS VERBA PBLICA PARA A SADE

    CONTRA A DRU

    PELA APROVAO DA EC 29

    POR UMA GESTO 100% PBLICA DOS HOSPITAIS UNIVERSITRIOS

    CONTRA OS MODELOS PRIVATIZANTES DE GESTO

    CONTRA AS FUNDAES ESTATAIS DE DIREITO PRIVADO

    PLANOS DE SADE: QUEM PAGA A CONTA?