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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DOENÇAS INFECCIOSAS PRISCILA CAMARGO GRANADEIRO FARIAS ANÁLISE DE FATORES GEOGRÁFICOS E CLIMÁTICOS RELACIONADOS À DISTRIBUIÇÃO DE PHLEBOTOMINAE (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM ÁREA DE TRANSMISSÃO DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, BRASIL VITÓRIA 2014

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPRITO SANTO

    CENTRO DE CINCIAS DA SADE

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DOENAS INFECCIOSAS

    PRISCILA CAMARGO GRANADEIRO FARIAS

    ANLISE DE FATORES GEOGRFICOS E CLIMTICOS RELACIONADOS

    DISTRIBUIO DE PHLEBOTOMINAE (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM REA DE

    TRANSMISSO DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NO ESTADO

    DO ESPRITO SANTO, BRASIL

    VITRIA

    2014

  • PRISCILA CAMARGO GRANADEIRO FARIAS

    ANLISE DE FATORES GEOGRFICOS E CLIMTICOS RELACIONADOS

    DISTRIBUIO DE PHLEBOTOMINAE (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM REA DE

    TRANSMISSO DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NO ESTADO

    DO ESPRITO SANTO, BRASIL

    VITRIA

    2014

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Doenas Infecciosas do Centro de Cincias da Sade da Universidade Federal do Esprito Santo, para a obteno do Ttulo de Mestre em Doenas Infecciosas.

    Orientador: Prof. Dr. Alosio Falqueto

    Co-orientador: Profa. Dra. Blima Fux

  • Dados Internacionais de Catalogao-na-publicao (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Esprito Santo, ES, Brasil)

    Farias, Priscila Camargo Granadeiro, 1982- F224a Anlise de fatores geogrficos e climticos relacionados

    distribuio de Phlebotominae (Diptera: Psychodidae) em rea de transmisso de leishmaniose tegumentar americana no estado do Esprito Santo, Brasil / Priscila Camargo Granadeiro Farias. 2014.

    91 f. : il. Orientador: Alosio Falqueto.

    Coorientador: Blima Fux.

    Dissertao (Mestrado em Doenas Infecciosas) Universidade Federal do Esprito Santo, Centro de Cincias da Sade.

    1. Psychodidae. 2. Leishmaniose Mucocutnea. 3. Vetores

    de Doenas. 4. Variaes Sazonais. I. Falqueto, Alosio. II. Fux, Blima. III. Universidade Federal do Esprito Santo. Centro de Cincias da Sade. IV. Ttulo.

    CDU: 61

  • Dedico este trabalho ao meu marido

    Thiago, aos meus filhos Bruno e

    Bernardo, e minha me, Maria de

    Ftima. Amo vocs!

  • AGRADECIMENTOS

    As coisas da vida so interessantes. Agosto j foi tido como o ms do cachorro

    louco. Pra mim um ms de grandes conquistas! H quase 13 anos, no dia 13 de

    agosto de 2001, eu passava pela primeira vez pelos portais da entrada principal da

    Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Era um sonho se tornando realidade,

    e me lembro de no crer que aquilo estava de fato acontecendo. Ficava conferindo

    meu nome nas listas de chamada pra ter certeza de que aquele lugar era meu. E era

    exatamente onde eu deveria estar.

    Hoje c estou, novamente em agosto, buscando mais uma vitria nessa minha

    trajetria. Agora fechando um ciclo. E foi difcil! Estudei como acho que nunca fiz

    para a prova de seleo e ainda muito durante o curso de Mestrado em Doenas

    Infecciosas. Eu estava adentrando um espao estranho, onde pessoas que eu no

    conhecia demonstravam domnio total de assuntos que eu, uma mdica veterinria

    num curso da sade humana, ainda precisava aprender. Mas minha formao

    acadmica e esforos puderam fazer as diferenas diminurem a cada dia, e percebi

    que a troca era muito rica. A Universidade Federal do Esprito Santo ento se tornou

    a minha casa. E era exatamente onde eu deveria estar.

    Por isso e muito mais, AGRADEO:

    Antes de tudo, a Deus, nosso Pai. A vida preciosa, e sei que sou privilegiada por

    ter a minha. Sade, amor, uma bela famlia, fora e oportunidades. Com tantos

    desafios desde sempre e podendo contabilizar tantas vitrias, s posso ser grata.

    Obrigada, amado Pai!

    Universidade Federal do Esprito Santo, que abriu suas portas e me permitiu

    vivenciar grandes experincias e aprendizados.

    Aos professores e colegas do curso de Ps-graduao em Doenas Infecciosas,

    pela dedicao, ensinamentos e parceria. Foram dois anos de crescimento pessoal e

    intelectual.

    CAPES, pela bolsa de estudos.

  • Ao meu orientador, prof. Alosio Falqueto, esse exemplo de mdico, pesquisador e

    ser humano. Seu comprometimento e imerso em sua misso profissional so

    inspiradores. Como meta, quero ser ao menos parecida com ele, s que na verso

    mdica veterinria!

    Mil vezes minha co-orientadora e amiga prof. Blima Fux, pelo apoio desde que

    cheguei Parasitologia. Obrigada pelos ensinamentos e pelas oportunidades que

    me ofereceu, como te acompanhar nas aulas da graduao. Isso tudo no tem

    preo, mas o maior valor de todos o da amizade sincera que construmos!

    Ao Claudiney, que acreditou em mim desde o comeo, e foi fundamental em todas

    as fases deste trabalho. No h palavras para agradecer por sua ajuda.

    Ao Prof. Gustavo Rocha Leite e colega doutoranda Vivianne Meneguzzi, pelo

    valioso auxlio nas anlises estatsticas, no esclarecimento da metodologia e na

    parte tica do trabalho, sempre com muito boa vontade e disponibilidade.

    Ao Jefferson, que participou ativamente das coletas e tabulao dos dados, mas que

    infelizmente desencarnou antes de ver este trabalho pronto.

    Aos meus colegas do Centro de Controle de Zoonoses de Cariacica, os mdicos

    veterinrios Fabrcio, Daniel e Thyara, alm das auxiliares Cristina e Emlia. Vocs

    me ajudaram muito nos piores perodos, com meus horrios malucos, e tornaram

    meus dias no trabalho mais leves e agradveis. Juntos somamos foras nas nossas

    lutas dirias.

    Aos meus queridos animais, meus pacientes ou no. Especialmente minha

    companheira das horas no computador, Maria Teresa. Com eles sofro, me divirto e

    aprendo a cada dia que h muitas outras linguagens alm da fala, as quais o

    homem, na construo da sua identidade e evoluo, deixou que adormecessem

    dentro de si. Descobrir a linguagem dos animais descobrir a mim mesma. Isso me

    move!

    Agradeo minha me Maria de Ftima, sempre guerreira. Voc o exemplo e a

    mola propulsora das minhas conquistas! Sem voc nada disso seria possvel. Ao

    meu irmo Adair, que comigo cresceu e que me faz rir sempre. Ao meu pai, Gilson,

  • grande entusiasta das minhas vitrias. Ao meu padrasto Gasto, que graas a Deus

    est conosco e pode participar de mais essa etapa da minha vida. Espero continuar

    sempre dando a vocs alegrias, orgulho e todo meu amor! Obrigada por acreditarem

    em mim!

    minha sogra Adlia, meu sogro Paulo Cezar e meu cunhado Cezinha, por me

    receberem de braos abertos, alm de me socorrerem nas horas mais complicadas.

    Vocs so demais! Amo vocs!

    Muito obrigada aos meus demais familiares e amigos queridos, por me

    impulsionarem e terem pacincia com a minha ausncia. Seria impossvel citar

    todos, ento deixo aqui um enorme beijo para minhas amigas-irms Patty Pacheco e

    Ana Paula Magalhes. O tempo e a distncia nunca podero apagar nossa amizade!

    Ao meu amado marido, Thiago. Como eu disse, sou privilegiada! Tenho ao meu lado

    uma pessoa maravilhosa, que me ajudou a dar conta quando faltou tempo, quando o

    fardo pesou demais, quando bateu desnimo e desespero. Te amo! Agradeo a

    Deus todos os dias por ter voc e nossos meninos!

    Aos meus filhos Bruno e Bernardo. Bruno, o mais velho, vivenciou comigo todos os

    desafios da graduao, do incio da vida profissional e agora do Mestrado. Um

    menino doce e que nunca fez cobranas, apesar de ter sofrido tanto quanto eu com

    a distncia e a minha falta de tempo. J Bernardo, meu pequenininho, este sim,

    cobra e mostra sua insatisfao quando a mame no pode dar ateno. Um perfil

    diferente, mas igualmente adorvel! No h felicidade maior do que olhar pra eles e

    v-los saudveis, felizes, ao meu lado! A cada dia me sinto mais honrada por ter

    recebido dois seres to especiais na minha vida. Mame ama vocs!

    E sim, no poderia deixar de cit-la, j que foi e ainda uma referncia fortssima na

    minha vida: minha av Arlete, que hoje j se encontra no plano espiritual. Espero

    ansiosamente por outros encontros nossos em sonhos e na vida. Meu amor eterno!

  • RESUMO

    A leishmaniose tegumentar americana (LTA) uma doena que acomete pele e

    mucosas causada por parasitos dermotrpicos do gnero Leishmania Ross, 1903.

    Os parasitos so transmitidos atravs da picada de pequenos dpteros da famlia

    Psychodidae, os flebotomneos. O municpio de Cariacica, Esprito Santo, Brasil,

    esteve nos ltimos cinco anos (2009 a 2013) entre os cinco que apresentaram maior

    nmero de casos notificados no estado, segundo a Secretaria de Estado de Sade

    (SESA-ES, 2014). A localidade de Roda Dgua demonstra grande importncia, por

    concentrar elevado nmero de casos, contribuindo com grande parte das

    notificaes do municpio. Avaliando os casos da doena na regio, registrados nos

    pronturios mdicos do servio de referncia, na Unidade de Medicina Tropical da

    Universidade Federal do Esprito Santo, observou-se que estes ocorriam a at 550

    m de altitude, numa rea que vai de 20 a 718 m. A hiptese mais provvel seria a de

    que o fenmeno fosse relacionado aos vetores, j que o homem e os animais

    estariam presentes em todas as altitudes. De fevereiro de 2002 a janeiro de 2004

    foram realizadas coletas mensais de flebotomneos em Roda Dgua, que

    aconteciam simultaneamente em trs nveis de altitude, sendo: nvel 1 - at 250 m;

    nvel 2 - entre 250 e 500m e nvel 3 - acima de 500m. Em cada nvel as coletas

    aconteciam em dois ambientes: mata e peridomiclio. As capturas eram feitas em

    armadilhas de Shannon modificadas e por busca ativa em repouso, com capturador

    de Castro. Avaliou-se o comportamento das espcies quanto pluviosidade

    (perodos seco e chuvoso) e s estaes do ano. Analisaram-se estatisticamente as

    principais espcies antropoflicas de importncia epidemiolgica (Falqueto, 1995).

    Foram calculados os ndices ecolgicos abundncia, riqueza, diversidade,

    equitabilidade e dominncia. Coletou-se um total de 13233 flebotomneos, com

    identificao de 23 espcies. A espcie predominante foi Nyssomyia intermedia

    (61,12%), seguida por Pintomyia fischeri (18,20%) e Migonemyia migonei (8,68%),

    todas antropoflicas. Somou-se a estas a espcie Pintomyia monticola, que

    representou 1,67% do total de espcimes coletados e tambm altamente

    antropoflica. As demais espcies somaram 10,10% do total de flebotomineos. A

    altitude influenciou a distribuio das quatro espcies analisadas, tendo Ny.

    intermedia e Pi. fischeri sido mais abundantes no nvel 2, Mg. migonei mais

    abundante no nvel 1 e Pi. monticola no nvel 3. Em relao ao ambiente, as

  • espcies Ny. intermedia e Mg. migonei foram estatisticamente mais abundantes no

    peridomiclio e Pi. monticola na mata. A distribuio de Pi. fisheri no apresentou

    diferena significativa entre os dois ambientes, porm foi a nica afetada pelas

    chuvas e estaes do ano, sendo a espcie mais encontrada no perodo seco e no

    inverno. Nyssomyia intermedia parece ser a principal espcie vetora da LTA em

    Roda Dgua, com Mg. migonei provavelmente tendo papel secundrio. Pi. fisheri

    no parece estar envolvido localmente na transmisso da doena para humanos,

    apesar de j ter sido incriminado em outras regies. A distribuio de Pi. monticola

    em relao altitude e ao ambiente indica ser improvvel sua participao na

    transmisso da LTA naquela regio.

    Palavras-chave: Psychodidae, Leishmaniose Mucocutnea, Vetores, Variaes

    Sazonais.

  • ABSTRACT

    American cutaneous leishmaniasis (ACL) affects the skin and mucous membranes

    caused by dermotropic parasites of the genus Leishmania Ross, 1903. The parasites

    are transmitted through the bite of small insects of the family Psychodidae, the

    sandflies. The municipality of Cariacica, Esprito Santo, Brazil, has been in the last

    five years (2009-2013) among the five municipalities which had the largest numbers

    of reported cases in the, according to the State Department of Health (SESA-ES,

    2014). The locality of Roda Dgua has shown high epidemiological importance, due

    to the large concentration of cases contributing to the municipality notifications.

    Evaluating the registered cases from the region, from the medical reference service,

    Unidade de Medicina Tropical da Universidade Federal do Esprito Santo, it was

    observed that they occurred up to 550 m of altitude, in an area between 20-718 m

    above sea level. The most likely hypothesis is that the phenomenon is related to the

    vector distribution, since humans and animals are be present in all altitudes. From

    February 2002 to January 2004 sand flies were simultaneously captured in monthly

    collections in Roda Dgua , at three altitude levels: level 1 - up to 250 m, level 2 -

    between 250 and 500 m and level 3 - above 500 m. In each level, collection of sand

    flies was carried out in two environments: sylvatic and peridomicile. Collections were

    made using modified Shannon traps and by active search with Castro pooter. We

    evaluated flight activity of the species as the rainfall (rainy and dry seasons) and the

    seasonality. Only species known to be anthropophilic and with epidemiological

    importance were statistically analyzed. Abundance, richness, diversity, equitability,

    and dminance ecological indices were estimated. A total of 13,233 sand flies from 23

    species were collected. The most abundant species was Nyssomyia intermedia

    (61.12%), followed by Pintomyia fischeri (18.20%) and Migonemyia migonei (8.68%),

    all species are anthropophilic. Pintomyia monticola represented 1.67% of the total

    specimens collected and is also antropophilic. The other species comprised 10.10%

    of the total specimens collected. The altitude affected the distribution of four species,

    and Ny. intermedia and Pi. fischeri were more abundant at level 2, Mg. migonei most

    abundant at level 1 and Pi. monticola at level 3. Nyssomyia intermedia and Mg.

    migonei were statistically more abundant in peridomestic areas and Pi. monticola in

    sylvatic environment. Pintomyia fischeri occurrence was not statistically significant

    according to environment, but it was the only one affected by the rain and showed

  • seasonality, most commonly found in dry periods and during the winter. Nyssomyia

    intermedia seems to be the most important vector of ACL in Roda Dgua and Mg.

    migonei presents probably acting as asecondary vector. Pintomyia fischeri does not

    seem to be involved in disease transmission to humans in the locallity, despite having

    already been incriminated in others regions. According to its distribuition, probably

    Pi. monticola does not play a role in ACL transmission in Roda Dgua.

    Keywords: Psychodidae, Mucocutaneous leishmaniasis, Vectors, Seasonal

    variations.

  • LISTA DE ABREVIAES

    C Graus Celsius

    DNA Desoxyribonucleic Acid (cido Desoxirribonuclico)

    ES Esprito Santo

    FUNASA Fundao Nacional de Sade

    GPS Global Positioning System (Sistema de Posicionamento Global)

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IJSN Instituto Jones dos Santos Neves

    Km Quilmetros

    LTA Leishmaniose Tegumentar Americana

    LV Leishmaniose Visceral

    Lu. Lutzomyia

    m Metros

    MG Minas Gerais

    Mi. Micropygomyia

    mm Milmetros

    Mg. Migonemyia

    NI No Identificados

    Ny. Nyssomyia

    OMS Organizao Mundial de Sade

    Pi. Pintomyia

    RJ Rio de Janeiro

    SP So Paulo

  • SESA-ES Secretaria Estadual de Sade do Esprito Santo

    SINAN Sistema Nacional de Notificaes do Ministrio da Sade

    TO Tocantins

    UFES Universidade Federal do Esprito Santo

    WHO World Health Organization

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1. Mapa da incidncia de leishmaniose tegumentar americana por 100

    mil habitantes no estado do Esprito Santo no ano de 2010 (SESA-ES, 2014).........23

    Figura 2. Nmero de casos de LTA notificados por municpio nos anos de 2009

    a 2013, na regio Metropolitana do Esprito Santo, segundo dados da Regional

    Vitria da Secretaria Estadual de Sade (SESA-ES, 2014).......................................23

    Figura 3. Fotografia do acesso localidade de Roda Dgua, Cariacica,

    evidenciando o relevo acidentado..............................................................................38

    Figura 4. Mapa dos limites administrativos do municpio de Cariacica ES.

    Fonte: Instituto Jones dos Santos Neves- Governo do Estado do Esprito Santo

    (IJSN-ES, 2014)..........................................................................................................39

    Figura 5. Mapa do modelo digital do terreno do municpio de Cariacica ES.

    Fonte: Instituto Jones dos Santos Neves- Governo do Estado do Esprito Santo

    (IJSN-ES, 2014)..........................................................................................................40

    Figura 6. Fotografia do acesso principal para a localidade de Roda Dgua,

    Cariacica, de onde podem-se observar os trs nveis de elevao demarcados por

    linhas...........................................................................................................................42

    Figura 7. Fotografia do ponto de coleta no nvel 1 da MATA..................................42

    Figura 8. Fotografia de ponto de coleta no nvel 2 do peridomiclio, mostrando duas

    residncias, rvores frutferas e ces vivendo prximos s casas............................43

    Figura 9. Fotografia do peridomiclio do nvel 2. Plantaes de banana, muito

    comuns na regio, e a mata ao fundo, na parte mais alta deste nvel.......................43

    Figura 10. Fotografia da vista do alto do nvel 3, este ponto a aproximadamente 680

    m de altitude. Ao fundo possvel ver o mar e os municpios de Vila Velha,

    esquerda, e em parte, Guarapari................................................................................44

  • Figura 11. Fotografia da coleta por busca ativa em repouso num galinheiro

    localizado no peridomiclio do nvel 2 (Fonte: arquivo do professor Gustavo R.

    Leite)...........................................................................................................................45

    Figura 12. Fotografia da coleta por tubo de suco de Castro em armadilha de

    Shannon modificada montada na mata do nvel 2......................................................45

    Grfico 1. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflicas,

    capturadas em diferentes faixas de altitude no peridomiclio da localidade de Roda

    Dgua, Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003...........................................50

    Grfico 2. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflicas,

    capturadas em diferentes nveis de altitude na mata da localidade de Roda Dgua,

    Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003........................................................51

    Grfico 3. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de

    flebotomneos antropoflicos capturados na MATA, em Roda Dgua, Cariacica, entre

    maro de 2002 e fevereiro de 2004............................................................................52

    Grfico 4. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de

    flebotomneos antropoflicos capturados no PERIDOMICLIO em Roda Dgua,

    Cariacica, entre maro de 2002 e fevereiro de 2004..................................................52

    Grfico 5. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em

    Roda Dgua, Cariacica, de acordo com pluviosidade, capturadas entre abril de 2002

    a maro de 2003.........................................................................................................53

    Grfico 6. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em

    Roda Dgua, Cariacica, em relao s estaes do ano, capturadas entre abril de

    2002 a maro de 2003................................................................................................54

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1. Flebotomneos capturados em Roda Dgua, nos ambientes mata e

    peridomiclio, no perodo de abril de 2002 a maro de 2004, com destaque para as

    principais espcies conhecidamente antropoflicas e de importncia

    epidemiolgica(*)........................................................................................................48

    Tabela 2. Percentuais das principais espcies de flebotomneos antropoflicas

    capturadas em Roda Dgua entre maro de 2002 a fevereiro de 2004....................49

    Tabela 3. ndices ecolgicos obtidos para as populaes de flebotomneos

    coletados em Roda Dgua, municpio de Cariacica, na mata e no peridomiclio, no

    perodo de abril de 2002 a maro de 2004.................................................................54

    ANEXOS

    Anexo 1. Parecer de autorizao consubstanciado n 494.029 emitido pelo Comit

    de tica em Pesquisa (CEP) envolvendo seres humanos, do Centro de Cincias da

    Sade da Universidade Federal do Esprito Santo (CCS -UFES).

  • SUMRIO

    1 INTRODUO.................................................................................................15

    1.1. Definio.....................................................................................................15

    1.2. Etiologia......................................................................................................15

    1.3. Ciclo biolgico da leishmaniose tegumentar americana.............................17

    1.4. Aspectos epidemiolgicos da LTA..............................................................18

    1.5. Reservatrios..............................................................................................23

    1.6. Os vetores..................................................................................................26

    2 JUSTIFICATIVA..............................................................................................34

    3 OBJETIVOS.....................................................................................................36

    3.1. Objetivo Geral.............................................................................................36

    3.2. Objetivos especficos..................................................................................36

    4 MATERIAIS E MTODOS...............................................................................37

    4.1. Descrio da rea de estudo......................................................................37

    4.2. Dados epidemiolgicos...............................................................................41

    4.3. As coletas...................................................................................................41

    4.4. As capturas.................................................................................................44

    4.5. Identificao dos insetos............................................................................46

    4.6. Avaliao da sazonalidade.........................................................................46

    4.7. Anlises estatsticas...................................................................................46

    4.8. Aspectos ticos...........................................................................................47

    5 RESULTADOS................................................................................................48

    6 DISCUSSO....................................................................................................55

    6.1 Altitude X Ambiente........................................................................................55

    6.2 Sazonalidade.................................................................................................62

    6.3 ndices Ecolgicos.........................................................................................63

    7 CONCLUSES................................................................................................66

    8 PERSPECTIVAS.............................................................................................67

    9 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...............................................................68

  • 15

    1 INTRODUO

    1.1 Definio

    As leishmanioses so zoonoses causadas por protozorios parasitos do gnero

    Leishmania Ross, 1903, que ocorrem em 88 pases de quatro continentes(1). Este

    gnero compreende aproximadamente 30 espcies, das quais cerca de 20 so

    patognicas para a espcie humana (2, 3). A transmisso entre os hospedeiros

    vertebrados feita pela picada de pequenos insetos pertencentes ordem Diptera,

    famlia Psychodidae, subfamlia Phlebotominae (4).

    H duas formas clnicas bsicas, causadas por espcies distintas do parasito: a

    leishmaniose tegumentar (LT) e a leishmaniose visceral (LV). Ambas so

    consideradas doenas associadas a baixas condies socioeconmicas (1).

    A leishmaniose tegumentar americana (LTA) acomete pele e mucosas.

    considerada pela Organizao Mundial de Sade como uma das seis enfermidades

    parasitrias mais importantes do mundo, tendo sido notificados cerca de 1 milho de

    novos casos de LTA nos ltimos cinco anos em todo o globo. Estima-se que a

    ocorrncia anual seja ainda maior, entre 0,7 e 1,3 milhes de novos casos,

    principalmente nas Amricas, base do Mediterrneo e Oriente Mdio e sia Central.

    Os seis pases onde h maior incidncia so Afeganisto, Arglia, Brasil, Colmbia,

    Ir e Sria(1). No Brasil a doena representa um dos grandes problemas de sade

    pblica, estando presente nos 26 estados da Federao.

    1.2 Etiologia

    Os parasitos do gnero Leishmania possuem a seguinte posio sistemtica

    segundo Levine et al (1980)(5):

    Reino PROTISTA Haeckel, 1866;

    Sub-reino PROTOZOA Goldfuss,1817;

    Filo SARCOMASTIGOPHORA Honigberg & Balamuth, 1963;

    Sub-filo MASTIGOPHORA Desing, 1866;

    Classe: ZOOMASTIGOPHOREA Calkins, 1909;

  • 16

    Ordem KINETOPLASTIDA Honigberg, 1963, emend. Vickerman,1976;

    Sub-ordem TRYPANOSOMATINA Kent, 1880;

    Famlia TRYPANOSOMATIDAE Doflein,1901; emend. Grobben,

    1905;

    Gnero: Leishmania Ross,1903.

    De acordo com o classificao taxonmica mais aceita atualmente, o gnero

    Leishmania compreende dois subgneros: Viannia e Leishmania (6).

    Nas Amricas, so reconhecidas atualmente 14 espcies dermotrpicas,

    responsveis pela LTA em humanos. No Brasil, ocorrem sete espcies, sendo as

    trs principais Leishmania (Viannia) braziliensis, Leishmania (Viannia) guyanensis e

    Leishmania (Leishmania) amazonensis, tendo ainda as espcies Leishmania

    (Viannia) lainsoni, Leishmania (Viannia) naiffi, Leishmania (Viannia) lindenbergi e

    Leishmania (Viannia) shawi, identificadas nas regies Norte e Nordeste do pas (7).

    At o momento, L.(V.) braziliensis a nica espcie de Leishmania registrada para

    o estado de Esprito Santo, com caracterizao de apenas um nico zimodema

    (Z27), ou seja, um nico conjunto de cepas de um microrganismo que compartilham

    o mesmo perfil isoenzimtico. Os isolados foram provenientes de amostras humanas

    e caninas (8).

    L.(V.) braziliensis a espcie com mais ampla distribuio geogrfica no Brasil,

    ocorrendo do sul do Par ao Nordeste, atingindo tambm o centro-sul do pas e

    algumas reas da Amaznia Oriental (9, 10). tambm a espcie mais prevalente

    no homem, podendo causar leses cutneas e mucosas. encontrada em todas as

    zonas endmicas do pas, desde o norte at o sul, principalmente em reas de

    colonizao recente, como tambm em reas antigas, nestas ltimas, geralmente

    associada presena de animais domsticos infectados (11).

  • 17

    1.3 Ciclo biolgico da LTA

    O ciclo da LTA do tipo heteroxnico, e completa-se necessariamente envolvendo

    hospedeiros intermedirios e definitivos, que so flebotomneos e mamferos,

    respectivamente(12).

    Existem duas formas evolutivas principais: a forma amastigota, observada em

    tecidos de hospedeiros vertebrados, que podem ser humanos e outros animais

    susceptveis infeco; e a forma promastigota, que se encontra no tubo digestivo

    do flebotomneo (13, 14).

    As fmeas do flebotomneo ao se alimentarem de sangue de um hospedeiro

    vertebrado infectado ingerem as formas amastigotas. Estas se alojam no tubo

    digestivo do inseto, transformando-se em promastigotas, que se multiplicam por

    diviso binria e depois migram para a probscide, podendo, a partir da, ser

    inoculadas no hospedeiro vertebrado (14, 15).

    A infeco por Leishmania sp. em mamferos, para ser bem sucedida, depende das

    habilidades dos parasitos em evadir da resposta imune do hospedeiro, multiplicarem-

    se e serem fagocitados pelas clulas do hospedeiro, e de sobreviver dentro do

    fagolisossoma de macrfagos. O parasitismo de Leishmania sp. ocorre no interior de

    macrfagos por e pode estimular diferentes tipos de reaes inflamatrias, deste

    modo dando origem a vrias formas clnicas e padres patolgicos da doena (16).

    Acredita-se que as formas promastigotas de Leishmania sejam parasitos primitivos

    dos flebotomneos ou de seus ancestrais. O parasito provavelmente adaptou-se

    sobrevivncia em mamferos aps a inoculao do organismo durante a evoluo

    dos hbitos hematofgicos dos flebotomneos ancestrais. Os hospedeiros mamferos

    agem agora no somente como um suporte para fornecer sangue para estes insetos,

    mas tambm como fonte de amastigotas localizadas na pele ou no sangue desses

    animais (14).

  • 18

    1.4 Aspectos epidemiolgicos da LTA A distribuio da LTA influenciada por fatores climticos e geogrficos ainda pouco

    conhecidos, e que determinam a distribuio de diferentes vetores flebotomneos,

    parasitos e reservatrios (17).

    A LTA ocorre nas Amricas desde o Sul dos Estados Unidos at o norte da

    Argentina. O foco mais importante o sul-americano, que compreende todos os

    pases, com exceo do Uruguai e do Chile (11).

    A doena humana apresenta, pelo menos, dois cenrios epidemiolgicos (18):

    O primeiro associa-se entrada do homem na floresta primria para

    atividades profissionais, o que, em certas ocasies, resulta em um

    nmero expressivo de casos, sugerindo uma epidemia. Nesta, o grupo

    mais afetado o de jovens e adultos do sexo masculino, que saem

    para trabalhar na mata e contraem a infeco aps serem picados

    pelos flebotomneos;

    O segundo cenrio associa-se a ambientes ps-devastados, com

    presena de mata remanescente ou residual, nos quais a populao

    humana se instala. Nesta conformao, indivduos de ambos os sexos

    e todas as faixas etrias podem ser infectados.

    A devastao das florestas tem alterado as caractersticas epidemiolgicas da LTA

    nas Amricas do Sul e Central (19, 20). No Brasil a incidncia de LTA tem

    aumentado nos ltimos anos em praticamente todos os estados (11). Surtos

    epidmicos tm ocorrido nas regies Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e, mais

    recentemente, na regio Amaznica, relacionados ao processo predatrio de

    colonizao (19-21).

    Onde a colonizao ocorreu h mais tempo, houve ampla destruio da floresta

    primria, que foi substituda por plantaes de diversos tipos de culturas, e intensa

    atividade humana (17, 22-25). A chegada do homem e o aporte de animais

    domsticos tambm representam a introduo de fontes importantes de alimento

    para os flebotomneos que atuam como vetores do parasita.

  • 19

    Pesquisas apontam que a simples deteco de uma das espcies de flebotomneos

    que apresentam importncia epidemiolgica j configura fator de risco para a LTA,

    no sendo este risco potencializado pela deteco de mais de uma espcie com

    essa caracterstica (26).

    Outros trabalhos indicam que o risco de transmisso da Leishmania se deve

    existncia de um grande nmero de espcies vetoras, somada ao surgimento de

    espcies que costumavam ser restritas vida selvagem. Com a modificao do

    ambiente, algumas delas so beneficiadas, e podem ser capazes de manter o ciclo

    periurbano da doena (27).

    A identificao e caracterizao da transmisso domiciliar, peridomiciliar

    (predominantemente rural) e extradomiciliar (silvestre) so fundamentais para o

    controle da LTA (28).

    No Esprito Santo, em 2010, foram notificados 138 casos em 29 municpios.

    Somando-se s condies ambientaisaspropcias para o desenvolvimento do vetor,

    a presena da doena pode estar relacionada ao processo migratrio, ocupao de

    encostas e aglomerados em centros urbanos associados a matas secundrias ou

    residuais (29). A doena considerada endmica na maioria dos municpios

    capixabas (25).

    Estudos realizados no estado demonstram que h predomnio do carter de

    transmisso domiciliar e peridomiciliar da LTA, ocorrendo em pessoas de ambos os

    sexos e diferentes faixas etrias (9, 17, 25, 30-32).

    Entre os anos de 1980 e 2000 houve uma intensa expanso populacional para a

    rea urbana, no Esprito Santo, com taxa de variao populacional geral do estado

    entre 1960 e 1970, segundo o IBGE, de apenas 13%. No entanto, nos municpios de

    Cariacica, Serra, Viana, Vila Velha e Vitria, o acrscimo tendo sido de 156%, 88%,

    60%, 123% e 60%, respectivamente (33).

    Coincidindo com este aporte de pessoas para as regies mais urbanizadas do

    estado, observou-se um aumento expressivo do nmero de casos de LTA

    registrados pela FUNASA. De 62 casos registrados em 1980, o nmero de registros

  • 20

    elevou-se para 548 em 2000, com perodos intermedirios apresentando nmeros

    ainda mais expressivos. Ressalta-se o trinio de 1991 a 1993, em que foram

    notificados, respectivamente, 728, 722 e 893 casos(8) . Estes dados reforam a

    hiptese da transmisso domiciliar da doena no Esprito Santo, visto que a molstia

    ocorre em reas de colonizao antiga, s vezes sem florestas nas proximidades

    das casas.

    Leishmania (V.) braziliensis tem sido a espcie de parasito identificada, por meio de

    eletroforese de isoenzimas (MLEE), como o nico agente etiolgico responsvel por

    casos humanos e caninos em todo o estado (8).

    O ciclo de transmisso de L. (V.) braziliensis no estado normalmente ocorre em

    reas situadas em altitudes baixas e mdias, compreendendo a faixa entre 50 e 750

    metros acima do nvel do mar. Os focos endmicos so comuns nas encostas das

    montanhas, em reas intensamente desmatadas, mas mostrando alguns

    remanescentes de vegetao original. A molstia ocorre em comunidades rurais,

    com casas dispersas e o espao entre estas ocupado por plantaes de caf e de

    banana. Nas ltimas dcadas, focos de LTA surgiram em comunidades j

    estabelecidas h mais de um sculo, prximas s cidades que compem a regio

    metropolitana da grande Vitria, na costa Atlntica. Essas reas ainda conservam

    caractersticas rurais, porm, a diviso sucessiva de pequenas propriedades deu

    origem a verdadeiros povoados, praticamente sem florestas nas proximidades das

    casas (30). Extensos bananais e rvores frutferas recobrem o espao no entorno

    das casas, mantendo o solo sombreado, com abundante matria orgnica, onde

    procriam os vetores de Leishmania sp (32). Tais caractersticas, associadas

    presena de animais domsticos infectados, sustentam a hiptese da transmisso

    domiciliar da LTA na regio.

    Hoje os municpios com maior coeficiente de incidncia (acima de 50 casos para

    cada 100 mil habitantes) esto localizados no interior, com destaque para os das

    Regies do Capara e Serrana, como Brejetuba e Afonso Cludio, locais com

    grande rea de vegetao, populao rural e baixos indicadores sociais. Muqui, na

    regio sul, um dos municpios com maior incidncia. Ressaltam-se ainda aqueles

    da regio do Vale do Rio Doce, como So Domingos do Norte (8, 29, 34) (Figura 1).

  • 21

    A disseminao da LTA na faixa litornea do Esprito Santo parece ter ocorrido h

    poucas dcadas, a julgar pelo relato de Barro et al. (1985) (23), que descrevem o

    primeiro surto da doena nos municpios de Viana e Cariacica. Sobre a distribuio

    geogrfica da LTA no estado, no perodo de 1978 a 1982, constatou-se que os

    municpios de Viana e Cariacica eram os que apresentavam maior prevalncia da

    doena. Os dois municpios juntos concentraram 60,5% das notificaes no estado,

    seguidos por Guarapari, Domingos Martins, Colatina e Linhares. Nessa ocasio, a

    localidade de Roda Dgua, no municpio de Cariacica, j aparecia como principal

    foco da doena na regio (25).

    Cariacica um dos municpios capixabas mais populosos, com 348.738 habitantes

    contabilizados no censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica, e a

    maioria dessa populao vive em reas urbanizadas (35). Sendo assim, os elevados

    nmeros de notificaes, que concentram-se nas reas rurais e periurbanas como

    Roda Dgua, diluem-se no total de indivduos e o municpio encontra-se na faixa de

    incidncia de 0 a 5 casos por 100 mil habitantes (Figura 1). Porm basta analisar os

    nmeros absolutos para compreender sua importncia no cenrio capixaba da LTA.

    O municpio esteve entre os 10 com maior nmero de casos notificados no Esprito

    Santo entre os anos de 1989 a 1998 (34). Nos ltimos cinco anos (2009 a 2013),

    esteve entre os cinco municpios com mais casos notificados na regio metropolitana

    do estado, segundo a Secretaria de Estado da Sade (29)(Figura 2).

  • 22

    Figura 1. Mapa da incidncia de leishmaniose tegumentar americana por 100 mil

    habitantes no estado do Esprito Santo no ano de 2010 (29).

  • 23

    Figura 2. Nmero de casos de LTA notificados por municpio nos anos de 2009 a

    2013, na rgio Metropolitana do Esprito Santo, segundo dados da Regional Vitria

    da Secretaria de Estado da Sade (29).

    Nota-se no grfico acima que Cariacica tem contribudo com boa parte das

    notificaes do estado, inclusive ficando frente de municpios como Afonso Cludio

    e Brejetuba, no ano de 2013, por exemplo. Estes nmeros tem origem no SINAN,

    mas tambm nas planilhas paralelas, enviadas SESA diretamente pelos municpios

    (29).

    1.5 Reservatrios:

    Cerca de 20 espcies de Leishmania infectam o homem, sendo que todas elas so

    zoonticas ou tm origens zoonticas recentes (2).

    Nmeros da LTA nos anos de 2009 a 2013 - Regio

    Metropolitana do ES (SESA/ES)

    56

    14

    10

    19

    0

    5

    10

    15

    20

    25

    30

    2009 2010 2011 2012 2013

    N

    me

    ro d

    e C

    as

    os

    Afonso Cludio

    Alfredo Chaves

    Anchieta

    Brejetuba

    Cariacica

    Conceio do Castelo

    Domingos Martins

    Fundo

    Guarapari

    Ibatiba

    Itagua

    Itarana

    Laranja da Terra

    Marechal Floriano

    Pima

    Santa Leopoldina

    Santa Maria de Jetib

    Santa Teresa

    Serra

    Venda Nova do Imigrante

    Viana

    Vila Velha

    Vitria

  • 24

    Para uma espcie animal ser incriminada como hospedeiro reservatrio, sua

    populao deve ser numerosa, possuir hbitos gregrios freqentes, vida longa,

    intenso contato com o inseto vetor, infeco leve de curso longo e o agente

    infectante deve ser indistinguvel do parasito encontrado no homem (36).

    Pouco se conhece sobre os reservatrios naturais de L.(V.) braziliensis, entretanto

    tm sido identificadas vrias espcies de roedores naturalmente infectados por este

    parasito: Oryzomys concolor, Oryzomys capito, Oryzomys nigripes, Akodon

    arviculoides, Proechimys spp, Rhipidomys leucodactylus, e Bolomys lasiurus, alm

    do marsupial Didelphis marsupialis (37-39).

    Pesquisas vem apontando a presena de ces (8, 30, 31, 40, 41), equdeos (31, 42,

    43) e roedores domsticos (44) infectados por leishmania em inmeros focos de

    LTA, sugerindo a participao dos mesmos na domiciliao da doena.

    No ES, presume-se que o tatu (Euphractus sexcinctus) e a paca (Agouti paca) sejam

    hospedeiros no ciclo silvestre de L. (V.) braziliensis (24), enquanto que os ces e,

    possivelmente, eqinos (30, 31) atuem como hospedeiros domsticos de infeco

    para seres humanos em muitos focos da doena (17, 30).

    De fato ainda controversa a caracterizao de animais domsticos como

    reservatrios da LTA, sendo estes comumente considerados hospedeiros acidentais,

    tal como o homem (40). Entretanto, merece destaque a participao do co no ciclo

    de transmisso domiciliar e peridomiciliar da doena, tendo em vista a frequncia

    com que o animal aparece infectado em reas de colonizao antiga, especialmente

    no Sudeste do Brasil, em geral pela mesma espcie de Leishmania sp isolada em

    casos huamanos. (8, 30, 31, 46). A importncia do reservatrio canino vem da

    freqente e intensa proximidade entre ces e humanos (47), alm de sua

    capacidade de transitar entre a mata e o domiclio.

    Mesmo com a ampla investigao sobre a infeco natural de ces por Leishmania

    sp., em reas endmicas de LTA, o papel desse animal como possvel reservatrio

    domstico ainda no est totalmente esclarecido. Sabe-se hoje, que o ciclo de

    transmisso da LTA apresenta caractersticas peculiares em cada regio endmica,

  • 25

    e nem sempre possvel extrapolar dados de uma localidade para outra. As

    condies fitogeogrficas de cada regio tendem a ser distintas, podendo no haver

    similaridades entre os fatores biticos como a presena da mesma espcie de

    parasito, reservatrios silvestres e flebotomneos (48).

    O parasitismo por Leishmania em lcera cutnea de co naturalmente infectado foi

    diagnosticado pela primeira vez por Pedroso, em 1913 (49). No entanto, somente a

    partir de 1980 foram intensificados os estudos sobre a participao de caninos

    domsticos em ciclos de transmisso da LTA, no Brasil (50).

    Em rea endmica no estado da Bahia, L. (V.) braziliensis foi identificada em seis

    amostras isoladas de ces, e essas, por sua vez, eram similares s isoladas de

    leses cutneas do homem, na mesma regio (41).

    Em foco de transmisso de LTA no estado do Rio de Janeiro, isolou-se L. (V.)

    braziliensis de 26 casos humanos, de dois ces e uma mula. Nesse foco constatou-

    se que 32% dos ces e aproximadamente 30% dos eqinos apresentavam leses

    cutneas de leishmaniose, sugerindo sua participao na transmisso da molstia ao

    homem (51).

    Ainda no RJ, no municpio de Paracambi, realizou-se inqurito epidemiolgico

    canino para LTA e constatou-se a infeco canina nas formas clnica/subclnica, A

    associao da prevalncia em ces com a infeco humana sugere que o co possa

    atuar como fonte de infeco, assim como favorecer a disseminao da doena.

    (46).

    No ES, em um estudo prospectivo no municpio de Viana, observou-se que 17,2%

    dos ces estavam naturalmente infectados. Dentre os 732 habitantes da rea, foram

    registrados 11 casos novos da doena, sendo que 10 deles ocorreram na coorte de

    indivduos que conviviam com ces doentes (24, 30).

    Em Itarana, tambm no ES, durante um surto epidmico, constatou-se que as

    pessoas que conviviam com ces doentes apresentavam-se infectadas em

    proporo significativamente maior do que as do grupo controle. No referido estudo,

  • 26

    verificaram que 45,24% dos indivduos que conviviam com ces doentes

    apresentaram intradermorreao de Montenegro positiva. J, entre os que no

    conviviam com animais infectados, apenas 19,53% apresentaram positividade. Na

    ocasio, L. (V.) braziliensis foi isolada tanto no homem quanto no co, sugerindo que

    o animal tenha papel importante no ciclo de transmisso da LTA (31).

    Em pesquisa sobre a especificidade alimentar de flebotomneos nos municpios

    capixabas de Viana e Afonso Cludio, observou-se que as mesmas espcies que

    apresentavam antropofilia tambm eram intensamente cinoflicas, tanto nos

    ambientes domiciliar quanto peridomiciliar e mata. O autor infere que a transmisso

    ocorre predominantemente no ambiente domiciliar, tendo como fonte de infeco o

    co e talvez o prprio homem (24).

    Vale lembrar que a inexistncia de ces com leses suspeitas em reas endmicas

    de LTA humana no significa que a doena canina no esteja ativa (52). comum

    encontrar animais que no desenvolvem leses, mas albergam os parasitos, e

    tambm aqueles que j apresentaram leses, mas evoluram naturalmente para a

    cura clnica.

    Ainda no se conhece o papel epidemiolgico dos animais com infeco subclnica,

    no ciclo de transmisso da LTA, mas sabida a grande dificuldade em caracterizar

    doena ou cura parasitolgica na espcie canina. No municpio de Viana, ES, foram

    examinados 186 ces, dos quais 46 apresentavam leses suspeitas, sendo

    encontrados parasitos em 31 deles. Os pesquisadores no puderam demonstrar

    parasitos em material obtido por bipsia das cicatrizes das leses curadas, seja por

    meio do exame direto ou inoculao em hamster, reforando a dificuldade de

    diagnstico preciso em ces(30).

    1.6 Os Vetores:

    Os flebotomneos so os vetores de Leishmania sp. So insetos hematfagos

    pertencentes ordem Diptera, famlia Psychodidae, subfamlia Phlebotominae. Estes

    insetos so popularmente conhecidos como mosquito-palha, asinha-de-palha,

  • 27

    birigui, cangalha, tatuqura. So pequenos, muito pilosos, castanhos claros ou

    cor-de-palha, e reconhecidos por permanecerem com as asas, lanceoladas,

    entreabertas e ligeiramente levantadas no repouso. Segundo (53) apresentam curto

    raio de ao, que fica em torno de 200 m.

    O grupo de insetos ao qual pertencem os flebotomneos surgiu no perodo Cretceo

    Inferior (h entre 145 e 65 milhes de anos) Estes dpteros ento ocuparam a

    maioria das regies compostas por Savanas, Mata Atlntica, Caatinga, Cerrado,

    Floresta Amaznica e Chaco, com exceo das regies frias e ilhas ocenicas (54).

    Atualmente so encontrados flebotomneos principalmente nos trpicos e

    subtrpicos, com algumas poucas espcies penetrando as regies temperadas tanto

    do Norte (a at 50 de latitude Norte) quanto do Sul (a at cerca de 40 de latitude

    Sul), no sendo encontrados na Nova Zelndia nem nas Ilhas do Pacfico. Ocorrem

    em uma gama muito ampla de habitats, desde o nvel do mar a altitudes de at 2800

    m (55).

    Quanto alimentao de adultos, machos e fmeas sugam seivas vegetais, nctar

    de flores, frutos e solues aucaradas, utilizando carboidratos como fonte de

    energia(56-60). Os carboidratos influenciam o desenvolvimento e a infectividade de

    Leishmania em flebotomneos. Somente as fmeas so hematfagas, necessitando

    de sangue de vertebrados para a maturao de seus ovos. Algumas espcies se

    alimentam apenas uma vez entre as posturas, enquanto outras precisam de vrios

    repastos para um nico ciclo de oviposio, o que pode fazer destas importantes

    vetoras (61-63).

    No ciclo biolgico desses dpteros, as fases imaturas ocorrem em ambiente terrestre.

    Os ovos, as larvas, com quatro estdios evolutivos, e as pupas necessitam de locais

    midos sombreados, ricos em matria orgnica, para se desenvolverem at a fase

    adulta, alada. De modo geral, para seu desenvolvimento, requerem temperaturas

    entre 20C e 30C, umidade superior a 80% e matria orgnica (53).

    Fatores como o clima, temperatura, umidade relativa do ar, precipitao, a fonte de

    alimentos, a declividade e outros parmetros ecolgicos podem influenciar na

  • 28

    densidade populacional destes insetos e, por conseguinte, na distribuio das

    leishmanioses (64, 65).

    Em condies de laboratrio, a temperatura tima para o desenvolvimento da

    maioria das espcies neotropicais de 25C a 27C, sendo que condies trmicas

    ligeiramente acima desta faixa implicam em ciclos mais rpidos (62). A maioria das

    espcies de flebotomneos da regio Neotropical habita reas de floresta com ndice

    pluviomtrico em torno de 2000 mm por ano, mas estes insetos tambm podem ser

    encontrados em reas semi-ridas, com cobertura vegetal arbustiva (53, 66).

    Sobre seu comportamento hematofgico, os flebotomneos iniciam sua atividade no

    crepsculo vespertino, avanando especialmente nas horas da primeira metade da

    noite (67). Durante o dia podem ser encontrados em ectopos naturais como troncos

    de rvores, tocas de animais, sob folhas cadas no solo, frestas em rochas e em

    cavernas, que utilizam para repouso aps a cpula e a hematofagia (68-71).

    At o momento, pelo menos 927 espcies ou subespcies de flebotomneos atuais e

    22 fsseis j foram descritas no planeta, sendo que aproximadamente 500 atuais e

    16 fsseis ocorrem no Novo Mundo (72). O Brasil o pas que concentra o maior

    nmero de espcies (73).

    Esses dpteros esto amplamente distribudos por todo o territrio brasileiro,

    ocorrendo em nichos ecolgicos variados, inseridos em diferentes biomas, o que

    caracteriza sua estreita relao adaptativa com o meio ambiente. A distribuio

    geogrfica das espcies de flebotomneos pode ser influenciada por barreiras fsicas,

    precipitao pluviomtrica, vegetao, luminosidade e abundncia de hospedeiros

    vertebrados(74). As mudanas ambientais, seja por fenmeno natural ou interveno

    humana, como destruio das matas nativas, alteram os habitats naturais de

    flebotomneos e modificam as relaes ecolgicas entre vetores e parasitos.

    Forattini, em 1960 (75), j enfatizava a chance de flebotomneos silvestres se

    adaptarem ao ambiente domstico e peridomstico. Segundo o autor, a capacidade

    adaptativa destes insetos depende da similaridade do ambiente alterado pelo

    homem com o nicho ecolgico por eles originalmente ocupado.

  • 29

    Como os habitats naturais so alterados ou destrudos pela atividade humana,

    algumas espcies desaparecem e outras se beneficiam. As espcies com maior

    probabilidade de se adaptarem so aquelas que predominam no estrato terrestre e

    prosperam em bordas florestais ou clareiras. Os flebotomneos pr-adaptados que

    levaram vantagens com a atividade antrpica, atualmente so encontrados tanto em

    ambientes rurais quanto urbanos, com afinidade por abrigos de animais domsticos

    e habitaes humanas (76).

    A densidade populacional desses insetos no ambiente peridomiciliar diretamente

    relacionada sua atratividade pelos animais domsticos e s condies ambientais

    encontradas nos abrigos. Tais condies podem ser: ambiente rico em matria

    orgnica, favorvel ao desenvolvimento das formas imaturas; grande quantidade de

    animais para a alimentao sangunea dos adultos e uma gama de micro-habitats

    que os protegem das situaes adversas como ventos e chuvas excessivos (77-79).

    Alguns estudos tm mostrado que a agregao de flebotomneos em ambiente

    peridomiciliar est relacionada com a liberao de feromnios pelos insetos e

    cairomnios pelos hospedeiros (80, 81). O carter oportunista destes psicoddeos,

    no que diz respeito alimentao sangunea, revela que uma grande variedade de

    vertebrados pode funcionar como fonte alimentar, entre eles animais domsticos,

    silvestres e o homem (82).

    Uma pesquisa sobre o comportamento de flebotomneos em rea endmica de LTA

    no norte do estado do Paran, encontrou alta prevalncia de insetos antropoflicos

    em abrigos de galinhas e sunos, deixando evidente que os animais domsticos

    exercem forte atrao sobre esses dpteros, independentemente de serem ou no

    caracterizados como reservatrios de Leishmania sp (83).

    De acordo com essas observaes, possvel compreender por que a LTA

    representa to importante problema de sade pblica e por que est presente em

    todos os estados do Brasil. Abrigos de animais domsticos construdos prximos das

    habitaes humanas, a falta de limpeza no peridomiclio e a localizao das casas

    ao lado de pequenos capes de mata so freqentemente observados nas reas

  • 30

    rurais em diversas regies do pas (84-87). Assim, surgem condies propcias para

    a procriao dos flebotomneos, favorecendo o aparecimento e a disseminao da

    doena.

    O potencial vetorial dos flebotomneos determinado por sua capacidade de

    sobrevivncia, multiplicao e diferenciao das promastigotas no trato digestivo, e

    probabilidade de transmitir os parasitos aos vertebrados (88).

    Para a espcie ser considerada transmissora da Leishmania ao homem, devem ser

    considerados os seguintes critrios(89):

    Apresentar certo grau de antropofilia;

    Ter a capacidade de infectar-se quando se alimentar no reservatrio e

    transmitir a Leishmania para um novo hospedeiro;

    A Leishmania encontrada no flebotomneo naturalmente infectado deve

    ser a mesma isolada no ser humano, em determinada rea geogrfica;

    Em reas onde a doena ocorre, a distribuio espacial do vetor deve

    coincidir com a da espcie de Leishmania encontrada no homem, e em

    densidade suficiente para manter a transmisso do parasito na

    natureza;

    A espcie de flebotomneo deve apresentar capacidade de se infectar

    experimentalmente e ser capaz de transmitir a Leishmania para um

    hospedeiro, pela picada.

    Em relao sistemtica de flebotomneos nas Amricas, Young e Duncan (1994)

    (61) agrupam as espcies em um nico gnero Lutzomyia, enquanto que Galati

    (2003) (71) as distribui em 24 gneros.

    No estado do Esprito Santo, adotando a classificao filogentica proposta por (71),

    existem registros de ocorrncia de 57 espcies de flebotomneos pertencentes aos

    gneros Bichromomyia, Brumptomyia, Evandromyia, Expapillata, Lutzomyia,

    Micropygomyia, Migonemyia, Nyssomyia, Pintomyia, Pressatia, Psathyromyia,

    Psychodopygus, Sciopemyia e Trichopygomyia. (4, 17, 61, 71, 90-93).

  • 31

    Pesquisas realizadas no estado do ES demonstraram a existncia de quatro

    espcies com potencial para transmisso de LTA, sendo elas Nyssomyia intermedia

    (Lutz & Neiva, 1912), Nyssomyia whitmani (Antunes & Coutinho, 1939), Migonemyia

    migonei (Frana, 1920) e Pintomyia fisheri (Pinto, 1926). Admite-se que essas

    espcies tenham importncia epidemiolgica por serem antropoflicas e j terem sido

    encontradas parasitadas pela L. (V.) braziliensis em outros estados brasileiros. No

    ES, leva-se em considerao o fato de aparecerem em alta densidade nas principais

    reas endmicas de LTA, sugerindo que tenham importncia como vetoras do

    parasito (17, 30).

    Nyssomyia intermedia tem sido considerada principal vetora de L.(V.) braziliensis no

    Sudeste do Brasil (22), embora Ny. whitmani (Antunes & Coutinho, 1939) e Mg.

    migonei (Frana, 1920) tambm sejam freqentemente encontradas fazendo repasto

    em humanos no peridomiclio, em reas com transmisso ativa de leishmaniose (24,

    71).

    Alm de j terem sido incriminadas como vetoras em diversas regies do pas, Ny.

    intermedia, Ny. whitmani e Mg. migonei tambm tm afinidade pelo co (24),

    considerado reservatrio de L. (V.) braziliensis no ambiente domiciliar (8, 17, 23, 30).

    Estudos sobre flebotomneos vm sendo realizados no Esprito Santo, tanto nas

    reas rurais quanto periurbanas, onde a LTA apresenta alta incidncia. No entanto, a

    captura de flebotomneos nessas regies, vem se restringindo aos ambientes

    domsticos e pequenos fragmentos de Mata Atlntica prximos s casas (22). O

    nico estudo em reserva primria de Mata Atlntica no estado foi realizado em rea

    com baixa incidncia de LTA (94).

    Pesquisas realizadas no Brasil e em outros paises da Amrica do Sul evidenciam

    que o clima tropical e as altitudes de at 800 metros acima do nvel do mar so

    favorveis transmisso da LTA (37, 85, 95-99).

    Pesquisadores estudaram as condies de sobrevivncia de Ny. intermedia, espcie

    incriminada como transmissora da LTA em diversas regies do Brasil. Segundo os

    autores, esta no habita altitudes mais elevadas (85). Um outro trabalho, em Itapira,

  • 32

    SP, encontrou-se que mais de 70% das reas de ocorrncia da LTA em altitudes

    menores que 750 m (100).

    Alm da declividade, o clima, influenciado por esta, as fontes de alimentos e outros

    parmetros ecolgicos determinam a distribuio dos flebotomneos. Assim, acabam

    por influenciar a ocorrncia das doenas transmitidas por eles (64). Fatores

    climticos como temperatura, umidade e pluviometria, tm influenciado de modo

    varivel a populao de flebotomneos, dependendo da rea analisada (101).

    A riqueza e diversidade de espcies pertencentes a diferentes grupos apresentam

    padres distintos de distribuio. Algumas so restritas ao ambiente silvestre e

    outras registradas em reas profundamente alteradas pela ao do homem. (102).

    O aumento da densidade ou abundncia das populaes de flebotomneos em torno

    das casas demonstra o grau de afinidade de algumas espcies a ambientes com

    elevada atividade antrpica (103, 104). Essas variaes populacionais podem estar

    associadas com o aumento na incidncia de leishmaniose, pois algumas delas

    podem atuar como vetores da doena (105, 106).

    Em Afonso Cludio, ES, foi desenvolvido um estudo altitudinal, no qual Ny.

    intermedia foi incriminada como principal espcie vetora da LTA naquele ambiente,

    tendo como possveis vetores secundrios Ny. whitmani e Mg. migonei. Neste estudo

    a transmisso peridomiciliar foi confirmada como a mais importante(17).

    Em Cariacica, ES, estudos anteriores apontam indcios de transmisso intra e

    peridomiciliar, com a participao de Ny. intermedia, Pi. fisheri e Mg. migonei como

    possveis vetores (22).

    Nos municpios de Viana e Afonso Cludio, ES, analisando-se fmeas de

    flebotomneos capturadas em focos de LTA, verificou-se que 0,77% delas continham

    DNA de Leishmania sp, dentre as quais algumas das principais espcies

    incriminadas como vetoras, tais como Ny. intermedia e Ny. whitmani. Ficou assim

    demonstrando que havia circulao dos parasitos entre a populao de vetores

    (107).

    Tambm no municpio de Viana, que faz limite com Cariacica, pesquisadores

    identificaram criadouros peridomiciliares de flebotomneos. Ao capturar formas

  • 33

    adultas que emergiam do solo em diferentes distncias das habitaes humanas e

    abrigos de animais, observaram que a espcie encontrada em maior nmero foi Ny.

    intermedia, que, assim como Mg. migonei deu preferncia a criadouros mais

    prximos das casas (32). Considerando que o raio de vo mdio dos flebotomneos

    curto, em geral at 200 metros (53), estes achados indicam que os insetos que

    circulam em determinado ambiente nascem de criadouros no prprio local.

    Observando-se os hbitos antropoflicos e potencial vetorial das duas espcies mais

    capturadas, refora-se a hiptese da transmisso domiciliar da LTA na regio.

    Analisando os aspectos epidemiolgicos da LTA em reas intensamente modificadas

    pela ao antrpica, como no Sudeste do Brasil, percebe-se a complexidade de que

    se reveste o ciclo de transmisso da doena na regio. A devastao das florestas

    reduzindo o quantitativo de animais silvestres, ao invs de facilitar o entendimento

    dos mecanismos de transmisso da LTA, parece ter desafiado a compreenso dos

    pesquisadores, que ainda no conseguiram explicar o ressurgimento da doena em

    reas onde havia desaparecido h dcadas (108). Mais que isto, o aparecimento da

    doena humana em reas colonizadas h mais de um sculo, onde nunca fora antes

    registrada, evidencia a necessidade de novos estudos para elucidar seu mecanismo

    de transmisso.

  • 34

    2 JUSTIFICATIVA

    Considerando os postulados de Killick-Kendrick e Ward (1981) (89), sobre os elos da

    cadeia de transmisso da leishmaniose em determinada regio, existem, na

    literatura, poucos trabalhos abrangentes, integrando informaes consistentes sobre

    a doena humana, animais reservatrios e espcies vetoras de Leishmania, em uma

    mesma rea endmica. A maioria das publicaes traz informaes fragmentadas,

    ora abordando exclusivamente aspectos relacionados doena humana, outras

    vezes focalizando um nico elo da cadeia de transmisso, como animais

    reservatrios ou insetos vetores. Soma-se a isto o fato de que diferentes grupos de

    pesquisadores trabalham de forma independente, utilizando metodologias

    diferenciadas, em reas com caractersticas ecolgicas diversas. Em funo disto,

    existe enorme dificuldade em se comparar os resultados de trabalhos realizados em

    diferentes reas endmicas, inviabilizando qualquer estudo de meta-anlise sobre os

    mecanismos de transmisso da LTA. Da a necessidade de realizar estudos mais

    abrangentes, com novas abordagens metodolgicas e resgatando informaes

    acumuladas a partir de pesquisas anteriores realizadas em uma mesma rea

    endmica. Com esta viso se prope a realizao do presente trabalho, na tentativa

    de elucidar os mecanismos de transmisso da LTA em rea de colonizao antiga,

    com caractersticas ecolgicas intensamente modificadas pela ao antrpica e onde

    a doena assume perfil epidemiolgico diverso daquele observado em regies com

    transmisso silvestre.

    O conhecimento sobre a composio da fauna flebotomnica de determinada regio

    e o comportamento das espcies que ali ocorrem imprescindvel para o

    esclarecimento de aspectos envolvidos na transmisso da LTA, possibilitando fazer

    inferncias a respeito de grupos mais ou menos expostos ao risco de infeco. Alm

    disso, a busca constante de informaes sobre o aumento do nmero de casos de

    LTA e a adaptao dos vetores a esses ambientes necessria para a

    compreenso da epidemiologia desse agravo e a sustentao de aes de

    preveno e controle.

    A observao de que os casos de LTA na rea desapareciam em altitudes acima de

    550 metros, a partir de um deslocamento de cerca de cinco quilmetros da base do

    vale at o topo da montanha, mostrou-se epidemiologicamente interessante para a

  • 35

    realizao do presente trabalho. Pelas caractersticas descritas, supe-se que os

    provveis reservatrios de Leishmania, sejam eles humanos, animais domsticos ou

    silvestres, estariam igualmente representados em qualquer nvel de altitude, na rea

    delimitada para o estudo. Como hiptese de trabalho, supe-se que a ausncia da

    doena na parte superior do vale ocorra em funo de mudanas nas populaes de

    flebotomneos, em diferentes nveis de altitude. Assim, um estudo ecolgico sobre os

    insetos nessa rea poder trazer importantes subsdios para a elucidao do ciclo

    de transmisso da LTA na regio costeira do estado do ES.

  • 36

    3 OBJETIVOS

    3.1 Objetivo geral

    Estudar as populaes de flebotomneos e alguns fatores que podem influenciar sua

    distribuio rea endmica para leishmaniose tegumentar americana, a localidade de

    Roda Dgua, municpio de Cariacica, Esprito Santo, Brasil.

    3.2 Objetivos Especficos

    I) Identificar as espcies de flebotomneos que ocorrem no ambiente silvestre e

    peridomiciliar na localidade de Roda Dgua;

    II) Avaliar a influncia da altitude sobre as populaes de flebotomneos da rea;

    III) Caracterizar a distribuio as espcies antropoflicas em relao ao ambiente

    peridomiciliar ou silvestre.

    IV) Inferir sobre as provveis espcies vetoras de Leishmania na rea estudada.

  • 37

    4 MATERIAIS E MTODOS

    4.1 Descrio da rea de estudo

    O estudo foi realizado na localidade de Roda Dgua, Cariacica, situada a 20 16

    21 de latitude Sul e 40 25 05 de longitude Oeste (Figura 3). O municpio faz parte

    da regio metropolitana de Vitria, capital do estado, da qual localiza-se a 15 Km de

    distncia. O relevo acidentado (Figura 4), com altitude variando entre 20 e 718 m

    acima do nvel do mar (109). O clima tropical mido, com ndice de precipitao

    anual entre 1200 e 1300 mm, com destaque para os meses de novembro a maro,

    com precipitao mensal que alcana mais de 150 mm. As menores precipitaes

    ocorrem nos meses de inverno com valores inferiores a 100 mm. A temperatura

    mdia do municpio da ordem de 24 C, apresentando os meses mais quentes no

    vero, em que as temperaturas chegam a ultrapassar 33 C (110).

    A localidade de Roda Dgua (Figura 5), uma rea endmica para LTA. Pertence

    zona rural do municpio e tem como caractersticas a localizao muito prxima de

    rea urbanizada (Figura 4), conservando, no entanto, caractersticas rurais, com

    remanescentes de floresta Atlntica. Tratam-se de vales, cujas encostas foram

    quase que totalmente ocupadas com extensas plantaes de banana e caf,

    entremeadas por pequenas glebas florestais de formao secundria, restritas aos

    cumes dos montes ou trechos com afloramentos rochosos, imprprios para

    agricultura. O tipo de relevo bastante acidentado da regio determina a localizao

    aleatria das residncias em diferentes nveis de altitude, com cenrio repetitivo no

    entorno das casas, representado pela presena dos abrigos de animais domsticos

    em contigidade com as plantaes de banana. Por sua vez, as lavouras delineiam

    uma faixa de isolamento entre o ambiente domstico e os remanescentes florestais.

    Tais caractersticas propiciam a formao de diferentes nichos ecolgicos para os

    insetos vetores, variando no sentido horizontal, do peridomiclio para a floresta e, no

    sentido vertical, em funo dos diferentes nveis de altitude.

    As casas distam pelo menos 100m dos remanescentes florestais. Na diviso

    sucessiva das propriedades rurais, as habitaes humanas passaram a ser

    construdas cada vez mais prximas entre si, formando verdadeiros povoados. Tal

    configurao do ambiente facilita o deslocamento das pessoas e dos animais

  • 38

    domsticos, principalmente os ces, de uma casa para outra. Muitos moradores

    criam tambm aves, porcos, gatos, cabras, entre outros animais.

    Figura 3. Acesso localidade de Roda Dgua, Cariacica, evidenciando o relevo

    acidentado.

  • 39

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  • 40

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  • 41

    4.2 Dados epidemiolgicos

    O presente estudo utilizou dados epidemiolgicos contidos nos pronturios mdicos

    dos pacientes diagnosticados com LTA provenientes de Roda Dgua atendidos na

    no Servio de Infectologia Unidade de Medicina Tropical da Universidade Federal do

    Esprito Santo (UFES), que referncia estadual para o agravo. As informaes

    colhidas e registradas nestes pronturios com fins didticos e de pesquisa, por tratar-

    se de um hospital-escola, vo muito alm daquelas existentes nas fichas de

    notificao do Sistema Nacional de Notificaes do Ministrio da Sade (SINAN),

    incluindo a localizao exata e georreferenciamento das residncias dos pacientes

    com diagnstico positivo para LTA.

    4.3 As coletas

    Para realizao das coletas foram definidos, com auxlio de um aparelho GPS, seis

    pontos fixos, distribudos em trs nveis de altitude, sendo que o nvel 1

    correspondeu faixa de altitude de at 250 m; o nvel 2 abrangeu a faixa entre 250 e

    500 m e o nvel 3 representou a faixa acima de 500 m. Em cada nvel de altitude

    foram definidos arbitrariamente dois pontos fixos para realizao das coletas de

    flebotomneos, um situado na mata e outro no peridomiclio, respectivamente.

    Programou-se uma coleta por ms, no perodo de maro de 2002 a fevereiro de

    2004. As coletas eram realizadas simultaneamente nos seis pontos fixos

    previamente definidos, sendo os insetos coletados no decorrer das trs primeiras

    horas noturnas. Em cada incurso ao campo participavam nove coletores, sendo que

    seis eram alocados aleatoriamente, um para cada ponto fixo, onde coletavam

    durante as trs horas programadas. Em cada nvel de altitude, um terceiro coletor

    dividia seu tempo de trabalho entre o peridomiclio e a mata, coletando durante uma

    hora e meia em cada ponto. Este protocolo teve como objetivo corrigir possvel vis

    de amostragem, decorrente da habilidade individual de cada coletor.

    Durante as coletas as temperaturas eram aferidas em dois momentos, uma vez no

    incio da coleta e outra no trmino. Ento era calculada a mdia da temperatura de

    cada nvel, em cada ponto, a cada coleta. Evitavam-se as coletas nos dias mais

    chuvosos, para que estas no interferissem nos resultados.

  • 42

    Figura 6. Acesso principal para a localidade de Roda Dgua, Cariacica, de onde

    podem-se observar os trs nveis de elevao demarcados por linhas.

    Figura 7. Ponto de coleta na mata do nvel 1, apontado pela seta vermelha.

    NVEL 3

    NVEL 2

    NVEL 1

  • 43

    Figura 8. Peridomiclio do nvel 2, mostrando duas residncias, rvores frutferas e

    ces (Fonte: arquivo pessoal).

    Figura 9. Peridomiclio do nvel 2. Plantaes de banana, muito comuns na regio, e

    a mata ao fundo, na parte mais alta deste nvel (Fonte: arquivo pessoal).

  • 44

    Figura 10. Vista do alto do nvel 3, a aproximadamente 680 m neste ponto. Ao fundo

    possvel ver o mar e os municpios de Vila Velha, esquerda, e em parte,

    Guarapari (Fonte: arquivo pessoal).

    4.4 As capturas

    Os flebotomneos foram capturados por busca ativa com capturador manual de

    Castro (figura 2), em superfcies de pouso, representadas por paredes externas das

    casas, abrigos de animais domsticos, troncos de rvores e nas armadilhas de

    Shannon modificadas (17). A armadilha de Shannon modificada representada por

    um retngulo de tecido branco de 2,00 m x 1,20 m, coberto por um teto tambm de

    tecido branco medindo 1,20 m X 1,50 m. Duas armadilhas foram instaladas

    simultaneamente em cada nvel de altitude, e sempre em cada uma delas havia um

    pesquisador fixo durante as trs horas e mais um mvel, durante a metade deste

    perodo. No peridomiclio os insetos foram capturados nas armadilhas, paredes das

    residncias, rvores e anexos. Na mata foram coletados nas armadilhas e nos

    troncos de rvores.

  • 45

    Figura 11. Coleta por busca ativa em repouso num galinheiro localizado no

    peridomiclio do nvel 2 (Fonte: arquivo do prof. Gustavo R. Leite).

    Figura 12. Coleta por tubo de suco de Castro em armadilha de Shannon

    modificada montada na mata do nvel 2 (Fonte: arquivo do prof. Gustavo R. Leite)

  • 46

    4.5 Identificao dos insetos

    Os flebotomneos capturados foram levados ao laboratrio onde passaram por

    processo de triagem e montagem em lminas, segundo a tcnica de Barretto &

    Coutinho (1940) (111). A identificao dos espcimes baseou-se nos critrios

    taxonmicos propostos por Galati (2003) (71), enquanto a abreviao dos gneros

    segue a proposta de Marcondes (2007) (112).

    Aqueles flebotomneos que no puderam ser identificados em nvel de espcie

    formaram o grupo NI. Estes foram depositados em um arquivo entomolgico do

    laboratrio e posteriormente sero reavaliados. Algumas espcies s podem ser

    identificadas pela observao de caracteres especficos da fmea ou do macho, e

    nem sempre um exemplar de cada sexo era coletado.

    4.6 Avaliao da sazonalidade

    A distribuio sazonal das espcies de flebotomneos que ocorrem em Roda Dgua

    foi avaliada com base em variaes observadas nos regimes de chuva e

    temperatura, ao longo do perodo estudado, com a finalidade de identificar possvel

    influncia dos parmetros climticos, sobre as populaes dos insetos. A avaliao

    foi conduzida de duas formas: a primeira dividindo o perodo em chuvoso e seco,

    com base nos ndices pluviomtricos estimados para a regio e a segunda, pelas

    estaes do ano, primavera, vero, outono e inverno.

    4.7 Anlises Estatsticas

    As anlises estatsticas foram realizadas em duas etapas, sendo a primeira foi

    executada no programa IBM SPSS Statistics 20 (45), em que somente as espcies

    reconhecidamente antropoflicas (24) foram avaliadas quanto s variveis nvel de

    altitude, ambiente, perodo do ano (chuvoso e seco) e estaes do ano.

    Alm da estatstica descritiva, aplicou-se o teste de Kolmogorov-Smirnov para saber

    se os dados apresentavam distribuio de Gauss. Como estes no seguiam a

    distribuio Gaussiana foi necessrio aplicar testes no-paramtricos. Para variveis

    como o nvel de altitude e estaes do ano aplicou-se o teste de Kruskall-Wallis e

    para ambiente de coleta e poca, o teste U de Mann-Whitney-Wilcoxon. Em relao

  • 47

    altitude tambm foi calculada a correlao de Spearman para dados no

    paramtricos (113).

    A segunda etapa referente anlise ecolgica das espcies de flebotomneos

    capturadas em Roda Dgua, obtendo-se os ndices abundncia, riqueza,

    diversidade de Shannon_H, equitabilidade_J e dominncia de Berger-Parker. Para

    esta fase de anlises foi utilizado o programa Past 3.x .

    Os dados foram tabulados e os grficos elaborados no programa Microsoft Excel

    Starter 2010.

    4.8 Aspectos ticos

    O projeto foi encaminhado ao Comit de tica em Pesquisa envolvendo seres

    humanos do Centro de Cincias da Sade da Universidade Federal do Esprito

    Santo, obtendo-se parecer de autorizao consubstanciado n 494.029 (Anexo 1).

  • 48

    5 RESULTADOS

    No perodo de abril de 2002 a maro de 2004 foram capturados 13.233 exemplares

    de flebotomneos, identificados em 23 espcies. Deste total, 114 exemplares

    estavam danificados e no puderam ser identificados em nvel de espcie com base

    nos caracteres taxonmicos analisados. Estes espcimes foram registrados no grupo

    NI, e contabilizados somente no total. A tabela 1 apresenta todas as espcies

    encontradas em Roda Dgua e sua distribuio de acordo com o nvel de elevao

    e o tipo de ambiente.

    Tabela 1. Flebotomneos capturados em Roda Dgua, nos ambientes mata e

    peridomiclio, no perodo de abril de 2002 a maro de 2004, com destaque para as

    principais espcies conhecidamente antropoflicas e de importncia

    epidemiolgica(*).

    Ambiente

    Espcie Peridomiclio Mata Total (%)

    Brumptomyia nitzulescui 1 8 9 0,068

    Evandromyia callipyga 1 18 19 0,143

    Evandromyia edwardsi 0 9 9 0,068

    Evandromyia sallesi 0 1 1 0,007

    Evandromyia tupynambai 0 2 2 0,015

    Martinsmyia gasparviannai 0 27 27 0,204

    Micropygomyia schreiberi 32 218 250 1,889

    Micropygomyia ferreirana 53 224 277 2,093

    Migonemyia migonei* 1021 127 1148 8,675

    Migonemyia quinquefer 136 407 543 4,103

    Nyssomyia intermedia* 7826 262 8088 61,120

    Nyssomyia yuilli yuilli 0 2 2 0,015

    Pintomyia fischeri* 1738 671 2409 18,20

    Pintomyia misionensis 0 2 2 0,015

    Pintomyia monticola* 20 202 222 1,677

    Pintomyia pessoai 0 1 1 0,007

    Psathyromyia pascalei 2 24 26 0,196

    Psathyromyia limai 1 9 10 0,076

    Psathyromyia lutziana 0 1 1 0,007

    Psychodopygus hirsutus 2 25 27 0,204

    Psychodopygus matosi 4 34 38 0,287

    Sciopemyia microps 2 4 6 0,045

    Trichopygomyia longispina 1 1 2 0,015

    NI 5 109 114 0,861

    TOTAL 10845 2388 13233 100%

  • 49

    Dentre todas as espcies capturadas e identificadas em Roda Dgua, a mais

    abundante foi Ny. intermedia (61,12%), seguida por Pi. fischeri (18,20%) e Mg.

    migonei (8,68%) (Tabela 2). As trs espcies demonstram comportamento

    antropoflico e cinoflico (Falqueto, 1995). Soma-se a estas uma quarta espcie que

    tambm tem o hbito de fazer repasto sanguneo em seres humanos e ces, que

    Pi. monticola. Entretanto, a mesma foi pouco encontrada neste estudo (1,67%).

    Sendo assim, a soma das quatro principais espcies antropoflicas em Roda Dgua

    representou 89,67% do total de espcimes identificados, contra os 10,1% resultantes

    da soma das demais. Estas ltimas sero analisadas parte, apenas do ponto de

    vista ecolgico.

    Tabela 2. Percentuais das principais espcies de flebotomneos antropoflicas

    capturadas em Roda Dgua entre maro de 2002 a fevereiro de 2004.

    Espcies

    antropoflicas

    Percentuais sobre

    o total Valores absolutos

    Ny. intermedia 61,12% 8088

    Pi. fischeri 18,20% 2409

    Mg. migonei 8,68% 1148

    Pi. monticola 1,67% 222

    Total 89,67% 11867

    As quatro principais espcies de flebotomneos que tm afinidade pelo homem

    apresentaram diferenas significativas quanto sua distribuio nos trs nveis de

    elevao estudados, utilizando-se o teste de Kruskal-Wallis. Ny. intermedia foi mais

    abundante no nvel 2, tendncia esta acompanhada por Pi. fisheri, porm de forma

    mais sutil. Mg. migonei esteve em maior quantidade no nvel 1, decrescendo no 2 e

    sendo quase inexistente no nvel 3. J Pi. monticola apresentou distribuio inversa:

    mais abundante no nvel 3, escassa no 2 e quase inexistente no 1 (figuras 1 e 2).

  • 50

    Em relao ao ambiente de coleta, das quatro espcies analisadas, apenas Pi.

    fischeri apresentou semelhana estatstica entre o nmero de espcimes coletados

    na mata e no peridomiclio segundo o teste U de Mann-Whitney (=0,05). Nas outras

    trs espcies nota-se tendncia fortemente significativa para um dos dois ambientes,

    sendo Mg. migonei e Ny. intermedia mais abundantes no peridomiclio, enquanto que

    Pi. monticola foi mais abundante na mata (figuras 1 e 2).

    Proporcionalmente, no entanto, observou-se que Pi. fischeri foi a espcie mais

    abundante na mata dentre as 23 coletadas, contribuindo com 28,10% do total de

    flebotomneos capturados neste ambiente, seguida por Mi. quinquefer (17,04%), que

    no tem importncia epidemiolgica. Ny. intermedia contabilizou apenas 10,97% do

    total da mata, Mg. migonei 5,32% e Pi. monticola 8,45%.

    J no peridomiclio Ny. intermedia foi a espcie que demonstrou-se fortemente

    dominante e abundante, contribuindo com 72,16% do total de espcimes coletados,

    seguida por Pi. fischeri com 16,02% e Mg. migonei com 9,41%. Pi. monticola

    contabilizou apenas em 0,18% do total dos insetos capturados neste ambiente.

    Grfico 1. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflicas,

    capturadas em diferentes faixas de altitude no peridomiclio da localidade de Roda

    Dgua, Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003.

    0

    1000

    2000

    3000

    4000

    5000

    6000

    N

    me

    ro d

    e e

    sp

    c

    ime

    s

    at 250m 250 a 500m acima de 500m

    Nveis de altitude

    PERIDOMICLIO

    Ny. intermedia

    Mg. migonei

    Pi. fischeri

    Pi. monticola

  • 51

    Grfico 2. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflica,

    capturadas em diferentes nveis de altitude na mata da localidade de Roda Dgua,

    Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003.

    Observando as propores das espcies antropoflicas em relao ao total de

    espcimes coletados em cada nvel de cada amkbiente, tem-se que na mata Ny.

    intermedia apareceu em 15,2% dos flebotomneos capturados no nvel 1. Neste

    ambiente, no nvel 2, em 10,37% do total de capturados. J no nvel 3, no foi mais

    capturada. A populao de Migonemyia migonei e partiu de 8,5% do total coletado

    no nvel 1 da mata, passando para 0,74% no nvel 2 e 0,18% no nvel 3. Pi. fischeri

    contribuiu com 22,94% de flebotomneos capturados no nvel mais baixo. No

    segundo nvel caiu para 9,87% e no mais elevado, rea sem doena, 55.75%. Pi.

    monticola distribuiu-se de forma diferente dos demais. Esta espcie apareceu em

    0,48% do total do nvel 1 na mata, subiu para 6,17% no nvel 2 e aumentou ainda

    mais no nvel 3, contribuindo com 31,71% do total de espcimes capturados neste

    ambiente (grfico 3).

    No peridomiclio, Ny.intermedia foi a espcie identificada em 57,57% daquelas

    coletadas no nvel 1. No segundo nvel, em 78,76%. J no nvel 3, cai para 0,33% do

    0

    50

    100

    150

    200

    250

    300

    350N

    m

    ero

    de e

    sp

    cim

    es

    at 250m 250 a 500m acima de 500m

    Nvel de altitude

    MATA

    Ny. intermedia

    Mg. migonei

    Pi. fischeri

    Pi. monticola

  • 52

    total. Migonemyia migonei contribuiu com 17,68%, caiu pra 5,98% no segundo nvel

    e no terceiro no apareceu. Pi. monticola comea com 0,03%, sobe para 0,19% 3 no

    nvel 3, o mais elevado, 1,49%. Pi. fischeri contribuiu com 22,94% de flebotomneos

    capturados no nvel mais baixo. No segundo nvel, caiu para 9,87%, e no nvel mais

    elevado, rea sem doena, 55.75%. Pi. monticola distribuiu-se de forma diferente

    dos demais. Esta espcie apareceu em 0,48% do total, subiu para 6,17% (grfico 4) .

    Grfico 3. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de

    flebotomneos antropoflicos capturados na MATA, em Roda Dgua, Cariacica, entre

    maro de 2002 e fevereiro de 2004.

    Grfico 4. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de

    flebotomneos antropoflicos capturados no PERIDOMICLIO em Roda Dgua,

    Cariacica, entre maro de 2002 e fevereiro de 2004.

    Mata

    0.00% 10.00% 20.00% 30.00% 40.00% 50.00% 60.00%

    P. fischeri

    N. intermedia

    M. migonei

    P. monticola

    Esp

    cie

    s

    Percentuais sobre o total capturado em cada nvel

    Nvel 3

    Nvel 2

    Nvel 1

    Peridomiclio

    0.00% 10.00% 20.00% 30.00% 40.00% 50.00% 60.00% 70.00% 80.00% 90.00%

    P. fischeri

    N. intermedia

    M. migonei

    P. monticola

    Esp

    cie

    s

    Percentuais sobre o total capturado em cada nvel

    Nvel 3

    Nvel 2

    Nvel 1

  • 53

    Utilizou-se o teste de Kruskal-Wallis para comparar a distribuio destes

    flebotomneos em relao s estaes do ano. Assim, foi possvel observar que

    apenas Pi. fischeri teve sua populao afetada pelas mesmas, sendo o inverno a

    estao em que foi mais capturado, e outono aquela em que foi mais escasso. As

    outras trs espcies de interesse distriburam-se uniformemente nas quatro

    estaes, no apresentando diferena estatstica para este parmetro (grfico 5).

    Quanto poca do ano, a anlise pelo teste U de Mann-Witney revela que apenas a

    distribuio de Pi. fischeri foi significativamente influenciada pela pluviosidade

    (p=0,07, NS=0,05), sendo maior na poca seca do que na chuvosa. As chuvas no

    influenciaram de maneira significativa a distribuio de Ny. intermedia, Mg. migonei e

    Pi. monticola (grfico 6).

    Grfico 5. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em

    Roda Dgua, Cariacica, de acordo com pluviosidade, capturadas entre abril de 2002

    a maro de 2003.

    0

    1000

    2000

    3000

    4000

    5000

    N

    mero

    de E

    sp

    cim

    es

    SECO CHUVOSO

    Perodo

    PLUVIOSIDADE

    Ny. intermedia

    Mg. migonei

    Pi. fischeri

    Pi. monticola

  • 54

    Grfico 6. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em

    Roda Dgua, Cariacica, em relao s estaes do ano, capturadas entre abril de

    2002 a maro de 2003.

    Dentre os ndices ecolgicos calculados neste trabalho, os mais importantes so a

    riqueza e a abundncia, mas para um melhor entendimento e possibilidade de

    discusso dos dados, tambm foram includos os ndices de Diversidade de

    Shannon, Equitabilidade de Pielou e a Dominncia de Berger-Parker (tabela 3).

    Tabela 3. ndices ecolgicos obtidos para as populaes de flebotomneos

    coletados em Roda Dgua, municpio de Cariacica, na mata e no peridomiclio, no

    perodo de abril de 2002 a maro de 2004.

    .

    0

    500

    1000

    1500

    2000

    2500

    3000

    3500

    N

    mero

    de e

    sp

    cim

    es

    OUTONO INVERNO PRIMAVERA VERO

    ESTAES DO ANO

    Ny. intermedia

    Mg. migonei

    Pi. fischeri

    Pi. monticola

    NDICE ECOLGICO MATA PERIDOMICLIO

    Riqueza 23 16

    Abundncia 2388 10845

    Diversidade de Shannon (H) 2.102 0.8721

    Equitabilidade de Pielou (J) 0.6705 0.3220

    Dominncia de Berger-Parker 0.2944 0.7220

  • 55

    6 DISCUSSO

    6.1 Altitude X Ambiente

    Nyssomyia intermedia foi espcie mais capturada em Roda D'gua (61,12%).

    Predominou no ambiente peridomiciliar do nvel 2 (78,76% do total para este nvel),

    onde provavelmente encontra melhores condies ecolgicas para seu

    desenvolvimento, alm de dispor grande densidade de hospedeiros. importante

    destacar que justamente neste nvel que se concentra o maior nmero de casos de

    LTA na rea (Unidade de Medicina Tropical/UFES dados no publicados). Trata-se

    de um txon predominante e abundante no peridomiclio de muitos focos de LTA,

    tanto no Esprito Santo, como em outros estados da regio Sudeste do Brasil (17, 24,

    28, 44, 114).

    Em Roda Dgua foi possvel observar notvel tendncia de Ny. intermedia ser mais

    abundante no ambiente peridomiciliar, com 7.826 espcimes capturados no

    peridomiclio contra apenas 262 na mata, tendncia acompanhada por Pi. fischeri

    (1738 exemplares no peridomiclio e 671 na mata) e Mg migonei. (1021 no

    peridomiclio e 127 na mata).

    Nyssomyia intermedia s.l. na verdade um complexo, e contempla duas espcies

    distintas: Ny. intermedia e Ny. neivai (Pinto, 1926), que foram consideradas

    sinnimos at meados dos anos 90 (115). So espcies com muitas caractersticas

    comuns