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INSTITUTO POLITÉCNICO DE LISBOA Instituto Superior de Engenharia de Lisboa Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa Prevenção de úlceras podológicas com recurso a uma palmilha de monitorização da pressão plantar, temperatura e humidade relativa Inês Alexandra da Mota Lourenço Trabalho Final de Mestrado para obtenção do grau de Mestre em Engenharia Biomédica Orientadores João Pedro Barrigana Ramos da Costa (ISEL) Outubro de 2018

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  • INSTITUTO POLITÉCNICO DE LISBOA

    Instituto Superior de Engenharia de Lisboa

    Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa

    Prevenção de úlceras podológicas

    com recurso a uma palmilha de monitorização da pressão

    plantar, temperatura e humidade relativa

    Inês Alexandra da Mota Lourenço

    Trabalho Final de Mestrado para obtenção do grau de Mestre em Engenharia Biomédica

    Orientadores João Pedro Barrigana Ramos da Costa (ISEL)

    Outubro de 2018

  • ii

    Direitos de Autor

    Prevenção de úlceras podológicas com recurso a uma palmilha de

    monitorização da pressão plantar, temperatura e humidade relativa

    Copyright© 2018 - Todos os direitos reservados: a Inês Alexandra da Mota Lourenço; Instituto

    Superior de Engenharia de Lisboa e Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa.

    O Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) e a Escola Superior de Tecnologia da Saúde de

    Lisboa (Estesl) têm o direito, perpétuo e sem limites geográficos, de arquivar e publicar esta dissertação

    de mestrado de obtenção de grau de Mestre em Engenharia Biomédica através de exemplares impressos

    reproduzidos em papel ou de forma digital, ou por qualquer outro meio conhecido ou que venha a ser

    inventado, e de a divulgar através de repositórios científicos e de admitir a sua cópia e distribuição com

    objetivos educacionais ou de investigação, não comerciais, desde que seja dado crédito ao autor e editor.

  • iii

    Agradecimentos

    Em primeiro lugar, ao meu orientador Professor Doutor José Pedro Barrigana Ramos da Costa,

    pela orientação, dedicação e disponibilidade excecional que me deu durante toda esta etapa e do qual

    tive o privilégio de aprender e a quem expresso a minha profunda gratidão.

    À coordenadora do Mestrado Professora Doutora Cecília Calado e restantes professores

    integrantes desta graduação pela oportunidade de aprendizagem e consequente enriquecimento da minha

    formação académica e profissional.

    Aos meus colegas de Mestrado por toda a ajuda e companheirismo nesta etapa, que foi sem

    dúvida fundamental, com destaque às colegas e amigas Sofia Gomes, Jéssica Duarte e Filipa Freitas por

    toda a ajuda durante os trabalhos de grupo.

    À Carolina, pelo carinho, amizade e apoio que sem dúvida foram essenciais e ao Bernardo por

    toda a amizade e principalmente pelo transporte tantas vezes oferecido para as aulas de Mestrado, dos

    quais espero levar comigo para fora desta etapa.

    Ao Miguel, por todo o apoio incondicional, partilha e momentos de diversão, dedicação e por

    toda a paciência que teve para comigo durante toda esta fase, que estes 4 anos sejam apenas o começo

    de uma longa e feliz estrada.

    Á minha Mãe, à minha Irmã Cheila e Mimi que nunca deixaram de acreditar em mim e por me

    motivarem sempre a perseguir os meus sonhos e me facilitarem o meu caminho com toda a vossa

    compreensão e amor e a quem estou sem dúvida a dever mais Domingos.

    Ao meu avô António Lourenço, a quem dedico a minha tese que esteja onde estiver sei que se

    iria orgulhar de mim.

    A todos estes, os meus sinceros agradecimentos.

  • iv

    Resumo

    A Diabetes Mellitus (DM) é um dos distúrbios metabólicos mais frequentes a nível mundial,

    com uma evolução tendencialmente positiva nos últimos 15 anos que estima um valor em 2030 de 366

    milhões de pessoas afetadas, o que leva à necessidade de desenvolvimento de sistemas de monitorização

    eficazes para o despiste de indivíduos em risco com o objetivo de evitar complicações futuras (1).

    Uma destas complicações é o aparecimento de úlceras podológicas que atinge 1 a 4 % da

    população a nível mundial anualmente, cujos sintomas se refletem por uma incorreta distribuição da

    pressão plantar e pelo aumento da temperatura do pé de 2,2º face à temperatura ambiente (2,3).

    Desta forma, o projeto realizado foi uma palmilha de monitorização da distribuição da pressão

    plantar, bem como da temperatura e humidade relativa do pé que pode ser utilizado como um dispositivo

    de despiste de possíveis aparecimentos de úlceras podológicas no pé diabético.

    Os componentes considerados no protótipo foram 6 sensores de pressão plantar do tipo FSR

    (Force Sensitive Resistor), um sensor de temperatura e humidade relativa (SHT21) e recorreu-se ainda

    ao Lilypad Simblee BLE, isto é, um microcontrolador com um tipo de comunicação por BLE (Bluetooth

    Low Energy) que permite a comunicação com um smartphone do utilizador e desta forma a apresentação

    de resultados em tempo real.

    O principal objetivo do sistema desenvolvido é permitir a observação de resultados em tempo

    real, que pode constituir um meio simples e flexível de redução da prevalência de úlceras podológicas

    em pacientes com pé considerado de risco, como também ajudar o cuidador ou profissional de saúde na

    vigília do mesmo.

    Palavras-chave: Úlceras; Diabetes; Simblee, BLE; Temperatura; Humidade.

  • v

    Abstract

    Diabetes Mellitus (DM) i sone of the world’s most frequente metabolic disorders. Althoug it’s

    positive evolution since the last 15 years, a total of 366 million people is estimated to suffer from this

    condition. This scenario increase the necessity to develop systems to detect people in groups of risk to

    avoid further complications.

    One of this complications might be the skin ulceration, that affects 1 to 4% of the world

    population every year, and wich the most contribution factors for this condition can be incorrect

    distribution of plantar pressure or the raise of feet global temperature 2,2 degrees above the ambiente

    temperature.

    This poject consist to build na pressure , temperature and humidity sensitive insole , that can be

    used as a monitoring device to detect the risk of feet ulceration on people with diabetic foot condition.

    The components included in the insole were: Force Sensitive Resistor (FSR), temperature and

    relative humidity sensor (SHT21) who where attached to microcontroller lilypad Simblee BLE

    (Bluetooth Simblee BLE) to allow comunication between the insole sensors and na ordinary smartphone

    displaying real time result.

    The main objective of the system is to allow real time observation of the foot parameters to

    predict the appearing of skin problems, like ulceration, on people included on risk groups for this kind

    of condition. It also will help healthcare professionals bay giving the possibility to acess objectively the

    foot conditions, havinf for that matter, accurate and reliable data that can be compared with the state of

    the art values.

    Key-words: Ulceration; Diabetes; Simblee, BLE; Temperature; Humidity.

  • vi

    Abreviaturas

    BLE-Bluetooth Low Energy;

    DM- Diabetes Mellitus;

    FPG- Fasting Plasma Glucose/ Teste da Glicémia em jejum;

    FSR- Force Sensitive Resistor;

    LADA- Diabetes Latente Autoimune do Adulto;

    ND- Neuropatia Diabética;

    OGTT- Oral Glucose Tolerance Test/ Teste da tolerância à glicose oral;

    RPG- Random Plasma Glucose/ Teste de glicose plasmática aleatória;

    WHO -World Health Organization;

  • vii

    Índice

    Direitos de Autor ..................................................................................................................................... ii

    Agradecimentos ...................................................................................................................................... iii

    Resumo ................................................................................................................................................... iv

    Abstract ................................................................................................................................................... v

    Abreviaturas ........................................................................................................................................... vi

    Índice de Figuras ..................................................................................................................................... x

    Índice de Tabelas .................................................................................................................................... xi

    Índice de Gráficos .................................................................................................................................. xi

    1. Introdução ........................................................................................................................................ 1

    1.1 Objetivos ................................................................................................................................. 1

    1.2 Estrutura do Projeto ................................................................................................................. 2

    2. Diabetes Mellitus ............................................................................................................................. 3

    2.1 Definições e Fisiopatologia ........................................................................................................... 3

    2.1.1 Diabetes Mellitus tipo 1 ......................................................................................................... 5

    2.1.2 Diabetes Mellitus tipo 2 ......................................................................................................... 5

    2.1.3 Diabetes Gestacional .............................................................................................................. 6

    2.1.4 Outros tipos específicos de Diabetes ...................................................................................... 6

    2.2 Epidemiologia ............................................................................................................................... 6

    2.3 Diagnóstico da DM ....................................................................................................................... 9

    2.4 Tratamento da DM ...................................................................................................................... 10

    2.5 Complicações associadas à DM .................................................................................................. 10

    2.5.1 Neuropatia Diabética ............................................................................................................ 10

    3. O Pé e a Marcha ................................................................................................................................ 11

    3.1 Anatomia do Pé ........................................................................................................................... 11

    3.2 A marcha humana ........................................................................................................................ 13

    4. O pé diabético- Conceito e Epidemiologia ........................................................................................ 15

  • viii

    4.2 Patogénese ................................................................................................................................... 16

    4.3 Prevenção .................................................................................................................................... 19

    4.4 Úlceras podológicas e a sua importância na monitorização ........................................................ 20

    4.4.1 Tratamento de úlceras Podológicas ...................................................................................... 23

    4.4.2 Úlceras crónicas e Amputação ............................................................................................. 24

    4.5 Ortóteses Plantares no pé diabético ............................................................................................. 25

    5. Técnicas de medição da pressão plantar ............................................................................................ 27

    5.1 Requisitos de sensores na medição da pressão plantar ................................................................ 31

    5.2 Sensores de Temperatura e Humidade ........................................................................................ 32

    5.2.1 Sensores de humidade relativa e temperatura....................................................................... 33

    5.3 Desenvolvimento de protótipos – Estado de arte ........................................................................ 34

    6. Desenvolvimento do Projeto- Objetivos, Materiais e Métodos ..................................................... 36

    6.1 Objetivos ..................................................................................................................................... 36

    6.2 Materiais ...................................................................................................................................... 36

    6.2.1 Escolha dos sensores e outros componentes para o desenvolvimento do sistema ............... 37

    6.2.2 Escolha do Simblee e programação em Arduino para o desenvolvimento do sistema......... 39

    6.2.3 Comunicação via Bluetooth e Bluetooth Low Energy (BLE) .............................................. 41

    6.3 Métodos ....................................................................................................................................... 41

    6.3.1 Código Implementado .......................................................................................................... 44

    7. Resultados Experimentais ............................................................................................................. 52

    7.1 Teste dos Sensores de pressão FSR ............................................................................................. 52

    7.2 Resultados obtidos com o protótipo ...................................................................................... 54

    7.2.1 Resultados de presença de pé plano e pé saudável ............................................................... 56

    7.2.2 Médias obtidas da distribuição da pressão plantar- Força normalizada obtida .................... 57

    7.2.3 Valores obtidos da temperatura e humidade e consumo energético ..................................... 57

    7.3 Discussão de resultados ............................................................................................................... 58

    8. Conclusões e Perspetivas futuras................................................................................................... 60

    8.1 Conclusão .................................................................................................................................... 60

    8.2 Perspetivas Futuras .................................................................................................................. 60

  • ix

    9. Bibliografia .................................................................................................................................... 61

    10. Anexos ................................................................................................................................... lxviii

    10.1 Multiplexer MC14953B datasheet ........................................................................................ lxviii

    10.2 Lilypad Simblee BLE- Datasheet ............................................................................................ lxxi

  • x

    Índice de Figuras

    Figura 1 – Níveis de Glicémia. ................................................................................................................ 3

    Figura 2- Anatomia do Pâncreas. ............................................................................................................ 4

    Figura 3- Prevalência da Diabetes em Portugal- 2015 Distribuição por género e faixa etária. ............... 7

    Figura 4 - Utentes saídos (internamentos hospitalares) por “pé diabético”. ........................................... 8

    Figura 5 - Amputações dos membros inferiores por motivos de Diabetes .............................................. 8

    Figura 6- Anatomia do Pé. .................................................................................................................... 11

    Figura 7- Movimentos de dorsiflexão e flexão plantar.......................................................................... 12

    Figura 8- Ciclo de Marcha no pé. ......................................................................................................... 13

    Figura 9- Úlcera Podológica.................................................................................................................. 16

    Figura 10- Zonas de aplicação do teste Semmes-Weinstein . ............................................................... 18

    Figura 11- Zonas de rico de úlceras podolológicas. .............................................................................. 21

    Figura 12- Constituição do calçado. ...................................................................................................... 26

    Figura 13- Pedigrafo. ............................................................................................................................. 28

    Figura 14 – Sensor do tipo FSR. ........................................................................................................... 30

    Figura 15 - Hidrocélulas e o seu modo de funcionamento. ................................................................... 31

    Figura 16- Exemplo da constituição de um termopar. .......................................................................... 33

    Figura 17 - Esquema do objetivo do projeto desenvolvido. .................................................................. 36

    Figura 18- Sensor de pressão plantar utilizado no desenvolvimento do sistema- Sensor FSR. ............ 37

    Figura 19- Localização dos sensores de pressão plantar. ...................................................................... 37

    Figura 20- Multiplexer MC14053BCP. ................................................................................................. 38

    Figura 21 - Sensor de temperatura e humidade relativa SHT21............................................................ 38

    Figura 22- Plataforma Arduino Uno. .................................................................................................... 39

    Figura 23- Constituição do LilyPad Simblee BLE. ............................................................................... 40

    Figura 24- Diagrama do sistema desenvolvido ..................................................................................... 43

    Figura 25- Protótipo da palmilha desenvolvida. .................................................................................... 44

    Figura 26 Abertura da aplicação "Pé-Avaliação". ................................................................................. 54

    Figura 27 - Ausência de pressão plantar- Visualização de resultados iniciais. ..................................... 55

    Figura 28- Distribuição da pressão plantar ao longo da marcha. .......................................................... 56

    Figura 29 -Distribuição da pressão plantar num pé plano. .................................................................... 56

    Figura 30- Distribuição da pressão plantar num pé não plano. ............................................................. 56

    Figura 31 -Datasheet Multiplexer MC14053BCP. ............................................................................... lxx

    Figura 32 - Caracteristicas técnicas Simblee. ...................................................................................... lxxi

    file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078070file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078071file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078072file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078073file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078074file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078075file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078076file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078077file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078078file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078079file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078080file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078081file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078082file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078083file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078084file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078085file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078086file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078087file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078088file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078089file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078090file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078091file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078092file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078093file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078094file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078095file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078096file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078097file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078098file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078099file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078100file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078101

  • xi

    Índice de Tabelas

    Tabela 1 -Níveis de Glicémia. ................................................................................................................. 3

    Tabela 2- Classificação pela Universidade de Texas de úlceras podológicas. ...................................... 23

    Tabela 3- Estado de arte relativo ao desenvolvimento de protótipos de palmilhas de monitorização. . 35

    Tabela 4- Teste experimental à sensibilidade do sensor FSR ............................................................... 54

    Tabela 5- Distribuição das médias de Força normalizada obtida durante uma marcha de 7 minutos. .. 57

    Índice de Gráficos

    Gráfico 1- Linha de tendência exponencial de valores médios da Resistência RS. .............................. 58

    Gráfico 2- Linha de tendência de Potência de valores médios da resistência RS. ................................ 58

    file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc532119110file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078272file:///C:/Users/Inês%20Lourenço/Dropbox/TFM_MestradoBIOMED/Trabalho%20escrito/TFM.docx%23_Toc526078273

  • 1

    1. Introdução

    A Diabetes Mellitus (DM) é um distúrbio metabólico que foi responsável pela morte de 5 milhões

    de pessoas a nível mundial em 2015 e do qual se espera uma prevalência de 366 milhões de pessoas no

    ano de 2030, sendo por isso uma preocupação para a saúde pública (1). Em 2014, Portugal ocupava o

    segundo lugar como país da Europa com maior prevalência de pacientes diabéticos e é estimado uma

    subida deste valor de 15,2% em 2030 (4).

    É por isso urgente ter em atenção todos os sintomas associados e quando já existente a doença tentar

    prevenir complicações futuras mais graves. Uma destas complicações reflete-se a nível podológico e é

    denominada como o pé diabético.

    O pé diabético é responsável por 70% das amputações não traumáticas a nível ocidental e indicador

    de possíveis úlceras podológicas (atinge 15 a 25% dos indivíduos com DM), sendo estas lesões que

    provocam a perda da integridade da pele e em casos mais graves pode atingir o músculo ou até o osso

    (5). A distribuição de úlceras podológicas não é algo uniforme, sendo que atinge com maior frequência

    a zona metatársica (56,3%), de seguida a zona dos dedos (32,1%) e ainda o calcâneo (1,9%), sendo por

    esta razão as zonas que são consideradas as de maior risco plantar (6).

    Existem alguns sintomas para o aparecimento de úlceras podológicas que podem ser despistados,

    nomeadamente o aparecimento de hiperceratoses, o aumento da temperatura local de aproximadamente

    2,2ºC, bem como zonas com uma pressão plantar excessiva que podem constituir assim um meio de

    monitorização e evitar uma prevalência de 1 a 4% de pessoas afetadas com este problema (2,3).

    Embora o desenvolvimento da tecnologia já tenha permitido o reconhecimento de pressões plantares

    excessivas, o mercado de monitorização plantar carece ainda de um sistema flexível e reconhecedor de

    resultados em tempo real da distribuição da pressão plantar, da temperatura e humidade a que o pé está

    sujeito.

    1.1 Objetivos

    Este projeto surge no âmbito do Mestrado em Engenharia Biomédica associando as tecnologias

    de informação aos sinais biológicos passíveis de serem monitorizados como principais sintomas ao

    aparecimento de úlceras podológicas- Incorreta distribuição plantar e um aumento de temperatura de

    2,2ºC face à temperatura externa.

    Além disto, foi constituído como objetivo o desenvolvimento de um sistema que permita a

    obtenção de dados em tempo real e compatível com as tecnologias mais recentes e que ocupam o

    quotidiano – Smartphones, permitindo assim ao utilizador visualizar a distribuição de pressão plantar e

    comparar a temperatura a que se encontra o pé com a temperatura externa de modo a identificar fatores

  • 2

    de risco. Uma ferramenta deste tipo é particularmente útil atendendo à falta de sensibilidade plantar que

    tipicamente afeta doentes em risco de desenvolver úlceras podológicas.

    1.2 Estrutura do Projeto

    Este projeto encontra-se dividido em capítulos onde no segundo capítulo é abordado o

    enquadramento do projeto do ponto de visto da patologia DM, do seu ponto de vista fisiológico,

    epidemiológico e as principais complicações associadas à doença, nomeadamente a neuropatia diabética

    que se apresenta como uma das consequências de destaque para a importância deste projeto.

    O terceiro capítulo refere a anatomia do pé e a marcha humana associado a conceitos que são

    fundamentais para o desenvolvimento do protótipo, sendo que no quarto capítulo o pé diabético é

    abordado sob o ponto de vista das suas principais características nomeadamente a possibilidade de

    desenvolvimento de úlceras podológicas e em casos extremos a amputação.

    O capítulo cinco aborda as diferentes técnicas de medição da pressão plantar desde os seus

    tempos mais remotos até ao presente onde a tecnologia se encontra já associada. Dentro deste mesmo

    tema, são descriminados os requisitos dos sensores de pressão plantar, bem como os sensores de

    temperatura e humidade necessários para a extração de dados do utilizador culminando na análise do

    estado de arte de desenvolvimento de protótipos de palmilhas que visam a obtenção de dados da pressão

    plantar e temperatura já existentes.

    O desenvolvimento do projeto é referido no capítulo 6, incluindo neste os materiais que foram

    necessários para a construção do protótipo, bem como o código implementado para o Lilypad Simblee

    BLE que leva aos resultados obtidos no capítulo sete e respetiva discussão dos mesmos.

    Em suma, no capítulo oito são referidas as conclusões do projeto e as perspetivas futuras do

    mesmo.

  • 3

    2. Diabetes Mellitus

    2.1 Definições e Fisiopatologia

    A Diabetes Mellitus (DM) é classificada como um distúrbio metabólico que se reflete numa

    hiperglicemia crónica por defeito da ação da insulina ou da sua produção ou ainda por ambas as situações

    pelo qual o órgão pâncreas é responsável (7,8).

    A hiperglicemia crónica surge como resultado de distúrbios do metabolismo dos lípidos,

    proteínas e hidratos de carbono e a longo prazo leva a consequências graves para o organismo do

    individuo, afetando-o a nível cardiovascular, sistema nervoso, sistema renal e oftalmológico e

    condicionando assim a sua qualidade de vida (8).

    A concentração plasmática de glicose no sangue de um individuo saudável deve estar entre os

    80-99 mg/dl, sendo que níveis superiores podem indicar uma situação de pré-diabetes ou diabetes, sendo

    o diagnóstico estabelecido pela American Diabetes Association como se apresenta na Tabela 1 (8).

    O pâncreas (Figura 2), é uma glândula mista localizada posteriormente ao estômago que

    apresenta entre 12 a 20 cm de comprimento e tem uma função endócrina (corresponde a 20% da sua

    Tabela 1 -Níveis de Glicémia. Fonte: (Ângelo T. Diabetes Mellitus e Doença Periodontal Universidade

    Católica Portuguesa; 2013.)

  • 4

    ação) e exócrina (80% da sua função) simultânea. A função exócrina é originária por acinos que

    produzem o suco pancreático, que juntamente com um sistema de canais o transportam até ao intestino

    delgado. A porção endócrina tem a função de produzir hormonas (insulina e glucagon) que entram no

    sistema circulatório, sendo esta porção constituída por ilhéus pancreáticos ou de Langerhans que por

    sua vez são constituídos por células beta (75%) que segregam insulina e por células alfa (20%) que

    produzem glucagon, este que tem a ação oposta da insulina e estimula o aumento de glucose no sangue,

    estes ilhéus são ainda constituídos por outros tipos de célula que se apresentam em pequena percentagem

    (5%) (9,10).

    A insulina produzida pelo pâncreas é fundamental no metabolismo dos hidratos de carbono,

    lípidos e gorduras e a falta desta hormona pode levar a consequências graves como perda de peso

    anormal, acidose ou pode ainda levar a um estado de coma (8,11).

    O anormal funcionamento do pâncreas pode resultar numa deficiente ação ou produção de insulina

    originando a DM. De acordo com os tipos clínicos, etiologicamente a DM pode ser de quatro tipos (12):

    ➢ Diabetes tipo 1;

    ➢ Diabetes tipo 2;

    ➢ Diabetes gestacional;

    ➢ Outros tipos específicos de diabetes.

    Figura 1- Anatomia do Pâncreas. Fonte : ( Seeley, R.; Stephens, T. & Tate P.

    Integration and control system. In: Anatomy & Physiology. 8th ed. McGraw-Hill;

    2008. p. 609–50. )

  • 5

    2.1.1 Diabetes Mellitus tipo 1

    A DM tipo I corresponde entre 5 a 10% de todos os casos de DM e ocorre pela destruição das

    células beta nos ilhéus pancreáticos, passando assim a insulinoterapia a ser fundamental para o individuo

    sobreviver (8,13).

    Esta destruição ocorre por um mecanismo de destruição autoimune, sendo que alguns estudos

    afirmam que 15 a 30% de todos os casos são diagnosticados em indivíduos cuja idade ultrapassa os 30

    anos, embora o pico de incidência ocorra em ambos sexos entre os 11 aos 14 anos de idade. A velocidade

    de destruição das células é variável, sendo que se verifica uma maior progressão em crianças do que nos

    adultos (diabetes latente autoimune do adulto (LADA)) (9).

    A nível se sintomatologia, observa-se principalmente em doentes adolescentes e na infância uma

    cetoacidose ou uma hiperglicemia ligeira em jejum que na presença de infeções ou situações de stress

    pode evoluir rapidamente para uma hiperglicemia grave (9).

    2.1.2 Diabetes Mellitus tipo 2

    A diabetes do tipo 2 é a forma mais comum da diabetes (entre 90 a 95% de todos os casos com

    DM) e é consequente de uma resistência por parte do organismo na utilização da insulina ou uma

    secreção compensatória desta de forma insuficiente ou inadequada devido a uma insulinopenia relativa.

    Esta falta de utilização deve-se a uma perda de sensibilidade dos tecidos à ação da insulina e que resulta

    num défice de captação da glicose (14,15).

    O facto deste tipo de diabetes resultar numa hiperglicemia crónica origina posteriormente

    complicações para o individuo, nomeadamente, complicações vasculares, microangiopatia diabética

    (que se caracteriza por lesões ao nível das células por stress oxidativo que pode ocorrer nas células

    capilares endoteliais da retina -retinopatia), células do glimérulo renal (nefropatia) e dos nervos

    periféricos. Células de Schwann (neuropatia), pode também ainda ocorrer macroangiopatia que provoca

    um progresso rápido no processo aterosclerótico desencadeando fatores de risco para doenças

    cardiovasculares associadas e ainda outras complicações que serão brevemente desenvolvidos no sub-

    capítulo 2.5 (15).

    Este tipo de diabetes está normalmente associado a fatores de obesidade, com destaque à

    obesidade abdominal, sedentarismo e inatividade física, dislipidemia1 e hipertensão arterial e por isso a

    estilos de vida prejudiciais (14).

    1 A dislipidemia caracteriza-se por um quadro clinico onde se observam concentrações anormais de lipoproteínas

    ou lípidos no sangue, cuja condição pode ser desencadeada por fatores genéticos e ambientais.(76)

  • 6

    A DM tipo 2 é clinicamente silenciosa uma vez que a hiperglicemia não é suficientemente

    elevada para provocar sintomas e assim é apenas diagnosticada por exames de rotina ou por recurso a

    uma hospitalização por parte do doente. Esta DM é considerada não insulinodependente, uma vez que

    neste caso ao contrário da DM tipo 1 os doentes não apresentam uma deficiência absoluta de insulina,

    mas sim relativa.

    2.1.3 Diabetes Gestacional

    A Diabetes Gestacional é definida como uma manifestação do aumento da resistência à insulina

    e diminuição de tolerância à glicose que ocorre pela primeira vez numa gravidez e que é independente

    de alterações metabólicas e da idade gestacional. Frequentemente esta situação é reversível após o

    período de gestação, no entanto, durante a mesma pode trazer graves complicações para a mãe e para o

    feto (16).

    Existem alguns fatores de risco relacionados com este tipo de diabetes, nomeadamente a

    obesidade, idade materna superior a 35 anos, antecedentes familiares diretos com diabetes, entre outros

    (16).

    2.1.4 Outros tipos específicos de Diabetes

    Outros tipos específicos de DM mas menos comuns podem ser diagnosticados como: Defeitos

    genéticos das células beta, defeitos genéticos da ação da insulina, doenças do pâncreas exócrino,

    Diabetes induzida por químicos ou fármacos e endocrinopatias diversas (12).

    2.2 Epidemiologia

    A Diabetes Mellitus (DM) é considerada como um dos distúrbios metabólicos mais frequentes

    a nível mundial que tem verificado um aumento nos últimos 15 anos o que leva à urgência de

    desenvolver sistemas de monitorização eficazes para o despiste de indivíduos em risco com o objetivo

    de evitar complicações futuras (1).

    Embora alguns autores e associações tenham realizado previsões estatísticas da prevalência de

    diabetes a nível global, nomeadamente a WHO (World Health Organization) que estimou um valor que

    excedia os 366 milhões de pessoas afetadas em 2030, na realidade não só esse valor foi atingido como

    também ultrapassado, uma vez que em 2013 este valor atingiu os 387 milhões de pessoas que

    corresponde a 8,3% da população mundial, em 2015 verificou-se a existência de 415 milhões de pessoas

    com diabetes (1) e as novas previsões estimam um aumento de 205 milhões em 2035, atingindo assim

    um valor de 592 milhões de pessoas afetadas e em 2040 642 milhões de pessoas vão ter esta doença

    considerada crónica e de elevado risco a nível de complicações secundárias (17).

  • 7

    Estes números tornam-se ainda mais preocupantes quando se observa um total de mortes por

    diabetes de 5 milhões de pessoas no ano de 2015, sendo que a cada seis segundos a nível mundial morre

    uma pessoa com diabetes e 1 em cada 11 adultos possui esta doença (18).

    Em relação à sua distribuição em 2015 é no pacifico ocidental que se observa uma prevalência

    mais elevada de 153,2 milhões de pessoas e logo em segundo lugar surge a Europa com 59,8 milhões

    de pessoas com DM (4).

    Portugal foi considerado em 2014 o segundo país da Europa com mais prevalência de diabéticos

    sendo que em 2011 este valor era de 12,7 indivíduos com DM por casa 100 habitantes e tende para um

    aumento de 15,2% em 2030 (4).

    Em 2015 a prevalência de DM na população portuguesa em idades entre os 20-79 anos (que

    correspondia a 7,7 milhões de indivíduos) de idade foi de 13,3%, ou seja, mais de e milhão de

    portugueses nesta faixa etária possui diabetes.

    A distribuição desta prevalência ocorre de forma desigual entre géneros, sendo que nos homens

    atingia um valor de 15,9% enquanto nas mulheres 10,9%. Também segundo os dados conclui-se a

    importância que o envelhecimento tem no incremento destes números, sendo mais de ¼ das pessoas

    entre os 60-79 anos de idade possuem diabetes como se observa na Figura 3.

    Em relação à taxa de incidência, também esta tem verificado aumentos tendo atingido valores

    máximos nos anos de 2010 e 2011. No ano de 2015 foram registados 591,5 novos casos em Portugal de

    DM por cada 100 000 habitantes.(18)

    A população que possui diabetes em Portugal representa ¼ das mortes ocorridas em hospitais,

    valor este que se encontra representado por 47,6% do número de óbitos ocorridos em Portugal

    Continental em 2015 (103 614 mortes) (18) e a nível global é responsável por 6,8% de mortes (5).

    Figura 2- Prevalência da Diabetes em Portugal- 2015 Distribuição por género e faixa etária.

    Fonte: (Diabetologia SP de. Diabetes: Factos e números - O ano de 2015. Lisboa: Letra

    Solúvel- Publicidade e Marketing Lda; 2016. 1-68 p.)

  • 8

    A DM pode estar associada ao aparecimento de complicações associadas, sendo quem em 90%

    dos casos observam-se lesões nos pés que podem evoluir para complicações graves como úlceras (19) e

    no seu extremo à amputação do respetivo membro que poderiam ser diminuídas até 85% através de

    estratégias de monitorização, prevenção e tratamento multidisciplinar de úlceras podológicas (20), sendo

    normalmente a principal causa de agressões ao pé o uso de sapatos inadequado e a zona mais afetada o

    antepé contudo, mesmo com monitorização diária 15% das pessoas com DM vão desenvolver uma

    úlcera no pé ao longo da sua vida e destas 24% levará à necessidade de amputação, o que leva à urgência

    de desenvolver sistemas de monitorização eficazes para o despiste de indivíduos em risco com o objetivo

    de evitar complicações futuras (21).

    O pé diabético é definido pelas várias lesões, quer nos planos profundos ou superficiais, como

    também alterações neuropáticas, ortopédicas, infeciosas, vasculares e funcionais no pé de um individuo

    que possui DM (5).

    Além de em Portugal, o número de internamentos hospitalares em 2015 por pé diabético ter

    diminuído com um decréscimo de 220 internamentos em relação ao ano de 2014, este número ainda é

    bastante elevado – 16,7 utentes internados por esta complicação em cada 100 000 habitantes, esta

    diminuição significativa revelou por consequência uma quebra do número total de amputações dos

    membros inferiores, como se observa na Figura 4 e 5 respetivamente.

    Figura 3 - Utentes saídos (internamentos hospitalares) por “pé diabético”. Fonte: (Diabetologia SP

    de. Diabetes: Factos e números - O ano de 2015. Lisboa: Letra Solúvel- Publicidade e Marketing Lda;

    2016. 1-68 p.)

    Figura 4 - Amputações dos membros inferiores por motivos de Diabetes Fonte:

    (Diabetologia SP de. Diabetes: Factos e números - O ano de 2015. Lisboa: Letra Solúvel-

    Publicidade e Marketing Lda; 2016. 1-68 p.)

  • 9

    Em relação aos diferentes tipos de Diabetes, a diabetes tipo I tem uma presença de 5-10% de

    todos os casos de diabetes, sendo que a incidência de DM do tipo I em jovens e crianças em Portugal no

    ano de 2015 apresentou um valor de 13,3 novos casos por cada 100 000 jovens, o que além de ainda ser

    um número de carácter preocupante, este valor é inferior aos registados na última década (12,18).

    A DM do tipo 2 é classificada como o tipo mais comum de diabetes que atinge 90% de todos os

    casos de diabetes, sendo clinicamente silenciosa e está associado a estilos de vida prejudiciais que

    possam originar por consequência problemas de obesidade, hipertensão arterial e dislipidemia (12).

    A Diabetes Gestacional refere-se a uma anomalia no metabolismo da glicose durante a gravidez pela

    primeira vez , sendo que esta condição afetou no ano de 2015 7,2% da população do Serviço Nacional

    de Saúde (SNS) o que comparativamente ao ano anterior resultou num acréscimo significativo de 6,7%

    para 7,2 (12,18).

    2.3 Diagnóstico da DM

    O diagnóstico da DM é frequentemente realizado através de sintomas manifestados pelo paciente

    com as respetivas e consequentes análises de sangue, contudo, a diabetes tipo 2 pode caracterizar-se por

    uma fase assintomática entre 4 a 7 anos o que reflete numa difícil deteção e desta forma 30 a 50% dos

    diabéticos tipo 2 ainda não se encontram diagnosticados (22).

    Os principais sintomas que surgem neste tipo de Diabetes são o aumento da sede, da urina, uma

    perda de peso inexplicada, sintomas de fadiga, visão turva, aumento de fome e dificuldade em

    cicatrização de feridas (22).

    Alguns estudos realizados indicam que certos fatores como o envelhecimento, uma maior resistência

    à insulina, história familiar com presença de DM, ambiente intra-uterino dismetabólico, alterações

    alimentares associadas a estilos de vida pouco saudáveis podem contribuir para o aumento de

    prevalência da DM tipo 2 (23).

    Os pacientes são usualmente diagnosticados pela presença de sintomas de hiperglicemia, embora

    podendo ser diagnosticados durante a fase assintomática através da realização de exames o que é mais

    vantajoso na medida em que pode ser realizado um tratamento imediato que pode prevenir ou atrasar a

    evolução da diabetes (23).

    Para a realização de um diagnóstico seguro são realizados alguns exames (23):

    • Teste da Glicémia em jejum – FPG (Fasting Plasma Glucose);

    • Teste da tolerância à glicose oral (OGTT- Oral Glucose Tolerance Test);

    • Teste à hemoglobina A1c ou também denominado A1C test;

    • Teste de glicose plasmática aleatória (RPG- Random Plasma Glucose);

  • 10

    2.4 Tratamento da DM

    Os principais objetivos do tratamento da DM é o controlo metabólico e prevenção de complicações

    associadas a esta doença com prevenção ou atraso no desenvolvimento e progressão de complicações

    crónicas, sendo assim fundamental o diagnóstico precoce, uma vez que a DM é considerada uma doença

    não curável pelo estado atual da ciência (24,25).

    O regime de tratamento aplicado deverá ser individualizado, não obstante de existirem algumas

    indicações gerais para todos os diabéticos (25).

    Na diabetes do tipo 2 o tratamento consiste numa dieta equilibrada com adição de exercício físico e

    administrações de fármacos que visam estimular a produção de insulina. A alimentação deve ser assim

    rica em carnes magras, fibras, peixe e cereais integrais, sendo que os carbohidratos devem ser

    consumidos em pequenas quantidades e o doente deve evitar jejuns prolongados realizando uma

    alimentação de 3-3 horas de modo e evitar situações de hipoglicemia (24,25).

    O exercício físico regular produz efeitos ao nível da diminuição do nível de glicose no sangue e no

    aumento da sensibilidade à insulina, sendo que antes de iniciar qualquer programa de atividade o

    individuo com DM deve realizar uma avaliação cardiovascular de modo a avaliar potencias riscos

    (24,25).

    2.5 Complicações associadas à DM

    As complicações da DM podem classificar-se em dois grandes grupos: Macrovasculares e

    Microvasculares (26).

    As lesões macrovasculares relacionam-se com os vasos sanguíneos grandes e podem originar

    doenças coronárias, doenças cerebrais, hipertensão arterial e ainda doenças arteriais dos membros

    inferiores (26).

    As doenças microvasculares são consideradas lesões que ocorrem ao nível dos vasos sanguíneos

    pequenos, podendo como consequência originar a neuropatia, retinopatia e nefropatia, sendo que neste

    trabalho é destacado a Neuropatia diabética (26).

    2.5.1 Neuropatia Diabética

    A Neuropatia Diabética (ND) é uma complicação associada da DM que apresenta um quadro

    variado de sintomas relacionado com as fibras nervosas sensórias e motoras ou alguma disfunção do

    sistema nervoso autónomo, que a nível de sintomas e manifestação pode ser assintomática até um quadro

    clinico de incapacitação física (27,28).

  • 11

    Em relação à sua epidemiologia, a ND é comum nos dois diferentes tipos de diabetes, ocorrendo

    pelo menos em 20% dos diabéticos diagnosticados (28). As manifestações físicas podem ser fraqueza

    e/ou atrofia muscular, perda de unidades motoras e dificuldade de contração muscular, prejudicando

    gravemente a qualidade de vida do doente (27,28).

    O controlo glicémico é fundamental para pacientes com neuropatia uma vez que pode ajudar na

    prevenção da progressão da doença (27,28).

    3. O Pé e a Marcha

    3.1 Anatomia do Pé

    A osteologia do pé (Figura 6) é constituída por 26 ossos entre os quais se subdividem no tarso,

    no metatarso e nos dedos. No tarso existem 7 ossos curtos: o tálus, o calcâneo, o cuboide, o navicular

    (ou escafóide), o cuneiforme lateral, o cuneiforme intermédio e o cuneiforme medial. A constituição do

    metatarso consiste em cinco ossos, os quais são denominados como 1º, 2º, 3º, 4º e 5º metatarsos,

    separados por espaços interósseos. Os cinco dedos são formados por três ossos longos - falanges, à

    exceção do hálux (1º dedo), que apresenta apenas duas falanges (29).

    O gíglimo ou talo-crural é a articulação responsável pelos movimentos entre a perna e o pé e

    constitui assim a articulação do tornozelo. Associados a esta articulação existem ainda certos

    ligamentos, com função de controlo e estabilização da estrutura em causa, como os ligamentos

    colaterais laterais (ligamento talo-fibular anterior, o ligamento talo-fibular posterior, e o ligamento

    calcâneofibular), e dos ligamentos colaterais mediais (29).

    Figura 5- Anatomia do Pé. Fonte:

    (http://www.podologia.com.pt)

  • 12

    O pé pode ser classificado em três segmentos: O retropé, que possui 7 ossos dispostos em duas

    filas (tálus e calcâneo e cubóide, navicular, e cuneiformes medial, intermédio e lateral); o metatarso ou

    médio-pé formado pelos cincos ossos metatársicos e o antepé ou dedos do pé (29).

    A flexão dorsal, flexão plantar, inversão, eversão, adução, abdução, pronação e supinação são

    os movimentos que o pé consegue realizar do ponto de vista biomecânico, caso não existam anomalias

    associadas que os limitem (30).

    Flexão Plantar - Movimento que consiste no movimento do dorso do pé no sentido

    descendente, ficando a face plantar do pé voltada para baixo. Os gastrocnémios e o músculo solhar são

    os músculos antagonistas e agonistas do movimento, sendo que a amplitude deste movimento varia entre

    0 e 50 graus, podendo ocorrer variações de 10 graus (30,31).

    Flexão dorsal (Figura 7)- Movimento caraterizado pela elevação da parte dorsal do pé em

    direção à tíbia no plano sagital. Os músculos envolvidos são o músculo tibial anterior, o extensor longo

    dos dedos e o músculo fíbular, resultando numa rotação externa da articulação do tornozelo de

    aproximadamente 15º de angulação. Este movimento é caracterizado pela movimentação do pé para

    cima e para o lado externo. A sua amplitude varia entre 0 e 20 graus (30,31).

    Inversão-. A amplitude desde movimento varia entre 0 e 45 graus. O movimento ocorre quando

    o bordo medial do pé se desloca em direção à parte medial da perna, sendo que os principais músculos

    intervenientes neste processo são: os tibiais anterior e posterior, os gastrocnémios, o solhar e o longo

    flexor dos dedos (32).

    Eversão- Movimento pelo qual a planta do pé fica virada para a parte lateral da perna sendo os

    principais músculos envolvidos os fíbulares longo e curto e o extensor longo dos dedos, variando a sua

    amplitude entre 0 e 30 graus (33).

    Abdução- Movimento que ocorre no plano transverso caracterizado pelo desvio do antepé

    lateralmente (34).

    Figura 6- Movimentos de dorsiflexão e flexão plantar.

    Fonte: (Moura B. Projeto e desenvolvimento de estribo para

    calçado ortopédico. Universidade do Minho; 2011.)

  • 13

    Adução- Movimento que ocorre no plano transverso caracterizado pelo desvio do antepé

    medialmente (34).

    Supinação- Movimento que resulta do conjunto de movimentos como a inversão, adução e

    flexão plantar. O calcâneo move-se em relação ao tálus em direção à parte lateral do pé, sendo por isso

    um movimento tridimensional, variando a amplitude deste movimento entre os 0 e 52 graus (34).

    Pronação- Assim como o movimento de supinação, também este resulta de um conjunto de

    movimentos como a eversão, abdução e flexão dorsal sendo por isso também um movimento

    tridimensional. A amplitude deste movimento varia aproximadamente entre 0 e 30 graus, um pé pronado

    de forma excessiva a nível plantar é classificado como um pé plano (33).

    3.2 A marcha humana

    A marcha resulta de uma combinação de forças musculares, movimentos articulares e comandos

    motores neurais, sendo necessário que se realizem quatro requisitos essenciais para a realização da

    marcha: Integridade músculo-esquelética, controlo neurológico (receção e integração de mensagem),

    equilíbrio (capacidade de assumir e manter o ortostatismo), e locomoção (capacidade de iniciar e manter

    marcha rítmica) (35). O ciclo de marcha inicia-se desde momento em que ocorre o contacto inicial ao

    solo de uma extremidade do pé, até ao momento em que a mesma extremidade contacta novamente com

    o solo, podendo ser assim definido como o intervalo de tempo entre dois acontecimentos sucessivos e

    repetitivos da marcha (36).

    O Ciclo de marcha divide-se em duas principais fases a fase de apoio ou stance (a qual representa

    60% do ciclo de marcha) e a fase de balanço ou swing (a qual representa 40% do ciclo de marcha) (36).

    A fase de apoio ou stance, é caracterizada por um apoio duplo ou simples do pé sobre o solo e

    divide-se em três frases: fase de duplo apoio (na qual ambos os pés se encontram em contacto com o

    solo), fase de apoio simples (quando apenas um pé se encontra apoiado sobre o solo), e segunda fase de

    duplo apoio (quando ambos os pés voltam a contactar com o solo) (35,36).

    Figura 7- Ciclo de Marcha no pé. Fonte:

    (http://www.footbionics.com/site/footbionics/images/gait%20cycle.jpg)

  • 14

    A fase de balanço ou swing, inicia-se desde o momento em que o membro inferior deixa de

    contactar com o solo e acaba antes do ataque ao solo do mesmo membro. Esta fase é subdividida em

    três fases: fase de balanço inicial ou fase de aceleração, fase média de balanço ou fase média de balanço

    e fase de balanço final ou fase desaceleração (36,37).

    A fase de apoio ou stance pode ser subdivida em (36–38) (Figura 8):

    ➢ Contacto inicial- Esta é a fase inicial do ciclo de marcha que corresponde entre 0-2% da fase de

    apoio e é determinada pelo momento em que o pé entra em contacto com o solo através do

    calcâneo com vista ao posicionamento do membro para posterior rolamento do calcanhar e é

    também o momento em que o centro de gravidade se encontra na sua posição mais inferior.

    Nesta fase o pé encontra-se a 25º em relação ao solo, enquanto a articulação do tornozelo se

    encontra aproximadamente em posição neutra (admitindo até 3º de flexão plantar). Esta posição

    depende da liberdade de movimentos existente na articulação do tornozelo, bem como do

    controlo ativo dos músculos anteriores da perna (tibial anterior, longo extensor do dedo grande

    e comum dos dedos e peroneal anterior) (36–38).

    ➢ Resposta à carga- Esta segunda fase inicia-se desde o contacto inicial com o solo e continua até

    que o pé da outra extremidade entre na fase de balanço, sendo o seu propósito a estabilização e

    absorção de choques, correspondendo a 2-10% da fase de apoio. Assim que o calcanhar contacta

    com o solo o pé desce controladamente até aos 10º de flexão plantar através da ação dos

    músculos pré-tibiais que evitam o colapso descontrolado do pé (em situações não patológicas)

    (36–38);

    ➢ Fase de médio apoio- representa uma percentagem entre 10-30% da fase de apoio sendo

    caracterizada pelo suporte unilateral da carga. Nesta fase ocorre o avanço do peso corporal sobre

    o pé em posição estacionária, iniciado quando o pé contralateral é elevado do solo.

    A força é então exercida sobre o pé estático em 3 pontos principais: calcâneo e cabeças dos 1º

    e 5º metatarsos. A ação de balanço ao nível do tornozelo permite a progressão do peso corporal

    estando nesta fase o centro de gravidade na sua posição mais elevada. À medida que o peso

    corporal avança a base do vetor da força move-se do calcanhar para o antepé. No início desta

    fase o pé apresenta uma ligeira flexão plantar, passando gradualmente à flexão dorsal (passando

    de uma angulação de 5º de flexão plantar, para 5º de flexão dorsal), atingindo os 10º de flexão

    dorsal aquando do levantamento do calcanhar no momento em que se inicia a fase de apoio

    terminal (36–38);

    ➢ Fase de Apoio Final- Esta fase também determinada como heel off é parte constituinte da fase

    de propulsão (push off). Começa quando existe a elevação do calcanhar terminando quando o

    pé contralateral toca no solo correspondendo entre 30-50% da fase de apoio. Durante esta fase

    o peso do corpo é deslocado para a frente sobre o pé, sendo o seu objetivo a progressão do corpo

    (36–38);

  • 15

    ➢ Fase de Pré-Balanço- Também denominada de toe off, a fase final da fase de apoio atua como a

    última fase da fase de propulsão e é o momento em que o pé de referência descola do chão.

    Nesta fase há a preparação da perna para a fase oscilante, existindo nesta fase o contacto com o

    solo por parte do pé contralateral, iniciando com esse contacto a fase média de apoio, e

    promovendo uma rápida transferência de peso para esse mesmo membro. Existe então nesta

    fase uma rápida flexão plantar até cerca dos 20º. Esta fase corresponde entre 50-60% da fase de

    apoio (36–38).

    A fase de balanço (swing) pode ser subdivida em três fases (36–38) :

    ➢ Fase Balanço Inicial ou Fase de Aceleração- Também determinada por initial swing corresponde

    a 60-73% da fase de balanço e tem inicio quando o pé de referência deixa o solo e termina

    quando este estiver diante do pé de apoio;

    ➢ Fase de Balanço Médio ou Fase Média de Balanço- Também determinada por mid swing é

    iniciada quando o pé oscilante estiver diante do pé de apoio e só termina quando existir uma

    projeção do mesmo para a frente e a tíbia permanecer na vertical correspondendo a 73-87% da

    fase de balanço

    ➢ Fase de Balanço Final ou Fase de Desaceleração-Também denominada por terminal swing com

    uma percentagem de 87-100% da fase balança. Tem início quando a tíbia passa para além da

    posição vertical em relação ao solo, e o joelho se coloca numa posição de ataque ao solo

    terminando no momento em que o pé entra em contacto com o solo.

    4. O pé diabético- Conceito e Epidemiologia

    O pé diabético foi definido em 1956 por Oakley como consequência de doenças vasculares,

    neuropatia e infeção, sendo mais tarde associado a fatores psicossociais e a uma anormal distribuição

    de pressões plantares. O seu atual conceito é definido pelo Internacional Working Group on the Diabetic

    Foot (IWGDF) como a presenta de dois factores etiopatogénios major: vasculopatia diabética e a

    neuropatia diabética- sensitiva, motora e autonómica (3).

    Assim, o pé diabético constitui um problema na saúde pública uma vez que as suas lesões podem

    originar complicações mais graves e evoluir para amputações do membro inferior o que não só remete

    para repercussões individuais como também sociais e económicas profundas, sendo esta condição

    responsável pela maior causa de amputação não traumática (70% das amputações) nos países ocidentais,

    onde entre 15 a 25% dos indivíduos com DM podem vir a desenvolver uma úlcera (5,39,40).

    A presença de úlceras no pé diabético ( Figura 9) está usualmente associada a uma neuropatia

    periférica com uma prevalência de 23 a 42% e à doença vascular periférica com uma frequência de 9 a

    23% (41).

  • 16

    O pé diabético é classificado em duas etiologias: O Pé Neuropático que deriva de uma

    Polineuropatia Distal e que é responsável por afetar aproximadamente 50% da população diabética e o

    Pé Neuroisquémico que resulta de uma oclusão arterial, ou Doença Arterial Obstrutiva Periférica. Estas

    duas classificações apresentam distinções quer na sua epidemiologia, clinica e tratamento e ainda

    fisiopatologia, o que por consequência necessita de uma avaliação diferente (42).

    O pé neuropático diabético resulta de uma das primeiras alterações patológicas no paciente com

    diabetes que é o mau controlo da glicémia associada aos baixos níveis de produção de insulina, sendo

    este tipo mais usual em populações jovens diabéticas. Em relação à sua prevalência, este tipo de pé

    diabético apresenta um valor entre 50 a 60%, no entanto nos países desenvolvidos este número tem

    vindo a ser alterado, resultante das condições sociais e económicas como ainda o aumento da esperança

    média de vida dos doentes diabéticos que origina a que as placas ateromatosas difusas existentes nas

    artérias poplíteas e femoral aumentassem o seu efeito e desta forma conduzir a que o pé neuropático

    evoluísse para um pé Neuroisquémico que aumenta a probabilidade de amputação de nível major

    (42,43).A distribuição do pé diabético pode ocorrer entre os diferentes tipos de Diabetes principais (1 e

    2), no entanto, certa de 90% dos indivíduos afetados possuem uma diabetes do tipo 2 (42).

    4.2 Patogénese

    A DM como abordado anteriormente caracteriza-se por um défice de insulina que origina uma

    hiperglicemia no individuo que compromete posteriormente a regeneração e cicatrização celular (5).

    O pé diabético é essencialmente determinado pelos efeitos da polineuropatia periférica diabética

    e pelos efeitos da aterosclerose. A polineuropatia diabética pode estar ou não associada aos efeitos

    aterosclerose, mas encontra-se seguramente presente em todos os indivíduos diabéticos (5).

    A nível celular com o aumento dos níveis de concentração intracelular de glicose os neurónios,

    bem como as células de Schwann não conseguem ter um funcionamento correto o que os torna bastantes

    Figura 8- Úlcera Podológica. Fonte: ( Kasiya MM, Mang’anda GD, Heyes S,

    Kachapila R, Kaduya L, Chilamba J, et al. The challenge of diabetic foot care:

    Review of the literature and experience at Queen Elizabeth Central Hospital in

    Blantyre, Malawi. Malawi Med J 2017;29(2):218–23. )

  • 17

    suscetíveis. A polineuropatia surge assim da degenerescência dos axónios tendo inicio na sua parte

    terminal, sendo que esta degradação depende do tamanho e do revestimento mielínico do neurónio,

    quanto maior for a mielina presente menor será a sua afectação atingindo por esta razão mais

    frequentemente os membros inferiores por apresentarem um maior tamanho de axónios e sendo também

    bilateral o estado do seu efeito, uma vez que as fibras do sistema nervoso autónomo não possuem mielina

    são as primeiras a ser atingidas (5,44), posteriormente são as fibras somáticas que levam a uma falta de

    sensibilidade no pé do individuo com DM (5).

    A diferente forma como as fibras são afetadas origina dois tipos de pés: o pé quente e túrgido

    que é resultado de uma anormal função simpática e da disfunção somática surge o pé insensível (5).

    Entre estas lesões nas fibras surge normalmente associada uma atrofia muscular intrínseca do

    pé que origina deformidades osteoarticulares (como exemplo de dedos “em garra”, dedos “em martelo”,

    proeminências das cabeças dos metatarsos, hálux valgo ou dedos sobrepostos) devido a um desequilíbrio

    dos músculos extensores e flexores do pé (3).

    Os dedos em garra surgem de desequilíbrios na musculatura intrínseca do pé nas primeiras

    falanges em estado de dorsiflexão o que remete para um aumento de pressão nas cabeças metatarsianas

    sobre a pele plantar, sendo a articulação metatarsofalângica afetada e é no dorso das articulações

    interfalângicas que a fricção com o sapato pode surgir formando calosidades (5).

    Estas alterações levam a formação de zonas de hiperpressão plantar que afeta não só a

    biomecânica do individuo como também a pele na zona plantar que adquire uma hiperceratose local que

    com a evolução e progressão negativa pode desencadear numa ulceração e em casos mais graves à

    amputação do membro (3).

    Pacientes com esta patologia podem apresentar diversos sintomas como uma diminuição da

    sensibilidade do pé, podendo atingir um estado de anestesia completa e por isso mesmo uma ausência

    de dor ou podem pelo contrário apresentar sintomas dolorosos agudos (5).

    A disfunção autónoma /Simpática resulta numa hiperperfusão do pé em profundidade por

    consequência de abertura dos “shunts” arteriovenosos levando a que o pé Neuropático apresente como

    um dos sintomas um fluxo superior ao normal e por isso quente e túrgido e edemaciado. A abertura

    destes “shunts” pode levar a um desvio do fluxo sanguíneo para a derme resultando num estado de

    isquemia relativa epidérmica com uma presença de pressão transcutânea de oxigénio baixa (5).

    Esta situação leva a outro sintoma que é a ausência de sudorese e uma pele na superfície plantar

    caracterizada por ser seca e facilmente friável, uma vez que perde a sua capacidade de absorver e dissipar

    as forças físicas da marcha, o que compromete o tecido celular cutâneo e a distribuição de pressões na

    posição ortostática ou na realização da marcha (5).

  • 18

    O pé neuropático está presente em 90% da patologia que é a Neuropatia de Charcot2 uma vez

    que este aumento e fluxo favorece as fraturas ósseas pela sua diminuição da massa óssea trabecular e

    cortical (5,45).Inicialmente a avaliação do pé diabético passa pela distinção do tipo de pé que o paciente

    apresenta através da presença ou não de pulsos periféricos, sendo o exame vascular decisivo enquanto

    que os exames neurológicos são apenas confirmativos (5).

    Não só esta avaliação é realizada através de exames vasculares, neurológicos como também

    através de uma inspeção ao pé, incluindo nesta uma observação óssea, articular, tegumentar e ungeal

    como também é efetuada uma avaliação do calçado (3).

    A avaliação neurológica é importante para o despiste de alterações sensitivas associadas ao pé

    neuropático, sendo assim utilizado testes como (3):

    ➢ Sensibilidade à pressão como o monofilamento de Semmes-Weinstein;

    ➢ Sensibilidade vibratória- através do uso de um diapasão de 128 Hz;

    ➢ Sensibilidade táctil- através do uso de algodão;

    ➢ Sensibilidade a reflexos aquilianos- como o uso de um martelo de reflexos.

    ➢ Sensibilidade à discriminação- Uso de um alfinete;

    O teste de Semmes-Weinsten (Figura 10) é importante para delinear o risco de ulceração, recorre

    a um monofilamento de 5.7-10g que deve ser aplicado perpendicularmente ao pé numa zona cutânea

    não afetada com pressão suficiente para dobrar este monofilamento com um máximo de 2 segundos,

    devendo o paciente estar de olhos fechados e responder sobre a sensibilidade do objeto, a forma correta

    de aplicação deste teste é no mínimo em 3 toques, alternando entre toques reais e irreais, é considerado

    uma boa sensibilidade se duas das três respostas ao toque estiverem corretas (5,46).

    Este teste possui uma sensibilidade entre 41 a 93% e uma especificidade entre 68 a 100% (47);

    2 A Neuropatia de Charcot é uma síndrome responsável pela destruição ou alterações na arquitetura osteoarticular

    do pé e tornozelo que pode original posteriormente luxações, deformidades ou fraturas (45).

    Figura 9- Zonas de aplicação do teste Semmes-Weinstein . Fonte:

    (Everett E, Mathioudakis N. Update on management of diabetic foot

    ulcers. Ann N Y Acad Sci 2018 Jan;1411(1):153–65.)

  • 19

    Após a identificação de um pé de risco, este deve ser periodicamente avaliado de forma a

    prevenir infeções que evoluam para úlceras ativas (45).

    4.3 Prevenção

    A ação profilática ocorre ao nível de cuidados primários de saúde com o objetivo principal de reduzir

    as complicações associadas ao pé diabético, dividindo-se assim esta prevenção em três principais níveis

    (42):

    Nível 1- Educação dos doentes ou familiares e cuidadores nos cuidados a ter com lesões não ulcerosas

    e ainda o modo de tratamento de úlceras superficiais e a importância do respetivo seguimento por

    equipas multidisciplinares ao qual deve estar incluindo um médico de família, ume enfermeira e um

    podologista se necessário (42) .

    Nível 2- Neste nível as ações profiláticas estão focadas na avaliação e na prestação de cuidados a doentes

    diabéticos com patologia ulcerosa, isquémica ou ainda associada a uma infeção e/ou necrose cujo

    tratamento inclui um desbridamento cirúrgico com ou sem internamento, sendo neste caso a equipa

    multidisciplinar composta por um médico endocrinologista, um ortopedista ou cirurgião geral e um

    enfermeiro ou podologista (42).

    Nível 3- Este nível está indicado para úlceras graves com recorrência a uma investigação vascular da

    mesma. A equipa neste nível é composta por um endocrinologista ou internista, cirurgião vascular,

    fisiatra, cirurgião geral, enfermeiro, profissional treinado em podologia e um ortoprotésico (42).

    Não só a educação dos cuidadores é fundamental, como também deve existir uma avaliação

    periódica com vista a identificar os pés que apresentem riscos de úlceras ativas, caracterizando assim o

    doente pela: sua história clínica; estilo de vida (que pode incluir hábitos de tabagismo, alcoolismo ou

    sedentarismo), presença de doenças ou outro tipo de condição (úlcera ou amputação) ou doença

    concomitante e sintomas como parestesias, dores em repouso, claudicação ou alterações na velocidade

    de marcha, sendo que o doente deve estar em posição ortostática e posteriormente em decúbito dorsal

    com os pés descalços(42) .

    Nesta avaliação é importante (42) :

    - O sistema vascular onde através de um exame objetivo poderá existir a confirmação de uma isquémia

    crónica, sendo que no pé neuroisquémico deve ter-se em conta a possibilidade de existir uma

    revascularização;

    - Pele e feneras- Neste caso fatores como a cor, temperatura, hidratação, presença de zonas com

    calosidades, fissuras, presença de edemas, úlceras, amputações e alteração nas unhas;

  • 20

    - Sistema osteoarticular- Observação de proeminências ósseas ou deformações ou alguma alteração na

    mobilidade articular;

    - Sensibilidade e reflexos- Resposta do paciente à pressão, discriminação e sensibilidade superficial,

    sendo esta uma avaliação de grande importância, uma vez que senão existir resposta do doente significa

    um maior risco de ulceração pois encontra-se abaixo do limitar de proteção contra agressões externas

    mecânicas.

    - Calçado e meias- O calçado e as meias são uma parte do vestuário a ter cuidado no pé diabético uma

    vez que a presença de costuras e/ou remendos, a altura do dorso do sapato, do tacão, a presença de

    corpos estranhos, um material do calçado não adequado, presença de palmilha com firmeza do calcanhar

    pode prejudicar gravemente o pé do indivíduo com diabetes pudendo originar úlceras nomeadamente

    nos dedos por causas de pressão de encarceramento.

    O calçado é indicado como a causa mais frequente de lesões ao nível do pé diabético, representando

    aproximadamente 80% das lesões (48) que podem eventualmente evoluir para úlceras e em casos mais

    graves para amputações, desta forma, existem algumas indicações para pessoas com esta doença a nível

    de tipo de sapatos a utilizar:

    • O sapato deve permitir o espaço para os dedos e medir assim mais um centímetro alem do

    primeiro dedo, sendo alto e largo e não bicudo na ponta para impedir possíveis lesões que

    possam ocorrer na zona dorsal e marginal dos dedos (48);

    • A altura do tacão deve ser no máximo de 2 centímetros, sendo o calcanhar firme e o aperto deve

    ter cordões ou velcro que estejam perto da articulação tibiotársica de modo a evitar

    deslizamentos aquando a realização da marcha (48);

    • Deve possuir uma palmilha amovível que permita a sua substituição por uma palmilha realizada

    por medida de acordo com as necessidades plantares do individuo com diabetes (48) .

    4.4 Úlceras podológicas e a sua importância na monitorização

    As úlceras são consideradas lesões que provocam a perda de integridade da pele, que se pode

    estender desde a derme para as camadas mais profundas podendo atingir o músculo e o osso subjacente

    (6).

    Existe uma maior prevalência das mesmas ao nível plantar (Figura 11) e são geralmente

    neuropáticas, atingindo em maior frequência a zona das cabeças metatársicas e o calcâneo, sendo que

    num estudo realizado com 87 participantes concluiu uma distribuição de úlceras podológicas de 56,3%

    na zona metatársica, 32,1% na zona dos dedos e 1,9% no calcâneo, sendo por isso consideradas as zonas

    de maior risco. Estas úlceras são ainda regularmente precedidas por hiperceratoses (6,49).

  • 21

    Estimativas admitem que a incidência de úlceras podológicas atinge a população entre

    aproximadamente 1 a 4% anualmente, sendo que um paciente diabético tem uma probabilidade de

    desenvolvimento de uma úlcera entre 15 a 25% o que é um número alarmante considerando que a

    ulceração é uma das principais causas de amputação de membros inferiores (2).

    As úlceras podem ser consideradas neuropáticas ou isquémicas ou ainda neuroisquémicas

    quando a isquémia periférica é a principal causa que se associa a um pé neuropático. As úlceras no pé

    diabético não ocorrem por ulceração espontânea, mas sim a combinação de fatores de ausência de

    sensibilidade com fatores externos que podem desencadear a formação da úlcera, como andar descalço

    sobre um objeto pontiagudo, uso de calçado inadequado e hiperceratoses que evoluem para um estado

    de ulceração (6).

    Desta forma, a úlcera não ocorre por um episódio único, mas sim pelo acumulado de situações

    de hiperpressões plantares ou agressões numa determinada região do pé ou por uma infeção (6).

    As infeções no paciente com DM devem ser consideradas potencialmente perigosas, uma vez

    que 1 em cada 5 infeções pode ter uma extensão até ao osso e preceder uma úlcera de maior complicação.

    Existem vários tipos de infeções que podem ocorrer: celulite, fascíte necronizante, artrite séptica,

    tendinite, osteomielite ou miosite, sendo as infeções o principal antecedente de qualquer úlcera

    podológica (5).

    Outro fator a considerar é que se o individuo com DM possuir DVOP o risco de infeção duplica,

    uma vez que a resposta inflamatória e imunitária diminui (5) .

    Após a barreira de proteção da pele ter sido penetrada, os tecidos que a antecedem são expostos

    a agentes patogénicos e se o tratamento antibiótico não surgir no respetivo tempo adequado os

    mecanismos de defesa diminuem podendo assim a infeção aumentar para níveis mais profundos e

    progredir negativamente (5). Os organismos patogénicos mais usuais neste tipo de infeção são:

    Figura 10- Zonas de rico de úlceras podolológicas. Fonte: (Ostadabbas S,

    Saeed A, Nourani M, Pompeo M. Sensor architectural tradeoff for

    diabetic foot ulcer monitoring. In: 2012 Annual International Conference

    of the IEEE Engineering in Medicine and Biology Society .IEEE; 2012.

    p. 6687–90.)

  • 22

    Staphylococcus aureus, Staphylococcus epidermidis e o Streptoccus sp, Peptostreptococcus magnus e

    Bacterioides fragilis como anaeróbios (42).

    Em 50% das infeções profundas é possível encontrar bactérias Gram-Negativas, contudo, a

    maioria das infeções são de origem policrobiana (42).

    Após a lesão instalada existe uma grande probabilidade de criação de edema e aumento da

    temperatura local, aproximadamente 2,2º C (49,50).

    Existem diversas classificações de úlceras diabéticas que ajudam a definir o estádio da úlcera e

    são importantes para um correto diagnóstico e tratamento, sendo atualmente as mais utilizadas (2,41,51):

    ➢ Classificação de Wagner- Meggit (2,41) Este tipo de classificação é utilizado há 28 anos

    e é usualmente indicado para pés diabéticos com doença vascular e classifica a ferida quanto à

    sua profundidade:

    ▪ Grau 0- Ausência de úlcera, mas pé com risco elevado;

    ▪ Grau 1 – Presença de úlcera superficial, mas sem infeção associada em termos clínicos;

    ▪ Grau 2- Presença de uma úlcera profunda com ou sem celulite associada, mas com

    ausência de osteomielite ou abcesso;

    ▪ Grau 3- Presença de úlcera profunda com associação de uma formação de abcesso ou

    osteomielite;

    ▪ Grau 4- Presença de gangrena localizada;

    ▪ Grau 5- Presença de gangrena geral, afetando todo o pé.

    Embora seja uma classificação muito utilizada, apresenta algumas desvantagens, como o facto

    de a infeção ser referida como um estádio da doença, não categorizando corretamente feridas superficiais

    com presença de infeção ou isquémicas periféricas e por isso mesmo não tem a capacidade de ser

    abrangente para todos os níveis de padrões de ulcerações no pé diabético (2).

    Existe ainda uma variância desta classificação com o propósito de ser mais precisa denominada

    por “Depth ischemic classification” que permite distinguir melhor o grau 2 do grau 3 anteriormente

    mencionado na Classificação de Wagner (51).

    ➢ Depth ischemic classification (51):

    ▪ Grau 0 – Pé com risco que teve na sua história clínica a presença de uma úlcera e pode

    desenvolver uma nova úlcera, não existe presença de isquémia.

    ▪ Grau 1- Presença de úlcera superficial sem infeção ou gangrena;

    ▪ Grau 2- Presença de úlcera profunda com exposição do tendão subjacente que pode

    possuir ou não infeção, existência de gangrena localizada;

    ▪ Grau 3- Úlceração profunda e extensa com exposição óssea subjacente ou presença de

    abcesso profundo com gangrena no total do pé.

  • 23

    ➢ Classificação da Universidade de Texas (2,51):

    Este tipo de classificação inclui parâmetros não presentes nas classificações anteriores, uma vez que a

    sua classifica de acordo com a profundidade da ferida, o tipo de infeção e ainda a presença de isquemia no

    membro inferior (A-D) através de 4 graus (0-3), além de ser mais abrangente e especifica se existe alguma

    dificuldade em aplica-la na prática clinica (2,51) como se observa na Tabela 2.

    Tabela 2- Classificação pela Universidade de Texas de úlceras podológicas. Adaptado da Fonte: (Noor S, Zubair M, Ahmad

    J. Diabetic foot ulcer—A review on pathophysiology, classification and microbial etiology. Diabetes Metab Syndr Clin Res

    Rev 2015 Jul;9(3):192–9.)

    Grau 0 1 2 3

    Infeção

    A Sem presença de úlcera,

    mas com risco de

    desenvolvimento ou de

    recidiva

    Presença de úlcera

    superficial sem

    envolvimento de

    planos profundos

    Lesão com

    exposição do

    tendão

    adjacente

    Lesão com

    exposição do

    osso ou

    articulação

    B Presença de Infeção Presença de Infeção Presença de

    Infeção

    Presença de

    Infeção

    C Presença de isquemia Presença de isquemia Presença de

    isquemia

    Presença de

    isquemia

    D Presença de Infeção e de

    isquemia

    Presença de Infeção e

    de isquemia

    Presença de

    Infeção e de

    isquemia

    Presença de

    Infeção e de

    isquemia

    4.4.1 Tratamento de úlceras Podológicas

    No pé diabético deve existir sempre um controlo metabólico rígido de modo a prevenir

    complicações mais graves, contudo, quando o paciente já possui uma úlcera o principal objetivo

    imediato é tratar o tipo de infeção, posteriormente proceder a uma revascularização quando a isquemia

    o permite e por fim estabelecer condições desejadas da ferida com remoção de hiperceratoses por

    exemplo (42).

    O tratamento da Infeção recorre à realização de uma terapêutica adequada e usualmente antibiótica,

    contudo tem de estar sempre associada a um cuidado da zona lesionada (42,52,53).

    A administração por via oral de Amoxiciclina/ Ácido Clavulânico, Cefalosporinas de 2ª ou 3ª

    geração ou Imipenem é normalmente suficiente quando a infeção é leve ou moderada, contudo, em

  • 24

    úlceras crónicas e graves é normalmente indicado o desbridamento e limpeza cirúrgica da zona afetada

    (42).

    As infeções menos graves necessitam aproximadamente entre 7 a 10 dias de terapêutica, enquanto

    que as úlceras de mais grave complicação podem necessitar de um tratamento de 3 semanas (42).

    Quando existe exposição do tendão, osso, articulação ou outro plano profundo com associação de

    gangrena ou fascite necrotizante a cirurgia deve ser realizada de forma a realizar a drenagem e

    desbridamento da zona ou em casos mais complicados e irreversíveis a amputação parcial do pé

    (42,52,53).A drenagem e desbridamento da zona tem como propósito a remoção de tecido necrótico

    através de incisões longitudinais dorsais e plantares e evitando as zonas de contacto plantar do pé. A

    remoção de tecido necrótico não só evita a progressão da infeção, como também permite fatores de

    crescimento de tecido saudável quando permitido (42,52).

    Numa situação de isquemia, a revascularização deve surgir 2 a 5 dias depois do desbridamento da

    ferida (42).O propósito terapêutico da revascularização é conseguir a prevenção da amputação do

    segmento afetado e promover a cicatrização da zona, isto é possível através do regaste de pelo menos

    uma artéria infrapoplítea que seja viável para o pé e que seja responsável por nutrir a região com úlcera

    (42,54).

    Esta etapa de processo terapêutico permite uma prevenção de amputação de 85 a 90% dos casos nos

    primeiros 3 anos (54).

    4.4.2 Úlceras crónicas e Amputação

    A nível geral as úlceras podem ser definidas como úlceras agudas em que o processo de cicatrização

    é relativamente rápido e sem complicações associadas e as outras úlceras que não apresentam este

    episódio são consideradas úlceras crónicas (55,56).

    As úlceras crónicas quanto à sua definição temporal são consideradas quando existe uma interrupção

    da pele por um período superior a 3 meses e estão normalmente associadas a patologias na sua maioria

    a DM, doença isquémica, inflamatória ou como resultado de pressões excessivas e mal distribuídas (56).

    O facto do tipo de úlceras crónicas não possuir uma fácil cicatrização pode ser consequente de

    um trauma ou uma isquemia tecidular local ou ainda por uma contaminação bacteriana (56).

    Ao contrário das úlceras agudas, as úlceras crónicas não possuem um processo de cicatrização

    ordenado e atempado e por isso acabam por não desenvolver corretamente as 4 fases associadas ao

    processo de cicatrização: Hemóstase- Inflamação- Proliferação e Maturação, apresentando ao revés um

    atraso em recuperar a integridade anatómica e funcional (56). Esta lentidão pode ter como origem uma

    elevada presença de citoquinas inflamatórias e protéases como também uma baixa mitose celular

    associada (56).

  • 25

    Em relação à sua presença, as úlceras crónicas encontram-se mais frequentemente nos membros

    inferiores e em indivíduos com uma idade superior ou igual a 65 anos, esta frequência pode ser explicada

    pelo impacto do envelhecimento nas respostas celulares e tecidulares e uma elevada resposta

    inflamatória associada a uma degradação de proteínas que podem levar a uma resposta lenta (56).

    Existe uma associação bastante representativa entre o desenvolvimento de úlceras no pé

    diabético e amputações, sendo que segundo estudos realizados 5% dos pacientes que apresentam esta

    condição irão desenvolver uma amputação Major (ao nível da coxa, perna e tornozelo) e entre 20 a 30%

    irão desenvolver uma amputação Minor (amputações parciais do pé) (57).

    4.5 Ortóteses Plantares no pé diabético

    A perda de sensibilidade anteriormente relatada torna os traumas plantares por vezes difíceis de

    identificar de forma atempada, ficando o pé suscetível à entrada de bactérias e outros microrganismos.

    As complicações neuro-vasculares levam a uma alteração da biomecânica do pé resultando numa

    anormal distribuição da pressão plantar com sobrecarga nas regiões da cabeça dos metatarsos, calcanhar

    e dedos do pé. Estas altas pressões podem ser redistribuídas através do uso de ortóteses plantares (58).

    As ortóteses plantares são dispositivos de uso externo cuja principal finalidade é prevenir, corrigir

    deformidades ou realizar o seu alinhamento de forma a promover uma melhoria na função corporal do

    segmento a que se encontra aplicado. No caso dos indivíduos com DM, as ortóteses plantares visam

    amortec