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«AGROINDÚSTRIA» Negócio líquido João Cortez Lobão decidiu, sete anos, comprar uma herdade de família e investir no azeite. Hoje, exporta 60% da produção para embaladores. Texto José Miguel Dentinho. Foto Paulo Vaz Henriques O Em 2005, João Cortez Lobão, então administrador de uma gestora de patrimó- nios do BCP, soube que a Herdade Maria da Guarda, que estava na família 350 anos, ia ser vendida. Em face disso, deci- diu comprar a propriedade, por ser o úni- co elemento da família com vontade de a manter. Após uma conversa com o pai, António Cortez Lobão, montou a opera- ção. Mas não era apenas para passar a ser dono de uma herdade. O fito era desen- volver um negócio. Mas João Cortez Lobão, 49 anos, era um neófito nestas andanças. Foi jornalis- ta durante dez anos no Tempo Económico, Semanário e Expresso. Em 1996, mudou de vida. Foi para os Estados Unidos fazer um curso de Analista de Ativos de Empresas Cotadas, na Universidade de Nova lorque. Tinha três filhos, na altura, e ficou a viver na cidade durante mais alguns anos. Inicialmente, achou que iria voltar à profissão após o curso. Mas um amigo, sócio de uma empresa de gestão de ativos, a Villas-Fisher Assets Management, desa- fiou-o, primeiro a fazer um part time enquanto estava a estudar, depois, a traba- lhar a tempo inteiro. Fazia essencialmen- te gestão de fundos de investimento para clientes europeus que não tinham expo- sição ao mercado acionista norte-ameri- cano. Eram empresas sem escritórios, mas queriam alocar uma parte dos seus ativos nos Estados Unidos por questões de dis- tribuição de risco. Em 1999, voltou a Portugal. "Sei onde estão as minhas raízes e não queria que os meus filhos crescessem sem saber as suas", diz. Começou numa corretora do Banco Comercial Português (BCP) e mais tarde numa gestora de patrimónios. Opção pela commodity azeite Durante o processo de aquisição da pro- priedade, estudaram várias opções, como os vinhos, mas a escolha recaiu sobre a produção de azeite, "por ser uma commo- dity e não precisar de grande esforço para ser vendido internacionalmente. É comer- cializado em cisternas de 25 toneladas e não precisa de rótulo nem canal de dis- tribuição que o promova, como acontece com o vinho", defende João Cortez Lobão. Além disso, embaladores não têm pro- dução própria e precisam de fornecedores de azeitonas e de azeite de qualidade. A empresa arrancou em 2006, altu- ra em que a Sociedade Agrícola Maria da Guarda começou a fazer as primeiras plantações. O diretor-geral, Carlos Mar- tins, e o diretor financeiro, Francisco Melo e Castro, não são sócios, mas participam nos resultados da empresa. "Inicialmen- te eram sócios, mas como a terra é difícil de partilhar, acharam que deveriam sair, mantendo a posição em termos de resul- tados", diz João Cortez Lobão. Este é um modelo comum no sector financeiro, "em empresas de fundos com poucos acio- nistas-fundadores, aos quais se juntam outros que não têm parte no capital, mas, sim, uma percentagem dos resultados sem terem de comprar ou vender posições" . Há, assim, um dono da terra, a Sociedade Agrícola Herdade Maria da Guarda, que pertence a João Cortez Lobão. Esta explora parte do olival e é proprietária da Doctor Oil, que explorará outra parte do olival e o

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Page 1: Press Review page - ClipQuick · os vinhos, mas a escolha recaiu sobre a produção de azeite, "por ser uma commo- ... tem de ser tudo apanhado ao mesmo tempo. Outra das razões tem

«AGROINDÚSTRIA»

NegóciolíquidoJoão Cortez Lobão decidiu, há sete anos, comprar uma herdadede família e investir no azeite. Hoje, exporta 60% da produçãopara embaladores. Texto José Miguel Dentinho. Foto Paulo Vaz Henriques

O Em 2005, João Cortez Lobão, entãoadministrador de uma gestora de patrimó-nios do BCP, soube que a Herdade Mariada Guarda, que estava na família há 350

anos, ia ser vendida. Em face disso, deci-diu comprar a propriedade, por ser o úni-co elemento da família com vontade de a

manter. Após uma conversa com o pai,António Cortez Lobão, montou a opera-ção. Mas não era apenas para passar a ser

dono de uma herdade. O fito era desen-volver um negócio.

Mas João Cortez Lobão, 49 anos, eraum neófito nestas andanças. Foi jornalis-ta durante dez anos no Tempo Económico,Semanário e Expresso. Em 1996, mudou de

vida. Foi para os Estados Unidos fazer umcurso de Analista de Ativos de EmpresasCotadas, na Universidade de Nova lorque.Tinha três filhos, na altura, e ficou a viverna cidade durante mais alguns anos.

Inicialmente, achou que iria voltar à

profissão após o curso. Mas um amigo,sócio de uma empresa de gestão de ativos,

a Villas-Fisher Assets Management, desa-

fiou-o, primeiro a fazer lá um part timeenquanto estava a estudar, depois, a traba-lhar a tempo inteiro. Fazia essencialmen-te gestão de fundos de investimento paraclientes europeus que não tinham expo-sição ao mercado acionista norte-ameri-cano. Eram empresas sem escritórios, mas

queriam alocar uma parte dos seus ativos

nos Estados Unidos por questões de dis-

tribuição de risco.

Em 1999, voltou a Portugal. "Sei onde

estão as minhas raízes e não queria queos meus filhos crescessem sem saber as

suas", diz. Começou numa corretora do

Banco Comercial Português (BCP) e mais

tarde numa gestora de patrimónios.

Opção pela commodity azeiteDurante o processo de aquisição da pro-priedade, estudaram várias opções, comoos vinhos, mas a escolha recaiu sobre a

produção de azeite, "por ser uma commo-dity e não precisar de grande esforço paraser vendido internacionalmente. É comer-cializado em cisternas de 25 toneladas e

não precisa de rótulo nem canal de dis-

tribuição que o promova, como acontece

com o vinho", defende João Cortez Lobão.

Além disso, há embaladores não têm pro-dução própria e precisam de fornecedoresde azeitonas e de azeite de qualidade.

A empresa arrancou em 2006, altu-ra em que a Sociedade Agrícola Mariada Guarda começou a fazer as primeirasplantações. O diretor-geral, Carlos Mar-

tins, e o diretor financeiro, Francisco Meloe Castro, não são sócios, mas participamnos resultados da empresa. "Inicialmen-te eram sócios, mas como a terra é difícilde partilhar, acharam que deveriam sair,mantendo a posição em termos de resul-

tados", diz João Cortez Lobão. Este é ummodelo comum no sector financeiro, "em

empresas de fundos com poucos acio-

nistas-fundadores, aos quais se juntam

outros que não têm parte no capital, mas,sim, uma percentagem dos resultados semterem de comprar ou vender posições" .

Há, assim, um dono da terra, a Sociedade

Agrícola Herdade Maria da Guarda, quepertence a João Cortez Lobão. Esta exploraparte do olival e é proprietária da DoctorOil, que explorará outra parte do olival e o

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Jornalista e financeiro João CortezLobão mudou a sua vida profissionalpara preservar a herdade da família,mas com uma visão de empresário

lagar que está a ser construído. Entretan-

to, a Sociedade Agrícola Herdade Maria da

Guarda adquiriu a parte de terra limpa da

contígua Herdade da Capela, a membrosda família Pulido Garcia, para plantar mais

oliveiras e erguer o lagar. Hoje, tem cercade 600 hectares de olival, dos quais 550hectares em sebe. Tem mais de 1 milhão de

oliveiras plantadas, regadas por quase 40

quilómetros de condutas subterrâneas de

distribuição e 1500 quilómetros de man-gueiras.

Uma das razões por que a empresa tem

plantado variedades diferentes de oliveiras

tem que ver com a colheita. Como ama-durecem em diferentes épocas, não >¦

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? tem de ser tudo apanhado ao mesmo

tempo. Outra das razões tem que ver coma aceitação do azeite nos mercados mun-diais. A variedade espanhola Arbequina"amadurece mais cedo e produz um azei-te muito macio que a comunidade inter-nacional aceita bem", revela João CortezLobão. Tal como a catalã Arbosana, a gregaKoroneiki e a italiana Tosca.

Clientes não faltamTem, no seu olival antigo, as variedades

portuguesas Galega, Cordovil de Serpa e

Verdeal. Produz azeite a partir desse olival,mas não poderia inveslir nestas varieda-des, porque não têm grande aceitação nomercado internacional e não permitem o

maneio em sebe e a mecanização. Sem a

baixa de custos de produção associada à

mecanização, seria difícil colocar o azeiteno mercado a preços competitivos. Este

produto, que chegou a atingir quase os 4

euros por quilo a granel há uns anos, está

entre os 2,2 e os 2,3 euros por quilo.A colheita da azeitona faz-se duran-

te 24 horas por dia. Como uma máquinaapanha 1 hectare em três horas, quantomaior for o número de horas, menor será

o tempo de colheita. No ano passado, teve

uma produção média de 12 toneladas porhectare, valor que deverá crescer por tersido a primeira produção em muitos dos

seus sectores.

O azeite é feito em lagares da região,como um em Ferreira e outro em Beja e

vendem azeitonas para a Esporão Azeites.A necessidade de diminuir os riscos devi-do à azeitona sair da propriedade levouJoão Cortez Lobão a investir no lagar: "Já

nos aconteceu entrar uma carrada de azei-tona com outra origem, o que fez o nosso

azeite perder qualidade." O investimentoé superior a 3 milhões de euros e poderátrabalhar a azeitona de outros produtoresda região de Serpa, onde se localiza a her-dade. Terá duas linhas e a capacidade de

moer 450 toneladas de azeitona por dia."Se produzir, em velocidade de cruzeiro, 7

milhões a 8 milhões de quilos de azeitona

por ano, pode trabalhar 20 dias para nós e

mais um a dois meses para os outros", dizJoão Cortez Lobão. Terá também capacida-de de armazenamento para cerca de 600mil quilos de azeite.

Não foi preciso fazer prospeção de

mercado à procura de clientes. Há sem-

pre compradores das embaladoras atentos

a novos investimentos em olivais e laga-res, que vieram bater à porta da empresae levaram amostras. "A qualquer deles,se quisesse, vendia a produção toda comum cheque. A um preço equilibrado como mercado, é claro." Alguns dos clientesdo azeite da Herdade Maria da Guarda são

embaladores espanhóis e italianos. Estes

últimos compram-no cá e embalam, com

rótulo de Itália. João Cortez Lobão diz queninguém sabe vender as suas marcas comoos italianos. E como sente que não temestas capacidades, tem de "jogar com as

deles. Não há nada pior do que querermosser o que não somos. Dá sempre asneira",afirma. Por isso, vai percorrendo o cami-nho da experiência e prevê uma apostamais forte na marca própria, quando tivera sabedoria e o parceiro mais adequado.

O futuro está em abertoO objetivo de João Cortez Lobão é produzir1,2 milhões de quilos de azeite por ano,para vender a granel, o que deverá dar ori-gem a vendas entre 3 milhões e 6 milhõesde euros, conforme o valor de mercadodo azeite. Como em condições normaisos custos poderão variar entre 500 e 1000euros por hectare em manutenção do oli-val, o azeite terá sempre margem. "Precisade descer para menos de 1 curo o quilopara eu ter algum problema para conti-nuar a investir", diz João Cortez Lobão.

Este ano, termina a fase de investi-mento que consumiu cerca de 14 milhõesde euros. "Tudo está em aberto a partirdaqui", diz João Cortez Lobão, porque nãosabe o que se irá passar com o mercadonos próximos 20 anos. Basta pensar que,há 30, era possível vender todo o vinho a

granel e hoje é necessário ter pelo menosuma marca para o fazer. O