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962 PRÁTICA PEDAGÓGICA NAS SALAS DE RECURSOS MULTIFUNCIONAIS: ENUNCIADOS DE PROFESSORES EM BLOGS Gabriela Alias Rios – PPGEEs, UFSCar, [email protected] Enicéia Gonçalves Mendes – PPGEEs, UFSCar, [email protected] Eixo Temático: Práticas de inclusão/exclusão em educação Categoria: Pôster Introdução No Brasil, a educação de crianças público alvo da educação especial (PAEE) começou a se tornar questão de política pública na década de setenta, quando ocorria, em contexto mundial o movimento baseado na filosofia da normalização e integração, o que acarretou numa mudança de pensamento no âmbito do atendimento aos estudantes PAEE, já que até então a segregação era considerada a melhor opção para atender estes alunos. A partir daí, a política passou a ser norteada pela ideia de integração escolar, que posteriormente viria chegar ao discurso de “educação inclusiva”, a partir da década de noventa (MENDES, 2010). A legislação que normatiza a educação inclusiva no Brasil é relativamente recente, pois foi apenas há pouco mais de vinte anos, com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, que foi oficializado que pessoas com deficiências fossem preferencialmente educadas na rede regular de ensino (LAPLANE, 2006). O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) também abordam esse direito, sendo que na LDB (BRASIL, 1996), foi incorporado o princípio que a escola deve se adequar para receber os alunos, quaisquer que sejam suas características (LAPLANE, 2006). Nessa lei também há um capítulo para a Educação Especial. Posteriormente, outros documentos foram publicados para normatizar a educação inclusiva no Brasil, como as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001), a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEE-EI) (BRASIL, 2008), e o Decreto 7611/2011(BRASIL, 2011).

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PRÁTICA PEDAGÓGICA NAS SALAS DE RECURSOS MULTIFUNCIONAIS:

ENUNCIADOS DE PROFESSORES EM BLOGS

Gabriela Alias Rios – PPGEEs, UFSCar, [email protected] Enicéia Gonçalves Mendes – PPGEEs, UFSCar, [email protected]

Eixo Temático: Práticas de inclusão/exclusão em educação Categoria: Pôster

Introdução

No Brasil, a educação de crianças público alvo da educação especial (PAEE) começou a se

tornar questão de política pública na década de setenta, quando ocorria, em contexto

mundial o movimento baseado na filosofia da normalização e integração, o que acarretou

numa mudança de pensamento no âmbito do atendimento aos estudantes PAEE, já que até

então a segregação era considerada a melhor opção para atender estes alunos. A partir daí,

a política passou a ser norteada pela ideia de integração escolar, que posteriormente viria

chegar ao discurso de “educação inclusiva”, a partir da década de noventa (MENDES,

2010).

A legislação que normatiza a educação inclusiva no Brasil é relativamente recente, pois foi

apenas há pouco mais de vinte anos, com a promulgação da Constituição Federal, em

1988, que foi oficializado que pessoas com deficiências fossem preferencialmente

educadas na rede regular de ensino (LAPLANE, 2006). O Estatuto da Criança e do

Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) também abordam esse direito, sendo que

na LDB (BRASIL, 1996), foi incorporado o princípio que a escola deve se adequar para

receber os alunos, quaisquer que sejam suas características (LAPLANE, 2006). Nessa lei

também há um capítulo para a Educação Especial. Posteriormente, outros documentos

foram publicados para normatizar a educação inclusiva no Brasil, como as Diretrizes

Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001), a Política

Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEE-EI)

(BRASIL, 2008), e o Decreto 7611/2011(BRASIL, 2011).

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Referencial Teórico

A PNEE-EI visa a constituir políticas públicas que promovam uma educação de qualidade,

tendo como objetivos o acesso, a participação e a aprendizagem dos alunos PAEE,

orientando os sistemas de ensino para promover respostas às necessidades educacionais

especiais (BRASIL, 2008).

As políticas de educação inclusiva indicam que o atendimento educacional especializado

(AEE) seja oferecido de forma complementar (para os estudantes com deficiência,

transtornos globais do desenvolvimento) ou suplementar (para os alunos com altas

habilidades ou superdotação) ao ensino regular (BRASIL, 2011). O AEE consiste num

conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucional

e continuamente, e tem por objetivos prover e assegurar condições de acesso, participação

e aprendizagem, bem como garantir serviços de apoio especializados de acordo com as

necessidades individuais dos alunos. O lócus do AEE na escola pública deve ser as Salas

de Recurso Multifuncionais (SRM) (BRASIL, 2011).

Devido ao fato de a legislação acerca deste atendimento ser recente, encontra-se ainda em

construção uma proposta do que seria na prática o AEE enquanto um serviço de apoio à

escolarização dos estudantes PAEE, o que representa um desafio aos professores, gestores

e acadêmicos.

Embora haja documentos que orientem as práticas, estas são adequadas de acordo com

cada realidade, pois professores das SRM lidam com imprevistos, e muitas vezes, não

cumprem o conteúdo planejado, pois atendem às solicitações dos alunos, como estudar

para provas, esclarecimento de trabalhos. Além disso, a (falta de) vontade política e as

condições de trabalho impactam diretamente na atuação desse professor

(ALBUQUERQUE, 2008).

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Objetivos

Apresentar práticas de professores que atuam nas SRM, divulgadas nos blogs desses

profissionais.

Metodologia

Este estudo é uma pesquisa qualitativa do tipo exploratório (MARCONI; LAKATOS,

2000).

Para alcançar os objetivos deste estudo, definiu-se como fonte de dados textos de autoria

de professores da educação especial, que atuam em SRM, publicados em seus blogs

pessoais. Inicialmente, foi realizado um levantamento dos blogs e dos textos. O

levantamento dos blogs foi feito a partir de buscadores na internet, com o filtro “Pesquisa

de Blogs”. Os descritores utilizados foram “sala de recursos multifuncional”, “sala de

recurso”, “atendimento educacional especializado”, “inclusão escolar” e “educação

inclusiva”.

Para a seleção dos blogs, foram adotados os seguintes critérios: ser nacional; pertencer a

professor da educação especial - verificado a partir do perfil do blogueiro. Desconsiderou-

se blogs de escolas, diretorias de ensino, ou similares, já que os textos não eram de autoria

de um único professor; conter pelo menos cinco postagens; temática ser relacionada à

educação especial. Blogs que continham várias temáticas, ou outras que não fossem a

educação especial foram descartados.

Para seleção dos textos, os critérios foram: textos originais, escritos pelo professor-

blogueiro. Textos copiados de outras fontes e informativos de eventos não foram

considerados; conteúdo relacionado à prática pedagógica do professor; textos publicados

entre o período de 2009 e 2012. Considerando que a PNEE-EI foi homologada em 2008,

optou-se por delimitar a busca entre 2009 e 2012.

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Foram selecionados dez textos, que terão suas estruturas discursivas analisadas a partir da

teoria semiótica do texto. Esta teoria tem como objeto o texto, que é visto como um todo

de significação (BARROS, 1994). A semiótica concebe o seu plano de conteúdo sob a

forma de um percurso gerativo, que compreende três níveis de organização do sentido do

texto: estruturas fundamentais, narrativas e discursivas. Para este trabalho, serão analisadas

apenas as estruturas discursivas, em que o texto é examinado como discurso. Até o

momento, apenas um desses textos foi analisado.

Desenvolvimento

O texto analisado foi escrito por uma professora de um município do Estado da Bahia, e

publicado no blog pessoal dela em 2011.

No nível discursivo, observa-se a espacialização, actorialização (atores do texto) e

temporalização (tempo). Também se examinam as figuras e os temas que recobrem o

discurso. A Tabela 1 ilustra a sistematização dos dados.

Nível Discursivo Elementos

Espacialização

Escola municipal em que leciona – “escola municipal onde já leciono em séries regulares há quase dez anos”

Temporalização

Presente: “leciono em séries regulares há quase dez anos”/ é visível grande distância”/ “ainda é pouco, embora seja o começo” Futuro: “Ainda há muito a fazer”

Actorialização

Actantes (função dos atores): professor Atores: professora-blogueira, que recebeu convite para atuar em uma SRM.

Temas

(a) Embora exista legislação que disponha sobre o AEE, a distância entre o que é preconizado pela legislação e a realidade das pessoas com deficiência ainda existe.

(b) Todos os alunos com deficiência precisam ser incluídos na rede regular de ensino. (c) Algumas iniciativas realizadas há pouco tempo.

Figuras

(a) Decreto; (b) Realidade das pessoas com deficiências; (c) Clientela fora da rede regular de ensino; (d) Iniciativas tímidas.

Tabela 1 – Sistematização da análise

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A partir da análise do texto, depreende-se que o enunciador (a professora) faz uma reflexão

acerca da situação do atendimento dos alunos PAEE na rede regular de ensino. Embora

exista legislação que estabelece os objetivos desse atendimento, a prática é dissonante, pois

enquanto a legislação prevê que o AEE deve oferecer condições de acesso, participação e

aprendizagem no ensino regular aos alunos público alvo da educação especial (BRASIL,

2011), a professora denuncia que grande parte desses alunos ainda se encontra fora da rede

regular de ensino. Ela ainda relata que embora ‘iniciativas tímidas’ tenham sido realizadas,

como cursos de capacitação na área da educação especial para professores, ainda é pouco

para que os objetivos da legislação sejam realmente alcançados.

Outro ponto é a relação que traz a professora é a importância da inclusão escolar desses

alunos, pois a partir do momento que forem realmente incluídos na escola, haverá

minimização de preconceitos e estereótipos em relação às pessoas com deficiência.

Considerações Finais

A PNEE-EI tem como objetivos garantir o acesso, a participação e a aprendizagem dos alunos

PAEE (BRASIL, 2008). A função do AEE é eliminar os fatores impeditivos da plena

participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas. A partir da análise do texto,

depreende-se que na prática isso ainda não tem acontecido. As estruturas discursivas remetem à

grande parte dos alunos PAEE fora da rede regular de ensino, e a grande distância entre o que é

proposto pela lei e o que realmente acontece na prática. Embora haja legislação e documentos

orientadores acerca da inclusão desse público alvo, as iniciativas ainda são poucas, e muito ainda

tem que ser feito para que legislação e prática tornem-se menos divergentes.

Pretende-se, ao finalizar as análises dos textos, ter um panorama geral de como tem se

dado as práticas dos professores em âmbito nacional.

Referências

ALBUQUERQUE, R. A. Educação e inclusão escolar: a prática pedagógica da sala de recursos de 5ª a 8ª séries. 2008. 144 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2008.

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BARROS, D. L. P. de. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo: Ática, 1994.

BRASIL. Atendimento Educacional Especializado. Decreto no 7.611/2011. BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: 2008. BRASIL. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Brasília: MEC/SEESP. 2001. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96. Ministério da Educação. 1996. BRASIL. Constituição Federal. Brasília, 1988.

LAPLANE, A. Uma análise das condições para implementação de políticas de educação inclusiva no Brasil e na Inglaterra. Educação e Sociedade, Campinas, SP, v. 27, n. 96, p. 689-715, out. 2006. MARCONI; M. A.; LAKATOS, E. M. Metodologia científica. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2000. MENDES, E. G. Breve histórico da educação especial no Brasil. Revista Educación y Pedagogia. V. 22, n. 57, PP. 93-109, mai/ago, 2010.