portugal, hoje - na perspectiva dos interesses dos trabalhadores

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  • 8/8/2019 PORTUGAL, HOJE - Na Perspectiva dos Interesses dos Trabalhadores

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    PORTUGAL, HOJENA PERSPECTIVA DOS INTERESSES DOS TRABALHADORES

    Miguel Judas

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    O objectivo, porm, no de provocar polmica, nem incomodar seja quem for,atribuir mritos ou condenaes. Em ltima instncia, a crise que temos da nossaresponsabilidade colectiva, cabendo a cada portugus a sua dose de responsabilidade.

    O nico objectivo suscitar a reflexo, se possvel ntima e intelectualmentehonesta, e que dessa reflexo possam resultar aces mais eficientes e convergentescom os Interesses do pas.A ideia-chave que subjaz ao presente trabalho consiste na ultrapassagem dosmodelos organizacionais hierrquicos, caractersticos de fases muito atrasadas dodesenvolvimento das sociedades humanas modernas e a aproximao aos modelosem rede , libertadores das energias, capacidades e mentalidades humanas,libertadoras de foras produtivas.

    Esta viso corresponde a levar em frente um processo que foi iniciado pelasrevolues burguesas que libertaram as sociedades pr-industriais do espartilhomonarquico-feudal do Antigo Regime, tendo, no plano da economia, institudo oCapitalismo como sistema scio-econmico dominante e, com ele, a liberdade de livrecooperao e interaco entre as empresas e a instituio do Mercado. Este, nosentido amplo, constitui a rede que permitiu a acelerao de todo o processo dedesenvolvimento. A instituio da Democracia no foi mais do que o reflexo, nodomnio da direco poltica da sociedade, dessa profunda reorganizao social.

    No entanto, a vitria da rede sobre a hierarquia no um processo automticonem linear. No o no Mercado, nas relaes inter-empresariais, nem na esferapoltica, na Democracia. A luta entre o velho e o novo no fica resolvida com aconquista do poder poltico pela parte da sociedade mais progressiva. Ela persiste notempo, com avanos e recuos, absorvendo as componentes do velho que se mantmteis e fazendo nascer novas particularidades ou caractersticas.

    Assim, as revolues burguesas aboliram os mecanismos hierrquicos gerais, ao

    nvel macro-social, mas no os aboliram ao nvel do funcionamento interno dasempresas nem do funcionamento interno da democracia. A organizao e ofuncionamento em rede sero, na perspectiva da nova classe dominante, tanto quantonecessrios para a defesa dos seus interesses e no mais do que isso. As novasestruturas ordenadoras do sistema social velam por que a entropia no aumente aoponto de comprometer a eficcia geral e as condies do desenvolvimento futuro.

    Da que as burguesias, implantando embora o funcionamento em rede ao nvel domercado, das relaes inter-empresariais e, parcialmente, ao nvel dassuperestruturas polticas da democracia representativa, tenham mantido os modelosrigorosamente hierrquicos e autoritrios no interior das empresas e ao nvel dosaparelhos dos Estados.

    As condies da disputa mundial entre o capitalismo e o socialismo sovitico, naqual se colocava a sobrevivncia de cada um dos sistemas, ambos adoptaram atitudesde recentralizao do poder tpicas das situaes de crise. Tal facto repercutiu-se naneutralizao das tendncias gerais de longo prazo de desenvolvimento de todos ossistemas em rede.

    Nas condies da revoluo cientfica e tcnica e da intensificao da concorrnciacapitalista escala mundial, as empresas mais dinmicas e a funcionar com base noConhecimento, foram em busca de factores de aumento da produtividade tanto navalorizao do capital humano como na adopo de modelos internos de organizaoe funcionamento em rede e por misso, baseados numa grande autonomia einteraco entre todos os elementos e unidades de trabalho.

    Ao nvel empresarial ou de grupos de empresas, surgiram assim diversos modelosorganizacionais, matriciais ou outros, que conjugam as suficientes componentes dedireco hierrquica (administrativa) com a organizao em rede.

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    Com a derrocada da URSS e o fim da guerra-fria, a nova economia mundializadapassou a encarar, a uma escala global, os Estados Nacionais do mesmo modo como,antes, desapreciava os feudos, isto , como entidades excedentrias ao processoeconmico, vivendo sua custa, alimentando elites parasitrias ou pouco justificadas.Da a sua luta radical contra qualquer barreira proteccionista e contra o pagamento de

    impostos. Este impulso, fundamentalmente revolucionrio, choca-se, porm, com anecessidade de garantia de um mnimo de estabilidade para os povos, no concreto, osquais no esto dispostos a pagar, hoje, o elevado preo que pagaram, no passado,em resultado dos processos de profunda reestruturao social e de rpida e desumanaindustrializao e urbanizao tpicas de todo o sculo XIX.

    rede mundial da economia mundializada ir corresponder a desestruturao dosEstados Nacionais hierrquicos e a sua gradual substituio por redes de novasentidades operacionais: grandes metrpoles, regies, pequenos municpioscompetitivos, etc.

    A correspondncia poltica a estes avanos do funcionamento em rede ao nveleconmico so a democracia participativa, isenta de qualquer espcie dediscriminao, e a substituio dos modelos centralistas e burocrticos de gesto dosaparelhos de Estado por modelos descentralizados, participativos e empreendedores.

    Uma economia moderna e competitiva s possvel se suportada por um sistemapoltico aberto, participativo, e por Estados empreendedores.

    Este trabalho no inclui, no seu corpo, apreciaes actividade do Governoactualmente em funes. No podemos, contudo, deixar de lhe fazer algumasreferncias telegrficas:

    a) Positivas:- Procura eliminar privilgios e submeter poderes corporativos;- Procura defender importantes conquistas sociais consagradas nos modelos de

    Estado Social europeus;- Valoriza a qualificao das pessoas e o conhecimento;- Teve a coragem de iniciar reformas estruturais racionalizadoras no aparelho

    do Estado;- Acredita profundamente no seu projecto e tem capacidade de deciso.

    b) Negativas:- centralista;- excessivamente impositivo;- No suscita a participao e a mobilizao social;- D prevalncia Confiana do empresariado relativamente Confiana dos

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    0. INTRODUOO Mundo encontra-se numa fase de profunda reorganizao econmica, poltica,

    social e cultural que d pelo nome de Globalizao.Esse processo de globalizao teve na sua base, no plano econmico e financeiro,

    o surgimento, especialmente a partir dos anos 60/70 do sculo passado, de empresasmultinacionais e da criao de uma rede de praas off-shore e, no plano poltico, aderrocada do bloco socialista e da URSS.

    No decurso desse processo veio a afirmar-se, por cima e contra as soberanias e aseconomias nacionais, um vasto e poderoso sector de economia mundializada, apoiadonas tecnologias mais avanadas e em imensos recursos financeiros, a qual concebe,implanta e gere, escala mundial, processos integrados de produo, transporte,distribuio, comercializao e consumo de mercadorias.

    Tal processo, prosseguido sob a hegemonia cientfica, tecnolgica, econmica efinanceira norte-americana, tem a sua correspondncia poltica na hegemonia poltica

    e militar dos EUA e na sua orientao unilateralista.A principal funo da Administrao norte-americana consiste exactamente nacriao das Condies Gerais de Operao e desenvolvimento desse novo sector deeconomia mundializada, mesmo que, para isso, tenha de entrar em confronto com osinteresses econmicos e polticos de outras partes.

    Face a essa dinmica, os restantes agrupamentos econmicos, de base nacional ouregional, de conjuntos de pases, procuram ajustar-se de modo a inserir-se noprocesso de globalizao e a aproveitar as oportunidades por ele abertas.

    A rede mundial do capital financeiro drena, atravs das praas off shore , incluindoa Suia e outros parasos fiscais, os recursos financeiros dos Estados, das economiasnacionais e dos sectores de tecnologia mais atrasada para o sector global da economiamundializada, onde encontra melhores condies de reproduo.

    Quem fica de fora dessa nova economia mundializada, tanto pases comoempresas e grupos empresariais, no s no tem acesso aos necessrios recursosfinanceiros como ir sofrer a intensa concorrncia dos produtos e servios dessa novaeconomia.

    Os objectivos estratgicos desse sector de economia mundializada so a criao deum mercado comum mundial, sem quaisquer barreiras, e o correspondenteesvaziamento das atribuies e dos poderes dos Estados Nacionais.

    Em consequncia da globalizao em curso, o mundo e mesmo cada pas,polarizam-se em zonas e sectores econmicos prsperos e zonas e sectores

    econmicos em depresso ou de subsistncia. Em termos sociais, esse fenmenotraduz-se numa crescente polarizao entre riqueza e pobreza, tanto entre zonas domundo como no interior de cada pas.

    neste contexto que se desenrolam, no plano internacional, as contradies entreos EUA e o Mundo, representado na ONU, entre este e o grupo das potncias maisdesenvolvidas, as contradies entre os diversos agrupamentos econmicos regionais,as contradies entre pases no seio destes agrupamentos e, finalmente, ascontradies entre classes e grupos sociais dentro do mesmo pas.

    ainda neste contexto que se colocam tanto as reservas sociais quanto aoesvaziamento das competncias dos Estados nacionais para novas entidades polticassupranacionais como, em cada pas, as opes governamentais pela defesa daseconomias e os sectores produtivos nacionais ou pela liberalizao einternacionalizao.

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    Portugal foi apanhado pela onda da globalizao econmica quando mal tinhainiciado o processo de modernizao econmica no quadro da sua entrada para aComunidade Europeia. Tendo, por incapacidade interna, perdido cerca de 20 anos edelapidado enormes recursos financeiros que poderiam ter permitido a criao de umabase econmica internacionalmente concorrencial, confronta-se hoje com umaprofunda crise econmica e financeira que, a no ser sustida com xito, poder

    resvalar para uma endmica crise poltica e, finalmente, de regime.A actual crise portuguesa no , contudo, um problema novo, decorrente da novasituao mundial. Sendo embora agravada por esta, ela no mais do que a repetiocclica de uma Histria muito antiga que, pela sua modernidade, mais comparvelcom a do perodo final do Sc. XIX.

    Constitui, antes, uma manifestao do baixo grau de desenvolvimento das forasprodutivas resultante da dominao histrica de classes e grupos sociais retrgrados,pr-capitalistas, que tm permanecido agarrados a formas de explorao e a atitudeseconmicas caractersticas do Antigo Regime monrquico-feudal, nunca se inserindoverdadeiramente nas dinmicas das sucessivas revolues tecnolgicas eorganizacionais capitalistas. No plano institucional, esse fenmeno manifesta-se natendncia dos republicanos da nossa Segunda Repblica, nascidos ou no na ditadurafascista, conservarem e reproduzirem, ainda hoje, algumas formas e tiques de gerir oEstado e os assuntos pblicos advindas da fase liberal-constitucional da monarquia.

    As Revolues Liberal de 1822 e Republicana de 1910 pouco adiantaram quanto aoprocesso de industrializao do pas. Assim, Portugal chegou a meados do sc. XXbasicamente com as indstrias lanadas no tempo do Marqus de Pombal, asinfraestruturas ferrovirias construdas no Sc. XIX e algumas industriastransformadoras de produtos agrcolas continentais ou coloniais.

    A ditadura fascista que vigorou de 1926 a 1974 manteve o pas fora dos processosglobais de desenvolvimento do capitalismo, favorecendo, especialmente a partir dadcada de 1960, uma industrializao baseada num muito reduzido grupo demonoplios financeiro-industriais e numa intensa represso laboral. No plano daagricultura prevaleceram, atravs dos latifndios do sul do pas e do minifndio donorte, as relaes pr-capitalistas de produo.

    Portugal ficou, por isso, de fora do processo geral de desenvolvimento docapitalismo, no tendo desenvolvido as relaes de Mercado em rede nem relaeslaborais modernas.

    A Revoluo do 25 de Abril de 1974 veio repor as condies gerais de democraciapoltica e de libertao das relaes de mercado para o desenvolvimento docapitalismo. Contudo, tanto pela estrutura monopolista do poder econmico como pelafragilidade das classes mdias burguesas, a Revoluo colocou na ordem do dia a

    passagem para um modelo de desenvolvimento de orientao socialista, baseado nanacionalizao dos grupos monopolistas financeiro-industriais e dos latifndios, nainterveno decisiva dos trabalhadores na gesto empresarial e no papel motor doEstado no desenvolvimento econmico.

    Nos dez anos subsequentes, at meados da dcada de 80, a preocupao centraldo poder poltico democrtico consistiu em criar as condies para a emergncia deuma nova classe empresarial privada que relanasse o desenvolvimento econmico eem promover a desestruturao das foras polticas e sociais colectivistas,designadamente da Intersindical Nacional.

    O primeiro desses objectivos traduziu-se na entrada de Portugal para a CEE comouma opo estratgica com vista consolidao da democracia poltica, abertura dopas ao investimento externo para modernizar as estruturas econmicas nacionais noquadro de uma economia de mercado capitalista e criao de condies legais, deinfraestruturao geral e de apoio directo aos sectores empresariais nacionais.

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    O segundo grande objectivo traduziu-se nas tentativas de partir a espinha Intersindical e na liquidao das formas de participao dos trabalhadores na gestoeconmica, na liquidao da Reforma Agrria com a restituio dos latifndios aosantigos proprietrios, na reprivatizao dos sectores financeiros e o desmantelamentodas indstrias das chamadas cinturas industriais, e no abandono do Alentejo comvista rendio dessa importante base social de apoio do PCP. Neste ltimo caso, s

    voltaram a olhar para ele muito mais tarde, quando j estava em runas.O segundo objectivo foi, de um modo geral, bem conseguido.O primeiro, porm, no o foi, de todo. Apesar dos grandes trabalhos pblicos de

    construo e modernizao das infra-estruturas nacionais, dos apoios directos aodesenvolvimento e modernizao empresarial e qualificao da fora de trabalho, osector empresarial privado portugus manteve-se, salvo poucas excepes,globalmente rstico, tacanho, vivendo de encomendas, de benesses e financiamentospblicos.

    Assim, a economia moderna portuguesa assenta hoje, fundamentalmente, emalguns poucos grupos empresariais nacionais, num conjunto de empresas multi outransnacionais estrangeiras e numa diversidade de empresas nacionais dependentesdas encomendas daquelas.

    Apanhado, logo no incio da dcada de 1990, pela onda da globalizao econmicae pelo processo de debilitao estrutural do Estado, Portugal no teve tempo nemsoube aproveitar as vantajosas condies para promover, nos ltimos vinte anos, aqualificao dos portugueses e criar uma economia nacional moderna, capaz decompetir no mercado internacional.

    A constituio da UE e o seu alargamento aos pases de leste vieram reduzir aindamais tanto a capacidade de deciso do Governo e do Estado Nacional como adisponibilidade de recursos financeiros para apoio ao desenvolvimento. A concorrnciainternacional aos produtos portugueses ir agudizar-se, assim como a tendncia paraa deslocalizao de empresas de Portugal para outros pases mais competitivos.

    A prosseguir a actual crise, poderemos perder o barco de mais esta nova fase dodesenvolvimento do capitalismo escala mundial, ver a nossa nacionalidade diludano oceano sociolgico da UE e a populao portuguesa fraccionada entre um pequenobloco internacional/cosmopolita e uma imensa maioria remetida para actividadeseconmicas de subsistncia.

    No plano poltico, a continuidade da crise reflectir-se-a no aprofundamento doprocesso de degradao das instituies, desde h muito em curso ao nvel daextenso da corrupo, da comunicao dos rgos polticos (nacionais e locais) e dospartidos com a populao, e da maior degradao e enfraquecimento do aparelho doEstado, incluindo algumas estruturas da justia e da segurana.

    A continuidade da crise tenderia a provocar uma radicalizao direita e esquerda , a agudizao das lutas sociais e a recomposio do actual espectropartidrio.

    A Segunda Repblica confronta-se hoje com uma profunda crise econmica efinanceira que, a no ser sustida com xito, poder resvalar para uma crise poltica ede regime. Se chegar a entrar no pntano, uma Terceira ir ter de surgir, mesmo queseja depois de todos sofrermos mais um perodo de conturbao.

    No fundo, o que se prope que, quanto antes, tenhamos a coragem colectivapara, por antecipao, romper com o crculo vicioso em que nos encontramos epromover a Revoluo Necessria , verdadeiramente Republicana, Democrtica e deorientao Socialista, conforme, alis, a esmagadora maioria do nosso Povo sempre aimaginou e, apesar das sucessivas alteraes, ainda se encontra prefigurada naConstituio da Repblica.

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    As experincias das Revolues de 1910 e do 25 de Abril constituem refernciasimportantes, pelas respectivas virtudes e limitaes, que nos podero ajudar adescobrir o caminho.

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    1. ANTECEDENTES E ESTRATGIADesde h muito que os sucessivos Governos Democrticos de Portugal tm vindo a

    implementar polticas que no se tm mostrado decisivas para a superao da criseactual.

    1.1 Antecedentes e CaracterizaoNo fundamental, a situao caracteriza-se por:

    a) Desmanteladas as estruturas do Poder Fascista na sequncia do 25 de Abril, oaparelho do Estado sofreu profundas alteraes quantitativas como resultado dosseguintes principais factores:

    - Descolonizao (absoro do funcionalismo pblico oriundo da administraocolonial; reduo dos efectivos militares);

    - Instituio do Poder Local (dotao dos Municpios com novos servios ecapacidade tcnica e dotao das Freguesias);

    - Alargamento das actividades do Estado nos domnios dos sectores sociais e deapoio ao desenvolvimento (educao, sade, aco social e habitao, justia eestruturas de apoio tcnico ao desenvolvimento econmico);

    - Alargamento da actividade internacional e do consequente aparelho diplomtico(estabelecimento de relaes diplomticas com um grande numero de pases eestruturas de apoio s comunidades emigrantes e de promoo econmicaexterna; integrao na CEE/UE);

    b) Entrada para a Comunidade Europeia com vista definitiva estabilizaodemocrtica e criao de uma oportunidade para o desenvolvimento num quadrode economia de mercado;

    c) Estabelecimento, a meados da dcada de 80, de mecanismos para a captao dosFundos disponibilizados pela UE;

    d) Desestatizao progressiva da economia, abertura e incentivos ao investimentoprivado; desmantelamento de alguns sectores econmicos consideradostecnologicamente obsoletos ou no competitivos no quadro da Comunidade;

    e) Tomada de conscincia sobre a profunda irracionalidade da estrutura e dofuncionamento do aparelho do Estado, sem contudo surgir qualquer ideia oumedida de fundo para a sua reforma;

    f) Surgimento, atrs do dinheiro fcil da UE de uma elite nacional degradada, comreflexos na atitude global e criativa do sector privado em montar mecanismos detransferncia e apropriao desses fundos com base no alastramento do

    favoritismo e da corrupo ao nvel do sector pblico;g) Cavaco Silva foi derrotado e abandonou o seu prprio partido face incapacidadepara inflectir as aplicaes financeiras para os sectores e projectos que poderiam,de facto, promover o desenvolvimento estratgico, a modernizao ecompetitividade da economia;

    h) Os Governos que lhe sucederam geriram o pas na expectativa que odesenvolvimento surgisse espontaneamente da dinmica e iniciativa do sectorprivado e de uma hipottica boa conjuntura internacional;

    i) Os ltimos governos do PSD s tiveram a vantagem de introduzir na sociedadeportuguesa algum dramatismo face necessidade de conteno das ilusesfacilitistas e quanto verdadeira situao das finanas pblicas. De resto, aindaficmos mais desmoralizados e afastados da Europa!

    j) O novo Governo do PS, apoiado numa confortvel maioria absoluta parlamentar,criou enormes expectativas. Porm, a Inovao e a luta contra as corporaes de

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    interesses s so realizveis com um forte apoio popular que, importa, no sejaesbanjado.

    1.2 Objectivos estratgicosAs cinco questes estratgicas que se colocam hoje so:1. Criao de um quadro de condies internacionais favorveis para o

    desenvolvimento do pas, fundadas na paz, na solidariedade e na cooperaointernacionais, no respeito pela diversidade cultural e pelas solues polticasdemocrticas dos povos e num maior controlo democrtico do capital financeiro edas off-shore escala mundial;

    2. Reformar o Estado conferindo-lhe um carcter democrtico e econmico-empreendedor, assegurando o equilbrio financeiro, recriando uma capacidade deinvestimento estratgico e promovendo a modernidade funcional e a qualidade deservios. No Menos Estado mas sim Melhor Estado;

    3. Promover um desenvolvimento econmico e social acelerado e sustentado do pas,superior mdia europeia, assegurando a mxima autonomia alimentar eenergtica, a coeso social e a valorizao do capital humano;

    4. Participar na plena instituio da UE assegurando o seu carcter democrtico e oseu papel progressista no desenvolvimento equilibrado da Europa e do mundo;

    5. Informar e mobilizar os portugueses para, num ambiente de grande ParticipaoSocial, superarmos das actuais dificuldades e promovermos o desenvolvimento dopas contando, em primeiro lugar, com as prprias foras.

    1.3 Amarga sntese do estado actual dos recursos estratgicosinternos:a) A Constituio da Repblica

    A Constituio da Repblica Portuguesa constitui a Lei Fundamental do pas. Nosendo prosseguida, coloca, imediatamente, no plano das correlaes de foras, eno do Direito, o processo de gesto nacional. As disposies constitucionais passama constituir frases vazias, uma mera apelao ou uma justificao.

    O respeito ou o cumprimento da Constituio , hoje, entendido, simplesmente,como o seu no desrespeito, a sua no violao. Pode-se fazer tudo, desde que nose pratiquem actos claramente anti-constitucionais. As prprias violaes, noconstituem crime, no envolvem penalizao, nem sequer sano poltica ou moral;somente se informa o transgressor que deve deixar de violar.

    Mais parece que a Constituio integra algumas disposies de programa mnimoobrigatrio e muitas outras facultativas , servindo somente como referncias morais

    ou utopias . esta, de resto, a postura pr-passiva dos Presidentes da Repblica e doTribunal Constitucional.

    No entanto, todo o discurso da Constituio pr-activo, designadamentequando comete obrigaes muito especficas ao Estado, tanto nos mbitos da suainterveno como nos objectivos, propsitos e formas de gesto.

    Da conferncia entre as disposies constitucionais e a realidade actual do pasressalta, imediatamente, o seu no cumprimento sistemtico e extensivo peloprprio Estado. Argumentar-se-, relativamente a algumas das suas obrigaes, queo Estado fraco , que no tem os recursos suficientes para... , etc. Com oprocesso em curso de pauperizao financeira, instrumental e de AutoridadeDemocrtica do Estado, ser de supor que este nunca estar em condies decumprir as suas obrigaes constitucionais.

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    Esta situao poderia e deveria ser minorada e evitada se os rgos que tm pormisso defender e fazer cumprir a Constituio tivessem uma atitude pr-activanessa funo e os adequados instrumentos de interveno.

    Em primeiro lugar, seria exigvel que os programas de Governo e os demaisinstrumentos de gesto previsional do Estado fizessem evidncia, relativamente acada Artigo da Constituio, do seu cumprimento, baseada em adequados estudos e

    dados estatsticos.Este, sim, deveria constituir o primeiro critrio de avaliao da aco governativae legislativa, o qual constituiria fundamento para o empossamento e a eventualdissoluo de rgos e para uma sustentada avaliao poltica pelos cidados emactos eleitorais: a governao por benchmarks constitucionais.

    Desde h 30 anos que o Estado tem como uma das suas Tarefas Fundamentais (alnea h do Art. 9 da Constituio) Promover a igualdade entre homens emulheres. Pelo grau de realizao dessa tarefa fundamental, que hoje todosreconhecemos ser irrisrio, poderemos inferir o estado de realizao de todas asoutras tarefas do Estado. Os episdios de boa vontade mas inconsequentes, queperiodicamente se repetem, normalmente em perodos eleitorais, darepresentatividade das mulheres nas estruturas polticas do pas, no reflectem umaactividade sistemtica de promoo da referida actividade. A realidade quotidiana dadiscriminao das mulheres , porm, hoje, em muitos aspectos, pior do que j foih 30 anos. A modernidade daquelas empresas que se recusam a empregarmulheres - porque podem engravidar, o alastramento do emprego clandestino - semcontratos nem recibos, e da legislao sobre o aborto so exemplos menores dainsidiosa, permanente e implacvel violncia que continuam a sofrer em todas asreas da vida familiar, econmica e social. As mulheres continuam, em geral, aconstituir uma classe de cidadania mitigada situada, mais ou menos, entre oscidados de pleno direito e os emigrantes clandestinos romenos. Este o estado demais de 50% do nosso capital humano.

    A Constituio da Repblica contm, em si, todas as condies e indica oscaminhos (designadamente, pelo aprofundamento da democracia participativa )para a Reforma do actual Sistema Poltico, reconhecidamente deficitrio e a entrarem crise de representatividade, e para as Reformas do Estado e do SistemaEconmico.

    Constatar-se-, mais adiante, que as vias para a superao da actual crisenacional passam, de facto, pela restituio Constituio da Repblica o seu papelfundamental no ordenamento e orientao estratgica do pas, pela reposio dalegalidade constitucional.

    A crise revela-se ser resultado, tambm, do elevado grau de incumprimento da

    Constituio.b) O EstadoTal como na fase final do sculo XIX, o Estado encontra-se altamente fragilizado,

    sem dinheiro, desorganizado e desmotivado, exercendo, essencialmente, a funode plataforma de distribuio de fundos externos e recursos prprios para oenriquecimento privado (o que at se poderia justificar como mtodo de

    acumulao primitiva a um sector privado nascente, o que no o caso dePortugal).

    Grande parte do sector empresarial do Estado foi sendo privatizado ao longo dosanos no tanto por uma motivao modernizadora mas sim para libertar o Estado

    dos respectivos proveitos (dividendos e impostos) e como meio de obteno derecursos para o seu funcionamento corrente, fazendo lembrar a venda, pelos liberaisnovecentistas, dos bens da igreja ento nacionalizados. Os restantes bens

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    patrimoniais vo sendo vendidos ou comprometidos, tanto mais ao desbaratoquanto maior for a crise financeira e menor a capacidade negocial.

    A gesto pblica , essencialmente burocrtico-administrativista. Muitos dosservios pblicos encontram-se em avanado estado de degradao das suascapacidades tcnicas e operativas, mantendo uma existncia vegetativa.

    Neste quadro, e paralelamente j referida privatizao das empresas pblicas,foram-se desenvolvendo, nos ltimos anos, a reboque da justificao ideolgica dasvirtudes empresariais do sector privado e das suas (no provadas) capacidades deinvestimento e de gesto, diversas teses relativas privatizao ou concesso aprivados de numerosos servios pblicos. So teses que muitas vezes correspondema um Estado que concebe o servio pblico sem ambio, como uma actividadeirremediavelmente ineficiente e que, ao mesmo tempo, satisfaz um sector privado(normalmente prximo do poder poltico) o qual, custa de tarifas mais caras e daqualidade do servio aos cidados, vai arranjando mais umas linhas de negcios ede acesso aos Fundos.

    As dbeis tentativas de reforma j promovidas (criao de Institutos dotados deautonomia, Regionalizao, etc.), ou foram absorvidas pelo Sistema ou,simplesmente, rejeitadas.

    O desprestgio do Estado junto dos Cidados e a sua desmotivao interna soum facto.

    A parte do Estado que funciona melhor a que se destina reciclagem dosFundos Europeus para o sector privado, deixando atrs de si alguma animaosocial.

    c) Os Partidos PolticosOs partidos polticos e o sistema poltico em geral encontram-se afastados dos

    cidados, pouco prestigiados, agarrados a conceitos envelhecidos, enrolados emtactismos de circunstncia e, por vezes, servindo de plataforma para benefcios eprestgio pessoal. H, globalmente, pouco sentido de servio pblico.

    Tendo-se apoderado, por uma interpretao restritiva do nmero 2 do Art. 10da Constituio, do monoplio da representao poltica, os principais partidosmantiveram, ao longo dos anos, uma grande preocupao comum em controlar oEstado. Num pas em que tudo gira volta do Estado, mesmo quando, como hoje,este fraco, poder-se- dizer que o controlo do Estado uma garantia de Poderreal. Pelo contrrio, sem esse controlo, o poder torna-se uma fico.

    Com a consolidao democrtica, a entrada para a CEE/UE e o incio do afluxo deFundos, o Estado tornou-se ainda mais importante na estratgia de poder dosprincipais partidos. Da que, praticamente, estes s tenham existncia activa nos

    perodos eleitorais e enquanto so Governo (nacional ou local). Os principaispartidos transformaram-se, de facto, em partidos de quadros, muitos deles profissionais da poltica, com a tendncia para o reforo da importncia dosaparelhos e das finanas partidrias.

    O funo poltico-pedaggica e de mobilizao da populao para os objectivos etarefas nacionais ficou subalternizada relativamente s questes pessoais e poltica-espectculo das campanhas eleitorais. Mesmo estas, cada vez mais,acorrendo a prestaes de servios externas (contratao de consultores demarketing, afixao de publicidade, etc.). O auto-enclausuramento dos principaispartidos reflecte-se de modo semelhante na Assembleia da Repblica e em todas asAssembleias do Poder Local. As nicas instituies com vitalidade so as que gerem

    recursos e tomam decises sobre vida diria dos cidados, as que tm funesexecutivas.

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    A ligao dos partidos polticos populao ficou, assim, cada vez maismediatizada pelos meios de comunicao social, especialmente a televiso, e pelosespecialistas de marketing . A poltica foi ficando transformada num produto que, naaltura das eleies, se vende com o propsito essencial da obteno do voto, noestabelecendo, em muitos casos, um compromisso de cumprimento das promessaseleitorais.

    Na sequncia desse sentimento generalizado, a classe poltica comeou areconhec-lo publicamente, tanto em declaraes para o exterior como em debatesinternos aos partidos. So bons sinais que carecem de ser prosseguidos commedidas de efectiva Reforma do Sistema Poltico que reforcem a representatividadedos partidos e legitimidade das instituies democrticas, clarifiquem os modelos definanciamento partidrio e confiram ao sistema uma rejuvenescida dimenso deutilidade pblica.

    No entanto, muito haver a fazer, dentro e fora dos partidos, para que se cumprao preceito constitucional de aprofundamento da democracia participativa e, poressa via, evitar a crescente reduo do nvel de literacia poltica dos cidados, nose sabendo onde poderemos chegar quando desaparecer a gerao formada pelo 25 de Abril .

    A melhor contribuio dos partidos polticos para a superao da actual crisenacional no se mede pelos seus patrimnios, recursos financeiros ou capacidade demarketing , mas, fundamentalmente, pelas suas ideias, propostas e exemplos, emsuma, pela sua capacidade pedaggica e motivadora de vontades e aces.

    A crise actual , mesmo, muito profunda, exigindo um urgente repensar dasprticas e da estrutura do sistema poltico.

    Se a actual crise tender a arrastar-se, no ser de excluir uma rearrumao doespectro partidrio tendente a uma maior polarizao da poltica portuguesa.

    d) O Regime e o Sistema PolticoSe bem que a Constituio da Repblica institua uma democracia participativa ,

    de facto a democracia portuguesa tem sido essencialmente, e cada vez menos,representativa .

    Da fragilidade dos partidos polticos, decorrente, quer do dficit democrtico dassuas vidas internas quer da falta de permeabilidade com as populaes, veio aresultar um extraordinrio ressurgimento das chamadas corporaes , informais e decarcter difuso.

    Estas, estruturam e representam, informalmente, de modo no oficial, osdiversos grupos sociais e econmicos com interesses privados especficos no saquedos recursos pblicos e na defesa intransigente e egosta dos respectivos interesses.

    Estas estruturas informais dotadas de grande e instantnea capacidade demobilizao, coordenao e influncia nos rgos do poder, no Estado e nacomunicao social, tm muito mais capacidade de modelar a poltica do pas do queas instituies democrticas ou os partidos polticos. A comprov-lo est a endmicaincapacidade do poder poltico em promover, na prtica, qualquer tipo de reforma defundo.

    As corporaes representam tanto interesses econmico-empresariais comointeresses profissionais de profisses liberais e de grupos de trabalhadores de elite,funcionalmente importantes para a estabilidade do sistema econmico ou social e,por isso, com capacidade reivindicativa.

    Quem tem ou pode usar os mecanismos corporativos, participa , de um modoegosta, na gesto da sociedade, normalmente com um sentido reaccionrio, emoposio s reformas que podero por em causa os seus interesses ou, ainda,

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    promovendo reformas e truques legislativos do seu exclusivo interesse; quem notem ou no pode , fica marginalizado.

    Em alguns pases, existe a figura dos lobbies, normalmente oficializados e comobjectivos claros, publicitados, constitudos por pessoas que publicamente osassumem. As corporaes em Portugal so muito mais clandestinas e subversivas :no se lhes conhecem os verdadeiros objectivos, nem os seus elementos activos ou

    colaboradores. Cruzam-se, interpenetram-se e partilham, por vezessimultaneamente, a colaborao das mesmas pessoas, especialmente se tiveremefectiva capacidade de influncia ou deciso. Alguns cargos pblicos poderiammesmo constituir-se, informalmente, como agncias privadas de prestao deservios s corporaes.

    Por vezes, os perdedores em alguma deciso bem tomada, de acordo com osInteresses Geral e Pblico, vm a exigir e a conseguir compensaes noutro mbitoou oportunidade, normalmente em processos com menor visibilidade pblica.

    Este fenmeno corporativo pr-capitalista corresponde a um srio entrave aodesenvolvimento da sociedade portuguesa e a uma profunda perverso do Mercadoe do Regime Poltico Constitucional, fazendo depender, ainda mais, a direco dasociedade, das correlaes de foras no terreno. Corresponde, segundo umaexpresso usada pelo heri do filme Platoon, a uma surda guerra civil .

    Neste estado de coisas, os Governos, qualquer que seja, ficam refns dosinteresses corporativos, nunca conseguindo gerar qualquer processoverdadeiramente nacional e coerente.

    A superao da actual situao de crise exige a superao desta profundaanomalia no Sistema Poltico.

    e) As estruturas representativas de Trabalhadores (Os Movimentos Sindical e dasComisses de Trabalhadores)

    O Movimento Sindical permanece dividido, agarrado aos quistos gerados noprocesso poltico de 1975, sem entender que, desde essa altura, se modificaramsubstancialmente as condies de organizao e de melhor defesa dos interessesdos Trabalhadores e do pas em geral.

    O movimento sindical tradicional do sculo XX (fordista), que respondeuadequadamente s condies da economia industrialista, entrou em crise perante asalteraes verificadas na composio das classes trabalhadoras e nas basestecnolgicas da economia moderna cada vez mais fundada nas tecnologias deinformao e comunicao e nos servios, operando num ambiente de competiointernacional escala de todo o globo.

    As Comisses de Trabalhadores, instrumentos essenciais para o desenvolvimento

    da participao nas empresas e para o lanamento de um processo nacional demodernizao e inovao empresarial, deixaram, praticamente, de existir. Para istocontribuiu, no s uma grande falta de perspectivas quanto s suas tarefas,socialmente teis e necessrias, como a contra-ofensiva contra elas (e os seusmembros) conduzida pelo empresariado, com o apoio do Estado, na dcada de1980.

    Remetemos para os Art. os 54, 55 e 56 da Constituio da Repblica para umaavaliao das potencialidades que as estruturas dos trabalhadores encerramenquanto recurso mobilizvel para, responsavelmente, contriburem para asuperao da crise nacional actual, no plano da conteno de custos do Estado, dodesenvolvimento, modernizao e inovao econmica e empresarial e, tambm, na

    qualificao e motivao do capital humano nacional.f) O Sector Econmico Privado:

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    A classe empresarial portuguesa fraca, salvo no muitas excepes, emdinamismo e prtica empresarial, em responsabilidade social e em atitude patritica,no se comprometendo globalmente com os destinos do Pas nem se esforandopara progredir, sem a muleta e a proteco do Estado, no sentido dacompetitividade. Em vez de trabalhar directamente para a comunidade e para omercado aberto, sobrevive das encomendas pblicas. No acreditando globalmente

    no Mercado, procura, antes, gerir as relaes pessoais e institucionais para obtervantagens margem do adequado funcionamento daquele. O sector econmicoprivado portugus mantm, globalmente, a atitude que sempre o caracterizou,desde os anos da Regenerao novecentista at ao regime fascista, no possuindoainda as caractersticas de fora motora da inovao, modernizao ecompetitividade do Pas.

    O sistema econmico privado (as empresas) sistematicamente sangrado derecursos financeiros para os mealheiros pessoais ou familiares de onde, regra geral,

    j no regressa por via do reinvestimento.Os recursos canalizados para o sector privado da economia ao longo dos ltimos

    anos poderiam ter gerado um movimento modernizador nas empresas com reflexosna sua adaptabilidade s novas condies do mercado. Porm, a atitude dos nossosempresrios foi, globalmente, a de aproveitarem a oportunidade para reforar osrespectivos patrimnios (em activos imveis ou mveis), de preferncia residentesno estrangeiro, em off-shore. O empresariado portugus ainda no se despiu datendncia para macaquear a velha aristocracia, preferindo viver de rendas, em vezde assumir a tradio progressista burguesa de arriscar em negcios (produo-venda-reinvestimento). Da que as privatizaes se tenham revestido muito maisdo carcter de operaes patrimoniais (activos fsicos e posies de mercado, svezes para revenda) do que de operaes de efectiva modernizao empresarial ede reforo da capacidade tributria.

    Os sectores financeiros, tendo abandonado a tradio estado-novense de criarcomplexos financeiro-industriais (os velhos monoplios nacionalizados aps o 25 deAbril), adaptou-se s novas condies da economia mundializada e passou adedicar-se exclusivamente ao jogo do capital financeiro internacional associado soff-shore . Assim, este sector deixou assim de constituir um motor dodesenvolvimento empresarial e da modernizao econmica, transformando-se,fundamentalmente, num mecanismo de reconcentrao dos fundos reciclados e dedrenagem para o exterior dos recursos financeiros do pas. A sua modernidadeinternacional compensada com benesses fiscais e outras. Algum, com acesso ainformao privilegiada sobre a actividade do sector financeiro, poderia responder pergunta do ex-Presidente da Repblica, Dr. Jorge Sampaio: ento onde queesto os Fundos? (que, ao longo dos anos vieram da EU).

    O parque empresarial encontra-se mal estruturado, prevalecendo as pequenas emuito pequenas empresas, reproduzindo nos sectores industriais e de servios, ominifndio virado para a economia de subsistncia. O sector primrio mantm-se,globalmente, ao nvel da simples recoleco (floresta, cortia,...) e da subsistncia,carecendo de uma profunda reforma capitalista , tanto no Norte como no Sul.A economia privada continua, no incio do Sc. XXI, a padecer, globalmente, dosmesmos males que no final do Sc. XIX !

    g) Conhecimento e MotivaoO Capital-Humano do pas dbil, qualitativamente. No temos asas para voar .

    Temos vivido sem Sonho, sem atrevimento e sem Tcnica.Depois de andarmos a fazer empresas-universidades, a trabalhar

    fundamentalmente para as estatsticas europeias, precisamos agora de pensar noassunto muito a srio, profissionalmente, no sentido de ligar o ensino superior e a

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    investigao s necessidades da modernizao, a projectos direccionados para amodernizao empresarial, para a criao de novos produtos interna e externamentenecessrios e competitivos.

    Depois de andarmos em manobras experimentais sucessivas no Bsico eSecundrio, haver que assentar e colocar esses nveis de ensino na direco que precisa: a formao de Cidados Responsveis e de esprito cooperativo (pois s

    assim apreendero as redes ) e a formao tcnico-profissional orientada para oTrabalho.Depois de passarmos por um relacionamento simptico com as Escolas, quase as

    deixando em auto-gesto, poltica e comunitariamente desenquadradas, haver queperguntar pelos Resultados Obtidos, ao nvel da apreenso da cidadania e dapreparao tcnica dos educandos.

    O Sistema Educativo encontra-se globalmente laxista, reflectindo tanto asdificuldades de enquadramento de um sistema to grande , como algumadesorientao e o desprestgio das sucessivas direces polticas.

    A debilidade da componente participativa na prtica da nossa Democraciaconstitui um factor de forte limitao ao desenvolvimento do capital humano dopas.

    A Motivao dos cidados no elevada. Nem vai crescer por decreto. Ircrescer, e muito, se confiar na Liderana, se estabelecer identificaes com ela.Bastar um click para os Cidados, trabalhadores, quadros e mesmo muitosempresrios, abraarem, com generosidade, uma Causa. O click tem de sersuscitado pelos exemplos da direco poltica do Pas.

    h) Capitais de InvestimentoSem mais quintais na ndia, em frica ou nas Amricas, sem as chamadas

    transferncias dos negreiros do sculo XIX ou dos emigrantes do sculo XX,dependemos essencialmente dos Fundos Europeus os quais, no tendo sidoeficientemente utilizados enquanto fartos, j se encontram em regresso. Sem aperspectiva de novos bales de oxignio, vamos ter de trabalhar, muito e melhorque os outros, se queremos aproximarmo-nos dos restantes pases europeus.

    Temos de gerar acumulao , em primeiro lugar no Estado, que no seja custade impostos exagerados, de baixas remuneraes ou da qualidade dos serviosprestados sociedade.

    Temos de gerar acumulao nas empresas, que no seja para criar ou aumentarfortunas pessoais nem custa da sobre-explorao dos trabalhadores ou do nocumprimento das obrigaes sociais e fiscais.

    Temos de ser capazes de mobilizar capitais prprios dos empresriosportugueses e, ainda mais, capitais estrangeiros, proporcionando confiana econtratualizando responsavelmente, sem que tenhamos, para isso, de adoptarposturas terceiro-mundistas.

    Temos de saber escolher e realizar os investimentos adequados, capazes de sereproduzirem, e no investimentos de prestgio ou insuficientementefundamentados.

    Fundamentalmente, temos que aproveitar os Fundos que nos restam, de modoexemplar, sem que se perca um tosto .

    i) Os Cidados e as organizaes sociais/comunitriasOs cidados e as suas organizaes sociais procuram, hoje, desenrascar-se

    danando conforme a msica. Sem uma liderana poltica estvel e reconhecida ecom insuficientes exemplos de cima , de dedicao causa pblica e nacional,

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    entregam, se necessrio, os seus prprios valores fundamentais para assegurar asobrevivncia ou o sucesso circunstancial.

    Este estado de coisas tem processos de revelao e razes profundas, alguns dosquais, de natureza subjectiva, se encontram brilhantemente descritos no livro deJos Gil Portugal, Hoje O Medo de Existir.

    Porm, a razo fundamental para a sua persistncia reside na desestruturao,esvaziamento e aniquilamento graduais dos mecanismos de Participao Social nagesto dos assuntos pblicos. Deixou de haver, efectivamente, espao pblico ,reduzindo-se este e os mecanismos existentes a meras formalidades (ocumprimento mnimo da Constituio), muitas vezes entre pares, em circuitofechado.

    De um modo generalizado, a populao entende, hoje, as solicitaes departicipao como o pedido de algum (pessoa ou instituio) que, para manter oualargar os seus interesses egostas, precisa desse mecanismo de legitimao. Aspessoas no estaro, naturalmente, dispostas a perder o seu tempo (e o dinheirodas deslocaes, dos telefonemas, dos selos de correio, etc.) a participar emqualquer processo de que, j sabe, ir resultar no a defesa dos seus interesses masos interesses privados de quem as convoca. Somos toscos mas no burros; poralguma razo somos pas independente h 900 anos.

    Este processo de crescente desconfiana e alheamento dos assuntos pblicos ecomunitrios, de desestruturao participativa, tender no futuro, se as condiesgerais de vida se degradarem alm de certo limite, a fazer germinar explosesanrquicas e contestatrias fora do sistema.

    Os portugueses j demonstraram, durante o anterior regime , ter uma grandecapacidade de encaixe e uma enorme crena nos dirigentes polticos. Porm, se acaldeira no tiver vlvulas de segurana, poder rebentar.

    A Constituio, porm, no concebe a Participao como um mecanismo de

    segurana. Concebe-o como um mecanismo de Desenvolvimento Social,Econmico e Cvico. Neste sentido, os Cidados e as OrganizaesSociais/Comunitrias constituem um poderoso e valioso recurso mobilizvel para asuperao da crise actual.

    j) Gesto do TempoO Tempo um recurso escasso. A nossa aproximao dos pases europeus

    desenvolvidos passa por uma coisa muito simples: densificar o nosso tempo commais realizaes que os outros.

    A gesto ptima do tempo vital tanto para a economia como para aadministrao dos assuntos pblicos e, em geral, para a eficincia social. No se

    pode perder tempo; tempo dinheiro j diziam os nossos avs.No tomar decises oportunas, perder tempo; Deixar as instituies semdireco, perder tempo; Tomar decises erradas, no fundamentadas ouvoluntaristas e ter de as corrigir depois, perder tempo; Executar deficientemente, perder tempo; Ter a informao de apoio deciso desorganizada, perdertempo; Andar procura de informao inexistente perder tempo; Guardar ainformao, fazer perder tempo; os engarrafamentos de trnsito, so uma enormeperda de tempo; tratar de qualquer assunto na administrao pblica , ainda, umaperda de tempos; buscar informaes necessrias em sites de Internet inteis, perda de tempo; Dialogar, negociar, explicar qualquer coisa a quem no querdialogar, negociar ou entender, perder tempo (a gesto da boa-f); Estar meses

    sem Governo ou com Governos deficientes perder muito tempo...Ganhar tempo , alm do mais, estudar experincias de programas dedesenvolvimento e solues j implementadas em outros pases, pesquisar nas

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    bibliotecas, na Internet e atravs de contactos internacionais tudo o que sirva pararetirar lies e recolher motivos de inspirao para o nosso esforo de inovao emodernizao. No estamos a descobrir a plvora nem teremos de nos sentiroriginais em tudo. Aproveitemos, andando depressa, os caminhos que outros, maislentamente, j desbravaram com xito. Sejamos inteligentes a cabular.

    O nosso desafio s este: realizar 2, 3 ou 4 vezes mais eventos (decises,

    obras, aces) que, no mesmo tempo, fazem os alemes, os franceses, os suecos eoutros.No temos tempo a perder. Estamos sem margem. Somos como uma equipa a

    perder no prolongamento do jogo.1.4 Quadro Geral de Referncia para o Futuro - Estratgia:

    De todos os recursos enunciados aquele que poder servir de motor , delocomotiva, , sem dvida, neste momento, o Estado, se este se dispuser a cumprir efazer cumprir, de modo pr-activo, a Constituio da Repblica. Tambm porque aquele que poderemos transformar directamente, pela nossa capacidade de deciso,e, atravs dele, induzir dinmicas positivas em todos os outros.

    Os partidos democrticos devero, nas suas relaes com os cidados e com oEstado, servir de exemplo de uma nova postura poltica ao servio dos interessesGeral e Pblico, e constiturem-se como impulsionadores da reforma do sistemapoltico e agentes de esclarecimento e mobilizao dos cidados e das instituies.

    O pas precisa de uma esquerda poltica prestigiada pelo exemplo das atitudes,pelo valor das suas ideias de modernidade, republicana e ousadamente reformistacapaz de mobilizar todos os sectores sociais e polticos necessrios para areconstruo democrtica e progressiva de Portugal, em primeiro lugar, ostrabalhadores e os quadros tcnicos e as suas organizaes representativas, bemcomo os sectores do empresariado moderno, efectivamente empreendedor e dotadode tica social.

    Importa, fundamentalmente, gerar espaos pblicos de exerccio da Liberdade e deParticipao, libertar a sociedade das tutelas, controlos e ameaas que persistem em,colectivamente, nos amordaar e inibir. Suscitar a irreverncia criadora e, tantoquanto possvel, Responsvel, abolindo o politicamente correcto , o conveniente , oeterno equilbrio do imobilismo. At a Fsica nos diz que s provocando o desequilbrioconseguimos caminhar...

    Da aco conjugada dos dois principais factores, Estado e foras democrticas esociais progressistas, depender o adequado esclarecimento dos cidados e dasinstituies quanto aos problemas a enfrentar e a sua mobilizao para a suasuperao.

    O Pas precisa que as Empresas e os Trabalhadores estabeleam uma base deConfiana para a cooperao entre todos os agentes envolvidos virada para o sucessoeconmico e social sustentado num quadro de grande competitividade internacional.Propomos, por isso, uma poltica econmica centrada num Conceito Moderno deEmpresa como centro de cooperao entre os diversos agentes intervenientes enecessrios: o Capital, o Trabalho, o Conhecimento, a Tecnologia e a tica .

    Este novo conceito de Empresa suscitar, por certo, a apreenso de sectores do patronato e sindicais, que vivem agarrados a velhas concepes corporativas dotempo da Revoluo Industrial. Porm, ela corresponde ao praticado nas empresas desucesso nos pases mais desenvolvidos, nos dois lados do Atlntico, no constituindoa qualquer problema ideolgico, antes uma necessidade da moderna economia queestimula e aproveita a participao dos trabalhadores e quadros tcnicos na gesto daproduo.

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    O Pas precisa de um Estado Forte , rico, eficiente, modernizador e mobilizadordas vontades e recursos nacionais para a defesa e realizao do Interesse Pblico eNacional.

    Esta ideia de um Estado Forte e interveniente s poder ser entendida comomotivo de disputa ideolgica a quem, por exemplo, no conhea os esforos do ex-Vice Presidente dos EUA, Al Gore, e outra literatura americana do incio dos passados

    anos 90 ( Reinventando o Governo , etc.) no sentido da reforma estratgica doEstado norte-americano com vista a assegurar a competitividade do pas no sc. XXI.Nesse quadro, mesmo sugerido que instituies e empresas pblicas,

    eficientizadas, deveriam competir no mercado com vista permanentemodernizao e competitividade das empresas americanas.

    Sem os cidados esclarecidos e mobilizados no haver sada para a crise. Todosos Governos ficaro vulnerveis se permanecerem tentados a trabalhar para asiluses, abandonando o caminho necessrio. Sucessivos fracassos poderiam levar oscidados a seguir um Salvador com qualquer roupagem.

    Num quadro de crise profunda, justifica-se, a par da tomada das necessriasmedidas de carcter econmico, jurdico-legal e administrativas, a adopo de umdiscurso mobilizador dos sentimentos patriticos dos portugueses e da sua crena emsi prprios. Este elemento subjectivo, a par da tica e do exemplo, constitui, apesardas suas eventuais ambiguidades no quadro da estratgia geral de integraoeuropeia, um factor de reforo da coeso nacional que no dever ser liminarmenteabandonado.

    Depois da grande empresa das Descobertas do passado, porque no um frum Portugal Redescoberto concebido no como um simples momento e lugar dereflexo e participao social e poltica mas como um verdadeiro e amplo ProjectoNacional destinado a ultrapassar de vez o atavismo sebastinianista que nos temcaracterizado nos ltimos sculos !.Sugere-se, pois, uma Estratgia Nacional apoiada nos seguintes factores:- Implementao pr-activa da Constituio da Repblica;- Construo de um Estado Forte Democrtico-Empreendedor;- Economia assente num Novo Conceito de Empresa;- Plena Integrao da Unio Europeia;- Ambiente Internacional de Paz, Cooperao e Solidariedade.

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    2. AMBIENTE INTERNACIONAL DE PAZ, COOPERAO E SOLIDARIEDADE

    A poltica externa portuguesa dever prosseguir, nos anos mais prximos, osseguintes objectivos principais:a) Ganhar tempo, junto dos parceiros europeus, para a nossa recuperao sem que

    nos criem situaes mais dramticas que nos desequilibrem internamente (Pactode Estabilidade e Crescimento); Contratualizar, pelo menos, a continuidade dadisponibilizao de Fundos Estruturais at 2020 com base em propostas definanciamento especficas;

    b) Pugnar, na arena internacional, com a Europa e dentro da Europa, para aeliminao, por via pacifica, de situaes de tenso internacional, de modo a obviaros dramas humanos, os danos econmicos e as despesas que qualquer guerraimplica.- Um clima internacional de Paz essencial para a libertao de recursos da defesa e

    segurana para o desenvolvimento. As capacidades de defesa da Europa nodevero resultar do seu empenhamento em novas armas mas sim da sua coesosocial e de uma mais rpida integrao dos diversos sistemas de defesa nacionaisnuma estrutura cooperativa plurinacional.

    - Pugnar por uma mais rpida evoluo para a Democracia de pases com regimesde ditadura excluindo, contudo, qualquer forma de interveno militar; promoverpolticas de mais rpido desenvolvimento econmico e social no conjunto dospases islmicos, designadamente na Arbia Saudita, Paquisto, Egipto, Marrocos eArglia, de modo a permitir despoletar as bases do terrorismo com origem emmovimentos fundamentalistas.

    - Pugnar pela resoluo pacfica e correcta da questo palestiniana de modo a que,na base de solues impostas pela actual correlao de foras com Israel, novenham a surgir, no futuro, mais graves problemas;

    - Pugnar por um acesso equilibrado (e democrtico) de todos os pases ao recurso petrleo e pela utilizao extensiva de energias alternativas com vista a diminuirfortemente o seu consumo.

    - Consolidao do sistema das Naes Unidas como palco de regulao democrticade conflitos e de resoluo cooperativa dos problemas globais da Humanidade.

    c) Fortalecer os laos com os grupos de pases susceptveis de alargar o actualmercado da economia portuguesa, em primeiro lugar os pases lusfonos.

    d) Cooperar mais estreitamente com a Espanha nas questes prprias da Pennsula,na construo europeia, no desenvolvimento das relaes com a Amrica Latina eo Norte de frica e na criao de uma capacidade ibrica em domnios daeconomia do futuro (aero-espacial, robtica, nanotecnologias, biologia molecular,energias alternativas, cincias do mar, telecomunicaes, sistemas de informao,etc.).

    e) Captao de investimentos estrangeiros estruturantes para Portugal,designadamente provindos da Alemanha e dos pases nrdicos.

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    3. CONSTRUO DE UM ESTADO FORTE

    3.1 Anos de construo de um Estado Pobre e Fraco, ou a teoriado Menos Estado

    A questo da Reforma do Estado anda na ordem do dia desde os tempos deCavaco Silva. Aps a aprovao do Cdigo do Procedimento Administrativo (CPA) edas operaes (quase s de cosmtica ao nvel dos atendimentos) promovidas pelachamada modernizao administrativa, desenvolvidas na base do reconhecendo dosdireitos dos cidados contra um Estado com cultura totalitria e discricionria, muitopouco foi feito para alterar radicalmente a situao. Seja por receio do peso dascorporaes instaladas, seja mesmo porque no se saber por que ponta se podercomear: o Estado tipo bola de bilhar.

    Algumas tentativas de empresarializao e de criao de Institutos autnomos,quer ao nvel local quer central, vieram, no fundamental, a ser recuperadas pelo

    sistema, da resultando, na maior parte dos casos, novos cargos dirigentes (parasatisfazer as necessidades do rotativismo poltico) e a reproduo do despesismo,ampliada pela diminuio dos mecanismos de controlo. A autonomia aproveitada,muitas vezes, para fugir aos procedimentos pblicos de adjudicao/contratao eno para a introduo de novos critrios de gesto, do tipo empresarial. Muitosresponsveis no entenderam ainda que gerir os dinheiros pblicos exige mais rigor eresponsabilidades que a gesto dos recursos prprios. No foi tambm aindaentendido que a gesto pblica, porque condicionada a necessrios mecanismos decontrolo e de tomada de deciso e, ainda, por lidar com acrescidos factores deincerteza quanto s circunstncias externas e avaliao dos cidados, exige os maiselevados nveis de profissionalismo e tecnicidade por parte dos dirigentes pblicos.

    Na sequncia de algumas iniciativas positivas de reorganizao regional do Estadoainda nos anos 80, a primeira tentativa do PS para a institucionalizao da

    Regionalizao foi, sem dvida, apesar de concebida com algumas fragilidades(essencialmente pelo perigo de canibalizao do Estado podendo produzir novas

    Madeiras), um momento de desestabilizao do sistema vigente.A poltica do menos Estado a partir do reconhecimento, fomentado, muitas vezes

    de dentro, da incapacidade do Estado para gerir as suas actividades levou crescente aquisio externa de servios a entidades privadas, muitas vezes criadaspara cada situao, de mais do que duvidosa idoneidade e competncia. A dada alturachegou mesmo a considerar-se a possibilidade de entregar a gabinetes externos asfunes relativas aos licenciamentos pblicos. Cresceu o mercado privado de

    consultorias e fiscalizaes, alimentando, a troco da qualidade e da

    responsabilidade do Estado, uma clientela de quadros tcnicos. Os gabinetes estoapinhados de estudos de diagnstico e propostas. Certamente que contero muitasideias meritrias. Porm, o mais difcil passar prtica. Veja-se a Resoluo53/2004 do Governo relativa reforma da Administrao Pblica, mais um estudogeneralista/acadmico a ser implementado por estruturas fracas; uma declarao depiedosas intenes!

    A degradao das funes dirigentes pblicas designadamente ao nvel dacompetncia e da assuno de responsabilidades leva ao recurso crescente a estudose pareceres externos supostamente competentes e imparciais, tanto para servir deencobrimento incompetncia tcnica e falta de iniciativa como, por vezes, para

    justificar o injustificvel.

    Desde a gesto dos projectos financiados por recursos pblicos s prestaes deservios mais diversas, instalou-se uma vasta teia de pipelines de drenagem dosrecursos pblicos para o sector privado sem que da tenha resultado qualquer

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    melhoria da qualidade dos investimentos e dos servios prestados. A privatizao dosector empresarial pblico veio a traduzir-se na sonegao ao Estado de vultuososrecursos de que poderia ser beneficirio, tanto por via dos dividendos como da colectade IRC. Em vez de menos despesa obteve-se menos receita. Muitos dos quadrostcnicos, por vezes at ento bons funcionrios pblicos, transformaram-se em

    clientelas flutuantes a tentar sacar trabalhos ao Estado vestindo a pele que mais

    lhes convenha segundo a conjuntura poltica.A situao em Portugal, no momento presente, mostra que no foi gerada, nestesanos de forte asperso de recursos, uma oferta privada credvel para a maioria dosservios pblicos. As iniciativas verificadas tiveram, essencialmente, o objectivo deaceder aos fundos comunitrios disponveis sem qualquer preocupao decontinuidade.

    A ideia do menos Estado que tem sido defendida corresponde, na prtica, a umabrir dos cofres pblicos (incluindo os fartos fundos comunitrios) a interessesprivados e particulares de conjuntura sem que da tenha resultado qualquer sistema

    civil credvel para assegurar com xito os servios pblicos privatizveis. Logo quedeixe de haver acesso aos Fundos e desaparea a garantia do lucro fcil, assim denovo fugiro as empresas privadas correspondentes, criando-se um novo vazio queser restitudo ao Estado para o necessrio preenchimento.3.2 Para a construo de um Estado Forte3.2.1. Domnios de Interveno

    Defendemos, neste mbito, o conceito geral de que tudo o que puder ser feito pelasociedade civil (mercado empresarial, comunidades organizadas, etc.) com garantiade preos/custos e de qualidade, deve ser feito por essa via. No limite, no vemosnenhum sector, com excepo dos de soberania, que no possa estar aberto siniciativas civis, empresariais e comunitrias, num quadro de defesa dos InteressesGeral e Pblico.

    O Estado Democrtico moderno tem como obrigao ocupar os espaos vazios eintervir activamente em qualquer espao que se reconhea no estar a corresponder,pela dinmica prpria da sociedade civil, s necessidades do desenvolvimentoestratgico e sustentvel da sociedade. A isto chama-se criar as Condies Gerais daproduo.

    Defendemos, pois, que, salvo em sectores e actividades relacionadas com asoberania e com interesses verdadeiramente estratgicos, sobre os quais deverhaver reservas do Estado, no dever haver Tratados de Tordesilhas, dedemarcao de reas de actividade pblica e privada.

    Um Estado, um poder poltico, que pretenda representar o pas no seu todo,assegurando a Liberdade, as Oportunidades, a Equidade e a Justia, no poderdeixar submeter-se a presses e chantagens sectoriais e corporativas e abdicar, porqualquer definio oportunista dos fundamentalistas de mercado, de estarpresente e, se necessrio, intervir, como regulador ou actor concorrencial directo, emqualquer sector da vida nacional, incluindo os sacrossantos sectores das actividadeseconmicas e financeiras e da comunicao social.

    Para melhor se compreender a importncia estratgica e em que dever consistir a Reforma do Estado, deixamos algumas observaes:3.2.2. Natureza e Estrutura do Estado

    A primeira observao a fazer refere-se actual estrutura e modo de gesto doEstado. Ela corresponde, no fundamental, herana do regime de Salazar e deriva doprocesso histrico em que foi criada. Salazar/Caetano construram um Estado a partirdo quase zero em termos de finanas, estrutura e capacidades. Tecnicamente, e

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    considerando os objectivos polticos ento fixados pelo Poder, foi um feito notvel(mais de 40 anos no poder e a capacidade tcnica e financeira para aguentar 15anos de guerras coloniais em vrias frentes, mostram grande eficincia naprossecuo dos objectivos). Sem uma forte centralizao do Poder e uma grandedisciplina financeira (recorde-se o papel central do sistema das Finanas) no teriasido possvel criar esse Estado. Fizeram-no, porm, fundados em concepes anti-

    democrticas. Assim, o Fascismo construiu um Estado Totalitrio, e Administrativo-Policial.Divorciados da Sociedade e conservando at ao fim a lgica da reproduo do

    Poder, inibiram e reprimiram as iniciativas dos cidados em geral, apoiando-se numpequeno nmero de fiis correligionrios. Travaram o normal desenvolvimento dasforas produtivas. E caram !

    Apesar da natureza democrtica das novas instituies, a estrutura e ofuncionamento do aparelho do Estado herdados pela 2 Repblica mantiveram-se,contudo, globalmente idnticos at ao presente.

    Na sequncia e com a vivncia do processo revolucionrio do 25 de Abril veio acriar-se uma sociedade muito livre e com exigncias participativas. A novaDemocracia mostrou-se capaz de resolver adequadamente o conjunto de desafiosimediatos que se impuseram, designadamente quanto s consequncias dadescolonizao, da abertura do pas ao exterior, da instituio e autonomia do PoderLocal, das nacionalizaes e da promoo das condies bsicas de vida da populao,designadamente nos domnios sociais. Por factores que no importa agoradesenvolver mas que assenta na adopo de uma atitude conservadora dos partidoscom vista conjuntural luta e utilizao do poder e ao acesso aos recursos da Europa,a Segunda Repblica esqueceu-se de reconfigurar o Estado s novas necessidades eobjectivos estratgicos da Sociedade. Assim, o velho Estado adaptou-se nova econjuntural funo de plataforma distribuidora dos recursos mantendo, nofundamental toda a anterior lgica, agora com mecanismos de responsabilizaoquase inexistentes por motivo do rotativismo partidrio a que foi sujeito duranteanos.

    Olhando para a estrutura do Estado central logo que constata a suaorganizao exclusivamente sectorial escala de todo o pas. Os serviosregionalizados de cada Ministrio sectorial no tm articulao entre si, mantendo-seestritamente dependentes do centro.

    Esta situao corresponde a que, na prtica, qualquer coordenao, inter-sectorialou territorial s poder ser realizada com maior probabilidade de xito pelo Primeiro-Ministro (antigamente, pelo Presidente do Conselho de Ministros, o qual, comoverdadeiro chefe, enviava o Amrico Toms, os Governadores Civis ou os nomeados

    Presidentes das Cmaras distribuir, localmente, algumas benesses).A instituio do Poder Local Democrtico constituiu, sem dvida, ao momento, umforte avano no sentido da resoluo dos problemas mais imediatos sentidos pelaspopulaes e da interveno democrtica dos cidados.

    Porm, o modelo centralista do Poder manteve-se no essencial, nodesempenhando o actual poder local qualquer funo estratgica.

    Os subsdios automticos ao Poder Local, o acesso a alguns fundos europeus (muitas vezes distribudos segundo critrios partidrios) e pelo rodopio fortementeentrpico dos trezentos e tal Presidentes das Cmaras junto dos membros do Governoe organismos da Administrao Central mendigando alguma ateno e recursos noresolveram o essencial do problema. As Presidncias Abertas e os Conselhos deMinistros descentralizados foram iniciativas inconsequentes para assegurar algummomento e lugar de sincronizao territorial.

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    O sistema chumbou o projecto revolucionrio/constitucional de Regionalizao,o qual, indicava uma direco e intenes correctas e urgentes, mas que continhademasiadas interrogaes quanto ao modo de implementao e aos resultados a curtoe mdio prazos.

    A necessidade de coordenao e integrao coerente das unidadesterritoriais/comunitrias tanta que se torna palco das maiores manobras

    demaggicas como foi a da descentralizao de alguns Secretrios de Estado peloGoverno Santana Lopes.Antecipando, diramos que nada obsta a que, sem alterao da estrutura poltica

    do pas, a Regionalizao possa ser prosseguida imediatamente, de forma gradual,acautelando os eventuais efeitos perversos (canibalizao do Estado e dos Fundos,demagogia regional, etc.) que poderiam surgir a partir de rgos regionais eleitos noactual quadro de cultura de Estado.

    A criao, no quadro do Governo, de alguns Ministrios Regionalizados, comresponsabilidades de gesto integrada das actuais estruturas desconcentradas doEstado em algumas Regies do pas, poderia permitir no s ensaiar asmetodologias mais adequadas global institucionalizao democrtica das futurasRegies como, ainda, iniciar uma Reforma global do Estado de acordo com osprincpios democrticos e econmicos sugeridos para a sua gesto.

    O desenvolvimento, quanto antes, desse processo de regionalizao do Governo,criaria ainda melhores condies para a prxima e necessria reforma do Poder Local(a desencadear antes das eleies autrquicas de 2009), num quadro mais bemconhecido das novas competncias a cometer-lhe, das condies (institucionais,tcnicas e financeiras) para o seu correcto exerccio e dos melhores critrios paraconcretizao futura da reforma da Diviso Administrativa do Pas.

    O Estado hoje constitudo, funcionalmente, dentro de cada Ministrio, pororganismos/entidades com poderes para distribuir recursos (avaliao, financiamentoe gesto de projectos) e organismos vegetativos .

    Aos primeiros, normalmente preenchidos por quadros de confiana, cabe afuno de gesto poltica da redistribuio dos fundos comunitrios e nacionaisdisponveis para o investimento e a gesto das parcerias pblico-privado.

    Aos segundos, para alm do prosseguimento (cada vez com mais dificuldade) dasnormais, essenciais e pouco interessantes funes administrativas e tcnicas doEstado, servem igualmente de palco, pela gesto dos lugares de direco/chefia, daformao de clientelas de nvel inferior.

    No sendo interessantes sob os pontos de vista poltico e econmico, osorganismos vegetativos no tm merecido do poder poltico qualquer ateno realquanto ao modo de funcionamento, ao desempenho e prpria razo de existirem.No entanto, cabe-lhes uma fatia muito significativa do Oramento corrente dedespesas, tornando-os os culpados pelo actual dficit.

    O denominado Programa de Reforma da Despesa Pblica de Junho de 2001 bem demonstrativo do lamentvel nvel conceptual a que se chegou na nsia deliquidar a parte (hoje vegetativa mas sempre essencial ) do Estado.

    No ser de admirar, pois, que as infra-estruturas e equipamentos pblicos daresponsabilidade do Estado, as estradas, pontes, barragens e linhas de gua,hospitais, escolas, etc., etc. se vo degradando, que os processos de licenciamento efiscalizao se arrastem, que o tradicional aparelho do Estado caia na inanio,desmotivao e degradao sem que, antes, haja sido feito algum esforo srio para oreformar, reorganizar e reanimar.

    O Estado Central funciona de modo semelhante ao que parece verificar-se emalgumas Cmaras Municipais de maior dimenso, onde cada Presidente retira umatalhada do oramento e cria a sua equipa pessoal com vista realizao das obras de

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    mandato, fazendo o mesmo os restantes vereadores de cada Partido, ficando o restopara a estrutura. Esta, entregue a si prpria e rotina, tende, por sua vez, areproduzir o modelo global aos mais diversos escales.

    No fundo, o que vamos encontrar um modo de produo feudal adaptado explorao dos recursos financeiros. Dir-se-, numa perspectiva de gesto poltico-eleitoral, que no se v alternativa que no conduza a uma prxima derrota. Porm, a

    manuteno do sistema actual tender, a prazo, a arrastar-nos para um processo de italianizao da poltica, incluindo o aumento da frequncia de rotao governativa.3.2.3. Estado de Direito, Prestgio e Autoridade

    O Estado que temos hoje, ainda no o Estado de Direito necessrio. , semdvida, muito melhor que o Estado discricionrio do fascismo, foram eliminados osmecanismos jurdicos que permitiam a maior discricionaridade (prises sem culpaformada, assassinatos, despedimentos e perseguies aos opositores, etc., etc., etc.).Porm, estamos muito longe do Estado de Direito a que se referia o PresidenteKennedy quando afirmava, a propsito da resistncia racista ao reconhecimento dosdireitos dos negros americanos, que no somos governados por pessoas mas sim

    pelas Leis... (apesar de ser prefervel um governo por Pessoas Legais...).Reconheamos que a poltica e o governo do Estado aos mais diversos nveis embitos, incluindo o da Justia, continuam, em Portugal, a ser influenciados pelaspessoas concretas envolvidas, em detrimento da perspectiva institucional. No indiferente ser-se ou no do Partido, amigo, da classe social conveniente, do quese tenha para a troca no universo das influncias, do que, conjunturalmente, dermais jeito, etc.

    O efectivo respeito pelos princpios do Estado de Direito Democrtico umacondio essencial para o prestgio do Estado junto da populao. Mas no suficiente. O Estado tambm necessita, para se prestigiar, de estar dotado depoderosos recursos financeiros, capazes de assegurar o melhor cumprimento das suasfunes especficas, promoo econmica e promoo social, e no um Estadomendicante, sujeito a todo o tipo de presses, exigncias e imposies, internas ouexternas; necessita de ter um relacionamento amigvel com a populao e dosadequados meios de persuaso democrtica, se necessrio, de legtima coero, parafazer cumprir as Leis por todos os cidados.

    O Estado que hoje temos continua, tambm, apesar do CPA (Cdigo doProcedimento Administrativo), a exercer o seu poder essencialmente pelosmecanismos administrativo-policiescos e no pelas ferramentas dos instrumentosmorais, econmicos, poltico-pedaggicos e do estmulo. No somos burocrticos pornascimento mas crescemos e formmo-nos nessa cultura. Porm, tambm nomudmos porque a manuteno desses instrumentos d, algumas vezes, algum jeitopara a manuteno do poder e o favorecimento de clientelas. Inibem-se,frequentemente, as actividades de outros com base na mobilizao de exignciasadministrativas ou de equipas de fiscalizao (ou, modernamente, de auditoria); aocontrrio, favorecem-se as iniciativas convenientes desmobilizando essesinstrumentos; accionam-se investigaes e processos judiciais conforme asconvenincias...

    Tudo isto conduz actual fraqueza estrutural do Estado, mesmo quando seimpunha a tomada de medidas de fora. De certo modo, o poder est na rua. Masno na rua dos cidados; mais ainda na rua dos gangs, qualquer que seja a cor docolarinho. O banditismo organizado j dividiu territrios e reas de actuao. Jcriou teias em instituies pblicas. As Covas da Moura, zonas da costa, nichos no aparelho do Estado (incluindo foras de segurana) e em algumas instituiesfinanceiras, servem-lhes de zonas de segurana/reas libertadas.

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    Os tristes episdios do sargento da GNR que, h uns anos, assassinou e cortou acabea a um jovem e o do segurana da Presidncia da Repblica que ajudava umamigo no trfico de drogas, mostram, por eles prprios, pelas explicaes pblicasdadas pelos responsveis dessas instituies e pela falta de exigncia revelada pelasestruturas do poder, o grau de laxismo em que este se encontra.

    Os nicos exemplos contra a corrente que conhecemos foram as aces policiais

    na Ponte 25 de Abril (Cavaco Silva) e numa manifestao da CAP (Jorge Coelho).Os episdios mais recentes que tm envolvido quer a PJ quer a Procuradoria daRepblica mostram ao cidado comum como os instrumentos de segurana daRepblica se encontram vulnerveis, permeveis a qualquer tipo de infiltrao econtrolo ilegtimo.

    S um Estado e um Poder Poltico prestigiados, podero ver concedida, peloscidados, a Autoridade necessria boa e democrtica execuo das polticasdecididas.

    A obteno dessa Autoridade, fundamental a um Estado que se pretenda Forte,exige uma postura de grande credibilidade pblica pelo Governo e pelo sistemapoltico no seu conjunto e um programa de informao e mobilizao poltica e cvicados cidados, em primeiro lugar dos servidores do Estado.

    A Autoridade reconhecida pelos cidados constitui o fundamento da firmeza e daexigncia do Poder Democrtico.3.2.4 O Dficit de Enquadramento Poltico Democrtico

    Ao nvel do enquadramento poltico democrtico das estruturas do Estado, o dficit tremendo.

    impraticvel um Ministro da Educao, por exemplo, com dois, trs ou quatroSecretrios de Estado gerirem, poltica e tecnicamente, talvez a maior e maisimportante empresa do pas, com centenas de milhares de trabalhadores e efeitos

    reprodutores estratgicos to vastos, designadamente enquanto criador de capitalhumano qualificado.O mesmo se poderia referir relativamente a outros departamentos

    governamentais, da sade, da segurana pblica, da segurana social, da economia,das finanas, etc.

    A experincia de hoje mostra que quando o actual Poder Local entende a suafuno como de verdadeiro Governo Local tornam-se crescentes as tenses com opoder central quanto ao enquadramento e desempenho dos servios

    desconcentrados do Estado, a comear pelos sistemas educativo, da sade e dasegurana pblica.

    O distanciamento dos titulares e responsveis polticos das acima chamadas estruturas vegetativas que no gerem projectos de prestgio ir, no futuro, provocarcada vez mais demisses no Governo pela ocorrncia, tendencialmente crescente, de

    barracas (nas pontes, nas estradas, nas balizas, nos aquaparques, nas casas pias,na segurana pblica, nos cuidados de sade, nos fogos e inundaes, nas obras malfeitas, na segurana alimentar,...) sem responsveis tcnicos e administrativosdirectos a quem, em conscincia, se possam atribuir tais responsabilidades.

    Ser membro do Governo, nas condies actuais, , de facto, uma profisso derisco onde, mesmo a pessoa mais competente, dedicada e com sentido do serviopblico poder ver cair, inopinadamente, na lama toda a sua credibilidade e prestgiopessoal e profissional. o preo poltico da decomposio e perverso a que se temconduzido o aparelho vegetativo do Estado.

    Da que se restrinja cada vez mais o campo de recrutamento para o Governo,preferindo algumas das pessoas mais conscientes e capazes abrigar-se em cargos efunes mais tcnicas, seguras e bem pagas.

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    Tal dficit de enquadramento poltico democrtico ter de ser corrigido tanto pela Regionalizao democrtica como pela maior participao do actual Poder Local nagesto dos servios j hoje regionalizados.3.2.5 Os Recursos Humanos da Administrao Pblica

    Sob o pretexto de despolitizar o aparelho do Estado na sequncia do processo

    revolucionrio de 1975, afastaram-se os quadros democrticos e progressistas quehavia e abriram-se lugares para as pessoas de confiana. No esqueamos que oaparelho de Estado herdado pela Democracia era profundamente conservador e dementalidade imobilista ao nvel dos seus dirigentes, no tendo alterado o seu carcterpelo arremedo de saneamento que se chegou a intentar. Desse novo saneamento esquerda resultou uma hierarquia globalmente de direita que tende a paralisarquaisquer tentativas de reforma democrtica. Quando o PS vai para o Governo, essahierarquia tende a disfarar o seu imobilismo com inconsequentes declaraes deprofissionalismo e iseno, tornando-se, pelo contrrio, efectivamente colaborantecom os governos de direita (recordemos, pelo menos, pela sua visibilidade pblica, as

    cascas de banana que constituram alguns episdios da GNR que comprometeram

    politicamente os Ministros do PS Fernando Gomes e Alberto Costa). No por acasoque quando o PS vai para o Governo ressurge sempre o alarido dos boys, que,antes, se chamavam comunistas... Com a algazarra da direita, que, ao longo dossculos, naturalmente, sempre entendeu o Estado como seu, a esquerda tende a ficarcom complexos, relativamente criao de uma hierarquia democrtica no aparelhodo Estado.

    De facto, o assunto no de filiao ou simpatia partidria mas sim de se ter ouno esprito reformador, criatividade organizacional e de gesto, liderana ementalidade econmico-empreendedora, sentido de servio pblico, num quadro demodernidade.

    Infelizmente, no possuindo embora o perfil adequado para promover a

    modernizao do aparelho do Estado, alguns desses dirigentes conservadores, massrios, ainda vo desempenhando um papel positivo no sentido de refrear algunsmpetos pseudo-modernos tendentes a autnticas prticas de baguna negocista naadministrao pblica.

    A linha de dirigentes e tcnicos de staff da Administrao Pblica encontra-sefortemente debilitada e pervertida. A chamada confiana partidria (que, depois dosaltos, invadiu os mais baixos escales de direco) e a disponibilidade para, por vezesde forma mais do que arrevesada, servir de carneiro no altar de algumas decisespblicas, passaram a ser uma espcie de cdigo deontolgico. De facto, ao nvel doEstado, extinguiu-se a Liberdade de opo poltica, em nada se distinguindo algumasprticas actuais dos clebres juramentos e procedimentos do antigo regime.

    A luta poltico-partidria pelo Poder o controlo do aparelho tecnico-administrativo ede gesto Estado transformou-se um facto mais que habitual, consensual, umacaracterstica da Democracia, ao contrrio do que pretendia mostrar um conhecidoprograma ingls de televiso. Muitos quadros, aptos e dedicados noutros tempos, comsentido do servio pblico, preferem aguardar hoje, passiva e confortavelmente, em

    prateleiras douradas, o tempo das suas reformas. Outros, para nossa sorte,mantm-se como verdadeiros heris resistentes, a manter o fundamental do queainda funciona na Administrao Pblica.

    A poltica de quadros da Administrao Pblica, como resultado do imobilismoconservador, do rotativismo poltico e das comisses de servio, estprofundamente pervertida.

    O Estado da Nao, devendo obedincia e lealdade ao poder poltico eleito masno podendo ser apropriado privadamente por qualquer grupo ou partido.

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    A par da reciclagem mental de muitos quadros reaccionrios (no no sentidopartidrio, porque reaccionrios e progressistas h-os em todos os partidos, mas,mais amplamente, das atitudes pessoais face s necessidades de mudana), dodesmantelamento do favoritismo poltico-partidrio na administrao pblica (que,muitas vezes, serve de justificao e cobertura ao imobilismo), dever-se-ia, tambm,extinguir a figura da comisso de servio, criando em seu lugar uma figura de

    contrato por objectivos, de remunerao flexvel, aberto concorrncia externa, porforma a qualificar o quadro de dirigentes pblicos em funo das novas exigncias.Nem tudo o que funcionrio pblico mau, assim como no constitui certificadode competncia o facto de se ter experincia anterior na privada. A experinciamostra que subsiste na Administrao Pblica uma reserva de quadros de grandegabarito profissional e dedicao ao interesse pblico.

    Sem um conceito estrutural, funcional e tecnolgico de referncia, como reformara poltica de quadros e de recursos humanos da administrao pblica?

    Haver que reorganizar Quadros de Pessoal, Carreiras, polticas remuneratriase de contratao, comear a reconstruir o corpo de efectivos para o modelo futuro.Sem modelo, sem projecto conhecido e compreendido, todas as medidas que se tmtomado (e que, globalmente, tm merecido suficiente compreenso, mesmo por partedos sindicatos) e que tenham de ser tomadas no futuro podero ser mal aceites egerar maiores conflitos. Aparentemente, todos esto espera de qualquer coisa queno seja mais do mesmo, isto , as solues do downgrade do tipo Programa deReforma da Despesa Pblica.

    Prosseguir esse caminho, dos cegos cortes oramentais, das reformas antecipadas,das demisses negociadas, sem um novo conceito estrutural, funcional e tecnolgicode referncia, s retiraria de uma rubrica do oramento o que teria de entrar poroutra rubrica. Ficariam mais umas dezenas de milhares de trabalhadores socialmentemarginalizados, aguardando inactivos o final das suas vidas, a viver de reformas desubsistncia.

    O caminho dever ser outro, o de reorganizar radicalmente as actividades doEstado e, eventualmente, criar novas actividades, econmica e socialmente teis eeficientes, de forma a tirar proveito de todos os actuais trabalhadores. Um esforo dereconverso e formao ter, necessariamente, de ser previsto em funo das novasfunes a desempenhar.

    Esta opo corresponderia a alargar os domnios de actividade do Estado,directamente ou com parcerias comunitrias ou privadas, em reas deficitrias dotecido econmico e dos servios comunitrios, numa base empresarial, a trabalharpara e no mercado, permitindo a absoro de muitos dos actuais funcionrios pblicose o suporte, pelo mercado, das respectivas remuneraes.

    3.2.6 A Reforma do Poder LocalO mbito da Reforma do Estado no dever, porm, ficar-se pela estrutura central.As Autarquias Locais tendem para um esgotamento do modelo de gesto deredistribuio social e, mais preocupante, para situaes financeiras de grandedebilidade podendo, a 5 ou 10 anos, desencadear-se um processo de inanioendmica ou falncia (esperemos que no se chegue ao ponto de Autarquias Locais sevirem a entregar, quais Egas Moniz de barao ao pescoo, ao Poder Central paranomeao de Comisses Administrativas de Salvao Local, ou, em alternativa,privatizarem-se atravs de contratos de gesto).Analisando superficialmente os dados consultveis de execuo de alguns dos

    Programas de Desenvolvimento Regional financiados pelos fundos europeus e osprojectos municipais neles includos, verifica-se que a maior parte das actividadesfinanciadas correspondem s normais funes/obrigaes municipais dirigidas para

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    o cimento ou o alcatro. Seremos levados a pensar que se falharem os fundospara financiar as obrigaes correntes municipais, a crise endmica destes explodir.Se no falharem, faltaro os recursos para o investimento Realmente Estratgico.De um modo geral, os Municpios s se preocupam com uma actividade econmica oimobilirio de onde retiram, pelas mais variadas vias, os seus proveitos prprios. Os

    Gabinetes de Apoio ao Empresrio e outras iniciativas viradas para a promoo

    econmica so, regra geral, inconsequentes ou simblicas, tanto por falta de quadrose de recursos, constituindo, muitas vezes, o equivalente a Postos de InformaoTurstica ou, noutros casos, como certos sites de Internet, uma mera e intildeclarao de modernidade.

    O Estado Central no , porm, isento de responsabilidades na presso negocistade alguns Municpios no domnio do Imobilirio: a insustentvel presso que exercesobre os Municpios para a cedncia gratuita (! ?) de terrenos (que a maior parte dasvezes este