por uma educaÇÃo pela nÃo violÊncia* adriane valÉria ... · incivilidade, indisciplina e...
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POR UMA EDUCAÇÃO PELA NÃO VIOLÊNCIA*
ADRIANE VALÉRIA KISZKA SCHEFFER**
MARIA DA GRAÇA DO ESPÍRITO SANTO TIGRE***
RESUMO
Este trabalho se propõe a discutir alguns dos fatores que têm contribuído para o aumento de manifestações violentas no interior das escolas e a provocar uma reflexão acerca de como a educação escolar pode atuar na construção de uma cultura da paz e da não violência. A intenção foi possibilitar mudanças na práxis educativa proporcionando aos alunos melhoria da auto estima e a formação da cidadania e aos professores o reconhecimento das necessidades de mudanças em suas práticas pedagógicas do cotidiano. A pesquisa foi realizada em uma escola estadual do ensino fundamental, na cidade de Ponta Grossa, no estado do Paraná, abrangendo alunos de 5º e 6º séries e professores onde momentos de reflexão foram utilizados para abordar o tema proposto. As ações educativas (debates, produções, dilemas morais, etc.) favoreceram a construção coletiva de normas de conduta e convivência social. As fragilidades da escola foram repensadas e analisadas pelo coletivo proporcionando resultados significativos no âmbito escolar. Refletir e debater a violência e a indisciplina presente na escola, buscando compreender seus significados e sentidos, mostrar de forma positiva o respeito e a tolerância para uma cultura da não violência incorporada no cotidiano escolar como suporte para a construção de regras de convivência entre os alunos, são o foco central do presente trabalho.
Palavras-chave: violência; indisciplina; educação para a paz.
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*Texto elaborado como condição sine qua non para a conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional, turma de 2007, pela Universidade Estadual de Ponta Grossa **Especialista em Pedagogia pela Universidade Estadual de Ponta Grossa- Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa e Professora Pedagoga da Rede Pública Estadual de Educação do Paraná. ***Mestre em Educação, professora de Didática da Universidade Estadual de Ponta Grossa, professora orientadora do Programa de desenvolvimento Educacional.
ABSTRACT
This paper aims to discuss some of the factors that have contributed to the increase of violent demonstrations inside the schools and lead a discussion about how the school can act in building a culture of peace and nonviolence. The intention was to allow changes in educational practice giving studentes self esteem and improving trainig for teachers of citizenship and the recongnition of the need for changes in their tesching practices of daily life. The study was conducted at a state school of elementary school in the city of Ponta Grossa, in the state of Paraná, covering studentes from 5 and 6 series and moments of reflection where teachers werw used to adress the theme. The educational activities ( discussions, productions, moral dilemmas, etc.), favored the collective creations of Standards of conduct and social coexistence.The weaknesses of the school were reviewed and analyzed by the colletive providing significant results in school. Reflect and discuss the violence and indiscipline in the school, seeking to understand its meaning and direction, in a positive way to show respect and tolerance for a culture of nonviolence incorporated into the school routine as support for the construction of rules of coexistence among studentes, are the central focus of this work.
Keywords: violence,indiscipline, educations for peace.
INTRODUÇÃO
Este artigo constitui-se na reflexão sobre a violência e indisciplina no interior
da escola e é resultado do trabalho de conclusão do PDE- Programa de
Desenvolvimento Educacional.
Uma das maiores fragilidades que as escolas vêm enfrentando, nos dias de
hoje, é a violência em suas diferentes formas de manifestações. A existência de
conflitos coletivos, sociais, familiares resultam em respostas violentas no ambiente
educativo.
O trabalho teórico iniciou através da realização de um grupo de estudo com o
tema violência no decorrer do ano de 2007.
Após diagnosticar o problema enfrentado no cotidiano escolar procedeu-se a
Proposta de Implementação na escola. A proposta foi desenvolvida respeitando a
carga horária estipulada pelo programa sendo de 32 horas de implementação.
A implementação deu-se em uma Escola Estadual do município de Ponta
Grossa, que oferece cursos de ensino fundamental de 5º a 8 séries tendo como
mantenedora o Governo do Estado do Paraná.
Atende crianças desde situação econômica de classe média baixa até classes
bem desfavorecidas, em sua maioria; está situada em bairro comercial porém a
participação da comunidade no ambiente escolar é nula. Os alunos matriculados são
em torno de 800 e as classes são superlotadas (atendendo em média de 35 a 45
alunos por sala de aula). Por ser escola de 5º a 8º séries, os alunos em sua maioria
são adolescentes apresentado condutas típicas da faixa etária, sendo grande o
índice de violência escolar.
A escola pretende resolver os conflitos em situação de diálogo, de defesa dos
valores da solidariedade e democracia, dando oportunidade de opinar, submetendo
suas idéias ao juízo de outrem, ouvindo o parecer e opiniões de seus semelhantes,
e com isso, desenvolvendo nos alunos a competência para discernimento entre o
bem e o mal.
1-Violência e Indisciplina escolar: alguns conceito s
O atual modelo de sociedade se pretende democrática e inclusiva trazendo a
tona um desafio aos profissionais da educação, cuja preocupação primordial é a
construção de uma escola de qualidade, cumprindo as normas legais estabelecidas
com a formação da cidadania e preparo dos estudantes para o mundo do trabalho e
para a vida em sociedade.
A convivência humana pressupõe diálogo, ação cooperativa e participativa de
toda comunidade escolar na resolução dos conflitos cotidianos e na busca de
soluções para os problemas que envolvem violência e indisciplina na escola.
SCHILLING traz algumas definições do termo violência e incita-nos a pensar sobre
como ela se reflete na escola contemporânea: a violência do desemprego, da
corrupção, da fome, das paixões, do preconceito, do racismo, da discriminação,
entre outros.
As diversas manifestações da violência implicam atores (sujeitos) diversos e
acontecem sob formas variadas (violência física, psicológica, emocional, simbólica),
exigindo respostas diferentes mas que se relacionam entre si de maneiras
peculiares, porém, em todos os casos há agressores específicos e há vítimas.
Segundo Yves Michaud (1989, p.13) “(...) há violência quando, numa situações de
interação, um dos vários atores agem de maneira direta ou indireta, maciça ou
esparsa, causando danos a uma ou várias pessoas, seja em sua integridade física,
seja em sua integridade moral, em suas posses, ou em suas participações
simbólicas e culturais”.
Nessa definição, o autora introduz a violência social, a violência entre as
pessoas de uma sociedade. Propõe uma definição ampla. A violência é
compreendida além da violência física e é vista como psicológica ou oral, com danos
a pessoa ou a sua extensão: família, vizinhança, bens. Nesse caso, a discriminação,
por exemplo, é uma violência. Atinge a integridade moral de uma pessoa, afeta sua
participação simbólica e cultural na sociedade.
Chauí (1999), contrapõe violência e ética e ressalta que a:
“(...) violência é um ato de brutalidade, sevícia e abuso físico ou psíquico contra alguém e caracteriza relações intersubjetivas e sociais definidas pela opressão e intimidação, pelo medo e pelo terror. A violência se opõe à ética porque trata seres racionais e sensíveis, dotados de linguagem e de liberdade, como se fossem coisas, isto é, irracionais, insensíveis, mudos, inertes ou passivos”.
Essa definição é ampla e moderna: incorpora como violência, indo além da violência
física, a violência psíquica contra alguém. Ações que comportam humilhação,
vergonha, discriminação, são consideradas hoje condutas violentas.
Além da violência interpessoal ou intersubjetiva, incorpora a violência social,
supondo toda a dimensão estrutural da violência, própria da sociedade: podemos,
portanto, falar da violência da fome e da miséria, da exclusão. Propõe que existe
violência quando tratamos sujeitos, seres livres, racionais e sensíveis como coisas.
Segundo Estrela (1994), a escola como um sistema aberto em interação com o
meio, não pode ficar imune às tensões e desequilíbrios da sociedade, por isso a
indisciplina que perturba a vida de muitas escolas é o reflexo dos conflitos e
violência desse meio.
É necessário que o professor compreenda sua verdadeira missão para atingir
um trabalho educativo satisfatório, visto que ele é o personagem principal na tarefa
de educar, o indicador do processo, o incentivador do aluno e o conscientizador da
família. Por isso é necessário que o educador saiba conduzir o processo de
construção da disciplina ideal, envolvendo o aluno, a escola, a família e sociedade
tendo em vista ser um trabalho coletivo.
No plano conceitual, sabe-se que é bem demarcada a linha divisória entre
incivilidade, indisciplina e violência, mas não se pode dizer o mesmo em relação ao
dia a dia escolar. Neste, nunca se sabe ao certo o que separa os atos de incivilidade
dos de indisciplina nem onde estes terminam para começarem os atos violentos.
(Aquino, p.10,2003 )
Vejamos a idéia de La Taille:
Disciplina remete a regras. Com efeito, a pessoa disciplinada segue determinadas regras de conduta. Logo, disciplina corresponde ao que chamamos de moral: o respeito por certas leis consideradas obrigatórias. Portanto, a pessoa indisciplinada transgride as leis que deveria seguir(...).A indisciplina pode, às vezes, vir em decorrência de bons motivos éticos. Se as regras não fazem sentido (e há muitas nas escolas) e se derivam de
valores suspeitos ( como a subserviência cega à autoridade), a indisciplina pode se justificar eticamente,(...). Há indisciplina eticamente válidas, desobediências legítimas, graças às quais, aliás, a sociedade acaba por evoluir. Mas pensemos agora nas formas de indisciplina que ferem as leis morais, estas definidas como garantias de respeito a direitos legítimos. Transgressões deste tipo também podem acontecer nas salas de aula. Por exemplo, o insulto, a agressão física, o tratar o professor como se fosse um objeto, não ouvi-lo, fingindo que não está presente, que não existe ( La Taille, 2001,p. 90-91).
A indisciplina, de acordo com o autor citado, poderia ter dois significados
opostos: um ato imoral, porém ético, ou um ato imoral e, ademais antiético. O que
importa é a motivação que se desobedece, ou seja, a razão subjacente à conduta
transgressiva. Se o ato indisciplinado aspirar outros horizontes (uma vida melhor; em
termos éticos), ele terá sua legitimidade garantida; se ele nada aspirar ou tão
somente recusar princípios validades, perderá sua legitimidade. Em outras palavras:
é na imbricação da conduta levada a cabo (a dimensão moral) com o tipo de vida
que se almeja (a dimensão ética) que encontramos a linha divisória das
“indisciplinas”.
Entende-se por indisciplina os comportamentos disruptivos graves que
supõem uma disfunção da escola. Os comportamentos indisciplinados simplesmente
obedecem a uma tentativa de impor a própria vontade sobre a do restante da
comum idade. Se for um aluno, dizemos que é difícil, indisciplinado, diferente... Se
for um professor, dizemos simplesmente que é autoritário. Também se entende por
indisciplina as atitudes ou comportamentos que vão contra as regras estabelecidas,
as normas do jogo, o código de conduta adotado pela escola para cumprir sua
principal missão:educar e instruir. Então, muitas vezes, o problema consiste em que
não existem tais normas, a escola funciona de acordo com um código não escrito,
conhecido somente por poucos, o qual não é divulgado entre os professores ou
entre os alunos e as famílias que fazem parte dela (Casamayor, p. 22, 2002).
Tomar a indisciplina e outros comportamentos disruptivos como fenômenos
complexos ditados pelo novos tempos pedagógicos significa conceber a relação
professor-aluno como necessariamente conflitiva.
Parece razoável pensar que estamos diante de novos desafios educacionais,
que essa disciplina que aparece como impossível é, na verdade, uma nova
encruzilhada educativa.
Daí o inegável fato de que a educação contemporânea tem priorizado o
domínio disciplinar-atitudinal em detrimento do âmbito propriamente pedagógico-
intelectual.
Foi Foucault (1987) um dos autores que melhor desvendou essa engenharia
normativa das instituições sociais, a partir da hipótese de uma “sociedade
disciplinar” marcada por práticas difusas de vigilância (hierárquica, contínua e
silenciosa) e “punição” (corretiva, diferenciadora e normalizadora).
Vasconcelos (1995), oferece um quadro pitoresco das condutas corriqueiras
dos alunos tidos como indisciplinados. Note-se que se trata de um universo de fato
paralelo das práticas escolares, em que hábitos dissonantes de parte do alunado
ganham o estatuto de figura, e não mais de fundo, do cenário pedagógico na
atualidade.
Conversas paralelas, dispersão; professor entra em sala e é como se não tivesse
entrado; dá lição e a maioria não faz; quando vem professora substituta, é dia de
fazer bagunça; alunos não trazem material; se negam a participar da aula; parece
que nada interessa; saem no corredor na mudança de professor; fazem bagunça
em sala quando não tem ninguém; irmãos entram no meio da aula para pedir
material, lanche, dinheiro; riscam carteiras até estragar ( ex: com estilete); colocam
tachinha na mesa do professor ou dos colegas; ficam comendo durante a aula;
mascam chiclete; ficam de boné durante a aula; não vão de uniforme; pintam
carteiras com líquido corretor; escrevem nas paredes; destroem trabalhos de alunos
de outros períodos fixados nos murais; sentam de qualquer jeito na carteira; roubam
material do colega; passam a perna no colega; entram sem pedir licença; querem ir
toda hora ao banheiro; respondem ironicamente; saem quando toca o sinal e o
professor ainda está explicando; no meio da explicação, se levantam e falam com o
outro(VASCONCELOS,p.13,1995).
2- A violência, um fenômeno interpessoal
De acordo com Fernández (2004, p.29), todos nós somos passíveis de
cometer uma agressão, mas o fenômeno de violência interpessoal no âmbito da
convivência entre escolares transcende o fato isolado e esporádico, convertendo-se
em um problema escolar de grande relevância, porque afeta as estruturas sociais
pelas quais deve ser realizada a atividade educativa. A responsabilidade da
agressividade pode ser compartilhada, já que a confrontação se origina em
necessidade de ambos os contendores; entretanto a violência envolve o abuso do
poder de um indivíduo ou de um grupo sobre outro indivíduo fraco e indefeso. A
violência implica a existência de uma assimetria entre os indivíduos que se vêem
implicados nos eventos agressivos.
Por outro lado, cada sociedade atribui aos comportamentos de seus membros
certos valores e significados que atravessam as próprias atribuições morais com que
os indivíduos julgam os fatos. O conceito de violência também se submete aos
valores e aos costumes sociais, o que não deixa de aumentar a confusão para
localizar-se conceitualmente nesse assunto. O que para nós é perseguição,
intimidação e destruição dos direitos humanos, pode ser considerado como ritual
inofensivo por grupos sociais, nos quais, por princípios religiosos ou culturais,
mulheres e homens, adultos e crianças, ricos e pobres não gozem dos mesmos
direitos. Entretanto, a partir de uma posição psicológica social, é necessário deixar
claro que, além da justificativa cultural ou tradicional existe violência quando um
indivíduo impõe a sua força e seu status contra outro indivíduo, de forma a
prejudicá-lo, maltratá-lo ou abusar dele física ou psicologicamente, direta ou
indiretamente, sendo a vítima inocente de qualquer argumento ou justificativa que o
indivíduo violento apresente de forma cínica e indesculpável.
O que se pode afirmar com toda segurança é que a violência tem todas as
possibilidades de aparecer em um clima no qual as normas são arbitráveis,
elaboradas à margem da participação dos alunos, inconsistentes e pouco claras,
sem que os implicados em seu cumprimento saibam quando são obrigatórias e
quando podem deixar de ser cumpridas, porque não existe clara definição sobre até
onde vai a liberdade individual e até onde a liberdade de cada um deve limitar-se
diante da ordem e do direito dos demais. Isso ocorre por duas razões básicas: o
marco cultural não oferece critérios de referência para elaborar padrões claros de
convivência e há inconsistência na aplicação das normas, o que impede saber o que
será considerado como correto ou incorreto.(Fernández,2004)
Os maus modos, os insultos, a provocação que precede uma briga, a própria
briga, a intimidação e, em geral, o comportamento de abuso social de certos
estudantes perante outros, até mesmo com relação aos próprios professores, são
um problema que sempre existiu e até agora não fomos suficientemente sensíveis à
sua importância e às suas conseqüências. A sociedade tem sido muito tolerante
diante dos comportamentos e das atitudes que os mais fortes demonstram ante
aqueles que ocupam um lugar de submissão a este poder, sem apresentar o fato de
forma concreta.
A mídia apresenta a violência como algo imediato, cotidiano e freqüente. Os
mais violentos têm capacidade de ganhar e de sobressair-se sobre os demais, e
essas ações se concentram na realidade da ação, são o mundo tal e qual. Apesar
disso, consideramos que as seqüências violentas dos programas de televisão têm
um dever moral perante seus espectadores visto que:
- a televisão é o primeiro provedor de informações e transmissor de valores;
- promove o imediatismo e a proximidade dos fatos violentos, até convertê-los
em cotidiano;
- mantém um padrão passivo da violência como meio de resolver conflitos e
de adquirir o poder.(Melendo,1997)
3- A violência no interior da escola
A problemática da indisciplina e da violência nas escolas está, sem dúvida,
relacionada também com a impunidade, com o aumento exorbitante da ocorrência
de situações de violência real e com a maneira como tais tipos são apresentados
pelos meios de comunicação de massa.
De acordo com Silva (2004), além da impunidade, há outros fatores que
concorrem para o aumento dos índices de violência. Dentre eles, temos a
morosidade do sistema judiciário, a ineficácia das instituições criadas para
recuperação dos sujeitos violentos, transformadas, ao contrário, em verdadeiras
escolas formadoras de criminosos, a falta de escolaridade, a situação econômica e
seus correlatos, como o desemprego, a falta de perspectiva, a estagnação social, o
uso de drogas lícitas e ilícitas como válvula de escape, dentre outros fatores. Além
disso, mais um fator de promoção da violência é a maneira como ela tem sido
veiculada pelos meios de comunicação: é transmitida na forma de espetáculo, o que
tem contribuído para a banalização deste fenômeno.
A violência passa a ser vista como algo comum e até certo ponto como um
fenômeno normal e natural. O uso da violência como único meio para a resolução de
conflitos interpessoais, é como se o homem deixasse de utilizar exatamente o
instrumento que o diferencia dos outros animais, a capacidade de dialogar e
passasse a fazer uso unicamente da violência física.
Outro aspecto que, sem dúvida, contribui para o aumento dos índices de
indisciplina e de violência nas escolas relaciona-se com o fato de a maioria dos
educadores se encontrarem desorientados quanto aos objetivos da educação
formal. Eles não sabem mais quais atividades devem desempenhar na instituição
escolar. Isto talvez esteja ligado às inúmeras mudanças ocorridas nas últimas
décadas no tocante à política educacional orientadora dos estabelecimentos de
ensino e, sem dúvida, à maneira como o educando tem sido concebido ultimamente.
Até a década de 1970, o professor tinha clareza quanto ao papel a ser
desempenhado por ele, qual seja: transmitir as informações contidas nos livros
didáticos, cujo teor dizia respeito aos conhecimentos produzidos ao longo da história
da humanidade.
Outra causa que sem dúvida contribui para o aumento da indisciplina e da
violência nas escolas foi a falência das formas tradicionais de se impor disciplina. As
formas empregadas, dentre outras, era a de advertir verbalmente, fazer uso da
ameaça de delação aos pais, de encaminhamento à direção (para aplicação de
advertência, suspensão e até expulsão da escola), aplicar pontos negativos, diminuir
a nota obtida na prova, colocar de castigo na sala, impedir a participar no recreio e
nas aulas de educação física ou em outras atividades sabidamente desejadas pelas
crianças e adolescentes.
Observa-se hoje, que essas sanções parecem não mais funcionar, pois os
alunos não lhe dão mais importância, isto é, elas não se revestem de valor para
eles. Ao contrário, algumas são até vistas como prêmios, como a de ficar fora da
sala de aula, pois assim, além de se livrar de uma atividade enfadonha (no caso, a
aula), o aluno poderá envolver-se com atividades que chamam a sua atenção e lhe
propiciam grande satisfação, com a de ficar jogando futebol na quadra. Em alguns
casos, eles consideram preferível ficar de castigo próximos à sala da diretoria a
permanecer na aula
Para outros a violência constitui um fenômeno tão abrangente que simples
conflitos de opinião são considerados como manifestações de violência. Contudo,
pode-se afirmar que, na maioria das visões que se tem do fenômeno, o que está
presente, como marca constitutiva, é a tendência à destruição, ao desrespeito e à
negação do outro, podendo a ação situar-se no plano físico, psicológico ou ético.
Como não poderia deixar de acontecer, o crescimento da violência urbana é
acompanhado de um significativo aumento de manifestações violentas no interior da
escola. Estando a violência presente na rua, nas relações de trabalho, na mídia, não
seria de se esperar que ela estivesse ausente no espaço escolar. Pais e educadores
têm manifestado uma grande preocupação com as freqüentes expressões da
violência no interior das escolas, tais como: depredação dos prédios e materiais
escolares, as brigas e agressões entre alunos e os adultos que trabalham nas
escolas e a violência familiar, que apesar de estar localizada, quase sempre, fora
dos muros escolares, interfere significativamente no trabalho que aí se realiza.
Esta crise reflete-se, no enfraquecimento do papel desempenhado pela
escola na sociedade. E expectativa de muitos pais e alunos continua sendo a de que
a escola proporcione às crianças e aos jovens o acesso a uma “ vida melhor”,
através de suas funções clássicas: a transmissão dos saberes historicamente
construídos e de uma disciplina que lhe seja útil para o desempenho de uma
profissão no futuro. Este discurso enfrenta, no entanto, sérias contradições. Se de
um lado, no imaginário popular, a escola promete ascensão social e respeitabilidade,
de outro a realidade desmente essa promessa, contribuindo para a falta de
perspectivas presentes, hoje em nossa sociedade e, em especial, entre os jovens.
Cresce a distância entre as expectativas dos indivíduos e a realidade.
Segundo NASCIMENTO, é possível que, no interior das escolas, esta cultura
da violência surja como uma não explícita de resistência ao julgamento escolar e/ou
protesto contra o mau exercício, pelo adulto de sua função. Não raro, o sistema
escolar, através de uma prática que privilegia o desempenho individual, coloca o
sujeito, seja professor ou aluno, a uma situação de solidão e competição, que pode
reforçar aquele modelo de sociedade que se tem desenvolvido nos últimos anos.
Neste campo, constata-se que a avaliação dos resultados escolares e as notas,
constitui um ponto de conflitos particularmente significativo no cotidiano escolar.
4-Por uma educação pela não violência
Conforme relata Fernández (2004,p.21), o centro do ensino é um organismo
vivo, dotado de movimento, atividades, relações e desenvolvimento humano. Em si
mesmo, isso envolve conflitos. O conflito é parte do processo de crescimento de
qualquer grupo social do ser humano; o importante é ser capaz de “ tratar esse
conflito” para o bem do maior número de pessoas. Pretender que um centro de
ensino se mantenha em calma contínua é alienar-se da realidade escolar. Por isso,
os conflitos e o mau comportamento devem ser admitidos como parte da vida
cotidiana da escola e como elemento de responsabilidade profissional, ou seja, em
aspecto da profissão e nem tanto um impedimento para o desenvolvimento da tarefa
docente.
Por conseguinte, deveríamos abordar a “filosofia de convivência” baseada na
dinâmica do conflito, em que as relações interpessoais e a organização escolar
tiverem o papel essencial. O transcendente é encontrar esse equilíbrio que nos
permita o desenvolvimento pessoal com “o que fazer” educativo.
As reflexões apontam para a complexidade de se estabelecer caminhos
possíveis para o enfrentamento de questão da violência na escola, dada a sua
abrangência. No que se refere ao trabalho que se realiza no interior da escola,
promover uma educação que enfatize os valores humanos e sociais, a resolução de
conflitos através do diálogo e a construção da justiça constitui um passo importante
para se enfrentar com determinação os desafios de superar a violência escolar.
Vivenciar valores como a amizade, a solidariedade, a justiça, exercitar o diálogo e a
participação nas diferentes instâncias escolares, cuidar do espaço físico e dos
materiais escolares, promover atividades extra-classe, intensificar as relações com
as famílias, zelar pelo bom relacionamento interpessoal, garantir espaços de
reflexão coletiva sobre a prática educativa constituem algumas das estratégias
pedagógicas para o enfrentamento da violência escolar e a construção da paz.
Dar voz aos estudantes, discutir com eles sobre suas próprias expectativas,
desvendar os ingredientes ideológicos da tarefa educacional, desenvolver formas
participativas de construção de normas são fatores que podem contribuir,
significativamente para a construção de um ser social capaz de falar, de respeitar,
de lutar pela justiça, de construir a paz. Para se enfrentar uma cultura da violência, é
necessário trabalhar por uma cultura da paz que enfatize os valores sociais e
humanos, a ética, a solidariedade, o respeito aos direitos humanos no dia a dia.
5. Algumas premissas pedagógicas fundamentais
5.1.O conhecimento: que é o objeto exclusivo da ação do professor. O âmbito de
atuação do professor é essencialmente pedagógico. Portanto ater-se ao seu campo
de conhecimento e suas regras particulares de funcionamento, nunca à moralização
dos hábitos, é uma medida fundamental.
5.2. A relação professor-aluno: que é o núcleo do trabalho pedagógico, uma vez que
o aluno é nosso parceiro, co-responsável pelo sucesso escolar. Mas é fundamental
que seja preservada a distinção entre os papéis de professor e aluno.Não se pode
esquecer nunca que é dever do professor ensinar, assim como é direito do aluno
aprender.
5.3.A sala de aula: é o contexto privilegiado para o trabalho, o microcosmo concreto
onde a educação escolar acontece de fato. É lá também que os conflitos devem ser
administrados, gerenciados.
5.4.Contratos pedagógicos: trata-se da proposta de que as regras de convivência,
muitas vezes implícitas, que orientam o funcionamento da sala de aula.
6. O QUE SE PODE FAZER?
Democratizar a escola é a linha central de todas as intervenções para diminuir
a violência em seu ambiente. A mudança na prática do sistema de ensino deve levar
à eliminação das barreiras muitas vezes não percebidas, entre os alunos e a escola.
Num trabalho que envolve ações de curto, médio e longo prazos de maturação, as
violências geradas pelo próprio sistema escolar devem ser questionadas e
subvertidas pelos seus atores.
7. UMA EXPERIÊNCIA DE SUCESSO
Segundo Aquino(2003), é passada da hora, pois, a necessidade de uma
revisão paradigmática dos valores que parecem embasar as ações/relações
constitutivas do fazer escolar contemporâneo, principalmente no que se refere às
prescrições disciplinares.A disciplina escolar é resultado tão somente de acordo
entre as partes. De outra forma, a disciplina escolar remete às pautas de convívio,
esboçadas a partir das rotinas, das expectativas e dos valores característicos das
relações escolares, os quais balizam o que fazemos e o que pensamos sobre o que
fazemos no dia a dia. Uma espécie de norte e, ao mesmo tempo, de combustível
das relações, ambos deflagradores dos laços de respeito e parceria entre alunado e
agentes escolares. Daí a proposta do contrato pedagógico.
Em linhas gerais, tal proposta implica desde o estabelecimento dos
parâmetros de conduta para ambas as partes até, principalmente, a explicitação
contínua dos objetivos, limites e horizontes da relação, sob pena de, caso contrário,
colocar-se em risco sua potência ou validade.
Também denominados “combinados” ou tão somente “acordos”, os contratos
visam à partilha da responsabilidade pelas decisões acerca das rotinas de trabalho e
das regras de convivência, a partir da tematização das exigências e condições
mínimas de funcionamento da relação professor-aluno em determinado enquadre
institucional.
Estabelecer um plano contratual significa organizar conjuntamente as rotinas
de trabalho pedagógico ( “o que” será feito) e de convivência escolar (“como” será
feito). Mas não se trata de regras fixas. Elas devem estar sempre abertas à revisão.
No meio do caminho, é inevitável recordar, ou mesmo reformular, as cláusulas. Isso
porque o grupo-classe passa por diferentes etapas progressivas no que se refere à
validação e à tomada de consciência quanto às regras de ação e de convívio: da
imposição ao consentimento e, por fim,à autodisciplina.
Uma vez ultrapassada a celebração inicial do contrato, o próximo passo
remete à implantação paulatina das rotinas de trabalho acordadas anteriormente. É
hora também de o professor antecipar-se aos alunos, não devendo esperar
anuência imediata da parte deles. Eles farão sua parte se o professor cumprir com o
que foi acordado. Trata-se de um momento ainda marcado pela reação ás atitudes
do professor. Também a relação com o campo de conhecimento será marcada pela
forte presença docente, tida como fonte externa de controle. Ou seja, os alunos
sabem o que deve ou não ser feito, mas quem inicia a ação e supervisiona o
cumprimento das regras ainda é o professor.
A terceira e última etapa do processo aponta para o consentimento voluntário
e o engajamento efetivo dos alunos em relação às regras de funcionamento do
grupo-classe. Trata-se do auge da intervenção escolar, ou seja, o momento em que
eles sabem o que deve ser feito e fazem-no por vontade própria, encarando tais
regras como parte de seu repertório pessoal e, por conseguinte, dispensando o
professor da função de supervisão coletiva.
Por essa razão, é desejável que se possa propor, discutir e definir
coletivamente desde os itens programáticos, o cronograma de atividades, as tarefas
decorrentes, as escolhas metodológicas, os critérios de avaliação, até, e
principalmente, as regras comuns de conduta em sala de aula. Se tais regras
devidamente acordadas, não haverá legitimação posterior
Dito de outra forma, a disciplina escolar remete às pautas de convívio,
esboçadas a partir das rotinas, das expectativas e dos valores característicos das
relações escolares, os quais balizam o que fazemos e o que pensamos sobre o que
fazemos no dia-a-dia. Daí a proposta do contrato pedagógico.
É desejável que se possa propor, discutir e definir coletivamente ( mas em
cada disciplina em específico) desde os itens programáticos, o cronograma de
atividades, as tarefas decorrentes, as escolhas metodológicas, os critérios de
avaliação, até, e principalmente, as regras comuns de conduta em sala de aula.
Burlas das cláusulas contratuais inevitavelmente despontarão no processo,
sejam elas individuais ou coletivas, seja de modo aberto ou velado
O rompimento dos pactos contratuais pode dar-se diante de quatro situações
específicas:
- Ambigüidade das regras: a transgressão ocorrerá quando as cláusulas não
estiverem suficientemente claras.
- Rigidez excessiva das regras: quando as cláusulas não se ajustam às
possibilidades factuais dos implicados, precisam ser adequadas a realidade do
grupo. Devido a flexibilização, pode ser o momento de repactuá-las.
- Indisposição de algum aluno:esta possibilidade de burla se dá quando, por alguma
razão incontrolável, os alunos têm uma predisposição muito negativa em relação ao
professor e resolvem sabotar as regras acordadas, como uma afronta pessoal.
- Ausência de lastro ético do professor:devido ao baixo acometimento ético-
profissional do professor, indica sua falta de autoridade moral para fazer valer os
acordos.
Porém, a exeqüibilidade dos contratos exige a contrapartida de todos os
envolvidos. Isso porque a visibilidade do aluno quanto ao seu papel é diretamente
proporcional à do professor quanto ao dele.
Por último, a definição das sanções. As sanções não podem, jamais, ser
tomadas como mecanismos de exclusão compulsória. Ao contrário, as penalidades
devem portar um caráter inclusivo e sempre de reparação ao andamento acordado
pelo grupo.
As sanções devem ser advertidas e previsíveis, deve haver clareza para
todos os alunos quanto à sua pertinência. As sanções devem ter como objetivo o
retorno ao grupo, por essa razão, elas devem ser discutidas publicamente e
aplicadas exclusivamente com vistas à solidificação dos acordos coletivos.
7.1.As assembléias de classe
Yves de La Taille , um dos estudiosos brasileiros da psicologia moral, propõe
uma inquietante reflexão que, por si só, justificaria a relevância e emergência da
educação em valores. Diz ele:
Parece certo que, hoje, vivemos um momento de certo “mal estar” ético: a despeito das claras conquistas democráticas em quase todo o planeta, há queixas generalizadas sobre violência, desrespeito ao espaço público, vandalismo, individualismo, desonestidade, ego[ismo etc(...) Daí a necessidade, reivindicada por muitos, de retomar a discussão do “contrato social” entre os indivíduos, discutir valores e princípios e incluí-los claramente nos projetos educacionais.No mundo todo, discute-se a volta da educação moral nas escolas ( 1998,p.7).
No Brasil da última década, assim como em outros países com conjunturas
sócio-econômicas diversas, uma crescente preocupação com uma educação em
valores ( às vezes sob o timbre de “educação moral”, outras vezes sob o de
“educação para a cidadania”, ou ainda “educação para a paz”) tem despontado
como fonte de inspiração para uma série de iniciativas, seja na esfera das práticas
escolares, seja no terreno das políticas públicas.
O que parece estar em pauta quando se evoca a idéia de educação em
valores é a dimensão propriamente atitudinal imanente ao trabalho educativo, e não
apenas os conteúdos morais a serem veiculados nas disciplinas. Ou seja: educar em
valores engloba diferentes dimensões, desde o ideário pedagógico corrente na
instituição até as atitudes cotidianas dos agentes escolares, passando pelas
estratégias de problematização pedagógica dos conflitos testemunhados no dia-a-
dia do alunado. Isto porque não basta veicular abstratamente conceitos e valores
democráticos, é preciso que eles sejam incorporados ao convívio intra-escolar, entre
os pares da ação escolar. É necessário que a educação em valores se materialize,
portanto em ações concretas.
No caso particular de uma educação em valores democraticamente orientada
( sinônima de educação moral),Parece haver um certo consenso quanto aos seus
objetivos:
A educação moral pode ser um âmbito de reflexão que ajude a detectar e criticar os aspectos injustos da realidade cotidiana e das normas sociais vigentes; construir formas de vida mais justas, tanto nos âmbitos interpessoais como nos coletivos; elaborar autônoma, racional e dialogicamente princípios de valor que ajudem a julgar criticamente a realidade; conseguir que os jovens faças seus aqueles tipos de comportamentos coerentes com os princípios e normas que pessoalmente construíram; fazer com que adquiram também aquelas normas que a
sociedade, de modo democrático e visando à justiça lhes deu. Dito de outro modo, a educação moral quer colaborar com os educandos para facilitar o desenvolvimento e a formação de todas aquelas capacidades que intervêm no juízo e na ação moral (Puig Rovira, 1998b,p.17).
Desse modo, temos um quadro paradigmático da educação em valores.
Dentre seus objetivos, destacam-se:
- Atribuir igual importância aos âmbitos cognitivo, afetivo e moral do aprendizado
escolar.
- Abordar temas curriculares contextualizados segundo os dilemas da cidadania
contemporânea, em particular aqueles relativos aos direitos humanos (preconceito,
desigualdade, injustiça,etc.).
- Propor sistematicamente a vivência de situações-problema, do ponto de vista do
convívio democrático, como disparadoras da construção das competências e
habilidades, ambas ancoradas, por sua vez, em valores universalmente desejáveis,
tais como eqüidade, solidariedade e justiça.
- Gerenciar os conflitos escolares numa perspectiva dialógica e de respeito mútuo, a
partir de trocas significativas entre os membros da comunidade escolar.
- Desenvolver a tomada de consciência e a capacidade autônoma de escolhas, no
que se refere ao universo não apenas do juízo moral, mas também da ação moral, o
que se traduziria numa apropriação mais significativa e conseqüente das ações
escolares por parte de seu alunado.
- Vivenciar, enfim, o próprio espaço escolar ( e em especial, a sala de aula) como
local privilegiado de participação democrática ativa e, ao mesmo tempo, de
legitimação dos fundamentos que regem o modo de vida democrático.
Avançando a discussão sobre a educação em valores , destacam-se dois
mecanismos procedimentais no que se refere à consecução de seus propósitos: o
contrato pedagógico e as assembléias de classe, estas como concebidas por Puig
Rovira (2002ª e b, 2001,2000, 1998 a e b).
A bem da verdade, trata-se de práticas de valor intimamente relacionadas e
recíprocas: as assembléias figuram como sustentação dos contratos e vice-versa.
Segundo Puig, as escolas devem ser tomadas como “comunidades
democráticas”, uma vez que se trata de um espaço social regido pelos critérios
próprios dos sistemas democráticos, cuja expressão máxima seriam as assembléias
de classe.
Herdeira das experiências de vanguarda da década de 1960, a proposta das
assembléias ressurge revigorada, dessa vez relativizando a escola como espaço de
otimização do ideário democrático. Isso porque o contexto escolar é sinônimo de um
espaço social em construção, com seus avanços e retrocessos próprios, visto que a
escola é “ um teatro de lutas e um espaço de compromisso em favor da democracia.
O futuro da escola não está escrito em nenhuma essência intrínseca nem em
nenhuma lei social inexorável. O futuro dependerá do trabalho que sobre ela levem a
cabo os implicados, desde a administração, até os alunos e alunas(Puig
Rovira,2001,p.59).
Para Puig, as assembléias de classe são momentos institucionais
privilegiados de diálogo, um dos valores democraticamente desejáveis e factíveis no
cotidiano escolar. Sua marca principal é o protagonismo e seu alvo, a co-autoria pela
construção dos valores e das atitudes características da convivência democrática.
No entendimento de Puig, as assembléias representam o momento institucional em
que o grupo-classe viabiliza a auto-reflexão, a tomada de consciência sobre si
mesmo e a conversão em tudo aquilo que seus membros consideram oportuno.
Uma assembléia de classe é, portanto, um evento escolar organizado para
que o grupo-classe ( incluídos os professores)possa discutir as questões que lhe
pareçam pertinentes ou necessárias, a fim de otimizar a ação e a convivência
democráticas. Para alcançar tal objetivo, a organização das assembléias prevê,
segundo Puig (2002b,p.28-29):
- Destinar uma pequena parte do tempo semanal a esse tipo de reunião, de maneira
que todos considerem a assembléia como uma atividade habitual da sala de aula,
que podem usar para alcançar diversas finalidades.
- Dispor o espaço da sala de aula, ás vezes, de forma distinta do habitual para
favorecer o diálogo e para fortalecer, com esse simbolismo, a atitude de cooperação
entre todos os seus membros.
- Interromper o trabalho individual da aula e modificar, de certo modo, os papéis de
alunos e professores de maneira que sua participação seja mais igualitária, embora
não idêntica nem com igual responsabilidade.
- Empregar o tempo atribuído à assembléia para falar juntos de tudo o que ocorre à
turma, ou de tudo aquilo que qualquer um de seus membros considera importante e
merecedor da atenção dos colegas.
- Dialogar com a disposição de se entender, de organizar o trabalho e de solucionar
os conflitos de convívio que possam apresentar-se.
- Dialogar, portanto, com a vontade de mudar o necessário para que a vida da turma
seja otimizada, e fazer isso com a vontade de se comprometer pessoalmente nessas
mudanças.(...)
- Finalmente, o modo de realizar as assembléias de sala de aula depende da idade
dos alunos. É evidente que as assembléias não podem ser realizadas do mesmo
modo na educação infantil ou no ensino médio. Sua necessidade e utilidade podem
ser parecidas, mas a maneira de concretizá-las varia em função da especificidade
própria de cada idade( Puig Rovira,2002b,p.28-29).
Além de tais pressupostos táticos, a assembléia de classe, na condição de
reunião centrada no diálogo, conta com diferentes funções. Esclarece Puig:
Em primeiro lugar, ela cumpre um claro papel informativo: tanto os professores, de maneira vertical, como os alunos, de maneira horizontal, podem utilizá-la para dar a conhecer tudo aquilo que considerem relevante(...).A assembléia é também uma reunião destinada à análise do ocorrido: é o tempo que se dedica a descobrir o sentido do vivido, as causas dos problemas ou as dificuldades que perturbam as tarefas escolares(...)Em terceiro lugar, na assembléia, por um lado decide-se e organiza-se o que se quer fazer e, por outro lado, regula-se a vida da turma. Projetos de trabalho e diretrizes de convivência são os dois resultados dessa função(...) Muitas vezes, as assembléias servem também como encontro catártico, como lugar para os participantes desabafar, para dizer tudo e, conseqüentemente, para um recomeço mais tranqüilo(...) Por último, as assembléias são, simplesmente, uma possibilidade para que todos digam o que desejam (IBID.,p.30-31).
No que diz respeito ao desenvolvimento das assembléias de classe, Puig
propõe três momentos claramente diferenciados: a preparação, o debate dos temas
e a aplicação dos acordos.
O primeiro momento, a “preparação”, é destinado a estabelecer os temas que
demandam debate. A classe deve contar com uma lista especialmente dedicada aos
itens passíveis de assembléia.A assembléia é presidida pelos encarregados, os
quais têm diferentes tarefas: iniciar a discussão, dar a palavra, anotar os nomes dos
que querem intervir e redigir os acordos em um papel que posteriormente será
exposto na sala.Desta feita, a assembléia converte-se num espaço de livre
participação do alunado.
O segundo momento da assembléia, o “debate dos temas”, constitui o núcleo
dessa prática educativa baseada no diálogo. Provavelmente uma das questões
prioritárias é conseguir uma certa ordenação na consideração dos temas, assim
como não perder de vista o objetivo que em cada caso se pretende. Um debate é
um intercâmbio de opiniões, razões e propostas sobre um tema visando alcançar
uma solução satisfatória para todos.A qualidade do diálogo é um dos objetivos
essenciais das assembléias de classe.
O terceiro momento da assembléia, a “aplicação dos acordos”, tem como
principal objetivo fazer com que os acordos se traduzam e se cumpram no cotidiano
da classe. Os resultados que costumam ser obtidos nas assembléias são de três
tipos: análise de certas situações difíceis; acordos e planos de ação; normas de
comportamento e propostas de trabalho.
No que concerne aos resultados formativos das assembléias de classe, Puig
aponta as seguintes capacidades: colocar-se no lugar dos outros companheiros e
imaginar como se sentem, expressar a opinião própria de forma respeitosa e
compará-la com a dos demais, entender quais situações são problemáticas e
comprometer-se com sua melhoria, ou defender uma postura pessoal oferecendo
razões para tal.
Ainda Puig destaca como desdobramentos das assembléias: a participação e
o interesse por tudo o que afeta o grupo, a colaboração entre os membros da classe,
a ajuda mútua, o reconhecimento e o apreço entre os participantes, o respeito aos
acordos coletivos e a atitude de sinceridade. Finalmente, questões afeitas à
solidariedade, igualdade, respeito às diferenças, amizade, confiança ou
responsabilidade são dimensões de valor bastante apropriadas para trabalhar nas
assembléias.
Para o autor, se as assembléias facilitam a formação de capacidades morais
e a aquisição de atitudes e valores, além de ser um bom momento para otimizar a
vida do grupo-classe, é evidente que os educadores devem atentar a ambas
finalidades. Ou seja: devem permitir que sejam focalizados os temas que interessam
ou preocupam o grupo-classe, mas, além disso, devem valer-se dessa oportunidade
para desenvolver capacidades morais desejáveis e criar hábitos orientados para o
fortalecimento do modo de vida democrático.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Construir um caminho que busque reforçar a função “formadora” da escola,
voltada para a aprendizagem escolar e cultura dos valores humanos , concebida
como um dos instrumentos de formação cultural e inclusão social e para a
construção do sujeito ético, político e social, constitui um grande desafio para
educadores.
A grande preocupação é que jamais conseguiremos acabar com os
fenômenos da indisciplina e da violência nas escolas. Porém, esses fenômenos é
que nos levam a modificar, construir novos conhecimentos e respeitar ainda mais o
outro.
As soluções para os problemas de violência são muito fáceis de serem ditas,
mas extremamente difíceis de serem executadas. Uma solução está na
democratização das relações escolares, mas como conseguir colocar em prática tal
princípio?
Não se pode esquecer que as soluções para a diminuição dos fenômenos de
violência extrapolam a competência da instituição escolar.São fenômenos
produzidos, basicamente, por fatores sociais mais amplos. A instituição educativa é,
portanto, reflexo da sociedade em que vivemos, com seus problemas e com a sua
beleza.
A intenção maior desta implementação foi ao tomar como base o diagnóstico
inicial do problema em questão, que se agrava no cotidiano escolar, poder auxiliar o
corpo docente nesta árdua tarefa das relações humanas.
Por se tratar de alunos ( pessoas), seres em permanente transformação,
diferentes entre si ( em suas ações e reações) e que constantemente procuram e
transformam o mundo, não se pode partir da idéia de que uma medida implantada
em determinado contexto, só porque obteve bons resultados, funcionará para todos
ou em outras ocasiões.
Isto posto, a implementação apresentou algumas soluções que podem ser
implantadas na escola, pois a educação deve procurar formar indivíduos que tenham
suas condutas guiadas por valores alicerçados na dignidade do ser humano. Isto
implica o desenvolvimento de valores morais, como a justiça, o respeito mútuo, a
solidariedade e o diálogo. Tais medidas são indispensáveis à existência e
consolidação de uma escola democrática.
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