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Universidade de Brasília ALESSANDRA LOPES DE SÁ OLIVEIRA A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL COMO EXPRESSÃO DA DESIGUALDADE SOCIAL A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO PARA A MUDANÇA Anápolis 2007

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Universidade de Brasília

ALESSANDRA LOPES DE SÁ OLIVEIRA

A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL COMO EXPRESSÃO DA

DESIGUALDADE SOCIAL

A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO PARA A MUDANÇA

Anápolis

2007

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ALESSANDRA LOPES DE SÁ OLIVEIRA

A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL COMO EXPRESSÃO DA

DESIGUALDADE SOCIAL

A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO PARA A MUDANÇA

Trabalho apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar. Orientador: Prof. Dr. Renato Sampaio Sadi

Anápolis

2007

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OLIVEIRA, Alessandra Lopes de Sá

A violência no futebol como expressão da desigualdade social. Anápolis, 2007.

50 p.

Monografia (Especialização em Esporte Escolar) – Universidade de Brasília. Centro de Ensino a Distância,

2007.

1. Violência 2. Futebol 3. Desigualdade Social

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ALESSANDRA LOPES DE SÁ OLIVEIRA

A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL COMO EXPRESSÃO DA

DESIGUALDADE SOCIAL

A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO PARA A MUDANÇA

Trabalho apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar pela Comissão formada pelos professores:

Presidente: Professor Doutor Renato Sampaio Sadi

Universidade de Federal de Goiás

Membro: Professora Doutora Mara Barbosa de Medeiros

Universidade de Brasília

Anápolis (GO), 09 de setembro de 2007.

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À Fernanda, minha filha de poucos meses, que me ensinou a sabedoria da espera.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, o todo de quem faço parte.

Ao meu esposo, pelo apoio de sempre. Aos professores Lucila Souto Mayor Rondon de Andrade e Efrain Maciel e Silva que

apesar da distância, estiveram presentes em todos os momentos em que foram solicitados. Aprendi com eles que um professor dedicado continuará a sê-lo mesmo que o ensino seja à distância

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RESUMO

A violência no futebol é resultado da desigualdade social, econômica e cultural do país, uma vez que fica demonstrado na vivência social do dia-a-dia as graves condições de pobreza e de dificuldades financeiras em que vive a maioria dos brasileiros. Entre tantos problemas que nos afligem o pior deles é a má distribuição de renda. Essa assimetria social por si só explica a violência no futebol. Mas a dinâmica do sistema econômico capitalista globalizado, aliado ao desenvolvimento científico-tecnológico contribui também para o surgimento de pequenos grupos de indivíduos movidos pela necessidade emocional de sentir-se acolhidos socialmente. Por isso, essas pessoas se agrupam em torno de um código de valores e interesses comuns, como as Torcidas Organizadas, por exemplo. Esses jovens, assim como a maioria dos brasileiros são produtos desse sistema político e econômico que continua favorecendo a uma minoria em detrimento de um grupo maior de pessoas. Esses indivíduos convivem com a falta de empregos, baixos salários, falta de moradias dignas, de saneamento básico, de assistência médica, ausência de um ensino crítico que motive o aluno a reflexão da própria condição social em vez de expulsá-lo e, principalmente a convivência com a escassa ou nenhuma política de incentivo às tradições culturais, todos esses fatores somados a uma personalidade que não saiba lidar com a frustração transforma um indivíduo em possível agressor num ambiente altamente provocador como os estádios de futebol num dia de jogo.

PALAVRAS CHAVES: violência, futebol, desigualdade social,

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 13

1 POR MEIO DA CULTURA OS CONFLITOS SOCIAIS SÃO EXPRESSOS

....................................................................................................................................... 15

1.1 A linguagem cultural dos jogos e do esporte ...................................................... 16

1.2 A cultura e a educação agentes de transformação social .................................. 28

2 ALGUMAS TEORIAS SOBRE A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL

....................................................................................................................................... 32

2.1 Agressividade no esporte ..................................................................................... 32

2.2 Estudo dos fatores que conduzem à violência no futebol .................................. 34

2.3 A escola e a violência no esporte ......................................................................... 41

2.4 Medidas tomadas no combate à violência .......................................................... 45

CONCLUSÃO .................................................................................................................. 47

REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 49

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INTRODUÇÃO

Não podemos apontar uma causa para a violência no futebol que não esteja

relacionada à própria natureza humana sempre desejosa de obter proveito em tudo, levando o

homem a sucumbir ao materialismo e ao incontrolável desejo de possuir poder não

importando os meios para tal.

Também nos parece pouco razoável admitir que a violência no futebol seja resultado

somente de aspectos da personalidade humana, como conduta patológica gerada por contextos

hostis e estressantes.

Assim, num primeiro momento, surgem-nos como causas da violência no futebol

fatores ligados ao contexto social, econômico e cultural do país. Quando falamos em contexto

sociocultural do país tem-se em mente o conceito de que a violência no futebol mantém uma

estreita relação com o nível socioeconômico do povo e o modelo de trabalho no sistema

econômico capitalista, considerando-se este último como o principal mecanismo que gera as

desigualdades sociais.

Dessa forma, entendemos que a violência no futebol é oriunda do mesmo contexto que

produz a exclusão social atualmente demonstrado pela ausência de políticas públicas que

facultem ao povo uma educação capaz de levá-lo a reconhecer à própria condição de

necessitado e o seu lugar no seu contexto histórico.

Nesse sentido, toda a noção de violência no futebol está subjacente à questão da

desigualdade social, resultado da má distribuição de renda em nosso país produzido pelo

modo de produção capitalista. É importante dizer que só se chega à compreensão desse fato

quando se olha criticamente para a história das relações de trabalho, trazendo-a para o calor

das discussões sobre como ocorreu e ocorre o distanciamento entre ricos e pobres. Assim por

meio de uma conduta de reflexão do problema conseguiremos minimizar os efeitos dessa

política geradora dos excluídos.

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Ainda sobre o que provoca à violência no futebol são analisados traços da

personalidade do indivíduo. Em muitos casos, esses indivíduos não possuem um aporte

psicológico forte o suficiente para lidar com várias frustrações do cotidiano. Segundo parecer

médico, uma pessoa submetida a intensos padrões de conflitos constituir-se-á um elemento de

alta periculosidade em razão das muitas provocações que surgem no decorrer da partida, em

campo.

Desta feita, essa pesquisa pretende ser relevante no sentido de trazer à discussão as

causas da violência e no mesmo interesse propor caminhos para solucioná-la.

O conteúdo desse trabalho está dividido em dois capítulos e tópicos. No primeiro

capítulo, serão conhecidas as maneiras como a cultura revela os conflitos sociais.

Apresentam-se nessa seção alguns textos com o intuito de se mostrar como as tradições

culturais são passadas às gerações, e como isso é feito. Não nos esquecendo de que a cultura

enquanto produto do fazer humano e por isso submissa às suas condições é capaz de

demonstrar aspectos sociais, políticos, econômicos e históricos de cada povo através de uma

poesia, por exemplo. Nela pode ser revelada a forma de uma sociedade lidar com os

problemas, as respostas que dão aos acontecimentos do cotidiano sejam alegres ou tristes.

Todo esse material se constitui a matéria prima da cultura.

No segundo capítulo, buscou-se demonstrar as principais teorias sobre a violência no

futebol.

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1 POR MEIO DA CULTURA OS CONFLITOS SOCIAIS SÃO EXPRESSOS

Apesar da larga capacidade de adaptação biológica e psicológica do homem, existiram

e ainda existem aspectos de sua vida que não se resolveram em razão de sua natureza instável.

O homem não é um ser acabado, intransponível, ao contrário, é um ser falho, adaptável. São

justamente essas características de sua personalidade que o levam a enfrentar desafios com a

pretensão de resolver as coisas que lhe obstam os caminhos. Ele está em contínua mobilidade,

mas não devemos pensar que ele o faça aleatoriamente. Não. É antes uma mobilidade

consciente, premeditada, que o leva a resultados.

Numa rápida leitura sobre a história da humanidade capitada dos conteúdos escolares,

observa-se que o homem foi mais bem sucedido em certos aspectos de sua vida do que em

outros. Ou seja, a sua investida sobre os elementos naturais lhe trouxe conhecimentos,

riquezas, poder. Ao passo que os seus relacionamentos sociais desde tempos remotos

experimentam momentos de intensos conflitos.

Atualmente e em nosso contexto o maior deles é o de criar condições pacíficas e

igualitárias de trabalho, de distribuição de renda, de educação e da acessibilidade aos bens

culturais. Enfim, da aquisição de uma identidade nacional que ofereça as mesmas condições

de vida a todos. Isso só advirá quando as disparidades socioeconômicas forem desarraigadas

de nossa estrutura social.

É neste contexto que esse estudo analisa a violência no futebol, como um fenômeno

contraditório ao esporte. Seguindo o raciocínio defendido pelo Programa Segundo Tempo, o

esporte deve conduzir o homem desde bem cedo a brincadeiras e práticas esportivas que lhe

instaurem a noção do outro como parte de si mesmo. Portanto alguém com quem estabelecerá

convívio de compartilhamento, sentindo-se parte do mesmo contexto. Estando com e não

contra o outro.

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1.1 A linguagem cultural dos jogos e do esporte

A respeito deste assunto, e em conformidade com o exposto em Manifestação dos

Jogos (2005), a busca de explicação sobre a origem dos jogos, dos esportes e dos movimentos

é tão antiga quanto à busca do homem pela origem da própria vida. Os movimentos humanos

foram combinados com atividades físicas orientadas para fins e objetivos sociais diferentes ao

longo do tempo histórico. Esses movimentos criativos resultaram em ações esportivas. De

acordo com isto, o jogo surge como elemento agregador de culturas ao mesmo tempo em que

as promove e as dissemina socialmente como legado a que todos têm direito. Cada sociedade

construía seus brinquedos e suas formas de jogar e por meio dessas ações lúdicas nos é

possível compreendê-las.

A verdade de um povo, segundo essa autora, Kishimoto (1993), é uma evidência de

que a cultura em suas várias linguagens sociais poderá se constituir em um relato histórico e

veemente do cotidiano onde nascem expressões de individualidade que somadas ao todo

social, torna-se a identidade de um povo.

É dessa forma que a autora constrói o conceito de cultura, uma linguagem autêntica e

em razão dessa autenticidade resiste ao tempo e se apresenta em cores vivas tais como são

conhecidas. É por isso, que as expressões artísticas, jogos, e outras, não desaparecem no

transcurso da história. Ao contrário, se resignificam no contexto de cada cultura:

Todo ser humano tem seu cotidiano marcado pela heterogeneidade e pela presença de valores hierárquicos que dão sentido às imagens culturais de cada época. Construídas por personagens que fazem parte desse contexto, tais imagens não decorrem de concepções de natureza científica, mas muito mais de informações, valores e preconceito oriundos da vida cotidiana. (KISHIMOTO, 1993, p. 7).

Sob a perspectiva dessa autora, as atividades lúdicas do homem são importantes canais

por onde são eliminados às tensões do cotidiano. Os sujeitos levam ao contexto do jogo as

impressões positivas ou negativas adquiridas nos relacionamentos mais próximos aos mais

distantes do dia-a-dia, seja qual for o relacionamento. Seguindo o raciocínio da autora,

observa-se que os conteúdos expressos culturalmente não precisam ser imediatamente os da

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realidade do sujeito. Pois o jogo constitui-se numa linguagem potencialmente capaz de

resgatar e expressar um conteúdo de uma época diferente de acordo com as especificidades de

cada cultura. Os relatos da autora são exemplos da força do jogo.

Sobre a característica dinâmica da cultura, vimos nos conteúdos apresentados por

Manifestação dos Jogos (2005, p. 48-58), que a cultura é dinâmica, já que depende totalmente

do âmbito social. De acordo com essa característica ela se torna responsável pela transmissão

das várias manifestações esportivas e de outras formas culturais coletivas. É necessário

entendermos esse assunto de forma mais adequada. O futebol continuará a ser jogado daqui a

uns cinqüenta, oitenta, cem anos, como o fazemos hoje. Essa afirmação é possível graças aos

estudos dos chamados movimentos fundantes e agonísticos, e movimentos secundários. Os

movimentos fundantes e agonísticos são responsáveis pela preservação da identidade do

movimento esportivo ao longo do tempo. Esses são considerados elementos estruturais,

específicos e necessários à realização de cada jogo.

Segundo aporte teórico supracitado, o movimento de lançamento do disco realizado no

mundo grego, por exemplo, continua a ser realizado nas Olimpíadas atuais, contudo a

identidade do jogo está preservada em seus movimentos essenciais, ou seja, fundantes. E os

movimentos secundários são constituídos, por exemplo, pelas regras e táticas do jogo.

Voltando a citar Kishimoto (1993), podemos ter em seus estudos importante fonte de

informação cultural do Brasil do início do século. A sua maior contribuição consiste em

resgatar do contexto cultural da época um pouco das brincadeiras e dos jogos. Seja da cultura

dos povos colonizadores, da cultura indígena, da cultura negra, seja do tempo dos engenhos,

seja nas pinturas que mostram as crianças brincando, no início do século, em São Paulo. A

força desse trabalho se intensifica quando conseguimos ver, nas análises das brincadeiras e

jogos infantis, um retrato do Brasil tão bem composto e descrito pela autora.

A autora analisa as brincadeiras com crescente interesse em demarcar as alterações no

ritmo e também nos temas sociais mencionados em suas letras. Os elementos essenciais à

identidade dessas formas lúdicas estão preservados. As cantigas foram se moldando às

realidades. As rimas se embaralhando criando sons engraçados.

Nesta proposta, analisaremos apenas a brincadeira do belisco apreciada pelas crianças

brasileiras dos séculos XVIII e XIX. Com o objetivo de se demonstrar como as manifestações

culturais são transmitidas, de que forma isso é feito. Vejamos:

Uma, duas angolinhas

Finca o pé na Pampolinha

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O rapaz que jogo faz?

Faz o jogo do capão.

O capão, semicapão,

Veja bem que vinte são

E recolha o seu pezinho

Na conchinha de uma mão

Que lá vai um beliscão.

Há, segundo, Kishimoto (1993) inúmeras variantes do jogo de beliscar envolvendo as

mãos, os pés e as orelhas. Este jogo identificado nos tempos do engenho continua presente na

cultura infantil brasileira com as seguintes denominações: pinicainho (Alagoas, 1952);

pinicadinho ( Pernambuco, antes de 1959); machado tora (Ceará – antes de 1966 ) uma, duas

angulinhas (RJ, 1955); puxa lagarta varre-varre e belisquinho (RJ, 1955); beliscador (SP-

antes de 1948); pintalainha (MG – antes de 1953 e Sergipe – 1986); angolinha (SP – antes de

1921) e outras como pé-de-pilão, belisco.

No Ceará, o jogo de beliscar se chama machado de tora. É brincado da seguinte

forma:

Uma pergunta:

— O machado tora?

— Não tora.

As crianças colocam as mãos sobrepostas umas as outras sobre o chão ou sobre a

mesa. A criança que inicia a brincadeira dá um murro nas mãos das crianças e sai beliscando

o dorso de cada mão, dizendo:

— Gofes, Mingofe, Bota-Fora, Tira a Mão.

Esta sai. Quem ficar de sobra, com a mão sobre o chão

Ficará encarregada de dizer:

— Machado tora.

No Rio de janeiro além dos beliscões no dorso das mãos, a mão libertada vai beliscar a

orelha da criança vizinha. Todos cantam:

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Maria Catimbeira

Do tempo da areia,

Vivia na poeira,

Puxa lagarta

Na ponta da areia...

Em São Paulo outros versos acompanham a brincadeira:

Uma, duas angolinhas,

Finca o pé na pompolinha:

Oh! Rapaz que jogo faz?

Faz o jogo do Capão!

O Capão sobre o Capão!

Lá de traz da Conceição:

Recolha o seu pezinho

Que lá vai um beliscão!

No Rio de Janeiro, uma variante do jogo, incluindo o beliscão nos pés, denominava-se

Uma, duas, angulhinhas:

Uma, duas, angulhinhas!

Bota o pé na pampulinha

O rapaz que jogo fez?

Foi o jogo do papão...

Conta bem que vinte são,

Vai dizê a Mané João,

Que recolha esta perninha,

Da conhinha do mamão...

Esse jogo consiste em uma roda de crianças com os pés estirados. A criança líder

segue cantando e beliscando os pés das outras crianças, à medida que cada criança tem seu pé

beliscado, ela o encolhe debaixo de si. Quando a contagem terminar em determinado pé, a

criança líder o belisca, e bate com ele no chão, dizendo:

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— Pé-de-pilão!

Carne seca com Feijão,

E rabinho de porco,

É muito bão...

Em Minas Gerais e Sergipe, a brincadeira se chama Pintalainha e apresenta a seguinte

versão:

Pintalainha

De cada Mindinha

Mingorra, Mingorra

Tire esta que já está forra

Ou

Sola Mengola

O rei mandou dizer

Para tirar essa mão

Fora

Em Pernambuco, há ainda uma versão mais popular chamada de “lagarta pintada”.

Essa versão é brincada em roda, com as crianças sentadas no chão com os pés juntos uns dos

outros. A criança líder segue cantando e beliscando os pés e orelhas dos demais. A criança em

cujo momento parar a cantiga terá suas orelhas puxadas pelas outras crianças:

Lagarta pintada,

Quem foi que te pintou?

Foi a velha

Cachimbeira

Que por aqui passou

No tempo da areia

Faz poeira

Puxa lagarta

Por essa ‘oreia’

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A autora chama nossa atenção para a oralidade dos versos que foram aglutinados.

Provavelmente, diz ela, de estórias, romances e poesias. A oralidade que caracteriza o

processo de transmissão fez, por exemplo, “mingorra” transforma-se em sola “mengola” e

“tire esta que está forra” para “tirar essa mão fora”. É muito interessante sua explicação: aqui

se agregam valores sociais que resistiram à passagem do tempo. Através dessas imagens

podemos conhecer uma realidade da nossa história, da nossa identidade.

O jogo fotografa a realidade. Quem poderia imaginar que o jogo da “lagarta pintada”

teria sido jogado pelas crianças brasileiras do século XVIII e XIX, em diferentes regiões do

Brasil. E como em cada lugar o jogo ganhava novos jeitos de ser brincado, incluindo o nosso

próprio jeito. Novas palavras colhidas do cotidiano daquelas crianças iam sendo incorporadas

à brincadeira. “O jogo é uma categoria maior, uma metáfora da vida, uma simulação lúdica da

realidade, que se manifesta, se concretiza, quando as pessoas praticam esportes, quando

lutam, quando fazem ginástica, ou quando as crianças brincam”, Jogo, Corpo e Escola (2004,

p. 141)

Segundo afirmação de Kishimoto (1993), os conflitos sociais foram sendo revelados no

cantarolar do negro em sua fadiga diária nos canaviais. Na pronúncia “errada” dos fonemas,

os sujeitos davam um significado pessoal ao seu drama, as suas necessidades. Neste contexto,

a língua adquiriu sua função social de revelar as intenções dos falantes.

Ainda entre os jogos de faz de conta que se destacam do cotidiano da época, há aquele

compartilhado pela sinhazinha e a menina negra. A temática da brincadeira gira em torno de

fatos que representavam o cotidiano da vida do engenho:

A senhora mandando nas criadas, as bonecas fazendo o papel de filhas, as meninas negras como as servas que obedecem as regras da pequena sinhá. Assim, alimentação, vestuário, festas, doenças, tratamentos médicos, viagens, visitas a outros engenhos, tudo servia como temática para o jogo simbólico das meninas brancas, que representavam, sempre, a família branca dominando tudo. (KISHIMOTO, 1993, p. 46).

Vimos na abordagem de Kishimoto (1993) dois aspectos importantes da cultura. O

primeiro, diz respeito ao dinamismo da cultura, exemplificado pela autora, na análise das

brincadeiras infantis de cada época. Vimos como as letras das cantigas foram sendo alteradas

à medida que eram cantadas pelas crianças e adultos ao longo do tempo, em diferentes regiões

do país. A autora diz que jamais uma brincadeira permaneceu inalterada ou foi brincada da

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mesma forma. No segundo aspecto, a autora apresenta as expressões culturais como fontes

inesgotáveis de informações sobre o modo de ser de cada povo com suas particularidades e

conflitos.

Dando seqüência a esse trabalho, mencionaremos as abordagens de Gebara apud

Bruhns (1997), porque julgamos tê-las como referência teórica de grande relevância aos

objetivos dessa pesquisa. A sua abordagem é diferente, mas não menos interessante do que a

de Kishimoto, (1993). O que há de comum entre os dois? O objeto dos seus estudos. Eles

foram buscar em documentos antigos o que procuravam para dá consistência aos seus estudos.

Na abordagem de Gebara apud Bruhns (1997), presenciamos a dominação

sociopolítica invadindo diretamente aspectos da recreação e da cultura do povo brasileiro. O

autor destaca o fato de como fomos incorporando ao nosso cotidiano de trabalho e de lazer as

imposições daqueles que nos dominavam economicamente. E como essa situação em

particular moldou nossos relacionamentos sociais. Busca-se compreender de modo mais

concreto a nossa passividade cultural, ou melhor, a tentativa de levar-nos ao inerte cultural.

Nesta perspectiva o autor mostra como o poder dos grandes proprietários de terras e de

riquezas, gerava as desigualdades sociais e ameaçava a iniciativa cultural do povo. Em suma,

para o discurso do poder, a cultura dos dominados não tem importância alguma. E tudo que

lhe diz respeito sofrerá a intervenção direta da ordem constituída. A começar pelo controle do

tempo. De acordo com Gebara apud Bruhns (1997, p. 73-78), naquela época, o tempo livre

usado em brincadeiras, danças, cantorias, bebedeiras, era considerado pelos patrões e senhores

como um tempo de vadiagem, e, que, portanto devia ser reprimido em nome das “pessoas de

bens” e para permanência da “ordem e dos bons costumes”.

Nos exemplos dados pelo do autor, além do controle da disciplina e do trabalho,

encontra-se também o controle do lazer nas populações trabalhadoras, assim como o avanço

do poder constituindo sobre a propriedade alheia, uma vez que as pessoas eram proibidas de

receber, em sua casa ou propriedade, as pessoas que quisessem. Se observarmos com atenção

os textos abaixo, veremos que as punições seriam aplicadas às pessoas livres também. Ora,

inferindo-se o teor dos textos, compreende-se que havia uma interação entre brancos e negros,

extraída do fato de que as autoridades da época, obedecendo a queixas dos “poderosos”,

proibiam a sociedade de receber em sua casa os negros e de compartilhar de suas tradições.

Vejamos:

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Art. 20 – quem permitir em sua casa reunião para dança, batuque ou jogos em que entrem escravos sem licença de seus senhores, será punido. Aos Ilmos. Srs. Fazendeiros Vendo nós abaixo assinados, diretores da sociedade Cayapó, um artigo na “Gazeta” de quinta-feira, 22 do corrente, em que os Srs. Fazendeiros pedem ao Sr. Redator que veja os inconvenientes que podem resultar da festa Cayapó (a que chamam Congo), temos a responder-lhes que: Art. 29 – Toda pessoa que na casa de sua morada consentir ajuntamentos para danças ou batuques em que entrem escravos, será multada em 15$000 e punida com três dias de prisão. Art. 199- Ficam proibidos dentro da cidade e chácaras próximas a cidade, batuques, cantorias e danças de pretos ou escravos que possam incomodar a vizinhança e o público. Multa 20$000 Art. 46 São proibidos na cidade os bailes (de qualquer natureza) de pretos, salvo com licença da autoridade policial: multa 10$ e três dias de prisão (GEBARA apud BRUHNS, 1997, p. 74-76)

Outro ponto da discussão de Gebara apud Bruhns (1997) é dirigido à cultura brasileira

inserida no aspecto socioeconômico. A sociedade capitalista, segundo ele, investe sobre a

cultura de muitas formas, a começar por nos mergulhar num clima de produção e de consumo

alienantes sem condição para um estilo de vida mais saudável por meio de práticas de

esportes.

Dessa forma, ele analisa os conceitos de tempo de trabalho e de tempo disponível

lançando-se ao fato de que a pressa cotidiana anda ao compasso da produção capitalista. O

homem se move num espaço temporal controlado. Nos parágrafos seguintes, o autor explica

como se deu o controle do tempo. O trabalho manual trazia vantagens para o homem nos

seguintes aspectos: o local de trabalho era o mesmo do seu descanso e do seu lazer, o tempo

de trabalho era controlado por ele, e obedecia as suas limitações físicas e, principalmente, o

seu ritmo. Os instrumentos que usava para fabricar seus produtos eram construídos por ele

mesmo. Concluindo, o sujeito antes da Revolução Industrial detinha o tempo e o modo de

produção. Após a Revolução, o ritmo de trabalho agora era medido em comparação ao

movimento da máquina. Essa transição do sistema da manufatura a grande indústria

contribuiu para desvalorização do homem.

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Daí para frente, os valores sociais representavam uma elite, respaldados pela ordem

econômica vigente. Com isso enormes lacunas surgiram na convivência diária dos

trabalhadores e da sociedade em geral. O tempo de trabalho e o tempo de não-trabalho são

conceitos indicadores de que as relações de trabalho correspondiam às prerrogativas da classe

dominante.

Neste mesmo sentido as palavras de Bruhns (1997) corroboram com as idéias de

Gebara apud Bruhns (1997), para ambos, o homem contemporâneo tem o seu direito de

praticar esporte usurpado pelos os mesmos agentes que controlam o seu tempo de não-

trabalho, como diz Bruhns (1997):

Vamos encontrar teorias concebendo o lazer como não-prioritário para as camadas pobres da população, sob o argumento destas não terem suprido suas necessidades básicas de saúde, alimentação e habitação. Nessa concepção, o lazer não é considerado como necessidade humana, ou se fosse assim entendido, seria um privilégio das classes mais favorecidas. (...) Tem-se observado, em relação ao lazer, uma visão funcionalista na análise do fenômeno, visão esta posicionando o homem em função do sistema vigente, buscando uma manutenção da ordem social presente. Sob essa perspectiva, o lazer é considerado como tempo de recuperação da força de trabalho, como compensação do trabalho alienante, como tempo de paz social ou um espaço para se trabalhar com os desvios das normas sociais. Ambos, tempo de trabalho e tempo de não-trabalho, na visão funcionalista, estarão atendendo às necessidades do sistema. (BRUHNS, 1997, p. 34)

Bruhns (1997) por sua vez, chama-nos a atenção para o fato de como nos adaptamos

ao contexto atual de trabalho. O trabalhador de hoje experimenta uma dificuldade de

demarcar a fronteira do espaço de trabalho com o de não-trabalho continuamente. Isso conduz

o sujeito à sensação de está ligado ao trabalho mesmo estando fora dele. Esse estado de tensão

permanente acarreta ao seu corpo problemas de ordem psicológica e física. Mas a

conseqüência mais grave é o embotamento de sua percepção crítica para causas

reivindicatórias de melhorias de trabalho e de vida.

Ainda mencionando Bruhns (1997) ao se referir à teoria de Lefebvre, sociólogo

francês, ela diz que o estado de acomodação na sociedade capitalista não agirá tão

absolutamente sobre o povo enquanto este alimentar seu espírito do desejo de lazer, de jogos e

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de esporte. Em outras palavras, é possível ao homem moderno manter a sua identidade social,

somente se der atenção a sua expressão lúdica através do lazer do jogo e do esporte. É sobre

essa concepção de sentir-se explorado que a consciência crítica agindo no cotidiano poderá

instaurar-se se revelando em movimentos reivindicatórios para o direito ao gozo do jogo e do

esporte em condições sociais dignas.

É importante o trabalho da autora porque nos oferece uma análise do homem da cidade

e o seu sofrimento com o excesso de trabalho sem que lhe seja dado às condições para a

prática de esportes. Em suma, Bruhns (1997) mostra que o homem urbano não pratica esporte

porque o trabalho não lhe dá tempo para isso. Os valores sociais atrelados aos do trabalho são

questionados na vida moderna da cidade justamente por não permitir que todos tenham as

mesmas condições de vida e as mesmas oportunidades de lazer. O consumo requer um ritmo

extenuante de produção, e de serviços. O clima de agitação prende a todos dia após dia numa

luta quase irracional pela sobrevivência.

O que mais é observado nesse assunto, é que a cultura, sinônimo de alegria, de

criatividade, de vivência das tradições populares não são marcantes nos grandes centros. Não

é que não existam. O carnaval, por exemplo, é uma expressão da cultura negra. Nele estão

agregadas outras ramificações culturais que se misturam e “explodem” em sons e cores, um

espetáculo magnífico. Contudo, o dinheiro arrecadado não retorna às comunidades carentes

dos morros: os legítimos “donos” dessa cultura.

Bruhns (1997) revela-nos uma cultura urbana sublimada, mas latente nas famílias

pobres e habitantes dos morros e dos becos das favelas. Os conhecimentos folclóricos vão

sendo passados de avós para os netos no dia-a-dia dessa gente simples que mora nas periferias

das grandes cidades. Uma vez que são os avós, em sua maioria, que cuidam dos netos para

que os pais trabalhem. A influência da televisão é bastante sentida nesses grupos sociais, mas

apesar disso a cultura está presente sendo contada, cantada ou degustada.

Por isso, Bruhns (1997) conceitua a cultura como um tempo curto de inspiração, mas

enriquecido da representatividade simbólica que transcende à feição do objeto construído.

Para a autora, o objeto realizado torna-se para o artista um símbolo de afetividade e de

liberdade. Continua: “A cultura é a compreensão do homem dos fatos que conhece, que cria,

faz, transforma”.

É certo que uma sociedade cindida pela fragmentação, seccionando o fazer e o tempo das pessoas, não poderia resistir desta maneira. Ocorre, contudo, que o movimento pelo qual se pulverizam

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práticas e consciências produz, simultaneamente, necessidade nos sujeitos sociais de recompor aquilo que está se perdendo. E não em pouco o que está em jogo. É nossa capacidade de nos reconhecermos nas práticas que realizamos; é, enfim, a oportunidade de redescobrir viva dentro de nós a seiva que nos liga a raízes comunitárias de uma vida em comum, na qual os outros homens são quais a nós em direitos e, ao mesmo tempo, diferentes no jeito de ser. O artesão, essa personagem quase banida dos tempos atuais, pode oferecer ensinamentos nesta direção. Não é o evocar nostálgico de outras épocas; é aprender com a simplicidade, com a união entre o fazer e liberdade. Liberdade de deixar voar o pensamento á busca de solução para os impasses práticos do fazer e discernimento para traduzi-los na ação que se quer realizar. Não há aí ruptura entre trabalho e diversão; não há, portanto, necessidade de um momento específico de distensão, chamado de lazer. Porque o lúdico se inscreve no fazer e o fazer se reveste de ludicidade. (BRUHNS, 1997, p. 28)

A expressão cultural seja ela uma modalidade esportiva, uma pintura, uma poesia, um

artesanato, pode ser usada como linguagem de protesto, de denúncia, ou de conformismo dos

fatos sociais. Por essa razão, qualquer tentativa de calar a cultura deve ser evitada, por se

constituir, tal feito, uma ação arbitrária, resultado de relações sociais desiguais tendentes a

reduzir as expressões culturais do povo a algo sem importância. Esporte e Sociedade (2004)

complementa essa idéia:

Nessa linha de pensamento, se todos os seres humanos produzem cultura na dinâmica de sua vida em sociedade, há que se considerar as variações de expressão dessa cultura e os diversos significados atribuídos às mesmas ações. Atuar com seres humanos sem considerar essa dinâmica cultural pode levar a certos preconceitos, discriminações ou, ainda, a certos pontos de vista absolutos que desconsiderem os reais significados inerentes às praticas humanas. (ESPORTE E SOCIEDADE, 2004, p. 76)

Em síntese, Bruhns (1997) se concentra no homem urbano e o analisa sob dois

aspectos de sua contemporaneidade: o trabalho e o lazer. Esses são os temas sobre os quais ela

se volta. A sua concepção de lazer está inserida no contexto do trabalho do homem

urbanizado. O lazer e o trabalho se imbricam, resultando no conceito de tempo de trabalho e

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de tempo de não-trabalho. Diante disso, surge na dinâmica da sociedade produtiva idéias de

regulação do tempo de lazer como compensação do trabalho. Dessa forma, as atividades de

lazer são consideradas necessárias para o descanso do tempo de trabalho. Às vezes, até o não

fazer nada é considerado como lazer.

A aparente existência de dicotomia lazer/trabalho encontra-se relacionado a tempos marcados e controlados por vários instrumentos (relógios, calendários e outros), estabelecendo espaços específicos e muito determinados, para uma e outra atividade. Dessa forma, vemos afastada (porém não impossível de conquista) a possibilidade de um trabalho mais lúdico, ou de um lazer mais comprometido com o desenvolvimento pessoal e social. A oposição radical entre trabalho e lazer poderá conduzir o segundo a uma compensação do primeiro, e o primeiro como algo detestável, pois desprovido de possibilidades criativas. É necessário, portanto, compreender a interação existente entre os dois. (BRUHNS, 1997, p. 34)

De fato, a idéia de lazer é vista aqui como necessária para o restabelecimento da força

de trabalho. A preocupação aqui é somente com as necessidades biológicas do homem. A

autora ressalta o fato de que os discursos que consideram as práticas lúdicas apenas como

necessidades biológicas, separadas da criatividade do sujeito, são contrários ao exercício da

cidadania. A construção da cidadania jamais será construída através de uma única via de

expressão. O homem é um ser multicultural. O jogo e o lúdico são componentes da

expressividade do homem como marcas de sua cultura.

A razão produtiva se afirma preponderantemente no meio social em que vivemos pela disseminação e interiorização de práticas, idéias e rotinas de trabalho. Não se restringe, todavia, às horas devotadas à produção: seu controle procura se assenhorear inclusive do não-trabalho por subentender, entre outras coisas, que todos seríamos propensos à vadiagem, caso um poder maior não refreasse nossos ímpetos. Como é difícil exercer um controle físico, haveria de ser um controle invisível, muito embora absolutamente real, feito a partir de práticas de entretenimento e distensão, insuspeitas por sua leveza. Essa a serventia do lúdico na ótica produtivista. Ocorre que, em termos de relações sociais, nada se processa tão simples e mecanicamente. Como já

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foi visto antes, as aspirações humanas vão muito além das necessidades de produção econômica. (BRUHNS, 1997, p. 31)

1.2 A cultura e a educação agentes de transformação social

De todas as formas de investimento humano para sair da opressão econômica e social,

a prática de esporte é um dos caminhos mais viáveis de o homem conseguir o

desenvolvimento de suas capacidades individuais e coletivas. Somente pela cultura advém o

conhecimento histórico de si e do universo social. O indivíduo que pratica esporte amplia seu

campo cognitivo para apreensão de outros conteúdos, de outras linguagens. É através do jogo

que o indivíduo histórico faz a sua crítica do seu cotidiano, mostrando para outras culturas

aquilo que lhe causa sofrimento, alegria, contentamento, ou seja, ter acesso à cultura como

sujeito ativo equivale a ter direito a uma vida de igualdade social.

A justiça social está relacionada com a quantidade e disponibilidade dos bens públicos a que tenham acesso os cidadãos. No público, tornam-se possíveis a equidade e a participação. O público é construído tornando-se como base a sociedade civil e se caracteriza pela capacidade duma sociedade de garantir mesmas condições e a mesma qualidade dos bens e serviços ofertados a todos sem distinção. (...) A proteção dos direitos humanos, em uma sociedade cultural, requer a observância dos direitos culturais, enquanto direitos universalmente aceitos. Não há direitos humanos, nem tampouco democracia, sem a justiça cultural, sem a diversidade e o pluralismo cultural e, nem tampouco, sem que se assegure o direito de existir, o direito à visibilidade, o direito à diferença e à dignidade cultural. (PORTO, 2006, p. 48)

De acordo com a autora, nenhum fato histórico acontece isoladamente do

contexto que o motivou, ainda que não seja possível percebê-lo na ocasião em que surgiu.

Dessa forma, é oportuno para essa pesquisa os seguintes questionamentos: De que forma o

esporte chega a população? Quem o patrocina? Para quem? O povo é mais praticante ou

observador dos esportes, por quê? De que forma o futebol produz violência? A violência no

futebol está restrita a este esporte? Ou recebe da sociedade uma influência maior que se

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substancia frente a outras questões como o desemprego, educação de baixa qualidade,

pobreza, etc.?

O processo de democratização no Brasil está nos seus primeiros passos. Mas isso não

é desculpa para que não sejam banidas dessa sociedade as suas desigualdades, como a má

distribuição de renda, ensino sem qualidade, saúde pública precária, pouco acesso à moradia,

e principalmente, no que diz respeito à participação do povo na gerência da própria cultura.

Consciência que se inicia na escola. A ausência de política de incentivo à cultura é, entre

tantos outros indicadores de atraso político-social, o mais cruel, porque também revela o

atraso na gestão da prática de esporte no contexto social e pedagógico da escola.

Porto (2006) afirma que o cerceamento ao conhecimento cultural e a sua livre

expressão é um retrocesso na busca da cidadania plena. A educação como agente de

transformação social e de formação do pensamento crítico deixa a desejar quando não se

organiza em relação às reais necessidades dos indivíduos no espaço social contemporâneo.

A escola, descrita por essa autora, não desperta a consciência para as questões que

dizem respeito ao recém formado estado democrático. Suas propostas não solucionam os

problemas vigentes de acesso ao mercado de trabalho, aos bens sociais e a outras demandas

públicas, tampouco se abre aos questionamentos sinceros que, se feitos, poderiam mudar o

papel da educação na vida política do país. A respeito disso, as palavras da autora Bruhns

(1997) dão ênfase ao vínculo entre a escola e a cultura e de que forma esta pode despertar nos

indivíduos sua consciência crítica:

[...] nota-se uma vinculação bastante estreita entre educação e cultura, apontado para a necessidade, no processo educativo, em considerar a especificidade cultural dos envolvidos. Quando a educação se fundamenta na realidade existencial dos educandos a aprendizagem significativa tem maior possibilidade de ocorrência. Integrando-se na cultura e conhecendo o seu conteúdo, o indivíduo pode compreendê-la e criar o seu sentido. (BRUHNS, 1997, p. 43).

Coelho (2006) alerta-nos para o perigo de olharmos essa questão sem lhe dá a devida

importância. É necessário focar esse assunto em todos os seus contornos. Para esse autor, as

condições políticas e econômicas atuais encaminham as instituições educativas brasileiras a

uma situação de paralisação. Porque não conseguem delimitar as reais condições de

intervenção nas demandas sociais.

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Cabe a escola a responsabilidade de redimensionar a consciência dos seus novos

atores. Para Coelho (2006), talvez ela não o faça porque esteja igualmente envolvida na

ideologia dominante. Ele nos alerta para o fato de o Estado ser co-responsável por uma série

de circunstâncias que resultam numa escola pouco atuante. Neste caso, a escola não poderá

arcar sozinha com o ônus de uma sociedade à margem das garantias dos direitos individuais e

coletivos.

Na concepção de Coelho (2006), não existe separação entre o Estado com sua classe

política, representado pelos partidos e seus organismos. O Estado se identifica com a classe

política numa relação negativa, exatamente porque não se consegue ver nitidamente, hoje, a

atuação de ambos. Essa relação assim disposta esconde as condutas antiéticas na

administração dos negócios públicos.

O autor afirma que não é para a sociedade civil que o Estado trabalha. É para a

sociedade política, aquela que se apodera da coisa pública, impedindo o povo, agora,

identificado como sociedade civil, obviamente em oposição à elite política, de usufruir de seu

destino democrático, conseguido através do direito ao voto. Direito este buscado com muita

luta através dos movimentos políticos da década de 80, que culminou nas eleições diretas para

a presidência da republica, e na elaboração de uma nova Constituição promulgada em 1988.

Contudo, esse estágio democrático a que se refere o autor é necessário para o

amadurecimento da responsabilidade cidadã. A mudança é possível quando há o sentimento

de insatisfação. O passo seguinte deverá ser a busca de si mesmo na engrenagem do

desenvolvimento social e econômico do país através da consciência do voto.

Em suma, A sociedade civil precisa se fortalecer impulsionada pela reflexão de sua

participação efetiva na gestão pública que acontece pelo voto. Em seu artigo “O Inerte

Cultural”, Coelho (2006) diz que isso não é ruim, ao contrário, agora é que realmente o povo

apoderar-se-á de sua essência política advinda do resgate de sua cultura.

É esse momento cultural simbólico que marca o instante em que se começou a romper, em cada um de nós começou a romper, apenas começou a romper, o mais forte obstáculo epistemológica enfrentado pela sociedade moderna contemporânea na busca de si mesma: aquela que se traduz na idéia de que a sociedade existe para o Estado, que o Estado é o centro de tudo e que nada se pode fazer fora dele, inclusive, o que seria cômico não fosse trágico, quando o alvo a atingir for o mercado. Fora da Igreja não há salvação, se dizia antes. Fora do Estado não há salvação, se disse e se

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insiste na modernidade. (...) o primeiro sinal na direção da construção da sociedade cívica em oposição à sociedade política. Antes da polis e para além dela está a civis, que a polis moderna e contemporânea tente controlar, instrumentalizar e esgotar. (COELHO, 2006, p. 13)

Bruhns (1997), em referência à forma como a sociedade capitalista industrial de

outrora prevaleceu àquela sociedade trabalhadora, negando ou dificultando a sua autonomia

cultural, causando-lhe imenso sofrimento, tanto pela carga excessiva do trabalho diário,

quanto pelo sentimento de opressão que lhe abatia, ressalta o anseio de libertação da classe

oprimida observada nem tanto em seus movimentos reivindicatórios abertos, mas

principalmente, pelas marcas deixadas na sua cultura. É neste sentido que o sociólogo francês

Henri Lefebvre foi citado pela autora. Assinalando a possibilidade de se interpretar

criticamente a vida cotidiana do homem urbano. Não no seu tempo de trabalho que resulta,

sob uma dinâmica de esforços involuntários, um produto alienado dos anseios de liberdade

criativa dos indivíduos. Não é a vida produtiva do homem no mercado capitalista que traduz a

sua identidade, tampouco suas queixas sobre o estado de opressão, mas sim, no seu universo

criativo onde vicejam as práticas lúdicas, diz a autora:

Para Lefebvre, é no interior das práticas de lazer e por meio delas que os homens, conscientemente ou não, realizam - na extensão de suas possibilidades – a crítica de sua vida cotidiana. Não quer ele dizer que todo lazer seja necessariamente questionador e sim que os homens almejam nos lazeres algo que o trabalho ou mesmo a vida privada em família, do modo como estão organizados na sociedade capitalista, dificilmente podem oferecer. Referia-se especialmente às aspirações da grande maioria, o enorme contingente de trabalhadores assalariados. (BRUHNS, 1997, p. 12)

Em ambos os pensamentos dos autores mencionados, Coelho (2006), e Bruhns (1997),

persistem a idéia de que é somente através do despertar da consciência crítica em prol da

cultura que poderemos experimentar uma democracia que se efetive em exemplos de

acessibilidade à própria cultura e de se viver para ela e por meio dela.

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2 ALGUMAS TEORIAS SOBRE A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL

Não é fácil compreender a violência no futebol atendo-nos apenas a uma vertente

teórica. Procuramos até aqui organizar uma pesquisa e uma discussão das possíveis causas

que explicam a violência no futebol. Como já dissemos, deparamo-nos com várias vertentes

teóricas. Cada uma, ao seu modo, contribuiu para que fosse esboçada a leitura dessa realidade.

Estacionamos num terreno onde o diálogo franco com essas vertentes foi o melhor a que

chegaríamos dessa proposta.

Optamos por ir direto ao assunto desviando-nos das teorias que a nosso ver pouco

contribuiria para uma base teórica consistente. Isso posto, a violência no futebol é antes de

tudo uma linguagem que expressa no cerne de sua existência uma profunda insatisfação com

o sistema socioeconômico vigente. As agressões físicas em campo e fora dele nas chamadas

torcidas organizadas são provas inquestionáveis desse problema.

2.1 Agressividade no esporte

Antes de entrarmos no mérito desse tema. Abordaremos conceitos necessários a uma

maior compreensão do assunto proposto.

O artigo: Agressividade e Comportamento Agressivo no Esporte, Santos, J., (2005)

constitui-se uma fonte imprescindível a esse trabalho, uma vez que este estudo aborda a

agressividade humana especificamente no esporte. Com o intuito de que fossem aferidas as

condições que proporcionariam atitudes agressivas. E quais tipos de pessoas estariam mais

suscetíveis a essas condições. Dessa forma, a violência no esporte, destacando-se as agressões

físicas, verbais e as possíveis discriminações sociais que ocorrem durante uma atividade

esportiva, estaria relacionada à violência social. Não podendo ser analisada diferente do

contexto da qual é tomada.

Segundo o autor, a violência é disparada e alimentada por fatores psicossociais de

natureza frustrante. O indivíduo, estando exposto com freqüência a ocorrências indesejáveis e

frustrantes, seria levado a se comportar violentamente em determinados contextos instigantes

desses estados psicológicos de tensão como a perda do time, por exemplo.

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O esporte é e sempre foi à representação simbólica da sociedade a qual está inserido. A influência dos modelos políticos, culturais, econômicos, os modos de produção de cada sociedade se evidenciam de certa forma nos esportes próprios a ela. Nesse contexto podemos afirmar que o esporte representa a filosofia de vida e os desejos intrínsecos de cada sociedade, sua auto-afirmação para o mundo. Na medida em que o fenômeno esportivo ganha notoriedade nas sociedades modernas, observa-se um aumento da agressão e da violência em todos as formas de manifestação do esporte principalmente no esporte de rendimento. (SANTOS, J., 2005, s.p.).

Para Santos, J., (2005), a teoria da frustração parte da hipótese de que vivência de

fracassos provoca agressões, frustrações assim como o impedimento de uma atividade

dirigida a uma meta. Dessa forma, o autor considera a frustração como elemento

desencadeador da agressividade.

A agressividade, a agressão e a violência se referem a comportamentos expressados em relação a outras pessoas, em relação a objetos do meio ou até mesmo em relação à própria pessoa. Esses comportamentos têm origem em um estado emocional denominado de raiva que, usualmente, se referem a sentimentos que variam de leves aborrecimentos, até a fúria e cólera. (SANTOS, J., 2005, s.p.).

Já para Bercowitz apud Santos, J., (2005), a frustração estimula um estado emocional

que pode ser de ira, criando uma predisposição a ações agressivas. Num sentimento, toda

derrota é sentida como uma frustração e geralmente a amplitude da mesma está na razão

direta da importância da competição perdida. Samuski apud Santos, J., (2005) a conduta

agressiva depende das tendências agressivas, da intensidade e quantidade das frustrações

passadas, de percepção de justiça, da intensidade da frustração atual que está condicionada a

esportiva diante da meta ou competição.

Segundo Santos, J., (2005), as agressões consomem energia física e psíquica e as

reações as frustrações variam de pessoa para pessoa, bem como o tipo de agressão que pode

ser física, gestual, verbal ou comportamental exemplo: Ficar nu após ser expulso do jogo.

A personalidade de uma pessoa é o resultado de uma complexa rede de influência de diversos

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fatores interdependentes como a constituição biológica e psicológicas, além das influências do meio social, ambiental e cultural em que se vive. (SANTOS, J., 2005, s.p.).

Como vimos, a violência no futebol depende de vários fatores combinados. Alguns

pontos doutrinários mencionam certos fatores que agravariam o problema, principalmente, o

clima do jogo e fatos inerentes a dinâmica do jogo. Trocas de agressões verbais durante a

partida acabariam levando os jogadores a agredirem-se fisicamente. Tal atitude contribuiria

para o aumento da violência entre os torcedores depois do jogo.

Para Becker Jr. apud Santos, J., (2005), o controle da violência no esporte poderá ser

feita:

• Medidas de longo prazo, orientação e educação e esclarecimento pela imprensa, livros,

pesquisas, congressos e sindicatos e associações de atletas

• Medidas de curto prazo, técnicas aversivas a ações agressivas e violentas

principalmente pelo professor e treinador de educação física e esportes bem como por

técnicas positivas como gratificação dos esportes mais disciplinados.

Para Crotty apud Santos, J., (2005). O primeiro passo é trabalhar a consciência do

esportista, a fim de que ele perceba que agressão não leva a algo produtivo. Será útil usar

exemplos de atletas bem sucedidos que diante da agressão não se envolvem demais e

canalizam a raiva para um melhor rendimento.

Para a prevenção e controle da agressividade, existem varias possibilidades

psicológicas como diminuir estímulos agressivos, reavaliar os estímulos agressivos, evitar

condutas agressivas e aprender formas alternativas de comportamento.

Singer apud Santos, J., (2005), o esporte provoca modificações positivas na expressão

da agressividade mais nos praticantes que nos espectadores, mesmo assim as regras e

limitações impostas podem confundir emocionalmente e provocar conflitos e pressões.

2.2 Estudo dos fatores que conduzem à violência no futebol

A partir de janeiro de 1992 a setembro de 2007, encontram-se relatos da violência no

futebol do Brasil, documentados por autores, como Pimenta (1997), estudioso deste assunto.

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À medida que a sociedade tomava conhecimento desses fatos, levados a público por meio da

imprensa falada e escrita, as indagações a respeito dos fatos tomaram conta dos programas

esportivos. Por que um esporte tão popular e tão apaixonante estava sendo alvo de estudos de

especialistas, entre quais, psicólogos, sociólogos, professores de educação física e outros

ligados ao ramo esportivo?

Seguindo a linha de argumentação do Programa Segundo Tempo, na perspectiva da

Comissão de Especialistas de Educação Física (2004), que diz que o futebol é um esporte

popular porque tem regras simples, pode ser jogado em qualquer lugar. Tudo isso é valido,

assim como as idéias que dizem que o futebol cativa tanta gente porque a história de luta

social dos jogadores e dos times confunde-se com as histórias individuais de cada um.

[...] a popularização do futebol brasileiro seria a facilidade de prática desse esporte, quer em termos de regras, como em termos de espaço e equipamentos. De fato, as regras do futebol são de fácil compreensão em relação aos outros esportes. Sua prática pode dar-se em qualquer lugar – campo, quadra, praia, terreno baldio, rua – e a bola, o único material obrigatório, pode ser representada por uma bola, de meia, de plástico,, uma lata, uma tampinha, etc. Com uniforme completo ou não, com bola de couro ou não, em um campo demarcado ou não, todos jogam futebol. (ESPORTE E SOCIEDADE, 2004, p. 87)

A autora do artigo “As torcidas e a violência no futebol”, Santos, T. (s.d.), inicia seu

texto discordando das idéias de que a violência no futebol seja causada pela presença de

gangues de delinqüentes juvenis ou marginais que vãos aos estádios para provocar confusão e

violência. Ela também refuta a idéia de que a violência seja uma resposta da massa irracional

a uma causa determinada. A violência no futebol, segundo ela, é um dos fatores estruturantes

da união e ação grupal entre os torcedores e não simplesmente como algo irracional ou uma

reação anônima da massa, conforme pensam alguns teóricos.

Santos, T. (s.d.) relaciona no seu trabalho vários autores com quem partilha suas

interpretações. De acordo com essas referências teóricas, a globalização estaria causando um

processo inverso na sociedade atual, que consiste numa busca de sua identidade social mais

imediatizada. Uma vez que as fronteiras econômicas e sociais não existam. Os grupos sociais

sentindo-se desamparados organizam-se em pequenos grupos, como as torcidas organizadas,

grupos Funks, por exemplo. Esses grupos se organizam através de regras próprias, idéias

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comuns, etc. Essa “tribalização” garante a autora está associada às tentativas de esses sujeitos

criarem novas identidades num desejo crescente de viver o momento.

O futebol, enquanto fenômeno sociocultural e arena simbólica privilegiada de onde podemos interpretar as características das sociedades globalizadas e cada vez mais virtualizada, revela uma nova configuração do espaço público, que apresenta uma rearticulação dos indivíduos, atomizados em torno de sociabilidades mais localizadas e que paradoxalmente se liga ao todo social. Entre outras palavras, isto significa que o movimento de globalização da economia e de mundialização da cultura arrasta dialeticamente consigo fragmentação da sociedade de massa em múltiplos grupos (...) tribos urbanas que se regem pela afetividade entre os pares, ligando-se a um totem comum, que no caso dos torcedores organizados são seus times e suas próprias torcidas como entidades autônomas. Isso porque essas tribos ou agrupamentos, a fim de se diferenciarem do restante da sociedade, criam identidade geralmente relacionadas aos produtos da indústria cultural, como times de futebol, grupos de rock, etc. (SANTOS, T. s.d.)

Além da noção de que os grupos se afirmam por meio de traços comuns, entre os

quais, a de se sentirem parte do contexto, a autora destaca também a mercantilização do

futebol e a mídia como fatores responsáveis pela violência no futebol. Os clubes fazem dos

jogos um mega evento, e as empresas de televisão incitam os torcedores através de palavras

de sentido violento.

De igual modo, Pimenta (s.d.) diz que é a necessidade social de pertencimento que faz

surgir no seio do macro tecido social alguns pequenos grupos. Tais ambientes facilitam o

entrosamento dos sujeitos, respondendo mais rapidamente as suas demandas sociais e

emocionais. Vejamos o que ele diz no artigo “Violência entre torcidas organizadas de

futebol”, referindo-se à década de 70, diz:

(...) a questão perpassa todo texto e remete a análise da constituição do tecido social das grandes cidades. As primeiras “torcidas organizadas” datam do fim da década de 60 e do começo dos anos 70. Neste período, o Brasil caminhava em passos largos na busca do desenvolvimento econômico e a cidade de São Paulo avançava no processo de aceleração urbana, porém,

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notoriamente desarticulado e descompromissado com as bases sociais. A violência entre torcidas organizadas não está desarticulada dos aspectos político, econômico e sociocultural vivenciados nas relações individuais e grupais na sociedade brasileira contemporânea. (PIMENTA, s.d.).

A princípio, Pimenta (s.d.) mostra-se espantado não somente pela violência em si, mas

pela violência cometida pelas torcidas. Para o autor, é importante revelar em quais

circunstâncias socioculturais, políticas e econômicas nasce a “nova categoria” de torcedor. As

primeiras torcidas organizadas datam do fim da década de 60 e começo dos anos 70. Nesse

ínterim os grandes centros caminhavam a passos largos para o desenvolvimento, porém,

desarticulados e descompromissados com as bases sociais.

(...) Conseqüentemente, o estilo de vida dos jovens, aqui denominados de novos sujeitos sociais, não pode ser dissociado dos desdobramentos causados por esses traçados político-econômicos legitimados no “jogo” social. Na década de 70, o poder de mando do complexo industrial interferiu nas macroorganizações político-econômicas, provocando grandes instabilidades nas microorganizações sociais emergentes. (...) o conflito entre os poderes econômico e social marcou a construção do espaço urbano das grandes cidades, prevalecendo o interesse do capital e, de alguma forma, esse processo interferiu, inclusive, na identidade social dos jovens que se expressam através da negação do outro (enquanto ser social), da disputa e da violência prazerosa entre os grupos rivais. Ademais, um apontamento possível desses desdobramentos é o esvaziamento da noção da coletividade na formação dos jovens, fator indispensável na compreensão dos novos sujeitos. O aumento dos atos de violência praticado pelos movimentos de “torcidas organizadas” tem decorrência no surgimento desses “sujeitos”. Estes são, predominantemente, jovens individualizados, do ponto de vista da formação de uma consciência individual e coletiva. (PIMENTA, s.d.).

Esse autor menciona as décadas de 1992 a 1994 como os períodos em que ocorreram

maior incidência de violência noticiada entre “torcidas”, o que resultou na morte de 12

pessoas, sendo quatro delas em 1992, e oito delas em 1994. Muitos esforços foram

empregados para conter as agressões e morte de jovens torcedores, mas tais medidas não

deram resultados efetivos.

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O autor menciona dois aspectos que podem estar causando ou contribuindo para a

violência no futebol. Primeiro, a influência da mídia. E o segundo, os ingredientes do próprio

jogo. Para Pimenta (s.d.), a mídia deveria se comportar eticamente em relação a esse assunto,

refletindo sobre como e quando noticiar o relato violento. Em vez disso, ela o faz sem

nenhum comprometimento ético com as pessoas e organização empenhadas em solucionar o

problema, bem como com a sociedade em geral, e principalmente consigo mesma. Pois, a

despeito do fato violento em si, a imprensa cria em torno dele um sensacionalismo que

extrapola as questões éticas. De acordo o autor, em muitos casos a mídia acaba incitando as

torcidas com palavras desafiadoras horas antes do inicio das partidas.

Outro ponto importante enfatizado pelo autor diz respeito ao fato de que às vezes a

violência é vista pela ótica dos mecanismos disciplinadores tendentes a reprimir a violência

como fatos isolados do contexto geral, acabando por intensificar os preconceitos aos negros e

pessoas de baixo poder aquisitivo. Segundo suas palavras, a ordem dominante não reconhece

que a violência possa ser constituinte de outras formas de relações sociais nas quais se

reproduzem códigos e estilo de vidas próprios. “o discurso dominante” não reconhece que o

indivíduo faz parte de um sistema social de padronização subjetiva e que recebe informações

de diversas ordens, reagindo aos estímulos como afetos, angústias, frustrações, excitações,

prazer, etc., Pimenta (s.d.).

Não cabe atribuir as causas da violência, exclusivamente, às questões de classe social ou fatores estritamente econômicos. Na composição de uma torcida participam pessoas que respondem a processos criminais, viciados, estudantes, trabalhadores das mais diversas profissões, pais de família, mulheres, jovens. Existe uma pluralidade de “agentes” que assumem diversos papéis nos “jogos” de relações sociais. (...) a torcida é um grupo diversificado. Aqui temos pessoais de todas as classes. (...), temos pessoas aqui que participam de partidos políticos (...), ricos, pobres, negros, amarelos, viciados. (PIMENTA, s.d.).

Pimenta (s.d.) diz que em muitas situações, os jogadores ao comemorar o gol dentro

do campo fazem gestos que provocam a torcida rival. Gestos agressivos que incitam a fúria

dos torcedores. Um gesto simples como levar o dedo à boca, em sinal de silêncio poderá gerar

na torcida perdedora uma reação extremamente negativa. Essa frustração somada a outras

vividas por esses sujeitos em situações diferentes do cotidiano pode levá-los ao confronto

violento, e em muitos casos fatal. Geralmente ocorridos quando os torcedores estão voltando

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para suas casas. Por esse motivo, o patrulhamento é reforçado nas saídas dos estádios e nas

adjacências dos terminais de ônibus e metrôs.

É importante mencionar aqui alguns momentos dos textos de Benevides (s.d.) que vão

na mesma direção do raciocínio de Santos, T. (s.d.), e de Pimenta (s.d.). Nessas referências

seus autores deixam transparecer o anseio de vê a sociedade repensar sua postura diante do

fenômeno da violência no futebol. Fica evidente nas análises desses escritores que a sociedade

começa a envolver-se com o assunto, pois está sentindo-se vulnerável a essa violência.

Contudo, na interpretação de Benevides (s.d.), do ponto de vista da Sociologia,

contataremos afirmações contundentes a respeito da participação política e social nessa

temática. “Quem disse que somos um povo pacífico, gentis por natureza, amantes de uma

pátria que dorme em berço esplêndido e abençoado por Deus?”. A socióloga inicia sua fala

trazendo à discussão antigos e sólidos conceitos que sutilmente sugerem uma característica

convenientemente romantizada sobre o Brasil. A intenção da autora é bastante clara, não

somos um povo pacífico e gentil por natureza. Isso é uma falácia com objetivos claros de

dominação. Mais do que nunca se questiona a verdade dessa afirmação que não se sustenta

frente à realidade brasileira atual. Em seguida, a autora retoma suas indagações da seguinte

forma:

Mas – esse é o ponto crucial – não podemos mais fingir que desconhecemos a realidade, acreditando piamente que, além de sermos um país “abençoado por Deus e bonito por natureza”, ainda somos filhos amorosos e devotos da pátria “mãe gentil”. Que gentileza? Que beleza? Que benção? Que mãe desnaturada será essa? Como diz a garotada, “caímos na real”. Essa perda da inocência tem um preço – gostaríamos tanto de continuarmos protegidos em nossas ilusões! – mas também é útil para tentarmos compreender a sociedade em que vivemos, o lado sóbrio da frágil e imperfeita natureza humana, e, acima de tudo, prepararmo-nos para discutir e encaminhar possíveis soluções. (BENEVIDES, s.d.)

Ela continua questionando a postura democrática do Brasil indo pelo caminho da

contra argumentação. Ora, se o Brasil é um país democrático, defensor dos direitos humanos,

por que temos a violência no futebol? A violência acaba por se tornar um traço de

contradição. Se o Brasil é um país de convicções pacíficas o que estaria por detrás da

violência no futebol? Por que não combater a violência, uma vez que isso é um dos direitos

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humanos, não somente em defesa dos cidadãos que pagam impostos, mas também dos que

cometem a violência?

É importante lembrar, no entanto, que o Brasil é signatário de acordos e pactos

internacionais de defesas dos direitos humanos, inclusive da Declaração de Viena (1993), a

qual reconhece que “a democracia é o regime que melhor favorece à promoção e a defesa dos

direitos humanos”. Portanto, enfrentar as diversas formas de violência é um compromisso

com a democracia, logo, com os direitos humanos. Mas estes, além da incompreensão sobre

seu significado, também são defendidos de maneira diferente pelos proprietários e pelos

despossuídos:

É evidente que práticas e situações violentas afetam diferentemente as classes, numa sociedade marcada pela maior desigualdade social do planeta. Os aposentados que morrem nas filas dos hospitais, as famílias disputando espaço debaixo dos viadutos, o despejo não-planejado de moradores em áreas valorizadas, a tortura sistemática de presos e suspeitos pobres nas delegacias são violências que refletem, para a boa consciência dos privilegiados, certa “fatalidade”, como se fosse natural e inevitável, independentemente do regime excludente que as gerou. (BENEVIDES, s.d.)

Para Benevides (s.d.), a classe política é co-autora da violência no futebol ao permitir

as desigualdades sociais pela má distribuição de renda, de posto de trabalhos, de uma efetiva

discussão dos direitos humanos. Em suma, a violência, seja ela da criminalidade comum, seja

da criminalidade institucional (dos próprios órgãos de prevenção e segurança do governo) ou

criminalidade econômica, é de natureza somente política, de acordo com a autora. Todo

conflito social circunscreve-se em torno da não acessibilidade aos bens sociais, de lazer,

emprego saúde, etc.

Tudo isso é sabido e tem sido amplamente discutido em encontros acadêmicos e jurídicos. O tema, contudo, não entusiasma a chamada “classe política”, nem os partidos – a não ser em casos exemplares que podem render alguns votos, como a defesa da pena de mote, o agravamento da repressão carcerária, a redução da idade para a imputabilidade, a defesa da intervenção militar, como na malfadada “Operação Rio”. (...) Inexiste, de meu conhecimento, uma vontade política efetiva, na esfera federal, para enfrentar eficientemente o grande crime organizado

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(narcotráfico, seqüestro, contrabando de armas), assim como o gravíssimo problema da participação da polícia, civil e militar na criminalidade. (...) Inexiste, ainda, uma tomada de consciência da sociedade de que ela também é responsável. De que o problema da violência tem raízes econômicas, sociais e culturais; que diz respeito aos governos e aos políticos, mas também às famílias, às escolas, às igrejas, às empresas, aos sindicatos e associações de profissionais, aos meios de comunicação, à sociedade civil, enfim. (BENEVIDES, s.d.)

Nessa visão, as medidas adotadas até agora para combater a violência entre torcidas

organizadas, como proibição de símbolos e reforço policial não enfrenta as causas de uma

violência que reside na falta de perspectivas da juventude das periferias e de uma classe média

cada vez mais revoltada com seu empobrecimento econômico. O mesmo poderia ser dito da

violência latente no Funk, no Rap, nas formas variadas de lazer dos jovens e da esperança

perdida.

A autora conclui seu artigo dizendo que o combate à violência, seja ela da

criminalidade comum, seja da criminalidade institucional (dos próprios órgãos de prevenção e

segurança do governo) ou da criminalidade econômica. Somente serão combatidos com ação

legitima, pois é da essência da democracia, regime baseado na soberania popular e no respeito

integral aos direitos humanos.

2.3 A escola e a violência no esporte

O autor do livro “Violência das torcidas e racismo no futebol”, Adelgício Ribeiro de

Paula, desenvolve o seu raciocínio sob a visão dos postulados de Durkhein. Dessa forma, a

sociedade em busca de sua identidade será base de seu estudo. Durkhein apud Ribeiro de

Paula vem à seguinte compreensão da sociedade: “Cada sociedade tem um tipo de eleição que

lhe define. Mas essa eleição também adquire novos significados na igual medida das

necessidades sociais”.

Há a compreensão de que as múltiplas aptidões e necessidades que a vida social exige

não pode se reproduzir simplesmente de maneira natural e hereditária.

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O sistema educacional pode criar no indivíduo um novo ser social, é no sistema educacional que o sujeito vai ser inserido num modelo de vida em sociedade, desenvolvendo formas de consenso ou pacto social, tendo oportunidades de experimentar exercer certos padrões de sociabilidade, ou seja, a internalização da moral social e do grupo. Neste entendimento somente uma educação e uma cultura voltadas amplamente para o aspecto humanístico pode dar às sociedades modernas os cidadãos de que elas têm necessidades. De tal forma a sociedade, através da educação, forja em cada indivíduo o tipo humano adequado para sua conservação e sua sobrevivência. Não apenas idealiza o modelo que o educador deve formar como o constrói. (RIBEIRO DE PAULA, 2005, s.p.)

Esse autor analisa a sociedade enquanto ente em constante transformação. Não é só

isso, a sociedade na visão do autor, satisfaz os interesses dos discursos dominantes que

subjazem à sua estrutura. E o que é mais grave, a escola reproduz em seu ambiente a

desigualdade que há fora dela. Bourdieu apud Ribeiro de Paula, (2005), “a escola reproduz os

valores da classe dominante. Durante todo o tempo a escola exclui por meio do discurso

democrático de oportunidades para todos. Subjacente a ele agem mecanismo de seleção

discriminatória”.

Os mecanismos de eliminação e exclusão ocorrem durante toda a carreira escolar, por meio de democráticas oportunidades de acesso que nada mais são do que resultado de um processo de seleção discriminatório, cujo peso é exercido com rigor desigual sobre os indivíduos de diferentes classes sociais. Atribui uma grande responsabilidade à “escola! Pela reprodução e pela legitimação das desigualdades sociais. (...) A reprodução da desigualdade torna-se tão eficaz que os objetivos das famílias reproduzem a estratificação e os membros das classes populares tomam a realidade por desejos, baseando-se nas condições objetivas de vida e excluindo qualquer possibilidade de desejar o possível. É necessário que a escola e o esporte ofereçam oportunidades objetivas de êxito para possa existir algum desejo razoável de ascensão, com esperanças mais objetivas, despertando nos sujeitos um ethos positivo de ascensão. (RIBEIRO DE PAULA, 2005, s.p.)

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É interessante observar a explicação do autor sobre o que causa a violência no futebol.

Segundo ele, os problemas que são encontrados em cada pequeno grupo social é a expressão

do que acontece numa dimensão maior da sociedade. Quer dizer: a escola, a igreja, a família,

o esporte, refletem os problemas da sociedade como um todo. Em suma, a violência, o

racismo, ascensão social desigual são representações dos problemas sociais que são levados

para essas pequenas estruturas sociais ou podem partir delas para os seguimentos sociais mais

amplos. De modo geral dizemos que os pequenos grupos sociais refletem os problemas

sociais maiores.

O grito de guerra das torcidas organizadas ultrapassa os degraus das arquibancadas e os alambrados dos estádios de futebol, trazendo disfarçado apelo ideológico formado por razões e intenções que vão muito além do gesto pela prática do futebol, carregados de conteúdos preconceituosos e racistas. Apelo ideológico que nada tem que o identifique com as cores do clube ao qual faz alusão de identidade. Ideologia exacerbada que faz apologia à intolerância, que ao invés de reunir os iguais é eficaz exatamente por unir aqueles são desiguais. (RIBEIRO DE PAULA, 2005, s.p.)

Outro aspecto a ser destacado aqui em relação à violência é o questionamento que se

faz sobre a escola e seu aparente distanciamento desse assunto e de outros que requerem seu

envolvimento direto, justamente porque ela é veículo de transformação social. Ainda que

tenhamos demonstrado aqui que a escola reproduz no seu aluno o discurso da classe

dominante. Estamos cientes de que é somente nela que repousa a esperança de mudança, uma

vez que a escola é um campo onde agem forças de diferentes aspectos ideológicos.

A escola, entretanto, não tem ido muito além do ensino de regras de “boa conduta”. A maneira como isso vem se dando ao longo da história está relacionada à sedimentação do processo de divisão tecnossocial do trabalho e a dominação de classes que, em última análise, constitui-se um mecanismo de manutenção das estruturas. (...) Obviamente, isso não acontece sem a resistência dos personagens que habitam o dia-a-dia da escola. O desconforto é generalizado, sobretudo o desconforto corporal. O corpo “fala” desse desconforto, e as crianças são as mais corajosas m revelar abertamente o que não é agradável, isto é, a rotina à qual estão sendo submetidas. Isso se

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evidencia antes mesmo dei r para escola. Já na ritualística preparatória, o mau humor é uma constante. (ESPORTE E SOCIEDADE, 2004, p. 101)

Em que pese o papel da escola na formação de consciência critica. É oportuno citar

neste espaço, objetivando uma compreensão maior do problema o seguinte:

Para que a educação seja transformadora, deve ser sobretudo crítica. Deve constituir-se em uma crítica radical da sociedade em que vivemos, crítica essa que, ao desvelar a realidade humano-social em suas contradições, baseie-se na crença em valores morais co justiça, verdade e liberdade, que se devem estender à humanidade como um todo. Sem uma visão crítica da realidade atual, a colocação de ideais perde o sentido, pois estará desvinculada da vida real. A crítica fundada nesses valores permite ao educador identificar as diferentes formas de injustiças, opressão e alienação que se efetivaram no desenrolar do processo histórico de dominação e, a partir dessa crítica, optar por práticas educativas que visem atingir dessa crítica, optar por práticas educativas que visem atingir objetivos de libertação do homem e de justiça. (GONÇALVES, 2002, p. 124).

Acredita-se que a escola deve mediada por saberes diversos, especialmente pelo da

Educação Física, desempenhar um papel importante na abordagem dos problemas recorrentes

na sociedade despertando no aluno a reflexão, motivando-o e oferecendo-lhe oportunidades

de inclusão na sociedade através do esporte.

Que visão podemos ter sobre o esporte escolar neste processo de reprodução, uma vez que a Educação Física é um componente curricular desta educação que ai se efetiva? Muitas vezes somos surpreendidos seguindo à risca certos elementos tradicionais da prática esportiva e da educação física. A escola é o lugar na sociedade que deve permitir ao indivíduo o acesso às manifestações culturais e participação na construção de uma cidadania democrática. Dentro da escola, o esporte deve ser ensinado para todos, em igualdade de condições de participação, sem qualquer forma de discriminação. Na escola os comportamentos e as regras da sociedade são largamente difundidos e onde também podem ser contestadas, e construídas

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as alternativas através dos valores encontrados no esporte. (RIBEIRO DE PAULA, 2005, s.p.).

Em relação à Educação Física, Bruhns (1997) analisa o assunto de forma interessante,

para ela, o jogo só é um espaço para a criatividade quando seus atores o praticam motivado

essencialmente pelo prazer. O jogo ensinado na escola foge ao conceito de jogo porque estaria

visando um resultado pré-estabelecido.

2.4 Medidas tomadas no combate à violência

Pela perspectiva de Santos Jr. (s.d.), a sociedade acordou finalmente para combater a

violência. Mas o que realmente pode ser feito? Novas leis serão necessárias? O que se quer da

polícia mais ousadia na repressão à violência?

A violência no futebol, diz o autor, é uma das faces da violência cotidiana na

sociedade. O esporte que, em tese, deveria ser a sublimação da violência passou a ser a

própria forma de manifestação desse fenômeno.

Impactada com a violência no futebol a sociedade buscou formas de evitá-las algumas

medidas deram certos, outras ainda precisam ser lapidadas para dá resultados, e ainda outras

medidas mostraram-se completamente fora de propósito por serem arbitrárias e

preconceituosas.

De acordo com as palavras do autor já foram adotadas algumas medidas para conter a

violência no futebol, a saber:

Medidas punitivas:

• Cerceamento ao direto de assistir a jogos;

• Prestação de serviços à comunidade no horário do jogo;

• Internação do menor agressor em estabelecimentos educacionais, até três anos,

obedecendo-se as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente;

• O cadastramento de torcedores;

• Proibição de torcidas uniformizadas nos estádios;

• Incentivo ao comparecimento de famílias aos jogos;

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Medidas direcionadas aos clubes:

• Fazer regulamentos para os campeonatos onde sejam inseridas cláusulas de punição

aos clubes cujas torcidas provocarem manifestações violentas;

• Formação de um colegiado constituído pela sociedade civil objetivando evitarem-se

posturas tendenciosas a influenciar os resultados dos jogos;

• Exigir-se dos clubes que separem uma parte da arrecadação num fundo de

assistência às vítimas das agressões e para campanhas sócio-educativas.

O autor acrescenta ainda que além das medidas supracitadas, são necessárias

campanhas educativas que repensem o papel da escola e da mídia na questão da violência no

esporte. Novamente vem à tona a postura da mídia no trato com o fato violento, para o autor,

a conduta da mídia é lamentável à medida que ela expõe a notícia de modo a aumentar a

animosidade dos torcedores.

A atitude que se espera da imprensa passa pela reflexão crítica de sua influência sobre

os torcedores e de seu potencial de mobilizar a massa a favor ou contra um determinado

assunto. Neste caso, a sua influência tem sido extremamente negativa. A longa exposição do

fato violento e a forma que é feita acabam por encorajar outros torcedores igualmente

envolvidos no clima de paixão e amor ao clube e ao time a responderem irracionalmente às

provocações dos adversários. Pensa-se que junto com a divulgação do episódio violento a

mídia, a escola e a sociedade juntas devam executar campanhas de conscientização a não

violência, focando todos os aspectos negativos expostos pelo ato. Saber as causas que geraram

o conflito debatê-las é mais produtivo do que a repetição da cena fora de um contexto sócio

educativo:

Na mesma direção a influência da Indústria Cultural e dos meios de comunicação de massa na manutenção da hegemonia conservadora indica uma dimensão mercadológica de padronização de imagens corporais e bens de cultura, reduzindo o esporte à manifestação de espetáculos, tornando-o prisioneiro do padrão único do rendimento máximo- rendimento de atletas de elite em detrimento da perspectiva educacional e de lazer. (ESPORTE E SOCIEDADE, 2004, p. 35)

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CONCLUSÃO

A questão que nos atinge e, até certo ponto incomoda, é saber, e agora, com razão de

causa, porque ainda convive-se com o absurdo da violência no futebol, mas não é só isso,

convive-se com uma escola deficitária no que diz respeito ao ensino do esporte, convive-se

com a exploração do esporte no Brasil, em especial no futebol, na qual se presencia ganhos

exorbitantes, gerados pela “indústria” do futebol.

A solução para tais problemas passa inevitavelmente pela reconstrução social no

sentido de se trazer para mais perto do povo e de sua cultura o direito de praticar esporte.

Assim como a possibilidade de efetivo engajamento em manifestações culturais próprias e de

usufruir da renda do produto cultural de sua comunidade, cidade, região, e assim

sucessivamente.

A escola aqui idealizada é aquela onde o ensino do esporte não segrega, ao contrário,

do ponto de vista metodológico, tudo é feito para garantir ao aluno o autoconhecimento

corporal que ocorre por meio de propostas, cujo objetivo é preservar o aspecto lúdico presente

no jogo. Essas brincadeiras e jogos se bem trabalhadas pedagogicamente trazem à discussão

tudo o que essas práticas podem oferecer de benefício ao aluno, à escola, à sociedade,

inseridas numa didática que resgata o jogo para o âmbito de uma nova pedagogia do esporte.

Essa pedagogia que foi construída ao longo deste curso expõe uma realidade da qual o

professor não pode se esquivar, que é a contraposição que a nova pedagogia fez a velha

pedagogia, denunciando sua ineficiência na formação de um cidadão de corpo inteiro, ou seja,

um indivíduo consciente de sua cultura corporal e geral.

Dessa forma. O conteúdo desta pedagogia consiste em construir no aluno por meio de

jogos e brincadeiras um repertório de situações que o levem à inserção social a partir do

ambiente escolar para a realidade exterior a escola. Para que esse resultado seja alcançado, os

conteúdos das aulas de Educação Física devem ser pautados em propostas que evitem o jogo-

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livre e o exagero do jogo-funcional. Neste contexto o professor é o protagonista. Somente ele

pode mediar satisfatoriamente essas situações para que o aluno seja alvo de uma intervenção

pedagógica socioeducativa.

Não vemos como a violência no futebol possa ser banida do nosso meio a não ser pelo

fortalecimento da cidadania, intermediada por uma educação forte que desperte as

consciências para a condição de dominação em que vivemos. É somente levando o

conhecimento às pessoas, tornando-as capazes de discernir os discursos interesseiros dos

idôneos que poderemos exigir do poder público e daqueles que nos representam os direitos

garantidos pela Constituição.

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