ponto de fusao

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1 A Formação de Sais no Desenvolvimento de Fármacos Aline Luci Glanzner 1 e Daniel Mendes da Silva 2 ARTIGO CIENTÍFICO Encarte da Revista Átomo Nº 8 - SINQFAR CURITIBA 2010 1 Aline Luci Glanzner ([email protected]) é farmacêutica pelo Centro Universitário Metodista IPA. 2 Daniel Mendes da Silva ([email protected]) é farmacêutico e mestre em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É também professor de graduação do curso de Farmácia do Centro Universitário Metodista IPA e da UNIVATES. Artigo Revista 8.indd 1 10.12.10 14:45:57

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  • 1A Formao de Sais no Desenvolvimento

    de Frmacos

    Aline Luci Glanzner1 e Daniel Mendes da Silva2

    ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    CuRItIbA 2010

    1 Aline Luci Glanzner ([email protected]) farmacutica pelo Centro universitrio Metodista IPA.2 Daniel Mendes da Silva ([email protected]) farmacutico e mestre em Cincias Farmacuticas pela universidade Federal do Rio Grande do Sul. tambm professor de graduao do curso de Farmcia do Centro universitrio Metodista IPA e da uNIVAtES.

    Artigo Revista 8.indd 1 10.12.10 14:45:57

  • 2ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    Sumrio

    1. Introduo 03

    2. Propsito de reviso 04

    3. Polimorfismo e Higroscopicidade 04

    4. Ponto de fuso 06

    5. Solubilidade 07

    5.1 Perfil de Solubilidade por pH 09

    5.2 Efeito on-comum 11

    6. Consideraes finais 13

    7. Referncias Bibliogrficas 14

    Artigo Revista 8.indd 2 10.12.10 14:45:58

  • 3ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    1. Introduo

    A explorao de sais a partir de cidos e bases fracos que possuem efeitos farmacolgicos

    uma das maneiras mais utilizadas para se contornar problemas no desenvolvimento de frmacos.

    Os sais tm propriedades fsicas diferentes de suas formas livres e podem ser usados para alterar

    a higroscopicidade, a estabilidade, a solubilidade e a taxa de dissoluo de um ingrediente

    farmacutico ativo.

    O aumento da solubilidade e da taxa de dissoluo pode melhorar a absoro do

    frmaco, enquanto a diminuio da higroscopicidade e o aumento da estabilidade podem facilitar

    ou at mesmo permitir sua produo comercial (Ando, Radebaugh, 2004). O efeito contrrio

    tambm pode ser o desejado: a benzilpenicilina benzatina, utilizado como antimicrobiano, um sal

    da benzilpenicilina muito pouco solvel em gua, e que, por isto, possui grande estabilidade e efeito

    prolongado no organismo; a injeo de embonato de cicloguanil (antiparasitrio), que manifestou

    atividade profiltica de at seis meses; embonatos de diidroestreptomicina (antimicrobiano),

    fendimetrazina (anfetamina) e imipramina (antidepressivo) tambm possuem ao prolongada

    (Korolkovas, burckhalter, 1988). Sais tambm so utilizados para permitir um frmaco mais

    adequado produo e comercializao: para mascarar o gosto amargo do cloranfenicol e da

    clindamicina e torn-los aceitveis s crianas, ambos foram convertidos s formas de palmitatos,

    que so inspidos (Korolkovas, burckhalter, 1988).

    At o momento nenhuma forma confivel de prever a influncia do agente formador

    de sal no comportamento do cido/base foi encontrada; apenas regras prticas qualitativas mas que

    servem apenas para algumas substncias, no sendo totalmente confiveis. Por isso, a seleo do

    contra-cido/-base apropriado para a produo de um sal com uma combinao de propriedades

    desejadas ainda realizada de forma emprica (OConnor, Corrigan, 2001a).

    Artigo Revista 8.indd 3 10.12.10 14:45:59

  • 4ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    2. Propsito da Reviso

    Esta reviso foi realizada como parte de um trabalho de pesquisa sobre a importncia da formao de sais no desenvolvimento de frmacos em geral. Esse assunto um tanto vago, com

    pouca literatura disponvel, principalmente em lngua portuguesa. A maior parte dos artigos trata

    de sais de apenas um determinado medicamento, e no de sais no geral.

    O propsito deste trabalho esclarecer a importncia da formao de sais para o

    desenvolvimento de frmacos, mostrando as principais caractersticas que podem ser alteradas:

    higroscopicidade, ponto de fuso e solubilidade. tambm sero abordados os principais problemas

    que podem decorrer da formao de sais, como o polimorfismo, a criao de solvatos e o efeito on-

    comum. Para cada uma dessas caractersticas e problemas sero apresentados exemplos reais de sais

    pesquisados na literatura revisada, a fim de demonstrar como a formao de sais influencia determinada

    caracterstica ou como determinado problema causado e o que pode ser feito para contorn-lo.

    3. Polimorfismo e Higroscopicidade

    um frmaco ideal deve manter suas propriedades fsicas por longos perodos de armazenamento

    de forma que observaes repetidas gerem as mesmas caractersticas, como ponto de fuso ou solubilidade.

    Entretanto, muitos sais so polimrficos, ou seja, so capazes de existir em duas ou mais formas cristalinas com

    diferentes arranjos e/ou conformaes de molculas e, alm disso, podem se transformar de uma forma para a

    outra no estado slido (balbach, Korn, 2004). O polimorfismo um fenmeno que pode ser observado em

    mais da metade das substncias ativas e pode ser um problema, principalmente se uma forma se transforma em

    outra com propriedades fsicas diferentes durante a produo do frmaco (Verbeeck, Kanfer, Walker, 2006).

    Isso pode gerar substncias finais com caractersticas imprevisveis. um exemplo a suspenso de palmitato

    de cloranfenicol (Huang, tong, 2004). Este sal existe em diferentes formas cristalinas (A e b), sendo que a

    forma b gera nveis no sangue muito mais altos que a forma A aps a administrao oral da suspenso. uma

    formulao da suspenso em particular pode no gerar os efeitos teraputicos esperados se contiver muito mais

    cristas na forma A que na forma b. Para evitar possveis problemas, a forma mais estvel termodinamicamente

    do frmaco preferida, onde estvel significa que no haver transformao da forma do cristal em intervalos

    aceitveis de temperatura e umidade durante o processamento e armazenamento (Stahl, 2003).

    Artigo Revista 8.indd 4 10.12.10 14:46:00

  • 5ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    Outro problema a criao de solvatos, quando molculas do solvente utilizado na

    sntese do sal so includas na estrutura cristalina, e em particular os hidratos, quando o solvente a

    gua. Materiais anidros, que geralmente possuem maior solubilidade em gua, podem se transformar

    em hidratos em contato com gua ou ar mido, mudando as caractersticas de biodisponibilidade.

    O uso de hidratos no proibido no desenvolvimento de frmacos, contanto que os intervalos de

    estabilidade climtica sejam bem conhecidos e as condies climticas sejam mantidas em nveis

    que evitem transformaes (Stahl, 2003).

    Figura 1. Adsoro/dessoro do vapor dgua de trs sais de uma base fraca. Fonte:GironeGrant(2002)

    A tendncia a formar hidratos diretamente proporcional higroscopicidade do

    sal. A higroscopicidade a capacidade de uma substncia sorver molculas de gua do ambiente

    onde se encontra, e quando aumentada pode reduzir a estabilidade do frmaco, especialmente se

    o mesmo sujeito hidrlise (Verbeeck, Kanfer, Walker, 2006). A Figura 1 ilustra os processos

    de hidratao e desidratao de trs sais de uma base fraca (Giron, Grant, 2002). A base e seu

    sal de maleato no so higroscpicos e no adsorvem gua. O sal de malonato adsorve umidade

    de forma reversvel at uma mudana de massa que excede 22%. O sal de cloridrato menos

    higroscpico, mas possvel observar uma forte histerese (quando as curvas de adsoro e

    dessoro so distintas) devido formao de um hidrato estvel. O sal de tartarato ainda menos

    higroscpico, exibindo uma discreta histerese. Esse exemplo ilustra como diferentes sais de uma

    mesma substncia podem ter valores distintos de higroscopicidade, ressaltando a importncia

    do estudo de polimorfismo e higroscopicidade dos sais candidatos a frmaco (balbach, Korn,

    2004).

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  • 6ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    4. Ponto de Fuso

    O ponto de fuso uma das mais importantes propriedades fsicas de um candidato

    a frmaco. Substncias com ponto de fuso abaixo de 100 C so difceis de processar e triturar, j

    que estas etapas da produo envolvem temperaturas elevadas, podendo ocorrer a sinterizao ou a

    prpria fuso da substncia (Stahl, Nakano, 2002). Geralmente, frmacos com baixo ponto de fuso

    exibem deformaes plsticas que podem resultar na aglomerao de partculas. Essa aglomerao

    pode alterar as propriedades de fluxo e as caractersticas de compresso, impactando negativamente

    na uniformidade da dose, na desintegrao e na taxa de dissoluo de formulaes slidas. Alm

    disso, a formao de materiais plsticos pode criar problemas para a reduo de tamanho e para o

    processamento de comprimidos, j que parte do material plstico pode aderir aos equipamentos de

    triturao e compresso (Verbeeck, Kanfer, Walker, 2006).

    uma das principais maneiras de se alterar o ponto de fuso atravs da formao de sal. O

    aumento do ponto de fuso pode contornar os problemas de deformao plstica, bem como tornar

    cidos e bases fracos com baixo peso molecular em slidos (Stahl, Nakano, 2002). Para formulaes

    slidas o ponto de fuso de uma substncia no deve ser inferior a 80 C; para candidatos a frmaco

    com ponto de fuso abaixo deste valor a formao de sal altamente recomendada (balbach, Korn,

    2004). Em alguns casos o contrrio tambm acontece, ou seja, abaixar o ponto de fuso para permitir

    o desenvolvimento de formulaes tpicas ou lquidas (Stahl, Nakano, 2002). O on conjugado

    tem um papel fundamental na determinao do ponto de fuso do sal. Geralmente ons pequenos,

    como o cloreto, aumentam o ponto de fuso devido s suas grandes densidades de carga (Giron,

    Grant, 2002). A tabela I mostra os diferentes pontos de fuso encontrados para diferentes sais de

    diclofenaco.

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  • 7ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    5. Solubilidade

    Em geral, sais de cidos ou bases orgnicas possuem maior solubilidade em gua do que

    suas correspondentes formas livres e, por isso, a formao de sal a abordagem mais utilizada para

    aumentar a solubilidade de frmacos (Sweetana, Akers, 1996). um exemplo de como a formao de

    sais pode alterar a solubilidade o diclofenaco. O diclofenaco um cido com pKa de 3,8 a 25 C e

    com baixssima solubilidade em gua (6 x 10-5 M a 25 C) (OConnor, Corrigan, 2001a). possvel

    observar na tabela I que os diferentes sais de diclofenaco possuem valores distintos de solubilidade,

    alguns dezenas de vezes maiores que outros. A solubilidade do diclofenaco um problema desde seu

    surgimento (Fini etal., 2007).

    Os sais de aminas alifticas do diclofenaco vm sendo constantemente estudados nestes

    ltimos anos (OConnor, Corrigan, 2001a; OConnor, Corrigan, 2001b, Fini et al., 1996; Fini

    etal., 1999a; Fini etal., 1999b; Fini etal., 2005; Fini etal., 2007), pois as aminas oferecem uma

    grande gama de escolha de parmetros estruturais teis para se obter diferentes comportamentos

    qumicos, fsicos e tecnolgicos do sal gerado. O problema que a formao de hidratos e a presena

    de polimorfismo tende a ser comum com o uso das aminas, necessitando de estudos aprofundados

    da estabilidade do sal antes de testes de solubilidade e pr-formulao a fim de estabelecer a forma

    mais estvel para isto (Fini etal., 2007).

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  • 8ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    Sal Solubilidade(mg/mL) Pesomolecular Pontodefuso(C) Ltio 8,2 303,07 >300 Sdio 9,6 318,13 283-285 Potssio 4,7 334,23 296-298 Rubdio 7,8 380,60 >300 Csio 6,2 428,04 275-277

    Amnia 3,0 313,18 178-180 Metilamina 2,9 327,21 172-174 Dimetilamina 4,1 341,23 178-179 trimetilamina 0,2 355,26 212-213 tetrametilamina 10,5 369,29 240-245 Dietilamina 4,1 369,29 157-159 Dipropilamina 3,7 397,33 168-169 Dibutilamina 1,6 425,40 144-147

    Pirrolidina 3,5 367,26 110-112 Piperidina 4,7 381,29 184-185 Morfolina 6,2 386,26 170-172 Piperazina 0,6 382,25 204-206 N-metil pirrolidina 3,3 381,29 209-210 N-metil piperidina 13,3 395,32 85-87 N-metil morfolina 2,6 397,26 105-108 N-metil piperazina 7,1 396,25 163-164

    Monoetanolamina 4,29 357,22 144-146 Dietanolamina 6,42 491,28 124-127 trietanolamina 7,57 445,33 132-135 tris (metilol) aminometano 1,67 417,28 194-196 N-(2-hidroxietil) pirrolidina 18,9 411,32 102-104 N-(2-hidroxietil) piperidina 5,5 425,34 122-124 N-(2-hidroxietil) morfolina 10,7 427,32 90-92 N-(2-hidroxietil) piperazina 6,4 426,33 102-104

    Fonte: Fini etal. (1996).

    Tabela 1. - Comparao entre diferentes sais de diclofenaco.

    Met

    ais a

    lcal

    inos

    Alq

    uila

    min

    as li

    near

    esA

    lqui

    lam

    inas

    cc

    licas

    Hid

    rxi

    alq

    uila

    min

    as

    Artigo Revista 8.indd 8 10.12.10 14:46:19

  • 9ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    5.1. Perfil de Solubilidade por pH

    O perfil de solubilidade a relao entre solubilidade e o pH da soluo. O perfil de

    solubilidade por pH de um cido fraco obtido pelo aumento gradual do pH atravs da adio de

    uma base a uma suspenso do cido e pela determinao da quantidade de cido dissolvido aps o

    equilbrio (Stahl, 2003) , como pode ser visto na Figura 2 para quatro diferentes sais de naproxeno,

    um cido monoprtico. No pHmax ambas as espcies cido livre e o respectivo sal coexistem no

    slido no-dissolvido (Stahl, 2003; Pudipeddi etal., 2002). O valor do pHmax constitui um descritor

    adicional do perfil de solubilidade de um sal em particular.

    Cada uma das quatro bases conjugadas utilizadas para a formao de sal limita a

    solubilidade em nveis diferentes, resultando em valores com at duas ordens de magnitude maiores

    (Chowhan, 1978). A base conjugada influi na solubilidade apenas na faixa de pH em que o cido

    fraco esteja ionizado, e, portanto, a formao de sal no consegue melhorar a solubilidade nas regies

    de baixo pH em que o cido no-ionizado prevalece. A solubilidade do cido tambm limitada

    produto de solubilidade Ksp do sal formado: uma vez que a solubilidade do sal alcanada, o controle

    de pH no consegue mais aumentar a solubilidade (Stahl, 2003; Pudipeddi etal., 2002).

    Figura 2. Perfil de solubilidade por pH de quatro sais de naproxeno em gua a 25 C.Fonte:Chowhan(1978).

    Artigo Revista 8.indd 9 10.12.10 14:46:34

  • 10

    ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    Para uma base fraca monoprtica o perfil de solubilidade por pH a imagem espelhada

    do perfil de um cido fraco, como ilustrado na Figura 3. Assim como no caso do cido, existe

    uma regio (pH> pHmax) com excesso de base no-dissolvida em sua forma livre e uma regio

    (pH< pHmax) de solubilidade constante, sendo o excesso sal. Cada cido conjugado produz um sal

    com solubilidade diferente: no caso do haloperidol (pKa 8,3), o sal mesilato (do cido conjugado

    metanossulfnico) possui solubilidade maior que o sal cloridrato (do cido conjugado clordrico), que

    por sua vez possui solubilidade maior que o sal fosfato (cido conjugado fosfrico) (Li etal., 2005).

    Figura 3. Perfil de solubilidade por pH da base fraca haloperidol.Fonte:Lietal.(2005).

    O parmetro-chave para avaliar a solubilidade por pH o pKa: no caso dos cidos, a

    solubilidade aumenta exponencialmente quando o pH ultrapassa o valor de seu pKa (Figura 2); caso

    o cido possua mais de um grupo ionizvel, a cada pKa ultrapassado a solubilidade aumentar de

    forma ainda mais elevada (Stahl, 2003). As bases fracas possuem comportamento anlogo, sendo

    que cada vez que o pH cai abaixo de um de seus pKa a solubilidade aumenta de forma ainda mais

    drstica (Figura 3).

    Artigo Revista 8.indd 10 10.12.10 14:46:58

  • 11

    ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    5.2. O Efeito on-comum

    Os cloridratos e os sais de sdio so os sais mais comuns para bases e cidos fracos, respectivamente.

    A alta ocorrncia de cloridratos e sais de sdio no acontece apenas pela sua convenincia, j que so derivados de um

    cido muito forte (cido clordrico HCl) e uma base muito forte (hidrxido de sdio NaOH) e que facilitam

    a formao de sais: os ons cloreto (Cl-) e de sdio (Na+) so os eletrlitos mais abundantes no corpo humano, e

    por isso espera-se que no causem alteraes fisiolgicas no organismo (Stahl, 2003; Engel etal., 2000). Embora

    os cloridratos e os sais de sdio possuam baixo peso molecular e baixa toxicidade, eles apresentam diminuio da

    solubilidade e da taxa de dissoluo em solues com excesso de ons de mesmo tipo pela lei da ao das massas. Essa

    reduo da solubilidade conhecida como efeito on-comum (Stahl, 2003; Engel et al., 2000).

    ons cloreto existem em abundncia nos fluidos gstricos e intestinais, prejudicando a

    solubilidade dos sais cloridratos. bogardus e blackwood (1979) compararam as taxas intrnsecas de

    dissoluo da doxiciclina em sua forma livre com seu sal cloridrato em uma soluo com 0,1 M de HCl.

    Embora o cloridrato seja mais solvel em gua, ele dissolveu-se seis vezes mais lentamente que a base

    livre, devido ao efeito on-comum. ons de sdio existem em abundncia no sangue, plasma e fluidos

    intercelulares, diminuindo a solubilidade dos sais de sdio nestes meios (Stahl, 2003).

    Li etal. (2005) realizaram um estudo para investigar os efeitos da presena de ons cloreto na

    solubilidade dos sais cloridrato, fosfato e mesilato de haloperidol, um antipsictico utilizado no tratamento de

    esquizofrenia e transtornos psicticos. O haloperidol em sua forma livre possui ponto de fuso de 151 C e

    solubilidade aquosa de 2,5 g/mL, e a solubilidade de cada um de seus sais j foi apresentada anteriormente na

    Figura 3, sendo que entre valores de pH 4 e 5 temos a seguinte ordem decrescente: mesilato >> cloridrato > fosfato.

    O estudo foi realizado atravs da medio da dissoluo de discos rotativos contendo 200 mg

    de cada um dos sais com 0,5 cm2 de rea exposta a 37 C. O primeiro teste foi realizado em uma soluo de

    0,01M de HCl, que possui pH em torno de 2 e utilizado frequentemente em testes de simulao do fluido

    gstrico, que possui pH entre 1 e 3. Os resultados encontrados esto na Figura 4 acima (pg 12).

    Os valores encontrados de dissoluo foram 2,28 mg/min/cm2 para o sal mesilato, 0,544 mg/

    min/cm2 para o sal fosfato e 0,32 mg/min/cm2 para o sal cloridrato. Em comparao com os perfis

    de solubilidade dos sais possvel observar que a taxa de dissoluo do cloridrato foi menor do que

    deveria: por ter solubilidade maior que do fosfato sua taxa de dissoluo deveria ser maior, mas

    praticamente a metade (0,32) da taxa do fosfato (0,544) devido ao efeito on-comum. Contudo,

    uma soluo de 0,01M HCl no bioequivalente ao fluido gstrico pois este possui uma maior

    concentrao de ons cloreto. Por isso, os prximos testes foram realizados adicionando-se cloreto de

    sdio (NaCl) em concentraes crescentes (0,05M, 0,1M e 0,15M) para aumentar a concentrao de

    ons cloreto. Os resultados desses testes esto na Figura 4 abaixo (pg 12).

    Artigo Revista 8.indd 11 10.12.10 14:47:00

  • 12

    ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    possvel observar que todos os sais tiveram decrscimo em suas taxas de dissoluo

    quando a concentrao de ons cloreto aumenta. O decrscimo do cloridrato explicado pelo

    efeito on-comum; j os decrscimos do fosfato e do mesilato se devem converso dos mesmos em

    cloridrato na superfcie do slido sendo dissolvido. Essa converso foi confirmada por espectroscopia

    de infravermelho, causando assim o efeito on-comum na parte convertida a cloridrato e diminuindo

    a taxa de dissoluo. O mesilato teve uma queda mais acentuada que o fosfato, provavelmente

    porque sua maior solubilidade permitiu que maiores quantidades de sal pudessem ser convertidas

    a cloridrato.

    Figura 4. Dissoluo dos sais de haloperidol em 0,01M HCl (acima) e taxa de dissoluo x concentrao de ons cloreto (abaixo). Fonte:Lietal.(2005).

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    ARTIGO CIENTFICOEncarte da Revista tomo N 8 - SINQFAR

    6. Consideraes Finais

    A formao de sal um dos mtodos mais utilizados para alterar caractersticas fsico-

    qumicas de substncias cidas ou bsicas que possuem efeitos farmacolgicos, a fim de facilitar

    ou at mesmo viabilizar o desenvolvimento de frmacos a partir destas substncias. Podem ser

    alteradas caractersticas como:

    solubilidade e taxa de dissoluo, a fim de conseguir uma maior ou menor absoro, para obteno de efeitos farmacolgicos mais rpidos ou prolongados, respectivamente;

    ponto de fuso, para tornar vivel a produo de comprimidos slidos atravs de seu aumento, ou de formulaes tpicas ou lquidas atravs de sua diminuio;

    higroscopicidade, tornando a substncia menos higroscpica para maior estabilidade.

    Entretanto, devem ser considerados alguns aspectos em relao aos sais formados. A

    tendncia de sais serem polimrficos e de criarem solvatos demanda que sais candidatos a frmacos

    sejam estudados a fim de se determinar qual a formao mais estvel e em qu condies esta

    ocorre, para no se comprometer a estabilidade. Alm disso, sais de sdio e cloridratos, embora

    vantajosos nos aspectos de formao e toxicidade, esto sujeitos reduo da taxa de dissoluo

    devido ao efeito on-comum.

    Diversos estudos investigaram as relaes entre o on conjugado utilizado e o sal

    produzido, procurando prever a influncia do on nas modificaes das caractersticas desejadas. No

    entanto, nenhuma forma confivel de prever as caractersticas do sal ainda foi descoberta, apenas

    regras prticas qualitativas, mas que no funcionam para todos os casos (OConnor, Corrigan,

    2001a). Portanto, o desenvolvimento e a seleo dos sais so realizados de forma emprica.

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    7. Referncias Bibliogrficas

    ANDO, H.; RADEbAuGH, G. Pr-formulao. In: GENNARO, Alfonso. Remington: A Cincia

    a Prtica da Farmcia. 20 ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. Cap.38, p.721-741.

    bALbACH, S.; KORN, C. Pharmaceutical evaluation of early development candidates the 100

    mg-approach. International Journal of Pharmaceutics, vol.275, p.1-12, 2004.

    bOGARDuS, J.b.; bLACKWOOD, R.K.J. Dissolution rates of doxycycline free base and

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    CHOWHAN, Z.t. pH-Solubility profiles of organic carboxylic acids and their salts. Journal of

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