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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP Sheila Aparecida Pereira de Oliveira Formação Docente: a arte literária como mediadora nas discussões reflexivas em ATPC. Mestrado Profissional em Educação: Formação de Formadores São Paulo 2018

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Sheila Aparecida Pereira de Oliveira

Formação Docente: a arte literária como mediadora nas

discussões reflexivas em ATPC.

Mestrado Profissional em Educação: Formação de

Formadores

São Paulo 2018

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP

Sheila Aparecida Pereira de Oliveira

Formação Docente: o texto literário como mediadora nas

discussões reflexivas em ATPC.

Mestrado Profissional em Educação: Formação de

Formadores

Trabalho Final apresentado à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL em Educação: FORMAÇÃO DE FORMADORES sob a orientação da Prof. (a), Dr.(a) Laurinda Ramalho de Almeida.

São Paulo

2018

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Banca Examinadora

________________________________________

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Dedicatória

Dedico esse trabalho a minha mãe Alice, por me

transmitir a coragem de seguir em frente, mesmo quando

tudo parece não dar certo, é preciso superar as

adversidades com determinação.

Obrigada pelos anos que lutou com todas as suas

forças para que eu pudesse ter uma formação adequada e

de boa qualidade, pelo incentivo e apoio em todas as

minhas decisões.

A vitória dessa conquista dedico com todo meu

amor, unicamente a Senhora!

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Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Deus por ter me sustentado até aqui e me

proporcionar chegar ao final desse percurso, apesar das adversidades que

encontrei no caminho.

A prof° Drª Laurinda Ramalho de Almeida, por não desistir de mim, pelo

carinho, paciência, persistência e dedicação em todo processo de orientação.

Aos professores do Mestrado Profissional em Formação de Formadores,

pelo comprometimento e dedicação para que nós discentes pudéssemos

desenvolver um aprendizado significativo e enriquecedor ao nosso

desenvolvimento profissional.

Aos amigos que conheci e fiz no mestrado profissional, agradeço pelas

discussões enriquecedoras e valiosas.

A minha amiga e diretora Isabel, pela confiança, parceria e oportunidade

de realizar este trabalho.

A Eliude R. Pocaia não só pela amizade, mas também parceira de trabalho

que aceitou dividir comigo a experiência de gestão escolar quando éramos

apenas duas professoras sonhadoras.

Aos docentes participantes desta pesquisa, por compartilharem comigo um

pouco de sua experiência e aprendizagem durante a formação em ATPC, o que

possibilitou o desenvolvimento dessa dissertação.

A minha madrinha Matilde e padrinho Reinaldo por todo incentivo e apoio

educacional e emocional.

A minha eterna amiga Cimere (in memoria), inteligente, leitora, amante

das artes como eu, e que com sua dedicação e amizade me ensinaram a ter

esperança sempre, apesar das dores e obstáculos que encontramos no caminho.

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Minha grande incentivadora nesse processo, mas que infelizmente não conseguiu

ver a finalização do trabalho. Saudades eternas.

A meus amigos pelo apoio, encorajamento, paciência, amizade e carinho

em todo esse percurso que por vezes foi dolorido, mais me impulsionaram a

seguir.

A Rosa Maria Marques pela amizade e companheirismo nesse processo

que por vezes quando eu quis estacionar no caminho, me empurrou a prosseguir.

Especialmente, a minha mãe por tudo que me tornei. Por seu exemplo de

amor, trabalho constante e coragem de recomeçar quando tudo era perdido. Pelo

seu estímulo, força, confiança e parceria constante em minha vida.

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“O homem não teria alcançado o possível, se inúmeras vezes

não tivesse tentado atingir o impossível”.

Max Weber

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RESUMO

Este estudo, de cunho exploratório, tem por objetivo analisar uma

formação oferecida em ATPC, utilizando a arte literária como mediadora. A

proposta de formação, inspirada na teoria psicogenética de HENRI WALLON

que postula a integração entre os conjuntos afetividade, cognição e

movimento, introduziu pequenas narrativas de Eduardo Galeano para dialogar

com textos de Paulo Freire. O contexto onde se realizou a pesquisa foi uma

escola de Ensino Fundamental II e Ensino Médio, portanto com professores

especialistas. A fala dos depoentes revelou que a utilização de diferentes

linguagens, nesse caso, a arte literária, afetou de forma positiva os

participantes da ATPC e mobilizou-os para empregar esses recursos com

seus alunos.

Palavras-chave: Formação Docente. ATPC. Arte Literária. Henri Wallon.

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ABSTRACT

This exploratory study aims to analyze a training offered in ATPC, using

literary art as a mediator. The proposal of formation, inspired by the

psychogenetic theory of HENRI WALLON that postulates the integration between

the affectivity, cognition and movement sets, introduced small narratives of

Eduardo Galeano to dialogue with texts of Paulo Freire. The context where the

research was carried out was a Primary School and Secondary School, therefore

with specialist teachers. The deponents' speech revealed that the use of different

languages, in this case, literary art, positively affected the participants of the

ATPC and mobilized them to use these resources with their students.

Keywords: Teacher Training. ATPC. Literary Art. Henri Wallon.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO: O MEU ENCONTRO COM A ARTE ...................................... 12

1. FORMAÇÃO DOCENTE E AFETIVIDADE: DO CONTÍNUO DA VIDA PARA O INTERIOR DA ESCOLA ................................................................... 19

1.1. Formação e Educação no Contínuo da Vida: a afetividade em foco. .......... ............................................................................................................ 19

1.2. A Formação Docente .......................................................................... 25

1.3. A Formação Docente Continuada na Escola ...................................... 35

1.4. ATPC: A conquista de uma formação em serviço ............................... 44

2. A IMPORTÃNCIA DA ARTE NO DESENVOLVIMENTO HUMANO ......... 53

2.1. A Arte através da Literatura na Formação Docente ............................ 60

2.2. A literatura pede passagem ................................................................ 63

3. PERCURSOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ................................. 68

3.1. Pesquisa Qualitativa: a minha opção .................................................. 68

3.2. O local da Pesquisa ............................................................................ 72

3.3. Os respondentes do questionário ....................................................... 73

3.4. Procedimento da Coleta de dados ...................................................... 74

3.5. Proposta Metodológica: Elaborando e Realizando a Formação Docente em ATPC ...................................................................................................... 75

3.6. Participantes da Pesquisa: a ATPC .................................................... 82

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................ 85

4.1. Apresentação e Análise de dados ....................................................... 85

4.2. O que os depoimentos e expressões revelam? .................................. 87

4.2.1. A que vem este texto? ........................................................................ 87

4.2.2. Um Texto literário pode se transformar em um texto pedagógico?...................................................................................................93

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... 102

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 107

ANEXOS .........................................................................................................117

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1- Jornada de Trabalho Docente.................................................50

Quadro 2- Perfil profissional dos docentes que participaram do encontro

da ATPC.............................................................................................................84

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INTRODUÇÃO: O MEU ENCONTRO COM A ARTE

Falar sobre a arte parece simples, no entanto, ao lembrar da emoção

que nos causa ao assistir qualquer representação artística e das reflexões que

nos proporcionam ao revive-las, percebemos o quanto é difícil exprimir em

palavras as emoções e pensamentos. Seja música, filme, peça teatral,

poemas, contos entre tantas outras formas de expressão, existe um

sentimento e aprendizado único, que nos leva a caminhos jamais percorridos

ou pensados e cada um traz consigo uma beleza excepcional e singular. As

formas artísticas de expressão intensificam a integração cognitiva-afetiva que

nos constitui como pessoa.

Não me recordo com exatidão em que época da vida passei a apreciar

a arte, tão pouco quando ela passou a interferir em minha vida e provocar

sensações, sentimentos e aprendizagens, mas me lembro com muita alegria

e nostalgia o cheiro das manhãs de domingo e o degrau em que me sentava

na escada de casa, acompanhada de meu padrinho que lia para mim

religiosamente as tirinhas da bruxa atrapalhada, logo depois ele me pedia

para criar a história pelo desenho que enxergava expresso no jornal e assim

acontecia. Mas a vida segue seu próprio percurso e antes que eu estivesse

alfabetizada o meu leitor favorito, de forma inesperada partiu.

Quando somos crianças por vezes os adultos tentam fazer com que a

dor da morte seja minimizada na criança, e nessa tentativa de me fazer sentir

a perda de forma menos dolorida alguns membros da família tentaram por

alguns domingos fazer o percurso da leitura comigo, no entanto, não era a

mesma coisa; não tinham a paciência do padrinho. Talvez, faltasse o principal

eu simplesmente não reconhecia neles o contador de estórias que despertava

em mim a imaginação e a interpretação que eu quisesse ter. Afinal, com o

meu leitor predileto qualquer narrativa que criasse era certa, não havia erros,

a imaginação podia fluir e ser expressada, já que não era podada, pelo

contrário era incentivada, já com os novos adultos o caminho era diferente,

simplesmente me contavam a história da tirinha, segundo a sua percepção e

não me deixavam ir além do que a imagem dizia.

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O percurso de leitura acompanhada aos domingos acabou antes que

eu fosse alfabetizada, mas como toda criança tem suas brincadeiras

preferidas a minha leitura dominical continuou existindo mesmo que solitária,

no entanto, um belo dia me dei conta que as tirinhas eram apenas imagens e

que podia sim existir a estória que eu quisesse, uma vez que percebi que as

que me contavam eram percepções do adulto sobre uma folha, inseridas num

contexto do mundo adulto que eu naquele momento não era capaz de

perceber ou entender a complexidade. Afinal, as tirinhas impressas no jornal

eram apenas imagens não tinham frases escritas e só descobri isso depois de

estar alfabetizada.

Acredito que naquele momento a arte- literatura já havia penetrado em

minha vida e já se encarregava de me revelar seus encantos e possibilidades

de ver o mundo de outra forma que não apenas aquela que está posta a olhos

nus.

Neste contexto é possível entender o que Wallon, descrevia sobre a

afetividade e aprendizagem, nas palavras de Mahoney:

“Toda pessoa é afetada por elementos externos, o olhar do outro, um objeto que chama a atenção, uma informação que recebe do meio, por sensações internas, medo, alegria, fome e responde a eles. Essa condição humana recebe o nome de afetividade e é crucial para o desenvolvimento. Todo ser humano é afetado positiva e negativamente” (MAHONEY,2011).

Hoje ao me lembrar da cena da escada, do despertar da literatura, da

arte em minha vida, não consigo evitar e tão pouco impedir que as lágrimas

rolem sobre meu rosto, no entanto, me deixa claro a importância de sermos

afetados interna e externamente por ela, pois naquela época não me dava

conta do que hoje percebo claramente: a importância da afetividade que se

fazia presente naquele momento.

Na teoria de desenvolvimento de Wallon, médico, psicólogo, educador,

que viveu na França entre 1879 e 1962, o indivíduo é o resultado da

integração do biológico com o meio social, isto, é, as características da

espécie humana e da herança biológica integrada com os diferentes meios:

físicos, sociais e culturais vão constituir a pessoa. Por sua vez, a pessoa é

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resultado do entrelaçamento de dimensões que funcionam entrelaçadas:

afetividade, cognição e movimento. Qualquer ação sobre uma dessas

dimensões afeta as outras.

Sendo assim, acredito que a escolha deste teórico para iluminar esta

pesquisa se faz oportuno, tendo em vista a ligação entre afetividade e

conhecimento.

Os anos se passaram e minha formação foi ocorrendo de forma que eu

sempre estivesse ligada a área de humanas, chegou a época do vestibular e

optei então por fazer psicologia, quiçá por já ter afinidades que naquele

momento nem me dava conta, mas que as artes assim como a psicologia por

si já se explicam, visto que ambas são para serem sentidas, vivenciadas e

trabalhadas de acordo com a percepção de cada um, cada pessoa. No curso

de psicologia erámos cotidianamente levados a pensar, imaginar e interpretar

as mais diversas situações, filmes e peças teatrais, deste modo, a arte nessas

situações sempre esteve presente e latente em minhas percepções sobre a

vida e a aprendizagem que vinha se desenvolvendo em mim.

Me formei em psicologia e iniciei na área da educação como docente

em 2002, a partir daí passei a observar, perceber e sentir o quão difícil é a

missão de ensinar que o professor lida todos os dias. Nesses anos de

docência minha relação com os alunos sempre foi muito boa, mas voltar para

a escola como educadora e ver esse ambiente e as pessoas que nele atuavam

me deixava intrigada, afinal tudo era novo e ao mesmo tempo estranho.

Acreditava que estudar deveria ser uma prática do cotidiano do

educador, talvez porque eu tenha aprendido isto em minha formação inicial, e

por anteriormente ter atuado no ramo empresarial, no qual, isto é elemento

fundamental para se manter no mercado de trabalho. No entanto, para minha

surpresa notei que na educação os docentes pareciam estar acomodados,

cansados, seja pela árdua luta com que enfrentam seus acúmulos de cargo,

escolas ou pelo fato de não terem forças. Falar sobre filmes, músicas e peças

teatrais não fazia parte do cotidiano e poucos eram os que assistiam um filme

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em cartaz e depois comentavam sobre o mesmo, ou simplesmente indicavam

algum filme que haviam gostado.

Como professora de psicologia pude apresentar diversos filmes para

os alunos e depois debatíamos o que havia por traz daquelas estórias que

assistíamos nas telas e que por vezes se vivenciava em nosso cotidiano.

Deste modo, as aulas eram enriquecidas com tantas observações diferentes

que a cada tema saíamos todos enriquecidos com as discussões que surgiam

e por vezes até por relatos de experiências vivenciadas por eles.

Após três anos de atuação, houve uma transformação na grade

curricular do Ensino Médio e a disciplina de psicologia foi eliminada, sendo

substituída por Sociologia e Filosofia. Naquele momento a Geografia já me

estimulava e decidi que faria esta graduação para continuar atuando como

docente, pois acreditava que tinha muito a contribuir na formação desses

jovens que estavam por construir seu futuro.

Atuando no Ensino Fundamental II e Médio, pude iniciar um projeto

cultural com os alunos, onde era oferecido um momento de lazer e também

cultural para os jovens que moravam no extremo da zona leste e o acesso a

teatros, cinemas, cultura é mais difícil, devido à distância, falta de dinheiro e

por vezes pelo simples fato de não conhecerem o que era um cinema ou um

teatro.

O projeto foi desenvolvido junto com um professor de artes que atuava

como iluminador em peças teatrais de renome e com artistas da televisão,

passamos a levar os alunos para assistir peças renomadas, na volta e na sala

de aula discutíamos então o conteúdo daquele espetáculo e o que ele tinha

causado de impacto para quem assistiu. O retorno dos alunos era muitas

vezes surpreendente pois, faziam associações que muitas vezes nem

imaginávamos, em outras ocasiões as respostas nos emocionavam pela

simplicidade com que comentavam até do local que haviam ido.

Certa vez, uma aluna entusiasmada ao ter ido assistir uma peça teatral

com um artista global, num teatro localizado na região dos Jardins, na cidade

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de São Paulo, comentou que havia ficado impressionada pois, o tamanho do

banheiro do teatro era maior que a sua casa inteira e que ela achava que

aquilo só existia na televisão. Naquele momento, nós educadores nos demos

conta do tamanho de nossa responsabilidade na formação cidadã daqueles

alunos, afinal não é só conteúdo que a escola transmite, vai muito além dele.

Diante disto, algumas questões surgiram para mim a respeito da

formação dos docentes que atuam na rede Estadual de São Paulo, uma vez

que notei que para muitos professores este também era o único momento de

encontro com a arte. Foi então, que passei a observar os momentos de ATPC

(Aula de Trabalho Coletivo Pedagógico), e a ficar incomodada com o que

encontrava na escola e nesses espaços e tempos de desenvolvimento, uma

vez que acredito que deveriam ser de fato utilizados para uma formação

continuada em serviço.

Assim, a partir de inquietações e na troca de experiências com colegas

da mesma escola e de outras que veem também o ATPC apenas como um

espaço de informação, atendimento a pais ou discussões que ficam apenas

no campo do achismo, surge o problema desta pesquisa. Que formação

estamos oferecendo nas ATPCs? Visto que inúmeras vezes, nota- se que não

há uma preocupação em instrumentalizar, de trazer autores com

embasamento teórico para as discussões com o intuito de fazer com que o

professor se sinta amparado quanto a uma formação em serviço.

Mas, como fazer isso de forma significativa para o professor que está

lá na escola imbuído de tantas tarefas e demandas em seu cotidiano?

Ao cursar a disciplina optativa, do curso de pós-Graduação em

Formação de Formadores, da Professora Dr° Laurinda Ramalho de Almeida,

me veio novamente a arte na questão da formação. Em todas as aulas a

professora Laurinda sempre nos levava um texto literário para terminar as

discussões teóricas, por vezes me peguei emocionada novamente e refletindo

sobre a formação que estava nos sendo oferecida naquele momento, saía das

aulas sempre correndo, e no trânsito ia refletindo como eu poderia oferecer

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aos professores que trabalham comigo uma formação que fosse de fato

significativa?

Foi então, que em conversas sobre a temática arte e formação docente

com a professora Dr° Laurinda Ramalho de Almeida, e após ler um conto de

Eduardo Galeano no final de uma aula ministrada por ela, que imediatamente

me dei conta que era essa a formação que gostaria de oferecer aos colegas

docentes. Ao relatar a orientadora qual a intenção no trabalho de pesquisa,

imediatamente me disse que seria um bom tema a ser desenvolvido e

teríamos muito a trabalhar, deste modo, deu-se início ao projeto com a

finalidade de realizar este trabalho de campo acerca do uso da arte na

formação docente.

LÜDKE e ANDRÉ (1986), ressaltam que “é igualmente importante

lembrar que, como atividade humana e social, a pesquisa traz consigo,

inevitavelmente, a carga de valores, preferencias, interesses e princípios que

orientam o pesquisador”. (LÜDKE e ANDRÉ ,1986 p. 3)

É possível mais adiante esclarecer ainda que;

[...] o pesquisador, como membro de um determinado tempo e de uma especifica sociedade, irá refletir em seu trabalho de pesquisa os valores, os princípios considerados importantes naquela sociedade, naquela época. Assim, a sua visão do mundo, os pontos de partida, os fundamentos para a compreensão e explicação desse mundo irão influenciar a maneira como ele propõe suas pesquisas ou, em outras palavras, os pressupostos que orientam seu pensamento vão também nortear sua abordagem de pesquisa” (LÜDKE e ANDRÉ,1986 p. 3).

LÜDKE e ANDRÉ (1986), chamam ainda a tenção sobre o “fenômeno

educacional estar situado dentro de um contexto histórico, pois sofre uma

série de determinações, visto que um dos desafios atualmente na pesquisa

educacional é exatamente o de tentar captar essa realidade dinâmica e

complexa do seu objeto de estudo, em sua realização histórica”. (LÜDKE e

ANDRÉ, 1986.p. 5)

Este estudo, portanto, se propõe a compreender como a escola pode

se organizar para que seja um espaço de formação continuada significativa

para os docentes que nela atuam. Nosso objetivo é analisar uma formação

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oferecida na Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo- ATPC, utilizando a arte

como mediadora na aprendizagem, para identificar como os docentes

participantes foram afetados pela utilização do texto literário nesse processo

de formação.

Uma das hipóteses desta pesquisa é que o professor não reconhece

esse espaço como momento de formação pois, não se sistematiza uma

formação que atenda suas necessidades e tão pouco que vá de encontro com

seus anseios. A segunda hipótese é que o docente não se deu conta ainda o

quanto as “artes” podem auxilia-lo em seu processo formativo e na melhoria

de sua didática em sala de aula.

Acreditamos que este trabalho será muito relevante para que gestores

e coordenadores pedagógicos reflitam e repensem sua prática de formação

neste espaço escolar, que muitas vezes não ocorre por inúmeras razões e por

vezes quando ocorre, não se tem o hábito de sistematizar um plano de

formação que atrele a arte e o desenvolvimento humano a conteúdos que por

vezes são extremamente densos.

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1. FORMAÇÃO DOCENTE E AFETIVIDADE: DO CONTÍNUO DA VIDA PARA O INTERIOR DA ESCOLA

“É preciso partir de nossas possibilidades para sermos nós mesmos.”

(Paulo Freire,1996)

Neste capítulo iremos abordar a formação docente, no atual contexto

brasileiro a luz do que se estabeleceu na educação de modo geral e através dos

estudos que se instituíram nessa área, apresentando os referenciais teóricos que

embasam este trabalho. A primeira parte deste capítulo, falaremos sobre a

formação docente e como a mesma vem ocorrendo.

A seguir, faremos uma apresentação sobre o que é, e como ocorre ou pode

ocorrer a formação continuada do professor, por acreditar que é de suma

importância para que este desenvolva o seu trabalho na escola de forma exitosa,

além de nos possibilitar compreender de que forma ela pode acontecer no

interior da escola.

Finalizaremos este capítulo apresentando e chamando a atenção para a

Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo, a ATPC, como um espaço importante

para a formação continuada do docente e o exercício da reflexão nesse processo

de desenvolvimento do professor.

1.1. Formação e Educação no Contínuo da Vida: a afetividade em foco

A palavra formação, quando ouvida vem atrelada a algumas práticas que

nela são desenvolvidas, e nos remete ao conceito de formar, moldar, adequar,

como se os outros, nesse caso, professores, educadores, se constituíssem num

banco de dados, que dão informações, conteúdos e teorias que orientam

algumas propostas formadoras. Esse conceito de formação como algo externo

ao sujeito e limitado ao conhecimento ou aquele que o transmite é limitado e

simplista.

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Para iniciarmos a discussão sobre o que vem a ser formação usaremos

Abbagnano (apud, Almeida, 2012) que diz:

Formação (al. Bildung). No sentido específico que esta palavra assume em filosofia e pedagogia, em relação com o termo alemão correspondente, ela indica o processo de educação ou de civilização, que se expressa nas duas significações de culturas; compreendida de um lado como educação, de outro lado como sistemas de valores simbólicos. (Almeida, 2012, p. 09)

Almeida (2012), ainda nos chama a atenção do que é necessário quando

falamos em formação, visto que nos referimos a educação e à cultura;

“[...] fala-se do conjunto de conhecimentos que a humanidade já construiu e do acervo que cada indivíduo acumulou em função dos grupos a que pertenceu e pertence e de suas experiências pessoais; entra-se nos terrenos de valores simbólicos, num processo que tem como intencionalidade o desenvolvimento do indivíduo, singular e social, histórico e concreto”. (Almeida, 2012, p. 10)

Henri Wallon, que, como educador foi um dos elaboradores do Plano

Langevin- Wallon sobre a reforma do Ensino Francêss, enfatiza que o papel da

escola não é simplesmente instruir, para ele escola é para formar o ser completo

e ser um instrumento para o desenvolvimento. A escola de Wallon admite que

se deve cuidar do cognitivo, reconhecendo que ao lidar com ele, estamos lidando

com o afetivo, pois dada a integração das duas dimensões, o que se conquista

no plano cognitivo é um propagar-se para o efetivo, e vice-versa, como afirma

Almeida (2012);

A nós professores, duas são particularmente importantes. Somos pessoas completas; com afeto, cognição e movimento. Somos componentes privilegiados do meio do nosso aluno. Torna-lo mais propício ao desenvolvimento é nossa responsabilidade. (Almeida, 2012, p.86).

Os processos de formação estão relacionados ao que saber, por que saber

e aos modos de saber na relação entre as pessoas. Se percebermos a relação

com os saberes constituídas de afeto, solidariedade, curiosidade, insatisfação,

provisoriedade, como próximas da vida em seu processo dinâmico e ininterrupto,

nos daremos conta das incertezas, inseguranças e das necessidades de

mudança, com elas se perdem algumas certezas, descobrem- se outras, sobre

as quais também não temos garantias do que emergem nos processos de

formação. Assim como as vezes, também somos cegos a respeito de nossa

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ignorância e optamos em nos manter no que parece mais seguro, deixamos de

nos aventurar em busca de outras possibilidades favorecidas no encontro com

os outros e perdemos por não aprendermos a buscar juntos.

Deste modo, pensar a formação docente é pensar num projeto que envolva

o ser humano como um ser completo e integrado: cognição, afetividade, corpo,

no entanto, historicamente não foi o que vimos nos processos de formação

postos nas universidades e principalmente nas propostas governamentais de

formação docente.

Segue uma breve narração sobre o processo histórico de formação em

nosso país para que possamos compreender melhor como este vem ocorrendo

e quais as possibilidades diante do que se apresenta.

A história tem nos mostrado que a partir dos anos 90, a educação vem

passando por um problema de ordem mundial e da mesma forma as questões

nas quais se atrelam a qualidade da educação.

Segundo Sanfelice (2011), nos anos 90 começou uma série de

implementações de reformas na educação, que foi estendida para uma esfera

mundial e passou a ser o centro de grandes fóruns internacionais. As reformas

tinham o objetivo de implantar políticas sociais para a América Latina revestidas

em “diretrizes” apresentadas em programas sociais e intensificadas no

movimento de assinaturas de acordos internacionais com a participação direta

de agências internacionais como, ONU, UNESCO, OIT, entre outras.

Sanfelice (2010, 2011), ressalva que o problema da educação passa a ser

tratado de modo global, e no âmbito mundial dá-se início a metas de

padronização da educação para o mundo todo, em especial para a América

Latina, alegando-se a necessidade de uma equidade, o que possibilitou que

grandes corporações empresariais, passassem a atuar em qualquer parte do

mundo, via de regra com formação minimamente qualificada, e, portanto, barata.

Inúmeros pactos e propostas de implementações se deram ao crescimento

da influência do neoliberalismo nos governos, em que os países periféricos

passaram a ser não só monitorados, mas também controlados pelo Banco

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Mundial, enquanto o Estado vai cedendo o controle das escolas às

multinacionais, exercendo sua participação apenas para promover as

implantações políticas.

Deste modo, cada vez mais as rédeas da educação vão ficando à mercê

de um mercado, que cumpre objetivos estritamente de ordem econômica e a

escola que se objetiva, passa a ter como embasamento fins mercantilistas.

Santos (2010, p.107), corrobora com essa afirmação, considerando que a

educação é regida por “macroatores” que de uma zona externa determinam e

controlam as ações internas e ganham papel de regulação subordinada às

instâncias espaciais e econômicas, em que se cumpre a “prevalência dos

interesses corporativos sobre os interesses públicos.

Como educadores não desejamos que o papel da escola no século XXI

seja restrito só a monitorar os alunos, a oferecer assistencialismo e fornecer mão

de obra a subempregos. Desejamos que seja uma escola que ofereça aos alunos

conhecimento que lhes dê acesso a melhores oportunidades, que lhes permita

o acesso e a permanência no ambiente escolar, com qualidade. E que acima de

tudo, torne o um homem- cidadão, conforme a proposta de Wallon no Projeto

Langevin- Wallon:

O conteúdo do ensino, mas também seus métodos e disciplina escolar são os meios permanentes e normais para dar à criança o gosto pela verdade, a objetividade do juízo, o espírito de livre exame e o senso crítico que farão dela um homem que escolherá suas opiniões e seus atos. (Plano Langevin- Wallon, 1969, p. 187, apud, Almeida 2010, p. 123).

Almeida (2012, p. 123) corrobora chamando a atenção que formar um

homem- cidadão significa formar uma pessoa, constituída a partir das condições

orgânicas e das condições sociais, é dar à criança e ao jovem as melhores bases

para o seu desenvolvimento motor- afetivo- cognitivo.

Para Wallon, a inteligência da pessoa se desenvolve ligada ao

desenvolvimento de toda sua personalidade, assim a escola tem que possibilitar

ao aluno as várias oportunidades de adquirir conhecimento, e deve faze-la

levando em conta a pessoa como um ser completo em processo de

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desenvolvimento, com dimensões afetivas, cognitivas e motora numa

organização de relações complexas.

Na teoria psicogenética de Henri Wallon a afetividade é vista como

constitutiva da pessoa, em integração com o conhecimento e o ato motor. Nos

deteremos aqui no conjunto afetividade, porque é o que mais fundamenta nossa

pesquisa.

Na teoria psicogenética de Wallon, a afetividade é característica da pessoa.

Na primeira fase de desenvolvimento, chamado por ele de primeiro estágio

(impulsivo- afetivo) reduz- se às manifestações fisiológicas da emoção, se

caracteriza como o ponto inicial do psiquismo.

Para Wallon, a cada estágio é possível perceber o que predomina nos

conjuntos funcionais. Principalmente no conjunto afetivo, pois é quando

podemos perceber em que estágio o indivíduo está mais voltado para si, que é

no estágio: impulsivo- emocional (0 a 1 ano), do personalismo (3 a 6 anos), e do

estágio da puberdade ou adolescência (a partir dos 11 anos), conforme

apresentado por Mendes (2017, pg. 56).

Quando chega a fase adulta a pessoa está mais segura de si, visto que já

passou pelas outras fases de desenvolvimento, espera-se que ele conheça suas

possibilidades, motivações, valores e sentimentos para fazer suas escolhas de

maneira mais adequada nas situações diversas. Ao alcançar essa maturidade o

sujeito é capaz de olhar para si e também para o outro, resultado de um equilíbrio

entre se conhecer e conhecer o mundo (MAHONEY; ALMEIDA, 2007).

No entanto, isso não constitui que o processo de desenvolvimento tenha

findado, pois em contato com o meio em que está inserido, as mudanças

continuam, ao mesmo tempo em que influencia os outros é influenciado.

A teoria Walloniana nos aponta um ponto importante em relação à

afetividade e três momentos de evolução: emoção, sentimento e paixão, Mendes

(2017, p. 56)

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A emoção é expressão orgânica da afetividade: o choro, o tremor, o sorriso,

que variam e vão adquirindo forma conforme as relações que se estabelecem

entre o sujeito e os outros com o qual convive.

Assim, podemos afirmar que a emoção é aquilo que percebemos, é aquela

expressa no corpo. Exemplo disso, é quando vemos alguém com muita dor, ela

se comprime, muda de feição ou chorar. Zazzo (apud MENDES, 2017, p. 57),

afirma que na teoria walloniana a emoção se manifesta antes mesmo da

linguagem: “a emoção esboça o pensamento, a representação que lhe é

contraditória e não contrária e dá também início à distinção do eu e de outrem,

preludia as afirmações da personalidade”.

A emoção é a expressão da afetividade, mas à medida que se expressa ela

socialmente está sujeita as interpretações sociais e culturais, nas quais modulam

e constituem-se a dinâmica do psiquismo humano. Podemos dizer então, que a

emoção é a exteriorização da afetividade através das manifestações corpóreas,

ou seja, motora, visível, ativada pelo fisiológico.

Almeida (2010) destaca que a emoção é determinante na evolução mental,

pois a criança responde a estímulos musculares (sensibilidade propioceptiva),

vicerais (sensibilidade interoceptiva) e externos (sensibilidade exteroceptiva). E

assim as trocas com o mundo externo vão ocorrendo, se afinando e pela

resposta do outro passa a produzir significações. Assim, podemos dizer que as

atitudes são resultados da emoção que é influenciada pela percepção e

interpretação do outro.

Wallon, refere-se ao sentimento como a representação da emoção, que são

elaboradas diversamente pelo sujeito, que se utiliza da linguagem, dos gestos,

da arte e da literatura para interagir. Os sentimentos estão presentes nas

relações sociais que ocorrem nos mais diferentes meios.

Pessôa (2010, p. 54), salienta que é preciso compreender: “ainda que não

há exteriorização, ou seja, uma manifestação objetiva da emoção, esta não deixa

de existir e de ser constitutiva do indivíduo, podendo, em algum momento, vir à

tona e torna-se pública (muitas vezes até de modo inadequado) ”. Ao falar sobre

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isso, vemos exposto o caso da paixão que por vezes pressupõe que o sujeito

exerça o autocontrole para atender a um objetivo, que é tornar secreta a emoção

presente para não se tornar pública. Deste modo, a paixão torna a emoção

silenciosa, como descreve Wallon (2007);

A paixão pode ser intensa e profunda na criança. Mas com ela aparece a capacidade de tornar a emoção silenciosa. Portanto, para se desenvolver, pressupõe o autocontrole da pessoa e não pode vir antes da oposição claramente sentida entre si mesmo e o outro, cuja consciência não se dá antes dos 3 anos. Então a criança se torna capaz de alimentar secretamente frenéticos ciúmes, apegos exclusivos, ambições talvez vagas, mas nem por isso menos exigentes. (WALLON, 2007, P. 126).

1.2. A Formação Docente

Há alguns anos que muito se discute sobre a temática da formação

docente, principalmente no que diz respeito à esfera educacional, e nestas

discussões a formação continuada dos professores sempre ganha ênfase.

A formação docente é considerada um pilar fundamental no processo

educativo, por tornar-se de suma importância rever os papéis dos educadores e

de sua formação, tanto inicial quanto continuada, já que é sabido que nossa

sociedade atual exige cada vez mais profissionais que aprendem o tempo todo,

pesquise, converse, crie, reconstrua, revise sua prática.

As mudanças necessárias nas práticas pedagógicas serão realizadas por

profissionais bem preparados e comprometidos com a construção de

conhecimentos, uma vez que, o que vemos nas escolas hoje é uma imensa

distância entre o perfil do educador que a sociedade exige e a realidade que

encontramos hoje dentro das unidades escolares.

Os estados da arte realizados por André, Simões, Carvalho e Brzezinski

(1999), sobre a formação de professores no Brasil no período de 1990 a 1996

nos mostra que: “(...) há um excesso de discursos sobre o tema formação

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docente, e uma escassez de dados empíricos que referenciem práticas e

políticas educacionais”.

Para Tardif (2010, p.10), não foi um fenômeno isolado e se estende

mundialmente com dez anos de antecedência, tendo em vista que a década de

80 foi um marco da ebulição científica, na qual o saber dos professores fez com

que surgissem milhares de pesquisas no mundo anglo-saxônico e, mais

recentemente, na Europa.

A análise de Perosa & Almeida (1998), expõe que desde a década de 80,

discussões sobre políticas educacionais na rede paulista de ensino vêm sendo

organizadas pelos programas de formação docente. Segundo as autoras, a

política educacional desde a década de 80, organiza-se a partir da ideia de que

formação docente é o eixo central a ser tratada na “má qualidade de ensino” e

no problema da exclusão escolar.

As autoras argumentam que este fato se dá devido a impossibilidade que

o governo encontra em explicar “a má qualidade” do ensino fundamental pelas

características dos alunos, fazendo-o pelas características acadêmicas dos

professores e pela indiferença ás condições concretas do trabalho docente.

Deste modo, explica que:

Os programas em serviço tornaram-se a solução natural e um aspecto central da política educacional na medida que o espaço de formação regular dos professores da escola pública foi atingido pelo mesmo diagnóstico e que as condições objetivas de exercício da profissão (salários, ausência de plano de carreira, condições materiais das escolas) são ignoradas. (PEROSA & ALMEIDA, 1998, p.32).

A temática da formação docente não é algo novo e vem acompanhada das

reformas políticas educacionais que atendem aos interesses das agências

internacionais. Desde a década de 60 as políticas voltadas para a formação de

professores vêm sendo desenvolvidas, mas só ganham visibilidade na década

de 90, no momento de reforma do Estado e implementação de políticas sociais,

onde a educação ganha visibilidade mundial nos grandes fóruns internacionais:

“ONU, UNESCO, OIT, FMI”. Como destaca Sanfelice;

Em 1996 a UNESCO, juntamente com a OIT, convocou a Conferência Intergovernamental Especial sobre a Situação dos Países Membros.

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Deste evento, herdou-se o documento “recomendação relativa à situação do pessoal docente. (SANFELICE, 2010, p. 03).

Conforme a autora, este documento trazia orientações políticas sobre

educação, planos de estudo, formação docente entre outros aspectos

relacionados as condições de trabalho e participação dos professores na tomada

de decisões.

Magalhães (2009) ressalva que a partir da década de 90, significados são

vinculados e estabilizados de maneira a-histórica na cultura escolar, e as ações

são embasadas em uma compreensão reducionista e individualista sob e na qual

a escola está organizada. Dessa forma, os profissionais da educação são

excluídos das discussões.

Pesquisas sobre a formação de professores e saberes docentes surgem

então, com uma marca da produção intelectual, através de autores como,

Alarcão (2000), Freire (1990), Nóvoa (1995), Perrenoud (1999), Imbernón

(2009), Pimenta (1999), Canário (2004), Tardif (2006), Almeida (2007), Saviani

(2007), Placco (2006), Gatti (2004), entre outros, através de estudos que utilizam

uma abordagem teórico- metodológica que dá voz ao professor, a partir da

análise de trajetórias, histórias de vida, etc.

Nóvoa (1995), destaca a importância desta nova abordagem que vem em

oposição a estudos anteriores e que terminavam reduzindo a formação docente

a um conjunto de competências e técnicas, gerando uma crise de identidade nos

docentes em decorrência de uma separação entre o profissional e o seu lado

pessoal.

Essa reviravolta nas investigações acerca do trabalho docente passou a ter

como foco central o professor, ponderando o quanto “o modo de vida” pessoal

interfere em sua prática profissional. Nóvoa (1995, p. 19) ressalta que esse

“movimento nasceu num universo pedagógico, num amálgama de vontades de

produzir um outro tipo de conhecimento, mais próximo das realidades educativas

e do cotidiano dos professores”.

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No final do século XX e neste início do século XXI, o foco nas pesquisas

em relação ao trabalho docente começa a levar em conta diferentes aspectos de

sua história: profissional, individual, etc., aí nota-se uma virada nos estudos que

passam a reconhecer e a considerar os saberes construídos pelos professores

e que anteriormente não era levado em consideração. Nessa perspectiva de

analisar a formação de professores, a partir da valorização destes, é que os

estudos sobre os saberes docentes ganharam impulso e começam a aparecer

na literatura, numa busca de se identificar os diferentes saberes implícitos na

prática docente. Nóvoa ressalta;

(...) nesse espírito, tinha-se em vista que é preciso investir positivamente os saberes de que o professor é portador, trabalhando-se de um ponto de vista teórico e conceptual. (Nóvoa, 1992, p. 27).

Fiorentini (1998) ressalta a virada nas pesquisas, conforme o autor,

passou-se de uma valorização quase exclusiva do conhecimento (saberes

específicos) que o professor possuía sobre a sua disciplina, uma característica

da década de 60, para a valorização dos aspectos didáticos- metodológicos

relacionados às tecnologias de ensino, passado para um segundo plano o

domínio dos conteúdos na década de 70. Nos anos 80, o discurso educacional

passa a ser dominado por uma dimensão sócio-política e ideológica da prática

pedagógica, mas a idealização de um modelo teórico para orientar a formação

docente conduzia para uma análise negativa da pratica pedagógica e dos

saberes docentes;

As pesquisas sobre ensino e formação de professores passaram a priorizar o estudo de aspectos políticos e pedagógicos amplos. Os saberes escolares, os saberes docentes implícitos e as crenças epistemológicas, como diz Linhares (1996), seriam pouco valorizados e raramente problematizados ou investigados, tanto pela pesquisa acadêmica educacional como por programas de formação de professores. Embora, este período, as práticas pedagógicas de sala de aula e saberes docentes estivessem começado a ser investigados, as pesquisas não tinham o intuito de explicita-los e/ou valoriza-los como formas apropriadas e legitimas de saber. (Fiorentini, 1998, p. 314).

Os anos 90 foram marcados pela busca de novos enfoques e paradigmas

para compreender a prática docente e dos saberes dos professores, embora tais

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temáticas ainda hoje sejam questionadas e pouco valorizadas, é possível

vermos essa mudança acontecendo nos programas de formação de professores.

Repensando a formação docente a partir das análises de práticas

pedagógicas, Pimenta (1999) identifica o aparecimento da questão dos saberes

como um dos aspectos mais considerados nos estudos sobre a identidade da

profissão do professor. Parte do princípio que a identidade é construída a partir

da;

[...] significação social da profissão; da revisão constante dos significados sociais da profissão; da revisão das tradições. Mas também da reafirmação das práticas consagradas culturalmente e que permanecem significativas. Práticas que resistam a inovações porque de saberes válidos às necessidades da realidade. Do confronto entre as teorias e as práticas, da análise sistemática das práticas à luz das teorias existentes, da construção de novas teorias. (Pimenta, 1999, p. 19).

Assim, é possível observamos o resgate na importância de se ponderar o

professor em sua própria formação, num processo de autoformação, de

reelaboração dos saberes iniciais em confronto com a prática vivenciada. Deste

modo, os saberes vão se formando a partir de uma reflexão na e sobre a prática.

Atualmente, tanto a escola como os professores mudaram a questão dos

saberes docentes e agora se apresenta com uma nova roupagem, em

decorrência da literatura internacional e de pesquisas brasileiras, que passaram

a considerar o professor como um profissional que adquire e desenvolve

conhecimentos a partir da prática e no confronto com as condições da profissão.

Segundo Tardif (1991), quanto mais um saber é desenvolvido, formalizado,

sistematizado, como acontece com as ciências e os saberes contemporâneos,

mais se revela longo e complexo o processo de aprendizagem que exige uma

formalização e uma sistematização adequada. (Tardif, 1991, p.219)

Diante dos autores citados é possível notar que a preocupação com a

qualificação da formação docente e as suas condições profissionais não são

recentes, mas hoje cresce cada vez mais essas preocupações diante do quadro

de desigualdades socioculturais que vivemos e ante aos desafios que nos

colocam e se apresentam num futuro próximo.

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A educação é um processo que envolve basicamente pessoas com

conhecimentos em níveis desiguais com o propósito de partilhar esses

conhecimentos. A educação escolar pressupõe uma atuação de um grupo

geracional com outro mais jovem, ou com menor domínio de conhecimentos e

práticas, na direção de uma formação social, moral, cognitiva, afetiva, dentro de

um contexto histórico. Assim a formação de quem vai formar torna-se central, na

direção de se preservar uma civilização que contenha possibilidades melhores

de vida e coparticipação de todos, por isso, é tão importante compreender e

discutir a formação, as condições de trabalho e carreira dos professores.

Se pensarmos na educação enquanto pensamento, ato e trabalho, vamos

notar que ela está imersa na cultura, em estilos de vida e não apenas vinculadas

às ciências. A educação formal, apresenta-se com seu modo de existir no social,

em ambientes escolares e similares, organizada em torno de processos de

construção e utilização dos significados que conectam o homem com a cultura

onde se insere, e com suas imagens, com significados não só gerais, mas locais

e particulares, ou seja, com significados que se fazem públicos e com as pessoas

que aí estão. Cruzando este espaço, temos as mídias, as crenças, os valores

extrínsecos à escola e seus agentes.

A escola inserida nesse contexto social, precisa redirecionar seu papel e

ao fazer isso, é imprescindível rever a formação dos docentes que nela atuam.

Mas para isso, é necessário que gestores compartilhem com a equipe escolar

suas tomadas de decisões, a fim de formular o projeto pedagógico pautado em

decisões coletivas, na participação da comunidade escolar, na interação

comunicativa, na busca do consenso em pautas básicas e no diálogo

intersubjetivo.

O professor é uma figura imprescindível, sua formação, suas formas de

participação em sala de aula, em um programa educacional, sua instituição e no

sistema, são pontos vitais. O professor não é descartável, nem substituível, pois

quando é bem formado, ele detém um saber que alia conhecimento do conteúdo,

da didática e das condições de aprendizagem para segmentos diferenciados.

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Não descartamos o papel de todos os atores sociais que atuam na escola.

Todos são importantes, conforme já falamos no Plano Langevin- Wallon (1969,

p. 187) “constituição da pessoa se dá a partir das condições orgânicas e das

condições sociais, o conteúdo do ensino, seus métodos e disciplina escolar são

os meios permanentes e normais para dar a criança o gosto pela verdade, a

objetividade do juízo, o espírito de livre exame e o senso crítico que farão dela

um homem que escolherá suas opiniões e seus atos”.

Formar-se é um processo para a vida toda, enquanto seres humanos,

temos a possibilidade de aprender, e assim, nos humanizarmos constantemente,

mediante as relações e interações que acontecem nos mais diversos ambientes

culturais nos quais temos afinidades. Aprender é muito mais do que receber,

obter informações e conhecê-las ou compreendê-las é fazer com que o

aprendizado parta do ser e se desenvolva com ele. Formar-se é um processo de

aprendizagem que se realiza desenvolvendo-se individual e coletivamente

dentro da cultura, incorporando-a, criando-a e recriando-a, para Assmann (1998,

p. 35-36); “a vida é essencialmente aprender... e estar vivo é um sinônimo de

estar agindo como aprendente”.

Falar em formação requer compreender as múltiplas relações dos mais

diversos conhecimentos nas dimensões ideológicas, políticas sociais,

epistemológicas, filosóficas e/ou da área especifica do conhecimento que se

quer aprender. Mas, a aprendizagem acontece de fato quando se incorporam ao

desenvolvimento individual e coletivo os conhecimentos e as relações que as

constituem, pois, estas características se entrelaçam e formam o sujeito que

pode ou não ser um formador.

Incorporar estas relações vai depender de fatores históricos de cada

pessoa, de suas vivências, seus fatores sociais cujas interações acontecem nos

diversos contextos da cultura humana, das teceduras dessas relações de que

cada pessoa e os coletivos fazem parte. (Alvorado- Prada et al., 2008)

Gatti (2009), ressalta que a discussão e a condição sobre formação

docente dos professores é antiga e vem ganhando destaque diante do contexto

das desigualdades socioculturais atuais. Segundo a autora há um aspecto

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importante para se considerar quanto as condições de cada docente para o

exercício do seu trabalho. Nesta percepção, as condições profissionais dos

professores

[...] interagem com as condições de formação em sua constituição identitária profissional, conduzindo a formas de atuação educativas e didáticas que se refletem em seu processo de trabalho. Daí a necessidade de se repensar entre nós os processos formativos de professores, de um lado, e sua carreira, de outro. (GATTI, 2009, p.99).

O universo da educação escolar, espaço- tempo em que os docentes

exercem sua profissão, marca a existência desses sujeitos. Assim, quando

tratamos do tema formação é importante levarmos em conta as condições e a

localização das escolas onde os docentes trabalham, as funções e atividades

que ali realizam, o nível de ensino em que atuam, a disciplina que ensinam, a

situação profissional, a titulação acadêmica ou o nível de escolaridade, o tempo

de serviço, a posição na carreira e as experiências profissionais, ou seja a

heterogeneidade das circunstâncias em que os professores exercem seu ofício.

A relação entre docentes e alunos é um aspecto essencial na constituição

do sujeito “professor”, visto que sua experiência vai se justificando nessa

interação que é mediada pelo conhecimento. Deste modo, para

compreendermos como pensam, agem e sentem os docentes não se deve

desconsiderar que os sujeitos que se constituem como alunos, são os que

interagem com os docentes.

Assim como os alunos, os docentes são marcados por suas vivências em

diferentes realidades, além da diferenciação da faixa etária ou a idade de

formação, levam para a escola referências afetivas e culturais internalizadas pela

convivência diária com parentes em diferentes tipos de família, com seus amigos

em momentos de lazer, com chefes e colegas de trabalho, com membros de sua

comunidade religiosa, com a vizinhança, etc.

Na escola encontramos pessoas que estabelecem relações de trocas, de

intimidade, de tensão e de conflito, entrelaçando suas vidas diariamente, por

vezes, por anos a fio, e ressignificando suas experiências constantemente.

Sendo assim, não se pode compreender o docente desprezando sua ligação

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com os alunos nem tão pouco pensar a formação docente sem reconhecer sua

importância para o aprimoramento dessas relações.

Deste modo, aguçar o olhar para as diferenças é de suma importância para

contribuir nos processos de formação docente para a renovação das práticas

pedagógicas, assim como no estimulo de inovações metodológicas e a

integração de novas linguagens, que aproximam a escola das expectativas e dos

interesses dos alunos e da sociedade. “Professores são mediadores e

intérpretes ativos das culturas, dos valores e do saber em transformação”

(PERRENOUD, 1999, p. 23).

Diante desta citação, para enfrentar os desafios cotidianos não podemos

recorrer apenas ao arsenal de conhecimentos formais que adquirimos ao longo

dos processos formativos centrados na aquisição de competências cognitivas, é

preciso levarmos em conta o sujeito como um ser incompleto, que vai se

constituindo e se formando perante as experiências vivenciadas e principalmente

das significativas.

A formação é um caminho de diversas possibilidades, permite que as

pessoas se desenvolvam, construam-se nas relações e que se compreendam

continuamente em seus próprios conhecimentos e os dos outros e associar tudo

isso, com suas trajetórias de experiências pessoais. A formação docente é uma

contínua caminhada dos profissionais da educação, em cujo caminhar atuam

todas suas dimensões individuais e coletivas de caráter histórico,

biopsicossocial, político, cultural, próprias de seres integrais e autores de sua

própria formação.

Os professores em exercício constroem novos conhecimentos, ideias e

práticas, é a partir daquilo que já possuem e sabem que continuam seu

desenvolvimento. A construção da formação docente, envolve toda a trajetória

profissional, suas concepções de vida, de sociedade, de escola, de educação,

seus interesses, necessidades, habilidades e também seus medos, limitações e

dificuldades.

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A construção da formação é contínua e não fica restrita a uma instituição,

à sala, um curso, pois os docentes vão se formando diante seu exercício

profissional, partindo de suas análises da sua realidade e de confrontos com a

universalidade de outras realidades que também têm fatos do cotidiano,

situações políticas, experiências, concepções, teorias e outras situações

formadoras.

Os docentes, são seres intimamente ligados aos processos de

aprendizagem na escola, ora alunos, ora educadores, vivenciam a realidade

escolar durante a maior parte de sua vida. É nesse contexto, e a partir dele, que

os profissionais da educação se formam, e em marcos freirianos, leem o mundo.

Deste modo, compreender o espaço escolar é preciso para ponderar outras

realidades, visto que ler o mundo implica ter conhecimentos que fundamentam

essa leitura, e o reconhecimento deste espaço como formador é composto de

fundamentos para as leituras necessárias à formação continuada de

professores.

A instituição escolar é o principal espaço onde acontece e precisa

acontecer os planos e as atividades de formação docente, mas para isso, é

preciso que haja condições que os viabilizem, um exemplo, é a organização da

gestão institucional na qual seja previsto o tempo e os recursos necessários para

a realização. A escola não é a única responsável pela formação, mas é de

grande importância para a socialização profissional, como afirma Canário (1998),

“a escola é habitualmente pensada como o sitio onde os alunos aprendem e os

professores ensinam. Trata-se, contudo, de uma ideia simplista, não apenas os

professores aprendem, como aprendem, aliás, aquilo que é verdadeiramente

essencial; aprendem a sua profissão”.

O espaço escolar depende das relações com outras instancias, como o

próprio Estado em seus diferentes níveis, a família e todas as organizações

instituídas socioculturalmente para que ela se desenvolva.

Levando em consideração que o docente vai se formando ao longo de

suas experiências e carreira, mostraremos a seguir como a formação continuada

é de suma importância na carreira do professor, Canário (1999), ressalta que

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valorizar a formação voltada para a reflexão sobre a prática do professor e sobre

os conhecimentos e saberes que o professor já construiu na sua experiência

docente implica valorizar a sua prática e seu saber- fazer.

1.3. A Formação Docente Continuada na Escola

Ao longo dos anos a sociedade vem sofrendo inúmeras mudanças, dentre

essas, podemos mencionar a quantidade de informações que nos são

disponibilizadas diariamente e a velocidade com que se propagam. Deste modo,

vivenciamos um período em que a informação e o conhecimento são

indispensáveis para a vida profissional.

Ultimamente, muitos autores têm se dedicado aos estudos da formação

contínua de professores em diversos países, estabelecendo inúmeras

interpretações e concepções sobre o tema, dentro de contextos de espaços e

tempos específicos.

Desde a década de 1980, as pesquisas vêm apontando para as

mudanças nas concepções e práticas de formação, como falado anteriormente,

assim o processo de formação continuada vem também sofrendo alterações

conceituais diante das novas exigências contemporâneas. A questão da

formação contínua foi ganhando projeção como problema, na mesma proporção

em que se aumentavam a preocupação social e política coma reprovação,

evasão e o fracasso escolar de inúmeros alunos das séries iniciais do até então,

primeiro grau.

Conforme Mussi (2000), demonstrou-se que a demanda pela

(re)discussão da formação de professores, no período se deu pelo insucesso

educacional dos discentes e a formação, essencialmente, para a aquisição de

habilidades técnicas pelos docentes.

No contexto nacional, a formação continuada dos docentes e o trabalho

coletivo dos professores nas escolas públicas, não são temas novos,

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desenrolando-se em debates que se processam em fóruns acadêmicos,

Secretárias de Educação, agências formadoras, unidades escolares, entre

outros.

Saul (1995, p. 7), lembra que “para o termo formação continuada, voltam-

se múltiplos olhares na expectativa de encontrar novos paradigmas que ampliem

a compreensão e sejam capazes de gerar práticas mais adequadas e que

impliquem a transformação da escola”. Nesta linha de raciocínio, reconhecemos

que a escola continua tendo um papel fundamental para o desenvolvimento

humano e cabe a ela, possibilitar a construção do conhecimento, pois o que há

nos livros e na internet, por exemplo, são apenas informações. A educação que

reproduz, aquela que apenas transmite as informações, já não faz mais sentido

no mundo de hoje.

Alarcão (2001), chama a tenção e diz, “urge que a escola pública mude,

que rompa com velhos paradigmas, que se enquadre na atualidade”. Para isso,

é necessária uma mudança de pensamentos sobre a escola, é preciso acreditar

na possibilidade de encontrar caminhos melhores e mais adequados para os

problemas vivenciados no momento.

Entendemos que o desenvolvimento humano ocorre dentro de um

processo de aprendizagem, a formação é também um processo de

desenvolvimento humano, e, portanto, profissional. Quando falamos em

docentes, estes se desenvolvem principalmente nos contextos de seu trabalho

exercido na instituição escolar, onde criam relações alicerçadas em estruturas

complexas que as sustentam ou permitem sua alteração. Assim, espera-se que

a formação continuada coopere com a manutenção, criação e alteração das

relações estruturantes e estruturadoras do desenvolvimento profissional do

coletivo docente na instituição escolar.

A concepção de formação continuada, pautada numa pratica coletiva

reflexiva, é enriquecida quando desenvolvida no contexto escolar, pesquisas

nacionais e internacionais apontam a escola como lócus privilegiado para essa

formação. Candau (2000) concebe que na escola interagem diferente culturas

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escolares (cultura da administração, cultura dos gestores, cultura dos

professores), a cultura da escola e as culturas sociais de referência.

Sendo assim, um projeto de formação continuada no interior da escola

implica em aprofundar-se numa rede de relações entre essas diferentes culturas,

buscando identificar e compreender “seus pontos de encontro, ruptura e conflito”

como sendo

[...] fundamental para promover um processo educativo entendido como prática social em que estão presentes as tensões inerentes a uma sociedade como a nossa que vive processos de profunda transformação. É a própria concepção da escola, suas funções e relações com a sociedade, o conhecimento e a construção de identidades pessoais, sociais e culturais que está em questão. (CANDAU, 2000, p. 68).

Boa parte da literatura sobre formação contínua em serviço, refere-se as

dificuldades institucionais e do coletivo dos professores, para a instauração

efetiva desses espaços. Fusari (1993) ressalta:

“a realização do trabalho coletivo não supõe apenas a existência de profissionais que atuem lado a lado numa mesma escola, mas exige educadores que tenham pontos de partida (princípios) e pontos de chegada (objetivos) comuns” (Fusari, 1993, p. 70).

Segundo este autor, o trabalho coletivo ainda está se construindo, visto que

o compromisso profissional e institucional precisa ser consolidado e com uma

certa consensualidade deve ser realizado. O coletivo na unidade escolar precisa

refletir de forma ampla para que possa ser capaz de formar cidadãos. Citando,

ainda, Fusari (1993):

Trabalhar coletivamente é então, algo a ser conquistado a médio e a longo prazos, que exige disponibilidade de cada uma das partes envolvidas no processo. Exige mais: querer crescer, mudar, transformar, querer participar do processo de criação de uma nova Escola, de uma nova sociedade. (Fusari, 1993, p. 71).

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Deste modo, reconhecer o docente como o sujeito de conhecimento e

adulto que se forma significa admitir que a aprendizagem é um processo interno

e que corresponde ao processo de sua autoconstrução como pessoa. A

formação continuada, em especial é conduzida, a professores que acumulam

experiência no exercício de sua profissão e que constroem e reconstroem

práticas e teorias.

A experiência vivenciada pelos docentes no dia a dia da escola é

enriquecedora, pois nesse ambiente ele aprende, reflete sobre sua prática e faz

descobertas. Dessa forma, a escola transformadora deve proporcionar aos

docentes nela inseridos, aprimorarem sua formação, tornando-a, por vezes

continuada. Nóvoa (1992), ao analisar essa questão da formação de

professores, afirma que:

[...] a formação de professores é concebida com um dos componentes de mudança da escola, em conexão estreita com outros setores e áreas de intervenção. A formação não se faz antes da mudança, faz-se durante, traduz –se nesse esforço de inovação e de procura dos melhores percursos para a transformação da escola. (Nóvoa, 1992, p. 15).

Assim, precisamos levar em conta que o professor é portador de uma

história de vida e uma experiência profissional orienta o seu olhar e justifica

determinados interesses e necessidades. Formar adultos implica em produzir

uma formação em sistema de colaboração, no qual mobilizamos recursos

teóricos e práticos. A formação quando realizada desta forma, deixa de ser vista

como um modo de ensinar determinados conteúdos e como consumo de

conhecimento pré-produzidos, e passa ser assumido como possibilidades de

crescimento, perspectiva de mudança e forma de resolução de problemas.

Porto (2000, p. 14), faz referência ao “fazer, entendido como uma

atividade alheia à experiência e ao conhecimento do professor, cede lugar ao

saber fazer reflexivo, entendido como autoformação”, ou seja, é um percurso que

acontece na junção entre a teoria e prática. Assim, podemos pensar a pratica

como mediadora da produção de conhecimento mobilizado na experiência de

vida do professor e em sua identidade.

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A formação continuada e centrada na escola provém de uma formação

voltada para a pratica do professor, abordando de forma critica as relações e

contribuições da teoria à ação pedagógica (Canário, 2001a). A prática é o

momento de idealizar a produção de novos conhecimentos, na medida em que

se atribui a ela um status de fator cultural e espaço de criação de conhecimentos

que, mesmo não organizados de acordo com a teoria, são tão importantes

quanto os conhecimentos que nela são construídos.

Nesse ponto de vista, a formação é a pratica como referência para análise,

reflexão e critica a partir do conhecimento que o professor constrói na sua pratica

docente. Canário (2000b), ressalta que, neste sentido a formação é

compreendida como processo de formalização da experiência. Valorizar a

experiência é admitir que o docente é um profissional que improvisa em

contextos de singularidades e complexidade, é legitimar a sua prática, sua leitura

de sala de aula, suas discrições (provisórias), seu saber- fazer.

Canário (1999b) realça que a escola é a unidade política de inovação e

que os sistemas escolares precisam pensar as inovações na perspectiva da

instituição, favorecendo situações que permitam aprender a pensar e agir de

forma diferente, enriquecendo, reconstruindo e reorientando a cultura

profissional dos professores. Embora o autor valorize a formação no contexto

escolar, ressalta que a formação centrada na escola não dispensa apoios

externos e suas contribuições de informação, facilitação e crítica.

[...] as situações profissionais vividas pelos professores ocorrem no quadro de sistemas coletivos de ação (organizações escolares) cujas regras são, ao mesmo tempo, produzidas e aprendidas pelos actores sociais em presença. Estamos, portanto, em presença de um “jogo coletivo”, susceptível de múltiplas e contingentes configurações, em função da singularidade dos contextos. É na medida em que a produção de práticas profissionais, realizada em contexto, é atravessada não apenas por factores individuais (dimensão biográfica), mas também por factores organizacionais que as práticas profissionais devem ser compreendidas não apenas em termos de efeitos de disposição, mas também em termos de efeitos de situação (os mesmos professores agem de forma diferente em tempos e contextos diferentes). (CANÁRIO 2010, p. 169).

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Almeida (2013), comenta que esse “jogo coletivo” sugere considerar a ação

de cada professor interdependente com a de outros profissionais da escola. Os

processos formativos que focalizam só o professor sem levar em conta o

contexto (a escola) no qual atua estão fadados, via de regra ao insucesso. É no

contexto do trabalho docente que se deve investir, instituindo uma dinâmica

formativa visando a escola como um todo.

Os processos formativos são pensados como processos de intervenção

nas organizações escolares que podemos falar em “formação centrada na

escola” (ALMEIDA, 2013, p. 12).

Muitos equívocos acorrem quando pensamos na formação continuada na

escola e Oliveira- Formosinho e Formosinho (2002) nos chamam atenção quanto

a isso, e destaca como primeiro sendo, um erro pensar que a formação que

acontece na escola seja necessariamente mais ativa e envolvente, argumenta

que o deslocamento da formação da universidade para a escola não garante

maior participação dos professores.

Azanha (1983) deixa explicito isso quando fala:

Cada escola tem características pedagógicas-sociais irredutíveis quando se trata de buscar soluções para os problemas que vive. A realidade de cada escola, não buscada por meio de inúteis e pretenciosas tentativas de “diagnósticos”, mas como é sentida e vivenciada por alunos, pais e professores é o único ponto de partida para um real e adequado esforço de melhoria. (Azanha, 1983, pg. 5).

A formação é um processo multideterminado que acontece em vários

espaços e em circunstâncias formais e informais, a partir das interações que

promovem o diálogo entre conhecimentos teóricos e saberes da experiência,

valorizar a formação na escola não significa desprestigiar outros espaços

formativos. Pelo contrário, aponta para a necessidade de uma composição entre

as instâncias formativas que compreendem a formação como processo e não

um produto.

Oliveira- Formosinho e Formosinho (2002), utilizam o termo “formação

centrada na escola” para abordar diferentes vertentes da formação continuada

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na escola. A primeira vertente refere-se à situação e ao local de formação, no

qual a formação provém do professor em seu local de trabalho, e é a ocasião e

a oportunidade de formação. A segunda vertente, é centrada nas iniciativas da

organização escolar, que define qual formação e qual o formato é necessário. A

terceira, é voltada para o papel do professor na sua formação, uma vez que ele

participa, executa, avalia a equipe de formadores trabalha com ele e não para

ele. Na quarta vertente, a formação é centrada nas práticas, com vistas às

mudanças e ênfase nos saberes práticos.

Há ainda uma vertente que apela para auto-organização dos professores,

para que promovam sua própria formação e de seus pares, o docente durante

esse processo, precisa ser o mediador, construir espaços interativos, possibilitar

a reflexão, para que ele e aluno se aproprie da experiência cultural e consiga se

desenvolver como sujeito da própria história. Nesse sentido, Freire diz;

[...] uma qualidade indispensável ao bom professor é ter a capacidade de começar sempre, de fazer, de reconstruir, de não se entregar, de recusar burocratizar-se mentalmente, de entender e de viver a vida como processo. (Freire, 1991, p. 103).

O trabalho em conjunto entre professores e gestores amplia as

possibilidades de êxito desse processo, pois ocorre uma comunicação

permanente, baseada na partilha de ideias e na troca de experiências

vivenciadas diariamente, rompem com as práticas isoladas e tornam-se mais

seguras as alternativas para definir os meios adequados de proporcionar uma

educação voltada ao desenvolvimento das potencialidades dos alunos.

Correia (1991) defende que as experiências e os conhecimentos docentes

sejam o ponto de partida, chegada e passagem na formação, pois compõem

referencias que podem transformar os caminhos informativos em instrumentos

conceituais passíveis de orientar um processo de mudança das práticas.

A ideia de se estruturar o trabalho de formação em torno de uma reflexão

sobre as práticas, não significa que a prática vivenciada individualmente por cada

um dos formadores seja o material exclusivo utilizado para a reflexão que é

produzida. As práticas individuais, ou melhor, as experiências vivenciadas

individualmente são encaradas como produtos individualizáveis de práticas

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sociais e o trabalho de formação consiste precisamente em realçar o caráter

social das práticas individuais através do conforto metódico de produtos

individualizados dos processos sociais de produção de práticas. (Correia, 1991,

p.122)

Para este autor, o grupo de formação é a instância de confronto das

práticas e da elaboração de projetos pedagógicos de intervenção e de formação,

na medida que pode contar com uma multiplicidade de olhares e perspectivas.

Nessa percepção, os projetos funcionam como instrumentos que estimulariam a

organização e fundamentação desse confronto e produção de saberes. Ele

discorre ainda sobre este assunto dizendo;

[...] formação na teoria e formação na prática não são simplesmente instancias complementares, mas interrogam-se num processo contraditório que estimula o desenvolvimento de práticas de formação organizadas em torno da análise de condições de trabalho. (Correia, 1991, p. 126).

Canário (2000a) destaca que as dimensões fundamentais da formação

centrada na escola, baseada nas experiências dos professores, consiste em

criar situações que permitem os docentes aprender a pensar e a agir de modo

diferente: a reflexão, conduzida de modo sistemático e finalizado, permite

transformar a experiência num saber utilizável.

A valorização de momentos de formação e trabalho, assim como

reconhecer que é de suma importância mobilizar os saberes adquiridos em

situações de trabalho no confronto com a teoria, justificam a emergência de

novas práticas que convidam o professor a dar sentido as suas experiências e

fazer com que elas sejam produtoras de saber, assim, formar-se passa estar

relacionado à reflexão de si, reflexão sobre o trabalho, sobre as situações,

acontecimentos, ideias.

A formação que acontece no interior da escola, até aqui nomeada como

centrada na escola, apresenta-se como uma perspectiva de ressignificar a Aula

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de Trabalho Pedagógico Coletivo (ATPC), pois neste momento, é a oportunidade

de se discutir com um grupo de docentes um referencial teórico que institua uma

cultura de colaboração, tomando a experiência docente como oportunidade de

diálogos da prática e teoria.

A ATPC (Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo) é o momento de formação

continuada dentro da escola, é um momento de compartilhar e formalizar a

experiência, nesse sentido, podemos admitir que a escola que antes era

pensada como o lugar onde os alunos aprendem e onde os professores ensinam,

é também o lugar onde os docentes aprendem. Canário (1999) ressalva que a

escola é o lugar onde o professor aprende sua profissão, na combinação com

muitas e diversificadas formas de aprender que vão se constituindo no

desenvolvimento pessoal e profissional de cada professor.

Realizar mudanças e inovações na ATPC, que segundo Mendes e Sousa

(2007), muitas vezes é associado a um “horário de trabalho perdido

coletivamente”, demanda, uma reinvenção de novos modos de socialização

profissional de cada professor, tarefa essa que precisa ser compreendida e

experimentada pelos grupos de docentes. Pensando assim, é preciso aceitar

que a formação não pode ser dissociada de processos de desenvolvimento

organizacional e que criar dinâmicas de formação individual e coletiva, depende

de novos modos de organização de trabalhos.

Produzir paralelamente mudanças coletivas e mudanças individuais implica

em reconhecer, como ensina Canário (1998, p. 5) “que os indivíduos mudam,

mudando o próprio contexto em que trabalham”.

Podemos então, considerar nesse processo, a escola como um local

próprio, especifico para a formação continuada e como um meio favorecedor aos

professores. Isso porque, além de fortalecer a formação continuada, fortalecer a

consciência de agente transformador da sociedade, beneficia a construção de

referenciais que fundamentam a prática do grupo, pois parte de suas reais

necessidades e fortalece a afetividade entre os docentes, facilitando a realização

de projetos coletivos em prol da qualidade do ensino e da aprendizagem.

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Quando a formação continuada é realizada dentro da escola, apresenta

inúmeros aspectos positivos, que de acordo com Nascimento (2001), podem

auxiliar no desenvolvimento profissional, na busca de prováveis soluções para

os problemas reais, na socialização de experiências bem e mal sucedidas e que

facilitam o processo de construção do saber, entre outros. Portanto, trabalhar

com os docentes dentro da própria instituição em que desenvolvem o seu

trabalho, favorece a construção coletiva de processos reflexivos, visando a

prática pedagógica concreta.

Vale ressaltar que desenvolver uma prática, harmônica com a realidade,

requer reflexão sobre os problemas enfrentados na escola, na busca de uma

melhoria na maneira de resolver com melhores ações que compreendam uma

coletividade construída entre grupos de docentes e a comunidade pertencentes

à escola.

Na sequência, apresentaremos algumas considerações sobre os encontros

de formação que acontecem nas escolas, as ATPCs (Aula de Trabalho

Pedagógico Coletivo), e sua criação na rede estadual paulista de ensino.

1.4. ATPC: A conquista de uma formação em serviço

“A escola é ainda, espaço em que se abrigam desencontros de

expectativas, mas também acordos solidários, norteados por princípios e

valores educativos, pactuados por meio do projeto político- pedagógico,

concebido segundo as demandas sociais e aprovada pela comunidade

educativa” (MEC, 1994).

O encontro de formação a ATPC, que é o foco deste atual estudo, é

compreendido na pesquisa como um acontecimento sócio histórico, no qual os

sujeitos que dela participam se constituem e constitui a formação continuada na

escola.

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A ATPC (aula de trabalho pedagógico coletivo) foi uma conquista muito

importante para os professores, pois foi um motivo de luta da categoria que por

muitos anos buscou que algumas aulas dentro da jornada de trabalho fossem

utilizadas para a formação docente em serviço e/ou o preparo de atividades das

aulas que seriam dadas.

BOZZINI e OLIVEIRA (2006), apontam que as primeiras iniciativas para

se ter de fato um trabalho coletivo nas escolas da rede estadual de São Paulo

datam do final da década de oitenta, com a criação do HTP (horário de trabalho

pedagógico) e da coordenação do trabalho pedagógico para os professores do

Ensino Fundamental I, antigo Ciclo Básico (1° a 4° série).

Com a Resolução SE n° 17, de 1988 da Secretaria da Educação do

Estado de São Paulo ficou instituída a jornada de trabalho do professor de 40

horas aulas semanais, mas desse total 6 horas aulas de trabalho pedagógico

que poderia ser na escola ou onde a Administração indicasse e 8 horas livres

cumpridas em horário e local de livre escolha.

No ano de 1991, com o projeto da Escola Padrão propunha-se uma série

de medidas, entre elas havia uma que dizia respeito a HTP (HORA DE

TRABALHO PEDAGÓGICO) para todos os professores dessas escolas do 1° e

2° graus, atualmente chamados de Ensino Fundamental II e Ensino Médio. Em

1996, o HTP passa a ser denominado HTPC (HORA DE TRABALHO

PEDAGÓGICO COLETIVO).

Em 1995 surge, a Portaria n°1, de 08.05.1995 que dispõe sobre as horas

de trabalho coletivo nas escolas de 1° e 2° Graus da Rede Estadual de Ensino,

sendo de 2 horas semanais, com o objetivo de articular os diversos segmentos

da escola, de fortalecer a unidade escolar como instância privilegiada de

aperfeiçoamento do projeto político pedagógico, do (re)planejamento e avaliação

das atividades de sala de aula, tendo em vista as diretrizes comuns que a escola

pretende imprimir ao processo de ensino e aprendizagem, possibilitar a reflexão

sobre a prática docente, favorecer a troca de experiências levando em

consideração a importância do trabalho coletivo dos professores (formação

continuada).

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A APEOSP (ASSOCIAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO OFICIAL

DO ESTADO DE SÃO PAULO), passa então a reivindicar que o HTPC seja para

todos os professores das escolas estaduais paulistas e não apenas para os que

atuavam nas escolas padrão. No ano de 1997 é estendido para todos, sendo

obrigatório para o Ciclo Básico (Ensino Fundamental I) e optativo para os

demais.

Neste mesmo ano o governo Estadual de São Paulo, instituiu pela Lei

Complementar n° 836 de 1997 o Plano de Carreira, Vencimentos e salários para

os integrantes do Quadro do Magistério da Secretaria da Educação, que em seu

artigo13 dispõe sobre as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), “as

horas de trabalho pedagógico na escola deverão ser utilizadas para reuniões e

outras atividades pedagógicas e de estudo, de caráter coletivo, organizadas pelo

estabelecimento de ensino, bem como para atendimento a pais e alunos.” (SÃO

PAULO, 1997).

A HTPC passa então, a integrar a jornada de trabalho dos docentes da

rede estadual paulista, e também a ser um espaço/ tempo remunerado, com a

normatização em 1996, pela Coordenadoria de Normas Pedagógicas (CENP).

De acordo com Domingues (2004), no ano de 1998, HTPC passa a ser

obrigatório a todos os professores da rede estadual com o mínimo 10 aulas

semanais e compõe a jornada de trabalho dos mesmos.

Os docentes cobravam um espaço em que pudessem ser discutidos

assuntos pertinentes à escola e a educação. O novo documento traz a esse

espaço o caráter de um trabalho coletivo e define os seguintes objetivos:

I- Construir e implementar o projeto pedagógico da

escola;

II- Articular as ações educacionais desenvolvidas pelos

diferentes segmentos da escola, visando a melhoria do processo de

ensino aprendizagem;

III- Identificar as alternativas pedagógicas que concorrem

para a redução dos índices de evasão e repetência;

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IV- Possibilitar a reflexão sobre a prática docente;

V- Favorecer o intercâmbio de experiências;

VI- Promover o aperfeiçoamento individual e coletivo dos

educadores;

VII- Acompanhar e avaliar de forma sistemática, o

processo de ensino aprendizagem.

No item IV da Portaria CENP n° 1/96, é possível observarmos que o

objetivo é que se volte para a questão da reflexão, o que parece ser um

paradigma sobre a reflexão prática, no qual o docente reflete sobre suas ações

num momento posterior ao que elas acontecem, definida por Schön (1983/2000)

como reflexão sobre a ação.

Conforme a legislação, o ATPC tem que ser realizado na Unidade Escolar

pelos professores, professor coordenador pedagógico e/ ou Diretor. Assim,

inicia-se nas escolas estaduais de São Paulo um espaço e tempo que garante

aos professores se reunirem para conversarem e se articularem a respeito dos

problemas da escola.

A incorporação do HTPC na jornada de trabalho não foi apenas uma

vitória da categoria, mas também um avanço para se ampliar as discussões

coletivas sobre como está o andamento da escola e suas questões pedagógicas.

Os horários de HTPC têm ficado na responsabilidade dos professores

coordenadores pedagógicos, que tem a incumbência de organizar os encontros,

as pautas, e conduzir as reuniões de uma forma geral, articulando os trabalhos

entre direção- docentes- alunos de todas as escolas. (BOZZINI E OLIVEIRA,

2006)

Em 2008, oficialmente a CENP, através de um comunicado CENP, de

29/01/2008 reitera que a HTPC deve se caracterizar como um espaço de

formação, conforme prescrição abaixo:

Formação continuada dos educadores, propulsor de momentos

privilegiados de estudo, discussão e reflexão das propostas

curriculares e melhoria da prática docente;

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Trabalho coletivo de caráter estritamente pedagógico, destinado à

discussão, acompanhamento e avaliação da proposta pedagógica da

escola e do desempenho escolar do aluno.

Nesse comunicado, pela primeira vez se menciona a questão da formação

continuada dos educadores. Ao mesmo tempo, aparece a palavra reflexão,

entretanto restrita aos estudos curriculares e a melhoria da prática docente. Ao

que parece, os modelos de reflexão que norteiam essas prescrições privilegiam

apenas a reflexão técnica e a reflexão prática. Não se nota em momento algumas

questões relacionadas a ética e aos valores morais.

De 29/01/2008 a dezembro de 2011, as escolas estaduais dispunham das

orientações contidas no Comunicado Cenp de 29/01/2008 para organizarem as

Horas de trabalho Pedagógico Coletivo, entretanto, torna-se importante ressaltar

que a partir de janeiro de 2001, conforme a resolução 8/2012, houve uma

mudança da carga horária do professor, (Rocha, 2012, p. 85).

Até abril do ano de 2012 utilizava- se a sigla HTPC, após esse ano a Lei

Complementar 836/97 institui a ATPC (AULA DE TRABALHO PEDAGÓGICO

COLETICO) como um espaço de formação continuada dos educadores, com

características pedagógicas, destinado à discussão, acompanhamento e a

avaliação da proposta pedagógica da escola e do desempenho escolar do aluno

(OLIVEIRA,2006).

Segundo a mesma portaria as ATPCs devem ser:

I- Planejadas pelo conjunto dos professores, sob a

orientação do diretor e do professor coordenador de forma a:

a- Identificar o conjunto de características,

necessidades e expectativas da comunidade escolar;

b- Apontar e priorizar os problemas educacionais a

serem enfrentados;

c- Levantar os recursos materiais e humanos

disponíveis que possam subsidiar a discussão e a solução dos

problemas;

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d- Propor alternativas de enfrentamento dos problemas

levantados;

e- Propor um cronograma para a implementação,

acompanhamento e avaliação das alternativas selecionadas.

II- No planejamento e condução das ATPCs é

importante:

Considerar as demandas dos professores frente às

metas e prioridades da escola;

Elaborar a pauta da reunião previamente, definida a

partir das contribuições dos participantes;

Dividir entre os participantes as tarefas inerentes às

reuniões (registro, escolha de textos, organização dos estudos,);

Planejar formas de avaliação das reuniões pelo

coletivo dos participantes;

Prevenir formas de registros (ata, caderno, diário de

bordo, e outros) das discussões, avanços, dificuldades

detectadas, ações e intervenções propostas e decisões tomadas;

Organizar ações de formação continuada com

conteúdos voltados ás metas da escola e à melhoria do

desempenho dos alunos, com apoio da equipe de supervisão e

oficina pedagógica da DE.

Deste modo, através de publicações e normas a SEE (Secretaria Estadual

de Educação) espera que as ATPC sejam utilizadas para reuniões e atividades

pedagógicas de estudo, de caráter coletivo, organizadas pelas escolas, bem

como para atendimento a pais de alunos.

No artigo 2° da Resolução 8/12, instituída em 19 de janeiro de 2012, a

carga horária dos docentes da rede estadual de ensino, quanto às jornadas de

trabalho Integral, Básica e Inicial, passam a ser exercidas em aulas de 50

(cinquenta) minutos sob a seguinte organização:

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Quadro 1 - Jornada de trabalho docente.

Jornada Integral de Trabalho Docente

Jornada Básica de Trabalho Docente

Jornada Inicial de Trabalho Docente

Jornada Reduzida de Trabalho Docente

a) 32 aulas;

b) 3 aulas de

trabalho

pedagógico

coletivo na

escola;

c) 13 aulas de

trabalho

pedagógico

em local de

livre escolha.

a) 24 aulas;

b) 2 aulas de

trabalho

pedagógico

na escola;

c) 10 aulas de

trabalho

pedagógico

em local de

livre escolha.

a) 19 aulas;

b) 2aulas de

trabalho

pedagógico

na escola;

c) 7 aulas de

trabalho

pedagógico

em local de

livre escolha.

a) 9 aulas;

b) 2 aulas de

trabalho

coletivo na

escola;

c) 3 aulas de

trabalho

pedagógico

em local de

livre escolha.

Quadro elaborado a partir da publicação no D.O de 20/01/12- Caderno Executivo, p. 122.

Nesta Resolução, podemos observar que ocorre uma alteração no tempo

de trabalho coletivo do professor na escola, e prevê, conforme a expressão “aula

de trabalho pedagógico coletivo”, a mudança da nomenclatura no contexto de

formação docente para ATPC (Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo).

O Coordenador Pedagógico de cada segmento de ensino é apontado

como responsável pelo planejamento e organização das ATPCs, e é evidente no

texto que devem ocorrer “em sintonia” e com o envolvimento de todos os

docentes e da equipe gestora, com o objetivo de integrar toda a equipe. No

entanto, o documento ressalta ser importante:

Considerar as demandas dos professores frente ás metas e as

prioridades da escola;

Elaborar previamente a pauta de cada reunião, definida a partir das

contribuições dos participantes;

Dividir entre os participantes as tarefas inerentes às reuniões (registro,

escolha de texto, organização dos estudos);

Planejar formas de avaliação das reuniões pelo coletivo dos

participantes;

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51

Prever formas de registro (ata, caderno, diário de bordo, e outros) das

discussões, avanços, dificuldades detectadas, ações e intervenções

propostas e decisões tomadas;

Organizar as ações de formação continuada com conteúdos voltados

às metas da escola e à melhoria do desempenho dos alunos, com apoio

da equipe de supervisão e oficina pedagógica da DE.

Neste documento é possível observar que a ATPC é um espaço destinado

ao trabalho pedagógico, do qual todos os professores devem participar. Em

relação ao funcionamento das ATPCs, apesar de estar previsto nesse

comunicado o envolvimento e participação de todos os educadores da escola.

Apesar da mudança substancial em relação ao caráter e funcionamento

da ATPC, não podemos ignorar o fato de que a legislação que a antecede (LC

114 de 1974/ LC 201de 1978/ LC 444 de 1985 e LC 836 de 1997) proporciona

um percurso onde as modificações sofridas ao longo do tempo são feitas de

maneira confusa, o que talvez justifique o quadro atual em que este espaço de

formação se encontre. Vale lembrar que a atual constituição da ATPC data

apenas de 03 (três) anos.

O documento norteador da Coordenadoria de Gestão da Educação

Básica (CEGEB) n° 10 de 2014, ressalta que as orientações dadas pela SEE,

permeiem todo processo educativo na escola, em especial, nas ATPCs, pois

sabe- se do compromisso e desempenho de todos os profissionais com uma

aprendizagem e ensino significativos, que contemplem as demandas da

sociedade atual. (CEGEB, 2014)

Nesse contexto, o Coordenador Pedagógico, conforme visto, torna-se a

peça-chave para que neste contexto a formação aconteça de forma efetivamente

crítica e represente uma contribuição na transformação da escola, a partir da

transformação de ações pedagógicas dos docentes. A demanda que se coloca

diante disso é: em que condições e sob qual organização escolar o Coordenador

Pedagógico desenvolve seu trabalho?

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Nos parece de suma importância que este profissional tenha um ambiente

propício a problematização das questões políticas e pedagógicas sob as quais a

escola é organizada e direciona o trabalho dos educadores, para que seja

possível, como bem nos traz Hargreaves (2004) uma reorientação do sistema de

padronização das práticas docente e para a possibilidade da construção de uma

comunidade de aprendizagem profissional sólida, caso contrário, qualquer

trabalho, ainda que em grupo, segue a rota do individualismo, da competitividade

e da ausência de solidariedade que nutrem a manutenção de tais sistemas

baseados.

Oliveira (2006), apresenta em seus estudos a urgência em se transformar

a realidade verticalizada do sistema de padronização sobre as relações

humanas e profissionais na escola. Porém, isso não acontece de repente, ao

contrário, há que se trabalhar conscientemente, intencionalmente e o primeiro

passo para isso, é o desejo coletivo de instaurar um ambiente, como proposto

por Oliveira (2006), para que as questões urgentes da escola possam ser

tratadas no âmbito de suas macro e micros estruturas, onde não há culpados,

mas ao contrário, o gérmen da transformação.

Reiteramos o que apresentamos na introdução: diante da conquista de

um espaço de desenvolvimento no interior da escola e das orientações acerca

de como devem ser as ATPCs nas escolas estaduais paulistas, esta pesquisa

busca compreender a formação continuada dos docentes nas ATPC e analisar

um projeto de formação no espaço e tempo das aulas de trabalhos pedagógico

coletivo, no qual a arte seja a mediadora essencial para a transformação na

formação, assim legitimando a afirmação de ALMEIDA (2013, pg.11): “Que o

eixo estrutural da eficácia do profissional é o seu contexto de trabalho”

No capítulo a seguir, apresentaremos a importância da arte na formação

humana, para que possamos compreender o contexto em que a pesquisa se

dará e a importância de se formar um ser humano mais completo e sensível para

os acontecimentos do cotidiano da sala de aula.

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2. A IMPORTÃNCIA DA ARTE NO DESENVOLVIMENTO HUMANO

-E depois, como é que um ano depois eu já era um mestre de ceticismo, escrevendo, com aquela

história do copo, alegorias de um mundo sem propósitos- porque era isso que eu queria dizer, posso senti-lo.

-Simplesmente porque mudou de professor. Um novo professor pode liberar o espirito crítico que um outro não permitia que se desenvolvesse.

E depois, naquela idade, nove meses de diferença é um século. (ECO,2005, p. 214-215)

A arte é a expressão da vida, que associada ao processo de criação,

transforma-se na capacidade de exercer plenamente a condição de “ser

humano”. A arte favorece o desenvolvimento integral do sujeito, possibilitando a

expressão livre do pensamento e das emoções, desenvolvendo seu raciocínio

com criatividade e imaginação.

É a primeira forma de expressão do sentimento humano sem cobranças ou

limites, podemos constatar isso nas figuras gravadas e desenhadas nos

rochedos e interiores das cavernas pelos homens primitivos, desde as primeiras

civilizações até os dias de hoje. O homem através da pintura de cenas do seu

cotidiano, representava o que vivenciava e/ou sentia, a arte desperta a

consciência e desenvolve a expressão contribuindo para o pensar de uma atitude

crítica frente o mundo.

A expressão da arte pode se dar de diversas maneiras, seja numa canção,

escultura, representação teatral, pintura, numa poesia, dança, etc. Atualmente a

arte tem grande importância na vida das pessoas e nas suas mais diversas

manifestações, pois possibilita o encontro do ser consigo mesmo, de si com os

outros, e com a totalidade da realidade humana, é provocadora da capacidade

de observação dos fenômenos que os cercam, estimula a exteriorização dos

sentimentos.

A arte tem a função básica na formação do homem e não é somente por

meio de atividades de natureza lógica e objetiva que ele desenvolve as

competências necessárias para atuar no meio profissional, pois “[...] a arte é um

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processo criativo-fruitivo que constitui fonte de humanização e educação do

homem” (Peixoto, 2003, p.94).

O papel que a arte tem é tão importante quanto a dos outros conhecimentos

na formação humana, seja do aluno ou do educador, através da arte é possível

propiciar o desenvolvimento do pensamento artístico e da percepção estética,

que caracterizam um modo próprio de ordenar e dar sentido à experiência

humana, desenvolvendo a sensibilidade, a percepção e a imaginação. Também

favorece o desenvolvimento da criatividade através do diálogo que se estabelece

com as diversas áreas do conhecimento que compõem o currículo escolar.

Conhecer a arte de outras culturas nos propicia compreender relativamente

os valores que estão enraizados nos modos de pensar e agir, que podem criar

um campo de sentido para a valorização do que lhe é próprio, e beneficia a

abertura à riqueza e a diversidade da imaginação humana.

O conhecimento da arte abre perspectivas para uma compreensão do

mundo na qual, é possível transformar continuamente a existência, que criar e

conhecer são indissociáveis e a flexibilidade é condição fundamental para

aprender.

Barbosa (2007), ao discutir a função da arte em um país com tantos

problemas sociais como o Brasil, assegura que a arte ultrapassa o conceito de

que é mercadoria ou quadro para se pendurar na parede. Se por um lado o

contato com a arte leva o público a reflexão, à busca de mudanças, por outro

lado ela também possibilita o desenvolvimento cultural e individual.

Para Barbosa (2007, p. 27); “a arte possibilita o reconhecimento, a reflexão

na relação entre conteúdos históricos culturais e conceitos de arte, para mim é

ir além da própria obra em busca do campo de referências culturais que

determinam a identidade histórica e questionam a distorcida visão dos

colonizadores”.

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E Pessi (2007, p. 60), ressalva, “esse reconhecimento é resultado da

experiência estética que promove a autoconsciência, impulsiona atitudes e

contribui para processos de formação humana”. Nesse sentido, é possível

compreender a existência do sujeito na relação com o contexto em que vive.

Inúmeras discussões já foram realizadas em torno da importância e da

necessidade da arte na escola, realçando as possibilidades do homem interagir

com o mundo que o cerca, de forma criativa e crítica, a partir dos conhecimentos

aprendidos. Vivenciar a arte proporciona aos alunos condições de desenvolver

saberes necessários e significativos que envolvem os saberes estéticos

implicados no pensar e fazer arte, Salomé (2000).

O professor, como sujeito da cultura precisa apropriar-se de uma

sensibilidade estética, desenvolvida nas relações com os objetos culturais e

artísticos. Ao fruir a arte, o sujeito relaciona-se consigo e com o contexto que o

cerca, assim quando entra em contato com o que o outro faz por meio dos seus

sentidos, acorre o diálogo humano, nos enxergamos nela, no contexto social,

pois, a arte é parte do humano. Mesmo na condição de criador, percebe-se que

é possível expressar livremente o que pensamos e sentir o diálogo conosco e

com o contexto que o cerca.

Educar com arte significa educar através do contato com o outro, do

despertar dos sentimentos e da troca. É sair de si mesmo para enxergar o outro.

A arte é um fenômeno social na medida em que o artista também é um ser

social e a sua obra resultado das relações com outros membros da sociedade,

provocando um modo de interpretar e conhecer o mundo, e proporcionando ao

homem a possibilidade de mudar os fatos porque ele próprio é produtor desta

realidade.

Podemos então, apontar a arte como uma atividade decorrente da

elaboração, ao nível da consciência, de uma atividade produtiva com o intuito de

satisfazer uma necessidade de expressão e de afirmação da existência do

homem.

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Assim, a obra de arte torna-se um “mundo próprio”, não apensa para quem dela se aproxima, mas também para seu criador: ele a cria, mas ela o ajuda a elevar-se a uma altitude de subjetividade estético-social, única a permitir realizações artísticas. Precisamente por isso, é decisivo para a estética a necessidade de representar com verdade e ao mesmo tempo como um mundo humano, adequado ao homem, uma realidade que existe independente da consciência humana. (Lukács, 1978, p. 78)

Assim, é imprescindível compreendermos que a arte é uma produção da

existência do homem em suas múltiplas manifestações. Negar a capacidade de

criação do homem seria como negar a si próprio, uma vez que a produção

artística envolve a apropriação da realidade humana através da concepção da

realidade tanto por parte do artista, como por parte do espectador. Quando

produzimos arte, principalmente nos dias de hoje, apresentamos a realidade sob

nosso ponto de vista, nossos significados, percepções, pela combinação de

formas, expressões e linguagens que vamos tendo ao longo do tempo, mas

também como espectador que fomos.

A arte, é a criação individual destinada, por sua própria essência, a superar o seu criador, enquanto criação para os outros. A arte é duplamente social: na medida e que sendo uma criação única, individual e sem repetições, é a criação de um indivíduo socialmente determinado; e na medida em que a obra de arte não só satisfaz a necessidade de expressão do seu criador, mas também a de outros, necessidade que por sua vez, estes só podem satisfazer quando penetram no mundo criado pelo artista, compartilhando-o, dialogando com ele. (Vazquez, 1978, p. 264).

Portanto, quando entendemos a arte como uma obra aberta, no qual seu

sentido se completa com a atuação do espectador, a compreensão ocorre pela

reflexão sobre o que se está vendo, transformando-se na compreensão da

sociedade e do mundo do qual fazemos parte.

No ensino da arte se tem a concepção de que se deve estar livre para

expressá-la, pois a criatividade deve ser aflorada e o conhecimento construído a

partir das experiências vivenciadas, sem a obrigação com o conhecimento

específico da área prática, que empobrece a compreensão da arte como um

desenvolvimento da sensibilidade e da estética.

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A busca pelo conhecimento acontece por inúmeros caminhos e um deles é

o acesso a bens culturais. Através da arte, o sujeito amplia sua capacidade de

reflexão e percepção, assim como sua sensibilidade. Vigotski (1999) afirma que;

O que não estamos em condição de compreender inteiramente podemos compreender por via indireta, através da alegoria e toda ação psicológica da obra de arte pode ser integralmente resumida ao aspecto indireto dessa via. (VIGOTSKI 1999, p. 35).

Assim, é na relação com arte que o sujeito pode indiretamente se relacionar

consigo mesmo, ampliar sua rede de compreensão daquilo que o cerca. A

experiência estética pode ser um meio pelo qual o sujeito percebe melhor a si e

seu entorno.

Para Carvalho e Bufrem (2006, p. 56), esse desenvolvimento dos sentidos

humanos é o elemento principal no processo de humanização e o indivíduo, “ao

entrar em contato com experiências artísticas, traz todo o conhecimento

adquirido ao longo de sua vida, a arte neste contexto é parte da cultura e lhe

permite experimentar, por meio de seus sentidos, situações inusitadas”.

Ter acesso aos bens artísticos e culturais da humanidade, inúmeras vezes

se dá exclusivamente através da escola, principalmente nas classes menos

favorecidas financeiramente, assim a escola é um espaço privilegiado de

aquisição e conhecimento, deste modo concordamos com Saviani quando diz:

À educação, na medida em que é uma mediação no seio da prática social global, cabe possibilitar às novas gerações incorporarem os elementos herdados de modo que se tornem agentes ativos no processo de desenvolvimento e transformação das relações sociais. (SAVIANI, 2003, p. 143).

Neste contexto, vale ressaltar que muitos docentes que estão no interior da

escola também não tiveram em sua formação esse contato de construção e

desenvolvimento com a arte, e assim, acabam por também irem se formando

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junto com seus alunos à medida que vão propiciando essa experiência e

transformação às crianças. Na escola, podemos observar a separação entre

artista e obra, arte e trabalho através dos discursos que se abrem sobre o

conhecimento, desconsiderando a dimensão do trabalho artístico e assumindo

um caráter funcional da arte provida de uma utilidade funcional, seja para

embelezar os muros das escolas, para ilustrar as aulas das demais disciplinas

do currículo ou simplesmente para o descanso e o lazer dos alunos.

Quando se começa a discutir a educação e reforça-se a importância de

conteúdos significativos de maneira que se permita trabalhar o acesso ao saber

elaborado a todos os que se encontram na escola, é indispensável assegurar o

espaço da arte na educação na perspectiva da representação artística como

reflexo de uma realidade historicamente construída na relação homem- mundo,

homem- humanidade.

Para Saviani,

[...] o objeto da educação diz respeito, de um lado à identificação dos elementos naturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta de formas mais adequadas para atingir esse objetivo. (Saviani, 2003, p. 13)

Pensando na perspectiva da escola como um local de trabalho que tem o

saber elaborado, cremos que a arte deve ser ensinada e aprendida nas

instituições de ensino a partir de conteúdos significativos, combinados como um

produto do homem e que ao nos defrontarmos com ela nos apropriemos da sua

realidade e confrontemos com a nossa própria realidade. A arte possibilita ao

homem apropriar-se da realidade e transforma-la, Kosik afirma que:

Na grande arte a realidade se revela ao homem. A arte, no sentido próprio da palavra, é ao mesmo tempo desmistificadora e revolucionária, pois conduz o homem desde as representações e os preconceitos sobre a realidade, até a própria realidade e à sua verdade. Na arte autêntica e na autêntica filosofia revela-se a verdade histórica: aqui a humanidade se defronta com a própria realidade. Qual é a realidade que na arte se revela ao homem? Talvez uma realidade que o homem já conhece e da qual deseja apenas

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apropriar-se sob outra forma, isto é, representando-a sensivelmente? (Kosik, 1994, p. 130).

Deste modo, podemos perceber a importância de se desenvolver um

trabalho significativo com arte na escola, no qual o objetivo de se possibilitar o

acesso à produção artística seja alcançado, visto que a educação necessita ser

colocada a serviço do fim da marginalização do conhecimento, no qual vive a

maioria da população, o que significaria “articular o trabalho desenvolvido nas

escolas com o processo de democratização da sociedade”, Saviani (2002, p.79)

A arte como já dissemos anteriormente nos permite ver o mundo de outra

forma, com outros olhos, faz com que captamos as coisas que estão ao nosso

redor, e se ver constitui o conhecer, e, portanto, entender, pensar e repensar o

que vemos, para assim fazermos a leitura crítica do mundo no qual, fazemos

parte, onde podemos deixar marcas para contribuir com a história. Quando

vemos mais, também aprendemos mais, aí aumentamos nossas possibilidades

de contato com a nossa própria realidade, passando a entender sempre mais o

que faz parte de nós mesmos, pois a arte busca o pensamento crítico em relação

ao mundo em que vivemos, relacionando assim a arte e a vida.

A arte envolve de forma que perdemos completamente o rumo de nossas

ideias, já não há mais sentido, tudo se confunde; mas nessa confusão que surge

algo novo, é nesse novo que renasce uma força avassaladora, que entra na

mente, fazendo com que o ser humano pense e reflita através da arte sobre sua

vida, transformando assim, a arte em uma canção para nossos ouvidos e uma

miragem para nossos olhos, tocando assim nossa alma, e invadindo nosso ser,

fazendo assim o ser humano simplesmente pensar, Seidel (2016)

Podemos concluir então, que a arte nos leva a viajar através das cores e

formas que nos rodeiam, representando a nossa atualidade de forma que o

espectador interprete as mais variadas formas, acompanhando o homem e sua

história em manifestações que refletem o contexto social do momento em que

ele está inserido.

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A arte é uma atividade fundamental ao ser humano, pois quando o homem

produz, ele interage com o mundo em que vive e consigo mesmo. Ela é

necessária para que o ser humano se torne capaz de conhecer e assim estimular

o pensamento humano, de fazer pensar sobre o mundo em que se está inserido

e sobre a própria forma de vida, tudo isso porque a arte é um conhecimento, uma

expressão humana muito forte, é um grito que provém da alma.

Através da arte pode-se criar e recriar tudo, dar um novo sentido a nossa

existência, retratar o presente da nossa própria maneira, para que este colabore

com a história, na qual cada um se faz presente, deixando assim marcada a

nossa época, o nosso hoje, a nossa contemporaneidade.

O produto da arte deve levar a reflexão, fazer com que o sujeito pense, e

questione sobre o que está vendo e analisando, e não simplesmente ver, pensar

que entendeu, reduzindo assim a um significado banal, a arte vai ao contrário

disso, ela quer o ápice do pensamento humano, entrando assim com sua função,

que é fazer as pessoas refletirem.

O principal sentido da obra de arte é, a sua capacidade de intervir no processo histórico da sociedade e da própria arte, ao mesmo tempo, ser por ele determinado, explicitado, assim a dialética de sua relação com o mundo.” (Fusari e Ferraz, 1993, p. 105).

A seguir, veremos como a arte se manifesta através da literatura, tendo em

vista que o objetivo desta pesquisa foi realizar uma formação docente continuada

no interior da escola, tendo a literatura como aliada ao texto teórico pedagógico.

2.1. A Arte através da Literatura na Formação Docente

Ao pensar no movimento literário como instrumento de formação por meio

da arte, partimos em busca de bibliografias que abordassem a formação humana

e/ou formação docente através de poesias, contos, etc. No entanto, isto não foi

uma tarefa fácil, uma vez que que muito se fala sobre a importância da arte na

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formação humana, mas pouco se diz sobre o uso de uma modalidade artística

neste desenvolvimento como instrumento nesse processo.

O registro escrito surgiu nas línguas europeias na segunda metade do

século XV, nas línguas francesas, italianas, castelhanas e inglesa, sua definição

era ligada ao saber e a ciência em geral, era denominado como literatura todo e

qualquer texto, de qualquer área (Aguiar e Silva, 1991). Essa falta de

especificidade ao que era a literatura, ou seja, a ausência de elementos do que

era literário, deixou um campo aberto que acolhia qualquer produção, ancorado

em uma premissa de que se tudo é literatura, nada é literatura. Até o século XVIII

não havia separação entre o que era poesia e o que era prosa, isso contribuía

mais ainda para que se empregasse o termo de forma indiscriminada.

Passado o século XVIII, houve um aumento no público leitor e como

resultado houveram algumas alterações na sociedade, como por exemplo o

acesso da classe burguesa à cultura. A leitura de obras literárias começou a ser

vista como um passatempo e a literatura passou a ser percebida como arte e

como tal apresenta valores estéticos.

No século XXI o leitor passa a assumir uma postura de abandono de

verdades estabelecidas e se insere num movimento de descrença e de procura

para entrar nas obras, assumindo assim uma postura multivalente e de

coautorias.

No século XXI o conceito de literatura como fenômeno estético se firmou e

como consequência provocou nos leitores um processo de fruição. Desde então,

a literatura vem ganhando espaço no campo das artes e inúmeros autores como

Eco (2003), Culler (2003), Galeano (2003) e outros não mais eram vistos como

simplesmente um texto escrito, mas um objeto estético. Kristeva (1974)

denomina os textos literários como algo que está por ser feita, algo que se

concretiza pela permutação com outros textos, reforçando a ideia da construção

em rede, um texto permite a associação de vários conceitos porque é composto

em redes que são múltiplas e se entrelaçam, o que não permite uma visão única

do objeto, pois nunca uma leitura domina sobre outra.

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Nessa concepção de obra como algo argiloso que vai se construindo, se

compondo pelo leitor, num processo que vai se construindo mediante as

intervenções do leitor. Assim, algumas obras nos permitem mais entradas que

outras, algumas permitem inúmeras interpretações, pois, estão organizadas para

estimular o mundo do leitor a emergir.

Assim, fomos buscar como vem sendo trabalhada a literatura nas escolas

atualmente, e ao realizar uma análise bibliográfica de como vem sendo

trabalhada a literatura ao longo dos séculos, foi possível encontrar muitos

movimentos que se iniciaram partir do século XVIII que tiveram como

predominante a concepção de literatura como fenômeno estético. Poetas,

contistas, romancistas como Fernando Pessoa, Ítalo Calvino, Guimarães Rosa,

Alan Poe, Mario de Andrade, Clarice Lispector, entre outros criaram uma

linguagem que creditava a literatura como um fenômeno estético, colocando-a

num patamar de arte que sobretudo, foi imensamente apreciada.

Embora tenha havido um grande esforço, a literatura na escola, ainda no

século XXI, é vista apenas como um domínio de parte da pedagogia, ou seja,

como um conteúdo a ser ensinado e aprendido. Esta percepção também é

enraizada na formação docente, que acreditam que a literatura é uma ferramenta

pedagógica para ensinar determinados conteúdos curriculares, não a

compreendem como um objeto estético.

No currículo educacional podemos observar que a literatura na escola, ao

longo dos anos vem sido usada prioritariamente como uma estratégia de ensino,

ou seja, como uma forma de se ensinar os componentes curriculares ou reforçar

valores, como é o caso das fábulas, deste modo, ela deixa de ser um meio de

prazer e passa a ser uma doutrinação. Ai muitos se afastam da leitura.

A percepção da literatura fruitiva, está atrelada a um objeto estético, e é

satisfatório pois conforme diz Barthes (2001), exige do leitor uma entrega, uma

imersão no texto para encontrar sua verdade, seu desfeixe, mas sobre tudo para

efetuar a sua ampliação, expandir seus significados.

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Barthes diz que fruição é;

“aquele que põe em estado de perda, aquele que desconforta (talvez até um certo enfado), faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas, do leitor, a consciência de seus gostos, de seus valores e de suas lembranças, faz entrar em crise sua relação com a linguagem.” (Barthes 2001, p. 22)

A fruição para Barthes está relacionada ao estado de busca que o leitor se

coloca em frente ao texto.

Eco (2003) atribui várias funções à literatura, mas em particular nos chama

a atenção quando diz que; a literatura existe para deleite fruição ou mesmo por

amor a si mesmo. Nesse aspecto reconhece que por meio do deleite o leitor pode

ampliar seus conhecimentos, além de possibilitar ao leitor a construção de sua

personalidade e de sua pessoa frente ao mundo.

A literatura nos permite a construção de valores, da ética, da moral,

respeito, entre outros, permite leituras diferentes de mundo, ou simplesmente

nos fornece modelos de vida e comportamento.

O processo de formação continuada com os sujeitos dessa pesquisa teve

o objetivo de ampliar o âmbito da reflexão acerca do uso da literatura e criar um

momento para que percebessem e humanizassem seus sentidos por meio de

vivências literárias.

2.2. A literatura pede passagem

Que me deixem passar- eis o que peço Diante da porta ou diante do caminho. E que ninguém me siga na passagem.

Não tenho companheiro de viagem Nem quero que ninguém fique ao seu lado.

Para passar, exijo estar sozinho, Somente de mim mesmo acompanhado.

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Mas caso me proíbam de passar Por ser eu diferente ou indesejado

Mesmo assim eu passarei Inventarei a porta e o caminho

E passarei sozinho. (Ledo Ivo, 2000)

Pensando nessa passagem e de como utilizamos nesta pesquisa a

literatura, encontramos uma definição que nos remeteu ao que nos emergiu a

realiza-la.

Segundo Antonio Candido (2015) a literatura se manifesta universalmente

através do ser humano, e em todos os tempos, tem função e papel humanizador,

pois ninguém é capaz de ficar as vinte quatro horas de um dia sem momentos

de entrega ao “universo fabulado”.

Além disso, assegura que;

[...] a literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos e, portanto, humaniza. (Candido, 1989, p. 122)

Assim, compreende-se que a literatura diz respeito a um caráter

humanizador, demonstra o homem e depois atua em sua formação. Exercendo

uma função social importante.

É através dela que “indivíduo abandona temporariamente sua própria

disposição e preocupa-se com algo que até então não havia experimentado. Traz

para o primeiro plano algo diferente dele, momento em que a vivencia a

alteridade como se fosse ele mesmo”. (Zilberman, 1999, p. 84)

Deste modo, a experiência vivenciada por quem lê a literatura é

diretamente relacionada ao horizonte de sua expectativa, em sua compreensão

do mundo, como ao seu comportamento social.

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Um texto literário não constitui necessariamente um utilitário. Mas é o

leitor que a partir do diálogo com o mesmo, que atribui funções ou finalidades. O

texto literário oferece inúmeras funções importantes, com ele aprende-se,

compara-se, questiona-se, diverte-se, amadurece-se, transforma-se, vive-se,

desenvolve-se a sensibilidade estética com as mais diferentes visões de mundo.

A literatura não dá apenas conhecimento ao leitor, ela sobretudo forma o

espirito, de maneira que suas ações sobre o mundo sejam carregadas dessas

riquezas. Perante a literatura abre-se inúmeras virtualidades cognitivas do texto,

pois como seres únicos temos condições de interpretar das maneiras mais

diversas. O contato com o texto literário é riquíssimo para o desenvolvimento

cognitivo e emocional dos sujeitos, deste modo, eles podem constituir-se cada

vez mais como seres humanos críticos e reflexivos, afinal não há uma leitura

pronta e única desse tipo de texto, pois o texto se produz no pleno diálogo entre

texto-leitor-autor.

Vivemos em uma época em que as pessoas dialogam pouco, no entanto,

fala muito consigo mesma e não conseguem efetivamente, colocar-se no lugar

do outro e essa possibilidade que a literatura nos dá. A literatura nos mostra

como vive outra pessoa, como pensa, como sente. Assim, ela possibilita o

alargamento dos horizontes, visto que proporciona aos sujeitos uma posição

crítica a diversidade vivenciada pelo leitor.

A literatura tem uma natureza perturbadora, causadora de inquietações.

Quando ela se nutri da tradição ou de algo inovador, está propondo diferentes

concepções de mundo, transita pelo que é real, expressa e interpreta o que é

possível, indo além do plano imaginário.

A complexidade que envolve um texto literário, se reflete em seu

aprofundamento filosófico, existencial e social, aceita o acaso, criatividade e o

inesperado como componentes do processo de vida social, questiona a

linearidade das ações humanas e atua com base em redes que simultaneamente

separam e unem conhecimento, em sistemas de organização abertos que

permitem a ampliação e aprimoramento do ser individual e socialmente.

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Compete a literatura a emancipação da humanidade de suas amarras naturais,

religiosas e sociais.

Cavalcati e Pereira (2010), ressalvam que a função da literatura fica ainda

mais delicada, quando se refere ao gênero poético, visto que é muito comum

vermos os próprios poetas dizerem que a poesia não tem função alguma, pois

não tem valor de troca no mundo dominado “pelo capitalismo e pelo status da

mercadoria como bem supremo”.

E Bossi (2003), distingue a poesia como a forma mais densa e mais

intensa da expressão verbal, intensamente ligada às experiências mais intimas

e mais significativas do ser humano, expressão de sua subjetividade mais

radical. Além dessa característica existencial e fundamental, a poesia também

tem o papel de contradizer ideologias abusivas, em especial ideologias

dominantes. Para nós, a poesia é a expressão de sentimentos despida das

amarras da ignorância, pois nos toca ao entrarmos em contato, de forma tão

avassaladora que somos contagiados pelas palavras e surpreendidos

geralmente pelas lágrimas, que surgem naturalmente ao lermos as palavras

descritas pelo autor.

A busca por uma educação de qualidade fez com que estudiosos da

formação contínua docente se focalizassem em determinados aspectos da

formação. Entretanto, essa busca ora foi por soluções externas, ora foi de

identificar um culpado pelo fracasso escolar, ora de divulgar os resultados dos

bons professores.

Refletindo sobre a arte e os benefícios que ela traz ao ser humano quando

este a compreende, vivencia ou simplesmente se vê naquela situação descrita,

é que buscamos realizar esta pesquisa num processo de formação dentro da

escola, tendo como base a necessidade de um ATPC significativo. A reflexão

sobre este estudo nos inspirou a realizar uma nova forma de ação e a idealizar

e realizar as ATPCs, de forma que passassem a ser significativas e fossem um

espaço e meio de desenvolvimento profissional contínuo para os professores em

serviço.

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Discutidos os fundamentos teóricos que nortearam a pesquisa, trazemos

no capítulo seguinte, a descrição da dinâmica de nossa proposta de trabalho e

de pesquisa, que nos levou a iniciar um programa de formação pensando nas

narrativas de Galeano como mediadoras nesse processo de desenvolvimento

profissional.

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3. PERCURSOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

“É preciso ir lá para ver com os olhos dos outros! ”

(Simoni, 2000)

Neste capítulo, será apresentado o percurso metodológico utilizado para

realizar este trabalho acadêmico. Ao pesquisar a formação docente na escola e

o uso da literatura como aliada nesse processo, este estudo se propõe a

compreender como a escola pode se organizar para que seja de fato um espaço

de formação continuada significativa para os docentes que nela atuam. Visto que

nosso objetivo, é analisar uma formação oferecida na Aula de Trabalho

Pedagógico Coletivo- ATPC, utilizando a arte como mediadora na

aprendizagem, para identificar como os docentes participantes foram afetados

pela utilização do texto literário nesse processo de formação.

3.1. Pesquisa Qualitativa: a minha opção

Considerando a proposta da pesquisa que desejávamos realizar e

consolidar como um trabalho acadêmico, optamos por utilizar uma abordagem

qualitativa, visto que está nos permite obter respostas ao problema de maneira

predominantemente descritiva, aprofundando a compreensão do que ocorre na

formação docente em serviço e como acontece.

Avaliamos que algumas características são de extrema importância para

optarmos por essa linha de pesquisa, são elas; o espaço da ATPC, a formação

idealizada e a oferecida, os sujeitos participantes, o impacto que a arte pode

causar na compreensão de determinados assuntos e na composição de um novo

educador. Deste modo, buscamos utilizar uma metodologia de pesquisa que nos

possibilite compreender como se dá o processo formativo através de uma

proposta de formação, no horário da ATPC, realizada numa escola da rede

Estadual de São Paulo, localizada no extremo da zona leste da cidade de São

Paulo.

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De acordo com MINAYO (1994), a pesquisa qualitativa;

Trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. (MINAYO, 1994, p.21).

Vale ressaltar, que essa constituição é provisória, pois leva em

consideração o momento histórico em que os fatos estão inseridos e o seu

contexto atual.

Ainda com a finalidade de justificar a escolha pela metodologia utilizada,

CHIZZOTTI (2005) esclarece que esta investigação advoga uma lógica

adequada para o estudo dos fenômenos humanos e sociais, buscando os

significados dos fatos no contexto concreto em que acontecem. A pesquisa

qualitativa norteia para a;

Análise dos significados que os indivíduos dão às suas ações no meio ecológico em que constroem suas vidas e suas relações, a compreensão do sentido dos atos e das decisões dos atores sociais ou, então dos vínculos indissociáveis das ações particulares com o contexto social em que estas se dão. (CHIZZOTTI, 2005 p.78)

As características da pesquisa qualitativa foram de extrema importância

para optarmos por essa linha, tendo em vista que nossas preocupações eram de

tornar os horários da ATPC de fato formativo, e neste contexto os professores

participantes é que iriam nortear o caminho que iriamos seguir na formação

proposta. Com a intenção de descobrir quais temas, assuntos os docentes da

unidade escolar gostariam que fossem discutidos nos horários da ATPC,

passamos a pensar como seria então, essa coleta de dados?

A coleta de dados sobre que temas os professores gostariam de ter

discutidos nas ATPCs, se fez necessário para que pudéssemos realizar planejar

o processo formativo, e incidiu sobre um questionário com questões

semiestruturadas.

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Utilizar o questionário como um método de coleta de dados é uma prática

que tem sido muito difundida na pesquisa qualitativa. Talvez se explique pelo

fato de vincular as expectativas do que é mais próximo do que os sujeitos

pesquisados sentem, e mais livres para descreverem suas opiniões sobre o

assunto estudado, ao mesmo tempo em que é resultado de um planejamento

anterior, permitindo que o respondente possa conduzir suas respostas no que

lhe é mais significativo.

O questionário é um instrumento que propicia respostas às questões em

esferas mais específicas, de acordo com CHIZZOTTI (2005);

Consiste num conjunto de questões pré-elaboradas, sistemática e sequencialmente disposta em itens que constituem o tema da pesquisa, com o objetivo de suscitar dos informantes respostas por escrito ou verbalmente sobre o assunto que os informantes saibam opinar ou informar. (CHIZZOTTI, 2005, pg. 55).

Quando o pesquisador elabora uma questão, visa exatamente àquilo que

espera dentro de sua pesquisa, de seu objetivo principal, é uma interlocução

planejada. Esta opção com certeza é válida para os questionários

semiestruturados que permitem uma troca entre o pesquisador, o sujeito da

pesquisa e a questão pesquisada. Essa interação entre o pesquisador e o

pesquisado, que neste estudo é o docente sujeito desta pesquisa, ocorre quando

o entrevistado se posiciona e se expressa ao escrever sua resposta e dessa

maneira, traduz seus pensamentos, apresenta seus anseios, suas frustrações,

seus valores sobre o tema e favorece o esclarecimento ás questões abordadas.

CHIZZOTTI (2005, p.55-56) comenta que; “o pesquisador, ao optar pelo

questionário, deve ter clareza das informações que investiga para, assim, ter a

resposta ao seu problema, o que pretende analisar”. As respostas obtidas dos

sujeitos da pesquisa são tarefas que exigem critérios de planejamento, para

esgotar todos os aspectos dos dados que se quer obter, sem descuidar dos

temas essências da investigação.

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Portanto, para alicerçar o processo formativo que pretendiamos o

questionário foi a melhor alternativa de investigação, para conhecermos a

opinião dos docentes da unidade escolar sobre os momentos de formação, na

ATPC.

Cumpre observar que no final do de cada ano letivo, a escola aplica um

questionário de avaliação final para todos os docentes, o objetivo é avaliar o que

deu certo naquele ano, o que deu errado e o que pode ser melhorado. Os

questionários aplicados anteriormente continham questões sobre vários

aspectos da escola, mas não tinham perguntas especificas a respeito da

formação docente na escola, ou seja, sobre os momentos da ATPC.

Pensando no trabalho de formação que pretendíamos realizar no próximo

ano, nas ATPCs, desenvolvemos um questionário (segue em anexo I) com

perguntas voltadas especificamente para estas ocasiões na escola, nossa

intenção era ter elementos que nos indicasse o que os docentes pensavam sobre

essas horas aulas que tem e ocorrem na escola, e que fazem parte de sua grade

horária de trabalho. Por vezes, sabemos de suas reclamações em ter que estar

ali naquele momento, mas o que de fato lhes desagradava nunca ficou muito

claro, deste modo, acreditando que podíamos oferecer uma formação que fosse

significativa aos docentes, fizemos algumas questões especificas sobre a ATPC

na escola, como por exemplo;

Você entende a escola como um espaço de formação continuada

para o docente?

A escola oferece condições ideais para a realização das ATPCs

(aula de trabalho pedagógico coletivo)?

Os temas vistos este ano nas ATPCs foram? Satisfatórios,

atenderam parcialmente as necessidades ou foram insatisfatórios?

Que temas poderiam ser estudados, trabalhados nos horários de

formação na escola?

Nos questionários aplicados, os docentes não precisavam se

identificar, deixamos esta opção para que pudessem responder com mais

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liberdade de expressão, acreditávamos que se pedisse a sua identidade

poderiam sentir-se constrangidos e nós não teríamos os dados do qual

precisávamos, deste modo, no início do questionário deixamos a seguinte

frase:

“Caro colega, suas respostas nos ajudarão a melhorar nossa

atuação como gestores. Por favor, dê suas opiniões e sugestões de

forma sincera neste questionário, não há necessidade de se identificar,

mas caso queiram no final há um espaço opcional. Obrigada! ”

3.2. O local da Pesquisa

A escolha da unidade escolar se deu pelo fato da pesquisadora atuar na

mesma como Vice-Diretora e perceber a necessidade de uma formação em

ATPC, que fosse de encontro aos anseios docentes. O fato da escola contar

apenas com professores especialistas, dificulta os temas e assuntos de

formação. Por diversas vezes, ao participar de alguns momentos de formação

notava o quanto o grupo se mostrava interessado em alguns temas, ignorava

outros, e alguns docentes cobravam formações mais específicas, alguns traziam

contribuições que enriqueciam em demasia o cotidiano da escola, etc.

NETO (2004, pg.54), comenta que “o lugar primordial é o ocupado pelas

pessoas e grupos convivendo numa dinâmica de interação social, essas pessoas

e esses grupos são sujeitos de uma determinada história a ser investigada,

sendo necessária uma construção teórica do objeto de estudo” (NETO, apud

MINAYO, 2004, pg.54).

Tendo em vista que nosso objetivo é construir um trabalho de pesquisa,

num grupo no qual, pesquisador e pesquisados interagem entre si, acreditamos

que a construção teórica de nosso objeto de estudo irá se constituir a partir dos

dados obtidos, discutidos e analisados.

NETO (2004), ressalta ainda que;

“Partindo da construção teórica do objeto de estudo, o local torna-se um palco de manifestações de intersubjetividades e interações entre

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pesquisador e grupos estudados, propiciando a criação de novos conhecimentos.” (NETO apud MINAYO, 2004, pg.54).

A unidade escolar palco desta pesquisa tem matriculados no Ensino

Fundamental dos Anos finais e Ensino Médio, cerca de um mil e oitocentos

alunos, divididos em três períodos distintos, manhã, tarde e noite. Contava no

início do ano letivo de 2017 com cerca de setenta docentes efetivos estatutários

da Rede Estadual de São Paulo, doze docentes estáveis e estatutários e cinco

contratados em regime de CLT, também pela Rede Estadual.

O quadro gestor da escola é composto por um Diretor, dois vice-diretores

(um dos vices- diretores atua como pesquisador), um vice-diretor responsável

pelo Projeto Escola da Família e dois professores coordenadores pedagógicos.

Há ainda dez professores readaptados que auxiliam nos serviços de secretaria

da escola.

O quadro de funcionários é composto por uma gerente e dez agentes

educacionais, mais quatro merendeiras e quatro auxiliares de serviços gerais,

que trabalham numa cooperativa, prestando serviços através de contratos com

a Secretaria Estadual de Educação.

A escola está localizada no extremo da zona leste, da cidade de São

Paulo, local considerado de alta periculosidade devido ao alto índice de

desemprego local, mas principalmente pela falta de opções de lazer e cultura

para a população carente que vive numa localidade praticamente abandonada

pelo poder público.

3.3. Os respondentes do questionário

Os respondentes do questionário avaliativos já referidos, foram os

educadores atuantes na unidade escolar que no ano letivo de 2016 eram 62

professores “efetivos” (concursados no regime estatutário) da Rede Estadual de

São Paulo, 9 professores estáveis (contratado em regime estatutário pela Rede

Estadual) e mais 8 professores contratados (em regime CLT pela Rede

Estadual).

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A escola possui quatro horários para a ATPC sendo terça-feira manhã e

tarde, e quarta-feira manhã e tarde. Os horários da ATPC no qual a proposta de

formação da pesquisa se desenvolveu, ocorreu em dois dias diferentes, na terça-

feira das 17h às 18h 40minutos e na quarta-feira, das 16h 40min até 18h 20

minutos. Os docentes participantes na segunda fase da pesquisa, (processo

formativo na ATPC) foram os que cumpriam suas ATPCs nesses horários.

3.4. Procedimento da Coleta de dados

O procedimento de coleta de dados deste trabalho de pesquisa se deu

em dois momentos diferentes, como já referido.

As respostas que obtivemos no questionário avaliativo (primeira

momento) foram as mais diversas, algumas imparciais outras bem pontuais, mas

acreditamos que foi uma amostra de participantes considerável e que já nos dá

um retrato do corpo docente que compõem a unidade escolar. Os temas

apontados pelos docentes para que fossem estudados na ATPC foram, entre

outros:

Relação professor x aluno;

Indisciplina;

Práticas pedagógicas;

Métodos de avaliação;

Avaliações externas;

Projetos;

Aulas dinâmicas;

Outras.

Obtivemos algumas respostas que nos diziam que os ATPCs estavam

bons, e que poderiam continuar como estava, que os temas abordados eram

satisfatórios, etc. No entanto, consideramos essas respostas insuficientes, visto

que nosso objetivo era ter um caminho para iniciar o próximo ano letivo com uma

formação que atendesse as necessidades do maior número de docentes

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possível, e as considerações dos professores não nos ajudaram nesse

propósito.

No início do ano de 2017, novamente os professores foram consultados,

com o mesmo questionário e as respostas foram igualmente amplas e muito

semelhantes a do ano anterior. Observamos que as respostas obtidas, depois

de três meses e com alguns docentes presentes, que não faziam parte do quadro

da unidade escolar no ano anterior, continuaram as mesmas.

Assim, com os dados colhidos partimos então para a elaboração da

formação docente na ATPC.

3.5. Proposta Metodológica: Elaborando e Realizando a Formação Docente em ATPC

Pela dificuldade em trabalhar as ATPC com professores especialistas,

que é o caso da escola no qual a pesquisa foi realizada, e por acreditar que a

arte é importante na formação humana, colabora na interpretação não apenas

de textos, mas da vida como um todo e na tentativa de fazer com que os

docentes conhecem uma formação diferente, utilizando o texto literário

propusemos um programa de formação com vários encontros, no qual a literatura

estaria sempre presente legitimando a aprendizagem em torno dos teóricos

discutidos.

Para iniciarmos o programa de formação, escolhemos o livro de Paulo

Freire; A pedagogia do oprimido, porque este englobaria todos os temas

propostos pelos professores, no questionário avaliativo.

No primeiro encontro discutiríamos a introdução e o primeiro capítulo, nos

quais o autor vai descrevendo como é ser aluno nesse universo que é a escola,

e por vezes convida o docente para se colocar no lugar de aluno também.

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Em nossa proposta de formação a cada encontro teríamos um texto

pedagógico e um texto literário, que seria utilizado ao final da discussão com o

intuito de que a arte colaborasse não apenas com a interpretação do texto, mas

que também ampliasse o universo de compreensão do docente acerca do

contexto em que está inserido.

Foi chegada a hora de planejar como ocorreria a formação para os

docentes nas ATPC. Durante todo o processo inicial desta pesquisa, a

pesquisadora (vice-diretora) e aos dois coordenadores pedagógicos

conversavam sobre a necessidade de se oferecer uma formação que de fato

fosse significativa para os docentes, visto que inúmeras vezes eles vêm de uma

jornada de trabalho dupla, cansados, desanimados com um cotidiano árduo, sem

vontade de estar naquele momento e lugar.

Para que pudéssemos desenvolver este trabalho nos colocamos diante

de uma grande provocação, que é pesquisar e formar ao mesmo tempo como

lembram ALMEIDA E BRUNO (2004);

Esse tipo de pesquisa, com diferentes adjetivações (colaborativa, de intervenção, de parceria, de aprendizagem conjunta) enfrenta desafios, pois coloca os pesquisadores, ao mesmo tempo, como coautores de ações e como investigadores dessas mesmas ações. Embora reconhecendo também que os processos de formação e de pesquisa se articulam em vários momentos, é preciso também reconhecer a especificidade de cada um. (ALMEIDA & BRUNO, 2004).

Devido ao horário de trabalho da vice-diretora, que neste caso é também

a pesquisadora, e de um dos professores coordenadores pedagógicos serem o

mesmo, a proximidade entre ambos facilitou as conversas formais e informais,

sobre formação continuada na escola, formação docente do professor e as

necessidades da escola que se estendiam para o andamento da pesquisa.

Enquanto a pesquisadora apontava para o coordenador pedagógico

algumas necessidades que percebia na formação dos docentes que atuam na

escola, o coordenador trazia de volta sua percepção acerca do grupo, visto que

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sua relação é mais direta e próxima dos sujeitos da pesquisa. Nestas idas e

vindas de conversas, olhares, observações e percepções, chegamos à

conclusão que deveria ser oferecida uma formação que atendesse a demanda

de nossos professores, pois são especialistas em disciplinas variadas, alguns

até pós-graduados, assim se fazia necessário discutirmos textos e temas

fundantes que englobariam as demandas solicitadas.

Após inúmeras conversas entre pesquisadora e coordenadora

pedagógica, chegou-se à conclusão que deveríamos discutir em nosso

programa de formação o que era ser um educador nos dias de hoje, e mais que

alunos temos hoje? Pois acreditamos que só assim o docente seria capaz de

avançar em qualquer outro tema de formação proposto, dentro das demandas

levantadas no questionário.

Assim, após inúmeras leituras e discussões chegamos à conclusão que o

autor que melhor conversaria com os anseios dos docentes neste momento, e

que se faz uma leitura obrigatória para qualquer pessoa que deseja atuar na área

da educação é do Professor Paulo Freire. Portanto, decidimos que o texto

pedagógico que utilizaríamos na discussão seria a “Pedagogia da Autonomia:

saberes necessários à prática docente”, especialmente o primeiro capítulo, que

discute a não existência da docência sem ser aluno, ao mesmo tempo em que

ensinamos. Vale ressaltar que está é uma leitura presente em “quase” todos os

cursos de licenciatura, concursos públicos na área da educação, mas, no

entanto, no cotidiano de nossa prática parecemos por vezes não saber lidar com

aquele aluno que nos faz uma pergunta da qual não temos respostas, ou

simplesmente pelo fato do aluno não se comportar como acreditamos ser o

correto.

Escolhido o tema inicial da formação que pretendíamos oferecer aos

docentes, ficamos frente a um grande desafio, que autor não acadêmico utilizar

nesta formação? E escolhido Galeano, veio então a pergunta: que narrativa de

Galeano utilizaríamos como aporte nesta formação? Uma vez que, utilizar as

narrativas de Galeano, foi nossa opção mesmo antes de escolhermos o texto

pedagógico, pois foram nas leituras de seus textos que surgiu nossa proposta

de pesquisa.

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Autor, tema e texto para iniciar a formação na ATPC, já tinham, mas e

agora como escolher um texto de Eduardo Galeano que fosse de encontro ao

que gostaríamos que fosse apreendido significativamente naquele momento?

Foi então, que enquanto pesquisadora fui em busca do nosso objeto de estudo,

o texto literário que nos no auxiliaria na compreensão do texto científico

pedagógico, assim revisitamos as narrativas do livro; O livro dos abraços de

Eduardo Galeano. Após inúmeras leituras e tentativas de levar algo que

contribuísse não apenas com a interpretação do texto de Paulo Freire, mas que

também fizesse com que o docente através da arte enriquecesse sua visão do

mundo que o cerca, acabamos escolhendo os seguintes contos; “A dignidade da

arte” e “O baixo astral”, já que ao ler ambos, tivemos a impressão que traduziam

de forma poética o que Freire nos diz de forma técnica. (Anexo II)

Com ambos os textos escolhidos, tanto o pedagógico, como as narrativas,

partimos então para a realização da formação docente na aula de trabalho

coletivo pedagógico, a ATPC.

A proposta de desenvolvimento da pesquisa foi pensada e planejada pela

coordenadora pedagógica e vice diretora também pesquisadora, em um conjunto

de formação de quatro encontros, envolvendo os textos teóricos e literários que

seriam utilizados em cada encontro, no entanto, para essa pesquisa nos

aprofundaremos apenas em um encontro de formação, o primeiro, com o objetivo

de investigar como o uso do texto literário afeta a formação do educador.

O primeiro encontro de formação ocorreu então, numa terça-feira à tarde

e iniciou com a pesquisadora esclarecendo como se daria esse programa de

formação nas ATPCs, avisamos que o encontro seria gravado através de áudio,

para que após a discussão pudéssemos realizar a análise daquele momento e

também planejar o próximo encontro de formação.

Ao aceitarem, pedimos que preenchessem o termo de consentimento (em

anexo III). Durante este encontro, também foi utilizado um diário de campo com

a finalidade de anotar os pontos intuídos, discutidos e que naquele momento

julgamos importante.

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A dinâmica de nossa proposta de trabalho nos levou a iniciar a ATPC,

apresentando a proposta de formação do dia, que era discutir a introdução do

livro do professor Paulo Freire, A Pedagogia da Autonomia: saberes necessários

à prática educativa. Mas antes de iniciarmos a discussão, esclarecemos que

aquele encontro seria utilizado como parte da pesquisa de mestrado da vice-

diretora, perguntamos se estavam todos de acordo e se alguém se opunha com

a gravação de áudio que ocorreria, todos os presentes concordaram e não se

opuseram a gravação, concordando assim, em integrar a pesquisa.

A pesquisadora então inicia perguntando se alguém já conhecia o livro de

Paulo Freire? Todos disseram conhecer, mas apenas duas pessoas disseram

que tinham visto na faculdade, no entanto, não se lembravam mais. Recordaram

também que ao estudar para o concurso público que pleiteava o cargo de

professor de ensino fundamental II e médio também leram, mas já não

compreendiam mais o autor, parecia que suas ideias haviam ficado confusas.

Então, propusemos uma leitura compartilhada, a cada trecho lido por um

participante, iriamos discutindo o que havíamos entendido e o que o autor estava

dizendo. Todos concordaram que fosse feito assim.

Iniciamos a leitura do texto de forma compartilhada e a medida que

sentíamos a necessidade, ou seja, que algo no texto nos chamava atenção,

íamos parando e debatendo sobre aquele ponto. Pesquisadora e coordenadora

pedagógica foram intervindo na discussão e leitura à medida que percebiam que

algo importante estava contido no fragmento lido, houve momentos em que os

docentes pediam para parar e interviam na leitura, o que tornou aquele momento

rico nas interpretações, discussões e compreensão do texto.

Havíamos preparado uma apresentação em slides para que pudéssemos

ir discutindo, mas diante da demanda que se apresentou exibimos apenas 2

slides que continham a apresentação da proposta de formação e o objetivo do

texto, visto que naquele momento o grupo acabou optando por realizar a leitura

compartilhada a fim de irmos juntos discutindo o texto à medida que houvesse a

necessidade, ou alguém sentisse vontade de intervir, uma vez que todos os

membros do grupo tinham liberdade para isso.

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A leitura do texto transcorreu de forma tranquila e muito proveitosa, o

professor Tatoo contribuiu muito na compreensão do texto, dando exemplos do

cotidiano quando algum colega dizia não compreender determinado trecho da

leitura.

Ao final da discussão do texto de Paulo Freire, entregamos para cada

participante dois contos de Eduardo Galeano (em anexo), o primeiro chamado:

“A dignidade da arte”, e o segundo: “O baixo astral”, com o objetivo de tornar

aquele momento de aprendizagem significante e ao mesmo tempo, responder

as seguintes perguntas que nortearam toda a pesquisa;

O que significou o uso do texto literário nessa formação?

Como o texto literário te afetou nesse momento de formação?

Almeida e Bruno (2004), ressaltam que formação não é apenas um

conjunto de procedimentos que leva ao domínio de conteúdos e habilidades

didáticas, mas um processo de formação, que embora com objetivos e

conteúdos específicos, em função da clientela à qual se dirige e do contexto no

qual está inserido, atinge a pessoa completa, em seus afetos e cognições,

valores e símbolos. E nesse processo, formando e formador são afetados. Deste

modo, propõe o delineamento de um fluxograma para registrar a distinção entre

os procedimentos de formação e os da pesquisa, que descreve a trajetória das

duas práticas e a articulação entre elas, pois este elucidou o trabalho aqui

registrado: vice-diretora e pesquisadora responsável pelos procedimentos da

pesquisa e ao mesmo tempo responsável pelo processo de formação

implantado.

Inspirada neste modelo de formação, a seguir apresentamos o fluxograma

desta pesquisa:

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Procedimentos da Pesquisa Procedimento da Formação

Discussão com a coordenadora

pedagógica sobre um programa

de formação em ATPC, que se

tornasse significativo para os

professores.

Definição e Aquisição do texto pedagógico a ser utilizado na formação: A pedagogia do oprimido.

Definição da narrativa literária O livro dos Abraços de Eduardo Galeano.

Observação, registro e

gravação do ATPC.

Planejamento em conjunto com a

coordenadora pedagógica do

programa de formação em 4

encontros.

Chamada para os pontos

de convergência e

divergências do texto

pedagógico e literário.

Registro no caderno de

campo dos tópicos

discutidos e que

chamaram atenção.

Registro dos tópicos que

serão retomados no

próximo encontro.

Escolha do grupo de ATPC,

no qual a pesquisa seria

desenvolvida

Elaboração do programa de

formação em 4 encontros

Levantamento Bibliográfico e

Literário.

Elaboração do projeto de

formação e decisão de utilizar o

texto: “Pedagogia do

Oprimido”, de Paulo Freire.

Escolha de 2 narrativas de

Galeano.

Realização do 1° Encontro de

formação:

Discussão reflexiva do

texto pedagógico.

Discussão reflexiva do

texto literário de Galeano.

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3.6. Participantes da Pesquisa: a Atpc.

Participaram desta etapa da pesquisa (formação proposta para a

ATPC) 11 professores: entre eles um vice-diretor (também pesquisador), que

neste trabalho é também o pesquisador que coordenou a reunião de ATPC, um

professor coordenador pedagógico (PCP), um professor readaptado, que

auxilia na unidade escolar na parte administrativa (sendo este, formado em

Estudos Sociais e um exímio leitor de vários autores), nove professores que

atuam diretamente em sala de aula, que lecionam disciplinas distintas.

Convém salientar que os nomes verdadeiros dos participantes foram

substituídos por nomes fictícios, segundo orientação do Comitê de Ética da

PUC-SP.

Vale ressaltar que o professor readaptado, nesta unidade escolar

cumpre sua jornada de trabalho, normalmente realizando atividades

administrativas ou de secretária, conforme descrito no hall de atividades do

professor readaptado.

Análise do encontro de

formação e o discurso

reflexivo acerca do tema

proposto

Redação final da dissertação.

Retorno da pesquisa para

coordenadora e grupo docente

do ATPC.

Avaliação com a

coordenadora do primeiro

encontro de formação.

Retorno da pesquisa para a

coordenadora pedagógica.

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No entanto, este professor que compartilhou deste momento da

pesquisa contribui não penas com suas funções administrativas e de secretária,

mas por ser um leitor intenso sempre coopera nas discussões que acontecem

na escola de forma exitosa, na maioria das vezes que é convidado a participar

das ATPCs, coopera com suas argumentações e pontos de vista sempre muito

ricos. Neste dia, este professor estava sentado na sala dos professores com

sua leitura diária, e enquanto nos dirigíamos para a sala onde acontece a ATPC

ele permanecia ali solitário com seu livro, neste momento o convidamos para o

encontro. Num primeiro instante disse que se nós não nos importássemos

ficaria ali sentado, então, eu enquanto pesquisadora lhe disse que seria de

grande valia sua participação, pois naquele dia discutiríamos sobre um autor e

ele com certeza teria muito a contribuir. Ele sorriu discretamente, levantou-se e

disse que então participaria.

Nesta pesquisa os professores têm idade entre 30 e 55 anos. Dentre

eles, apenas 2 cursaram o antigo magistério em nível médio, mas todos têm

formação universitária em cursos de licenciatura. Dentre os participantes, a

experiência no magistério varia entre 6 e 26 anos. Desses professores, quatro

acumulam com a rede municipal de São Paulo. Continuaram os estudos em

nível de pós-graduação quatro docentes, sendo que um deles concluiu a pouco

tempo seu mestrado em educação matemática.

A seguir, apresento um quadro, no qual podemos observar um breve

perfil dos professores participantes da pesquisa.

Quadro 2 - Perfil profissional dos docentes que participaram do encontro da ATPC

Nome Fictício

Idade Tempo de Magistério

Tempo na Instituição

Trabalha em outra instituição

Fez Magistério

Formado em nível Superior

Pós-Graduação

Mamede 32 12 2 Não Não Geografia e

Letras

Não

Tatoo 54 26 14 Sim Não História e

Pedagogia

Sim

Cachos 27 4 3 Não Não História Não

Luís 42 20 10 Sim Não Matemática

e

Pedagogia

Sim e Mestra

do

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Linda 55 29 12 Não Sim Letras Não

Bia 41 20 17 Sim Sim Matemática Sim

Jorge 39 15 15 Não Não Letras Não

Loira 47 7 5 Não Não Matemática Não

Cida 40 17 17 Sim Não Letras Sim

O grupo de professores participantes do programa de formação e desta

pesquisa é heterogêneo, de idades e disciplinas diferentes (conforme descrito

no quadro), por isso faz se necessário que os temas discutidos na formação

fossem condescendentes a qualquer matéria lecionada e comum a todos os

participantes sem distinção ou grau de importância.

Apresentado o percurso de nossa pesquisa, trazemos no capítulo

seguinte, a análise e discussão dos dados obtidos no encontro de formação

da ATPC.

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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

“Somos o que fazemos, mas somos,

Principalmente o que fazemos para mudar o que somos”.

(Eduardo Galeano)

O objetivo deste capítulo é analisar e discutir a primeira aula das quatro

realizadas no programa de formação que realizamos nas ATPC. Por meio

das falas obtidas durante o encontro da ATPC e interpretando-as à luz da

teoria que nos deram suporte à atual dissertação, acreditamos as respostas

obtidas responderão à pergunta da qual essa pesquisa se direcionou: analisar

uma formação oferecida na Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo- ATPC,

utilizando a arte como mediadora na aprendizagem, para identificar como os

docentes participantes foram afetados pela utilização do texto literário nesse

processo de formação.

4.1. Apresentação e Análise de dados

Para realizar a análise desta pesquisa utilizaremos o método da

“análise de prosa”, pois é a que melhor atende a nossa proposta de pesquisa,

tendo em vista que ela possibilita investigar uma realidade multidimensional e

com uma variedade de significados.

André (1983, pg.67) ressalva que a análise de prosa é uma forma de

investigação do significado dos dados qualitativos, é um meio de levantar

questões sobre o conteúdo de um determinado material, o que este diz, o que

significa, quais suas mensagens intencionais e não intencionais, explicitas e

implícitas, verbais e não verbais, alternativas e contraditórias.

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André (1983), ainda chama atenção para as condições de se

estabelecer temas e/ou categorias para análise;

A orientação teórica do pesquisador, sua experiência anterior, seu grau de imersão nos dados, seus valores, suas crenças e perspectivas podem orientar o foco da investigação para aspectos mais concretos ou concepções mais abstratas, tópicos ou para os temas ou para ambos. (André, 1983, pág. 68)

Optamos em separar as análises por tema, tendo em vista que as

perguntas que realizamos ao final da leitura se deram de forma que os docentes

pudessem responder de imediato o que acharam, sem tempo para elaborar a

resposta ou falar de forma cuidadosa, pensada. Assim, como toda a formação

ocorreu em forma de prosa esse momento final do encontro também aconteceu

naturalmente.

As perguntas foram iguais para todos, algumas respostas também

ficaram bem parecidas, então estabelecer “temas” para realizarmos as análises

foi a maneira que encontramos de agrupar os elementos colhidos, ideias e

expressões em torno do objetivo que queremos atingir.

Mills (1959, apud André, 1983) esclarece que o tema é uma ideia que

envolve uma abstração maior que os tópicos, pois este segundo gira em torno

de um assunto determinado, enquanto o primeiro permite que o pesquisador

utilize de sua experiência anterior, seu grau de imersão nos dados, seus

valores, suas crenças e perspectivas.

“A interação do pesquisador com o objeto pesquisado se torna algo único em cada estudo de natureza qualitativa, é preciso levar em conta que a categorização do material qualitativo não leva só em conta o conhecimento lógico, intelectual, objetivo, mas também conhecimento pessoal, intuitivo, subjetivo, experiencial.” (Stake, 1981, apud, Andre, 1983, pg 68)

Ao estabelecermos temas para análise nossa intenção é apresentar

não só as falas dos docentes, mas também a impressão que tivemos, os

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comentários, observações, intuições, etc. Segundo André (1983), subjetividade

e intuição tem um papel fundamental no processo de localização desse tipo de

dado, além de evidentemente do quadro teórico no qual o estudo se situa.

É importante destacarmos que a teoria walloniana que vai embasar

nossa discussão não propõe uma metodologia educacional ou uma teoria

pedagógica, mas como afirma MAHONEY (2004, p 13), “uma boa teoria é como

uma fotografia, aquela que permite descobrir dimensões para além do seu

foco”.

4.2. O que os depoimentos e expressões revelam?

Após inúmeras leituras, releituras, ouvirmos a gravação e discutirmos,

optamos em verificar o que os dados colhidos na formação revelaram, e em

função do objetivo principal desta pesquisa constituímos dois temas de análise

que são:

“A que vem este texto? ”;

“Um Texto literário pode se transformar em um texto pedagógico? ”

4.2.1. A que vem este texto?

Esse primeiro tema de análise surge ao percebermos o ar de espanto

no rosto dos professores após termos tido uma discussão tão acalorada e

proveitosa sobre o texto de Paulo Freire, ao entregar a eles as duas narrativas

de Eduardo Galeano, os olhares se cruzaram como se falassem uns aos outros:

“Ah não, texto de autoajuda? ”

Quando os professores receberam o texto, a impressão que tivemos foi

que inicialmente, acreditaram que era mais um daqueles textos de sensibilização

ou autoajuda, quero salientar que não utilizamos esse método nas formações, e

também não estamos aqui querendo dizer que esse tipo de texto seja menos

importante, ou que não deve ser utilizado, ao contar isso, queremos

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simplesmente relatar os olhares que naquele momento se cruzaram entre os

participantes e formadores. Em seus semblantes ficou nítido o espanto e o ar da

decepção por acreditarem se tratar de mais um texto de autoajuda,

simplesmente pareciam nos dizer “a não, isso não”.

Passado esse primeiro estranhamento, falamos de quem era o conto e

em que livro estava contido, não demos maiores explicações sobre o autor,

então, pedimos que alguém lesse o primeiro conto, Tatoo rapidamente se

prontificou e iniciou a leitura, em seguida pedimos que continuasse o segundo,

pois, naquele momento nos olhavam e a impressão que tivemos foi de um susto

ao avesso, nos observavam com espanto e surpresa, mas agora como se

quisessem dizer: “Como pode um conto falar a mesma coisa que o texto, mas

de outra forma”?

Quando pedirmos para que alguém do grupo que fizesse a leitura,

Tatoo, ao ver o nome do autor estampado na folha, se prontificou

imediatamente. Ele realizou a leitura com um tom de prazer o que naquele

momento também representou muito para o grupo. Pois, receberam o texto e

ficaram com os semblantes um tanto decepcionados, no entanto, ao irem

ouvindo o colega ler com entusiasmo e dando a interpretação que o texto pedia,

as expressões se modificaram e o ar de espanto deu lugar ao prazer que foi

surgindo.

Lembrando Wallon (2007), a emoção é contagiosa e expressiva. E a

emoção expressa na voz do leitor contagiou os presentes.

Assim, transcorreu o primeiro encontro do programa de formação que

propomos ao grupo docente, no qual pesquisador/ formador e docentes faziam

parte de um mesmo contexto.

Quando terminou a leitura lançamos a primeira pergunta:

“O conto tinha alguma semelhança com o que tínhamos acabado

de ler e discutir”?

Vieram imediatamente as respostas:

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“Nossa, perfeito, parece que traduz o que Paulo Freire diz”. (Mamede)

“Muita semelhança, e quando diz que escreve para os que não podem

ler, parece que estou vendo eu dando aula para meus alunos”. (Loira)

“Interessante como um texto que inicialmente parece apenas um simples

conto, pode ir de encontro com situações da vida”. (Cachos)

Nas falas acima, ficaram expresso o que havíamos intuído sobre o

espanto deles ao receberem as narrativas, mais que isso nos deixou claro que

obtivemos sucesso na escolha dos textos literários. Escolher as narrativas para

que estas afetassem o professor naquele momento de formação não foi uma

tarefa fácil, no entanto, na busca literária de Galeano ao encontrarmos essas

narrativas fomos afetadas de tal forma que não podíamos escolher outros se

não esses, o melhor foi perceber nos rostos, que como nós também foram

afetados pelo texto. É interessante que as respostas que primeiro vieram foram

de uma professora de geografia, seguido de uma de matemática e o outro de

história

Wallon (1879- 1962), postula que a pessoa é constituída pela

integração de três dimensões, que coexistem e atuam de forma intimamente

imbricada, de tal modo que uma atividade dirigida a uma das dimensões afeta

as outras; motora, afetiva e cognitiva.

Entendemos que a atividade proposta nesse processo de formação

que os afetou, estando, portanto, na dimensão afetividade, atingiu as outras

duas dimensões, pois Almeida (2004, p. 56), com base em Wallon também

ressalva “o que é constituído em um plano atinge o outro, mesmo que não se

tenha conquistado nesse outro”. Mahoney (2012, pg. 15) esclarece esse ponto

ao dizer que “o motor, o afetivo, o cognitivo, a pessoa, embora cada um desses

aspectos tenha identidade estrutural e funcional diferenciada, estão tão

integrados que cada um é parte constitutiva dos outros.

Nos rostos, era visível a transformação que a arte pode operar: uma

simples leitura emocionava como um meio potencializador do desenvolvimento

intelectual de cada um naquele momento, nessa ação, a afetividade e a

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inteligência se desenvolviam mutuamente. Nesse processo nascia o sentimento

com caráter mais cognitivo, no qual conseguimos representar as sensações que

surgem no momento de falar sobre o que afeta.

“Sou de exatas achei que esses textos, no final seria mais um daqueles

de sensibilização, sabe? Mas me surpreendeu, parece que traduziu para mim

coisas que antes não conseguia perceber”! (Bia)

A fala de Bia, nos mostra exatamente isso, mas talvez mais que isso,

por ser da área de exatas Bia demonstra certa surpresa com a arte e com o que

acabava de vivenciar. Percebeu naquela simples leitura, que a arte revela o

verdadeiro ser humano, devido as emoções que são liberadas

“Não tem como ocultar as emoções, elas afloram independente da

vontade humana”. (Bia)

Lembramos mais uma vez que a afetividade “refere-se à capacidade, a

disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo e interno por

sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis” (ALMEIDA,

MAHONEY 2007, P.17).

“Fiquei espantada, agora maravilhada em perceber a ligação dos

textos, estou com sensação estranha e ao mesmo tempo também não tinha

vivenciado isso ainda de ligar teoria com conto desse jeito” (Cida)

Nesse contexto, acreditamos que os professores foram afetados

primeiro, ao se espantarem ao receber as narrativas, depois ao terem uma

leitura agradável que os levou a compreender o texto pedagógico com mais

facilidade e ao serem surpreendidos com o contexto das narrativas.

Conseguimos perceber o que um texto literário é capaz de fazer quando toca o

sujeito, leitor desprevenido, mas também um tanto resistente.

“Surpreendeu-me, pensei numa coisa e de repente era outra,

completamente diferente e que no final deu sentido, deu liga... na matemática

isso dificilmente acontece aí me surpreende entrar mais nesse mundo

subjetivo. ” (Luis)

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O conjunto de fatores externos e internos nesse primeiro momento

realçou a nossa proposta de formação que era de fato afetar, tocar, emocionar

internamente o sujeito que estivesse naquele instante tentando compreender o

texto pedagógico.

Cremos que o texto literário veio cumprir o papel de formar o homem

não apenas pelos meios óbvios da lógica objetiva, mas cumpriu seu papel de

fonte de “humanização e educação do homem” descrito por Peixoto (2003),

quando fala que a arte e o grande público têm uma distância a ser extinta.

O ser afetado e o aprender se dá através da experiência, e a literatura

proporciona conhecer de modo muito especial, através das significações, das

experiências estéticas, pois nos faz conhecer nossos sentimentos, nossas

percepções e emoções.

Almeida (2012, p. 15) ainda ressalva que o meio social regula a

existência e as atividades dos indivíduos, lembra que na teoria walloniana a

relação genético-social é o fruto da unidade organismo-meio que resulta a

integração dos conjuntos funcionais: motor, afetivo, cognitivo, pessoa.

“À medida que nos leva a pensar como usar um conto ou poema nas

aulas e como para mim foi um tradutor de um texto pedagógico, me pego

sendo influenciado a reavaliar a maneira de planejar minhas aulas” (Jorge)

Ao buscarmos compreender a função do texto literário na contribuição

do texto científico nos deparamos com falas que também expressam essa

descoberta, quando perguntamos se o conto contribuiu com a compreensão do

texto de Paulo Freire, as respostas obtidas foram as seguintes;

“Interessante que em algumas aulas utilizamos poesia para falar de

um tema, trabalhar um conteúdo específico, mas eu não havia pensado em

usar esse tipo de texto dessa forma. Elucidando o conteúdo trabalhado”.

(Linda)

“Sendo da área de exatas, para mim é difícil às vezes ler esse tipo de

texto e entender de primeiro o que ele quer dizer, o que o poeta fala as vezes

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me parece grego. Dessa forma, não soou como uma sensibilização no final,

porque as vezes saímos com a sensação que só utilizou o texto para dar

aquela finalizada emotiva. Aqui me emocionou sim, mais que isso compreendi

o que o autor quis dizer e agora esse tipo de texto (conto e poesia) parece

que tem sentido”. (Loira)

Loira esclarece o quanto o outro (nesse caso o coordenador do

processo formativo), possibilita uma aprendizagem nos termos colocados por

Mahoney (2003), baseados em Wallon, a aprendizagem é realizada quando

“nos transformamos ao nos relacionarmos com o outro”. Podemos pensar

também que temos aqui dois outros: o outro coordenador e o outro Galeano,

que lhe permitiu ampliar a visão.

Assim, a aprendizagem é concretizada quando nos relacionamos com

o outro, sendo possível perceber a importância de todos os agentes dentro da

instituição escolar, na transmissão dos valores e no desenvolvimento de sua

humanização.

Na fala da professora de exatas, o estranhamento inicial entre o conto

e o texto Freiriano é superado após o momento de reflexão, quando ela se deu

o direito de sentir o texto e se sensibilizar, relatando que ficou emocionada, e

mais do que isso, conseguiu compreender de forma intensa e pessoal, o que

foi apresentado.

A sensibilização da professora de exatas, nos lembra que Wallon

(1982) aponta a necessidade de o professor estar atento as emoções

manifestadas pelos alunos, mas também às suas próprias emoções nessa

relação de parceria. Wallon, nos permite estender a relação professor-aluno

para todo o contexto escolar e todos os agentes desse meio, assim,

compreender as emoções dos outros professores durante a ATPC é de suma

importância para uma boa convivência e troca de experiências.

Wallon (1986, p. 146), comenta a interligação entre as emoções na vida

social e suas relações com a vida intelectual, social e a importância de não se

desvincular das emoções, ou escondê-las.

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“A coesão de reações, atitudes e sentimentos, que as emoções são capazes de realizar em um grupo, explica o papel que elas devem ter desempenhado nos primeiros tempos das sociedades humanas: ainda hoje são as emoções que criam um público, que animam uma multidão, por uma espécie de consentimento geral que escapa ao controle de cada um. Elas suscitam arrebatamentos coletivos capazes de escandalizar, por vezes, a razão individual.” (Wallon,1986, p. 146)

Para nós, um grupo docente, agente, e integrante do ambiente escolar,

duas lições de Wallon, destacadas por Almeida (2000, p.86) são pertinentes:

“Somos pessoas completas: com afeto, cognição e movimento, nos relacionamos com um aluno também pessoa completa, integral, com afeto, cognição e movimento. Somos componentes privilegiados do meio de nosso aluno. Torná-lo mais propício ao desenvolvimento é nossa responsabilidade Almeida (2000, p.86). ’

4.2.2. Um Texto literário pode se transformar em um texto pedagógico?

Ao pensarmos na análise de nosso processo formativo nos surgiu essa

pergunta, pois quando perguntarmos aos docentes se o uso do texto literário foi

oportuno, as falas que obtivemos de imediato foram:

“Foi muito, finaliza nossa discussão com clareza e abre outras

perspectivas para pensarmos em como planejar nossas aulas”. (Luís)

“Fiquei surpreso, porque já fui achando que era mais uma daqueles

textos de sensibilização e quando a leitura começou, fui percebendo que ele

apenas dizia a mesma coisa de Paulo Freire, mas de forma mais clara, me vi

na sala de aula dando aula, explicado e os alunos com aquelas caras de

quem não haviam entendido, mas também não dizem. Uma sensação de

solidão que dá quando eles ficam parados, sem entender, será que um texto

literário, ou outra coisa que eles gostem, se misturado a aula vai ter esse

efeito que tivemos agora? ”. (Mamede)

Em nossas observações como gestores, percebemos Mamede como

um professor que usa diferentes estratégias em suas aulas. Mas nunca havia

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verbalizado o que agora faz: a solidão do professor quando não recebe do aluno

a reciprocidade para o empenho ao preparar a sua aula.

A fala de Mamede, nos diz exatamente o sentimento que tentamos

evitar, quando fomos visitar a obra de Galeano. Nossa maior preocupação era

que o conto, a narrativa, falasse de fato algo que fosse significativo, que tivesse

sentido e que não ficasse apenas como o uso de um texto qualquer para

finalizar uma formação. Buscamos exatamente não sentir essa solidão que vem

expressa no silencio explicito, quando algo não fica claro, mas ninguém tem

coragem de dizer.

A arte me toca, me faz sentir, vivenciar situações que inúmeras vezes

acreditava que apenas vivenciado seria capaz de entender, pensando nela

como um fenômeno social e resultado das relações que estabelecemos com

outros membros da sociedade, é que me senti provocada em proporcionar ao

outro o mesmo sentimento que me desperta quando entro em contato com arte.

E ao ouvir Mamede falar sobre isso, foi possível sentir que despertamos

nele a vontade de aproximar-se dos alunos de forma diferente, de forma que de

fato fosse significativa. Essa consciência que ele teve de si ao ensinar para o

aluno, se expressou naquele momento e expôs seu medo, sua aflição e isso

começa a dar lugar a um processo de tranquilidade maior para resolver as

dificuldades, e ainda pôde leva-lo a uma coerência e a uma segurança maior

nas atitudes, passando de sua experiência sensível para o plano de

representação intelectual.

É essencial o papel do professor no desenvolvimento dessa

consciência, Wallon (1986, p. 132) ressalva que “o único ponto útil é perguntar

diante de cada comportamento, que condições de base tornam possível e que

relações ele propicia e depois influência nas semelhanças sobre a situação

subjetiva e objetiva, sobre o indivíduo e sobre o meio”.

A fala de Tatoo revela também sua angústia diante das circunstâncias

difíceis do cotidiano do magistério e da responsabilidade que tem o professor.

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“Sheila, a escolha do conto foi espetacular, conheço os dois autores,

são dois revolucionários, cada um à sua forma e seu tempo e é muito

interessante como você utilizou os contos com o texto, o conto traduz bem o

que Paulo Freire diz e nos dá perspectivas diferentes, sobre um mesmo

assunto. Para que alunos estamos ensinando? E que alunos somos nós? Mas

de fato a depressão vem e as vezes demora a ir embora”. (Tatoo)

Naquele momento por vezes, me senti surpreendida pela fala do

professor, ao escolher Paulo Freire, não pensei na semelhança histórica que

tinha com Galeano, pois antes de pensar em que texto pedagógico iria utilizar

no processo formativo, já havia escolhido o autor literário.

A escolha pela narrativa de Galeano se deu pela emoção que me foi

despertada ao ouvir uma narrativa na aula do mestrado profissional de

formação de formadores, sob a regência da professora Laurinda Ramalho, me

recordo que naquele dia sai da aula tão tocada e emocionada que mal via a

hora de chegar na escola e conversar sobre o autor com a coordenadora

pedagógica. Todos os dias, ao voltar das aulas e ir diretamente para a escola

conversávamos sobre o conteúdo do dia, as discussões, no que poderíamos

melhorar a nossa escola, entre tantas outras coisas.

Paulo Freire dispensa apresentações, pois é sabido toda sua trajetória

de formação humana e de contribuições com a educação, acredito que

inconscientemente a escolha já tenha se dado nas conversas informais que

tinha com a coordenadora, pois sempre comentávamos de quão simples seria

o processo de ensino e aprendizagem se os professores seguissem a fala e a

experiência de Paulo Freire, pois nos parecia tão claro entender que era preciso

partir do conhecimento do aluno, mas alguns professores pareciam não

compreender que era preciso se aproximar do aluno para só então leva-lo para

mais longe.

Nessa perspectiva, naquele momento me pareceu claro e obvio que a

escolha e semelhança de ambos autores já havia ocorrido mesmo antes de todo

o planejamento do programa de formação, e que o conto iria sim contribuir com

o texto de Paulo Freire, afinal se eu pesquisadora já havia sido afetada, era

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sinal que também poderia afetar outras pessoas apresentando esses dois

autores em conjunto.

“O conto terminando o texto, fecha com chave de ouro, o texto fica

claro”. (Loira)

Ao ouvir a fala de Loira, tive então a confirmação de que de fato não

apenas Tatoo havia sido afetado, compreendido e percebido a semelhança de

ambos. De certa forma, as colocações de Tatoo contribuíram para a

compreensão de todos, mas também poderia ter camuflado a percepção real

do restante do grupo, visto que ele é um conhecedor de vários autores, inclusive

da obra de Galeano como ele mesmo elucidou. Loira é professora de

matemática, por vezes quer e prefere as coisas explicadas claramente; em

outras ocasiões chega a afirmar que não precisa “enrolar”, é preciso ser clara.

Mas a arte não é clara, por vezes ela também nos intriga, nos enrola e

leva a caminhos que nos possibilita uma reflexão que vai além do que

simplesmente está exposto, nos impulsiona a processos de desenvolvimento

humano que não conseguimos explicar, apenas sentir e depois perceber que

houve uma mudança, mas que não sei explicar e que nos pega pensando em

como nunca havia percebido tal coisa, ou simplesmente por que só agora me

dei conta disso?

Loira naquele momento se mostrou aberta para o novo, para arte, pois

compreendeu através da reflexão, que ela muitas vezes chama enrolação, que

é preciso ser espectador para compreender o que está vendo e transformar o

meio em que faz parte.

“- Nunca entendo essas poesias, esses textos, me parece sempre

enrolação, mas hoje confesso que minha indiferença a esse tipo de texto, deu

espaço para ouvir atenta a leitura que Tatoo fez, pois gosto de ouvir ele falar, e

ele tão rapidinho quis ler que achei intrigante”. (Loira)

Essa fala retrata o momento de pausa que Loira se permitiu vivenciar,

as vezes é preciso parar e vivenciar, para então sejamos afetados.

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Todo texto ao ser utilizado em um programa de formação para

educadores, pode ser pedagógico, mesmo quando não acadêmico, faz-se

necessário apenas que se tenha um objetivo ao utiliza-lo pois, a busca pelo

conhecimento dá-se por diversas vias e uma delas são os textos não

acadêmicos. Vigotski (1999, p.35) assegura que “o que não estamos em

condição de compreender diretamente podemos compreender por via indireta,

através da alegoria, e de toda a ação psicológica da obra de arte pode ser

integralmente resumida ao aspecto indireto dessa via”.

Loira, ao entrar em contato com o texto, se permitiu um momento de

pausa, a partir daquele instante entrou em contato com as experiências

artísticas que trouxe o conhecimento adquirido ao longo de sua vida, “[...] a arte

lhe permitiu experimentar, por meio dos sentidos, situações inusitadas”

(Carvalho e Bufrem, 2006, p.56).

O texto literário possibilita um olhar sensível e podemos transpor esse

olhar para as situações da sala de aula e refletir sobre nossa atuação naquele

espaço. Na fala a seguir, foi possível notar essa transposição;

“Contribui à medida que nos leva a pensar que podemos fazer

diferente nossa prática, minhas aulas podem ser mais interessantes, ter mais

sentido para o aluno e para mim também, que muitas vezes saio da sala

também insatisfeita”. (Cida)

Novamente, aparece a insatisfação pelas próprias aulas e a

possibilidade de se pensar em novos recursos e metodologias de aula. Sendo

assim, a relação com o texto literário possibilitou esses sujeitos ampliarem sua

compreensão do mundo que os cerca, pela arte os professores se perceberam

e perceberam o que podem vir a realizar para o outro.

A escola é o espaço que nossos alunos têm para entrar em contato com

arte, minha experiência revela que por vezes é o “único” espaço.

Quando colocado aos professores se utilizar um conto havia sido

significativo naquele momento para a interpretação e reforço do conteúdo

textual de Freire, as seguintes respostas foram dadas:

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“Foi muito significativo à medida que nos leva a pensar como usar um

conto ou poema.”

“Significativo porque me surpreendeu, pensei numa coisa e de repente

era outra, completamente diferente e que teve sentido.”

É possível observar pela reação dos professores, que o conto auxiliou

em ilustrar o texto, e foi benéfico para a compreensão da aula, trazendo uma

surpresa de modo que os professores esperavam, como de costume, apenas a

utilização de um texto teórico, ou apenas a utilização do conto, a união entre os

dois causou uma reflexão entre os educadores.

É possível observar, pelas falas abaixo, o espanto positivo da união

textual ao conto:

“Significativo porque você conseguiu fazer uma ponte entre dois

autores revolucionários, teve a ousadia de fazer um casamento que deu certo.

Mas, mais que isso percebemos que teve o cuidado de preparar uma aula no

qual saímos com a sensação de algo apreendido”.

Na fala acima vale ressaltar duas características observadas, do

professor em dizer o quanto foi satisfatório unir não só dois gêneros textuais

diferentes, mas também dois autores, e, mais do que isso, o professor se

colocou em posição de aluno, fazendo a inversão do papel clássico, e

mostrando que há ainda muito a se aprender. Importante lembrar aqui de

Wallon: “a formação psicológica dos professores não pode ficar limitada aos

livros. Deve ter uma referência perpétua nas experiências pedagógicas que eles

próprios podem pessoalmente realizar” ( Mahoney e Almeida, 2012).

“Para mim que sou de exatas, matemática me faz refletir em como

posso utilizar materiais diferentes na minha aula, o que posso utilizar para os

alunos perceberem que tudo se liga a matemática? Normalmente já busco isso,

mas essa forma de explicar conteúdo mexeu comigo.”

A fala da professora de exatas complementa o parágrafo anterior, onde

ela visa utilizar diferentes materiais e métodos em suas aulas para correlacionar

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a matemática com o mundo ao redor dos alunos, trazendo aos discentes,

diferentes e constantes aprendizados.

Por fim, quando foi perguntado sobre o que os professores acharam em

finalizar a discussão com o uso de literatura, as respostas foram unânimes,

todos gostaram. Segue as falas:

“Foi bom, foi uma forma diferente de usar um texto literário.” (Linda)

“Eu gostei, dessa vez foi uma aprendizagem diferente, acho que mais

significativa, porque pude ver uma outra forma de utilizar textos diferentes, mas

que se conversam apesar dos gêneros e intenções serem opostas”. (Bia)

“Ah, eu gostei, achei interessante” (Jorge)

“Foi bem importante apresentar uma outra forma de usar esse tipo de

texto que não só como sensibilizador” (Cachos)

“Em geografia tem alguns poemas de João Cabral de Melo Neto que

utilizo para retratar algumas situações de seca, regionalização, mas dessa

maneira não havia pensado.” (Mamede)

O professor de geografia salienta que também se utiliza da prática de

interdisciplinaridade, caminhando entre a geografia e outras matérias da grade

curricular, nesse caso, também se utilizando de poemas para trabalhar com os

alunos temas como seca ou regionalização.

“Gostei porque valorizou os dois textos, tanto de Paulo Freire que

parece simples, mas as vezes para algumas pessoas é difícil entender, e do

Galeano que é um autor revolucionário tem toda uma história de luta no

Uruguai, ambos parecidos. Interessante como conseguiu fazer essa relação,

eu leitor de inúmeros autores e de Galeano também nunca me atentei a esse

casamento. Te recomendo o teatro do bem do mal de Galeano, são textos

que também retratam o cotidiano de forma bem-humorada, as vezes irônica

de situações que são atuais para nós”.

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Camargo (2015, p.107), aponta que, segundo Vygotsky, “as interações

entre sujeito e objeto têm papel marcante nos processos de desenvolvimento e

aprendizagem num determinado meio sociocultural”. Assim, correlacionar as

experiências vivenciadas junto a interação dos sujeitos é trabalhar, de forma

cultural, a fim de provocar “efeitos subjetivos nos sujeitos: as emoções e

dimensões afetivas”

Deste modo, quando foi trabalhado a vivência de dois autores, Freire e

Galeano, com duas abordagens textuais diferentes, pode-se, de forma

conjunta, complementar o raciocínio, e também, o pensamento de cada autor.

“Depois dessa aula do Tatoo e de toda nossa discussão saímos mais

inteligentes, [risadas], brincadeiras à parte é enriquecedor demais para nós

estes momentos de discussão e aprendizagem, as vezes nem nos damos

conta com a correria, mas fico feliz em fazer parte desta equipe”. (Bia)

Diante da fala acima, é notável que não só o professor em si, mas todos

do grupo, saíram da ATPC com uma sensação de pertencimento ao corpo

docente e o mais importante, se apropriaram do conhecimento. E

reconheceram não terem dado espaço para o lazer, para a fruição da arte em

suas vidas.

Tassoni e Leite (2013, p.269) salientam que, segundo Wallon, “a escola

é um espaço privilegiado de interação social, onde o trabalho com o

conhecimento sistematiza-se, promovendo o contato com a cultura e suas

ferramentas, possibilitando a apropriação de uma diversidade de recursos de

aprendizagem”. Sendo assim, é na escola que o espaço de aprendizagem do

mundo é concretizado, aprendizagem essa que engloba não apenas os

conteúdos, mas também a si e do outro.

“Obrigada, pela formação porque percebemos o cuidado em preparar

e pensar em algo que de fato nos atingisse de alguma forma, quando você

fala em significativo, não sei te responder agora, talvez depois, mais à frente

quando vivenciar alguma situação e eu lembrar da discussão de hoje e de

quanto crescemos.” (Luis)

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Esta observação nos gratifica como gestores formadores de

professores e evidencia que formar implica em intencionalidade: definir

objetivos, estratégias, acompanhamento e avaliação.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Alguns Homens vêem as coisas como são, e dizem “Por quê? ” Eu sonho com as coisas que nunca foram e digo “Por que não? ”” (Geroge Bernard Shaw, apud Elliot, 1987))

O estudo aqui relatado foi projetado com a intenção de compreender

como a escola pode se organizar para que seja um espaço de formação

continuada significativa para os docentes que nela atuam. Desta forma, busquei

analisar uma formação oferecida na Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo, a

ATPC, no qual a arte literária foi a mediadora no processo de aprendizagem do

docente, procurando identificar como os docentes participantes foram afetados

pela utilização do texto literário (pequenas narrativas de Eduardo Galeano) no

processo de formação, à luz da teoria walloniana. Embora se trate de um estudo

exploratório, forneceu elementos para a compreensão do objetivo proposto.

Num primeiro momento, realizou-se uma pesquisa bibliográfica sobre a

formação docente, visando um enfoque no atual contexto nacional e sobre a

ATPC, visto que ela era o nossos lócus da pesquisa. O termo formação,

inicialmente atrelado a moldar ou adequar, como se os professores, educadores

se constituíssem num banco de dados, felizmente hoje formação inicial e

formação continuada são vistas como partes do processo de desenvolvimento

profissional, na qual os professores devem ser considerados donos de saberes.

Henri Wallon, teórico que me inspirou, psicólogo, médico, educador

francês e também elaborador do plano Langevin- Wallon que propõe a reforma

do sistema de ensino francês após a Segunda Guerra Mundial, ressalta que o

papel da escola não é apenas instruir, mas sim formar o indivíduo por completo

e ser instrumento nesse processo de desenvolvimento. Para Wallon cuidar do

cognitivo é também cuidar dos afetos.

O ato de saber completa a formação de modo a preparar as pessoas

para o mundo. A formação docente está entrelaçada a um projeto que contemple

de forma integral o ser humano, trabalhando a cognição, afetividade, movimento,

conjuntos que formam a pessoa em integração constante com o meio. Porém,

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como visto, nem sempre os processos formativos visam esse desenvolvimento

integral.

Os conhecimentos adquiridos durante o processo de formação proposto

e suas análises levaram à compreensão do quão importante é utilizarmos várias

linguagens em processos formativos, uma delas a arte literária, seja com os

docentes ou discentes, pois isso possibilita que as informações sejam melhor

apreendidas e que o desenvolvimento aconteça de forma integral no homem.

Nessa perspectiva, pudemos notar que muito do que surge nas relações do eu-

outro e eu-meio pode ser potencializado tendo a arte como mediadora, pois

possibilita uma reflexão acerca do que estamos estudando, sua aplicação na

vida real, no cotidiano, e principalmente na atuação e preparo em sala de aula.

Os sentimentos permeiam as relações sociais que acontecem em

diferentes meios, tanto em processos de formação com professores como na

sala de aula com alunos e

A educação escolar está imersa na cultura, em estilos de vida, e não

apenas vinculada às ciências e à academia, assim é uma construção de

significados que conecta o homem com a cultura, o meio. É necessário

considerar o contexto social na qual a escola está inserida, para assim todo

corpo docente e gestores se integrarem na comunidade ao seu entorno,

buscando um diálogo intersubjetivo.

A formação é um processo para a vida toda, e a Aula de Trabalho

Pedagógico Coletivo (ATPC), é o momento de formação continuada dentro da

escola; é o momento no qual o saber docente, as experiências e vivências vão

sendo compartilhadas pelos profissionais da educação, trocando os saberes e

aprendendo novas visões de mundo. Mas meu desejo era compreender como a

arte literária pode ser subsidio importante para dar significado ao que se

pretende desenvolver com os professores.

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Escolhi a arte literária porque ela sempre me afetou, mas a arte pode ser

expressa de diversas maneiras, como a música, escultura, teatro, pintura, etc.,

sendo todas essas maneiras, uma forma de de fazer aflorar emoções e

sentimentos, que ajudam a sedimentar relações interpessoais e favorecem

aprendizagens nos processos formativos.

Conhecer a arte é abrir um leque para compreender o mundo e os

sujeitos. Assim, educar por meio da arte é, através do contato com o outro, do

despertar dos sentimentos e da troca, enxergar além do outro, mas buscar a si

mesmo.

A vivência estética do leitor de uma obra literária, seja conto, narrativa,

poema, etc., permite uma experiência muito diferente da que temos em contato

com um texto científico, especializado ou ainda pelo uso da linguagem cotidiana.

A arte é produto do trabalho humano que pode levar o sujeito a uma consciência

social, por isso lidar com a literatura, com a concepção de literatura como

fenômeno estético, oportuniza ao indivíduo a compreensão de seu universo e a

apreensão de uma nova visão de mundo, ampliando a consciência da realidade.

A arte, nesta perspectiva é um movimento para consagrar a realidade

apresentada.

No âmbito escolar, utilizar a arte para o ensino é abrir portas para a

imaginação, estar livre para se expressar de forma criativa, estimulando o

conhecimento vivido, as experiências de vida, desenvolvendo a sensibilidade,

capacidade de reflexão e percepção.

Espero que este trabalho de pesquisa ofereça subsídios para que

gestores e educadores compreendam melhor a importância de se realizar uma

a ATPC que seja de fato formativa, e que ao realizarmos formações significativas

deixamos marcas que contribuem para a constituição da profissionalidade.

No processo de desenvolvimento desta pesquisa percebi o quanto ainda

tenho a aprender sobre a arte e o quão importante ela se faz em minha vida, na

constituição de meu processo de aprendizagem, principalmente ao atuar como

e com docentes.

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Desenvolver um trabalho significativo com arte dentro da escola permite

que todos dentro do ambiente escolar passem a ver o mundo de outra forma,

pensando e repensando o que se tem ao redor, podendo assim fazer uma leitura

de forma crítica e exercer o papel fundamental de cidadão, contribuindo com a

sociedade.

Ler e compreender a literatura é compreender o mundo e o que nele

acontece, os comportamentos sociais. O leitor realiza um diálogo consigo

mesmo, não apenas recebendo o conhecimento, mas enriquecendo

desenvolvendo o lado cognitivo e emocional.

Diante da proposta de formação desenvolvida, pudemos observar

através das falas dos docentes que os dois autores escolhidos, e os dois gêneros

literários foram benéficos para a formação e reflexão dos professores que

participaram da ATPC.

Sendo assim, pude identificar pelas falas dos professores que

participaram da formação na ATPC que a atividade proposta foi benéfica para a

formação e reflexão dos professores que participaram, além de possibilitar uma

integração maior do grupo, e também por perceberem como a arte e a literatura

são benéficas para as práticas de formação. Quando se utilizou um texto

pedagógico de Paulo Freire e, como contraponto, as narrativas de Galeano, os

professores notaram que interligar gêneros literários é possível e complementa

o entendimento e a discussão.

Os professores se mostraram inicialmente surpresos com o texto de

Galeano, achando que era apenas mais uma sensibilização, mas ao ouvir a

leitura prazerosa de um dos professores passaram a sentir o texto e pela reflexão

ligada ao sentimento, vivenciaram uma formação que contribui para vida

profissional.

Encerro este trabalho com a certeza que me constituí melhor como

docente ao realizar uma formação atrelada aquilo que de fato me toca, e que de

alguma forma também toquei o outro pela arte. Acredito que daqui em diante

estarei mais segura ao realizar formações docentes e a trabalhar com os meus

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alunos do Ensino Fundamental II, utilizando a arte como mediadora do

conhecimento, uma vez que a relação eu-outro se estabelece e se concretiza

através da arte. Espero que este trabalho colabore com outras propostas de

formações inovadoras e possa ajudar a refletir sobre a prática pedagógica que

desenvolvemos, seja você leitor, professor, coordenador pedagógico, diretor,

supervisor de ensino, enfim quem queira melhorar sua prática profissional.

Modestamente, faço minha as palavras do grande líder dos direitos civis Marthin

Luther King Junior.

“Talvez não tenha conseguido

fazer o melhor, mas lutei para que o melhor

fosse feito. Não sou o que deveria ser, mas

Graças a Deus não sou o que era antes”.

(Marthin Luther King, Jr)

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ANEXOS

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Auto avaliação da Unidade Escolar 2016

Caro colega, suas respostas nos ajudarão a melhorar nossa atuação como gestores.

Por favor, dê suas opiniões e sugestões de forma sincera nesse questionário. Obrigada!

1- Há quanto tempo você atua na educação? ___________________________

2- Há quanto tempo atua como docente? ______________________________

3- Qual a sua idade?_______________________________________________

4- Há quanto tempo atua na E.E Wilson Rachid?________________________

5- Se passasse num concurso para docentes do Estado de SP, você escolheria a

E.E Wilson Rachid? Ou indicaria para alguém?

( ) sim ( ) não

Por que?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

6- Quais as características que te agradam nesta U.E?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

7- Como é a comunicação nesta U.E?

( ) Boa ( )Precisa melhorar ( ) Não há comunicação ( ) Informações

desencontradas

Sugestões:_____________________________________________________

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8- Quais as características que te desagradam nesta U.E?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

9- A escola incentiva à realização de atividades culturais e esportivas dentro da

escola e divulga aquelas que aconteçam fora delas?

_____________________________________________________________

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10- A escola (gestão) promove condições ideais para que haja integração do grupo

(docentes, funcionários, gestão, alunos)?

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11- A gestão acolhe as ideias, projetos, críticas, sugestões, etc dadas pelo corpo

docente?

_____________________________________________________________

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12- Demonstra agir com ética e transparência na condução dos projetos educativos

e dos processos administrativos da escola?

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_____________________________________________________________

13- Quanto aos projetos desenvolvidos na escola, você se sente apoiado?

( )sim ( ) Precisa melhorar ( ) não há apoio

Sugestão:______________________________________________________

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14- Quanto aos materiais pedagógicos?

( ) são fornecidos ( ) não fornecidos ( ) pouco fornecido ( ) inadequados

15- Quanto as reuniões pedagógicas realizadas no ano de 2016:

( ) foram satisfatórias ( ) não atenderam parcialmente as necessidades

( )insatisfatórias ( ) temas fora do contexto

16- Você entende a escola como um lugar de formação continuada?

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_____________________________________________________________

17- A escola garante condições ideais para a realização dos ATPCs?

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18- Que temas poderiam ser estudados nos horários de formação?

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19- O que você melhoraria na U.E?

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Nome(opcional):________________________________________________

Obrigada por colaborar com a melhoria de nossa escola!

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Termo de consentimento

Eu,

____________________________________________________,

RG: _________________, autorizo a pesquisadora Sheila Aparecida

Pereira de Oliveira, RG: 27.874.017-0 a utilizar o que for dito por mim

na ATPC, para ser utilizado em seu projeto de pesquisa de mestrado

em Educação: Formação de Formadores, que tem por objetivo

analisar a arte como mediadora na formação docente.

Sem mais,

_______________________________

São Paulo, ____ de março de 2017.