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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Alessandra Felix de Almeida DESCONTINUIDADES, CONTROVÉRSIAS E SIGNIFICAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL Estudo de caso Programa Mais EducaçãoMESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS São Paulo 2017

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Alessandra Felix de Almeida

DESCONTINUIDADES, CONTROVÉRSIAS E SIGNIFICAÇÃO DAS

POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL

Estudo de caso “Programa Mais Educação”

MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

São Paulo

2017

Alessandra Felix de Almeida

DESCONTINUIDADES, CONTROVÉRSIAS E SIGNIFICAÇÃO DAS

POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL

Estudo de caso “Programa Mais Educação”

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título de

Mestre em Ciências Sociais (Política), sob a

orientação da Profa. Dra. Rosemary Segurado.

São Paulo

2017

Banca examinadora:

_____________________________________

Profª. Dra. Rosemary Segurado (PUC-SP)

_____________________________________

Profª. Josildeth Gomes Consorte (PUC-SP)

_____________________________________

Prof. Dr. Marcos Tarcísio Florindo (FESPSP)

À Jô e Paulo, meus pais, por me ensinarem a aprender.

À Laila, minha filha, por me ensinar a ensinar.

À Anísio Teixeira, por me ensinar que a tarefa educativa necessita de paixão.

À Darcy Ribeiro, por me ensinar que a educação democrática necessita de coragem.

À Rosemary Segurado, por me ensinar que leveza e respeito também são formas de educação.

À Josildeth Gomes Consorte, por me ensinar que a escola é o lugar no qual o Brasil se encontra.

À Marcos Florindo, por me ensinar que Política Pública é o lugar no qual o Brasil se apresenta.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Exu, aquele que cruza e descruza os caminhos; aos meus orixás Iansã,

Oxóssi, Xangô e Oxum, aqueles que cuidam da minha cabeça; a Ogum, Iemanjá e Oxalá,

aqueles que protegem sem distinção; a Iroko, aquele que cuida do Tempo; às Mulheres que

lutaram pelo direito à nossa educação; aos meus pais, sem vocês esta dissertação não teria

nascido.

Agradeço à minha orientadora, companheira de jornada e luta, Rosemary Segurado,

agradeço pela amizade, pela paciência, pelo seu modo de encarar a vida, de maneira generosa,

afetiva e firme; à Banca, Josildeth Gomes Consorte e Marcos Tarcísio Florindo, por

concederem seu tempo para avaliar e orientar esta importante fase da minha vida, sem vocês

esta dissertação não teria sido desenvolvida.

Agradeço às amigas Aline Rocha, Caroline Freitas, Daisy Serena, Karina Lima, Marisa

Mateus e Patrícia Cucio Guisordi, pela paciência com as minhas ausências, pelos incentivos,

pelos elogios, pelos ombros disponíveis, pelos sorrisos de cumplicidade, sem vocês esta

dissertação não faria sentido.

RESUMO

A presente dissertação tomou como estudo de caso o Programa Mais Educação com o

objetivo de discutir a relação entre as fases de Formulação e Implementação de Políticas

Públicas, tendo como base a ideia de Ciclo da Política Pública. O estudo considerou o

histórico da Educação Integral no Brasil, a atuação dos professores no processo educacional,

o desenvolvimento da docência no cenário brasileiro, os elementos da Gestão da Política e o

histórico político-social brasileiro como dados relevantes para a Análise de Políticas Públicas.

O caso estudado foi impactado pela conjuntura política de 2016, marcada pela aprovação do

processo de Impeachment e respectiva perda do mandato presidencial de Dilma Rousseff,

resultando, entre outras mudanças na agenda governamental, na extinção do Programa

analisado. Este dado ganha destaque neste trabalho, pois revela a complexidade da Análise de

Políticas Públicas, assim como a fragilidade das Políticas Sociais.

Palavras-chave: Ciclo da Política Pública; Educação Integral; Políticas Públicas

Educacionais; Programa Mais Educação.

ABSTRACT

The current dissertation took as a case study the “Programa Mais Educação” (More

Education Program), with the goal of discussing the relationship between the phases of

Formulation and of Implementation of Public Policies, based on the idea of Policy Cycle. The

study considered the history of Integral Education in Brazil, the role of teachers in the

educational process, the development of teaching in the Brazilian scenario, the elements of

Policy Management and the Brazilian political-social history, all as relevant data for the

Policy Analysis. The case studied was affected by the political conjuncture in 2016, which

was marked by the approval of the Impeachment process and the respective loss of Dilma

Rousseff's presidential term, resulting, among other changes in the governmental agenda, in

the extinction of the Program in question. This is highlighted in this work, as it reveals the

complexity of the Policy Analysis, as well as the fragility of Social Policies.

Keywords: Policy Cycle; Integral Education; Public Educational Policies; “Programa Mais

Educação” (More Education Program).

Lista de quadros

Quadro 1: Programas e políticas de educação integral no decorrer da história brasileira ........ 51

Quadro 2: Evolução da adesão ao Programa Mais Educação – 2008 a 2011 ......................... 82

Lista de figuras

Figura 1: Centro Educacional Carneiro Ribeiro ....................................................................... 23

Figura 2: Planta do Centro Educacional Carneiro Ribeiro ....................................................... 27

Figura 3: Biblioteca Centro Educacional Carneiro Ribeiro...................................................... 29

Figura 4: Sala de aula – Escola-Classe Centro Educacional Carneiro Ribeiro ........................ 29

Figura 5: Pavilhão de Trabalho (Artes Aplicadas, Industriais e Plástica) – Escola-Parque

Centro Educacional Carneiro Ribeiro....................................................................................... 30

Figura 6: Pavilhão de Educação Física – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro ... 30

Figura 7: Vestiário – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro ............................ 31

Figura 8: Atividades Físicas – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro ............. 31

Figura 9: Atividades Físicas (balé) – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro ... 32

Figura 10: Área de convivência –Centro Educacional Carneiro Ribeiro ................................. 32

Figura 11: Arquitetura (projeto padrão) CIEP .......................................................................... 38

Figura 12: Construção CIEP ..................................................................................................... 39

Figura 13: Atendimento médico CIEP ..................................................................................... 40

Figura 14: Atendimento Odontológico CIEP ........................................................................... 40

Figura 15: Refeitório CIEP ....................................................................................................... 41

Figura 16: Cardápio CIEP ........................................................................................................ 42

Figura 17: Cardápio CIEP ........................................................................................................ 43

Figura 18: Fachada CIEP Thomas Jefferson ............................................................................ 45

Sumário

Introdução ............................................................................................................................... 11

1. A Escola Integral no Brasil: Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro ....................................... 20

2. Componentes da Análise e Gestão de Políticas Públicas ................................................ 54

2.1 Sistema Federativo Brasileiro: impactos na adesão e implementação de políticas

públicas ....................................................................................................................... 54

2.2 A Fase de Implementação .......................................................................................... 58

2.3 Variáveis determinadas e estruturas político-sociais determinantes .......................... 60

3. O Programa Mais Educação - PME .................................................................................. 67

3.1 Antecedentes do Programa ......................................................................................... 68

3.1.1 As Dimensões da Política ............................................................................................. 69

3.1.2 A Janela de Oportunidade do PME .............................................................................. 82

3.2 Controvérsias entre Formulação e Implementação .................................................... 86

4. Os professores, sua formação, a relação com o serviço público e considerações sobre

sua relação com o Programa Mais Educação ................................................................ 96

4.1 Malu e Rosa: a Docência, a Escola e o Programa Mais Educação ......................... 103

Considerações Finais ............................................................................................................ 120

Referências Bibliográficas ................................................................................................... 126

Anexo - Roteiro de Entrevista ............................................................................................. 135

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Introdução

Em 1934, Jean Piaget, como de diretor do Bureau International d’Éducation

(BIE), hoje parte da UNESCO, proferiu em discurso o seguinte pensamento: “somente a

educação pode salvar nossas sociedades de uma possível dissolução, violenta ou

gradual”. A Educação, para Piaget, seria a “primeira tarefa de todos os povos” e em

1940, ainda como diretor do BIE, afirmou que o “bem comum de todas as civilizações

[é] a educação da criança” (PIAGET apud MUNARI, 2010, p. 17). T. H. Marshall

(1967, p. 75, 80), em 1949, ao desenvolver o conceito de cidadania, elege a Educação

das crianças – oferecida e obrigada pelo Estado – como a base do direito social – um

dos direitos que compõe o conceito de cidadania –, sua argumentação se dá quando

identifica que sujeitos educados teriam melhores condições para compreender e

reivindicar os demais direitos, deste modo, a desigualdade social, fruto de uma frágil

cidadania, teria, potencialmente, chances de ser diminuída. Já em 1962, Adorno (1962,

p. 112, 154) identificou na Educação a qualidade para o enfrentamento à Barbárie, esta

compreendida como uma relação paradoxal entre avanço intelectual e tecnológico, que

caminhariam lado a lado com uma “agressividade primitiva, um ódio primitivo, [...] um

impulso de destruição [...] que contribui para aumentar ainda mais o perigo de que toda

esta civilização venha a explodir”.

O interesse desta pesquisadora pela área educacional teve início nos primeiros

anos de sua graduação em Sociologia e Política, nos anos 2011, estimulada pelo

pensamento que atribui à Educação a solução de diversas demandas sociais. Ao iniciar

suas pesquisas, deparou-se com um vasto campo de métodos, técnicas, modelos,

teorias, legislações e até algumas experiências práticas que, pelo menos em tese, seriam

mais do que suficientes para dar à Educação brasileira a qualidade que solucionaria as

referidas demandas, no entanto, o fato concreto era que os dados da Educação ainda

necessitavam de atenção. Passados mais de duzentos e cinquenta anos da ideia da

implementação de uma Educação Pública no Brasil1, ainda tínhamos, em 2010, segundo

o IBGE (2012), 28,2% das pessoas na faixa-etária dos 25 aos 29 anos de idade, com

ensino fundamental incompleto, e 39,9% com ensino médio completo e/ou superior

1 Em 1759 tivemos a emissão do Alvará Régio para a introdução do ensino púbico no Brasil, o seu

objetivo pedagógico era o de renovar a educação da colônia para modernizar o país. Na elaboração do referido Alvará não foram consideradas as “escolas de primeiras letras”, dificultando assim a sua implementação, esta ocorreria apenas em 1772 (MARCÍLIO, 2005, p. 19-21).

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incompleto. Ou seja, 68,1% desta população não concluiu seu processo educacional e

não estaria qualificada para o mercado de trabalho, cada vez mais exigente e um dos

mais eficientes motivadores para a busca pela Educação.

Ainda que Leis, teorias, métodos e diagnósticos educacionais representem

instrumentos para o posicionamento e tratamento da Educação, assim como para o seu

aprimoramento e qualidade, correspondendo aos interesses da população e do Estado,

foi possível perceber um choque entre desenho educacional e realidade educacional, o

que poderia ser considerado como uma incompatibilidade entre pensado e produzido,

meta e resultado, entre ideal e real, na qual a significação da Educação, nos campos

cultural e político, seria anterior aos referidos instrumentos. Neste sentido, a primeira

questão que estimulou o desenvolvimento desta pesquisa foi como a Educação está

colocada no campo político, especificamente na ação do Estado, entendida como

Política Pública.

Se a Educação representa ou não a solução para todas as demandas sociais, ainda

não sabemos, pois ela ainda parece embrionária se a compararmos com o idealizado e o

realizado. Um caminho possível para compreender o exercício da Educação, enquanto

ação do Estado, seria através da análise de Políticas Públicas direcionadas para esta

área, pois seriam elas que atenderiam às necessidades da população, mas há um porém,

Política Pública não é algo mágico, que uma vez regulamentada torna-se realidade, e

esta foi a segunda questão que deu estímulo ao desenvolvimento desta pesquisa: a

compreensão entre a formulação e a implementação de Políticas Públicas, fases que

compõem o método Ciclo da Política Pública, tomando como estudo de caso a política

Programa Mais Educação – PME, a partir da percepção de seus principais

implementadores: os Docentes.

Sabe-se que as Políticas Públicas dificilmente são definitivas, os processos de

adaptação e redesenho são relativamente comuns, no entanto, por mais redesenhos que

essa política sofresse, a questão da significação do servidor público professor merecia

ser considerada, afinal, seria o seu serviço que, necessariamente, colocaria a política em

ação. O Programa Mais Educação trazia consideráveis níveis de sofisticação, do ponto

de vista da esfera federal, se comparado às ações que lhe deram base, como as escolas

de tempo integral implementadas nas décadas de 1950, 1960 e 1980, porém, seu

principal ator, o docente, parecia não ter sido contemplado com a mesma sofisticação

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contida na letra da Lei do PME, neste sentido, pareceu haver um contrassenso entre a

perfeição objetivada pelo Programa Mais Educação, com a imperfeição do tratamento

recebido pelos professores por parte do Estado. A escolha do PME, como estudo de

caso, se justificou pela amplitude de seu desenho, que objetivava reposicionar a

Educação das crianças em um sentido Integral, sentido este, cujo desenho recebeu seus

primeiros traços nos anos 1920, já a escolha dos docentes como atores a serem

investigados, se justificou no sentido de coloca-los, nesta pesquisa, como os atores

principais do processo de implementação.

Nos anos 1960, Anísio Teixeira nos alertou que a Educação brasileira sempre

teve como base as leis e os decretos elaborados por intelectuais que pouco sabiam da

realidade nacional, e ainda, que a “lei era algo mágico”, capaz de subitamente mudar a

face das coisas. (TEIXEIRA apud MARCÍLIO, 2005, p. 127-8). O Programa Mais

Educação, do ponto de vista de sua formulação, trouxe aspectos deste “algo mágico”,

tratava-se de uma política pioneira, ainda que indutora, que partiu da esfera federal,

neste sentido, apresentava-se como uma política inovadora, no que diz respeito às bases

de seu planejamento, critérios para adesão, disponibilização de verbas e orientações

operacionais, pois propunha elementos que até então não faziam parte da Educação

enquanto prática, esta prática seria exercida pelos atores implementadores que teriam

suas próprias significações quanto ao papel da Educação e de si mesmos no interior do

processo educacional.

O processo de finalização desta dissertação teve início na última quinzena de

agosto/2016, nos últimos dias desse mês (25/08/2016), foi anunciado pelo Ministério da

Educação, que o Programa Mais Educação seria extinto. O mesmo Ministério passou

por uma nova composição de seus quadros, em razão da aprovação da abertura de

processo de Impeachment ocorrida em 12/05/2016. O vice-presidente Michel Temer

(PMDB), ainda que governando interinamente, reformulou a direção de todas as Pastas

Governamentais, como consequência, as políticas – principalmente as sociais –

desenhadas nos mandatos presidenciais de Luis Inácio Lula da Silva (2003-2010) e

Dilma Rousseff (2011-2016), ambos do Partido dos Trabalhadores (PT), passaram a

correr riscos de descontinuidades, tendo em vista as propostas de enxugamento da

máquina estatal anunciadas pelo governo interino, ainda que o processo de

Impeachment não havia sido finalizado. Tais propostas pareciam já em fase de

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formulação, uma vez que doze dias após a aprovação de abertura do Processo, o

governo interino já lançava a nova marca do Governo Federal (SECOM/BRASIL,

2016).

Durante o desenvolvimento do capítulo “A Escola Integral no Brasil: Anísio

Teixeira e Darcy Ribeiro”, já com o processo de Impeachment em curso, esta

pesquisadora foi tomada por uma sensação de reviver o passado histórico da Educação

Integral no Brasil. O Programa Mais Educação descendeu dos ideais de Anísio Teixeira

e Darcy Ribeiro, o primeiro na construção das Escolas Parques e o segundo, na

construção dos CIEPS, embora essas construções sejam distantes, do ponto de vista da

infraestrutura, relacionada com o Programa Mais Educação, aproximavam-se na

questão da formação integral dos educandos, ainda que ideologicamente, no entanto

suas descontinuidades eram semelhantes, pois foram definidas por cenários políticos,

por governos específicos. Nos anos 1950, Anísio Teixeira (1977, p. 164) colocava o

problema da Educação brasileira na esfera política, não na técnica e conteúdo, era um

problema da formação nacional, pouco acostumada à vida democrática, já Darcy

Ribeiro (1986, p. 11), nos anos 1980, entendia o fracasso da Educação como resultado

da atitude das classes dominantes brasileiras, ambos parecem ainda ter razão.

Diante do cenário político, brevemente apresentado, e suas consequências para o

objeto de estudo desta dissertação, a discussão sobre a relação entre a formulação e a

implementação do Programa Mais Educação, através da perspectiva e vivência dos

docentes, foi impactada. As primeiras entrevista realizadas apontaram para a questão do

atendimento à burocracia, presente nos programas educacionais, como a principal tarefa

dos funcionários do setor educacional, entre eles os docentes, e estes manifestaram suas

auto percepções no processo educacional quanto a implementadores de políticas

públicas: “somos nada”; “me sinto um boneco”; “sou substituível” . No entanto, esta

questão apresenta-se como coadjuvante no processo de formulação e implementação de

Políticas Públicas (Policy: dimensão material da Política), pelo menos para o caso

estudado nesta dissertação. A dimensão institucional (Polity) apresenta-se como o ator

principal das políticas educacionais, no que diz respeito ao seu nascimento e ao seu fim,

a gestão, na qual podemos localizar as dimensões material e processual (Politics), neste

caso, parecem ser dependentes da Polity. Estudos de análise de Políticas Públicas

entendem que as três dimensões da Política (Polity, Politics e Policy) não teriam uma

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hierarquização (FREY, 2000, p. 217), mas para o caso das políticas educacionais, e

possivelmente das políticas sociais de modo geral, essa hierarquização, assim como os

elementos e significações culturais possam ser consideradas em estudos futuros.

São Paulo foi a região escolhida para a realização das entrevistas com os

docentes, tomados no planejamento desta dissertação, como os atores principais do

estudo de caso PME, seriam eles aqueles que dariam voz à concretude do Programa

analisado. Ocorre que em outubro/2015, o governo do Estado de São Paulo, anunciou a

política “Reorganização Escolar”, dentre seus resultados – atingindo estudantes de

todos os ciclos educacionais e seus respectivos professores – o maior deles seria o

fechamento de diversas unidades escolares, a resposta dos estudantes secundaristas foi a

ocupação de suas escolas, como uma ação de protesto. A resposta do Estado foi a

violência, tanto dentro das escolas ocupadas, quanto nas manifestações dos estudantes

secundaristas nas ruas de São Paulo. O papel da mídia tradicional foi o de divulgar os

benefícios da política, pautada, de acordo com o Governo, como a redução de despesas,

o que beneficiaria o Estado de São Paulo, e o de não divulgar a violência sofrida pelos

estudantes pelas mãos da política militar. Por outro lado, os estudantes organizados,

criaram redes virtuais nas quais difundiam o que de fato ocorria: 1) as consequências da

política estadual, caso fosse implementada; 2) as ações de violência do Estado; e 3) a

vivência nas ocupações. Não temos como avaliar o resultado das ações dos estudantes

secundaristas, mas o fato concreto é que o governo estadual anunciou em

dezembro/2015 que a política da “Reorganização Escolar” seria redesenhada, e o fato

subjetivo é que a relação entre estudantes, professores, escola e política pública teria

sido ressignificada.

A segunda etapa das entrevistas com os docentes foi colocada como a penúltima

tarefa do cronograma de planejamento de pesquisa (a ser seguida pela análise das

entrevistas e considerações finais), prevista para o mês de setembro/2016. Os

agendamentos foram realizados na última semana do mês julho/2016, porém quando

retomados os contatos para os encontros entre pesquisadora e entrevistados, estes se

mostraram desmotivados pelo cenário político, pela ameaça das políticas educacionais

do Estado Federal e Estadual, mas principalmente pela extinção do Programa Mais

Educação. Falas concedidas na primeira etapa das entrevistas foram repetidas por estes

novos atores: “somos nada”, “somos substituíveis” e complementadas por “eu sabia que

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não daria certo”, “ninguém quer saber da escola”, “mais um programa sem sentido”,

“tanto trabalho jogado fora”, “agora é esperar a nova meta”. Os docentes a serem

entrevistados, se mostraram pouco interessados em conceder seu tempo para falar sobre

algo que não existia mais e sobre um tema constantemente desqualificado pelo Estado:

Educação e Escola. Não disseram explicitamente que não concederiam as entrevistas,

mas buscaram formas de novos agendamentos. Percebi seus constrangimentos, lidos

como um conflito entre suas vontades e o respeito pelo compromisso assumido. Decidi

que não os constrangeria ainda mais.

O planejamento inicial desta dissertação foi divido em duas etapas principais:

1. Análise da fase de Formulação do Programa e seus antecedentes; e

2. Análise da fase de Implementação, através da ótica das professoras e

professores que lecionavam em escolas que aderiram ao PME.

Esta segunda etapa da pesquisa foi objetivada como uma tentativa de identificar

os papéis dos entrevistados como servidores públicos e/ou como docentes, o primeiro

como o corpo da ação do Estado, seu recurso humano, e o segundo como protagonista

do desenvolvimento da Educação, sendo que ambos, em tese, fazem parte de um mesmo

processo. O objetivo geral era o de compreender como teria sido o diálogo entre a

Formulação da Política, tradicionalmente elaborada por equipes descoladas da realidade

dos atores implementadores, com a Implementação, que necessariamente, seria

concretizada através dos servidores públicos, estes possuiriam suas próprias

perspectivas, objetivos e significações, que não obrigatoriamente estariam em sintonia

com o desenho da política. O possível contraste entre estas duas realidades, dos atores

implementadores e dos atores formuladores de Políticas Públicas, somadas à

significação dos docentes pelo Estado e seu papel como servidores públicos, teria sido a

base da problematização desenvolvida nesta pesquisa, através do estudo de caso do

Programa Mais Educação (PME).

O resultado da decisão desta pesquisadora, ao não dar continuidade à fase das

entrevistas, foi colocar em cheque os objetivos iniciais desenhados para esta dissertação.

A saída encontrada pautou-se na orientação recebida na fase de Qualificação: o

desenvolvimento do capítulo “A Escola Integral no Brasil: Anísio Teixeira e Darcy

Ribeiro”. Assim como já anunciado, a Educação, no caso brasileiro, não seria um

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problema de conteúdo, método ou quantidade de unidades escolares, mas sim um

problema da Política. Esse capítulo de abertura, traz um levantamento do histórico das

primeiras escolas de tempo integral implementadas no Brasil, os anos 1950 e 1980. Sua

elaboração contribuiu para o contato com ideia de Educação Integral das crianças como

um desejo dos principais educadores brasileiros, desejo este que não se perde no tempo,

ainda que seja como um desejo. É possível perceber nesse capítulo, os pontos de

convergência entre as primeira experiências de Escola Integral com o PME,

principalmente no que diz respeito às descontinuidades, estas como resultado de fortes

alterações no cenário político.

O capítulo “Componentes da Análise e Gestão de Políticas Públicas” apresenta

as especificidades do Sistema Federativo Brasileiro e seus impactos na adesão e

implementação de Políticas Públicas; apresenta ainda a discussão da relação entre as

fases de Formulação e Implementação, o argumento inicial que estimulou o

desenvolvimento desta pesquisa. Nesse item são tratadas: 1) a importância que a fase de

implementação passou a representar na Análise de Políticas Públicas, uma vez que,

tradicionalmente, a ideia de sucesso desta fase estava relacionada ao desenho da política

(Formulação); 2) os conflitos existentes entre formulador e implementador; e 3) a

conjuntura política como mais um ator no processo de Implementação, o que, para o

nosso caso, resultou na extinção do objeto desta pesquisa. Por fim são apresentadas as

variáveis necessárias para o processo da Gestão de Políticas Públicas, tais variáreis

demonstram a complexidade de tal processo, que pode ser potencializada pela

Gramática Política do Brasil e pelo tipo de cidadania desenhada em nosso histórico

político-social.

O Programa Mais Educação é apresentado na sequência. Esse capítulo é

composto pelos antecedentes do Programa, descritos através das dimensões Polity

(institucional), Politics (processo político) e Policy (conteúdo concretos da política).

Ainda nesse capítulo é discutida a Janela de Oportunidade, termo utilizado para

demonstrar quais seriam as condições necessárias para que determinada demanda ou

problema, seja objeto da atenção governamental, no que diz respeito à ação efetiva do

Estado, ou seja, a sua entrada na Agenda Decisória. As referidas condições estão

divididas entre Problemas (condições sociais), Alternativas e soluções (propostas já

desenvolvidas para os Problemas identificados) e Político (somatória do clima ou

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humor nacional, forças políticas organizadas e mudanças no interior do próprio

governo). Nesse capítulo é possível perceber a entrada do problema da Educação das

crianças na Agenda Decisória, a partir das condições descritas, mas a condição que

ganha destaque é a Política (fluxo Político), essa é a mesma que lhe dá a vida e a

extinção, confirmando assim o que já fora diagnosticado por Anísio Teixeira e Darcy

Ribeiro.

O capítulo que antecede as Considerações Finais desta dissertação, é “Os

professores, sua formação, a relação com o serviço público e considerações sobre sua

relação com o Programa Mais Educação”. Esse capítulo foi o primeiro a ser

desenvolvido, uma vez que julguei necessário compreender quem seria o ator a ser

entrevistado para esta pesquisa. Embora sua importância, enquanto implementador,

tenha sido ofuscada pela atual conjuntura política, colocada como determinante em todo

o Ciclo da Política Pública, esse capítulo foi mantido, pois se esse ator foi preterido

desde a fase de Formulação do PME até sua extinção, ele será reconvocado para

implementar outras Políticas Públicas, sejam elas redesenhos de políticas anteriores,

sejam elas novas políticas, em outro ou no mesmo cenário político, no entanto seu

histórico e sua significação, provavelmente, continuarão os mesmos. Esse capítulo deu

ênfase ao histórico do professor no Brasil, teve por objetivo relacionar as condições do

professor construídas neste histórico com as necessidades da implementação de uma

política pública, na qual, no campo da prática, ele é o ponto de partida e o ponto de

chegada. Por fim, há duas entrevistas realizadas quando da primeira etapa desta

pesquisa, nelas o objeto investigado foi o PME, no entanto, é possível ter contato com

as sensações das entrevistadas, quanto às suas relações com a docência, com a escola e

com as políticas educacionais.

O aprendizado adquirido por esta pesquisadora, no processo de desenvolvimento

desta dissertação é composto por duas categorias. A primeira categoria engloba os

objetos estudados, ela ensinou que a Educação é um processo contínuo de

descontinuidades, influenciadas, necessariamente, pelas instituições políticas. Este

aprendizado, para a comunidade acadêmica, para os implementadores e formuladores de

políticas educacionais, possivelmente não é um novo aprendizado, assim como também

não o é para os decisores das políticas, para estes, as descontinuidades podem

representar um objeto contínuo de bandeiras partidárias e políticas. Enquanto o

19

problema da Educação não for solucionado, ele sempre estará presente em comícios,

discursos, pautas e debates. A Educação como problema, se coloca como uma fonte

inesgotável de propostas governamentais, compostas por meio e fim, sendo este

necessário para outro meio, mas dificilmente para um novo início.

A segunda categoria engloba as minhas sensações. A primeira delas esteve

vinculada ao desenho do Programa Mais Educação, ele era sofisticado, tinha bases

teóricas consolidadas, havia verba. Havia problema e solução. Havia um caminho longo

a ser percorrido, mas havia caminho. Havia falhas em seu desenho, mas havia a

possibilidade de redesenhos. Essa sensação foi sendo desmistificada durante o processo

de pesquisa, entendo essa desmistificação como um aprendizado básico para a formação

de uma pesquisadora. A segunda sensação se deu quando da extinção do PME, e gerou

a pergunta “O que faço agora?”. O primeiro aprendizado foi a compreensão de que

pesquisa não se faz sozinha, a orientação da professora Rosemary Segurado foi

fundamental para a minha reconexão com o meu plano de trabalho, que não

necessariamente estava vinculado à problematização do objeto, mas sim ao meu

processo educacional, tema trabalhado nesta pesquisa. O terceiro aprendizado foi o

respeito emocional dado às professoras agendadas para as entrevistas, elas não mais

queriam falar sobre o assunto, estavam cansadas de serem objetificadas por estudantes,

mas principalmente pelo Estado, um dos problemas identificados nesta pesquisa. O

quarto aprendizado foi a significação da necessidade do redesenho desta dissertação, tal

como ocorre com as políticas públicas, que não atingem os resultados previstos quando

de seu desenho. O quinto aprendizado é resultado dos aprendizados anteriores desta

categoria: o primeiro passo rumo ao meu amadurecimento como pesquisadora.

20

1. A Escola Integral no Brasil: Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro

Falar do dito não é apenas redizer o dito, mas reviver o vivido que gerou o

dizer agora, no tempo do redizer, de novo se diz. Redizer, falar do dito, por

isso envolve ouvir novamente o dito pelo outro sobre ou por causa do nosso

dizer (FREIRE, 2011, p. 23).

Ampliar a jornada escolar, tendo como tarefas principais as questões sociais e

culturais, foi a base do conceito de Educação Integral, que começou a ser desenhado nos

anos 1920 e 1930, através de diferentes correntes políticas: a) Autoritárias e Elitistas,

estando em seus extremos a Ação Integralista Brasileira; e b) Liberal, na qual Anísio

Teixeira teve maior destaque. Neste período, foram os Integralistas que atribuíram à

Educação uma função moralizadora, pautada por valores como sacrifício, sofrimento,

disciplina, obediência aos superiores e disposição para morrer pelos ideais nacionais, o

“indivíduo seria moldado para servir aos interesses do Estado Integral”, já na visão das

“correntes liberais”, o objeto principal era a Escola, que teria como função principal e

como fundamento da Educação a “propagação da mentalidade e das práticas

democráticas” (CAVALIERE, 2010, p. 249-50). Cavaliere (2010, p. 250) chama a nossa

atenção para o fato de que Anísio, o representante mais expressivo dessa corrente e aquele

que concretizou a construção de escolas de jornada ampliada, praticamente não fez uso da

expressão Educação Integral, segundo sua análise, essa curiosidade se deve ao fato de que

Anísio procurava “evitar qualquer identificação com os Integralistas”, que usaram

abundantemente as expressões “Homem Integral”, “Estado Integral” e “Educação

Integral”. Embora esse termo tenha ligações mais expressivas com as correntes

autoritárias, a “Educação Integral” da qual trataria o Programa Mais Educação - PME

(2007) teria suas origens teóricas mais próximas do pensamento desenvolvido por Anísio

Teixeira e é com este autor que este capítulo começará a ser desenvolvimento.

Clarice Nunes (2010, p. 12), inicia seu ensaio sobre Anísio Teixeira,

questionando o leitor: “Qual seria o propósito da vida de Anísio Teixeira?” e nos conta

que Anísio nasceu em 1900, na pequena cidade de Caetité no interior baiano. Sua

origem social teria colocado à sua disposição um diverso quadro de alternativas para o

encaminhamento de sua vida adulta como o

sacerdócio, a magistratura, o exercício liberal da advocacia, medicina ou

engenharia, o exercício do jornalismo e das letras, a condução dos negócios e

interesses familiares ou a carreira de político profissional. Tratava-se de um

amplo repertório se comparado ao de outras crianças de origem social

diferente (NUNES, 2010, p. 12).

21

Em 1924, dirigindo a instrução pública da cidade de Salvador, na função de

Inspetor Geral do Ensino, Anísio começa a ter contato com a área educacional, é neste

momento que o nosso futuro educador se depara com o contraste entre sua formação

educacional e a realidade da Educação do sistema público, esse contraste lhe expõe a

“pobreza de recursos materiais e humanos, a dispersão e a desarticulação dos serviços

educativos, o despreparo do professor, a imoralidade, a corrupção e a acomodação dos

poderes públicos”. Em 1927, Anísio, em viagem aos Estados Unidos, conhece um

diferente tipo de sistema público de educação, baseado na literatura de John Dewey

(1859-1952), que seria a sua fundamentação teórica para pensar uma Educação voltada

ao conhecimento e ao exercício da democracia. A escolha dessa literatura representou a

substituição de seus valores católicos pelo pensamento científico, “apostando na crença

de que o enraizamento e as direções da mudança social a favor da democracia estavam

apoiadas na infância”. A literatura deweyana fomentou as bases para o combate à

improvisação e ao autodidatismo, característicos da história educacional brasileira até

aquele período. Quando de seu retorno, em novembro de 1927, Anísio escreveu ao pai,

confessando seu gosto pelos assuntos educacionais, afirmou “sua convicção de não mais

se afastar desse rumo, a despeito das oscilações políticas e da imprensa que não lhe

poupava críticas”, no entanto, reconhecia que tal convicção era idealista, uma “paixão

necessária para a tarefa educativa” (NUNES, 2010, p. 16, 18-9).

A “paixão necessária para a tarefa educativa”, pode ter sido um dos alicerces para a

elaboração do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932, no qual Anísio foi um

de seus signatários. O Manifesto é marcado pela construção de uma “Educação Nova”, na

qual a educação integral dos indivíduos é o seu maior fundamento, e dentre esses

indivíduos, as crianças têm destaque. Essa Educação Integral idealizada, teria como objeto

“organizar e desenvolver os meios de ação durável com o fim de dirigir o desenvolvimento

natural e integral do ser humano em cada uma das etapas de seu crescimento”. Neste

sentido, o papel da escola necessitaria de um redesenho, ela seria o vínculo com o meio

social, o seu ideal seria condicionado “pela vida social atual, mas profundamente humano,

de solidariedade, de serviço social e cooperação”. Olhando para o futuro, o Manifesto

vislumbrou a formação integral das novas gerações através de um novo tipo de escola

(MANIFESTO DOS PIONEIROS, 1932, p. 191, 194).

22

Em 1935, Anísio redige o programa do Partido Autonomista do Distrito

Federal2, no qual faz críticas às organizações políticas, tanto liberais, quanto as

extremistas de esquerda e de direita. Os liberais, para Anísio, “não percebiam a

necessidade de homogeneidade e coesão”, já os extremistas de esquerda e de direita,

tornavam-se “pequenos sacerdotes ativos e operantes”. O programa partidário foi

considerado por seus opositores como uma “obra anárquica”, mas para Anísio, o seu

partido era revolucionário, não necessitaria de “censura ou segredo”, ocorre que a

conjuntura da época, marcada pelo autoritarismo de Getúlio Vargas, não conformaria a

organização de nada que estivesse livre de censura e quando a ditadura de Getúlio

Vargas se consolidou, Anísio Teixeira foi uma de suas vítimas. Ele e seus colaboradores

foram calados e o histórico de sua obra pública foi apagada (NUNES, 2010, p. 20-4).

Em meados de 1940, Monteiro Lobato escreve a Anísio:

Lembro-me quando te vi no Rio de Janeiro, perseguido pela polícia,

escondido pelos amigos como um grande criminoso – e naquela ocasião

também chorei. To whom the bells toll?3 Todos estávamos implicitamente

perseguidos, foragidos, escondidos com você (...) Dez anos passou, você

caminhando como minhoca por baixo da terra, escondido da Reação

Triunfante, mas caminhando sem o saber (VIANNA & FRAIZ, 1986, p. 101

apud NUNES, 2010, p. 25)

Monteiro Lobato havia profetizado que os “tocos” da obra de Anísio ficariam

enterrados e brotariam novamente, e após ser desmoralizado pelo fascismo brasileiro,

acusado de “tapeador público, denunciado nos subterrâneos do Serviço Secreto da

Polícia varguista, ao lado de estupradores, estelionatários e mandantes de homicídio”,

minerar manganês no Amapá e vender carros em Salvador, Anísio foi reconhecido pela

Unesco, que o convidou, em 1946, para ser um de seus conselheiros do Ensino

Superior, no ano seguinte foi convidado para o cargo de Secretário de Educação e Saúde

do Estado da Bahia, cargo que ocupou até 1950. Nesse cargo e em um novo momento

democrático, os ideais dos Pioneiros da Educação foram retomados e em 1950, foi

construído o Centro Popular de Educação Carneiro Ribeiro, popularmente denominado

de Escola-Parque, em Salvador no bairro da Liberdade, que fornecia às crianças “uma

educação integral, cuidando de sua alimentação, higiene, socialização e preparação para

o trabalho e a cidadania” (NUNES, 2000, p. 11-2, 26).

2 À época, o Distrito Federal era na cidade do Rio de Janeiro. 3 A quem os sinos dobram?

23

Figura 1: Centro Educacional Carneiro Ribeiro4

4 “Fotos de HANS MANN, EDMUNDO e cedidas gentilmente pela USAID. Reprodução de fotos

autorizadas” (EBOLI, 1969, p. 12)

24

Inaugurada em 21 de setembro de 1950, o Centro Educacional Carneiro Ribeiro

(CECR) era composto por Escolas-classe e pela Escola-parque, sendo esta última

formada por teatro, biblioteca, pavilhão de educação física, pavilhão de trabalho, artes

plásticas, jornal, rádio e banco econômico. O Centro

constitui uma imagem viva em prol dos benefícios da educação integral, ou

seja, do processo educativo que considera o educando na inteireza da sua

individualidade, desenvolvendo-lhe todos os aspectos da personalidade e

procurando afirmar nele os valores maiores da pessoa humana, como a

liberdade com responsabilidade, o pensamento crítico, o senso das artes, a

disposição da convivência solidária, o espírito aberto a novas ideias, a

capacidade de trabalhar produtivamente (EBOLI, 1969, p. 5, 6).

O projeto arquitetônico do CECR foi considerado um “excelente modelo de

organização e principalmente corajoso e arrojado para o sistema rotineiro e acanhado do

País”. O Centro era constituído por um conjunto de prédios nos quais funcionariam “a

mais completa demonstração de Educação Integral, em nível primário, da América

Latina, idealizada por Anísio Teixeira” (EBOLI, 1969, p. 12):

Quatro Escolas-classe de nível primário para mil alunos cada, com

funcionamento em dois turnos;

Uma Escola-parque, com sete pavilhões, destinados às chamadas práticas

educativas, onde os mesmos alunos completavam sua educação, em horário

diverso, de maneira a oferecer, aos alunos, o dia completo de permanência

em ambiente educativo.

Objetivos gerais do CECR:

1. Dar aos alunos a oportunidade de maior integração na comunidade escolar,

ao realizar atividades que os levariam à comunicação com todos os colegas

ou com a maioria deles;

2. Torná-los conscientes de seus direitos e deveres, preparando-os para atuar

como simples cidadãos ou líderes, mas sempre como agentes do progresso

social e econômico; e

3. Desenvolver nos alunos a autonomia, a iniciativa, a responsabilidade, a

cooperação, a honestidade, o respeito a si mesmo e aos outros (EBOLI,

1969, p. 20-1).

25

Seguem abaixo, trechos do discurso de Anísio Teixeira, quando da inauguração

do Centro Educacional Carneiro Ribeiro (ainda em construção), a partir deles podemos

ter uma ideia geral de sua estrutura e objetivos:

Todos sabemos que sem educação não há sobrevivência possível. A questão é

sobre a escola e não a educação. É sobre a escola que o ceticismo nacional

assesta os seus tiros tão certeiros e eficazes. O brasileiro não acredita que a

escola eduque. E não acredita, porque a escola, que possui até hoje,

efetivamente não educou.

[...] A escola primária é dividida em dois setores: o da instrução,

propriamente dita, ou seja, da antiga escola de letras, e o da educação,

propriamente dita, ou seja da escola ativa. No setor de instrução, manter-se-ia

o trabalho convencional da classe, o ensino da leitura, escrita e aritmética e

mais ciências físicas e sociais, e no setor educação, as atividades

socializantes, a educação artística, o trabalho manual, as artes industriais e a

educação física. A escola é construída em pavilhões, num conjunto de

edifícios que melhor se ajustem às suas diversas funções.

[...] Para economia tornava-se indispensável que se fixe um número máximo

para a matrícula de cada centro. Pareceu-nos que 4.000 seria esse número,

acima do qual não seria possível a manipulação administrativa.

[...] A criança fará um turno na Escola-Classe e um segundo turno na Escola-

Parque. Nesta escola, além de locais para suas funções específicas, temos

mais a biblioteca infantil, os serviços gerais e de alimentação. [...] A criança

terá um regime de semi-internato, recebendo educação e assistência

alimentar.

[...] Teremos os professores primários comuns para as Escolas-classe e para a

Escola-parque, os professores primários especializados de música, de dança,

de atividades dramáticas, de artes industriais, de desenho, de biblioteca, de

educação física, recreação e jogos. Em vez de um pequenino gênio para tudo,

muitos professores diferenciados em dotes e aptidões para a realização da

tarefa sem dúvida extraordinária de formar e educar a infância nos seus

aspectos fundamentais de cultura intelectual, social, artística e vocacional. A

escola primária terá, em seu conjunto, algo que lembre uma pequenina

universidade infantil (EBOLI, 1969, p. 14-6).

Anísio Teixeira (1977, p. 35, 53, 164) colocava para a Educação e para a Escola,

funções sociais, a primeira relacionava-se com a qualidade da vida individual e em

comunidade, tornando as crianças futuros brasileiros. A função social da Educação seria

efetiva a partir da função social da Escola, esta seria o ambiente legítimo para formar

valores, hábitos e atitudes que seriam indispensáveis ao cidadão de uma democracia.

Anísio, compreendia a complexidade dessa formação, por este motivo se justificava a

necessidade de uma Escola de tempo integral, construída e planejada para a “tarefa

educativa”, tanto da perspectiva arquitetônica, quanto metodológica. Os problemas

técnicos, como financiamento, construção dos edifícios e contratação de funcionários

pertenciam à ideia deste tipo de Escola, no entanto, a técnica não era um problema da

26

Educação, seu problema estava na esfera da política, a Educação era um problema, por

excelência, de uma nação, de sua formação nacional.

Anísio, em 1952, compreende a necessidade de observação e resolução dos

problemas econômicos, políticos e sociais, mas elege a Educação como o primeiro

problema a ser resolvido, pois a sua solução daria condições para o enfrentamento dos

demais problemas (TEIXEIRA, 1977, p. 164). Essa ideia dialoga com o pensamento de

T. H. Marshall (1967, p. 73), que em 1949 também elegeu a Educação como o primeiro

passo, a ser obrigado pelo Estado para as crianças, para a transformação do homem em

cavalheiro, do indivíduo em cidadão, seria a primeira fase do ensino a responsável pela

formação do adulto em perspectiva, não se deveria apenas atender ao direito da criança

em frequentar a escola, mas sim, ao direito do cidadão adulto ter sido educado. Marshall

entende a cidadania como o conjunto dos direitos sociais, civis e políticos, aqui a

Educação é colocada como a base do direito social, pois assim, os indivíduos educados

teriam melhores condições para compreender e conquistar os demais direitos. Anísio

também elenca essas esferas como problemas da construção democrática e cidadã,

colocando-as como esferas de Direitos, como partes de um problema básico:

Este é o problema básico - econômico, político e social. Problema

econômico - porque resolve o da igualdade de oportunidade para todos;

político - porque habilita ao uso das franquias políticas; e social - porque cria

a única hierarquia que não é iníqua: a do mérito e do valor. Somente, pois,

com a sua solução é que o homem brasileiro estaria em boas condições de

lutar pelas reivindicações posteriores - de melhor equilíbrio social. Seu

preparo educacional é que o habilitaria para receber as novas franquias e

novos direitos, sem o perigo de deformá-los transformando-os em ameaças

ao próprio equilíbrio social (TEIXEIRA, 1977, p. 164).

27

Figura 2: Planta do Centro Educacional Carneiro Ribeiro5

Em 1964 o Centro era constituído por 11 prédios divididos em:

Quatro Escolas-Classe;

A Escola-Parque, numa área arborizada de 42.000 m2 com os seguintes

setores: 1) pavilhão de trabalho; 2) setor socializante; 3) pavilhão de

educação física, jogos e recreação; 4) biblioteca; 5) setor administrativo

geral e almoxarifado; 6) teatro de arena ao ar livre; e 7) artístico.

Cada Escola-Classe, contava com 12 salas de aula cada uma, áreas cobertas,

consultório médico e dentário, instalações para administração, jardins, hortas e áreas

livres. Os alunos permaneciam nestas salas por quatro horas em aprendizagem escolar:

linguagem, aritmética, ciências e estudos sociais. Após este período, os alunos

encaminham-se para a Escola-Parque, na qual permaneciam por mais quatro horas,

agrupados por suas preferências e distribuídos em turmas de 20 a 30 alunos no máximo,

para realizar as seguintes atividades (EBOLI, 1969, p. 20):

5 “Fotos de HANS MANN, EDMUNDO e cedidas gentilmente pela USAID. Reprodução de fotos

autorizadas” (EBOLI, 1969, p. 21)

28

1. Setor de trabalho: artes aplicadas, industriais e plásticas;

2. Setor de Educação Física e Recreação: jogos, recreação, ginástica;

3. Setor Socializante: grêmio, jornal, rádio escola, banco e loja;

4. Setor Artístico: música instrumental, canto, dança, teatro;

5. Setor de Extensão Cultural e Biblioteca: leitura, estudo, pesquisa.

Havia ainda, na Escola-Parque, os seguintes setores:

Direção e Administração Geral do CECR;

Currículo, Supervisão e Orientação Educativa;

Assistência médico-odontológica; e

Assistência Alimentar.

Os alunos recebiam os uniformes, material didático, merenda e medicamentos

necessários. As Escolas-Classe 1, 2 e 3 atendiam crianças de 7 a 13 anos, em grupos

organizados pela idade cronológica. Procurava-se “constituir a classe de alunos com

interesses comuns, próprios de cada idade, em total oposição às conhecidas e artificiais

classes homogêneas que só tomam em consideração a capacidade mental do aluno e os

resultados de exames” (EBOLI, 1969, p. 22).

Na Escola-Classe 4 funcionava a Educação Complementar (ginasial da época,

atualmente corresponde aos 6º, 7º, 8º e 9º anos do ensino fundamental). Essa Educação

era a ampliação e o melhoramento do ensino primário adaptado às necessidades da

época e contemplava as seguintes disciplinas e práticas:

1. Disciplinas: Português, Matemática, Iniciação à Ciência, Geografia, História,

Estudos Socioeconômicos baianos, Organização Social e Política Brasileira,

Higiene (para meninos), Higiene e Puericultura (para meninas), Ciências

Físicas e Biológicas, Desenho, Noções de Comércio e Inglês.

2. Práticas Educativas: Educação Física, Artes Industriais e Domésticas,

Atividades Comerciais, Religião, Atividades Artísticas e Extensão cultural.

3. Atividades complementares relacionadas: a) com programas de estudo de

uma ou mais disciplinas; b) com a vida social, artística e recreativa dos

alunos e da comunidade; c) com atividades vocacionais.

29

a. Organização das Atividades complementares: clube de ciência, de

literatura, de línguas estrangeiras, de arte musical, de artes

domésticas, de enfermagem de urgência e de jornalismo.

Nessa Escola-classe, também estavam instalados o Serviço de Orientação

Pedagógica; os Conselhos de Classe; e o Grêmio Estudantil (EBOLI, 1969, p. 24-5).

Figura 3: Biblioteca Centro Educacional Carneiro Ribeiro6

Figura 4: Sala de aula – Escola-Classe Centro Educacional Carneiro Ribeiro7

6 “Fotos de HANS MANN, EDMUNDO e cedidas gentilmente pela USAID. Reprodução de fotos

autorizadas” (EBOLI, 1969, p. 28). 7 Idem.

30

Figura 5: Pavilhão de Trabalho (Artes Aplicadas, Industriais e Plástica) – Escola-Parque Centro

Educacional Carneiro Ribeiro8

Figura 6: Pavilhão de Educação Física – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro9

8 Idem. 9 Idem (EBOLI, 1969, p. 54).

31

Figura 7: Vestiário – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro10

Figura 8: Atividades Físicas – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro11

10 Idem (EBOLI, 1969, p. 54). 11 Idem (EBOLI, 1969, p. 56).

32

Figura 9: Atividades Físicas (balé) – Escola-Parque Centro Educacional Carneiro Ribeiro12

Figura 10: Área de convivência –Centro Educacional Carneiro Ribeiro13

12 Idem (EBOLI, 1969, p. 63). 13 Idem (EBOLI, 1969, p. 64).

33

Embora o Centro Educacional Carneiro Ribeiro tenha sido um considerável

empreendimento educacional, a sua importância parecia não ganhar destaque no cenário

nacional da época. O jornal A Tarde de Salvador, em 1967, publicou a seguinte matéria,

sob o título “A obra monumental que o Brasil desconhece”:

Por que estamos usando desta linguagem superlativa com relação ao CECR?

Porque acabamos de conhecê-lo. E no caminho de volta viemos debatendo-

nos entre duas emoções contraditórias: um enorme orgulho verde-amarelo

por ter constatado de quanto somos capazes, quando realmente nos dispomos

a fazer as coisas bem feitas; e certa melancolia, também verde-amarela, por

ver quanto somos idiotamente cegos, abandonando a uma obscuridade

incompreensível as obras máximas. Ficamos um pouco envergonhados até ao

saber que o Centro Educacional Carneiro Ribeiro, focalizado em reportagens

por diversas revistas estrangeiras, conhecido e divulgado na ONU e objeto de

visita de técnicos em educação de diversos países, é quase completamente

desconhecido, não só em todo o Brasil, mas até aqui na Bahia. (JORNAL A

TARDE apud EBOLI, 1969, p. 35).

Eboli (1969, p. 35) sinalizou, no final dos anos 1960, que o pior não era a falta

de reconhecimento público, mas sim a questão dos recursos financeiros que eram

reduzidos dia a dia “o que poderá levar à extinção total da obra, que tem sobrevivido

pelo esforço da equipe abnegada que a dirige e de alguns administradores que fazem

milagres com o reduzido orçamento”. O Centro não foi completamente extinto, no

entanto, conforme analisado por Cordeiro (2001, p. 241) os efeitos do tempo, assim

como a descontinuidade administrativa e, provavelmente, a incompreensão da proposta

original, “fizeram com que a Escola Parque se descaracterizasse, quase nada restando

dos seus pressupostos teóricos e princípios de atuação, dos seus mestres e dos produtos

concretos dos seus trabalhos”. Essa análise pode ser complementada por Cavaliere

(2010, p. 258) que pontua o afastamento de Anísio Teixeira da vida política, por conta

da ditadura militar iniciada em 1964, como um dos motivos pelos quais a ideia dos

Centro Educacionais, nos moldes do CECR, não tiverem continuidade, “a concepção de

educação integral esteve esquecida por cerca de 20 anos”, sendo retomada nos anos

1980 e 1990 através do programa dos CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública

do Rio de Janeiro, idealizado por Darcy Ribeiro, que seria uma atualização da proposta

de Anísio para a Educação Integral, de acordo com a autora, as propostas, de Anísio e

Darcy Ribeiro possuíam “enormes convergências”.

Implantados entre 1984-1987, na cidade do Rio de Janeiro, no Governo de

Leonel Brizola, sob orientação de seu vice, Darcy Ribeiro, os primeiros CIEPs –

Centros Integrados de Educação Pública, foram assim descritos por Brizola:

34

O CIEP é uma nova instituição que surge, questionando, por dentro, esta

realidade social injusta, desumana e impatriótica. Estas novas escolas

proporcionarão às nossas crianças alimentação completa, aulas, a segunda

professora que os pobres nunca tiveram, esporte, lazer, material escolar,

assistência médica e dentária. Depois de permanecer todo o dia no colégio,

voltam, de banho tomado, para o carinho da família. Mais de 50% de nossas

crianças, depois de anos de repetência, deixam a escola mal assinando o

nome. Noutras palavras, analfabetas e ressentidas. Por quê? Deficientes de

saúde e alimentação, apenas permanecem algumas poucas horas no ambiente

escolar, o qual, por sua vez, tem sido precário e ineficaz. Os alunos dos

CIEPs vêm alcançando cerca de 90% de aprovação. Só este alto rendimento

justifica, inclusive economicamente, os Centros Integrados de Educação

Pública. (RIBEIRO, 1986, p. 6).

Já Darcy Ribeiro (1986, p. 11, 13) revela-se impressionado com a magnitude da

rede escolar pública e sua precariedade, para ele a escola brasileira era uma produtora

de analfabetos. O fracasso educacional não seria resultado da falta de escolas, nem da

falta de escolaridade ou de alguma prática pedagógica, segundo Darcy, o fracasso se

devia à “atitude das classes dominantes brasileiras para com o nosso povo, um fator

importante do nosso baixo rendimento escolar reside na exiguidade do tempo de

atendimento que damos à criança”. Tal como Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro percebia

que a tarefa de educar não poderia ficar sob total responsabilidade da família, pois na

“imensa maioria das famílias brasileiras não há pessoa desocupada e pronta para tomar

conta das crianças e estudar com elas, a escola não tem o direito de esperar isto”

(RIBEIRO, 1986, p. 14). Anísio, neste sentido, afirmava que

Existe algo de irreal e equívoco nessa afirmação de que cabe à família o

controle da escola. Costumam os defensores dessa posição afirmar que a

família é o grupo social natural e concreto e que o Estado é vago e abstrato.

Ai de nós, que hoje é exatamente o contrário. Por mais desagradáveis que

sejam certas realidades, há que aceitá-las e dispor as coisas à vista dos fatos,

dos "teimosos fatos" de que falava William James. Respeitar os fatos é o

começo de toda sabedoria (TEIXEIRA, 1977, p. 211).

As convergências, entre as perspectivas de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro,

apontadas por Cavaliere, podem ser percebidas na construção de uma escola de tempo

integral direcionada para as crianças mais pobres, assim como a consciência de que

cabia ao Estado e não exclusivamente às famílias, oferecer este tipo de educação. O

CIEP, desenvolvido como um projeto educacional, foi resultado de uma das medidas

elencadas no Programa Especial de Educação, esse programa começou a ser formulado

no início do governo Brizola, em 1983, a partir da Comissão Coordenadora de

Educação e Cultura, presidida por Darcy Ribeiro, que acumulava, naquele ano, os

cargos de vice-governador, secretário de Ciência e Cultura e chanceler da Universidade

35

do Estado do Rio de Janeiro. A meta principal do Programa era “recuperar a dignidade

da escola pública”,

a partir de uma análise que apontava um quadro desolador no que se referia à

qualidade dos serviços públicos. A máquina administrativa herdada era vista

pelos novos administradores como a serviço do clientelismo, marcada pela

corrupção, por tráfico de influências e inchada por contratações de cunho

eleitoreiro. (MIGNOT, 2001, p. 156).

Em 1986, cerca de quinhentos mil alunos estavam matriculados em toda a rede

dos CIEPs. Cada uma de suas unidades, durante um período de 8 horas diárias (das

08h00 às 17h00), oferecia aulas do 1º Grau, atividades esportivas, participação em

eventos culturais, quatro refeições, um banho e ainda, sessões de Estudo Dirigido, esta

atividade significava “Aprendendo a Estudar”, na qual buscava-se o “rendimento global

de todos os alunos, oferecendo um tempo específico para os deveres, trabalhos e

atividades que normalmente seriam desenvolvidos em casa (RIBEIRO, 1986, p. 127).

No período da noite, os CIEPs atendiam 400 jovens de 14 a 20 anos, analfabetos ou

insuficientemente instruídos. A Proposta Pedagógica dos CIEPs se colocava em uma

perspectiva de “escola-casa”, suprindo as questões alimentares, de higiene e saúde.

Todos os profissionais envolvidos na dinâmica dos CIEPs participavam de treinamento

inicial intensivo, complementando-se por treinamentos periódicos e por reuniões com o

objetivo de estimular a constante “troca de ideias e vivências”. A principal tarefa do

CIEP era introduzir a criança no “domínio do código culto” em diálogo com sua

“bagagem de vida”, pois essa concepção de escola objetivava ser uma “ponte entre os

conhecimentos práticos já adquiridos pelo aluno e o conhecimento formal exigido pela

sociedade letrada”, recuperando assim, o papel político e social da escola (RIBEIRO,

1986, p. 17, 42, 47-9).

O trabalho pedagógico dos CIEPs era orientado por sete eixos (RIBEIRO, 1986,

p. 98-100):

1. Vontade Política: estruturação de uma escola voltada para o atendimento

das camadas populares, através do compromisso político dos educadores

para com os alunos; recuperação do senso de trabalho público, erradicando a

“descrença e a apatia geradas no magistério pelos anos de autoritarismo”;

2. Gestão e Decisão na (pela) Escola: democratização da escola púbica versus

relações de poder presentes nas Instituições educacionais, a partir de

36

treinamentos que estimulavam a superação da “arbitrariedade e da

centralização do poder na escola”. Além desses treinamentos, também

foram construídos canais de informação e de participação com o objetivo de

serem espaços de “formulação, reformulação, reflexão e debate contínuo

sobre as práticas pedagógicas”;

3. Cultura: valorização da cultura do aluno como parte do conteúdo

pedagógico, tais como “conhecimentos e habilidades construídos na luta

pela sobrevivência, no seio de suas relações sociais” que, de modo geral,

eram ignorados pelos professores oriundos dos setores médios da

população;

4. Essencialização dos Conteúdos: desenvolvimento de livros didáticos com

conteúdos que, de um lado, dialogassem com as experiências dos alunos

visando mudanças pessoais e assim, na sociedade, e de outro, voltados aos

pontos fundamentais de uma ciência. A essencialização não significava

“tratar a educação das classes populares de forma superficial”, ela tinha

como objetivo o “aumento real das possibilidades dos alunos adquirirem o

domínio básico da língua, da matemática, das ciências humanas e naturais”,

aplicando-as em suas vidas;

5. Unificação dos Conteúdos e Métodos de Ensino: revisão da tendência dos

cursos de formação dos professores que, até então, não articulavam os diversos

conteúdos trabalhados em sala de aula. Assim, este eixo, a partir de uma

Consultoria Pedagógica de Treinamento trabalhava, na perspectiva de que cada

professor dominasse seu “ramo de conhecimento e as formas de transmiti-los”,

mas articulados com os demais ramos que não fossem suas especialidades;

6. Interdisciplinaridade: esta metodologia de ensino tomava a disciplina de

Língua Portuguesa “como o elo integrador, uma vez que o domínio dos

conteúdos das demais disciplinas se efetiva através da linguagem”; e

7. Avaliação: entendido com o eixo mais sensível de todos, pois seria a

avaliação o “maior instrumento de poder do professor e da instituição

escolar”, geradora de alunos submissos, sistematicamente reprovados e

assim “fracassados”. A escola tradicional avaliaria apenas aquilo que o

37

aluno não sabia, de acordo “com os padrões da cultura formal”. Com o

objetivo de superar essa tradição, o sistema de avaliação dos alunos dos

CIEPs, era ser um “instrumento para o aperfeiçoamento contínuo do

trabalho pedagógico”. Todos eram avaliados: alunos, professores e escolas.

Para o desenvolvimento e aplicação do Trabalho Pedagógico, todo o corpo docente

passava pela “Capacitação do Magistério”, na qual, todos os professores participavam,

periodicamente, de encontros pedagógicos que procuravam 1) articular os diversos aspectos

do universo educacional; 2) compreender o fazer pedagógico como um processo filosófico,

político e ideológico; 3) selecionar e priorizar conteúdos programáticos em uma

metodologia que pudesse estabelecer as diretrizes práticas que permitissem “a efetivação

das condições que proporcionam aos alunos um real crescimento de suas possiblidades de

participação na sociedade”. Essas capacitações eram organizadas pela “Consultoria

Pedagógica de Treinamento” do Programa Especial de Educação, as atribuições dessa

Consultoria estavam organizadas da seguinte maneira (RIBEIRO, 1986, p. 83-4):

1. Aperfeiçoamento do corpo docente e dos funcionários:

a. Efeito multiplicador: professores orientadores repassavam aos seus

colegas o treinamento recebido; cada professor-orientador era

responsável pela coordenação do treinamento de 10 professores; a

estratégia “efeito multiplicador” foi adotada em razão da dificuldade

operacional em convocar o número necessário de professores para

treinamento centralizado.

2. Orientação das equipes técnico-pedagógicas dos CIEPs, para a organização

dos currículos;

3. Acompanhamento do processo de implantação do trabalho pedagógico, dando

especial atenção a: a) projetos prioritários (Alfabetização e Língua Portuguesa

na 5ª série), b) desenvolvimento do Estudo Dirigido, e c) repasse dos

treinamentos recebidos pelos professores e funcionários no interior dos CIEPs; e

4. Participação na avaliação de todo o processo de implantação dos CIEPs.

Toda a proposta pedagógica do CIEP era vivenciada em prédios projetados por

Oscar Niemayer, que segundo Darcy Ribeiro, eram 30% mais baratos que um prédio

escolar convencional”. O Projeto-Padrão era composto por três construções distintas

(RIBEIRO, 1986, p. 103-4):

38

1) Prédio Principal: três pavimentos ligados por uma rampa central:

a. Pavimento térreo: refeitório com capacidade para 200 pessoas e uma

cozinha dimensionada para café da manhã, almoço e lanche, para até

1.000 crianças; centro médico; e “amplo recreio coberto”;

b. Pavimentos superiores (2): salas de aulas; auditório; salas especiais

(Estudo Dirigido e outras atividades); instalações administrativas; e

c. Terraço: área reservada para atividades de lazer.

2) Salão Polivalente: ginásio desportivo coberto, com arquibancadas, vestiários

e depósito para guarda de materiais. Este espaço, “polivalente”, era utilizado

para prática de Educação Física e Esportes diversos, apresentações de

espetáculos teatrais, shows de música, rodas de capoeira e festas promovidas

pela Associação de Moradores.

3) Biblioteca: atendimento aos alunos para consultas individuais ou em grupos

supervisionados, e também à disposição da comunidade. Sobre a Biblioteca,

havia alojamentos para vinte e quatro crianças, que poderiam “morar na escola

em caso de necessidade, sob os cuidados de um casal”.

Figura 11: Arquitetura (projeto padrão) CIEP14

14 (RIBEIRO, 1986, p. 104)

39

Relação das Áreas dos CIEPs (RIBEIRO, 1986, p. 108):

CIEP Padrão (Área Total: 6.800 m2):

• Prédio Principal: 5.400 m2

• Biblioteca/Alojamento para crianças: 320 m2

• Ginásio: 1.080 m2

CIEP Compacto: 5.400 m2

Figura 12: Construção CIEPs15

15 (RIBEIRO, 1986, p 112)

40

Sobre a “Vida nos CIEPs”, Darcy Ribeiro (1986, p. 115) destaca a assistência

médico-odontológica, como uma rotina vivenciada pela primeira vez no ambiente escolar

como “parte integrante e inseparável de um projeto educativo renovador, ultrapassando os

limites da escola para ir ao encontro das necessidades comunitárias”. Nos Centros Médicos,

era desenvolvido um trabalho nos moldes da medicina preventiva, “mas sem descuidar da

assistência curativa”, oferecendo atendimento odontológico, oftalmológico, assistência

profissional em nutrição e atividades de educação para a saúde.

Figura 13: Atendimento médico CIEP16

Figura 14: Atendimento Odontológico CIEP17

16 (RIBEIRO, 1986, p. 117)

41

O Planejamento Alimentar das crianças também é objeto de destaque, assim

como a higiene, ambos relacionados à saúde. A cozinha tinha capacidade para produzir

3 mil refeições e 3 mil lanches por dia, orientadas por nutricionistas. A proposta básica

do plano alimentar consistia no fornecimento de 4 refeições diárias e suplementação

alimentar para os alunos-residentes e participantes do Programa de Educação Juvenil

(RIBEIRO, 1986, p. 120-1).

Figura 15: Refeitório CIEP18

17 (RIBEIRO, 1986, p. 114) 18 (RIBEIRO, 1986, p. 121)

42

Figura 16: Cardápio CIEP19

19 (RIBEIRO, 1986, p. 122)

43

Figura 17: Cardápio CIEP20

Na “Vida nos CIEPs” os Esportes e a Educação Física também eram fatores

importantes para a educação integral, pois agilizariam “o desenvolvimento dos alunos,

melhorando seu desempenho global”. O objetivo principal da Educação Física era

reverter sua posição tradicional nos currículos, no qual as crianças praticavam esportes e

aprendiam suas regras sem associa-los às demais disciplinas cursadas em sala de aula. A

Educação Física era realizada nos CIEPs “por meio da aplicação da filosofia de ensino

20 (RIBEIRO, 1986, p. 123)

44

integrado, todas as atividades desenvolvidas na escola estão entrelaçadas e a Educação

Física não é exceção”. Havia ainda, na “Vida nos CIEPs” os “Alunos-Residentes”, esses

alunos, considerados desamparados, eram abrigados em moradias no edifício principal e

eram assistidos por um casal-residente “especialmente treinado para essa missão”. O

projeto “Alunos-Residentes” não tinha o objetivo de ser um internato, a ideia era que a

permanência das crianças fosse temporária, pois também visava um trabalho conjunto

com os responsáveis pela criança, o que poderia resultar no seu retorno ao núcleo

familiar (RIBEIRO, 1986, p. 129-0).

Por fim, os CIEPs desenvolviam atividades de “Animação Cultural”,

compreendidas como um “elo integrador”. A “Animação Cultural” era uma ponte de

“mão dupla entre a escola e a vida comunitária”, na qual as apresentações e os artistas

faziam parte do cotidiano da comunidade, deste modo, incorporavam-se ao dia-a-dia da

escola (RIBEIRO, 1986, p. 133). O “elo integrador” pode ser visto como uma

estratégia que dialoga com a ideia da municipalização do ensino pensada por Anísio

Teixeira, no que diz respeito à valorização dos saberes locais e dos atores da

comunidade, uma forma de dar vida ao papel político e social da escola em sua própria

localidade a partir de elementos e experiências da vida cotidiana, o que traria concretude

às atividades escolares.

Nesse processo de estreitamento de laços entre a escola e sua comunidade, as

atividades de animação cultural passam a ter especial importância. Além de

contribuírem para a aprendizagem global dos alunos, pela valorização do

trabalho criativo no espaço escolar, as atividades culturais possibilitam um

reencontro com o próprio prazer de aprender. No dia-a-dia dos CIEPs, a

educação não pode mais ser dissociada das manifestações culturais e

artísticas, sobretudo daquelas que já se desenvolvem no interior da própria

comunidade. Afinal, elas são a ponte viva que leva a comunidade para dentro

da escola e vice-versa (RIBEIRO, 1986, p. 49)

45

Figura 18: Fachada CIEP Thomas Jefferson21

A Imprensa deu ampla cobertura ao projeto CIEPs, através de pronunciamentos

e entrevistas com Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, que defendiam e justificam o projeto,

por outro lado, também dava voz à crítica, pautada principalmente pelo custo e

manutenção das escolas, assim como uma demasiada atenção de Leonel Brizola à

Educação, o que teria deixado de lado outras áreas sociais. Tais críticas foram

iluminadas nas eleições de 1986, para governo do Estado do Rio Janeiro, que teriam

selado “quase definitivamente o destino dos CIEPs” (BOMENY, 2008, p. 13),

21 (RIBEIRO, 1986, p. 155)

46

Na disputa eleitoral, a bandeira da Educação e da construção dos CIEPs

colocou o governo Leonel Brizola como alvo de acusações divergentes: ao

mesmo tempo em que se criticava o chamado ‘governo de uma obra só’,

também se denunciava o fato de o governador não ter cumprido

integralmente as metas anunciadas. Assim, nem o brilho intelectual de Darcy

Ribeiro, nem os esforços depositados na modernização do ensino público

estadual foram suficientes para garantir a continuidade do PDT no governo

do estado do Rio de Janeiro. Venceria o candidato da oposição (XAVIER

apud BOMENY, 2008, p. 13)

Bomeny (2008, p. 14) chama a atenção para o posicionamento político de

Brizola, que antes das eleições de 1986, colocou-se, publicamente, contra “o que

chamava a ‘farsa do Plano Cruzado’”, denunciando como “eleitoreira a política

econômica do então presidente José Sarney”, a autora analisa que Brizola “amargaria

não só a crítica implacável em toda a mídia como a derrota do candidato do PDT, Darcy

Ribeiro, ao governo do Rio de Janeiro”. Tanto o Programa Especial de Educação,

quanto os CIEPs, eram identificados com o governo de Leonel Brizola e com Darcy

Ribeiro, sendo assim, com a derrota nas eleições, também foram derrotados os seus

projetos educacionais, o Programa Especial de Educação foi totalmente interrompido a

partir de 1987.

Com a derrota eleitoral de Darcy Ribeiro para o governo estadual em 1986, o

projeto foi interrompido. Em ruas, estradas, praças, bairros e favelas onde os

CIEPs estavam apenas em fase inicial da construção, os canteiros de obras

foram abandonados. Eram resquícios de um sonho, escombros de um

monumento à educação. Tapumes e entulhos macularam a paisagem e a

imagem da cidade vitrine do país. A escola que havia se tornado o seu mais

novo cartão postal, ainda assim pretendia dar mais uma lição: a lição sobre a

importância da continuidade administrativa. O debate sobre qualidade do

ensino que gerou, continuou vivo, apaixonado e apaixonante. (MIGNOT,

2001, p 163).

Brizola vence as eleições de 1990 para o governo do Estado do Rio de Janeiro e

uma das primeiras medidas foi retomar e ampliar o Programa Especial de Educação,

assim como concluir a construção dos CIEPs que ficaram paralisadas e dar continuidade

aos que foram construídos em seu governo. Ao final de 1993 já era possível

avaliar a pertinência do programa pela procura crescente por esta Escola e

pelo depoimento dos alunos e da comunidade como sendo uma escola

diferente: o respeito aos valores culturais, às diferentes individualidades.

Pontos determinantes para a construção do conhecimento e o acesso ao saber

legitimado pela sociedade (BARBOSA apud BOMENY, 2008, p. 16).

Restava, no entanto, a tarefa de completar a construção dos 500 CIEPs, meta do

primeiro governo Brizola, a questão que se colocava era a falta de professores

capacitados. Darcy Ribeiro, “um crítico impiedoso dos cursos de pedagogia [...]

47

ironizava: ‘A Pedagogia é como a neblina: quanto mais densa, menos se vê’”. Este

posicionamento significava que a formação docente não deveria passar pelo crivo da

pedagogia, a formação em serviço era a palavra de ordem. O que se deu foi uma

quantidade “imensa de escolas e de professores formados em tempo recorde”. Dada a

urgência da demanda por professores, foi criado um centro de capacitação, no qual era

ministrado um curso de dois anos e neste período o professor estagiava em sua futura

escola. Esse projeto de formação enfrentou severa resistência e pressão por parte da

comunidade acadêmica, que classificava como “eleitoreiro, populista e empreguista”,

sendo assim, o projeto de formação docente, idealizado por Darcy Ribeiro, foi sendo

abandonado. Em meio ao desgaste da imagem de Darcy Ribeiro, em 1993 Brizola

renunciou ao mandato para concorrer às eleições presidenciais de 1994, e além de não

ter saído vitorioso, viu o candidato do PSDB vencer as eleições para o governo do

estado do Rio de Janeiro, mais uma vez o Programa Especial de Educação foi paralisado

(BOMENY, 2008, p. 17, 19).

A relação entre as propostas de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro não teria sido

marcada pelo projeto ou pela prioridade a ser dada ao ensino básico, segundo Bomeny

(2008, p. 26-7), o que os diferenciou foi o volume de estabelecimentos, a velocidade

que Darcy “impôs a si mesmo para solucionar um problema com o qual a sociedade

brasileira conviveu em todo período republicano”, foram ainda, os atributos políticos e

sociológicos colocados acima dos pedagógicos na dinâmica dos CIEPs. A autora analisa

ainda o perfil de Darcy Ribeiro contrastado com os meios burocráticos, que orientam as

instituições educacionais. O perfil de Darcy seria aquele entusiástico, totalizador,

sintonizado “com mobilizações em que as fronteiras hierárquicas se dissolvem”. Este

tipo de perfil seria o oposto da rotina e da disciplina, características da burocracia, na

qual não caberiam os fundamentos das ações de Darcy Ribeiro, como a emoção, a

independência, o decidir no clamor da interação imediata, pois as rotinas institucionais

são pautadas pela regularidade, repetição e racionalidade.

Em 1995, diz assim Darcy Ribeiro:

Todos nós que participamos desse empreendimento sentimos a frustração de

ver ameaçado nosso projeto educacional, que efetivamente foi desativado e

descaracterizado. Trata-se de um ato de vandalismo cultural só comparável

ao que recaiu, há 60 anos, sobre Anísio Teixeira, que viu o seu programa

educacional extinto por obscurantismo. Era o maior e melhor experimento de

educação que se realizara em nosso País até então. Vivemos ainda hoje das

ideias de Anísio, encarnadas naquela época por Pedro Ernesto em duas

dezenas de grandes escolas públicas primárias, no Instituto de Educação e na

48

Universidade do Distrito Federal. Soterradas todas pela onda fascista que

invadiu o mundo. Hoje, o mesmo obscurantismo se repete, agora contra os

CIEPs e contra os GPs [Ginásios Públicos]. Por quê? (RIBEIRO, 1995, s/nº).

A Educação Integral no Brasil pode ser visualizada na seguinte linha do tempo:

Ano Descrição

1932

Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova

O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, redigido por 26 importantes

intelectuais brasileiros, foi lançado em 1932 e teve como objetivo implementar

um sistema de Ensino Público no Brasil que integrasse diferentes frentes de

aprendizagem: leitura, aritmética, escrita, ciências físicas e sociais, artes

industriais, desenho, música, dança, educação física, saúde e alimentação. No

texto intitulado A reconstrução educacional no Brasil: ao povo e ao governo, a

escola era descrita como um elemento vivo, que pode sofrer alterações

conforme o meio social onde está inserida. A influência da família e de toda a

sociedade no processo educativo já aparecem na declaração como uma

necessidade real para alcançar um modelo educacional eficiente.

1950

Centro Educacional Carneiro Ribeiro

Idealizador(a): Anísio Teixeira

Área de Abrangência: Nacional

Resumo: Entre os estudiosos que assinaram o Manifesto dos Pioneiros da

Educação Nova, destaca-se o educador Anísio Teixeira (1900 -1971), que em

1948 foi secretário de educação e saúde do governo de Otávio Mangabeira,

na Bahia. Anísio Teixeira foi responsável pela implementação do primeiro

modelo de Educação Integral bem sucedido no Brasil, com a criação do

Centro Educacional Carneiro Ribeiro (CECR), em Salvador, em 1952. Nesse

modelo, as atividades escolares aconteciam nas chamadas Escolas-Classe no

turno básico e nas Escolas-Parque no contraturno, complementando a

aprendizagem em sala de aula. Havia quatro Escolas-Classe com mil alunos

cada uma, construídas ao redor de uma única Escola-Parque com capacidade

para 4 mil estudantes em turnos alternados. A Escola-Parque tinha como

objetivo oferecer uma Educação Integral, garantindo à criança alimentação,

atividade esportiva e artística, higiene, maior socialização, além de preparação

para o mundo do trabalho e de discussões permanentes sobre cidadania e

cultura colaborativa.

1960

Escolas-classe e Escolas-parque

Idealizador(a): Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro

Área de Abrangência: Brasília (DF)

Resumo: Em 1960, Anísio Teixeira junto a Darcy Ribeiro e outros

importantes nomes da educação brasileira, criaram o Plano Humano do

Distrito Federal. Com a fundação da cidade de Brasília foram inaugurados

vários centros educacionais, construídos na mesma perspectiva do Centro

Educacional Carneiro Ribeiro, implementado em Salvador, na Bahia. O

Centro de Educação Elementar, pioneiro entre as iniciativas na capital, era

formado por diversos prédios escolares, que abrigavam jardim de infância,

Escolas-Classe e uma Escola-Parque. Foram construídas Escolas-Classe

e Escolas-Parque, onde eram realizadas atividades variadas, na mesma

perspectiva da formação desenvolvida na proposta baiana.

49

1980

Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs)

Idealizador(a): Darcy Ribeiro

Área de Abrangência: Rio de Janeiro (RJ)

Resumo: Os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) foram

idealizados por Darcy Ribeiro nos anos de 1980, a partir da experiência do

Centro Educacional Carneiro Ribeiro, experiência da Bahia. Durante os

dois mandatos do então governador Leonel Brizola (PDT), foram criados

aproximadamente 500 prédios escolares que respondiam a uma estrutura

denominada “Escola Integral em horário integral”. Os CIEPs atendiam

crianças e adolescentes em turnos estendidos e buscavam oferecer, além

das atividades pedagógicas tradicionais, outras possibilidades educativas,

recreativas e culturais e amparo assistencial, como atenção básica à

saúde e alimentação aos estudantes.

1993

Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (CAIC) de Seropédica

Idealizador(a): Universidade Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

Área de Abrangência: Seropédica (RJ)

Resumo: O Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (CAIC)

de Seropédica nasceu em 1993, a partir da solicitação de estudantes dos

cursos de licenciatura do campus central da Universidade Federal Rural

do Rio de Janeiro (UFRRJ) que desejavam experimentar processos de

educação integral como educadores ainda durante a graduação. O centro

foi implementado no município de Seropédica, a 75 quilômetros da capital,

e tinha como objetivo a maior integração da comunidade com o processo

escolar e o acompanhamento dos estudantes de licenciatura desde a pré-

escola até a graduação. O projeto ainda existe no município e também foi

ampliado a outras regiões do Rio de Janeiro.

2000

Projeto/Programa: Centros Educacionais Unificados (CEUs)

Idealizador(a): Governo Marta Suplicy

Área de Abrangência: São Paulo (SP)

Resumo: Os Centros Educacionais Unificados (CEUs) foram criados em

2000, na capital paulista durante a gestão da prefeita Marta Suplicy (PT).

Os centros, que existem até hoje e permaneceram como política de

governos posteriores, são constituídos por creche, educação infantil e

fundamental, além de estruturas para desenvolver práticas educacionais,

recreativas e culturais no mesmo espaço da formação escolar e têm como

proposta agregar a comunidade do entorno à oferta de atividades.

2006

Programa: Bairro-escola Nova Iguaçu

Idealizador(a): Secretaria Municipal de Educação de Nova Iguaçu (2005-

2010)

Área de Abrangência: Nova Iguaçu (RJ)

Resumo: Sob a égide da educação integral e do conceito de Bairro-escola,

desenvolvido pela Associação Cidade Escola Aprendiz a partir de

experiências práticas em diversas localidades brasileiras, a prefeitura de

Nova Iguaçu criou e implementou o programa Bairro-escola Nova Iguaçu.

No programa, praças, clubes comunitários, teatros e até as próprias ruas

viraram espaços educativos. Como extensão das salas de aula, esses

espaços eram acionados pelas escolas em parceria com o governo

municipal, oferecendo aos estudantes outras possibilidades educativas,

sempre ancoradas no currículo e na proposta pedagógica da escola. Além

50

da reformulação curricular e mudança no papel dos professores,

assumindo dentro da escola, novos agentes educativos, o Bairro-escola

propôs a reconfiguração da cidade como um todo. O projeto era concebido

intersetorialmente e reunia todas as secretarias sob a agenda da

educação integral (O programa continua, porém tem outras

características).

2006

Escola Integrada de Belo Horizonte

Idealizador(a): Secretaria Municipal de Educação Belo Horizonte (2006-

2010)

Área de Abrangência: Belo Horizonte (MG)

Resumo: A partir do conceito de Bairro-escola, de Cidades Educadoras e

de Educação Integral, a Secretaria Municipal de Belo Horizonte,

desenvolveu o Programa Escola Integrada, que tinha como grande

objetivo fortalecer a relação entre a escola e a comunidade onde se

inseria. O programa ampliava a jornada educativa para nove horas diárias

e uma integração ao currículo de novas atividades pedagógicas, em

diálogo com formação pessoal, artes, esporte, cultura e lazer. Além das

próprias escolas, as atividades mobilizam parques, centros culturais e

outros espaços comunitários, que recebem os estudantes em parcerias

efetivamente colaborativas. O poder público também atua articulado,

integrando diferentes secretarias. E, para apoiar as escolas na oferta de

oficinas, o Programa congregava estudantes universitários para apoiar as

escolas na execução de atividades. A escola recebia um cardápio de

oficinas e seu professor comunitário (havia um por unidade) determinava

com os estudantes e corpo docente quais seriam as oficinas ali oferecidas.

Por fim, cada escola operava seu orçamento para o programa de forma

autônoma: a verba era depositada em caixas-escolares e a escola tinha

liberdade, dentre os critérios dispostos da secretaria, para estruturar suas

ações (O programa continua, porém tem outras características).

2007

Programa Mais Educação

Área de Abrangência: Brasil

Resumo: O Programa Mais Educação é um dos objetivos do Plano de

Desenvolvimento em Educação e a principal ação indutora para a agenda

de educação integral no país. Criado em 2007, no governo Lula, o

programa tem como foco a ampliação da jornada escolar e reorganização

curricular, visando uma educação integral, com um processo pedagógico

que conecta áreas do saber à cidadania, ao meio ambiente, direitos

humanos, cultura, artes, saúde e educação econômica. O Programa é

coordenado pela Coordenação de Ações Educacionais Complementares

da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade

(SECADI/MEC), em parceria com a Secretaria de Educação Básica

(SEB/MEC) e com as Secretarias estaduais e municipais de educação.

Criado pela Portaria Interministerial nº 17/2007, o Mais Educação aumenta

a oferta educativa nas escolas públicas por meio de atividades optativas

que foram agrupadas em macrocampos, como, por exemplo,

acompanhamento pedagógico, meio ambiente, esporte e lazer, direitos

humanos, cultura e artes, cultura digital, prevenção e promoção da saúde,

educomunicação, educação científica e educação econômica. As

atividades tiveram início em 2008, com a participação de 1.380 escolas,

51

em 55 municípios, nos 27 estados para beneficiar 386 mil estudantes. Em

2009, houve a ampliação para cinco mil escolas, 126 municípios, de todos

os estados e no Distrito Federal com o atendimento previsto a 1,5 milhão

de estudantes, inscritos pelas redes de ensino, por meio de formulário

eletrônico de captação de dados gerados pelo Sistema Integrado de

Planejamento, Orçamento e Finanças do Ministério da Educação (SIMEC).

Hoje [até agosto/2016], o Mais Educação está em quase 60 mil escolas

nos 26 estados e Distrito Federal.

Quadro 1: Programas e políticas de educação integral no decorrer da história brasileira22

O principal eixo em comum dos programas e experiências de Educação Integral,

apresentados acima, é a ampliação das atividades escolares, essa ampliação tem como

referência o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, do qual Anísio Teixeira foi um

de seus signatários e também aquele que colocou em prática a primeira experiência de

Educação Integral em Tempo Integral, conforme apresentado neste capítulo. O mesmo

Anísio Teixeira foi um defensor da municipalização do ensino e este é o segundo eixo

em comum das experiências descritas no quadro acima, entendido como a escola

integrada à comunidade. Estes dois eixos, reivindicados desde os anos 1930, apresentam

dois problemas, que em alguma medida, estão relacionados entre si: 1) Currículo; e 2)

Descentralização da Educação.

A necessidade de ampliação da grade curricular sugere que as disciplinas

tradicionais, como português, matemática, geografia e ciências, por exemplo, não é

capaz de formar integralmente as crianças, as futuras cidadãs. A questão do ser cidadão,

da perspectiva do currículo escolar, pode ser problematizada a partir da teoria do

currículo, analisada por Tomaz Tadeu da Silva (2010). Silva (2010, p. 15) faz os

seguintes questionamentos: 1) Qual saber deve ser ensinado? 2) Qual conhecimento ou

saber é considerado válido ou essencial para ser inserido no currículo? 3) Qual é o tipo

de ser humano desejável para um determinado tipo de sociedade? O currículo é

entendido pelo autor como uma questão de identidade, ele nos torna o que somos,

Nas discussões cotidianas, quando pensamos em currículo pensamos apenas

em conhecimento, esquecendo-nos de que o conhecimento que constitui o

currículo está inextricavelmente, centralmente, vitalmente, envolvido naquilo

que somos, naquilo que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa

subjetividade. Talvez possamos dizer que, além de uma questão de

conhecimento, o currículo é também uma questão de identidade (SILVA,

2010, p. 15-6).

22 Fonte: Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em http://educacaointegral.org.br/linha-

do-tempo. Acesso em: 05/08/2016.

52

Silva (2010, p. 11, 16) nos mostra qual teoria do currículo teria se tornado uma

realidade, esta seria um “processo de racionalização de resultados educacionais,

cuidadosamente especificados e medidos”, um processo semelhante ao das fábricas, a

Teoria Tradicional do Currículo23. O autor coloca ainda a decisão sobre o conteúdo

curricular como uma questão de poder. O objetivo dos programas e experiências da

Educação Integral, pode ser visto como um esforço para romper com esse padrão fabril

da Educação, o que resultaria na construção de uma nova identidade dos brasileiros e

assim do Brasil, uma possibilidade de formar integralmente os indivíduos para o

exercício da cidadania, diminuindo as desigualdades de entendimento e acesso aos

direitos que a compõe, fortalecendo assim a democracia.

O eixo Currículo encontra o eixo Descentralização a partir do pensamento de

Anísio Teixeira, uma das justificativas para a Descentralização (Municipalização)

estava “na possibilidade do currículo escolar refletir a cultura local” (AZANHA, 1991,

p. 62). Anísio ainda enfrenta o poder central, enfatizando que

Superada a fantasia legislativa dos sistemas escolares uniformes, ideados

pelos caprichos intelectuais do legislador, não iremos conservar e muito

menos repetir esses monstruosos códigos de educação, mas, fixar na lei

apenas os objetivos amplos e claros da escola e dar-lhe recursos para que ela

se crie ou se reajuste e cresça e se aperfeiçoe dentro das condições ambientes,

autônoma e responsável, procurando, apesar da diversidade de programas e

de condições, certa equivalência de resultados dentro dos objetivos comuns

(TEIXEIRA, 1977, p. 74).

Azanha (1991, p. 62) aponta para uma possível visão romântica de Anísio,

quanto à Municipalização da Educação, pois não teria levado em conta o jogo político

que coordena a política educacional brasileira e ainda salienta que

o tema da municipalização do ensino é também um componente de um

pathos participativo. Após duas décadas de uma ordenação legal autoritária

da vida nacional, há uma ânsia participativa em torno da qual tem se

congregado todas as camadas da população. Hoje, há até um mito da

participação como se apenas as iniciativas que dela decorressem fossem

válidas e aceitáveis [...] Todos sabemos que as coisas não são bem assim

(AZANHA, 1991, p. 62).

E de fato não foram bem assim. Desde o Centro Popular de Educação Carneiro

Ribeiro (BA), passando pelos Centros Integrados de Educação Pública (RJ) e a Escola

Integrada de Belo Horizonte (MG), estas experiências, de âmbito local, foram

23 Teoria desenvolvida pelo professor estadunidense Franklin John Bobbitt no livro The curriculum,

publicado em 1918.

53

descontinuadas ou perderam seus objetivos iniciais. Se a decisão de conteúdos

curriculares definem a identidade de uma população, o não acolhimento de uma nova

proposta curricular denota uma identidade da Educação e portanto, do nosso país, como

algo cristalizado, com profundas raízes políticas e culturais. Se o estreitamento do

vínculo entre município e escola fortalece o valores locais, pois estes são mais próximos

da população e assim, são concretos, a não municipalização representa que os valores

são os Centrais, os do Governo Federal, e estes são distantes da população, portanto

seriam abstratos, provavelmente abstratos entre si, Município e Governo Federal.

54

2. Componentes da Análise e Gestão de Políticas Públicas

2.1 Sistema Federativo Brasileiro: impactos na adesão e implementação de

políticas públicas

Celina Souza (2005, p. 106) apresenta o Federalismo brasileiro como sinônimo

de Descentralização, no qual, o seu fato gerador é ao mesmo tempo um de seus maiores

problemas: as diferenças econômicas entre as regiões brasileiras, o que resulta na

dificuldade dos governos em redirecionar o rumo de certas políticas públicas de acordo

com suas questões macroeconômicas, não previstas pelos constituintes de 1988. Para a

autora, este fato é um problema marcado pela “distância entre os dispositivos

constitucionais e as circunstâncias políticas e econômicas, com as últimas prevalecendo

sobre os mandamentos constitucionais”.

Haveria, segundo Souza (2005, p. 113), duas visões sobre o peso do poder para

os entes da Federação. A primeira, dos juristas, defende que a divisão de poder favorece

o governo federal, pois este é o responsável pela definição de políticas, é o detentor e

distribuidor dos recursos financeiros e ainda tem o “excessivo” poder de legislar. A

segunda visão, de analistas de políticas públicas, defende que a divisão de poder

favorece ao governo local, “que vem expandindo sua autonomia ao longo da história”.

A autora não compartilha desta visão, pois não há fundamentação na teoria do

federalismo, nesta teoria não há o ente Município, como é caso do Brasil, a teoria do

federalismo considera apenas as esferas federal e estadual de governo. Neste sentido, o

federalismo brasileiro, deve ser compreendido como “descentralização de relações

intergovernamentais”, para a autora, essa compreensão é de “crucial importância para o

melhor entendimento de como o federalismo atua na prática”.

O tipo de federalismo brasileiro, que atribui ao Munícipio o status de ente

federativo, sugere um tipo de federalismo cooperativo, no entanto essa dinâmica não se

realizaria, “as relações intergovernamentais são altamente competitivas, tanto vertical

como horizontalmente, e marcadas pelo conflito” permanente, pois não haveria “canais

institucionais de intermediação de interesses e de negociação”, como resultado desse

conflito, é instalada uma tensão entre os entes da federação, na qual o governo federal

não encontra um ambiente favorável para reduzir as desigualdades regionais através da

implementação de políticas públicas (SOUZA, 2005, p. 114, 118)

55

Por fim, na análise de Celina Souza (2005), o federalismo brasileiro está diante

dos seguintes problemas:

A federação está assentada em alto grau de desigualdade entre as regiões, a

despeito das medidas constitucionais que buscam diminuí-la; e a escassa

existência de mecanismos de coordenação e cooperação intergovernamentais,

tanto vertical como horizontal, coibindo a criação de canais de negociação que

diminuam a competição entre os entes federados (SOUZA, 2005, p. 118-9).

Para a autora, a solução para esses problemas não é matéria a ser solucionada

pelo desenho constitucional ou institucional, a solução estaria no âmbito das políticas

públicas, estas seriam capazes de mediar conflitos políticos mais amplos, em especial o

das desigualdades regionais, através da “redefinição de prioridades governamentais”

(SOUZA, 2005, p. 119).

Os Estados e Municípios brasileiros são politicamente autônomos, sendo assim,

as políticas desenhadas pela esfera federal necessitam primeiramente, além de um

desenho palatável, de uma estratégia de indução que seja suficientemente atrativa para

que os demais entes sintam-se motivamos à adesão. Após a adesão é apresentado um

segundo problema, no caso do Brasil, representado pelas desigualdades estruturais

presentes no universo de vinte e seis estados e mais de cinco mil e quinhentos

municípios. Para Marta Arretche (1999, p. 112), as desigualdade estruturais podem ser

equilibradas pelos seguintes elementos: 1) legado das políticas prévias; 2) regras

constitucionais; 3) engenharia operacional; e 4) estratégia para estimular a adesão. No

caso do PME, esses elementos demonstram alguma fragilidade, pois não foi

identificado: 1) legado federal de sucesso relacionado à Escola de Tempo Integral, 2) as

regras institucionais existem, mas ainda parecem estar presentes no campo da ideia, 3) a

engenharia operacional considerou apenas os âmbitos dos recursos financeiros

necessários e elaboração de materiais orientadores para a sua implementação; e 4) a

estratégia de indução fundamentou-se apenas nos pré-requisitos necessários para

adesão, pautados por medidores de avaliação dos alunos e suas condições de

vulnerabilidade. Este último elemento, do ponto de vista desta pesquisadora, não é o

suficiente para a adesão ao Programa, no que diz respeito à ideia de Educação Integral,

desenvolvida e executada por Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, que, segundo o

Ministério da Educação, deu os fundamentos para o desenho do Programa Mais

Educação.

56

Outro problema para a adesão às Políticas Públicas formuladas pela esfera

federal, é a competição partidária em estados federados (ARRETCHE, 1999, p. 115).

Este problema é facilmente identificado no Estado e na Cidade de São Paulo. O

Programa Mais Educação, formulado em 2007 pelo governo federal, na gestão do

Partido dos Trabalhadores (PT), teve adesão do Estado de São Paulo, governado pelo

Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) desde 1995, ao PME apenas em 2014.

Já o município de São Paulo, aderiu ao PME no primeiro ano de governo, na gestão do

PT. Arretche (1999, p. 115) ainda chama a atenção para os conflitos

intergovernamentais como resultado da competição partidária, que geram “barganhas

federativas” nas quais “cada nível de governo pretende transferir a uma outra

administração a maior parte dos custos políticos e financeiros da gestão das políticas e

reservar para si a maior parte dos benefícios dela derivados”.

Diante dos fatores apresentados, podemos questionar quais seriam as variáveis

quer resultariam em maior ou menor grau de adesão às políticas desenhadas pelo

governo federal. De acordo com Arretche, são as variáveis de natureza estrutural e

institucional que determinam a descentralização e adesão às políticas, “na medida em

que são elementos da tomada de decisão pela qual uma dada administração virá a

assumir (ou não) a gestão de uma política qualquer” (ARRETCHE, 1999, p. 133). Em

se tratando do PME e o respectivo atendimento à burocracia necessária para a sua

adesão, somado às desigualdades dos municípios, no que se refere aos recursos

humanos e estruturais, e ainda ao histórico de descontinuidade de políticas de Educação

Integral e a definição do papel da instituição escolar, é possível perceber o quanto a

adesão e consequente implementação desse programa se tornam difíceis.

O fato do Brasil ser formado por “uma esmagadora maioria de municípios

fracos, com pequeno porte populacional, densidade econômica pouca expressiva e

significativa”, os governos estaduais seriam os atores principais na condução das

adesões de seus municípios aos programas federais (ARRETCHE, 1999, p. 133), aqui o

conflito de competição partidária se faz presente, no exemplo do Estado de São Paulo

relacionado com o Programa Mais Educação. A importância do protagonismo do

governo estadual é apresentado por Arretche nos estados do Ceará e Paraná, estes, para

que

57

alcançassem os mais elevados graus de descentralização da amostra, foi

decisivo que seus sucessivos governos estaduais tenham instituído políticas

ativas e continuadas de capacitação municipal e de transferência formal de

atribuições de gestão a seus municípios. Esta ação do executivo estadual foi

mais decisiva para as taxas de municipalização do que o fato de que, no

Estado do Ceará, apenas 11% de seus municípios tenham mais de 50 mil

habitantes e que apenas esta classe de municípios nos estados do Nordeste

disponha de uma receita própria média superior a R$ 10 per capita, ou ainda

que, no caso do Estado do Paraná, apenas 8% de seus municípios tenham

população superior a 50 mil habitantes e uma receita própria média superior a

R$ 53,20. (ARRETCHE, p. 1999, p. 134)

Quanto à implementação de Política Públicas, o tipo de federalismo brasileiro,

descentralização ou federalismo cooperativo, segundo Kleinke (et al., 2010, p. 3),

privilegiaria os governos locais como mais eficientes que o governo central para

prestação de serviços à população, em razão de sua proximidade com os usuários. Esta

ideia dialoga com o pensamento da municipalização da Educação, por exemplo, a

questão a destacar é que essa ideia não se realiza plenamente, pois há um plano de ação

já definido pelo governo central que não encontra condições para sua execução, nas

diversas localidades do país. O desenho da política, assim como os recursos financeiros

disponíveis não são suficientes para que sua implementação corresponda aos resultados

esperados quando de sua formulação, pois cada localidade tem infraestruturas diversas.

De acordo com Kleinke (et al., 2010)

a decisão de descentralizar poderes favoreceu a consolidação da democracia

pela emergência de novos atores e centros de poder, mas não excluiu a

necessária regulação do governo federal para assegurar a efetividade da

implementação e execução da prestação dos serviços à população (KLEINKE

et al., 2010, p. 4).

Sendo assim, a descentralização encontra consideráveis barreiras para sua

efetivação e como consequência, a autonomia do poder parece ainda estar mais próxima

do governo central, no que diz respeito à formulação das políticas, no entanto, a

implementação e o grau de resultados esperado pelo desenho original, está nas mãos dos

governos regionais. No caso da Educação, o problema da centralização, no que se refere

ao desenho das políticas, já era anunciado por Anísio Teixeira nos anos 1950, para ele,

uma dos maiores problemas estava na substituição do pensar a Educação, pelo

cumprimento de instruções,

até o estudo das questões do ensino está a desaparecer. Ninguém se sente

estimulado para isso, porque a centralização determina se transformem todos

os educadores estaduais em simples cumpridores de instruções, de ordens

recebidas. Perdido o incentivo, perdida a liberdade, pois centralização é,

sobretudo, uma tirania, o homem perde as suas qualidades e se faz autômato.

58

E não só no ensino, mas, em todos os demais setores da técnica e do saber, o

monstruoso centralismo brasileiro está a destruir muitas possibilidades de

progresso, de diversificação e de florescimento brasileiro. Somos todo um

povo a cumprir regulamentos, instruções e ordens emanadas de um poder

central, distante e remoto, como o da metrópole, ao tempo da colônia. A

descentralização, a autonomia estadual, a autonomia municipal ora em

debate, relativamente ao problema da educação, constituem problemas

essenciais da democracia e da implantação definitiva do regime federativo no

país (TEIXEIRA, 1977, p. 170).

Os problemas apresentados: 1) distância entre os dispositivos constitucionais e

as circunstâncias políticas e econômicas; 2) desigualdade estruturais; 3) legado de

políticas prévias; 4) engenharia operacional de cada política; 5) estratégia de estimulo à

adesão; 5) competição partidária; e 6) protagonismo dos governos estaduais; poderiam

ser acolhidos como causas do descompasso entre formulação e implementação de

Políticas Públicas federais.

2.2 A Fase de Implementação

Tendo como base o método Ciclo da Política Pública, a fase da Formulação é

aquela que antecede a fase de Implementação. Por Formulação, entende-se um processo

através do qual os governos traduzem seus propósitos em programas e ações, que

produzirão resultados ou mudanças desejadas no mundo real (SOUZA, 2006, p. 26).

Quanto à fase de Implementação, é recente a atenção que ela tem recebido dos analistas

de políticas públicas, pois a ideia do resultado de uma política estava ligada diretamente

ao seu desenho (formulação). O momento da Implementação começa a ganhar destaque

quando é percebido que um bom desenho, somado a recursos financeiros disponíveis e

apoios político e social, não necessariamente atingem os efeitos objetivados quando da

formulação da política. Deste modo, a fase de Implementação “passou a ser considerada

como um momento da política pública que possui estrutura e dinâmica próprias, exigindo

um campo específico de análise”. Esta fase da política tem sido tratada como um

problema reforçado pela ideia de que “o sucesso da política seria resultante da perfeição

de seu desenho, mas seu fracasso seria derivado da forma como ela foi executada”

(LIMA; D’ASCENZI, 2014, p. 51-2).

Baptista e Rezende (2011, p. 149-52) nos mostram que, de maneira geral, a fase

de Implementação é definida como o momento de colocar uma determinada solução em

prática, é a fase da administração da política e envolve os sistemas gerencial, decisório,

logístico, operacional e de informação. As autoras nos apresentam dois pontos de vista

59

teóricos para a análise desta fase. O primeiro deles é o chamado top-down, aqui haveria

uma organização central que assumiria o controle dos fatores políticos, organizacionais

e técnicos, nesta visão há uma divisão de responsabilidades, entendida como uma

divisão do trabalho, em que de um lado, estão aqueles do nível central de poder e de

outro, aqueles que colocarão a política em prática procurando atender às diretrizes e

regras daqueles que a elaboraram.

O segundo ponto de vista é o chamado bottom-up, aqui a implementação da

Política Pública não parte da administração, mas sim da sua execução, sendo esta

analisada através das redes de decisões e de seus respectivos atores, sem considerar as

estruturas pré-existentes, segundo a análise bottom-up, o processo de elaboração da

Política Pública é controlado de maneira imperfeita e esta imperfeição é percebida no

momento da Implementação, pois é apenas nesta fase que se vivencia as relações entre a

teoria (fase de Formulação) e os contextos e atores responsáveis por sua execução (fase

de Implementação), seria aqui que teríamos contato com universo concreto da política.

Os pontos de vista apresentados, apontam para a síntese da fase de

Implementação: “um jogo em que uma autoridade central procura induzir agentes

implementadores a colocar em prática objetivos e estratégias que lhe são estranhas”,

este jogo pode ter como resultado a aceitação, neutralidade ou rejeição da Política

Pública e este resultado é permeado pelo entrosamento entre formuladores e

implementadores, pela compreensão da política, pelo conhecimento de cada fase do

processo e pela quantidade de mudanças envolvidas. De acordo com as autoras, este

último aspecto representa o mais crítico dentro da fase de Implementação, pois é ele que

“determina os graus de consenso ou conflito em torno das metas e objetivos de uma

política, e quanto maior a mudança, menor o consenso” (BAPTISTA e REZENDE,

2011, p. 151).

Para Lima e D’Ascenzi (2014, p. 52) a implementação de uma política pública

“inevitavelmente diferirá das intenções daqueles que a formularam”, pois haveria um

distanciamento entre as experiências e vivências dos atores formuladores e

implementadores, e o agravante seria que ainda hoje a política tem sido “observada a

partir do plano que lhe deu origem”, isto por parte do Estado. Os autores ainda apontam

duas definições possíveis para os problemas da fase de implementação: 1) “a natureza

do problema é administrativo-organizacional, e sua resolução depende da especificação

de objetivos e do controle dos subordinados”; e 2) “o problema da implementação

60

decorre de conflito de interesses, e a preocupação é com a obtenção de cooperação dos

participantes do processo”. Baptista e Rezende (2011, p. 151-2) apontam para a

“complexidade de elementos que convergem na fase de Implementação”, tornando-a um

momento crucial no Ciclo da Política e como consequência a “necessidade de se buscar

entender o processo político de forma mais dinâmica e interativa”, pois se de um lado há

grandes consensos na fase de Formulação, de outro, na fase de Implementação temos as

reais potencialidades da Política Pública, há contato com os atores que a apoiam, com o

que cada um dos grupos disputa e com os seus interesses. Por fim, Rodrigues (2011, p.

53) orienta que para a análise desta fase seria necessário levar em consideração as

condições que permeiam tanto a formulação quanto a implementação das políticas,

principalmente as políticas públicas sociais, tais como condições institucionais,

históricas, culturais e sociais.

2.3 Variáveis determinadas e estruturas político-sociais determinantes

O processo de uma Política Pública, seu início, meio e fim, é impactado por um

considerável conjunto de variáveis, que vai desde as condições necessárias para que

determinada demanda entre na Agenda Decisória, com o objetivo de ser atendida, até a

Implementação de fato. Nesse processo, a Gestão da Política Pública, de maneira geral,

investe esforços para gerir (COSTA, 2013):

1. Mudanças Estruturais necessárias;

2. Plano de Ação, no qual estão inseridos a medição de:

a. apoio político;

b. disponibilidade de governo;

c. custos;

d. prazos;

e. tempo político e administrativo; e

f. fontes de financiamento.

3. Atores Envolvidos e seus interesses;

4. Riscos, no qual são analisados:

a. se o orçamento contempla;

b. se o tempo é viável;

c. se existem problemas de meio ambiente ou social; e

61

d. se existe risco de sofrer ataques e desgaste político.

5. Balanço da Política, no qual são previstos:

a. a possibilidade de alcance dos resultados esperados;

b. os responsáveis pela implementação da política;

c. capacidade da equipe implementadora;

d. necessidade de redesenho (plano B); e

e. relação entre resultados previstos e riscos/custos da política.

Esta breve descrição das etapas da Gestão, demonstra a complexidade do

processo pelo qual passa uma Política Pública. As variáveis apresentadas são,

relativamente, controláveis e na pior das hipóteses, a equipe formuladora da política

pode chegar à conclusão de que a proposta não é viável, como resultado, a política pode

ser redesenhada, ou ainda, pode-se aguardar o alinhamento das variáveis problemáticas

para que a política seja implementada futuramente. No entanto, uma vez decidido que a

política possui os elementos necessários para sua implementação, serão somados ao seu

processo as especificidades da fase de Implementação e o tipo de Sistema Federativo

brasileiro, que dialogam entre si. Estes dois fatores possuem baixa capacidade de

controle, pois contém elementos estruturantes e estruturados, seja na capacidade dos

atores evolvidos até os recursos materiais existentes. Tal problemática – variáveis da

gestão mais os elementos estruturantes e estruturados – é potencializada pelo tipo da

Gramática Política do Brasil (NUNES, 2003) e pelo tipo da cidadania brasileira,

entendida por Santos (1994) como Cidadania Regulada, ambos também com baixa

capacidade de controle, senão, nenhuma. Esses dois estudos, o primeiro publicado em

1997 e o segundo em 1979 (com segunda edição revisada em 1994) tiveram como ponto

de partida, o período Getúlio Vargas e seus antecedentes. Passados mais de oitenta anos

do período Getúlio Vargas, marcados por uma segunda ditadura e duas

redemocratizações, os elementos trazidos por Nunes e Santos parecem ainda ativos, essa

atividade é concretizada na aprovação do impeachment da presidenta Dilma Rousseff,

em agosto/2016. A mudança na condução do governo, além de impactar diretamente e

principalmente as políticas sociais desenhadas e implementadas no governo anterior,

reforçam as ideias dos autores citados.

Em Cidadania e Justiça: a política social na ordem brasileira, obra que trata da

cidadania regulada, Santos (1994) alerta no prefácio da segunda edição:

62

Seria, talvez, o caso de acrescentar um capítulo sobre a evolução política

social no contexto da transição [democrática]. O compromisso do atual

governo com o resgate da dívida social brasileira é tema frequente nos

documentos oficiais. E, sem dúvida, medidas importantes têm sido

anunciadas [...]. Entretanto, recomenda a prudência que se aguarde algum

tempo para aferir até que ponto as forças conservadoras do país conseguiram

frear o processo de modernização social e até que ponto conseguiu-se romper

a estrutura presidida pela concepção de uma cidadania regulada (SANTOS,

1994, p. 7)

A prudência recomendou de maneira assertiva. O conceito de cidadania de

Marshall (1967), como um conjunto de direitos (civis, políticos e sociais), não se

aproximaria do conceito experienciado no caso brasileiro. A cidadania brasileira,

pensada por Santos, é aquela que regula, aquela que subordina, pacifica ou estimula, e

está assentada na ideia de acumulação, isto significa dizer que os estímulos para o

desenho das primeiras políticas sociais não estavam relacionados à “expansão dos

valores inerentes ao conceito de membro da comunidade”, mas sim à “regulamentação

de novas profissões e/ou ocupações, mediante a ampliação do escopo dos direitos

associados a estas profissões”, como resultado desta visão de política social, os cidadãos

são divididos em duas categorias: 1) cidadão por direito, mediante sua ocupação

prevista em lei; e 2) “pré-cidadão, aquele cuja ocupação a lei desconhece” (SANTOS,

1994, p. 68). Neste sentido é possível pontuar duas questões preliminares: 1º

nascimento da cidadania brasileira como um direito reservado apenas aos trabalhadores

reconhecidos por lei; e 2º estratificação dos indivíduos, entre cidadãos de primeira e

segunda categoria, e portanto com direitos sociais seguindo a mesma ordem de

classificação. Esse tipo de ordenamento social é reconsiderado por Santos (1994) nas

últimas linhas de seu livro, quando analisa o pós ditadura militar de 1964:

O início de novos programas, em anos recentes, revelou a impossibilidade de

replicar o modelo de cidadania regulada [...]. É bem possível que, ao

despertar o país do longo período de recesso cívico, seja, também, impossível

repetir o modelo anterior de participação limitada e de cidadania estratificada.

A desorganização da vida social que se seguiu ao movimento de 1964 poderá

ter gerado, apesar de seus líderes, as condições para a emergência de um

sistema de valores centrados em torno dos conceitos de cidadania universal,

trabalho e justiça (SANTOS, 1994, p. 88)

O previsto por Santos (1994) teve alguma concretização, como por exemplo, a

implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), aqui, não apenas os trabalhadores,

reconhecidos por lei, tinham acesso à saúde pública, mas sim todos os cidadãos, a partir

de 1988, com a nova Constituição Federal. No entanto, o mesmo autor chama a atenção

para a fragilidade das políticas sociais quando relacionadas às mudanças na composição

63

da elite política, aquelas que monopolizam as instituições de poder, tal elite é produzida

“pelas próprias instituições, sejam as instituições econômicas, sejam as burocrático-

administrativas, públicas e privadas, sejam as políticas” (MICHELS apud SANTOS,

1994, p. 53) e estabelecem-se como ator com forte capacidade de governo para a

decisão e estabilidade das políticas públicas (SANTOS, 1994, p. 54).

A mudança na composição da elite política ocorrida em 2016, por ocasião do

impeachment da presidenta Dilma Rousseff, confirma a fragilidade das políticas sociais

apontada por Santos, em especial com a extinção do objeto de estudo desta dissertação.

A ideia de cidadania regulada marca alguma presença, no que diz respeito às suas

raízes, no exemplo da proposta de política educacional da atual gestão federal,

conduzida pelo presidente Michel Temer, do Partido do Movimento Democrático do

Brasil (PMDB), partido tradicional da elite política brasileira. Esta proposta, intitulada,

Reforma do Ensino Médio propõe inicialmente a flexibilização do currículo e a

ampliação da jornada escolar, a primeira retira do currículo, ou não obriga, as

disciplinas da área de humanas (filosofia, sociologia, geografia e história) e oferece

disciplinas relacionadas ao mercado de trabalho, através de cursos técnicos. A questão

curricular sugere a (re)centralização ou a (re)significação de políticas sociais

relacionadas ao mercado de trabalho, já a questão da ampliação da jornada escolar

apresenta-se como inviável, pois a maiorias das escolas têm seus três turnos ocupados,

não há infraestrutura que comporte essa proposta. Se é inviável, por que foi proposta?

A essa questão, tomo como exemplo a condução da política educacional do

Estado de São Paulo, também governado por uma elite política tradicional, na figura do

governador Geraldo Alckmin do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB),

partido este formado por dissidentes do PMDB. No estado de São Paulo, a proposta é a

Reorganização Escolar, e é significada pelo Movimento dos Estudantes Secundaristas e

por demais críticos à proposta, como a Privatização do Ensino. A Reorganização

Escolar também prevê a ampliação da jornada escolar, porém não há infraestrutura

necessária conforme apontado no caso federal, portanto essa proposta também é

inviável. Aqui é possível responder o porquê de tal proposta sendo ela inviável, isto de

acordo com os estudos realizados pelo Movimento dos Estudantes Secundaristas. De

acordo com o Movimento, o modelo sugerido pelo governo estadual tem suas bases no

modelo Norte Americano de escolas de tempo integral, no qual as escolas são

administradas por empresas privadas, sendo que no contraturno escolar são oferecidas

64

atividades extracurriculares ministradas também por empresas privadas ou

Organizações Não Governamentais (ONGs). Grosso modo, “as escolas são financiadas

com recursos públicos, mas geridas por empresas e mais ‘livres’ de restrições legais do

que as escolas regulares” (ESCOLA SEM EMPRESA, 2016, p. 4). O que temos aqui é

o encontro das elites descritas por Santos (1994), aquelas com capacidade para a decisão

e estabilidade das políticas públicas.

Luiz Carlos Bresser Pereira, em 1996, no prefácio da obra A Gramática Política

do Brasil: clientelismo e insulamento burocrático, de Edson Nunes (2003) também

demonstra algum otimismo, tal qual Wanderley Guilherme dos Santos (1994), nas

últimas linhas de seu livro. Para Bresser

No plano político, por sua vez, ocorre um grande avanço democrático. O

clientelismo continua presente nos partidos políticos, mas a crítica da

sociedade a esse tipo de comportamento é cada vez mais forte, abrindo

espaço para o aparecimento de políticos modernos, situados tanto na

esquerda quanto na direita do espectro político-ideológico. [...] As

instituições integradoras e coordenadoras hoje relevantes, entretanto, não são

mais as mesmas (NUNES, 2003, p. 14).

Bresser não se apoia na experiência conselheira da prudência, assim como o fez

Santos (1994), mas sinaliza que “a definição de quais sejam elas [as instituições] nos

anos 90 e como se inter-relacionam é uma tarefa a ser realizada” (NUNES, 2003, p. 14).

As instituições às quais Bresser se refere são as descritas por Nunes como: 1)

Clientelismo; 2) Corporativismo; 3) Insulamento Burocrático; e 4) Universalismo de

Procedimentos. Essas instituições são problematizadas como “padrões

institucionalizados de relações ou ‘quatro gramáticas’ que estruturam os laços entre

sociedade e Estado no Brasil” (NUNES, 2003, p. 11). Para a compreensão da

complexidade que envolve tanto a gestão de Políticas Públicas, quanto a sua análise,

assim como o rumo tomado para a extinção do PME, como resultado da mudança na

condução do governo federal, chamo a atenção para as gramáticas Clientelismo e

Corporativismo como resistentes no desenvolvimento político do Brasil, impactando

diretamente as Políticas Sociais.

As duas gramáticas políticas escolhidas, seriam, na análise de Nunes (2003, p.

11-2, 18) os “instrumentos de legitimidade política”. O Clientelismo, presente em todas

as fases da política brasileira, com algumas adaptações de acordo com o momento

histórico, é entendido, grosso modo, como sendo uma relação de subordinação, na qual

os valores estão assentados em critérios pessoais e não-universalistas, o processo de

65

troca depende de relações anteriores entre as partes envolvidas e prevê expectativas

futuras, esse tipo de troca é “transferida para associações, instituições políticas, agências

públicas, partidos políticos”, cristalizando nestas esferas o caráter personalista das ações

(NUNES, 2003, p. 27-9). Já o Corporativismo, formalizado por leis, foi uma tentativa

de enfrentar a “natureza informal do clientelismo”, no entanto suas leis “preocupam-se

com incorporação e controle, não com justo e igual tratamento de todos os indivíduos” e

ainda é um mecanismo que absorveria antecipadamente conflitos políticos através da

incorporação e da organização do trabalho (NUNES, 2003, p. 36). O ponto de

convergência entre Clientelismo e Corporativismo é que este também opera como uma

“arma de engenharia política para o controle político, a intermediação de interesses e

controle do fluxo de recursos materiais disponíveis”. Por fim e para objeto deste

trabalho, o Corporativismo se constitui também como um “sistema de formulação de

políticas” (NUNES, 2003, p. 37).

Para o desenvolvimento desta dissertação não foram descritos de maneira densa

as duas gramáticas escolhidas, bem como o conceito de cidadania regulada, a função de

suas anotações e breves apresentações é chamar a atenção para o caminho sinuoso pelo

qual percorre uma Política Pública, desde seu nascimento, passando pela fase adulta, até

sua morte. Sendo que o acompanhamento de sua vida, com seus altos e baixos

desempenhos, podem ser controlados, ou no limite, monitorados, através das variáveis

de caráter mais técnicos, presentes na área da Gestão da Política Pública, no entanto os

fatores estruturais e estruturantes, mais localizados no universo da subjetividade, são

determinantes para a orientação das ações governamentais. O episódio do impeachment

alterou significativamente a condução do governo e em seu bojo, alterou-se também o

entendimento das políticas sociais, sua função, seu custo, seu valor social e até mesmo

seu papel como mediadoras de conflitos. Essa alteração não tem por base um estudo

técnico, pautado, por exemplo, em Viabilidade do Projeto, termo característico da área

de Gestão de Políticas Públicas, um estudo de tal magnitude – isto levando em

consideração as dimensões continentais de nosso país – não é realizado em pouco mais

de três meses (período entre a abertura do processo de impeachment e a extinção do

PME), essa alteração, em caráter de urgência, pode ter suas fundamentações na ideia de

cidadania regulada, assim como nas estruturas clientelistas e corporativistas.

* * *

66

O que fica deste capítulo é a sensação de um eterno ciclo político composto

pelos mesmos elementos e orquestrados por uma mesma elite de poder. Neste ciclo

haveria pequenos períodos de avanço, no sentido do fortalecimento da democracia

brasileira, assim como na aquisição e exercício de direitos. Ainda neste ciclo, a

formulação, implementação e descontinuidade de políticas, especialmente as sociais,

são condicionadas mais pelos interesses e respectivas significações do propósito

governamental das elites tradicionais de poder, que pelas demandas sociais de fato.

Neste sentido, população e agentes implementadores de políticas públicas, tomam a

posição dos atores mais frágeis e portanto mais impactados pela vontade e humor das

instituições brasileiras.

No caso da Educação, especificamente a Educação das crianças e o papel do

professor, o histórico brasileiro nacional apresenta uma sucessão de conflitos,

irresponsabilidades e equívocos para a construção de uma agenda educacional eficaz e

efetiva, colocando em risco contínuo a construção de uma cidadania universal e ainda, e

não menos relevante, o desperdício de recursos de tempo, humanos, financeiros e até

emocionais de todos os atores envolvidos, desde o formulador até o beneficiário. Como

exemplo, temos o Programa Mais Educação (PME), que procurou resgatar os

princípios de educação democrática idealizados e executados, regionalmente, por Anísio

Teixeira e Darcy Ribeiro, nos anos 1950 e 1980. O PME, criado em 2007,

regulamentado em 2010, com diretrizes operacionais disponibilizadas entre 2011 e

2012, envolveu os Ministérios da Educação, do Desenvolvimento Social e Combate à

Fome, da Ciência e Tecnologia, do Esporte, do Meio Ambiente, da Cultura, da Defesa e

a Controladoria Geral da União e, ainda que de maneira imperfeita, investiu em

materiais de apoio, sistemas de informática, disponibilizou e distribui recursos

financeiros. Esta política foi extinta em 2016, seis anos após a sua regulamentação,

período inviável para qualquer tipo de avaliação no setor educacional, é esta política,

objeto desta dissertação, que é apresentada no próximo capítulo.

67

3. O Programa Mais Educação - PME

As esferas federal, estadual e municipal, possuem uma relativa autonomia para a

organização dos sistemas de ensino, se levarmos em consideração as áreas de sua

jurisdição, de todo modo, essas esferas procuram operar de forma cooperativa, tanto na

oferta, quanto no financiamento da Educação, ou seja, “autonomia, colaboração e

cooperação na educação, são expressões setoriais da organização política federativa do

país” (FARENZENA; LUCE, 2014, p. 202). Neste sentido, Farenzena e Luce (2014, p.

212-3) entendem que as políticas para a educação básica, propostas pela União, não

podem ser consideradas como políticas federais, mas sim, como políticas

intergovernamentais, e este fato seria colocado como um desafio para a educação básica

brasileira, pois embora exista uma autonomia relativa das esferas citadas, elas devem

obedecer às regulamentações da ordem nacional, que subordinam o sistema educacional

como um todo. Sendo assim, os componentes do desafio apontados pelas autoras

estariam no universo conceitual e de articulação política “que precisa corresponder à

complexidade do tecido social, dos interesses conflitantes de diversos atores e de suas

di(con)fusas linguagens/mensagens de participação”.

O Programa Mais Educação, uma ação indutora do Governo Federal para a

implementação do Ensino de Tempo Integral (ETI) em todo o território nacional,

apresenta um desenho sofisticado que dificilmente dialoga com toda a diversidade das

regiões brasileiras, no que diz respeito à tecnologia disponível, recursos humanos e

infraestrutura. Madeira (2014, p. 7-11) mostra que implementações de políticas sociais,

entre elas as educacionais, a partir dos anos 1990, geraram fortes expectativas em seus

usuários e em seus principais atores políticos, uma vez que o debate para a formulação

de tais políticas se deu em meio ao processo constituinte de 1988, como uma resposta

aos “altos níveis de pobreza e desigualdade que recortavam o país”, estas políticas se

colocavam “no centro dos debates sobre a agenda de desenvolvimento”. Ocorre que

dada a dimensão do Brasil e a consequente diversidade cultural e socioeconômica das

regiões brasileiras, os processos de implementação representaram desafios para os

municípios mais pobres, que além de sua condição financeira, também deveriam

responder aos novos critérios de gestão e governança. A autora observa que na

implementação de políticas educacionais há consideráveis diferenças em relação à

qualidade dos serviços prestados pelo setor público, para exemplificar tínhamos em

68

2013, nos estados do Norte do país, 60% dos professores com ensino superior, já nos

estados das regiões Sudeste e do Sul, os professores com ensino superior representavam

83% do corpo docente. Neste sentido “é de se esperar que níveis diferenciados na

formação dos professores venham a impactar na qualidade da prestação de serviços

educacionais”.

3.1 Antecedentes do Programa

A literatura que trata da Análise de Políticas Públicas divide a política, para

efeito de categorização, em três dimensões: 1) Polity: dimensão institucional – “se

refere à ordem do sistema político, delineada pelo sistema jurídico, e à estrutura

institucional do sistema político-administrativo”; 2) Politics: dimensão processual –

considera o processo político, “frequentemente de caráter conflituoso, quanto à

imposição de objetivos, aos conteúdos e às decisões de distribuição”; e 3) Policy:

dimensão material – conteúdos concretos da política, “configuração dos programas

políticos, problemas técnicos e conteúdo material das decisões políticas”. Estas três

dimensões influenciam-se mutualmente durante todo o Ciclo da Política Pública24

(FREY, 2000, p. 216-7), assim como as fases do próprio Ciclo. De todo modo, com o

objetivo de mapearmos os estímulos que deram origem à formulação do PME e para

que o leitor tome contato com o processo desta política, o texto que segue é uma

tentativa de recuperar os seus antecedentes a partir das dimensões descritas acima.

24 Método para análise de Políticas Públicas, composto, de maneira geral, pelas fases: 1) Agenda; 2)

Formulação da política; 3) Implementação; e 5) Avaliação. “A ideia de ciclo da política talvez seja a perspectiva mais corrente e compartilhada nos estudos atuais de política, com grande parte dos estudos fazendo uma análise por momentos ou fases do processo político. Apesar das críticas ao modelo (caráter funcionalista, racional e que tenta manter o controle sobre o processo político), este persiste no debate acadêmico como referência. [...] Talvez a principal contribuição da ideia do ciclo da política seja a possibilidade de percepção de que existem diferentes momentos no processo de construção de uma política, apontando para a necessidade de se reconhecer as especificidades de cada um destes momentos, possibilitando maior conhecimento e intervenção sobre o processo político. Já as desvantagens estão por conta da inevitável fragmentação que a ideia de fases provoca em qualquer análise a ser empreendida. Por mais que haja um cuidado do analista em não isolar uma fase e seus efeitos, há sempre o risco de tratá-la de forma estanque. Além disto, a aplicação deste(s) modelo(s) carrega consigo o perigo de se imaginar que a política se comporta de forma previsível. Imagina que é possível fazer um estudo das políticas que seja neutro ou que abstraia totalmente das disputas e intenções dos analistas. Ou seja, há dificuldade de se discutir as implicações políticas na afirmação deste ou daquele modelo. No entanto, esta é uma questão que se apresenta para todo o campo de análise da política e não apenas para o uso específico deste modelo (BAPTISTA, T. W. F.; REZENDE, M. A ideia de ciclo na análise de políticas públicas. In MATTOS, R. A.; BAPTISTA, T. W. F. Caminhos para análise das políticas de saúde, 2011.)

69

3.1.1 As Dimensões da Política

O Programa Mais Educação encontra sua base legal na Constituição Federal;

no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 9089/1990); na Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/1996); no Plano Nacional de Educação (Lei

nº 10.172/2001); no Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério (Lei nº 11.494/2007); no Plano de

Desenvolvimento da Educação – PDE (2007); e no Plano de Metas Compromisso

Todos pela Educação (Decreto nº 6.094, de 24/04/2007).

A Constituição Federal, o principal conjunto de normas legais que orientam o

país, já tratava o cuidado da criança e do adolescente como uma questão de absoluta

prioridade, este cuidado, expresso em seu Capítulo VII – Da Família, da Criança, do

Adolescente, do Jovem e do Idoso – Art. 227, é composto pelos direitos à vida, à saúde,

à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao

respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1988). O

Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), que dispõe sobre a proteção integral à

criança e ao adolescente, reforça os artigos da Constituição Federal que tratam desta

população e ainda prevê assegurar “todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes

facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de

liberdade e de dignidade” (BRASIL, 1990). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação –

LDB (1996), começa a desenhar os objetivos da ampliação da jornada escolar, quando

afirma que “serão conjugados todos os esforços objetivando a progressão das redes

escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo

integral. O Plano Nacional de Educação - PNE, aprovado em 2001, é a regra que mais

oferece as características que compõe o Programa Mais Educação.

Aprovado em 24/04/2007, o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE,

oferece as condições instrumentais para o desenvolvimento das ações que atendam às

determinações do Plano Nacional de Educação. Os programas do PDE estão

organizados em quatro eixos norteadores: educação básica, educação superior, educação

profissional e alfabetização (BRASIL/MEC, 2007, p. 7, 15), no eixo Educação Básica, a

ampliação da jornada escolar é tratada no Plano de Metas Compromisso Todos pela

Educação (Decreto nº 6.094, de 24/04/2007), que representa um programa estratégico

do PDE. No mesmo dia 24/04/2007, é instituído o Programa Mais Educação, através da

70

Portaria Normativa Interministerial nº 17. Por fim, o Fundo Nacional de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - FUNDEB

(Lei nº 11.494/2007), o maior financiador do PME.

As legislações apresentadas podem ser consideradas como o resultado de

processos políticos protagonizados tanto pelo Estado, quanto pela sociedade civil. Tal

processo, “frequentemente de caráter conflituoso” (FREY, 2000, p. 216), pode ser

confirmado na leitura do histórico da Educação brasileira, cujo debate, assim como o

entendimento sobre os objetivos da escola pública, o seu papel e de seus atores, se

mantém como um constante ponto de pauta, presente nos principais episódios políticos

do país. No caso da Educação das crianças, o debate tem início nos anos 1920 e o

aparato legal desenvolvido, apresentado na dimensão institucional, também pode ser

considerado um resultado do processo que ganhou alguma organização a partir do

governo Getúlio Vargas, com a criação no Ministério da Educação e Saúde Pública.

Nos anos 1920, começa a nascer no Brasil dois movimentos educacionais

formados por intelectuais: “O entusiasmo pela educação25”, preocupado com a abertura

de mais unidades escolares, e o “Otimismo pedagógico26”, cujo foco eram os métodos e

conteúdos educacionais. Nesta época, pós Primeira Guerra Mundial, estes intelectuais

começaram a ter contato com literaturas educacionais estadunidenses, percebiam que a

República não havia se tornado algo de fato público e defendiam a ideia de

“republicanização da República”; no Brasil, o campo econômico começa a ser marcado

pelo desenvolvimento industrial, e consequente urbanização; e no campo educacional

tínhamos, em dados quantitativos, 75% da população analfabeta (GHIRALDELLI,

2009, p. 32-3). Estes quatro fatores: literaturas educacionais estadunidenses; a não

efetivação da República; o desenvolvimento industrial; e o alto índice de analfabetismo,

foram fatores que contribuíram para o desencadeamento dos referidos movimentos, no

qual o “Otimismo pedagógico” teve maior destaque por conta de ações concretas,

embora pontuais, em estados e municípios, quando da implementação de escolas de

tempo integral e que visavam o ensino integral, não apenas uma carga horária

expandida.

25 "Crença de que, pela multiplicação das instituições escolares, da disseminação da educação escolar,

será possível incorporar grandes camadas da população na senda do progresso nacional e o Brasil no caminho das grandes nações do mundo" (NAGLE, 1976, p. 100). 26 “Crença de que determinadas formulações doutrinárias sobre a escolarização indicam o caminho para a

verdadeira formação do novo homem brasileiro” (NAGLE, 1976, p. 100).

71

No Governo Provisório, a questão educacional começa a ser organizada, do

ponto de vista da esfera federal, a partir da criação do Ministério da Educação e Saúde

(1931), neste sentido, a Educação passou a ser tema de um programa definido e

integrado (MARCÍLIO, 2005, p. 144). No entanto, o primeiro nome a liderar a pasta da

Educação, Francisco Campos, embora fosse leitor de um dos principais intelectuais

estadunidenses adotados pelo movimento “Otimismo pedagógico”, John Dewey,

focalizou suas ações/reformas distantes das orientações deweyanas, preferindo investir

esforços nos arranjos políticos varguistas. No mesmo ano, a Associação Brasileira da

Educação – ABE organizou a IV Conferência Nacional de Educação, cujo tema

orientador foi “Grandes Diretrizes da educação popular”, estiveram presentes, além

dos intelectuais e educadores, o então presidente Getúlio Vargas e seu ministro

Francisco Campo, ambos provocaram a ABE para que respondessem à questão sobre o

“sentido pedagógico da Revolução”, referindo-se à Revolução de 1930. A resposta da

ABE ocorreu no ano seguinte, 1932, através do “Manifesto dos Pioneiros da Educação

Nova”, que “compunha uma autêntica e sistematizada concepção pedagógica, indo da

filosofia da educação até formulações pedagógico-didáticas, passando pela política

educacional”, ainda que sob influências de John Dewey e Émile Durkheim

(GHIRALDELLI, 2009, p. 40-2).

As questões conflituosas, características da dimensão Politics (processo

político), podem ser observadas quando da resposta do Governo Provisório às

manifestações dos Pioneiros da Educação Nova. A Associação Brasileira de Educação,

a partir de seus estudos, desenvolveu uma proposta para o capítulo da nova Constituição

sobre educação, na qual destacava a necessidade de se fugir das “divisões e lutas de

classes e de religião, para fundar, deste lado do Atlântico, uma nação livre [...] cujos

filhos tenham, todos, oportunidades proporcionais às suas capacidades”

(GHIRALDELLI, 2009, p. 72-3). A resposta do Governo Provisório ao trabalho

desenvolvido pela ABE foi uma “não resposta”. Os oito artigos elaborados pela ABE

foram reduzidos a dois, cujos conteúdos contrariavam o proposto pela Associação para

o anteprojeto à Constituição. De todo modo, o texto aprovado pela Constituinte, embora

não contemplasse todos os pontos elencados pela Associação Brasileira de Educação,

representou algum avanço para a Educação na Constituição de 1934, se comparada à

primeira Constituição Republicana de 1891 (GHIRALDELLI, 2009, p. 74, 76). Ocorre

72

que em 10 de novembro de 1937, temos um golpe de Estado liderado por Getúlio

Vargas, resultando em um governo autoritário que durou nove anos, o Estado Novo.

A Educação volta ao debate democrático, com o fim do Estado Novo, no qual a

nova Constituição (1946), traz o texto “a educação é direito de todos e será dada no lar e

na escola”, tratava agora de mais uma reforma no ensino que levou treze anos de

debates para resultar na primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1961

(MARCÍLIO, 2005, 148-9). Porém, com o Golpe Militar de 1964, é elaborada uma

nova Constituição (1967) onde foram produzidos instrumentos rígidos de controle da

Educação, esta, por conta da aceleração do crescimento nacional, passou a ser orientada

para o desenvolvimento do país, procurando inserir as classes mais baixas da população

no mercado de trabalho (MARCÍLIO, 2005, p. 151). Em 1971 ocorre uma nova

reforma do ensino com ênfase no 2º grau, este teria como objetivo a profissionalização

universal e compulsória, sua função era a de alimentar o mercado de trabalho e também

inibir o acesso ao ensino superior. Este formato de ensino durou 21 anos e pode ser

caracterizado pela repressão, privatização do ensino, institucionalização do ensino

profissionalizante, tecnicismo pedagógico, confusa legislação educacional,

autoritarismo, forte centralização e desestruturação da formação dos professores dos

ensinos fundamental e médio (MARCÍLIO, 2005, p. 154).

De acordo com Ghiraldelli (2009, p. 167-8), durante o governo Sarney

(mandato: 1985-1990), embora o MEC tenha ocupado a posição do segundo maior

orçamento da União, a política educacional do período foi “pouco criativa”; o governo

posterior, Fernando Collor de Mello (mandato: 1990-1992) foi um governo conturbado,

no qual a política educacional teria sido “improdutiva”. Quando deposto, pelo processo

de impeachment, deixou para seu sucessor, Itamar Franco (mandato: 1992-1995), “um

país em frangalhos, em particular o MEC e todo o aparato estatal de fomento à cultura,

educação e ciências”. De todo modo, em 1993, o novo Projeto de Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional foi aprovado pelo plenário da Câmara Federal e segundo

Rocha e Pereira (1994, p. 428), o debate iniciado em 1988 teria levado cinco anos para

a aprovação em razão do “desinteresse da maioria e da oposição” e quando de sua

aprovação, as autoras chamam a atenção para o surpreende fato desse projeto “ter sido

aprovado sem que nenhum do seus artigos, no momento da votação, tivesse gerado

73

debate em plenário. As sessões de votação sequer repercutiram no âmbito do

Congresso”.

Em 1996 é decretada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, já no

governo Fernando Henrique Cardoso (mandato: 1995-2002), em seu texto temos a

menção da ampliação da jornada escolar, “Serão conjugados todos os esforços

objetivando a progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental

para o regime de escolas de tempo integral” (BRASIL/MEC, 1996), estabeleceu que a

União seria responsável, com a colaboração dos estados, municípios e do Distrito

Federal, pela elaboração do Plano Nacional de Educação - PNE com diretrizes e metas

para os dez anos seguintes, e declarou que a partir daquela data (20/12/1996) seria

instituída a “Década da Educação”, estabelecendo que a União, no prazo de um ano,

deveria encaminhar ao “Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação (PNE),

com diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração

Mundial sobre Educação para Todos” (BRASIL, 1996), esta Declaração, elaborada por

ocasião da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, no ano de 1990

organizada pela UNESCO, na qual participaram 155 países, teve como meta principal

“a revitalização do compromisso mundial de educar todos os cidadãos do planeta”

(BOTEGA, 2005) e teve como patrocinadores e financiadores a Organização das

Nações Unidas para a Educação (UNESCO); o Fundo das Nações Unidas para a

Infância (UNICEF); o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD);

e o Banco Mundial (BID). Em seu Artigo 5º declara que a escola é o principal “sistema

de promoção da educação básica fora da esfera familiar” e ainda que a educação

fundamental deve “levar em consideração a cultura, as necessidades e as possibilidades

da comunidade” (UNESCO, 1998, p. 5).

Em pouco mais de um ano (11/02/1998), o poder executivo enviou ao Congresso

Nacional o projeto de lei que instituía o PNE, tendo sido aprovado em 09/01/2001,

penúltimo ano do governo Fernando Henrique Cardoso. Dentre suas cinco prioridades, a

serem cumpridas no prazo de dez anos, é possível perceber os primeiros traços do

Programa Mais Educação:

Prioridade 1: Garantia de ensino fundamental obrigatório de oito anos a todas

as crianças de 7 a 14 anos, assegurando o seu ingresso e permanência na

escola e a conclusão desse ensino. Essa prioridade inclui o necessário esforço

dos sistemas de ensino para que todas obtenham a formação mínima para o

exercício da cidadania e para o usufruto do patrimônio cultural da sociedade

74

moderna. O processo pedagógico deverá ser adequado às necessidades dos

alunos e corresponder a um ensino socialmente significativo. Prioridade de

tempo integral para as crianças das camadas sociais mais necessitadas

(BRASIL/Casa Civil, Lei nº 10.172, de 9/01/2001) (grifo nosso).

O PNE (2001) considera que “a educação infantil terá um papel cada vez maior

na formação integral da pessoa” e determina que seja adotado, progressivamente, o

atendimento em tempo integral, pois, internacionalmente “a ampliação da jornada

escolar para turno integral tem dado bons resultados”, esta ampliação seria composta

pela “orientação no cumprimento dos deveres escolares, prática de esportes,

desenvolvimento de atividades artísticas e alimentação adequada”, de modo a resultar

em “um avanço significativo para diminuir as desigualdades sociais e ampliar

democraticamente as oportunidades de aprendizagem”, o PNE ainda prevê que a

implantação de escolas de tempo integral resultará em mudanças significativas quanto

“à expansão da rede física, atendimento diferenciado da alimentação escolar e

disponibilidade de professores, considerando a especificidade de horários” (BRASIL,

2001). O Ministério da Educação entende o PDE como um “plano executivo, como um

conjunto de programas” que visam cumprir as metas quantitativas estabelecidas pelo

PDE, sem desconsiderar a necessidade de melhoria da qualidade da Educação nacional,

tal qualidade seria alcançada através de uma “visão sistêmica da educação e a sua

relação com a ordenação territorial e o desenvolvimento econômico e social”

(BRASIL/MEC, 2007, p. 7).

O primeiro mandato do presidente Lula, iniciado em 2003, de acordo com Dalila

Andrade Oliveira (2009, p. 198, 204), teria sido marcado, no campo educacional “mais

por permanências que rupturas em relação ao governo anterior”. Em seu primeiro

mandato (2003-2006) a educação básica sofreu pela ausência de “políticas regulares e

de ação firme no sentido de contrapor-se ao movimento de reformas iniciado no

governo anterior”. Nesse período houve programas pontuais e diversificados cujo

público alvo era aquele das faixas mais baixas da população, quanto à vulnerabilidade

social (esta característica representa um dos pré-requisitos para a adesão ao Programa

Mais Educação criado em 2007, primeiro ano do segundo mandato do presidente Lula),

e ainda esses programas “chegam à escola pública como mais uma tarefa a ser

desempenhada em meio ao conjunto de exigências apresentado aos docentes”, uma

crítica dos implementadores do PME.

75

Em 2006, último ano do primeiro mandato do presidente Lula, foi criado o

Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos

Profissionais da Educação (FUNDEB)27, que representa o principal mecanismo de

financiamento da educação básica e portanto é o financiador do Programa Mais

Educação. No dia 24 de abril de 2007, foi publicada a Portaria Interministerial nº 17,

que instituíra o PME, que visa fomentar a educação integral de crianças, adolescentes e

jovens, por meio do apoio a atividades sócio-educativas no contraturno escolar. No

mesmo dia da criação do PME, foi decretado o Plano de Metas Compromisso Todos

pela Educação, seu primeiro artigo o define como “a conjugação dos esforços da União,

Estados, Distrito Federal e Municípios, atuando em regime de colaboração, das famílias

e da comunidade, em proveito da melhoria da qualidade da educação básica” (BRASIL,

Decreto nº 6.094, de 24/04/2007). Oliveira (2009, p. 206) alerta para a ideia inserida

nesse plano: “Compromisso todos pela educação”, nesse “todos”, além da União,

Estados e Municípios, também está a família e a sociedade civil, neste sentido,

a escola pública necessita do apoio de todos os segmentos para cumprir seu

papel de educar [...] como se estivesse nas mãos de cada indivíduo, em

particular, melhorar o mundo, melhorando a educação – quando se sabe que

fatores estruturais intra e extraescolares são determinantes do baixo

desempenho obtido nos exames de “medição” de qualidade (OLIVEIRA,

2009, p. 206).

Este tipo de apelo social, iniciado dos anos 1990, acaba articulando setores da

sociedade civil, em especial as ONGs, o Estado terceiriza o seu papel e esta

possibilidade também está no PME, sendo inclusive, estimulada e também é alvo de

críticas de seus implementadores. Este “voluntarismo”, analisado por Oliveira (2009),

pode ser considerado como riscos políticos

à medida que desarmam as formas de controle direto, o que pode resultar, em

última instância, que a delegação de poder por parte do Estado a outros atores

envolvidos no processo de implementação dessas políticas pode gerar um

vazio que vai sendo paulatinamente preenchido por interesses particulares.

Tal processo pode resultar em que a ação pública seja cada vez menos estatal

e, por isso mesmo, menos pública. Esse é um risco de esvaziamento de poder

e de referência que tal modelo de gestão de políticas públicas pode ensejar

(OLIVEIRA, 2009, p. 208).

De todo modo, o Estado, através do MEC, mantém o seu papel de protagonista

na definição de Políticas Públicas educacionais, ainda que como indutor, o que

27 Criado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494/2007 e pelo Decreto

nº 6.253/2007.

76

representa um avanço se o compararmos com o histórico da educação nacional.

Segundo o Texto de referência para o debate nacional (BRASIL/MEC/SECAD, 2009,

p. 11) elaborado pelo MEC, a partir do final do ano de 2007 até o final do primeiro

semestre de 2008 (o PME foi criado em abril de 2007), um grupo de trabalho,

convocado pelo Ministério, sob a coordenação da SECAD - Secretaria de Educação

Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, através da Diretoria de Educação

Integral, Direitos Humanos e Cidadania, reuniu-se periodicamente para que a política de

Educação Integral fosse formulada. O trabalho deste grupo, formado por gestores

municipais e estaduais, representantes da União Nacional dos Dirigentes Municipais de

Educação (UNDIME), do Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED),

da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), da Associação

Nacional pela Formação de Profissionais da Educação (ANFOPE), de ONGs

comprometidas com a educação pública e de professores universitários, pautou-se na

“intersetorialidade da gestão pública, na possibilidade de articulação com a sociedade

civil e no diálogo entre saberes clássicos e contemporâneos” com o objetivo de

responder à pergunta “Por que Educação Integral no contexto brasileiro

contemporâneo?”, entendeu-se que o debate nacional sobre a Educação Integral não

deveria se pautar somente

pelo acesso à escola, mas pela permanência, com aprendizagem, de cada

criança e de cada adolescente nesse espaço formal de ensino. O direito à

educação de qualidade é um elemento fundamental para a ampliação e para a

garantia dos demais direitos humanos e sociais, e condição para a própria

democracia, e a escola pública universal materializa esse direito.

(BRASIL/MEC/SECAD, 2009, p. 15).

O grupo ainda considerou complexa e urgente as demandas sociais e estas

dialogariam diretamente com os “processos escolares”, entendidos como um desafio

que poderia ser enfrentado a partir da adoção da Educação Integral articulada com

“outras políticas sociais, outros profissionais e equipamentos públicos, na perspectiva

de garantir o sucesso escolar”, a garantia desse sucesso representaria um “compromisso

ético com a inclusão social” (BRASIL/MEC/SECAD, p. 15, 21).

A Educação Integral, o que na prática está mais próxima da Educação em

Tempo Integral (ETI), se coloca, nas palavras do Ministério da Educação, como “um

ideal presente na legislação educacional brasileira e nas formulações de nossos mais

brilhantes educadores”. O Ministério aponta que houve iniciativas, em diferentes

77

momentos da história brasileira, que objetivaram este ideal, porém, de maneira pontual

e esporádica. A criação do Programa Mais Educação representa a retomada deste ideal,

por meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD)

e de Educação Básica (SEB), em parceria com o FNDE, a partir de experiências que

indicaram o papel central que a escola deve ter no projeto de Educação Integral, e ainda

a “necessidade de articular outras políticas públicas que contribuam para a diversidade

de vivências que tornam a Educação Integral uma experiência inovadora e sustentável

ao longo do tempo” (BRASIL/MEC, 2009, p. 7).

O conteúdo concreto do Programa Mais Educação, a sua dimensão material,

denominada Policy nos estudos de análise de Políticas Públicas, é representado por um

desenho sofisticado e em sintonia, pelo menos em tese, com as dimensões institucional

e processual já descritas. O Programa criado pelo Ministério da Educação, em 2007,

regulamentado em 2010, teve suas diretrizes operacionais disponibilizadas entre 2011 e

2012, é parte do Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, e se define como uma

estratégia do Governo Federal para induzir a ampliação da jornada escolar e a

organização curricular, na perspectiva da Educação Integral e atende aos Ensinos

Fundamental e Infantil. O PME, de acordo com a documentação oficial, trata da

construção de uma ação intersetorial entre as Políticas Públicas educacionais e sociais,

contribuindo para a diminuição das desigualdades educacionais e para a valorização da

diversidade cultural brasileira.

Para demonstrar o caráter intersetorial, o Programa é articulado entre os

Ministérios da Educação, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Ciência e

Tecnologia, do Esporte, do Meio Ambiente, da Cultura, da Defesa e a Controladoria

Geral da União. Já a valorização da diversidade cultural brasileira, pode ser

representada pela ampliação de oportunidades educativas e pelo compartilhamento da

tarefa de educar entre os profissionais da educação e de outras áreas, as famílias e

diferentes atores sociais dentro dos macrocampos: acompanhamento pedagógico,

educação ambiental, esporte e lazer, direitos humanos em educação, cultura e artes,

cultura digital, promoção da saúde, comunicação e uso de mídias, investigação no

campo das ciências da natureza e educação econômica, de modo a associar ao processo

de escolarização a aprendizagem conectada à vida e ao universo de interesses e de

possibilidades das crianças, adolescentes e jovens (MEC, 2012, p. 4-9). O Programa tem

78

como base os princípios da Educação Integral previstos no Decreto n° 7.083/2010,

sendo eles:

Compreensão do direito de aprender como inerente ao direito à vida, à saúde,

à liberdade, ao respeito, à dignidade e à convivência familiar e comunitária e

como condição para o próprio desenvolvimento de uma sociedade

republicana e democrática. Por meio da Educação Integral, reconhecem-se as

múltiplas dimensões do ser humano e a peculiaridade do desenvolvimento de

crianças, adolescentes e jovens (MEC, 2013, p. 4).

Cabe ressaltar que os princípios acima citados, são os mesmos desenvolvidos no

Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, publicado em 1932, e que produziu

experiências de escolas com jornadas ampliadas de ensino, embora de maneira

fragmentada em estados e município. De todo modo, este Programa pode ser

considerado uma Política Pública pioneira, no âmbito do Governo Federal, para a

Educação Fundamental e Infantil, no que diz respeito às bases de seu planejamento,

critérios para adesão, disponibilização de verbas e orientações operacionais.

A Portaria Normativa Interministerial nº 17, de 24/04/2007, que instituiu o

Programa Mais Educação, apresenta suas considerações e objetivos, dos quais destaco:

O programa será implementado por meio do apoio à realização, em escolas e

outros espaços sócio-culturais, de ações sócio-educativas no contraturno

escolar, incluindo os campos da educação, artes, cultura, esporte, lazer,

mobilizando-os para a melhoria do desempenho educacional, ao cultivo de

relações entre professores, alunos e suas comunidades, à garantia da proteção

social da assistência social e à formação para a cidadania, incluindo

perspectivas temáticas dos direitos humanos, consciência ambiental, novas

tecnologias, comunicação social, saúde e consciência corporal, segurança

alimentar e nutricional, convivência e democracia, compartilhamento

comunitário e dinâmicas de redes. (Portaria Normativa Interministerial nº 17,

de 24/04/2007 - Art. 1º - Parágrafo único)

Das finalidades do Programa, destaco:

contribuir para a redução da evasão, da reprovação, da distorção idade/série,

mediante a implementação de ações pedagógicas para melhoria de condições

para o rendimento e o aproveitamento escolar; promover a aproximação entre

a escola, as famílias e as comunidades, mediante atividades que visem a

responsabilização e a interação com o processo educacional, integrando os

equipamentos sociais e comunitários entre si e à vida escolar (Portaria

Normativa Interministerial nº 17, de 24/04/2007 - Art. 2º - itens II e VIII);

O Art. 4º do Capítulo – Da Execução, destaco:

O Programa Mais Educação poderá contar com a participação de ações

promovidas pelos Estados, Distrito Federal, Municípios e por outras

instituições públicas e privadas, desde que as atividades sejam oferecidas

gratuitamente a crianças, adolescentes e jovens e que estejam integradas ao

projeto político-pedagógico das redes e escolas participantes (Portaria

Normativa Interministerial nº 17, de 24/04/2007 - Art. 4º - Parágrafo 2º).

79

Das atribuições dos integrantes do Programa, destaco:

mobilizar e estimular a comunidade local para a oferta de espaços, buscando

sua participação complementar em atividades e outras formas de apoio que

contribuam para o alcance das finalidades do Programa (Portaria Normativa

Interministerial nº 17, de 24/04/2007 - Art. 8º - item III).

O Manual Operacional de Educação Integral (MEC, 2012, p. 5-12) apresenta o

Programa Mais Educação como operacionalizado pela Secretaria de Educação Básica

(SEB), por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), do Fundo Nacional

de Desenvolvimento da Educação (FNDE), e é destinado às escolas de territórios

prioritários. Nele são encontrados os principais critérios técnicos para adesão,

habilitação e financiamento, conforme transcritos abaixo:

a) Critérios para seleção

Escolas contempladas com o Programa Dinheiro Direto na Escola/Integral

(PDDE) a partir de 2008;

Escolas estaduais, municipais e/ou distritais que foram contempladas com o

Plano de Desenvolvimento da Educação/Escola (PDE) e que possuam o IDEB

(Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) abaixo ou igual a 4,2 nas

séries iniciais e/ou 3,8 nas séries finais;

Escolas localizadas nos territórios prioritários do Plano Brasil Sem Miséria;

Escolas com índices igual ou superior a 50% de estudantes participantes do

Programa Bolsa Família;

Escolas que participam do Programa Escola Aberta; e

Escolas do campo.

b) Etapas de Habilitação

Para que as escolas sejam habilitadas para o recebimento dos recursos

financeiros, é imprescindível que as entidades executoras (municípios, estados, Distrito

Federal, escolas federais, estaduais e municipais), cumpram os prazos divulgados pela

Secretaria de Educação Básica (SEB) para as seguintes diretrizes:

Adesão das entidades executoras e indicação dos técnicos das secretarias

estaduais, distrital e municipais de educação, para a coordenação e

acompanhamento do Programa;

80

Liberação de senhas no Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e

Controle (SIMEC: http://www.simec.mec.gov.br) para os técnicos das

secretarias estaduais, distrital e municipais de educação e para os cadastradores

das escolas pré-selecionadas para o Programa;

Preenchimento, no SIMEC, do Plano de Atendimento pelas escolas que farão a

adesão, incluindo as escolas que já participam do Programa;

Validação pelas secretarias estaduais, distrital e municipais de educação do

Plano de Atendimento das escolas e envio, via SIMEC, para avaliação do MEC;

Aprovação e finalização, pelo MEC, do Plano de Atendimento;

Confirmação do Plano Geral Consolidado no SIMEC pelas Secretarias estaduais,

distrital e municipais de educação.

Uma vez atendidos a todos esses critérios, as escolas pré-selecionadas deverão

confirmar a adesão ao PME, via ofício, e nomear no mínimo um técnico da Secretaria

Estadual, Distrital ou Municipal de Educação, com a responsabilidade de coordenar as

atividades realizadas nas escolas participantes do Programa. Esses técnicos ficam

responsáveis por acompanhar a disponibilização das senhas, o preenchimento do Plano

de Atendimento, pelos representantes das escolas, a tramitação dos documentos no

SIMEC e a confirmação do Plano Geral Consolidado. Cabe à Secretaria Estadual,

Municipal ou Distrital de Educação disponibilizar um professor vinculado à escola, com

dedicação de no mínimo vinte horas, preferencialmente quarenta, denominado

“Professor Comunitário”. Este é responsável pelo acompanhamento pedagógico e

administrativo do Programa.

Às Unidades Executoras compete ainda que estabeleçam critérios claros e

transparentes para a gradativa implementação da ampliação da jornada escolar na

perspectiva da Educação Integral, selecionando, preferencialmente, para a participação

no Programa:

Estudantes que apresentam defasagem idade/ano;

Estudantes das séries finais da 1ª fase do ensino fundamental (4º e/ou 5º

anos), onde existe maior saída espontânea de estudantes na transição para a

2ª fase;

81

Estudantes das séries finais da 2ª fase do ensino fundamental (8º e/ou 9º

anos), onde existe um alto índice de abandono após a conclusão;

Estudantes de anos/séries onde são detectados índices de evasão e/ou

repetência; estudantes beneficiários do Programa Bolsa Família.

Cada turma deve ter 30 estudantes, que poderão ser de idades e séries variadas,

conforme as características de cada atividade.

c) Financiamento

O montante de recursos destinados a cada escola será repassado por intermédio

do Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE/Educação Integral, para conta corrente

em nome da Unidade Executora Própria (UEx)28 representativa da unidade escolar,

liberado em duas parcelas. A primeira parcela corresponde a seis meses letivos do valor

de serviços, materiais de consumo e ressarcimento de monitores29, mais 100% dos

valores dos Kits30. A segunda parcela se refere aos quatro meses letivos restantes. Os

valores a serem ressarcidos a monitores e custeio de material estão devidamente

especificados em tabelas no manual operacional do programa. O recebimento dos

recursos do PDDE/Integral está condicionado à apresentação e aprovação de prestação

de contas pela UEx.

Ampliação do Programa

De acordo com os dados disponíveis no portal do Ministério da Educação, o

PME teve suas atividades iniciadas em 2008 e até 2011 temos a seguinte evolução:

28 Unidade Executora Própria (UEx): entidade privada sem fins lucrativos, representativa das escolas

públicas, integrada por membros da comunidade escolar comumente denominada de caixa escolar, associação de pais e mestres, conselho escolar, círculo de pais e mestres, etc., constituída para receber, executar e prestar contas dos recursos destinados às referidas escolas (BRASIL, Resolução nº 17, de 19/04/2011). 29 O trabalho de monitoria deverá ser desempenhado, preferencialmente, por estudantes universitários de

formação específica nas áreas de desenvolvimento das atividades ou pessoas da comunidade com habilidades apropriadas, como, por exemplo, instrutor de judô, mestre de capoeira, contador de histórias, agricultor para horta escolar, etc. Além disso, poderão desempenhar a função de monitoria, de acordo com suas competências, saberes e habilidades, estudantes da EJA e estudantes do ensino médio. (BRASIL/MEC, 2012, p. 10). 30 Os kits são compostos por materiais pedagógicos e de apoio indicados para o desenvolvimento de cada

uma das atividades. Para cada uma das atividades do Programa, há um kit de material específico. (BRASIL/MEC, 2012, p. 10).

82

Ano Escolas Municípios Estados Estudantes

2008 1.380 55 26 386.000

2009 5.000 126 Todos 1.500.000

2010 10.000 389 Todos 2.300.000

2011 14.995 Não informado Todos 3.067.644

Quadro 2: Evolução da adesão ao Programa Mais Educação – 2008 a 201131

3.1.2 A Janela de Oportunidade do PME

Uma das primeiras perguntas, ao analisar uma Política Pública, é “qual o

interesse governamental ao inserir em sua agenda decisória (ou não inserir) determinada

demanda?” e ainda “como é possível analisar as tomadas de decisões quando

relacionamos os interesses da sociedade versus os interesses do Estado?” (RUA e

ROMANINI, s/d, p. 3). Dentre os diversos instrumentos para a análise de Políticas

Públicas, foi escolhido, primeiramente, a Janela de Oportunidade (KINGDON apud

BAPTISTA e REZENDE, 2011, p. 145-6). Embora exista uma série de problemas

sociais que demandam por soluções, para que estes problemas ganhem a atenção

governamental, é necessário que a referida Janela seja aberta. A sua abertura se dá pela

combinação dos Fluxos:

1) Problemas: referente às condições sociais e à forma como cada condição

desperta a necessidade de ação;

2) Alternativas e soluções: propostas rotineiramente elaboradas por

especialistas, funcionários públicos, grupos de interesse, entre outros; e

3) Político: dimensão da política na qual as coalizões são construídas a partir de

barganhas e negociações. Neste fluxo, três elementos exercem influência

sobre a agenda governamental: a) “clima” ou “humor” nacional; b) forças

políticas organizadas (grupos de pressão); e c) mudanças no interior do

próprio governo.

Uma vez que os três fluxos se encontram, e com isto a Janela de Oportunidade é

aberta, o problema entra na Agenda Decisória, no entanto, esta fase da agenda, segundo

os estudos de Kingdon (apud BAPTISTA e REZENDE, 2011, p. 144) é precedida pelas

fases:

31 Disponível em

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=16689&Itemid=1113. Acesso em 02/03/2015.

83

1) Sistêmica ou não-governamental: corresponde à lista de assuntos e problemas

que por algum motivo não despertaram a atenção do governo e dos

formuladores de políticas e assim, ficam aguardando uma oportunidade e

disputando espaço para entrar na agenda governamental; e

2) Institucional ou governamental: inclui os problemas que obtêm a atenção do

governo, mas ainda não se colocaram na mesa de decisão.

Tanto a Janela de Oportunidade, com a convergência de seus Fluxos, quanto às

fases da Agenda, nos servem de base para a Análise de Políticas Públicas, mas elas não

são estanques ou correspondem a um passo a passo rígido, tendo em vista que

problemas que colocam em risco o poder político podem compor a Agenda Decisória

sem aviso prévio.

O PME encontra sua Janela de Oportunidade no segundo mandato do governo

federal do Partido dos Trabalhadores, em 2007 (presidente Luiz Inácio Lula da Silva).

No entanto, o tema da Educação Integral para as crianças, previsto pelo PME, começou

a ser debatido no Brasil no início dos anos 1920. As experiências, já apresentadas,

concentraram-se em estados e municípios, neste sentido este tema não despertou a

atenção da esfera federal até os anos 2007, sendo assim, pode-se considerar, que do

ponto de vista da convergência dos Fluxos, não havia até o referido período,

possibilidades para que fosse aberta uma Janela de Oportunidade para a Educação

Integral das crianças.

Primeiramente, o Fluxo de Problemas estava presente de maneira ainda

embrionária, pois nos anos 1930, a Educação, da perspectiva do governo federal, tinha

como objetivo colocar o país na marcha do desenvolvimento, sendo assim, o foco da

ação governamental, para esta área, eram os ensinos técnico-profissionalizante e

superior, a Educação passou a ser significada como uma “oportunidade de ascensão

social (GHIRALDELLI, 2009, p. 53). Já o Fluxo de Alternativas e Soluções, estava

pautado por ideais norte-americanos e europeus, que embora tenham fundamentações

relevantes, não faziam parte do ideário brasileiro no que se refere ao tratamento e ao

entendimento da Educação das crianças. Por fim, o Fluxo Político, que se dá através de

barganhas e negociações, era ausente, uma vez que na década de 1930 estávamos sob o

governo Getúlio Vargas, cujo foco, entre outros, era colocar ordem e progresso à

84

crescente urbanização do país, em que a responsabilidade da educação das crianças, de

maneira geral, estava ao cargo dos pais.

Sem a convergência dos Fluxos, portanto sem a abertura da Janela de

Oportunidade, a Educação Integral não encontrou espaço em nenhuma fase da Agenda

até os anos 1987, ano em que foi iniciada a nossa última constituinte. Passados vinte e

um anos de ditadura militar e portanto, de repressão social e política, os elementos que

exercem influência sobre a agenda governamental se fizeram presentes com a

redemocratização: 1) clima ou humor nacional; 2) forças políticas organizadas (grupos

de pressão); e 3) mudanças no interior do próprio governo. Sendo assim, pode-se

considerar que o problema da Educação Básica teria se colocado na Agenda sistêmica

ou não-governamental a partir da Constituição de 1988, teria passado a ocupar a Agenda

institucional ou governamental no governo Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2002) e

encontrou o seu espaço na Agenda decisória ou política apenas no segundo mandato do

governo Lula (2007), a partir da combinação dos Fluxos citados, que resultaram na

Janela de Oportunidade, deste modo, a elaboração do PME só foi possível a partir de

um conjunto de condições favoráveis a alterações nas agendas governamental e de

decisão.

Além da Janela de Oportunidade, há ainda alguns indicadores relativos à

Educação que podem ter contribuído para a formulação do PME. O Índice de

Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB)32 – que sintetiza dois conceitos para a

qualidade da educação: aprovação e média de desempenho dos estudantes em língua

portuguesa e matemática – apurou que nos anos iniciais do ensino fundamental em

2005, a nota foi de 3,8, já nos anos finais foi de 3,5. Em 2007, ano de criação do PME,

os anos iniciais pontuaram 4,2 e os anos finais, 3,8. Embora a variação entre os anos

iniciais e finais não seja alta, é possível verificar o seu resultado negativo. Outro ponto

de atenção é o declínio da proficiência em Língua Portuguesa, no período entre 1995 a

2005, em uma escala de 125 a 325 pontos, em que a proficiência insuficiente está entre

0 e 199 pontos; a básica, entre 200 a 274 pontos; proficiente, entre 275 e 324 pontos; e

avançado, igual ou maior que 325 pontos, os alunos do 9º ano do ensino fundamental

pontuaram 256,1, em 1995; 250,0, em 1997; 232,9 em 1999; 235,2, em 2001; 232,0, em

2003; e 231,9, em 2005 (BRASIL/MEC/SAEB, 2007).

32 O indicador é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e

médias de desempenho nas avaliações do Inep, o Saeb e a Prova Brasil. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/portal-ideb. Acesso em 26/04/2015.

85

Nos demais campos sociais, que contribuem para a Janela de Oportunidade,

temos o campo político. Em 2004, ano da criação da SECAD33, estávamos no primeiro

mandato do governo federal do Partido dos Trabalhadores. O Ministério da Educação

era chefiado por Tarso Genro (PT), que ficou à frente da pasta, aproximadamente, por

um ano e seis meses, neste período foi responsável pela criação do Programa

Universidade para Todos - PROUNI (Decreto nº 5.245, de 15/10/2004) e pelo envio ao

Congresso dos projetos de criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da

Educação Básica (Fundeb) e do Piso Nacional dos Professores. Genro também deu

início à expansão das Escolas Técnicas Federais, que seria concluída por seu sucessor

Fernando Haddad, sendo este o responsável, enquanto Ministro da Educação, pela

formulação do PME.

Do ponto de vista econômico, segundo Guilherme Delgado (ADITAL, 2007), o

cenário em 2007, era positivo com forte crescimento do emprego formal, assim como

do PIB (em torno dos 5% ao ano). Quanto à valorização cambial, Jurandir O. Negrão

apontou que, em comparação a 2006, a cotação média do dólar caiu 13% – ou seja, o

real se valorizou nessa proporção, considerando ainda as moedas de outros países que

são importantes no comércio exterior do Brasil, o real terminou o ano valendo cerca de

20% a mais do que valia no começo do ano, e quase 40% a mais do que no final de

2004. A dívida externa líquida, em 2007, foi negativa, deste modo o Brasil passou a ser

credor internacional (BCB, 2015), o total registrado de sua dívida externa passou a ser

menor que o montante de suas reservas cambiais.

Por fim, a significação da Educação, no cenário internacional, ganha um reforço

nos anos 2000, quando da elaboração dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

(ODMs)34 e da modernização do Marco de Ação de Dakar35, referente às metas de

33 “Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) em articulação

com os sistemas de ensino implementa políticas educacionais nas áreas de alfabetização e educação de jovens e adultos, educação ambiental, educação em direitos humanos, educação especial, do campo, escolar indígena, quilombola e educação para as relações étnico-raciais. O objetivo da Secadi é contribuir para o desenvolvimento inclusivo dos sistemas de ensino, voltado à valorização das diferenças e da diversidade, à promoção da educação inclusiva, dos direitos humanos e da sustentabilidade socioambiental, visando à efetivação de políticas públicas transversais e intersetoriais”. Disponível em http://portal.mec.gov.br/secretaria-de-educacao-continuada-alfabetizacao-diversidade-e-inclusao/apresentacao. Acesso em 05/12/2015. Quando de sua criação, a sigla adotada foi SECAD, o termo “Inclusão”, foi inserido posteriormente. 34 “Em setembro de 2000, refletindo e baseando-se na década das grandes conferências e encontros das

Nações Unidas, os líderes mundiais se reuniram na sede das Nações Unidas, em Nova York, para adotar a Declaração do Milênio da ONU. Com a Declaração, as Nações se comprometeram a uma nova parceria global para reduzir a pobreza extrema, em uma série de oito objetivos – com um prazo para o seu alcance

86

Educação para Todos (EPT) definidas nos anos 1990. Estes compromissos, assumidos

pelos países membros Organização das Nações Unidas (ONU), elencavam metas a

serem cumpridas até os anos 2015. Sendo assim, os cenários político, econômico e

internacional se mostravam favoráveis e somados a este cenário, os dados do

desenvolvimento e aproveitamento escolar podem ter contribuído para que a Agenda

Decisória abrisse espaço para uma Política Pública direcionada ao ensino básico, fase

esta que ganhou pouca ou nenhuma atenção do governo federal em toda a história do

país. Como dito anteriormente, este quadro analítico não é estanque, pois há problemas

que quando ameaçam o poder governamental entram na Agenda Decisória sem,

obrigatoriamente, atender aos “passos” analisados. De acordo com o exposto, pode-se

entender que a Educação básica não seja um problema que ameace a governabilidade,

mas passou a ser objeto de uma política pública federal.

3.2 Controvérsias entre Formulação e Implementação

O Ministério da Educação tomou como referência, para a formulação do PME,

os pensamentos e as experiência de Escola Integral de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro,

tais referências estão no conteúdo da política, mas foram colocadas apenas como

propostas e sugestões. Nas experiências concretas, o exercício das atividades era

desenvolvido em infraestruturas construídas para esse fim e este é um dos quesitos

principais que afasta a referência inspiradora do Programa Mais Educação. O

desenhado pelo MEC destaca-se pelos fatores burocráticos a serem atendidos, quando

da solicitação, adesão e permanência ao Programa. Houve ainda, a autonomia dos entes

da Federação para aderir ou não à indução do governo federal e no caso da adesão, a

diversidade de recursos humanos, de infraestrutura e até mesmo especificidades

políticas, culturais e ambientais poderiam ser tomadas como pontos de atenção para a

implementação da política, tal como foi desenhada. Ainda que, quando da formulação

do PME, tenha havido a abertura da Janela de Oportunidade com disponibilidade de

em 2015 – que se tornaram conhecidos como os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).” Disponível em http://www.pnud.org.br/odm.aspx. Acesso em 05/05/2016. 35 “O Marco de Ação de Dakar é um compromisso coletivo para a ação. Os governos têm a obrigação de

assegurar que os objetivos e as metas de EPT (Educação Para Todos) sejam alcançados e mantidos. Essa responsabilidade será atingida de forma mais eficaz por meio de amplas parcerias no âmbito de cada país, apoiada pela cooperação com agências e instituições regionais e internacionais. Disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Direito-a-Educa%C3%A7%C3%A3o/declaracao-de-dakar.html. Acesso em 05/05/2016.

87

governo (Federal), recursos financeiros disponíveis, tempo político e administrativo

favoráveis, a Implementação da política foi um elemento de controvérsia, entre o

desenhado e o executado.

Do ponto de vista estratégico o programa surpreendeu, primeiramente por ter

sido uma política transversal que englobou um considerável número de Ministérios. Do

ponto de vista do planejamento, é possível considerar que o programa apresentou um

desenho eficaz, desde cartilhas para a sugestão de aulas a serem ministradas no

contraturno, até tutoriais para adesão e preenchimento de formulários, deste modo, à

primeira vista, o programa teve condições para atender a demanda do problema da

educação básica, não fossem duas pesquisas exploratórias, realizadas para este trabalho,

que colocam em questão a eficiência do programa. A primeira, realizada com uma

secretária de escola na Zona Leste da cidade de São Paulo, na qual o programa foi

implementado, esta, confessou que a dinâmica proposta pelo PME não foi atendida,

tendo em vista a qualidade da capacitação dos professores, e estes por sua vez,

compreenderam o programa como mais uma tarefa a cumprir, já a segunda entrevistada,

uma diretora de escola na Zona Norte, relatou que embora a demanda por Educação

Integral seja considerável na região, pois a maioria das mães trabalha, e ainda por ser

um local de tráfico intenso de drogas, a escola que dirige não atendeu aos pré-requisitos

para adesão ao PME.

Nóbrega e Silva (2013, p. 11-2) analisaram as dificuldades ocorridas no

município de Caruaru/PE, quando da implementação do PME. Os destaques deste

estudo são: 1) indisponibilidade dos espaços físicos para as atividades no contraturno

escolar, pois a maioria das escolas possuem turmas nos três turnos regulares; 2)

necessidade de treinamento em informática por parte do setor administrativo das

instituições de ensino, para que estes possam preencher os diversos ofícios exigidos, e

como exemplo, apresentam que das 51 escolas participantes do Programa, 15 não

conseguiram executar o preenchimento dos formulários e assim, perderam os repasses

financeiros; e 3) ausência de capacitação dos professores, primeiro porque não haveria,

por parte do município, a intenção de capacita-los, e se houvesse, os professores não

teriam tempo para tanto, pois ministram aulas em mais de uma escola, ocupando todo o

seu dia, a alternativa que o município encontrou e que também é estimulada pela

formulação do PME é a contratação de coordenadores (corresponde ao “Professor

Comunitário”) que passam por treinamento, mas estão descolados da dinâmica das

88

escolas e não, necessariamente, são professores que passaram por formação pedagógica.

Estes coordenadores, depois de contratados, têm sob sua responsabilidade a contratação

de monitores, que embora tenham experiência prática quanto às suas áreas de atuação,

não possuem nenhum domínio pedagógico. Seguindo este mesmo objeto de

problematização, Rosa (2012, p. 10) chama a atenção para a impossibilidade de atender

à magnitude do programa através dos escassos recursos humanos disponíveis, sendo

assim, o Estado, para equacionar esta escassez, estimula as parcerias público-privadas e

o voluntariado, deste modo, o resultado destes estímulos acabaria por

desprofissionalizar as funções de professoras e professores.

Coelho (2011, p. 78) em seu ensaio Alunos no Ensino Fundamental, ampliação

da jornada escolar e Educação Integral, nos mostrou que os alunos entrevistados

percebem a qualidade das mudanças provocadas pelo PME como positivas (novas

perspectivas para o futuro, contato com temas inéditos em suas vidas, alimentação

garantida, melhor utilização do tempo antes ocioso). Já as professoras entrevistadas por

Amorim (2013, p. 16) para a elaboração do artigo Docência e educação integral:

percepções das professoras da escola básica adotiva Liberato Valentim, não tinham

experiência em Educação Integral e não houve capacitação para tanto, e ainda,

criticaram o Programa, pois este destina-se às crianças com baixo aproveitamento

escolar e segundo elas, o programa deveria ser oferecido a todos alunos, uma vez que

dividir as crianças entre alto e baixo desempenho pode caracterizar segregação. Temos

ainda a visão dos diretores escolares entrevistados por Parente e Conceição (2011, p. 9),

para o artigo Gestão escolar: o perfil do diretor das escolas públicas municipais de

Itabaiana – SE, embora os entrevistados não atribuam, de maneira explícita, aspectos

negativos ou positivos, declararam que o acúmulo de atividades, como as

administrativas e a intervenção no processo de planejamento pedagógico geral,

representam constantes desafios quando relacionados com o tempo necessário para

cumpri-los.

No ano de criação do PME, Ana Maria Cavaliere (2007, p. 1016) apresenta em

seu artigo Tempo de escola e qualidade na educação pública, alguns entendimentos que

justificariam a ampliação da jornada escolar: 1) o alcance de melhores resultados dos

educandos; 2) “adequação da escola às novas condições da vida urbana, das famílias e

particularmente da mulher”; e 3) mudança da concepção de educação escolar, “isto é, no

papel da escola na vida e na formação dos indivíduos”. De acordo com a autora, a

89

última justificativa seria aquela que englobaria as anteriores, por ser a mais abrangente e

coloca em debate as questões:

Que tipo de instituição pública de educação básica a sociedade brasileira

precisa? Que funções relativas ao conhecimento cabem à escola, frente aos

demais meios de informação e comunicação presentes na vida social? Qual o

papel da instituição escolar na formação para a vida em sociedade e para a

democracia? (CAVALIERE, 2007, p. 1017).

Cavaliere (2007, p. 1017-8) aponta que a ampliação da jornada escolar, pautada

nas justificativas descritas, não está em uma relação direta de causa e efeito, ou seja,

ampliar o tempo de permanência no ambiente escolar não resulta obrigatoriamente na

melhoria das práticas escolares, pois há variáveis que influenciam tanto o entendimento

de uma Educação Integral, assim como o que se entende por qualidade do ensino. As

variáveis, colocadas pela autora: 1) circunstância histórica ou local; 2) cultura familiar;

3) “tipo de visão sobre a formação geral da criança e do adolescente”; e 4) “tipo de

associação entre educação escolar e políticas públicas de assistência social ou de

preparação para o trabalho”, podem nos ajudar a compreender a questão da Educação

em tempo integral.

Tanto para a leitura do desenho do PME, quanto para a compreensão de sua

implementação e de seus respectivos atores, Cavaliere (2007, p. 1018-9) nos ajuda,

quando coloca, em seu artigo, possíveis fatores que determinariam a implementação de

uma Educação em tempo integral, de um lado teríamos o bem-estar das crianças; as

necessidades do Estado e da sociedade; e ainda o diálogo com a rotina e conforto dos

adultos, pais ou professores. A autora chama a atenção para a complexidade que evolve

estes fatores, pois estão localizados na dimensão cultural, neste sentido, não seria

possível trata-los apenas nas dimensões administrativas ou burocráticas, pois a

significação da Educação em tempo integral, assim como seus objetivos, seriam

resultado não apenas de um desenho consistente da política pública, mas também do

resultado “de conflitos e negociações”.

Sete anos após a criação do Programa Mais Educação, Cavaliere (2014)

apresenta suas análises quanto à relação do Programa com a ideia de assistencialismo e

do voluntarismo, também apontada por Oliveira (2009), uma prática estimulada pelo

Estado a partir dos anos 1990. O Plano Nacional de Educação de 2014 fortalece as

possibilidades de parcerias com entidades da sociedade civil “de variados matizes na

oferta de atividades complementares ao horário escolar convencional” (CAVALIERE,

90

2014, p. 1209), isto significa que as atividades oferecidas no contraturno escolar podem

ser realizadas em espaços outros, que não a escola, embora esta, à princípio seja a

coordenadora das referidas atividades, e executadas por voluntários, não

necessariamente por professores, para Cavaliere (2014, p. 1210) esta prática traz

mudanças significativas para a concepção da Educação em Tempo Integral.

Cavaliere (2014, p. 1210-2) entende que o PME pode representar uma resposta

às “emergências colocadas pela realidade social associadas às dificuldades em criar em

grande escala ou transformar escolas convencionais em ETI” (Escolas de Tempo

Integral), e ainda, o Programa procura se colocar como um “tipo de solução” para a

melhoria da qualidade da Educação, no entanto, de acordo com a própria ideia de

voluntariado e ocupação e/ou locação para a realização das atividades de contraturno,

acaba reforçando “os estigmas da escola pública precária e de fraca ambição”. A

concepção de uma Educação em Tempo Integral em locais para além do espaço escolar

e ministrada por um corpo de voluntários, remunerados ou não, segundo a autora, faz

com que o formato do PME fique desconectado das atividades “ordinárias” da escola,

como consequência,

essa solução organizacional do tempo integral, que na verdade não constrói

uma escola de tempo integral e nem cria as condições para o

desenvolvimento da chamada “educação integral”, mas apenas oferece um

regime escolar diferenciado para os alunos “mais necessitados”, gera uma

excessiva dispersão de objetivos, ao mesmo tempo em que não mexe com o

“coração” da instituição e pode levar a um trabalho com identidade

educacional inespecífica, ao sabor de idiossincrasias locais e pessoais, ainda

que em alguns casos ele possa aliviar tensões e situações emergenciais

relacionadas aos direitos humanos específicos da infância e da adolescência

(CAVALIERE, 2014, p. 1212-3)

Viviane Silva da Rosa (2012) aponta o incentivo do MEC quanto à ampliação

dos espaços escolares para além da escola e a inserção de ONGs como atores do

processo educacional público, como um ato irresponsável e ainda traria aos conceitos de

Estado e Sociedade Civil alguma releitura, pois o Programa Mais Educação seria uma

oportunidade de maior atuação do Estado, mas quando delega a outras esferas o seu

dever, mostraria certa “desresponsabilização do Estado com a Educação Pública na

medida em que apresenta novas funções para a escola, professores/as e sociedade civil”,

sendo assim, ao sugerir a ampliação dos espaços educativos e o incentivo ao

voluntariado, o Estado desprofissionaliza a função do/a professor/a” (ROSA, 2012, p. 9-

10). Essa tendência, iniciada nos anos 1990, quanto à descentralização das políticas

91

sociais, embora tenha sido constante alvo de críticas dos pesquisadores, parece ter se

estabelecido.

Em 2007, o Ministério da Educação convidou as Faculdades de Educação das

Universidades UNIRIO (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro), UFPR

(Universidade Federal do Paraná), UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), e

UnB (Universidade de Brasília) para a realização de uma pesquisa qualitativa intitulada

“Educação integral/educação integrada e(m) tempo integral: concepções e práticas na

educação brasileira - Mapeamento das experiências de jornada escolar ampliada no

Brasil”, com os seguintes objetivos: 1) mapeamento das experiências de ampliação de

jornada no ensino fundamental, em curso no Brasil; 2) análise das experiências

mapeadas, a partir da construção de critérios que evidenciassem suas concepções e

práticas; e 3) subsidiar a proposição de políticas públicas voltadas para a

implementação de educação integral (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 6).

A pesquisa, iniciada em 2008 e publicada em 2010, apresenta pontos de atenção

quando da implementação do Programa Mais Educação, especificamente os

relacionados à infraestrutura, formação dos profissionais, resistência dos gestores

escolares, fraca formação dos professores, sobrecarga de trabalho e baixos salários. No

município de Olímpia (SP) foi identificado, nas escolas pesquisadas (duas), o problema

do espaço físico, que fora adaptado para que as atividades, a serem realizadas no

contraturno escolar, pudessem ser incorporadas à rotina das escolas, no entanto, a

equipe de pesquisa considerou que essas adaptações não estavam em consonância com a

concepção do que seria Educação Integral realizada em jornada ampliada, pois “não

foram pensados espaços alternativos, cujas atividades não interferissem em outras que

lhe fossem próximas”, foi identificada ainda, a resistência, por parte dos gestores

escolares, na implementação da jornada ampliada, tal resistência se pauta nas seguintes

justificativas: 1) adequação das crianças à alimentação escolar; 2) espaço físico

inadequado; 3) ampliação da jornada de maneira compulsória; e 4) cansaço dos alunos,

gerando pouca aprendizagem. Por outro lado, pais e professores puderam perceber

aspectos positivos na Educação de Tempo Integral “relacionadas à sociabilidade e à

aprendizagem mais significativa para as crianças”. Por fim, nas escolas pesquisadas no

município de Olímpia (SP), o principal desafio identificado para a implementação de

uma Educação em Tempo Integral foi “a ausência de uma formação continuada que

92

solidifique conhecimentos e habilidades dos professores e, ainda, no que tange à

profissionalização, de uma situação que transforme os contratos anuais e temporários

em contratos efetivos” (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 94-5, 98).

No município de São Paulo, à época da pesquisa, todas as escolas ofereciam

atividades no contraturno escolar a partir dos programas “Jornada Ampliada” e “São

Paulo é uma escola”, as atividades se davam tanto no espaço escolar, quanto em outros

espaços, atendendo aos alunos dos anos iniciais e finais do ensino fundamental. A

equipe de pesquisa selecionou o Centro de Educação Unificada (CEU) Caminho do Mar

(Zona Sul) e a Escola Municipal Carlos Pasquale (Zona Leste) para conhecer as suas

experiências na implementação de jornada escolar ampliada (BRASIL/MEC/SECAD,

2010, p. 101, 105). Nas duas instituições, os fatores tempo e espaço físico também

colocam-se como desafios para a implementação de uma Educação de Tempo Integral,

a equipe verificou que

mesmo adequando os espaços existentes, nem sempre as instituições

conseguem viabilizar as situações de aprendizagem que pretendem a partir

dos ambientes construídos e/ou (re)adaptados, o que não impede as tentativas

várias de realização do melhor trabalho. Vale destacar que a diversidade dos

locais visitados coloca em destaque o engajamento e a articulação da equipe

para além da disponibilidade espacial (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 101,

108).

Nos municípios mais afastados dos grandes centros populacionais e financeiros

do país, a implementação da Educação de Tempo Integral, encontra maiores obstáculos,

como é o caso de Santarém (PA), um dos municípios selecionadas pela equipe de

pesquisa, neste munícipio as experiências de ampliação do tempo no ambiente escolar

não tem destaque, de todo o modo, nos projetos relacionados à ampliação do tempo

escolar, a equipe identificou como sendo o maior problema a ser enfrentado na região,

os baixos salários dos educadores dos Projetos e ainda, a ausência de “normatização ou

regulamentação das experiências vividas” (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 20). Em

Palmas (TO), município em que havia “uma proposta de educação integral considerada

referência no Brasil, já registrada em algumas publicações e atendendo um grande

número de alunos”, os gestores, pais e alunos aprovam a ampliação da jornada escolar,

já os professores se queixaram do “cansaço pelo trabalho excessivo e o tempo de

permanência na escola”, pois embora tenham “horário para planejamento, ainda levam

tarefas para a casa”, de todo modo, estas manifestações não significam que os

professores rejeitem o projeto (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 22-3).

93

Em Recife (PE) um coordenador do Programa Mais Educação demonstrou uma

significativa repercussão do PME na região, pois até a sua implementação alguns

projetos estavam “semidesativados” e sem infraestrutura, neste sentido “o PME teria

sido uma porta de entrada para que eles fossem relacionados à proposta pedagógica da

secretaria e chegassem às escolas por uma outra via”, de todo modo, os problemas de

espaço também foram identificados, assim como a insuficiência de formação dos

educadores, monitores e tutores, e ainda a ausência de planejamento das atividades, que

resulta em um constante “regime de urgência em que tudo é sempre feito”. No caso da

insuficiência dos espaços, foi observado que as parcerias firmadas, com entidades

religiosas, para enfrentar este problema se deram a partir de relações pessoais dos

tutores e monitores. A equipe de pesquisa considerou a relação com entidades religiosas

como um ponto de atenção, pois é uma prática frequente e não possuiu nenhuma espécie

de normatização. No caso da contratação, por parte da Secretaria de Educação, de

monitores e tutores, os pesquisadores também pontuaram a ausência de critérios no

processo seletivo, foi identificado que esses profissionais não necessariamente “estão

ligados ao bairro da escola em que atuam e nem sempre trazem consigo uma proposta

educativa [...] e salvo exceções, não preenchem os requisitos de parceiros”

(BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 28-31). De todo modo

a chegada de recursos às unidades escolares em Recife, através do PME,

serviu ao atendimento de necessidades reais, seja de pessoal ou de material, e

representou um fortalecimento para as escolas envolvidas. De acordo com os

profissionais que atuam nas escolas, a escolha dos alunos obedeceu

estritamente aos critérios contidos em documento do MEC

(BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 32).

A Secretaria Municipal de Educação de Natal (RN) aderiu ao PME como uma

estratégia “para colocar em prática o que já vinha sendo estudado e discutido” quanto à

implementação de uma Educação em Tempo Integral, no entanto os pesquisadores

identificaram dificuldades no âmbito das parcerias, relativas aos espaços para a

realização das atividades do contraturno, necessárias para implementação do Programa

na região, entre elas estão 1) “grande parte das escolas municipais está localizada em

áreas com pouquíssimos ou cujos equipamentos públicos integrantes do bairro carecem

de conservação”; e 2) não há “benefícios financeiros aos parceiros, os quais, em geral,

tendem a ter aumento de despesas”. (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 39). Em todas as

entrevistas realizadas, foram identificados avanços na educação local,

94

foram mencionados aspectos associados à melhoria da aprendizagem e a

inclusão social dos alunos. Melhoria no rendimento escolar, aumento da

concentração, da autoestima, resgate do prazer de estar na escola, aumento da

colaboração nos trabalhos em grupo, aproximação da comunidade e das

famílias à escola, melhoria da disciplina dos alunos, redução da violência nas

escolas (BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 40).

No estado do Ceará as iniciativas de implementação de Educação em Tempo

Integral, tem se consolidado como uma política municipal, financiada pelos próprios

municípios, embora não esteja normatizada em lei orgânica. As atividades, realizadas no

contraturno, são desenvolvidas por professores efetivos e por monitores, no entanto são

os professores a “peça-chave” para o sucesso da ampliação da jornada escolar, neste

sentido, os professores são remunerados pelo estudo necessário para o projeto assim

como, para o planejamento escolar. Segundo a Secretaria de Educação é indispensável

“o professor aceitar, o professor querer, o professor se sentir parte daquele sucesso [...]

determinados lugares-comuns que são repetidos reiteradamente pelos professores têm

que ser desconstruídos”. A equipe de pesquisa identificou o “orgulho” dos professores

que atuam na jornada ampliada, quando observaram “os painéis de fotografias, as

apresentações, o campeonato, a fala das professoras e coordenadoras e o incansável

trabalho das equipes”. A Secretaria de Educação não pretende realizar um “projeto nota

dez”, ela reconhece que faltam recursos, espaços e profissionais, no entanto, o que

importa é o processo de aprendizagem das crianças das classes populares

(BRASIL/MEC/SECAD, 2010, p. 50-3).

O Ministério da Educação entende que o PME, embora seja uma realidade,

aceita que tudo em educação, e assim o próprio programa, se dá de maneira progressiva,

com a participação de educadores, educandos, artistas, atletas, equipes de

saúde e da área ambiental, cientistas, gestores das áreas sociais, enfim, com

todos aqueles que, pessoal e profissionalmente, dedicam-se à tarefa de

garantir os direitos de nossas crianças, adolescentes e jovens.

(BRASIL/MEC/SECAD, 2009, p. 7).

O processo do Programa Mais Educação, desde seus antecedentes até a sua

formulação, pode ser compreendido dentro de uma expectativa favorável quanto à sua

eficácia (resultados), isto do ponto de vista quantitativo e da racionalidade burocrática.

No entanto, o observado em algumas experiências de implementação, descritas acima,

revelou o descompasso entre o desenho e a execução, o que de uma perspectiva

racional, impacta diretamente a própria eficácia da política e consequentemente a sua

efetividade (transformação/impacto social). Os destaques deste descompasso estão: 1)

95

na significação da Educação Integral proposta; 2) na infraestrutura disponível nas

diversas regiões do Brasil; e 3) na questão dos professores. Este último item se coloca

como o mais relevante para esta dissertação, uma vez que entendo este ator, como o

principal implementador, ainda que ele receba orientações e autorizações da direção

escolar, é ele o responsável pela tarefa concreta da execução da política. O professor é

ainda, o que mais aparece nas pesquisas descritas neste capítulo, no que diz respeito à

sobrecarga de trabalho e respectivo cansaço, baixos salários, desprofissionalização de

sua função, fraca formação, ausência de capacitação continuada, pouca ou nenhuma

experiência em Educação Integral e portanto baixa compreensão da política a ser

executada. Neste sentido, é este ator que conheceremos no próximo capítulo.

96

4. Os professores, sua formação, a relação com o serviço público e

considerações sobre sua relação com o Programa Mais Educação

A categoria dos professores de “primeiras letras” foi desvalorizada até o final do

Império e era formada pelas categorias mais pobres da população. “Nossos mestres são

o alvo do menosprezo, os párias na sociedade dos empregos públicos”, esta frase

proferida pelo inspetor-geral da Instrução Pública de São Paulo, data de 1864

(MARCÍLIO, 2005, p. 72), estes mestres, docentes nas Escolas Normais, tinham como

responsabilidade apenas a transmissão de conteúdos determinados pelo Estado, questões

de caráter didático-pedagógico não ganharam nenhum destaque na formação dos

professores até os anos 1890, após este período e até 1932, a questão didática e

pedagógica ganhou algum destaque na formação dos docentes das Escolas Normais do

Estado de São Paulo e ainda houve a tentativa de expandir esta atenção para os outros

estados do país, no entanto a marca conteudista, na formação docente, não perdeu o seu

status, de maneira a ofuscar as novas intenções dos métodos educacionais.

Os Institutos de Educação implantados em Brasília (1932) e em São Paulo

(1933), por Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, respectivamente, trouxe novamente

a questão pedagógica para a formação docente, no entanto, ainda restrita ao âmbito das

duas referidas localidades. A implantação dos cursos de pedagogia e licenciatura ocorre

no período de 1939 a 1971, sendo expandida para todo o território nacional com a Lei

Orgânica do Ensino Normal (1946), no entanto, nestes cursos ainda continuou sendo

desprezado o aspecto didático-pedagógico, este “em lugar de se constituir em um novo

modelo a impregnar todo o processo da formação docente, foi incorporado sob a égide

do modelo dos conteúdos culturais-cognitivos”. De 1971 a 1981 (período sob o regime

militar), a exigência para a docência na educação básica foi reduzida a uma habilitação

de 2º grau – a formação em Magistério –, “configurando um quadro de precariedade

bastante preocupante”, tal quadro chamou a atenção do Estado e este lançou, em 1982,

os Centros de Formação e Aprimoramento do Magistério, o que também não gerou

resultados satisfatórios (SAVIANI, 2009, p. 144-5, 147).

Nos anos 1980, paralelamente à ineficiência da formação dos docentes, foi

desencadeado o movimento pela reformulação dos cursos de Pedagogia e Licenciatura,

cujo princípio era o da “docência como a base da identidade profissional de todos os

profissionais da educação” (SILVA apud SAVIANI, 2009, p. 148). Este movimento,

97

somado à redemocratização do país, em 1985, gerou nos educadores a ideia de que o

problema da Educação teria melhores chances de entrar na agenda governamental,

porém mesmo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, o

equacionamento do problema educacional continuou a frustrar aqueles que por ele se

dedicaram. A política educacional sinalizada pela LDB, quanto à formação dos

docentes, tendeu a um nivelamento por baixo: “os institutos superiores de educação

emergem como instituições de nível superior de segunda categoria, provendo uma

formação mais aligeirada, mais barata, por meio de cursos de curta duração” (SAVIANI

apud SAVIANI, 2009, p. 148). As significações da formação docente para o ensino

básico, descritas acima, vão até os anos 2006, último ano do período analisado por

Saviani (2009), e o Programa Mais Educação é criado em 2007.

Nos anos 2012 as greves dos professores públicos chegaram a atingir vinte dos

vinte e sete estados brasileiros (UOL, 2012). Em março de 2015, a greve dos

professores públicos atingiu cinco estados brasileiros (OESP, 2015) e em 12/06/2015, a

greve dos professores do estado de São Paulo completou noventa e dois dias,

configurando-se como a mais longa de toda a história das greves no estado (EBC, 2015)

desde 1978, data da primeira greve (APEOESP). Farenzena e Luce (2014, p. 211)

destacam que embora, os investimentos em Educação têm sido expressivos, assim como

a oferta de vagas para os educandos, ainda persiste o “constrangimento das condições de

trabalho” dos professores, que vão desde os déficits de sua formação até a precariedade

de infraestrutura material e tecnológica, esta colocação é reforçada com as

reivindicações dos professores nessa última greve, segundo a APEOESP – Sindicato

dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, as reivindicações foram as

seguintes: 1º melhores salários; 2º melhores condições de trabalho; 3º melhores

condições de infraestrutura nas escolas e melhoria das condições de ensino-

aprendizagem para os estudantes, como bibliotecas, laboratórios, espaços multiuso,

salas-ambiente, laboratórios de informática e outras; 4º mais participação de

professores, pais e estudantes na vida da escola “queremos conselhos de escola

democráticos, atuantes e participativos” (APEOESP, 2015).

Dalila Andrade Oliveira já apontava em 2004 a precarização do trabalhado

docente vinculada às reformas educacionais ocorridas a partir dos anos 1990 nos países

da América Latina por conta do “imperativo da globalização”. Se de um lado as

reformas educacionais dos anos 1960, tinham como objetivo primeiro a ampliação do

98

acesso às escola, o que resultaria na redução das desigualdades sociais e assim em uma

mobilidade social dos educandos, as reformas de 1990, de outro lado, tiveram como

eixo principal “a educação para a equidade social”, para a autora essa mudança de

objetivos impactou a gestão da educação pública, que necessitou inserir em sua pauta a

formação de indivíduos para o mercado de trabalho, dito de outro modo “a educação

geral é tomada como requisito indispensável ao emprego formal e regulamentado”, essa

forma de conceber a Educação seria uma forma de atender às orientações da

Organização das Nações Unidades (ONU) para os países latino-americanos que

deviriam entender a Educação como o meio para a “transformação produtiva com

equidade”. A consequência imediata desse entendimento teria sido a reconfiguração dos

aspectos físicos e organizacionais nas redes de ensino, que foram obrigadas a inserir em

sua dinâmica cotidiana os “conceitos de produtividade, eficácia, excelência e eficiência,

importando, mais uma vez, das teorias administrativas as orientações para o campo

pedagógico” (OLIVEIRA, 2004, p. 1129-0).

As marcas mais profundas das reformas a partir dos anos 1990, de acordo com

os compromissos firmados na Conferência Mundial sobre Educação para Todos,

realizada pela Unesco em março de 1990, estão na padronização e massificação dos

processos administrativos e pedagógicos. No campo da gestão escolar, o modelo

adotado teria sido o da “combinação de formas de planejamento e controle central na

formulação de políticas, associado à descentralização administrativa na implementação

dessas políticas”. É possível perceber, na análise de Oliveira (2004), nuances das linhas

mestras do Programa Mais Educação, que seria criado em 2007, a autora percebe que

para atender aos objetivos da Unesco para a Educação nos países com altos índices de

desigualdade social, seria necessário elencar na formulação de políticas públicas

educacionais apelos “ao voluntarismo e ao comunitarismo”, uma estratégica que

possibilitaria “arranjos locais como a complementação orçamentária com recursos da

própria comunidade assistida e de parcerias”. No campo da educação básica, a

consequência para os professores estaria na sobrecarga e reestruturação do seu trabalho

e ainda como protagonistas do sucesso ou insucesso dos alunos, das políticas

educacionais, da escola e do sistema educacional, o que traria para os professores,

segundo a autora, “constrangimentos” relacionados aos limites de sua formação com o

exigido pela administração pública. (OLIVEIRA, 2004, 1132).

99

A combinação de exigências e constrangimentos geraria nos docentes “um

sentimento de desprofissionalização, de perda de identidade profissional, da constatação

de que ensinar às vezes não é o mais importante (NORONHA apud OLIVEIRA, 2004,

p. 1132). Sampaio e Marin (2004, p. 1204) também consideram os constrangimentos

dos professores relacionados à sua formação, que somada às condições materiais do

ambiente escolar e à focalização no atendimento às metas das políticas públicas,

resultam na precarização de seu trabalho. As autoras utilizam como exemplo o currículo

“prescrito” alinhado às prioridades internacionais, tal como também verificado por

Oliveira (2004), esse currículo também importa teorias administrativas para o campo

pedagógico, nele estão articulados “avaliações externas, que classificam as escolas e as

obrigam a redirecionar seu trabalho pedagógico” (SAMPAIO e MARIN, 2004, p.

1205). Para a compreensão dessas práticas curriculares, as autoras convidam para a

análise dos elementos que cercam o trabalho docente: 1) Necessidade de escolaridade e

de professores; 2) Salário; e 3) Condições de trabalho.

No elemento “Necessidade de escolaridade e de professores”, as autoras

apontam a dificuldade de transformar o que aprenderam em sua graduação com os

conteúdos a serem ensinados para os educandos, o que faz com que a experiência

docente seja o fator mais relevante na prática em sala de aula. O elemento “Salário”,

seria a questão mais visível na precarização do trabalho docente, pois significaria a

“pauperização da vida pessoal nas suas relações entre vida e trabalho, sobretudo no que

tange ao acesso a bens culturais”, as autoras relacionam a dificuldade de acesso aos

bens culturais com a própria atuação do docente em sala de aula. O não acesso, ou o

acesso precário a esses bens, reduz os momentos de lazer, a sua atualização e o contato

com o que ocorre na esfera cultural e no mundo, “o processo de realimentação quanto a

informações, em geral, fica restrito à frequência a cursos de especialização”, os

professores pesquisados pelas autoras disseram manter-se atualizados através da

televisão, isto “quando há tempo” (SAMPAIO e MARIN, 2004, p. 1209-11).

Sampaio e Marin (2004, p. 1212-6), quando analisam o elemento “Condições de

trabalho”, têm o cuidado de dividi-lo em carga horária de trabalho e de ensino; tamanho

das turmas; razão professor/alunos; e rotatividade/itinerância dos professores pelas

escolas. A carga horária, estaria diretamente relacionada ao salário, os professores

tendem a lecionar em diversas escolas, com características diversas (escolas privadas,

públicas, municipais e estaduais) de modo a terem um rendimento mensal que possa

100

mantê-los. As turmas, em geral, são superlotadas (principalmente nos locais em que

ocorreu a reorganização das escolas públicas), este fator também é fonte de queixa

constante dos professores, pois além da dificuldade no ensino/aprendizagem, ainda

resulta na evasão dos alunos. A “razão professor/alunos” está relacionada diretamente

com o tamanho das turmas, em 1999 a razão professor/alunos no ensino fundamental no

Brasil era de 28,9, sendo que a média obtida pelos países da OCDE (Organização para a

Cooperação e Desenvolvimento Econômico) era de 17. O elemento

Rotatividade/itinerância é tratado pelas autoras, como um fenômeno da educação

brasileira, a rotatividade dos professores pode ocorrer de um ano para outro “ou, às

vezes, num mesmo ano, e da itinerância deles por várias escolas, ao mesmo tempo, ao

longo do ano”, fatores que contribuem para o seu desgaste e consequente precarização

do seu trabalho. Por fim, as autoras entendem que a precarização do trabalho docente

está inserida no currículo, nele “explicita-se como se pensa e se avalia a sociedade,

quais modelos humanos são apontados ou desvalorizados, quais crenças são respeitadas,

como se vivem as diferenças, o que ainda vale a pena na escola”.

Entre 2012 e 2013 a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem

(TALIS – Teaching and Learning International Survey), coordenada pela Organização

para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), investigou o ambiente de

ensino e aprendizagem em escolas de educação básica de 34 países, no Brasil a pesquisa

foi organizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira (INEP), para a qual foram entrevistados 14.291 professores, distribuídos em

escolas dos níveis federal, estadual e municipal e de acordo com o INEP “os resultados

relativos ao Brasil representam todas as escolas brasileiras desse nível educacional”. A

pesquisa revelou que 71% dos professores no Brasil são mulheres, têm, em média, 39

anos de idade (os professores das redes privadas, tendem a ser mais jovens que os das

rede pública), 96% deles concluíram algum curso de educação superior36, possuem, em

média, 14 anos de experiência como professor, 77% têm contrato permanente e 40%

estão empregados em tempo integral (BRASIL/MEC/INEP, 2014, p. 9-10).

De acordo com a pesquisa TALIS, 19,8% dos professores utilizam grande parte

do seu tempo mantendo a ordem em sala de aula, esta taxa é a maior de todos os países

36 Embora 96% dos professores tenham curso superior, verificou-se que há grande variação daqueles das

redes municipal e estadual e esta variação é acentuada quando considera-se as regiões do país. “Por exemplo, enquanto no Distrito Federal e no Paraná não há professores sem nível superior, no estado da Bahia, 19% dos docentes não tem formação em nível superior, seguido por Roraima e Maranhão (16%)” (BRASIL/MEC/INEP, 2014, p. 12).

101

pesquisados, assim como o tempo utilizado para o cumprimento das tarefas

administrativas em sala de aula – registro de frequência, distribuição de informativos e

formulários – deste modo, os professores brasileiros são aqueles que “dedicam o menor

tempo médio em sala de aula com ensino e aprendizagem de fato”. Quanto aos

componentes de sua formação, apenas 51% dos professores pesquisados afirmaram que

seus cursos contemplaram a pedagogia ou a didática de todas as disciplinas. Na temática

“Indução”37, verificou-se a ausência de políticas para os professores recém formados, a

consequência dessa ausência está na baixa retenção de docentes no início de suas

carreiras, menos de um terço dos professores brasileiros participaram de programas

dessa temática e este dado é um dos menores em todos os países pesquisados

(BRASIL/MEC/INEP, 2014, p. 18-20).

O relatório da OCDE (2014) para o Brasil, referente à TALIS, destacou, como

um dos principais resultados, que os professores brasileiros são aqueles que mais

trabalham, dentro do universo pesquisado. Os professores entrevistados relataram que

sua jornada semanal é de 25 horas, sendo que a média da TALIS foi de 19 horas

semanais. A OCDE destacou ainda, que no Brasil os professores utilizam 20% de seu

“tempo de aula mantendo a ordem em sala”. Dessa forma, no Brasil, menos de 70% do

tempo de aula é gasto com ensino e aprendizagem de fato (OECD, 2014, p. 1). Esse

relatório não contemplou a questão da remuneração docente, mas esse item foi

levantado pela Secretaria do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social

(SEDES) no relatório As desigualdades na escolarização no Brasil (BRASIL/SEDES,

2014, p. 13, 24), a Secretaria reconhece que a remuneração dos professores da educação

básica tem melhorado lentamente, no entanto, o destaque principal é a diferença entre as

remunerações dos profissionais com ensino superior. O salário médio do professor

brasileiro “foi equivalente a 51,7% do rendimento médio obtido pelos demais

profissionais com nível superior completo” e ainda que, embora exista um piso salarial

para a categoria, firmado em 2008, há estados e municípios que não remuneram seus

professores de acordo com este piso, o que resulta, segundo o relatório da SEDES, para

além da persistência da desigualdade salarial, a “desvalorização social à qual vem sendo

submetida essa categoria, tanto por parte do Estado quanto pela comunidade”. Por fim, a

37 “Um ‘programa de indução’ é definido como uma gama de atividades estruturadas para dar apoio à

introdução do professor em sua profissão, por exemplo, trabalho em pares com outros professores novatos, tutoria com professores mais experientes, etc”. (BRASIL/MEC/INEP, 2014, p. 20).

102

Secretaria reconhece como “grave” a situação de precariedade do vínculo profissional

do docente, quando em 2012 o Censo Escolar levantou que “cerca de 30% dos

professores da rede estadual são temporários, ou seja, não são concursados, nem sequer

CLT. E, em pelo menos 10 estados, o percentual de professores com contrato

temporário se aproxima ou supera os 50%.”.

Embora exista uma abundante produção acadêmica que desenvolveu e

desenvolve modelos educacionais, considerando que esta produção é fundamental e

necessária para a problematização e desenvolvimento da educação formal e pública, e

ainda, sem diminuir os esforços dos formuladores de Políticas Públicas, estas só se

realizam, enquanto ação concreta na esfera do Estado, através do servidor público, este

representa os recursos humanos estatais, “o interesse público, o interesse daquilo que é

coletivo” (FRANÇA, 1994, p. 199). No caso da Educação, a ponta final da

implementação de uma Política Pública (ação do Estado), se dá pelo trabalho do

professor e este, necessariamente, deve legitimar o que foi formulado pelas esferas

superiores do Estado, é este servidor que já foi o “alvo do menosprezo, os párias na

sociedade dos empregos públicos”, que teve uma política precária para sua formação e

que ainda precisa reivindicar por questões mínimas de trabalho, como salário e

infraestrutura, é este servidor que é convocado a ser em “tudo devotado ao Estado”

(HEGEL apud FRANÇA, 1994, p. 200), “o Estado, no final das contas, são os seus

funcionários” (TEIXEIRA, 1977, p. 111) seria sobre este funcionário que estaria a

responsabilidade da implementação do Programa Mais Educação, nas escolas que a ele

aderiram.

Em 1956, no artigo A administração pública brasileira e a educação, Anísio

Teixeira (1977, p. 118-21) aborda a relação entre professor e Estado, demonstrando suas

críticas quanto à organização impessoal que permeia essa relação, seriam os professores

como hóspedes da esfera estatal, “mais ou menos passageiros”. Nessa relação, o mais

grave seria a desmoralização generalizada dos serviços, encorajando “cada vez mais a

sua progressiva desagregação”. Quanto aos órgãos que administram a Educação, Anísio

revela que estes a transformaram em uma “atividade estritamente controlada por leis e

regulamentos, como resultado, a Educação “que é um processo de cultura individual,

passou a ser um processo formal, de mero cumprimento de certas condições externas,

que se comprova mediante documentação adequada”. Essas críticas, apresentadas há

103

sessenta anos, ainda estão ativas e nas falas das duas entrevistas de pré-campo para esta

dissertação.

4.1 Malu e Rosa: a Docência, a Escola e o Programa Mais Educação

Duas mulheres docentes no ensino fundamental em escolas da rede municipal,

residentes no bairro Vila Brasilândia (Zona Norte da cidade de São Paulo), bairro no

qual também trabalham, são mulheres casadas e sem filhos, com nível superior de

ensino e com diversos cursos de extensão e especialização na área educacional; a

primeira entrevistada, A1, se autodeclara Parda, tem 33 anos de idade, é docente há 8

anos, sua jornada de trabalho semanal oficial é de 25 horas e seu rendimento mensal é

de R$ 3.500,00, a segunda entrevistada, A2, se autodeclara Negra, tem 35 anos de

idade, é docente há 15 anos, sua jornada média de trabalho oficial semanal é de 50

horas, ela trabalha em duas escolas, em uma como professora e em outra como

coordenadora pedagógica, seu rendimento mensal é de R$ 4.500,00; foram essas duas

mulheres que, gentilmente, relataram o que é o ser docente para elas, como significam a

Educação e a Escola, o que sabem sobre legislação e políticas educacionais, o que

pensam sobre a Educação Integral e o Programa Mais Educação, e como se percebem

nestes eixos.

O ser docente

Gosto pelo conhecimento contínuo e o desenvolvimento do ser humano, foram

as duas maiores motivações para a escolha da docência. A experiência de observar o

processo de aprendizagem dos alunos lhes proporciona muita satisfação, desde aquele

aluno que não sabia escrever o próprio nome até o contato com história e a geografia,

por exemplo, o acesso a esses temas e a utilização de novas linguagens lhes emociona.

A1, teve como exemplo de professor um familiar, um primo do interior da Bahia, que

foi um “excelente” professor sem nível superior. Já A2 sempre quis ser professora,

desde criança, confessa ser apaixonada pela profissão embora reconheça o desgaste

desse ofício.

Para as duas entrevistadas, a formação acadêmica (graduação) não é o suficiente

para o exercício da docência, são necessários, além da troca de experiência com os

colegas veteranos, a formação em cursos de extensão e especialização. A graduação de

104

A1, em universidade pública, auxiliou no conhecimento sobre o que é escola, por

exemplo, mas a prática da sala de aula não é ensinada nessa formação, tal prática é

aprendida através da discussão com outros professores e no “chão da sala” mesmo. A1,

dá como exemplo a questão da Literatura, disciplina que não foi trabalhada em sua

graduação, segundo ela, é possível que o programa do curso imaginasse que os

graduandos já a conhecesse, mas ela como ex-aluna de escola pública de periferia não

havia tido contato com a Literatura, A1 só foi saber sobre Literatura conversando com

outros professores, fazendo pesquisas e cursos de extensão que são realizados com

muito esforço financeiro, pois seus recursos são baixos.

A2 acorda às 05h30 todos os dias, sai de casa por volta das 06h30 e retorna às

23h00, em alguns dias da semana goza de 1 hora de descanso que utiliza para ir ao

banco ou comprar mantimentos para sua casa, que fica perto das duas escolas nas quais

trabalha. Como coordenadora pedagógica trabalha mais com a parte burocrática, a

coordenação pedagógica de fato fica para quando “sobra tempo”, uma vez que a

burocracia toma grande parte de seu expediente, embora exista uma secretária, esta está

sobrecarregada, “falta mais mão de obra para a burocracia do que para pensar a escola”,

sendo assim, o trabalho pedagógico ocupa os horários de descanso e os finais de

semana.

No início de sua carreira, A2 foi professora em escola particular e essa

experiência lhe mostrou o quanto a educação nesse espaço, segundo sua visão, é

limitadora. A2 reconhece-se como uma “idealista”, seguidora de Paulo Freie, e este

idealismo em conjunto com a corrente paulofreiriana não é possível dentro de uma

escola particular, para ela, apenas a escola pública viabiliza esse tipo de prática, ela dá

como exemplo a questão da “consciência negra”, segundo ela, é quase impossível falar

sobre isso na rede particular. Seu ideal, como professora e coordenadora pedagógica, é

“ajudar as pessoas que estão na condição de oprimidas, fazendo com que elas

compreendam essa condição, este idealismo é um trabalho de “formiguinha”, nem todo

mundo está a fim”.

Para A2, tanto a formação acadêmica, quanto a troca de experiências com outros

professores são importantes para o desenvolvimento da docência, mas o que mais conta

são os cursos de extensão ou especialização, eles permitem “enxergar coisas que a

prática do cotidiano não permite, como a questão das questões étnico raciais, na prática

105

cotidiana fica muito no senso comum, conforme fui estudando mudou muito a prática”,

na graduação, A2, diz que não teve contato com este tema, por exemplo, “o fazer

pedagógico é melhorado com os cursos e os cursos que faço, eu compartilho com os

colegas que não podem fazer”.

A Educação e a Escola

A1 significa a Educação como o acesso ao desenvolvimento, ao lidar com o

conhecimento, o “pensar o mundo, pensar a gente, ela está no dia a dia desde quando a

criança nasce, no desenvolvimento das habilidades motoras, a fala, depois vem a escola

com a escrita, a leitura. Educar também é ensinar as regras sociais”. O ensinar, para A1,

é um processo, é a elaboração de método para transmitir alguma coisa que o outro não

sabe. Quanto questionada sobre os papéis da Educação e da Escola, A1 permanece

calada por alguns segundos, pede para que a pergunta seja repetida, coça a cabeça, sorri,

repete a pergunta em voz alta, sorri novamente, fica em silêncio, abaixa a cabeça,

respira fundo e inicia a sua resposta:

Eu acho que pensar a educação de uma forma mais ampla é o

desenvolvimento mesmo, é cultural, motor, intelectual, artístico, é das

pessoas, o desenvolvimento da linguagem, é tudo. Pensando de uma forma

geral, é algo para vida, é para facilitar esse nosso tempo aqui na terra. Ajudar

as pessoas a ajudarem o máximo de pessoas. É poder sentir mais que ela está

participando da vida, entender melhor o mundo, ler, escrever, enfim. A escola

é fundamental nisso tudo, por isso ela tem que melhorar. Sem ela, muitas

pessoas, muitas crianças teriam insucesso. A escola faz com que as pessoas

possam acompanhar melhor o mundo, entender melhor o mundo. O papel da

escola é inserir a pessoa nesse mundo.

No processo educacional, A1 se significa como “substituível” um “quase nada”,

ela percebe a rede pública dessa forma, pois é normal mudar de escola, assumir outra

turma, ficar de licença, quando essas alterações ocorrem, uma outra professora fica em

seu lugar, sem que os motivos que levaram a essas mudanças sejam pensados e

questionados, tudo fica do mesmo jeito,

Não dão voz ao professor, o professor não expõe o que ele faz, não existem

espaços para você expor o que você faz, para você compartilhar dificuldades,

então nesse sentido, de quem sou eu dentro disso, eu me sinto quase nada, eu

tenho esse ponto de vista, de que é esse sistema e de quem eu sou, então eu

me sinto substituível, sinto que o professor é jogado em um esquemão ali,

tantas horas por semana, tantos alunos, segue esse currículo, então, parece

que é um pouco isso, tanto faz.

Por outro lado, A1 se sente valorizada por parte dos alunos e de seus pais

106

Esse papo de que o pai pobre, o pai da periferia, a mãe da periferia para eles

tanto faz, que eles não estão nem aí, tanto faz o filho aprender ou não, é

mentira, pelo contrário, eu já tive abraços assim calorosos de uma mãezinha

que veio falar ‘muito obrigada porque eu vi minha filha tendo interesse pela

leitura, animada para ir à escola’. Então, desse ponto de vista mais íntimo, eu

me sinto bem importante, bem valorizada.

A1 significa o papel do professor na escola como uma peça de um quebra

cabeça, uma peça importante dentro do sistema educacional, o fato de haver muitos

alunos faz com que a rotina da escola seja “bem acelerada”, neste sentido, “se o

professor não está ali e não tem alguém para substituí-lo, o ambiente se torna um pouco

caótico e complicado”, o papel do professor para A1, também pode ser significado

como o de um “agente de diálogo”, embora não existam muitos momentos para isso,

em função da própria rotina acelerada da escola e da rotina do professor que costuma

lecionar em mais de uma instituição.

Quanto ao ambiente de trabalho, de maneira geral, ele é agradável, embora

existam os contratempos relacionados ao “corpo mole” que alguns funcionários,

inclusive professores, fazem, como exemplo, a entrevistada cita as ocorrências de

aparelhos instrucionais que não funcionam ou de alunos que precisam de ajuda, essas

ocorrências são urgentes, e muitas vezes não são atendidas, provavelmente em função

da insuficiência de recursos humanos relacionado ao grande número de alunos na escola

e por sala. A1 tem 35 alunos em sua turma em uma pequena sala com poucos recursos,

o que torna o ambiente “muito desgastante” tanto para ela, quanto para os alunos, um

desgaste físico e mental, a entrevistada ainda cita o exemplo da arquitetura da escola na

qual leciona,

outra coisa é o excesso de barulho, eu não sei porque a escola que eu trabalho

foi projetada com a quadra esportiva ao lado da janela. É um absurdo, é uma

coisa mínima a ser percebida por quem estaria dentro de um ambiente

escolar. Foi feito sem nenhuma consulta. Essa construção é totalmente

inviável no ambiente escolar. Você vai ter um espaço com setenta crianças

com atividades livres, uma atividade corporal, brincando, gritando, e você

com a sala ao lado.

O apoio pedagógico na escola na qual A1 leciona é quase inexistente, e ela

reconhece que não se trata da “má vontade” das coordenadoras (são 3), pois elas são

totalmente absorvidas pelo atendimento à burocracia,

Elas não conseguem porque estão com demandas burocráticas, muita coisa,

muita mesmo, a gente percebe, é muita coisa para preencher, por exemplo,

campanhas de saúde que tem na escola que demanda esse tempo da

107

coordenadora que não era para isso, então quando o professor fala ‘absurdo

vacinação na escola’, a gente não tá querendo que as crianças deixem de ser

vacinadas ou a gente acha absurdo a vacina ser no espaço escolar, não é isso,

é usar os funcionários, os recursos humanos que você tem na escola para

organizar isso. Tirar o aluno da sua aula, para fazer isso, isso não é pouca

coisa. Você está dando aula bate na porta e fala ‘agora é a vacinação’, ‘agora

é o uniforme’, ‘agora é o não sei o que’.

A1 mudaria muita coisa na Escola, “bastante coisa”, desde o número de crianças

por turma (o ideal seriam 20) até o acesso a vídeos e à internet. A1 conta que “é

impressionante, você arrisca ali dez minutos para explicar alguma coisa depois de uma

leitura, quando você pede atenção nem a metade está atenta, mas se pega um vídeo do

mesmo assunto, nossa, eles prestam atenção em detalhes que você não percebeu”. As

mudanças necessárias para a Educação, caso A1 tivesse o poder de executa-las,

começaria pelo currículo que é “muito, muito fechado, muito pensado por uma minoria

brasileira, sabe? É um currículo que dialoga pouco com a vida das crianças”, A1

compara o conteúdo do currículo com o que é necessário para ter uma boa pontuação no

ENEM, por exemplo, “as provas do ENEM estão baseadas em interpretação, diálogo,

dia a dia, violência doméstica, e o currículo escolar não contempla esses temas, de

maneira geral, o currículo é ‘conservador’”. A1 ainda faz um desafio,

Eu faço um desafio para você que está estudando, pega o livro de geografia e

folheia, não tem imagens da periferia, se ele tá falando de cidade, ele está

falando de vegetação, aí ele mostra várias paisagens, mostra a floresta

amazônica, os pampas, o cerrado, as grandes cidades, e aí é assim, a maior

parte das pessoas mora na periferia e não mostra [...] você fica amarrado

enquanto professor, porque você tem pouco recurso para trabalhar.

A1 imprime outras imagens em sua impressora particular para levar para os

alunos, mas é um recurso dispendioso que ela não poder arcar a “toda hora”, e o livro

didático que é comprado pelo Estado “é muito caro, então eu tenho que usar alguma

coisa dele, eu tenho que usar algumas coisas, mas tenho que complementar se eu quiser

trabalhar além do currículo que está colocado”.

A2 percebe que a dinâmica da escola gira em torno de datas comemorativas, e

quando questionada sobre o que significa a Educação, A2 ficou em silêncio por alguns

segundos, que foi quebrado pela frase “É difícil pensar nisso” e recorre a Paulo Freire,

que ensinou que “não existe a posição privilegiada do professor”, no entanto o professor

“é um facilitador para informações que não seriam alcançadas fora da escola”, daí a

importância dos dois na vida das crianças: Professores e a Escola. Mas, após mais

alguns segundos de reflexão, A2 confessa que “isso é tudo ideal, na realidade é uma

108

educação conteudista, uma educação bancária”. A sua importância no processo

educacional começa com a quebra de estereótipos que os alunos já aprenderam em casa,

por exemplo, como questões de raça e opção sexual. Com a participação dos alunos,

através de projetos, ela se vê como uma desmistificadora de estereótipos, pois essa coisa

de “enquadrar as pessoas nas caixinhas, é uma tradição da escola e de muitos

professores que são preconceituosos com negros e gays, sem contar que existem

professores que fazem oração dentro da sala”.

Assim como para A1, A2 percebe que para um ambiente de trabalho agradável

são necessários o “comprometimento e o companheirismo”, além de uma gestão

democrática, “sem tirania do diretor”, o diretor tem o dever de “ouvir o que o professor

sente, porque o que ele sente é real [...] a gestão democrática é isso, ouvir o que os

professores têm a dizer, porque eles são o chão da escola, se a gestão não é democrática

o ambiente fica pesado”. Quanto à Educação, assim como A1, A2 também começaria as

mudanças a partir do currículo, essa é a mudança mais importante para A2, desde a aula

“quebrada de 45 minutos”, o que traz muitos problemas para os alunos com dificuldade

de aprendizagem. Segundo A2

o sonho do professor é uma sala homogênea, aquela escola antiga não

democratizada, em que havia uma peneira natural, as crianças saiam. Hoje a

escola é para todos e isso pressupõe trabalhar com a diversidade; no ano

passado tinha um aluno que viu o pai matar a mãe, esse é o aluno real e ele

terá problemas .

O currículo atual, que não interliga as disciplinas, faz com que o conhecimento

fique cada vez mais sem sentido, o “aluno não consegue conectar as matérias que teve

durante o período”, fica desestimulado e o professor também.

Já quanto às mudanças necessárias na Escola, A2 se mostra cautelosa, quando

diz que as mudanças que ela percebe são “facas de dois gumes”, pois envolvem,

primeiramente, o professor. Esse termo “faca de dois gumes” representa um contradição

para ela, pois “há professores que se acomodam por terem estabilidade”, mas o

professor “também fica muito desgastado, então não dá para saber o que é esta

acomodação de verdade”. O professor que falta muito, prejudica o andamento da escola,

há casos de

Compra de atestado médico, vira um oba-oba, mas há gente que realmente

fica doente, sei lá, por isso é contraditório, porque um controle sobre isso

poderia gerar um diretor tirano, de se aproveitar desse poder a mais. Fico

109

confusa. Essa coisa de não ser mandado embora é um problema. Teve um

caso de um professor que deixou uma aluna de castigo de joelhos virada para

parede e por acaso essa aluna era negra. Isso foi a maior dor de cabeça para

montar um processo com termos jurídicos, foi mais uma burocracia para a

direção e no final das contas o professor recebeu apenas uma advertência e

ok, como ele sabe que nada acontece, é difícil mudar isso.

A2 sabe que há muito professor agressivo, mas entende que esse professor está

esgotado, de todo modo, “é preciso haver mecanismos para isso ser combatido e não

acontecer mais. Há a precarização, sei que é difícil, mas ninguém foi obrigado a

trabalhar na escola”. A2 fica dividida entre o risco da tirania do gestor, com a

impunidade do professor com estabilidade. A entrevistada também realizaria mudanças

na arquitetura das escolas, “precisaria ter espaço verde mais amplo, ajudaria a tirar essa

cara de prisão”.

Legislações que regulamentam a Educação brasileira

A1 não possui muito conhecimento relativo às legislações que regulamentam a

Educação brasileira, a norma com a qual ela mais tem familiaridade é o PCN –

Parâmetros Curriculares Nacionais, mesmo a LDB - Lei de Diretrizes e Bases da

Educação, não lhe é familiar, as regras

dentro da escola não se fala tanto, às vezes em uma reunião pedagógica

comenta alguma coisa, mas não discute, sabe? [...] tem essa Lei 10.639/2010

da história afro, eu não me lembro, provavelmente ela está dentro dos PCNs,

isso eu não lembro se é uma alteração dentro da questão do currículo.

A2 tem mais conhecimentos sobre legislações, ela também é coordenadora

pedagógica e possui mais cursos de extensão e especialização do que A1. Para A2 “o

que vem à mente é que muita coisa tem que sair do papel, por exemplo a escola laica,

tem professor que reza o ‘pai nosso’, eles pensam que o ‘pai nosso’ é uma reza

universal”. Em termos de LDB, o que é seguido é “o mínimo do mínimo”, um exemplo

de Leis que não saem do papel é a Lei 10.639/2010, que a escola não conseguiu

implementar, “tem muitos professores que trazem as suas questões religiosas para

escola; há livros que trazem a mitologia dos orixás e tem professores que se recusam a

ensinar, por exemplo. Em termos de legislação há muito a ser implementado nas

escolas”.

110

Políticas Públicas para a Educação

A1 conhece apenas o Programa Mais Educação, ouviu falar do Mais Cultura,

mas este programa chegou muito em cima da hora em sua escola, “não deu tempo da

minha escola mandar nada, porque tem que ser em parceria com alguma ONG da

região, você manda o projeto e eles enviam o dinheiro e aí você faz, esse é o Mais

Cultura na Escola”. Foi sugerido à entrevistada que ela se imaginasse como uma

formuladora de políticas públicas educacionais e em seguida foi questionada sobre quais

políticas ela formularia, ela sorriu e fez as suas propostas:

Começaria pela construção de mais escolas, para diminuir o número de

alunos por sala, porque eu sei que o professor conseguiria trabalhar melhor,

teria mais qualidade e poderia trabalhar mais a dificuldade dos alunos, porque

seriam menos.

A formulação de políticas públicas educacionais, para A1, possui um “nó” que é

a não participação do professor nesse processo,

é o Secretário, é o economista, é um juiz. Eles podem ser bons, podem ter

boa intenção, mas se não estão na escola, não vivenciam a escola, esse lado

fica faltando. É importante ter uma sensibilidade sobre o que está

acontecendo na escola. Eles não têm tempo. Dificilmente o cara vai dizer ‘eu

vou em uma escola, vou ficar ali, vou conversar um pouco com os

professores’, então é muito complicado porque isso muitas vezes está dentro

de um jogo político mesmo, de indicação. A gente vê Secretária entrar e sair

muito rápido, não se dialoga com os professores, dá a impressão que não

quer, ‘ah, a gente não quer saber o real’. Muitas vezes tiram o que o anterior

fez e não coloca nada no lugar. A pessoa, o grupo, ou o secretário tal assume

aquele grupo, e a primeira coisa é eliminar todos os resquícios da gestão

anterior, e aí eles começam a elaborar uma nova gestão que chega ao seu

final sem ter terminado o que foi elaborado.

Sobre o conhecimento do Programa Mais Educação, A1 foi comunicada através

das reuniões pedagógicas, do grupo de e-mail e de conversa com os outros professores.

Para ela a forma como as políticas públicas, a serem implementadas em sua escola, são

comunicadas está muito boa, pois as coordenadoras pedagógicas são “bem acessíveis”.

A1 se vê como uma implementadora de políticas públicas educacionais, quando

questionada “Por quê?” ela fica em silêncio por alguns instantes e diz que

A educação está dentro de um direito, uma política pública das mais

importantes, talvez a mais importante, então quando a gente pega lá a Lei tal

que diz que o aluno tem o direito a ler e a escrever, a ter acesso ao

conhecimento científico, a ter uma noção, a aprender sobre localização,

enfim, toda aquela parte de currículo e do direito do aluno, eu estando em

uma sala de aula estou propiciando isso, então eu vejo que estou

implementando a Lei.

111

A2 também dá destaque para o Programa Mais Educação, quando questionada

sobre quais programas tem conhecimento, para ela era uma proposta interessante, que

em sua escola foi implementada apenas por um ano, ela não sabe o porque, mas a escola

deixou de receber os recursos. A2 ainda citou a política Universidade Aberta do Brasil

que considera muito importante porque “tem o fazer cotidiano que é no automático, e a

formação é de extrema importância”; e o Programa Projovem que “ainda não virou”.

Quando uma política pública deverá ser implementada na escola na qual A2

leciona, a comunicação se dá como um “vai acontecer e acabou”, ela explica que há o

IDEB no qual há uma meta estabelecida e quando a escola não atinge essa meta ela fica

meio obrigada a ter um programa, o diretor é pressionado a aceitar e

pressiona os professores, não tem como sair disso. Não tem diálogo, o que

fazemos, no máximo, é ler o decreto, a minha sensação é de impotência, eu

só sou um boneco.

Quando questionada se se sente como uma implementadora de políticas

públicas, sua resposta é “que pergunta difícil” mas dá continuidade: “uma vez que existe

a política pública e ela está sendo implementada, eu costumo vestir a camisa, por mais

que existam críticas a gente quer fazer com que dê certo, então eu me sinto uma

implementadora”. A2 procura fazer o exercício de se ver como uma servidora pública,

pois afinal ela está

servindo os munícipes, os contribuintes. Nós prestamos um concurso público

cientes disso, mas sei que existe uma ruptura entre professor e servidor,

porque tem muito professor que se acha o deus do saber, mas há mães muito

cientes dos seus direitos, e o professor muitas vezes não aceita, há uma

inversão de valores, ele não aceita ser exigido pela comunidade porque ele

não se vê como servidor, eu mesma não consigo todo tempo, mas tento trazer

essa reflexão.

Educação Integral

A1 não atribui à jornada ampliada das escolas nenhum dos termos Educação

Integral ou Educação em Tempo Integral, para ela o termo é apenas Jornada Ampliada,

porque na verdade o aluno tem um período comum de aula, o que fazem é

ampliar em mais uma hora e meia na escola e de forma improvisada, com

poucos recursos, não aumentaram os recursos na escola para se fazer isso, é

assim ‘se virem aí meio do jeito que der, tem a sala vazia você vai lá e usa’. E

muitas vezes não há nenhuma sala vazia.

112

O posicionamento de A1 se deve à relação que ela fez com o que “se diz sobre

educação integral” com o que de fato acontece nas escolas, na educação integral

propriamente dita

o aluno entra oito, nove horas da manhã, tem acesso a várias linguagens

diferentes, ele vai trabalhar o corpo, vai aprender danças e lutas, vai trabalhar

a parte artística, plástica, música, ele vai ter acesso às aulas e a momentos

bem diferenciados, isso para mim é escola integral, então uma hora e meia a

mais é jornada ampliada.

As atividades desenvolvidas na “jornada ampliada”, o que o PME chama de

“contraturno” são definidas por A1 como “Ações Educativas complementares” e este

termo não aparece em nenhuma documentação do MEC. Quando lida uma lista de

denominações A1 relacionou Ações Educativas Complementares com aula de reforço;

Atividades extracurriculares com Karatê e Xadrez, não identificou a palavra

“contraturno” e questionou “Eles usam essa denominação?”. Não conhecia os

termos/programas reforçados pelo MEC como o Bairro na escola, Educação Integral,

Escola Integrada, Segundo tempo, Turma Complementar, Turno Complementar, Turno

Contrário ou Turno Inverso, mas conhecia o Programa Mais Educação.

A2 quando questionada sobre qual a melhor expressão para a Jornada Ampliada,

Educação de Tempo Integral ou Educação Integral, ela diz que no caso do PME,

o ideal seria educação integral, não é o tempo que tem que ser integral,

porque se o aluno fica na escola com mais do mesmo não vai ter beneficio,

precisa possibilitar atividades diferenciadas que ele não vai ter acesso, mais

uma hora na escola copiando matéria não ajuda em nada na questão da

educação integral de um conhecimento integrado e o que temos é uma escola

em tempo integral.

O Programa Mais Educação

A1 teve conhecimento sobre o Programa Mais Educação através das reuniões

de planejamento de sua escola, o PME foi comunicado, mas não foi discutida a forma

pela qual seria implementado. A1 critica o excesso de “variáveis” necessárias para que o

programa seja oferecido, ela pensa que deveria comunicar os professores de melhor

forma “levantando a demanda” para o professor que pudesse e tivesse condições para

participar, “a diretora fala ‘vou tentar solicitar esse material’, mas como depende de

muitas variáveis, você não consegue o material e acaba não conseguindo participar do

113

programa como deveria ser”. Essas variáveis também impactam a adesão ao programa,

pois há

regiões em São Paulo que mais precisariam do programa, porque a

vulnerabilidade social é gigante, e aí o professor que tá lá, ele mal quer dar

aquelas aulas porque é um lugar horrível, ele não gosta, a escola é horrível,

ou seja, não tá rolando nada lá. De repente um lugar é legal, o professor tá lá

num trabalho bacana, tá rolando a mil por hora, então não depender dessas

variáveis, teria que ser assim, regiões de São Paulo que tenha vulnerabilidade

vão acontecer X projetos lá, não tem o professor? Contrata, sei lá, dá um

jeito. Teria que atender.

Na escola na qual A1 leciona, o tipo das atividades a serem desenvolvidas no

PME são escolhidas pelos próprios professores, a direção diz

Você quer desenvolver o que? O professor, tem várias coisas que gostaria de

desenvolver, eu, por exemplo, eu poderia trabalhar alguma coisa com eles, na

área de rádio, na área de dança, porque eu tenho um conhecimento ali que

seria possível trabalhar, só que para mim não dá por causa do horário que já

estou com os meus alunos e com a minha turma, entendeu? Para eu ficar

mais, planejar as coisa, ficar naquele ambiente mais tempo, é muito

cansativo, e com uma remuneração baixa, porque é uma remuneração baixa,

não tem nada que implique em cima disso, então é assim, eles pegam o

padrão do professor lá, divide por tantas aulas, se você der duas aulas a mais

você ganha aquele pouquinho a mais, em cima disso não tem um vale

alimentação, não tem nada, não tem nenhum tipo de benefício, você vai

demandar mais tempo, você tem que preparar mais aulas, e não tem nenhum

tipo de bonificação, não tem um retorno para você. Então eu penso que essa

questão de ficar muito solto, ser um programa assim, ‘ah, quem quer?, quem

está a fim?’ Não funciona.

A1 acredita que a adesão ao programa se deu por imposição da secretaria, ela

sorri e diz “falando sério, teve uma preocupação também em levar acessos diferentes

aos alunos, a outras linguagens, houve essa preocupação, além da imposição”. A1

imagina que o PME tenha alguma base legal, mas se tiver, ela não sabe qual é

exatamente, seria “uma meta do PNE sobre escola integral até tal ano? Acho que está

dentro disso”. A1 sabe que o Programa Mais Educação está

acontecendo na rede municipal e está inserindo muita criança ao trabalhar a

linguagem através do xadrez, a própria recuperação paralela, o reforço, sabe?

Está dentro desse Mais Educação, então eu vejo que ele é importante, só que

ele é feito também um pouco marginalizado, ele não é ainda algo para todo

mundo que quer, para todo mundo que tem interesse, por exemplo, tem aluno

que não consegue, ou mora muito longe e depende do transporte, ou não tem

vaga o suficiente.

Os professores que trabalham nas atividades do PME, na escola de A1, são da

própria rede, pois não foi permitido pela diretoria que fossem professores de fora, este

fator prejudicaria o desenvolvimento das atividades, por exemplo “um professor vai

114

fazer uma cirurgia no joelho aí não vai ter a atividade nesse ano, entendeu? Então fica

assim um pouco difícil, estou falando da realidade da escola que eu trabalho, eu não sei

como é por aí”. A1 teve acesso a alguns materiais disponibilizados pelo MEC referentes

às atividades que poderiam ser executadas no contraturno, como “tatame”, xadrez e

algumas apostilas. A1 considera o PME um programa importante, mas sua crítica maior

está no atendimento aos alunos, à forma como esses alunos deveriam ser interpretados

pelo programa,

o aluno mais vulnerável não está nesse programa, porque é o aluno que nem

vai para escola, é o aluno que vai evadir, é o aluno que tem dificuldade, ele

está na rua, ele não participa desse programa. Ele não vai ao reforço,

recuperação paralela, ele não vai no karatê, ele não vai no xadrez, ele não vai.

Eu acho que quem está indo, está aproveitando. Eu acho que tem que

ampliar, eu sou muito a favor, tem que estar ali, não tem problema que gera

mais trabalho para gente. Mas aquele aluno que é mais vulnerável ele não

está, eu tinha um aluno no ano passado. O que eu conversava com ele! Ele

faltava nas aulas de reforço, ele não se inscreveu para nada, ele achou que

não ia conseguir, eu perguntei sobre ele e ele falou que ficava sozinho em

casa, ele tem dez anos. Teve vários dias que pediram para ele levar a irmã na

escola, e ele está em uma situação de vulnerabilidade total. Eu saía da escola

ele estava na rua. Então o programa não chega nesse aluno, ele abandona a

escola.

O critério que a escola de A1 adotou para que os alunos entrassem no programa

foi o “sorteio”, “o aluno levanta a mão, se inscreve, e aí faz o sorteio, tem o número de

vagas e o número de interessados”, pois as vagas não são suficientes para todos,

provavelmente porque

tem pouco material, está certo que quando o programa vai mesmo acontecer,

o material vem. Então por exemplo, o professor vai dar karatê, tem lá

bonitinho as roupas. Mas é isso, qual a palavra que eu usei mesmo? Variável.

Se o professor for trabalhar esse ano, se tiver professor disponível, então o

material é comprado, mas se acontecer alguma coisa com esse professor, o

material fica guardado, não será utilizado. Assim fica ruim. Se o professor

não pode, que venha outro, contrata alguém para continuar o projeto.

A1 sabe que a direção não permite que sejam contratados professores de fora,

mas ela não sabe que o MEC estimula essa prática, e também não concorda com ela,

pois o ideal seria

pagar melhor para o professor fazer a atividade. O professor vai dar aula de

karatê em um outro lugar, vai ganhar cem reais a aula, lá na escola é quinze,

vinte reais, não é complicado? O professor que tem outras habilidades na área

artística, de luta ou de idioma, ele vai trabalhar por fora, ele não vai trabalhar

ali, tem que ter muito amor para ele querer trabalhar ali. Eu nem por causa

disso, eu até trabalharia, mas é cansativo para mim, eu sou um pouco

contrária sobre isso, a tarde inteira na escola já me suga, porque às onze horas

da manhã eu já estou preparando alguma coisa, eu vou para escola, às vezes

115

tem reunião, muitas coisas. Depois fico com os alunos da uma e meia às seis

e meia. Para mim já está no limite. Não dá para mim, porque eu quero, à

noite, fazer outras coisas, descansar, ir à academia, enfim, tenho outras

coisas.

Todas as atividades são realizadas dentro do ambiente escolar; todos os

professores são concursados, não há estagiários ou oficineiros; A gestão acompanha as

atividades quanto à inscrição dos alunos online e, solicita os materiais.

Em uma escola anterior, na qual A2 lecionou, o PME não foi implementado,

pois

o IDEB não estava abaixo do que o MEC determinou, embora fosse uma

escola de periferia, com alunos em completa vulnerabilidade social, então

como a escola não foi obrigada a participar, a direção escolheu não aderir,

mas as escolas deveriam aceitar porque tem a verba, ela está disponível,

precisaria de um diálogo para que essa verba fosse melhor aproveitada.

Na escola atual de A2, há oficineiros contratados, pois em sua escola “falta

muito pessoal, a autonomia do diretor para contratar é apenas no PME e então ele

contrata”. Mesmo assim, o PME “não dá para todo mundo, a gente tenta ser o mais

democrático possível, tipo fazer um sorteio, gera muito trabalho, mas é uma forma de

fazer dar certo”. Quando houve a adesão ao PME

o pessoal da diretoria de ensino nos chamou para ler a portaria do programa,

não existe a possibilidade do diálogo porque a coisa já está posta. Por

exemplo, a gente sabe que existem coisas inviáveis para se ter na escola, mas

não tem jeito. A prestação de contas é um desgaste tamanho, tem oficineiros

que deixam de receber e se existisse esse diálogo poderia ser diferente,

porque a pessoa que está legislando não sabe nem sabe o que é uma prestação

de contas. Como é difícil a forma como está disposta na lei. O dinheiro acaba

ficando parado. O dinheiro acaba voltando, seria importante o diálogo para a

elaboração das leis. Conversar com os professores que são o chão da sala de

aula, eles é que sabem se vai dar ou não para implementar.

A2 também reconhece a importância da proposta do PME porque

a gente sabe que nas periferias deveria ter espaços de lazer, com ele [PME]

conseguiria oferecer oportunidades como capoeira, xadrez, atividades

diferenciadas. Aqui em volta não tem nada. São ações importantes, mas elas

começam com todo o gás e depois se perdem no meio do caminho,

principalmente quando muda de governo, muda de nome, fica com outra

cara.

Em sua outra escola, a adesão ao programa se deu por conta do baixo IDEB, só

após a adesão a direção foi “pensar em como seriam as possibilidades dentro da escola,

mas a motivação inicial é a questão do IDEB”. A2 reflete sobre o bom resultado do

programa, para ela o

116

grande problema é que não atinge todos, não tem como obrigar o aluno

participar, para quem participa é bastante enriquecedor, mas aquele que mais

precisa não consegue porque a família não incentiva, ou porque tem outros

afazeres como cuidar do irmão mais novo. Como não atinge todo mundo não

é perceptível na massa dos alunos. Não contempla todo mundo também

porque a verba não dá para contratar oficineiros suficientes para todo mundo.

A2 não teve acesso aos materiais disponibilizados pelo MEC, todas as atividades

são executadas por oficineiros e quem coordena as atividades é a gestão da escola,

“mais uma demanda para nós”.

Assuntos polêmicos/atuais

Tanto na escola de A1 quanto de A2 não há atendimento psicológico e ambas

reconhecem que é necessário, tanto para alunos quanto para os professores. Ambas

também ficaram impressionadas e surpresas como o movimentos dos alunos

secundaristas.

A1 se comoveu porque também estudou em escola pública, e nunca foi

incentivada

a nenhum tipo de protesto, nenhum tipo de dizer que não estava bom [...] na

área da educação vem muita coisa de cima, alguém decide que vai ser assim,

e pronto. Então quando começou o movimento de que ‘não vou sair da minha

escola’, ‘não é para fechar a escola’, nossa... foi uma surpresa tão

maravilhosa para mim, eu falei, ‘é o pessoal que está se organizando’, eu

fiquei em êxtase, porque aí você vê aquela coisa da autogestão [...] eu achei

que deu muita esperança de que essa turminha se levante contra os absurdos

que há na educação.

A2, percebeu que o movimento dos secundarias revelou que

esperava-se uma passividade dos adolescentes, ficou claro que a escola não é

a única forma de conhecimento e que a rede estadual é muito precária, a

categoria está muito desarticulada com aquele monte de categorias, os

professores nunca mais conseguiram as suas reivindicações e o movimento

mostrou que a escola não é a única possibilidade, a juventude vem se

empoderando através das redes, outras formas e aprendizagem que

fortalecem e dão as bases para essa articulação.

A2 nunca participou de greves como ativista, já A1 passou por essa experiência,

mas tem críticas quanto ao movimento, pois tudo é decido “lá no viaduto, lá na frente da

prefeitura”.

* * *

117

É importante salientar que, não raro, iniciativas reformadoras das práticas

educacionais caiam sobre os professores em cascatas de novas prescrições,

sem considerar que as instituições educacionais têm uma história própria e

que, nessa história, os professores acabam por achar modos de agir que lhes

permitem dar conta de realizar seu trabalho. Essas propostas, por vezes,

desorganizam as práticas dos professores e os culpabilizam por não fazerem

o que deveria ser feito. Assim, mudanças qualitativas nas propostas

educacionais não serão efetivas se não derem conta de acolher o saber-fazer

dos professores, incluindo a dimensão daquilo que é possível e necessário

fazer, e não contribuam, por meio das capacitações e/ou formações, para a

construção de novos saberes (FARIA, 2012, p. 30).

A citação acima faz parte do trabalho desenvolvido por Tereza Cristina Leandro

de Faria (2012) e se refere à análise da implementação do Programa Mais Educação no

município de Natal/RN, munícipio distante da cidade escolhida para a realização do pré-

campo desta dissertação, São Paulo. No entanto, é possível reconhecer em sua análise

pontos de convergência com as falas de Malu e Rosa. Compreendo que duas entrevistas

não são suficientes para a análise do universo docente, no entanto, as falas descritas,

assim como a citação de Faria (2012), fecham esta dissertação confirmando, em alguma

medida, o apresentado nos capítulos que lhe antecedem. O eixo “O ser docente”

confirma o desgaste dessa categoria, a incipiência da formação acadêmica, o baixo

salário e o atendimento à burocracia no lugar do pensar a Educação. Em “A Educação e

a Escola”, os fundamentos pensados por Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro estão

presentes no que as professoras entendem sobre os papéis da Educação e da Escola, no

entanto os seus constrangimentos ao responder a essa pergunta, podem representar o

conflito existente entre pensado e executado, entre vontade e possibilidade. As

“Legislações que regulamentam a Educação brasileira” são conhecidas apenas pela

entrevistada que estudou este tema através de cursos de capacitação, este dado

demonstra a divisão existente entre legisladores e profissionais da Educação, o que

remete à dificuldade de compreender as políticas educacionais e seus respectivos

objetivos.

No eixo “Políticas Públicas para a Educação”, o conhecimento é mínimo sobre

as políticas disponíveis para implementação. É possível considerar, a partir de suas

falas, mais a necessidade de políticas educacionais que garantam a infraestrutura

necessária para as atividades, do que métodos ou sugestões de conteúdos, e ainda o

problema da não participação dos professores na formulação de políticas públicas

educacionais, o que resulta em uma implementação distante da formulação, não por

ausência de vontade dos docentes, mas sim porque esses já sabem, por sua experiência,

118

qual política é viável ou não. As respostas ao eixo “Educação Integral” confirma o

problema que envolve o seu próprio entendimento conceitual, isto tendo como

referência as experiências de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, confirma ainda a

improvisação para a implementação da política, o que retoma o problema de

infraestrutura e da sobrecarga de trabalho dos professores.

O Programa Mais Educação, objeto deste trabalho, embora extinto, oferece

dados que dialogam com as formas como as diversas políticas públicas educacionais são

apresentadas e executadas. De maneira geral, as políticas educacionais têm por objetivo

o cumprimento de metas, cuja métrica é a nota dos alunos, que resulta na nota da escola,

caso a nota seja abaixo do determinado pelo governo, a direção da escola é pressionada

pela Secretaria de Educação para aderir a determinado programa e a direção pressiona

os professores para que o implementem. Os detalhes e/ou objetivos da implementação,

de acordo com as entrevistas, não são discutidos, a implementação tem caráter de ordem

e não de projeto.

Para os beneficiários do Programa, o dado que ganha mais destaque, do meu

ponto de vista, é a questão da política não chegar ao aluno mais vulnerável, aquele que

está matriculado na escola, mas não tem frequência. Este dado revela que a política

procurou atender alunos em situação de vulnerabilidade, mas parece haver níveis de

vulnerabilidade, conforme apontado por uma das entrevistadas: a “vulnerabilidade

total”. Esse nível de conhecimento das educadoras/implementadoras, parece não ser de

conhecimento dos formuladores, esse possível desconhecimento poderia ser mitigado

com a participação das docentes no processo de formulação da política, tomo este dado

como grave e gerador de riscos sociais que serão “solucionados” futuramente por outra

instituição do Estado, a Polícia. Já para os implementadoras, o Programa também

representou mais trabalho, principalmente no quesito atendimento à burocracia,

representou ainda, mais uma ordem a ser cumprida para o atendimento a uma meta

baseada em indicativos de aproveitamento escolar, não a um projeto pedagógico de fato,

estes fatores podem ter contribuído para a sensação de um “quase nada” que uma das

entrevistas diz sentir, quanto ao seu papel no processo educacional.

De todo modo, foi identificado pelas entrevistadas, perspectivas positivas no

Programa Mais Educação. As atividades propostas, se implementadas, seriam um

alternativa ao enfrentamento da ausência de espaços de lazer nas periferias, neste caso,

119

de São Paulo; as crianças poderiam ter contato com outras áreas do conhecimento; os

professores poderiam desenvolver atividades que lhe dessem prazer, mais livres do

currículo imposto pelo Estado. No entanto, não houve tempo suficiente para que o

Programa fosse avaliado do ponto de vista de sua efetividade, ou seja, da transformação

social ocorria por conta de sua implementação. Entre compassos e descompassos,

pontos positivos e negativos, entendimentos e desentendimentos, o Programa Mais

Educação foi extinto da mesma forma pela qual foi criado, sem nenhuma consulta

prévia aos professores, o ator mais frágil da rotina de descontinuidades das políticas

educacionais, superado apenas pelas crianças, adolescentes e jovens brasileiros.

Tudo que fazemos pode sempre ser feito de forma diferente e muitas vezes

melhor. A nossa experiência é uma experiência aberta. O passado é

extremamente importante, mas como uma luz que ilumina o presente e nos

ajuda a vê-lo melhor, e a evitar os erros e omissões da experiência anterior

(TEIXEIRA, 1977, p. 11).

120

Considerações Finais

Tamanho fracasso educacional não se explica, obviamente, pela falta de

escolas - elas aí estão, numerosíssimas - nem por falta de escolaridade, uma

vez que estão repletas de alunos, sobretudo na primeira série, que absorve

quase metade da matrícula. Muitos fatores contribuem para este fracasso [...].

Só queremos adiantar agora que a razão causal verdadeira não reside em

nenhuma prática pedagógica. Reside, isto sim, na atitude das classes

dominantes brasileiras para com o nosso povo (RIBEIRO, 1986, p. 13).

O título dessa citação é “Uma escola pública antipopular”, seu autor é Darcy

Ribeiro e ela tem exatos trinta anos. Na ocasião dessa citação, Ribeiro apresentava a

experiência dos CIEPs, no estado do Rio de Janeiro, um projeto que enfrentou o

problema do caráter antipopular da escola pública, durante o governo Leonel Brizola.

Nove anos depois, em 1995, o projeto foi descontinuado e Darcy Ribeiro (1995, s/nº),

retoma a lembrança do “vandalismo cultural” ocorrido há sessenta anos sobre Anísio

Teixeira, e pergunta “Por que?”. De acordo com o verificado no desenvolvimento desta

dissertação, a resposta é a mesma daquela elaborada por Darcy Ribeiro: a “atitude das

classes dominantes para com o nosso povo”, essa resposta pode ser entendida como um

eco do pensado por Anísio Teixeira, que também colocava o problema da Educação

como uma questão da decisão política. Darcy e Anísio viram seus projetos educacionais

implementados e descontinuados por uma mesma razão: comando de governo e sua

respectiva tendência política. O Programa Mais Educação, seguiu o mesmo destino.

Um dos estímulos para o desenvolvimento desta dissertação foi a hipótese da

ausência dos professores (implementadores) na formulação das políticas públicas

educacionais como uma possível causa de desenhos pouco executáveis para a realidade

de cada escola ou município, essa hipótese foi confirmada, porém foi ofuscada pela

conjuntura política. Klaus Frey (2000, p. 217) sinaliza que as dimensões da política

(institucional, processual e material) “são entrelaçadas e se influenciam mutuamente”,

mas no caso brasileiro, a dimensão institucional parece subordinar as demais

dimensões, as influenciando e determinando, tal influência e determinação podem ser

compreendidas como um resíduo dos longos períodos de governo autoritário, o que

coloca em cheque a qualidade de nossa democracia, a classificação e significação das

demandas sociais, e portando a permanência e o caráter de suas políticas.

Embora as Políticas Sociais relacionadas à saúde, alimentação, trabalho,

moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à

121

infância (direitos sociais previstos na Constituição Federal de 1988) sejam políticas que

necessitem de manutenção e avaliação constantes, é possível, em alguns casos, avaliar

os resultados em curto ou médio prazo, descontinuando a política em função do alcance

esperado de sua efetividade. Uma política de moradia, por exemplo, pode ser

descontinuada quando a demanda deixar de existir, assim como uma política de saúde

para o enfrentamento de uma epidemia, ou ainda a construção de linhas de metrô, o que

fica é o monitoramento da demanda que gerou a política. No exemplo de moradia,

podem ser disponibilizadas verbas de financiamento e não mais a construção de grandes

quantidades de residências; no exemplo da epidemia, pode-se manter um sistema de

vacinação; por fim, no exemplo do transporte, pode-se monitorar o crescimento da

população economicamente ativa, o que demandaria por mais transporte público. Não

haveria, de maneira geral, a ideia de processo para os exemplos citados, não é usual

remeter-se ao processo da moradia, ao processo da saúde ou ao processo do transporte,

diferentemente da Educação, a ela utilizamos o termo processo educacional.

As políticas educacionais geram resultados entre si, portanto a ideia de processo.

Uma política para a educação infantil, impacta a política para o ensino fundamental,

esta para o ensino médio e esta, para o ensino superior. A constante descontinuidade de

políticas educacionais, em um curto período de implementação, do ponto de vista da

Análise de Política Pública, inviabiliza a fase de Avaliação, pois para medir os

resultados do processo educacional, seria necessário, no mínimo, quatorze anos (ensinos

infantil, fundamental e médio). Essa etapa do Ciclo da Política Pública é essencial para

o desenvolvimento e a adaptação contínua das formas e instrumentos de ação pública,

denominado com aprendizagem política (PRITTWITZ apud FREY, 2000, p. 229), tal

aprendizagem necessita de tempo suficiente para maturação, o que dificilmente ocorre

com as políticas educacionais, como consequência, a fase de formulação torna-se um

estudo sem conclusão, no qual são sucessivamente retomadas políticas anteriores, não

avaliadas satisfatoriamente, portanto sem a aprendizagem política necessária para

adaptações ou até mesmo novos desenhos, uma vez que a demanda poderia ser alterada

como resultado da efetividade da política anterior.

Do ponto de vista social, as descontinuidades colocam em risco todo o

desenvolvimento do processo educacional, da significação da Educação e da Escola. O

fim do processo educacional público parece continuar exclusivamente na esfera do

122

mercado de trabalho, alimentando-o com mão de obra barata, assim foram desenhadas

as políticas no governo Getúlio Vargas (1930-1945), Militar (1964-1985), Fernando

Henrique Cardoso (1995-2002) e agora sinalizadas por Michel Temer (2016). O período

entre fim do governo Vargas e início do governo militar (anos 1950 e 1960) foram

marcados, na esfera da educação pública, como tempos áureos. Nesse período a escola

pública formava as elites, a função docente possuía respeitado status social, esse tempo

é finalizado com o Golpe de 1964. O processo educacional da elite migra para a

iniciativa privada, neste sentido, em um Estado administrado para a manutenção dessa

camada social, o cuidado com a educação pública perde sentido, a ela é destinada a

repressão, a institucionalização do ensino profissionalizante, o tecnicismo pedagógico, a

confusa legislação educacional, o autoritarismo e a desestruturação da formação dos

professores dos ensinos fundamental e médio (MARCÍLIO, 2005, p. 154). No período

pós Golpe, a partir da Constituição de 1988, houve a tentativa legal de driblar essas

características do ensino público, no entanto elas permanecem com novos nomes, os

atuais “Reforma do Ensino Médio” ou “Reorganização Escolar”, por exemplo.

Já para os implementadores de Políticas Públicas Educacionais, a constante

descontinuidade reforça os sentimentos expressados nas entrevistas realizadas, assim

como nas pesquisas analisadas para esta dissertação. A ideia de uma nova política,

herdaria a experiência de brevidade dos programas educacionais, o que dificultaria o seu

acolhimento por parte do implementador, as políticas já nascem com a certeza de sua

morte, caracterizando-se como mais um trabalho, mais uma tarefa da rotina profissional,

mais uma burocracia a ser atendida, mais uma meta e não como parte da construção do

processo educacional de crianças e adolescentes. Neste sentido, a função docente

mantem-se desvalorizada, assim como a escola pública, que segue mantendo os

estigmas de precariedade e de “fraca ambição”, conforme apontado por Cavaliere

(2014), tal estigma pode, no limite, ser introjetado pela categoria dos professores, já

considerada como uma categoria doente. No estado de São Paulo, em pesquisa realizada

pela APEOESP (2012), 57% dos afastamentos de professores teve como principal

causa, a depressão. Ainda no estado de São Paulo, são concedidas 372 licenças por dia,

sendo que, no ano de 2015, 136 mil professores foram afastados temporariamente, por

motivos de saúde, isto em um universo de 220 mil professores da rede (OESP, 2016).

123

Quanto ao Programa Mais Educação, cujo desenho foi inspirado nas

experiências de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, foram encontradas dificuldades em sua

implementação, principalmente em razão da infraestrutura necessária, tal infraestrutura

foi o quesito central das experiências referenciadas. Esse dado demonstra que a tarefa da

Educação Integral, primeiramente, não se realiza apenas através de legislações,

manuais, sugestão de conteúdos, referencial ideológico, estímulo à ação voluntária ou

rigor burocrático. Essa tarefa, tem em si questões preliminares, básicas, óbvias talvez:

pessoas e espaços, em uma palavra, professores capacitados e infraestruturas adequadas.

Para a solução dos primeiros, o Estado procurou remediar com a ajuda voluntária,

ONGs e até mesmo a iniciativa privada, já para a solução do segundo problema, este

identificado após a criação do Programa, ficou, em alguns casos, sob a responsabilidade

dos implementadores contratados ou voluntariados, que a partir de suas relações

pessoais, puderam articular espaços fora das escolas, em outros casos ficou à sorte de

uma sala de aula ou quadra de esportes disponíveis. À responsabilidade do Estado, de

maneira geral, ficaram a disponibilização de verbas e os critérios burocráticos.

De todo modo, dada a considerável situação de vulnerabilidade social pela qual

passam e vivem milhares de crianças brasileiras, o Programa apresentou resultados

positivos, ainda que distantes da formulação e da fonte inspiradora, reconhecidas nas

entrevistas coletadas, no município de São Paulo, e nos estudos dos municípios de

Natal, Palmas e Recife. Os principais pontos positivos estão na captação de recursos

financeiros, na possibilidade de oferecer aos alunos atividades fora do currículo

obrigatório e ainda dar início a projetos já pensados por algumas escolas quanto à ideia

de Educação Integral. A identificação desses pontos como positivos, não exclui a

identificação dos pontos negativos, como recursos humanos e de infraestrutura, por

exemplo, mas nos depoimentos é possível perceber que o Programa não era o ideal, mas

era alguma coisa. Neste sentido, fica a percepção de que as políticas educacionais,

normalmente são significadas como políticas de segunda categoria, na qual o pouco é

melhor do que nada, a “fraca ambição” da escola pública como ação e resultado da

“fraca ambição” da Educação.

124

Com uma breve vida – para a ideia de processo educacional –, com pontos

negativos e positivos, o Programa Mais Educação foi extinto seis anos após sua

regulamentação. A entrada do problema da Educação Integral na Agenda Decisória,

com a criação do PME, dependeu da sintonia dos componentes da Janela de

Oportunidade: 1) Problema; 2) Alternativa e solução; e 3) Político; este último, o mais

complexo deles, é composto por a) “clima” ou “humor” nacional; b) forças políticas

organizadas; e c) mudanças no interior do próprio governo. No entanto, para a saída da

Educação Integral da Agenda Decisória, bastou um único subitem: mudanças no interior

do próprio governo, por ocasião do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, o que

representou, para além do conhecimento dos elementos de conflitos de interesses, o fim

de uma tendência ideológica de condução governamental. Esse dado revela que a

significação das demandas sociais e suas respectivas soluções dependem dos valores e

princípios de determinada elite de poder, colocando em cheque as pressões da sociedade

civil organizada, pelo menos no atual período histórico, confirmando a não

consolidação da democracia brasileira. Cabe destacar ainda, que na sequência da

extinção do PME, o Ministro da Educação, por meio de Medida Provisória, lança a

Reforma do Ensino Médio, na qual haveria a ideia de Educação Integral. Essa ação

revela, em certa medida, as controvérsias das descontinuidades de políticas

educacionais: extingue-se uma política e cria-se outra, recuperando alguns elementos da

política extinta, ou seja, para esses atores, não se trataria de pensar em Política Pública,

mas sim em política de governo. Revela ainda, o caráter autoritário da ação

governamental, que propõe uma reforma educacional por meio de Medida Provisória

sem dar voz a nenhum ator envolvido no debate educacional.

Em tese, todos perderiam com a descontinuidade de políticas educacionais. Por

dedução, há perda e a maior delas está reservada aos beneficiários: as crianças, os

adolescentes, os jovens e os adultos. O segundo grupo perde, e esta dissertação

procurou demonstrar esse dado, eles perdem autonomia, confiança e estímulo, são eles

os servidores públicos da educação, em especial os docentes. No entanto, se todo o

conjunto da sociedade perdesse, com suas respectivas camadas sociais, econômicas e

políticas, as políticas educacionais não seriam descontinuadas, haveria assim, também

por dedução, algum grupo que ganha. Como hipóteses, o sucateamento e a

desmoralização da Educação poderia resultar em privatização do Ensino; já o

alinhamento dos currículos ao mercado de trabalho técnico/operacional, poderia resultar

125

em uma massa de mão de obra barata e quiçá, mansa. O grupo que ganharia com a

confirmação destas duas hipóteses seria aquele com capacidade política para participar e

vencer um possível leilão da Educação e com capacidade econômica para empregar a

mão de obra barata, o único grupo possível é o grupo da iniciativa privada, os grandes

empresários, as “classes dominantes brasileiras” citadas por Ribeiro (1986). Hipóteses à

parte, o fato concreto é que a Educação Integral das crianças, tal qual pensada por

Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, permanece como ideia, como vontade e desejo de

alguns personagens dotados de paixão e coragem, quesitos não contemplados na

Análise de Políticas Públicas.

126

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135

Anexo - Roteiro de Entrevista

1. Sobre o ser docente – Vivência profissional

[Pergunta] Qual é a sua rotina?

[Itens a serem explorados] escola em que trabalha; se trabalha em mais escolas;

horário que acorda; se utiliza transporte público; como é a alimentação

(marmita, refeitório, merenda); que horas chega em casa.

[Pergunta] Por que escolheu ser professorx?

[Itens a serem explorados] quais elementos/motivações estimularam a escolha

pela docência e a relação dessas motivações com a prática; se há perspectivas

de futuro, como plano de carreira; até onde o entrevistado quer chegar.

[Perguntas auxiliares] Há alguém na sua família que também é

professor? Você se inspirou em alguém para ser professor? O que você

pensou sobre a docência se realizou? Como você se vê daqui 10 anos?

[Pergunta] O que ajudou mais na sua profissão: a formação acadêmica ou a

prática docente?

[Itens a serem explorador] o que mais importa: a formação acadêmica, a troca

de experiência com os colegas e/ou cursos de extensão?

2. Sobre a Educação e a Escola

[Pergunta] O que é a Educação para você?

[Itens a serem explorados] Compreender como os entrevistados significam a

educação: objetivos e realidade.

[Perguntas auxiliares] Em sua opinião o que significa ensinar? Qual é o

papel da educação e da escola?

136

[Pergunta] Como você vê a sua importância no processo Educacional?

[Itens a serem explorados] Perceber se o entrevistado se vê como sujeito ativo

no processo educacional ou apenas como um cumpridor de burocracias e

determinações da gestão.

[Perguntas auxiliares] Qual é o papel do professor para a educação?

Qual é o papel do professor para e na escola?

[Pergunta] Para você, o que ajuda a manter um ambiente agradável no trabalho?

[Itens a serem explorados] Identificar os aspectos positivos e/ou negativos no

ambiente profissional; compreender o “peso” da instituição escolar no processo

do desenvolvimentos do trabalho, como níveis de liberdade e opressão.

[Perguntas auxiliares] Como é a sua experiência na relação professor X

professor? E como ela deveria ser? O que esta relação contribui para o

desenvolvimento da educação e para o clima institucional? O que você

pensa sobre existir professores que não são concursados? Para você esta

prática é consequência do que? Você acha que as decisões pedagógicas

deveriam partir de quem? Quanto ao apoio pedagógico, o que você

entende sobre isso? Qual a importância? Por que? Na escola em que

você trabalha, existe apoio pedagógico? Os Diretores e vice-diretores

exercem liderança pedagógica na escola na qual você trabalha? Para

você, qual a importância da gestão escolar? Como é a sua participação

na elaboração dos programas pedagógicos?

[Pergunta] Você mudaria alguma coisa na Educação? O quê?

[Itens a serem explorados] Identificar a contribuição do professor na formulação

de políticas públicas.

[Pergunta] Você mudaria alguma coisa na Escola? O quê?

[Itens a serem explorados] Identificar a contribuição do professor na gestão

escolar.

137

3. Sobre Legislações que regulamentam a Educação brasileira

[Pergunta] Para você, quais são as principais Leis para a Educação?

[Itens a serem explorados] Verificar o conhecimento do entrevistado sobre as

leis que regem a Educação.

4. Sobre as Políticas Públicas para a Educação [nível de governo]

[Pergunta] Quais programas educacionais do governo você conhece? [O que acha

deles?]

[Itens a serem explorados] Identificar o conhecimento do entrevistado sobre as

ações governamentais; perceber como ele significa estas políticas.

[Perguntas auxiliares] Se você fosse um formulador de políticas públicas

educacionais o que você faria primeiro? Para você, quem deveria

formular as políticas públicas educacionais (Por que)? Você sabe como e

quem formula as políticas públicas educacionais?

5. Sobre as Políticas Públicas para a Educação [nível da gestão escolar]

[Pergunta] Quando surge um novo programa na escola, como você é informado?

[Itens a serem explorados] Identificar como o entrevistado percebe a conduta da

direção.

[Perguntas auxiliares] Você mudaria alguma coisa na forma como o

programa é comunicado? (se a resposta for sim) O que?

6. Sobre as Políticas Públicas para a Educação [nível implementação]

[Pergunta] Você se vê como um implementador de políticas públicas? Por que?

[Itens a serem explorados] Perceber a relação entre docência e servidor público.

[Perguntas auxiliares] Você se sente preparado para implementar

políticas públicas educacionais? [Se não se sente preparado perguntar o

que acha que seria necessário para esse preparo]

138

7. Sobre a Educação Integral

[Pergunta] Sobre as escolas que tem uma jornada ampliada para os alunos, qual

expressão seria mais apropriada utilizar: Educação de Tempo Integral ou

Educação Integral?

[Itens a serem explorados] Verificar como o entrevistado identifica a proposta

do Estado, pois este utiliza os dois termos e eles são diferentes;

[Perguntas auxiliares] Você acha que há diferenças entre estes dois termos? [Se

sim: perguntar quais]

[Pergunta] Sobre as atividades que são desenvolvidas no contraturno escolar, vou

ler uma relação de denominações, você pode apontar aquela que é mais utilizada

na sua escola?

a. ( ) Ações Educativas Complementares

b. ( ) Atividades Extracurriculares

c. ( ) Bairro Escola

d. ( ) Contraturno;

e. ( ) Educação Integrada;

f. ( ) Educação Integral;

g. ( ) Escola Integrada;

h. ( ) Jornada Ampliada;

i. ( ) Segundo Tempo;

j. ( ) Tempo Integral;

k. ( ) Turma Complementar;

l. ( ) Turma Integral; Turno Complementar;

m. ( ) Turno Contrário;

n. ( ) Turno Inverso

o. ( ) Outras __________________________

[Itens a serem explorados] Verificar se o entrevistado tem intimidade com

os termos oficiais da política federal; Verificar quais são as atividades que

são realizadas no “contraturno”

139

8. Sobre o PME

[Pergunta] Como você tomou conhecimento da adoção do Programa?

[Itens a serem explorados] Verificar a relação entrevistado X gestão X governo.

[Pergunta] Você participou do processo de planejamento para a implementação?

(Se sim: Como foi o processo? Se não: Por que, como você acha que deveria ter sido?

O que seria preciso ser feito para melhorar o planejamento de implementação?)

[Itens a serem explorados] Capacidade decisória no processo da ação da política

no ambiente escolar e liberdade diante da gestão.

[Pergunta] Na sua opinião qual foi o principal motivo para a adesão ao PME?

[Itens a serem explorados] Verificar se o motivo identificado pelo entrevistado,

é o mesmo estimulado pelo governo.

[Possibilidades de respostas] Experiências bem sucedidas em outros

lugares; Diagnóstico da realidade local; Política Pública Federal; Política

pública estadual; Política pública municipal; Proposta Pedagógica da

escola; Ideias de pensadores da educação; Proposta de Assessoria.

[Pergunta] Você sabe se o PME tem alguma base legal? Qual?

[Itens a serem explorados] Verificar se o entrevistado sabe que as políticas

possuem uma base legal; familiaridade com os processo burocráticos do Estado.

[Possibilidades de respostas] Lei Estadual; Lei Municipal; Lei Federal;

Decreto; Portaria; Determinação da Gestão; Incentivo/Programa de

ONGs; Incentivo/Programa de Empresas privadas; Incentivo/Programa

da comunidade.

[Pergunta] Você teve acesso aos materiais disponibilizados pelo MEC para auxiliar

na implementação do programa, como as sugestões de oficinas (Mandala, por

exemplo)?

[Itens a serem explorados] Verificar se todo o trabalho desenvolvido pelo MEC

está sendo utilizado para a implementação da política.

140

[Pergunta] O que você acha desse Programa?

[Itens a serem explorados] Expectativas e possíveis redesenhos.

[Perguntas auxiliares] O que você espera desse programa? Você mudaria

alguma coisa no programa? (Se não: Por que? Se sim: O que?)

[Pergunta] Como são as atividades desenvolvidas no contraturno?

[Itens a serem explorados] Identificar as características da implementação,

como pessoal suficiente, infraestrutura adequada; materiais disponíveis;

atendimentos às sugestões do MEC; satisfação dos alunos; impactos no

processo tradicional das aulas (resultados, como por exemplo: diminuição da

evasão escolar);

[Pergunta] Todas as atividades realizadas no contraturno são realizadas na escola?

[Itens a serem explorados] Ver se se confirma uma das maiores críticas ao

programa, de acordo com as pesquisas realizadas.

[Perguntas auxiliares] Se a resposta for não, perguntar o que o

entrevistado acha sobre isso.

[Pergunta] Quem são os responsáveis pela execução das atividades do contraturno?

[Itens a serem explorados] Ver se se confirma uma das maiores críticas ao

programa, de acordo com as pesquisas realizadas.

[Observação] Aqui entra a questão do Professor Concursado; Professor

Contratado; Agente Cultural; Voluntário; Estagiário; Estagiário bolsista;

Jovem Aprendiz; Funcionário de ONG.

[Perguntas auxiliares] 1) se as atividades forem executadas por

não professores do corpo docente = O que você pensa sobre

isso?; 2) se houver envolvimento de ONG = O que você pensa

sobre isso? Você sabe como se dá a organização e gestão a partir

da ONG e a relação com a diretoria da escola? Quem participa

das articulações? Quais são os êxitos? Existem conflitos? Quais?

141

[Pergunta] Como a gestão e/ou coordenação direciona as atividades?

[Itens a serem explorados] Verificar a autonomia da gestão e a autonomia dos

executores (Professor Concursado; Professor Contratado; Agente Cultural;

Voluntário; Estagiário; Estagiário bolsista; Jovem Aprendiz; Funcionário de

ONG)

9. Background

Sexo (identificado pela entrevistadora): [ ] FEM | [ ] MASC

Gênero:__________

Idade: ___________

Cor: ____________

Renda: __________

10. Assuntos polêmicos/atuais

[Pergunta] Têm atendimento psicológico na escola em que você dá aula? Você

conhece alguém que precisaria? Você acha que este atendimento é importante

(Por que?)

[Pergunta] O que você achou do movimento dos alunos secundaristas?

[Pergunta] Você já participou de alguma manifestação de rua na época de greve

dos professores?

[Itens a serem explorados] Verificar o nível de identificação com a categoria

dos professores.

[Perguntas auxiliares] Independente da resposta (sim ou não) perguntar

o porquê.