polÍticas pÚblicas e desenvolvimento local: o caso de...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
JOSÉ RODRIGUES VIEIRA
POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTO LOCAL: O CASO DE LENÇÓIS
Salvador 2005
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JOSÉ RODRIGUES VIEIRA POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTO LOCAL: O
CASO DE LENÇÓIS
Dissertação apresentada à Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia (EAUFBA) como requisitos parcial para obtenção do grau de Mestre em Administração. Orientador: Prof. Dr. Reginaldo Souza Santos
Salvador 2005
DEDICATÓRIA
Ao Verbo
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, pela confiança em todos os momentos, pelos silêncios eloqüentes
quando há muito ruído à minha volta e pelas surdas exclamações nas horas em
que o silêncio se abate sobre mim.
A Armenia, pela doçura e interminável paciência com as muitas ausências, com um
casamento por muito tempo adiado e com a fugacidade dos encontros cotidianos
com um marido sempre atrasado e cansado.
Aos meus irmãos, João e Luis, pelo desafio do aprendizado em comum ao longo de
uma vida compartilhada em suas dúvidas e certezas.
Ao Professor Reginaldo Souza, pelas portas sempre abertas, permanente atenção
e delicadeza com um orientando fugaz.
Ao Núcleo de Pós Graduação em Administração da UFBa, por ter recebido, contra
todos os prognósticos, pela terceira vez um ex-aluno em busca de iluminação e
novos caminhos.
Ao sempre amigo Victor Mendes, pela insistência com que recitou o seu mantra
predileto: “Zé, você tem de fazer o Mestrado”, pela inabalável confiança e pelo
investimento realizado e crédito concedido ao professor neófito na primeira
oportunidade que teve.
Aos amigos da Urbe Projetos, em especial, a André Pinho e Pablo Maurutto pelo
apoio na pesquisa documental e bibliográfica, cessão de fotografias de seu acervo,
auxílio na confecção dos mapas e pelas muitas discussões ao longo de
intermináveis madrugadas e viagens de trabalho conjunto.
EPÍGRAFE
O que ocorreria no distrito diamantino do Paraguaçu, na serra do Sincorá, estava fadado a exceder todas as expectativas em termos de esplendor e de opulência. Era, sem dúvida, (...) uma revolução que se operava em toda a Província da Bahia.
Walfrido Moraes, 1984
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo verificar as mudanças sofridas pelo município de Lençóis, ao longo do período constituído pelos anos de 1991 e 2002, após a criação do Prodetur-BA e sua eleição para tornar-se “Portão de Entrada” da Zona Turística Chapada Diamantina. Há um interesse em se compreender como uma Política Pública de caráter exógeno- o Prodetur-BA- tem afetado o processo de desenvolvimento de um município cuja gênese e esplendor político econômico ao longo da segunda metade do século XIXI fundou-se na atividade de extração mineral e cuja decadência é a marca do século XX. Por meio da consulta a fontes secundárias documentais e bibliográficas, buscou-se montar um quadro que ajude na compreensão das mudanças vividas por esta sociedade ao longo do período em análise por meio de um olhar que busca compreende-las a partir da atividade turística. Palavras-chave: política pública, desenvolvimento, desenvolvimento local.
ABSTRACT This job seeks to comprehend the changes that happened in Lençóis, during the period among the years 1991 and 2002, after the creation of Prodetur-BA and the election of the city by this Public Policy to become the “Arriving Gate” of the Chapada Diamantina’s Touristic Zone. There is a declared interest in comprehend how an external Public Policy affects the local developing process of this city, that was created and lived its golden age under its Diamond’s Exploration Era, along the 19th century. After its end, the city lost economic and political importance during the 20th century. This research was built through secondary sources of information. It has tried to build a scene that allows the observer to understand the changes experienced by that society from the touristic activities point of view. Keywords: public policy, development, local development.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 - Bahia: Principais eixos logísticos 70
FIGURA 2 - Lençóis: Vista aérea da região 94
FIGURA 3 - Rio Lençóis 101
FIGURA 4 - Centro histórico de Lençóis 102
FIGURA 5 - Lençóis: Ocupação Sub Normal 115
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - Síntese das abordagens clássicas em Políticas Públicas 34
QUADRO 2 - Formas históricas de Estado e Sociedade no Brasil 40
QUADRO 3 - Bahia: Composição setorial do PIB 71
QUADRO 4 - Prodetur-NE I: Ações Concluídas (abril/2002) 84
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - Prodetur-BA: Investimentos na Zona Turística Chapada Diamantina 105
TABELA 2 - Lençóis x Salvador: evolução do fluxo turístico 108
TABELA 3 - Aeroporto de Lençóis: fluxo de passageiros 111
TABELA 4 - Lençóis: Participação do aeroporto sobre o fluxo turístico total 112
TABELA 5 - Lençóis: Crescimento Populacional e Urbanização (1980-2000) 113
TABELA 6 - Lençóis x Bahia: Crescimento Populacional e Taxa de Urbanização 114
TABELA 7 - Lençóis: Evolução da Pirâmide Etária 116
TABELA 8 - Lençóis: Evolução nos Índices de Alfabetização 118
TABELA 9 - Lençóis: Número de Estabelecimentos de Ensino Pré -Escolar 119
TABELA 10 - Lençóis: Número de Matrículas Iniciais no Ensino Pré Escolar 119
TABELA 11 - Lençóis: Número de Estabelecimentos de Ensino Fundamental 120
TABELA 12 - Lençóis: Número de Matrículas Iniciais no Ensino Fundamental 120
TABELA 13 - Lençóis: Número de Estabelecimentos de Ensino Médio 121
TABELA 14 - Lençóis: Número de Matrículas Iniciais no Ensino Médio 121
TABELA 15 - Lençóis x Bahia: Evolução do Coeficiente de Mortalidade Infantil 122
TABELA 16 - Lençóis:Índices de Cobertura de Serviços de Água e Coleta de Lixo 123
TABELA 17 - Lençóis: Produto Municipal e Participação no PIB da Bahia 125
TABELA 18 - Lençóis x Bahia: Evolução do IDH 127
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BNB Banco do Nordeste do Brasil
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
CEF Caixa Econômica Federal
GMDI Gasto Médio Diário Individual
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas
NPM New Public Management
PDITS Plano de Desenvolvimento do Turismo Sustentável
PIB Produto Interno Bruto
PND Plano Nacional de Desenvolvimento
Prodetur-BA Plano de Desenvolvimento Turístico da Bahia
Prodetur-NE Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste
SCT Secretaria de Cultura e Turismo do Estado da Bahia
SEI Superintendência de Estudo Econômicos e Sociais da Bahia
SUDETUR Superintendência de Desenvolvimento do Turismo
SUINVEST Superintendência de Investimento em Pólos Turísticos
SUMÁRIO APRESENTAÇÃO 14
1 POLÍTICA PÚBLICA X ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 28
1.1 CONCEITO 29
1.2 POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA VISÃO GERAL 33
1.3 DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 36
1.4 ADMINISTRAÇÃO POLÍTICA BRASILEIRA 40
2 DESENVOLVIMENTO LOCAL: UMA QUESTÃO CONTEMPORÂNEA 46
2.1 TENSÕES DO DESENVOLVIMENTO 47
2.2 DESENVOLVIMENTO: UMA VISÃO CLÁSSICA 49
2.3 A CONSTRUÇÃO NEOCLÁSSICA 54
2.4 A ABORDAGEM KEYNESIANA 57
2.5 ALÉM DO CRESCIMENTO ECONÔMICO 60
2.6 CONTEXTO LOCAL 63
3 BAHIA: TURISMO E DESENVOLVIMENTO NO INÍCIO DO SÉCULO XXI
70
3.1 UM MAPA ESPACIAL DA ECONOMIA BAIANA 70
3.2 1950-2000: MEIO SÉCULO DE HISTÓRIA 73
3.3 ANÁLISE DE UMA POLÍTICA PÚBLICA: O PRODETUR/BA 81
3.4 PRODETUR: FONTES E CRITÉRIOS DE FINANCIAMENTO E
RACIONALIDADE DA POLÍTICA PÚBLICA 86
3.4.1 Demandas geradas pelo Prodetur-NE 89
4 LENÇÓIS: PORTÃO DE ENTRADA DA ZONA TURÍSTICA CHAPADA DIAMANTINA
95
4.1 A GÊNESE DE UM MUNICÍPIO NO CORAÇÃO DAS LAVRAS
DIAMANTINAS 95
4.2 ASPECTOS HISTÓRICOS 97
4.3 ESTRUTURAS DE PODER OLIGÁRQUICO 99
4.4 LENÇÓIS ATUAL: PORTÃO DO TURISMO REGIONAL 101
4.5 A ZONA TURÍSTICA CHAPADA DIAMANTINA 102
4.6 INVESTIMENTOS PÚBLICOS 104
4.7 INVESTIMENTOS PRIVADOS 108
4.8 LENÇÓIS E O TURISMO: FLUXO E PERFIL DO TURISTA 110
4.9 LENÇÓIS E O PRODETUR-BA: 10 ANOS PASSADOS (1991-2002) 113
4.9.1 Investimentos e o Fluxo Turístico 113
4.9.2 Estrutura Populacional 115
4.9.3 Educação 121
4.9.4 Saúde e Saneamento Urbano 125
4.9.5 Economia 127
4.9.6 Índice de Desenvolvimento Humano 129
CONSIDERAÇÕES FINAIS 130
REFERÊNCIAS 137
14
APRESENTAÇÃO
As questões envolvendo desenvolvimento das sociedades ganham profunda
importância num momento em que as comunidades humanas alcançam um
elevadíssimo grau de maturidade de sua capacidade produtiva e tecnológica. Estas
comunidades atingiram tamanho desenvolvimento que tornaram possível gerar um
volume de produção de bens suficiente para que todos os habitantes do planeta
tenham direito ao mínimo necessário para sobreviver em condições dignas.
Entretanto, a despeito da possibilidade técnica, tal não ocorre. O globo encontra-se
claramente dividido entre regiões e países ricos, onde as condições de
sobrevivência e conforto material atingem um grau bastante elevado e outras em
que estas condições simplesmente inexistem, estando seus habitantes entregues à
própria sorte.
Como se isto não bastasse, a complexidade e fragmentação das sociedades
contemporâneas atingiram tal ponto, que, mesmo dentro destas regiões
tradicionalmente classificadas como ricas ou pobres, desenvolvidas ou em
desenvolvimento, podem-se verificar enormes diferenças nos níveis de conforto e
bem-estar de seus habitantes. A estratificação sócio-econômica verifica-se mesmo
no interior da urbe. Os recentes distúrbios verificados no “novembro de fogo” francês
é apenas um sintoma desta ordem.
Assim, questões como a do desenvolvimento e, especificamente, a do
desenvolvimento local, tornam-se fundamentais para que os governos possam
15
promover os ajustes necessários nas estruturas de suas as sociedades, sejam elas
mais ou menos desenvolvidas, de modo a promover o bem-estar de seus cidadãos.
Nesta luta, as Políticas Públicas constituem-se no instrumento fundamental à
disposição dos governos na promoção das adequações necessárias para alcançar
seus objetivos.
É necessário frisar que a questão do desenvolvimento é bastante delicada. Há uma
multiplicidade de fatores que influenciam o processo de desenvolvimento de uma
dada sociedade. Alguns possuem natureza absolutamente intrínsecas a uma dada
localidade, sendo, portanto, endógenos, constituindo-se em aptidões, competências
e problemas inerentes às mesmas. Outros, entretanto, podem afetar a muitas, senão
todas as localidades ao mesmo tempo, sendo exógenos e, portanto, não
controláveis por estas. Como harmonizar estes vetores, muitas vezes conflitantes ou
mesmo incompatíveis é um desafio que se apresenta cada vez mais intenso.
Nesta dissertação a questão das relações entre políticas públicas e seu impacto
sobre o processo de desenvolvimento local é discutida a partir do desenvolvimento
de um estudo de caso. Este busca apreender as dinâmicas geradas pela introdução
de um novo modelo de desenvolvimento para a região da Chapada Diamantina
lastreado na atividade turística, por meio de uma política pública estadual- o
Prodetur-BA.
Lençóis, município alvo deste estudo, integra a região da Bahia originalmente
conhecida como “Lavras Diamantinas”, atualmente ampliada e conhecida por
Chapada Diamantina. Esta região, cujos limites originais abrangiam a área hoje
16
ocupada pelos municípios de Lençóis, Mucugê, Piatã, Boninal, Palmeiras, Seabra e
Andaraí, tem sua gênese e desenvolvimento calcados sobre a extração mineral, sob
a sombra dos coronéis, ao longo do século XIX e início do século XX. Neste período,
atingiu o ápice de sua importância econômica e política, chegando a abrigar o
consulado francês, além de representações do governo estadual.
Entretanto, após o ocaso desta atividade econômica, em função da concorrência
internacional das jazidas sul-africanas e pelo esgotamento dos veios superficiais do
carbonato e do diamante, a região enfrentou décadas de decadência e perda de
importância política e econômica.
Desde então, ao longo do século XX, o município enfrentou uma contínua perda de
importância econômica, política e de dinamicidade social, tendo como um de seus
reflexos uma significativa perda populacional. É nesta situação que a adoção de
uma nova estratégia de desenvolvimento para o estado pelo governo estadual, como
um vetor exógeno, oferece aos municípios da região, e a Lençóis em especial, uma
oportunidade de adequarem suas estruturas e embarcarem no processo. Neste novo
modelo, a indústria do Turismo, especificamente o eco-turismo, passa a ocupar o
centro da economia regional.
A criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina, por meio do Decreto Federal
nº 91.655, de 17/09/1985, associada à adoção do segmento turístico como um dos
eixos prioritários de uma nova estratégia de desenvolvimento e política de inversões
pelo governo do estado, a partir de 1991, são os 2 marcos a partir dos quais se inicia
17
um processo de reestruturação regional. Em específico, nos interessa o segundo
marco e sua política de inversões: o Prodetur-BA.
Este trabalho pretende compreender como este processo afetou a economia, a
sociedade, o modo como influenciou o desenvolvimento do município. Sua missão é
ampliar a capacidade de compreensão acerca dos efeitos da política pública sobre a
sociedade local.
18
DEFINIÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO
O Problema
Denominada “Políticas Públicas e Desenvolvimento Local: O Caso de Lençóis”, esta
dissertação tem como objeto de estudo os efeitos causados sobre o município de
Lençóis-BA pela implantação do Prodetur-BA, analisando as mudanças ocorridas no
mesmo ao longo do período que se inicia no ano de 1991, com a posse do então
governador Antônio Carlos Magalhães, e finda em 2002, com o término da gestão do
governador Otto Alencar, vice-governador eleito na chapa do Partido da Frente
Liberal (PFL), encabeçada por César Borges, afastado do cargo para se candidatar
a vaga de Senador da República naquele pleito.
A proposta deste estudo é responder à questão que se segue: “Quais os efeitos da
implantação do Prodetur-BA pelo Governo do Estado da Bahia e a conseqüente
transformação de Lençóis em principal destino turístico da então constituída Zona
Turística Chapada Diamantina, sobre o município ao longo do período 1991-2002?”.
Para tanto, deve identificar quais são as mudanças introduzidas na sociedade de
Lençóis pela nova política proposta pelo governo estadual e os impactos causados
sobre a estrutura sócio-econômica anterior à sua implantação. Desta análise
comparativa emergirá uma visão capaz de auxiliar a fixação de parâmetros que
auxiliem futuros projetos a estabelecer conexões de causalidade entre a dinâmica
econômico-social atualmente em vigor e aquela original.
19
Pressupostos
O pressuposto que orienta a confecção deste estudo está arrolado a seguir. As
respostas obtidas aos questionamentos originados pela questão de partida
permitirão confirmar, ou não, a sua validade:
1. Ao realizar investimentos diretos e viabilizar a concretização de novos
investimentos por agentes econômicos privados, o Prodetur-BA instalou uma
nova dinâmica que permitiu ao município de Lençóis realizar uma série de
avanços no que tange as condições de vida de sua população, em especial
nas dimensões econômica, educacional e de saúde/saneamento, ao longo do
período em análise.
Para verificar tal pressuposto são empregados uma série de indicadores, que
permitem, por meio da observação de suas variações entre o início e o fim do
período, observar as mudanças ocorridas em cada uma destas dimensões. Assim,
empregam-se, em especial, os seguintes índices:
(a) na dimensão econômica o indicador base empregado é o Produto Interno
Bruto Municipal;
(b) na dimensão educacional: taxa de alfabetização, número de matrículas
iniciais nos diversos níveis de ensino e número de estabelecimentos
dedicados a tais níveis;
(c) na dimensão de saúde e saneamento: coeficiente de mortalidade infantil,
cobertura de água, esgoto e coleta de lixo.
20
Além destes, observam-se, ainda, outros índices que ajudam a compor o quadro
geral e, portanto, a compreender melhor as mudanças experimentadas pelo
município, ao longo do período em análise. Assim, também são empregados neste
estudo dados referentes à estrutura etária populacional, grau de urbanização e, por
sua capacidade de integrar as dimensões em análise, o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH).
Tendo como pano de fundo a questão do desenvolvimento local, este estudo
procura, portanto, compreender os efeitos de uma política pública exógena, o
Prodetur-BA, sobre uma comunidade, que pouca ou nenhuma influência teve sobre
a sua formulação. O grau de sucesso desta política no incremento dos níveis de
bem-estar desta população, que é apenas uma das beneficiárias sob a ótica dos
seus formuladores (Governo do Estado da Bahia), é função da capacidade de
adaptação e articulação desta comunidade com as ações desenvolvidas pelos
promotores da política pública.
21
JUSTIFICATIVA
Este projeto se justifica pela necessidade de se avaliar um processo que completou
uma década, avaliando seus sucessos e insucessos, de modo que se possa
contribuir para seu correto encaminhamento.
Antes de qualquer argumentação, deve-se recordar a importância que o local
assumiu, a partir da crise dos 1970, quando o esgotamento do modelo keynesiano
de desenvolvimento obrigou os governantes a buscarem alternativas de
desenvolvimento, recaindo, a partir de então, uma responsabilidade cada vez maior
sobre a esfera local. Uma vez que esta esfera assume tais responsabilidades, a
formatação de sua dinâmica ganha relevo social inegável, uma vez que suas
populações ganham maior autonomia na busca de seu desenvolvimento e melhoria
nas condições de vida.
Esta observação fundamenta o investimento na busca do entendimento das
dinâmicas locais, em função de sua importância nas dinâmicas econômicas
vigentes. Assim, o caso de Lençóis é mais um a partir dos qual se pode tomar novas
lições sobre o funcionamento do local e de como se estabelecem suas conexões
com outras regiões, especialmente no que se refere ao contexto baiano.
Uma vez que, em seu processo de desenvolvimento, as dinâmicas locais são
determinadas pela resultante da interação entre vetores das dinâmicas endógenas e
exógenas e as políticas públicas estaduais são um dos fatores exógenos mais
importantes atuando sobre as comunidades locais, o estudo acerca de seus efeitos
22
sobre tais dinâmicas é uma etapa capital para a compreensão da ação pública e
seus resultados.
Este fato ganha relevo, na medida em que se assume que a finalidade da ação
governamental é o bem-estar de suas populações, sendo, portanto, o alcance deste
a meta de suas políticas.
Deste modo, a política pública estadual, concretizada por meio das ações do
Prodetur-BA, no município de Lençóis, para ser considerada bem sucedida deve, ao
longo do tempo, incrementar os níveis de bem-estar de sua população.
Como se trata de um projeto de política pública que tem como objetivo o
desenvolvimento da região pode servir de parâmetro para a discussão acerca de
seus erros e acertos, fornecendo um parâmetro qualitativo para a discussão de
dinâmicas de desenvolvimento regional.
23
METODOLOGIA
Para atingir os seus objetivos, este trabalho busca compreender a conexão entre um
referencial teórico acerca dos conceitos básicos em análise, a saber, política pública
e desenvolvimento local. Emprega para tanto a metodologia do estudo de caso,
tomando como referência os impactos do Prodetur-BA sobre o município de Lençóis.
Deve-se destacar que este fator exógeno transforma, em poucos anos, um município
cuja economia, por seu processo formativo e sua história pregressa, sempre girou
em torno do setor primário (extração mineral e agricultura), na principal cidade de
uma das sete Zonas Turísticas do estado.
A opção pelo município de Lençóis se deu por duas razões básicas:
a) pela peculiaridade já destacada da gênese e história pregressa do município;
b) pela maior abundância de informações disponíveis sobre a atividade turística
no município, em função deste constituir-se numa espécie de “portão de
entrada” de uma das sete zonas turísticas criadas pelo Prodetur-BA.
Para sua realização, esta pesquisa fundou-se em dados de fonte exclusivamente
secundária, apresentado resultados de análise puramente qualitativa destes.
Apoiando-se numa pesquisa exploratória conceitual, em que se busca determinar
marcos inteligíveis para a compreensão dos conceitos de Política Pública e
Desenvolvimento Local, este trabalho fundou-se, ainda, numa pesquisa bibliográfica
e documental, com base em uma série de textos, periódicos e publicações contendo
dados, análises e avaliações acerca do objeto deste estudo.
24
.
Por fim, as principais fontes de informação utilizadas ao longo da confecção deste
estudo foram o Governo do Estado da Bahia, por meio da Secretaria de Cultura e
Turismo do Estado da Bahia (SCT), da Superintendência de Investimentos em Pólos
Turísticos (SUINVEST), da Empresa Baiana de Turismo (Bahiatursa), além do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Superintendência de
Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI).
OBJETIVOS
Objetivo Geral
O objetivo geral deste estudo é verificar quais as mudanças experimentadas pela
sociedade lençoense, ao longo do período decorrido entre os anos de 1991 e 2002,
ocasião de implantação do Prodetur-Ba.
Objetivos Específicos
Como objetivos específicos, este estuda busca:
1. Evidenciar as características principais do Prodetur-Ba, enquanto Política
Pública;
2. Identificar as alterações ocorridas na estrutura e dinâmica da população do
município de Lençóis, ao longo do período em análise;
25
3. Identificar as mudanças nas condições de vida da população do município,
por meio da análise dos principais indicadores de renda, educação e saúde
do município, ao longo do período analisado.
26
ESTRUTURA GERAL
Para atingir as suas aspirações, este trabalho encontra-se dividido em 4
diferentes capítulos. Após esta apresentação, em que se colocam as questões
em tela, bem como hipóteses/pressupostos, metodologia e objetivos, inicia-se
uma etapa de construção do marco conceitual do projeto, que consome os dois
capítulos seguintes.
O primeiro capítulo, portanto, discute os conceitos e a relação que existe entre
Política e Administração Pública. Busca evidenciar como a política pública e a
Administração Pública são reflexas, ao mesmo tempo em que busca promover
uma breve leitura acerca da evolução do estado brasileiro e da forma assumida
por sua Administração Pública ao longo do século XX.
O segundo capítulo busca efetuar uma discussão acerca do conceito de
Desenvolvimento Local, partindo das abordagens clássica, neoclássica e
Keynesiana para crescimento econômico, num primeiro instante. Na sua segunda
metade, concentra-se efetivamente na idéia de Desenvolvimento Local,
discutindo a idéia de local, suas múltiplas interfaces e a complexidade associada
à sua gestão.
A partir do capítulo três, construídos seus parâmetros teóricos de análise, o texto
começa a concentrar-se em seu objeto de estudo. Neste capítulo, em específico,
realiza-se uma sucinta revisão da estratégia baiana de desenvolvimento
econômico, ao longo da segunda metade do século XX, discutindo rapidamente
27
os seus ganhos, as razões de seu esgotamento, a partir de meados da década
de 1980, lançando, então, um olhar sobre a nova estratégia proposta a partir do
século XXI. Na sua segunda metade, concentra-se no Prodetur-BA, enquanto
uma política de desenvolvimento turístico proposta pelo governo estadual,
buscando caracterizá-la, a partir de suas premissas, limitações e contexto
histórico.
O capítulo quatro tem por objetivos:
a) expor brevemente ao leitor as nuances da gênese do município de Lençóis
e de sua região, evidenciando o caráter exploratório de sua ocupação e as
características que marcam a sociedade dela derivada;
b) demonstrar quais foram as ações do Prodetur-BA na Zona Turística
Chapada Diamantina, em especifico no município de Lençóis, destacando
os montantes investidos pelo poder público e pelo setor privado, ao longo
da década de 1990, bem como a características destes investimentos;
c) por fim, montar um quadro que avalie as mudanças ocorridas nas
características da população do município, seu grau de urbanização, nível
de educação, estrutura de saúde e saneamento e criação de riqueza
(renda municipal).
Findo este último capítulo, as considerações finais buscam realizar um balanço
daquilo que se verificou a partir da observação e análise dos dados levantados,
procurando traçar diretrizes que auxiliem a realização de um estudo mais
rigoroso, a fim de verificar as relações de causalidade entre as ações do
Prodetur-Ba e as mudanças verificadas no município de Lençóis.
28
CAPÍTULO I POLÍTICA PÚBLICA x ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Esta seção tem como objetivo discutir as diversas dimensões envolvidas quando
se busca empreender a análise de uma Política Pública qualquer. Os
fundamentos que subsidiam tal discussão estão calcados nas diferentes
abordagens existentes para entender tal fenômeno social.
Assim, para auxiliar esta análise, num primeiro momento este capítulo busca
definir Estado, Sociedade e Política Pública. A partir desta conceituação, há uma
tentativa de entender como as políticas públicas são afetadas pela relação
dinâmica Estado-Sociedade, ao mesmo tempo que apresenta um quadro
resumo com as diversas abordagens existentes sobre políticas públicas.
Um elemento que não escapa ao olhar aqui proposto é aquele do papel
desempenha pela Administração Pública sobre a definição e aplicação das
políticas públicas. Partindo da clássica conceituação Weberiana, sem, contudo,
ignorar as propostas da New Public Management especula-se sobre o tema.
Por fim, uma vez definidas tal visão e suas singularidades, seu último objetivo é
aquele de realizar uma breve exposição acerca da evolução da dinâmica
Estado-Sociedade no Brasil e das formas assumidas, em função destas
mudanças, pela Administração Pública no país, ao longo do século XX.
29
1.1 CONCEITO
As questões envolvendo a relação entre Estado, entendido como aquele a quem
cabe o monopólio da força e da coerção legítimas (DUPAS, 2003, p. 27)1, e
Sociedade, moldam a configuração do mundo. A mediação destas relações,
desde a criação do Estado Democrático de Direito, vem sendo realizada pelo
governo, fundado nos princípio de:
a) soberania popular exercida por representantes eleitos;
b) divisão de poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário);
c) direitos individuais declarados e assegurados;
d) prerrogativas dos governantes limitadas explicitamente pela
Constituição.
Esta configuração atende, em linhas gerais, à classificação Weberiana de
Estado Legal, pois nele claramente se afigura a construção de uma estrutura
formal, a partir da qual o estado funciona. Esta estrutura é gerida por
funcionários especializados, aos quais cabe decidir, a partir de critérios gerais
(técnicos, legais), o que deve ser feito para atingir os fins desejados. Nele os
cidadãos só estão obrigados a submeter-se à lei, sendo justas as decisões que
aplicam a regra geral aos casos particulares.
1 Esta afirmativa encontra guarida na definição Weberiana, segundo a qual o Estado se define como a estrutura ou o agrupamento político que reivindica com êxito o monopólio do constrangimento físico legítimo (Freund, 1980, p.159).
30
A Sociedade, por sua vez, encontra-se dividida, em duas esferas: a pública e a
privada. O espaço público, a Ágora, consiste no espaço reservado ao debate
político, habitado pelo cidadão. Nele se dá “a intermediação, envolvendo
instituições e práticas sociais” (DUPAS, 2003, p. 30). O espaço privado é
demarcado pelos interesses particulares dos indivíduos. Caracteriza-se, assim,
pela “afirmação da individualidade e da diferença, do desejo e dos gostos
específicos” (DUPAS, 2003, p. 30).
Por sua vez, ambas as esferas encontram-se submetidas ao governo, que,
sendo constituído por representantes eleitos, tem nas mãos a condução do
Estado no sentido de cumprir a sua finalidade: o bem-estar público. Santos
(2001, p. 65) afirma que é através do Estado “que se dá a manifestação política
da sociedade em busca da finalidade: o bem-estar pleno da humanidade”.
Refletindo este fracionamento social, os bens à disposição da sociedade
apresentam características de bens públicos ou privados. Segundo Giambiagi e
Além (1999, p. 20), “bens públicos são aqueles cujo consumo é indivisível ou
‘não-rival’. (...) Outra característica importante é o princípio da ‘não exclusão’”.
Santos (2001, p. 83) adiciona outra característica: a produção de grandes
economias/ deseconomias externas.
Os bens privados, por sua vez, são gravados por apresentarem consumo
divisível ou “rival” e excludente. Por último, existe uma categoria de bens que
31
apresentam características dos bens privados, mas que, em função do nível de
consenso das sociedades modernas, foi integrada à agenda pública: os bens
semi-públicos. São exemplos clássicos destes: educação e saúde (GIAMBIAGI
E ALÉM, 1999).
Assim, é sobre esta construção original que ocorrem os embates a partir dos
quais se constroem as modernas sociedades. Estes embates, que ocorrem em
seu seio, têm como objeto a definição do que fazer com os bens públicos, e esta
destinação é determinada a partir do controle da gestão estatal.
Azambuja (1990, p. 9), comentando a obra O Príncipe, de Nicolau Maquiavel,
define o fundamento da Política como “a arte de governar os Estados, ou mais
exatamente, como arte de atingir, exercer e conservar o poder”. O ilustre jurista
Hans Kelsen (apud AZAMBUJA, 1990, p. 9), por sua vez, afirma: “a política
descreve o Estado como deve ser e porque deve ser”.
Estas assertivas conduzem ao entendimento de que é através da política que se
molda o Estado e se alcança e mantém tal poder. A primeira uma visão positiva,
a segunda uma abordagem normativa. Penteado Filho (2003) define Política
como o “conjunto de procedimentos formais e informais que expressam relações
de poder e que se destinam à resolução pacífica dos conflitos quanto aos bens
públicos”. Esta concepção evidencia um entendimento processual, subentendida
apenas nas anteriores, reforça a dimensão de poder envolvida na questão
32
política e introduz a dimensão da estabilidade jurídica, ao valer-se da expressão
“resolução pacífica de conflitos”. Como tal, seu ambiente natural é o espaço
público.
Logo adiante, o mesmo autor concebe Política Pública como “outputs,
resultantes da atividade política (“politics”): compreendem o conjunto de
decisões e ações relativas à alocação imperativa de valores”. Vê-se, aqui, que,
sob esta ótica, a política pública, nada mais é senão a materialização das
discussões originadas no espaço público. No entanto, como resultam em ações
governamentais, sua validade transcende a este espaço, atingindo também o
espaço privado.
Desta discussão, pode-se perceber que as Políticas Públicas originam-se no
espaço do debate (espaço público), mas reverberam por toda a sociedade, uma
vez que, sendo atos estatais de governo, obrigam toda a sociedade, dado o
caráter universal e coativo de suas normas. Destarte, podemos afirmar que a
Política Pública é o instrumento por meio do qual o governo, após a discussão
no espaço público (Política), busca alcançar a sua finalidade: promover o bem-
estar geral.
33
1.2 POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA VISÃO GERAL
Sendo as políticas públicas os instrumentos através dos quais os governos
determinam a sua ação, cresce a importância do seu estudo e investigação. Isto
se dá, pois, de um ponto de vista pragmático, o orçamento público representa
parcela significativa das inversões totais efetivadas nas economias dos estados
nacionais2.O orçamento público, por sua vez, é regido pelas políticas públicas
adotadas.
Assim, a utilização do conhecimento obtido para resolver da melhor maneira os
problemas do cotidiano, parece plenamente justificado. Penteado Filho (2003)
adiciona, ainda, uma outra razão: a de “informar a discussão política,
desenvolver o grau de consciência política e melhorar a qualidade da política
pública (seja através da reforma ou da revolução)”.
No entanto, o campo de estudos das políticas públicas encontra-se longe de ser
pacífico. Diferentes abordagens são utilizadas, expressando uma pluralidade de
ângulos de observação, o que reflete o grande número de interessados nesta
complexa temática. Faria (2003, p. 22) reforça este ponto vista ao afirmar que:
(...) há hoje uma Babel de abordagens, teorizações incipientes e vertentes analíticas, que buscam dar inteligibilidade à diversificação dos processos e gestão das políticas públicas em um mundo cada vez mais caracterizado pela interdependência assimétrica, pela incerteza e pela complexidade das questões que demandam regulação.
2Giambiagi (1999, p.25) afirma que a relação Gasto Público/PIB internacional foi de cerca de 46% em 1996.
34
Ao longo da história da ciência política, uma série de abordagens, hoje
clássicas, foi construída com o intuito de interpretar os mecanismos envolvidos
no processo de formulação política. No quadro 1, que se segue, há uma
apresentação esquemática que busca sintetizar estas abordagens clássicas do
campo das políticas públicas:
35
Quadro 1 – Síntese das abordagens clássicas em Políticas Públicas Abordagem Conceito de PP Pressupostos Implicações
Institucionalismo Resultado do arranjo institucional dos pode- res políticos
1.Instituições governa- mentais legitimam PP; 2. PP são universais; 3. Governo detém mo- nopólio da violência
1. Estrutura institucio- nal pode beneficiar al- guns grupos específi- cos; 2.Acesso ao poder se dá de forma assimétrica
Pluralismo Resulta da interação entre os grupos de in- teresse, refletindo o e- quilíbrio entre estes
1. Interesse dos grupos reflete o interesse da Sociedade. 2. Sistema Político ge- rencia conflito:a) esta- belecendo regras; b)balanceando interes ses; c)criando as PP, a partir deste balancea-mento; d) respeitando compromissos
1. Formuladores das políticas respondem à pressão dos grupos que competem entre si. 2. Aquele que possui maior poder de pres - são exerce maior in – fluência
Teoria das Elites Reflete preferências e valores da Elite domi-nante
1. As massas são manipuláveis; 2. Mudanças nas PP são incrementais; 3. Elites têm alto grau de homogeneidade.
1. A responsabilidade pelo bem estar social cabe às elites; 2. O jogo democrático tem importância apenas simbólica
Racionalismo Reflete a tomada de decisão ótima, ou seja, aquela que maximiza o valor para a sociedade
1. Os agentes econômicos são racionais; 2. A distribuição de informações é prefeita e mensurável;
1. Os benefícios devem exceder os custos das PP adotadas; 2. A análise das PP devem se ater ao bem- estar econômico.
Incrementalismo
Se concretizam por meio de aproximações sucessivas, fortemen - te determinadas pelo curso histórico.
1. Há assimetria na distribuição de infor- mações; 2. A distribuição dos recursos constitui-se num fator restritivo à plena racionalidade
1. Restrições de or - dem prática impedem a tomada de decisões “ótimas”. 2. Cada nova PP é um novo degrau construí- do sobre a História.
Teoria dos Jogos Resultam do somató - rio de todas as esco- lhas feitas por todos os indivíduos
1. Os agentes são ra-cionais; 2. Suas decisões são uma função daquela adotada pelos demais.
1. As decisões toma - das pelos agentes são interdependentes.
Teoria dos Sistemas Resulta do “processa- mento”, pelo governo, de “entradas” deman- dadas pela Sociedade
1. As demandas da so- ciedade são inputs do sist. político. Afetam o próprio sist. político; 2. O sist. político trans- forma os inputs em PP
1. Os outputs do sistema político afetam a sociedade, gerando novas demandas, num loop interminável.
Marxista Resultam do viés de classe da Burguesia, hegemônica no contex- to do capitalismo
1. Luta de Classes; 2. Estado como “Co- mitê da Burguesia”; 3. Hegemonia ideo- lógica burguesa
1. PP como instrumento para assegurar poder e valores burgueses.
Fonte: elaborado pelo autor.
36
1.3 DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Um dos mais importantes elementos que determinam as políticas públicas é o
modelo de gestão assumido pela Administração Pública. Weber, originalmente,
associa tais modelos a dimensões legítimas de domínio, que afirma serem três,
a saber: o domínio legal; o domínio tradicional; e o domínio carismático. Cada
um destes domínios pode materializar-se de diferentes formas. São focos desta
análise o Patrimonialismo (forma típica do domínio tradicional) e a Burocracia
(forma típica do domínio legal).
O Patrimonialismo, típico das sociedades tradicionais, possui como
características próprias, dentre outras:
a) Indistinção entre esfera oficial e privada (interesse do cargo e do
administrador);
b) a norma que fundamenta o sistema (Direito) lastreia-se no costume;
c) Autoridade fundada na pessoa.
Freund (1980, p. 174) ilustra estas características no trecho que se segue:
A autoridade (...) é fundamentalmente pessoal, independentemente de qualquer fim objetivamente racional. O soberano é senhor, e não magistrado; o poder lhe pertence em virtude de atributos pessoais; não lhe é conferido com base em critérios exteriores e formais que definam a função por ele ocupada.
37
Este modelo de dominação revelou-se típico das sociedades pré-capitalistas.
Nestas, o patrimônio público e o patrimônio do rei ou imperador se confundiam,
a regulação tinha como eixo central as tradições (usos e costumes), e as
funções públicas eram exercidas por desígnios do mandatário supremo, a
despeito de qualquer outra consideração. Bresser Pereira (2001) caracteriza o
Estado brasileiro como Patrimonialista, até o ano de 1930.
Por sua vez, a Burocracia Moderna, segundo Freund (1980, p. 170), funda-se
nos seguintes princípios:
a) Competências claramente definidas pelas normas;
b) Existência de um corpo de funcionários dedicados ao exercício das
funções públicas;
c) Estrutura hierárquica do sistema administrativo, tendendo à
centralização;
d) Recrutamento do funcionário por concurso (via impessoal);
e) Remuneração regular do funcionário;
f) Subordinação dos funcionários à norma (Direito);
g) Promoção de funcionários com base em critérios objetivos;
h) Separação completa entre oficial e privado (interesse do cargo e do
administrador).
38
O Domínio Burocrático é característico das sociedades ocidentais democráticas
modernas. Nestas há uma evidente separação entre o patrimônio público e o
privado, a regulação é exercida com base numa legislação genérica, impessoal,
e as funções públicas são exercidas por mandatários eleitos para tal fim, ou por
outros critérios igualmente impessoais (concurso público). Ao longo do período
que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, este modelo atingiu o seu ápice e
consolidou-se concomitantemente ao Estado de Bem-Estar Social (Welfare
State).
Uma das especificidades da Burocracia é o fato desta ser internamente
orientada. O importante é que as normas se cumpram; o processo deve ser
corretamente feito; a norma deve ser estritamente cumprida. Isto acarreta perda
de flexibilidade e distanciamento entre as atividades executadas (e, por
conseqüência, daqueles que as executam) das suas finalidades (daqueles que
demandam o produto final: em última instância os cidadãos).
Além destas formas, a Administração Pública pode ainda assumir,
hodiernamente, ao menos um outro formato: a Administração Gerencial. Esta,
conhecida na literatura internacional como New Public Management (NPM),
surge como um fruto da crise dos anos 1970, portanto do momento em que o
ideário neoliberal volta a ganhar terreno nas discussões político-econômicas.
39
Na década de 1990, em que começa a ser adotada no país, a principal
contribuição advém da obra de Osborne e Gaebler, publicada no Brasil sob o
título “Reinventando o Governo”. No Brasil, assume a denominação de
Administração Pública Gerencial.
Carneiro (2002, p. 96) atribui as seguintes características a este modelo:
• descentralização do ponto de vista político, transferindo-se
recursos e atribuições para os níveis políticos regionais e
locais;
• descentralização administrativa, através da delegação e
autoridade para os administradores públicos transformados
em gerentes crescentemente autônomos;
• organizações com poucos níveis hierárquicos, ao invés de
piramidal;
• controle por resultados, a posteriori, ao invés do controle
rígido passo a passo, dos processos administrativos;
• administração voltada para o atendimento do cidadão, ao
invés de auto-referida.
Como se pode ver, o foco deste modelo está nos resultados, na eficácia da
gestão. Apresenta-se, portanto, como uma alternativa à administração
burocrática que tem como singularidade a preocupação com o processo, a
despeito dos resultados atingidos.
40
1.4 ADMINISTRAÇÃO POLÍTICA BRASILEIRA
Para que se possa efetivamente empreender uma análise consistente acerca de
qualquer política pública, é preciso, antes de qualquer passo, procurar
compreender a evolução da gestão pública, espelhando o binômio Estado-
Sociedade.
Só a partir do entendimento acerca da dinâmica com a qual o governo interage é
que se pode, de fato, construir uma análise mais consistente. Assim, vê-se que a
compreensão das políticas públicas é uma derivada de três eixos, a saber: a) da
realidade objetiva, marcada pela forma de gestão existente no locus em foco; b)
do modo como esta evolução se deu historicamente; e c) da opção teórica do
pesquisador.
Assim, para que se possa efetivamente empreender uma análise de qualquer
política pública brasileira, deve-se compreender a evolução de sua dinâmica
Estado-Sociedade.
Bresser Pereira (2001, p. 224 afirma):
O Estado brasileiro, no início do século XX, era um Estado oligárquico e patrimonial, no seio de uma economia agrícola mercantil e de uma sociedade de classes mal saída do escravismo. Cem anos depois, é hoje um Estado democrático, entre burocrático e gerencial, presidindo uma economia capitalista globalizada e uma sociedade que não é mais essencialmente de classes, mas de estratos: uma sociedade pós-industrial.
41
Soma-se a esta afirmação, o quadro a seguir (BRESSER PEREIRA, 2001, p.
226).
Quadro 2 – Formas Históricas de Estado e Sociedade no Brasil 1821-1930 1930-... Início?
Sociedade Mercantil Senhorial Capitalista-Industrial Pós-Industrial (?)
Estado (Política) Oligárquico Autoritário-Capitalista Democrático (1985)
Estado (Administração) Patrimonial Burocrático Gerencial (1995)
Este quadro auxilia a percepção de que para cada nova relação Estado-
Sociedade corresponde um modelo específico de gestão pública. Assim, no que
tange à primeira fase, o depoimento de Garcia e Palmeira (2001, p.47) ao
comentar a visão de Holanda, em sua obra Raízes do Brasil, é elucidativo:
Sérgio Buarque [...] interessa-se [pela] projeção [do brasileiro] na vida pública, no comportamento político, e analisa como constitui um empecilho à construção de um Estado moderno e democrático. O ’homem cordial’, escravo de suas paixões, não aceita normas que transcendam seus desejos; nenhum espaço público moderno pode se assentar sobre tais bases. (grifo nosso)
A constituição histórica da sociedade brasileira a levou a se organizar como uma
oligarquia patrimonial, mesmo nas primeiras décadas após a proclamação da
república. O Império brasileiro era claramente Patrimonialista. A própria relação
entre o Imperador e a Administração Pública, evidenciava tal confusão entre as
esferas pública e privada. A nascente burocracia era integrada por membros de
uma elite econômica aristocrática.
42
O fim do Império não representou alteração no modo de dominação exercido.
Fundamentalmente, a Sociedade e o Estado permaneceram com suas
estruturas originárias inabaladas. O continuísmo político representado pela
política do “café com leite” evidenciava que, a despeito da modernidade da
república democrática, em essencial os “donos do poder” continuavam os
mesmos. Barbosa (1992, p. 86) afirma:
Quando os movimentos políticos e sociais do final do século XIX nos levaram de encontro aos novos valores da modernidade, não trocamos nossos valores antigos pelos novos, apenas superpusemos às nossas velhas calças um paletó novo e, assim, criamos um sistema social onde todos os códigos, modernos e tradicionais, se entrecortam, permitindo uma multiplicidade de opções igualmente válidas a todos que aqui vivem.
Foi apenas como um fruto dos movimentos internos ocorridos ao longo da
década de 1920 e, fundamentalmente, do advento da primeira crise financeira
global, em função do crash da Bolsa de Valores, ocorrida em 1929, que o
sistema entrou em colapso.
O golpe de 1930 deu início a uma profunda reestruturação da Sociedade e do
Estado nacional. A centralização do poder de modo autoritário conduziu este
movimento. A realocação de capitais agrários, aliada a vultosas inversões
estatais, deu origem à industrialização e consolidou o fenômeno da urbanização
do país.
Estes novos centros urbanos florescentes abrigaram novas classes operárias,
empregadas das fábricas modernas e uma nova burocracia não aristocrática.
43
Estas foram semente para as reformas trabalhistas e administrativas promovidas
pelo governo Vargas. Esta última, ao introduzir mecanismos como a instituição
dos concursos públicos como meio de ingresso para o funcionalismo,
racionalizar os métodos empregados pela administração pública e instituir
critérios gerais para classificar os cargos, dentre outras, (BRESSER PEREIRA,
2001, p. 235) evidencia a criação de um novo modelo de gestão, que reflete o
novo binômio Estado-Sociedade: a Burocracia Moderna.
Em linhas gerais, este modelo de gestão é aquele que vai perdurar ao longo dos
50 anos seguintes. A despeito da introdução de novos elementos, eventuais
avanços e retrocessos, a burocracia moderna será o sistema de gestão pública
que suportará o modelo econômico de substituição de importações, do mesmo
modo que o modelo patrimonialista forneceu as bases para o modelo agrário-
exportador.
Este modelo vai perdurar até meados da década de 1990, quando o
esgotamento do modelo econômico, associado a novas demandas internas
(renovação democrática, Carta de 1988, hiperinflação) e externas (ascensão do
ideal neoliberal, acirramento da globalização, fim do regime comunista,
“Consenso de Washington”) levará a uma nova configuração para a gestão
pública.
44
Bressan (2002, p.370) classifica o modelo de gestão pública anterior a 1995
como “altamente burocrático” e aponta disfunções como caráter rígido, atividade
fragmentada, normalização excessiva, estrutura excessivamente hierarquizada.
Estes signos geravam desmotivação entre funcionários, impediam a percepção
do resultado do trabalho que prestavam, “processos longos, onerosos e
ineficazes”, dentre outras mazelas. Por fim, afirma:
É neste contexto que se desenvolve o projeto de reforma administrativa do governo Fernando Henrique. Seu objetivo central seria reformar um governo burocrático e insatisfatório diante das novas exigências, o que provocava uma combinação perversa entre serviços de baixa qualidade e alto custo. Era necessária, portanto, uma reforma gerencial (grifo nosso) que trouxesse à Administração Pública maior flexibilidade, agilidade, eficácia e eficiência. (BRESSAN, 2002, p. 371)
Deste modo, a reforma gerencial foi a resposta encontrada pelos responsáveis
pela Administração Pública para fazer face às demandas da sociedade. Sua
implantação tinha como objetivos:
• redirecionar o papel do Estado, de executor ou prestador direto de serviços para promotor do desenvolvimento social e econômico, aumentando sua capacidade de formulação, controle e avaliação de políticas públicas;
• recuperar a autonomia de gestão e o dinamismo necessários à prestação dos serviços estatais através de novos modelos institucionais;
• desenvolver uma política de recursos humanos capaz de atender o novo papel assumido pelo Estado; de caráter regulatório, articulador dos agentes econômicos, sociais e políticos (BRESSAN, 2002, p. 375).
Este novo modelo encontra-se ainda em processo de construção, não estando
ainda completamente implantado. Esta montagem deverá consumir ainda anos
45
de medidas e discussão com a sociedade, uma vez que tal modelo sofre
severas críticas de seus opositores.
Deve-se, desde já, deixar claro que esta proposta tem um cunho flagrantemente
neoliberal. Ao afirmar que um de seus objetivos é aquele do Estado assumir um
papel de agente regulador este caráter fica evidente. Esta proposta estava,
portanto, alinhada a uma filosofia política mais ampla, implantada ao longo do
governo Fernando Henrique, cujo lastro fundamental pautava-se no conjunto de
valores neoliberais conhecido como “Consenso de Washington”3. Esta espécie
de cartilha para políticas públicas gozou de grande prestígio internacional ao
longo da primeira metade dos anos 1990, até ter sua credibilidade seriamente
abalada pelas sucessivas crises econômicas que sacudiram o final desta década
(crises do México, Argentina, Ásia, Rússia, Brasil, Turquia e Argentina
novamente).
3 O “Consenso” propunha, dentre outras medidas, rígida disciplina fiscal, reforma tributária, abertura comercial, privatizações, desregulação da economia, fortalecimento dos direitos de propriedade, taxas de juros reais e positivas, taxa de câmbio competitiva,incentivo ao investimento direto estrangeiro
46
CAPÍTULO II DESENVOLVIMENTO LOCAL: UMA QUESTÃO CONTEMPORÂNEA
Esta segunda seção tem por objetivo discutir a problemática associada à idéia
de Desenvolvimento Local, partindo de uma revisão da discussão acerca da
evolução do conceito de desenvolvimento no campo da Economia.
Num primeiro instante, destaca-se a relevância do tema, acentuada nas
sociedades contemporâneas pelo grau de desenvolvimento tecnológico do
sistema de produção, não acompanhado de políticas distributivistas adequadas.
Partindo da abordagem dos economistas clássicos, faz um retrospecto das
abordagens dos neoclássicos e keynesianos, que fornecem o lastro sobre o qual
se constroem as discussões contemporâneas. Nestas, a dimensão puramente
econômica do desenvolvimento encontra-se em xeque e as fronteiras entre local
e global tornam-se difusas.
No último instante, procura fazer uma leitura do conceito de desenvolvimento
local. Destaca-se a complexidade da gestão deste processo, marcada (a) pela
necessidade de reconhecer a existência de um espaço histórico e um de espaço
de produção que mantém lógicas próprias, e (b) por uma multiplicidade de
fatores e dimensões que se combinam continuamente redefinindo o local e o
global num fluxo interminável.
47
2.1 TENSÕES DO DESENVOLVIMENTO
As questões envolvendo desenvolvimento das sociedades ganham profunda
importância a partir do momento em que as comunidades humanas alcançam
um grau de maturidade de sua capacidade tecnológica e produtiva, que lhes
permite gerar tamanha produção de bens que possibilita que todos os habitantes
do planeta tenham direito ao mínimo necessário para sobreviver em condições
dignas.
Entretanto, o globo encontra-se claramente dividido entre regiões e países ricos,
onde as condições de sobrevivência e conforto material atingem um grau
elevadíssimo, e outras em que estas condições simplesmente inexistem,
estando seus habitantes simplesmente entregues à própria sorte.
A complexidade e fragmentação desta sociedade atingiram tal ponto, que,
mesmo dentro destas regiões tradicionalmente classificadas como ricas ou
pobres, desenvolvidas ou em desenvolvimento, pode-se verificar enormes
diferenças nos níveis de conforto de seus habitantes. A estratificação sócio-
econômica verifica-se mesmo na urbe.
Refletindo sobre o tema, Dupas (2003, p. 45, 47, 91) afirma:
(...) a utopia da globalização e dos mercados livres torna-se a grande referência. (...) A mobilidade do capital e a emergência de um mercado global, por sua vez, favoreceram a criação de uma nova elite
48
que controla os fluxos do capital financeiro e das informações. (...) o antigo ‘conflito social’ entre burguesia e proletariado foi substituído por uma tensão mais profunda entre os incluídos na sociedade global e a crescente maioria dos excluídos aos benefícios do progresso tecnológico e do acúmulo de riqueza gerado pela lógica dos mercados livres.
A nova estrutura da sociedade fundada na criação de riqueza, por meio da
exploração cada vez mais intensiva de capital intelectual e tecnologia da
informação, cria uma nova tensão em que os fluxos financeiros controlados por
uma, muitas vezes distante, elite global determina a sorte da maioria da
população. O local e o global se confundem.
Assim, questões como a do desenvolvimento, e especificamente a do
desenvolvimento local, tornam-se fundamentais para que as sociedades (sejam
elas mais ou menos desenvolvidas) possam promover os ajustes necessários
em suas estruturas, de modo a promover o bem-estar de seus cidadãos.
49
2.2 DESENVOLVIMENTO: UMA VISÃO CLÁSSICA
Ao longo dos últimos duzentos anos, a visão da economia clássica orientou as
discussões acerca do tema desenvolvimento nas sociedades ocidentais, bem
como as ações dos governos destes países. A influência do pensamento de
Smith e seus desdobramentos moldaram a estrutura destas sociedades, sendo,
deste modo, fundamental entender os pressupostos básicos de suas idéias para
se entender a configuração atual das economias ocidentais.
É importante observar que esta escola discute apenas a questão do crescimento
econômico. A idéia é que o crescimento econômico por si eleva os padrões de
bem-estar da sociedade como um todo, culminando no princípio utilitarista de
que a cada parcela de riqueza corresponde a sua parcela de felicidade. Assim,
para esta discussão crescimento e desenvolvimento não são mais que
sinônimos.
Um outro aspecto que deve ficar claro é que, para os clássicos, a racionalidade
dos agentes econômicos é ilimitada1. Ou seja, os agentes econômicos têm plena
ciência de todas dimensões que cercam as questões e sempre tomam decisões
com o intuito de maximizar a eficiência da utilização dos fatores de produção.
Daí a construção do Homo Economicus como figura representativa desta
concepção.
1 Em verdade, esta concepção será melhor elaborada pelos economistas neoclássicos, como adiante se verá, pois, para que esta visão atinja sua maturidade, será necessária a introdução de refinados modelos matemáticos, a partir dos quais tem origem a Microeconomia.
50
Segundo Santos (2001), a escola clássica pode ser dividida em duas vertentes
básicas: aquela afiliada ao pensamento original de Smith e aquela fundada na
visão de Malthus, que se contrapunha a este. Afirma, o autor:
Sendo esta a posição da teoria das finanças públicas no contexto da teoria clássica, deriva daí a constatação de que os macro-fundamentos dessa teoria não apresentam a homogeneidade suposta. Nesse ponto, ela apresenta pelo menos duas abordagens diametralmente opostas. De uma lado, tem-se as abordagens convergentes de Smith, Ricardo, Say e John S. Mill. De outro, tem-se o pensamento contraposto de Malthus.
Esta divisão dentro da concepção clássica tem seu ponto central na discussão
acerca da importância do impacto causado pela demanda efetiva sobre a
economia como um todo. Esta diferença gera visões absolutamente distintas
quanto à natureza e importância da intervenção governamental através de seus
gastos e da tributação.
O ponto que nos parece importante destacar nesta discussão refere-se,
justamente, à natureza do consumo e gastos governamentais. A ótica
hegemônica encontra seu pilar essencial sobre o pensamento de Say e sua
famosa assertiva de que toda oferta gera sua própria demanda. Conforme Mill
(apud KEYNES, 1982, p. 34)
O que constitui os meios de pagamento das mercadorias são as próprias mercadorias. Os meios de que cada indivíduo dispõe para pagar a produção alheia são os produtos que ele mesmo possui. Todos os vendedores são, no próprio sentido da palavra, compradores. Se pudéssemos duplicar repentinamente as forças produtoras de um país, poderíamos duplicar a oferta de mercadorias
51
em todos os mercados, mas ao mesmo tempo duplicaríamos o poder aquisitivo. Todo o mundo duplicaria simultaneamente a procura e a oferta; todos poderiam comprar o dobro, pois teriam duas vezes mais para oferecer em troca.
Deve estar claro que, no modelo clássico, a economia é concebida como em
equilíbrio, isto significa dizer que oferta e demanda são iguais. No bojo desta
visão, uma afirmação como a de Say orienta todo o esforço das sociedades para
o impulsionamento da oferta. Para que a economia cresça (desenvolva-se), a
sociedade deve estimular o incremento de sua capacidade produtiva, pois,
assim procedendo, estará, concomitantemente, impulsionando a demanda, o
que gera um incremento da atividade econômica como um todo.
Para esta corrente, os gastos da sociedade dividem-se em produtivos e
improdutivos. Os gastos privados podem assumir qualquer das duas
características, devendo os gastos produtivos ser estimulados. Já os gastos
governamentais necessariamente possuem o caráter improdutivo. Deste modo,
devem ser reduzidos ao mínimo necessário, vez que cada novo gasto
governamental (improdutivo) implica numa redução do mesmo montante nos
gastos privados, o que, por sua vez, implica numa redução dos gastos
produtivos, que resulta, por fim, numa redução do crescimento econômico, pois
o crescimento se dá como função direta do investimento de caráter produtivo, só
realizável pelos agentes privados.
Levando esta ótica às últimas conseqüências, chega-se à conclusão de que a
tributação, fonte de recursos governamentais, é inexoravelmente um mal, pois
52
retira recursos da esfera privada, única capaz de invertê-los produtivamente,
reduzindo a capacidade de crescimento da economia.
De outro lado, há a corrente Malthusiana que atribui à demanda efetiva um papel
importante no que se refere ao crescimento econômico. Malthus, além de ir de
encontro ao princípio de que a oferta gera sua própria demanda, rediscute o
caráter dos gastos governamentais.
Ilustrando a convicção de Malthus quanto a insuficiência do crescimento
alavancado sem o estímulo à demanda efetiva, Santos (2001, p.23) afirma:
Mas, na defesa dos elementos estimuladores da demanda efetiva – convencido que estava da importância desse princípio no processo de expansão capitalista -, Malthus propõe ainda um papel mais ousado por parte do Estado. Isto implicava a expansão da produção, mediante a construção de obras públicas, como: abertura e manutenção de estradas, construção de canais e portos etc. Esta passagem é particularmente importante porque Malthus estava consciente de que estas novas ações do Estado não implicavam apenas demanda efetiva, mas eram a garantia para a ampliação do emprego e do nível de renda.
Como se pode perceber desta passagem, fica evidente a oposição da visão
Malthusiana, daquela dos afiliados a Smith. Enquanto para estes o crescimento
econômico dava-se apenas através do incremento à capacidade produtiva, que
só poderia ser feita por inversões dos agentes privados, assumindo os gastos
governamentais um caráter pernicioso, para Malthus estes gastos poderiam ser
o coração do crescimento econômico ao estimularem o nível agregado da
53
demanda efetiva da sociedade. Os impostos assumem, desta forma, um caráter
distributivista da renda nacional.
O fato das idéias de Malthus terem sido relegadas a um segundo plano auxilia o
entendimento acerca da construção das concepções sobre Estado mínimo terem
obtido tamanho êxito entre os países ocidentais. Isto também dá pista quanto ao
papel que se espera que seja desempenhado pelos agentes econômicos
privados na tarefa de gerar o crescimento (desenvolvimento) econômico, bem
como aos mercados.
Repousa, assim, sobre os ombros dos agentes privados e dos mercados a
tarefa da promoção do crescimento econômico. Ao Estado cabe o papel de
facilitar e estimular as atividades desempenhadas por estes atores em sua
labuta em busca de seus objetivos. Do seu sucesso depende todo
desenvolvimento da sociedade. Não há, sob esta ótica, qualquer outro papel que
deva ou possa ser desempenhado pela esfera pública.
54
2.3 A CONSTRUÇÃO NEOCLÁSSICA
O século XIX assistiu a consolidação do capitalismo e a sua entrada num novo
estágio, qual seja, o capitalismo industrial. Restringindo a análise apenas à
esfera econômica, este século assiste a Segunda Revolução Industrial – a
revolução dos transportes (ferrovias, indústria naval), das novas fontes de
energia (eletricidade, petróleo) e da indústria química.
Assistiu, portanto, o surgimento da grande indústria, marcada pela
movimentação e inversão de vultosos recursos da sociedade nestes
empreendimentos, pelo longo prazo de maturação destes investimentos e pela
necessidade de instauração de uma burocracia técnico-gerencial especializada
para geri-la, dada sua complexidade. São reflexos diretos desta nova realidade o
surgimento de duas novas áreas do conhecimento, a saber: a microeconomia e
a “ciência” da Administração.
O pensamento neoclássico é marcado pelo emprego de uma racionalidade
instrumental levada ao extremo em função da introdução e consolidação de um
novo recurso na Economia: a Matemática. Este instrumento lógico-quantitativo
viabiliza a busca do que, a partir de então, vai marcar o discurso econômico
hegemônico: o funcionamento ótimo do sistema econômico.
Em nota quanto a este tema, Santos (2001, p. 61) afirma:
55
Na concepção de Pigou, no estudo da economia do bem-estar, três premissas são importantes. Primeira, que nessa linha de abordagem a economia deve ser considerada como ‘uma ciência positiva do que é e tende a ser, não uma ciência normativa do que deve ser’. Segunda, que o bem-estar econômico é apenas uma fração do bem-estar total- e como este não é facilmente quantificável-, assim o que importa é saber de ‘que forma esta magnitude estará afetada por causas que os governantes e os indivíduos privados podem criar’. Terceira, considerando-se que o dinheiro é o único instrumento aproveitável na vida social, o alcance da análise deve-se restringir ‘`aquela parte do bem-estar social que pode pôr-se em relação, direta ou indiretamente, com o padrão monetário de medida’- que é denominado de bem-estar econômico.
Este trecho elucida claramente a ruptura neoclássica. Como primeira premissa,
estabelece o professor Pigou que a Economia deve deixar de lado o caráter
“normativo” adotado pelos clássicos. Em lugar disto, deve ater-se àquilo que
existe, do modo que exista. Isto implica, em abrir mão de objetivos políticos
maiores e na aceitação do que existe como “perfeito”. Não se deve gastar
energia em discussões tolas quanto às desigualdades sociais, pois a distribuição
é sempre a ideal, posto que resultante da interação livre das forças econômicas,
para uma dada sociedade.
A segunda e terceira premissas, em conjunto, estabelecem um novo conceito
que deve assumir a condição de meta fundamental da política pública: em lugar
da busca do incremento do bem-estar geral, como anteriormente propunham os
clássicos, o alvo deve ser o incremento do bem-estar econômico.De fato, o rigor
matemático não permite a busca de uma quimera que não pode ser
quantificada.
56
Em lugar de lutar contra gigantes imaginários na busca do bem-estar geral, o
poder público deve, reconhecendo que, em verdade, estes são apenas moinhos
de vento, orientar-se em prol da promoção de sua fração exeqüível, posto que
mensurável – o bem-estar econômico. Esta opção pelo pragmatismo,
absolutamente em linha com a primeira premissa, deve conduzir toda ação do
Administrador Público.
57
2.4 A ABORDAGEM KEYNESIANA
A obra de Malthus ganharia uma importante revisão a partir de sua releitura e
aperfeiçoamento por aquele que seria considerado o mais influente economista
do século XX – John Maynard Keynes. Caberia a Keynes colocar em dúvida a
concepção equilibrista dos clássicos e dar novo impulso à discussão acerca da
importância da demanda efetiva e, por extensão, ao papel desempenhado pelos
gastos governamentais na promoção do crescimento (desenvolvimento), a
despeito de sua abordagem teórica não possuir “um corpo teórico estruturado
consagrado às finanças públicas” (Santos, 2001, p. 85).
Em breves linhas, assim expõe Keynes (1982, p. 39) a espinha dorsal de sua
concepção:
As grandes linhas da nossa teoria podem expressar-se da maneira que se segue. Quando o emprego aumenta, aumenta também, a renda real agregada. A psicologia da comunidade é tal que, quando a renda real agregada aumenta, o consumo de agregado também aumenta, porém não tanto quanto a renda. Em conseqüência, os empresários sofreriam uma perda se o aumento total do emprego se destinasse a satisfazer uma maior demanda para consumo imediato. Dessa maneira, para justificar qualquer volume de emprego, deve existir um volume de investimento suficiente para absorver o excesso da produção total sobre o que a comunidade deseja consumir quando o emprego se acha a determinado nível. A não ser que haja este volume de investimento, as receitas dos empresários serão menores que as necessárias para induzi-los a oferecer tal volume de emprego. Daqui se segue, portanto, que dado o que chamaremos de propensão a consumir da comunidade, o nível de equilíbrio do emprego, isto é, o nível em que nada incita os empresários em conjunto a aumentar ou reduzir o emprego, dependerá do montante de investimento corrente. O montante de investimento corrente dependerá, por sua vez, do que chamaremos de incentivo para investir, o qual, como se verificará, depende da relação entre a escala da eficiência marginal do capital e o complexo das taxas de juros que incidem sobre os empréstimos de prazos e riscos diversos.
58
A demanda efetiva, segundo Keynes, é justamente resultado do somatório entre
o montante que se espera seja gasto pela comunidade em consumo e o
montante que se espera seja aplicado em novos investimentos. Como se pode
ver do trecho acima, esta variável, ao contrário da concepção hegemônica
clássica, ocupa lugar central em seu modelo econômico. Alban (1999, p. 32)
assim se expressa a este respeito:
Rejeitando a visão ortodoxa para as altas taxas de desemprego, Keynes desenvolverá sua teoria contrapondo a lei de Say com o princípio da demanda efetiva. Para ele, a idéia de que toda oferta gera sua própria demanda não era válida nas modernas sociedades industriais.
Um outro elemento que ganha destaque, sob esta abordagem, é a expectativa
dos empresários por meio da análise da eficiência marginal do capital2 que
assume o papel de determinar o nível de investimentos que estes estariam
dispostos a fazer, ampliando ou reduzindo o nível geral de emprego. Esta
expectativa, pode-se notar, é uma função direta da propensão a consumir da
comunidade, que, assim, em última instância, determina a dinâmica do ciclo.
A despeito de não introduzir uma nova concepção sobre a idéia de
desenvolvimento, é importante frisar que o modelo Keynesiano provoca uma
grande alteração na atribuição de responsabilidades ao poder público, no que
tange ao crescimento econômico.
2 Segundo Alban (1999, p. 34) esta é a “taxa de desconto que iguala o fluxo de rendimentos esperados ao custo de efetivação do investimento”.
59
A partir de Keynes, principalmente da implantação da política de “New Deal”
pelo governo Roosevelt, os governos assumem uma postura ativa na condução
de políticas de crescimento (desenvolvimento). A força, coerência e repercussão
de suas idéias vão lastrear as ações da Social Democracia e servir de lastro
sobre o qual se erguerá o Welfare State europeu, que irá estabelecer novos
parâmetros de bem-estar para as sociedades ocidentais no século XX.
60
2.5 ALÉM DO CRESCIMENTO ECONÔMICO
Como colocado anteriormente, na visão dos economistas clássicos,
neoclássicos e keynesianos crescimento econômico e desenvolvimento eram
sinônimos. A despeito de suas diversas disputas ideológicas e concepções
muitas vezes antagônicas, neste ponto não havia controvérsia: a meta a ser
atingida era o crescimento econômico.
Entretanto, as limitações de tal concepção começaram a ser expostas através
do trabalho de uma série de filósofos, economistas, sociólogos ao longo do
século XX, especialmente a partir de sua segunda metade.
Atacando a raiz da racionalidade econômica, Karl Polanyi coloca em xeque a
figura do Homo Economicus ao afirmar:
A descoberta mais importante nas recentes pesquisas históricas e antropológicas é que a economia do homem, como regra, está submersa em suas relações sociais. Ele não age desta forma para salvaguardar seu interesse individual na posse de bens materiais; ele age assim para salvaguardar sua situação social, suas exigências sociais, seu patrimônio social. Ele valoriza os bens materiais na medida em que eles servem a seus propósitos. Nem o processo de produção, nem o de distribuição está ligado a interesses econômicos específicos relativos à posse de bens. Cada passo desse processo está atrelado a um certo número de interesses sociais, e são estes que asseguram a necessidade daquele passo. (1988, p. 61)
Como se pode perceber, Polanyi não apenas introduz uma dimensão social na
racionalidade humana, como também subordina a dimensão econômica àquela,
61
o que vai de encontro à concepção clássica, onde só os aspectos puramente
econômicos devem ser considerados no processo de tomada de decisão.
Neste aspecto Bresser-Pereira (2003, p.32) propõe um conceito de
desenvolvimento que abarca três dimensões indissociáveis: a econômica; a
social; e a política. Assim, afirma:
O desenvolvimento é um processo de transformação econômica, política e social através do qual o crescimento do padrão de vida da população tende a tornar-se automático e autônomo. Trata-se de um processo social global, em que asa estruturas econômicas, políticas e sociais de um país sofrem contínuas e profundas transformações. Não tem sentido falar-se em desenvolvimento apenas econômico, ou apenas político, ou apenas social. Não existe desenvolvimento dessa natureza, parcelado, setorializado, a não ser para fins de exposição didática. Se o desenvolvimento econômico não trouxer consigo modificações de caráter social e político; se o desenvolvimento social e político não for a um tempo o resultado e a causa de transformações econômicas, será por que, de fato, não tivemos desenvolvimento. As modificações verificadas em um desses setores terão sidas tão superficiais, tão epidérmicas que não deixarão traços. [...] O desenvolvimento, portanto, é um processo de transformação global.
Este trecho evidencia uma concepção sob a qual para que um fenômeno seja
entendido como desenvolvimento toda a estrutura sobre a qual se fundam as
sociedades devem ser concomitantemente afetadas. As transformações
econômicas devem, necessariamente, implicar em mudanças na estrutura social
e na estrutura política de uma determinada localidade e vice versa.
Esta abordagem torna mais complexa a apreensão de tal fenômeno, uma vez
que novas variáveis são introduzidas na discussão. No que tange à dimensão
política, certamente os modelos de dominação vigentes, o grau de participação
62
das pessoas e organizações na tomada de decisão, a utilização e
institucionalização espaço público são dimensões que ganham espaço no
debate. Por sua, em relação à dimensão social, a forma da organização da
sociedade, os organismos e instituições existentes, as normas de convivência /
práticas sociais vigentes também se inserem no contexto da discussão.
63
2.6 CONTEXTO LOCAL
Uma vez que se chegue a um conceito de desenvolvimento torna-se importante
debater, afinal, as questões que afetam o processo de desenvolvimento local.
Muito mais do que um esforço conceitual-teórico, esta é uma construção
fundamental para a moderna sociedade.
A crise dos 70 trouxe consigo um incremento nas responsabilidades sob a tutela
da esfera local. O fim do modelo de desenvolvimento Keynesiano que vigorara
hegemonicamente nas sociedades ocidentais desde o fim da II Guerra Mundial,
marcado pelo intervencionismo governamental na economia e a concentração
da gestão dos esforços na esfera central esgotou-se. Nas palavras de Castells
(2001, p.36):
O modelo Keynesiano de crescimento capitalista, que levou
prosperidade econômica sem precedentes e estabilidade social à
maior parte das economias de mercado durante quase três décadas
após a segunda guerra mundial, atingiu as próprias limitações no
início da década de 70, e sua crise manifestou-se sob a forma de
inflação desenfreada.
Do processo de reestruturação econômica que teve origem então, emergiu uma
nova concepção onde caberia à esfera local uma participação mais ativa. Até
então, aos espaços locais coube, no mais das vezes, ajustar-se passivamente a
tais decisões originárias de outras esferas de poder.
64
Entretanto, a complexidade da crise, colocando em xeque simultaneamente o
poder econômico (fim do padrão ouro-dólar estabelecido na Conferência de
Bretton Woods) e o poder político (crise do Estado de Bem Estar Social), criou
um ponto de inflexão na história das economias ocidentais. As discussões locais
surgem justamente como uma reação aos impactos negativos, e os efeitos
sociais mesquinhos que a crise macroeconômica gerava no espaço local. Como
afirmam Juncal e Corteggiano Jr (1998):
De esta manera, la discusión y el énfasis en las iniciativas localistas se constituyen en partes fundamenrales de un amplio proceso de tomada de consciencia, a nivel local, de la necesidad de reverter los efectos sociales negativos del funcionamiento no regulado del sistema económico. Así, la mobilizacíon en favor de respuestas locales tenía como objetivo central generar mecanismos propios de reacción frente a las macro-transformaciones por que pasava el capitalismo.
Uma questão deve ser claramente exposta para que se possa avançar. O
conceito de “local” aqui utilizado lastreia-se na definição de Czamanski (apud
CODES LIMA 1999, p. 21):
Área dentro da economia nacional que possua uma estrutura suficientemente completa para que possa operar com certa independência e sobre a qual se exerça, por parte do agente decisório, um determinado controle político administrativo que permita a aplicação de um conjunto de medidas ou programas sobre essa área.
Esta definição preliminar, relativamente simples, não deixa de levar em conta a
corajosa observação de Duncan e Savage (apud Vainer 2002, p. 16-17):
Talvez a mais irritante característica da ‘pesquisa local’ seja a variedade de significados e usos atribuídos a ‘lugar’. Esta, como é
65
unanimemente reconhecido, foi uma das principais falhas da tradição anterior de pesquisa de comunidade que também tentou especificar como o espaço faz a diferença de processos sociais.
A dimensão do desenvolvimento, discutida anteriormente, envolve uma série de
outras dimensões que refinam o entendimento da questão. Para que se possa
melhor espelhar a concepção de “evolução” alcançada por uma dada sociedade,
deve-se “designar um processo de superação de problemas sociais, em cujo
âmbito uma sociedade se torna, para seus membros, mais justa e legítima”
(SOUZA, 2000, p.18).
Esta assertiva de Souza faz menção à Ética de uma sociedade. Uma sociedade
em seu processo de desenvolvimento deve, superando seus problemas sociais,
tornar-se mais justa e, à medida que isto ocorre, tornar-se mais legítima. Uma
certa configuração social é tão legitima quanto o grau de justiça social que
consegue promover. Além da dimensão puramente econômica, a dimensão
social passa a ocupar um eixo nuclear da discussão acerca do desenvolvimento.
Esta visão encontra-se em consonância com aquela exposta por Wolfe, quando
afirma:
A questão com que, cada vez mais, iremos nos defrontar não é se o desenvolvimento é possível, mas que tipo de desenvolvimento será e, para responder a esta pergunta, o social deverá se tornar parte de nosso foco, tanto quanto o econômico e o político (apud LOYOLA e MOURA,1995, p. 10)
66
Um aspecto que deve, igualmente, ser considerado, é aquele que se refere às
limitações existentes ao poder de decisão das instâncias locais. Estas,
efetivamente participam de uma rede de interesses onde existem atores com os
mais diversos tamanhos e objetivos. Assim, a sua atuação é sempre limitada
pela atuação dos demais, devendo considerar os possíveis feedbacks que
advirão antes mesmo de decidir como agir.
Sob esta ótica, Benko afirma:
Cada região, cada cidade torna-se extremamente específica porque
se definem por na divisão espacial do trabalho. Mas ao mesmo tempo
elas são esvaziadas de poder e de se sentido na lógica geral da
produção. Os lugares são transformados em fluxos. A
transformação do modelo de produção significa dependência das
unidades territoriais (produtivas) em relação aos fluxos internacionais.
(apud ECHAVARRÍA 2002, p. 11, grifo nosso).
Assim, o poder e a importância dos atores são definidos pelo seu papel no fluxo
de produção, pelo seu maior ou menor engajamento na rede global. O raio de
atuação da esfera local é limitada, antes de mais nada, pela sua necessidade de
engajar-se num fluxo mais amplo que os seus próprios limites territoriais. Ela
não pode, isoladamente, controlar todos os fatores que determinam o seu
desenvolvimento.
Para que o espaço local consiga desenvolver-se, precisa encontrar uma
conexão com outros espaços, locais ou não. Não existe a possibilidade de
67
desenvolvimento exclusivamente endógeno. Há fatores exógenos, fora da esfera
de controle do poder local, que desempenham papéis fundamentais para o
desenvolvimento dos espaços locais. Numa tentativa de ilustrar alguns destes
fatores Almeida (2000, p.41) afirma:
Assim, conclui-se que são muitos os fatores exógenos que afetam as
dinâmicas locais. A criação do FUNDEF, a Lei de Responsabilidade
Fiscal, o PRODUR, o SAC, a política cambial, todos são exemplos
destes fatores no âmbito nacional e estadual, que somadas às
transformações estruturais externas, formam o ambiente em que os
ambientes estão inseridos.
Com o mesmo raciocínio, observa-se que no plano interno, novos
pontos diretamente vinculados à realidade local contribuem para a
conformação da dinâmica. A existência de um poder municipal
autoritário e soberano, que muitas vezes infringe os limites da
legalidade, convivendo com uma sociedade sem capacidade de
reação, haja vista que grande parcela é refém desta estrutura e a
outra é corrompida por ela, também são exemplos de fatores
endógenos que auxiliam na conformação da dinâmica local.
Em busca de melhor entender esta questão, Vieira & Vieira (2003) classificam os
lugares em função do papel que desempenham: lugares-locais e lugares-
globais. Assim, afirmam:
O lugar-local é o espaço da herança histórica. Dele se projeta a percepção de realidades construídas no passado, modernizadas de acordo com os ritmos econômicos e renovadas com o avanço cultural. O lugar local é base de sustentação do território organizado. Os processos demográficos, econômicos e culturais têm caráter histórico e fazem parte do contexto da formação econômica e social da região de inserção. (Vieira & Vieira 2003, p. 19-20)
68
O lugar-local é, portanto, o espaço do homem e de sua comunidade. É neste
local que os eventos históricos se processam e a partir do qual as sociedades
humanas se constroem e compreendem. Não há como o indivíduo dele
desvencilhar-se, pois é apenas nele que têm lugar todas as suas aspirações,
desejos, atitudes. Em suma, é no lugar-local que se consumam todas as ações
humanas- individuais e/ou coletivas. Por sua vez,
O lugar global é a definição do espaço em função do processo de globalização da economia. (...) Assim, o lugar-global é a sede da ação, onde se operacionalizam as práticas produtivas e circulatórias; o centro da ação, contudo, pode estar muito distante fisicamente, porém virtualmente próximo nas operações de comando.(...) O lugar-global é, portanto, o espaço para as estratégias mundiais das grandes corporações multinacionais, estabelecendo redefinições territoriais e mudanças nos procedimentos de gestão. (Vieira & Vieira 2003, p. 19-20)
A questão que se coloca, então, é como orquestrar a ação de uma multiplicidade
de fatores endógenos e exógenos, a superposição adequada do lugar-local e do
lugar- global, de modo que o gestor do espaço local otimize a atuação destes
mesmos fatores em benefício próprio.
Uma outra questão que se coloca neste debate, a partir destas observações, é
aquela da influência exercida pela forma de percepção dos espaços locais pelos
diversos agentes econômicos. Uma vez que o desenvolvimento do espaço local
é determinado por fatores exógenos e endógenos, é preciso que os diversos
agentes sintam-se motivados a realizar inversões neste espaço, e que estes
investimentos estejam em consonância com a estratégia adotada pelo poder
local.
69
Como afirma Harvey, “as possibilidades político-econômicas da reconstrução de
lugares estão coloridas pela maneira evaluativa da representação dos lugares”
(apud SANCHÉZ 2001, p. 3). Vê-se, então, que a questão do desenvolvimento
local é marcada por um emaranhado de variáveis, que complexificam
sobremaneira a gestão de seu processo, demandando uma capacidade de
adaptação cada vez maior das localidades. Como afirmam, ainda, Vieira & Vieira
(2003, p. 20): “A gestão do território, na nova dimensão dos lugares, depende
das forças que sobre ele atuam”.
70
CAPÍTULO III Bahia: Turismo e Desenvolvimento no Início do Século XXI
3.1 UM MAPA ESPACIAL DA ECONOMIA BAIANA
No início da última década do século XX, a economia da Bahia apresentava uma
elevada concentração de investimentos, somada a altas densidades econômica
e demográfica ao longo de sua faixa litorânea, herança do processo de
colonização nacional. A Macrorregião de sua capital concentrava, então, 62,34%
dos fluxos sócio econômicos do estado, enquanto os municípios localizados no
litoral do estado eram responsáveis por 70,85% destes fluxos (PORTO, 2002).
Esta tendência é ainda mais reforçada pelo eixo logístico formado pela BR 101,
que corta o litoral do estado, responsável pela ligação das regiões Sudeste e Sul
do país à capital baiana e aos demais estados do nordeste brasileiro.
Além desta região litorânea, alcançavam algum destaque e significado
econômico, municípios situados nas fronteiras do estado. Na região Oeste,
Barreiras alcança uma posição de destaque, ao mesmo tempo em que, ao
Norte, Juazeiro também atinge status singular. Não por acaso, ambos os
municípios são pontos de inflexão de vias de grande fluxo, respectivamente as
BR 242 e BR 407, que cruzam o estado conectando sua capital às regiões
Centro-Oeste e Nordeste do país.
O fato interessante a se notar é que, ao final do século XX, a Bahia apresentava
uma grande concentração da sua riqueza em seus extremos. Seja no litoral
71
(Leste), ao Norte, ou a Oeste esta característica se podia observar. Além destes
municípios, situados nos extremos geográficos do estado, outros três, situados
ao longo da BR 116, que liga Salvador à Minas Gerais e ao Sudeste, também se
destacam, a saber: Vitória da Conquista, Jequié e Feira de Santana. Assumem
uma importância regional ao se tornarem importantes pólos locais de comércio.
(PORTO, 2002)
No restante do estado predomina um enorme vazio econômico e demográfico.
Nesta região interior, 317 municípios respondem por apenas cerca de 12% dos
fluxos de riqueza estadual. Um sem número deles possui participação inferior a
0,1% nos fluxos econômicos, o que evidencia sua pobreza e irrelevância
econômica. É neste meio que se encontra a região da Chapada Diamantina e,
em especial, o município de Lençóis- objeto deste estudo. Para estas
municipalidades, a criação de novas alternativas de desenvolvimento são um
imperativo, sem o qual estão fadadas a remanescer em estágio econômico
vegetativo.
Vê-se, portanto, que há uma indubitável concentração de riquezas no estado. Na
verdade, no ano de 1990 apenas os 29 maiores municípios baianos
concentravam 74,86% dos fluxos econômicos estaduais (PORTO,2002). É a
partir deste quadro de concentração da riqueza que o Governo Estadual,
premido por uma série de circunstâncias fora de seu controle, e por um
72
ambiente econômico nacional hostil, implanta uma nova estratégia de
desenvolvimento.
Figura 1 - Bahia: Principais Eixos Logísticos.
73
3.2 1950 – 2000: MEIO SÉCULO DE HISTÓRIA
Deve-se observar que o momento contemporâneo de transição vivenciado pela
economia baiana é fruto do esgotamento do modelo de substituição de
importações, responsável pelo bem sucedido processo de criação do parque
industrial nacional.
Este eixo original começa a ser implantado com a criação da Refinaria Landulfo
Alves, aprofunda-se com a implantação do Centro Industrial de Aratu (CIA) e,
finalmente, consolida-se com a concepção do Pólo Petroquímico de Camaçari,
na década de 1970, quando o setor secundário finalmente supera o primário. O
quadro que segue evidencia a dramaticidade das alterações na estrutura
econômica baiana, por meio da composição setorial do seu PIB, ao longo do
período compreendido entre a década de 1960 e o ano 2000. Assim:
Quadro 3 - Bahia: Composição setorial do PIB (%)
ANO
SETOR PRIMÁRIO
SETOR SECUNDÁRIO
SETOR TERCIÁRIO
1960 40,0 12,0 48,0
1970 21,2 13,4 65,4
1975 30,7 27,5 41,8
1980 20,2 40,0 39,8
1985 18,7 42,3 39,0
1990 10,4 38,0 51,5
1995 13,6 35,2 51,3
2000 10,0 41,2 48,7
Fonte: CPE/SEI/IBGE
74
A análise dos dados acima deixa claro o monumental impacto causado pela
criação do Pólo Petroquímico de Camaçari na estrutura econômica baiana. O
Pólo, fruto do II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), consolidou a
entrada da Bahia na era industrial, ao tornar este setor o vetor dinâmico de
desenvolvimento da economia estadual.
Em uma década, a participação da indústria salta de modestos 13,4% para
40,0% do total da economia, transformando-se em seu maior segmento. Ao
mesmo tempo, o setor primário inicia um processo de redução inexorável de seu
significado econômico. No ano 2000, este setor respondeu por apenas 10% do
produto baiano.
Observando o fenômeno da transformação da economia baiana ao longo da
década de 1970, Vieira e Souza (2002, p. 104) comentam:
As modificações quantitativas e qualitativas na estrutura industrial
baiana, na década de 70, promoveram profundas transformações na
base produtiva do estado. O dinamismo apresentado foi confirmado
pelas taxas de crescimento acumulado e médio anual do PIB, no
período de 1976 a 1985 (77,9% e 5,9%, respectivamente), resultando
numa elevação significativa na renda per capita, que passou de uma
taxa de 5,5%, em 1976, para 7,2 %, em 1985. Esse é o período áureo
na economia baiana, pela expansão do setor industrial.
No entanto, após este período áureo, o estado foi colhido pela crise enfrentada,
desde o início dos anos 1980, pela nação brasileira. O conhecido esgotamento
75
da capacidade de financiamento do processo de desenvolvimento pelo Estado
levou a uma crise nacional que poria fim ao modelo de desenvolvimento de
substituição de importações, sobre o qual repousava o sucesso da economia
baiana.
Apesar de retardatária, no que tange a sentir os efeitos desta crise, os dez anos
que se seguiram (1986-1996) cobraram do estado um penoso tributo. A crise
enfrentada pela Bahia superaria aquela enfrentada pelo país. Dados da SEI
relatam que neste período a taxa média geométrica de crescimento da economia
nacional foi de três por cento anuais, enquanto a média baiana foi de apenas um
inteiro e setenta e nove centésimos por cento – pouco mais que a metade.
Em busca de uma alternativa, sob a inspiração do, assim chamado, “Consenso
de Washington”, cartilha econômica hegemônica ao longo dos anos 1990, uma
nova estratégia liberal de desenvolvimento, fundada nos princípios de abertura
econômica e privatização de empresas estatais como alavancas da ampliação
da competitividade dos agentes econômicos nacionais, teve lugar. A
implantação da nova estratégia pelo governo Collor, e sua confirmação pelos
governos Itamar e FHC, atinge em cheio o estado e o obriga definitivamente a
repensar a sua estratégia de desenvolvimento.
Num diagnóstico bastante agudo, Porto (2002, p.277-278) atinge o âmago da
questão, ao afirmar:
76
(...) a mundialização dos fluxos econômicos (...) elevou sobremaneira a competitividade entre as unidades de produção forçando-as a repensar suas estratégias, inclusive locacionais, e exigiu uma revisão do papel do Estado no fomento direto aos processos econômicos (...) Agora há regiões especializadas em atividades que devem encontrar competitividade numa escala mundial (...) É a submissão do desenho espacial da Bahia, agora sob os auspícios de movimentos que fogem do controle das políticas locais, embora elas possam vir a servir como elementos indutores do desenvolvimento, mas nunca como antes.
Assim, ao longo destes últimos 15 anos, o eixo de desenvolvimento fundado na
indústria de bens intermediários, especialmente a petroquímica, criado na
década de 1950 começa a ser substituído por outra dinâmica. As limitações de
um modelo fundado numa única base tornam-se evidentes e novas alternativas
começam a ser estudadas.
Comentando este diagnóstico e as respostas encontradas pelo governo baiano,
Alban (2002, p. 143) observa:
Ao contrário, [...] os limites e as fragilidades de um crescimento muito baseado nos bens intermediários já são questões bem conhecidas e que se tenta superar através de três novos vetores de crescimento. O primeiro deles é constituído pelos complexos agroindustriais de grãos, fruticultura irrigada e madeira/celulose, que, desde o começo dos anos 1980, se desenvolvem em várias regiões do estado. O segundo é o setor de turismo, uma vocação natural e esquecida da Bahia, que, a partir dos anos 1990, voltou a merecer uma certa atenção.[...] O terceiro vetor de crescimento [...] é a verticalização dos bens intermediários em direção à produção de bens finais.
Estas atividades, como se pode inferir desta assertiva, vêm ganhando
importância e transformando o cenário econômico baiano, ao longo das últimas
décadas. Em conformidade com esta visão liberal, este período, por sua vez,
77
especialmente os anos 1990, caracterizou-se pela adoção por parte do governo
estadual de um papel de agente catalisador e indutor do desenvolvimento.
Há, portanto, consonância entre a nova estratégia de desenvolvimento, as
diretrizes assumidas pelo governo federal e as premissas do “Consenso de
Washington”. Ao deixar aos agentes privados o protagonismo na produção,
ampliando o nível de competição por meio da abertura da economia, a
Administração Pública assume um comportamento gerencial, conforme a
nomenclatura anteriormente citada de Bresser Pereira (2001), afinada com a
nova visão liberal do papel do estado.
As novas diretrizes da estratégia de desenvolvimento do estado têm sido
importantes para sua reestruturação e a recuperação do vigor perdido de sua
economia. A consolidação e o incremento desta estratégia afeta os três setores
da economia baiana, conferindo-lhe maior equilíbrio:
• no setor primário, o novo agribusiness empresarial fundado no uso de
novas tecnologias de cultivo e irrigação intensiva, empregado nas regiões
produtoras de frutas (Juazeiro) e grãos (Oeste do estado), vem assumindo uma
posição de destaque, deslocando as culturas tradicionais (cana-de-açúcar, fumo,
cacau) de seu lugar;
78
• no setor secundário, a indústria de bens de consumo finais, como a
automotiva e de papel e celulose, substituem a indústria de bens intermediários,
dando novo fôlego e perfil ao parque industrial estadual;
• no setor terciário, a indústria do turismo, recebe atenção prioritária das
instituições governamentais e, a partir do desenvolvimento de novas políticas
públicas e do desenvolvimento de parcerias entre estas e instituições de
fomento ao desenvolvimento como o BID (Banco Interamericano de
Desenvolvimento) e o BNB (Banco do Nordeste do Brasil), realiza uma série de
investimentos por meio do PRODETUR/BA (Plano de Desenvolvimento Turístico
da Bahia) também tem alcançado extremo sucesso ao longo da última década.
O agronegócio competitivo moderno, a agroindústria, tem crescido
significativamente no estado. O desenvolvimento do Oeste Baiano, como
importante celeiro de grãos (soja, em especial), a dinamização do município de
Juazeiro, ao norte, como grande centro fruticultor, colocam a Bahia de vez no
cenário agrícola nacional. Estas novas culturas, que trazem consigo inversões
locais no desdobramento de sua cadeia de valor, ganhando importância
econômica e tomando o espaço outrora ocupado por culturas tradicionais como
a cana de açúcar, o fumo e o cacau.
No que tange à indústria de bens finais, é visível o esforço do governo estadual
no estímulo ao seu desenvolvimento com o objetivo de dinamizar a economia. A
79
atração de grandes investimentos, bem exemplificado pelas inversões realizadas
pela implantação do Complexo Amazon pela Ford e seus sistemistas na RMS, e
pela Schincariol, no município de Alagoinhas, é apenas a parte mais visível das
políticas de apoio a esta. Outros estímulos são evidentes na consolidação de
pólos como o calçadista, de tecnologia, moveleiro, dentre outros.
Por fim, a atividade turística tem ganhado cada vez mais a atenção e
comprometimento por parte dos governos estadual e municipais além dos
agentes privados que percebem nesta um imenso potencial. Potencial que vem
se confirmando e materializando ao longo da última década. No decênio
compreendido entre os anos de 1991 e 2000, segundo dados do Monitor Group
(2001) o estado apresentou um crescimento médio anual de 8,5% do número de
visitantes, que foi acompanhado de um incremento médio anual de 7,9% da
receita advinda desta. Assim, ao longo deste período a receita turística do
estado cresceu 770,3 milhões de reais para atingir 1 532,7 milhões de reais
anuais.
Assim, a década de 1990 assistiu a adoção de uma nova estratégia de
desenvolvimento proposta pelo governo do estado. Esta tem se revelado bem
sucedida, na medida em que a economia recuperou a sua dinamicidade,
voltando a crescer num ritmo superior àquele do país. No período compreendido
entre os anos 1997 e 2003, em que a estratégia começa a render os primeiros
80
frutos, a taxa média geométrica de crescimento da economia baiana foi de 3,2%
anuais, enquanto a média nacional não superou a 1,6% ao ano.
No entanto, no que tange à concentração econômica, os estudos de Porto
(2002) indicam que a situação do estado permaneceu a mesma ao longo do
período 1991-2000, com os 30 maiores municípios do estado concentrando
73,65% de seus fluxos econômicos totais. Isto, por sua vez, não impediu que a
nova dinâmica gerasse seus impactos próprios: ao longo deste mesmo período,
as regiões Oeste e Extremo Sul do estado experimentaram um grande
acréscimo em seus fluxos de 245,60% e 70,95%, respectivamente, enquanto
que a Macrorregião de Salvador experimentou um decréscimo em sua
participação relativa.
81
3.3. ANÁLISE DE UMA POLÍTICA PÚBLICA: O PRODETUR-BA
Para os fins deste trabalho, dentre os três vetores da nova estratégia de
desenvolvimento baiana, interessa em específico aquele voltado para o Turismo.
Esta seção tem, portanto, o objetivo de elucidar a lógica assumida pela política
pública desenhada para este segmento pelo governo do estado.
Segundo Gaudenzi (2001), o Plano de Desenvolvimento Turístico da Bahia
(Prodetur-BA) é a terceira estratégia de desenvolvimento turístico adotada pelo
governo baiano. Esta tem início no terceiro governo de Antônio Carlos
Magalhães, em 1991, período em que se iniciava o esforço de reestruturação da
estratégia de desenvolvimento fundada na produção de bens intermediários,
então em crise.
Tratando especificamente deste tema Mendonça Jr, Garrido e Vasconcelos
(2002, p.120) afirmam:
O Prodetur-BA pode ser descrito como um programa multissetorial do
Governo do Estado, que busca integrar ações de implantação de infra-
estrutura pública, promoção e educação para o turismo, em zonas
turísticas prioritárias. A Superintendência de Desenvolvimento do
Turismo (SUDETUR), na condição de gestora do PRODETUR,
responsabiliza-se pela articulação entre as entidades executoras de
infra-estrutura do Governo do Estado, sendo parceiros do programa a
BAHIATURSA, a EMBASA, o DERBA, a CONDER, o IPAC, o CRA e o
DDF.
82
O processo de articulação tem-se aperfeiçoado dentro do programa e,
ao longo desses anos, tem incorporado a participação das
comunidades locais e das organizações não governamentais (ONGs).
Constituem objetivos do Prodetur-BA, segundo o site da Secretaria da Cultura e
Turismo (SCT), aqueles abaixo arrolados:
• Desenvolver Centros Turísticos Integrados, capazes de competir
em nível internacional;
• Promover o desenvolvimento sustentado, através da adequação da
legislação do uso do solo e ambiental, visando manter a qualidade
dos recursos naturais;
• Obter a participação do setor privado, a quem cabe a implantação
dos projetos turísticos (hotéis, parques temáticos, marinas,
restaurantes etc.);
• Enfatizar o aproveitamento turístico dos atrativos naturais em
condições de se garantir a proteção do meio ambiente, via
especificação de uma capacidade de carga (carrying capacity)
conservadora;
• Analisar as experiências de outros projetos similares, podendo
aproveitar as iniciativas bem sucedidas e coincidentes com as
premissas estabelecidas no modelo baiano.
Estes objetivos somados devem ser capazes de originar, ao concretizar-se, a
finalidade de toda política pública: promover o bem-estar geral. Isto implica no
reconhecimento que a atividade turística não proporciona apenas
benefícios/ganhos para as regiões receptoras. Há, também, custos que devem
ser avaliados e medidos pelas instâncias reguladoras, com o fito de mantê-los
sob controle e, então, após o balanço acurado de ganhos e perdas, assegurar
que o resultado final proporcionado pela atividade seja positivo.
83
Vê-se, deste modo, que há um evidente interesse na descentralização desta
atividade, daí o interesse em constituir-se Centros Turísticos Integrados
internacionalmente competitivos. Além disto, há, ainda, uma segmentação entre
os papéis do setor público (responsável pelas inversões em infra-estrutura) e do
setor privado, responsável pela “implantação dos projetos turísticos (hotéis,
parques temáticos, marinas, restaurantes etc.)”.
Para possibilitar a eficiente consecução dos seus objetivos, o estado foi dividido
em sete áreas de investimento, a saber: Costa dos Coqueiros, Baía de Todos os
Santos, Costa do Dendê, Costa do Cacau, Costa do Descobrimento, Costa das
Baleias e Chapada (GAUDENZI, 2001). A divisão do estado em áreas de
investimento, tem por objetivo propiciar uma maior eficiência na gestão dos
recursos, reconhecendo as diferentes necessidades das diversas regiões.
Concomitantemente, favorece a desconcentração do desenvolvimento da
atividade em território baiano, ampliando a difusão dos ganhos por ela
proporcionados.
A denominação de cada uma das diversas zonas turísticas origina-se de suas
singularidades mais marcantes: acidentes geográficos (Chapada Diamantina,
Baía de Todos os Santos), histórico-culturais (Costa do Descobrimento, Costa
do Cacau) e atrativos naturais (Costa dos Coqueiros, Costa das Baleias, Costa
84
do Dendê). Ao mesmo tempo, todas elas têm um destino principal, que funciona
como uma espécie de portão de entrada. Assim, tem-se:
• Baía de Todos os Santos – Salvador;
• Chapada Diamantina – Lençóis, Rio de Contas e Morro do Chapéu;
• Costa das Baleias – Caravelas;
• Costa do Cacau – Ilhéus, Itabuna e Itacaré;
• Costa dos Coqueiros – Camaçari e Mata de São João;
• Costa do Dendê – Valença;
• Costa do Descobrimento – Porto Seguro.
Estes municípios se tornam, naturalmente, grandes beneficiários da estratégia
adotada pelo estado. São alvo de grandes inversões levadas a cabo pelo
governo estadual, que beneficiam sobremaneira sua infra-estrutura e, por
conseguinte, o bem-estar imediato de suas populações.
Quando se pensa em estratégia turística, a existência de “portões de entrada”
faz sentido, uma vez que a atividade precisa de um locus para se materializar.
Para que as zonas turísticas tenham significado efetivo é preciso que se
consolidem como um destino específico. É preciso que exista infra-estrutura
logística que permita o acesso (estradas, portos, aeroportos), equipamentos
para recepção (hotéis, pousadas, campings) e, fundamentalmente, serviços os
mais variados (alimentação, lazer, transporte, cultura).
85
A função fundamental dos “portões de entrada” é consolidar a zona turística, ao
tornar-se o eixo em torno do qual a atividade organiza-se. Para que tal ocorra,
neles concentra-se o grosso do equipamento receptivo, infra-estrutura logística e
de serviços. Os demais destinos de uma dada zona têm sua demanda como
uma função direta daquela do “portão de entrada” de sua zona, assumindo uma
posição de dependência do sucesso do primeiro.
Apenas a partir do ano de 1995, o Prodetur-BA passa a contar com recursos
advindos do Prodetur-NE. Desde a sua constituição, 1992, até então, o
Prodetur-BA havia sido exclusivamente financiado por iniciativas de captação e
inversão de recursos do governo do estado da Bahia (Mendonça, 2002).
86
3.4 PRODETUR-BA: FONTES, CRITÉRIOS DE FINANCIAMENTO E
RACIONALIDADE DA POLÍTICA PÚBLICA
O Prodetur-BA é uma política cujo lastro econômica está em grande parte
fundado em recursos do Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste
(Prodetur-NE), que possui como principal financiador o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID). Cabe ao Banco do Nordeste do Brasil (BNB), por sua
vez, a gestão operacional dos recursos do programa: assim, este é o
responsável pela a análise dos projetos, aprovação, liberação e
acompanhamento da aplicação dos recursos.
Cabe, entretanto, ressaltar que esta política, a despeito de estar umbilicalmente
associada ao Prodetur-NE, é uma política autóctone, sendo o Prodetur-BA,
inclusive, anterior ao Prodetur-NE, que herdou o seu nome (Mendonça, 2002).
Assim, em última instância, cabe ao governo do estado a seleção e gestão dos
investimentos que devem ser realizados.
Entretanto, dadas às limitações orçamentárias vividas pelo poder público
estadual, existe uma necessidade de alternativas de funding, que não apenas o
orçamento estadual, para financiar o Prodetur-BA. Este acaba, portanto, usando,
em larga medida, os recursos disponibilizados pelo BID, via Prodetur-NE, além
de outras fontes, tais como o BNDES e Caixa Econômica Federal (CEF), dentre
outras, para poder viabilizar a sua estratégia de desenvolvimento.
87
A demanda de necessidades para o desenvolvimento do turismo na Bahia tem impulsionado o Governo do Estado à captação de outras fontes de recursos, não se limitando apenas ao financiamento do Prodetur/NE. São recursos provenientes do próprio Governo do Estado, BNDES, Governo Federal, Caixa Econômica Federal, Banco Mundial, entre outros (Bahia, 2005)
Deve-se destacar que os recursos advindos do Prodetur-NE, dado o seu
volume, têm sido fundamentais para o financiamento do Prodetur-BA. O quadro
4, abaixo, evidencia o montante de investimentos concluídos pelo Prodetur/BA,
com recursos advindos do Prodetur-NE I, até abril do ano de 2002.
Analisando o emprego de parcela expressiva dos recursos do PRODETUR-NE I
em saneamento básico, e sua classificação como investimento em infra-
estrutura, Mendes (2001, p. 56) afirma:
(...) o investimento em saneamento básico surge como investimento
expressivo de estratégia econômica. Se, por um lado, é socialmente
inadequado que investimentos em melhoria da qualidade de vida da
população sejam justificados por fins econômicos, por outro lado,
percebe-se que o negócio do turismo só é plenamente viável se o for
socialmente.
Esta observação elucida a relação entre as dimensões econômica e social das
atividades turísticas, evidenciando a lógica existente na gestão dos recursos
pelo poder público. Porém, não se pode desprezar a sua dimensão política. Ao
incrementar diretamente os níveis de bem-estar da população local, por meio de
investimentos em saneamento básico e infra-estrutura em geral, o programa
88
Quadro 4 – Prodetur-NE I : Ações Concluídas (abril/2002)
Fonte: SUINVEST
PROJETOS VALOR DA OBRA (US$ MIL)
DATA DE CONCLUSÃO
BAÍA DE TODOS OS SANTOS 8.242
Recuperação da Igreja do Bonfim
Quarteirão Cultural / Praça das Artes
Centro Histórico de Salvador – 6a. etapa – Fase 1 (Cont.)
Centro Histórico de Salvador - 6a. etapa – P. da Sé (Cont.)
1.181
5.323
277
1.461
12/98
07/99
08/99
03/99
COSTA DOS COQUEIROS 1.054
Sistema de esgotamento sanitário da Praia do Forte 1.054 07/01
COSTA DO DENDÊ 3.137
Acesso Aeroporto Valença/ Atracadouro B. Jardim (Cont.)
APAS Pratigi e Maraú
3.046
91
06/00
07/00
COSTA DO CACAU 18.058
Rodovia Ilhéus – Itacaré 18.058 05/98
COSTA DO DESCOBRIMENTO 81.798
Sistema de abastecimento de água de Belmonte (Cont.)
Sistema de abastecimento de água Arraial d’Ajuda (Cont.)
Sistema de abastecimento de água de Trancoso (Cont.)
Aeroporto de Porto Seguro
Atracadouro Cabrália / Tombador
Rodovia Cabrália / Belmonte
Sistema de abast. água Porto Seguro – Orla e Frei Calixto
Sistema de esgotamento sanitário de Belmonte
Atracadouro Porto Seguro / Apaga Fogo (Cont.)
Sistema abast. água e esgot. sanitário P. Seguro- setor A
Sistema de abastecimento de água de St. Cruz Cabrália
Sistema de abastecimento de água de Coroa Vermelha
Drenagem P. Seguro/ Acesso Apaga Fogo/Arraial d’Ajuda
Rodovia p. Seguro / Trancoso
Recuperação de Matas Ciliares de P. Seguro (Cont.)
Recuperação Patrimônio Histórico de P. Seguro/Trancoso
Sistema de esgotamento sanitário Coroa Vermelha
Sistema de esgotamento sanitário St. Cruz Cabrália
Sistema de esgot. sanitário P. Seguro/ Orla Frei Calixto
Sistema de esgotamento sanitário de Arraial d’Ájuda
982
682
328
5.480
256
8.310
5.361
2.994
383
11.885
744
276
5.729
21.442
316
2.015
1.055
2.893
7.916
2.751
06/96
08/96
08/96
12/96
12/96
05/97
11/00
08/01
12/97
08/98
07/99
12/99
12/99
01/00
02/00
04/00
05/00
01/01
10/00
12/00
CHAPADA DIAMANTINA 7.469
Aeroporto de Lençóis 7.469 05/98
CUSTOS FINANCEIROS DO PROGRAMA 18.866
ENGENHARIA / ADMINISTRAÇÃO 3.801
TOTAL 142.425
89
contribui para a manutenção, ao menos imediata, da estrutura de poder político
ancorada no governo estadual, gestor do programa.
3.4.1 Demandas geradas pelo Prodetur-NE
Dados a importância e o significado dos recursos vindos do Prodetur-NE, a
Secretaria de Cultura e Turismo (SCT) criou, num primeiro instante, a
Superintendência de Desenvolvimento do Turismo (SUDETUR) e, mais tarde, a
Superintendência de Investimento em Pólos Turísticos (SUINVEST) para gerir
os projetos voltados para o desenvolvimento turístico no Estado e aqueles
diretamente ligados ao Prodetur-NE.
Os critérios para seleção dos projetos de investimento financiáveis seguem as
normas firmadas pelo Regulamento Operacional do programa estabelecido por
convênio entre os governos beneficiários, o BNB e o BID. Estas fontes são
responsáveis por 60% dos investimentos do programa, advindo os 40%
remanescentes de contrapartidas do governo dos estados e do BNDES.
Para obtenção dos recursos que financiam as inversões do Prodetur-BA, instala-
se um processo de crédito. Ao governo do estado cabe a fixação da política de
desenvolvimento do turismo. No entanto, dado o volume de recursos
demandados, o que pode ser visto na tabela anterior, e a escassez de recursos
vivida pelos estados, a efetiva implantação dos grandes projetos depende de
90
uma aprovação exógena. Sabedor disto, o Governo criou a SUINVEST, cujo
objetivo fundamental está no acompanhamento do processo de aprovação dos
projetos de investimento considerados cruciais pela SCT.
Esta política, entretanto, apesar de exógena, apresenta conexão com a
realidade local ao exigir que os projetos propostos sejam parte de uma política
estruturada de longo prazo. Esta demanda evidencia-se pela expressa
determinação de que os projetos constem (1) do Plano Diretor Municipal,
instrumento de planejamento municipal previsto pela Constituição Federal e
tornado obrigatório pelo Estatuto da Cidade (Lei Federal no. 10 257, de 10 de
julho de 2001) para todos os municípios com mais de 20 000 habitantes e (2) do
Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentável (PDITS),
instrumento de planejamento regional elaborado em conjunto pelas
municipalidades e pelo Governo Estadual.
Deve-se destacar que as políticas implantadas/ financiadas por recursos do BID,
são avaliadas segundo uma lógica neoclássica. Assim, os parâmetros de
avaliação passam por uma análise que busca quantificar os benefícios e custos
advindos de sua implantação, sendo aprovadas apenas aquelas cujos benefícios
excederem os custos. Estes elementos ficam evidenciados no trecho abaixo:
Para que seja elegível para financiamento, o projeto proposto deverá
fazer parte do PDITS, do Plano Diretor Municipal e constituir-se na
alternativa técnica de mínimo custo econômico (ou de maior benefício
91
econômico líquido, quando os alcances esperados forem diferentes) e
ser viável economicamente.
A análise da viabilidade econômica dos projetos deverá:
• Verificar seu adequado dimensionamento;
• Verificar se a alternativa selecionada é a de mínimo custo
econômico; e
• Calcular a rentabilidade econômica dos projetos através de
uma análise tipo custo-benefício. (BID/BNB, p.7)
Uma outra preocupação inerente às políticas financiadas pelo BID é aquela
voltada para a sustentabilidade financeira do projeto financiado. Sob a ótica
desta instituição, apenas projetos que comprovem ser auto-sustentáveis
financeiramente devem ser levados a cabo. A análise desta capacidade deve
levar em conta as possíveis tarifas cobradas dos usuários dos beneficiamentos
promovidos, além de eventuais retornos proporcionados por meio da elevação
da arrecadação tributária diretamente decorrente das intervenções realizadas
pelo projeto. O trecho abaixo evidencia esta demanda:
5.4 Estudo de Sustentabilidade Financeira do Projeto
Este estudo é composto de duas análises. A primeira corresponde a sustentabilidade financeira do projeto, enquanto a segunda refere-se a recuperação de investimentos pela entidade investidora e de OAM pela entidade gestora .
5.4.1 Análise de Sustentabilidade do Projeto
No caso de o projeto vir a contemplar intervenções passíveis de cobrança de taxas/ingressos, caberá um estudo para estimar as receitas financeiras esperadas e em seguida compará-las com os custos de OAM, em valores mensais. Caso as receitas sejam insuficientes para cobrir as despesas, especificar a instituição gestora responsável pela complementação;
5.4.2 Demonstrativo de Recuperação dos Custos do Projeto
92
Comprovar que os custos de investimento, de operação, de manutenção e de administração do projeto serão recuperados mediante incremento tributário, taxação direta do usuário (cobrança por usuário) ou pela tributação direta sobre imóveis. Esta última, poderá ser através da contribuição de melhoria, sempre que a implantação do projeto proporcionar uma valorização imobiliária, considerando-se o princípio da capacidade contributiva do beneficiário. Apresentar a capacidade institucional do município para recuperar o investimento através de instituição de cobrança. Caso o município não tenha capacidade para tal, apresentar os mecanismos necessários para fortalecer a capacidade financeira do mesmo para implementar o sistema de cobrança e estimativa de receita. (BID/BNB, p.10)
Vê-se, portanto, que há uma clara preocupação não apenas com a capacidade
de o projeto gerar retornos diretos (receita gerada pela operação do projeto) e
indiretos (receita tributária incremental), como também de apresentar uma
relação superavitária, no que tange ao seu fluxo de caixa. Deste modo, o projeto
além de economicamente viável (benefícios sociais maiores que os custos
sociais), deve ser financeiramente sustentável (receitas maiores que custos e
investimentos financeiros), caso contrário não deve ser implantado.
Está evidenciada, destarte, a lógica neoclássica que norteia o critério de decisão
de financiamento e, portanto, que molda a elaboração da política pública em
última instância. A despeito de tratar-se de uma política pública (Prodetur-BA) e
um programa de desenvolvimento regional (Prodetur-NE) geridos por instituições
distintas, com escopos próprios, sendo o primeiro anterior ao segundo, não há
como dissociar ambos em última instância. Mendonça (2002, p.174) não deixa
dúvidas quanto a esta indissociabilidade ao afirmar:
93
Embora uma das diretrizes do Prodetur-BA fosse a desconcentração da atividade turística no Estado (com a definição de seis zonas turísticas prioritárias fora da capital), a necessidade de comprovar, para os agentes financiadores do Prodetur-NE, a viabilidade econômica e financeira dos investimentos e infra-estrutura pública, aliada a um volume de recursos limitados, em face do amplo programa estabelecido pela Bahia, acabaram por limitar bastante este objetivo.
Esta restrição à liberdade de execução da estratégia estadual não se limitou
apenas a reduzir os investimentos realizados. Um outro efeito decorrente da
necessidade de se submeter as inversões estaduais ao crivo dos agentes
financiadores do Prodetur-NE foi a concentração dos investimentos efetivamente
realizados, conforme se pode ver no Quadro 4.1, nas zonas turísticas Bahia de
Todos os Santos e Costa do Descobrimento (Mendonça, 2002). Este fato
concreto vai de encontro ao propalado objetivo de desconcentração do Prodetur-
BA. Verifica-se, assim, uma efetiva sujeição da política de desenvolvimento
turística estadual aos interesses e objetivos de agentes exógenos.
Pode-se, então, afirmar que o Prodetur-BA é uma política pública que assume,
de fato, um caráter racionalista conferido pelos seus formatadores, em última
instância (BID). Há aqui, então, a conformação final da lógica adotada pelo
estado na sua nova estratégia de desenvolvimento: inspirada numa visão liberal,
hegemônica no início dos anos 1990, calcada numa nova configuração da
Administração Pública Gerencialista, na qual o estado perde o protagonismo das
ações econômicas e assume uma postura de gestor preocupado
fundamentalmente com os resultados das políticas de desenvolvimento, não há
espaço para adoção de políticas públicas que não contenham, portanto, um
94
explícito viés racionalista. Caracterizando estas políticas, Vasconcelos (2002, p.
126) assevera:
O método neoclássico- o “individualismo metodológico”- baseia-se na idéia de que todos os fenômenos sociais devem ser compreendidos como um produto da ação dos indivíduos e que esse comportamento individual é “totalmente racional”, ou seja, é movido por uma busca por maximização de benefícios
95
CAPÍTULO IV LENÇÓIS: PORTÃO DE ENTRADA DA ZONA TURÍSTICA CHAPADA
DIAMANTINA1.
4.1 A GÊNESE DE UM MUNICÍPIO NO CORAÇÃO DAS LAVRAS
DIAMANTINAS.
Como era de prever, as boas-novas do aparecimento dessas jazidas
[de diamante] correriam, em pouco tempo, até os gerais. E não
tardaria, como efetivamente não tardou, que gente de todas as
procedências, sobretudo dos antigos distritos diamantinos de Minas, se
abalasse pelo São Francisco adentro ou pela Serra do Espinhaço
afora, buscando caminhos que reduzissem, por vezes, distâncias de
além de 300 quilômetros, na ansiedade de chegar depressa, o mais
depressa possível, ao novo, ao formidável centro de enriquecimento
fácil.
Em meio dessa avalancha terrível de trabalhadores e de aventureiros
que entulhava o caminho do diamante – com bateias, frincheiros,
carumbés, enxadas, cavadores, ralos, etc – vinha de tudo. A única
seleção que a aventura se dignava era a de atribuir aos que
conseguissem chegar primeiro os melhores meios de alcançar a coisa
sonhada. Quem tivesse forças para chegar, trabalhar e vencer,
venceria! (MORAES 1984, p.31)
A força deste relato, extraído do já clássico “Jagunços e Heróis”, de Walfrido
Moraes, não deixa dúvidas quanto à natureza da ocupação e colonização das
terras das lavras diamantinas. Também é bastante elucidativo quanto às 1 Ao final do Prodetur-NE I, o governo da Bahia substituiu o conceito de Zonas Turísticas pelo de Pólos Turísticos. Estes novos Pólos são frutos da junção de duas ou mais Zonas Turísticas. No caso específico da Zona Turística Chapada Diamantina, sua sucessão pelo Pólo Turístico Chapada Diamantina a partir do ano de 2002, implicou não na sua fusão com outra Zona Turística, mas, sim, na sua ampliação, com a entrada de novos municípios, e posterior divisão em três circuitos que o compõe, a saber: o Circuito do Ouro, o Circuito do Diamante e o Circuito Chapada Norte. Lençóis, em específico, integra atualmente o Circuito do Diamante, constituindo-se em seu portão de entrada e principal destino turístico. Alguns dados, dadas algumas dificuldades para obtê-los, foram extraídos a partir de informações referentes ao Pólo Turístico Chapada Diamantina. No entanto, estão claramente indicados no texto.
96
características da sociedade que lá se ergueria e do modo de organização que
esta assumiria. Uma sociedade violenta, organizada em torno da exploração do
diamante, distante dos centros de poder nacionais e das suas normas e
convenções sociais, marcada pela lei do mais forte, pela sombra dos coronéis.
Figura 2 - Lençóis: Vista Aérea da Região. Fotos: Maurutto (2003) Lençóis, como Mucugê, Campestre (atual Seabra), Andaraí, dentre outras,
nasceu desta corrida desenfreada e organizou-se a partir da riqueza e da lógica
intrínsecas à exploração mineral. Tornou-se próspera e rica, violenta e injusta,
palco de lutas e centro de interesses. Enfim, enquanto de suas terras, ao longo
do século XIX, brotou o minério tão sofregamente ambicionado, as suas ruas
foram cheias de vida e energia.
No entanto, uma vez findo este ciclo de riqueza fácil e de proporções
inimagináveis, pouco sobrou dos áureos tempos. O testemunho dos imponentes
sobrados, que se espraiam por toda a cidade, erguidos pelos coronéis do
diamante, além de uma miríade de histórias e lendas, que se escutam pelas
ruas e bares, envolvendo aqueles, seus homens de confiança e seus desafetos
são tudo o que resta daqueles dias de fartura.
97
4.2 ASPECTOS HISTÓRICOS
A história de Lençóis se confunde, em larga medida, com a da região das Lavras
Diamantinas. Como desta, ao longo de séculos, toda sua organização sócio-
econômica girou em torno do extrativismo mineral, em específico da exploração
dos veios de diamante e carbonato abundantes em suas ricas terras.
Ao final da primeira metade do século XIX, teve início o ciclo do diamante em
terras baianas. A descoberta dos primeiros veios diamantíferos se deu na região
de Mucugê, ao longo do ano de 1844, por um negociante local, José Pereira do
Prado, que, em vão, tentou manter em segredo a sua descoberta. Uma vez
descoberto seu segredo, a notícia se espalhou e logo um turbilhão humano
tomou o rumo do coração baiano, dando origem a uma multiplicidade de novos
povoamentos.
Mucugê, Andaraí e Lençóis surgiram de provisórios acampamentos de
garimpeiros que tomaram feições urbanas, com a fluência persistente
dos diamantes, consolidando-se como pontos de trocas, centros de
abastecimento e sedes das instituições sociais, políticas e jurídicas.
(BAHIA 1997, p.121)
Em pouco tempo, graças à abundância e à qualidade dos diamantes originários
dos leitos dos rios Lençóis e São José e de sua centralidade geográfica, o
povoado de Lençóis tornou-se a capital das Lavras Diamantinas, centro em
torno do qual se organizava toda a região. O comércio rapidamente floresce. As
98
feiras tornam-se imensas, os mascates afluem de todas as regiões.
Estrangeiros, pesquisadores, gente de toda sorte chega aos montes. Na
segunda metade do século XIX, o município alcançaria uma população de mais
de 30.000 habitantes.
Dois eventos são capazes de ilustrar a importância econômica atingida pelo
povoado. Em 1856, o então presidente da Província da Bahia, Dr. Cansansão
Sinimbu, consegue da Assembléia Legislativa a aprovação de uma concessão
para construção e exploração de uma ferrovia (Companhia Tram-Road
Paraguaçu, depois Ferrovia Central da Bahia) ligando São Félix a Santa Isabel,
com ramais para Andaraí e Lençóis. Em seguida, “o governo francês providencia
junto ao governo brasileiro – tamanho é o interesse comercial reinante – a
instalação nos Lençóis, a Capital das Lavras, de um vice consulado” (MORAES
1984, p.38).
Estas duas demandas não surgiram natimortas, presas ao papel. De modo
contrário, ganharam vida e definiram uma rota de escoamento utilizada, até
meados do século XX, pela gente da região, bem como efetivamente
contribuíram para colocar o município no tabuleiro dos interesses políticos
baianos.
99
4.3 ESTRUTURAS DE PODER OLIGÁRQUICO
Esta ascendência histórica deu origem, bem como em toda a região das lavras
diamantinas, a uma sociedade marcada pela lei do mais forte. A distância dos
grandes centros civilizados, fez com que a organização social se desse em torno
daqueles senhores que, detendo grande fortuna, possuíam poder de polícia e
capacidade de estabelecer e fazer cumprir normas de conduta gerais.
A articulação do estrato senhorial forjou as milícias coloniais não
profissionalizadas e auto-sustentadas, base do poder local, emanado
da propriedade territorial que, monopolizando o controle social,
privatizava o poder público. Essa cultura de poder entranhou-se na
organização sócio-econômica e político-administrativa coloniais,
consolidando-se no processo de formação do Estado Nacional
Brasileiro. (BAHIA 1997, p.123)
Uma sociedade patrimonial, marcada pela personificação do estado na figura
dos coronéis locais, perdurou até o fim da República Velha. No entanto, com o
esgotamento dos veios superficiais de diamante e carbonato, no início do século
XX, o município e toda a região iniciaram um longo período de declínio e
ostracismo.
No início do século XX, começou a exaustão dos diamantes e
carbonados. Grande parte da população das Lavras Diamantinas
emigrou, por falta de trabalho nos garimpos e pelas freqüentes secas.
(...) No curso da primeira metade deste século, verificou-se enorme
diáspora populacional, resultando no esvaziamento econômico, que
100
nem as ocorrências de ouro nas serras do Assuruá, Tromba e Sincorá
foram capazes de modificar o perfil regional. (BAHIA 1997, 122).
Soma-se a este fator um segundo: o assassinato, neste mesmo período, do
último grande coronel local – o Coronel Horácio de Mattos. Este senhor
alcançou, à sua época, destaque que ultrapassou as fronteiras da região. No
plano estadual, influía diretamente nos embates ao governo estadual entre Ruy
Barbosa e J. J. Seabra, e no plano nacional, além de manter intensa
correspondência com o presidente Arthur Bernardes, exercer um mandato de
senador da república, liderou a resistência local à coluna Prestes, e organizar
uma parte da força que a perseguiu até o seu exílio (MORAES, 1984).
Assim, esfacelados seus pilares econômicos e políticos, o município e a região
como um todo entram em decadência. A população remanescente voltou-se
para atividades primárias, em especial a agricultura e a criação animal,
assistindo, ao longo do século XX, a uma progressiva perda de seu significado
para o estado.
Um reflexo da sua profunda agonia foi a forte perda populacional experimentada
por Lençóis. No início da década de 1990, o município que no século XIX
alcançara uma população de cerca de 30 000 habitantes estava reduzido a
pouco mais que um quarto disto: apenas 7 584 pessoas o habitavam.
101
4.4 LENÇÓIS ATUAL: PORTÃO DO TURISMO REGIONAL
O município de Lençóis não só é a capital do turismo regional – o
portão de entrada- como também a cidade-sede mais cosmopolita da
Chapada Diamantina, em razão da sua vinculação com o trade turístico
nacional e internacional (BAHIA 1997, p. 70) Dentre os municípios que integram a Zona Turística Chapada Diamantina
destaca-se o de Lençóis. Com uma área total de 1240,36 km2, limita-se com os
municípios de Iraquara, Palmeiras, Andaraí, Wagner, Lajedinho e Bonito. Está
ligado à capital do estado por meio da BR 242, distando 410 km desta. É o
grande centro turístico da região, tendo sido eleito pelos órgãos responsáveis
pela gestão do Prodetur-BA como um dos “portões de entrada” da zona turística
(BAHIATURSA, 1992).
Detentor de uma infra-estrutura adequada de suporte para a atividade turística,
possui, não apenas aeroporto e rodoviária, o que por si só já o configura como
efetivo hub logístico, mas também boa parte dos equipamentos de hospedagem
da região. Em suas terras localizam-se, ainda, um significativo número de
players locais conectados ao trade turístico nacional e internacional, que
acabam por organizar, a partir de lá, o fluxo turístico da região.
Como “portão de entrada” o município acaba recebendo a maior parte do fluxo
turístico direcionado para a região. Ao mesmo tempo, em função disto, recebe
uma parcela significativa de recursos voltados para investimentos na atividade
turística, tanto aqueles de origem pública quanto os de origem privada.
102
4.5 A ZONA TURÍSTICA CHAPADA DIAMANTINA
A Zona Turística Chapada Diamantina, ao longo da vigência do Prodetur-NE I2,
originalmente era composta pelos municípios de Lençóis, Andaraí, Mucugê,
Palmeiras, Iraquara, Itaetê, Seabra, Rio de Contas, Érico Cardoso, Piatã e
Abaíra.
Esta é uma região marcada pela existência de uma profusa série de atrativos
naturais, tais como rios, canions, montanhas, cachoeiras. Ao mesmo tempo é
herdeira de uma rica história de uma sociedade construída em torno da extração
de diamantes e carbonato. Municípios históricos como Lençóis, Andaraí e
Mucugê guardam um rico patrimônio arquitetônico/cultural.
Figura 3 - Rio Lençóis. Foto: Maurutto (2002) 2 Período que coincide com aquele em análise neste estudo do Prodetur-BA, findando no ano de 2002.
103
A figura abaixo dá uma pequena mostra deste patrimônio arquitetônico. Nela
pode-se ver o centro histórico de Lençóis, com uma vista aérea (1) da Praça
Horácio de Mattos, onde se localiza o antigo Centro Comercial Francês, antiga
plataforma de exportação dos diamantes; (2)da Praça dos Nagôs, em que se
encontra o Antigo Mercado Municipal; e (3)a Praça Octaviano Alves ou Praça
do Coreto, conectadas pela Avenida 7 de setembro.
Centro Histórico de Lençóis Antigo Mercado Municipal
Antigo Centro Comercial Francês Secretaria de Turismo Municipal
Figura 4 - Centro Histórico de Lençóis. Foto: Maurutto (2002)
104
4.6 INVESTIMENTOS PÚBLICOS
A Zona Turística Chapada Diamantina recebeu apenas uma pequena parte do
montante total de recursos originariamente previstos pelo Prodetur/NE I. Como
já anteriormente citado, a necessidade de se comprovar a viabilidade econômica
das inversões públicas, bem como sua sustentabilidade financeira aos gestores
do programa foram restrições que reduziram significativamente o montante de
recursos efetivamente empregados.
Em relação aos investimentos específicos do PRODETUR/NE I na área objeto de estudo, é necessário salientar que grande parte das intervenções propostas, quando de sua elaboração, não foram de fato implementadas. Neste sentido, haviam sido previstos investimentos na ordem de US$ 53.5 milhões, entretanto, apenas US$ 7,538,635.88 foram efetivamente investidos. Entre os projetos propostos para o setor de transportes, foi realizado 100% da construção do Aeroporto Horácio de Mattos, em Lençóis, que foi inaugurado no 2º semestre de 1998, com um investimento total de US$ 7,469,000.00. Em relação aos projetos na área de meio ambiente, foram realizados os Planos de Manejo da Área de Proteção Ambiental [APA] de Marimbus/Iraquara e da Área de Proteção Ambiental da Serra do Barbado, com investimento total de US$ 69,635.88. (BAHIA, 2003, p.2)
Como se pode ver, do total de recursos programados, apenas 14,1% foram
efetivamente levados a cabo. Deste total, 99,1% foram investidos no município
de Lençóis, numa única obra. A diminuta concretização das inversões e seu alto
grau de concentração deixam dúvidas quanto aos benefícios potenciais
advindos destas inversões.
No entanto, dentro da estratégia de desenvolvimento do turismo, uma parcela
complementar de recursos, cuja fonte exclusiva é o orçamento estadual, foi
105
implantada de modo concomitante. Prevista pelo Plano Estratégico do Estado
1991-2005, mais da metade das inversões concretizou-se – evidenciando o
comprometimento do governo do estado com o Prodetur-BA.
Apesar de poucas intervenções terem sido de fato implementadas no Pólo Turístico Chapada Diamantina no âmbito do PRODETUR/NE I, outros investimentos públicos do Governo do Estado da Bahia foram realizados na área objeto de estudo a partir do ano de 1991. Do total de investimentos previstos para o período entre os anos de 1991 e 2005 (US$ 170.619.000,00), 55,2% correspondem a obras já concluídas, 43,7% a obras em fase de elaboração de projetos e 1,2% encontram-se atualmente em execução. Desta forma, foram alocados recursos públicos, desde o ano de 1991, em projetos no setor de transportes, obras de energia elétrica, saneamento, entre outras áreas. Todavia, destaca-se que os projetos nas áreas de preservação ambiental, recuperação urbanística e do patrimônio histórico receberam um percentual reduzido de recursos (cerca de 1,1% dos projetos concluídos), o que reforça a importância de novos investimentos nestas áreas. (BAHIA, 2003, p.2)
Em resumo, do total de recursos efetivamente empregados na Zona Turística
Chapada Diamantina, ao longo do período 1991-2002, apenas 7,93% foi
financiado com recursos advindos do Prodetur-NE I. Todo o restante foi
financiado com recursos do Governo da Bahia. A tabela abaixo evidencia a
distribuição das inversões programadas e concluídas para o período, por setor
de investimento:
106
Tabela 1 - Prodetur-BA: Investimentos na Zona Turística Chapada Diamantina (1991-2005) (US$)
SITUAÇÃO SETOR
Em Projeto Em Execução Concluído TOTAL %
Transportes 49 475,00 - 39 047,00 88 522,00 51,9
Saneamento 14 849,00 1 343,00 30 057,00 46 249,00 27,1
Energia Elétrica 958,00 - 15 697,00 16 655,00 9,8
Sist. Aeroportuários - - 7 469,00 7 469,00 4,4
Recup. Urbanística 3 300,00 620,00 94,00 4 014,00 2,4
Rec. Patrimônio Histórico 2 350,00 - 914,00 3 264,00 1,9
Preservação Ambiental 2 417,00 - - 2 417,00 1,4
Outros 1 160,00 - 869,00 2 029,00 1,2
TOTAL 74 509,00 1 963,00 94 147,00 170 619,00 100
FONTE: Bahia, 2003a.
Como se pode ver da tabela, há uma grande concentração dos investimentos
públicos programados e concluídos no setor de infra-estrutura. Isto está em
conformidade com os objetivos e a lógica concebida da política pública. Como já
comentado, sob a ótica do Prodetur-BA, o papel do setor público é justamente
aquele de preparar a infra-estrutura a partir da qual a atividade turística deve
desenvolver-se.
Entretanto, cabe à iniciativa privada a realização dos investimentos necessários
à montagem dos equipamentos para a operacionalização da atividade. Assim,
as inversões em equipamentos de hospedagem, alimentação, entretenimento e
a montagem do trade turístico local cabem a estes agentes. Para ser bem
sucedido, deve haver, portanto, uma complementaridade entre as ações
públicas e privadas. As primeiras funcionam como uma espécie de catalisador
107
das segundas, que, uma vez iniciadas, devem consolidar o destino e se
retroalimentar de modo contínuo, conduzindo-o ao seu estágio de maturidade.
108
4.7 INVESTIMENTOS PRIVADOS
O Circuito do Diamante é, com grande vantagem, o que mais exerce atração sobre os empresários, por possuir um fluxo turístico maior e consolidado há mais tempo, e por ser o portal de entrada da Chapada Diamantina, graças à existência de um aeroporto. (BAHIA 2003a, p.26)
Ao longo da década de 1990, somou-se aos gastos governamentais, uma série
de inversões realizadas pelos agentes econômicos privados. Ao longo do
período entre os anos de 1992 e 1998, um montante total de US$8,551,060.00
foi investido por estes apenas no município de Lençóis, principalmente em
equipamentos de hospedagem.
Este dado evidencia o significado do município de Lençóis dentro da zona
turística. Isto, pois, o montante investido pela iniciativa privada no município
representa 64,41% das inversões totais (que alcançaram a US$ 13,275,500.00)
realizadas por estes no Circuito do Diamante ao longo do período. Representa,
ainda, 49,54% do montante total investido em toda a Zona Turística Chapada
Diamantina que alcançou a US$17,261,000.00.
Estes dados evidenciam a competitividade do destino Lençóis e a sua
consolidação como efetivo “portão de entrada” da Zona Turística Chapada
Diamantina, ao longo da década de 1990. Outro elemento que se pode verificar
é a confirmação da complementaridade esperada entre os investimentos
público-privados na atividade.
109
Entretanto, até este momento não se pode deixar de destacar a predominância,
ao menos nesta zona turística, de investimentos públicos face às contrapartidas
do setor privado. Uma rápida análise permite perceber que o montante total dos
investimentos privados, no período em análise, equivale a apenas 18,33% do
investimento público realizado.
Um fato que ajuda a explicar este desnível, ao menos neste primeiro instante, é
o elevado custo intrínseco aos investimentos em infra-estrutura, quando
comparados aos necessários à montagem de equipamentos de hospedagem,
alimentação e na montagem inicial do trade local. Ao longo do tempo, se espera
que o amadurecimento do destino eleve a participação dos agentes privados a
uma parcela compatível do investimento total (Bahia, 2003a).
110
4.8 LENÇÓIS E O TURISMO: FLUXO E PERFIL DO TURISTA
O município de Lençóis e o Pólo Turístico Chapada Diamantina vêm se
consolidando como destino turístico. A observação dos dados de fluxo turístico
do município respalda esta assertiva.
Tabela 2 – Lençóis x Salvador: Evolução do Fluxo Turístico ANO Variação
1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 93/01
Lençóis (em 1000)
49,12 53,86 53,72 65,14 67,96 75,06 80,74 83,00 79,41 30,29
Cresc (%) - 9,6 (0,3) 21,3 4,3 10,04 7,6 2,8 (4,3) 61,7
Salvador (em 1000)
1 071 1 185 1178,36 1474,16 1579,24 1533,57 1623,07 1688,02 1625,64 553,99
Cresc (%) - 9,65 (0,26) 21,3 5,6 (2,0) 7,5 3,8 (4,3) 51,7
Fonte: Bahia, 2003
Como se pode ver na tabela, o município de Lençóis experimentou um vigoroso
crescimento do fluxo turístico, ao longo do período 1993-2001. Este fluxo
apresentou-se 19,3% superior aquele experimentado pela capital baiana no
mesmo período.
Este dado se torna mais importante ainda quando se leva em conta que a
Chapada Diamantina é um destino turístico que se diferencia dos demais
destinos baianos, sendo o único destino voltado prioritariamente para o eco-
turismo.
111
A série apresenta significativa redução do fluxo turístico para ambos os destinos
no ano de 2001, ano dramático para a indústria turística global, em função do
atentado ao World Trade Center nos EUA, que afetou não apenas esta mas a
economia mundial como um todo.
Este dado encontra eco no perfil do turista que visita o município de Lençóis.
Pesquisa realizada com estes, ao longo do ano de 2000, aponta que 17,8% dos
turistas tinham origem estrangeira, um percentual superior aquele dos turistas
que visitaram o município de Salvador, que atingiu, no mesmo ano, 10,5%
(Bahia, 2003a).
Uma análise dos dados do perfil do turista que visita Lençóis para o ano 2000
apresenta as seguintes características (Bahia, 2003a):
• 75,6% dos turistas que visitam o município hospedam-se em
estabelecimentos hoteleiros classificados (36,5%) ou não classificados
(39,1%);
• 22,8% das viagens realizadas ao destino turístico Lençóis, ao longo do
ano de 2000, foram promovidas por agências de viagem;
• A idade média dos turistas que visitaram o município, no ano de 2000, foi
de 34 anos. Sua renda média alcançou a US$ 1,544.00 mensais;
• 76,6% dos turistas visitam o município por motivo de passeio;
112
• Ao longo do ano 2000, a estadia média no município dos turistas de
origem nacional foi de 6,77 dias, enquanto aquela dos turistas
estrangeiros foi de 7,17 dias;
• Quanto ao Gasto Médio Individual Diário (GMDI), aquele dos turistas
nacionais alcançou a US$ 28.20, enquanto aquele dos turistas de origem
estrangeira alcançou a US$16.31.
113
4.9 LENÇÓIS E O PRODETUR-BA: 10 ANOS PASSADOS (1991- 2002)
4.9.1 Investimentos e o Fluxo Turístico
Conforme já explicitado, dos investimentos previstos para Zona Turística
Chapada Diamantina, um dos mais importantes foi o Aeroporto Horácio de
Mattos. Este foi criado e instalado no município de Lençóis. Totalizando um
montante de US$ 7,469,000.00 o aeroporto rapidamente transformou-se num
elemento de consolidação do status de Lençóis como “capital” da Chapada
Diamantina.
Tabela 3- Aeroporto de Lençóis - Fluxo de Passageiros 1998 1999 2000 2001 Sazonalidade
Mês Absoluto (%) Absoluto (%) Absoluto (%) Absoluto (%) 98/01
Jan 0 0 435 11 1.147 15 1.164 13 12,8%
Fev 0 0 173 4 629 8 564 6 6,4%
Mar 0 0 108 3 539 7 712 8 6,3%
Abr 0 0 126 3 575 8 613 7 6,1%
Mai 0 0 250 6 352 5 455 5 4,9%
Jun 0 0 172 4 564 8 809 9 7,2%
Jul 3 0 549 14 983 13 1 082 12 12,2%
Ago 31 3 443 12 471 6 490 5 6,7%
Set 123 12 294 8 540 7 866 10 8,5%
Out 625 59 530 14 573 8 964 11 12,6%
Nov 171 16 280 7 443 6 641 7 7,2%
Dez 100 9 490 13 643 9 692 8 9,0%
TOTAL 1 053 100 3 850 100 7 459 100 7 970 100 20 332
Cresc. (%a.a.)
- - 2 797 265,6 3 609 93,7% 511 6,8% 96,34%
Fonte: Bahia, 2003a.
114
A entrada em funcionamento do Aeroporto Horácio de Mattos tem importância,
pois torna efetivamente o município de Lençóis no Portão de Entrada da
Chapada Diamantina, ao transformá-lo num hub logístico, a partir do qual o fluxo
turístico para região se organiza. Este fato é corroborado pela sua centralidade
geográfica e pela concentração neste da oferta de prestação de serviços
turísticos da região.
Tabela 4 - Lençóis: Participação do Aeroporto sobre o Fluxo Turístico Total FLUXO
TURÍSTICO 1998 1999 2000 2001
Aeroporto (em 1000)
1,05 3,85 7,46 7,97
Lençóis (em 1000)
75,06 80,74 83,00 79,41
Participação(%) 1,4% 4,8% 9,0% 10,0%
Fonte: Bahia, 2003a. Elaborado pelo autor
Pode-se perceber que as elevadas taxas de crescimento do fluxo de
passageiros do aeroporto rapidamente transformaram-no num importante portal
de acesso ao município. Em apenas 4 anos de operação, seu fluxo de
passageiros atingiu o equivalente a 10,0% do fluxo total de turistas que visitam o
município de Lençóis. Isto foi possível graças ao rápido crescimento do fluxo de
passageiros do aeroporto que apresentou uma taxa média geométrica no
período de 96,34% anuais.
115
4.9.2 Estrutura Populacional
Uma análise sobre os dados de evolução populacional do município de Lençóis
permite observar que o município, ao longo das duas últimas décadas,
apresenta um crescimento populacional. Não há indicação de saldos migratórios
positivos ou negativos.
Tabela 5 - Lençóis: Crescimento Populacional e Urbanização (1980-2000) TAXA DE CRESCIMENTO (%)
POPULAÇÃO 1980 1991 2000 80/91 91/00 81/00
Total 5 640 7 584 8 910 2,73 1,81 2,31
Urbana 2 604 3 481 6 395 2,67 6,99 4,59
Rural 3 036 4 103 2 515 2,78 (5,29) (0,94)
Tx de Urbanização (%) 46,17 45,90 71,77 (0,05) 5,09 2,23
Fontes: IBGE, SEI
Entretanto, observando-se com atenção a distribuição de sua população,
verifica-se que, ao longo da década de 1990, há uma redução absoluta em sua
população rural, que parece indicar uma redução no significado das atividades
rurais dentro do município. Concomitante, a população urbana apresenta um
crescimento mais que proporcional aquele da população total.
Evidentemente, este é um processo natural nas sociedades contemporâneas.
Desde o advento da Revolução Industrial, em meados do século XVIII, o
deslocamento do eixo de geração de riqueza, primeiro do setor primário para o
secundário da economia, depois deste para o setor terciário, criou uma dinâmica
que dá origem ao fenômeno da urbanização das sociedades. Entretanto, o que
116
chama atenção, no caso específico do município de Lençóis, é a velocidade que
este fenômeno atinge ao longo dos anos 1990.
A tabela que se segue evidencia um significativo crescimento da taxa de
urbanização do município, que se eleva de um patamar que permaneceu
estagnado em torno de 46%, ao longo da década de 1980, para 71,77%, ao final
da década de 1990, alcançando uma taxa média geométrica de urbanização
anual de 5,09%. Estes dados sugerem uma alteração na estrutura de
organização da sociedade local, em que se verifica um intenso processo
migratório do campo para a urbe.
Tabela 6 - Lençóis x Bahia: Crescimento Populacional e Taxa de Urbanização Taxa Crescimento População (%) Taxa de Urbanização (%)
80/91 91/00 80/00 1980 1991 2000
Lençóis 2,73 1,81 2,31 46,17 45,90 71,77
Bahia 2,09 1,08 1,63 49,29 59,12 67,12
Fontes : IBGE, SEI
Quando colocados em perspectiva os dados do município com aqueles do
estado como um todo, verifica-se que este apresentou taxas de crescimento
populacionais sempre superiores ao estado, ao longo de todo o período.
Entretanto, o aprofundamento do processo de urbanização, ao longo da última
década, se revela bastante significativo. O município, em uma década, consegue
superar o índice médio de urbanização do estado, que, no início dos anos 1990,
era cerca de 30% superior ao seu.
117
Esta ampliação significativa do ritmo de urbanização refletiu-se espacialmente. A
urbe apresentou um inchamento que se refletiu no surgimento de algumas
ocupações sub-normais, como evidencia a figura que se segue.
Ocupação Sub Normal
Figura 5 - Lençóis: Ocupação Sub Normal. Foto: Maurutto (2002).
Uma observação atenta da evolução da pirâmide etária de sua população pode
auxiliar na identificação de algumas mudanças experimentadas pelo município
neste período. Esta encontra-se abaixo exposta, sob a forma de tabela.
118
Tabela 7 - Lençóis: Evolução da Pirâmide Etária 1991 2000 FAIXA
ETÁRIA Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres
00 a 04 anos 1147 592 555 1160 563 597 05 a 09 anos 1195 588 607 1062 541 521 10 a 14 anos 1041 501 540 1125 558 567 15 a 19 anos 786 424 362 1069 522 547 20 a 24 anos 594 293 301 821 411 410 25 a 29 anos 530 252 278 686 362 324 30 a 34 anos 426 217 209 567 297 270 35 a 39 anos 313 156 157 538 269 269 40 a 44 anos 306 160 146 422 201 221 45 a 49 anos 226 106 120 289 152 137 50 a 54 anos 210 99 111 252 133 119 55 a 59 anos 158 73 85 228 102 126 60 a 64 anos 149 60 89 187 84 103 65 a 69 anos 170 86 84 141 59 82 70 anos ou + 333 156 177 363 163 200
TOTAL 7584 3763 3821 8910 4417 4493
Fonte: IBGE
Pode-se verificar algumas alterações na disposição da população pelas faixas
etárias, ao longo do período 1991-2000. Dentre estas, destacam-se:
1. Apesar de ainda representar o grupo populacional mais significativo,
constituindo 37,56% da população total, as crianças (indivíduos entre 00 e
14 anos) são o segmento populacional que apresenta a mais significativa
redução ao longo do período. Verifica-se uma redução absoluta desta
população, que tem o seu contingente reduzido em 36 indivíduos. Isto se
reflete numa redução em sua participação relativa de 7,04%.
2. O segundo grupo que apresenta redução em sua participação relativa é o
de idosos (indivíduos com idade superior a 59 anos). Ao contrário do
119
grupo de crianças, estes apresentaram um crescimento absoluto (39
indivíduos). No entanto, este crescimento foi menor que aquele
apresentado pela população como um todo, fazendo com que sua
participação relativa se reduzisse de 8,60%, em 1991, para 7,76%, em
2000, do total – uma redução de 0,84%.
3. O grupo de jovens adultos (indivíduos com idades entre 15 e 29 anos,
inclusive) apresentou crescimento absoluto (666 indivíduos) e relativo
(34,86%), alcançando uma participação de 28,91% na população como
um todo.
4. Por sua vez, o grupo de adultos (indivíduos com idades entre 30 e 59
anos inclusive) apresentou o maior incremento em sua participação
relativa (40,08%), alcançando a 25,77% do total.
Estes dados sugerem uma desaceleração do crescimento vegetativo da
população, dada a redução do contingente de crianças, acompanhada de uma
aceleração do processo de envelhecimento da população.
Além disto, há uma pressão por uma expansão na oferta de empregos pela
economia local, dada a expansão da população em idade ativa (PIA) – composta
pelos grupos de jovens adultos e adultos, que foram os responsáveis por
praticamente toda a elevação do contingente populacional. Em conjunto foram
120
responsáveis apresentaram um crescimento de 1 323 indivíduos, ou 99,77% do
crescimento líquido da população no período (1 326 indivíduos).
A análise destes dados se revela importante para a discussão das mudanças
experimentadas pelo município, ao longo da década de 1990, período de
implantação do Prodetur-BA. Sua observação acurada revela que:
1. o município experimentou uma elevação significativa do seu processo de
urbanização, num ritmo tal que levou o município, em dez anos, a superar
a taxa média estadual, que, no início da década de 1990, apresentava-se
30% superior à sua. Deve-se ressaltar que, ao longo dos anos 1980, a
taxa de urbanização do município permaneceu estagnada, apresentando,
mesmo, leve involução;
2. este fenômeno tem conduzido a um inchamento da urbe, o que implica
numa demanda pela expansão acelerada da oferta de serviços públicos à
população urbana, sob pena de haver uma crescimento das ocupações
sob-normais e, conseqüentemente, uma redução nos níveis de bem-estar
da população;
3. a significativa elevação dos grupos de jovens (34,86%) e de adultos
(40,6%), ao longo dos anos 1990, cria uma demanda elevada por
políticas de geração de emprego e renda. Cabe ao poder público
121
municipal, destarte, a responsabilidade pela elaboração de políticas
públicas de estímulo ao primeiro emprego e introdução de jovens no
mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que, também, há forte
demanda por políticas de (re)qualificação do trabalhador adulto, para que
este possa manter-se empregado. Estas políticas ganham ainda maior
importância na medida em que parcela significativa destes trabalhadores
é originária da zona rural.
4.9.3 Educação
Tomando a Educação como novo eixo de análise, algumas observações podem
ser feitas. Em primeiro lugar, pode-se verificar como evoluiu, ao longo do
período, a taxa de alfabetização da população do município, com base nos
dados dos censos 1991 e 2000. A tabela, a seguir, expõe estes dados
Tabela 8 - Lençóis: Evolução nos Índices de Alfabetização LENÇÓIS BAHIA
ÍNDICE 1991 2000 Cresc % 1991 2000 Cresc %
População Alfabetizada
53,6 68,09 27,04 51,41 66,67 29,70
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
Vê-se, então, que, no que tange a alfabetização, o município de Lençóis
praticamente acompanhou o ritmo de crescimento das taxas estaduais. Em
verdade, há uma leve piora relativa nos indicadores locais, uma vez o ritmo de
crescimento da taxa de alfabetização do município se, ao longo dos anos 1990,
122
foi inferior aquele da Bahia como um todo. Mesmo assim, o município continua
apresentando índices de alfabetização acima da média estadual.
Observando de modo mais atento os dados sobre educação no município, pode-
se notar que há uma melhora no quadro geral da educação municipal, conforme
expõem as tabelas que se seguem.
Tabela 9 - Lençóis: Número de Estabelecimentos de Ensino Pré -Escolar URBANA RURAL ANO
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular 1996 - 4 - 1 - 2 - - 2002 - - 3 2 - - 3 -
EVOLUÇÃO (%) - EVOLUÇÃO (%) 50%
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
Tabela 10 - Lençóis: Número de Matrículas Iniciais no Ensino Pré Escolar URBANA RURAL ANO
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular 1996 - 254 - 20 - 36 - - 2002 - - 218 63 - - 196 -
EVOLUÇÃO (%) 2,6 EVOLUÇÃO (%) 444,4
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
Como se pode observar, em função das novas diretrizes educacionais, ao longo
do período, o município assumiu a função de oferta de ensino pré–escolar, em
substituição ao Estado. Na zona urbana, houve uma redução no número de
matrículas nas escolas públicas, compensadas por uma expansão na oferta de
vagas privadas. Na zona rural, com a ampliação no número de estabelecimentos
públicos houve forte incremento no número de matrículas (444,4%), ao longo do
período.
123
No que tange ao ensino fundamental, verificou-se, também, uma substituição,
ainda que parcial, do estado pelo município na oferta de estabelecimentos de
ensino. Esta realidade fica clara quando se observam os dados referentes aos
estabelecimentos da zona rural, onde o poder municipal concentrou seus
esforços. Nesta o número de estabelecimentos de ensino experimentou uma
forte elevação da oferta de 850%.
Tabela 11 – Lençóis: Número de Estabelecimentos de Ensino Fundamental URBANA RURAL ANO
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular 1996 - 4 2 - - 2 - - 2002 - 3 2 2 - - 19 -
EVOLUÇÃO (%) 16,7% EVOLUÇÃO (%) 850,0
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
Ao mesmo tempo, na zona urbana a ampliação do número de estabelecimentos
de ensino fundamental se deu em razão da entrada em cena de
estabelecimentos particulares de ensino.
Tabela 12 - Lençóis: Número de Matrículas Iniciais no Ensino Fundamental URBANA RURAL ANO
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular 1996 - 781 605 - - 471 - - 2002 - 1138 211 113 - - 1800 -
EVOLUÇÃO (%) 5,48 EVOLUÇÃO (%) 282,2
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
Estas mudanças levaram a uma ampliação do número de matrículas no ensino
fundamental, principalmente na zona rural, onde este incremento alcançou
124
282,2%. É importante frisar que, dada a redução absoluta que experimentou a
população rural, uma parte destas vagas provavelmente está sendo preenchida
por adultos.
Por fim, no que se refere ao ensino médio, cuja responsabilidade se transferiu,
ao longo do período, da esfera municípal para a estadual, não houve qualquer
expansão no número de estabelecimentos de ensino. Persiste, ainda, a absoluta
falta de alternativa para a população rural. O número de matrículas, entretanto,
experimentou uma elevação significativa saltando 242,9%, ao longo do período,
como se pode ver das tabelas que se seguem.
Tabela 13 - Lençóis: Número de Estabelecimentos de Ensino Médio URBANA RURAL ANO
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular 1996 - - 1 - - - - - 2002 - 1 - - - - - -
EVOLUÇÃO (%) - EVOLUÇÃO (%) -
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
Tabela 14 - Lençóis: Número de Matrículas Iniciais no Ensino Médio URBANA RURAL ANO
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular 1996 - - 147 - - - - - 2002 - 504 - - - - - -
EVOLUÇÃO (%) 242,9 EVOLUÇÃO (%) -
Fonte: Bahia, 1997b, 2003b. Elaboração própria pelo autor
A análise destes dados evidencia que, de modo geral, houve uma melhoria no
quadro geral da educação no município de Lençóis, ao longo do período
analisado. Esta melhora se deve, fundamentalmente, a uma ampliação da oferta
125
de estabelecimentos de ensino municipais na zona rural. Além disto, na zona
urbana, percebe-se uma ampliação da oferta de vagas em estabelecimentos de
ensino privado, nos níveis pré-escolar e fundamental, que têm complementado a
ação estatal.
4.9.4 Saúde e Saneamento Urbano
Os dados acerca de mortalidade infantil no município de Lençóis, apontam para
uma redução desta, ao longo da década de 1990. No entanto, como se pode ver
da tabela abaixo, esta redução tem se dado numa velocidade inferior àquela
verificada no estado como um todo.
Tabela 15 - Evolução do Coeficiente de Mortalidade Infantil 1990 1998 Variação
LENÇÓIS 69,96 60,35 (13,74)
BAHIA 62,67 50,4 (19,58)
Fonte: Bahia, 2003a. Elaboração própria pelo autor
Este dado encontra eco no Índice do Nível de Saúde, indicador que integra o
Índice de Desenvolvimento Social, calculado pela Superintendência de Estudos
Econômicos e Sociais da Bahia (SEI). Para o período 1998-2000, o município
apresenta um situação de relativa imobilidade, passando de 5 014,97 pontos
para 5 008,51. Isto implicou numa queda em seu posicionamento no ranking
baiano da 142ª posição para a 172ª (Bahia, 2002).
126
No que se refere aos serviços de saneamento básico, o município apresenta
uma melhora bastante representativa. O sistema de abastecimento de água se
elevou 47%, ao longo dos anos 1990, atingindo 70% da população do município,
uma média superior à da Zona Turística Chapada Diamantina (62,73%).
Tabela 16 – Lençóis: Índices de Cobertura de Serviços de Água e Coleta de Lixo
1991 2000 Crescimento
1991/2000
Água 47,50% 70,0% 47%
Coleta de Lixo 28% 53% 89%
Fonte: Bahia, 2003a. Elaboração própria pelo autor
Ao mesmo tempo, o serviço de coleta de lixo também apresenta uma elevação
de 89%, atingindo 53% dos domicílios. Na Zona Turística Chapada Diamantina
este percentual é de somente 38,73%.
Deve-se frisar que, no ano de 2000, 55,3% da população de Lençóis era
atendida pelo serviço de esgotamento sanitário, um índice mais de duas vezes
superior ao da Zona Turística Chapada Diamantina, que alcançava apenas
25,0% da população. Neste mesmo ano, o índice de atendimento do estado da
Bahia era de 58,6%. (Bahia, 2003a)
A despeito de aproximar-se da média do estado, esta oferta não se dava de
modo equilibrado no município. Enquanto na área urbana o atendimento
chegava a 90,5%, na área rural este caia para apenas 8,1% (Bahia, 2003a)
127
4.9.5 Economia
Entre os anos de 1996 e 2000, o município de Lençóis experimentou uma
significativa elevação de seu PIB. Este conheceu um crescimento global de
585,72%, apresentando uma taxa média anual de crescimento 61,8%. Esta taxa
quase sete vezes superior à taxa média de crescimento da Bahia.
Verifica-se, portanto, uma tendência de crescimento do produto municipal de
Lençóis bastante superior àquele do estado como um todo.
Tabela 17 – Lençóis: Produto Municipal e Participação no PIB da Bahia 1996 1998 2000
PIB (R$) % BA PIB (R$) % BA PIB (R$) % BA
CRESC ANUAL
1996/2000
Lençóis 3 417 0,01 15 733 0,04 23 431 0,05 61,8
Bahia 31 616 054 100,00 38 738 618 100 44 391 386 100 8,9
Fonte: Bahia, 2003a
Para se ter uma idéia do significado desta elevação, basta mencionar o fato de
que, apenas o crescimento do período 1998-2000 fez com que o município
desse um salto de 65 posições no ranking dos municípios baianos. Isto fez com
o mesmo deixasse a 306 a posição e se tornasse a 241a economia municipal do
estado (Bahia, 2003b).
128
A análise de dados, referentes ao Produto Interno Bruto Municipal, do IPEA3
para o período 1985-1996, aponta uma taxa de média de crescimento negativa
de 2,19% anuais para o município de Lençóis. No mesmo período, segundo esta
fonte, o estado da Bahia apresenta uma taxa média positiva de crescimento de
8,29% (Bahia, 2003a).
Pode-se perceber, então, que o período 1996-2000 representou um momento de
reversão de uma tendência de decrescimento da economia do município de
Lençóis. Esta se deu de modo bastante rápido e intenso, denotando enorme
pujança econômica.
Um outra dimensão que merece destaque é a que se refere à importância da
atividade turística na composição do produto municipal. Para o ano de 2001,
estima-se que o impacto econômico dos gastos turísticos na economia de
Lençóis tenha alcançado o montante de US$ 11,692, 000.00 (Bahia, 2003 a).
Neste mesmo ano, a receita gerada pelas atividades agrícolas alcançaram
apenas US$1,500,546.45, ou seja, cerca de 14% da primeira (Bahia, 2003 a).
Este dado indica o peso da atividade turística para a Lençóis contemporânea,
sugerindo que o cotidiano desta começa a orbitar em torno do Turismo.
3 A metodologia de cálculo empregada pelo IPEA difere daquela empregada para obtenção dos dados anteriores pela SEI. A despeito da impossibilidade da comparação dos valores, tal não elimina a possibilidade de se verificar tendência de crescimento/ redução dos produtos municipais nos dois períodos.
129
4.9.6 Índice de Desenvolvimento Humano
A melhoria das condições do município de Lençóis nas diversas dimensões
analisadas se refletiu, como era de se esperar, em seu Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH). Como se pode ver na tabela abaixo, o IDH do
município de Lençóis, ao longo do período em análise, apresentou um índice de
crescimento acima daquele apresentado pelo Estado como um todo.
Tabela 18 – Lençóis x Bahia: Evolução do IDH 1991 2000 CRESCIMENTO (%)
LENÇÓIS 0,510 0,614 20,47
BAHIA 0,601 0,693 15,33
Fonte: Bahia, 2003 a
Esta variação positiva do IDH indica que as condições de vida da população do
município têm melhorado num ritmo acima daquele da população do estado
como um todo. Deve-se destacar que a região da Chapada Diamantina
historicamente tem apresentado indicadores de desenvolvimento bastante
inferiores ao do restante do estado. Esta melhora, na última década, é um sinal
positivo para o município, que começa a recuperar terreno, em termos de bem
estar, com relação ao nível médio experimentado pela população do estado.
130
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Transformado no centro vital de uma revolução econômica, pela abundância de pedras preciosas, os Lençóis passam a ser, dos meados do século XIX em diante, a capital das Lavras Diamantinas. (Moraes, 1984, p.41)
Este trabalho não tem a ambição de chegar a conclusões definitivas quanto aos
impactos de uma política pública (Prodetur-BA) sobre o processo de
desenvolvimento de uma localidade em específico (o município de Lençóis). Por
sua própria natureza, de pesquisa exploratória fundada em dados documentais e
bibliográficos, portanto limitada aquilo já observado em maior ou menor grau por
outros, não pode argüir-se tal papel.
No entanto, pode aventar hipóteses que auxiliem futuros projetos que busquem
empreender uma avaliação mais aprofundada do tema, por meio de uma
pesquisa descritiva causal. Não há aqui, destarte, um arremate categórico
quanto ao fenômeno que se verifica em Lençóis. Apontam-se alguns eventos
que parecem merecer destaque e explicitam a necessidade de se conhecer
melhor o que o Prodetur-BA efetivamente significa para o município.
Este trabalho permite concluir que, após mais de uma década da criação do
Prodetur-BA, o município de Lençóis, sem dúvida, encontra-se numa situação
distinta daquela que vivia no final dos anos 1980. A criação da Zona Turística
Chapada Diamantina e o carreamento de investimentos públicos em infra-
131
estrutura ampliaram significativamente a oferta de bens e serviços públicos à
população do município, bem como fomentaram o crescimento de negócios
privados que giram em torno da atividade turística.
O volume de recursos de origem privada destinado a inversões geradoras de
emprego e renda no município, principalmente, em atividades relacionadas à
hospedagem e lazer, é um dos sintomas deste fenômeno. Além disto, as
estimativas quanto a elevada participação das atividades turísticas na
composição do produto municipal, permitem especular-se quanto ao grau de
importância assumido por esta atividade para o município nos dias que correm.
Voltando para os objetivos deste estudo, pode-se aqui, por fim, analisá-los um a
um.
Em primeiro lugar, no que tange às características do Prodetur-BA, este estudo
chegou à conclusão que dada sua elevada associação ao Prodetur-NE,
programa do BID, para obter recursos e financiar suas inversões, esta política
pública acaba assumindo as características de uma política de cunho
racionalista (que marca definitivamente os programas do BID), evidenciando
uma sujeição da política de desenvolvimento estadual a interesses e objetivos
de terceiros.
132
Já quanto ao segundo objetivo específico (aquele de verificar as mudanças
ocorridas na estrutura da população do município), chama atenção, não apenas
o elevado grau de urbanização alcançado por Lençóis, que supera a média
baiana, mas, principalmente, a velocidade que tal fenômeno alcançou nos anos
1990.
Há como que uma corrida para a urbe – onde se concentram a oferta de
serviços públicos municipais e a oferta de serviços turísticos diversos
(hospedagem, pousadas, bares, restaurantes, agências de viagem, excursão,
lojas de artesanato, equipamento para eco-turismo...), capazes de gerar
emprego e renda para uma vasta camada da população urbana e para aqueles
que lá chegam.
Esta corrida, sem dúvida, gera uma pressão sobre a estrutura de oferta infra-
estrutura e serviços públicos na zona urbana, que precisam ser expandidos
numa velocidade tão grande quanto o crescimento populacional. Há, portanto,
uma pressão sobre os gestores públicos municipais, que devem ser capazes de
traçar políticas públicas e realizar investimentos adequados para fazer face a
este “inchamento”da urbe.
Um outro elemento que conduz a especulações, ainda neste tópico, é a
alteração verificada na pirâmide etária do município. A redução, não apenas
relativa, mas absoluta, do grupo de crianças sugere uma queda nas taxas de
133
natalidade do município. A despeito disto, a população do município cresceu a
uma taxa considerada normal ao longo da década, graças à forte expansão dos
grupos de jovens adultos e de adultos. Esta constatação, por sua vez, sugere
que o município pode ter sido receptor de fluxos migratórios de populações em
busca de oportunidade de emprego e renda, motivadas pelas inversões de que
este foi alvo e pela notoriedade alcançada no período.
Esta constatação, como já anteriormente ressaltado, coloca nas mãos do poder
público uma responsabilidade na criação de políticas públicas adequadas de
qualificação e inclusão desta mão de obra no mercado de trabalho.
No que tange ao coração deste estudo- as dimensões econômica, de educação
e de saúde e saneamento- algumas observações podem ser feitas, a saber:
a) o PIB Municipal apresentou excepcional crescimento no período em
análise. Com uma elevação superior a 500% do Produto Municipal
Absoluto num período de apenas cinco anos há um inegável boom na
geração de riqueza local, apenas comparável ao período de corrida ao
diamante. Este fato não dá margem a dúvidas quanto aos efeitos da
atividade turística sobre a economia municipal;
b) quanto à educação, verifica-se relativa estabilidade no quadro geral.
Enquanto os níveis de alfabetização permanecem levemente acima dos
134
níveis estaduais, houve forte incremento no número total de matrículas
nos estabelecimentos rurais voltados para o ensino fundamental,
financiadas pela expansão da oferta de vagas pelo poder público
municipal. Além disso, verifica-se o surgimento de estabelecimentos de
ensino particulares voltados para o ensino pré-escolar e fundamental na
zona urbana. Estes foram os responsáveis pela ampliação no número de
matrículas nestes dois níveis na zona urbana, uma vez que a oferta
pública na zona urbana estagnou-se no período;
c) no que se refere à dimensão de saúde e saneamento há dados
controversos. Ao mesmo tempo em que o município apresenta melhoria
nos índices de cobertura de serviços de água, esgoto e coleta de lixo,
além de uma redução no coeficiente de mortalidade infantil, verificam-se
dados conflitantes: (1)no que tange ao serviço de esgotamento sanitário,
enquanto na urbe este atinge um patamar de 90,5%, na zona rural este é
inferior a 10%; (2) a despeito da melhora no índice de mortalidade infantil,
esta é 30% inferior ao experimentado pelo estado como um todo. Além
disto, o Índice do Nível de Saúde da SEI aponta uma piora relativa do
município, que despenca da 142ª. posição para a 172ª. dentre os
municípios do estado. Este é um dado inconcebível, pois revela que a
despeito de todo crescimento econômico experimentado, não há um
correlato crescimento da infra-estrutura de saúde local.
135
Um das dimensões que não foram avaliadas por este trabalho, mas que não
pode ser esquecida em qualquer projeto que busque avaliar o grau de
desenvolvimento de uma sociedade, é a dimensão Política. Em geral, a criação
de atividades envolvendo o eco-turismo dá origem à criação de organizações
não governamentais (ONGs) e instituições do terceiro setor, voltadas para a
proteção do meio ambiente, cuja atividade política no cotidiano da população se
revela intensa.
A criação destes organismos pode ter um papel importante para criação de uma
nova estrutura de poder local. Um primeiro sintoma de que algo ocorre nas ruas
de Lençóis é o fato da perda do mandato político na eleição de 2002 pelo sr.
Horácio de Matos, neto do coronel Horácio de Mattos, cuja família manteve o
poder político sobre a região ao longo de todo o século XX. Se este é apenas
um fato isolado não há como se verificar, senão por meio de uma pesquisa
judiciosa, mas não deixa de ser uma constatação sugestiva o momento em que
ocorre.
Todas estas mudanças, sem dúvida, são fruto da criação do Prodetur-BA e da
transformação do município em portão de entrada da Zona Turística Chapada
Diamantina, portanto, principal beneficiário de uma série de suas inversões. No
entanto, o quanto se deve exclusivamente a este fator é uma importante questão
remanescente. Para resolvê-la faz–se necessário desenvolver uma nova
136
pesquisa que busque isolar o impacto deste fator exógeno sobre a dinâmica
endógena própria vigente no município quando da implantação do Prodetur-BA.
O fato que se apresenta como inegável é que, como no trecho de Moraes citado
acima, os Lençóis passam ao final do século XX, início do século XXI, por mais
uma “revolução econômica”. Esta, em larga medida, estimulada por agentes
exógenos à comunidade tem causado mudanças em sua sociedade que se
adapta e promove ajustes em sua própria dinâmica para aproveitar os benefícios
dela advindos. Se o resultado final será sustentável, ou assumirá a característica
de apenas mais um ciclo como o do diamante, em que após a extração da
riqueza que abunda à flor da pele há uma grande derrocada, o tempo dirá.
137
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