políticas de saude_apostila

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1 Polticas de Saœde: organizaªo e operacionalizaªo do Sistema nico de Saœde

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  • 11111

    Polticas de Sade:organizao e

    operacionalizao doSistema nico de Sade

  • 22222

    FUNDAO OSWALDO CRUZ

    Presidente

    Paulo Buss

    Vice-Presidente de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnolgico

    Jos Rocha Carvalheiro

    Coordenador da rea de Fomento e Infra-Estrutura

    Win Degrave

    Coordenadora do Programa de Desenvolvimento e Inovao Tecnolgicaem Sade Pblica (PDTSP)

    Mirna Teixeira

    ESCOLA POLITCNICA DE SADE JOAQUIM VENNCIO

    Diretor

    Andr Malho

    Vice-Diretora de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnolgico

    Isabel Brasil Pereira

    Vice-Diretor de Desenvolvimento Institucional

    Sergio Munck

    Coleo Educao Profissional e Docncia em Sade: a

    formao e o trabalho do agente comunitrio de sade

    Coordenadora

    Mrcia Valria G. C. Morosini

    Esta publicao contou com o apoio do PDTSP/Fiocruz

  • 33333

    Polticas de Sade:organizao e

    operacionalizao doSistema nico de Sade

    Organizadoras

    Gustavo Corra Matta

    Ana Lcia de Moura Pontes

  • 44444

    Projeto Grfico e Editorao Eletrnica

    Marcelo Paixo

    Capa

    Gregrio Galvo de Albuquerque

    Diego de Souza Incio

    Reviso

    Janana de Souza Silva

    Soraya de Oliveira Ferreira

    Reviso Tcnica

    Ana Lcia de Moura Pontes

    Anamaria DAndrea Corbo

    Gustavo Corra Matta

    Mrcia Valria G. C. Morosini

    Catalogao na fonteEscola Politcnica de Sade Joaquim VenncioBiblioteca Emlia Bustamante

    M435p Matta, Gustavo Corra. Polticas de sade: organizao e operacionalizao do sistema nico de sade. / Organizado por Gustavo Corra Matta e Ana Lcia de Moura Pontes. Rio de Janeiro: EPSJV / Fiocruz, 2007.

    284 p. : il. , graf. ; - (Coleo Educao Profissional e Docncia em Sade: a formao e o trabalho do agente comunitrio de sade, 3). Coordenadora da coleo Mrcia Valria G. C. Morosini.

    ISBN: 978-85-98768-23-6

    1. Sistema nico de Sade. 2. Poltica de Sade. 3. Brasil. 4. Avaliao em Sade. 5. Agente Comunitrio de Sade. 6. Livro Didtico. I. Ttulo. II. Pontes, Ana Lcia de Moura.

    CDD 362.10425

  • 55555

    AutoresAutoresAutoresAutoresAutores

    Ana Lcia AbrahoEnfermeira sanitarista, doutora em Sade Coletiva Sade pela Universi-

    dade Estadual de Campinas (Unicamp), professora e pesquisadora da

    Escola de Enfermagem da Universidade Federal Fluminense (UFF).

    Arlinda B. MorenoPsicloga, doutora em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina Social

    da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), professora e

    pesquisadora da Escola Politcnica de Sade Joaquim Venncio da Fun-

    dao Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz).

    Carlos Gonalves SerraCirurgio-dentista, doutor em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina

    Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj) e profes-

    sor do Mestrado de Sade da Famlia da Universidade Estcio de S.

    Cludia Medina CoeliMdica, Docente do Departamento de Medicina Preventiva da Faculda-

    de de Medicina e Instituto de Estudos em Sade Coletiva da Universida-

    de Federal do Rio de Janeiro (IESC/Ufrj).

    Cristiani Vieira MachadoMdica sanitarista, doutora em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina

    Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), profes-

    sora e pesquisadora do Departamento de Administrao e Planejamento

    em Sade da Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca da Funda-

    o Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz).

    Elaine Silva MirandaFarmacutica, doutoranda em Sade Pblica na Escola Nacional de SadePblica Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), pes-quisadora do Ncleo de Assistncia Farmacutica do Departamento deCincias Biolgicas da Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca

    da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz).

  • 66666

    EDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADE

    Elizabeth Moreira dos SantosPh.D Community Health UI USA, pesquisadora titular do Departamen-

    to de Endemias Samuel Pessoa da Escola Nacional de Sade Pblica

    Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz) e coordenado-

    ra do Laboratrio de Avaliao de Situaes Endmicas Regionais(Laser-

    Ensp/Fiocruz.

    Gabriela Costa ChavesFarmacutica, mestre em Sade Pblica pela Escola Nacional de Sade

    Pblica Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz) e pes-quisadora do Ncleo de Assistncia Farmacutica do Departamento de

    Cincias Biolgicas Escola Nacional de Sade Pblica Srgio Arouca da

    Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz).

    Gustavo Corra MattaPsiclogo, doutor em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina Social

    da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj) e professor

    pesquisador da Escola Politcnica de Sade Joaquim Venncio da Funda-

    o Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz).

    Kenneth Rochel de Camargo Jr.Mdico, doutor em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da

    Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), professor adjunto

    do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado Rio de Janeiro

    (IMS/Uerj).

    Luciana Dias de LimaMdica sanitarista, doutora em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina

    Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), profes-

    sora e pesquisadora do Departamento de Administrao e Planejamento

    em Sade Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca da Fundao

    Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz).

    Marly Marques da CruzPsicloga, doutora em Sade Pblica pela Escola Nacional de Sade Pbli-

    ca Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz) e pesquisa-

    dora visitante do Departamento de Endemias Samuel Pessoa (Ensp/Fiocruz).

  • 77777

    Orenzio SolerFarmacutico, doutor em Cincias Socioambientais, profissional na-

    cional em Assistncia Farmacutica da Organizao Pan-Americana

    da Sade (Opas).

    Paulo Henrique RodriguesSocilogo, doutor em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina Social

    da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj) e professor do

    Mestrado de Sade da Famlia da Universidade Estcio de S.

    Tatiana Wargas de Faria BaptistaPsicloga, doutora em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina Social

    da Universidade do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), professora e pesquisado-

    ra do Departamento de Administrao e Planejamento em Sade da Esco-

    la Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz

    (Ensp/Fiocruz).

    Vera Lucia LuizaFarmacutica, doutora em Sade Pblica pela Escola Nacional de Sade

    Pblica Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), pes-

    quisadora e coordenadora adjunta do Ncleo de Assistncia Farmacuti-

    ca do Departamento de Cincias Biolgicas da Ensp/Fiocruz.

    Waldir da Silva SouzaSocilogo, mestre em Sade Pblica pela Escola Nacional de Sade P-

    blica Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), douto-

    rando em Sociologia pelo Instituto Universitrio de Pesquisas do Rio de

    Janeiro (Iuperj) e professor da Universidade Estcio de S.

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    EDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADE

  • 99999

    SumrioSumrioSumrioSumrioSumrio

    Apresentao da Coleo

    Apresentao do Livro

    Histria das polticas de sade no Brasil: a trajetriado direito sadeTatiana Wargas de Faria Baptista

    Princpios e Diretrizes do Sistema nico de SadeGustavo Corra Matta

    O Legislativo e a Sade no BrasilTatiana Wargas de Faria Baptista e Cristiani Vieira Machado

    Participao Popular e Controle Social na Sade:democratizando os espaos sociais e agregandocapital socialWaldir da Silva Souza

    Configurao Institucional e o papel dos gestoresno Sistema nico de SadeCristiani Vieira Machado, Luciana Dias de Lima e TatianaWargas de Faria Baptista

    Notas sobre o Planejamento em SadeAna Lcia Abraho

    O Financiamento da Sade no BrasilCarlos Gonalves Serra e Paulo Henrique Rodrigues

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    61

    81

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    EDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADEEDUCAO E SADE

    O Medicamento na Poltica de Sade no Brasil:como os agentes comunitrios de sade podemcontribuir para a promoo do acesso e do usoracional dos medicamentos?Vera Lucia Luiza, Gabriela Costa Chaves, Elaine SilvaMiranda e Orenzio Soler

    Informao e Avaliao em SadeKenneth Rochel de Camargo Jr., Cludia Medina Coelie Arlinda B. Moreno

    Avaliao de Sade na Ateno Bsica:perspectivas tericas e desafios metodolgicosMarly Marques da Cruz e Elizabeth Moreira dos Santos

    227

    251

    267

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    Apresentao da Coleo

    Educao Profissional e Docncia em Sade:

    a formao e o trabalho do Agente Comunitrio de Sade

    A coleo Educao Profissional e Docncia em Sade: a formao e o

    trabalho do Agente Comunitrio de Sade, organizada pela Escola Politcnica

    de Sade Joaquim Venncio da Fundao Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz),

    dirigida aos docentes das instituies responsveis pela formao dos agentes

    comunitrios de sade, em particular s Escolas Tcnicas do Sistema nico de

    Sade (ETSUS). Estas escolas pblicas da rea da sade, majoritariamente

    ligadas s Secretarias de Sade dos estados e municpios, dedicam-se educa-

    o profissional dos trabalhadores de nvel mdio e tcnico do SUS, estando

    organizadas em mbito nacional, desde 2000, na Rede de Escolas Tcnicas do

    SUS (RETSUS), da qual a EPSJV faz parte.

    A idia de uma coleo de textos de referncia bibliogrfica para os do-

    centes que se dedicam educao dos ACS surge do reconhecimento da ne-

    cessidade de sistematizar e socializar os saberes fundamentais formao des-

    ses profissionais, saberes estes que transcendem o nvel local e conformamuma base comum ao trabalho. A coleo buscou tambm contemplar o enten-

    dimento de que o ACS realiza um trabalho complexo, cujas bases tcnicas no

    podem ser descontextualizadas das relaes sociais e polticas que as atraves-

    sam e condicionam. Tal premissa marca a concepo de educao profissional

    promovida pela EPSJV/Fiocruz, que entende o trabalho como princpio educativo

    e a formao docente como um processo contnuo no qual pesquisa e ensino se

    articulam em objetos de trabalho e investigao permanentes.

    As discusses abordadas nos livros que compem a coleo emergiram

    dos debates realizados com docentes, ACS, gestores e especialistas (repre-

    sentantes das coordenaes municipais e estaduais da Sade da Famlia) em

    oficinas regionais desenvolvidas em trs escolas da Retsus no Centro de For-

    mao de Pessoal para os Servios de Sade Dr. Manuel da Costa Souza (Na-

    tal-RN), na Escola Tcnica em Sade Maria Moreira da Rocha (Rio Branco-

    AC) e na Escola Tcnica de Sade de Blumenau (Blumenau-SC) , contem-

    plando as trs macrorregies geoeconmicas do pas, respectivamente, Nor-

    deste, Amaznia e Centro-Sul. Nestas oficinas, participaram tambm o Centro

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    de Formao de Pessoal Caetano Munhoz da Costa, do Paran, a Escola de

    Formao em Sade de Santa Catarina e o Centro de Formao de Recursos

    Humanos da Paraba.

    Nesses encontros, almejou-se reconhecer as condies do trabalho dos

    ACS, buscando a interlocuo necessria construo da coleo. Esse pro-

    cesso se deu no mbito do projeto Material Didtico para os Docentes do

    Curso Tcnico de ACS: melhoria da qualidade na Ateno Bsica, coordenado

    pela EPSJV/Fiocruz, realizado em parceria com Escolas Tcnicas do SUS, e

    financiado pelo Programa de Desenvolvimento e Inovao Tecnolgica em Sa-

    de Pblica: Sistema nico de Sade (PDTSP-SUS) da Fiocruz, edital 2004. A

    coleo foi viabilizada, assim, pelo dilogo j constitudo no interior da Rede,

    apresentando-se, desta forma, tambm, como uma contribuio ao seu fortale-

    cimento e ao processo de colaborao e parceria entre estas escolas.

    Para melhor localizarmos a coleo no contexto da formao tcnica dos

    ACS, devemos, ento, remetermo-nos, em primeiro lugar, s questes relati-

    vas ao seu trabalho e sua profissionalizao e, em segundo lugar, ao projeto

    do qual a coleo resulta, incluindo suas concepes sobre trabalho, conheci-

    mento e material didtico.

    A Formao do ACS e a Relevncia desta Coleo

    Em meados de 2004, o Ministrio da Sade e o Ministrio da Educa-

    o publicaram o Referencial Curricular do Curso Tcnico de Agente Co-

    munitrio de sade, instituindo a formao tcnica deste trabalhador e tra-

    zendo uma contribuio fundamental regulamentao desta profisso,

    estratgica para a reorganizao da ateno bsica no SUS, por meio da

    Sade da Famlia. Entretanto, a operacionalizao da formao em nvel

    tcnico dos ACS no constitui tarefa simples. Esta operacionalizao se

    depara com as complexidades inerentes prpria configurao da atividade

    dos ACS, no que diz respeito natureza inovadora da atividade, fragilida-

    de de sua identidade profissional e regulamentao incipiente. Alm dis-

    so, a formao dos ACS transcende o setor da sade.

    Reconhecidamente o trabalho do agente comunitrio de sade lida com

    questes relativas cidadania, poltica, s condies de vida e organizao

    dos grupos e suas relaes, incluindo a famlia. Assim, exige o aporte de conhe-

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    cimentos que extrapolam o campo da sade, e que precisam estar sistematiza-

    dos na formao dos ACS, alm dos saberes especficos que perpassam a pr-

    tica cotidiana da sua atuao. Independentemente da realidade local em que o

    ACS se encontra, estes eixos so estruturantes para o desenvolvimento de um

    trabalho com qualidade no campo da sade.

    A produo de material didtico no est descolada desta complexidade.

    Porm, o material produzido para apoiar a capacitao dos ACS, que se desen-

    volveu predominantemente em servio, vem-se caracterizando predominante-

    mente por centrar-se no desempenho das atividades e atribuies especficas

    desses trabalhadores. Este tipo de material, embora tenha uma aplicao

    justificada em algumas circunstncias especficas de qualificao, pode, por ou-

    tro lado, reforar a simplificao do trabalho do ACS e reduzi-lo sua dimenso

    operacional, no contemplando, de forma satisfatria, a abrangncia requerida

    por uma formao tcnica congruente com a complexidade congruente com a

    complexidade inerente s diversas etapas do trabalho em sade.

    O nvel tcnico, em nossa perspectiva, introduz a oportunidade de elabo-

    rao de um projeto poltico pedaggico que fundamente o saber sobre o traba-

    lho e recupere as bases tcnicas que o estruturam e o qualificam, constituindo-

    se na possibilidade de domnio pelo trabalhador do conhecimento cientfico

    construdo pela humanidade. Este conhecimento permite ao sujeito a apropria-

    o dos fundamentos tericos e tcnicos do seu trabalho, ampliando-lhe a com-

    preenso do processo em que se insere.

    A partir da atuao das ETSUS na formao tcnica dos agentes comu-

    nitrios, estas escolas iniciaram a produo de material didtico dirigido para

    tal formao. A diretriz que prevaleceu foi que este material deveria ser sens-

    vel realidade local em que se desenvolve o trabalho e a formao do ACS, em

    ateno s diferenas regionais. Entretanto, de se considerar que tais dife-

    renas expressam tambm desigualdades socialmente produzidas e que se ater

    a elas pode implicar a sua reproduo. Alm disso, mesmo se considerando que

    h contextos e prticas culturais particulares, partimos do princpio que h co-

    nhecimentos que constituem uma base comum para a produo da sade, e,

    portanto, para o trabalho e a formao do ACS.

    Neste cenrio, coloca-se a pertinncia e a necessidade da presente pro-

    posta. Primeiro, por objetivar constituir um referencial bibliogrfico sistemati-zado e tematizado a partir de um projeto formativo norteado por diretrizes

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    nacionais. Segundo, por buscar articular as diretrizes nacionais realidade lo-

    cal, atravs da integrao das escolas tcnicas que concebem os planos de

    curso orientados pelas diretrizes nacionais e que realizam a formao dos ACS

    locais. Terceiro, por visar o docente que participa dessa formao tcnica e que

    participar ativamente da elaborao do prprio material, ensejando um duplo

    processo de qualificao desse docente: no prprio processo de produo do

    material e na sua utilizao posterior.

    Concepes Terico-Metodolgicas de Construo

    do Material Didtico

    Quanto aos referenciais terico-metodolgicos, destacamos a orien-

    tao de pautar a produo do material didtico pela considerao dos dife-

    rentes discursos em disputa histrica sobre temticas centrais formao

    dos agentes comunitrios: trabalho, educao e sade. A concepo aqui

    defendida a de que no h forma de tratar tais temticas sem problematizar

    as noes, scio-historicamente produzidas, a respeito destas.

    A metodologia experimentada no est circunscrita adaptao dos

    conhecimentos das tecnologias de base fsica e organizacional para a reali-

    dade dos agentes comunitrios de sade. Em certa medida, tal adaptao

    poderia significar o reforo da concepo de processo de trabalho como

    soma de funes executadas e do agente comunitrio como ltimo nvel na

    hierarquia da diviso social e tcnica do conhecimento. Assim, na perspec-

    tiva da presente coleo, uma forma de colocar em xeque a diviso social e

    tcnica do trabalho colocar os conceitos acima apontados em sua

    historicidade via noes em disputa no discurso dos docentes, dos ACS,

    dos trabalhadores da sade da famlia, enfim, em todos os sujeitos envolvi-

    dos na configurao da formao e do trabalho do ACS. Ou seja, o conhe-

    cimento no neutro; o conhecimento se define como tal porque implica

    formas de ao e de existncia no caso, dos trabalhadores da sade.

    Neste sentido, a diversidade de temas e questes tratadas pela pre-

    sente coleo ao longo dos seis volumes no constitui um adendo ou uma

    busca de iluminar os docentes atuantes na formao dos ACS. Parte-se

    do princpio que a historicidade do conhecimento que passa por analisar

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    suas condies de produo e de disputa est no cerne da compreenso e

    da construo do trabalho e da formao do ACS, tanto quanto o conheci-

    mento mais imediatamente associvel prtica desse trabalhador.

    Note-se tambm que a compreenso de material didtico, construda nombito dessa coleo, no se confunde com aquela que concebe este tipo de

    texto unicamente como instrumento in loco do processo ensino-aprendizagem.Ao contrrio, compreende o processo ensino-aprendizagem de forma ampliada,

    abrangendo a formao do docente e a concepo do docente como um inves-

    tigador. Destarte, nosso material didtico formata-se como textos de refern-

    cia que articulam ensino e pesquisa como dimenses indissociveis da educao

    profissional, podendo constituir-se em uma biblioteca de consulta.

    Est tambm presente em nossa concepo de material didtico a ne-

    cessidade de considerar e colocar em confronto a realidade cotidiana dos

    servios e o conhecimento socialmente acumulado como ponto de partida da

    formao da classe trabalhadora. Entendemos esse confronto entre os signifi-

    cados como uma dinmica profcua, na medida em que os contextos diferencia-

    dos, quando em interao, estabelecem uma relao no apenas de justaposi-

    o ou de indiferena, mas, sobretudo, de interao e conflito. Nesta relao

    pode-se estabelecer o dilogo, havendo tantas significaes possveis quantos

    os projetos histrico-sociais em disputa.

    Neste sentido, a construo do material didtico de apoio aos docentes

    atuantes na formao dos agentes comunitrios de sade orienta-se pela idia

    de dilogo como condio de linguagem, dilogo entendido aqui como a inexorvel

    inscrio de sujeitos e discursos na histria para que se produza sentido,

    conhecimento, saber. Logo, o dilogo, na perspectiva aqui adotada, constitutivo

    da prpria linguagem e do conhecimento.

    No entanto, esta condio de linguagem chamada por ns aqui de dilo-

    go se realiza e se manifesta historicamente nas mais diferentes formas, inclu-

    sive naquela que busca negar sua prpria existncia: ou seja, aquela que tenta

    reprimir, na superfcie do texto, o carter histrico e social dos conceitos. O

    resultado disto, no mbito do material didtico, a idia de que o conhecimento

    ali apresentado e construdo se confunde com o real.

    A presente coleo almeja alcanar o horizonte oposto, buscando incor-

    porar a noo de livro didtico como um processo e um texto em que mltiplas

    vozes esto representadas e, algumas vezes, em conflito. Alm da prpria for-

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    ma de implementao do projeto de pesquisa do qual este material didtico

    emerge, este atravessamento de temticas no trabalho do ACS ganha

    materialidade no tratamento editorial da coleo, no qual buscou-se explicitar,

    atravs de notas remissivas cruzadas em cada texto, a abordagem de conceitos

    e noes tratadas por outros textos tambm publicados na coleo. Esta dire-

    o constitui um dos passos para construir os contedos curriculares centrais

    formao do agente comunitrio e para colocar como questo o resgate e a

    produo de conhecimento envolvidos neste trabalho.

    Nesta perspectiva, portanto, entendemos o livro didtico como um

    artefato que tambm pode potencializar que os sujeitos-leitores vivenciem

    a leitura como um ato que permita a compreenso da dimenso histrica da

    produo do conhecimento, abrindo espao para o questionamento e a re-

    significao do texto.

    Enfim, entendemos o material didtico como uma tecnologia educativa

    que pode problematizar a naturalizao de conceitos e noes que atravessam

    o trabalho e a formao do ACS, entendendo que estes tambm so fruto de

    um processo em que o trabalhador foi subalternizado e expropriado da cria-

    o do trabalho. Mais que uma devoluo, no entanto, os textos aqui publica-

    dos consistem de um questionamento direto da invisibilidade e da simplicidade

    deste trabalho, explicitando sua inevitvel inscrio histrica nas prticas e nos

    saberes do trabalho em sade.

    Mrcia Valria G. C. MorosiniCarla Macedo Martins

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    Equipe do projeto Material Didtico para os Docentes do Curso Tcnico

    de ACS: melhoria da qualidade na ateno bsica

    Coordenao do Projeto:

    Mrcia Valria Guimares Cardoso MorosiniLaboratrio de Educao Profissional em Ateno Sade EPSJV/Fiocruz

    Equipe de pesquisa:

    Integrantes da equipe no mbito da EPSJV/Fiocruz:

    Laboratrio de Educao Profissional em Ateno Sade:Ana Lcia PontesAnglica Ferreira FonsecaCarla Macedo MartinsGustavo Corra Matta

    Laboratrio de Educao Profissional em Gesto em Sade:Adriana Ribeiro Rice GeislerValria Lagrange

    Vice-direo de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnolgico:Isabel Brasil Pereira

    Secretaria Tcnica da RET-SUS:Renata Reis

    Assessoria da Vice-direo de Ensino e Informao:Anakeila de Barros Stauffer

    Coordenao de Cooperao Internacional:Anamaria DAndrea Corbo

    Integrante do projeto em outra instituio:

    Universidade Federal Fluminense Faculdade de EnfermagemAna Lcia Abraho

    Secretaria administrativa do projeto:Glucia Martins

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    Relao dos colaboradores, participantes das oficinas regionais do proje-

    to Material Didtico para os Docentes do Curso Tcnico de ACS:Melhoria da Qualidade na Ateno Bsica, etapa fundamental para aconstruo da pauta de temas dos livros da Coleo Educao Profissio-nal e Docncia em Sade: a formao e o trabalho do agente comu-nitrio de sade1.

    Participantes da Oficina em Blumenau SC:

    Alade Maria CorreaAgente Comunitrio de Sade Secretaria Municipal de Sade BlumenauArlete BarzenskiEnfermeira Coordenadora pedaggica do Curso Tcnico de ACS Centro Formadorde Recursos Humanos Caetano Munhoz da Rocha (CFRH Curitiba) PR.Cludia Vilela de Souza LangePedagoga Coordenadora Geral Escola Tcnica de Sade de Blumenau (ETS -Blumenau) SCKtia Lcia Brasil PintarelliCirurgi Dentista ETS Blumenau SCLorete Margarida BernardesPedagoga Coordenadora Administrativa ETS Blumenau - SCLuis Carlos KriewallVeterinrio SMS BlumenauMaria de Ftima CamposEnfermeira Coord. CursoTcnico de Enfermagem ETS Blumenau - SCMaria de Lourdes dos SantosEnfermeira Coordenadora PSF SMS Blumenau SCNanci Aparecida da SilvaEnfermeira Coordenadora PSF SMS Blumenau SCNuria da Silva GuimaresPedagoga da ETS Blumenau SCNilcia Bastos dos SantosAgente Comunitrio de Sade SMS Blumenau SCRosana A. Antunes NunesPedagoga Escola de Formao em Sade (EFOS) SCRosete de Jesus Rosa BoennerAssistente social Coordenadora Regio Garcia SMS Blumenau - SCSandra Marli ButteiAssistente Social ETS Blumenau SC

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    Solange Melo de LizAgente Comunitrio de Sade SMS Blumenau SCStella Maris DuarteEnfermeira Gerente PSF/UAS SMS Blumenau SCSusana Maria Polidrio dos SantosPedagoga EFOS SCTereza Miranda RodriguesEnfermeira Coordenadora pedaggica do Curso Tcnico de ACS CFRH Curitiba PR

    Coordenadores da oficina em Blumenau:Marcia Valria Guimares Cardoso Morosini; Ana Lcia Abraho; Anamaria D AndraCorbo; Anakeila de Barros Stauffer; Renata Reis Cornlio (EPSJV/Fiocruz)

    Participantes da Oficina em Natal - RN:

    Aldeci Padilha HonrioPedagoga Coordenadora pedaggica do Curso Tcnico de ACS Centro de Forma-o de Pessoal para os Servios de Sade Dr. Manuel da Costa Souza (Cefope) RNAna Dilma da SilvaAgente Comunitria Secretaria Municipal de Sade de So Gonalo do Amarante RNAura Helena Gomes Dantas de ArajoEnfermeira Coordenadora pedaggica de Curso de Auxiliar de Enfermagem CefopeRNBrbara C. S. Farias SantosDentista PSF Secretaria Estadual de Sade Pblica RNCarolene de Ftima O. EstrelaPedagoga Coordenadora Pedaggica Centro Formador de Recursos Humanos(Cefor RH) PBDivaneide Ferreira de SouzaEnfermeira Coordenadora Pedaggica do Curso de Aux. Enf. Cefope RNFrancisco Djairo Bezerra AlvesAgente Comunitrio de Sade SMS Natal RNMaria das Graas TeixeiraSociloga - SMS Natal RNIvaneide Medeiros NelsonPedagoga Asessora CefopeRNJacira Machado Alves ArajoDentista Docente do Curso de Formao de ACS Cefor RHPBJeovanice Borja da SilvaAgente Comunitria de Sade SMS Natal

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    Lda Maria de MedeirosDentista Coordenadora do Curso de THD e do Curso Tcnico de ACS CefopeRNMarco Aurlio Azevedo de OliveiraDentista PSF SMS Natal docente CefopeRNMaria Bernadete Almeida CavalcantiEnfermeira Coordenadora Pedaggica do Curso de formao de ACS CeforPBMaria da Assuno RgisEnfermeira Coordenadora pedaggica dos Cursos de Qualificao do ACS - Cefope-RNMaria da Conceio Jales de M. GuedesEnfermeira SMS de So Gonalo do Amarante RNMaria das Graas Leite RebouasEnfermeira Coordenadora do Curso de Aux.Enfermagem CefopeRNMaria dos Remdios de Oliveira MacedoAgente comunitria de sade PACS SMS de So Gonalo do Amarante RNMaria Luciene B. da CostaAgente comunitria de sade SMS Natal RNMaria Neusa da Nbrega AlmintasEnfermeira Coordenadora pedaggica do curso de Enfermagem e Hemoterapia -Cefope-RNNeuma Lucia de OliveiraDentista - PSF SMS Natal Docente Cefope-RNMaria das Graas da Silva LucasHistoriadora Tcnica do Setor de Desenvolvimento de Pessoal SMS Natal RNMaria das Neves M. Maia (Nevinha)Administradora Coordenadora pedaggica da formao do ACS Cefope-RNSolane Maria CostaEnfermeira Coordenadora local dos ACS PACS/PSF Secretaria Estadual deSade Pblica RN Assessora do COSEMS RNUiacy Nascimento de AlencarAssistente social Coordenadora do PSF/PACS Estado-RN Secretaria Estadualde Sade Pblica RNVera Lucia da Silva FerreiraEnfermeira Diretora Cefope-RNVernica Maria e SilvaEnfermeira Coordenadora pedaggica do curso de Aux. Enfermagem Cefope-RN

    Coordenadores da oficina em Natal:

    Mrcia Valria Guimares Cardoso Morosini; Anglica Ferreira Fonseca; Anamaria

    D Andra Corbo; Anakeila de Barros Stauffer (EPSJV/Fiocruz)

  • 2 12 12 12 12 1

    Participantes da oficina em Rio Branco AC:

    Analdemira da Costa MoreiraEnfermeira rea Tcnica de Leishmaniose Superviso das U.S.F. SEMSA Coordenao Local do PROFAEAcre Escola Tcnica de Sade Maria Moreira daRocha ETSMMRAurlio Fernandes de LimaBilogo mediador ETSMMR Secretaria de Estado de Sade do Acre SESACREElza Fernanda Leo de AssisBiloga/Enfermeira mediadora ETSMMRrica Fabola Arajo da SilvaEnfermeira rea Tcnica de Tabagismo Supervisora das U.B.S. SEMSA mediadora ETSMMRFrancisca Lima do NascimentoPedagoga Assessora PedaggicaFrancisca Viana de ArajoACS PSF Secretaria Municipal de Sade de Rio Branco SEMSAGerncia de Educao Profissional GEPRO Secretaria de Estado de EducaoGlacimar Alves de NazarPedagoga assessora pedaggica ETSMMRHerleis Maria de Almeida ChagasEnfermeira coordenadora de Sade Comunitria (PACS/PSF) - SEMSAJarderlene Borges de MatosACS PACS SEMSAJoo Batista Francalino da RochaEnfermeiro Gerncia de Aes Bsicas de Sade (GABS) SEMSAJoo Bosco Moreira MartinsPedagogo Assessor Pedaggico ETSMMRLdia Maria Lopes da SilvaLicenciada em Letras mediadora Assessora de Portugus ETSMMRMaria Estela Livelli BeckerEnfermeira mediadora ETSMMRMaria Zulnia da Silva SousaACS SEMSAMarlene Campos dos ReisEnfermeira rea Tcnica Hipertenso e Diabetes SEMSA mediadora ETSMMRMarlene da Silva de OliveiraPedagoga Coordenadora de Aprendizagem ETSMMRMirtes da Silva Andrade RibeiroEnfermeira mediadora ETSMMR

  • 2 22 22 22 22 2

    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    Neidiany Vieira JovariniPsicloga mediadora ETSMMRPatrick Noronha DantasEnfermeiro mediador ETSMMRRaimundo Jesus PinheiroEnfermeiro Coordenador Local ETSMMRRosa Maria da Silva Costa RochaBiloga sanitarista Coordenadora Tcnica do Curso de Agentes Comunitrios deSade ETSMMRRoseane da Silveira MachadoEnfermeiro ETSMMR SESACRERosinei de QueirozACS PSF SEMSASilene Ferreira da SilvaACS PSF SEMSA Associao dos Agentes Comunitrios de Sade de Rio BrancoSimone Maria de Souza do NascimentoACS Associao dos Agentes Comunitrios de Sade de Rio BrancoTalita Lima do NascimentoEnfermeira Coordenao Geral ETSMMRValria Cristina de Moraes PereiraHistria Coordenao de Recursos Administrativos ETSMMRVnia Maria Lima da SilvaEnfermeira Coordenadora Tcnica da rea de Enfermagem PROFAE Acre

    Coordenadores da Oficina em Rio Branco:Mrcia Valria Guimares Cardoso Morosini; Anakeila de Barros Stauffer; CarlaMacedo Martins; Gustavo Corra Matta.

    1 Os crditos institucionais referem-se situao dos colaboradores poca da realizao dasoficinas.

  • 2 32 32 32 32 3

    Apresentao do Livro

    Sobre o que um livro de polticas de sade deve versar? Que poltica

    ou polticas estamos a produzir nesses textos? Apesar da simplicidade das

    perguntas, suas respostas apresentam diferentes significados em diferen-

    tes contextos. A proposta deste livro discutir de forma integrada o campo

    de relaes entre o Estado e a sociedade na construo de polticas pbli-

    cas, e a organizao e operacionalizao do setor sade no Brasil. Tem-se o

    objetivo de possibilitar uma compreenso das polticas de sade sem dissociar

    o processo e a arena poltica dos contedos que informam o desenho da

    poltica. Ou seja, no se trata de um manual de orientaes tcnicas e

    legais, mas de um conjunto de processos sociais que se materializam em

    leis, procedimentos, orientaes, princpios e diretrizes que do forma e

    contedo ao sistema de sade brasileiro com suas proposies e contradi-

    es, prprias do processo de construo social.

    O livro Polticas de Sade: organizao e operacionalizao do Siste-ma nico de Sade o terceiro volume da coleo Educao Profissional eDocncia em Sade: a formao e o trabalho do Agente Comunitrio de

    Sade. Os textos que compem este volume enfocam especificamente a

    temtica das polticas de sade e o Sistema nico de Sade, e materiali-

    zam a consolidao de polticas pblicas fundadas no direito sade e os

    desafios, impasses e contradies na efetivao desse direito.

    O texto que abre o livro, Histria das polticas de sade no Brasil: a

    trajetria do direito sade, de Tatiana Wargas de Faria Baptista, descre-

    ve a trajetria das polticas de sade,tomando como eixo de anlise o direi-

    to sade no Brasil. Esta perspectiva ao mesmo tempo em que analisa

    criticamente os contextos histricos, polticos e as propostas de ateno

    sade no pas em cada perodo, expe as contradies e os desafios pre-

    sentes no Sistema nico de Sade (SUS), seu fortalecimento e consolida-

    o. A autora aponta para o compromisso social de cada trabalhador da

    sade, de cada cidado em fazer o SUS avanar na defesa do direito

    sade. O texto traz ferramentas e anlises fundamentais para a compreen-

    so histrica das mazelas atuais do sistema de sade e para as discusses

    presentes em todos os textos que fazem parte deste livro.

  • 2 42 42 42 42 4

    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    O texto Princpios e diretrizes do Sistema nico de Sade, de GustavoCorra Matta, apresenta uma proposta de leitura a partir de uma perspectiva

    histrica, poltica e epistemolgica. Argumenta que os princpios do SUS repre-

    sentam valores que escolhemos para a organizao do sistema de sade e

    mostra os avanos e obstculos do SUS tendo por referncia esses mesmos

    valores. O texto apresenta ainda o desafio crtico de seguir defendendo o SUS

    ao mesmo tempo em que denunciamos suas imperfeies. O autor se prope a

    organizar didaticamente a compreenso sobre os elementos que compem a

    base do SUS, tornando o texto um instrumento de uso didtico-poltico para

    trabalhadores e cidados que lidam diariamente ou no com a luta pelo direito

    sade.

    O artigo O legislativo e a sade no Brasil, de Tatiana Wargas de Faria

    Baptista e Cristiani Vieira Machado, faz uma importante contribuio para a

    compreenso da atuao do poder Legislativo na construo e formulao das

    polticas de sade no Brasil, a partir do perodo da redemocratizao do Estado

    na dcada de 1980. Em uma primeira parte, as autoras discutem a organizao

    dos Poderes no Brasil, o papel do Legislativo e o formato institucional atual,

    regras e comisses de trabalho relacionadas sade. Em seguida, discutem

    como, no mbito do Legislativo, deu-se a construo do sistema de seguridade

    social e ampliao do direito sade. Em uma terceira parte, abordam a legis-

    lao em sade aprovada no perodo de 1990 a 2004 e as principais caracters-

    ticas e especificidades da relao Executivo-Legislativo na definio da poltica

    pblica de sade brasileira.

    A partir do conceito de capital social, Waldir da Silva Souza no texto

    Participao popular e controle social na sade: democratizando os espaos

    sociais e agregando capital social, faz um histrico das noes de participao

    popular e controle social, tendo como referncia as polticas pblicas e o Estado

    democrtico. O autor afirma que apesar da conquista da participao da comu-

    nidade no SUS isso no assegura que o cidado margem dos processos de

    representao social e institucional participem da formalidade das instncias de

    representao da comunidade no SUS, comprometendo muitas vezes as reivin-

    dicaes e posies daqueles que mais necessitam. Entretanto, os esforos

    para constituir uma arena de participao nas polticas pblicas trazem um

    sentimento de pertencimento e responsabilidade dos diversos atores sociais na

    construo da democracia e da cidadania.

  • 2 52 52 52 52 5

    O texto Configurao Institucional e o papel dos gestores no Sistema

    nico de Sade, de Cristiani Vieira Machado, Luciana Dias de Lima e Tatiana

    Wargas de Faria Baptista, tem o objetivo de apresentar o papel dos gestores

    no SUS a partir da anlise legal e poltica das instncias de pactuao e gesto

    nas trs esferas de governo. Ao tomar como ponto de partida o federalismo

    poltico brasileiro e a descentralizao da sade no SUS, o artigo aborda as

    funes e as contradies do processo poltico de gesto da sade defendida

    pela Reforma Sanitria brasileira e a agenda neoliberal em voga nos anos 90.

    Dessa forma, as autoras expem de forma clara e didtica os avanos e desa-

    fios da complexa gesto poltica e administrativa do sistema de sade brasilei-

    ro e suas relaes com o cenrio poltico nacional.

    Tomando o planejamento como uma forma de o homem atuar em socie-

    dade buscando a soluo de problemas coletivos, o texto Notas sobre o pla-

    nejamento em sade, de Ana Lcia Abraho, apresenta as principais teorias e

    modelos de interveno que influenciam o planejamento em sade. Enfocando

    os desafios da gesto na Estratgia Sade da Famlia e o papel de cada traba-

    lhador, em especial o agente comunitrio de sade (ACS), o artigo mostra a

    importncia da identificao e formulao de aes que busquem atender s

    demandas da populao de forma estratgica e democrtica. A autora ressalta

    o papel fundamental do planejamento, em especial do planejamento estratgico

    situacional, na busca permanente de dispositivos que ampliem a participao e a

    transformao das prticas de sade nas equipes de sade da famlia.

    No texto O financiamento da sade no Brasil, de Carlos Gonalves

    Serra e Paulo Henrique Rodrigues, considerando o destaque dado s ques-

    tes financeiras na explicao dos problemas do sistema de sade brasilei-

    ro, os autores fazem uma anlise histrica do financiamento da sade no

    Brasil desde o incio do sculo XX, acenando principalmente para a relao

    dessa questo com aos fatos sociais, econmicos e polticos ocorridos no

    pas. Dessa forma, correlacionam o contexto poltico-econmico com a con-

    formao do modelo de financiamento das polticas de sade implementadas

    em cada perodo, com destaque para o perodo da construo do SUS. A

    partir dessa contextualizao, os autores fazem uma anlise crtica das

    normas legais do SUS, das normas operacionais (Noas e Nobs), do financi-

    amento de procedimentos de alta complexidade e das fontes de financia-

    mento do SUS.

  • 2 62 62 62 62 6

    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    O artigo O medicamento na poltica de sade no Brasil: como os agen-

    tes comunitrios de sade podem contribuir para a promoo do acesso e do

    uso racional dos medicamentos?, de Vera Lucia Luiza, Gabriela Costa Chaves,

    Elaine Silva Miranda, Orenzio Soler, realiza uma abrangente e profunda discus-

    so acerca das questes relacionadas ao uso e polticas de medicamentos. Os

    autores destacam questes socioculturais, polticas e econmicas dos interes-

    ses envolvidos no uso dos medicamentos. Apresentam tambm questes sobre

    os princpios frmaco-qumicos dos mesmos, e o processo de regulamentao

    pela Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa). Assim, constroem uma

    anlise da assistncia farmacutica no Brasil e da Poltica Nacional de Medica-

    mentos, destacando questes relacionadas ao acesso, qualidade e uso racional

    dos medicamentos. Desse modo, o texto apresenta algumas possibilidades de

    contribuies dos ACS para a assistncia farmacutica

    A partir do entendimento da avaliao como parte fundamental do pro-

    cesso de trabalho das equipes de sade no sentido de consolidar a reestruturao

    da ateno bsica, o texto Informao e avaliao em sade, de Kenneth

    Rochel de Camargo Jr., Cludia Medina Coeli e Arlinda B. Moreno, discute a

    produo e uso dos sistemas de informao. O trabalho correlaciona as ques-

    tes relativas coleta, armazenamento e processamento de dados com a difu-

    so das informaes. Ademais, os autores realizam uma anlise crtica dos

    principais sistemas de informao em sade no Brasil, tais como SIM, SINASC,

    SIAB, SINAN, SIH-SUS, APAC, entre outros, assim como detalha os princi-

    pais indicadores que constituem esses sistemas. Dessa forma, os autores apre-

    sentam questes fundamentais para a discusso sobre o preenchimento de

    formulrios desses sistemas e o uso das informaes produzidas no cotidiano

    de trabalho dos ACS. necessrio tambm destacar a contribuio dos auto-

    res para uma discusso sobre o uso de base de dados e sistemas de informao

    para a avaliao do sistema e servios de sade.

    Tendo em vista alguns desafios da construo do SUS, tais como a

    reorientao do modelo assistencial e a garantia do acesso universal com qua-

    lidade na ateno bsica, Marly Marques da Cruz e Elizabeth Moreira dos San-

    tos, autoras do texto Avaliao de sade na ateno bsica: perspectivas te-

    ricas e desafios metodolgicos, abordam a questo da avaliao em sade. O

    texto procura facilitar a tematizao e problematizao sobre as bases conceituais

    e metodolgicas da avaliao em sade, considerando que a mesma constitui

  • 2 72 72 72 72 7

    uma prtica social que auxilia a nortear as prticas de sade e a gesto na

    tomada de deciso. So discutidos alguns desenhos e abordagens da avaliao

    em sade, com destaque para a avaliao participativa. A questo da

    institucionalizao da avaliao na ateno bsica outro ponto de destaque,

    sendo que as autoras procuram discutir as possibilidades de pactuao de crit-

    rios e padres nesse processo.

    Este livro contribui para uma formao crtica e abrangente dos ACS no

    Brasil, convidando cada docente, cada trabalhador, a levar para a sua realidade

    regional, comunitria, os temas aqui abordados. O convite se desdobra em uma

    investigao permanente sobre a organizao e operacionalizao do SUS em

    cada estado, em cada municpio, atualizando e reformulando incessantemente

    os artigos deste livro e da poltica como processo e participao.

    Gustavo Corra MattaAna Lcia de Moura Pontes

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

  • 2 92 92 92 92 9

    Histria das Polticas de Sade no Brasil:a trajetria do direito sade

    Tatiana Wargas de Faria Baptista

    Introduo

    Antes de iniciarmos a leitura sobre a histria das polticas de sade noBrasil, fao um convite reflexo:

    Qual a importncia da sade para o indivduo e para a sociedade?

    Quem ou deve ser responsvel pela sade dos indivduos e da socie-

    dade?

    Que direitos e garantias os Estados devem prover a seus cidados?

    Os Estados devem atuar na proteo sade das comunidades?

    Se entendermos que os Estados tm um papel fundamental na garan-

    tia do direito sade, qual deve ser a extenso desse direito?

    Os Estados devem proteger todos os indivduos ou apenas aqueles que

    contribuem financeiramente para um sistema de ateno? Ou apenas os

    mais necessitados?

    Qual deve ser a abrangncia da proteo ofertada? O Estado deve

    prover todos os tipos de assistncia sade ou somente aes coletivas

    de preveno e promoo sade?

    Estas questes tm permeado o debate das polticas de sade em todos

    os pases desde pelo menos o final do sculo XIX. Desde ento, cada pas bus-

    cou solues e modelos de polticas que atendessem a suas necessidades e

    respondessem s reivindicaes de cada sociedade, conformando modelos de

    proteo social de maior ou menor abrangncia.

    No Brasil, a garantia do direito sade1 e a configurao de uma poltica

    de proteo social em sade abrangente (para todos e de forma igualitria) se

    configuraram muito recentemente, com a promulgao da Constituio Federal

    1 Sobre direito e cidadania, ver Reis, texto Cultura de direitos e Estado: os caminhos (in)certosda cidadania no Brasil, no livro Sociedade, Estado e Direito Sade, nesta coleo (N. E.).

  • 3 03 03 03 03 0

    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    de 1988 e a instituio do Sistema nico de Sade (SUS). Contudo, ainda hoje(2007) as questes anteriormente apontadas se apresentam no debate polticoe social, tensionando interesses e somando problemas para a consolidao domodelo de proteo social.

    Fato que o SUS legal no ainda uma realidade nacional e muito hque se fazer para se alcanar a proposta constitucional. Basta dizer que ogasto pblico em sade no Brasil, no ano de 2006 (gastos do Ministrio daSade, dos governos estaduais e municipais), foi menor que o gasto privadoem sade. Neste mesmo ano eram beneficirios de planos de sade 36 mi-lhes de brasileiros (ANS, 2007).

    O que esses dados revelam um paradoxo, pois, apesar da existncia deum sistema de sade pblico e universal, h uma boa parcela da populao queoptou por outro tipo de sistema de sade, o privado. Tal situao fragiliza omodelo de proteo definido em 1988 e levanta questionamentos acerca daextenso dos direitos desde as formas de financiamento do sistema protetorat quem dever ser protegido pelo Estado.

    O objetivo central deste texto apresentar a histria das polticas desade no Brasil, tendo como principal eixo de anlise o direito sade conhe-cer como e por que no se tinha o direito sade at um perodo da nossahistria e quando isso mudou a fim de avanar em uma compreenso crtica

    sobre os desafios e dilemas do SUS na atualidade.

    A Formao do Estado Brasileiro e as Primeiras Aes de Sade Pblica

    A histria das polticas de sade no Brasil est inserida em um contextomaior da prpria histria do Brasil como Estado-Nao. As primeiras aes desade pblica implementadas pelos governantes foram executadas no perodocolonial com a vinda da famlia real para o Brasil (1808) e o interesse na manu-teno de uma mo-de-obra saudvel e capaz de manter os negcios promovi-dos pela realeza.

    Muitas doenas acometiam a populao do pas, doenas tropicais e des-conhecidas dos mdicos europeus, como a febre amarela e a malria, alm dasdoenas trazidas por estes, como a peste bubnica, a clera e a varola. Oconhecimento acerca da forma de transmisso, controle ou tratamento dessasdoenas ainda era frgil, possibilitando diferentes intervenes ou vises sobreas molstias.

  • 3 13 13 13 13 1

    O povo brasileiro constitua-se de portugueses, outros imigrantes eu-

    ropeus e, principalmente, ndios e negros escravos. Cada um desses grupos

    era detentor de uma cultura prpria, costumes e tradies e um conheci-

    mento tambm prprio acerca das doenas e da forma de trat-las.

    At a chegada da famlia real, o assistir sade era uma prtica sem

    qualquer regulamentao e realizada de acordo com os costumes e conhe-

    cimento de cada um desses grupos. A populao recorria, em situaes de

    doena, ao que fosse vivel financeiramente ou fisicamente.

    Existia o barbeiro ou prtico, um conhecedor de algumas tcnicas

    utilizadas pelos mdicos europeus, tais como as sangrias, que atendia

    populao capaz de remuner-lo. Existiam os curandeiros e pajs, perten-

    centes cultura negra e indgena, mais acessveis maioria da populao,

    que se utilizavam das plantas, ervas, rezas e feitios para tratar os doen-

    tes. Havia tambm os jesutas, que traziam algum conhecimento da prtica

    mdica europia utilizando-se principalmente da disciplina e do isolamento

    como tcnica para cuidar dos doentes.

    A vinda da famlia real para o Brasil possibilitou tambm a chegada

    de mais mdicos e o aumento da preocupao com as condies de vida nas

    cidades, possibilitando o incio de um projeto de institucionalizao do setor

    sade no Brasil e a regulao da prtica mdica profissional. Foi assim que,

    no mesmo ano da chegada da famlia ao Brasil (1808), foi inaugurada a

    primeira faculdade de medicina, a Escola mdico-cirrgica, localizada em

    Salvador Bahia, com vistas institucionalizao de programas de ensino

    e normalizao da prtica mdica em conformidade aos moldes europeus.

    A regulamentao do ensino e da prtica mdica resultou em um

    maior controle das prticas populares e na substituio gradativa dos reli-

    giosos das direes dos hospitais gerais, especialmente a partir da Repbli-

    ca. Outro resultado da poltica de normalizao mdica foi a constituio de

    hospitais pblicos para atender algumas doenas consideradas nocivas

    populao e de necessrio controle pelo Estado, como as doenas mentais,

    a tuberculose e a hansenase. Assim, em 1852 inaugurado o primeiro

    hospital psiquitrico brasileiro no Rio de Janeiro Hospital D.Pedro II

    com o objetivo de tratar medicamente os denominados doentes mentais

    (Costa, 1989).

    HISTRIA DAS POLTICAS DE SADE NO BRASILHISTRIA DAS POLTICAS DE SADE NO BRASILHISTRIA DAS POLTICAS DE SADE NO BRASILHISTRIA DAS POLTICAS DE SADE NO BRASILHISTRIA DAS POLTICAS DE SADE NO BRASIL

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    Nesse perodo, o interesse pela sade e pela regulamentao da prtica

    profissional esteve estritamente relacionado ao interesse poltico e econmico

    do Estado de garantir sua sustentabilidade e a produo da riqueza, seguindo

    uma velha poltica, j aplicada com sucesso em outros pases da Europa, desde

    o incio do sculo XVIII (Costa, 1985; Rosen, 1979), de controle da mo-de-

    obra e dos produtos, com aes coletivas para o controle das doenas, discipli-

    na e normatizao da prtica profissional (Foucault, 1979).

    Assim, as primeiras aes de sade pblica (polticas de sade) que

    surgiram no mundo e que tambm passaram a ser implementadas no Brasil

    colnia voltaram-se especialmente para:

    proteo e saneamento das cidades, principalmente as porturias, res-

    ponsveis pela comercializao e circulao dos produtos exportados;

    controle e observao das doenas e doentes, inclusive e principal-

    mente dos ambientes;

    teorizao acerca das doenas e construo de conhecimento para

    adoo de prticas mais eficazes no controle das molstias.

    A preocupao maior era a sade da cidade e do produto; a assistncia

    ao trabalhador era uma conseqncia dessa poltica. Nesse sentido, algumas

    campanhas voltadas para os trabalhadores comeavam a ser implementadas,

    mas ainda eram pouco resolutivas, como a quarentena afastamento por qua-

    renta dias do doente do ambiente que habita e circula , principal estratgia

    utilizada para evitar a propagao de doenas entre os trabalhadores, sem

    uma preocupao mais efetiva com o tratamento do doente.

    A proclamao da Repblica em 1889 inicia um novo ciclo na poltica de

    Estado com o fortalecimento e a consolidao econmica da burguesia cafeeira.

    As polticas de sade ganham ainda mais espao nesse contexto, assumindo

    um papel importante na construo da autoridade estatal sobre o territrio e

    na conformao de uma ideologia de nacionalidade, configurando um esforo

    civilizatrio (Lima, Fonseca & Hochman, 2005). A lavoura do caf e toda a base

    para armazenamento e exportao do produto, dependentes do trabalho assa-

    lariado, necessitava cada vez mais de mo-de-obra, e as epidemias que se

    alastravam entre os trabalhadores, devido s pssimas condies de sanea-

    mento, prejudicavam o crescimento da economia.

  • 3 33 33 33 33 3

    Comeava a busca por conhecimento e aes na rea da sade pbli-ca,2 com a criao, em 1897, da Diretoria Geral de Sade Pblica (DGSP),o incentivo s pesquisas nas faculdades de medicina e no exterior (no Insti-tuto Pasteur) e a criao de institutos especficos de pesquisa, como oInstituto Soroterpico Federal, criado em 1900, renomeado Instituto OswaldoCruz (IOC) um ano depois.

    A partir de 1902, com a entrada de Rodrigues Alves na presidncia daRepblica, ocorreu um conjunto de mudanas significativas na conduo daspolticas de sade pblica. A primeira ao mais concreta levou concepo deum programa de obras pblicas junto com o prefeito da capital Guanabara,Pereira Passos, na primeira tentativa mais sistematizada de organizao e sa-neamento da cidade capital. As aes de saneamento e urbanizao foramseguidas de aes especficas na sade, especialmente no combate a algumasdoenas epidmicas, como a febre amarela, a peste bubnica e a varola.

    A reforma na sade foi implementada a partir de 1903, sob a coordena-o de Oswaldo Cruz, que assume a diretoria geral de sade pblica. Em 1904,Oswaldo Cruz prope um cdigo sanitrio que institui a desinfeco, inclusivedomiciliar, o arrasamento de edificaes consideradas nocivas sade pblica,a notificao permanente dos casos de febre amarela, varola e peste bubnicae a atuao da polcia sanitria. Ele tambm implementa sua primeira grandeestratgia no combate s doenas: a campanha de vacinao obrigatria. Seusmtodos tornaram-se alvo de discusso e muita crtica, culminando com ummovimento popular no Rio de Janeiro, conhecido como a Revolta da Vacina(Costa, 1985; COC, 1995).

    O cdigo sanitrio foi considerado por alguns como um cdigo de tortu-ras, dada a extrema rigidez das aes propostas. A polcia sanitria tinha,entre outras funes, a tarefa de identificar doentes e submet-los quarente-

    na e ao tratamento. Se a pessoa identificada como doente no tivesse recurso

    2 Durante os sculos XVIII e XIX, os cientistas europeus buscavam explicaes para os quadrosde morbidade que acometiam a populao. As pesquisas acerca das doenas baseavam-se naobservao da morbidade com registro contnuo dos quadros de adoecimento e morte (evolu-o da doena e acompanhamento dos casos) e na busca de causualidade e formas de trans-misso das doenas (Costa, 1985). Uma referncia interessante o livro de Snow (1967) publicado em 1849 no qual o autor demonstra o raciocnio e a conduta de investigao de umcientista para compreender a forma de transmisso do clera. No Brasil, a pesquisaepidemiolgica (o estudo das doenas) tem incio de forma mais sistemtica no sculo XX,sendo seu principal executor Oswaldo Cruz (mdico, especialista em microbiologia, formadopelo Instituto Pasteur na Frana).

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    prprio para se isolar em fazendas distantes e pagar mdicos prprios, eraenviada aos hospitais gerais conhecidos no perodo como matadouros ousimplesmente isolada do convvio social, sem qualquer tratamento especfico, oque significava a sentena de morte para a grande maioria, uma prtica quecausou revolta e pnico na populao. O isolamento dos doentes e o tratamen-to oferecido nos hospitais eram o maior temor do perodo. Alm disso, a igno-rncia da populao sobre o mecanismo de atuao da vacina no organismohumano associada ao medo de se tornar objeto de experimentao pelos cien-tistas e atender interesses polticos dos governantes fez com que surgissemreaes de grupos organizados (Costa, 1985).3

    Em contrapartida, com as aes de Oswaldo Cruz conseguiu-se avanarbastante no controle e combate de algumas doenas, possibilitando tambm oconhecimento acerca das mesmas. Em 1907, a febre amarela e outras doenas jtinham sido erradicadas da cidade do Rio de Janeiro e Belm. Outros cientistas,como Emlio Ribas, Carlos Chagas, Clementino Fraga, Belisrio Penna, estiveram,juntos com Oswaldo Cruz, engajados na definio de aes de sade pblica e narealizao de pesquisas, atuando em outros estados e cidades do pas.

    Nas dcadas de 1910 e 1920 tem incio uma segunda fase do movimentosanitarista com Oswaldo Cruz, e a nfase passou a estar no saneamento rurale no combate a trs endemias rurais (ancilostomase, malria e mal de Cha-gas). A partir de expedies pelo pas, os mdicos sanitaristas tiveram umconhecimento mais amplo da situao de sade no territrio nacional e doquanto era necessrio desenvolver uma poltica de Estado nesta rea (Hochman& Fonseca, 1999).

    As expedies revelaram um Brasil doente e suscitaram o questionamentodo discurso romntico sobre os sertes como espao saudvel. A repercussodos relatrios mdicos sobre as condies de sade nos sertes propiciou inten-so debate sobre a questo nacional, e a doena generalizada passou a serapontada como razo para o atraso nacional (Lima, Fonseca & Hochman, 2005).As expedies foram acompanhadas por escritores como Euclides da Cunhaque, mais tarde, atravs da sua obra Os Sertes, expressou as mazelas vividaspelo povo brasileiro nesta regio.

    3 interessante como ainda existe no imaginrio social do povo brasileiro o temor em relaos vacinas e a desconfiana acerca das intenes dos governantes quando instituem uma novavacina no calendrio oficial, como ocorreu nos anos 90 no caso da vacina contra a gripe para osidosos.

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    Durante a Primeira Repblica, o movimento sanitarista trouxe a situaode sade como uma questo social e poltica o grande obstculo civilizao.Um dos efeitos polticos do movimento, nesse perodo, foi a expanso da auto-ridade estatal sobre o territrio, ao mesmo tempo em que se criavam as basespara a formao da burocracia em sade pblica. Em 1920, criada a DiretoriaNacional de Sade Pblica (DNSP), reforando o papel do governo central e averticalizao das aes (Hochman & Fonseca, 1999).

    Mas o fato de as aes de sade pblica estarem voltadas especialmentepara aes coletivas e preventivas deixava ainda desamparada grande parcelada populao que no possua recursos prprios para custear uma assistncia sade. O direito sade integral no era uma preocupao dos governantes e

    no havia interesse na definio de uma poltica ampla de proteo social.

    Cidadania Regulada e Direito Sade

    Na dcada de 1920, incio do sculo passado, o Estado brasileiro sofriamais agudamente a crise do padro exportador capitalista. Os pases importa-dores tornavam-se cada vez mais exigentes com a qualidade dos produtos emuitas represlias surgiam com relao aos produtos brasileiros, pois os naviose portos ainda mantinham nveis de higiene insalubres, exportando doenas.Novas aes foram implementadas no controle das doenas, tanto na rea dasade pblica quanto na da assistncia mdica individual (Costa, 1985).

    As revoltas populares, os movimentos anarquistas e comunistas pressio-navam por aes mais efetivas do Estado na ateno sade. Foi a partirdesses movimentos que o chefe de polcia, Eloy Chaves, props, em 1923, umalei que regulamentava a formao de Caixas de Aposentadorias e Penses (Caps)para algumas organizaes trabalhistas mais atuantes poltica e financeiramen-te, como os ferrovirios e os martimos, ligados produo exportadora (Olivei-ra & Teixeira, 1985).

    As Caps eram organizadas por empresas e administradas e financiadaspor empresas e trabalhadores, em uma espcie de seguro social. Nem todaempresa oferecia ao trabalhador a possibilidade de formao de uma Caixa esse era um benefcio mais comum nas empresas de maior porte. O Estado emnada contribua financeiramente e muito menos tinha responsabilidade na ad-ministrao dessas Caixas sua atuao restringia-se legalizao de umaorganizao, que j se vinha dando de maneira informal desde a dcada de

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    1910, e ao controle a distncia do funcionamento dessas caixas, mediando pos-

    sveis conflitos de interesses (Oliveira & Teixeira, 1985).

    Os benefcios que os segurados recebiam eram: socorros mdicos (para

    o trabalhador e toda a famlia, inclusive amigados), medicamentos, aposenta-

    dorias e penses para os herdeiros. Com as Caps, uma pequena parcela dos

    trabalhadores do pas passava a contar com uma aposentadoria, penso e as-

    sistncia sade. Assim, o direito assistncia sade estava restrito, nesseperodo, condio de segurado.

    Note-se que apesar de o Estado no ter definido um sistema de proteo

    abrangente e de se ter mantido parte dessa forma de organizao privada,

    restringindo-se a legaliz-la e a control-la a distncia, esse modelo serviu de

    base para a constituio de um primeiro esboo de sistema de proteo social

    no Estado brasileiro, que se definiu a partir dos anos 30 no contexto do governo

    de Getlio Vargas.4

    O Estado assume ativamente, a partir de 30, o papel de regulador da

    economia (Fiori, 1995) e define um projeto econmico baseado na industrializa-

    o. Investe na rea de energia, siderurgia e transportes, implantando uma

    infra-estrutura produtiva, absorvendo a mo-de-obra advinda do campo e

    alavancando a economia nacional. Assistia-se a um gradativo fortalecimento do

    projeto poltico-ideolgico de construo nacional, acompanhado de medidas

    que favoreceram sua implementao (Lima, Fonseca & Hochman, 2005). Duasmudanas institucionais marcaram a trajetria da poltica de sade e merecem

    ser aprofundadas: a criao do Ministrio da Educao e Sade Pblica (Mesp)

    e do Ministrio do Trabalho, Indstria e Comrcio (MTIC).

    O Mesp trazia para o centro do debate duas polticas sociais importantes

    na configurao de qualquer modelo de proteo. No entanto, os primeiros anos

    do Mesp foram marcados pela inconstncia e indefinio de projetos e propostas,

    enquanto o MTIC reunia proposies claras e bastante especficas de proteo ao

    trabalhador, inclusive na rea da sade. Desenvolveu-se de um lado um arcabouo

    jurdico e material de assistncia mdica individual previdenciria, a ser garantida

    pelo MTIC, e, de outro, a definio de aes de sade pblica de carter preven-

    tivo atribudas ao Mesp. Como resumem Lima, Fonseca & Hochman (2005: 41)

    4 O governo Vargas tem incio no cerne de uma crise mundial, efeito da quebra da bolsa de NovaIorque em 1929, e a partir de uma revoluo poltica interna, Revoluo de 1930, que encerraa Repblica Velha (1889-1930).

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    muito alm de uma simples diviso e especificao de funes em razo da rea

    de atuao de cada rgo, em um contexto de reestruturao e consolidao de

    polticas sociais, a separao correspondeu a um formato diferenciado de reconhe-

    cimento de direitos sociais.

    A poltica de proteo ao trabalhador iniciada no governo Vargas marca

    uma trajetria de expanso e consolidao de direitos sociais. Algumas polticas

    foram importantes: a obrigatoriedade da carteira profissional para os trabalha-

    dores urbanos, a definio da jornada de trabalho de oito horas, o direito a

    frias e a lei do salrio-mnimo. Getlio, o pai dos trabalhadores, como passou

    a ser conhecido, inicia no Estado brasileiro uma poltica de proteo ao traba-

    lhador, garantindo, com isso, uma mo-de-obra aliada ao projeto de Estado,

    mantendo sua base decisria na estrutura estatal centralizada e atendendo aos

    seus interesses econmicos. nesta fase que so criados os Institutos de Apo-

    sentadorias e Penses (Iaps ), ampliando o papel das Caps, constituindo um

    primeiro esboo do sistema de proteo social brasileiro.

    Os Iaps passam a incluir em um mesmo instituto toda uma categoria

    profissional, no mais apenas empresas instituto dos martimos (IAPM), dos

    comercirios (IAPC), dos industriais (Iapi) e outros , e a contar com a partici-

    pao do Estado na sua administrao, controle e financiamento. Com os Iaps,

    inicia-se a montagem de um sistema pblico de previdncia social mantendo

    ainda o formato do vnculo contributivo formal do trabalhador para a garantia

    do benefcio. O trabalhador que no contribusse com os institutos estava exclu-

    do do sistema de proteo. Portanto, estavam excludos: o trabalhador rural,

    os profissionais liberais e todo trabalhador que exercesse uma funo no reco-

    nhecida pelo Estado. A proteo previdenciria era um privilgio de alguns in-

    cludos, o que fazia com que grande parcela da populao, principalmente os

    mais carentes, fosse vtima de uma injustia social. Para Santos (1979), essa

    forma de organizao do sistema protetor brasileiro reforou um padro de

    regulao do Estado que valoriza o trabalhador que exerce funes de interesse

    do Estado, atribuindo apenas a estes um status de cidado, uma cidadaniaregulada e excludente, pois no garante a todos os mesmos direitos.

    Outra caracterstica desse modelo era a discriminao dos benefcios de

    acordo com a categoria profissional. Cada IAP organizava e oferecia a seus

    contribuintes um rol de benefcios compatvel com a capacidade de contribuio

    e organizao de cada categoria, o que fez com que algumas categorias pro-

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    fissionais tivessem mais privilgios que outras. As categorias com maior poder

    econmico, como os industriais, os bancrios, tinham maior disponibilidade de

    verbas, e por isso podiam oferecer a seus contribuintes um leque maior de

    benefcios. No que diz respeito sade, tal fato significava um padro melhor

    de assistncia mdica e hospitalar, diferenciado por categoria e mantenedor da

    desigualdade social mesmo entre os trabalhadores.

    Quem no se inseria na medicina previdenciria estava tambm

    excludo do direito assistncia sade prestada pelos institutos e

    contava com alguns servios ofertados pelo Mesp em reas estratgias

    (sade mental, tuberculose, hansenase e outros), alm da caridade e

    do assistencialismo dos hospitais e de profissionais de sade. O Mesp

    promovia tambm as aes de sade pblica, cuidando do controle e

    preveno das doenas transmissveis.

    Anos 50: desenvolvimento e sade

    A partir da dcada de 1950, mudanas ocorreram no sistema de pro-

    teo sade. O processo de acelerada industrializao do Brasil determi-

    nou um deslocamento do plo dinmico da economia. At ento, o Brasil

    tinha sua economia assentada na agricultura, mas, a partir dessa dcada,

    com o processo de industrializao, os grandes centros urbanos passaram a

    ser o plo dinmico da economia, o que gerou uma massa operria que

    deveria ser atendida pelo sistema de sade (Mendes, 1993). Tal fato levou

    a uma expanso progressiva e rpida dos servios de sade, instaurando a

    prtica de convnios-empresa para suprir as demandas cada vez mais cres-

    centes. Surgem os grandes hospitais, com tecnologias de ltima gerao e

    com a incorporao da lgica de especializao dos recursos humanos. A

    assistncia torna-se mais cara, e o hospital, o principal ponto de referncia

    para a busca de um atendimento em sade.

    O modelo de sade que passa a se definir baseado no hospital e na

    assistncia cada vez mais especializada tambm seguia uma tendncia mundi-

    al, fruto do conhecimento obtido pela cincia mdica no ps-guerra.5 O conhe-

    5 A guerra possibilitou um grande quantitativo de experimentos com humanos utilizados comocobaias nos campos de concentrao e nos hospitais militares e, conseqentemente, um maiorconhecimento acerca das drogas, tcnicas mdicas e seus efeitos no homem.

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    cimento mais detalhado da fisiologia e da fisiopatologia permitiu o desenvolvi-

    mento de drogas modernas6 e possibilitou uma revoluo na prtica mdica,

    bem como o incio de um processo de mudana nos nveis de sade das popula-

    es, que passam progressivamente a viver mais (aumenta a expectativa de

    vida) e a sofrer de doenas mais complexas (crnicas) ou tpicas da modernidade,

    como os acidentes de carro, violncias, entre outras.7

    Nos principais pases desenvolvidos da Europa, constituem-se, no ps-

    guerra, os Estados de Bem-Estar Social (tambm conhecidos como WelfareState) com o objetivo de reerguer as economias afetadas pela guerra e configu-rar Estados fortes e compromissados com a democracia e a justia social uma

    forma de combater o comunismo e manter as economias europias no padro

    competitivo mundial (Esping-Andersen, 1995).

    Os Estados de Bem-Estar consistem em uma poltica sustentada e pac-

    tuada entre a rea econmica e a rea social com o objetivo de garantir o bem-

    estar da populao e manter a produo econmica. Os pilares dessa poltica

    eram: o pleno emprego, a proviso pblica de servios sociais universais como

    sade, educao, saneamento, habitao, lazer, transporte etc. e a assistn-

    cia social para aqueles no includos no sistema produtivo (Faria, 1997).

    No Brasil, no se configurou nesse perodo (anos 50) uma poltica de

    bem-estar social, mas ganhou espao a ideologia desenvolvimentista que apon-

    tou a relao pobreza-doena-subdesenvolvimento, indicando a necessidade de

    polticas que resultassem em melhora do nvel de sade da populao como

    condio para se obter desenvolvimento este foi o primeiro passo para uma

    discusso mais aprofundada sobre o direito sade e proteo social como

    poltica pblica. O sanitarismo desenvolvimentista, que tinha como represen-

    tantes Samuel Pessoa, Carlos Gentile de Melo e Mrio Magalhes, reagia ao

    campanhismo da sade pblica, centralizao decisria, fragilidade dos go-

    vernos locais e ao baixo conhecimento do estado sanitrio do pas e propunha a

    6 Como exemplos, podemos citar os betabloqueadores, para a preveno das dores cardacas;os medicamentos contra lcera e Parkinson; a quimioterapia do cncer, os antidepressivos.7 Fenmeno que se consolidar especialmente nos pases desenvolvidos, em trs dcadas (de1950 para 1980), e que ser denominado transio demogrfica para explicar a mudana noperfil populacional, com pessoas mais idosas e maior controle da natalidade e transioepidemiolgica para explicar a mudana no perfil das doenas, com uma diminuio dasdoenas infecciosas e parasitrias e o aumento das doenas degenerativas, crnicas e tpicasda modernidade. Nos pases em desenvolvimento (ou perifricos), h uma grande variedade desituaes com transies mais ou menos avanadas, convivendo novas e antigas doenas.

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    compreenso das relaes entre sade e doena e sua importncia para a trans-formao social e poltica do pas (Lima, Fonseca & Hochman, 2005).

    Foram acontecimentos importantes deste perodo e que marcaram a tra-jetria da poltica de sade: a criao do Ministrio da Sade em 1953, atribu-indo um papel poltico especfico para a sade no contexto do Estado brasileiro;e a reorganizao dos servios nacionais de controle das endemias rurais noDepartamento Nacional de Endemias Rurais (Deneru) em 1956, possibilitandoo incremento nas aes e nos programas de sade voltados para o combate sdoenas endmicas na rea rural.

    Na prtica, os anos do desenvolvimentismo mantiveram a lgica de orga-nizao do modelo poltico em vigor para a sade, com as aes e servios desade pblica de um lado e o sistema previdencirio de outro, com polticasisoladas de sade que atendiam a diferentes objetivos. Uma poltica de sadepblica universal e com nfase na preveno das doenas transmissveis, e umapoltica de sade previdenciria, restrita aos contribuintes da previdncia e seusdependentes, com nfase na assistncia curativa. O direito sade integralainda no era um direito do cidado brasileiro.

    Mas o desenvolvimentismo gerou riqueza e mobilizou recursos, o quelevou a mudanas concretas nas cidades e novas demandas para o sistemaprevidencirio e para a sade pblica. A partir de ento, as polticas de sadeconfiguram-se em um importante instrumento do Estado, no mais apenas pelocontrole a ser exercido no espao de circulao dos produtos e do trabalhador,mas principalmente pelo quantitativo de recursos que passou a mobilizar pos-tos de trabalho, indstrias (de medicamentos, de equipamentos), ensino profis-sional, hospitais, ambulatrios e tantos outros. Estava constituda a base paraa expanso do sistema de sade e para a consolidao de um complexo produ-

    tivo, como veremos no tpico a seguir.

    Expanso e Consolidao do Complexo Mdico-Empresarial

    O golpe militar, em 1964, e a nova forma de organizao do Estado trou-xeram mudanas para o sistema sanitrio brasileiro, dentre elas a nfase naassistncia mdica, o crescimento progressivo do setor privado e a abrangnciade parcelas sociais no sistema previdencirio.

    A primeira ao significativa no sistema previdencirio brasileiro ocorreuem 1966 com a unificao dos Iaps e a constituio do Instituto Nacional da

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    Previdncia Social (INPS). A criao do INPS permitiu uma uniformizao dosinstitutos, principalmente em termos dos benefcios prestados, causando certainsatisfao naqueles contribuintes com mais benefcios; afinal, com a unifica-o, a assistncia dos institutos mais ricos podia tambm ser usufruda peloscontribuintes de outros institutos, que contribuam com valores menores e noapresentavam uma assistncia de to boa qualidade. Tal fato ocasionou umamigrao de pacientes de alguns institutos e a superlotao de alguns hospi-tais, gerando filas, demora no atendimento e outros problemas, o que culminouem uma insatisfao geral.

    Alm disso, a unificao levou centralizao do poder dos Iaps no Esta-do e ao afastamento dos trabalhadores das decises a serem tomadas. Comisso, fortaleceu-se a tecnocracia8 e reforaram-se as relaes clientelistas doEstado, como a troca de favores, a barganha de interesses e o jogo de benef-cios para os aliados do poder.

    No incio da dcada de 1970, a poltica proposta pelo INPS levou incluso de novas categorias profissionais no sistema trabalhadores ru-rais, empregadas domsticas e autnomos , e, a cada nova categoria in-cluda, aumentava ainda mais a procura por servios e os gastos no setorsade. O Estado respondeu demanda com a contratao dos serviosprivados, permitindo a formao do que ficou conhecido como complexomdico-empresarial (Cordeiro, 1984).

    Os gastos com a sade dobraram de valor, com uma tendncia clara parao atendimento hospitalar. A poltica de sade estava subordinada organizaodo INPS, que manteve a estrutura de funcionamento anteriormente propostapelos Iaps e oferecia servios apenas para aqueles que comprovavam o vnculocom o INPS as pessoas levavam suas carteiras de trabalho ou carn de con-tribuio previdenciria quando procuravam os hospitais ou qualquer outro tipode assistncia, a fim de comprovar sua incluso no sistema.

    Mesmo com a incluso de novas categorias no sistema de proteo, muitos

    ainda no tinham o direito ateno sade. Os ndices de sade mostravam

    8 A tecnocracia expressa uma forma de atuar do burocrata que se utiliza do argumento tcnicono processo de construo de estratgias de ao do Estado. O tecnocrata, assim como otcnico, parte da competncia e tem em vista a eficincia. No um especialista, mas umperito em idias gerais, e com isso acumula um conhecimento global das variveis de ao. ele quem coordena e reelabora o processo decisrio, com o argumento da legitimidade eneutralidade da cincia. Outras interpretaes sobre esse conceito so apresentadas noDicionrio de Poltica organizado por Bobbio, Matteuci e Pasquino (1995).

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    a situao alarmante vivida pelo pas. Apenas para citar alguns dados: a espe-

    rana de vida ao nascer na dcada de 1970 era de 52,7 anos, a taxa de morta-

    lidade infantil era de 87,9 bebs para 1.000 nascidos-vivos, e as doenas infec-

    ciosas e parasitrias constituam uma das principais causas de bito. A transi-

    o demogrfica e epidemiolgica ocorrida nos pases desenvolvidos ainda esta-

    va longe de ser alcanada na realidade brasileira, mesmo em face de todo de-

    senvolvimento econmico obtido pelo pas desde os anos 50 at o milagre econ-mico do perodo 1968-1974. A principal razo para o quadro de estagnao

    social foi o total descaso dos governantes com relao s polticas pblicas

    comprometidas com o desenvolvimento social. Durante todo o regime militar

    autoritrio, o investimento na rea de sade pblica foi precrio, doenas antes

    erradicadas voltaram, doenas controladas apareceram em surtos epidmicos,

    o saneamento e as polticas de habitao populares foram desprezados, au-

    mentou a pobreza e, principalmente, a desigualdade social.

    A partir de meados da dcada de 1970, finalizado o milagre econmico

    e em um cenrio de crise poltica, institucional e econmica iminente do gover-

    no militar comeam a se definir novas estratgias para a garantia de manuten-

    o do governo, dentre elas a definio do II Plano Nacional de Desenvolvimen-

    to (II PND) e a poltica de abertura do governo.

    O II PND significou a composio de uma poltica de desenvolvimento

    que tinha como meta bsica a formulao de estratgias de desenvolvimento

    social, buscando a integrao e a interdependncia das polticas estatais um

    avano na poltica de Estado, pois selava o compromisso de conjugao da po-

    ltica econmica e social. O processo de abertura, em outra medida, possibilitou

    a expanso e expresso gradativa dos movimentos sociais, at ento, sob forte

    represso e sem espao para vocalizar as demandas.

    Para a sade, esse contexto significou a possibilidade de fortalecimento do

    movimento sanitrio, que estabelecia sua base de apoio em instituies acad-

    micas com forte respaldo terico Universidade de So Paulo (USP), Universida-

    de Estadual de Campinas (Unicamp), Instituto de Medicina Social da Universida-

    de do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), Escola Nacional de Sade Pblica

    Sergio Arouca da Fundao Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), dentre outras. A

    intelectualidade pertencente ao setor sade divulgava estudos sobre as condies

    sociais e de sade com crticas contundentes conduo poltica do Estado brasi-

    leiro e reinvidicava mudanas efetivas na assistncia sade no Brasil.

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    O movimento sanitrio buscava reverter a lgica da assistncia sade

    no pas apresentando quatro proposies para debate:

    A sade um direito de todo cidado, independente de contribuio ou

    de qualquer outro critrio de discriminao;

    As aes de sade devem estar integradas em um nico sistema, ga-

    rantindo o acesso de toda populao a todos os servios de sade, seja

    de cunho preventivo ou curativo;

    A gesto administrativa e financeira das aes de sade deve ser des-

    centralizada para estados e municpios;

    O Estado deve promover a participao e o controle social das aes

    de sade.

    O cenrio era de excluso de uma boa parcela da populao do direito sade, haja vista o fato de que apenas poucos tinham garantido, nesse momen-to, o direito assistncia mdica prestada pelo INPS, e que os servios desade, do Ministrio da Sade, das secretarias estaduais e municipais, noabsorviam a demanda de ateno gerada pelo restante da populao. No ha-

    via de fato se constitudo, at ento, no Brasil, uma poltica de Estado cidad nosentido mais abrangente; uma cidadania substantiva que desobrigasse qual-quer espcie de vnculo com o processo produtivo e que reconhecesse o cidadosimplesmente pelo valor que tem como membro daquela comunidade. Prevale-cia a lgica da cidadania regulada, em que cidado era aquele que se encon-trava localizado em qualquer uma das ocupaes reconhecidas e definidas por

    lei. Portanto, a proposta de reforma do setor sade apresentada pelo movi-mento sanitrio tambm se inseria em uma lgica maior de reestruturao doprprio Estado e de afirmao de uma cidadania substantiva para o povo brasi-leiro (Baptista, 2003).

    As presses por reforma na poltica de sade possibilitaram transforma-es concretas ainda nos anos 70, mudanas que se efetivaram de forma

    incipiente e resguardando os interesses do Estado autoritrio.Dentre as polticas implementadas, destacam-se: a criao do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS), em1974, que distribuiu recursos para o financiamento de programas sociais; a formao do Conselho de Desenvolvimento Social (CDS), em 1974,que organizou as aes a serem implementadas pelos diversos ministri-os da rea social;

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    a instituio do Plano de Pronta Ao (PPA), em 1974, que consistiu em

    uma medida para viabilizao da expanso da cobertura em sade e dese-

    nhou uma clara tendncia para o projeto de universalizao da sade;

    a formao do Sistema Nacional de Sade (SNS), em 1975, primeiro

    modelo poltico de sade de mbito nacional, que desenvolveu inedita-

    mente um conjunto integrado de aes nos trs nveis de governo;

    a promoo do Programa de Interiorizao das Aes de Sade e Sa-

    neamento (Piass), em 1976, que estendeu servios de ateno bsica

    sade no Nordeste do pas e se configurou como a primeira medida de

    universalizao do acesso sade;

    a constituio do Sistema Nacional da Previdncia e Assistncia Social

    (Sinpas), em 1977, com mecanismos de articulao entre sade, previdn-

    cia e assistncia no mbito do Ministrio da Previdncia e Assistncia Soci-

    al (MPAS) e a criao do Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Pre-

    vidncia Social (Inamps), que passou a ser o rgo coordenador de todas

    as aes de sade no nvel mdico-assistencial da previdncia social.

    Este conjunto de medidas favoreceu a construo de polticas maisuniversalistas na rea da sade priorizando a extenso da oferta de serviosbsicos e fortalecendo a perspectiva de reforma do setor. Foi tambm nesteperodo que o setor mdico-empresarial comeou a se fortalecerinstitucionalmente, beneficiando-se igualmente das polticas de investimentona rea social. O FAS, por exemplo, repassou grande parte dos recursos parainvestimento na expanso do setor hospitalar, onde 79,5% dos recursos foramdestinados para o setor privado e 20,5% para o setor pblico. O aumento gradativodos convnios com o setor privado significou o desinvestimento progressivo nacriao de servios pblicos, e as medicinas de grupo surgiram tambm comomais uma opo de ateno populao (Cordeiro, 1984).

    A concesso de privilgios ao setor privado e a mercantilizao da medi-cina sob o comando da previdncia social foram duramente criticados pelo mo-vimento sanitrio. Os reformistas buscavam a universalizao do direito sa-de, a unificao dos servios prestados pelo Inamps e Ministrio da Sade emum mesmo sistema e a integralidade das aes (com a garantia do acesso aaes de preveno e assistncia mdica). A partir desse momento, ampliava-se o debate sobre o direito sade no Brasil, a comear pela prpria concepode sade.

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    A sade passava a assumir um sentido mais abrangente, sendo re-sultante das condies de alimentao, habitao, educao, renda, meioambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso a servi-os de sade, dentre outros fatores. Portanto, o direito sade significavaa garantia, pelo Estado, de condies dignas de vida e de acesso universal

    e igualitrio s aes e servios para promoo, proteo e recuperao,em todos os nveis, de todos os habitantes do territrio nacional.

    Nesse sentido, a proposta de reforma para a sade era tambm umaproposta de reforma do Estado, Estado este que se havia constitudo sobuma base fundada no patrimonialismo, poltica de clientela, centralizaodecisria e excluso social modos de fazer poltica que se reproduziam

    no s no mbito de organizao do setor sade como em todos os demaissetores, mas que foram explicitados no debate da sade, talvez por sereste um setor que criticava com muito mais dureza a situao de injustiasocial que se havia consolidado (Baptista, 2003).

    Os 100 anos de histria do Brasil tinham enraizado uma cultura pol-tica de Estado enfaticamente concentradora do poder decisrio nas mosde uma parcela pequena da sociedade (poder oligrquico), ou dos recursos

    produzidos no mbito do Estado, mantendo um grande fosso entre grupossociais e regies, reproduzindo, dessa forma, uma situao de desigualda-de. Assim, o processo poltico tambm estava comprometido em uma redeimbricada de poder institudo na burocracia estatal, na organizao polticae partidria e na cultura social.

    O ideal da Reforma Sanitria exigia, nesse contexto, uma reviso do

    modo de operar do Estado, da lgica burocrtica que concentrava poder euma disposio social para repartir a renda (redistribuir) e participar ativa-mente da construo desse novo Estado, agora de inteno democrtica.

    Redemocratizao e Direito Sade

    A dcada de 1980 iniciou-se em clima de redemocratizao, crise

    poltica, social e institucional do Estado Nacional. A rea social e, em espe-

    cial, a previdncia social vivia uma crise profunda, assumindo medidas de

    racionalizao e reestruturao do sistema. No mbito da sade, o movi-

    mento da Reforma Sanitria indicava propostas de expanso da rea de

    assistncia mdica da previdncia, intensificando os conflitos de interesse

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    POLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADEPOLTICAS DE SADE

    com a previdncia social e envolvendo poder institucional e presses do

    setor privado.

    Neste contexto, foi realizada a VII Conferncia Nacional de Sade

    (1980), que apresentou como proposta a reformulao da poltica de sade

    e a formulao do Programa Nacional de Servios Bsicos de Sade (Prev-

    Sade). O Prev-Sade consistia em uma proposta de extenso nacional do

    Programa de Interiorizao das Aes de Sade e Saneamento (Piass),

    que havia sido desenvolvido no perodo compreendido entre 1976/79 no

    Nordeste do Brasil.

    O Piass foi uma experincia bem-sucedida que possibilitou uma

    melhoria no nvel de sade da populao da regio Nordeste a partir da

    implantao de uma estrutura bsica de sade pblica nas comunidades de

    at 20.000 habitantes. O Prev-Sade visava, na mesma medida, dotar o

    pas de uma rede de servios bsicos que oferecesse, em quantidade e

    qualidade, os cuidados primrios de proteo, promoo e recuperao da

    sade, tendo como meta a cobertura de sade para toda a populao at o

    ano 2000 (Conferncia Nacional de Sade, 1980).

    No entanto, o Prev-Sade acabou no sendo incorporado pelo governo e

    muito menos estabelecido na prtica, dadas as resistncias intraburocrticas

    assentadas no Inamps, a forte oposio das entidades do segmento mdico-

    empresarial e ainda as presses oriundas do campo da medicina liberal e do

    setor privado contratado (Cordeiro, 1991). Este conjunto de foras conformou

    um sem-nmero de razes para que o Prev-Sade no se concretizasse. Os