poesias maio da africanidade

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Alguns textos extraídos da obra 1. EU-MULHER (Conceição Evaristo) Uma gota de leite me escorre entre os seios. Uma mancha de sangue me enfeita entre as pernas Meia palavra mordida me foge da boca. Vagos desejos insinuam esperanças. Eu-mulher em rios vermelhos inauguro a vida. Em baixa voz violento os tímpanos do mundo. Antevejo. Antecipo. Antes-vivo Antes - agora - o que há de vir. Eu fêmea-matriz. Eu força-motriz. Eu-mulher abrigo da semente moto-contínuo do mundo. Comentário: Conceição Evaristo, neste poema, exibe um corpo de mulher talhado por significantes que dizem da função geratriz inscrita no corpo da mulher: Eu-mulher em rios vermelhos / Inauguro a vida / Em baixa voz / Violento os tímpanos do mundo. / Antevejo. / Antecipo. / Antes-vivo / Antes agora o que há de vir. / Eu fêmea-matriz. / Eu força-motriz./ Eu-mulher / abrigo da semente / moto-contínuo / do mundo. 2. LINHAGEM (Carlos Assumpção) Eu sou descendente de Zumbi Zumbi é meu pai e meu guia Me envia mensagens do orum Meus dentes brilham na noite escura Afiados como o agadá de Ogum Eu sou descendente de Zumbi Sou bravo valente sou nobre Os gritos aflitos do negro Os gritos aflitos do pobre Os gritos aflitos de todos Os povos sofridos do mundo No meu peito desabrocham Em força em revolta Me empurram pra luta me comovem Eu sou descendente de Zumbi Zumbi é meu pai e meu guia

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Poesias Maio Da Africanidade

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Page 1: Poesias Maio Da Africanidade

Alguns textos extraídos da obra

1. EU-MULHER (Conceição Evaristo)

Uma gota de leite

me escorre entre os seios.

Uma mancha de sangue

me enfeita entre as pernas

Meia palavra mordida

me foge da boca.

Vagos desejos insinuam esperanças.

Eu-mulher em rios vermelhos

inauguro a vida.

Em baixa voz

violento os tímpanos do mundo.

Antevejo.

Antecipo.

Antes-vivo

Antes - agora - o que há de vir.

Eu fêmea-matriz.

Eu força-motriz.

Eu-mulher

abrigo da semente

moto-contínuo

do mundo.

Comentário: Conceição Evaristo, neste poema, exibe um corpo de mulher talhado por

significantes que dizem da função geratriz inscrita no corpo da mulher: Eu-mulher em

rios vermelhos / Inauguro a vida / Em baixa voz / Violento os tímpanos do mundo. /

Antevejo. / Antecipo. / Antes-vivo / Antes agora o que há de vir. / Eu fêmea-matriz. / Eu

força-motriz./ Eu-mulher / abrigo da semente / moto-contínuo / do mundo.

2. LINHAGEM (Carlos Assumpção)

Eu sou descendente de Zumbi

Zumbi é meu pai e meu guia

Me envia mensagens do orum

Meus dentes brilham na noite escura

Afiados como o agadá de Ogum

Eu sou descendente de Zumbi

Sou bravo valente sou nobre

Os gritos aflitos do negro

Os gritos aflitos do pobre

Os gritos aflitos de todos

Os povos sofridos do mundo

No meu peito desabrocham

Em força em revolta

Me empurram pra luta me comovem

Eu sou descendente de Zumbi

Zumbi é meu pai e meu guia

Page 2: Poesias Maio Da Africanidade

Eu trago quilombos e vozes bravias dentro de mim

Eu trago os duros punhos cerrados

Cerrados como rochas

Floridos como jardins

Comentário: No poema "Linhagem" (acima), através do verso "Eu sou descendente de

Zumbi", o poeta evoca uma ancestralidade que tem a ver com a trajetória de batalhas

dos afro-descendentes no Brasil. Uma trajetória cujas raízes remontam a Palmares e ao

guerreiro que melhor simbolizou a trajetória do quilombo, e que atualmente consta do

panteão oficial dos heróis brasileiros.

3. UM SOL GUERREIRO (Celinha)

(A todas as crianças negras assassinadas em Atlanta e a muitas outras crianças

assassinadas todos os dias no ventre da humanidade)

Já não ouço meu pranto

porque o choro emudeceu

nos meus lábios

O grito calou-se

em minha garganta

o sol da meia-noite

cegou-me os olhos...

Sou noite e noite só

O meu sangue espalhou-se

pelo espaço

E o céu coloriu-se de um tom avermelhado

como o crepúsculo

E eu cantei

Cantei porque agora a chuva

brotará da terra.

As sementes de todos os frutos

cairão sobre os nossos pés

E germinaremos juntos

Embora tu não possas mais

tocar as flores deste jardim, eu sei

Mas o teu solo é livre

Cante, menino,

cante uma canção que emudeça os prantos,

que repique os ataques

e ensurdeça os gritos

Porque amanhã não haverá mais

nenhum resto de esperança

não haverá mais um outro amanhecer,

pois certamente muito antes

de surgir um novo dia

um sol, guerreiro, há de raiar

à meia-noite, para despertar o teu sono,

Como uma nova alvorada.

Page 3: Poesias Maio Da Africanidade

Comentário: O poema "Um sol guerreiro" recupera uma dicção política que, em outros

momentos fazia-se a tônica da poesia libertária: As sementes de todos os frutos / Cairão

sobre os nossos pés / E germinaremos juntos.

LINHAGEM

Eu sou descendente de Zumbi

Zumbi é meu pai e meu guia

Me envia mensagens do orum

Meus dentes brilham na noite escura

Afiados como o agadá de Ogum

Eu sou descendente de Zumbi

Sou bravo valente sou nobre

Os gritos aflitos do negro

Os gritos aflitos do pobre

Os gritos aflitos de todos

Os povos sofridos do mundo

No meu peito desabrocham

Em força em revolta

Me empurram pra luta me comovem

Eu sou descendente de Zumbi

Zumbi é meu pai e meu guia

Eu trago quilombos e vozes bravias dentro de mim

Eu trago os duros punhos cerrados

Cerrados como rochas

Floridos como jardins

Comentário: No poema "Linhagem" (acima), através do verso "Eu sou descendente de

Zumbi", o poeta evoca uma ancestralidade que tem a ver com a trajetória de batalhas

dos afro-descendentes no Brasil. Uma trajetória cujas raízes remontam a Palmares e ao

guerreiro que melhor simbolizou a trajetória do quilombo, e que atualmente consta do

panteão oficial dos heróis brasileiros.

LEPÊ CORREIA

TEIMOSA PRESENÇA

Eu continuo acreditando na luta

Não abro mão do meu falar onde quero

Não me calo ao insulto de ninguém

Eu sou um ser, uma pessoa como todos

Não sou um bicho, um caso raro

ou coisa estranha

Sou a resposta, a controvérsia, a dedução

Page 4: Poesias Maio Da Africanidade

A porta aberta onde entram discussões

Sou a serpente venenosa: bote pronto

Eu sou a luta, sou a fala, o bate-pronto

Eu sou o chute na canela do safado

Eu sou um negro pelas ruas do país.

Neste poema o eu-lírico relata a sua luta e jornada cotidiana, mostrando que corre atras dos

seus ideais, ultrapassa obstáculos sem perder a essência racional,discutindo fatos, buscando

um melhor tratamento da sociedade para com o negro.

NO REGRESSO

"No dia em que retornares

provavelmente me encontrarás

entre a pia e o fogão.

Antes que tua boca te anuncie, procurarei retirar a gordura densa nas banheiras

anunciadas na tevê.

Usarei o xampu que dará

mobilidade aos meus cabelos

farei teatro em tua presença.

Te convencerei de que minha disposição é a mesma, te envolverei de tal forma...

Farei morrer de inveja a melhor das atrizes.

Carregarei de ternura o teu coração

quero que me embales!

Deixarei deitares teus lábios nos meus grossos e banhados em veneno doce

farei com que bebas através deles minha alma

e que nos consumamos os dois

Te carregarei para o inferno

em que minha vida transformaste."

Comentário:

No poema “No Regresso” existe uma síntese que me faz pensar em um momento de

espera fantástico de uma mulher apaixonada por um homem que tudo que ela sabe e

que ele talvez vá voltar, e por isso sua vida é um inferno de esperança feliz no qual ela

se prepara todos os dias para esse regresso triunfante de seu amado onde ela descreve

uma mistura de sensações de desejo carnal e doçura sem perder com o tempo todo

sentimento que ela tem desde o inicio por ele, quando ela diz: “Te convencerei de que

minha disposição é a mesma”. Outra ideia que o poema traz é como se o leitor

estivesse dentro da historia e faz imaginar fatos em questões abertas como “te

envolverei de tal forma...” onde o eu lírico nos possibilita imaginar as formas de como

ele reagiria detro do contexto poetico.

Page 5: Poesias Maio Da Africanidade

OSWALDO DE CAMARGO EM MAIO Já não há mais razão de chamar as lembranças e mostrá-las ao povo em maio. Em maio sopram ventos desatados por mãos de mando, turvam o sentido do que sonhamos. Em maio uma tal senhora liberdade se alvoroça, e desce às praças das bocas entreabertas e começa: "Outrora, nas senzalas, os senhores... " Mas a liberdade que desce à praça nos meados de maio pedindo rumores, é uma senhora esquálida, seca, desvalida e nada sabe de nossa vida. A liberdade que sei é uma menina sem jeito, vem montada no ombro dos moleques e se esconde no peito, em fogo, dos que jamais irão à praça. Na praça estão os fracos, os velhos, os decadentes e seu grito: "Ó bendita Liberdade!" E ela sorri e se orgulha, de verdade, do muito que tem feito!

Este poema ,"Em maio" de Oswaldo de Camargo descreve a epóca da abolição da escravatura ocorrida em 13 de maio de , assinada pela Princesa Isabel. Neste poema percebe-se que o eu lírico é negro então temos uma visão mais realista da epóca abolicionista, a liberdade neste poema não é tratada como apenas uma conquista dos negros, o poema nos mostra que a liberdade deveria ser algo bom para eles mas foi ''uma senhora esquálida, seca, desvalida e nada sabe de nossa vida.'' e logo nos ultimos versos do poema ela diz que ela se orgulha e sorrir mas de nada valia essa liberdade se ainda havia o preconceito

Dançando Negro

" Quando eu danço

atabaques excitados ,

o meu corpo se esvaiando

em desejos de espaço,

a minha pele negra

dominando o cosmo ,

envolvendo o infinito , o som

criando outros extases .....

Não sou festa para teus olhos

de branco diante de um show !

Quando eu danço há enfusão dos elementos ,diluem - se na cachaça

mas,pouco a pouco ..... "

Page 6: Poesias Maio Da Africanidade

( Autor :Luiz Carlos Amaral Gomes , Éle Semog , poema "

Dançando Negro " )

Sobre Éle Semog :

Nascido no Estado do Rio de Janeiro , em 1952 , ele se formou

em Análise de Sistemas e se especializou em Administração de Empresas . Ele

também exerceu entre 1989 e 1996, a presidência do Centro de Articulação de

Populações Marginalizadas.Fundou no ano de 1984 o Grupo Negrícia , Poesia e Arte de

Criolo ,ele também foi Cofundador do Jornal Maioria Falante , onde atuou até o final

do ano de 1991. Atualmente ele é assessor do Senador Abdias Nascimento e

Conselheiro Executivo do Instituto Palmares de Direitos Humanos .

Comentário :

Nesse poema nos faz perceber que estar se referindo á um escravo negro ,

onde o eu lírico espressa a dor de ser negro , e que pelo fato de ser Negro não ser

bem visto pelos brancos , fazendo uma comparação com a sociedade em

que vivemos atualmente esse poema retrata o preconceito existente contra os

descendentes de escravos negros .

ass: Indiamara Silva

NEGRITUDE

Para Jorge Henrique Gomes da Silva

De mim

parte um canto guerreiro

um voo rasante, talvez rumo norte

caminho trilhado da cana-de-açúcar

ao trigo crescido, pingado de sangue

do corte do açoite. Suor escorrido

da briga do dia

que os ventos do sul e o tempo distante não podem ocultar.

De mim

parte um abraço feroz

um corpo tomado no verde do campo

beijado no negro da boca da noite

amado na relva, gemido contido

calado na entranha

oculto do medo da luz do luar.

De mim

parte uma fera voraz

(com sede, com fome)

de garras de tigre

pisar de elefante correndo nas veias

je fogo queimando vermelho nas matas Frugir de leões bailando no ar.

De mim

parte de um pedaço de terra semente de vida com gosto de mel criança parida com

cheiro de luta com jeito de

Page 7: Poesias Maio Da Africanidade

briga na areia da praia de pele retinta, deitada nas águas sugando os seios das ondas do

mar.

De mim

parte NEGRITUDE

um golpe mortal

negrura rasgando o ventre da noite

punhal golpeando o colo do dia

um punho mais forte que as fendas de aço

das portas trancadas

da casa da história.

COMENTÁRIO: O poeta , ele recorre a um resgate historico do tempo da escravidao ,

relembra a cultura da cana-de-açucar e os crueiscastigos fisicos que os negros eram

obrigados a sofrer . Mais a memoria desses tempos faz do negro um ser de resistenci

disposto a lutar

Historia de cadernos negros: Em 1978 surgiu o primeiro volume de CADERNOS NEGROS , contendo 8 poetas que

dividiam os custos do livro publicado em formato de bolso com 52 paginas. A

publicação , vendida principalmente em um grande lançamento circulou posteriormente

de mao em mao , sendo distribuida para poucas livrarias , mas obteve um bom retorno

dos que tiveram acesso a ela .

Desde então e sem ser interonpido foram lançados outros volumes , um volume por ano

. Os cadernos tem sido um importante veiculo para chama atençao para a literatura

negra , reflete a luta de escritores afro-brasileiro .Os poemas tem raizes oncestrais e tem

uma reflexao poetica sobre avida e a cultura dos afro-brasileiro , mostra a historia não

oficial . Exemplo coomo a violencia urbana , luta das classesexcluidas e preconceito

racial , sao mostrados em cada pagina dos poemas .

Ahistoria reflete varias pessoas negras com influencias marcaram em parte a criaçao .

Exemplo : Ruy Barbosa , Zumbi dos Palmares , Luiz Gama (escritor , jornalista e

advogado que libertou mais d mil cidadoes negros , ainda ilegalmente escravizados)

entre outros

MANDELA Nenhum cárcere pode prender, entre paredes de pedra e musgo, a música das

passeatas, a voz rebelde dos jovens, o beijo de amor das mulheres no rosto negro dos

homens, a aurora do novo mundo nos bairros de lata e pólvora.

II Não, nenhum cárcere tira dos homens os sonhos de liberdade. Os sonhos desafiam as

armas, o fogo não os dilacera, os homens vertem o sangue mas seguem a luta cantando.

III Ah, senhores, que túmulo de merda será o vosso, que vermes vos roerão na morte

amarga e sonora, que alvos dragões defecarão em vossa carne. Nenhuma estupidez

escraviza o negro ao branco e permanece impune.

IV Qual cárcere pode prender o etéreo aroma da flor, o

Page 8: Poesias Maio Da Africanidade

horrível rugido da fera, um róseo brilho de fogo, o carinho de uma criança nas mãos

rugosas de um velho?

Pisa, Sul da África, a nívea pele dos oceanos de brancura, invade as ricas cidades,

derruba os prédios malditos, a música da vitória acorda todos os povos, seguiremos teu

exemplo de luta e dignidade.

VI Não, nenhum cárcere detém o crepúsculo ou impede a marcha sangrenta das horas.

Esse poema se refere a Nelson Mandela que lutou a favor da liberdade da Africa do Sul (

famoso apartheid ). Queria uma Africa do Sul livre das mãos dos brancos e foi tido pelo

governo como terrorista e passou quase 27 anos preso.

O poema como um todo retrata que ninguém e nem a prisão vai tirar o sonho de liberdade que

não é só de uma pessoa mais de todo o povo sul africano , que cansou de ser dominado pelos

brancos , ninguém tira suas vontades se for pra ter guerra e sofrimento eles estarão unidos para

as suas convicções de uma pátria melhor.

Em um trecho fica bem claro a explicação a cima :

“... Não,nenhum cárcere tira dos homens os sonhos de liberdade.Os sonhos desafiam as

armas,o fogo não os dilacera,os homens vertem os sangue mais seguem a luta cantando ...”

Raça e Classe:

Nossa pele teve maldição de raça

e exploração de classe

duas faces da mesma diáspora e desgraça

Nossa dor fez pacto antigo com todas as estradas do

mundo e cobre o corpo fechado e sem medo do sol

Nossa raça traz o selo dos sóis e luas dos séculos

a pele é mapa de pesadelos oceânicos

e orgulhosa moldura de cicatrizes quilombolas.

Quando o eu - lirico fala "Nossa pele teve maldição de raça e exploração de classe" ele

se refere a escravidão dos negros , há uma época em que os negros sofriam nas mãos de

seus senhores e da perseguição dos capitães do mato. Uma época que nem as mulheres e

crianças tinham piedade , trabalhava de sol a sol só aumentando a riqueza e o poder do

seu senhor . Citação que continua nos versos seguintes :

“... Nossa dor fez pacto antigo com todas as estradas do

mundo e cobre o corpo fechado e sem medo do sol

Nossa raça traz o selo dos sóis e luas dos séculos

a pele é mapa de pesadelos oceânicos...”