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Plantas medicinais do Brasil em desenhos científicos de fundos documentais da Universidade de Lisboa: a ‘Flore Médicale’ de François Chaumeton (Século XIX) Thailine Ap. de Lima 1 [email protected] PECIM, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Silvia F. de M. Figueirôa [email protected] Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Resumo Este trabalho apresenta um recorte na área de Botânica com enfoque nas plantas com aplicações medicinais, tendo-se selecionado o Códice “Flora Medicinal” existente no Museu de História Natural e da Ciência (MUHNAC) da Universidade de Lisboa, Portugal. Este Museu dispõe de um conjunto de quase 2.000 desenhos, produzidos durante as expedições ao antigo Império português, agrupados em códices conforme suas áreas e temáticas. Os desenhos do códice acima referido são de 1875 e reproduzem as estampas do livro de CHAUMETON, François Pierre [et al] – “Flore Médicale”, originalmente publicado no início do século XIX – contemporâneo, grosso modo, dos extensos levantamentos de recursos naturais empreendidos pela Coroa Portuguesa em seus domínios coloniais – e que conheceu uma nova edição em 1833. A intenção da reprodução dos desenhos pelo Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda visava a integrar uma versão portuguesa da obra. Nossa investigação explorou as imagens a partir da filtragem dos fitoterápicos presentes na obra de Chaumeton que ocorrem no território brasileiro, nos diferentes contextos culturais, históricos e científicos. Palavras-chave: Desenhos, história, plantas medicinais, conhecimento tradicional. 1 Bolsista de Mestrado FAPESP N.º do processo:2018/09696-1; Bolsa de Iniciação Científica FAPESP N.º do processo: 2015/25120-4.

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Plantas medicinais do Brasil em desenhos científicos de fundos documentais da

Universidade de Lisboa: a ‘Flore Médicale’ de François Chaumeton (Século XIX)

Thailine Ap. de Lima1

[email protected]

PECIM, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Silvia F. de M. Figueirôa

[email protected]

Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Resumo

Este trabalho apresenta um recorte na área de Botânica com enfoque nas plantas com aplicações medicinais, tendo-se selecionado o Códice “Flora Medicinal” existente no Museu de História Natural e da Ciência (MUHNAC) da Universidade de Lisboa, Portugal. Este Museu dispõe de um conjunto de quase 2.000 desenhos, produzidos durante as expedições ao antigo Império português, agrupados em códices conforme suas áreas e temáticas. Os desenhos do códice acima referido são de 1875 e reproduzem as estampas do livro de CHAUMETON, François Pierre [et al] – “Flore Médicale”, originalmente publicado no início do século XIX – contemporâneo, grosso modo, dos extensos levantamentos de recursos naturais empreendidos pela Coroa Portuguesa em seus domínios coloniais – e que conheceu uma nova edição em 1833. A intenção da reprodução dos desenhos pelo Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda visava a integrar uma versão portuguesa da obra. Nossa investigação explorou as imagens a partir da filtragem dos fitoterápicos presentes na obra de Chaumeton que ocorrem no território brasileiro, nos diferentes contextos culturais, históricos e científicos. Palavras-chave: Desenhos, história, plantas medicinais, conhecimento tradicional.

1 Bolsista de Mestrado FAPESP N.º do processo:2018/09696-1; Bolsa de Iniciação Científica FAPESP N.º do processo: 2015/25120-4.

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Plantas medicinais brasílicas: um breve contexto histórico

Os desenhos científicos foram importantes ferramentas de difusão de saberes durante

o período das grandes expedições entre os séculos XVIII e XIX. Essas viagens tinham como

um dos objetivos estabelecer relações entre o Estado e suas colônias a fim de exercer maior

controle sobre as mesmas. Durante as primeiras tentativas de colonização portuguesa ao longo

da costa do território brasileiro foram introduzidas espécies animais e botânicas,

principalmente, que se encontravam já aclimatados em Portugal ou nas suas ilhas atlânticas,

devido ao desconhecimento por parte dos colonos diante da diversidade natural (DEAN,

1991).

O início do século XVII assistiu ao surgimento de novos meios de intercâmbios de

espécies botânicas tropicais: o jardim botânico colonial e o herbário, que permitiam a troca de

plantas entre as colônias tropicais e sua aclimatação, além de estudos comparativos de

espécimes vegetais secos tropicais. Através dessa importante prática de movimentação de

espécimes exótica no território brasileiro, que teve grande impacto nos ecossistemas naturais,

os portugueses selecionaram elementos culturais que seriam estratégicos para garantir e

expandir seu controle sobre a sociedade colonial (DEAN, 1991). A diversidade de plantas

encontradas nas colônias tropicais fornecia um largo campo de possíveis aplicações no

cotidiano do ser humano, desde plantas ornamentais, passando pelas alimentícias e,

principalmente, aquelas com potencial farmacológico (SANTOS, 2009). A partir da chegada

da Companhia de Jesus às terras brasileiras, a necessidade de medicamentos para tratar e

prevenir doenças dos colonos, escravos e dos índios foi incorporada às atividades da

instituição. Foram construídas, ao lado dos colégios de ensino e catequese, as boticas onde

eram armazenados e preparados remédios cuja composição. Nessas boticas foram geradas

receitas com as etapas de preparo de medicamentos, bem como seus ingredientes, que

circulavam entre os colégios das colônias e, principalmente, na Europa. Em meio a essa

circulação de saberes e ingredientes, muitas plantas brasílicas também acompanharam o fluxo

de informações e viajaram à Europa, ao Oriente, e vice-versa, formando uma teia de intensa

circulação de conhecimentos medicinais. Na interação com os nativos, os jesuítas adquiriram

maior conhecimento da fauna e flora locais e incorporaram as plantas brasílicas nos

tratamentos medicinais. Os escravos que vinham do continente africano também contribuíram

para os conhecimentos medicinais, trazendo de lá outras plantas e seus modos de uso e

preparo (KURY, 2013). Dentre as receitas jesuíticas confeccionadas nas boticas brasileiras, a

que obteve grande repercussão foi a Triaga Brasílica, largamente utilizada durante o século

XVIII. Considerada uma panaceia, a Triaga Brasílica foi o primeiro remédio a utilizar plantas

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brasileiras no seu preparo, o que demonstra a importância do saber dos nativos frente à

interação com os colonos (SANTOS, 2013).

Os poucos médicos e boticários oficialmente habilitados pela Coroa portuguesa para

prática assistencial se misturavam aos curandeiros, benzedeiras e barbeiros que garantiam as

práticas de cura. Em meio a esse cenário, importantes manuais foram confeccionados na

tentativa de divulgar saberes e práticas medicinais pela colônia, principalmente em sua vasta

área rural. Já no Império, os manuais do Dr. Chernoviz, por exemplo, foram de suma

importância dentro do contexto médico imperial, não apenas pelo sucesso na difusão dos

saberes tradicionais no tratamento de doenças, mas também na formação e instrução

acadêmica de inúmeros praticantes leigos da medicina. Nesses manuais foram compiladas as

principais moléstias encontradas, quais recursos tradicionais caseiros poderiam ser aplicados e

como prepará-los (GUIMARÃES, 2005). Assim, a medicina no Brasil, tanto na Colônia

quanto no Império, foi marcada pelo uso de plantas medicinais e práticas curativas que

derivaram da cultura das diferentes etnias que coabitaram o território brasileiro. A partir de

meados do século XIX, com a expansão das atividades medicinais regulamentadas logo após

a chegada da Coroa Portuguesa, que culminou na oficialização da medicina e das práticas

médicas, iniciou-se a perseguição institucional contra os praticantes da medicina popular,

vistos como “ilegais” (ARAÚJO, 2017). O distanciamento do conhecimento tradicional e das

plantas medicinais empregadas no tratamento de doenças no Brasil ocorre, de forma mais

intensa, a partir do século XX em razão da industrialização e da urbanização, com o

surgimento de medicamentos sintéticos. (LORENZI E MATOS, 2008). Assim grande parte

da composição química de plantas medicinais ainda é desconhecida, resultando em cerca de

99%2 de espécies sem seus princípios ativos catalogados, conforme dados de Santos (2009).

Em contrapartida, grande parte da população confia no conhecimento tradicional e utiliza, de

alguma forma, plantas medicinais nos cuidados com a saúde. Além disso, registros fósseis

indicam que o ser humano faz uso de plantas como medicamentos há pelo menos 60 mil anos

(SOLECKI & SHANIDAR, 1975).

Material e métodos: A ‘Flore Médicale’ e os procedimentos para análise

O material contido na ‘Flore Médicale’ foi produto de inúmeras expedições e

conhecimentos acumulados sobre diversos locais do planeta. Contém 119 imagens

2 Ainda que este dado provenha de um trabalho de 2009 – de quase 10 anos trás, portanto – nenhuma informação mais atual permite contradizê-lo substancialmente. Se houve variações, estas podem ser consideradas pouco expressivas para nosso raciocínio.

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representativas e informações taxonômicas de plantas que possuem propriedades medicinais,

e muitas eram empregadas nas terapêuticas há séculos. As imagens representativas das

espécies estão organizadas em ordem alfabética segundo o idioma francês seguido por outros

idiomas como o grego, latim, italiano, espanhol, alemão, etc. Nas imagens estão evidenciados

características morfológicas como botões florais, frutos, cortes dos ovários, estames (Figura

1). O sabor, textura de partes das plantas, a ocorrência geográfica, a escala da imagem em

relação ao tamanho real, entre outras informações, constavam no guia. As espécimes seguem

a classificação binomial de Carolus Von Linné, (1707–1778) desenvolvida em 1730, cujos

princípios de sistematização possibilitaram a organização do universo biológico e vêm sendo

utilizados até hoje pelos taxonomistas (Silva, 2009).

Figura 1. Imagem retirada da obra Flore Médicale (Tomo 2); apresentação de Polygonum aviculare L,

vulgarmente chamada de Sanguinária.

A obra “Flore Médicale” foi escrita por François Pierre Chaumeton3, tendo Jean Louis

Marie Poiret e Jean Baptiste Joseph Anne César Tyrbas de Chamberet como coautores: o

primeiro foi um médico militar e o segundo, um clérigo botânico e explorador. Podemos

supor que o fato de Chaumeton ser médico militar e acompanhar soldados em diferentes

países tenha servido de estímulo para a produção de uma obra extensa, em três volumes,

compilando de forma abrangente as variedades de plantas úteis na farmacopeia, a fim de

3 Nascido em Paris em 20 de setembro de 1775, Chaumeton foi um botânico e também médico militar que se aventurou pelos saberes farmacológicos. Além de medicina, estudou ciências humanas e línguas, se aperfeiçoando principalmente no idioma grego. Na qualidade de médico militar, acompanhou diferentes exércitos em nas mais variadas regiões. Passou seus últimos dias lutando contra a tuberculose e faleceu em 10 de agosto de 1819.

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facilitar os tratamentos e a cura. Para verificação da presença no Brasil dos táxons amostrados

no códice Flora Medicinal e verificação de nomes válidos foi utilizada a plataforma ‘Flora do

Brasil 2020’ (ainda em construção). Além desta, a plataforma ‘Tropicos.org’ (constantemente

atualizada) também foi utilizada para verificações nomenclaturais. A obra de Chaumeton

(1833) “Flora Médicale” foi utilizada como objeto investigativo sobre as possíveis aplicações

de plantas com potencial fitoterápico. Utilizamos a versão digital disponível gratuitamente

para download na Gallica – Bibliothèque Nationale de France (www.gallica.bnf.fr). Para

comparar o conhecimento atual sobre o uso medicinal destas espécies representadas na “Flore

Médicale”, recorremos, principalmente, à obra de Lorenzi & Matos, intitulada “Plantas

Medicinais no Brasil Nativas e Exóticas”, entre outros trabalhos. Após a identificação dos

espécimes botânicos que possuem ocorrência no território brasileiro, realizamos

levantamentos bibliográficos sobre temas botânicos, taxonômicos, etnobotânicos e

etnofarmacológicos. Além disso, buscamos identificar dentre as plantas medicinais

selecionadas no presente estudo, quais são citadas no “Formulário e Guia Médico” do Dr.

Chernoviz (1841), importante material de medicina popular da época, bem como quais delas

eram também utilizadas na receita da Triaga Brasílica. Para isso, utilizamos sobretudo dois

trabalhos: Ricardo (2017), no qual a autora realiza um levantamento de plantas brasileiras

empregadas na medicina tradicional presentes no “Formulário e Guia Médico” do Dr.

Chernoviz; e Santos (2013), que faz uma contextualização da Triaga Brasílica e sua

importância histórica durante o século XVIII.

Resultados

Dentre as 119 gravuras da obra de Chaumeton presentes no Códice “Flora Medicinal”

do MUHNAC, foram identificadas 19 plantas ocorrentes no Brasil. As plantas não eram

apresentadas apenas sob a perspectiva médica, mas também quanto ao grau de importância

econômica e sua versatilidade em atender às necessidades humanas. Algumas das plantas,

inclusive, apresentavam outras propriedades mais evidenciadas do que o aspecto

farmacológico, como é o caso de Arachis hypogaea L. e Silybum marianum (L.) Gaertn, das

quais não identificamos seus usos medicinais descritos no livro “Flore Médicale”. Além

disso, Chaumeton também assinalava o sucesso ou o fracasso da aclimatação dessas plantas.

Todas as informações levantadas sobre as plantas medicinais estudadas foram compiladas nas

Tabelas 1, 2, 3 e nos gráficos (Figuras 2A, 2B, 2C, 2D; 3A, 3B, 3C, 3D). Em relação à

taxonomia e distribuição geográfica das espécies apresentadas na Tabela 1, as famílias

botânicas mais representativas dos táxons amostrados são Leguminosae, com 4 espécies,

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seguida por Apiaceae, com 2 espécies (Figura 2A). Os táxons estão distribuídos entre os

domínios Mata Atlântica (33%), Amazônia (22%), Caatinga (17%), Cerrado (14%), Pantanal

(8%) e Pampa (6%). Nesses domínios, as espécies apresentam variados status biogeográficos

(Zenni, 2015) como “cultivado”4 (42%), “nativa”5 (37%) e “naturalizada”6 (21%) (Figura

2C). Quanto à forma de vida das plantas medicinais, as ervas são as mais expressivas dentre

as estudadas neste trabalho, com 58% de destaque. As árvores compreendem 42% e o restante

estão distribuídas como arbustos e subarbusto representando ao todo 10% (Figura 2D). As

informações sobre as estruturas das plantas utilizadas e seus respectivos modos de preparo,

apresentados na Tabela 2, indicaram maior utilização das folhas (27,8%), seguida pelos frutos

(22,2%), grãos ou sementes (16,7%), raízes (11,1%) e resinas (11,1%) (Figura 3A). Na

medicina tradicional atual também se observam as folhas como maior fonte de substâncias

para preparação de remédios e tratamento de doenças (26,9%), seguidas pelos frutos (15,4%).

Além dessas, outras estruturas emergem no conhecimento popular como as flores e botões

florais (11,5%), lenho e tronco (3,8%). Em alguns casos ainda, todas as partes das plantas

podem ser utilizadas (11,5%) (Figura 3B). Quanto aos modos de preparo, a “Flore Médicale”

indica a extração (36,4%) e a infusão ou decocção (22,7%) como os mais utilizados (Figura

3C). Tais modos de preparo se mantêm em destaque na medicina tradicional atual, sendo

maior, no entanto, a preferência por chás (infusão decocção) do que por extração (Figura 3D).

A Tabela 3 apresenta dados farmacológicos, como os sintomas tratados por cada espécie de

planta na perspectiva do ‘Flore Médicale’ (1833) e de levantamentos mais recentes. Podemos

observar que grande parte dos saberes medicinais se mantém até hoje, uma vez que notamos a

ocorrência de pelo menos um uso/aplicação em comum para a mesma planta nos diferentes

levantamentos (destacados em negrito na Tabela 3). Além disso, muitas dessas plantas

possuem respaldo científico para suas aplicações atuais, que acompanham também outros

estudos em busca de novas atividades biológicas que essas espécies podem apresentar

(bibliografia apresentada na Tabela 3).

Ao compararmos os espécimes botânicos estudados com o “Formulário e Guia

Médico de Chernoviz” presente no trabalho de Ricardo (2017), verificamos que 04 espécies

do nosso trabalho são citadas por Chernoviz em seu formulário medicinal, sendo uma

cultivada e as demais nativas do Brasil. São elas: Anacardium occidentale, Myroxylon

balsamum, Hevea guianensis, que são plantas nativas, e Arachis hypogaea, cultivada. Com 4 Plantas que ocorrem no território brasileiro por meio do cultivo e manipulação humana. 5 Espécies botânicas de origem brasileira. 6 Espécies que foram introduzidas no território brasileiro e que atingiram a idade reprodutiva produziram descendentes e tiveram sucesso para formar uma população viável (ZENNI, 2015).

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relação à receita da Triaga Brasílica disponível na pesquisa de Santos (2013), dentre as 47

espécies empregadas, 03 espécies presentes no nosso estudo

fizeram parte dessa receita, sendo 01 nativa e 02 cultivadas. Essas espécies são: Apium

graviolens, Zingiber officinale e Dysphania ambrosioides7.

7 No trabalho de Santos (2013), aparece o sinônimo heterotípico de Dysphania ambrosioides, o Chenopodium ambrosioides.

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Tabela 1. Plantas medicinais brasileiras citadas por Chaumeton ocorrentes no Brasil8

8 Informações sobre Tabela 1:*Esta espécie é tratada atualmente pelo nome Paubrasilia echinata (Lam.) E. Gagnon, H.C. Lima & G. P. Lewis – Gagnon et al. (2016). (-) Informação faltante na Flora do Brasil 2020. (²) Plantas medicinais estudadas que aparecem no “Formulário e Guia Médico”, Chernoviz. (³) Espécimes botânicas estudadas que fizeram parte da receita da Triaga Brasílica.

Espécie Família botânica Nome popular Forma de

Vida Status

biogeográfico Domínio

fitogeográfico Apium graviolens

L. (³) Apiaceae Aipo Erva Cultivada Mata Atlântica

Vitex agnus-castus L. Lamiaceae Árvore-da-

castidade arbusto Naturalizada Caatinga, Mata Atlântica

Zingiber officinale Roscoe (³) Zingiberaceae Gengibre Erva Cultivada -

Anacardium occidentale L. (²) Anacardiaceae Cajueiro Árvore Nativa

Amazônia, Caatinga, Cerrado,

Mata Atlântica, Pampa, Pantanal

Ananas comosus (L.) Merr. Bromeliaceae Ananás Erva Nativa Mata Atlântica

Dysphania ambrosioides (L.)

Mosyakin & Clemants (³)

Amaranthaceae Anserina vermífuga Subarbusto Naturalizada

Amazônia, Caatinga, Cerrado,

Mata Atlântica

Arachis hypogaea L. (²) Leguminosae Amendoim Erva Cultivada

Amazônia, Caatinga, Cerrado,

Mata Atlântica, Pampa, Pantanal

Avena sativa L. Poaceae Aveia-comum Erva Cultivada Mata Atlântica, Pampa

Melia azedarach L. Meliaceae Cinamomo ou amargoseira Árvore Cultivada

Amazônia, Caatinga, Cerrado,

Mata Atlântica

Canna indica L. Cannaceae Erva-conteira Erva Nativa

Amazônia, Caatinga, Cerrado,

Mata Atlântica, Pantanal

Musa x paradisíaca L. Musaceae Bananeira Erva Cultivada Amazônia, Mata

Atlântica Myroxylon

balsamum var. pereirae (Royle)

Harms (²)

Leguminosae Balsameiro-do-Perú Árvore Nativa Amazônia

*Caesalpinia echinata Lam. Leguminosae Pau-brasil Árvore Nativa Mata Atlântica

Haematoxylum campechianum L. Leguminosae Pau-de-

campeche Árvore Cultivada -

Hevea guianensis Aubl. (²) Euphorbiaceae Seringueira Árvore Nativa Amazônia

Tropaeolum majus L. Tropaeolaceae

Chagas, mastruço-do-

Perú ou capuchinha

Erva Naturalizada -

Daucus carota L. Apiaceae Cenoura Erva Cultivada Mata Atlântica Polygonum aviculare L. Polyganaceae Sanguinha ou

centonódia Erva Nativa Mata Atlântica

Silybum marianum (L.) Gaertn. Asteraceae cardo-mariano Erva Naturalizada -

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Figura 2. A. Número de espécies por família botânica; B. Domínio Fitogeográfico; C. Status

biogeográfico; D. Forma de Vida.

Tabela 2. Plantas medicinais ocorrentes no Brasil, suas partes utilizadas e o modo de preparo e

aplicação.

Espécie Nome

vulgar PUA PUFM

Modo de Preparo/

Aplicação Atual

Modo de Preparo/ Aplicação "Flora

Médicale"

Apium graviolens

L. (³) Aipo TP Fo, Gr

Infusão; extração de óleo

das sementes/ oral, tópico

Maceração, suco, extração de óleo das

sementes/ Oral, tópico.

Vitex agnus-

castus L.

Árvore-da-

castidade Fo

Infusão, maceração com

gordura/ oral, tópico

Zingiber

officinale Roscoe

(³)

Gengibre Ri Ri

Infusão, extração de óleo

essencial dos rizomas

frescos/ Oral

Maceração, infusão, in natura/ oral,

Anacardium

occidentale L. (²) Cajueiro TP Fr

Decocção, infusão,

extratos/ Oral, tópico Extração de óleo/ Tópico

Ananas comosus

(L.) Merr. Ananás Fr Fr

in natura, suco, misturada

com levedura de cerveja/

Oral, tópico

Suco, in natura/ Oral, gargarejos

Dysphania

ambrosioides

(L.) Mosyakin &

Clemants (³)

Anserina

vermífuga Fo Gr

cataplasma, suco, chás

(insusão) xarope/ oral,

tópico

Pó/ Oral

Arachis

hypogaea L (¹). Amendoim -

-

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(²)

Avena sativa L. Aveia-

comum

Fo, fi,

ca, se Gr -

Infusão, cozimento, extração de água

da farinha de aveia/ Oral, tópico

Melia azedarach

L.

Cinamomo

ou

amargoseira

ra, ca,

fo, fr,

fl

Fo, fr, ra -

fruto in natura, cozimento, extração de

suco das raízes, pomada com os

frutos/Oral, tópico

Canna indica L. Erva-

conteira Fl, ra Fr

Decocção, infusão

(chá)/oral Sumo do fruto/Oral

Musa x

paradisíaca L. Bananeira

Br,

casca

dos

frutos

Fl Infusão (chá)/Oral Extração de sumo da flor/Oral

Myroxylon

balsamum var.

pereirae (Royle)

Harms (²)

Balsameiro-

do-Perú

Fo, fr,

re

(bálsa

mo)

Re Misturas das partes

utilizadas/ Oral, tópico

Mistura de bálsamo com açúcar,

resina/ Oral, tópico

(*) Caesalpinia

echinata Lam. Pau-brasil

Lenho

(casca) Fo

Extrato do

lenho,maceração

/gargarejo

Infusão/ Oral

Haematoxylum

campechianum

L.

Pau-de-

campeche

Tr,

Rm Fo -

Decocção, extrato das folhas diluído

em água com canela e menta/ Oral

Hevea guianensis

Aubl. (²) Seringueira - Re -

Extração do suco leitoso do tronco/

Tópico

Tropaeolum

majus L.

Chagas,

mastruço-

do-Perú ou

capuchinha

Fo,

BF, fl Fo, fr

Infusão e extrato das

folhas / Oral, tópico Suco das folhas, frutos secos/ Oral

Daucus carota L. Cenoura TP Ra

in natura, cozimento,

decocção, suco, raiz

ralada com suas

folhas/oral, tópico

Suco da raiz (xarope), decocção/ Oral,

tópico

Polygonum

aviculare L.

Sanguinha

ou

centonódia

- - - -

Silybum

marianum (L.)

Gaertn. (¹)

cardo-

mariano - - - -

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*Esta espécie é tratada atualmente pelo nome Paubrasilia echinata (Lam.) E. Gagnon, H.C. Lima &

G. P. Lewis – Gagnon et al. (2016). (¹) Informações medicinais faltantes no Flora Médicale. (²) Plantas

medicinais estudadas que aparecem no “Formulário e Guia Médico”, Chernoviz. (³) Espécimes

botânicas estudadas que fizeram parte da receita da Triaga Brasílica. Siglas:Partes Utilizadas Atual

(PUA); Partes Utilizadas “Flora Médicale” (PUFM) Flor (Fl), Folha (Fo), Botão Floral (BF), Raíz

(Ra), Rizoma (Ri), Caule (Ca), Toda a planta (TP), Troncos (Tr), Ramos (Rm), Semente (Se), Grãos

(Gr), Frutos (Fr), Resina (Re); Brácteas (Br).

A

B

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Figura 3. A. Estruturas das plantas utilizadas na preparação dos remédios na perspectiva tradicional

segundo a “Flore Médicale”; B. Estruturas das plantas utilizadas na preparação dos remédios na

perspectiva tradicional atual. C. Modo de preparo das plantas medicinais tradicionais segundo “Flore

Médicale”; D. Modo de preparo das plantas medicinais tradicionais no contexto atual.

Tabela 3. Plantas medicinais ocorrentes no Brasil e dados sobre o uso tradicional nas perspectivas do

“Flore Médicale” e do atual, juntamente com estudos farmacológicos.

Espécie Nome

Popular "Flore Médicale" Perspectiva Atual Validação Farmacológica

Apium

graviolens L.

(³)

Aipo

Escorbuto, obstruções

viscerais; estímulo para os

órgãos urinários,

contusões, lesões, para

diminuir ou dissipar o

leite que inflama os

mamilos; febres

intermitentes, carcinomas.

Sedativo, afrodisíaco, flatulência

e reumatismo, reduz pressão

sanguínea, indigestão, estimula

atividade uterina, efeitos

diuréticos e anti-inflamatórios.

Depurativa, expectorante,

febrífuga e antiescorbútica,

cálculos renais, colite, anemia.

Comprovada a atividade de eliminação

de gases e sementes apresentam afeito

sedativo (Lorenzi & Matos, 2008)

Vitex agnus-

castus L.

Árvore-da-

castidade "paixão do amor"

Erisipela, diabetes, adstringente,

relaxante, regula funções

hormonais, espasmos,

reumatismo, gastralgia,

amenorreia, anti-inflamatório,

diurético, antidisentérico,

expectorante, hematúria,

hemorroidas, problemas

menstruais e de menopausa,

lactação insuficiente.

Seguro para a maioria das mulheres em

idade fértil, não devendo ser usado

durante a gravidez, mas seu uso é seguro

durante a lactação ; eficaz no alívio dos

sintomas da síndrome pré-menstrual

(Simões et. al, 2011) , controle da acne

juvenil (Maia, 2001).

Zingiber

officinale

Roscoe (³)

Gengibre

Estimulante energético,

problemas nos órgãos

digestivos, afecções

Tratamento de problemas do

estômago, garganta e fígado,

asma, bronquite e menorragia;

Remédio contra asma, bronquite e

menorragia ; ação antimicrobiana,

estimulante digestivo, carminativo,

C D

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catarrais crônicas. gripe e resfriado. problemas da garganta; antivomitativa,

antireumática, antiviral, antitrombose,

cardiotônica, antialérgica, colagoga e

protetora do estômago (Lorenzi &

Matos, 2008).

Anacardium

occidentale L.

(²)

Cajueiro

Úlceras causadas por

fungos e outras afecções

de pele.

Antisséptico e anti-inflamatório(

no caso de ulceras na boca e

afecções da garganta),

antiabética, adstringente,

antidiarréica, depurativa, tônica,

antiasmática .

Antiacne, antidiabética, antigenotóxica,

anti-inflamatória, anti-helmíntica, anti-

leishmania, antimicrobiana,

antimutagênica, antiofídica, antioxidante,

antitumoral, antiulcerogênica, antiviral,

gastroprotetora (Ushimaru et. al, 2007).

Ananas

comosus (L.)

Merr.

Ananás

Fraqueza do estômago,

doenças das vias urinárias,

hidropsia, doenças

inflamatórias, biliares.

Estomáticas, carminativo,

diurético, e anti-inflamatório,

sendo indicado para problemas

das vias respiratórias e para

neurastenia; afecções de pele (

acne, espinhas, cravos), feridas e

úlceras.

Mucolítica e fluidificante das secreções e

das vias aéreas superiores (Costa &

Nunes, 2010). Efeitos antidiabético, anti-

hiperlipidimêmico

e antioxidante (Manetti et al. 2009)

Dysphania

ambrosioides

(L.) Mosyakin

& Clemants (³)

Anserina

vermífuga Vermífugo

Vermífuga, antibiótico,

expectorante, machucados

(cicatrizante), diurética, bronquite,

tuberculose, abortiva, reumatismo,

afecções de pele, estomáquica,

antifúngico, antitumoral, anti-

helmíntico, analgésico

Anti-helmíntica, antitumoral e

antifúngica, antinociceptivo, anti-

inflamatório e cicatrizante (Grassi, 2011);

Antiviral, atividade antimicrobiana,

antioxidante, analgésico (Kokanova-

Nedialkova, 2009)

Arachis

hypogaea L.(¹)

(²)

Amendoim

-

Avena sativa

L.

Aveia-

comum

Escorbuto, anti-

inflamatório, antisséptico,

estimulante, cólicas,

inflamações da pleura,

problemas estomacais.

antidiabética, doenças metabólicas,

dores musculares, pele e

tecidos subcutâneos, sistema

digestivo, cólicas estomacais,

gota, artrite e reumatismo,

propriedades calmantes

Anti-trombose, anti-inflamatório,

antioxidante (Lee et al. 2016);

imunomodulatório, anti-diabético,

combate colesterol, regula imunidade

(Singh et al. 2013)

Melia

azedarach L.

Cinamomo

ou

amargoseira

Vermífugo, mata-piolhos,

estimulante do crescimento

capilar e da menstruação,

cura de micoses e sarnas.

dores de cabeça,

anti-helmíntico, antilítico,

diurético,doenças de pele, dor

estomacal, desordens intestinais,

doenças uterinas e cistites, bem

atividade antimicrobiana, antimalarial,

antiparasitária, contraceptiva,

antifoliculogênica, citotóxica (Araujo,

2009.).

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como diurético

e febrífugo; reumatismo

Canna indica

L.

Erva-

conteira

Diurético, calmante de

infecções urinárias.

Calmante, antimalárica, colesterol

alto, glicose, diabetes,

emagrecer, vitamina, fígado,

amarelão (hepatite), triza

(hepatite).

Antiviral (HIV); ativdade inibitória da TR

(transcriptase reversa), (Dan e Castellar,

2015); atividade antibacteriana,

antihelmíntico, moluscicida, anti-

inflamatório, analgésico, imunodulador,

antioxidante, citotóxico, hemostático,

hepatoprotector, anti diarréico (Al- Snafi,

2015)

Musa x

paradisíaca L. Bananeira Adstringente, antidiarreica

Bronquite, gripe, tosse forte;

diarréia, disenteria, lesões

intestinais, diabetes , nefrite, gota,

hipertensão, doença cardíaca

Asma e bronquite; antiulcerogênica,

antitumoral, antimutagênica, antioxidante

e antimicrobiana; atividade

antihelmíntica. Cicatrizante, peitoral, anti-

inflamatório, combate a afecções de pele

(Nascimento, 2014). Diarréia, disenteria,

úlcera, diabetes, hipertensão e doenças

cardíacas (Imam & Akter, 2011)

Myroxylon

balsamum var.

pereirae

(Royle) Harms

(²)

Balsameiro-

do-Perú

Tratamento de cólicas,

problemas no estômago e

coração, contra tosse,

problemas pulmonares,

doenças do peito e das vias

urinárias e cura feridas

recentes sem supuração e

sem cicatriz.

Asma, reumatismo, catarro e

feridas externas.

Expectorante, antifusivo e antiséptico;

espasmolíticas, cicatrizantes e

antiparasitárias, tratamento de sarnas,

feridas e úlceras dérmicas (Soares,

2006)

*Caesalpinia

echinata Lam. Pau-brasil

Adstrigente, febres,

problemas estomacais e

oftálmicos*

Adstringente, cicatrizante,

odontoálgico e tônico

atividade antinociceptiva. antitumoral,

antimicrobiana (Grangeiro, 2009),

odontálgico, diabetes, adstrigente ( Sá &

Silva, 2012)

Haematoxylum

campechianum

L.

Pau-de-

campeche Diarreia, disenteria Cólica, anemia, diarréia

Antiinflamatorio, digestivo, antioxidante,

antiséptico, antidiarréico, antibacteriano,

hemostático, hepatoprotetor (Matilla,

2013)

Hevea

guianensis

Aubl. (²)

Seringueira Curativo, cicatrização de

feridas. - -

Tropaeolum Chagas, Escorbuto, catarro Antiescorbútica, antiséptica, efeito antimicrobiano em infecções do

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majus L. mastruço-

do-Perú ou

capuchinha

pulmonar, catártico. fortificante capilar, tratamento de

afecções pulmonares, diurético,

desinfetante das vias urinárias,

expectorante.

trato urinário; efeitos antineoplá-

sicos e antioxidantes,

atividade inibitória

células tumorais humanas, atividade

antitrombínica,

Atividade anti-inflamatória (Lourenço,

2011)

Daucus carota

L. Cenoura

Disenterias, vermífugo,

úlceras pútridas,

escorbúticas e cancerosas;

já foi usada contra

elefantíase, estimulante.

Cistite, cálculos renais, afecções

cutâneas, edema, indigestão

flatulenta, e problemas

menstruais, antisséptica,

vermífuga, digestiva, refrescante

e tônico dos nervos. É usada

tambem em casos no tratamento

de anemia.

visão e cegueira noturna, alto teor

nutricional, prevenção de doenças

gastrointestinais, regularização da

glicemia, aumento da saciedade (Leite,

2010)

Polygonum

aviculare L.

Sanguinha

ou

centonódia

Adstringente, dissipação

do catarro, controle de

hemorragias e

principalmente a

hemoptísia, diarreia e

disenterias.

Alivia dores no estômago,

estimulante, diurético, emenagogo,

gota, anti-hemorroidal,

retenção de urina, afecções das

vias urinárias, adstringente,

cicatrizante, hemostática.

Anti-inflamatório (De Almeida)

Silybum

marianum (L.)

Gaertn. (¹)

cardo-

mariano - -

*Esta espécie é tratada atualmente pelo nome Paubrasilia echinata (Lam.) E. Gagnon, H.C. Lima

& G. P. Lewis – Gagnon et al. (2016). (¹) Informações medicinais ausentes no Flore Médicale.

(²) Plantas medicinais estudadas que aparecem no “Formulário e Guia Médico”, Chernoviz. (³)

Espécimes botânicas estudadas que fizeram parte da receita da Triaga Brasílica

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Resultados e Discussão

O uso de produtos naturais como forma de aliviar dores e enfermidades acontece

desde a Antiguidade, quase sempre aliado a procedimentos ritualísticos que reafirmam o

aspecto cultural por trás dos tratamentos terapêuticos (NOGUEIRA, 2009). Estudos recentes

indicam que esse uso possa ser recuado até os Neandertais, mostrando que indivíduos da

região de Sidrón (Espanha) comiam álamo, planta que contém naturalmente o ácido salicílico,

hoje tão comum na aspirina (WEYRICH et al., 2017). Nesse contexto, a obra Flore Médicale

pode ser considerada uma espécie de revisão científica, na qual Chaumeton referencia

diversos especialistas na área médica, farmacológica e botânica, como forma de refutar ou

aceitar as propriedades tradicionais das espécies terapêuticas. Tal revisão mostra como o

conhecimento científico acerca das plantas medicinais evoluía e como as experiências

empíricas auxiliaram na confecção de trabalhos como esse analisado. Referências a clássicos

como Hipócrates, Dioscórides, Plínio, Galeno, ou seus contemporâneos como Lamarck,

Humboldt, Bonpland, entre outros autores e estudiosos, serviram como base para comparação

dos conhecimentos populares em relação ao antigo e ao contemporâneo de Chaumeton.

Mesmo utilizando os saberes populares em sua obra, a forma de abordagem de Chaumeton

deixa claro seu desprezo por boa parte do conhecimento tradicional antigo, como se pode ler

neste exemplo: [...] “Muitos povos menos delicados que “nós”, colocavam a aveia no topo

alimentar” [...] (CHAUMETON, 1833). Dentre as espécies contidas no códice Flora

Medicinal, a grande maioria foi reproduzida a partir da obra ‘Flore Médicale’, exceto a

Anacardium ocidentale – vulgarmente conhecida como ‘caju’. A representação dessa espécie

foi produzida de forma original pelo Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda de Portugal e

não se parece de modo algum à ilustração presente na obra original, sendo mais detalhada,

viva e exuberante. Isso pode significar um conhecimento empírico dessa planta por parte dos

desenhistas e naturalistas portugueses, uma vez que tiveram contato direto com a flora

brasileira. O cajueiro é tratado na obra ‘Flore Médicale’ por meio de comparações estruturais

com outras plantas, a fim de facilitar o reconhecimento dessa espécie nativa do Brasil. Outra

planta local presente no estudo é a Paubrasilia echinata, o famoso pau-brasil. Na medicina

tradicional o pau-brasil é utilizado desde há muito, aparecendo na “Flore Médicale” como

adstringente, propriedade essa comprovada farmacologicamente por meio de estudos mais

recentes (Tabela 3). Grande parte das plantas do códice “Flore Medicinal” foi introduzida no

território brasileiro (Figura 1C) e permanece como cultivadas ou naturalizadas. Uma possível

explicação para o destaque de plantas exóticas é que o ser humano transporta plantas ao redor

do mundo há muito tempo em resposta às necessidades da agricultura, horticultura, etc.

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(ZENNI, 2015). As plantas fizeram parte de importantes circuitos de intercâmbios, comerciais

e culturais (KURY, 2009). Neste contexto, durante o processo de colonização e ocupação do

território brasileiro, muitas trocas culturais foram realizadas, inclusive aquelas envolvendo

plantas medicinais. Os conhecimentos trazidos pelos lusitanos e pelos africanos escravizados

se fundiram aos dos indígenas nativos, possibilitando o cultivo de novas espécies com

finalidade terapêutica e alimentar, e o aproveitamento das plantas nativas através do contato

com os povos indígenas. A identificação da distribuição dessas espécies botânicas pelo

território brasileiro permite relacionar, com certo nível de detalhe, o processo de colonização

com a utilização e, ou introdução de plantas medicinais. Não com a pretensão de propor uma

interpretação revisionista ou mesmo inovadora, mas sim para articular o contexto mais amplo

(o processo de colonização) ao objeto da pesquisa. Do ponto de vista geográfico, a Mata

Atlântica é um bioma costeiro e que foi alvo dos primeiros viajantes e colonizadores que

tiveram contato diretamente com a biodiversidade local. Nessa região foram instaladas as

primeiras vilas e cidades e dela foram extraídos diversos recursos naturais, como, por

exemplo, o pau-brasil. Além disso, a expansão agrícola e introdução de espécies exóticas

como a banana, o café, o trigo, entre outros (PAVAN-FRUEHAUF, 2000), possivelmente

levaram à retirada de recursos naturais nativos mesmo antes do conhecimento dos mesmos.

Das oito espécies medicinais que ocorrem na Amazônia, levantadas nesse trabalho, quatro são

nativas e o restante é classificado como cultivadas ou naturalizadas. Juntamente com sua

diversidade natural, havia um grande conhecimento tradicional composto por inúmeras etnias

que integrava toda uma cultura diversificada dos povos indígenas (CERQUEIRA, 2007).

Devido a sua alta biodiversidade e à cultura indígena, esperava-se nesta pesquisa um destaque

das plantas medicinais pertencentes a este bioma. No entanto, com o processo de colonização,

grande parte da extensão original foi perdida devido ao avanço do desmatamento nesse

ambiente. Porém, apesar do ímpeto destrutivo, alguns naturalistas também exploraram as

matas amazônicas atrás de suas riquezas, descrevendo, catalogando e ilustrando a

biodiversidade, como Alexandre Rodrigues Ferreira. Dos desenhos científicos contidos no

códice Flora Medicinal, mais da metade são representações de plantas medicinais do tipo

herbáceas (ervas) (Figura 1D). De todas as práticas terapêuticas que eram utilizadas no Brasil

colonial, o uso de ervas era o que detinha grande aprovação popular (EDLER, 2006). Do

ponto de vista tradicional, as ervas são muito utilizadas por curandeiros, médiuns, raizeiros,

parteiras, benzedeiras e por toda a população em geral. A relação das ervas com seu status

biogeográfico no território brasileiro ressalta, mais uma vez, a importância dos encontros

culturais entre os povos nativos, os africanos e os europeus. A seguir das folhas temos os

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frutos, que também são importantes na construção das farmacopeias tradicionais (Figura 2. A

e B). A utilização de frutos no contexto medicinal pode ser resultado do emprego das plantas

como alimento desde os grupos humanos pré-históricos (LORENZI E MATOS, 2008).

Verificamos ainda a presença dos fitoterápicos analisados neste trabalho em obras

importantes de medicina tradicional no século XIX como o de Chernoviz, “Formulário e Guia

Médico” e na receita da Triaga Brasílica (SANTOS, 2013), a qual foi muito difundida durante

o século XVIII.

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