planejamento territorial volume 2

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Estudo da Dimensão Territorial para o Planejamento Visão Estratégica Nacional MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E INVESTIMENTOS ESTRATÉGICOS

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Estudo da Dimensão Territorial para o Planejamento Visão Estratégica Nacional MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E INVESTIMENTOS ESTRATÉGICOS VOLUME II - VISÃO ESTRATÉGICA NACIONAL MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E INVESTIMENTOS ESTRATÉGICOS Brasília 2008

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  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

    Viso EstratgicaNacional

    MINISTRIO DO PLANEJAMENTO, ORAMENTO E GESTOSECRETARIA DE PLANEJAMENTO E INVESTIMENTOS ESTRATGICOS

    IIII

  • MINISTRIO DO PLANEJAMENTO, ORAMENTO E GESTOSECRETARIA DE PLANEJAMENTO E INVESTIMENTOS ESTRATGICOS

    ESTUDO DA DIMENSO TERRITORIAL PARA O PLANEJAMENTOVOLUME II - VISO ESTRATGICA NACIONAL

    Braslia2008

  • Copyright 2008 Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto

    Qualquer parte desta publicao pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

    Disponvel em: http://www.planejamento.gov.br/planejamentoterritorialTiragem desta edio: 1000 exemplaresImpresso no Brasil1 edio 2008

    MINISTRIO DO PLANEJAMENTO, ORAMENTO E GESTOSECRETARIA DE PLANEJAMENTO E INVESTIMENTOS ESTRATGICOS Esplanada dos Ministrios, bloco K, 3 andarTelefone: 55 (61) 3429-4343Fax: 55 (61) 3226-812270040-906 Braslia-DF

    Esta publicao uma realizao do Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto (MP) em parceria com Centro de Gesto e Estudos Estratgicos (CGEE) no mbito do Contrato de Prestao de Servios n27/2006, em 01/09/2006; Processo n03300.000415/2006-91, publicado no D.O.U. de 04/09/2006, seo 3, pgina 96; no D.O.U. de 19/9/2006, seo 3, pgina 85; e no D.O.U. de 27/7/2007 (Termo Aditivo).

    Catalogao: DIBIB/CODIN/SPOA/MP

    Brasil. Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto. Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratgicos - SPI. Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento: Volume II - Viso Estratgica Nacional / Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto. Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratgicos. Braslia: MP, 2008.

    185 p.

    1. Poltica econmica. 2. Planejamento territorial. I. Ttulo

    CDU: 338.2

  • Equipe Tcnica responsvel pela elaborao deste volume:

    Rosana Barros Boani Pauluci Coordenadora de MduloAntonio Carlos Filgueira GalvoBertha Koiffmann Becker ConsultoraConstantino Cronemberger MendesGilda Massari Coelho ConsultoraMrcio de Miranda SantosThiago Marques Ferreira

  • Viso Estratgica Nacional

    II

  • Sumrio

    PREFCIO ........................................................................................................ 9APRESENTAO ......................................................................................... 13LISTA DE SIGLAS ........................................................................................ 171. INTRODUO .......................................................................................... 192. METODOLOGIA DE CONSTRUO DA VISO ESTRATGICA NACIONAL ............................................... 21

    2.1 Modelo Terico de Foresight do CGEE ............................................212.2 Desenvolvimento Metodolgico de Elaborao da Viso Estratgica Nacional ....................................................................242.3 Principais Conceitos Adotados ...........................................................27

    3. VALORES E OBJETIVOS ESTRATGICOS .................................... 314. BASES DA ESTRATGIA TERRITORIAL DE DESENVOLVIMENTO ............................................................................... 37

    4.1 Fundamentos Gerais ..............................................................................374.2 Referncias Territoriais ..........................................................................48

    5. REFERENCIAIS DE FUTURO PARA A CONSTRUO DE ESTRATGIAS NACIONAIS ............................................................. 83

    5.1 Imperativos Globais e Linha do Tempo .............................................835.2 Fatos Portadores de Futuro ..................................................................955.3 Escolhas Estratgicas e Determinantes Nacionais............................97

    6. VISO ESTRATGICA NACIONAL E A CONCEPO DO PAS QUE QUEREMOS ....................................................................103

    6.1 Construo do Brasil Policntrico .....................................................1126.2 Vetores de Desenvolvimento Territorial ...........................................116

    7. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..................................................1458. ANEXO I PARTICIPANTES DE DISCUSSES .........................1579. ANEXO II VETORES DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL X FATOS PORTADORES DE FUTURO .............16110. ANEXO III LINHA DO TEMPO POR HORIZONTE TEMPORAL ..................................................................................................17111. ANEXO IV RELAO DE DIRETRIZES ESTADUAIS COMPILAO .............................................................................................175

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    PREFCIO

    A Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratgicos SPI, do Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto MP, apresenta o Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento, desenvolvido em parceria com o Centro de Gesto de Estudos Estratgicos - CGEE que servir para subsidiar a insero da dimenso territorial no planejamento governamental.

    O estudo ora apresentado insere-se no esforo do Governo Federal de instrumentalizar o debate acerca da necessidade de se olhar o territrio como base do desenho das polticas pblicas de mdio prazo que dialogue com a viso de longo prazo.

    O estudo aborda o territrio de forma no-convencional com uma metodologia de planejamento governamental que incorpora a dimenso territorial como orientador da ao pblica programtica.

    O combate s desigualdades, regionais e sociais, deve estar no foco das polticas pblicas. Assim, parte importante da estratgia de planejamento territorial implica a promoo do desenvolvimento das regies menos dinmicas do pas.

    A Constituio Federal de 1988, que definiu o Plano Plurianual, organizou de forma regionalizada a ao pblica pela primeira vez.

    Os instrumentos de ao pblica devem considerar a necessidade da regionalizao dos gastos desde a formulao da poltica pblica, a partir das necessidades identificadas pelos cidados, at a avaliao dos impactos dessas polticas.

    Nos anos 70 e 80, o Brasil perdeu sua capacidade de planejamento com a crise da dvida e a hiperinflao. Na dcada de 90, o pas alcanou a estabilidade da moeda com o Plano Real, mas foram necessrias fortes medidas de ajuste fiscal que tiraram do Estado brasileiro sua capacidade de investimento e afetaram fortemente o crescimento econmico, prejudicando a retomada das aes de planejamento.

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    Hoje o cenrio mudou e o pas tem conseguido manter a estabilidade macroeconmica e crescimento, possibilitando ao governo o resgate do planejamento das aes pblicas que observado nos diversos planos nacionais, tais como o Plano Nacional de Logstica e Transportes, o Plano Decenal Energtico, o Plano de Desenvolvimento da Educao, Programa de Acelerao do Crescimento PAC e Territrios da Cidadania.

    Inserir a dimenso territorial no planejamento significa eleger o territrio como plataforma de integrao das polticas pblicas e, assim, situar-nos no cerne do debate acerca da eficincia e qualidade dos gastos pblicos. Para isso, precisamos incorporar metodologias, ferramentas e prticas modernas orientadas para resultados e foco no cidado.

    O Estado brasileiro precisa de polticas pblicas capazes de garantir igualdade de oportunidades, os direitos bsicos de cidadania e o desenvolvimento sustentado, organizadas em planos de mdio e longo prazo com estabilidade de fluxo oramentrio e financeiro a fim de garantir a concluso do que foi iniciado.

    Devemos superar a viso setorial incorporando a dimenso territorial. Ao se estabelecer os territrios como base das demandas sociais, torna-se mais fcil a compreenso das causas do problema a ser enfrentado e a priorizao das aes a serem implementadas.

    Tanto na rea social, como nas polticas educacionais, de sade, ou nas questes de infra-estrutura e segurana, os diagnsticos dos territrios deveriam ser a primeira referncia para a delimitao da ao e a priorizao dos gastos, garantindo que a populao beneficiada com a ao pblica seja a que mais necessita da ajuda do Estado e no apenas aqueles mais bem capacitados institucionalmente.

    Da mesma forma, o planejamento territorial favorece o dilogo federativo focado no enfrentamento das fragilidades e potencialidades de cada um dos entes, alm de abrir canais de participao com a sociedade, cobrando nova postura dos movimentos sociais, agora co-responsveis pelas polticas pblicas.

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    Para se integrar de forma competitiva no cenrio internacional, o Brasil precisa aumentar o grau de coeso do desenvolvimento entre as regies, de forma a potencializar a diversidade das foras produtivas, incorporando novos agentes econmicos com a formao de um mercado de massa dinamizador do mercado interno.

    Espera-se com a publicao dos principais resultados do Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento, estar contribuindo para que o Estado avance o seu olhar estratgico sobre os rumos que se deseja para o desenvolvimento nacional, ao mesmo tempo em que se municia para alcanar maior qualidade do gasto pblico.

    Paulo Bernardo SilvaMinistro do Planejamento, Oramento e Gesto

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    APRESENTAO

    O presente Estudo tem por objetivo subsidiar a abordagem da dimenso territorial no planejamento nacional, procurando contribuir para responder s inquietantes indagaes que desenharo o nosso futuro: Como estaro distribudas a capacidade produtiva, a rede de oferta de servios e a infra-estrutura ao longo do territrio nacional daqui a vinte anos? Onde estaro as pessoas, para onde se daro os fluxos migratrios? Quais os impactos territoriais das novas tecnologias? Enfim, qual o Brasil que queremos ter em 2027?

    O Estudo procurou apresentar alternativas de aes para se alcanar uma organizao territorial do pas que promova o desenvolvimento sustentvel de suas diversas regies e a reduo das desigualdades sociais e regionais. Nessa linha, sete grandes diretrizes orientaram o desenvolvimento do projeto:

    Superao das desigualdades sociais e regionais. 1. Fortalecimento da unidade (coeso) social e territorial. 2. Promoo do potencial de desenvolvimento das regies. 3. Valorizao da inovao e da diversidade cultural e tnica da 4. populao brasileira. Promoo do uso sustentvel dos recursos naturais encontrados no 5. territrio brasileiro. Apoio integrao sul-americana. 6. Apoio insero competitiva e autnoma do pas no mundo 7. globalizado

    O Estudo estruturou-se formalmente em oito mdulos, envolvendo atividades e produtos complementares e articulados entre si. Os oito mdulos compreendem o marco inicial, um servio de georreferenciamento e seis linhas principais de atividades. A organizao metodolgica permite dividi-las em duas partes principais: uma associada s definies de contexto e aos referenciais bsicos de suporte da operao de montagem de uma carteira de investimentos, compreendendo as atividades e produtos relacionados aos mdulos 2, 3 e 4; outra relacionada s atividades de estruturao e tratamento dos investimentos selecionados para a carteira, abordando os produtos e atividades dos mdulos 5, 6 e 7.

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    O Mdulo 1 (Marco Inicial) tem como objetivo definir as bases conceituais e metodolgicas do Estudo, bem como apresentar o detalhamento dos outros sete mdulos, com a descrio das atividades, produtos, cronograma fsico-financeiro e estrutura de gesto do Estudo.

    Este Mdulo 2 (Viso Estratgica) apresenta uma viso estratgica para o territrio nacional no horizonte de 2027, considerando os referenciais temporais intermedirios de 2011 e 2015, que coincide com os anos de concluso dos prximos dois Planos Plurianuais (2008/2011 e 2012/2015). Para tanto, lana novo olhar sobre o territrio nacional, identificando seis grandes regies homogneas, para as quais identifica vetores de desenvolvimento. Foram analisados os imperativos globais e determinantes nacionais que impem obstculos ou oferecem oportunidades ao projeto de estruturao de uma nova organizao do territrio nacional, assim como identificados os principais fatos portadores de futuro que podero influenciar essa trajetria. O Mdulo 3 (Regies de Referncia) construiu uma regionalizao em duas escalas (macrorregional e sub-regional) para o territrio brasileiro que permite subsidiar a escolha e localizao de projetos de investimentos, bem como a articulao de polticas pblicas. Foram considerados critrios econmicos, ambientais e sociopolticos na definio das regies, que tm em conta o papel desempenhado pelas cidades na organizao do territrio, dada a fora de polarizao em sua rea de influncia. Ainda, a aposta na estratgia de desconcentrao e desenvolvimento mais equilibrado do pas levou escolha de novos plos, vrtices de uma rede policntrica de cidades, estrutural para a nova organizao territorial pretendida.

    O Mdulo 4 (Estudos Prospectivos - Escolhas Estratgicas) objetivou realizar anlises prospectivas sobre setores tais como transportes, energia, comunicaes, infra-estrutura hdrica, saneamento, habitao e temas como meio-ambiente, demografia e inovao , os quais tm repercusses importantes na dinmica e organizao territorial atual e futura do pas. Adotando abordagem multidisciplinar, almejou-se explorar os futuros possveis a mdio e longo prazo, em exerccio de antecipao para subsidiar a tomada de deciso. Ademais, buscou-se examinar as polticas pblicas e apontar as estratgias que poderiam ser adotadas para aproximar o pas do futuro desejado para 2027. Como resultado desse processo foram selecionadas - luz dos imperativos globais, determinantes nacionais, elementos de futuro

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    e gargalos (identificados pelos mdulos 2 e 4) - 11 iniciativas ou grandes linhas de ao que moldam a jornada de desenvolvimento territorial do Brasil nos prximos 20 anos.

    O Mdulo 5 (Carteira de Investimentos) lanou-se identificao de conjunto de iniciativas estratgicas, compreendendo as dimenses econmica, social, ambiental e de informao/conhecimento. Sua elaborao considerou dois momentos distintos: um levantamento de iniciativas j existentes no mbito do governo federal e do setor produtivo, as quais seriam objetos de anlise dos mdulos 6 e 7. Esses mdulos, por sua vez, indicaram, como resultado de suas avaliaes, o grau de distanciamento/ proximidade da carteira de investimentos proposta e os objetivos perseguidos para a organizao territorial futura do pas. Aps essa anlise, a equipe do mdulo 5 procedeu a complementao da carteira, com iniciativas que aproximassem o territrio nacional trajetria almejada.

    O Mdulo 6 (Impactos Econmicos da Carteira de Investimentos) analisou os impactos socioeconmicos da carteira de investimentos nas regies de referncia identificadas no mdulo 3, alm de o fazer tambm para as unidades federativas. A metodologia para gerao de cenrios setoriais e regionais articula modelos de Equilbrio Geral Computvel nacional, insumo-produto interestadual e mdulos de decomposio microrregionais (econometria espacial). Foram feitas simulaes para o curto (perodo de 4 anos, fase de implantao dos projetos) e mdio prazos (fase de operao dos projetos). Dadas as caractersticas do modelo, os investimentos da carteira atinentes a desenvolvimento agrrio, meio-ambiente, educao e sade no puderam ser avaliados . Vale destacar, no entanto, que tais investimentos foram avaliados sob o ponto de vista da sustentabilidade (mdulo 7).

    O Mdulo 7 (Avaliao da Sustentabilidade da Carteira de Investimentos) compreendeu a anlise de sustentabilidade da carteira de investimentos por regio de referncia, por meio da construo e do teste de um modelo de avaliao de sustentabilidade, como processo simplificado de Avaliao Ambiental Estratgica. Partiu-se da anlise da situao atual de sustentabilidade de todas as unidades federativas e se estimaram os impactos provenientes da implantao e operao dos diferentes agrupamentos setoriais da carteira de investimento nos territrios.

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    O mdulo 8 (Servios de Georreferenciamento) contempla a sistematizao das informaes utilizadas nos vrios mdulos do Estudo em bases georreferenciadas.

    Com este Estudo, tm sido geradas contribuies para o aperfeioamento da funo planejamento no pas , notadamente no que se refere considerao da dimenso territorial do desenvolvimento na formulao, gesto e implementao das polticas pblicas.

    Os principais resultados do Estudo so agora disponibilizados em sete volumes, a saber:

    Volume I Sumrio ExecutivoVolume II Viso Estratgica NacionalVolume III Regies de Referncia Volume IV Estudos Prospectivos - Escolhas EstratgicasVolume V Carteira de InvestimentosVolume VI Impactos Econmicos da Carteira de InvestimentosVolume VII Avaliao de Sustentabilidade da Carteira de Investimentos

    As opinies expostas no estudo refletem o trabalho tcnico desenvolvido pelos pesquisadores, que certamente vm enriquecer as discusses no mbito do Governo Federal, dos demais entes federativos e das entidades da sociedade civil que se debruam sobre os temas abordados.

    Secretaria de Planejamento e Investimentos EstratgicosMinistrio do Planejamento, Oramento e Gesto

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    LISTA DE SIGLAS

    AND Agenda Nacional de DesenvolvimentoBR3T Projeto Brasil Trs TemposBRIC Brasil, Rssia, ndia e ChinaCDES Conselho Nacional de Desenvolvimento Econmico e SocialCGEE Centro de Gesto e Estudos EstratgicosCT&I Cincia, Tecnologia e InovaoIEA/USP Instituto de Estudos Avanados da Universidade de So PauloIIRSA Iniciativa de Integrao da Infra-Estrutura Regional Sul-americanaIPCC Painel Intergovernamental em Mudanas do ClimaLDO Lei de Diretrizes OramentriasLOA Lei Oramentria AnualNAE/PR Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da RepblicaNIC National Intelligence CouncilONU Organizao das Naes UnidasP&D Pesquisa e DesenvolvimentoPAS Plano Amaznia SustentvelPIB Produto Interno BrutoPNDR Poltica Nacional de Desenvolvimento RegionalPPA Plano PlurianualSPI/MP Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratgicos do Ministrio do Planejamento Oramento e GestoTIC Tecnologias de Informao e ComunicaoVESA Viso Estratgica Sul-Americana

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    1. INTRODUO

    Pensar o futuro de uma nao um projeto complexo e desafiador. No aceitar esse desafio condenar o pas a vagar pelo tempo, sem rumo definido e sem saber se estamos realmente caminhando em direo a um futuro desejado. Num pas de recursos escassos, escolher uma boa rota, aproveitar oportunidades e precaver-se de escolhas erradas essencial (Wright e Spers, 2006).

    A obteno de mais informaes sobre eventos futuros se faz por meio de estudos prospectivos, de tal forma que as decises de hoje sejam mais solidamente baseadas no conhecimento tcito e explcito disponvel (Coelho, 2001). A atividade prospectiva se define como um processo mediante o qual se chega a uma compreenso mais plena das foras que moldam o futuro de longo prazo e que devem ser levadas em conta na formulao de polticas, no planejamento e na tomada de deciso. A atividade prospectiva est, portanto, estreitamente vinculada ao planejamento (Coates, 1985).

    Os exerccios de prospeco buscam entender as foras que orientam o futuro, promover transformaes, negociar espaos e dar direo e foco s mudanas. Tais estudos so conduzidos de modo a construir conhecimento, ou seja, buscam agregar valor s informaes do presente para transform-las em conhecimento e subsidiar os tomadores de deciso e os formuladores de polticas, destacando rumos e oportunidades para os diversos atores sociais.

    Este documento est estruturado de forma a apresentar no Captulo 2 a metodologia de construo da viso estratgica nacional, contando para isso com a descrio do modelo terico de foresight do CGEE, o desenvolvimento metodolgico da elaborao da viso e os principais conceitos adotados1. O Captulo 3 apresenta argumentos sobre os valores e objetivos que fundamentam a construo da viso. No Captulo 4 faz-se a apresentao e discusso das bases da estratgia territorial do desenvolvimento: fundamentos gerais, referncias territoriais e vises contemporneas de futuro. O Captulo 5 traz uma observao seguida de anlise dos referenciais de futuro para a construo das estratgias nacionais: imperativos globais e linha do tempo, fatos portadores de futuro, determinantes nacionais e escolhas estratgicas. E, finalmente, o Captulo 6 apresenta a concepo estratgica do Pas que

    1 Estes conceitos foram adotados para a construo do Mdulo 2 - Viso Estratgica Nacional no mbito do Projeto do Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento.

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    queremos: construo do Brasil policntrico, vetores de desenvolvimento territorial e o enunciado da Viso Estratgica Nacional.

    O Anexo I contempla minimamente a relao de participantes de discusses em fruns especficos2. No Anexo II, demonstra-se, por meio de matriz de relacionamento, a relao entre Vetores de Desenvolvimento Territorial e Fatos Portadores de Futuro, por Territrio da Estratgia. O Anexo III apresenta a linha do tempo com os eventos distribudos no mais por dimenso, mas pela data possvel de ocorrncia. Para aqueles eventos cuja previso se situa entre duas faixas temporais, a opo metodolgica foi aloc-los numa data intermediria, entre o perodo inicial e final. Finalmente, o Anexo VI apresenta a relao compilada de diretrizes estaduais.

    O desenvolvimento do Mdulo 2 foi conduzido, em larga medida, juntamente com o Mdulo 4. Tal opo fundamentou-se na possibilidade de contar com um grande nmero de especialistas setoriais e temticos para a discusso das perspectivas de futuro para o Brasil e o mundo. Nesse sentido, foram identificados fatos portadores de futuro, tendncias e questes estratgicas, que contriburam para a reflexo, discusso e construo da Viso Estratgica Nacional. Vale destacar o nmero de pessoas envolvidas nas discusses sobre a construo do futuro para o Pas que queremos.

    Quadro 1: Reunies e participantes de discusses de contedos includos na construo da Viso Estratgica Nacional

    Reunies de discusso Quantidade

    Reunies de discusso do contedo do Mdulo 2 (no necessariamente integrais) 14

    Workshop prospectivos 6

    Entrevistas estruturadas 5

    Participantes (inclusives especialistas em suas especialidades) Quantidade

    Participantes das discusses 374

    2 As discusses, entrevistas e workshops foram realizados no mbito do Mdulo 2 Viso Estratgica Nacional e Mdulo 4 Estudos Prospectivos Setoriais e Temticos Referenciados no Territrio do Projeto do Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento.

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    2. METODOLOGIA DE CONSTRUO DA VISO ESTRATGICA NACIONAL

    A metodologia utilizada na construo da Viso Estratgica Nacional tem fundamento no conceito de foresight e na abordagem metodolgica desenvolvida pelo Centro de Gesto de Estudos Estratgicos (CGEE) para a conduo de estudos de futuro, com as adaptaes necessrias aos objetivos do Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento.

    2.1 Modelo Terico de Foresight do CGEEAtualmente existe uma extensa lista de campos de estudo relacionados com a temtica de explorar o futuro. A denominao mais utilizada internacionalmente, particularmente por estudos em mbito governamental, e que adotada pelo CGEE, o foresight, que inclui meios qualitativos e quantitativos para monitorar pistas e indicadores das tendncias de desenvolvimento e seu desenrolar, e melhor e mais til quando diretamente ligado anlise de polticas e suas implicaes. O foresight nos prepara para as oportunidades futuras.

    Estudos prospectivos constituem poderosos auxiliares do planejamento e do gerenciamento dos nveis de incerteza, porm precisam estar inseridos em um contexto planejado, isto , estar embasados em diretrizes e necessidades pr-estabelecidas. Sua efetividade est intrinsecamente ligada a um desenho metodolgico adequado, o qual s pode ser obtido a partir de uma delimitao precisa das questes a serem respondidas, do tipo de resposta desejada, da orientao espacial, do escopo do tema, bem como da estruturao de uma rede de atores capazes de se articularem de forma a buscarem consensos e comprometimentos necessrios implementao das linhas de ao identificadas.

    O modelo terico organizado apresentado na Figura 1 e foi construdo levando-se em conta a estrutura metodolgica proposta por Horton (1999) e aprimorada a partir das idias de Conway e Voros (2002). Seguiu tambm as orientaes do Handbook of Knowledge Society Foresight (2002).

    A conduo de exerccios prospectivos no CGEE busca seguir o modelo terico apresentado abaixo, considerando quatro grandes conjuntos para sua execuo:

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    Definio de Objetivos - So as diretivas estratgicas que 1. fundamentam o estudo.Seleo de Tpicos - Uma vez definidos os objetivos para o 2. estudo prospectivo, so selecionados os tpicos considerados prioritrios a partir do reconhecimento das questes crticas a serem respondidas.

    Figura 1 Modelo terico de foresight do CGEE

    Implementao do Exerccio Prospectivo - Este passo, de modo geral, 3. dividido em trs fases. Cada fase agrega valor em relao seguinte, criando uma cadeia que transforma informao em conhecimento e este em estratgia. A cada fase, tem-se um nvel maior de complexidade, diminuindo o nvel de incerteza e aumentando o potencial de contribuio dos resultados do exerccio ao processo de tomada de deciso.

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    Fase inicial - Esta fase corresponde coleta, organizao e resumo das informaes disponveis sobre o tpico ou tema sob anlise, utilizando para isso estudos, diagnsticos, anlises e sistemas de inteligncia, de forma a construir um melhor entendimento sobre o entorno do problema. Identificam-se oportunidades e ameaas, foras e fraquezas e delimitam-se os fatores sociais, tecnolgicos, econmicos, ambientais, polticos e valores culturais que potencialmente impactam o tema/tpico sob estudo. De modo complementar, so identificados e mobilizados os demais atores relevantes.Exerccio Principal - Durante o exerccio principal, esto presentes processos de traduo e interpretao acerca das tendncias correntes e das possibilidades futuras, utilizando tcnicas de previso e de prospeco (forecast e foresight). Enfatiza-se, nessa fase, a ampla participao de especialistas, grupos de interesse e tomadores de deciso, fortalecendo as redes criadas e o aprendizado coletivo. O resultado esperado enriquecer o conhecimento existente com um melhor entendimento dos condicionantes envolvidos e das possibilidades apresentadas para o futuro. Fase de disseminao - Nessa fase, busca-se disseminar os resultados e reforar o comprometimento dos atores que participaram da etapa anterior com as decises que decorrerem dela a partir de procedimentos de validao, divulgao e assimilao para audincias mais amplas. Os resultados esperados so o estabelecimento de consensos e comprometimentos e a transformao do conhecimento acumulado em estratgicas e propostas passveis de serem apropriadas pelos tomadores de deciso, buscando a expanso da percepo das opes estratgicas.

    Tomada de Deciso - Nesta fase, busca-se selecionar as opes 4. estratgicas mais adequadas dentre as identificadas como possveis, partindo da interao com principais tomadores de deciso. Os resultados esperados envolvem a definio de mecanismos e instrumentos para implementao das opes selecionadas, bem como a identificao de outros temas para aprofundamento e anlise futura.

    A Figura 2, a seguir, apresenta o modelo expandido da metodologia atualmente em uso pelo CGEE. A idia central dessa abordagem proporcionar flexibilidade ao planejamento das aes, tendo em vista o alto nvel de incerteza associado aos ambientes complexos.

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    Figura 2 Esquema expandido do modelo terico do CGEE para estudos prospectivo

    2.2 Desenvolvimento Metodolgico de Elaborao da Viso Estratgica NacionalEm sua fase de planejamento, a metodologia proposta levou em conta a definio dos seus principais elementos, tais como: horizonte temporal, atores envolvidos, prazos, organizao e gesto do processo; ferramentas e tcnicas a serem empregadas, consultas a especialistas, parcerias para a execuo e relao com as iniciativas j existentes.

    Em funo da natureza deste Projeto, selecionaram-se tcnicas e ferramentas utilizadas em estudos de futuro com base no conceito de foresight, sendo as mais freqentes a realizao de notas tcnicas, reviso de literatura, sesses de brainstorming, workshops para a produo de snteses e cruzamentos temticos e setoriais, painis de especialistas e workshops de validao. Importante destacar que muitas dessas tcnicas e ferramentas selecionadas visaram, tambm, proporcionar espao para amplo aprendizado coletivo, construo de consensos e mapeamento de divergncias, processos intangveis de grande valor que resultam da aplicao da abordagem utilizada pelo CGEE. Trata-se, portanto, de abordagem atual, que tem por inteno explorar idias no contexto prospectivo, enfrentando possveis trajetrias para o desenvolvimento.

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    As anlises referentes construo da Viso Estratgica Nacional consideram eventos com ocorrncias provveis localizadas em 2015 e 2027. A figura abaixo apresenta o fluxo de elaborao de produtos3 a partir da definio dos objetivos que norteiam toda a operao.

    Considerados os objetivos definidos pelo projeto de estudo, a Viso Estratgica Nacional foi construda por meio de um processo estruturado, que originou trs produtos intermedirios. Tal processo constituiu-se, em grande medida, de: (1) desenvolvimento de novos estudos com referenciais internacionais (anlise de estudos internacionais realizados) e a anlise de estudos temticos e setoriais j conduzidos pelo CGEE; (2) anlise integrada dos estudos considerados, com as discusses e entendimentos produzidos nos demais mdulos deste projeto (como apresenta a Figura 4); (3) interao com especialistas nacionais e internacionais em temas e setores prioritrios (por intermdio de outros estudos, conduzidos paralelamente pelo CGEE).

    Figura 3 Fluxo de elaborao de produtos da Viso Estratgica Nacional, a partir dos Objetivos

    3 Estes produtos foram elaborados no mbito do Mdulo 2 - Viso Estratgica Nacional do Projeto do Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento.

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    Figura 4: Etapas e inter-relao entre os mdulos do Projeto de Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento, no que se refere

    construo da Viso Estratgica Nacional

    O primeiro estudo referente construo da Viso Estratgica Nacional, Vises Contemporneas de Futuro produto 1, teve como objetivo relacionar vises de futuro existentes. Contempla a compilao e anlise de entendimentos postos at aqui sobre as perspectivas de futuro para o Brasil e o mundo, tendo por base estudos nacionais e internacionais j realizados e disponveis.

    O segundo momento envolveu o desenvolvimento do estudo Estratgia Territorial do Desenvolvimento Brasileiro produto 2, que construiu os fundamentos de uma viso estratgica nacional, considerando uma nova territorializao e a identificao preliminar de vetores de desenvolvimento territorial, alm de uma perspectiva do ordenamento do territrio brasileiro para o horizonte temporal de 2027. Incorpora, ainda, entendimentos produzidos por outros mdulos4 do Projeto de Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento.

    Em seguida, o terceiro momento contemplou a elaborao da Viso Estratgica Consolidada (preliminar) produto 3, que consolida as informaes contidas nos produtos 1 e 2 do Mdulo 2, alm de incorporar: (a) resultados preliminares

    4 Mdulo 3 Regies de Referncia e Mdulo 4 Estudos Prospectivos Setoriais e Temticos Referenciados no Territrio.

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    dos exerccios prospectivos setoriais e temticos realizados no Mdulo 45; (b) resultados do Mdulo 3 Regies de Referncia; (c) resultados de outros estudos prospectivos realizados pelo CGEE; (d) entendimentos produzidos nos mdulos6 5 e 6.

    Vale destacar que essa etapa incorporou maior inter-relacionamento com os Mdulos 3 e 4 (ver nota 5), como pode ser observado na Figura 5. A efetividade dessa inter-relao obtida por meio de anlises de estudos setoriais, temticos e regionais realizadas nos Mdulos 3 e 4 (ver nota 5), reunies de coordenao com especialistas de todos os Mdulos, e por meio da consulta a especialistas (entrevistas estruturadas).

    Por fim, a composio da Viso Estratgica Nacional incorpora: (1) os resultados finais dos Mdulos 3 e 4 (ver nota 5); (2) a reviso das bases constitutivas da viso, com seus fundamentos, anlise da organizao territorial atual do Brasil e vises de futuro; (3) a reviso da linha do tempo, tendo em vista novos estudos apresentados; (4) a reviso e adequao dos fatos portadores de futuro; (5) a definio da relao mais precisa entre vetores de desenvolvimento territorial, fatos portadores de futuro e escolhas estratgicas; e (6) o enunciado final da Viso Estratgica Nacional. Prev, ainda, a validao da Viso Estratgica Nacional com especialistas.

    2.3 Principais Conceitos Adotados Apresentam-se, a seguir, os conceitos norteadores da construo da Viso Estratgica Nacional, de forma a possibilitar um entendimento mais claro do que estar sendo desenvolvido e sobre as orientaes tericas que fundamentam o seu processo de construo.

    Configurao territorialCompreende a distribuio de elementos, processos e relaes sociais no territrio em um dado momento (Coraggio, 1980).

    Determinantes nacionaisSo questes de mbito nacional, sobre as quais se tem governabilidade e que condicionam opes e escolhas estratgicas do pas.

    5 Mdulo 4 Estudos Prospectivos Setoriais e Temticos Referenciados no Territrio.6 Mdulo 5 Carteira de Investimentos e Mdulo 6 Impactos da Carteira de Investimentos por Regio de Referncia.

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    Fatos portadores de futuroSo fatos mutantes ou portadores de mutaes associados a acontecimentos ou inovaes capazes de afetar um sistema, ao estabelecer pontos de inflexo em tendncias observadas, ou determinar escolhas irreversveis por partes de atores importantes (Prigogine, apud Dagnino, 1997). No mbito do estudo, so considerados pontos orientadores para a identificao e seleo de vetores de desenvolvimento territorial.

    Gargalos nacionaisSo obstculos que dificultam a operacionalizao de estratgias, planos e programas ou que afetam diretamente os seus resultados.

    Imperativos globaisSo questes relacionadas com o planejamento nacional sobre as quais se tem pouco ou nenhum controle, ou ingerncia, e que restringem as possibilidades de modelar o futuro.

    Linha do tempo (Timeline) a seqncia de eventos de diferentes naturezas, organizados em ordem cronolgica e posicionados ao longo de uma linha temporal. A linha do tempo pode apresentar uma evoluo histrica ou posicionar, no futuro, a data provvel de ocorrncia de eventos possveis.

    Organizao TerritorialCompreende uma configurao territorial para a qual possvel identificar as relaes legais e fenmenos que a explicam.

    ProspecoA atividade prospectiva se define como um processo mediante o qual se chega a uma compreenso mais plena das foras que moldam o futuro de longo prazo e que devem ser levadas em conta na formulao de polticas, no planejamento e na tomada de deciso. A atividade prospectiva est, portanto, estreitamente vinculada ao planejamento (Coates, 1985).

    A obteno de mais informaes sobre eventos futuros se faz por meio de estudos prospectivos, de tal forma que as decises de hoje sejam mais solidamente baseadas no conhecimento tcito e explcito disponvel (Coelho, 2001).

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    RegioA regio resultado da prtica dos detentores do poder e da prtica social coletiva que demarca um territrio. Corresponde a um nvel de agregao das coletividades locais e seus territrios no interior do Estado-Nao, que tem em comum as diferenas de base econmica, poltica e cultural em relao s demais, capazes de gerar uma identidade prpria da populao, que se manifesta numa finalidade social e poltica prpria e em modos especficos de relacionamento com o poder hegemnico (Becker, 1986).

    TendnciasSo padres evidenciados a partir da anlise da ocorrncia de eventos no passado. Permitem estabelecer previses sobre o futuro, construdo na hiptese de que as coisas mudam na mesma direo e no mesmo ritmo que no passado e no presente. (University of Arizona, 2007; Prospectiva Madrid 2014, 2006).

    TerritrioO conceito tem varias razes, mas medida que se construram e se consolidaram os Estados-Nao, o territrio passou a ser identificado com sua base geogrfica, o sustentculo fsico da soberania nacional. Territrio o espao da prtica. Por um lado, o produto da prtica espacial, que inclui a apropriao efetiva ou simblica de um espao e implica a noo de limite componente de qualquer prtica , manifestando a inteno de poder sobre uma poro precisa do espao. Por outro lado, tambm um produto usado, vivido pelos atores, utilizado como meio para sua prtica. A territorialidade humana uma relao com o espao que tenta afetar, influenciar ou controlar aes a partir do controle do territrio. a face vivida do poder.

    Territrio da estratgiaSo territrios abrangentes definidos como tal por realar os traos fundamentais da organizao territorial do pas. Justificam-se no estudo por servirem de base para o delineamento dos vetores estratgicos de desenvolvimento, relacionando-se com as escalas macro e sub-regionais que referenciam as carteiras de investimento.

    ValoresSo virtudes desejveis ou caractersticas bsicas positivas que se quer adquirir, preservar e incentivar (Unicamp, 2004).

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    Vetores de desenvolvimento territorialCompreendem as principais linhas de referncia para a estruturao das estratgias de desenvolvimento associadas s principais unidades que do nexo atual organizao territorial do pas. Os vetores devem orientar a estruturao das carteiras de investimento que detalham as iniciativas de ao sugeridas pelo Estudo.

    Viso estratgica nacionalDescreve, em termos ideais, o pas que se deseja para o futuro de mdio e longo prazos, a partir dos resultados esperados de polticas, programas e projetos estratgicos. A viso estratgica d direcionamento e inspirao para a fixao de metas para um projeto nacional (Unicamp, 2004).

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    3. VALORES E OBJETIVOS ESTRATGICOS

    Pensar o desenvolvimento brasileiro futuro implica lidar com as trajetrias provveis de evoluo do pas luz de imperativos globais, determinantes nacionais, escolhas estratgicas e fatos portadores de futuro que podem moldar essa jornada. A atual organizao territorial do Brasil pode ser superada pela ao decidida dos seus cidados, a partir de uma estratgia que organize as aes de desenvolvimento no todo e em cada frao do Territrio Nacional e se oriente pelas configuraes futuras desejveis e viveis no horizonte adotado. Para isso, necessrio estabelecer objetivos claros e pactu-los amplamente com a sociedade.

    Na conduo dessa tarefa, algumas referncias importantes podem ser invocadas. Um conjunto de instrumentos normativos e de planejamento, oriundos de processos constitucionais ou iniciativas governamentais recentes, podem servir a esse propsito, emprestando maior solidez s orientaes contidas na viso estratgica nacional. Ao longo do atual Governo, quatro referenciais7 se destacam:

    O Plano Plurianual vigente (PPA 2004-2007), coordenado pelo Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto (MP), elemento principal de referncia de nosso Estudo;A Agenda Nacional de Desenvolvimento (AND), emanada pela instncia mxima de representao social junto ao Poder Executivo, representada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (CDES);O Projeto Brasil 3 Tempos (BR3T), coordenado pelo Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica (NAE), orientado para referenciais estruturais e de longo prazo da economia e sociedade brasileiras;A Viso Estratgica Sul-Americana (VESA), articulada ao esforo da Iniciativa de Integrao da Infra-Estrutura Regional Sul-americana (IIRSA).

    7 No incio do segundo mandato do Presidente Lula, foi lanado o Programa de Acelerao do Crescimento PAC, que abrange o perodo de 2007-2010 e visa promover o desenvolvimento por meio de um amplo conjunto de investimentos em infra-estrutura e um grupo de medidas de incentivo e facilitao do investimento privado. O seu lanamento ocorreu quando o Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento j estava em sua fase final e no ser objeto de anlise na concepo da Viso Estratgica Nacional, que tem uma perspectiva de mdio e longo prazos. Por outro lado, constitui um elemento fundamental da elaborao da Carteira de investimentos (Mdulo 5 do Projeto de Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento).

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    Todos esses documentos assinalam rumos para o desenvolvimento territorial brasileiro e servem de base para escolhas iniciais desse Estudo. H referncias indispensveis como, por exemplo, a proposta de adoo de um modelo de consumo de massas incorporada ao PPA 2004-2007 ou a prioridade absoluta para a reduo das desigualdades sociais e regionais sugerida pela AND. Dessa forma, se h um contedo normativo implcito na escolha dos objetivos da viso estratgica nacional, o uso dos referenciais oficiais de planejamento reduz o grau de arbitrariedade nela envolvido.

    Propor rumos para o desenvolvimento brasileiro no se coaduna, necessariamente, com a satisfao dos desejos de todas as fraes da populao. A superao dos eventuais conflitos de interesse pressupe a utilizao dos instrumentos democrticos existentes para uma efetiva validao social dos valores, objetivos e opes estratgicas selecionadas.

    A estratgia territorial de desenvolvimento parte de valores que conformam toda a construo do Estudo. Adotou-se como referncia o conjunto de valores declarados na Agenda Nacional de Desenvolvimento (CDES, 2005) pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social, que mescla representaes dos poderes constitudos com representaes mais amplas da sociedade civil. So eles:

    Democracia; Liberdade; Eqidade; Identidade Nacional; Sustentabilidade; Respeito diversidade sociocultural; Soberania.

    Esses valores j apontam, em larga medida, para os objetivos que se definem frente. Espelham anseios maiores da sociedade nacional em pleno exerccio da democracia. Em parte, apresentam dimenses essenciais da nacionalidade, muitas delas pouco consideradas em projetos anteriores de desenvolvimento, especialmente em momentos de menor liberdade poltica.

    Ao lado dos valores, um conjunto de fundamentos e outro de meios esclarecem aspectos importantes a considerar na seleo dos objetivos do

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    Estudo, justificando-se pela aderncia ao seu objeto especfico principal, o territrio. Toda a concepo proposta de desenvolvimento parte da considerao direta de que o territrio referncia indispensvel e decisiva para alcance dos objetivos pretendidos. Isso reala o significado de alguns fundamentos e meios que organizam os princpios e espaos preferenciais de atuao subjacentes viso de desenvolvimento defendida no Estudo.

    Os quatro fundamentos principais, abordados com maior profundidade no prximo captulo, representam alicerces indispensveis da viso, pois sem eles o conjunto de objetivos poderia assumir composio diversa da que se apresenta mais frente. So eles:

    O modelo de consumo de massas, j incorporado em suas linhas gerais no PPA 2004-2007, que assinala uma trajetria sustentada de expanso da economia e que conjuga progresso tcnico e distribuio de renda;O atendimento simultneo dos princpios de eqidade e eficincia, que habilita outro caminho de desenvolvimento para o pas, reduzindo desigualdades e aproveitando potenciais inexplorados de organizao social produtiva em diversas partes do territrio nacional;O papel do Estado como articulador das estratgias e promotor das iniciativas de desenvolvimento, personagem indispensvel para fazer frente s tendncias de esgaramento das identidades nacionais; O significado do territrio como elemento-guia capaz de fazer convergir as escolhas estratgicas do desenvolvimento brasileiro e de informar a soluo do problema das desigualdades.

    De outra parte, cabe destacar um conjunto de meios, como espaos essenciais de interveno. De uma forma ou de outra, os meios esto presentes no elenco de iniciativas que se pretende propor para cada um dos compartimentos territoriais. So referncias obrigatrias para a estratgia de desenvolvimento de qualquer frao territorial e sintetizam o que mais importante de se modificar para o alcance de outra organizao territorial. Identificam-se quatro meios:

    O sistema de logstica, que concorre para ampliar a acessibilidade dos agentes, insumos e mercadorias e se desdobra num conjunto expressivo de redes de infra-estrutura.

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    A rede de cidades, que organiza a estrutura urbana do territrio e responde pelas condies para as suas conexes nacionais e internacionais.O sistema de cincia, tecnologia e inovao, que irradia novos padres tecnolgicos e determina o comportamento desejado das estruturas de produo e consumo.O padro de oferta de bens e servios, que estabelece o perfil socioprodutivo e determina as bases para a interao espacial, espelhando o padro de especializao dos territrios.

    Os fundamentos percorrem alguns elementos centrais do debate nacional sobre o planejamento nacional e territorial, de forma a assinalar referncias importantes que amparam as opes adotadas no Estudo. Os meios, por outro lado, representam o substrato pelo qual transitam as orientaes com vistas a um novo ordenamento territorial nacional, ou seja, o lcus preferencial de incidncia das estratgias.

    Os valores, fundamentos e meios concorrem para dar suporte e coerncia ao conjunto de sete objetivos da estratgia proposta:

    1. Superar as desigualdades sociais e regionais (condiciona os demais)8;2. Fortalecer a unidade (coeso) social e territorial;3. Promover os potenciais de desenvolvimento sustentvel das regies;4. Valorizar a inovao e a diversidade cultural e tnica da populao;5. Promover o uso sustentvel dos recursos naturais;6. Apoiar a integrao sul-americana;7. Apoiar a insero competitiva autnoma no mundo globalizado.

    Transformar a organizao territorial brasileira, substituindo-a por um novo ordenamento territorial, envolve assumir estratgias ousadas de desenvolvimento. As escolhas dependem, em ltima instncia, de decises polticas que, dentro de certos limites, podem ser adaptadas s condies

    8 A hierarquia entre o primeiro objetivo e os demais no nasce aqui, mas na Agenda Nacional de Desenvolvimento (AND). A idia de um enfrentamento prioritrio das desigualdades como meio de transformar o Brasil surgiu com fora na agenda aprovada pelos empresrios, sindicalistas, pesquisadores, gestores pblicos e outras lideranas expressivas da sociedade brasileira que integram o CDES.

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    especficas de uma regio ou localidade.O Estado pode e deve retomar a conduo de um projeto nacional de desenvolvimento, ajustando-se s novas condies que se impem para o exerccio de seu tradicional papel social. Tambm se obriga a ouvir cada vez mais a sociedade e a compartilhar internamente estratgias e iniciativas entre os vrios entes federados constitudos. A sociedade, em contrapartida, tender a estar mais participativa e atenta aos movimentos dos temas que a afetam.

    Neste pas de grandes contrastes, os avanos em termos de coeso social e econmica esto ligados aos processos que viabilizam a reduo de desigualdades sociais e regionais. imprescindvel manter a viso de conjunto, em que as orientaes emanadas para uma determinada frao territorial sejam pensadas em harmonia com as definidas para os outros territrios. Almeja-se construir um resultado para todo o territrio nacional e isso tem seu preo.

    A viso estratgica nacional ganha, assim, consistncia inequvoca no conjunto dos objetivos propostos e na maneira singular de interpret-los.

    Figura 5 - Bases constitutivas da estratgia de desenvolvimento territorial

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    4. BASES DA ESTRATGIA TERRITORIAL DE DESENVOLVIMENTO

    As estratgias de desenvolvimento tomam por base referncias que amparam as escolhas adotadas. A estratgia de desenvolvimento aqui proposta baseia-se em trs referncias principais:

    Um conjunto de fundamentos gerais, que qualificam aspectos essenciais das rotas traadas para a ao; Um ponto de partida territorial, o retrato do Brasil que se quer modificar - que uma interpretao da atual organizao espacial/territorial e de suas caractersticas principais; Uma viso do futuro, apta a colocar as reflexes estratgicas em confronto com fatos, processos, determinantes e imperativos que orientam a linha do tempo considerada.

    4.1 Fundamentos GeraisA definio de uma estratgia territorial para o desenvolvimento brasileiro pode buscar referncias em diversas composies de valores, fundamentos e objetivos. A concepo aqui defendida, inspirada na Agenda Nacional de Desenvolvimento elaborada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social, toma por base quatro fundamentos principais, que so abordados em maior detalhe neste item:

    O modelo de consumo de massas; A composio entre os princpios de eqidade e eficincia; O papel do Estado; O significado do territrio.

    Os quatro fundamentos apresentam estreita articulao entre si. No h como promover o consumo de massas no pas sem estimular, simultaneamente, uma reduo das desigualdades; tampouco, no h como avanar na direo de conciliar dinmica e igualdade, sem a cumplicidade ativa e o respaldo do Estado; ou ainda, no h como efetivamente obter resultados nesses campos, sem que se utilize largamente o territrio como ponto de articulao das iniciativas.

    importante assinalar que o Brasil, j h alguns anos, tem um desempenho geral convergente com esses quatro fundamentos da estratgia territorial.

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    Isso confirma que o momento favorvel para a intensificao dos esforos realizados e a ampliao e refinamento da estratgia territorial de desenvolvimento.

    4.1.1 O MODELO DE CONSUMO DE MASSAO PPA 2004-2007 adotou como estratgia para o desenvolvimento do Brasil o modelo de consumo de massas. O modelo contempla uma efetiva possibilidade de organizao de um novo ciclo de crescimento sustentado do pas, aps vrios anos de desempenho insatisfatrio da economia. Ao contrrio do antigo modelo de substituio de importaes9, que podia ser compatvel com a concentrao de renda, ele se ancora numa elevao persistente do rendimento e consumo das famlias trabalhadoras, que se associam dinamicamente aos investimentos em infra-estrutura fsica tradicional e inovao tecnolgica. A auto-alimentao desses dois componentes promove um crculo virtuoso capaz de sustentar o crescimento da economia e propiciar a transformao social do pas.

    Barbosa e Bielschowsky (2007), principais propositores, assim descrevem o modelo:

    Dado um crescimento qualquer, macroeconomicamente slido e capaz de promover a expanso dos investimentos, a modalidade consolida-se ao longo do tempo pelo estabelecimento gradual de um crculo virtuoso que opera da seguinte forma (...): a) Os investimentos se traduzem em aumento da produtividade e das exportaes; b) A elevao da produtividade beneficia equilibradamente a lucros e rendimentos das famlias trabalhadoras. c) Esses rendimentos se transformam em consumo popular continuamente ampliado; e d) A ampliao do consumo provoca a expanso dos investimentos e o progresso tcnico.

    O modelo demanda um esforo concertado de poltica, pois se apia tanto na elevao da produtividade e competitividade da estrutura produtiva quanto do consumo e rendimentos dos trabalhadores, processos que j se encontram em curso na economia brasileira. Em sentido oposto s percepes muito difundidas na anlise econmica, o cerne desse duplo movimento reside no fato, j amplamente constatado pela literatura, de que o consumo popular estimulado pela elevao da renda se orienta para os

    9 Para uma anlise do modelo de substituio de importaes, cf. Furtado (1972 e 1974), Tavares e Serra (1972), Rodriguez (1981), Mantega (1984) e Bielschowsky (1988).

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    segmentos modernos da economia, de maior produtividade e mais afetos incorporao de inovaes.

    O avano do modelo no Brasil tem sido paulatino, na esteira da reformulao da prioridade das polticas direcionadas transferncia de renda s populaes mais carentes e da lenta retomada dos investimentos. Pode ser passvel de acelerao pela via da melhor organizao de um conjunto amplo de polticas pblicas que alimentam seus principais circuitos e desestimulam obstculos porventura existentes.

    O estmulo necessrio ao crculo virtuoso do consumo de massas nasce do aproveitamento das economias de escala e de escopo derivadas da ampliao do tamanho do mercado, da incorporao de novas tecnologias e recorrente recurso inovao e seus processos, do deslocamento de mo-de-obra dos setores tradicionais para os modernos ou, ainda, da transformao dos padres de produo dos setores atrasados; processos que tendem a reforar aumentos de produtividade do sistema.

    Para Carneiro (2006), a sustentao do modelo por prazo mais longo (...) precisa ser um movimento em pina: permitir a um contingente cada vez maior do universo de mais de 56 milhes de famlias brasileiras (que representam um potencial de despesa de cerca de US$ 700 bilhes, equivalente ao PIB da Austrlia) o acesso aos bens de consumo que a moderna tecnologia torna cada vez mais baratos e permitir que a produo desses bens se faa a preos competitivos ao longo de toda a cadeia produtiva.

    No Brasil de hoje, alguns fatores contribuem de forma expressiva para aumentar as possibilidades do modelo. Dentre outros, cabe assinalar a janela de oportunidade demogrfica ora vivida pelo pas. Por um perodo de aproximadamente mais duas dcadas, o Brasil contar com uma combinao favorvel de taxas declinantes de crescimento populacional que se faro acompanhar por um aumento da proporo relativa das pessoas em idade ativa no conjunto total da populao. Alm disso, a elasticidade-emprego do PIB vem se elevando sistematicamente nos ltimos anos e observa- se uma tendncia benigna de aumento relativo da demanda por mo-de-obra no mercado de trabalho, o que amplia as chances de apropriao de maiores fatias da renda pelos trabalhadores.

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    O consumo de massa mostra-se igualmente compatvel com o crescimento das exportaes. Os ganhos gerais de competitividade e o avano do setor agrcola moderno, em que o pas detm vantagens comparativas naturais, pavimentam o caminho para a gerao de impulsos que auxiliam na sustentao dinmica do modelo.

    Algumas caractersticas negativas da realidade brasileira, como assinalam Barbosa e Bielschowsky (2007), podem se fazer presentes, o que atrapalha a viabilizao do modelo:

    A estratgia de crescimento por consumo de massa tem boas chances de xito, mas requer a implementao de polticas de distribuio de renda e de investimentos fixos e em inovao tecnolgica. So esses os dois mbitos fundamentais, j que neles residem as principais barreiras sua operao: i) So historicamente frgeis os mecanismos de transmisso do aumento de produtividade aos rendimentos das famlias trabalhadoras; ii) Tem sido muito baixa a propenso a investir e a inovar na economia brasileira.

    No obstante as dificuldades, hoje o Brasil dispe de um quadro macroeconmico favorvel, que permite cogitar esforos de poltica pblica que amenizem traos histricos indesejados da economia brasileira. Se as iniciativas sociais j geraram frutos expressivos, no campo das polticas ativas de desenvolvimento ainda necessrio superar velhos preconceitos e agressivamente estimular uma mudana comportamental da estrutura produtiva em busca de outro patamar de relaes com a inovao10. Desnecessrio assinalar que o fortalecimento do processo de gerao autctone de inovaes pode e deve estar articulado aos caminhos da internalizao de inovaes, num processo igualmente de auto-alimentao11.

    O dilogo entre o modelo de consumo de massas e a estratgia territorial de desenvolvimento do pas se d em bases tericas convergentes. Em princpio, como argumentam Barbosa e Bielschowsky (2007), ambas as estratgias de desenvolvimento pertencem mesma tradio heterodoxa e desenvolvimentista, que ainda conta com a parceria provvel da que identificam como inovao e competitividade, de inspirao neoschumpteriana.H, no obstante, nuances num e noutro olhar que permeiam certa distino

    10 Segundo a Pesquisa de Inovao Tecnolgica PINTEC 2005 (IBGE 2005), apenas 5.046 empresas declaram dispndios em P&D no Brasil.11 Cf. IBGE (2005), Negri et alli (2006) e Dahlman (2007).

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    dessas concepes estratgicas. Os que se associam vertente da integrao territorial defendem que a moderna concepo do desenvolvimento inova na abordagem multiescalar do territrio, desde o local ao global, o que propicia a obteno de resultados mais eficazes para a melhoria da qualidade de vida das populaes. Acreditam que nenhuma estratgia macro pode mais dispensar um dilogo com as diversidades sociais e regionais do pas. O territrio conta, e no pode ser desconsiderado.

    Se a estratgia territorial para o desenvolvimento brasileiro est perfeitamente amparada pelos preceitos do modelo de consumo de massas, a abordagem territorial o qualifica, ajustando-o s mltiplas realidades que o pas congrega. Os investimentos em infra-estrutura e inovao constituem, igualmente, seus instrumentos preferenciais de ao. E, por fim, reivindicar prioridade relativa circunstancial para a reduo das desigualdades contribui para aumentar a probabilidade de que o Brasil possa se transformar em um pas desenvolvido. Da por que se torna importante, nesse momento, discutir a harmonia da relao entre eqidade e eficincia.

    4.1.2 A COMPOSIO ENTRE OS PRINCPIOS DE EQIDADE E EFICINCIAO crescimento uma condio necessria e indispensvel ao desenvolvimento brasileiro, porm a efetiva transformao social, anseio da maioria da populao, reclama enfrentamento direto e objetivo das desigualdades sociais e regionais.

    A histria do Brasil no sculo passado mostra que adotar uma trajetria de crescimento no suficiente para que o pas alcance efetivo desenvolvimento12. As vrias dcadas seguidas de crescimento econmico intenso no foram suficientes para permitir que o Brasil superasse a condio de pas subdesenvolvido ou em desenvolvimento e ocupasse lugar no conjunto das naes desenvolvidas. Milhes de dlares de investimentos ao longo daqueles anos permitiram ao Brasil modernizar-se parcialmente, gerar riqueza comparvel do primeiro mundo para certa frao da populao, construir uma estrutura produtiva significativa, mas no criar um caminho persistente de mudana social, que tornasse substancialmente melhor a vida do conjunto dos seus cidados.

    12 Segundo Maddison (1989), o Brasil foi o pas que mais cresceu no mundo entre 1900 e 1980.

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    Por essa razo, ao contrrio do que prevaleceu no passado, o desafio de reduzir desigualdades assume, hoje, uma natural ascendncia em qualquer estratgia de desenvolvimento que se organize para o pas (CDES, 2006).

    Os ltimos vinte anos de letargia atestaram a profundidade dos impactos da globalizao sobre a sociedade brasileira. No contexto da adeso s foras neoliberais, ancoradas na suposta superioridade dos princpios do mercado, destruiu-se a antiga mquina de crescimento sem que novas orientaes estratgicas fossem concebidas e implantadas (Barbosa e Bielschowsky, 2007 e Dahlman, 2007). A liderana do Estado na mobilizao das foras sociais em torno construo de trajetrias de desenvolvimento foi desarticulada com a crise dos padres monetrios e financeiros vigentes e a assuno de novas orientaes para a ordem global instituda. O fenmeno da hiperinflao manifestou-se com fora na passagem de uma ordem mundial para outra, determinando esterilizao de grande parte da riqueza financeira acumulada nas dcadas de forte dinamismo e desnacionalizao relativa de ativos. Diante do novo modo de regulao da ordem social, no cabia mais o velho modelo de desenvolvimento.

    Em direo oposta, a redemocratizao do pas abriu espao para outro modelo de desenvolvimento brasileiro. A base democrtica em consolidao torna cada vez mais possvel rearticular politicamente esse pas de extremos. Tambm impe olhar para outras dimenses, inverter o essencial das estratgias passadas e redefinir a hierarquia dos objetivos do desenvolvimento.

    O crescimento precisa ser matizado pela mudana social, de forma que parcelas expressivas da populao tenham assegurados os seus lugares e a incluso em uma nova ordem social. Assim, critrios de eqidade, eficincia, coeso e competitividade devem pr-se lado a lado na organizao de um novo modelo de desenvolvimento nacional, capaz de aplicar maior dinmica no sistema econmico, alm de solidarizar o tecido social brasileiro, construindo uma trajetria de superao das desigualdades13.

    O Brasil, claro, no pode dispensar os efeitos positivos que o crescimento econmico pode propiciar, em especial aps duas dcadas de relativa estagnao na economia. Tampouco pode desperdiar o enorme esforo realizado nos

    13 Debate semelhante foi travado no seio da Unio Europia e est relatado nas posies do Relatrio Sapir, que apresentou proposta para reconciliar os preceitos de eqidade e crescimento na estratgia de investimentos dos Fundos Estruturais. Cf. Sapir et alli (2003)

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    ltimos anos para conquistar novos mercados e gerar saldos comerciais. Na sociedade global dos ciclos nervosos do dinheiro mundial que circula por todos os cantos do planeta, a velocidade acelerada dos capitais e a necessidade de inovao contnua, movimentos institudos pela revoluo cientfica e tecnolgica da microeletrnica, da informao e das comunicaes, continuaro a estimular transformaes (Harvey, 1999). A logstica integrada dos vetores de produo, circulao e processamento induziro o avano da globalizao, o crescimento econmico e modificaro a organizao dos territrios.

    As finanas e a cincia, tecnologia e inovao esto no epicentro das mudanas, reorientando fluxos de investimento, propondo novos padres de consumo, suscitando novas bases para as infra-estruturas de comunicaes, energia e transporte e gerando os impulsos dinmicos mais significativos que o sistema econmico mundial requer (Galvo, 2005). No entanto, embora determinantes na conformao da nova economia mundial, no organizam processos autnomos de mudana, dissociados de outros processos sociais, econmicos e ambientais. Resultam, convm lembrar, de decises humanas e polticas, que possibilitam, dentro de certos limites, ajuste s condies especficas de uma nao, regio ou local.

    A associao da estratgia territorial com o modelo de consumo de massas parece promissora quanto possibilidade de se tratar, de maneira simultnea, dos requerimentos de eqidade e eficincia. O equilbrio desejado entre esses dois princpios, no entanto, reclama considerao objetiva do papel do Estado como condutor principal da estratgia de desenvolvimento.

    4.1.3 O PAPEL DO ESTADONa esteira das orientaes neoliberais das ltimas dcadas do sculo XX, propugnou-se o modelo de um Estado mnimo, destitudo de maiores papis na orientao da economia e na regulao das relaes sociais, sem fora para interferir decisivamente nos fluxos globais de comrcio e de capitais. A instncia nacional deixaria de representar o elemento de referncia bsico das estratgias de desenvolvimento, o que abriria espao para uma articulao global-local mais profcua e promissora, destituda dos vcios que caracterizaram o perodo no Ps II Grande Guerra.

    O modelo neoliberal do Estado no mais se coloca na agenda atual, ainda que persistam arautos que defendem seus princpios at hoje. Ele teve maior

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    influncia nos receiturios de organismos internacionais para os pases em desenvolvimento, como condio para enquadramento inicial aos ditames da ordem global vigente. Nesse sentido, subsistem algumas mudanas que aquele modelo patrocinou, a exemplo da poltica de cmbio flutuante, requisito para os movimentos globais dos capitais.

    A idia de um Estado apartado das relaes sociais e econmicas, mero garantidor das posturas e decises do mercado, que foi incessantemente defendida para os pases perifricos como norma, no mais se mantm. A crtica ao Estado desenvolvimentista mostrou-se inadequada, mesmo que nos marcos e no estrito interesse da globalizao.

    No entendimento atual, o Estado cumpre papel decisivo na organizao das iniciativas de desenvolvimento e deve reassumir funes importantes que foram aparentemente perdidas na transio de paradigmas associada implantao da nova ordem global. A organizao de novos arranjos de poltica pblica, fundamentais para o futuro do pas, uma preocupao central deste Estudo sobre a dimenso territorial do planejamento.

    As nacionalidades alimentam-se das identidades culturais e sociais e principalmente dos sonhos comuns de desenvolvimento. Mas as desigualdades sociais e regionais tendem a questionar uma unidade nacional irrestrita e a gerar tenses que podem prejudicar o ritmo do desenvolvimento e dissipar solidariedades, representando uma fragilidade constitutiva do arranjo poltico-territorial. A esse respeito, um elemento importante na definio dos novos arranjos do Estado a funo de distenso poltico-social que a organizao federativa do Estado ajuda a promover.

    Como ressalta Furtado (1999, p.39), o federalismo (...) o conceito mais amplo que tem sido utilizado para expressar a idia de que a organizao poltica deve basear-se na solidariedade e na cooperao, no na compulso. As jurisdies superpostas sobre o territrio criam condies para que percepes polticas distintas ou mesmo antagnicas possam conviver lado a lado, reduzindo as chances de conflito14. Um projeto nacional de desenvolvimento pode ser negociado e posto em marcha com a flexibilidade

    14 Para Riker (1987, p. 15) a vantagem do federalismo que no se opera uma unio fraca e instvel entre as partes, como nas Alianas, nem uma submisso total, com seus problemas de fraca identidade interna, como no Imprio. O pacto de poder situa-se, dessa forma, no meio do espectro de opes de organizao dos Estados nacionais.

  • Volume II - Viso Estratgica Nacional

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    necessria para acomodar, na margem, as variaes provocadas por projetos regionais ou locais que apresentam agendas alternativas de conduo de aes, desde que no conflitem com o essencial do projeto maior.

    A barganha federativa, territorial por definio, estimula as partes a dirimirem seus conflitos e pactuarem posies. A questo bsica que ela pode conciliar a necessidade de comando central de certas dimenses do projeto nacional de desenvolvimento com a autonomia dos governos estaduais e locais. Estes podem, assim, operar suas prprias iniciativas dentro de marcos mais gerais pr-estabelecidos. A esse respeito, o debate no pode se restringir oposio entre a centralizao ou descentralizao das aes. Segundo Furtado (1999):

    No Brasil, a luta pelo federalismo est ligada s aspiraes de desenvolvimento das distintas reas. No se coloca o problema de choque de nacionalidades, de agresses culturais ligadas a disparidades tnicas ou religiosas. Mas sim o da dependncia econmica de certas regies com respeito a outras, da assimetria nas relaes, de transferncias unilaterais de recursos encobertas em polticas de preos administrados.

    Furtado est certo em valorizar a instncia regional num pas de dimenses continentais. Isso possibilita um espao efetivo para articular iniciativas que precisam mobilizar as mais variadas foras sociais. A integrao nacional, pea inquestionvel do sonho de desenvolvimento, no pode mais se fazer sem que se produza um equilbrio mnimo das unidades federadas. E o planejamento territorial, no sentido defendido por Furtado, pode vir a ser uma ferramenta importante na costura de um projeto de desenvolvimento adequado.

    O papel de polticas ativas de desenvolvimento organizadas sob a liderana do Estado e compromissadas pelos vrios segmentos sociais parece um componente importante para a redefinio de novos rumos para o pas no contexto de uma sociedade que se democratiza. Os sinais de mudana so positivos nesse cenrio.

    4.1.4 O SIGNIFICADO DO TERRITRIOH um conjunto de posturas inovadoras na conduo de polticas pblicas que qualificam de outra forma o papel do territrio. Segundo Batchler et alli (2003), em anlise para o caso europeu, algumas evolues conceituais tm tido impacto sobre as tendncias de longo prazo das polticas pblicas:

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

    46

    Troca de objetivos de poltica na direo do apoio competitividade regional;Declnio dos tradicionais instrumentos de poltica orientados pela demanda (em especial, nos esquemas de ajuda aos negcios) em favor dos instrumentos mais leves articulados do lado da oferta;Contrao das reas cobertas com ajuda regional; Crescimento das iniciativas de desenvolvimento locais, de baixo para cima;Maior preciso na definio dos alvos espaciais (em especial, reas urbanas) e setoriais (clusters) das polticas;Mudanas na governana das polticas (descentralizao, parcerias e coordenao das polticas);Um crescente interesse na sustentabilidade e na incluso social.

    As tendncias assinaladas mudam a concepo de como o territrio influencia e organiza o conjunto de iniciativas de desenvolvimento15 O territrio no mero palco das aes, mas representa, em si mesmo, um elemento das relaes sociais e econmicas mundiais.

    Um primeiro ponto a realar o da revalorizao das regies. As regies no so mais tratadas apenas como provedoras passivas de insumos ao desenvolvimento. Agora, consideradas como estruturas scio-espaciais ativas, dispem de capacidade para aprender (learning regions) e podem ser orientadas para ajustar-se aos ditames mutantes da competio. O ambiente socioeconmico e os traos histrico-culturais e scio-geogrficos da regio so decisivos para o sucesso competitivo (Simmie, 1997; Landabaso, 1997; Cooke e Morgan, 1998). A capacidade de inovar e de gerar ganhos suplementares com a maior eficincia produtiva no so considerados atributos apenas das empresas, mas de todo o tecido social e da teia de colaboradores, territorialmente situados, que amparam as virtudes e debilidades de uma estrutura produtiva. Desenvolver um ambiente de negcios favorvel obteno de ganhos econmico-financeiros um dos principais desafios das polticas pblicas (Galvo, 2005).

    As polticas pblicas encontram nas escalas sub-regionais e locais uma melhor possibilidade de articulao das aes com a gama variada de atores e demais grupos sociais, que assim obtm melhor resposta aos problemas da agenda.

    15 O Marco Inicial do Estudo, CGEE (2006), aborda no Captulo Territrio e Desenvolvimento algumas dessas caractersticas emergentes da nova abordagem territorial.

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    E isso muda radicalmente a forma de organizar as aes no territrio. Com relao ao passado, a operao prxima ao tecido social local representa um divisor de guas para com as polticas territoriais passadas, definidas no mbito macro, tpicas do perodo entre o Ps II Grande Guerra e os anos 1970. Hoje, a articulao dos vrios planos escalares, do local ao regional, ao nacional e ao global, propicia resultados mais eficazes, mais robustos.

    O territrio ganha agora maior expresso para ajudar a promover, neste pas de grandes contrastes e desigualdades, uma substantiva reverso de valores e um refinamento de estratgias que condicionam e fazem convergir as escolhas associadas trajetria desejada de desenvolvimento.

    Para o pas, essas convices ganham maior amplitude no contexto da redemocratizao e da globalizao, no singular avano de foras centrpetas e centrfugas que podem abalar os fundamentos de nossa unidade poltica, econmica e social. O aparente paradoxo entre a reconhecida unidade lingstica e poltica e a efervescente diversidade social e cultural do pas continental representa uma chave para a estruturao de um projeto de nao desenvolvida, apta a prover qualidade de vida para seus cidados, dinmica econmica para o ambiente de negcios e estabilidade poltica para as suas instituies.

    No Brasil, o peso da globalizao ficou evidente com o surgimento de ilhas de crescimento na periferia e bolses de pobreza no centro, sobretudo nas metrpoles. Fez-se sentir tambm na presso ambiental refletida pelos novos recortes territoriais constitudos pelas reas protegidas, bem como pelos movimentos sociais organizados com base em novas relaes locais globais 16. A importncia de se operar em prol da inovao nas diversas agendas territoriais deve ser posta, frente s necessidades de encontrar resposta para as crescentes presses competitivas.

    No plano instrumental, a negociao coletiva de programas de desenvolvimento abrangentes e integrados, de carter plurianual, com processos mais recorrentes de planejamento e avaliao estratgicos, so os elementos centrais da gesto associada com a nova concepo territorial do desenvolvimento.

    16 A multiplicidade de territrios e conflitos que embasou a viso de fragmentao da economia, da sociedade e do territrio (Pacheco, 1996) insinua olhares mais atentos sobre a complexa teia de interesse dos grupos sociais envolvidos no debate do desenvolvimento. Becker (2004) tem chamado insistentemente ateno sobre esse ponto na questo da Amaznia.

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    Em suma, o territrio retoma, assim, sua importncia clssica como fundamento do poder do Estado, mas em um contexto mais complexo que o anterior. Nesse cenrio, essencial estruturar e desenvolver uma viso estratgica que resgate a tica nacional e a recoloque em sua expresso federativa, desdobrando-a nas escalas e instncias relevantes, de forma a animar uma slida articulao poltica em torno dos objetivos do desenvolvimento. Mais ainda, esse olhar nacional que prega a unidade e a integrao territorial do pas cobra agora tambm outro olhar sobre a Amrica do Sul, abrindo novas perspectivas para a integrao dos pases do continente. A insero autnoma do Brasil nos circuitos financeiros e econmicos globais requer essa outra condio - e no demais explorar essa nova vertente.

    4.2 Referncias TerritoriaisA feio territorial mais caracterstica do Brasil a desigual distribuio da populao, da riqueza e do potencial natural no contexto de sua grande extenso continental. Historicamente construda, essa caracterstica ainda mais acentuada hoje, condicionada por uma dinmica socioeconmica e poltica que incidiu de modo bastante heterogneo sobre o territrio. Dessa maneira, como definir unidades territoriais relevantes para que se possa conceber uma estratgia de desenvolvimento para o Brasil? Que caractersticas do territrio devem ser levadas em considerao para tal finalidade? preciso identificar os traos principais que justificam seccionar o vasto territrio brasileiro e organizar suas diferenas e semelhanas mais significativas.

    4.2.1 ORGANIZAO ATUAL DO TERRITRIO BRASILEIROUma nova configurao do territrio nacional emergiu como expresso da dinmica econmica e poltica nas ltimas duas dcadas. A nfase nas exportaes sobretudo da agroindstria e dos minerais e a privatizao das redes de circulao e comunicao geraram uma logstica poderosa das corporaes, que tende a apagar a diferenciao regional mais consolidada que permanece no imaginrio da sociedade e do governo. Na mesma direo, mas em sentido oposto, o avano das iniciativas no campo da seguridade social, como a previdncia rural e os mecanismos de transferncias monetrias diretas para cobertura das carncias sociais agudas bolsa famlia e assemelhados - promoveu paulatina distribuio da renda em favor das camadas menos abastadas da populao, movimento que foi acelerado nos ltimos anos. No contexto de baixo dinamismo do perodo, essas trajetrias contraditrias tenderam a se anular, produzindo variaes quase imperceptveis na usual forma agregada com que se olha para o conjunto do pas. Trata-se

  • Volume II - Viso Estratgica Nacional

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    de uma configurao territorial cujas bases so bem distintas daquelas que se observavam no contexto do acelerado crescimento econmico que se processou em dcadas anteriores.

    O desafio da superao das desigualdades sociais e regionais, portanto, que se acentuou ao longo do sculo XX, permanece intacto. Uma anlise da configurao territorial do pas termina por demonstrar uma primeira diviso persistente, expressa por uma linha diagonal que secciona o Norte e o Nordeste do Centro-Sul, dividindo o pas em duas fraes: A e B (conforme Cartograma 1).

    Cartograma 1: A Diagonal bsica que divide o territrio nacional

    Aracaju

    Belm

    Belo Horizonte

    Boa Vista

    Brasilia

    Campo Grande

    Cuiab

    Curitiba

    Florianpolis

    Fortaleza

    Goinia

    Joo Pessoa

    Macap

    Macei

    Manaus

    Natal

    Palmas

    Porto Alegre

    Porto Velho

    Recife

    Rio Branco

    Rio de Janeiro

    Salvador

    Sao Lus

    So Paulo

    Teresina

    Vitria

    UruguaiArgentina

    Paraguai

    Bolvia

    Peru

    Equador

    Colmbia

    Venezuela

    GuianaSuriname

    Guiana Francesa

    Chile

    B

    A

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

    50

    Praticamente todas as variveis socioeconmicas relevantes, como a renda, a educao, a sade e outras, destacam no mapa do Brasil a diferena marcante entre duas fraes do territrio, uma ao norte e outra ao sul, divididas por uma linha que passa pela regio das cidades de Porto Velho, Sinop, Braslia e Vitria (Cartograma 1).

    Curiosamente, a nica varivel que constitui exceo a esse padro a desigualdade pessoal de renda, cujas caractersticas principais se distribuem de maneira relativamente uniforme por todo o Territrio Nacional (Galvo, 2005).

    Cartograma 2: Educao 2000

    Aracaj

    Belm

    Belo Horizonte

    Boa Vista

    Braslia

    Campo Grande

    Cuiaba

    Curitiba

    Florianpolis

    Fortaleza

    Goinia

    Joo Pessoa

    Macap

    Macei

    Manaus

    Natal

    Palmas

    Porto Alegre

    Porto Velho

    Recife

    Rio Branco

    Rio de Janeiro

    Salvador

    So Luis

    So Paulo

    Teresina

    Vitria

    0.00 - 18.00

    BrasilMicrorregies Geogrcas% de pessoas com mais de 15 anosde idade e com menos de 4 anosde estudo em 2000

    25.31 - 36.10

    36.11 - 52.10

    52.11 - 63.20

    63.21 - 74.55

    Rodovias

    18.01 - 25.30

    Fonte: IBGE - Censo Demogrfico 2000 (originalmente produzido pelo Ministrio da Integrao Nacional para a PNDR)

  • Volume II - Viso Estratgica Nacional

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    A ttulo de exemplo, toma-se o Cartograma 2, que relaciona para cada uma das 558 microrregies geogrficas a proporo da populao com mais de quinze anos de idade e menos de quatro anos de estudo. Como esse, o Ministrio da Integrao Nacional desenvolveu, nas mesmas bases, vrios outros cartogramas que seguem o mesmo desenho bsico, incluindo o prprio mapa de referncia da Poltica Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR).

    Cartograma 3: Trs anis baseados em biomas e densidade populacional

    Aracaju

    Belm

    Belo Horizonte

    Boa Vista

    Brasilia

    Campo Grande

    Cuiab

    Curitiba

    Florianpolis

    Fortaleza

    Goinia

    Joo Pessoa

    Macap

    Macei

    Manaus

    Natal

    Palmas

    Porto Alegre

    Porto VelhoRecife

    Rio Branco

    Rio de Janeiro

    Salvador

    Sao Lus

    So Paulo

    Teresina

    Vitria

    UruguaiArgentina

    Paraguai

    Bolvia

    Peru

    Equador

    Colmbia

    Venezuela

    GuianaSuriname

    Guiana Francesa

    Chile

    1

    2

    3

    Outros critrios de anlise sugerem ainda novos recortes imprescindveis compreenso dos elementos da atual organizao territorial brasileira, pea essencial para a definio de estratgias de desenvolvimento. Eles delimitam a existncia de trs grandes anis (1, 2 e 3, apresentados no cartograma 3) que

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    segmentam o mapa do Brasil em sentido oposto ao da diagonal anteriormente assinalada, do noroeste ao sudeste. Cada anel relaciona-se, no geral, com padres distintos de densidade demogrfica e, juntos, sugerem graus diferenciados de antropizao dos territrios, realando formas distintas de articulao das respectivas estratgias aos objetivos estabelecidos.

    No primeiro caso, isolou-se, para efeito da construo da estratgia de desenvolvimento territorial, o bioma da Floresta Amaznica, caracterizado aqui como aquele delimitado pelas linhas divisrias das sub-regies Amaznia Ocidental e Amaznia Central, tal como definidas no Plano Amaznia Sustentvel PAS (Cartograma 4).

    Cartograma 4: Plano da Amaznia Sustentvel PAS

  • Volume II - Viso Estratgica Nacional

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    No outro caso, destaca-se a poro litornea do territrio, num reconhecimento da perda de importncia relativa dos laos de unio entre os ncleos urbanos principais e suas reas de influncia contguas, em especial no Norte e Nordeste (Cartograma 5). Naturalmente, a opo de reconhecer a separao desses conjuntos territoriais importa igualmente em assumir que apresentam problemticas peculiares de desenvolvimento e, portanto, uma orientao estratgica singular.

    Enquanto o cartograma da densidade populacional (Cartograma 5) revela a concentrao do povoamento na faixa litornea e no Centro-Sul, o bioma da Floresta Amaznica singulariza uma vasta extenso territorial, ainda com elevado grau de preservao ambiental. Como parte da Amaznia Legal oficial, exclui aquela frao de territrio regional que abriga as mais pesadas iniciativas de ocupao promovidas ao longo dos ltimos anos.

    Cartograma 5: Densidade populacional (Hab/km2)

    Aracaj

    Belm

    Belo Horizonte

    Boa Vista

    Braslia

    Campo Grande

    Cuiaba

    Curitiba

    Florianpolis

    Fortaleza

    Goinia

    Joo Pessoa

    Macap

    Macei

    Manaus

    Natal

    Palmas

    Porto Alegre

    Porto Velho

    Recife

    Rio Branco

    Rio de Janeiro

    Salvador

    So Luis

    So Paulo

    Teresina

    Vitria

    0.00 - 1.00

    BrasilMicrorregies Geogrcasdensidade populacional ( Hab/Km2 )

    11.01 - 29.00

    29.01 - 54.00

    54.01 - 219.00

    219.01 - 5500.00

    Rodovias

    1.01 - 11.00

    Fonte: IBGE - Censo Demogrfico 2000 (originalmente produzido pelo Ministrio da Integrao Nacional para a PNDR)

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    O cruzamento da diagonal inicial com os trs anis produz cinco conjuntos territoriais. No entanto, a posterior subdiviso do territrio que compreende a poro central norte-nordestina, com o reconhecimento do tradicional problema do Semi-rido, delimita, ao final, seis territrios da estratgia (Cartograma 6): 1. Bioma Florestal Amaznico; 2A. Centro-Oeste; 2B1. Centro-Norte; 2B2. Serto Semi-rido Nordestino; 3A. Litoral Sudeste-Sul; 3B. Litoral Norte-Nordestino. Estes territrios compreendem o essencial para a construo da concepo estratgica defendida e devem habilitar um dilogo com as escalas regionais de referncia que organizam os investimentos sugeridos no Estudo.

    Cartograma 6: Territrios da estratgia

    Aracaju

    Belm

    Belo Horizonte

    Boa Vista

    Brasilia

    Campo Grande

    Cuiab

    Curitiba

    Florianpolis

    Fortaleza

    Goinia

    Joo Pessoa

    Macap

    Macei

    Manaus

    Natal

    Palmas

    Porto Alegre

    Porto VelhoRecife

    Rio Branco

    Rio de Janeiro

    Salvador

    Sao Lus

    So Paulo

    Teresina

    Vitria

    UruguaiArgentina

    Paraguai

    Bolvia

    Peru

    Equador

    Colmbia

    Venezuela

    GuianaSuriname

    Guiana Francesa

    Chile

    1 2B1

    2B2

    2A

    3A

    3B

  • Volume II - Viso Estratgica Nacional

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    No meio da zona central da configurao atual do territrio nacional, prevalece uma vasta rea cuja ocupao foi se intensificando nos ltimos anos, impulsionada pelo avano da agroindstria capitalista e pelo mais importante movimento concreto da poltica de desenvolvimento regional brasileira, que foi a instalao da nova capital do pas, Braslia, com sua conexo com a vizinha Goinia e seus eixos de acesso ao Centro-Sul, em direo ao Tringulo Mineiro e So Paulo e a Belo Horizonte e Rio de Janeiro.

    Cartograma 7: Grau de urbanizao

    Aracaj

    Belm

    Belo Horizonte

    Boa Vista

    Braslia

    Campo Grande

    Cuiab

    Curitiba

    Florianpolis

    Fortaleza

    Goinia

    Joo Pessoa

    Macap

    Macei

    Manaus

    Natal

    Palmas

    Porto Alegre

    Porto Velho

    Recife

    Rio Branco

    Rio de Janeiro

    Salvador

    So Luis

    So Paulo

    Teresina

    Vitria

    20.71 - 38.78

    BrasilMicrorregies Geogrcasgrau de urbanizao (%)

    53.78 - 67.56

    67.57 - 82.52

    82.53 - 95.80

    95.81 - 100.00

    Rodovias

    38.79 - 53.77

    Fonte: IBGE - Censo Demogrfico 2000 (originalmente produzido pelo Ministrio da Integrao Nacional para a PNDR)

    Alguns outros indicadores concorrem tambm para dar suporte s linhas que ordenam esses seis grandes compartimentos territoriais. A extensa diagonal

  • Estudo da Dimenso Territorial para o Planejamento

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    que atravessa todo o territrio, desde Porto Velho at o litoral capixaba, logo acima de Vitria, marcando a desigualdade social em termos econmicos e de acesso s redes de circulao, informao, proviso de servios pblicos etc., divide tanto o anel litorneo quanto o central.

    As condies da logstica, a partir das dotaes relativas de infra-estrutura econmica, bem como a estrutura urbana, com seu papel na proviso de servios pblicos essenciais, representam os elementos de diviso mais importantes. No caso do litoral brasileiro de Belm a Rio Grande, o corte acima de Vitria Territrio 3B - reconhece a existncia de uma maior debilidade de recursos logsticos no Nordeste e no Norte do pas - um desafio da agenda futura de desenvolvimento. No caso da zona central do Brasil, a diagonal nos lembra os diferentes padres de urbanizao entre aqueles dois grandes territrios, ainda que os recursos logsticos associados a eles apresentem deficincias semelhantes. No Territrio 2A, o padro de urbanizao existente se aproxima do vigente no litoral desenvolvido, representado pelo Territrio 3A.

    Cada uma dessas reas merece anlise objetiva em separado em qualquer estratgia de desenvolvimento que se pretenda organizar para o Brasil.

    Pensar o futuro da configurao territorial brasileira pensar como se pode transformar a realidade do pas em busca de uma trilha de superao de ao menos algumas dessas grandes marcas de diviso do territrio nacional. Em outras palavras, requer imaginar quais so os vetores estratgicos de desenvolvimento que permitem gerar impulsos dinmicos de desenvolvimento para as diversas regies de referncia e sub-regies delimitadas, de forma a possibilitar uma convergncia dos nveis de renda per capita e de qualidade de vida da populao.

    4.2.2 RELAO ENTRE OS TERRITRIOS DA ESTRATGIA E AS REGIES DE REFERNCIAA literatura cientfica sobre planejamento aceita que a regio, a escala territorial convencionalmente entendida como intermediria entre o nacional e o local, um meio indispensvel para explicar os padres espaciais produzidos por processos econmicos e sociais e para planejar atividades que visam intervir nesses padres. E tal atributo no desaparece com a formao de novas escalas supranacionais e sub-regionais. Pelo contrrio, na Unio