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Pimentas Pimentas... o ardido que faz bem à saúde AUTORES SÃO DO LABORATÓRIO DE BIOTECNOLOGIA VEGETAL DA UNESP DE ASSIS P esquisas desenvolvidas no Laboratório de Biotecnologia Vegetal (LBVeg), vinculado ao Departamento de Biotecnologia da Facul- dade de Ciências e Letras da Unesp, Câmpus de Assis, vem explorando acessos cultivados de Capsicum em diferentes vertentes. Plantas como as pimentas e pimentões do gênero Capsicum (Solanaceae) têm sido foco de inúmeras pes- quisas em diferentes áreas do conhecimento, devido ao seu potencial biotecnológico, benefí- cio nutricional e, principalmente, pela sua im- portância no agronegócio brasileiro e mundial. O Brasil é o principal centro de origem e do- mesticação de espécies cultivadas e silvestres de Capsicum, e neste gênero observamos cerca de 36 espécies, das quais cinco são amplamente cultivadas pelo homem desde os primórdios da 18 DRA. MÔNICA ROSA BERTÃO E DR. DARÍO ABEL PALMIERI UNESPCIÊNCIA | JUNHO 2018

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Pimentas... o ardido que faz bem à saúdeAUTORES SÃO DO LABORATÓRIO DE BIOTECNOLOGIA VEGETAL DA UNESP DE ASSIS

Pesquisas desenvolvidas no Laboratório de Biotecnologia Vegetal (LBVeg), vinculado

ao Departamento de Biotecnologia da Facul-dade de Ciências e Letras da Unesp, Câmpus de Assis, vem explorando acessos cultivados de Capsicum em diferentes vertentes. Plantas como as pimentas e pimentões do gênero Capsicum (Solanaceae) têm sido foco de inúmeras pes-quisas em diferentes áreas do conhecimento, devido ao seu potencial biotecnológico, benefí-cio nutricional e, principalmente, pela sua im-portância no agronegócio brasileiro e mundial.

O Brasil é o principal centro de origem e do-mesticação de espécies cultivadas e silvestres de Capsicum, e neste gênero observamos cerca de 36 espécies, das quais cinco são amplamente cultivadas pelo homem desde os primórdios da

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Agricultura. E são inúmeros os tipos de pimentas comercializados pela população. A variabilidade de frutos é muito grande. E a ardência, então, nem se fala. Também conhecida como pungência, a característica do “ardido” das pimentas é muito variável. Podemos encontrar pimentas extrema-mente ardidas, pouco ardidas e as conhecidas pimentas doces. Para conhecer um pouco mais sobre o quanto varia a ardência das pimentas de que você gosta consulte a Escala de Scoville.

“Em 1912, enquanto trabalhava para uma farmacêutica, o farma-cêutico Wilbur Scoville desen-volveu um método para medir o “grau de calor” das pimentas. Este teste é chamado de Teste Orga-noléptico de Scoville ou Proce-dimento de Diluição e Prova. No teste original, Scoville misturou a pimenta pura com uma solução de água com açúcar. Então, um painel de provadores bebeu esta solução. Quanto mais solução de água e açúcar é necessária para diluir uma pimenta, mais alta sua pungência. Depois disso, o método foi melhorado e foram criadas as unidades de calor Scoville (Sco-ville heat units, ou SHU). Assim, 1 xícara de pimenta, que equivale a 1000 xícaras de água, correspon-de a 1000 unidades na escala de Scoville. A substância Capsaicina, aquela que gera a ardência nas pimentas, quando pura, equivale a 15 milhões de unidades Scovil-le.” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Escala_de_Scoville).

Atualmente, inúmeras variedades morfologi-camente distintas das espécies cultivadas (Cap-sicum annuum L., C. baccatum L., C. chinense Jacq., C. frutescens L. e C. pubescens Ruiz & Pavon) podem ser encontradas em mercados e feiras livres (Figura 1), abastecendo a agroin-dústria mundial, sustentando a agricultura fa-miliar e criando perspectivas no crescimento da área cultivada e no consumo para os mercados

interno e externo, seja na forma in natura, seja processada (condimentos, conservas, temperos).

O que atrai a atenção de pesquisadores de todo o mundo para as espécies de Capsicum é o fato de as mesmas constituírem uma rica fonte de compostos bioativos, com destaque para os compostos fenólicos (ácidos fenólicos e flavonoides), carotenoides envolvidos na pig-mentação dos frutos (capsantina, criptoxantina,), capsaicinoides (capsaicina, dihidrocapsaicina, por exemplo), alguns dos quais responsáveis pela ardência (pungência), e vitaminas dos complexos C, E, A (caroteno e provitamina A) e B (B2- riboflavina, B3-niacina, B6). Estes compostos são explorados quanto às suas pro-priedades funcionais como antioxidantes, anti-cancerígenos, anti-inflamatórios, antialérgicos,

Figura 1. Acessos ardidos e doces de pimentas pertencentes às espécies de Capsicum annuum, C.chinense, C. frutescens, C. baccatum e C. praetermissum, evidenciando a variabilidade de tipos existentes que são avaliados no Laboratório de Biotecnologia Vegetal da FCL, Assis.

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antimutagênicos ou antibacterianos e assim empregados na conservação de alimentos ou como agentes no controle de neuropatia diabé-tica, osteoartrite, psoríase e obesidade, entre outras enfermidades que afligem o homem.

Os “Capsicum” apresentam outras particu-laridades importantes, em termos das relações de parentesco entre as espécies, na evolução de seus cariótipos, na sua ampla variabilidade ge-nética. O LBVeg vem desenvolvendo desde pes-quisas de caracterização dos recursos genéticos até projetos de germinação e cultivo de células in vitro. Variedades cultivadas e semicultiva-das de Capsicum consumidas por populações locais já foram analisadas para verificação da ocorrência de polimorfismos cromossômicos intra e interespecíficos (Figura 2) que podem auxiliar na elucidação de questões referentes à evolução cariotípica do gênero.

Figura 2. Caracterização do complemento cromossômico de diferentes acessos das espécies de Capsicum baccatum, C. chinense e C. annuum.

Na área de Biologia Molecular, a aplica-ção de marcadores moleculares tipo RAPD permitiu a caracterização da variabilidade genética em Capsicum annuum, C. chinense, acessos de provável origem híbrida e outras espécies (Figura 3). Níveis significativos de polimorfismo entre os acessos foram demons-trados, comprovando a expressiva diversidade genética existente nas espécies cultivadas e, complementando tais análises, marcadores moleculares ISSR têm sido ensaiados.

Outra importante área de pesquisa desen-volvida no LBVeg se refere à avaliação de extra-tos de frutos maduros de diferentes pimentas quanto aos níveis de compostos bioativos como fenóis, flavonoides e capsaicinoides e sua ati-vidade antioxidante, e aqueles com atividade expressiva estão sendo explorados quanto a sua competência para o desenvolvimento in vitro.

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Figura 3. Uso de marcadores moleculares na caracterização de polimorfismo genético de diferentes acessos das espécies de Capsicum chinense e C. annuum.

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Recentemente foram realizadas análises da citotoxicidade, genotoxicidade e atividade an-tioxidante de extratos de espécies cultivadas e semicultivadas de Capsicum (Figura 4). Inte-ressante constatar que espécies semicultivadas como C. praetermissum têm mostrado maior atividade antioxidante total, maiores concen-trações de compostos fenólicos e flavonoides e níveis mais elevados de capsaicina em compa-ração a C. annuum, C. frutescens, C. baccatum e C. chinense. Em nossas pesquisas, os extratos de C. praetermissum e C. baccatum apresen-taram baixo potencial citotóxico e genotóxico em comparação com outros genótipos, abrindo perspectivas para o uso seguro e sustentável na produção de fármacos ou na cosmética.

Do ponto de vista da perspectiva do cultivo in vitro, os acessos contendo as maiores concen-trações de compostos fenólicos e flavonoides, níveis elevados de capsaicina e baixo poten-cial citotóxico e genotóxico, como Capsicum baccatum, foram explorados em experimentos de germinação in vitro e protocolos otimizados para a obtenção de explantes axênicos (Figura 5), visando o estabelecimento de cultura de calos e células em suspensão.

Mais recentemente, variáveis críticas de ope-ração, associadas às etapas de cultivo de células em suspensão de Capsicum baccatum, utilizando

Figura 4. Estratégia metodológica para avaliação de compostos bioativos em Capsicum: caracterização dos compostos, da atividade antioxidante, potencial citotóxico e genotóxico.

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sistema de frascos em agitação, foram avaliadas para produzir metabólitos se-cundários com propriedades antioxidantes. Os resultados serão empregados no estabeleci-mento de um bioprocesso a ser executado em biorreator tipo tanque com agitação e aeração, permitindo o escalonamento da produção de extratos com propriedades antioxidantes.

Um dos aspectos que merecem destaque nesse cenário todo refere-se à participação dos discentes dos cursos de graduação em Enge-nharia Biotecnológica e de Ciências Biológicas e do Programa de Pós-graduação – Mestrado em Biociências do Câmpus da FCL, Assis, os quais contribuíram significativamente pa-ra o desenvolvimento dessas pesquisas. As-sim, através da pesquisa científica o LBVeg e sua equipe tem procurado a aplicação e o desenvolvimento de estratégias clássicas e inovações tecnológicas que possam contri-buir com o conhecimento e a exploração da rica biodiversidade brasileira, bem como com a agricultura, através do estudo de espécies vegetais de interesse econômico.

Figura 5. Estratégia metodológica para a germinação in vitro, cultura de calos, cultura de células em suspensão visando o estabelecimento de um bioprocesso em biorreator para o escalonamento da produção de extratos com propriedades antioxidantes em Capsicum.

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23JUNHO 2018 | UNESPCIÊNCIA

Dra. Mônica Rosa Bertão e Dr. Darío Abel Palmieri atuam no Laboratório de Biotecnologia Vegetal, Departamento de Biotecnologia, Faculdade de Ciências e Letras, Unesp - Universidade Estadual Paulista, Assis, Brasil,