perseguição

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Felizes ou abatidos pela perseguição? Evangelho de Marcos, capítulo 10 : 29 Respondeu Jesus: “Em verdade vos digo, quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por causa de mim e do Evangelho, 30 receberá cem vezes mais agora, durante esta vida casa, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições e, no mundo futuro, a vida eterna. Ao ouvir este trecho do Evangelho, durante a missa dominical, pus-me a pensar no que estas palavras significariam no que se refere à ‘perseguições’, especialmente no contexto de minha caminhada espiritual pela Renovação Carismática Católica. A necessidade humana da mitificação Recentemente, vimos o país ‘parar’ (espero que os carismáticos, não) para acompanhar...uma novela. Fico me perguntando o que seja este fenômeno. A resposta não é difícil: o ser humano precisa do lúdico e da fantasia. O que o capitalismo global conseguiu foi transformar isto em negócio. E coube às pessoas entrar na onda... Esta necessidade da ‘fantasia’, ou usando um termo filosófico, de ‘mitificação’, se expressa na política, na família, no mundo profissional, na vida sexual, e, obviamente, no campo religioso. Para simplificar, explico aos meus alunos que a diferença entre ‘religião’ e ‘mito’ é a fé. Exemplifico com Madre Tereza de Calcutá: ninguém se doa por amor em troca de uma mitificação... A RCC resgata, com vigor, o discurso ‘mítico’. Até aí, nenhum problema. Como disse acima, o ser humano precisa disto. A experiência ‘fundante’ do carismático, o ‘Batismo (ou Efusão) no (ou do) Espírito Santo’ é uma experiência mística (não mítica, cuidado!), cuja tentativa de explicação é absolutamente empobrecedora. A minha foi em 1983, e por mais que eu tentasse racionalizá-la, ou analisá-la, seria uma bobagem: simplesmente, seria inútil. Portanto, o carismático começa sua trajetória ‘devendo uma’ ao discurso mítico. Bom, qual místico na caminhada da Igreja não o ‘deveu’? Quando Saulo cai do cavalo, Francisco beija o leproso, Tereza de Calcutá olha pela janela aos pobres abandonados, como racionalizar estas experiências? Mas, temo que nossa ‘mitificação’ extrapole a realidade em alguns momentos. E não apenas quando se proclamam curas inexistentes (atenção: acontecem curas na RCC. Falo de proclamações sem discernimento). Às vezes, nossa fantasiaimpede de enxergar a realidade. E a mania de enxergarmos perseguições é um exemplo disto.

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Um artigo sobre o conceito de perseguição na Renovação Carismática Católica,em especial na Diocese de Teófilo Otoni, Minas Gerais.

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Felizes ou abatidos pela perseguição?

Evangelho de Marcos, capítulo 10 : 29

Respondeu Jesus: “Em verdade vos digo, quem tiver

deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por causa de mim e do

Evangelho, 30

receberá cem vezes mais agora, durante esta vida — casa, irmãos, irmãs, mães,

filhos e campos, com perseguições — e, no mundo futuro, a vida eterna.

Ao ouvir este trecho do Evangelho, durante a missa dominical, pus-me a pensar no que estas

palavras significariam no que se refere à ‘perseguições’, especialmente no contexto de minha

caminhada espiritual pela Renovação Carismática Católica.

A necessidade humana da mitificação

Recentemente, vimos o país ‘parar’ (espero que os carismáticos, não) para acompanhar...uma

novela. Fico me perguntando o que seja este fenômeno. A resposta não é difícil: o ser humano

precisa do lúdico e da fantasia. O que o capitalismo global conseguiu foi transformar isto em

negócio. E coube às pessoas entrar na onda...

Esta necessidade da ‘fantasia’, ou usando um termo filosófico, de ‘mitificação’, se expressa na

política, na família, no mundo profissional, na vida sexual, e, obviamente, no campo religioso.

Para simplificar, explico aos meus alunos que a diferença entre ‘religião’ e ‘mito’ é a fé.

Exemplifico com Madre Tereza de Calcutá: ninguém se doa por amor em troca de uma

mitificação...

A RCC resgata, com vigor, o discurso ‘mítico’. Até aí, nenhum problema. Como disse acima, o ser

humano precisa disto. A experiência ‘fundante’ do carismático, o ‘Batismo (ou Efusão) no (ou do)

Espírito Santo’ é uma experiência mística (não mítica, cuidado!), cuja tentativa de explicação é

absolutamente empobrecedora. A minha foi em 1983, e por mais que eu tentasse racionalizá-la, ou

analisá-la, seria uma bobagem: simplesmente, seria inútil.

Portanto, o carismático começa sua trajetória ‘devendo uma’ ao discurso mítico. Bom, qual místico

na caminhada da Igreja não o ‘deveu’? Quando Saulo cai do cavalo, Francisco beija o leproso,

Tereza de Calcutá olha pela janela aos pobres abandonados, como racionalizar estas experiências?

Mas, temo que nossa ‘mitificação’ extrapole a realidade em alguns momentos. E não apenas quando

se proclamam curas inexistentes (atenção: acontecem curas na RCC. Falo de proclamações sem

discernimento). Às vezes, nossa ‘fantasia’ impede de enxergar a realidade. E a mania de

enxergarmos perseguições é um exemplo disto.

Definindo o que é ‘perseguição’

Pessoalmente, tenho uma boa cota de ‘perseguições’ em minha vida. Minha família não aceitou

minha decisão de me voltar para a Igreja Católica, aos 16 anos de idade, sendo que de várias

maneiras tentou-se cortar aquele caminho de ‘exageros’: críticas, boicotes, ironia. Meus colegas de

escola ficaram ‘de boa’, mas achando tudo meio estranho. O tempo foi passando, e o ‘trem’ apertou

mais um pouco. Intolerância no seminário de uma ordem religiosa, com escolhas pastorais feitas

pelos superiores mais rígidas para mim e Celso, que éramos carismáticos (até o convite para

sairmos de lá). Depois, fui vítima de uma série de afirmações não verdadeiras: de que comprei meu

primeiro carro com dinheiro da Igreja, de que era fanático, de que processara uma paróquia para

receber direitos trabalhistas (isto dito numa reunião do clero!), que não tomava banho, que

‘eduquei’ meus filhos para obrigá-los a serem padres, que proibia minha mulher de usar

anticoncepcional...líderes marcavam reuniões na hora do grupo de formação que eu dirigia, a fim de

que as pessoas não fossem lá. Uma ‘serva’ do Senhor se deu ao trabalho de procurar todos, eu disse

TODOS os padres de uma Diocese, para falar ‘mal’ de mim. Até acusado de ter ‘chulé’ fui entre

grupos de oração!(?).

‘Nossa, como você foi perseguido’, diriam os mais incautos...não, não penso que ainda tenha sido

realmente perseguido, pelo menos no sentido bíblico nem etimológico da palavra.

‘Per-seguir’, se não falha minha memória, vem do latim, e significa ‘seguir totalmente’. ‘Seguir ou

procurar alguém por toda a parte com frequência e importunidade’, diz um dicionário on-line de

Portugal (Priberam). E isto me parece bem adequado.

Perseguição assim é muito mais uma ação deliberada de alguém em ir por toda a parte e procurar

prejudicar, pessoal e profissionalmente, uma pessoa. Eu diria, inclusive, que perseguição tem um

traço de intolerância, no sentido de não querer a existência do outro. Assim, a perseguição nem

precisaria ser violenta. Bastaria usar do poder que alguém tem para fazê-lo, já que pessoas sem

poder não podem perseguir. Ou poderia ser violenta, como foi no passado e é em muitos lugares

hoje, com a tentativa de matar quem crê.

RCC perseguida ou carismáticos perseguidos?

Assim, quando algum padre não quer que haja um grupo de oração em sua paróquia, usando de seu

poder para isto, eu poderia até dizer que ele está perseguindo ‘a renovação’. Mas, estaria

perseguindo aos carismáticos? Bom, minha experiência diz que, necessariamente, não. Já convivi

espiritualmente muito bem com bispos e padres que fizeram o que podiam para que não houvesse

grupos de oração em seus ‘domínios’, mas eram profundamente leais comigo como católico.

Bom, para alguns é difícil entender isto. Porque devido à própria experiência, há uma identificação

entre RCC = Igreja = eu. Deixo para os psicólogos interpretarem. Mas, me lembra do bebê que não

consegue distinguir a pessoa dele e da mãe.

No fundo, o que percebi nestes 30 anos de RCC é que certa imaturidade leva as pessoas a quererem

ser aceitas como são ou pensam, e, mais do que isto, que os outros pensem e sejam como nós

somos. Assim, vejo muita gente achar que a Igreja Católica estará ‘renovada’ quando for uma

grande RCC. Graças a Deus, não é assim.

Qualquer observador atento percebe que a RCC (no Brasil, onde é uma das mais ‘animadas’ no

mundo) há muito se bifurcou em duas realidades distintas. A necessidade da criação de

comunidades e associações dissociou uma parte da outra, daquela que se firma no dia a dia

paroquial. E isto não se fez sem dor nem sofrimento...o curioso é que a Igreja é assim, já que

ordens, congregações e institutos convivem (também com tensões ) há dois milênios com as

instâncias diocesanas. E em muitos lugares, na RCC, desde a década de 80 (!) isto significou

‘perseguições’ entre carismáticos.

Modelo da RCC

Pois bem, se a Igreja se tornasse uma grande RCC, qual ela seria? A das comunidades e

associações, ou a paroquial?

Pra piorar, recentemente a liderança nacional da RCC, conforme se encontra no Planejamento

Estratégico 2010-2017, decidiu interpretar (a meu ver, equivocadamente) este sopro do Espírito

com uma associação leiga (citação do texto que está em

http://www.rccbrasil.org.br/download_conta.php?id_down=123 : conforme o cânon 215 do Código

do Direito Canônico, os fiéis têm o direito de fundar e dirigir livremente associações para fins de

caridade e piedade, ou para favorecer a vocação cristã no mundo, e de se reunir para a consecução

comum dessas finalidades. Os movimentos eclesiais, entre eles a Renovação, são associações leigas).

Ora, ao se declarar ‘parte’, limita a influência sobre o todo. O que o braço tem a ensinar à perna?

Ora, a RCC, como instrumento do Espírito, deve chegar à ‘alma’. Imagine que eu diga que a

Associação Luz dos Povos é modelo para a Igreja... seria caso de internação! A Associação Luz dos

Povos é Igreja, com uma missão específica. ‘Autonomizar’ a RCC a faz não ser modelo para o

Corpo. Ora, se somos apenas uma parte, porque ficar pensando em dar lição de moral para

paróquias e Dioceses? Teríamos apenas a obrigação de sermos bons no que fazemos. A não ser que

queiramos fundar paróquias e dioceses próprias, mas aí seria um ‘cisma’...

A Igreja Católica no Brasil, como eu dizia, felizmente, não vai virar uma grande RCC. Digo

felizmente, pois me envergonho com o rumo que a arte. a política partidária e a prática pastoral de

certas realidades ‘carismáticas’ tomaram no país. De certa forma, precisam de uma ‘renovação’. Já

o papel da RCC sempre seria de fermento, e fermento não vira pão, fermento some no pão. Ao ver,

por exemplo, grupos como EAC e EJC profundamente ‘carismáticos’, aqui em Teófilo Otoni, mais

que grupos de oração ditos da RCC, vejo que o Espírito está fazendo sua obra. Quando vejo

liturgias renovadas, com uma profundidade espiritual na celebração e na música, por influência

direta ou indireta da RCC, vejo que Deus está agindo.

Olhar misericordioso para com todos

Certos carismáticos parecem ter uma dificuldade muito grande com pessoas, especialmente padres,

que não pensam como eles. Parece que pensam que Deus espera que elas condenem pessoas que

não façam certas coisas, e como padres parecem, para elas, não fazer o que Deus quer (e fazer o que

Deus abomina!), então se ‘desce o sarrafo’. Não consigo achar fundamento bíblico nisto. Ah, sim,

Paulo fala como devemos corrigir os que erram. A mim, como irmão, cabe bem Mateus 18, quando

Jesus nos manda ir conversar com o irmão, e corrigi-lo. Mas, condenar?

Parece que esperamos ser aceitos em tudo, inclusive em nossas bobagens, que ‘perdoamos’

facilmente entre nós... mas ,somos duros e rígidos com aqueles que definimos não serem ‘batizados

no Espírito Santo’, já que não oram, pregam ou dançam como nós...

Assim, reclamamos e muito de sermos ‘perseguidos’ porque não nos aceitam como somos... mas

não aceitamos os outros como eles são! Reclamamos que são intolerantes conosco, quando também

não aceitamos que os outros sejam como são. ‘Ah, Luís, mas eu cumpro a lei, jejuo, pago o dízimo,

leio a Bíblia, oro em línguas. Não sou como aquele que faz isto e aquilo...’. Bom, sabemos o que

Jesus disse sobre quem pensa assim...

A Bíblia fala em não julgar. Não julgueis, e não sereis julgados. Sejam misericordiosos, como o Pai

do Céu é misericordioso. Penso que deveríamos aceitar os outros, mesmo aqueles que pensamos

que estejam errados, como uma oportunidade a mais que o Pai dá a todos. Aceitar não é ser

conivente: aceitar é amar. É não ‘per-seguir’, isto é, não excluir o outro de ser, quando não

concordo com ele.

Um grupo de uma comunidade católica (de abrangência nacional) procurou certa vez seu Bispo,

para reclamar que os padres da Diocese os estavam perseguindo. O Senhor Bispo perguntou;

‘Vocês já derramaram o sangue por Jesus?’. Ao ouvir que ‘não’, ele retrucou: ‘Deus quer mártires’.

E os mandou embora...

Temos que parar de ‘chorar’ porque não gostam de nós. E em primeiro lugar, perguntar seriamente:

porque não gostam de nós? O que não gostam em nós?

Enviados ou intrometidos?

Lembro-me da palestra de Taciano Barbosa, da RCC de Goiás, em 1995, na Casa de Oração aqui de

Teófilo Otoni, sobre a passagem a seguir...

Atos dos Apóstolos 9, 26.Chegando a Jerusalém, tentava (Saulo) ajuntar-se aos discípulos, mas

todos o temiam, não querendo crer que se tivesse tornado discípulo.27.Então Barnabé, levando-o

consigo, apresentou-o aos apóstolos e contou-lhes como Saulo vira o Senhor no caminho, e que

lhe havia falado, e como em Damasco pregara, com desassombro, o nome de Jesus.28.Daí por

diante permaneceu com eles, saindo e entrando em Jerusalém, e pregando, destemidamente, o

nome do Senhor.29.Falava também e discutia com os helenistas. Mas estes procuravam matá-

lo.30.Os irmãos, informados disso, acompanharam-no até Cesaréia e dali o fizeram partir para

Tarso.31.A Igreja gozava então de paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria. Estabelecia-se ela

caminhando no temor do Senhor, e a assistência do Espírito Santo a fazia crescer em número.

Saulo havia se convertido ao Senhor, estava cheio de fogo e unção, mas... só houve paz na Igreja

quando ele foi enviado para Tarso. Porque isto? Porque ele não estava agindo na vontade de Deus.

Isto no contexto da diferença entre um ‘enviado de Deus’, aquele que escutou do Senhor e foi servi-

lo, e aquele que por conta própria foi fazer a ‘obra de Deus’ (?).

Está claro? Saulo era ungido, mas não seguia a vontade de Deus, tirando a paz da Igreja. Era

imaturo. Queria converter os outros, não evangelizá-los. Até que, após anos, virou o grande

missionário Paulo.

A RCC tem, no geral, um sério problema em sua ação, pelo menos aqui em Teófilo Otoni.

Dificilmente conseguimos nos organizar em comunhão com toda a pastoral diocesana. Em primeiro

lugar porque, historicamente, aqui em Teófilo Otoni não havia pastoral diocesana, e segundo,

porque não temos uma definição do que queremos, ou melhor, do que Deus quer de nós. A exemplo

do clero, que durante muitos anos bateu cabeça por disputa de poder e de modelo pastoral, dentro da

RCC-TO a mesma coisa acontece.

Pois bem, qual é a nossa meta? Aonde queremos chegar? Qual nosso objetivo?

Passei dois anos e meio da última vez que estive na Coordenação Diocesana da RCC dizendo aos

coordenadores de grupo: ‘como anda a evengelização-formação em seu grupo?’ O grupo tem

Seminário de Vida, de Carismas, Discipulado e formação permanente? Tem vida de oração?

Pessoal e comunitária?

Ora, se fizermos isto, basta esperar que o fruto aparecerá em abundância, a começar no amor

fraterno, sinal mais importante da vida cristã, e nas conversões verdadeiras ao Senhor.

Em oposição (infelizmente) a esta perspectiva, existe outra opção...a de evangelização de eventos,

que só produzirá frutos se for orgânica e sistemática, com toda a Diocese. De que adianta reunirmos

milhares de pessoas, se não temos como alimentá-las, orientá-las, fortalecê-las? Assim, fez Jesus:

pregava à multidão, e formava seus discípulos-apóstolos, que depois seriam os pastores das ovelhas.

Digo por experiência própria: onde estão os milhares de pessoas que se reuniam nos Cenáculos da

década de 90? Os que estão na Igreja, estão porque, de alguma forma, foram inseridas

comunitariamente. Caso contrário, ou são evangélicas hoje (menos mal), ou se afastaram da fé. É

esta a pastoral desejada por Deus? E os grupos de oração? Como caminharam? E as comunidades,

associações e ministérios? Firmaram-se pelos milhares de pessoas? Quem perseverou? Por que

perseverou?

Somos enviados ou intrometidos? O que dizem nossos frutos?

Por que a perseguição?

Pois bem, porque somos ‘perseguidos’? Por que oramos muito? Porque servimos aos pobres?

Porque damos valor à Palavra de Deus? Porque amamos muito? Porque nossa vida comunitária é

‘exagerada’? Ou o que nós chamamos de ‘perseguição’ é o fato de que não gostam do que fazemos,

e padres fazem o que podem para que não o façamos?

Para mim, desculpe, significa muito pouco para ser ‘perseguição’. Comecei minha caminhada

carismática em 1983, e se eu deixar o Espírito agir, vou continuar assim até a morte. A bispos que

não aceitavam o dom de línguas, expliquei a eles porque orava assim, e continuaria fazendo. Se o

bispo pedisse que não o fizesse numa comunidade católica, eu o obedeceria, já que ele que vai

responder a Deus pela pastoral. Mas, na minha oração pessoal, e mesmo entre irmãos de oração, o

faria, como o faço, normalmente. Nem por isto o bispo se tornou meu inimigo. Aliás, pelo contrário.

Com isto, não quero diminuir o sofrimento que temos quando somos contrariados pelos que nos

‘dirigem’, sejam os pais ou os padres. Apenas quero dizer que este é o único caminho do cristão,

isto é, sofrer, e em paz. E dar a dimensão correta a cada coisa. Morrer como cordeiro mudo, e não

como ‘porco gritando’.

Se o que queremos é, repito mais uma vez, fazer da Igreja de Teófilo Otoni uma grande RCC, acho

que estamos perdendo tempo. A RCC, especialmente em nossa Diocese, é muito fraca e pobre para

ser modelo para alguém. As várias cidades não se ‘respeitam’ em suas riquezas. Os grupos

disputam entre si. Já perdi muito tempo, quando coordenador diocesano, tendo que auxiliar padres

em grupos em que o núcleo queria puxar o tapete do coordenador. ‘Servos’ de Deus boicotam

eventos de ‘servos’ de quem não gostam. Vida de oração e sacramental? Bom, reparem bem por

aí... Não damos testemunho de fé que deva ser imitado...

Não, não estou dizendo que somos ‘o demônio’... só estou dizendo que, no geral, não damos

testemunho adequado. E, aos que tem vida exemplar, nem preciso defender...eles estão na RCC aí,

sendo para nós sinais de Deus.

Desmitificar a ‘falsa realidade’

Proponho que façamos uma leitura realista da história e da fé. Paremos de nos sentir os

‘coitadinhos’, incompreendidos, e vejamos quem somos de fato. Como uma vez me disse Antônio

Carlos Santini, num dos diálogos mais libertadores de minha vida, e quando eu mais sofria por me

sentir ‘perseguido’: ‘Se o que falam de você não é verdade, porque você se incomoda? Se é

verdade, porque você se incomoda?’

Que tal, ao invés de ficarmos reclamando da falta de conversão dos outros, comecemos a caprichar

mais na nossa? Que ao invés de reclamarmos que não nos aceitam, passemos a aceitar mais aos

outros? E que ao invés de esperar que façam por nós, façamos o que devamos fazer?

Precisamos, com urgência, ler os sinais dos tempos que estão diante de nós, a começar ao nível

pessoal, mas,também, pelo inverso: que tal começarmos a ver diante de nós o que temos de

‘concreto’ na Igreja: pessoas, comunidades, Diocese, Bispo, padres, e começar a agir dentro da

realidade que o Senhor Deus, generosamente, nos concede?

Para mim, é fácil falar isto. Em Belo Horizonte, eu já fizera uma opção de fugir do sucesso

carismático, e seguindo um apelo, que acho que foi de Deus, vim pra Teófilo Otoni. Fui

profundamente acolhido por vários irmãos, e ‘bonitamente perseguido’ por outros (isto é uma ironia

ao tema do texto). E, por seguir ao apelo de Deus que me trouxe para cá, vou reclamar de quê? Esta

é a realidade a que Ele me trouxe, portanto, é a melhor para mim.

Peçamos ao Espírito que abra os nossos olhos para a realidade, não para a fantasia que criamos, ao

querer o que não temos, e não querer o que temos.

Quando serei perseguido

Os que vão virar o rosto quando me verem após ler este texto...não serão meus perseguidores. Os

que vão me criticar nos comentários do facebook... não serão meus perseguidores. Os que poderão

até me ofender... não serão meus perseguidores. Os que não me chamarem mais para pregar ou

cantar (já não chamam muito mesmo...)... não estarão me perseguindo.

Quando a última gota de meu sangue verter por terra, após terem tomado todos os meus bens, me

torturado, e meu nome for lama para que todos pisem, sem nome, sem honra, sem lembrança,

esquecido de todos...aí sim, poderei dizer para Jesus: ‘Agora sim, Senhor. Obrigado porque sabias

que era muito pouco o meu amor pelo Senhor, e só agora me deixastes de fato ser perseguido. E, me

perdoe, por não ter aceito o que acontecia antes, e que eu tanto reclamava.’

Se perseguido aqui eu não for

Sinceramente um cristão não sou

A Tua glória quero conhecer

Ver a experiência de sobreviver...

Viver pra mim é Cristo, morrer pra mim é ganho

Não há outra questão, quando se é cristão

Não se para de lutar

Triunfarei sobre o mal, conquistarei troféus

Não há outra questão, quando se é cristão

Não se para de lutar... até chegar ao céu

Se calarem o som da minha voz

Em silêncio estarei a orar

Se numa prisão me colocar

Eu vou Te adorar

Se minha família me trair

Eu vou sonhar com Deus

Viver seus planos isso é parte

De uma carreira de cristãos

Mt 5, 11Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem, e, mentindo, disserem

todo tipo de mal contra vós, por causa de mim. 12a

Alegrai-vos e exultai, porque será grande a

vossa recompensa nos céus”.

Que tal começarmos a cumprir esta palavra, digo, Palavra?

É tempo de refletir, e até a próxima. Deus está conosco.