perez, trindade, fogaça, batista. universo_signico_da_pirataria
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UNIVERSO SÍGNICODA PIRATARIA:
Falso? Verdadeiro!
Clotilde PerezEneus Trindade
Jôse FogaçaLeandro Leonardo Batista
(Organizadores)
Alexandre Las Casas • Alhen Rubens • André Luiz Peruzzo •
Andrea Meneghel • Bibiana Stholer Sabença Almeida • Bruno
Pompeu Marques Filho • Carolina Boari Caraciola • Cinira Baader
• Clotilde Perez • Dorinho Bastos • Eneus Trindade Barreto
Filho • Gabriela Ayer • Gino Giacomini Filho • Hélio Silva • Janiene
Santos • Jeferson Hugo Pacheco de Rezende • Jôse Fogaça • José
Palandi Junior • Lawrence Koo • Leandro Leonardo Batista
• Livia Souza • Marcos Hiller • Maria Cecília Andreucci Cury •
Nicolás Llano • Paulo Roberto Monteiro de Araújo • Raquel de
Castro Dantas Cavalcante • Sergio Bairon • Silvio Koiti Sato
• Thais Novais de Curtis • Wesley Moreira Pinheiro
São Paulo– 2013 –
© Clotilde Perez; Eneus Trindade; Jôse Fogaça e Leandro Leonardo Batista (orgs.), 1ªed., 2013.
INMOD Instituto da ModaAlameda dos Jurupis 943, 13º and.Moema – São Paulo – SP – BrasilCEP 04088-906www.institutodamoda.org.br
Direção editorial: Clotilde PerezCapa: Luiz Basile / Casa Desenho
Diagramação: Tarlei E. de Oliveira
Todos os direitos reservados.Proibida reprodução total ou parcial.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Clotilde Perez, Eneus Trindade, Leandro Leonardo Batista e JôseFogaça (Organizadores)
Vários autores. Universo sígnico da pirataria : Falso? Verdadeiro!São Paulo: Editora Imod, 2013.
16x23cm 363 p.ISBN 978-85-87963-66-6
1. Comunicação. 2. Consumo. 3. Cultura. 4. Signo.5. Comércio
CDD 306.309
5
Sumário
Prefácio – Falso de Verdade ............................................................... 9Massimo Canevacci
GESC3, um Grupo que Pesquisa e Faz ............................................ 13Clotilde Perez; Eneus Trindade e Leandro Leonardo Batista
Colaboradores ................................................................................. 23
Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na PesquisaFotoetnográfica .......................................................................... 31Eneus Trindade e Clotilde Perez
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria .................................... 41Paulo Roberto Monteiro de Araujo
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea:Motivaciones para la Busqueda, Compra e Uso de las MarcasFalsificadas ................................................................................. 53Clotilde Perez; Eneus Trindade e Sérgio Bairon
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação ... 79Lawrence Chung Koo
Imitação na Propaganda Comercial ................................................. 91Gino Giacomini Filho
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um NovosParadigma de Consumo ........................................................... 125Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos 155Thaís Novais de Curtis
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Contrafação e seus Museus: Espaços de Apologia ou Crítica aoConsumo Pirata? ...................................................................... 167Eneus Trindade; Livia Souza e Nicolás Llano
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo ............................... 189Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
Tepito, Cidade do México – DF: A Versão Mexicana daRegião da 25 de Março Paulistana e suas Adjacências ............... 217Jefferson Hugo Pacheco de Rezende
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações –Resultados de Pesquisa Coletiva Realizada pelos Integrantesdo GESC3 ................................................................................ 227Jôse Fogaça; Silvio Koiti Sato; Clotilde Perez; Alhen Damasceno;
Cecília Cury; Lawrence Koo; Cinira Baader eRaquel Cardoso
Glossário Pirata
Apresentação ................................................................................. 255Alhen Rubens Damasceno e Cinira Baader
Adaptação ..................................................................................... 257Jôse Fogaça
Análogo ........................................................................................ 259Hélio Silva
Autêntico ...................................................................................... 263Lívia Souza
Autoria .......................................................................................... 267Bibiana Stohler Sabença de Almeida
Avatar: Nome Masculino, Mitologia Hindu .................................. 271José Palandi Junior
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Clonagem ..................................................................................... 275Eneus Trindade
Contrafação .................................................................................. 279André Peruzzo
Cópia ............................................................................................ 283Bruno Pompeu Marques Filho
Copyright e Copyleft .................................................................... 287Silvio Kioti Sato
Creative Commons ....................................................................... 293Bruno Pompeu Marques Filho
Duplo ........................................................................................... 295Bibiana Stholer Sabença de Almeida
Fair Use ........................................................................................ 299Bruno Pompeu Marques Filho
Falsificação .................................................................................... 301Lívia Souza
Fantasia ......................................................................................... 305Andrea Meneghel
Genérico ....................................................................................... 311Jôse Fogaça
Genuíno ....................................................................................... 315Eneus Trindade
Imitação ........................................................................................ 317Clotilde Perez e Sergio Bairon
Kitsch ........................................................................................... 323Janiene Santos
Knockoff ....................................................................................... 327Jôse Fogaça
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Original ........................................................................................ 331Bruno Pompeu Marques Filho
Paródia .......................................................................................... 335Clotilde Perez
Pirataria Moderna ......................................................................... 337Alhen Damasceno
Plágio ............................................................................................ 341Leandro Batista
Réplica .......................................................................................... 345Gabriela Ayer
Reprodução .................................................................................. 347Marcos Hiller
Screener ........................................................................................ 349Alhen Damasceno
Simulacro...................................................................................... 353Bruno Pompeu Marques Filho
A linguagem cotidiana no campo pirata: novos aprendizados ........ 355
Paraquedas .................................................................................... 355
Camelô ......................................................................................... 356
Loja .............................................................................................. 356
Galeria .......................................................................................... 357
Olheiro ......................................................................................... 357
Puxador ........................................................................................ 357
Homem da escada ........................................................................ 357
Rapa ............................................................................................. 358
Vendedor de perfume ................................................................... 358
Réplica / Réplica de primeira linha ............................................... 359
Cópia / Réplica de segunda linha .................................................. 359
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Prefácio
Falso de Verdade
MASSIMO CANEVACCI
A tecnologia e, ainda mais a cultura digital, está expandindo um tipo
de sensibilidade estética e de práticas domésticas ou pós-industriais, com
forte criatividade subjetiva (multividual) onde a diferença dicotômica
clássica entre o que é falso e o que é verdadeiro tem um sentido
questionável e nunca mais igual como foi no contexto analógico. Claro,
as falsificações de obras e de pessoas pertencem a muitas culturas humanas
e na “ocidental” ainda mais. O pirata é pirata e na visão piratesca eu tenho
o direito de me apossar dos bens materiais dos outros. Só que agora a
distinção entre bem material e imaterial está cada vez mais sutil e é quase
impossível dividi-la. Simetricamente, as práticas além do dualismo falso/
verdadeiro, se difundem por meio de uma sensibilidade operacional
material/imaterial. Por isso os piratas mais “autênticos”, isto é falso, são
aqueles que praticam a hackeragem, inventam partidos fantasmas,
replicam infinitos e mutáveis produtos culturais.
Na minha experiência na China, onde morei por seis meses ensinando e
pesquisando na Universidade de Nanjing, foi fundamental entender o
que significava o falso. Um techno-canibalismo devora a verdade ou
mesmo a origem de cada produto. A China conseguiu dar em
Massimo Canevacci
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pouquíssimo tempo um salto organizado, diria quase sistêmico, a tudo
isso, unificando reprodução material e imaterial, além das lojas “oficiais”.
Nos mais diversos territórios se expandem lojinhas, bancas e banquinhas,
carrinhos, simples tapetes, ambulantes: uma infinita microfísica de
verdadeira falsificação incontrolável, cujos custos de reprodução são
aproximadamente zero e os preços de venda sem possibilidade de
concorrência com produtos similares de outras partes do mundo. A China
interpreta melhor aquilo que a glocalização oferece graças ao modo tempo-
espaço acelerados com a tecnologia digital. As mercadorias chinesas
exportadas em quase todos os cantos do planeta tinham a clara visão de
que estes produtos pareciam verdadeiros, é como se fossem verdadeiros,
talvez até sejam verdadeiros: todavia, também se são falsos, todo o mundo
gosta de comprar por tal ambigüidade. Elas muitas vezes são produzidas
na China sob licença das grandes marcas, é suficiente modificar uma letra
(de Armani à Amani ou YSL vira YSJ) para evitar improváveis causas,
mesmo que o produto seja de todo igual ou verossímil. Um fluxo de
mercadoria fake sai das fábricas gêmeas ou subfábricas paralelas, sem que
sejam necessárias operações de camuflagem. Por isso, os direitos autorais
(copyright) estão em crise não só nos produtos intelectuais, mas também
nos produtos materiais, ou melhor, esta distinção não dá mais o sentido
do que está acontecendo na contemporaneidade. São dimensões cruzadas;
esta distinção entre material e imaterial não funciona mais, é um dualismo
lógico, intelectual e produtivo e que está em crise; que tenta defender
um passado certamente alterado. Estamos vivendo uma fase na qual todos
nós podemos criar coisas, objetos, histórias, imagens, seja lá o que for e
replicar sem que tenhamos o dever de pedir permissão a alguém: e já
funciona é a impressora 3D!
Se refletirmos melhor sobre o que está acontecendo, parece que esta
distinção entre verdadeiro e falso é modernista. Existe uma visão artística
Prefácio – Falso de Verdade
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sobre este assunto que o autor Orson Welles elaborou no final da sua
vida criativa. Por isso, eu chamarei esta mistura falso/verdadeiro de fake
em homenagem ao filme dele ForFake – Verdades e Mentiras (F for Fake)
– onde ele apresenta a profunda superfície e a tenuidade dessas coisas.
Ocopy-left não é só um slogan de uma esquerda pirata, é a prática que
qualquer pessoa dotada de instrumentos, agora ao alcance das mãos,
realiza na vida cotidiana. Uma vez que a autenticidade do produto é cada
vez menor, o valor ambíguo que tal conceito sempre comportou entra
em crise ou evoca um arcaico modelo restaurativo. Em antropologia, a
autenticidade juntamente com a pureza e a origem foram questionadas
há muito tempo, estão em discussão nas criatividades culturais e nas
identidades individuais. Tudo é resultado de misturas híbridas e mutações
sincréticas: uma vez que alguém – estilista de moda ou engenheiro de
software – invente um produto, este se torna público porque de novo a
distinção clássica público/privado é obsoleta. As coisas vêm selecionadas,
dissecadas, engolidas, regurgitadas, montadas e recicladas como se fossem
deliciosas partes de um corpo inimigo feito prisioneiro e cozinhado, ainda
cheio das virtudes que trazia consigo e cujo objetivo final será o de ser
devorado e absorvido pela famosa iniciativa local.
Fake é o verdadeiro-falso, o falso que é verdadeiro, uma mistura semiótica
e fetichista que dissolve as distinções dualistas tradicionais baseadas na
certeza da verdade e do direito. Um processo que a arte há muito pratica
em ambígua aliança com o mito. A arte nunca é realista e nem reproduz
a realidade. Em certo sentido, o fake pratica uma obra de arte estendida
aos produtos materiais e imateriais, ao consumo performático, à
comunicação digital. E assim, o Fake está se tornando algo mais e alterado,
uma visão de mundo com uma sua filosofia e com tantas práticas
relacionadas.
Massimo Canevacci
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O livro curado por Clotilde Perez, Eneus Trinidade, Jôse Fogaça e
Leandro Leonardo Batista, professores e pesquisadores do GESC3 –
Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo,
da ECA USP, navega felizmente nesta perspectiva glocal, onde marketing,
mercadoria, publicidade, ideação, produção e consumo são focalizados
numa metodologia plural que desafia cada singular disciplina
“disciplinada”. E nesse sentido, trata-se de uma abordagem atual e
comprometida com as implicações múltiplas que a temática instala,
oferecendo aos leitores tensões e caminhos para o aprofundamento da
pesquisa na área. Provavelmente, precisamos imaginar uma interpretação
diversa ou outramimese e é nesse sentido que os autores de “Universo
Sígnico da Pirataria: Falso? Verdadeiro!”, direcionam suas reflexões. O
fake não é simples imitação, é uma visão mais complexa, onde a seleção
mimética, como anunciado no inicio, é ela mesma antropofágica e
sincrética: cada multivíduo aprendeu a criar através de miméticas parciais
sempre verdadeiras porque são falsas. Falsas? Fake....
Fake em São Paulo/Roma, Junho de 2013.
13
GESC3, um Grupo que Pesquisa e Faz
CLOTILDE PEREZENEUS TRINDADE
LEANDRO LEONARDO BATISTA
O GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura
e Consumo, certificado pelo CNPq e pela USP desde 2007, reúne o tra-
balho de investigação de vários pesquisadores, professores, pós-graduandos
e alunos de Iniciação Científica da ECA USP e de diversas outras entidades
de ensino e pesquisa parceiras. Trata-se de um grupo multidisciplinar,
envolvendo áreas como a Comunicação, a Antropologia, a Psicologia, a
Filosofia, a Arquitetura, o Design, a Moda, a Administração, a Economia,
entre outras. Busca refletir a respeito dos fenômenos comunicacionais,
midiáticos, mercadológicos e culturais e seus reflexos na sociedade
contemporânea, particularmente, nas manifestações do consumo. Nesse
sentido, o GESC3 tem contribuído com publicações científicas sob a forma
de livros, capítulos de livros e artigos, mas também por meio da realização
e da participação em seminários e congressos de Comunicação, Semiótica,
Publicidade, Consumo, Antropologia, Marketing e áreas afins (Congresso
Mundial de Semiótica, Congresso AISV – Semiótica Visual, Global
Branding, Intercom, Intercom regionais, Anpad, Ibercom, Comunicom,
Compós, Siep, Alaic, Imagens da Cultura/Cultura das Imagens, Cultura
Visual, Cultura Pirata, Encontro de Mídia, Pró-Pesp PP, Relaip, entre
outros). Seus membros ministram aulas em cursos de extensão e especia-
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista
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lização em São Paulo e em várias instituições no país (na PUC SP, na ECA
e FEA-USP, FIA, IED, FAAP e FGV). Também foram criados dois cursos
de Especialização pelos líderes do GESC3, que são ofertados na ECA USP;
o curso de Pesquisa de Mercado, já na sua 9ª. edição, coordenado pela
Profa. Dra. Clotilde Perez em conjunto com o Prof. Dr. Leandro Batista
e o curso de especialização em Estética e Gestão da Moda, na 2a. edição,
coordenado pelo Prof. Dr. Eneus Trindade, em conjunto com a Profa.
Dra. Clotilde Perez. Seus pesquisadores também são demandados para
entrevistas destinadas à imprensa escrita, audiovisual e digital, além de
serem convidados para palestras em Universidades, ONGs e empresas no
Brasil e no exterior.
Foi no GESC3 que surge a vontade de criar uma entidade que reunisse
os pesquisadores em publicidade que se encontravam dispersos no país e
que, muitas vezes, não tinham proveitosa interlocução em seus estados
de origem, indo ao encontro dos mesmos desejos nutridos há anos pelos
pesquisadores do GT de Publicidade e Propaganda da Intercom, em
especial nas duas gestões do Prof. Dr. Jean Charles Zozzoli, UFAL e na
atual gestão da Profa. Dra. Maria Lilia Dias de Castro, UFSM. Foi assim
que em 2010 foi criada a ABP2 – Associação Brasileira dos Pesquisadores
em Publicidade, atualmente com mais de 180 filiados. A entidade,
juntamente com o GESC3 e a ECA USP, além de vários outros parceiros,
organiza anualmente o encontro de seus pesquisadores, intitulado Pró-
Pesq PP, que finalizou recentemente sua quarta edição, com pleno êxito.
Desde a primeira edição do Propesq PP, o evento contou com o apoio
do CRP – Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo
e do PPGCOM – Programa de Pós-Graduação em Comunicação da ECA
USP, além do financiamento da Pró-reitoria de Cultura e Extensão da
USP, do curso de Especialização em Pesquisa de Mercado, da Capes e,
em especial, da FAPESP.
GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz
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O GESC3 mantém atividades conjuntas com grupos de estudo locais e
internacionais, como o MARCO (PUC SP) liderado pelo Prof. Dr.
Alexandre Las Casas, com o CEDIPP (ECA USP), liderado pelo Prof.
Dr. Sergio Bairon, com o GENN (ECA USP), liderado pelo Prof. Dr.
Paulo Nassar; com o grupo de estudos liderado pela Profa. Dra. Nilda
Jacks da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, além das parcerias
internacionais em ensino e pesquisa com a Universidade Católica Portu-
guesa, Núcleo de Estudos da Marca, liderado pelo Prof. Dr. Paulo Len-
castre, com a Universidad de Múrcia, Espanha, por meio do Grupo de
Estudos em Comunicación y Información, liderado pelo Prof. Dr. Pedro
Hellin, com a Pontifícia Universidade Católica do Chile, por meio da
coordenação da Profa. Dra. Paulina Goméz, com a Universidade de
Sevilla, por meio do grupo de pesquisa liderado pelo Prof. Dr. Fernando
Contreras, com a Universidad Complutense de Madrid, por meio do
grupo Corporate Excelente, liderado pelo Prof. Dr. Juan Benavides, com
o Prof. Dr. Massimo Canevacci, da Universidade La Sapienza de Roma
e do IEA – USP.
Além da página dos grupos de pesquisa vinculada à plataforma Lattes do
CNP (http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=
0067609LVC6FNW), o GESC3 mantém um perfil no Facebook (https:/
/www.facebook.com/groups/396462983712353/?fref=ts) para fomentar
o diálogo e o compartilhamento de ideias, temas, teorias, metodologias
e autores.
O GESC3, por meio de seus líderes, criou e edita semestralmente a revista
Signos do Consumo (classificada no qualis B3) desde 2009, cumprindo
com seu compromisso de registrar e promover o acesso ao conhecimento
na área da Comunicação e nas suas interfaces com as demais Ciências
Sociais Aplicadas, Humanas e Artes.
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista
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As linhas de pesquisa do GESC3 estão reunidas em cinco eixos centrais:
a) Antropossemiótica: discussões teórico-metodológicas; b) Estética e
ética da publicidade e do consumo; c) Estudos de tendências; d) Publi-
cidade e semiótica das expressividades da marca; e) Semiótica e rituais
de consumo e f) Criatividade e brasilidade. Essas linhas de investigação
abrigam várias pesquisas que congregam diferentes pesquisadores (de Ini-
ciação Científica a pós-doutorados) em arranjos orgânicos, organizados
a partir das afinidades temáticas. São as seguintes as principais pesquisas:
1) A produção de sentido na recepção da publicidade e nas práticas de
consumo de alimentos na cidade de São Paulo (financiamento CNPq,
concluído em 2011).
2) Cerveja, Publicidade, Regulação e Consumo: o olhar da comunicação
sobre as marcas de cervejas contemporâneas e suas implicações na vida
social de adolescentes. (financiamento CNPq e concluirá em 12/
2013)
4) Personas do Consumo (pesquisa coletiva)
5) Jovem e consumo cultural em tempos de convergência (projeto
financiado pelo CNPq em parceria com UFRGS)
6) Criatividade empreendedora e brasilidade (Financiamento FAPESP,
ECA-USP)
7) Tendências de Comportamento e Consumo (em parceria com o
Instituto Ipsos)
Com isso entendemos que estamos trilhando um caminho sólido que
busca integrar a pesquisa no cotidiano de nosso estar/ser universidade,
fundamentando nossa prática docente e nossas atividades na comunidade.
O GESC3 é assim um grupo de pesquisadores que pensa e faz.
GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz
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É com a perspectiva empreendedora, que nos move para o fazer científico,
que apresentamos mais um produto, desta vez, fruto de pesquisa coletiva
dos membros do GESC3, intitulado Universo Sígnico da Pirataria: Falso?
Verdadeiro! Este trabalho condensa as contribuições dos integrantes e
convidados do GESC3 em investigação conduzida entre os anos de 2010
a 2011 sobre a perspectiva do falso como verdadeiro na construção das
percepções estéticas, das condutas éticas e das generalizações correspon-
dentes às dimensões simbólicas que constituiem o universo de sentidos
do consumo de mercadorias de marcas pirateadas.
Com este horizonte, o capítulo 1 inicia a obra trazendo a reflexãoteórico-
metodológica sobre a opção do grupo pelo método etnográfico, privile-
giado pela Antropologia Visual. A discussão neste momento é metodo-
lógicae busca a sustentação epistemológica da concepção dos trabalhos
coletivos realizados em campos distintos que se referem às contribuições
dos organizadores da obra e coordenadores da pesquisa no que diz respeito
Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica, que
aponta os fundamentos epistemológicos dos estudos empíricos que se
seguirão nos resultados apresentados nos capítulos 7, 8, 9, 10 e 11.
O segundo capítulo A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria de autoria
de Paulo Roberto Monteiro de Araújo, que nos faz pensar a legitimidade
do desejo sobre as coisas e como ela se projeto numa conduta ética de
consumo, este princípio é regido por um querer, desejo, que torna legí-
timo o consumo por um bem, na perspectiva da ética do bem-estar e que
o produto pirata parece ser um artífício de acesso. Na sequência o capítulo
3, A antecedência do simulacro na sociedade contemporânea: as motivações
para a busca, compra e uso de produtos e marcas falsificadas de autoria dos
Pesquisadores Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon, aprofunda
reflexões sobre a dimensão cultural de que os produtos copiados,
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista
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replicados, falsificados, tem o seu consumo numa expectativa legítima
de colocarem o seu comprador em conjunção com a narrativa do bem-
estar, não sendo este consumo visto sob a perspectiva legal, da propiedade
da marca, mas o sentimento que mobiliza um mercado fantástico de pro-
dutos a partir da ensígnia da piratiaria, lançando a questão que moveu a
condução da pesquisa, a saber: quais ritualidades de consumo estão em
jogo nas lógicas comunicacionais e de interação das marcas originais para
com asmarcas pirateadas na construção de sentidos entre vendendores e
consumidores de produtos de marcas pirateadas? A questão longe de ser
respondida, busca aguçar a curiosidade do leitor, por meio dos capítulos
subsequentes, na construção de caminhos para a compreensão do falso
como verdadeiro que constitui o universo de sentidos do consumo pirata.
Nesse sentido, o capítulo 4Uma Visão Milenar da Piratariade autoria de
Lawrence Chung Koo, mostra na percepção de um chinês, residente no
Brasil, como o ideário confucionista compreende o papel pedagógicoda
cópia, nos presenteando com um olhar diferenciado, oriental, outros
sentidos possíveis da pirataria.
Já o capítulo 5 Imitação na Propaganda Comercialde Gino Giacomini
Filho nos permite mergulhar no fenômeno da pirataria para outras
dimensões que vão além do produto e que chegam às manifestações da
imitação no contexto da comunicação mercadológica, a publicidade. O
capítulo seis traz para a realidade da obra o ponto de vista do sistema
captitalista sob a ótica de O marketing da pirataria: legalidade e ilegalidade
em um novo paradigma de consumo, de Alexandre Las Casas e Wesley
Moreira Pinheiro, porém, o texto traduz também a partir do conflito
entre a legalidade e ilegalidade do consumo pirata, a aspiração do
consumo da mercadoria falsa, como elemento que satisfaz as necessidades
de um grande público dos consumidores, desejosos por ingressar no
fascinante mundo de consumo, cujos preço praticados pelas marcas
GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz
19
originais segregam esse grande público, ao mesmo tempo que o faz desejar
as marcas em suas expressividades de contatos com os públicos na vida e
povoando o imaginário social coletivo.
A crítica social sobre os processos que envolvem o consumo pirata
também são alvo da reflexão de Thais Novais de Curtis que nos oferece
o texto do 7º. Capítulo, Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos
Falsos Produtos.
O primeiro desses resultados, capítulo 8, Contrafação e seus museus: espaços
de apologia ou crítica do consumo pirata? Paradoxos da hipermodernidade e
sua estética, de autoria de Eneus Trindade,Lívia Souza e Silva, Nicolás Llano
Linares, o trabalhobusca mostrar no paradoxo do hiperconsumo como o
espaço do museu da Pirataria em Paris se configura como um elogia à
pirataria, ao mesmo tempo que tem em seu horizonte a perspectiva crítica
e educativa para seus visitantes contra a produção pirata. Em complemento
a essa percepção, o espaço do museu se reverte num local revelador de uma
taxionomia das manifestações do produto e das marcas piratas.
Josê Fogaça e Silvio Sato, no capítulo 9, abordaram no texto Luxo Pirata,
Desejo Autêntico, Uso Legítimo, as tensões e soluções engendradas durante
a construção e negociação de sentidos inerentes às relações de produção
e consumo de produtos e serviços piratas. Com uma visão mais largada
e profunda, os autores apresentam caminhos mais consequentes para o
entendimento desta manifestação social tão característica da sociedade
pós-moderna.
Já Jefferson Hugo Pacheco Rezende, apresenta no capítulo 10, um estudo
empírico realizado na região metropolitana da cidade do México, DF a
contribuição intulada Tepito, Cidade do México-DF: A versão mexicana
da região da 25 de Março paulistana e suas adjacências.
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista
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Por fim, a obra chega ao seu clímax com a apresentação no capítulo 10
do texto construído por “muitas mãos” Em campo pirata: olhares, registro
e interpretações, possibilitando ao leitor a conexão dos pressupostos da
pesquisa em antoplogia visual, fotoetnográfica, na interface com a
comunicação como tradução de um conhecimentosensível, visual das
realidades estudadas em campo. Contudo, cabe ressaltar que o trabalho
vai além dos sentidos das expressões visuais apreendidas no contexto do
campo realizado na rua 25 de março em São Paulo, local privilegiado do
comércio da pirata brasileiro, trazendo contribuições advindas de um
processo etnográfico das relações entre vendedores e consumidores no
contexto comercial da temática em pauta.
Mas se o capítulo anterior poderia significar o fim da obra, o trabalho
coletivo mostra-se vivo e aberto a desdobramentos, presenteando os
leitores com três produtos que aguçam ainda mais o questionamento so-
bre o tema da pirataria: o primeiro deles, refere-se a umglossário (realizado
por 32 autores) que busca delinera um horizonte determinologias do
universo sígnico do consumo pirata, cujas reflexões trazem novos aportes
e questões para aqueles que se interessam pela temática. O segundo põe
em evidência a riqueza e a criatividade da linguagem ordinária utilizada
nos contextos de produção e consumo pirata, por meio da organização
de um pequeno glossário de termos – um convite à imersão no universo
de sentidos imaginativos e carregados de sentido. E por último, mas não
menso importante, o Publicitário e Professor de Arte Publicitária do
Curso de Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicações e Artes
da USP, Dorinho Bastos, nos presenteia com uma imagem síntese O
mapa da pirataria, trazendo pelo princípio teórico-metodológico da
expressão visual, sensível, algo que explica, traz conhecimento sobre a
realidade vivida, como aqui tetamos articular nesta obra sobreos sentidos
do consumo pirata. Este então foi o nosso ponto de vistapara este trabalho
GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz
21
e que operou num pressuposto de valorização de que o que move os
indivíduos a consumirem produtos pirateados é o desejo legítimo de
querer o melhor para se, associado a uma ideia de ter algo belo, que
vislumbra um lugar de sentido sematizado pela noção de qualidade no
consumo e de asperiação social, que alimenta uma lógica de existência
que se fundamenta na experiência no consumo do falso-verdadeiro, sendo
este aspecto uma das manifestações anarquicas do mundo capitalista que
trabalha com a lógica da midiatização das marcas para a contrução de
um universo de consumo aspiracional que se coloca como objeto
privilegiado no contexto da comunicação em vias de midiatização.
Tenham uma ótima leitura!
CLOTILDE PEREZ
ENEUS TRINDADE
LEANDRO LEONARDO BATISTA
23
Colaboradores
ALEXANDRE LAS CASAS
Doutor em Administração pela FGV. Administrador. Professor
titular de Marketing da PUC SP, junto ao Programa de Estudos
Pós-graduados em Administração. [email protected]
ALHEN RUBENS
Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA
USP. Publicitário formado pela Universidade Federal do Ceará.
Pesquisador do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]
ANDRÉ LUIZ PERUZZO
Graduando em Publicidade pela ECA USP. Bolsista do CNPq –
Iniciação Científica, junto ao GESC3 – Grupo de Estudos Semió-
ticos em Comunicação, Cultura e Consumo.
ANDREA MENEGHEL
Mestre em Administração pela PUC SP, com graduação na mesma
área. Pesquisadora do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo.
Colaboradores
24
BIBIANA STHOLER SABENÇA DE ALMEIDA
Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA USP.
BRUNO POMPEU
Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA
USP. Publicitário formada pela ECA USP. Professor no IED.
Pesquisador do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]
CAROLINA BOARI CARACIOLA
Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia
Universidade Católica (PUC). Mestre em Educação, Arte e Histó-
ria da Cultura, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com a
dissertação “A arte na publicidade de uma marca de luxo”. Pós Gra-
duação em Comunicação com o Mercado pela ESPM. Graduação
em Propaganda e Marketing (ESPM) e Direito (FMU).
CINIRA BAADER
Graduada em Comunicação Social (Publicidade e Propaganda)
pela Universidade Regional de Blumenau (SC). Mestranda do
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da
Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo
(SP). [email protected]
Colaboradores
25
CLOTILDE PEREZ
Livre-docente em Ciências da Comunicação pela ECA USP. Pós-
doutora em Comunicação pela Universidade de Murcia, Espanha.
Doutora em Comunicação e Semiótica e Mestre em Administração
pela PUC SP. Professora da ECA USP. Professora na PUC SP.
Semioticista. Líder do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected],
DORINHO BASTOS
Possui graduação em Arquitetura pela Universidade Braz Cubas.
Mestrado em Ciências da Comunicação pela Escola de Comuni-
cações e Artes da Universidade de São Paulo e doutorado em
Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. É
professor no curso de Publicidade da Escola de Comunicações e
Artes da Universidade de São Paulo e Sócio Diretor do Estúdio K
Arquitetura e Comunicação Visual S C Ltda. Chartunista.
ENEUS TRINDADE BARRETO FILHO
Livre-docente em Ciências da Comunicação pela ECA USP. Pós-
doutor pela Universidade Aberta, Portugal. Doutor e Mestre em
Ciências da Comunicação pela ECA USP. Professor da ECA USP.
Vice-líder do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]
Colaboradores
26
GABRIELA AYER
Mestre em Administração de Marketing pela PUC SP. Adminis-
tradora. Pesquisadora junto ao GESC3 – Grupo de Estudos Semió-
ticos em Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]
GINO GIACOMINI FILHO
Possui graduação em Publicidade e Propaganda pela Universidade
de São Paulo, mestrado em Ciências da Comunicação pela Uni-
versidade de São Paulo, doutorado e Livre-docência em Publici-
dade pela USP. Atualmente é professor da graduação em Comu-
nicação Social e do Programa de Mestrado em Comunicação da
Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), e docente
da graduação em Comunicação Social da Universidade de São
Paulo. [email protected]
HÉLIO SILVA
Mestrando do Programa de Pós-Graduação da Escola de Comu-
nicação e Artes – ECA; Redator publicitário com mais de 25 anos
de experiência no desenvolvimento de campanhas para clientes de
variados segmentos de negócios; Membro do GESC3 – Grupo de
Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo.
[email protected] e [email protected]
JANIENE SANTOS
Mestre e doutoranda em Ciências da Comunicação pela ECA USP.
Professora e Coordenadora do Istituto Europeodi Design. Pesqui-
sadora do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comuni-
cação, Cultura e Consumo.
Colaboradores
27
JEFERSON HUGO PACHECO DE REZENDE
Mestrando em Geografia pela USP. Possui graduação em Geografia
pela Universidade de São Paulo (2007). Atualmente é Técnico em
Geoprocessamento da Prefeitura Municipal de Guarulhos. Tem
experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia
Humana. [email protected]
JÔSE FOGAÇA
Doutoranda em Ciências da Comunicação pela ECA USP, Mestre
em Sociologia pela Unicamp, Cientista Social pela FFLCH USP.
Professora do Curso de Pós-Graduação em Pesquisa de Mercado
da ECA USP. [email protected]
JOSÉ PALANDI JUNIOR
Doutor em Comunicação e Semiótica e Mestre em Administração
de Marketing pela PUC SP. Professor na PUC SP e na Universi-
dade Mackenzie. [email protected]
LAWRENCE KOO
Pós-doutorando na ECA USP. Possui graduação em Engenharia
Mecânica pelo ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica. Mes-
trado e Doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Administração
pela FGV/CEAG. Pesquisador do GESC3 – Grupo de Estudos
Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo.
Colaboradores
28
LEANDRO LEONARDO BATISTA
Doutor e Mestre em Comunicação pela Universidade da Carolina
do Norte, EUA. Professor da ECA USP, junto ao PPGCom e a
graduação em Publicidade. Pesquisador do GESC3 – Grupo de
Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo.
LIVIA SOUZA
Mestre e doutoranda em Ciências da Comunicação pela USP –
Universidade de São Paulo. Especialista em Cinema, Vídeo e
Fotografia pela Universidade Anhembi-Morumbi. Graduada em
Publicidade e Propaganda pela Universidade de São Paulo. É
pesquisadora do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]
MARCOS HILLER
Mestrando em Comunicação e Práticas do Consumo pela Escola
Superior de Propaganda e Marketing e responsável por todo
processo de comunicação digital do Programa. Coordenador do
MBA em Branding da Trevisan Escola de Negócios. Possui gra-
duação em Marketing pela ESPM, possui especializações em
marketing de serviços pela FAAP e em gestão de marcas pela
Universidade Anhembi Morumbi.
MARIA CECÍLIA ANDREUCCI CURY
Doutoranda em Ciências da Comunicação na Universidade de São
Paulo, Cecília Andreucci é mestre em Comunicação e Práticas de
Consumo pela ESPM-SP e professora do MBA em marketing da
FGV. [email protected]
Colaboradores
29
NICOLÁS LLANO
Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA
USP. Membro do GESC3 – Grupos de Estudos Semióticos em
Comunicação, Cultura e Consumo da ECA USP. [email protected]
PAULO ROBERTO MONTEIRO DE ARAÚJO
Doutor em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas
(2003). Atualmente é professor do Programa de Pós-Graduação
Stricto Senso em Educação, Arte e História da Cultura na Uni-
versidade Presbiteriana Mackenzie. Atua principalmente nas
seguintes áreas: Cultura Contemporânea, Arte, Ética e Filosofia
Política. Pesquisador do GESC3 – Grupos de Estudos Semióticos
em Comunicação, Cultura e Consumo da ECA USP.
RAQUEL DE CASTRO DANTAS CAVALCANTE
Publicitária formada pela Escola de Comunicações e Artes da Uni-
versidade de São Paulo. Membro do GESC3 – Grupos de Estudos
Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo da ECA
USP.
SERGIO BAIRON
Livre-docente em Ciências da Comunicação pela ECA USP.
Doutor em Ciências pela FFLCH – USP. Historiador e Cientista
Social. Professor do PPGCOM ECA USP e da graduação em
Publicidade. Líder do CEDIPP – Centro de Estudos em Comu-
nicação e Produção Partilhada do Conhecimento.
Colaboradores
30
SILVIO KOITI SATO
Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola
de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA
USP). Publicitário pela ESPM-SP e especialista em Administração
de Empresas pela EAESP/FGV-SP. Docente nos cursos de gra-
duação e pós-graduação da FAAP e do IED. Pesquisador do GESC3
– Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Con-
sumo. [email protected]
THAIS NOVAIS DE CURTIS
Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Possui graduação em Comunicação Social
com habilitação em Publicidade e Propaganda pela Fundação Esco-
la de Comércio Álvares Penteado e graduação em Secretariado
Executivo Trilíngue pela FECAP. Atua como professora auxiliar
do curso de Comunicação Social da FECAP.
WESLEY MOREIRA PINHEIRO
Mestrando em Administração de Empresas pela PUC SP. Pesqui-
sador do núcleo de Marketing e Comunicação (MARCO) da PUC
SP e do Grupo de Pesquisa Opinião Pública, Marketing Político
e Comportamento Eleitoral da UFMG.
31
Sobre o Olhar na Antropologia Visual ena Pesquisa Fotoetnográfica
ENEUS TRINDADECLOTILDE PEREZ
Buscamos eleger um método de investigação que fosse pertinente ao
nosso objeto – consumo da pirataria – ao mesmo tempo em que per-
mitisse um diálogo proveitoso com os demais métodos de pesquisa já
praticados pelos diferentes pesquisadores do GESC3, com privilégio para
o método semiótico de Peirce (1977) expresso na Teoria Geral dos Signos,
as várias vertentes de análise do discurso (AD), as distintas metodologias
e técnicas qualitativas (grupos de discussão, entrevistas em profundidade
etc.) entre outros. Com esse paradigma foi quase que inevitável nos valer
da pesquisa etnográfica de forma privilegiada, uma vez que, é um método
em constante diálogo com outras regionalidades científicas e teorias
(CANEVACCI, 2008, 2013), ainda que muitos antropólogos acreditem no
seu uso restrito a este campo do saber científico (a Antropologia), aspecto
este com o qual, evidentemente, não concordamos.
Para construir um corpus de reflexão e que também servisse de uma espécie
de guia, uma vez estávamos trabalhando com um grande número de
pesquisadores, construímos um percurso para subsidiar o trabalho de
campo, a partir das reflexões de Ribeiro (2003) que nos possibilita iden-
tificar os caminhos básicos da pesquisa em Antropologia, de Achutti
Eneus Trindade e Clotilde Perez
32
(2004) que permite compreender a dimensão estética de um conheci-
mento sensível dado pela visualidade da fotoetnografia e de Pétonnet
(1982) que nos propõe o percurso do olhar flutuante, aberto às
percepções espontâneas que emanam do contexto de investigação.
Em Ribeiro (2003, pp. 89-91) temos de forma bastante didática, as
dimensões de construção do saber antropológico:
1º Etnografia – Aqui se dá a coleta de material para a escrita das culturas.
São consideradas as posturas do pesquisador em campo e os materiais e
técnicas para as observações e descrições que constituem os produtos da
ação de pesquisa etnográfica.
2º Etnologia – Reflexão sobre o contexto cultural investigado a partir
dos dados etnográficos. Aqui são operadas as relações e as conexões que
constituemos elementos estruturantes e os significados das culturas.
3º – O saber antropológico constituído, isto é, as correlações interdisci-
plinares e transversais a partir dos aspectos culturais observados e anali-
sados na etapa etnológica.
Fonte: RIBEIRO, 2003
ETNOGRAFIAETNOGRAFIAETNOGRAFIAETNOGRAFIAETNOGRAFIAObserObserObserObserObservação evação evação evação evação edescriçãodescriçãodescriçãodescriçãodescrição
ETNOLOGIAETNOLOGIAETNOLOGIAETNOLOGIAETNOLOGIAAnáliseAnáliseAnáliseAnáliseAnálise
ANTROPOLOGIAANTROPOLOGIAANTROPOLOGIAANTROPOLOGIAANTROPOLOGIACULCULCULCULCULTURALTURALTURALTURALTURALSínteseSínteseSínteseSínteseSínteseVisão global e holísticaVisão global e holísticaVisão global e holísticaVisão global e holísticaVisão global e holística
Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica
33
O trabalho de campo segundo Ribeiro (2003, p. 61-117) envolve uma
série de etapas, às quais passamos a seguir:
A abordagem em campo e o aceite da presença do pesquisador: trata-
se do primeiro contato com os informantes, momento no qual são escla-
recidos os objetivos da pesquisa, princípios e finalidades. Também é nesse
instante em que o pesquisador avalia a aceitação de sua presença no
campo. Certamente, dada a natureza da nossa investigação, este será um
momento delicado que seguirá em um bom termo se construído um
diálogo direto e de confiança mútua.
A coleta da autorização para os usos de imagem e para realização da
entrevista: além da concordância em participar da pesquisa, o informante
deve concordar com o uso de sua imagem – fotográfica ou em filme, para
que seja possível seguirmos com a pesquisa. Também dada a natureza de
nosso objeto este não será um item fácil de ser atendido.
As observações: seguiremos os preceitos estabelecidos no item a seguir in-
titulado “O exercício do olhar na antropologia visual e na fotoetnografia”.
As notas de campo: todo o trabalho no terreno/campo deve ser registrado
em texto. As notas de campo são um registro fundamental que além de
auxiliar na recuperação de informações, serve como apoio à analise dos
resultados e eventual retomada da pesquisa no futuro.
Os diários de campo: mais extenso do que as notas, o diário de campo é
um registro muito mais detalhado de todas as atividades, sentimentos,
pensamentos e ações tomadas pelo pesquisador durante todo o processo
de investigação no terreno.
Entrevistas em campo: as entrevistas de campo seguirão o roteiro mínimo
estabelecido.
Eneus Trindade e Clotilde Perez
34
O exercício do olhar na antropologia visual e nafotoetnografia
Após, as essências contribuições de Ribeiro para a compreensão da cons-
trução do saber em antropologia, cabe o resgate dos trabalhos de Achutti
(2004) e Pétonnet (1982) para esta pesquisa. E com eles o aprofunda-
mento para a compreensão de um subcampo da antropologia que dialoga
com a Comunicação que se refere à Antropologia Visual. Este ramo da
antropologia busca em seus pressupostos a escrita visual dos fenômenos
das culturas que, durante muito tempo, foi um procedimento comple-
mentar ao tradicional trabalho etnográfico por meio dos trabalhos em
filmes etnográficos e do uso da fotografia em campo. Essa caracerização
histórica da disciplina da antropologia visual, que não é o foco de nossa
discussão neste momento e pode ser melhor percebida em trabalhos
como o de Riberio (in RIBEIRO e BAIRON, 2007, p. 13-21), Jay Ruby
(2005, p. 159-170) e em Achutti (2004, p. 77-87), que fazem um per-
curso esclarecedor de resgate da memória de tais experiências para
justamente legitimar os propósitos e horizontes de atuação desse subcam-
po da antropologia na atualidade.
O aspecto histórico do surgimento de novas formas de registro, no tra-
balho de campo/terreno, para além do uso do signo verbal na antropo-
logia, é um reflexo do que ocorria em paralelo com a vida ordinária, no
cotidiano dos centros urbanos industriais, desde os séculos XVIII e XIX.
Esse cenário foi marcado pelo surgimento de novas formas de comu-
nicação que passam a operar por meio de mensagens visuais, sonoras e
verbais, sobretudo, o fascínio criado pelo cinema e pelas promessas da
publicidade, na perspectiva de construção e consolidação, já nos anos 70,
de uma cultura massificada pelo consumo material que também é sim-
bólico. Tal processo de ploriferação de linguagens visuais, especifica-
Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica
35
mente, passa a funcionar como um conjunto de mensagens-guia de con-
dutas, de expressões estéticas na vida cotidiana e de consumo nas socie-
dades, vistas a partir deste ângulo como sociedades de consumo.
É nesta perpespectiva, que buscamos a possibilidade de ter na fotografia
o exercício de um olhar etnográfico para o estudo do consumo na pira-
taria. Hoje a fotografia na antropologia para o trabalho antropológico,
assim como o filme, passa a ser visto como linguagem autônoma capaz
de dizer pelo que se pode ver e mostrar, sentidos que tocam o sensível e
permitem uma forma de conhecer que associa estética e produção do
conhecimento sobre as culturas.
Para Achutti (2004) as fotografias resultantes de um processo etnográfico,
por ele denominado de fotoetnografia, não é um conjunto isolado de
fotos, sendo antes de tudo um conjunto coeso e coerente em linguagem
fotográfica, constituído de enquadramentos, descrições espaciais do obje-
to estudado, pontos de vista que indicam uma interpretação sobre as
significações e sentidos oferecidos pelas imagens. Assim como o texto
verbal etnográfico, que transcreve de forma clara os fragmentos de reali-
dade e os encadeamentos específicos necessários para os trabalhos de
análises e de interpretações antropológicas, buscando evitar descrições
excessivas de detalhes que possam prejudicar as análises. (ACHUTTI, 2004,
p. 95-97).
Os tipos de olhares e o registro fotoetnográfico
Nesse sentido, cabe então uma breve reflexão sobre o papel do olhar na
fotoetnografia, pautado, como sugere o trabalho de Pétonnet (1982)
sobre a dimensão metodológica da observação flutuante, que busca despir
o olhar do pesquisador de pré-concepções, visando levantar percepções
Eneus Trindade e Clotilde Perez
36
para além do senso comum, a partir dos significados espontâneos que
emanam do contexto investigado, a exemplo da experiência de observação
flutuante de Pétonnet (1982, p. 37-47) no Cemitério Père-Lachaise em
Paris, que demonstra, por meio de uma narrativa construída de registros
e impressões operados em campo, como um conjunto de signos incomuns
ao universo que tange a um cemitério. Assim, é dado ao Père-Lachaise
uma conotação não necessariamente ligada à morte e à religiosidade, mas
sim à recreação e ao turismo. É com um olhar semelhante a este que
buscamos o exercício do olhar metodológico para o fenômeno da pirataria
em São Paulo.
A partir do exposto teríamos então três dimensões do olhar a considerar:
o olhar metodológico, já mencionado, que em campo, aponta para o
apoio do pesquisador em pilares da antropologia visual imbuído na rea-
lização da observação flutuante, tentando assim vivenciar com atenção a
cultura, um modo de perceber em desapego aos supostos paradigmas
axiomáticos de quem julga por olhares estereotipados; o olhar subjetivo
que independentemente de ser ou não o primeiro contato de um pes-
quisador com o terreno, é misterque este sujeito traga consigo, para o
campo, uma série de conceitos culturais adquiridos em sua práxis social
que podem tanto constituir uma antítese, e portanto estranhamento,
assim como constituir tese, indicando um olhar viciado que dificulta a
percepção dos hábitos culturais e suas inter-relações; e por último, o olhar
para o objeto de estudo que consiste em:
a) Olhar nas suas dimensõescontextualizantes
b) Olhar na identificação de ações e situações
c) Olhar para os detalhes
d) O olhar para o semelhante
e) Oolhar para o dispare ou diferente.
Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica
37
A partir desse conjunto de olhares que se interpõem sobre um mesmo
olhar de um grupo de investigadores é que o exercício da nossa equipe
se deu na concepção da compreensão do consumo Pirata. Por fim,
discute-se na complementação ao trabalho fotoetnográfico o uso das
entrevistas, das notas de campo e de possíveis cruzamentos teóricos frente
aos dados registrados.
Entrevistas: O roteiro das entrevistas com vendedores econsumidores
Para subsidiar as diferentes equipes que estavam no campo, propusemos
um roteiro breve para ser seguido com flexibilidade, nas diferentes situa-
ções do processo de consumo. Os dois focos centrais na presente in-
vestigação eram o vendedor e o consumidor de produtos piratas. For-
necedores, intermediários, influenciadores e outros atores não foram foco
da pesquisa.
Breve roteiro para entrevistas vendedores:
– Informações identitárias: nome, idade, escolaridade, região onde mora
etc.
– História de vida (breve relato)
– O que vende? (o que? Para que? O que vende mais?)
– Quem compra? (perfil idade, sexo, freqüência...)
– Como promove os produtos? (alto-falante, faz performance, cartaz...)
– Como é a rotina? (onde compra, quando, como paga o fornecedor etc.)
Eneus Trindade e Clotilde Perez
38
Breve roteiro para entrevistas com os consumidores:
– Informações identitárias: nome, idade, escolaridade, região onde mora
etc.
– História de vida (breve relato)
– O que compra e por quê?
– Para quem? Uso próprio? Família? Presente?
– Frequência de compra e uso.
– Tem preferência de marca?
– Critérios de escolha. O que define a compra?
A descrição dos dados
Uma vez coletados os dados. Instaura-se a necessidade da descrição dos
dados, na perspectiva da construção de uma síntese exaustiva que buscasse
dar conta das notas de campo, fotografias, transcrições de entrevistas. Essa
etapa correspondeu a uma sistematização que buscou respeitar a cultura
observada tal como ela se apresentou, considerandoos relatórios dos
integrantes das equipes, que buscaram esclarecer o que foi visto nos tipos
de olhares, que se somaram a uma lista/sumário das fotos, com a data e
descrição do percurso realizado em campo e CD com as fotos; relatos
verbais sobre as imagens quanto aos tipos de olhares (oolhar nas suas
dimensões contextualizantes; na identificação de ações e situações; o olhar
para os detalhes; o olhar para o semelhante; o olhar para o dispare ou
diferente); transcrição das entrevistas realçando o contexto da entrevista,
o que é comum entre os entrevistados, a situação observada em cada entre-
vista, seus detalhes, suas semelhanças com outros entrevistados e suas
diferenças; bem como as observações sobre as imagens e nas entrevistas
referentes aos hibridismos culturais (CANCLINI, 1996) eos rituais de
Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica
39
compra, posse e uso (MCCRAKEN, 2003), pois tais aspectos em sua
totalidade permitem dimensionar a magnitude dos processos intercul-
turais e construção de significados dos objetos de consumo pirateados
no tecido social da vida cotidiana.
Assim, as descrições possibilitaram a construção de uma primeira reflexão
etnológica rumo ao saber antropológico constituído, que no nosso caso,
permitiu a compreensão da complexa relação do falso – verdadeiro do
Universo Sígnico da Pirataria.
Referências bibliográficas
ACHUTTI, L. E. R. (2004) Fotoetnografia. Porto Alegre: Ed. UFRGS/TomoEditorial.
CANCLÌNI, N. G. (1996) Culturas Híbridas. Poderes Oblíquos. Estratégiaspara entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp.
McCRACKEN, G. (2003) Cultura e consumo. Novas abordagens ao carátersimbólico dos bens e das atividades de consumo. Rio de Janeiro. Ed.Mauad. Trad. Fernanda Eugênio. Coleção Cultura e Consumo coor-denada por Everardo Rocha.
PÉTONNET, C. (1982) L’observation flottante. L’exemple d’un cimetièreparisien.L’Homme.Paris: v. 22. n. 4. 1982. p. 37-47.
RIBEIRO, J. S. (2003) Métodos e técnicas de investigação em Antropologia. Lisboa:Universidade Aberta.
. & Bairon, S. (orgs.) (2007) Antropologia Visual e hipermedia.Porto: Edições Afrontamento.
RUBY, J. (2005) “The last 20 years of visual anthropology – a critical review”.Visual Studies, v. 20. n. 2. p. 159-170.
Eneus Trindade e Clotilde Perez
40
TRINDADE, E. (2008a) Por uma fotoetnografia da publicidade: aspectos dacultura e do consumo alimentar no Brasil e em Portugal. Porto: Uni-versidade Aberta de Portugal/Laboratório de Antropologia Visual. Rela-tório final de Pós-Doutorado.
. (2008b) Recepção publicitária e práticas de consumo. RevistaFronteiras. Estudos Midiáticos. São Leopoldo. Unisinos. v. X. n.11. p.73-80.
41
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria
PAULO ROBERTO MONTEIRO DE ARAUJO
A questão da autoria na Modernidade pode ser compreendida em uma
dimensão estética a partir do Romantismo Alemão: reconhecimento da
genialidade daquele que elabora uma determinada obra de Arte. Deste
modo, a discussão sobre a autoria se vincula ao processo de reconhe-
cimento da subjetividade, compreendida como identidade singular que
apreende aquilo que os outros não conseguem captar: seja na esfera cog-
nitiva, seja na esfera sensível da percepção.
A ideia de genialidade artística revela na história da cultura ocidental um
novo patamar no que se refere às práticas sociais. O Romantismo Alemão
marca uma diferença com outros períodos históricos do ocidente. Na
Idade Média não havia ainda o conceito de autonomia artística ou algo
do gênero. O artista em sua elaboração não era conduzido por si mesmo,
como sujeito, mas por Deus, o verdadeiro criador da obra. O artista era
um instrumento do divino em seu processo de elaboração artístico.
Podemos dizer que até o final da Renascença, o artista não era autônomo
em seu próprio fazer artístico. Somente com o advento do movimento
Romântico Alemão é que o conceito de sujeito ganha status de reco-
nhecimento. Com o desenvolvimento de um vocabulário de valor refe-
rente aos significados de autonomia, de sujeito e de identidade, o artista
Paulo Roberto Monteiro de Araujo
42
passa a ser aquele que detém a determinação da obra, ou seja, ele tem o
direito sobre a sua criação.
Como salienta Hegel (1986), em sua Filosofia do Direito, as qualidades
do espírito (compreendido como razão) quando se concretizam em uma
exterioridade (sensível), como é o caso da invenção de algum instrumento,
da criação uma escultura artística ou algo do gênero, ocorre uma espécie
de assimilação, por parte dessas qualidades do espírito, do aspecto externo
da coisa, isto é, da sua aparência (Schein). É como se acontecesse uma
espécie de coisificação das qualidades internas do espírito, ou seja, da razão
que se torna algo palpável à nossa dimensão sensível. Sendo assim, estando
no estado da aparência da coisa, as qualidades do espírito tendem a ser
negociadas por aqueles que as possuem, no caso, os artistas.
Deste modo, coloca-se em questão, por exemplo, se um artista tem
juridicamente posse da obra de arte que ele produziu. Portanto, se ele
tem realmente direito de dispor de algo que lhe é interno (como aptidão,
conhecimento, disposição) como algo externo (como coisa – a obra), de
forma que possa negociá-lo. Para Hegel (1995) fica claro que o artista
como sujeito que produziu um quadro, ou outro produto qualquer que
esteja na esfera da produção do espírito (razão), tem o direito de negociá-
lo como se fosse uma coisa. Não há em termos ontológicos uma modifi-
cação real do conceito interno das qualidadesdo espírito.
Quando se trata da negociação dessas qualidades do espírito (razão) no
plano externo, o que acontece é uma tomada de posse pela pessoa, como
sujeito (o artista) daquilo que é interno a si mesmo, por meio da exterio-
rização das suas obras, que surgem como coisas potencialmente negociá-
veis. A negociação é somente o modo pelo qual se exterioriza o caráter
da posse dessa capacidade criativa do espírito (razão). Só se pode fazer
um contrato ou negócio a partir daquilo que se tem posse. Hegel no §
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria
43
41 da sua Filosofia do Direito salienta que a pessoa como sujeito tem o
direito que exteriorizar a sua posse interna dos seus produtos ao
transplantá-los para o mundo das coisas negociáveis. Está aí o caráter
exterior das qualidades do espírito. Deste modo, o artista como sujeito
de suas capacidades espirituais internas tem o direito de propriedade de
suas obras como exteriorização de tais capacidades. Daí para a cultura
ocidental a pirataria é um crime, pois significa roubar a propriedade
alheia, isto é, roubar a capacidade daquele que possui a genialidade de
elaborar uma obra de arte. Hegel (1986) faz parte desse movimento de
construção de um vocabulário de valor que reconhece o direito do artista,
como aquele que expressa as qualidades internas da razão, sob a forma
de coisas externas na dimensão da arte.
A construção de um Vocabulário de Valor tem como objetivo formar
um conjunto de significados referenciais que são internalizados entre
aqueles que pertencem a uma mesma comunidade linguística. Tal comu-
nidade pode ser compreendida também como sendo a mesma comuni-
dade cultural, em que seus membros participam de semelhantes signi-
ficados, vinculados a um determinado vocabulário de valor. A partir da
elaboração de um vocabulário de valor podemos compreender a formação
de novos desejos, no sentido de realização como Pessoa. Sendo assim, a
construção de um vocabulário de valor significa que o artista é reco-
nhecido em sua dimensão humana e, por isso mesmo deve ser preserva-
do o direito de proprietário de sua obra como expressão de sua identidade
humana.
No entanto, cabe lembrar que há uma diferença entre aquilo que o filó-
sofo canadense Charles Taylor (1997) diz sobre a elaboração de um
vocabulário de valor, em que o outro deve, por exemplo, ser reconhecido
em suas obras, como artista, e a realização dos desejos na esfera das coisas,
mesmo sendo essas obras de arte. A realização dos desejos nas coisas tem
Paulo Roberto Monteiro de Araujo
44
a ver com a utilidade e satisfação das pessoas, não das suas dignidades
humanas (é disso que trata um vocabulário de valor). É neste aspecto que
podemos nos voltar para compreender a relação entre o Consumo e a
Pirataria.
O consumo como ocorre no já conhecido Sistema Capitalista está voltado
para o ato de “devorar” as novidades por ele produzidas. Lembrando ainda
Hegel (1986) em sua Filosofia do Direito, a partir da relação imediata
com o mundo, apessoa se limita ao desejo de tomar posse dos objetos
que surgem ao seu redor, embora esse tomar posse seja o primeiro ato de
construção do conceito de liberdade. No Capitalismo, esse tomar posse
não significa propriamente o se ganhar como pessoa consciente da sua
liberdade, mas dos seus desejos imediatos cujas premissas estão no
desenvolvimento de um hiperconsumo já apontado por Lipovetsky em
obras como O Império do efêmero (ver a segunda parte dessa obra A sedução
das coisas. Companhia das Letras, p.184).
O Capitalismo para manter a sua dinâmica precisa permanecer em altos
níveis de consumo. Deste modo, cada vez mais as pessoas precisam
internalizar o referencial significativo do “ato de devorar novidades”. O
problema está na sofisticação cada vez maior dos objetos oferecidos para
serem consumidos como Bolsas Gucci, Jeans Diesel, Perfumes Prada, etc.
Neste sentido, surge o problema da autoria. Se na história do ocidente,
como analisamos acima, tivemos a elaboração do conceito de sujeito cujas
qualidades espirituais se tornaram reconhecidas por meio de um voca-
bulário de valor, hoje vemos que tal vocabulário não tem mais o mesmo
significado em seu fundamento. O reconhecimento daquele como sujeito
que elabora determinada obra não está mais na pauta das preocupações
da cultura do consumo. A autoria é o que menos importa, no sentido de
reconhecer o seu autor em sua dignidade humana. O que importa é o
que tal autor significa para a manutenção da marca. Não é por acaso que,
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria
45
no mundo da moda, diversos estilistas considerados talentosos perderam
as suas autorias, viraram marcas para conglomerados financeiros (os esti-
listas tornaram-se seus funcionários). Sendo assim a discussão em relação
à pirataria não está mais no âmbito do respeito ao autor de alguma obra,
seja ela artística ou não. O que importa é a capacidade que o trabalho do
criador tem de manter a marca no mercado em um alto grau de consumo.
Daí o motivo de se combater a pirataria não está simplesmente no respeito
ao autor, mas na conservação do valor da mercadoria, não naquele sentido
relativo ao trabalho que Marx concebeu em o Capital. Manter o valor
no capitalismo avançado é manter o fetiche da própria mercadoria, prin-
cipalmente quando se trata das mercadorias de luxo. É o caso do mercado
de bolsas femininas; ter uma bolsa Louis Vuitton virou sinônimo de
status, por mais que milhares de mulheres andem com tais bolsas pelos
corredores dos Shoppings Centers. Exibir uma bolsa Louis Vuitton signi-
fica expressar a sua capacidade de consumo, pois é tal capacidade que lhe
confere uma “dignidade” social.
A manutenção dessa suposta “dignidade” social dos compradores das
marcas, faz com que haja o combate àquilo que se mostra como sendo o
mesmo de algo que possui marca. O que eu quero dizer é que o produto
pirata ao imitar o produto original, busca minar as bases da idealização
valorativa do que é marca sem afetar a sua aparente determinação de ser
original. Por mais que a imitação pirata seja vulgar, a aparência de coisa
permanece em seu caráter perceptivo na esfera do consumo (em seu signi-
ficado social amplo – as pessoas ainda reconhecem a marca no produto
não original), cuja estrutura lógica é a realização de desejos em sua ime-
diata sensibilidade. Cabe lembrar que o imediato sensível do desejo não
tem em si mesmo o caráter critico para fazer supostas diferenciações do
que é original ou não. Daí pouco importa para o sensível imediato dos
desejos qual o material que a pirataria usa para fabricar as suas imitações.
Paulo Roberto Monteiro de Araujo
46
A pirataria barateia a realização do desejo de um amplo grupo social que
procura realizar desejos não por simples imitação do modo de vida dos
compradores de marcas caras, mas sim de consumir algo fora do seu âm-
bito de consumo cotidiano. O problema da pirataria para as marcas,
incluindo principalmente as de luxo, está em sua difusão para aqueles
que não sustentam a sua idealização valorativa original. A pirataria ao
democratizar o desejo de consumir marcas, contraditoriamente elimina
tal desejo, pois acaba com o fetiche da marca, do seu suposto status social.
A pirataria é combatida, como salientamos anteriormente não por uma
questão de reconhecimento dos seus autores, mas pela manutenção do
desejo de consumir algo que aparentemente não está ao alcance de todos.
Cidades como São Paulo que detém mais de 70% do mercado de luxo
brasileiro, em que boa parte da sua população não pode consumir marcas
que lhe dão status, criam referenciais significativas de desejos, mesmo para
aqueles que não podem consumir objetos de luxo.
Contraditoriamente tais referenciais criados pelas marcas de luxo geram
cada vez mais a concepção do fabricar aquilo que é do outro, para oferecer
ao mercado como sendo aparentemente igual. A pirataria significa a
tentativa de democratizar o consumo, ou mais do que o simples consumo,
o consumo como status social. É claro que o consumo por status não é
uma novidade na história recente do consumo, mas o que é novidade é
o fato das pessoas terem como referencia a ideia de participar do espetá-
culo que as marcas se tornaram. Não quero fazer aqui nenhuma referencia
a ideia de espetáculo do GuyDebord (1997), mas sim a ideia de alguém
se tornar sujeito por meio do outro que não é ninguém. Neste aspecto o
pensamento de Heidegger é fundamental.
Se tornar sujeito por meio dos objetos é o modo encontrado em nosso
cotidiano de consumo para nos tirar da tarefa de nos tornarmos nós
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria
47
mesmos. Não havendo mais referenciais valorativos culturais, éticos e
políticos, a vontade individual como subjetividade se encontra naufragada
existencialmente. Daí a despreocupação ou a não ocupação conosco, com
a nossa existência humana. É neste aspecto da não ocupação com a
existência, que as marcas elaboram as suas linguagens, no sentido de dar
alguma determinação significativa à indigência existencial da nossa
contemporaneidade. Não se trata de uma simples acusação moralizante
em relação às marcas e as suas linguagens voltadas para a manutenção do
alto consumo, mas sim de compreender o que funda ou dá origem aos
novos formatos de consumo e a preocupação em combater a imitação
no que se refere aos produtos de luxo.
A contradição daqueles que querem ser sujeitos através dos objetos de
consumo oferecidos pelas marcas é se tornarem piratas; pois pegam algo
que não são originalmente deles para imitar algo que não é originalmente
de ninguém. O status de se ter uma bolsa Louis Vuitton é uma forma
metafórica de piratear o significado de sujeito, elaborado culturalmente
pelo ocidente. Ser sujeito, então, é participar do que chamei do espetáculo
das marcas. Tal espetáculo se determina por meio não mais da linguagem
publicitária com a sua triunfante sofisticação imagética, mas sim da inven-
ção de um modo de ser cuja determinação está no agraciar que os objetos
trazem para corpo compreendido agora como o lugar que deve refletir o
que nós somos, sujeitos. Daí a cueca Calvin Klein, os jeans da Diesel, os
casacos da Burberry. Sendo assim Prada, Gucci, Dior, entre outras se
tornam uma espécie de nome de família que o corpo consome como
sujeito, sem ser. O corpo como lugar que reflete o consumo de marcas
para se tornar sujeito traz em si o problema do desejo. Cabe lembrar aqui
do livro de Harry G. Frankfurt (1997) intitulado The importance ofwhat
we care about, cuja preocupação se vincula à problemática do desejo.
Frankfurt em um dos textos que compõe o referido livro Liberdade da
Paulo Roberto Monteiro de Araujo
48
vontade e concepção de pessoa (Freedom of the will and the conceptof a
person) analisa a questão relacionada aquilo que ele chama de um desejo
de primeira ordem (instintivo – em seu sentido passivo) e de uma segunda
ordem (vontade – em um sentido ativo).
Para Frankfurt, alguém que se limita aos desejos sem questioná-los, per-
manecendo em uma simples escolha de querer ou não realizá-los, estaria
nisso que salientamos acima de primeira ordem. Alguém que permanece
nesse estádio de desejo, Frankfurt diz que não poderia ser considerado co-
mo pessoa, pois mesmo havendo algum tipo de racionalidade em suas deci-
sões, não há uma avaliação sobre o próprio desejo, isto é, uma avaliação
sobre o que move o seu desejo. Já em um desejo de segunda ordem há uma
preocupação com o que move um determinado tipo de desejo, por isso
nesta segunda ordem aparece o conceito de vontade (volition). Deste mo-
do, um desejo de segunda ordem pode se tornar uma vontade de segunda
ordem, cujo cerne é a preocupação ou o cuidado com os conflitos que exis-
tem nos desejos. Eis o motivo de Frankfurt dizer que para uma pessoa ser
considerada humana ela precisa ter o discernimento do seu próprio desejo
como algo que se sabe como desejo naquilo pretende ser qualitativamente.
Apesar da tese forte de Frankfurt de chamar aqueles que permanecem
em desejos que ignoram os seus conflitos desejantes de wantons (que em
uma tradução imediata poderia ser dito em português como aqueles de
desejos indeterminados ou sem conflitos), tal termo pode nos ajudar a
compreender a estrutura do desejo na esfera do mercado de bens de luxo,
por exemplo. Digo isto não para concordar com as teses de Frankfurt
sobre o conceito de agente humano em contraponto a passividade dos
wantons, mas para compreender que, o quê está em jogo nas marcas é a
sua dimensão de realização de algo que em nossa temporalidade pós-
moderna não comporta mais: a ideia de sujeito moderno concentrado
em seu ato pensante sobre si e sobre o mundo. Este algo que chamei
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria
49
atenção refere-se à realização do corpo que quer ser não mais por meio
da sua autoexibição, mas através de algo que lhe traga uma marca para
ser mostrada no espaço público. Daí as bolsas Louis Vuitton serem tão
usadas, sejam originais ou não, pois apesar dessas terem virado algo
comum nos mais diferentes espaços, elas garantem uma marca ao corpo
daquelas(es) que as usam. Os objetos com o grife das marcam dão ao
corpo uma qualidade que não é mais intrínseco a ele mesmo. A contra-
dição de nossa época que valoriza a forma física é fazer com que tal valor
perca a sua importância quando se trata do uso das marcas. O objeto não
é mais o complemento do corpo, mas a expressão dele, da sua capacidade
de realizar o desejo que ele quer através de algo que lhe qualifica perante
os outros. É a marca que qualifica o corpo, que lhe confere uma forma
de reconhecimento do outro no espaço da convivência.
A estrutura do desejo que se realiza através das marcas se funda nessa
dimensão de garantir ao corpo algo que lhe dê distinção no espaço pú-
blico, sem ter que dá satisfação seja ao seu intelecto seja à sua existência
humana. A preocupação aqui não é fazer nenhum juízo moral ou político
sobre esse modo de ser do desejo em nossos dias, mas mostrar a neces-
sidade de interpreta-lo como forma de compreender os motivos que
fazem as marcas se preocuparem cada vez mais com a proteção de seus
produtos frente à Pirataria. Tal preocupação se encontra na necessidade
mesma de garantir esse algo, que salientamos acima, para o corpo como
forma de realização de si através de outra coisa que não ele próprio. As
marcas oferecem tal algo para os corpos e, por isso mesmo, não interessa
a elas verem profanados seus produtos pela pirataria.
Deste modo, a pirataria é o elemento corrosivo desse modelo de desejo
que se construiu em nossa era do hiperconsumo, principalmente, em sua
versão de luxo. Quanto mais os produtos de marcas de luxo vão se sofis-
ticando e ganhando status de coisas hiperespeciais para os corpos, maior
Paulo Roberto Monteiro de Araujo
50
a necessidade de se combater a pirataria. Temos assim a formação de um
mapa da nossa vida cultural pós-moderna cujo cerne está no modo como
o desejo se estruturou em nosso capitalismo atual. As marcas reconhecem
a estrutura desse desejo e sabem da sua importância para a manutenção
do consumo em níveis elevados. Daí os elos entre corpo, desejo, marca e
o contraponto destes, a pirataria. Sendo a pirataria o elemento corrosivo
das marcas ele pode ser o motor para alavancar uma discussão sobre a
estrutura do próprio desejo que se formou em nossa era.
É claro que as práticas da pirataria é uma forma de geração de capital em
que o respeito à autoria do outro não é considerado, no entanto o que
tais práticas nos dizem, pelo menos no nível do pensamento conceitual,
é que existe a busca pela diferenciação dos desejos daqueles que podem
consumir objetos especiais frente aos outros que não o podem fazer. Mas
não é só isso. O problema não está simplesmente no desejo de buscar a
diferenciação de classe social, essa busca já é evidente em nossa história
sócio-político-cultural, mas sim pela busca de algo que dê aos corpos uma
qualidade que está fora deles mesmos. Assim o desejo de alguém que pode
consumir marcas de luxo não está mais no corpo como elemento fun-
dador das vontades, mas sim no objeto fabricado em condições especiais,
isto é, não massificado.
O objeto passa ter valor intrínseco para a realização do desejo, pois é ele
que dá o tom e o vetor tanto para mim (para minha estrutura interna,
isto é, psíquica e existencial) como para a minha importância frente ao
outro sem que se precise provar qualquer tipo de qualidade pessoal:
cultura, formação educacional, caráter, sensibilidade, consciência política,
etc. O objeto fundado na marca faz uma espécie de milagre para a nossa
realização desejante de ser. A nossa identidade não precisa mais ser
desenvolvida ao longo da nossa vida pessoal, do nosso esforço de com-
preendermos o que estamos elaborando para nós mesmos. Não preci-
A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria
51
samos mais fazer um interpretação daquilo que somos ou queremos ser.
O objeto nos lança fora daquilo que falamos acima, a partir de Heidegger,
sobre a necessidade existencial que temos de nos ocuparmos de nós
mesmos.
Para finalizar, cabe dizer mais uma vez que na presente análise sobre a
relação consumo e pirataria não elaboramos nenhum discurso contra o
desejo estruturado nas marcas ou ainda reducionismos conceituais a
respeito de tal desejo. A nossa pretensão foi fazer uma hermenêutica do
desejo no horizonte do consumo das marcas e o conflito destas em relação
à pirataria.
Referências bibliográficas
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LIPOVETSKY, Gilles. O Império do efêmero – A moda e seu destino nassociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
Paulo Roberto Monteiro de Araujo
52
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TAYLOR, Charles. As fontes do Self – A construção da identidade moderna (trad.Adail U. Sobral e Dinah de Azevedo de Abreu). São Paulo: EdiçõesLoyola, 1997.
53
La Centralidade del Simulacro en la SociedadContemporánea: Motivaciones para la Busqueda,
Compra e Uso de las Marcas Falsificadas1
CLOTILDE PEREZENEUS TRINDADE
SÉRGIO BAIRON
Introducción
La comprensión de cómo manejar las múltiples posibilidades de simu-
lación de materiales reales en las señales diarias de las relaciones de
consumo es una preocupación creciente en el contexto de la búsqueda
dela diferenciación asediado en la certeza de un mercado cada vezmás
difícil de ser distinto. La estrategia de falsificación es histórica, presen-
tado fenómenos de la piratería, de las copias de los más variados tipos,
las imitaciones, las réplicas de productos y marcas que se vuelcan a
las calles y se presentan enlas relaciones de consumo de cualquier ciudad
en cualquiera de los países capitalistas.
En el campo de la comunicación, las discusiones son amplias y variadas y
están relacionadas con la pérdida de negocio (en este caso en relación con
1. Texto originalmente escrito em espanhol para o XI Congresso Latino-Americanode Investigadores da Comunicação. Montevidéu. Universidad de Montevideo. 2012.Gt. Publicidade e Propaganda.
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
54
el departamento legal y las leyes de derechos de autor y propiedad inte-
lectual), la dilución de las inversiones (perspectivas financieras), la medi-
ción de las ganancias mal habidas (el subrayado es economía), empo-
brecido visual (estética), el engaño y el crimen (la policía y cuestio-
nes morales).
Sin embargo, nosotros creemos que hay caminos positivos atravesados
por imitación, según lo informado por Giacomini (2011, p. 217) “los
conceptos de estándares de mensajería, repetir la información, la
reintroducción de las situaciones de la vida y el consumo ...”, y reflexiones
sobre la naturaleza del ejercicio de la imitación humana en el aprendi-
zaje y el desarrollo.
De la comprensión del simulacro de Jean Baudrillard (1991) basada en la
certeza de que en la sociedad contemporánea ya no es un tiempo nece-
sariamente la existencia de la cosa representada, pero sólo la repre-
sentación – de ahí la prioridad del simulacro – trató de problematizar el
diálogo con investigadores que ayudan a la comprensión en profundidad
de la materia en diferentes regionalidades científicos.
En línea con la noción de precedencia del simulacro, Rocha (2005) en
su estudio del consumo nos llama la atención a las “representaciones de
consumo”, lo que sería el sentido común y la visión de los médios de la
cultura de masas, que tienden a clasificar el consumo de un sesgo
moralista, sobre todo como una actividad hedonista y responsable por
muchos males sociales, incluyendo lo que habría dado lugar a poca aten-
ción a esta área de estudio dentro de las ciencias sociales. Más reciente-
mente, el consumo también se le asigna el uso de los recursos naturales
en exceso de los problemas ambientales y diversas, al “calentamiento
global”. Sinembargo, como vimos en Miller (2002) no hay placer en la
rutina de compras de supermercado, por ejemplo. Mientras que otros
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
55
hábitos de consumo también están asociados con el placer de los otros,
como los presentes. Para Miller (2002), sin embargo, la actividad más
importante en la experiencia de compra, y llevar a casa lo que compra
(objeto del deseo), es la economía. Este factor es un tema muy debatido
y pone siempre a la vanguardia de las actitudes de compra. Es importante
destacar que la noción de la economía varía mucho de un consumidor a
otro. Por un lado, la economía puede significar sólo precios bajos,
mientras que otro puede pensar que la compra de un producto más caro,
pero es mejor que se estará ahorrando una vez que la durabilidad es la
derecha.
Por lo tanto, los compradores no necesitan tener ningún conocimiento
tomado de fuera de la experiencia de las compras. No hay necesidad de
recordar ninguna información de precios de entender y sentir que están
ahorrando. En este sentido, el hecho de que comprar un producto que
no es necesaria, pero que está en liquidación o en una promoción de
precio interesante puede ser caracterizado como una economía. Así se
ahorrará el gasto. Todo lo que necesita es tomar una decisión al
seleccionar y justificar que la elección por sí mismos cómo la economía
“era realmente una necesidad”. La cuestión de la economía se acerca al
enfoque del estudio del consumo como los precios bajos de los productos
piratas son la principal motivación que viene a la mente para justificar la
compra, sin embargo, la complejidad de las motivaciones es mucho
mayor, como veremos más adelante.
En otra dirección reflexiva, que está trayendo a las consideraciones acerca
de la copia en la perspectiva oriental. Esta inversión se justifica, pues
nunca se habló tanto de copias como en los últimos años y la profusión
de los medios de comunicación se relaciona con el fuerte crecimiento de
China en el ámbito internacional, no sólo el crecimiento económico,
sino simbólico, el crecimiento tal vez incluso más fuerte. Como principio
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
56
confussionista, la copia es la etapa inicial de la innovación para los
chinos. En consecuencia, creemos que tiene que copiar, repetir, imitar, a
continuación, aumentar el poder y así crear lo nuevo. Curso en contra
de la perspectiva occidental-capitalista que aumenta la propiedad y el
copyright (que incluye la propiedadintelectual) la creencia y la práctica
de la copia como la etapa inaugural de la innovación ha sacudido las
estructuras de comercialización y mental del occidente.
Después de la inmersión de más de seis meses en China, Canevacci (2011,
p. 19), en referencia al consumo en ese país, dice “... la falsificación ya
no es lo contrario de lo real o auténtica, es la hola que acelera el cambio
de estilos de vida y se propaga a una simple verdad sobre el estado
de cosas: falso es el verdadero-falso, una mezcla sincrética que disuelve las
distinciones dualistas clásico”. Lo que emerge es una integración de la
entonces “verdadero-falsodimensiones” en favor de otra “cosa”, mixta
y sincrético que el autor llama una falsificación: la disolución de las
fronteras. Y a medida que los productos chinos son en la vida cotidia-
na los mercados capitalistas occidentalesno hay manera de ocultar el
abrumador poder de los simulacros que perturban la lógica de la autoría
occidental.
Está claro que el último punto de vista, que aquí se presenta a principios
de las reflexiones de Canevacci (2011) es menos evidente en la investi-
gación científica y la comercialización, cuando nos referimos a la piratería,
la imitación. La inmersión antropológica, etnográfica en el universo del
consumo de estos productos y marcas, y la búsqueda de la comprensión
de las motivaciones humanas a la adhesión (compra, uso, posesión entre
otros rituales de consumo) la falsificación de productos y marcas es
siempre marginal. Pero en nuestra percepción esta és una explicación
simple del fenómeno.
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
57
Otra forma en que el tema estimula la reflexión es la relación entre la
estética y el consumo. La historicidad imbuida dentro del concepto de
la estética siempre ha estado involucrado en la concepción de sentido
común, y todo indica que los caminos de innovadoras ideas estéticas están
llegando, cada vez más, tal vez en homenaje al mantenimiento de las
tradiciones de sentido de la estética vanguardista común. Los fenómenos
de la reproducción están directamente relacionados con la relación entre
el sentido común y la estética. El kitsch es un fenómeno que siempre se
correlaciona con las reflexiones sobre la estética y el sentido común.
Baudrillard (2008, p. 141) afirma que “kitsch opone a la estética de la
belleza y originalidad de su estética de la simulación” en este sentido se
abre el punto de contacto entre el kitsch y el cliché, los lugares comunes
del habla cotidiana.
De otro modo el kitsch tambien puede ser comprendido como una
busqueda a la aspiración de la belleza. En este sentido la estética kitsch
se queda más próxima de las considerasiones de Canevacci (2011) sobre
lo “verdadero-falsodimensiones” a otra cosa: la copia, imitación en
productos falsificados.
Benjamin (1985) afirmó que la reproducción de obras de arte pierde su
aura, es decir, pierde su propia autenticidad, con la excepción de la
reproducción de la fotografía y el cine en el que la reproducibilidad es
inherente en estos tipos de (re) producción de arte, por lo tanto
admisible. Benjamin creó un aura de antagonismo entre el arte y el arte de
masas, permitiendo que el segundo tipo de arte, una posición progresista,
y explicó que el arte del aura había sido relegado al abandono. Al lado de
la industria cultural, el kitsch se basa en nuestros medios de comunicación
escritos diarios a través de las telenovelas, música, publicidad, moda. Por
otra parte, el kitsch es detectable en las estrategias de globalización como
una forma de “democratizar” la economía y la cultura y en ese sentido,
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
58
podría ser más apropiado referirnos a la pasteurización. Las grabaciones de
re-éxitos de una época, con nuevas interpretaciones y ritmos musicales
pueden ser consideradas kitsch, así como fusiones de estilos, épocas y
ritmos que, cuando pierden sus características originales a través de fusiones
y aglutinaciones, contribuen a formar el kitsch. En el curso de la moda,
especialmente las prendas de vestir, está buscando la inspiración del pasado
para dictar las direcciones futuras, que calificó de “noticias” que formaba
parte de la temporada. Muchas nuevas colecciones se acompañan de
referencias a “vintage” y “retro” o “relectura”. La cultura de masas, inmersa
en la industria de la cultura puede convertirse en arquetipos los
estereotipos, las normas de la moda estandartizando a través de la repetición
de estos modelos para ser consumidos masivamente por la sociedad. De
este modo, el kitsch se podría definir como una panacea a la psicosocial
sustituir la auténtica naturaleza del objeto en un intento para tratar de
resolver una frustración social y psicológica de los individuos-
consumidores. ¿Quién no quiere tener un Picasso en su salón?Incluso
unaalmohadilla puede tener el mismo efecto. El hecho es que es un solo
intento y nunca una solución, sí, para resolver un problema psicosocial
más. Parece que esto no es lo que realmente importa quién hace uso del
kitsch. Lo importante es “mirar” y encontrar una respuesta viable a la
tensión, aunque la superficie. De este modo, el kitsch puede ser una manera
de ocultar, disfrazar, ocultar una alternativa a la frustración (el deseo
permanente y la satisfacción siempre parcial), Pérez (2004). Sin embargo,
el kitsch también tiene su lado positivo en la sociedad. Puede ser la solución
ideal a un problema social. Todas las transformaciones en los nuevos
productos y productos de embalaje son una manera completamente sana
con la reconstrucción simbólica de las dimensiones sociales nuevas.
Aquí se abren las discusiones sobre el reciclaje, la reutilización y la trans-
formación no es sólo un punto de vista económico y ambiental (reducción
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
59
en el uso de materiales y residuos), sino también simbólica: una nueva
satisfacción simbólica y el crecimiento – la semiosis nuevo, pero ahora
tal vez, ilimitada (PEIRCE, 1977). En este sentido, sostiene Moles (2001,
p. 28-9) “kitsch es más una dirección que un objectivo”, y añade “hay
algo kitsch en la parte inferior de cada uno de nosotros” y por lo tanto
nos libera de juicio del gusto y su necesidad de explicaciones. Todavia,
la estética kitsch tambien posibilita cuestiones sobre procesos de sentido
de juicio de gusto en dos modos distintos: lo que podremos considerar
como kitsch de malo gusto y de bueno gusto.
La idea de que el evento popular como kitsch ya no existe como un
camino que todos llevamos dentro, también puede referirse a las
reflexiones de De Certeau (1997) en el lenguaje ordinario. Una de las
características más problemáticas del lenguaje ordinario haría que el
superlativo de la repetición de un acontecimiento frecuente. Su abandono
de la improvisación es condenado a la incredulidad por el cientificismo.
Sin embargo, debemos entender que esta caída es la falta de significado,
esta imposibilidad de apropiación de sentido, esta erosiva repetición,
”ocultar” su mayor fascinación. El consumo diario es la materialización de
esta descripción de la fascinación. Estamos haciendo todos los días, y sólo
más tarde esposible se dar cuenta de una pequeña parte de estas
acciones. En cierto modo, lo es ahora, que la experiencia estética actúa
para mantener la apertura a la reinterpretación continua. Una relectura
de la noción de signo semiótico se aplica al contexto cultural del consumo
y puede representar una forma muy interesante de la comprensión.
Muy rentables son las reflexiones de Peirce (1977) sobre temas de verda-
dero signo y el signo degenerado desde que las relaciones de impresión
diferentes en su capacidad de generar interpretantes posible. El término
“degenerado” se hace referencia a su significado en la geometría (Santaella,
1992, p. 82). En señal genuina o un símbolo, siempre hay tres dimen-
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
60
siones involucradas: signo, objeto y el interpretante. Las ideas típicas
asociadas a ella son: la terceridad, la cognición, el aprendizaje, la ley, la
generalización, el hábito, el crecimiento y la complejidad, entre otros.
Esta es la tierra de la semiosis infinita, ilimitada continuidad y evolución
del pensamiento. En este tipo de señal es, sin embargo, otros, como el
índice y el icono, que difiere de la naturaleza representativa del símbolo.
Cada uno de estos tipos de señal se considera como tener variaciones
sutiles, que son la degeneración interna. Así, cada una de ellas se clasifica
como una genuina naturaleza paralelo a dicho otro degenerado.
Mientras que el símbolo se corresponde con la idea de signo auténtico,
el índice se corresponde con la idea de la señal desde el degenerado. No
hay señales que es un índice, no es necesariamente involucrados dos
(signo-objeto), salvo que el tercero (intérprete) existe o no. Un signo
degenerado en lo más mínimo es un índice, que es un signo de su objeto,
cuya importancia se debe al hecho de que él tenía una relación genuina
con ese objeto, sin tener en cuenta el interpretante. Este es el caso, por
ejemplo, la exclamación “¡Eh!” Como indicativo de peligro inminente,
o un golpe en la puerta como un indicio de una visita (PEIRCE, 1977,
p.28). Las ideas asociadas con ella son las típicas: la alteridad, la acción,
la individualidad, la realidad existente, la contigüidad, otro atracón ... Esta
señal, a su vez, también tiene la degeneración interna.
El icono se corresponde con la idea de la señal dos veces degeneran. En
ella sólo hay un conjunto de elementos (el signo – en primer lugar),
mientras que los otros dos elementos (objeto – interpretante y el segundo
a tercero), planteó como posibles. En este sentido, un signo degenerado
en un grado más alto es un icono, que es un signo cuya virtud debe ser
significativa si, y sólo su calidad. Las ideas típicas asociadas con ella son
los de: primeridad, el sentimiento, la similitud, la individualidad, la opor-
tunidad, el azar, la libertad, entre otros. Una señal de que es un icono
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
61
que ya tiene en sí misma el mayor grado posible de degeneración, sin
variaciones en el índice o como un símbolo.
En este sentido, las relaciones de similitud que hacen ver algo parecido a
algo que es a su vez deriva de los signos degenerados, ya que estas relacio-
nes son igualmente anclado en las cualidades de estos signos. La profusión
de signos en el universo delconsumo conectados sólo por sutiles relaciones
cualitativas son la esencia del uso de la producción-compra-venta de pro-
ductos piratas y marcas. En muchas situaciones similitud imitación de
productos viene dado por la forma o diseño, y el otro en tantos colores,
además de las aproximaciones de la semántica visual signos marcarios el
universo del lujo: Luis Viton (Louis Vuiton) Lacouste (Lacoste), Tomy
( Tommy), Doelce Gabbana (Dolce Gabbana) y muchos otros.
Como hemos visto, parece que lo único que justifica la existencia de las
sentencias y jurídico-moral (aumento de la producción y las reflexiones
publicidad en vehículos comerciales y académicos), con respecto a la copia
de la llamada o la piratería, se basa en nociones capitalista moderna
occidental y la autoría, y la copia hasta su tarjeta de identificación. En
las ciencias sociales, antropología, especialmente, perotambién en la
psicología y la semiótica, los procesos de imitación, copia, etc. Enfoque
es absolutamente natural y lo que resulta afectado es el efecto de sentido
generado y construido en el interpretadoras mentes de estas simulaciones.
El papel de la publicidad e de la moda en los cambios delconsumo
Baudrillard (1991) afirma que es ingenuo pensar que el discurso del
consumo y la búsqueda de una felicidad proporcionada sólo por los
objetos materiales es la explicacion totalizante para el fenómeno. Para el
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
62
autor, el proceso de consumo se puede analizar desde dos aspectos
principalmente: 1) Como un proceso de significación y de comunicación
(el consumo funciona aquí como un sistema de intercambio y un
equivalente en la lengua), 2) Cómo proceso de diferenciación de clasi-
ficación y social.
Siguiendo este pensamiento, el objeto, la cosa en sí, no se consume (busca,
compra, uso, almacenamiento ...) sobre la base de su valor de uso. Los
objetos actúan como signos que distinguen las personas socialmente. Por
lo tanto, las zapatillas que sirvem para proteger los pies mientras se ejecuta
como un elemento de comodidad, prestigio y diferenciación social.
Dentro de todo tipo de otros objetos pueden reemplazar el zapato como
un elemento significativo de prestigio, por ejemplo. Siguiendo esta lógica,
los objetos ya no están atados a una función específica o necesita
claramente definido. Siguiendo esta lógica, el consumo se utiliza como
un lenguaje como comunicación. Esto no quiere decir que los objetos
no tienen utilidad funcional, sino para entender que en la sociedad
contemporánea con el propósito de consumo no sólo en sí mismo (a que
se refiere Baudrillard, 1991). En este sentido, el movimiento, compra,
venta, propiedad de los bienes y objetos, signos y diferenciado a
ladisposición hoy en día es nuestra lengua y nuestro código, a través del
cual la sociedad fragmentada y compleja, se comunica, interactúa.
Para Baudrillard (1991) que el significado se pone facilitado por la
publicidad y la comunicación, que no transmite imágenes de vez en
cuando, pero los modos de relación y la percepción de que imponer
cambios en las estructuras familiares tradicionales y el grupo. Según él,
la publicidad se transforma el objeto en el evento, la construcción de ésta,
como tal, a través de la eliminación de sus características objetivas. Es un
objeto de la pseudo-caso de que se convertirá en el caso real de la vida
cotidiana mediante la unión al consumidor a su discurso.
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
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Aún en las formas de comunicación, Rocha (1995) afirma que para
entender la cultura contemporánea que se necesita para dar a conocer
los contenidos transmitidos por los medios de comunicación. Según el
autor, el mundo dentro de la industria cultural es fascinante. Hay miles
de mensajes que llegan e interactuar con la gente, creando una formidable
máquina de la sociedad imaginaria. Rocha (1995) afirma que en este
mundo interior de la comunicación puede unir a las diferentes cosas que
no serían posibles en la vida real, puede crear un hechizo que une a las
cosas por lo que el éxito y los cigarrillos, la ecología y la vivienda, que
data y pasta de dientes, omás recientemente, el tránsito, seguro de auto
y de la vida más agradable. Por lo tanto, el consumo de estos productos
se asocia con un placer muy gratificante, una clasificación entre los grupos,
castas, tribus y por lo tanto diferenciar entre estos diferentes grupos de
consumidores.
En sus teorías sobre la cultura de consumo, Featherstone (1995) reconoce
que la expansión capitalista dio lugar a una vasta acumulación de la cultura
material en forma de bienes o la adquisición y el consumo local, lo que
hizo necesaria la creaciónde nuevos mercados y “educar” a los consu-
midores a ser nuevas audiencias, tanto sea necesario utilizar mecanismos
más fuertes de la seducción y la manipulación. Sin embargo, para el autor,
otra empresa ha utilizado tanto para marcar los productos como las
relaciones sociales actuales. No sería una economía de prestigio y posición
social, en el que los bienes escasos, que requieren una mayor inversión
en tiempo y dinero, se utilizan para que el individuo que pertenece a las
características de transferencia de ustedes y propiedades, la formación de
hábitos y de las identidades. Las preferencias y estilos de vida identifican
a juicio de la persona de gusto, haceindolo susceptible de clasificar y
ordenarse. Por esta razón, las clases sociales más bajas buscan los
productos adquiridos por las clases altas, que siempre buscan nuevos
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
64
productos, objetos de deseo y de la moda con el fin de restablecer la
distancia social original, produciendo una búsqueda sin fin.
Feartherstone (1995) también cree que la imaginería de la cultura de
consumo que se celebra a través de un mundo de sueños, imágenes y
placeres, que son objetivados y se mide por los grandes centros de
consumo, tales como centros comerciales, grandes almacenes y los par-
ques temáticos, lugares que producen estos placeres estéticos y físicos,
donde están expuestos a la abundancia y el lujo a un montón de
glamour. En este escenario, los medios de comunicación y la publicidad
celebran que la vida debía ser vivida: “la vida es ahora” como dice la
Campaña de tarjetas de la marca Visa de crédito), los placeres de ser
sentimiento experimentado y bueno para ser fieltro, y que esto es todo
lo posible a través del consumo.
Sin embargo, el gran aporte de Featherstone (1995) consiste en relacionar
la cultura de los consumidores con el postmodernismo, que de acuerdo
a los cambios promovidos autor que pueden ser entendidas en términos
de campos artísticos, intelectuales, académicos y también en el ámbito
cultural que implican los modos de producción, consumo y circulación
de bienes y servicios y los cambios en las prácticas cotidianas y
experiencias general.
Para Di Nallo (1999), en la sociedad contemporánea estas nuevas
prácticas y experiencias,agregado para aumentar las posibilidades y la
reducción paralela de la regulación social, el sujeto experimenta una
condición sin precedentes de autonomía. Para la autora,previamente
sujeto que pertenece a un grupo de referencia, basado en la posicióndentro
del modelo de estratificación social, un hecho que influyó en su estilo
de vida ysu comportamiento de consumo constante y consistente. Sin
embargo, esto no se aplica em la sociedad moderna, en la que los
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
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consumidores son muy variados dentro de un hombre y no el sujeto
contemporáneo, el tema de la identidad cambiante y contradictorio, el
tema para que el nuevo descubrimiento se convierte en una necesidad. Por
lo tanto, una persona que está tomando los hábitos de consumo,
relacionado con un estilo de vida puede tomar ciertas futuro comple-
tamente diferente e incluso contradictoria.Hoy en día, la gente quiere
sentirse diferente, desean mostrarse como única. La lata nuevo se desea
y, sobre todo, se valora.
En este nuevo contexto, el consumidor de la patina (MCCRAKEN, 2003),
que le da importancia al ciclo de vida de la tradición y el poder de los
objetos más de la familia de las generaciones, y se convierte en “moda”. De
acuerdo con Lipovetsky (1989) la “moda” es un dispositivo para generar
el juicio social y estético que se conecta con el placer de ver y ser
visto. También es un sistema de regulación y la presión social, los cambios
tienen un carácter vergonzoso, van acompañadas de la obligación de
cambiar de adopción. Debe ser un entorno social determinado, sin
perjuicio de las sanciones (la risa, la desaprobación, etc.). En caso de no
aprobación. Por otra parte, la “moda” se extiende aún más por el deseo
de las personas que se parecen a los que se consideran superiores y, sobre
todo, con ella, el individuo gana el derecho de mostrar un gusto personal,
de innovar, ser originales despertar el deseo de nuevas necesidades, nuevos
bienes y servicios, la reorganización de producción y consumo de
masas. El culto de “moda” los productos despadroniza, la oportunidad
de ampliar las opciones, promueve la renovación acelerada de los bienes,
ya que hoy es “de moda” probablemente no será de seis meses a partir de
ahora.
Otro autor también señala que los cambios culturales con el fin de
dilucidar el comportamiento de losconsumidorespós-modernos es
Campbell (2000). El autor presenta la idea de que hubiera sido una
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
66
revolución en el comportamiento del consumidor antes de la Revolución
Industrial. Contrariamente a la impresión común, Campbell (2000)
muestra que las industrias relacionadas con la Revolución Industrial
fueron para producir más bienes de consumo que el capital y dominó la
producción de bienes para el consumo de artículos de lujo, es decir, los
elementos que no eran necesarios. Para el autor, de hecho, fue el aumento
de la demanda de los consumidores que se inició el crecimiento
económico y la acción se justifica en la adopción de nuevos valores
culturales, lo que permitió el aumento del consumo. Según Campbell
(2000) los cambios en los hábitos de consumo y los procesos se basaron
en nuevos valores y actitudes éticas y morales que a su vez estimuló un
cambio de hedonismo, el ascetismo, dando lugar a nuevos sentimientos
y el gusto por la lectura, para el romance, el ocio por la producción
cultural en general. Aunque en un principio ha habido una oposición
moral, estos nuevos valores para justificar los beneficios del lujo y el
consumo. La gente viene a ver de esta forma una manera de expresar su
esencia individual y estimular el amor por la familia.
En vista de Campbell (2000) las personas están fuertemente influenciadas
por las emociones que se encuentran dentro de sí mismos. Es decir, los
individuos usan sus poderes imaginativos y creativos para la construcción
de imágenes mentales que consumen el placer intrínseco que ofrecen,
una práctica que el autor describe cómo soñar despierto o fantasear. En
este hedonismo moderno y libre ilusoria-, el individuo es un artista de
imaginación, alguien que toma imágenes de la memoria y se apropia de
estas formas muy agradable. Estas sensaciones placenteras alterar
radicalmente el diseño del lugar de placer y el consumo en la vida real
del individuo. En este sentido, un nuevo producto, conocido por los
consumidores, puede generar la imaginación de diferentes, por lo que es
una ocasión para crear mundos de fantasía posibles. La actividad central
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
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del consumo se convierte, por tanto, no la selección y compra del
producto, pero la búsqueda del placer proporciona mercancía
imaginativa.
Esta sería la razón por la cual muchos consumidores se preguntan frente
a las ventanas con una determinada pieza de ropa, o preguntándose qué
tan bien una caída de móvil en la decoración del hogar. Por lo tanto, cada
producto nuevo disponible es la posibilidad de alcanzar un sueño que el
consumidor tiene en su imaginación, sin embargo, como en la realidad
de los placeres que no son tan reales como la idealizada, cada compra lleva
a la desilusión y la búsqueda frenética del otro producto que puede
satisfacer sus deseos.
Para Campbell (2000), sólo así se puede entender la insaciabilidad del
consumidor posmoderno. En este sentido, la publicidad es el motor que
hace que esta insaciabilidad púlsar, como ella misma dice que la
supervivencia y dispersión (“La solución de la innovación definitiva a los
problemas”), por lo que días más tarde muestra el nuevo, totalmente
esquiva.
Finalmente, en una manera general, los autores presentan la actividad de
consumo como unla práctica impregnada de significados diversos y
distintos en el espacio y un tiempo diferentes, que son creadas y recreadas
por los individuos de acuerdo a las categorías y los contextos culturales en
que viven. Por lo tanto, es necesario pensar en el uso como una actividad
gobernada no sólo por la variable de carácter económico, sino también
simbólicamente. Esta perspectiva es aún más intensa cuando nos referimos
a los productos piratas del consumo. También debido a esta complejidad
es que entendemos la urgencia de la investigación de los consumidores
mirando a la investigación empírica, sin la cual puede ser empalidecidos
y carente de la vitalidad que las relaciones de este tipo de consumo.
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
68
Como hemos visto, existen diversos enfoques y componentes utilizados
para tratar de explicar el consumo y la influencia que la publicidad puede
tener en estas relaciones. En sólo un pequeño número de las obras
analizadas son diversas explicaciones y teorías destinadas a las posibles
razones para los comportamientos y las actitudes de los consumidores. No
es el lugar para discutir lo que las teorías son más correcto, si no es más
correcta que otra, pero estas explicaciones absorberlos y utilizarlos como
soporte teórico para tratar de entender el comportamiento de las personas
que formaban parte de la investigación empírica. Todo el material ante-
rior es de gran valor para ayudar a comprender los fenómenos típicos de
las corrientes en la sociedad de consumo en que vivimos, y, posterior-
mente, para confrontarlos con los acontecimientos y las costumbres
observadas en el trabajo de campo que se propone llevar a cabo y detalle
a continuación.
La inmersión en el “real”: consideraciones metodológicas
En el presente estudio se adoptó la perspectiva de la interpretación porque
críamos ser la más adecuada para la aproximación etnográfica que hemos
utilizado. En esta investigación, cualitativo y exploratorio, a través de
entrevistas en profundidad y observación participante se llevó a cabo una
investigación sobre el universo del consumo de productos falsificados o
pirateados. Las entrevistas en profundidad se llevaron a cabo con los
consumidores y vendedores de productos falsificados y de marcas en los
espacios de comercialización en las calles, galerías y tiendas en la ciudad
de Sao Paulo, Río de Janeiro, Brasilia y Ciudad de México, además de la
observación de la observación y los participantes de los diferentes rituales
de consumo de estos productos y marcas en diferentes momentos de los
años 2010 y 2011. Estas encuestas son parte del proyecto de investigación
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
69
“Verdadero y Falso: El consumo de la piratería” Levada a cabo por El
Grupo de Estudios Semióticos en Comunicación, Cultura y Consumo
– GESC3, de la Universidad de São Paulo.Es importante aclarar que en
este momento haremos una presentación sintesis de nuestra metodologia
de trabajo empírico.
La realización de entrevistas con los consumidores se vio impulsado por
una línea abierta, que incluye los principales temas, más allá de la
caracterización inicial de la parte demandada: 1) ¿Se consumía ya (o si
usted está consumiendo) algún tipo de producto pirata? 2) ¿Con qué
frecuencia consume este tipo de producto? 3) ¿Qué tipos de productos
piratas son más consumidos? 4) ¿ Cual es la intención de compra? 5)
¿Quien consume el producto pirata y no el original, si tuviera las con-
diciones para la compra financiera sólo productos originales? 7) ¿La gente
hace comentarios a otras personas manifestando queestán usando un
producto pirata? 8) O la gente tiene miedo de dejar que descubran que
está usando un producto pirateado o falsificado? En esta secuencia de
comandos a los entrevistadores tenían libertad para adaptar las preguntas
de acuerdo a las necesidades y la situación de consumo de presentified
durante la entrevista.
El tratamiento e interpretación de los datos fue realizada mediante la
combinación de hechos ysituaciones, y en ese sentido, los fotoetnografias
de gran ayuda, estableciendo así un conjunto de relaciones que ayudaron
a describir el análisis de grupo, y las similitudes y diferencias en el informe
comportamientos identificados, así como la conciliación de las respuestas
y los comportamientos observados.
De acuerdo con Barbosa (2003) permite el uso de la etnografía para
estudiar el comportamiento de un grupo en el “interior” y busca el
conocimiento del punto de vista de otro. La propósito de utilizar una
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
70
aproximación de este método en este estudio es la posibilidad de crear
un contacto sinérgico con los consumidores de productos piratas,
interactuar con ellos y buscar una interpretación que nos pueda ayudar,
a pesar de toda la complejidad, para describir su comportamiento de
consumo densamente. Describir significa densamente revelan los valores
que están detrás de los actos cometidos por estos individuos, a
continuación, establecer una correspondencia y tal vez incluso una
jerarquía de estructuras significativas en términos de actitudes que se
producen, perciben e interpretan (GEERTZ, 1978).
Las limitaciones del método son debidos al hecho de que a pesar de ser
una condición fundamental para una descripción densa del grupo, es
todavía una interpretación subjetiva aspecto polémico para los que creen
en la idealización de rigor científico en disciplinas sociales. Por último,
otra limitación de la etnografía es acerca de los intentos degeneralización
de los resultados de la investigación. La especificidad no puede ser
considerado como genérico, sobre todo cuando se trata de algo tan
complejo como el consumo y un mayor consumo de productos
piratas. Tal como señala Geertz (1978, p.35), “cualquier persona puede
alcanzar la generalidad que surge de la delicadeza de sus distinciones no,
la amplitud de sus generalizaciones.”
Los resultados, que aquí seron discutidos en sus aspectos generales de la
encuesta, muestran una comprensión de los matices que explican las
diferentes posibilidades de simulación y sus poderes de significado en las
relaciones sociales cotidianas. También apuntan a la complejidad de las
motivaciones a la búsqueda, compra, uso y posesión de productos
falsificados y marcas, poniendo “en jaque” los vínculos financieros sólo
como una explicación de estos movimientos y comportamientos.
Además, era posible entender el papel de la publicidad en estas relaciones
que en realidad no es una prioridad dentro de la compleja red de
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
71
relaciones e influencias. Por lo tanto, comenzamos el análisis de la
información.
La sistematización de los resultados
Basándose en las reflexiones teóricas interdisciplinario de Baudrillard
(1991, 2008), Moles (2001), Benjamín (1985), Canevacci (2008, 2011),
Peirce (1977), además de discutir la centralidad del consumo en la vida
contemporánea por médio de Lipovetsky (2005), Featherstone
(1995), Geertz (1978) y los métodos cualitativos basados en la inmersión
en las entrevistas etnográficas, las photoethnografias, que era posible
construir una comprensión más profunda de las relaciones que están
involucrados en el consumo de los piratas, que ha permitido a la
comprensión sistemática de las raíces en el que se basan en las
motivaciones de consumo y el papel de la publicidad en cuestión.
Tomamos nota de que las motivaciones son muy variadas y el consumo
de los piratas son muy variables. Por lo tanto, para que estén mejor
presente y asimilarlas, se agruparon en: a) la aprobación del espacio, b)
la forma obligatoria, c) la estética, d) el precio y el sentio de economia e
e) flexibilidad. Vamos a la comprensión de cada una de esas dimensiones.
La aprobación del espacio: mucha gente compra productos falsificados
sin tener la menor idea de que, de hecho, son cada vez copias, imitaciones,
signos degenerados que mantienen similitudes cualitativas con el “origi-
nal”. Frases como “Si estás aquí es porque está de moda”, gritó uno de
los entrevistados, ya que revelan la capacidad del lugar de la legiti-
midad. El área de compras de la escena es la aprobación, el lugar de venta
representa la importancia del objeto material como el portador de esas
capacidades que dan a la posición distintiva.
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
72
El imperativo de la moda: La legitimidad de la zona se sigue el imperativo
de la moda y está de moda es porque es bueno. A través de la aquisición
y el uso objeto de burla de que lo que está en juego no es realmente una
simulación, pero el verdadero poder que tiene el objeto de poner a la gente
en la multitud de la moda, que en esencia representa la amplia aceptación
social y para el reconocimiento. El movimiento de “moda” no es la razón
por la simulación. Aquí destacamos el papel de los medios de
comunicación en la materialización de la moda. Las telenovelas se
destacaron en esta perspectiva, en este caso, la adhesión de los productos
y marcas por parte de personas de proyección de gran evidencia midiática
y la identificación de las masas con estas. Al mismo tiempo, también el
papel de la publicidad ha puesto en destaque una vez que pone de
manifiesto las preferencias, opciones y nuevos.
La estética: la belleza y el gusto son determinantes independientes de la
elección de la naturaleza “original” o “copia” del producto / marca. ”Me
voy a comprar porque es muy hermosa”, afirma uno de los entrevistados.
“Me encanta la combinación de color rosa con rojo”, el comprador de
una camisa rosa con el logotipo de Diesel en rojo (imitación). Lo que
estaba en cuestión fue no comprar una camisa que imitaba la casa de moda
italiana Diesel, pero el sabor, la manifestación estética “es hermoso”.
El precio y el sentido de la economía: la accesibilidad (entendida aquí
en las perspectivas financieras) es, sin duda, una gran motivación para la
compra de productos piratas imitados. Al unísono se puede ver la
satisfacción y la sensación de poder que está en la base de la compra.
Compra de energía (incluyendo el pago) es, sin duda, una alegría extraor-
dinaria, sobre todo teniendo en cuenta que la sociedad post-moderna se
basa en el paradigma de consumo. Absolutamente coherente con las
reflexiones de Miller (1992) sobre la economía y la sensación de placer
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
73
que se dio, está claro que la compra de productos y marcas que le permiten
ser la satisfacción económica y abarca la situación de la compra de un
aura especial.
Para los consumidores, aunque el consumo de la piratería también sirve
como una forma de protesta contra los altos precios cobrados por los
productos originales, es, sobre todo, visto como una ventaja, al menos
en el corto plazo.
Flexibilidad: es la satisfacción de las personas famosas mujeres con
respecto a las múltiples posibilidades de adquirir el producto. Los
vendedores siempre están abiertos a ofrece a sus clientes y “hacer todo lo
posible” para evitar perder la venta. Es la actitud habitual de buscar el
producto con otro proveedor si no está ya disponible en este mo-
mento. Asimismo, el orden es una práctica de rutina. “Espere un rato voy
a ententar con mi amigo, él tiene marrón” (hablando de un vendedor a
la pregunta que el cliente percibe la ausencia de un color entre los
productos en exhibición). Ciertamente, la conveniencia. La flexibilidad
también se manifiesta en diferentes formas de pago. Más evidente en los
mercados populares, la mediación de dinero a cambio / compra se susti-
tuye por otras formas de pago tales como el intercambio de productos,
vales de transporte, pase de autobús, o otros recursos que se convierten
en medios monetarios.
En esta perspectiva, tanto la flexibilidad necesaria para conseguir lo que
quieres que se tenga que buscar a través de múltiples ventas ofrece también
asociado a la opción de pago flexible crea un contexto muy favorable para
las relaciones de consumo que tienen lugar en los mercados populares.
Así que cuando se analiza la influencia de la publicidad en las relaciones
de consumo es pirata notorio su influencia indirecta, a través de su papel
Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon
74
decisivo en la construcción de universos compartidos de sabor, sin
embargo, no es tan directa que la publicidad fomenta el consumo de los
productos piratas. Las comunicaciones de marketing tradicionales, en los
que podemos incluir anuncios en diferentes medios (revistas, periódicos,
TV, Internet, etc.) Son marginales en el mercado pirata. Sin embargo,
la fuerza de la comunicación “boca-a-boca”, y grupos de influencia es
decisiva. También es evidente poder simbólico de la televisión en la
construcción de universo referencial de personas. Aquí destacamos
fuertemente la influencia de la telenovela popular para el consumo. La
imitación de ídolos y de las celebridades es un comportamiento percibido.
Consideraciones finales
Despues de este percurso teórico-empírico nos quedo más evidente que
el consumo de las falsificaciones es certamiente,una de las facetas más
complejas dentre las múltiplas posibilidades del consumo contempo-
ráneo. Sin embargo la más grande contribución está en la constatación
de que la busqueda, la compra, el uso y posesión de los productos
falsificados sufren fuertes influencias culturales alcanzadas por los médios
principalmente en los sectores de lamoda, de belleza y de tecnología y
por las intensas relaciones sociales involucradas en este proceso, como la
gran flexibilidad durante la compra, la comodidad y conveniencia de los
procesos de compra e venta, que apuntam para las posibilidades de la
adehesión, la resistencia y la negociación, como percibe Hall (2003) ao
estudiar los sentidos das práticas de apropiación culturales en las culturas
populares.
Frente a este aspecto tenemos que asegurar que la explicación monetária
de bajo precio non puede ser la explicación única del consumo pirata.
Hay en este fenómeno la busqueda de inclusión social por las acciones
La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...
75
de consumo, añadido de una actualización permanente frente al deseo
de estar en conjunción con los valores post-modernos de que habla
Feathestone. ¿Pero, hasta que punto esto es legitimo y beneficioso para
la evolución social del mundo capitalista actual? ¿Um otro modo de
organización se manifesta en la sociedad por medio del consumo? Aún
no tenemos las respuestas para estas cuestiones, pero nuestro trabajo
empeza a ponerlas en discusión.
Como también percibimos um valor sentido estético lleno de jucio de
gustoen sentido comum que posibilita una sensación legitima en términos
simbólicos sobre la compra, uso y posesión de los productos falsificados,
que no tiene en muchos casos, nada que ver con las cuestiones de
similitud de estes productos/marcas con sus originales. Cuando hay esta
preocupación con la semejanza el valor de las marcas originales y de su
universo comunicativo se transfiere para los productos piratas. En este
sentido la comunicación funcciona como estimulante indirecto ao deseo
de consumo de los productos falsificados. Creemos entonces que el
camino es seguir las investigaciones buscando comprender los sentidos
do “verdadero-falso dimensiones” de los productos falsificados como
Canevacci ha puesto. Aquí hemos hecho una primera mirada sobre este
tema que configura su importancia social.
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79
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia,Aprendizagem, Inovação
LAWRENCE CHUNG KOO
Queremos descrever por meio deste capítulo os conceitos orientais
sobre o que significa cópia, eles são derivados principalmente das raízes
chinesas e muitas vezes são interpretados de forma equivocadas para aque-
les que possuem cultura primordialmente ocidental.
Um dos problemas mais relevantes na sociedade de consumo é a violação
das patentes, pirataria e práticas similares, segundo a visão de muitos, prin-
cipalmente economistas e gestores, que calculam as perdas financeiras
decorrentes de tais infrações. O que queremos endereçar neste capítulo
é resultado parcial da pesquisa sobre Pirataria conduzida pelo Grupo de
Pesquisa GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação,
Cultura e Consumo, que abordou o tema exaustivamente e por meio de
abordagens interdisciplinares.
Aproximação: como eu aprendi a caligrafia
Quando fui “alfabetizado” na China, uma das minhas tarefas diárias
consistia em escrever os caracteres chineses, que é uma operação altamente
complicada para um menino de seis anos. Imaginemos que eu teria que
Lawrence Chung Koo
80
escrever algo como uma palavra “cavalo” em ideograma chinês, que tem
o seguinte aspecto . Certamente era algo muito difícil para uma
criança colocar os traços exatamente no espacejamento dentro da estética
requerida. Uma das técnicas mais utilizadas era colocar um papel vegetal
ou similar, sobre o livro texto (já era impresso e encadernado para essa
finalidade) onde reproduzíamos a letra no papel translúcido seguindo a
sequência ordenada de traços previamente determinada, inúmeras vezes,
até que a mecânica da sequência e o desenho resultante fossem inter-
nalizados. As figuras deixadas no papel vegetal eram um desenho piorado
do livro texto, mas o processo nos treinava para a obtenção das nossas
habilidades reforçando a mecânica necessária para escrever. Depois desse
treinamento, começamos a escrever sem a “cola”. A partir desse momento,
nós começamos a desenvolver a nossa própria caligrafia. Alguns dos alunos
conseguiam ter escritos que demonstravam claramente a sua persona-
lidade e a beleza artística nos textos, que na cultura chinesa é considerada
obra de arte.
O labutar nas tarefas escolares, quando é criado a disciplina e a diligência,
faz parte da cultura confucionista da China, onde valoriza-se o respeito,
a honra, o resultado pelo trabalho e a educação, portanto, praticar manus-
critos copiando ideogramas para aprender é parte dos conceitos básicos
do povo chinês.
Inegavelmente, essa atividade sistemática de repetição faz parte da
dinâmica do processo de aprendizagem do oriente. Somos instados a
primeiro imitar para depois criar. Para a cultura chinesa, essa cópia faz
parte do processo natural de aprendizagem, e as primeiras impressões vem
dos modelos de referência, portanto, sempre queremos usar as melhores
caligrafias, de pessoas famosas, pois quanto melhor forem os modelos na
fase de iniciação, com mais qualidade e rapidez obteremos na nossa
formação.
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação
81
Cabe aqui elaborarmos mais detalhadamente o que entendemos por
modelos de referência. Um modelo é necessariamente associado a um
conceito abstrato, ele é materializado por meio de uma representação,
por exemplo, um logo, uma cor, contudo ele carrega uma ideia de
excelência, algo especial, são valores intangíveis mas são representáveis.
O que atribui o valor ao modelo não está necessariamente no que vemos,
mas no que não vemos. Quando esse modelo se torna líder na nossa
mente, ele se transforma em referência para nós. Todos querem copiar o
modelo de referência, mas no início nós copiamos a representação, e
quando copiamos exaustivamente várias representações, um dia, com-
preenderemos melhor o intangível, se exercitarmos corretamente o que
compreendemos podemos nos tornar em um novo modelo de referência,
porque agora já podemos ser diferentes. Copiamos para ser diferentes e
não ser igual. Aliás, o sonho de toda marca é ser a marca de referência,
portanto ela está intrinsecamente se candidatando para ser copiada,
ironicamente isso passa a ser o seu maior problema, a partir desse mo-
mento ela passa a não permitir que seja copiada, é o paradoxo da cópia.
Diferenciando os vários aspectos da Pirataria
No nosso grupo de estudos listamos várias palavras chave que compõe o
repertório das áreas que vivenciam, estudam ou problematizam a pirataria.
Conceitos como falso, cópia, réplica, genérico etc., são exemplos que
integram o glossário da pesquisa, que foi formado com o objetivo de
compartilhar de um vocabulário comum entre todos os pesquisadores.
Gostaria ressaltar o conceito”cópia” dentre desse cenário. Ela diferencia
do falso, ou réplica. Quando nos deparamos com um produto falsificado,
que em geral carrega uma marca famosa, cara, muitas vezes do mercado
Lawrence Chung Koo
82
de luxo, conhecida e valorizada pelo consumidor, como por exemplo,
canetas Mont Blanc, e nos deparamos com outro produto que estampa
a marca, mas que não é fabricado ou licenciado pela empresa detentora
da marca, estamos diante do conceito clássico de pirataria. Há aqui
nitidamente a usurpação do valor da marca construído ao longo de anos
e com altos investimentos por parte da detentora da marca MontBlanc.
Queremos nos ater principalmente nos âmbitos da perspectiva da cópia,
seja ela a cópia de um produto físico, como a cópia de um processo de
fabricação, ou mesmo a cópia de um comportamento.
Cópia ou Imitação?Na cultural oriental, a cópia é parte do conceito de
imitação, que em tese é positivo e deve ser plenamente exercitado.
Podemos resgatar esta ideia desde tempos bíblicos e nas culturas gregas,
chinesas etc.. Queremos introduzir a prática de aprendizagem por meio
do discipulado, praticado pela cultura helenista, judaica, chinesa
etc.(KAUNG, 1976). O aprendiz deve absorver o conhecimento do seu
mestre por meio da convivência e adquirir com o tempo a sua forma de
agir. Por exemplo, para aprender a ser um sapateiro, ele deve saber como
criar o gado, como abater o animal, a forma de curtir o couro, assim por
diante, até o momento de cortar o couro e, finalmente, confeccionar o
sapato e levá-lo até o mercado e comercializar. Para tanto, ele se muda
para a casa do seu mestre, imitando-o em todos os aspectos da sua vida
até ser formado. A partir desse momento ele deixa de ser um aprendiz
para ser um profissional. Como um profissional ele pode criar, inovar e
produzir artigos diferentes do seu mestre inserindo a sua própria perso-
nalidade. A partir desse momento os produtos gerados não serão mais
cópias, e sim originais, pois a imitação do processo de produção passou
a ser agregada à própria pessoa, integrante da essência do novo profis-
sional. Podemos diferenciar que, em geral, copiar é um ato mais mecâ-
nico, e imitar é tentar ser o modelo a que se quer perseguir. Portanto, no
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação
83
Oriente, a imitação é um passo necessário para se criar e, culturalmente
apreciado e bem-vindo.
Relembrando o histórico dos produtos japoneses
Para aqueles que vivenciaram a invasão dos japoneses, desta vez, não por
meio do bombardeio a Pearl Harbor, mas da diversidade de produtos
baratos, de qualidade questionável, produzidos sem muito cuidado...,
experimentou a construção da fama de que o Japão era uma nação que
produzia artigos “copiados” e ruins. Ao olharmos para esse cenário não
podemos esquecer que em primeiro lugar, o Japão tomou a decisão de
copiar das outras nações várias práticas que eram consideradas interessan-
tes, adaptando para suas condições, por exemplo, nos esportes, com
destaque para o baseball, que passou a ser um dos principais esportes
nacionais (CHRISTENSEN, 1996). Constatamos que ao fazer isso, os
japoneses conseguiram não apenas ampliar seus conhecimentos sobre
diversos produtos, mas também praticar o que hoje chamamos de enge-
nharia reversa, com ganhos sobre todo o ciclo de produção.
Atualmente, as gerações X e Y, que não vivenciaram esses momentos da
história do Japão, reconhecem os produtos japoneses como sendo de alta
qualidade, inovadores e criativos.
Revolução Industrial Japonesa
Devemos relatar que essa mudança da qualidade dos produtos japoneses
não aconteceu por acaso, ela aconteceu de forma planejada desde a Era
Meiji,1 quando o Imperador Meiji entendeu que para sair do papel
1. Era Meiji http://pt.wikipedia.org/wiki/Era_Meiji
Lawrence Chung Koo
84
subalterno em que o país se encontrava, como um importador de quase
todos os tipos de produtos manufaturados, haveria a necessidade do
fortalecimento da indústria local. Foram contratados mais de três mil
estrangeiros para que fosse possível treinar e transferir know-how para a
economia local, em especial, para a área industrial.
Podemos afirmar que desde aquela época, começou o processo de
aprendizagem por meio de imitação dos modelos industriais ocidentais
e, aperfeiçoamento dos mesmos, evitando os erros que identificavam na
transferência de conhecimento. Esse movimento datado antes do século
20, segundo o artigo publicado na The North American Review em 1900,
então pelo primeiro ministro do Japão (OKUMA, 1900 ?), já nos indicava
o processo de aprendizagem e do planejamento estratégico do Japão.
O modelo foi desenvolvido inicialmente com reprodução industrial de
produtos simples, com uso de fósforo, evoluindo para produtos tecnoló-
gicos e de infraestrutura, sendo que hoje o Japão constitui-se em um dos
países com forte presença em siderurgia, sem ser produtor de minério
de ferro. De acordo com NOSOTRO,3 o Japão observou e emprestou as
melhores tecnologias da Europa, porém conseguiu evitar seus erros, sendo
portanto, mais eficiente. Começou-se com o aprendizado em copiar,
imitar, produzir, aperfeiçoar, pesquisar, inovar e, atualmente, em liderar
e, com isso, também ser copiado.
2. NOSOTRO, R., The Industrial Revolution in Europe and Japan, Compare the
process the of industrialization in Europe and Asia with a focus on England and Japan.Disponível em: <http://www.hyperhistory.net/apwh/essays/comp/cw21industrial-revolution-europe-japan.htm>
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação
85
Modernização na China
Analisando o processo de modernização da China, temos que comparar
as duas “Chinas” que para muitos pode passar despercebida, a China
propriamente dita e Taiwan. Em seu artigo Tzeng (2005), relata com
bastante clareza o que ocorreu historicamente em termos de desenvolvi-
mento, como pode ser observado na figura 1, a seguir.
Lembremos que embora a China seja um país comunista, o direcio-
namento econômico dado pelo Partido Comunista não foi sempre o
mesmo: esteve sob duas abordagens culturais diferentes. Durante a
condução do Mao Tse Tung, houve uma rejeição à orientação educa-
cional e cultural de Confúcio que descrevemos anteriormente de forma
resumida.
Fig 1. Mudança cultural concebida pelo Deng Xiaoping (TZENG, 2005)
Comparando com o que ocorreu em Taiwan sob regime de Kuomintang
(KMT) ou China Nacionalista que ao identificar que o regime do Mao
estava deixando a cultura milenar para trás, apressou em enfatizar os
valores, em primeiro lugar para efeito de preservação da história, e em
Lawrence Chung Koo
86
segundo lugar, como forma de aprendizagem e alavancagem tecnológica
e modernização. Sem dúvida, esse movimento foi totalmente acertado,
pois embora Taiwan não tenha um papel político tão relevante quanto a
China Continental, as suas indústrias de alta tecnologia são reconhecidas
mundialmente. O país tem um dos melhores índices de IDH (não é
classificado, mas é contabilizado em 0,932 o que equivale a 8o. lugar no
mundo).
Fig 2. Estratégia de Chiang Kai-Shek para renascimento cultural (TZENG, 2005). Umaanálise sobre o que aconteceu com as indústrias em Taiwan também mostra os
resultados coerentes com as abordagens que relatamos anteriormente. Citemos algunsexemplos a seguir.
Como exemplo desse “acerto”, podemos citar a Acer Computer Com-
pany, que se especializou em usar a tecnologia da IBM PC, começando
a produzir o PC XT, e alguns anos depois ela foi capaz de lançar PC 386
com chips da Intel antes da própria IBM. Hoje é uma indústria total-
mente consolidada e considerada inovadora. Outro exemplo que pode-
mos citar é o de United Microelectronics Company (UMC) que é uma
empresa de semicondutores que iniciou as suas operações com a tecno-
logia transferida de RCA, que mais tarde se tornou a primeira empresa
de Taiwan a licenciar a tecnologia de semicondutor para todo o Ocidente.
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação
87
Como contra-exemplo, temos a Vanguard International Semiconductor
Corporation (VIS) também de Taiwan, fundada em 1994. O objetivo
era ser uma referência no negócio de chip DRAM (Dynamic Random
Access Memory) com um orçamento inicial de 200 milhões de dólares.
Diferentemente dos casos anteriores, preferiu-se contratar engenheiros
taiwaneses de alto calibre dos EUA para desenvolver a tecnologia em vez
de transferir ou comprar tecnologiaestrangeira. Resumindo a história, em
2001 já acumulava um prejuízo de mais de 6 milhões de dólares e,
finalmente, encerrou as suas atividades em 2004.
Assim como o histórico de desenvolvimento de Taiwan, estamos assisti-
mos a China seguindo os mesmos passos. Ainda consideramos no
Ocidente os produtos chineses como cópias de baixa qualidade, mas ao
mesmo tempo já conseguimos adquirir alguns artigos de grande sofis-
ticação e de ótimo nível de acabamento e desempenho, com preços
bastante competitivos. São sinais claros do processo natural de aperfei-
çoamento de uma nação, que por meio da cópia chega ao aperfeiçoa-
mento, à inovação eà liderança. Como que já pontuamos anteriormente,
o êxito do sucesso não é fruto somente do processo de aprendizagem por
meio de cópia, imitação e inovação, ela tem que ser vista dentro da
perspectiva de toda uma cultura que premia trabalho, diligência, disci-
plina e persistência. Evidentemente há muitos que aproveitam da cultura
de cópia para lucrar sem esforço, mas ao olharmos para os conceitos de
valor predominante da sociedade inegavelmente a média é positiva.
Considerações finais
Queremos demonstrar que a cópia é um fator primordial para desen-
volvimento humano, dentro de parâmetros estratégicos, pode e deve ser
praticado. Entendemos que a inovação pode ser em decorrência da
Lawrence Chung Koo
88
imitação, que nada mais é do que utilizar as descobertas do passado e
aperfeiçoá-las. Não entramos aqui com outros componentes para justifi-
car a práticas desleais de pirataria, apenas queremos demonstrar que a
prática da cópia quando se está dentro de um plano de desenvolvimento,
de forma acordada, constitui-se em procedimento necessário para cresci-
mento de um país.
Realçamos o caráter estratégico da prática, ela se consolida após décadas
desde o início da cópia, muitas vezes não conseguimos ver esse resultado
de imediato mas, ao longo do tempo perceberemos que os resultados não
são obtidos na forma de produto final, o mais importante é a absorção
dos processos de desenvolvimento, de onde foram tiradas as lições das
experiências dos pioneiros, evita-se os erros cometidos e aprende-se a
cultura e costumes das fontes ao que se copia. Por sua vez, o produto desse
desenvolvimento fará parte da riqueza da humanidade, que confere nessa
aprendizagem à perpetuidade do conjunto do conhecimento. Portanto,
o aprender pela cópia foi, é e será uma das práticasdo desenvolver do ser
humano.
Referências bibliográficas
Christensen M. The Meiji Era and the Modenization of Japan. Disponivel em<http://www.samurai-archives.com/tme.html> acesso em: 28 de abril de2012
GLASS, A. Imitation as a Stepping Stone to Innovation, OSU Working PaperNo. 99-11, TEXAS: Department of Economics, A&M University. 1999
KAUNG, S. Disciple to Christ. New York: Christian Fellowship Publisher,1976. Loc 253 a 266.
LIKER, J. The Toyota Way, 14 management principles from the world’s greatestmanufacturer. New York: McGraw-Hill Education. 2003
Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação
89
SLACK, N.; CHAMBERS, S.; JOHNSTON, R. Administração de Produção,3a. ed., São Paulo: Atlas, 2009.
OKUMA, C. The Industrial Revolution in Japan, Page 677-691. In: The NorthAmerican Review. Vol. 171, No. 528, Nov., 1900
TZENG, C. H. Understanding Economic Development in Modern China:The Interplay among the State, the Market, and the Social Sector. In:Business and Economic History Online, 2005. Vol 3. Disponível em:www.thebhc.org/publications/.../2005/tzeng.pdf
91
Imitação na Propaganda Comercial
GINO GIACOMINI FILHO
Introdução
A imitação, enquanto atividade de aprendizagem, reprodução de um
fenômeno natural ou repetição natural de práticas sociais foi e sempre
será fundamental para as pessoas. Está impregnada na cultura e valores
de forma que é impossível encontrar algo que seja absolutamente original
ou que não contenha traços imitativos. A imitação é parte estrutural da
comunicação expressando-se, por exemplo, por meio da redundância,
além de que a própria indústria da comunicação reproduz modelos que
se tornam acessíveis e replicados na forma de informação, entretenimento
e persuasão.
Porém, faz parte também da natureza humana e das organizações a imi-
tação depreciativa, em que obras e direitos são imitados causando danos
a outrem, caso da esfera da comunicação em que tantos trabalhos têm
seus conteúdos imitados fazendo com que a difusão massiva de itens
copiados traga danos a consumidores e organizações.
Modelos teóricos recentes alocam a imitação dolosa e a pirataria como
temas das novas responsabilidades sociais organizacionais, uma vez que
tais práticas implicam danos em várias esferas, como o concorrencial,
Gino Giacomini Filho
92
autoral e consumerista (SOARES, 2004; ASTOUS GARGOURI, 2001;
BONEBEAU, 2004).
2. Propaganda comercial: práticas imitativas
Barreto (1982) afirmava que a criatividade na propaganda é precedida
por várias atividades que lhe dão suporte e a fazem canalizar para a ela-
boração de uma peça publicitária:
Desta forma, a criatividade em marketing – envolve, depende e
se relaciona com pesquisa técnica, pesquisa de mercado, admi-
nistração, disponibilidades financeiras e operacionais etc – ante-
cede à criatividade em Propaganda (sendo esta, como se sabe, tão-
só segmento do Marketing, como um todo) (p. 113).
Essa realidade não mudou. Dessa forma, um fator a verificar para que
um anúncio seja analisado do ponto de vista imitativo é o fluxo do
trabalho de marketing e pesquisa que o antecedeu, pois é consenso que
uma peça publicitária e a própria ação de publicidade é caudatária de um
esforço de marketing. A criação publicitária é um produto coletivo e de
co-autoria, bastando voltar a fazer tal percurso para certificar se a peça
publicitária reuniu os elementos que a construíram no plano da cria-
tividade de marketing e no próprio trabalho processual que envolve a
elaboração de uma peça publicitária.
Bertomeu (2002), baseando-se na rotina profissional de uma agência de
propaganda, também sustenta que a criação de um anúncio publicitário
é precedida por algumas etapas, dentre elas o planejamento de marketing
(oferece informações mercadológicas do anunciante/marca para a criação
publicitária) e o briefing de criação (trabalho de planejamento da propa-
ganda e informações específicas). Para esta construção criativa, são envol-
Imitação na Propaganda Comercial
93
vidos diversos profissionais: atendimento (faz a ponte entre agência e
anunciante), planejamento (elabora o plano e o briefing), de forma que
esses documentos têm a participação da agência e do anunciante, que
oferecem assim as bases estratégicas para os anúncios:
Sendo assim, todos esses profissionais citados definem o conteúdo
do documento que irá também direcionar todas as outras ativi-
dades que farão parte da campanha de propaganda. Enquanto a
criação cria a mensagem, o mídia é responsável pela reserva de
espaços e futura veiculação da mensagem. O profissional de pes-
quisa alimenta com informações atualizadas todo o grupo e o
atendimento aprovará com o cliente essa mesma propaganda,
sempre direcionado pelo “foco” definido por todos os profissio-
nais, inclusive, o cliente, no documento chamado briefing de
criação (BERTOMEU, 2002, p. 31).
Portanto, a condução criativa de um anúncio é um trabalho de co-criação,
que envolve também o anunciante: “O trabalho de criação na propaganda
é em equipe [...] É um trabalho que envolve a parceria dos publicitários
entre si e do cliente [...]” (BERTOMEU, 2002, p. 50). Completa o autor:
“Quando se cria uma campanha, o fato de o cliente tê-la aprovado, coloca-
o como co-autor [...]” (p. 51).
Mas, atualmente, é possível agregar a essa co-autoria o próprio consu-
midor. A internet possibilitou que o consumidor influenciasse a criação
de valor, desdobrando e propagando a criação de valor por toda a cadeia
(PRAHALAD RAMASWAMY, 2002). Porém, a responsabilidade continua
sendo dos que fazem a propaganda em termos de relações comerciais,
ou seja, anunciante, agência e veículos de comunicação. De forma mais
específica, cabem aos criativos da publicidade (profissionais da criação)
a elaboração estética da peça publicitária.
Gino Giacomini Filho
94
Existem obras bibliográficas em propaganda cujos autores também tive-
ram experiência profissional em publicidade; suas palavras são represen-
tativas do fazer publicitário. Nesse sentido, é pertinente confirmar que,
de uma forma geral, tratam a “idéia” como fator essencial na criação
publicitária:
A indústria cria produtos basicamente iguais. As lâmpadas acen-
dem, os óleos lubrificam, os desodorantes desodorizam. Em
milhões de casos, o que vai destacar um produto dos outros são
... boas idéias – expressas em marketing criativo, em propaganda
criativa. (BARRETO, 1982, p. 104)
A não ser que sua campanha seja construída em torno de uma
grande idéia, ela redundará em fracasso (OGILVY, 1976, p. 91)
De certa maneira o layoutman precisa transmitir o subjetivo de
modo concreto. E o subjetivo é infinito. Jamais a imagem (e difi-
cilmente a palavra) consegue expressar de fato uma única idéia.
O que se comunica dessa idéia, através de palavras e/ou traços, é
sempre uma das diferentes e várias maneiras de se representar essa
idéia (LADEIRA, 1997, p. 58).
A Criação é a essência da agência, como vimos. Sua função é criar
idéias para serem transformadas em slogans, temas publicitários,
anúncios para jornais e revistas, comerciais de rádio, televisão e
cinema, cartazes e outras mensagens publicitárias (SAMPAIO, 2003,
p. 66).
Esses e outros autores publicitários enfatizam a importância da “idéia”
no processo criativo, porém destacam-na como insumo e não como o
anúncio ou expressão tangível.
De forma similar, Read (1981) argumentava que, no campo da arte, a
idéia não pode ser imitada ou copiada, visto ser uma ocorrência mental
Imitação na Propaganda Comercial
95
que não oferece observação objetiva. Somente a expressão da idéia pode
ser imitada.
Seria o caso da propaganda, exemplificando-se com um anúncio que usa
frases e foto para expressar a idéia de segurança na alimentação de uma
criança. Na tentativa de estender esse ponto de vista para o campo publi-
citário, pode-se estabelecer que a idéia de segurança na alimentação de
uma criança foi concebida no planejamento mercadológico que, via
briefing de criação, passou para a agência de publicidade empregá-la no
anúncio usando para isso foto de criança no colo da mãe e um slogan.
Um anúncio imitativo poderia usar foto semelhante para uma peça publi-
citária de automóvel e expressar a idéia de vida em família, assim como
um concorrente do setor alimentício infantil poderia usar fotos e título
diferenciados para expressar segurança na alimentação de uma criança.
Neste exemplo, a manifestação mental dessa idéia surgiu de forma
particular no universo cognitivo de seu criador de forma que esse indi-
víduo irá traduzi-la para o mundo exterior usando determinados suportes
ou elementos estéticos. Porém, esse indivíduo criativo fez uma tradução.
É inviável considerar a idéia como referência para atestar trabalhos simi-
lares uma vez que as idéias estão à disposição de todas as mentes. Porém,
a aplicação de uma idéia oferecerá contextos únicos ou especiais passíveis
de observação e avaliação por pessoas e entidades.
Talvez esses sejam também motivos para que a Lei dos Direitos Autorais
não proteja as idéias, mas as obras delas resultantes. Proteger idéias seria
algo inviável dado não somente à natureza humana, mas também a multi-
plicidade de suportes, conteúdos, tecnologias disponíveis ainda por vie-
rem, caso dos meios virtuais.
Adler (2002) mostra que a internet apresenta condições e contextos
inovadores para a propaganda atual em que um anúncio é “clicado” por
Gino Giacomini Filho
96
bilhões de pessoas individualmente ou em comunidades virtuais. A
audiência global de uma peça publicitária pode acarretar sua reprodução
em escala internacional, o que faz aumentar a responsabilidade daqueles
que fazem propaganda e, na mesma proporção, o risco de imitações trans-
continentais que, antes, pouco eram percebidas no trade publicitário.
Cappo (2003) entende que os trabalhos das agências de publicidade em
meados do século XX mantinham diferenciações e bom grau de cria-
tividade, sendo até possível caracterizar diante de um anúncio a sua agên-
cia de origem, quase que formando uma marca distintiva. Porém,
atualmente: “Uma análise dos comerciais de diferentes países mostra que
as idéias criativas são habitualmente copiadas ou adotadas” (p. 82).
Baudrillard (2000) também se mostra desencantado com a mesmice na
propaganda, como os anúncios na área de moda e varejo, talvez fazendo
com que a sociedade e os agentes de comunicação já não sejam sensíveis
em demarcar o que é inovação ou imitação nessa área.
Segundo Castro (2008): “Os produtos promocionais marcam-se por um
conjunto de características comuns e constituidoras que possibilitam a
formulação de uma gramática da produção promocional televisual” den-
tre elas o “movimento de repetição e inovação”, ou seja, “A publicidade
tenta trazer o novo sem abdicar do mesmo: ela se situa no limiar entre aquilo
que é inédito, diferente, novo e aquilo que dela se espera, o procedimento
previsível” (p. 43-44).
É evidente que ao lado dos anúncios mais ousados, até mesmo
inovadores, em alguns casos, convive uma imensa maré de lugares-
comuns, banalidades como a de colocar um atleta para vender
vitamina, um aparente dentista para divulgar certa pasta dental,
um bem-sucedido empresário para recomendar determinada
corretora de valores. (CITELLI, 1998, p. 43).
Imitação na Propaganda Comercial
97
Nesta mesma linha, Carvalho aponta que um dos recursos discursivos
da publicidade é trabalhar com “fórmulas fixas”, que seriam chavões, fra-
ses feitas, caso de “Todos os caminhos levam a Visa [Roma]” (2007, p.
88); a partir deles, o anúncio apenas se completa com informações
adicionais sobre a marca ou produto. A fórmula fixa funciona como um
chassi que pode acomodar diferentes carrocerias de automóveis. Assim,
frases feitas como “negócio da China”, “são as águas de março fechando
o verão”; “faça o maior cartaz”; “é pelas partes que se conhece o todo”
podem receber os elementos substitutos necessários para finalizar o con-
teúdo de um anúncio publicitário (CARVALHO, 2007, p. 86-89). Por isso
são frequentes as coincidências em anúncios publicitários.
Iasbeck (2002) ressalta que os slogans são “frases de efeito”, porém nem
todas “frases de efeito” são slogans. Pois enquanto as primeiras podem estar
no texto com outras frases, os segundos aparecem de forma isoladamente
marcante. Menciona o autor que o slogan é um tipo de clichê e que pode
se revestir de sentidos emocionais e coercitivos, caso do slogan utilizado
pela Varig no início dos anos 1990: “Acima de tudo, você” (p. 75).
Iasbeck mostra na sua obra muitos slogans publicitários, sendo possível
detectar no seu livro slogans semelhantes entre si, caso de Abuse e Use
[lojas C&A] (p.70) e Use e Abuse [Mate Leão] (p. 75) ou então Ter é poder
[IOB] (p. 64) e Ter é Poder [Diners] (p. 68). Também foi possível
encontrar na obra de Iasbeck slogans semelhantes a outros encontrados
em fontes diversas, caso de Experimente [Colgate Menta] (p.70) com
Experimenta [slogan utilizado pela cerveja Schincariol alguns anos depois]
e Acima de tudo, você [Varig] (p. 70 e 75) com Acima de tudo, você [Cosil
alguns anos depois].
O publicitário Thomas Roth (2003), da agência Lua Nova (São Paulo)
menciona que muitas agências e anunciantes copiam ou reproduzem tra-
Gino Giacomini Filho
98
balhos sem permissão de quem os criou. O publicitário Daniel Funes
(2004), redator da SNBB Novaagência, admite que há na indústria da
propaganda muitos casos de cópias de trabalhos, considerando algo
“rasteiro e covarde”, o que teria feito o publicitário desenvolver técnicas
para evitar ser plagiado pelos colegas.
Talvez, um estímulo para a imitação na publicidade decorra da suposição
de que a peça imitada tenha sido veiculada para target diferente do que
foi a peça imitadora, analogamente ao procedimento de comercialização
de produtos piratas que se destinam a público diverso daquele que o faz
a marca original.
Segundo Carrascoza (2008), o profissional da propaganda serve-se de
conhecimentos e experiências passadas para oferecer uma solução
publicitária ao anunciante; de outro lado, terá que usar discurso com-
patível com os signos do seu target a fim de possibilitar o intento da per-
suasão. Portanto, o texto publicitário é um subproduto de elementos
linguísticos anteriores. Para o autor, muitos profissionais da propaganda
ficam maculados como plagiador injustamente, até porque boa parte do
trabalho de: “[...] criação resulta de um processo de associação de idéias
e as coincidências são comuns, já que vários publicitários podem chegar
às mesmas soluções [...]” (CARRASCOZA, 2003, p. 98).
Pode-se dizer que não é raro que profissionais recebam orientação para
considerar trabalhos alheios como referência na elaboração de anúncios
e campanhas, caso da sugestão de Ladeira: “Ao criar uma campanha de
lançamento, é aconselhável verificar outras campanhas veiculadas nesse
período, principalmente de produtos similares” (1997, p. 83).
Uma exemplificação desse compartilhamento de recursos ocorre com o
acesso a bancos de materiais de comunicação, caso de bancos de fotos,
Imitação na Propaganda Comercial
99
bancos de logos, bancos de sons, bancos de áudio, bancos de imagens,
bancos de textos, bancos de slogans, bancos de ideias e até bancos de
anúncios.
Telles (2007) entrevistou 30 profissionais que trabalhavam em agências
de propaganda nos setores de criação, atendimento, mídia, produção e
planejamento. Apurou que a imitação de idéias publicitárias é vista tanto
como negativa (roubo de idéia) como positiva (reconhecimento de uma
boa idéia). Esse sentimento positivo está associado à vaidade do publici-
tário, uma vez que a imitação de sua idéia inflaria seu ego e reforçaria
sua auto-estima. A autora menciona o depoimento de um dos publicitá-
rios neste sentido:
[...] Eu já tive plágio de conceitos mecânicos para produção gráfica
e, até certo modo, é gratificante. Se alguém achou que aquilo era
viável e legal, que iria funcionar para outras coisas, quer dizer que
o sistema que eu criei naquele momento era adequado. Se você
pensar bem, se copiaram, é porque a idéia era boa. (E14, homem,
30 anos, profissional de produção de agência brasileira de médio
porte). (p. 73).
Segundo os entrevistados por Telles, há dois tipos de cópia: a proposital,
praticada intencionalmente e que mostra descaso para com a criação
alheia, e a coincidente, que é involuntária e, por isso, desculpável, uma
vez que é razoável não se conhecer tudo que foi publicado ou criado.
Os sentimentos negativos podem ser ilustrados com dois depoimentos:
[...] Eu sinto uma sensação de impotência, até mesmo revolta, ao
perceber que o mercado pratica cada vez mais atitudes que vão
contra o que eu aprendi em propaganda. (E25, homem, 51 anos,
profissional de atendimento de agência brasileira de pequeno porte).
Gino Giacomini Filho
100
[...] Fico possessa, porque eu odeio injustiça. Se você não está
conseguindo, vai discutir, vai procurar ajuda, vai dividir, mas não
precisa tomar os louros para você. (E2, mulher, 36 anos, profissional
de mídia de agência brasileira). (p. 74)
Preocupado em sinalizar um comportamento ético para o setor, David
Ogilvy, fundador e publicitário da agência Ogilvy & Matter enunciou
seus onze mandamentos para quem quisesse trabalhar em sua agência; o
11º mandamento foi dedicado à imitação:
Não seja um copiador: [...] Se você já teve a felicidade de criar
uma grande campanha de publicidade, verá logo outra agência
roubá-la. É irritante, mas não deve deixá-lo preocupado; ninguém
constrói uma marca imitando a do vizinho. Imitação pode ser “a
forma mais sincera de plagiarismo”, e é também a indicação de
um indivíduo interior (OGILVY, 1976, p. 99).
Talvez o trabalho mais expressivo acerca da imitação publicitária esteja
sendo realizado por Joe la Pompe. Além de ser autor do livro Noveau?
Le meilleus de la production et reproduction publicitaire (Paris: CBNews/
Telemaque, 2008), mantém um website com informações, discussões e
ocorrência de práticas imitativas na publicidade mundial
(www.joelapompe.net). Joe la Pompe é o pseudônimo de um publicitário
de expressão na França e no seu site afirma que seu website é livre, fixado
na França e não afiliado a empresas ou organizações. O site está dedicado
a obter idéias publicitárias similares e reunia em 31/8/2010 muitos anún-
cios considerados similares, caso de 709 só na categoria de impressos e
mídia exterior.
Imitação na Propaganda Comercial
101
3. Ações normativas contra a imitação publicitária
Para Delener (2000), a imitação, no escopo comercial, tem o único pro-
pósito de fraudar as pessoas. A imitação de conteúdos publicitários envol-
ve interesses individuais e coletivos, comerciais e autorais, traz consequên-
cias morais e econômicas. São razões para que incidam normas jurídicas,
corporativas e institucionais sobre esse tema. A publicidade, por ser obra
técnica de caráter estético, é protegida legalmente “na medida em que
não seja banal, ou seja, que estampe uma qualidade criativa do autor, que
vai além da comunicação de um fato comum” (PEREIRA, 2001, p. 37).
Existem muitas normas legais que incidem de forma correlata ou indireta
na imitação publicitária, caso da Constituição Brasileira (artigos 5º e 216),
Código Comercial Brasileiro (artigo 207), Lei 9.279 (1996) sobre
propriedade industrial, Lei de Direitos Autorais (9.610, 12/01/1998),
Lei de Propriedade Industrial – LPI – 9.279 (14/05/1996), além de deci-
sões do Poder Judiciário, jurisprudências e acórdãos que são importantes
sinalizadores para os níveis aceitáveis de imitação na publicidade.
Ainda quanto às normas, de incidência mais direta pode ser citada a Lei
4.680 (18/06/1965) que, ao incorporar o Código de Ética dos Profis-
sionais de Propaganda (1957), dá valor ao item 17 do Código em que
“O plágio ou a simples imitação de outra propaganda é prática condenada
e vedada ao profissional”. O Decreto 57.690 (01/02/1966) estipula no
artigo 17 que à agência de propaganda, ao veículo de divulgação e ao
publicitário não é permitido “reproduzir temas publicitários, axiomas,
marcas, músicas, ilustrações, enredos de rádio, televisão e cinema, salvo
consentimento prévio de seus proprietários ou autores” (item “I”, “c”).
No plano privado, podem ser destacadas as normas do Conselho Execu-
tivo das Normas-Padrão (CENP), Associação Brasileira de Propaganda
Gino Giacomini Filho
102
(ABP) e Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária
(Conar).
O CENP1 é uma entidade de direito privado que cuida do relacionamen-
to comercial entre anunciantes, agências de publicidade e veículos de
comunicação, frente à Lei 4.680/65 e aos decretos 57.690/66 e 4.563/
02. Concede certificação de qualidade para agências, algo que as diferencia
no mercado e na pretensão de serviços. Editou as Normas-Padrão da
Atividade Publicitária (2002), parâmetro qualitativo para os negócios do
setor publicitário. As Normas-Padrão prevêem no item 3.7: “Como
estímulo e incentivo à criatividade, presume-se que as ideias, peças, planos
e campanhas de publicidade desenvolvidos pertençam à Agência que os
criou, observada a legislação sobre o direito autoral”.
A ABP – Associação Brasileira de Propaganda – é uma entidade civil
fundada em 16 de julho de 1937 que congrega publicitários, agências,
veículos e várias entidades publicitárias. Desempenha, dentre outros, o
papel de Entidade Depositária da Criação de Propaganda desde 2003
(regras atuais revisadas em 2004). Protege campanhas, peças, obras, temas
e conceitos publicitários de agências de propaganda certificadas no
CENP. Esta reserva de direito é garantida por até um ano, pois a ABP
acolhe trabalhos que estão em licitação ou esperando por veiculação. Caso
apareça trabalho semelhante, a ABP encaminhará, conforme solicitação,
material ao Conar ou Poder Judiciário.2
1. CENP. Conselho Executivo das Normas-Padrão. Site. Disp. em www.cenp.com.br.Acesso em 28/12/2009.
2. ABP. Associação Brasileira de Propaganda. Site. Disponível em:http://www.abp.com.br/entidadedepositaria/resolucao.asp. Acesso em 04/04/2010.
Imitação na Propaganda Comercial
103
Existem institutos que cuidam do registro autoral. O ISWC (Interna-
tional Standard Musical Work Code) cadastra dados como nome da
música, duração, criadores, tipo, linguagem e o número ISWC (http://
www.iswc.org). O ISAN (International Standard Audiovisual Number)
possibilita a identificação de obras audiovisuais, filmes, documentários,
programas de TV e anúncios publicitários (www.isan.org). No Brasil, a
ABRAMUS é reconhecida pela ISAN e possui registros de obras na área
da Teatro/Dança, Artes Visuais, Música e Audiovisual
(www.abramus.org.br).
Importante papel também cabe às entidades de autorregulamentação do
setor. Cabe destacar que a prática da autorregulamentação publicitária
possui raízes internacionais. Talvez a pioneira seja a ICC – International
Chamber of Commerce – organização fundada em 1919 que, desde 1937,
institui normas no campo do marketing e da propaganda comercial. Com
sede em Paris, França, editou em 2006 o Consolidated ICC Code of
Advertising and Marketing Communication Practice, guia escrito que
contém normas de autorregulamentação para o setor (ICC, 2006).
Seu artigo 16 é dedicado à comunicação imitativa prevendo que a comu-
nicação de marketing não deve imitar outras, caso de induzir o consumi-
dor a erro ou confusão, por exemplo por meio de um layout geral, texto,
slogan, tratamento visual, musica ou efeitos sonoros. O artigo também
condena a apropriação de elementos estéticos utilizados em outros países
e continentes sem respeitar um razoável período de tempo (ICC, 2006).
O Conar – Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária –
é uma entidade representativa do campo ético publicitário no Brasil e
adota as diretrizes do Código da ICC. Trata-se de uma entidade civil sem
fins lucrativos, fundada em 1980, que reúne representantes de agências,
veículos, anunciantes e até consumidores com a atribuição, dentre outras,
Gino Giacomini Filho
104
de julgar anúncios à luz de seu Código Brasileiro de Autorregulamentação
Publicitária. Seu site também informa que, desde a sua criação, foram
instaurados mais de sete mil processos éticos.3 O Código condena a imi-
tação e plágio, notadamente quando infringem direitos autorais e quando
“[...] configure uma confusão proposital com qualquer peça de criação
anterior” (art. 42).
A relevância do Conar pode ser atestada por ser o órgão constantemente
consultado pela justiça no caso de embate ético no campo publicitário.
Casos como o do chiclete Den-Den, Sand Lake e Tabaco Stop tiveram o
Conar como mediador, papel esse reconhecido pelos tribunais e suas
decisões observadas pela justiça (SCHNEIDER, 2005).
Porém, o Conar não tem suas decisões sempre acolhidas pelo poder
judiciário, caso do litígio entre as escolas de idiomas Just in Time Asses
em Idiomas e a CNA Cultural envolvendo acusação de plágio em
campanhas publicitárias (TRIBUNAL, 2009). Esse caso mostrou também
que Conar e o Poder Judiciário possuem entendimento por vezes diverso
do que seja uma obra publicitária imitativa.
O Conar julga litígios publicitários por meio de seu Comitê de Ética
estabelecendo Representações em que todos os envolvidos podem se ma-
nifestar para que seja definida uma decisão do órgão. Como a imitação
publicitária é um dos objetos de julgamento do Conar, o conteúdo dessas
Representações pode oferecer indicadores qualitativos e quantitativos
envolvendo práticas imitativas realizados no mercado publicitário
brasileiro.
3. CONAR. Uma breve história do Conar. Disponível em: http://www.conar.org.br.Acesso em 3 jun 2010.
Imitação na Propaganda Comercial
105
No período de março a junho de 2010, foi consultado o banco de dados
do Conar (www.conar.org.br) com o propósito de encontrar decisões
sobre casos de anúncios publicitários envolvidos com imitação publi-
citária. A amostra correspondeu às decisões publicadas no período de
2001 a 2009, abrangência de anos esta contemplada na seção “Conar em
Números, disponível no site do Conar (http://www.conar.org.br/) em
2010, ano em que esta pesquisa fez o levantamento.
Foram consideradas somente as decisões que tiveram como despacho a
sustação ou alteração nas categorias “Originalidade”, “Direitos Autorais”
e “Propaganda Comparativa”; assim apurou-se que o Conar apresentou
50 Representações em que anunciantes foram advertidos por fazerem uso
imitativo de peças publicitárias. Estipulou-se três categorias a serem
quantificadas:
1. Direitos envolvidos. Correspondem aos conteúdos relatados em cada
Representação que apontam afronta a direitos de âmbito autoral, con-
correncial e consumerista (consumidor).
2. Setor. Aponta em quantas Representações o litígio envolveu anun-
ciantes e um mesmo setor de atividade econômica.
3) Elementos estéticos imitados. Identificou nas Representações quais ele-
mentos estéticos das peças envolveram-se com a imitação.
O critério adotado levou em conta o conteúdo da Representação e não
apenas a categoria de enquadramento escolhida pelo Conar. Assim foi
possível detectar em algumas representações o enquadramento em duas
ou mais categorias de direitos envolvidos. Desta forma se, por exemplo,
o conteúdo da Representação aponta infração aos direitos autorais e relata
também danos ao concorrente, o enquadramento também se deu tanto
no direito autoral como concorrencial; ou se mereceu das entidades
Gino Giacomini Filho
106
envolvidas comentários sobre prejuízos ou confusão para o consumidor,
há também o enquadramento no direito consumerista. Os resultados
estão no Quadro 3.
Quadro 3 – Decisões do Conar quanto a práticas imitativas
Número da Direitos Setor Elementos estéticos
Representação (1) (2) imitados (3)
1. Autoral 2. Conc. 3. Cons A T I C S
08/01 x — x
11/06 x x — x
17/04 x x x
18/03 x x x x
30/03 x x x x
32/07 x x x x
043/05 x x x x
48/04 x x x x
51/01 x x x x
60/03 x x x x
66/04 x x x x
76/04-79/04 x x x x
84/05 x x x x
92/01 rec. ord. x x x x
96/03 x x x x
101/04 x x x
124/03 x x x
135/03 x x x x
141/03 x x x
143/04 x x x x
147/03 x — x
155/04 x x x
156/01rec. ord. x x x x
167/06 x x x x
168/06 x — x
172/09 x x x
175/04 x x x
178/06 x x x x
192/04 x x x
197/07 x x x x
Imitação na Propaganda Comercial
107
Número da Direitos Setor Elementos estéticos
Representação (1) (2) imitados (3)
1. Autoral 2. Conc. 3. Cons A T I C S
198/03 x x x
200/01 x — x
206/07 x x x x x
207/02 x x x x x
209/06 x x x x
211/01 x x x
217/06 x x x x
222/04 x x x
231/07 x x x
237/06 x x x
242/01 x x x x
248/04 x x x x
258/09 x x x x
265/05 x — x
301/07 x x x
317/06 x x x x
323/05 x x x x
323/07 x x x x x
367/08 x x x
430/08 x — x
Representações 50 12 20 43 3 8 5 17 17
% 100% 24% 40% 86% 6% 16% 10% 34% 34%
(1) Direitos envolvidos: correspondem aos direitos de âmbito 1. Autoral, 2. Concorrenciale 3. Consumerista. (2) Anunciantes que atuam num mesmo setor de atividade econômica(3) Elementos estéticos imitados: correspondem aos elementos das peças, ou seja,Assinatura (A), Texto/Título (T), Imagem (I), Conjunto (C) e o Slogan/Tema (S). O elementoSlogan pode compor quaisquer dos demais elementos.
Quanto aos direitos envolvidos, a análise verificou os direitos correspon-
dentes ao âmbito Autoral, Concorrencial e Consumerista. Apuraram-se
os seguintes dados: 100% das decisões envolveram direito autoral, 24%
direitos concorrenciais e 40% direitos do consumidor. Portanto, parece
que as práticas imitativas na comunicação promocional atingem plena-
mente os direitos autorais; esse enquadramento é natural se for levado
em conta que a imitação ocorre, fundamentalmente, de uma obra inte-
Gino Giacomini Filho
108
lectual protegida. Porém, não deixa de ser interessante perceber que o
segundo tipo de dano mais apontado refere-se a direitos dos consumi-
dores, de certa forma mostrando que a imitação publicitária precisa ser
considerada e regulamentada em termos consumeristas. Embora os direi-
tos concorrenciais fossem pouco evocados, é importante considerar que,
implicitamente, estariam contemplados nos dois anteriores, já que se
apossar de trabalhos (direito autoral) e confundir consumidores configu-
ram-se como formas de concorrência desleal.
Do total das 50 Representações, 43 (ou 86%) dos litígios envolveram
anunciantes de um mesmo setor de atuação, o que confirma parcialmente
o entendimento geral de que a imitação publicitária ganha relevância
quando participa de esforços de marketing pela disputa de mercados e
consumidores.
Considerando os elementos estéticos das peças promocionais, das 50
decisões, 17 (34%) se relacionaram ao conjunto estético e o mesmo valor
para o composto slogan/tema. 8 (16%) apresentaram imitação nos ele-
mentos textuais (texto/título), enquanto imagem ficou com 5 ocorrências
(10%) e assinatura com 3 aparições (6%). Esses dados mostram que a
imitação publicitária normalmente ocorre no conjunto, e não apenas em
uma parte. Porém, cabe destaque ao composto slogan/tema, frase sucinta
e marcante que diferencia o anunciante cuja imitação pode provocar
sensível dano autoral, concorrencial e consumerista.
4. A visão de especialistas em publicidade
Com o propósito de obter e registrar o entendimento sobre práticas imi-
tativas no plano social, mercadológico e publicitário, foram realizadas
entrevistas com quatro especialistas em publicidade.
Imitação na Propaganda Comercial
109
O depoimento ou avaliação de especialistas ajudam no entendimento e
na elaboração de parâmetros a fim de se considerar aspectos imitativos
na comunicação (ABREU, 1968; CORREA, 2004; VEGA, 2011).
Em 2011 foram contatados quatro especialistas com a finalidade de apon-
tar aspectos que incidem na avaliação qualitativa e quantitativa da imi-
tação, especialmente na publicidade. O formulário de pesquisa dava aos
especialistas opções para escolherem a forma de identificação de seus
nomes e associação com as respostas. A pedido de dois entrevistados, as
respostas não foram associadas aos especialistas, sendo que o especialista
do Clube de Criação de São Paulo também solicitou para não ter seu
nome mencionado. Portanto, decidiu-se por não associar as respostas a
nenhum entrevistado.
O especialista Edney G. Narchi é formado em Direito e ocupa o cargo
de vice-presidente do Conar – Conselho Nacional de Autorregulamen-
tação Publicitária, entidade que aprecia e julga processos envolvendo
conduta ética do setor publicitário no Brasil, considerando assim a mais
importante instância ética da publicidade brasileira desde 1978, quando
foi efetivado.
O especialista João Vicente Cegato Bertomeu é autor dos livros Criação
na Propaganda Impressa (Futura, 2002) e Criação em Filmes Publicitários
(Cengage Learning, 2010), doutor em Comunicação e Semiótica pela
PUC-SP e docente Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP onde
atua nas linhas de pesquisa Processo de criação nas mídias e Design de
comunicação.
Outro especialista é um dos dirigentes do Clube de Criação de São Paulo
(CCSP), entidade que existe desde 1975. O CCSP edita o Anuário do
Clube de Criação desde 1976, anuário que é referência nacional para o
Gino Giacomini Filho
110
setor da criação publicitária brasileira; esses fatores e a relevância que o
CCSP tem no mercado publicitário, o tornam a entidade de criação
publicitária mais importante do Brasil.
O especialista José de Sá é doutor em Comunicação Social pela Uni-
versidade Metodista de São Paulo, docente em 2011 da disciplina Ética
da Comunicação na Universidade Municipal de São Caetano do Sul,
instituição que abriga o Mestrado em Comunicação recomendado pela
CAPES.
4.1 Questões, respostas e comentários
1. Organizações e pessoas podem imitar marcas, produtos, pro-
cedimentos de concorrentes e até colegas de seu campo profissional.
Atribua um grau de relevância para a imitação não autorizada
ou ilegal dentro de um mesmo setor (0-nada grave a 10-
gravíssimo):
Os quatro especialistas atribuíram nota de forma que os quesitos tiveram
a seguinte média:
Imitação na Propaganda Comercial
111
5,5 imitação em jornalismo (uso de fotos, matérias jornalísticas etc)
6,2 imitação de programas (programas de TV, filmes, novelas queimitam outros)
6,5 imitação de produtos (tênis, medicamentos, combustíveis etc)
7,5 imitação de marcas (imitação de marcas famosas, marcas líderesetc.)
6,7 imitação de arte (música, quadros artísticos etc)
6,7 imitação de propaganda comercial (slogans, anúncios etc)
8,2 imitação de trabalhos acadêmicos (trabalhos de pesquisadores,professores ou alunos)
8,7 imitação de idéias comerciais (ex-funcionários que repassamsegredos comerciais ou os utilizam em negócios próprios).
Depreende-se que, para os especialistas, a imitação não autorizada de
propaganda comercial ocupa lugar relevante. Se considerarmos os
extremos – 5,5 para a imitação em jornalismo e 8,7 para imitação de idéias
comerciais – a propaganda ficaria bem próxima da mediana (7,1), caracte-
rizando assim uma posição intermediária; porém se considerarmos a
amplitude total do intervalo considerado, essa importância cresce subs-
tancialmente, o que equivale dizer que, para os especialistas a imitação
publicitária não autorizada é algo grave.
2. No geral, em que grau você considera os anúncios publicitários
parecidos entre si (Muito parecidos: 0; Muito diferentes: 10)? Exis-
tem setores de atividades econômicas ou tipo de anunciantes em
que a semelhança é maior?
Três especialistas apontaram resposta, que alcançou a média de 6,3. Os
setores varejista e imobiliário foram apontados por dois especialistas,
havendo uma menção para operadoras de celulares, investimento, bancos,
cerveja e automóveis.
Gino Giacomini Filho
112
Os especialistas consideram que os anúncios publicitários são parecidos
entre si, porém não em grande escala, além do que alguns setores
apresentam esse quadro de forma mais acentuada, caso de imóveis e
varejo.
AS QUESTÕES AGORA TRATAM DA IMITAÇÃO ENTRE
ANÚNCIOS PUBLICITÁRIOS de anunciantes diferentes, caso do
exemplo abaixo.
3. Você vê problema um anúncio imitar outro? Se sim, qual ou quais
os problemas que gerariam?
Os quatro especialistas responderam “Sim”.
O problema mais apontado foi confusão, citado pelos quatro especialistas.
Os direitos autorais foram apontados por dois especialistas, vindo a seguir
apropriação indébita e falta de criatividade.
Assim, os especialistas unanimemente consideram que o maior problema
gerado pela peça publicitária é a confusão, confusão esta que alguns deles
mencionaram em termos de recepção junto aos públicos de interesse e
consumidores. Também o problema autoral é ressaltado, podendo a
apropriação indébita indicada por um especialista somar-se a este fator,
dando-lhe ainda mais relevância. Num patamar inferior ficou a falta de
criatividade.
Imitação na Propaganda Comercial
113
4. Expresse sua avaliação em temos de graus de concordância (0-
Discordância total a 10-Concordância total). Anúncios que se
assemelham a outros:
Os quatro especialistas indicaram resposta obtendo os quesitos a seguinte
média:
6,2 contribuem com o empobrecimento do repertório cultural daspessoas que os vêem.
9,5 colaboram com a mesmice na publicidade.
9,5 contribuem com a falta de diferenciação de produtos e marcas.
8,5 revelam desrespeito ao consumidor.
9,5 sinalizam que aquele anúncio não é criativo.
7,5 revelam que não existe preocupação do anunciante quanto àqualidade da propaganda.
7,2 mostram que o anunciante quer mais imitar o concorrente doque prestigiar a sua própria marca.
6,0 mostram que a publicidade é algo decadente.
Para os especialistas, a semelhança entre anúncios, quase em termos
absoluto colabora com a mesmice na publicidade, contribui com a falta
de diferenciação de produtos e marcas e sinaliza que aquele anúncio não
é criativo. Num patamar elevado também revela desrespeito ao
consumidor.
Assim, a imitação dentre anúncios os indiferencia, trazendo impactos para
o setor como um todo e para os elementos (marcas, produtos) ali inse-
ridos, revelando-se um potencial problema no âmbito de marketing e
vendas. Como boa parte dos anúncios é voltada para o público em geral,
tal indiferenciação pode significar desrespeito ao consumidor.
Gino Giacomini Filho
114
5. Quando um anúncio publicitário é imitado por outro, pode trazer
danos (considerar múltiplas opções):
Os quatro especialistas apontaram danos “aos seus criadores, ou seja,
publicitários e equipe que o criou” e “ao anunciante, ou seja, a empresa
para a qual foi criado o anúncio”; três apontaram “ao consumidor que
foi alvo da propaganda” e dois “à sociedade em geral”. Um especialista
mencionou na categoria “outros” que um anúncio pode trazer danos aos
alunos dos cursos de Publicidade.
De certa forma, os especialistas consideram que a imitação de um anúncio
traz danos maiores na esfera do direito autoral ou criação intelectual,
embora tal dano possa alcançar também relevância no plano econômico
ao gerar prejuízos financeiros à equipe e profissionais que idealizaram o
trabalho. Também apontam danos a quem pagou pelo trabalho
(anunciante), neste caso possivelmente trazendo prejuízos de ordem
econômica, mercadológica e concorrencial. O dano ao consumidor
também tem destaque, talvez por gerar confusão e isso repercutir nas suas
decisões de consumo.
6. A imitação dentre anúncios publicitários pode impactar direitos
dos consumidores ou interferir nas decisões de consumo? Como?
“Sim” foi a resposta dos quatro especialistas.
Três apontaram que tal possibilidade leva o consumidor à confusão,
notadamente quanto a marcas e produtos. Houve menção também a
aspectos do Código de Defesa do Consumidor relacionados à clareza e
correção da informação publicitária.
Imitação na Propaganda Comercial
115
Portanto, no entendimento dos especialistas, a imitação dentre anúncios
publicitários impacta o consumerismo, principalmente ao levar o
consumidor à confusão em relação a marcas e produtos anunciados.
7. Um anúncio que imita outro pode confundir o consumidor?
Como?
Os quatro especialistas responderam que sim.
Dois remeteram à questão anterior (questão 6), enquanto os outros apon-
taram que a confusão pode prejudicar a associação da campanha com o
anunciante, levar o consumidor a se enganar quanto a um produto e dei-
xar o comprador insatisfeito.
Assim como na questão 6, a imitação publicitária pode ser vista como
fenômeno que provoca confusão ao consumidor, quer em termos de
reconhecimento do anunciante ou quanto ao conteúdo/marcas/produtos
anunciados, podendo assim causar insatisfação.
8. No Brasil, já foram publicados anúncios que imitavam outros para
induzir consumidores a comprar produtos concorrentes ou acre-
ditar em informações que, na verdade, foram copiadas de outros
anúncios. Levando em conta casos como esses e outros que ocorre-
ram, você é favorável à existência de uma legislação que penalize
a imitação publicitária com potencial de dano aos consumidores?
Se sim, em que sentido?
Três especialistas indicaram resposta, sendo todas “Sim”.
Um ressaltou que tal legislação já existe no campo da propriedade inte-
lectual e consumerista, enquanto dois sugeriram criar leis para este pro-
Gino Giacomini Filho
116
pósito, salientando-se que desses dois, um apontou esforços do Conar
nesse sentido.
Metade dos especialistas é favorável ao estabelecimento de uma legislação
específica sobre a imitação publicitária com potencial de dano aos
consumidores.
9. A amplitude de veiculação de um anúncio deve agravar a
penalização de uma prática imitativa? (Ou seja, quanto mais
ampla for a divulgação, maior deve ser a penalização)
Três dos quatro especialistas apontaram “Sim”.
Nesse caso, a penalização de uma prática imitativa publicitária seria
proporcional à amplitude de veiculação do anúncio, ou seja, quanto maior
for o alcance (audiência, tiragem, extensão geográfica ou midiática) da
peça publicitário, maior seria a penalização no caso de gerar danos.
10. A exclusividade de uso de uma solução criativa de um anúncio
deve prescrever depois de um certo tempo? Se sim, em quanto
tempo? Deveria ser permitido que qualquer outro anunciante
utilizasse essa solução criativa se pagasse pelos respectivos
direitos? Algum comentário?
Dois especialistas apontaram “Sim” e dois assinalaram “Não”. Dos que
indicaram “Sim”, um mencionou que depende do tempo de veiculação
da mensagem e outro que essa prescrição deve ser em, no máximo, um
ano. Quanto à consulta se deveria ser permitido que qualquer outro anun-
ciante utilizasse essa solução criativa se pagasse pelos respectivos direitos,
igualmente dois disseram “Sim” e dois “Não”. No primeiro caso, bastaria
o interessado adquirir os direitos na forma da lei. No segundo caso seria
Imitação na Propaganda Comercial
117
melhor cada anunciante ter sua própria voz e a solução criativa deveria
ser usada por período determinado.
Os especialistas se mostraram bastante divididos quanto ao uso de uma
solução criativa na publicidade e também quanto a um período de
prescrição, ficando então essa questão sem uma resposta mais definida.
11. Para julgar que um anúncio publicitário é imitação de outro,
que perfil de pessoas são aptas a fazer tal avaliação (considerar
múltiplas opções)?
Três especialistas apontaram resposta para este quesito.
Os três assinalaram que “especialistas” seriam pessoas com perfil mais
indicado para julgar se um anúncio é imitação de outro, com destaque
para peritos em criação publicitária, juristas, sociólogos, jornalistas e pes-
quisadores. Dois indicaram “profissionais da publicidade”. Consumidor
/ público em geral obteve uma indicação.
Embora o consumidor possa merecer lugar de destaque enquanto pú-
blico-alvo da propaganda e sofrer impactos consumeristas diante da imi-
tação publicitária, os especialistas consideram que pesquisas com
consumidores seriam menos relevantes do que consulta a especialistas no
que se refere ao julgamento de práticas imitativas da propaganda. Esse
resultado respalda a opção deste trabalho de pesquisa ao escolher
especialistas para contribuir com aspectos técnicos sobre a imitação
publicitária, embora outros perfis de especialistas e até pesquisas com
consumidores pudessem também oferecer significativa contribuição.
Gino Giacomini Filho
118
12. Um anúncio publicitário tem que ser totalmente igual a outro
para ser considerado imitação ou plágio? Se não, qual seria esse
critério quantitativo?
“Não” foi a resposta dos quatro.
O conceito publicitário foi mencionado por dois especialistas.
A presença de elementos relevantes ou de fácil identificação da peça
original, além de aspectos estéticos e textuais foram citados.
Segundo os especialistas, se parte de um anúncio for igual a outro é
suficiente para ser considerado imitação ou plágio. Esse teor pode
simplesmente denotar o conceito utilizado, ou algo que poderá ser visua-
lizado em elementos estéticos destacados.
13. O que pode ser feito para que os publicitários não imitem
anúncios criados por outros? Dê uma nota para a importância
(0-Irrelevante a 10-Importantíssimo) para as ações abaixo:
Este quesito não obteve dos especialistas um tratamento uniforme, pois
dois indicaram para todos os quesitos uma nota de 0 a 10, enquanto dois
assinalaram apenas suas opções. Portanto, a média se refere a apenas dois
especialistas, à qual será acrescentada a indicação de opção dos demais.
“toda criação publicitária deve ser depositada em banco de dadospara prévia consulta”: 1,0
“a legislação deve ser mais completa ou rigorosa com essa questão”:7,5 e mais uma indicação de um especialista.
“os publicitários devem ter melhor formação ética”: 10 e mais umaindicação de um especialista.
Imitação na Propaganda Comercial
119
“os publicitários devem se aplicar melhor em ter idéias inovadoras”:9,5 e mais uma indicação de um especialista.
“entidades profissionais ligadas à publicidade devem fiscalizar maisas práticas imitativas”: 7,5 e mais uma indicação de um especialista.
A inibição de práticas publicitárias imitativas, na visão dos especialistas,
decorreria de uma postura dos próprios profissionais em adquirir uma
formação ética mais aprimorada e se empenhar em idéias inovadoras. A
intervenção legal ou corporativa parece não ser tão relevante, embora fosse
apontada como uma possibilidade construtiva. Os especialistas não
consideram o depósito de criações publicitárias em bancos de dados como
algo relevante para inibir a imitação de anúncios.
14. Comentários que julgue pertinente:
Apenas um especialista se manifestou; fez comentário no sentido de se
evidenciar casos de práticas imitativas na propaganda com o intuito de
despertar mais o senso ético e legal da profissão publicitária.
5. Comentários e considerações finais
A imitação publicitária é um tema amplo e heterogêneo, lida com muitas
variáveis qualitativas e valorativas que impedem uma sistematização
conclusiva.
Existe e afeta aspectos concorrenciais, autorais e consumeristas, o que
indica tratar-se de assunto que precisa melhor e mais estudado.
Indicadores importantes dessa relevância e complexidade foram retratados
pelas opiniões e posições dos especialistas entrevistados.
Gino Giacomini Filho
120
Consideraram que os anúncios publicitários são parecidos entre si,
notadamente nos setores de imóveis e varejo, avaliando tal assunto como
relevante. Para eles, a prática imitativa ilegal na publicidade afeta os
direitos intelectuais, direitos concorrencial e até os direitos dos
consumidores.
Os especialistas em publicidade entrevistados apontaram que a inter-
venção legal ou corporativa parece não ser tão relevante, embora fosse
apontada como uma possibilidade construtiva. Consideram que a for-
mação ética mais aprimorada e o empenho em idéias inovadoras são mais
relevantes para diminuir a imitação no setor. Ficaram divididos quanto
ao estabelecimento de uma caducidade para a reserva de direito autoral
para uma peça publicitária, porém em sua maioria considerou que, quanto
maior a extensão ou audiência de uma peça publicitária, maior deve ser
a reparação decorrente do dano.
As entrevistas com os quatro especialistas trouxe elementos específicos
para a abordagem da imitação publicitária. Reconhecem que um anúncio
não precisa ser 100% igual a outro para ser considerado uma imitação,
porém não indicaram um critério quantitativo para os casos em que essa
imitação é parcial.
Segundo eles, a semelhança entre anúncios colabora com a mesmice na
publicidade, contribui com a falta de diferenciação de produtos e marcas,
sinaliza que aquele anúncio não é criativo e revela desrespeito ao
consumidor.
Ficou marcante a preocupação deles com o impacto que a imitação
publicitária pode trazer ao consumidor. No anúncio mostrado como
exemplo, o fator que mais pesou na análise foi a possível confusão gerada
ao consumidor, ou seja, foram unânimes em ressaltar que a imitação
Imitação na Propaganda Comercial
121
dentre anúncios publicitários pode impactar direitos dos consumidores
ou interferir nas decisões de consumo, chegando em sua maioria a
recomendar que houvesse legislação mais apropriada nesse sentido.
12. Referências bibliográficas
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Imitação na Propaganda Comercial
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125
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade emum Novos Paradigma de Consumo
ALEXANDRE LUZZI LAS CASASWESLEY MOREIRA PINHEIRO
A evolução da pirataria no processo de consumo de produtos
A pirataria é uma forma mercadológica de cópia de produtos, que vai
contra aos interesses econômicos das empresas legalmente estabelecidas
e, em conformidade aos princípios jurídicos e tributários do país. É uma
prática ilegal, porém tem forte adesão de consumo no mundo, especial-
mente no Brasil – tornando-o um dos principais países afetados por esse
tipo de ilegalidade.
Podemos observar que a pirataria nasce a partir da revolução industrial.
As primeiras máquinas têxteis foram patenteadas na Inglaterra, porém
não demorou muito para que cópias dessas máquinas fossem fabricadas
nos Estados Unidos, sem o pagamento devido dos direitos patenteados
aos Ingleses. Mesmo dentro desse contexto não se pode afirmar que a
invenção da pirataria é norte-americana. Podemos então sugerir que a
pirataria nasce por motivos econômicos, e esses motivos ainda refletem
nos dias atuais: a carência de desenvolvimento de máquinas e produtos,
barateando os custos, dentre eles – o fiscal.
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
126
Lessig (2004) aponta que os principais setores da mídia de massa – filmes,
música, rádio e TV a cabo – tem ligação em sua origem com a pirataria.
• Filmes: Hollywood foi criada para que os criadores e diretores fugissem
para um Estado onde não houvesse o controle de patentes do inter-
ventor do cinema, Thomas Edison.
• Música: os direitos autorais não deixavam claro o que seria efetiva-
mente considerado como “apresentação pública” e, isso permitiu que
cantores reproduzissem músicas sem pagar os direitos autorais.
• Rádio: nos Estados Unidos quando uma estação de rádio tocava uma
música no ar, isso constitui uma “apresentação pública” do trabalho
do compositor, mas o artista ficava de fora desse ganho.
• TV à Cabo: Quando os empreendedores do cabo começaram a
fornecer às comunidades, muitos deles não pagavam às redes de TV
pelo conteúdo redistribuído.
Podemos perceber que a negação dos direitos autorais atravessa os séculos,
mas o marketing se firma como ferramenta aliada ao processo de pirataria
só nos anos 80 – a partir do momento em que algumas indústrias passam
a copiar ilegalmente modelos e logotipos de marcas famosas, proporcio-
nando ao consumidor, baixo custo – suprindo a elevada procura por
marcas famosas, cujo produto original tem alta precificação. Essa prática
tornou-se muito popular no Brasil e, passadas três décadas, ainda é uma
prática muito comum, fortalecida pelos comerciantes informais como
os camelôs. Apesar de frequentemente a pirataria ser relacionada dire-
tamente com o mercado informal, ou mercado negro, é possível encontrar
pequenas empresas que se apropriam da identidade visual de uma marca
conhecida para alavancar a sua própria marca.
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
127
Figura-1 – Logomarcas semelhantes.
A figura 1 ilustra a comparação entre duas identidades visuais: Armani
Exchance (ao lado esquerdo) do estilista Giorgio Armani e, a brasileira
Empório Alex (ao lado direito). Ambas trabalham com moda jovem e
suas interfaces visuais (logomarca, sites, banners) têm muita semelhança.
Não cabe nesse capítulo a discussão sobre plágio ou a intervenção jurídica
sobre a falsificação e a pirataria. Neste momento estamos observando as
similaridades da apropriação visual de uma marca em função da outra.
O Empório Alex usa da aproximação visual da sua marca com a da grife
italiana para causar um efeito de proximidade ao consumidor. Sob a lente
do marketing é possível compreender que o consumidor se sentirá mais
seguro com a segunda marca, em função da primeira. Pagará um preço
menor para ter um produto que necessariamente não se assemelha a
qualidade da versão copiada. Essa é uma prática comum e facilmente
reconhecida na rua ou na Internet.
É necessário levar em consideração que a pirataria está associada a eventos
ligados à cópia. Por exemplo, algumas das ferramentas que possibilitaram
a popularização da pirataria foram a criação dos gravadores de fita cassete
(K7) e os aparelhos de vídeo cassete (VHS). A partir do momento em
que a cópia tornou-se um hábito doméstico, foi fundamental para que o
consumidor assumisse a naturalidade de adquirir uma cópia, pois ele
assumia essa prática em casa, seja de uma fita K7 para um amigo ou uma
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
128
fita de VHS para um parente. Assim propagou-se a desses produtos piratas
na década de 80. O que não aconteceu com o disco de vinil (LP), pois
não havia dispositivos caseiros de cópia.
As pessoas aderem à compra de produtos copiados basicamente por três
motivos:
1 – Custo: preço muito baixo, quando comparado ao produto original.
2 – Comodidade: filmes, álbuns musicais, programas de computador,
recém lançados.
3 – Cultura: hábito de fazer rotineiramente cópias em casa e repassar para
amigos e parentes.
Esses três indicadores certamente proporcionaram uma forma de marke-
ting para o mercado da pirataria, pois por meio deles tornou-se sustentável
o mercado das falsificações. E são esses mesmos indicadores que pro-
porcionaram a popularidade da pirataria ao longo das décadas.
A pirataria teve a sua promoção impulsionada pela criação do CD e DVD.
Por meio de gravadores caseiros, em computadores domésticos, era pos-
sível fazer dezenas de cópias em uma velocidade muito superior ao pro-
cesso de cópia de K7 e VHS. Isso tornou a pirataria mais viral no meio
da mídia do entretenimento. Nesse mesmo período iniciava a avalanche
de cópias piratas de programas de computadores, incluindo o sistema ope-
racional da Microsoft – o Windows – que se tornou o sistema operacional
de computador doméstico e empresarial mais utilizado no mundo.
Até esse momento da história da pirataria é possível identificar como a
sua ligação com o consumidor se dá por meio do marketing. A cultura
da cópia caseira, o compartilhamento dessas cópias entre pessoas conhe-
cidas, e o entendimento que essa ação era para promover e não para
destruir a indústria, fizeram com que ao mesmo tempo, empresas de
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
129
softwares particulares crescessem e a indústria fonográfica encolhesse.
Ampliando a sua atuação de forma diversificada a pirataria se fez presente
não só nos produtos ligados à tecnologia digital, mas em todos os tipos
como esportivos, vestuários, acessórios, perfumes e, brinquedos.
O setor da indústria mais afetado na década de 90 foi o setor fonográfico.
A popularização dos computadores e a chegada da Internet em residências
possibilitaram o nascimento de um novo padrão de consumo, o do com-
partilhamento. Se esse valor já existia desde a década de 80 com as cópias
caseiras de K7 e VHS, ele foi ampliado de forma exponencial com a che-
gada da rede mundial de computadores. Ficou cada vez mais fácil adquirir
e compartilhar músicas. Não era mais necessário comprar um CD pirata
que custava três vezes menos do que o original, pois pela Internet, por meio
de arquivo eletrônico chamado MP3, não custaria nada. Apenas o valor do
tempo de acesso, que não era percebido pelo consumidor.
Sites de compartilhamento de arquivos como o Napster, criaram uma
rede mundial de pessoas que dividiam o seu acervo musical umas com as
outras. Isso pulverizou até mesmo o mercado de pirataria tradicional, a
barraquinha do camelô que vendia CD. Até mesmo esse indivíduo foi
prejudicado.
Naquele momento havia uma mudança no padrão de consumo de música,
percebido por poucas empresas, dentre elas a APPLE, que no início do
século XXI, no ápice da crise da pirataria digital de música, criou o iTunes,
uma loja virtual para compra de músicas, separadas ou na forma de álbum
digital. Havia um momento em que o marketing precisava entender a
mudança no padrão de consumo e como isso afetaria o processo de venda,
pois também afetava o processo tradicional de pirataria de CDs.
A tecnologia digital influenciou novos padrões de consumo e também
de pirataria. A Internet e as redes sociais (Orkut, Twitter, Youtube,
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
130
Facebook, entre outras) ampliaram as formas de divulgação e promoção.
O marketing está cada vez mais presente nessas ações promocionais das
cópias, incluindo aquelas que propositalmente nasceram como piratas
para promover um produto legal.
Os novos rumos da pirataria e, seus diversos produtos como música, fil-
mes, softwares, roupas, acessórios, remédios, tendem a caminhar junto
com a evolução da tecnologia. Em muitos casos o marketing torna-se um
agente pró e contra a pirataria, dependendo da situação, como veremos
nos tópicos seguintes.
O Marketing na indústria da pirataria
A pirataria inicialmente pode levar a crença de que o perfil dos consu-
midores dos produtos falsificados está ligado às classes sociais de baixa
renda, não obstante essa é uma visão equivocada. Há consumo de pro-
dutos piratas em praças como a Rua 25 de Março em São Paulo por
diversas classes sociais, da A à E. Nesse sentido, o que difere é a forma
como o consumidor se relaciona com o produto pirata.
A pirataria, mesmo com o prejuízo que ela causa, amplia o conhecimento
das marcas, assim há chances de um consumidor da classe C – que compra
uma bolsa falsificada – vir a comprar a versão original em uma loja esta-
belecida regularmente, mediante as facilidades de parcelamento e de cré-
dito existentes no mercado. Nesse sentido a pirataria pode ser vista como
um agente promotor da marca (KLINE, 2012). Não há comercial da Louis
Vuitton na TV aberta, porém as ruas servem como passarela para
consumidores de várias classes sociais conhecerem a marca. Um dia po-
dem vir a comprar o produto original.
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
131
É importante ressaltar que dentro do mercado de produtos piratas há uma
classificação de qualidade. São os produtos de primeira e segunda linha,
classificados pelos ambulantes e comerciantes informais. O mesmo
produto está presente em faixas diferentes de preço. O próprio
comerciante quando busca o produto de origem da China ou do Paraguai
acredita na qualidade daquilo que adquire para revender e, mesmo tendo
ciência de que o produto é uma falsificação, busca comprar a imitação
de primeira linha. Essa crença na qualidade é como um código de honra
entre os vendedores, que passam para o consumidor esse valor, fazendo-
o também acreditar que está comprando um produto de qualidade
comparável ao original (MACHADO, 2008).
As falsificações mais baratas, são mais simples, com qualidade inferior,
por isso as chamam de produtos de segunda linha, dentro do mercado
da pirataria. Produtos com melhor acabamento, mais próximos do
original, são mais caros, porém oferecem maior qualidade e durabilidade,
denominados primeira linha. O consumidor percebe esse valor, quando
a precificação não se impõe com relação ao custo-benefício, assim o
consumidor opta pelo mais caro, devido à suposta qualidade e, a
similaridade com o produto original.
Esse é o ponto central para a observação de marketing. Notar que mesmo
dentro da pirataria há segmentação e posicionamento. Observar o valor
agregado e a percepção do consumidor quanto a isso, e certamente poderá
aproximar o consumidor do produto original. Porém é um erro afirmar
que o comprador de produto pirata é um ex-comprador ou futuro
consumidor de produtos originais.
A percepção da proximidade do produto pirata com o original se dá
inicialmente pelo seu aspecto exterior por meio da reprodução da
embalagem, marca e, formatos do produto. É uma percepção individual
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
132
e, o que pode ser definido como legal ou ilegal no mercado, pode não
ser percebido pelo consumidor (TRINDADE, 2008). O que favorece a
pirataria é a possibilidade de vivenciar o prestígio de usufruir de uma
marca famosa, pagando baixo valor de precificação.
Diferentemente da pirataria de filmes ou de música, a pirataria de pro-
dutos como roupas, acessórios, e brinquedos, acontece por motivo de
status social. As marcas consumidas são famosas no mundo e, com alta
precificação. A pirataria nesse sentido torna-se uma alternativa para o con-
sumo de marcas caras. Isso não significa que somente os indivíduos de
baixa renda consomem o produto falsificado. Há distinção dos cenários
de consumo e o marketing precisa estar atento para esses fenômenos
sócio-culturais.
O indivíduo de classe com renda alta compra o produto pirata em dias e
horários alternativos, normalmente fora dos chamados momentos de
picos, como finais de semana e datas festivas. Isso para que seus pares não
o vejam comprando um produto ilegal (TRINDADE, 2008). O risco da
associação da ideia de consumir algo falso faz o indivíduo correr o risco
de ser repelido por seus pares sociais.
Uma pesquisa realizada por Trindade (2008) na cidade do Rio de Janeiro
– nas zonas Oeste e Sul – com consumidores de produtos piratas, apontou
comportamentos distintos sobre os consumidores e a sua posição social.
Indivíduos das classes A e B compravam produtos falsificados de primeira
linha com a finalidade de utilizá-los na academia, escola ou faculdade.
Em eventos mais sofisticados utilizavam produtos originais. Indivíduos
de classes de baixa renda consumiam as duas categorias de produtos pira-
tas, primeira e segunda linha, para dois momentos distintos: produtos
de primeira linha em ocasiões solenes e especiais e, os de segunda linha
no dia a dia.
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
133
Podemos observar que nesse contexto aplica-se o efeito trickle-down. O
indivíduo de classe de alta renda, que consome produtos originais man-
tém uma posição social garantida e, passa a transitar pelo universo das
falsificações sem que haja alto risco de rejeição social. As classes C e D,
com menos recursos financeiros, encontram na falsificação um meio de
aquisição de marcas caras, para poder se aproximar dos indivíduos de
classes de rendas mais altas (TRINDADE, 2008).
O marketing pode usufruir dessas percepções ligadas ao status social e
promover o uso dos produtos originais como forma de sustentabilidade
da posição na sociedade. A pirataria na perspectiva do consumo apresenta
elementos de comportamento para as estratégias de marketing das
empresas de produtos originais. Não adianta apenas esperar a ação efetiva
por meio dos órgãos governamentais no combate à pirataria. O marketing
pode e deve exercer a sua função no sentido de resgatar o consumidor
das barraquinhas de camelô, para os corredores dos shoppings. Mesmo
com as exorbitantes diferenças de preços é possível atacar a pirataria e,
para isso é preciso conhecer bem o cenário do mundo das falsificações.
É preciso entender o que efetivamente o consumidor busca e espera desses
produtos.
A pirataria de software
Possivelmente a primeira forma de pirataria digital mais conhecida pelo
consumidor é a de programas de computadores. Este tipo de pirataria
ocorre por meio de cópia, download na Internet, ou distribuição de
software com direitos autorais protegidos sem autorização do fabricante.
A pirataria de software teve a sua popularização junto com o crescimento
do uso de computadores domésticos. Nos anos 90 o sistema operacional
da Microsoft – Windows – foi o programa de computador mais pirateado
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
134
do mundo. Isso ocorreu pela necessidade de sistema operacional em todo
microcomputador, conhecido como PC, cuja venda do dispositivo físico
não contemplava o armazenamento de sistema operacional e pacotes de
programas como editores de textos, planilhas ou, banco de dados. O
único sistema operacional oferecido no mercado para a instalação em
computadores PC era o Windows, criando um monopólio do setor.
Sistemas operacionais gratuitos como o Linux eram rudimentares,
apresentavam alto grau de dificuldade de usabilidade e, requeria conheci-
mentos técnicos avançados, inviabilizando a utilização por parte de um
usuário doméstico comum. Como computador e programas eram ven-
didos separadamente, o usuário optava por comprar o componente físico
e, com a cumplicidade das lojas, instalavam irregularmente o sistema
operacional.
Esse foi um mercado que avançou muito, principalmente porque a pira-
taria era oferecida como um serviço de bonificação para o cliente. O clien-
te comprava e a loja instalava. Em muitos casos o consumidor nem tinha
noção de que estava comprando um computador com sistema operacional
pirata.
Muito próxima a realidade da pirataria de software é a de jogos eletrô-
nicos. Os jogos tanto para computadores, quanto para dispositivos pró-
prios como Xbox ou Playstation, sofreram a competição de cópias piratas,
devido à facilidade de reprodução e distribuição das falsificações. Para a
indústria de jogos eletrônicos esse foi um fator decisivo para impulsionar
o marketing de relacionamento, com o objetivo de ampliar o contato com
os jogadores/consumidores e torná-lo mais duradouro e profundo para
não perdê-lo para a pirataria (KRÜGER; MOSER, 2005).
Com relação aos problemas causados pela pirataria de software, Casali
et al. (2005) apontam quatro consequências:
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
135
1 – diminuição de pesquisa e desenvolvimento por parte da indústria;
2 – elevação dos preços dos softwares;
3 – perda de arrecadação de impostos;
4 – ausência de associação da pirataria com o crime.
O ponto central desse processo de popularização dos programas de com-
putadores piratas é o consumidor. Diferentemente de outros casos como
os de falsificação de roupas, perfumes ou acessórios, o consumidor de
programas piratas de computadores não tem noção exata se está ou não
adquirindo algo irregular.
Com relação à pirataria de software o consumidor apresenta algumas
características com relação a sua percepção do produto, que o leva a
comprar a versão falsificada.
– O produto mantém a qualidade técnica similar ao original, apesar de
não possuir suporte técnico;
– O preço é muito inferior ao do original;
– Facilidade na aquisição pela Internet;
– Ausência da percepção sobre punição;
– Não sabe diferenciar um programa original de um pirateado.
Para minimizar os impactos da pirataria no mercado de programas de
computadores, empresas como Microsoft e Adobe têm distribuído no
mercado versões mais simples de seus principais programas. O consu-
midor pode comprar uma versão básica e com o tempo migrar para uma
versão mais completa, ou adquirir os pacotes que contemplam vários pro-
gramas. São estratégias que visam minimizar os impactos da pirataria de
software e ampliar o consumo legal.
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
136
Os chamados softwares livres, ou programas gratuitos de computadores
como o Linux, por exemplo, evoluíram, e por meio de parcerias gover-
namentais têm ajudado a diminuir o preço para a população adquirir o
seu computador. Um caso interessante é do microcomputador Positivo.
Ele pode ser encontrado em lojas de departamentos e hipermercados com
preços populares, e crédito facilitado. Esse é um caminho que o marketing
pode auxiliar no combate à pirataria de softwares, promovendo parceria
com a indústria de computadores, facilitando a aquisição de programas
originais por funcionários e parentes de empresas regularizadas, que uti-
lizam softwares legais. Por meio do marketing é possível demonstrar para
os consumidores os benefícios da aquisição de um programa original.
Do mesmo modo é possível destacar os riscos que o indivíduo corre por
ter um programa pirata. Um dos maiores problemas do programa
pirateado é a falta de segurança. Muitas vezes o indivíduo efetua o
download pela Internet e instala outros programas para romper o “lacre
virtual” do software original. Normalmente esses programas, sem que o
usuário perceba, instalam vírus de computador e, alguns deles extraem
informações sigilosas como senhas e dados de contas bancárias, correndo
o risco de o usuário ser assaltado virtualmente. O lado negativo da pira-
taria de software pode e deve ser explorado nas campanhas de marketing
como fortalecimento dos produtos originais.
A pirataria na música e as implicações ao Marketing
A indústria fonográfica possivelmente é a que mais sofreu com a pirataria
no mundo ao logo das últimas décadas, pois nesse caso específico houve
uma mudança no padrão de consumo, com o apoio da rede mundial de
computadores. Até meados da década de 90 somente o CD pirata era o
problema da indústria da música no mundo, mas a Internet possibilitou
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
137
a criação de um novo formato de música, o MP3. Esse tipo de arquivo
proporcionou o compartilhamento de músicas por meio de sites de
armazenamento de arquivos. Uploads e downloads de MP3 mudaram o
padrão de consumo de música no mundo.
A velocidade com a qual se proliferavam os arquivos pirateados dificultou
qualquer tentativa de banir esse comportamento de consumo. No final
da década de 90 o Napster criou uma eficiente rede de distribuição musi-
cal. A inovação permitia a transferência ou download, de arquivos
musicais de um computador para outro. Esse movimento de compartilha-
mento dos arquivos de músicas popularizou a pirataria virtual (BARROS,
2008). Depois do Napster, muitos outros sistemas virtuais de compar-
tilhamento apareceram como KaZaa, eMule ou LimeWire, tornando
impossível impedir a quebra do paradigma de consumo da música. Para
o consumidor isso significou apenas comodidade, para indústria um re-
projeto.
Essa mudança no padrão de consumo possibilitou ao indivíduo obter a
aprovação de seus pares para esse tipo de comportamento. O individuo
não entende que o compartilhamento de músicas seja ilegal ou imoral, é
apenas um novo sistema de aquisição.
Enquanto a indústria tradicional da música continuou orientando o
consumo de CD e, batalhava na justiça para proibir a utilização se sistemas
de compartilhamento de arquivos pela Internet, a APPLE conseguiu
popularizar a sua loja virtual o iTunes, principal fonte de comércio de
música digital do mundo, nos dias atuais. O quadro 1 evidencia o impacto
da pirataria digital na indústria fonográfica nos últimos anos.
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
138
Quadro 1: Certificação das vendas de CDs Nacionais
Antes de 01 de jan/2004 Até de dez/2005
Ouro 100.000 Ouro 50.000
Platina 250.000 Platina 125.000
Platina Duplo 500.000 Platina Duplo 250.000
Platina Triplo 750.000 Platina Triplo 375.000
Diamante 1.000.000 Diamante 500.000
Até 31 de dez/2009 A partir de 01 de jan/2010
Ouro 50.000 Ouro 40.000
Platina 100.000 Platina 80.000
Platina Duplo 200.000 Platina Duplo 160.000
Platina Triplo 300.000 Platina Triplo 240.000
Diamante 500.000 Diamante 300.000
Fonte: Associação Brasileira dos Produtores de Disco (ABPD)
O quadro 1 representa o impacto da pirataria na indústria fonográfica
tradicional entre os anos de 2004 e 2010. Em menos de uma década a
quantidade necessária para certificar um CD como ouro, platina ou
diamante, caiu em média 70%. Ou seja, atualmente basta vender um
terço da quantia necessária de discos de 2004 na categoria diamante para
obter a mesma certificação hoje. Essa revisão na métrica de certificação
de vendas pode ser alterada nos próximos anos, diminuindo ainda mais
a quantidade mínima necessária para obter algum grau de certificação.
Para minimizar o impacto na queda das vendas de CDs podemos pensar
em um marketing mais cuidadoso e segmentado, com estratégia de
divulgação de nichos. As pessoas de alguns segmentos são naturalmente
propensas a consumir CDs compatíveis ao seu nicho, porém essa
segmentação exigiria um departamento de marketing formado por
profissionais altamente especializados no tipo de música relacionado ao
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
139
público consumidor (BARROS, 2008). É uma medida paliativa, que
dificilmente se sustenta ao longo dos anos.
Na realidade é necessário pensar na mudança do mercado. Atualmente
os álbuns musicais são lançados com a função de promover shows. Como
as vendas são cada vez mais baixas em função da pirataria digital, o
mercado de entretenimento do showbizz passou a ser o foco das estratégias
dos cantores, bandas e afins. Assim o marketing caminha nesse sentido.
A questão da pirataria na música não é pura e simplesmente de âmbito
jurídico, mas de padrão cultural. As pessoas entendem que compartilhar
música não é crime. Elas estão até dispostas a comprar uma música virtual
pelo iTunes, mas não na mesma proporção de décadas atrás. Talvez
compre por lealdade ao artista, mas o que ela simplesmente quer ouvir
despretensiosamente buscará por meio dos recursos gratuitos da Internet.
Então o caminho do marketing no segmento de música é promover a
canção para fortalecer as ações de apresentação em festivais e turnês –
regional, nacional ou mundial. Parcerias com outras marcas e empresas
também são bem-vindas.
Livro Digital: um novo paradigma de consumo?
A cópia impressa ou digital sem a devida autorização do autor ou de seu
representante é crime, porém não é de hoje que a cópia de livros é um
problema para as editoras, principalmente no meio acadêmico.
Mais uma vez a Internet proporcionou um aumento na pirataria. As
cópias digitalizadas de muitos livros são facilmente encontradas pela rede
mundial de computadores. Em 2005 para combater a pirataria de livros
foi criada a Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR), cujo
primeiro acordo com as copiadoras foi estabelecer a permissão da
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
140
reprodução de 10% do conteúdo de cada obra. De acordo com a ABDR
o mercado editorial perde mais de um bilhão de Reais por ano no Brasil,
contabilizando bilhões de cópias ilegais, principalmente pelos estudantes
do ensino superior (MOURA, 2011). Ainda segundo a ABRD 30% do
material pirateado são acessados pela internet.
O mercado de publicações de livros apresenta um tipo de pirataria muito
próximo da pirataria de música. De modo semelhante ao que aconteceu
com as vendas de músicas digitais, o mercado de livros tende também a
fragmentar os seus conteúdos. Para incentivar o consumo a estratégia de
marketing foi concebida em função de atrair o consumidor para a compra
de partes de livros, somente as quais o interessam. Isso faz com que o
consumo seja segmentado e amplie as vendas online. As editoras têm
ampliados os investimentos em livros customizados (MOURA, 2011).
Algumas Instituições Privadas de Ensino Superior têm aderido a esse novo
cenário, incentivando a compra de capítulos de livros. Além de baratear
o preço de uma obra, amplia o consumo, pois o estudante pode comprar
10 capítulos de livros diferentes, de obras as quais nem compraria se não
fosse por essa perspectiva.
Essa é uma alternativa muito semelhante à estratégia da Apple com o
iTunes. De forma análoga às mudanças no padrão de consumo de música
digital é possível identificar que o consumo de livro segue o mesmo
caminho. É preciso também levar em consideração que as novas gerações
aprenderam a ler por meio de dispositivos eletrônicos, logo a leitura
impressa não tem mais tanta importância na cadeia de valores dos jovens.
Isso significa que a leitura tende a ser cada vez mais virtual, por meio de
tablets, computadores, celulares e aparelhos de TV. É um novo padrão
de consumo. Ainda não é tão radical quanto o caso da música, mas é
crescente e dificilmente as editoras conseguirão reverter esse processo.
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
141
A alternativa da customização de obras deve inibir o crescimento da
pirataria de livros técnicos e acadêmicos, pois o estudante opta pela sua
necessidade dentro da sua possibilidade econômica. O marketing tem
dentro dessa alternativa um grande aliado para as ações de comunicação
e promoção: volume de conteúdo mais objetivo e preço mais baixo.
Essa mudança no padrão de consumo de livros afeta também os autores
das publicações. Não será mais preciso escrever capítulos de livros apenas
para atingir um número adequado de páginas para terminar uma obra.
Livro do tipo “organizado” que reúne uma série de autores, em forma
de artigos, passa a ser totalmente fragmentado para a venda online,
possibilitando ao consumidor a seleção da parte que mais o interessa.
É uma guerra que não está perdida, mas é necessário o entendimento da
mudança na forma de aquisição e consumo e, as editoras que não se
adequarem a esses novos padrões, certamente terão um destino muito
próximo ao da Kodak.
A indústria farmacêutica e os remédios falsificados
Possivelmente essa é a modalidade que oferece maior risco para a
população, a pirataria de remédios. São cada vez mais freqüentes as
notícias de roubo de cargas, roubo dentro de hospitais e, vendas
clandestinas de medicamentos. A pirataria cresce no mercado brasileiro
e a falta de informação adequada e a facilidade de compra pela Internet
são razões para esse crescimento.
A Internet facilitou as vendas de medicamentos controlados. Essa
modalidade de compra fácil movimenta milhões de reais. Produtos
originais contrabandeados e falsificados se misturam nesse mercado. Por
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
142
mais fácil que seja a aquisição, o cliente não tem garantias da procedência
e da qualidade. Isso o torna refém de produtos que podem até levá-lo à
morte. Essa é a brecha que a falsificação e a pirataria proporcionam e, o
ataque do marketing é fundamental para inibir o comércio ilegal.
Campanhas de conscientização do alto risco que esses produtos têm em
conseqüência negativa à saúde devem ser exploradas. Mesmo para o
indivíduo que compra o produto de procedência desconhecida por não
ter uma receita médica, precisa ter a consciência de que sua vida está em
risco.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) informa que os
produtos mais pirateados e contrabandeados são aqueles que possuem
maior valor agregado e consequentemente são mais caros, além dos
remédios para a disfunção erétil (MACHADO, 2011; Valor Econômico,
2012). A fama Viagra alavancou as vendas desse tipo de medicamento
contrabandeado ou falsificado, por motivos econômicos e culturais. Os
consumidores de remédios de disfunção erétil estão em faixa-etária
variada, de jovens de 18 anos a senhores de 80. Vale ressaltar que muitos
dos consumidores adquirem o produto irregular pela a facilidade de
compra sem receita médica.
O desafio do marketing ao combate específico dessa modalidade de
pirataria está ligado às ações da indústria farmacêutica em prol de
conscientização dos males que o remédio pirateado pode causar; o esforço
com relação as organizações médicas como CRM em movimentos para
inibir esse tipo de consumo, por meio de campanhas; e por meio do
Estado, que deve agir com mais freqüência nas campanhas de conscien-
tização dos riscos desse consumo. A principal característica que o
marketing precisa observar nesse cenário é que o consumo se dá por conta
da facilidade de aquisição sem a formalidade da receita médica. O
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
143
consumidor busca essa comodidade, esquece os riscos, seja por motivo
de automedicação, indicação por pessoa de seu círculo social, ou mesmo
por fantasia, como é o caso dos remédios de disfunção erétil, consumido
por muitos jovens que não possuem deficiência em sua capacidade sexual.
Outros vilões que movimentam esse mercado ilegal são os emagrecedores
e anabolizantes. O Conselho Nacional de Combate à Pirataria (CNCP)
pontuou que esses produtos são encontrados em locais irregulares, como
feiras, camelôs e internet, mas também podem ser encontrados em
farmácias, drogarias e lojas. Para sensibilizar a população com relação ao
risco que ela corre consumindo esses produtos de forma irregular, o
governo federal por meio da ANVISA criou em 2009 a campanha
“Medicamento verdadeiro” (Valor Econômico, 2012).
Deve haver uma sinergia entre a indústria farmacêutica e o poder público
em prol de campanhas intensivas de conscientização do consumo regular
de medicamentos. O marketing deve contribuir com a formatação dessas
campanhas, com pesquisas junto ao público consumidor para entender
as suas necessidades e, estudar ações que visem baratear os produtos e
ampliar as facilidades de vendas regulares em estabelecimentos legais.
Pirataria um mal necessário
A distribuição ilegal de cópias de produtos, programas de computadores,
filmes e músicas, causa prejuízo para a indústria formal, porém há casos
em que a pirataria fortalece as vendas de um produto e o torna um sucesso.
Lessig (2004, p.59) aponta que “muitas formas de pirataria são úteis e
produtivas, seja para produzirem conteúdo novo ou para criarem novas
formas de negócios. Nada na nossa tradição ou em qualquer outra jamais
negou toda a pirataria nesse sentido da palavra”.
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
144
O primeiro exemplo clássico é o do sistema operacional Windows da
Microsoft. Ele foi pirateado no mundo inteiro, porém isso o tornou o
principal programa de computador utilizado por pessoas, pequenas,
micro e grandes empresas. A pirataria de software possibilitou a empresa
de Bill Gates à consolidação como monopólio de sistema operacional para
microcomputador PC, durante duas décadas. Tentativas de emplacar sis-
temas operacionais gratuitos perdiam força devido a dependência cada
vez maior do indivíduo ao programa da Microsoft. Com o seu posicio-
namento definido e consolidado a empresa então passa a combater a
pirataria, como forma de oficializar um mercado que já era dela. Seus
sistemas, servidores e programas tiveram na pirataria uma alavanca para
a sua consolidação. “Quando os chineses ‘pirateiam’ o Windows, isso
torna a China dependente da Microsoft. A Microsoft perde o valor do
software tomado. Mas ele ganha usuários que estarão acostumados a
viverem no mundo da Microsoft” (LESSIG, 2004, p.59).
O filme Tropa de Elite é outro exemplo de produto que foi beneficiado
diretamente com a pirataria. O filme tinha previsão de lançamento nas
salas de cinema em novembro de 2007, mas foi foco da pirataria meses
antes da sua estreia. A cópia ilegal rapidamente se espalhou pelas bancas
de camelô pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e outras muitas
cidades, e pela Internet em diversos sites de download (TORRES; SARAIVA;
PAZ, 2008).
O que poderia ser uma catástrofe tornando-o filme conhecido e desgas-
tado em sua estreia revelou-se uma potente arma de promoção. A distri-
buição ilegal não afetou o desempenho do filme, pelo contrário, tornou
um dos filmes mais assistidos do ano, superando grandes produções de
Hollywood. O marketing promocional do filme se deu por conta da dis-
tribuição ilegal e toda a repercussão que teve entre as pessoas que tiveram
acesso a essas cópias (TORRES; SARAIVA; PAZ, 2008).
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
145
O compartilhamento pela Internet é uma forma que proporciona a livre
circulação de informação, porém a indústria cultural entende que a rede
mundial de computadores ajuda apenas a promover a pirataria.
É preciso observar as oportunidades dentro do conceito de distribuição
da pirataria em função de uma promoção mais ampla, com menos custos
e com apelo popular garantido. Nessa linha é possível apontar para os
supostos “vazamentos” de músicas pouco antes do lançamento oficial de
um álbum. A cantora Madonna utiliza esse artifício desde 2000. No
período próximo ao lançamento de um álbum, inesperadamente algumas
músicas aparecem na Internet. Com isso as pessoas conhecem o trabalho
e dão um indicativo se será ou não, aceito no mercado consumidor. Se a
resposta for negativa, ou seja, houver rejeição por parte do público, então
haverá tempo para mudanças na edição das canções e nas estratégias de
marketing para a divulgação. O maior resultado dessas ações pode ser visto
pelo fato de seus últimos 4 álbuns terem estreado como número um em
vendas, já no primeiro dia. Em seu último álbum MDNA (2012) foi
utilizado mais uma vez esse recurso, possibilitando que as pessoas
conhecessem meses antes o seu novo trabalho e assim iniciassem um buzz
marketing pelas redes sociais na Internet. Com isso o álbum estreou em
primeiro lugar de vendas em mais de 40 países, incluindo os principais
mercados consumidores como Estados Unidos, Japão e Inglaterra.
É possível perceber que há algumas ações de marketing que são travestidas
de pirataria e ações de pirataria que acabam beneficiando o marketing.
Assim a observação dos rumos que o mercado consumidor toma com
relação a utilização dos mecanismos de distribuição de arquivos, prin-
cipalmente pela Internet, pode ser aliada das estratégias de marketing.
Isso não significa que a pirataria deve ser encorajada.
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
146
A pirataria nas redes sociais
A popularização da Internet e a evolução das ferramentas digitais levaram
o indivíduo para um tipo de vida paralela, onde tudo é possível: estudar,
trabalhar, fazer compras e, se relacionar. Com a população cada vez mais
conectada fatalmente nichos de contatos e relacionamentos seriam cria-
dos. E assim foi. Desde 2004 com o surgimento da primeira rede de rela-
cionamento efetivamente popular no mundo, o Orkut, a forma com a
qual estabelecemos o nosso elo na sociedade virtual tem se intensificado.
Milhões de pessoas conectadas por meio de páginas da Internet, nas for-
mas de Blogs, microblogs e, sites de relacionamentos. Com uma
população cada vez mais frequente e atuante na Internet, o avanço da
pirataria digital seria inevitável. E foi.
Todas as ferramentas criadas para o compartilhamento de as mídias sociais
fomentaram o aumento do consumo dos produtos piratas, livros,
softwares, músicas, filmes entre outros, formando assim a pirataria digital
(CASALI, 2005).
As ferramentas mais conhecidas de proliferação da pirataria pela Internet
são:
Sites de compartilhamento: são páginas na Internet que disponibilizam
acesso em servidores para que o usuário faça download e upload. Um dos
sites mais conhecidos de compartilhamento de arquivos é o MegaUpload,
que foi fechado pelo governo dos Estados Unidos, por meio da polêmica
lei anti-pirataria conhecida como SOPA. Porém ainda há muitos sites
semelhantes como o 4shared e RapidShare espalhados pelo mundo, prin-
cipalmente em países como a China. É por meio desse tipo de ferramenta
que são armazenados e descarregados, programas de computadores, mú-
sicas em formato MP3 e filmes.
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
147
Blogs: é uma página pessoal, fácil de ser utilizada e frequentemente usada
com fins de promover assuntos de nicho, como Música, Cinema e
Informática. Por meio dos blogs a proliferação de links de arquivos arma-
zenados nos sites de compartilhamento toma proporções exponenciais.
Mesmo com o fechamento de um blog, nada impede que dez outros no
mesmo segmento, com as mesmas intenções de promover a pirataria
sejam criados, quase que em tempo real. Os tipos mais comuns de pro-
moção a pirataria por meio de blogs são música, filmes e programas de
computadores.
Sistemas de Compartilhamento: diferentemente dos sites de compar-
tilhamento, essa ferramenta é um programa instalado no computador do
usuário ao qual compartilha arquivos com todos os outros usuários do
mesmo sistema. Os arquivos ficam localmente no computador de cada
usuário, diferentemente dos sites de compartilhamento que armazenam
os arquivos em servidores. O Napster, a famosa ferramenta de compar-
tilhamento de arquivos foi a pioneira na distribuição de arquivos piratea-
dos e uma das principais agentes pela mudança dos rumos que a indústria
fonográfica sofreu ao longo deste século. Atualmente há ferramentas
conhecidas como o Bittorrent e Limeware.
Mídias sociais: Twitter, Orkut, Facebook, entre outras, são as mídias
digitais que mais agravam a distribuição de links para downloads de arqui-
vos piratas (músicas, filmes ou softwares). É também por meio dessas mí-
dias que outros agentes piratas divulgam seus produtos falsificados (roupas,
assessórios, brinquedos) para a venda online, inclusive medicamentos.
O maior problema da proliferação da pirataria por meio das redes sociais
na Internet é a forma como o indivíduo entende o produto que está con-
sumindo. Raramente ele entende como pirata, nocivo, ilegal ou imoral.
É uma oportunidade rápida e barata, apenas.
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
148
Em um estudo feito por pesquisadores da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG) sobre o comportamento dos consumidores de produtos
piratas, foi constatado que “comparando a pirataria virtual com a eventual
perda de vidas, o jovem reduz o dano de suas ações” (SAUERBRONN et
al., 2010, p.18). Com relação à pirataria de música, por exemplo “os
jovens minimizam o impacto econômico de suas ações baseados no fato
de que artistas consagrados já acumularam fortunas e não sofrerão
impacto se alguém baixar o CD na internet (‘A Madonna já está muito
rica. Além disso, ela ganha dinheiro mesmo é no show! Ela já nem trata mais
com gravadora, trata com firma de shows.’). Esse pensamento reforça a ideia
de que o padrão de consumo mudou, a forma com a qual o consumidor
se relaciona com o consumo não é mais a mesma, então de nada adianta
pensar que as redes sociais são vilãs, que promovem a pirataria. Apesar
de ser um canal de comunicação e promoção, é por meio do ser humano
e do seu entendimento de certo e errado que a pirataria avança pela
Internet. E mais uma vez cabe ao marketing um esforço de entendimento
sobre como obter oportunidades dentro dessas mudanças de consumo.
Marketing contra a pirataria
A prefeitura de São Paulo informou que no período entre dezembro de
2010 e março de 2012 foram apreendidos mais de 58 milhões de produtos
piratas. Em 2011 a Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro
(Fecomércio-RJ) apresentou uma pesquisa nacional, feita em mil domi-
cílios de 70 cidades, em nove regiões metropolitanas. O objetivo era des-
vendar o perfil do consumidor de produto pirata no Brasil. Vejamos
alguns dados dessa pesquisa:
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
149
• 52% dos entrevistados compraram algum produto pirata em 2011.
• 96% dos entrevistados que compraram o fizeram por causa do preço.
• 57% dos consumidores das classes A/B compraram algum tipo de
produto pirata, contra 52% na classe C e 44% nas classes D e E.
• 80% dos entrevistados acreditam que a pirataria prejudica artistas e
fabricantes.
A pirataria se apresenta em um primeiro momento como uma concor-
rente tradicional de mercado, pois seus produtos falsificados disputarão
consumidores com as empresas donas das patentes das marcas originais
(RYNGELBLUM, 2005). Mesmo com a aparente vantagem do posiciona-
mento dos produtos piratas enquanto preço é possível ter as ferramentas
de marketing como apoio aos esforços de combate à pirataria. Vimos que
há questões sociais e culturais envolvidas no processo de compra de pro-
dutos de marcas famosas, e fazer um esforço para que o cliente perceba o
valor agregado de um produto original pode pesar na decisão na hora da
compra.
É possível que haja um desânimo com relação à concorrência entre pro-
duto pirata e produto original, por questões econômicas ligadas à re-
muneração de direito autoral, carga tributária, ou mesmo estrutura admi-
nistrativa da empresa. Elementos que não incidem sobre o mercado das
cópias. Para que a indústria possa concorrer com a pirataria é preciso pen-
sar em ações focadas e posicionadas nos diversos tipos de pirataria. Cada
mercado pirateado exigirá uma forma específica de atuação do marketing.
Na música, por exemplo, a estratégia é focar nas apresentações ao vivo,
nas parcerias com marcas; aos produtos de marcas famosas, é preciso tra-
balhar a noção de valor agregado ao cliente como, qualidade, bom aten-
dimento, formas de parcelamento, garantias e afins. Não há receita
estratégica, mas há necessidade de um esforço para atuar contra a pirataria
Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro
150
de modo a encará-la como um problema nicho, não como um problema
globalizado. Os diversos tipos de piratarias abordados neste capítulo
mostram o quanto segmentado o mercado ilegal.
A concorrência desleal dificulta a estratégia empresarial, pois a situação
torna-se mais complexa. Não basta uma análise competitiva tradicional
para resolver os problemas com a pirataria quando o produto concorre
com a sua cópia. O consumidor precisa conhecer as diferenças entre um
produto e outro. Há também a necessidade incondicional de políticas
de preços mais flexíveis e de reformas tributárias eficientes.
Aproximação de preços, pelo menos para os títulos e modelos mais
visados, a veiculação das possíveis diferenças de desempenho, de
rentabilidade, de durabilidade e outras características de qualidade
que um produto contrafeito deixasse de apresentar, a promoção
de serviços complementares ao usuário-consumidor no pós-venda,
que pudessem atrair por seu apelo, são algumas ações que via-de-
regra não são experimentadas (RYNGELBLUM, p. 13, 2005).
Um bom exemplo de combate a pirataria mediante aos novos padrões
de consumo é o caso dos serviços online para a distribuição de filmes.
Empresas como Netflix, Netmovies, Sky e Apple disponibilizam
ferramentas para que o consumidor possa assistir seus filmes preferidos
por meio de aparelhos de TV, celular ou computador, utilizando a
Internet. Com preços competitivos essa estratégia de ataque à pirataria
de DVD de filme, apresentações musicais e documentários vem
conquistando rapidamente a adesão do consumidor, que não quer
comprar o filme em forma física. Assim ele evita de fazer download
ilegalmente e volta para o consumo formal. As empresas têm percebido
uma oportunidade viável nesse sentido. Outras empresas que aderiram
a essa perspectiva foi o comércio eletrônico Submarino e o portal Terra.
O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...
151
O marketing pode contribuir em ações de combate ou estratégias de
adaptação quando um padrão de consumo tenha se estabelecido,
mudando as regras de aquisição de um produto, não obstante é
importante ter a consciência que essas medidas são pontuais e visam
minimizar os impactos nocivos da pirataria no mercado formal. Não há
como pensar a extinção da pirataria sem políticas públicas e reforma
tributária, porém enquanto o Estado não consegue atacar de forma
eficiente e definitiva, cabe ao marketing fazer a sua parte.
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155
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumodos Falsos Produtos1
THAÍS NOVAIS DE CURTIS
“Se você não tem, falsifique! É baixa demais?Ponha um salto bem alto, mas pratique o passo!”
VICTORIA BECKHAM
“O inimigo do autor não é a pirataria, é a obscuridade”TIM O’REILLY
Em uma matéria apresentada pela televisão brasileira, em 15/08/2010,
sobre o prejuízo que os produtos falsificados trazem ao bolso do consu-
midor, revelando esquemas de pirataria desde fábricas até camelôs, é
curioso notar o discurso do ambulante para convencer um consumidor
sobre a originalidade de seu produto. Ele transforma uma furadeira sem
marca em uma das líderes de mercado:
“É original, mas não da Bosch. A máquina é original, qualidade
boa. Ela é furadeira e parafusadeira”, diz o vendedor. “Eu tenho
o selinho aqui, dá pra colocar o selinho nela”, continua ele. “Você
1. Trabalho originalmente apresentado apresentado no DT 2 – Publicidade e
Propaganda do XVI Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste realizadode 12 a 14 de maio de 2011.
Thaís Novais de Curtis
156
pode levar e colocar lá. Vem tudo branco e é só colocar nela aí”,
concluiu.
Esse é um cenário cada vez mais comum no cotidiano dos mercados de
produtos falsificados. Por um lado, vendedores de produtos piratas que
desejam convencer seu público sobre as qualidades daquilo que estão ven-
dendo. Por outro, consumidores ávidos por satisfazer seus desejos, na
direção que a publicidade sempre se propôs, alimentando-os com as mais
diversas promessas do mundo do marketing.
De forma resumida, buscaremos explicitar como a falsificação leva
consigo o emblema da nova classe média, apresentando-se não somente
como comportamento social, mas também como uma força social, sendo
que alguns estudiosos já consideram a falsificação e sua comercialização
como uma estratégia de marketing.
Uma primeira linha de raciocínio é buscar superar a falsa dicotomia entre
o consumo do que é necessário e o consumo de supérfluos. Falsa dico-
tomia porque jamais saberemos ao certo onde passa a linha divisória entre
uma coisa e outra. As necessidades são muitas, mas são sobretudo
diferentes. O que é necessário para um, nem sempre o é para outro. Mais
ainda, o que é definido como necessário por uma cultura, pode ser
simplesmente supérfluo em outra. Basta pensar na cultura dos monges
tibetanos para verificar que a meditação é tão necessária quanto a alimen-
tação, sendo que a quase totalidade do que os ocidentais consomem não
seria mais que supérfluo para eles. Mesmo quando se fala em necessidades
básicas, das quais ninguém, supostamente, poderia abrir mão, vê-se o
quanto elas diferem de uma cultura a outra. O que é supérfluo, portanto,
varia na mesma proporção da ideia que se faz do que é necessário para
cada um. Tais conceitos parecem decorrer, portanto, do campo da
cultura, visto que cada cultura desenha os hábitos e costumes dos
indivíduos.
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos
157
Isso nos leva a uma segunda linha de raciocínio, que busca entender o
consumo não apenas no interior dessa dicotomia entre o necessário e o
supérfluo, mas no campo de outra dinâmica, onde se vincula a questão
da aquisição de bens com as várias estratégias de produção de desejo. De
fato, a discussão sobre o que é necessário ou supérfluo para a vida de
alguém decorre diretamente das ações de aquisição de bens, da dificuldade
ou facilidade em se adquirir alguma coisa, do preço e esforço que se deve
fazer para isso, e, portanto se vale ou não a pena tal sacrifício ou vaidade.
Mas quando se pensa do lado da produção do desejo, percebe-se que os
indivíduos encontram-se dentro de uma rede mais complexa, que envolve
uma série de agentes que suscitam, instigam, fomentam seus desejos.
Aqui, o consumo deixa de ser entendido simplesmente como um ato de
consumir, e passa a ser visto como aquilo mesmo que é produzido, inven-
tado dentro de cada um.
Essa perspectiva se tornou mais clara desde que nos entendemos no inte-
rior de uma sociedade na qual a produção de bens materiais vem cedendo
lugar a uma produção de bens cada vez mais imateriais. O trabalho no
mundo contemporâneo produz bens imateriais, e é esse imaterial que é
consumido, que é desejado, e não apenas o produto físico que lhe serve
de suporte. Por isso o produto falso também é desejado, já que não é o
produto físico que se deseja, mas sua imaterialidade.
Consumo no olhar da economia
Juliet Schor, em seu livro Born to Buy (2004), nos mostra que o olhar da
economia sobre o consumo sempre esteve apoiado nos estudos sobre a
parte de renda e riqueza que é gasta pelos consumidores. Mas a natureza
mesma do consumo, o que motiva os indivíduos a consumir, o sentido
cultural desse ato, como as pessoas decidem quais produtos consumir, o
Thaís Novais de Curtis
158
papel da publicidade e do marketing, a compra por impulso e o compor-
tamento de consumo compulsivo são algumas das questões que parecem
ausentes dos estudos de economia. Ou seja, os estudos sobre o rendimento
dos indivíduos pareceu satisfazer os economistas mais do que a forma
como aplicam esse rendimento, a maneira como decidem consumir.
Outro aspecto que parece ter distanciado os economistas de tais análises
é o fato do consumo ser entendido como exercido por agentes indepen-
dentes, sem a influência de outros indivíduos, portanto sem uma visão
de interdependência nas decisões individuais. As preferências de cada um
seriam independentes daquelas de outros atores. Ou seja, não há um papel
social inscrito nas decisões individuais de consumo, segundo os econo-
mistas clássicos. Outro aspecto é a crença na existência de qualidades
inerentes a produtos e serviços, e como isso atende a necessidades práticas.
Disso decorre a visão utilitarista do consumo, sem referência às qualidades
culturais, simbólicas e sociais daquilo que se consome.
Mas o economista John Kenneth Galbraith parece destoar dessas posi-
ções, e isso fica claro em seu livro The Affluent Society (1958). Nesse texto,
Galbraith levanta três aspectos que definiriam um novo raciocínio sobre
o consumo: a) a produção cria o desejo de consumo; b) a relação entre
consumo e utilidade torna-se fraca e até mesmo negativa; c) as pressões
estruturais para o aumento de consumo privado acabam desalojando a
provisão de bens públicos. Em relação ao primeiro aspecto, fica claro que
Galbraith ataca a ideia de que as empresas têm melhor desempenho con-
forme entendam como satisfazer o desejo dos consumidores. Ele reverte
essa posição, entendendo que a sociedade já teria chegado num ponto
em que suas necessidades básicas estariam relativamente satisfeitas, e que
o aumento do consumo agora se faz pela criação do desejo de consumo
via o esforço de ações de venda e marketing das corporações. Carros mais
elegantes, roupas mais sofisticadas, entretenimentos mais elaborados, são
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos
159
apenas alguns dentre os vários exemplos de que o consumo está cada vez
mais ligado a valores culturais que, por sua vez, são diretamente produ-
zidos pelas ações de publicidade das empresas. Então a produção não se
limita mais, ou não pode mais ser entendida como uma fonte que supre
as necessidades de bem estar dos indivíduos. A relação entre consumo e
bem-estar parece ter sido quebrada.
Mas nos anosidor não leva em conta sua incapacidade de escapar do
consumo como modo de vida. Quando Bourdieu, por exemplo, com seu
conceito de capital cultural aponta que não há consumo de nenhum
produto, serviço ou atividade que não esteja implicado num código de
classe social, que caracteriza justamente o regime possível de consumo
de cada indivíduo, ele reforça que não se pode escapar das posições de
sua classe social do mesmo modo que não se pode recusar ser parte do
sistema de consumo.
Consumo e trabalho imaterial
Vamos explicar melhor o que vem a ser o trabalho imaterial.
Num trabalho de pesquisa intitulado Le Bassin de Travail Immatériel dans
la Métropole Parisienne,2 desenvolvido no início dos anos 1990 e publi-
cado em 1996 por Toni Negri, Maurizio Lazzarato e Antonella Corsani,
consolida-se um conjunto significativo de conceitos sobre o trabalho
imaterial. Nessa pesquisa, ainda no começo desse debate nos anos de
1990, os autores afirmam que o trabalho imaterial seria aquele que pro-
duz, por exemplo, os programas de televisão, a moda, a transformação
das cidades, as mercadorias que consumimos, os jornais e revistas que
lemos. Mais fundamentalmente, ele produz a maneira de ver e sentir, de
morar, de vestir, de pensar e de consumir das pessoas. Ele produz as for-
Thaís Novais de Curtis
160
mas de vida e as subjetividades de nossas sociedades. Essa produção de
formas de vida e de subjetividade se tornaram os novos setores de
acumulação capitalista:
“A produção de subjetividade deve se tornar então, simultanea-
mente, o conteúdo do trabalho e o resultado da atividade do traba-
lho imaterial. A definição do trabalho imaterial, como trabalho
que produz o conteúdo cultural e informacional da mercadoria,
começa, portanto a se expressar numa nova articulação, que tem
como pivô ‘a produção de subjetividade’. Há, portanto uma
relação específica entre o conteúdo do trabalho imaterial e o
conteúdo do produto imaterial.” (COSANI, 1996, p. 42).
Negri, Lazzarato e Corsani (1996, p.82) entendem que o trabalho ima-
terial se encontra no cruzamento de uma nova relação produção/consu-
mo, do qual ele é a interface. O trabalho imaterial ativaria e reorganizaria
a relação produção/consumo, já que ele dá forma às necessidades, ao
imaginário, aos gostos do consumidor, ele os materializa, e esses produtos
tornam-se por sua vez produtores de necessidades, de imaginários, de
gostos. Os autores notam que não se trata aqui de necessidades fisioló-
gicas, mas “de gostos (moda), de operações intelectuais (produção de soft-
wares), de maneiras de ver (as imagens), de viver (transformação do terri-
tório), de pensar (jornalismo), de morar (a arquitetura), etc.” (p. 82-83).
A ideia de ‘consumo pelo consumo’ teria então se tornado o motor da
nova produção do ‘excesso’ capitalista. Seria pelo consumo que se produ-
ziria o próprio consumo, sua própria expansão. É consumindo o imaterial,
que simbolizam as mais variadas formas de vida, que se alimenta a necessi-
2. Corsani A., Lazzarato M., Negri A. Le bassin de travail immatériel (BTI) dans lamétropole parisienne. L’Harmattan, Paris, 1996.
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos
161
dade de se consumir mais, e portanto sua produção. O ‘consumo pelo
consumo’ cria uma reestruturação/inovação contínua dos produtos, das
profissões e das formas de organização que parecem desde então se
autoproduzir. O produto, o consumidor e o trabalho imaterial estão con-
tinuamente em vias de se fazer, evoluem sem cessar.
Essa discussão sobre a produção do desejo (ou da subjetividade) na socie-
dade neocapitalista, se traduz portanto como invenção de gostos, de
formas de imaginar, de pensar e viver. Essa produção de subjetividade
seria, simultaneamente, a produção de novas formas de consumo, que
se diferenciam do consumo de simples bens materiais. Essa produção de
consumo, ao produzir o que será consumido na forma da comunicação,
da moda, dos estilos de vida, etc., acaba por realimentar a própria produ-
ção, no sentido de que ela deve realizar as novas necessidades do consumo.
A ênfase aqui está na imaterialidade dos produtos, e portanto na sua
associação com a própria subjetividade que consome (não é o corpo que
come, que veste, que passeia, mas sim a subjetividade, o desejo).
O capitalismo inventa o falso
Há um termo cunhado em economia, chamado de ‘paradoxo da pirataria’
(ANDERSON, 2009) baseado no dilema que fundamenta a economia da
moda. A moda é um dos setores possíveis de se analisar como a era moderna
do consumo se molda na democratização do acesso aos bens mercantis.
Diferenciar-se em seu grupo, ou até mesmo destacar-se através dos signos
é uma pretensão também dos consumidores menos privilegiados. Os
comportamentos e aspirações individualistas se manifestam mesmo em
obediência à moda ou estilos de vida, importando para o indivíduo não
ser inferiorizado.
Thaís Novais de Curtis
162
Existe uma noção de que as réplicas podem auxiliar nas vendas dos itens
originais de consumo. A indústria da moda opera com itens de estação,
peças sazonais que são substituídas de tempos em tempos sem uma
justificativa funcional de que aquele item esteja defasado, atua apenas na
sua diferenciação visual para justificar tal troca. A solução que o mercado
encontra para as diferenciações entre os modelos de estações se baseia
justamente na estratégia da ‘obsolescência induzida’. Réplicas dos modelos
da estação são espalhadas pelo mercado de massa, justificando assim, que
os consumidores mais exigentes requisitem por modelos novos e exclusivos
que os diferenciem dos outros consumidores. Dessa forma, tanto o item
original quanto sua réplica possuem segmentos definidos, um fortalecendo
o mercado do outro. Ainda assim, o preço do autêntico determina o preço
do falso, pois o prestígio e o alcance do original na sociedade determinam
a demanda e o valor pelo item replicado, gerando inclusive mercados de
alta, média e baixa qualidade dentre os próprios falsificados.
Ao obter um produto falso de grife, o consumidor não está apenas
interessado na posse física daquele item, ele não substitui o original, mas
preenche uma lacuna no desejo de possuir o verdadeiro e o que ele pode
trazer com sua reprodução de imagem como status, reputação, inclusão,
etc. Toda essa imaterialidade alcança a percepção do consumidor ao optar
por determinada escolha: original x falso.
“Na imprensa ocidental, a pirataria chinesa é considerada crime.
Mas na China, produtos pirateados não passam de outro produto
a outro preço, uma forma de segmentação em versões imposta pelo
mercado. Comprar ou não uma bolsa Louis Vuitton pirateada não
é uma decisão moral, mas uma decisão baseada em qualidade,
status social e redução de riscos. Se as pessoas tiverem o dinheiro,
preferirão comprar o original, porque, em geral, é a melhor versão.
Mas a maioria das pessoas só pode pagar pelas versões pirateadas.”
(ANDERSON, 2009, p. 207)
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos
163
O mercado de massas produz a demanda pelo mercado de réplicas, já
que não possui renda suficiente para consumir o original, e esse desejo
está relacionado com a imagem e a representação daquele objeto pela
pessoa. Cria-se um mercado de evidências falsas, no qual os produtos são
uma coisa, e o status que os acompanha outra, por vezes mais importante.
No aspecto psicológico, o indivíduo acredita que consumindo um
produto de luxo, embora falsificado, representará outra imagem de si
próprio perante os outros, desde que o fato de ser falsificado seja omitido.
Mesmo o item falso, muitas vezes, carrega consigo a logomarca do ori-
ginal, distribuindo sem custos o nome da marca. Os fabricantes autênticos
do produto diriam que poderiam fazer o mesmo sem necessidade de
intermediários, no entanto, é de se pensar que o alcance também vai por
outros caminhos, atingindo parcela de consumidores antes ignorada.
Considerando também que o indivíduo não pagante de hoje, ou
consumidor de réplicas, podem vir a tornar-se um consumidor pagante
do item original amanhã.
Conclusão
Juntamente com a ‘civilização do desejo’ que foi construída ao longo da
segunda metade do século XX, as marcas foram adquirindo representações
diferentes na mente dos consumidores. O que antes era caracterizado
apenas como um símbolo de representação gráfica ou visual para expressar
um nome, hoje assumiu uma posição dinâmica de relações que envolvem
desde o produtor, aquilo que é produzido e quem o consome, criando
um campo de valores para todos os envolvidos. Para Lipovetsky (2007),
o que caracteriza o consumidor da atual ‘civilização do desejo’ é que:
Thaís Novais de Curtis
164
“O hiperconsumidor não está mais apenas ávido de bem-estar
material, ele aparece como um solicitante exponencial de conforto
psíquico, de harmonia interior e de desabrochamento subjetivo,
demonstrados pelo florescimento das técnicas derivadas do
desenvolvimento pessoal bem como pelo sucesso das sabedorias
orientais, das novas espiritualidades, dos guias da felicidade e da
sabedoria.” (p. 15).
A maneira de se desenvolver uma marca vem transformando as estratégias
de marketing e de comunicação, inventando novos instrumentos com
vista à conquista de mercados. Passamos de uma economia centrada na
oferta a uma economia centrada na procura. Contudo, os valores intan-
gíveis de uma marca abrem um campo de consumo que modifica a produ-
ção de desejo na sociedade, desejos que expressam sua subjetividade. En-
tendemos aqui por subjetividade tudo aquilo de ordem imaterial que é
parte de um indivíduo, como suas crenças, seus valores morais e religiosos,
sua conduta ética, mas também seu imaginário, suas fantasias, sonhos,
os elementos que servem a sua capacidade criativa etc. Quando mencio-
namos especificamente o desejo de consumo, falamos então de uma parte
dessa subjetividade que se expressa. Esse consumo pode ser tanto de bens
materiais quanto de bens imateriais. Mas o que estamos buscando aqui
é mostrar que mesmo quando se trata de bens materiais, é seu aspecto
imaterial que é desejado, em muitos casos.
Acontece que o mercado de falsificações age de modo a garantir a opor-
tunidade de grande parte dos consumidores satisfazerem seus desejos de
representação social e satisfação pessoal. No entanto, envoltos por tais
estratégias, os consumidores já não conseguem distinguir entre aquilo
que são levados a querer e o que realmente querem.
Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos
165
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167
Contrafação e seus Museus: Espaços de Apologia ouCrítica ao Consumo Pirata?
ENEUS TRINDADELIVIA SOUZA
NICOLÁS LLANO
Introdução
Este trabalho nasce no seio das discussões do Grupo de Estudos Semió-
ticos em Comunicação, Consumo e Cultura (GESC³) do CNPq/USP,
sobre consumo e pirataria. Dentre os vários aspectos do consumo pirata,
encontramos algumas experiências interessantes compreendidas como
museus da pirataria ou museus da contrafação, como são chamados, que
comunicam mensagens de sentido paradoxal: a crítica e a possibilidade
de educação contra tal fenômeno do consumo; e o de se revelar como
um espaço de exaltação à pirataria.
Nesse sentido, este texto busca a reflexão sobre este aspecto do mundo
do consumo contemporâneo e traz alguns subsídios, a partir do pensa-
mento atual de Lipovetsky (2004 e 2007), ao passo que também funda-
menta sua discussão a partir dos casos do Tilleke & Gibbins Museum of
Counterfeit Goods da Tailândia, do Museo del Falso em Salerno-Itália e,
com maior profundidade, da visita feita ao Musée de La Contrefaçon de
Paris, como formas paradoxais de comunicar sentidos e valores da pira-
taria no contexto atual.
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
168
Para tanto, consideramos que o ponto de partida para esta reflexão se dá
justamente a partir da pesquisa das acepções do termo “Contrafação”.
Em inúmeros idomas notamos que a contrafação está relacionada à repro-
dução, à imitação, à falsificação, de qualquer espécie de bens industriais:
seja de um produto, de uma assinatura ou de uma patente, por exem-
plo. Para tornar mais claro tal argumento, podemos buscar mais detalhes
a respeito do termo contrafação, a partir do ponto de vista etimológico.
A ação de contrafacere em latim em sua declinação na ação substantivada
contrafactìo, ónis: “confrontação”, gera a acepção de imitação ilícita da
obra de outro. O termo ao ser incorporado na língua francesa converte-
se na expressão contrefaçon e desde a sua incorporação a essa língua, per-
siste a ideia do termo como algo relacionado a todo tipo de produção
por cópia ou imitação, de maneira fraudulenta, não se restringindo a mer-
cadorias, podendo assim aplicar-se a “qualquer ato ou coisa”.
Juridicamente, ainda, a contrafação relaciona-se atualmente à violação
da propriedade intelectual, direitos de autor, propriedade industrial e pa-
tentes. Segundo a Lei dos Direitos Autorais (Lei 9.610/98, Art. 5, do
inciso VII1), temos: “contrafação – a reprodução não autorizada”.
É correto, portanto, trabalharmos a contrafação como um termo guarda-
chuva, seja a partir de sua definição nos dicionários das várias línguas,
sua construção etimológica, ou a definição legal. É como se este termo
se referisse a um gênero, dentro do qual se encontram outros conceitos
específicos, como pirataria, falsificação ou paródia, por exemplo, como
iremos identificar a partir das categorias elaboradas por Giacomini Filho
(2011). Podemos classificar como contrafação, dessa forma, desde as
falsificações de documentos e moedas, até as obras de artes em geral,
1. http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=148431
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
169
roupas, remédios, produtos eletrônicos e softwares, bem como a utilização
não-autorizada de logomarcas e produção intelectual.
No que diz respeito aos registros acadêmicos sobre este assunto, identi-
ficamos a partir das buscas com as palavras-chave “conftrecaçon”,
“counterfeit” e “contrefación”, algumas centenas de produções científicas
em inglês, espanhol e francês. São livros, artigos indexados em bases de
dados que tratam basicamente da contrafação no setor farmacêutico, na
área da biogenética, na área do Direito (no campo das patentes, dos
direitos autorais violados por plágios, falsidade ideológica, de cópias
falsificadas, usos indevidos de marcas e de produtos entre outras ocor-
rências), da falsificação ou plágio de obras impressas e de obras de arte,
não cabendo aqui mencionar esses trabalhos.
Mas no que se refere aos termos museus e contrefação, percebemos que
existe um número considerável de artigos que tratam das cópias e falsi-
ficações de documentos históricos e de obras de arte, mas só um desses
trabalhos registra uma discussão semelhante a nossa, todavia restrita a
descrever o Museo del Falso em Salerno, Itália. Trata-se do artigo de Laura
Colby (1994, p. 44-47), publicado na Revista Museum International de
Paris, sobre o qual faremos comentários mais a diante.
A partir desta constatação, de que o consumo cotidiano manifesta-se per-
meado por uma série de produtos “contrafeitos”, popularmente conheci-
dos como piratas, percebemos a configuração de três espaços sui generis que
se referem aos museus de contrafação, objeto de discussão deste artigo.
Tais lugares como falamos no início deste artigo, configuram-se como
pontos de retaliação à pirataria e possibilitam uma forma de educar o
consumidor quanto aos tipos de contrafação, bem como espaços de
denúncia para o reconhecimento da obra contrafeita, buscando evitar este
tipo de consumo. Por outro lado, ao se intitularem como museus, estes
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
170
espaços criam um lugar de apresentação e exaltação ao produto contra-
feito. Isso demonstra o sentimento paradoxal que está no íntimo do sen-
timento do consumo de toda produção pirata: é um produto que parece
com o original e funciona como tal, além de ser mais barato. Todavia, se
o produto original fosse mais barato, todos o comprariam.
Desse modo, fica explícita uma correlação entre a aura da marca original
que se transfere para o seu correlato pirata, o que justifica uma observação
sobre o fenômeno dos museus da contrafação.
Museus da contrafação e categorias estéticas do contrafeito
Para tentar explicar estas manifestações, somos obrigados a retomaro
assunto da definição legal da contrafação e seu marco histórico no âmbito
da regulamentação da proteção à propriedade intelectual e industrial que
remonta ao século XIX. Trata-se da atuação da UNIFAB – União dos
Fabricantes, criada na França em 1872, que inicialmente atendia aos inte-
resses de empresas da indústria farmacêutica, justamente com a missão
de atuar no desenvolvimento de tratados internacionais a esse respeito
na proteção de patentes para a produçaõ de medicamentos.
Nesse sentido, em 1883, a UNIFAB participou da elaboração da União
Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial e, em 1891,
do Acordo de Madri, relativo ao Registro Internacional de Marcas de
Comércio. Em 1951, a UNIFAB criou o Museu da Contrafação, em Paris
(Musée de La Contrefaçon)2, que visitamos em julho de 2010 e a partir
do qual identificamos exemplos de manifestações e categorias de produtos
e marcas contrafeitos, que discutiremos mais a diante.
2. http://www.unifab.com/en/our-association/history.html
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
171
O Musée de La Contrefaçon (Museu da Contrafação) de Paris foi criado
com a função didática de ensinar aos seus visitantes sobre a contrafação
e suas modalidades. O espaço do museu dispõe de um grande número
de itens originais e falsificados, tais como estátuas de bronze de Rodin,
perfumes, softwares e tudo que represente um caso emblemático de
processos de falsificação.
Além de mostrar as peças falsificadas e seus respectivos originais, ensi-
nando aos visitantes como diferenciá-las, o museu também tem a missão
de mostrar o grande impacto negativo da contrafação na economia
internacional, e a importância de se respeitar a propriedade intelectual
de itens como obras de arte, marcas e softwares. E ainda, esclarece as
possíveis sanções legais que existem para os indivíduos envolvidos nos
processos de produção e distribuição de itens contrafeitos, e como elas
podem ser aplicadas, no caso da legislação francesa.
Outros dois museus dedicados à contrafação localizam-se respectivamente
em Bangkok, Tailândia e em Salerno, Itália. O Tilleke & Gibbins Museum
of Counterfeit Goods foi criado em 1989 pelo Tilleke & Gibbins, o maior
escritório de advocacia do país, especializado justamente em Propriedade
Intelectual.3 Assim como o Museu da Contrafação de Paris, o museu de
Bangkok tem expostas mais de 3.500 mercadorias contrafeitas, com o
objetivo de mostrar aos visitantes as diferenças quanto à qualidade em
relação aos produtos originais. Além disso, há também aqui um im-
portante caráter educativo, ao mostrar os prejuízos econômicos e sociais
causados pela produção em massa destes itens falsificados.
3. http://www.tillekeandgibbins.com/firm/community/museum
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
172
Já o Museo del Falso, nasce em 1991, a partir do interesse acadêmico e
finaceiro do Prof. Dr. Salvatore Castillo, coordenador do Centro Studi
sul Falso da Universidade de Salerno, Itália, que com proposta semelhante
aos dois museus anteriormente citados, mantem o referido espaço, por
meio de trabalhos de sua empresa de consultoria, que também está ligada
ao seu centro de estudos sobre contrafação, bem como estabelece parceiras
da Universidade com a Prefeitura local. Neste museu são organizadas
várias exposições temporárias que mostram a pirataria e a falsificação de
vários setores produtivos da vida comercial, o artigo que descreve tal
museu deu destaque à exposição intitulada “Falso food” (alimentos
falsificados), ver (COLBY, 1994, p. 44-47).
Não se tem registros de outros espaços semelhantes, mas sabe-se que
outros museus se dedicam a exposições sobre obras artísticas verdadeiras
e falsificadas. Contudo, os espaços aqui citados, parecem ser os registros
de museus mais contundentes da produção comercial contrafeita ou pirata
no mundo ocidental.
Quanto a estes exemplos de museus da contrafação, há que se observar
alguns fenômenos característicos da hipermodernidade, conforme
teorizou Gilles Lipovetsky (2004).
A partir do final da década de 1970, assiste-se ao surgimento, sobretudo
no âmbito acadêmico, do conceito de pós-modernidade. A princípio liga-
do ao discurso arquitetônico, tal conceito passou a designar “ora o abalo
dos alicerces absolutos da racionalidade (...), ora a poderosa dinâmica de
individualização e de pluralização de nossas sociedades” (LIPOVETSKY,
2004, p. 51).
Para o autor, a pós-modernidade configura-se, na verdade, como um pe-
ríodo de transição, que nos encaminhou à sociedade que agora viven-
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
173
ciamos, a sociedade hipermoderna. Este atual estágio da modernidade
caracteriza-se, sobretudo, por ser a era do hiper, do que é levado ao
extremo, que é encabeçada pelo hiperconsumo.
Cada domínio apresenta uma vertente excrescente, desmesurada,
‘sem limites’. Prova disso é a tecnologia e suas transformações verti-
ginosas nos referenciais sobre a morte, a alimentação ou a procria-
ção mostram-nos também as imagens do corpo no hiper-realismo
pornô; a televisão e seus espetáculos que encenam a transparência
total; a galáxia Internet e seu dilúvio de fluxos numéricos (...); o
turismo e suas multidões em férias; as aglomerações urbanas e suas
megalópoles superpovoadas (...). (LIPOVETSKY, 2004, p. 55).
Outra característica é o fato de ser a era do paradoxo. Aspectos paradoxais
aplicam-se a diferentes esferas da hipermodernidade: a relação com o
tempo, com o passado, com o futuro, a formação da personalidade etc.
“É com os traços de um composto paradoxal de frivolidade e ansiedade,
de euforia e vulnerabilidade, que se desenha a modernidade do segundo
tipo” (LIPOVETSKY, 2004, p. 65).
Quanto à relação do indivíduo com o tempo, esta é tomada justamente
pelo paradoxo e pelos extremos, característicos da hipermodernidade. Ao
contrário do carpe diem que pregava a era moderna, em um clima de tran-
quilidade e descontração quanto ao futuro, hoje “a hipermodernidade
indica menos o foco no instante que o declínio do presentismo em face
de um futuro que se tornou incerto e precário” (LIPOVETSKY, 2004, p.
71). Com foco no futuro, mas de maneira preocupada, estamos o tempo
todo vivendo intensamente o presente, sempre em ritmo de urgência, e
prevendo e prevenindo: exemplos disso são o culto à saúde, a prevenção,
a longevidade. Por outro lado, vivemos uma era de celebração e recorda-
ção do passado:
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
174
Celebrando até o menos objeto do passado, invocando as obri-
gações da memória, remobilizando as tradições religiosas, a hiper-
modernidade não é estruturada por um presente absoluto; ela o é
por um presente paradoxal, um presente que não pára de exumar
e ‘redescobrir’ o passado. (LIPOVETSKY, 2004, p. 85).
Assim, em tempos de hiperconsumo e hipermodernidade, paradoxalmen-
te vemos a vivência intensa da antecipação do futuro, e o resgate saturado
do passado:
Logo não existirá mais nenhuma atividade, nenhum objeto, ne-
nhuma localidade, que não tenha a honra de uma instituição
museal. Do museu da crêpe ao da sardinha, do museu do Elvis ao
dos Beatles, a sociedade moderna é contemporânea do tudo-
patrimônio-histórico e do todo-comemorativo. (LIPOVETSKY,
2004, p. 86).
Voltando nosso foco aos museus da contrafação, notamos que estes
museus se encaixam muito bem nesta última afirmação de Lipovetsky.
Tudo é digno de ter um museu, de ser resgatado como patrimônio
histórico, de ser celebrado, a exemplo dos museus de Paris e de Bangkok,
com suas milhares de réplicas, imitações e falsificações, envoltas pelo
superficial objetivo didático.
Dizemos superficial, pois, por trás da declaração de que estes museus exis-
tem para educar, paradoxalmente – e aqui entramos em outra caracte-
rística da hipermodernidade – estas instituições prestam-se, em tempos
de hiperconsumo, ao hiper encantamento por parte do público. A partir
da experiência da visita ao Museu da Contrafação de Paris, pudemos
perceber exatamente este movimento: se por um lado estes museus
trazem, de fato, um fundo didático, com o objetivo aparente de ensinar
sobre a contrafação e suas modalidades, alertando aos visitantes desde os
problemas relativos à qualidade, até os graves problemas sociais e
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
175
econômicos gerados pela indústria da falsificação, por outro lado, eles
podem também funcionar como uma espécie de apologia. A exibição
destes produtos, por vezes tão semelhantes aos originais, produz exata-
mente uma experiência de encantamento.
Tal paradoxo vem, justamente, do fato que nós, indivíduos hipermoder-
nos, estamos imersos em um estado constante de aflição, como quem
agoniza, em constante medo, aqui particularmente em relação não sim-
plesmente à pirataria, mas ao que o museu nos mostra como sendo seus
maiores desdobramentos: a desobediência legal aos direitos do autor e
suas correspondentes sanções, e a relação da contrafação com o finan-
ciamento de organizações criminosas. Contudo, paralelamente a isso,
imersos também em um deslumbramento com a hiperrealidade, ficamos
em êxtase ao contemplar mercadorias contrafeitas, por vezes tão perfei-
tamente semelhantes às originais, em seus menores detalhes e a preços
mais acessíveis que os originais.
A partir da reflexão apresentada sobre os paradoxos que apresenta o
museu, e com o objetivo de fazer do relatório de visita ao Musée de la
Contrefaçon de Paris uma fonte de pesquisa para estudos sobre consumo,
marcas, bens culturais e processos de imitação industriais-culturais, esta
segunda parte do artigo visa classificar os materiais expostos no museu a
partir das tipologias ligadas à imitação, identificadas por Gino Giacomini
Filho (2011, p. 216-238).
O uso das tipologias determinadas pelo autor: falsificação, pirataria, plá-
gio, knockoff, adaptação e paródia, parte da justificativa de que estas não são
exclusivas do plano estético publicitário – já que as mesmas particulari-
dades operativas podem se encontrar tanto em diferentes dimensões da
indústria cultural quanto em uma variedade de gêneros de discursivos –,
e que em um processo complexo como a imitação as distintas tipologias
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
176
permitem entender a variedade não só de processos industriais de con-
sumo, mas as diversas produções de sentido simbólicas dos consumidores
e suas relações com as marcas e produtos.
Antes de iniciar a classificação de acordo com a tipologia, vale à a pena
introduzir a arquitetura do museu: vários salões que abrigam diferentes
vitrines com uma variedade produtos compartilham a distribuição do
espaço com informações escritas (banners, citações, placas com textos
impressos) e telas de computador (material digital). O percurso inicia sob
uma placa com uma citação de Jean-Jacques Rousseau sobre a arte do
falso: “Le faux est susceptible d’une infinité des combinaisons, mais la vérité
n’a qu’une manière d’être”.4 Tal afimação por si só já justifica o argumento
levantado neste artigo sobre a possibilidade de exaltação ao consumo pira-
ta e mostra os paradoxos vividos na experiência estética de visita o espaço
que busca educar contra a contrafação e que, ao mesmo tempo, investe
de certa aura admirável a apresentação do produto pirata, sobretudo as
contrefações de boas qualidades em relação aos seus originais. A partir
do exposto, iniciamos nossa apresentação das categorias de contrafação
e seus exemplos registrados no museu de Paris, para perecebermos as
nuanças de qualidades dos produtos contrafeitos nas manifestações dos
tipos de contrafação.
Falsificação
A falsificação implica a cópia ilícita de um direito marcário, de
forma que o bem imitador torna-se idêntico ou indistinto do
4. “O falso é susceptível de uma infinidade de combinações, mas na verdade não é maisque um jeito de ser”. Tradução nossa. ARRUMAR TRADUÇÃO, O CORRETO É
QUE A VERDADE, AO CONTRÁRIO DO FALSO, TEM UMA ÚNICAMANEIRA DE EXISTIR, a tradução seria então: “O falso é suscetível de umainfinidade de combinações, mas a verdade tem uma única maneira de ser”
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
177
original desrespeitando os respectivos direitos (BIAN e MOUTI-
NHO, 2009). Dois dos elementos essenciais na falsificação comer-
cial são a existência da fraude e a não autorização do fabricante
(STREHLAU, 2004). (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 225).
Se analisarmos de forma mais detalhada os produtos falsificados que se
encontram na exposição usando a classificação feita por Chaudhry e
Walsh (1996) e resenhada no artigo de Giacomini Filho (2011, p. 225),
encontramos: produtos falsificados completamente, o que tem muita
similitude, inclusive o uso da mesma marca do original; produtos dupli-
cados do original mas com marcas diferentes; reproduções que não são
completamente exatas; imitações que se afastam do original e não criam
o mesmo ethos do original, ou seja que não são convincentes como
falsificação.
Em relação aos produtos falsificados que usam as marcas dos originais,
os brincos, broches, chaveiros e bolsas da marca Chanel (Figura 1. e 2.)
FIGURA 1 FIGURA 2
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
178
são um exemplo perfeito para ilustrar a primeira classificação; os produtos
duplicados com marcas diferentes constituem uma parte importante da
mostra do museu, a exemplo, dos aparelhos para barbear BIC e BIC
sensitive (Figura 3. e 4.). Neste caso, podemos notar que os aparelhos são
bicolores (branco e amarelo) e na falsificação são monocromáticos
(amarelo). Já na linha BIC sensitive, ocorre o contrário. Existe a BIC versus
a BIG, mas a mascote não tem a caneta em seu traçado. Neste tipo de
falsificação também encontramos bens culturais como pinturas e obras
de arte, como por exemplo uma falsificação do quadro de Henri Matisse
Les poissons rouges (Figura 5.).
De forma geral, as reproduções dos
produtos apresentados na exposição
não são copias exatas dos originais:
existem modificações nas emba-
lagens, nos nomes dos produtos, nas
cores tanto do produto ou das emba-
lagens ou simplesmente proporções
que mudam do original para o pro-
duto falsificado. Para ilustrar este fe-
nômeno, observemos o caso da bate-
deira da marca Moulinex (Figura 6.).
FIGURA 5
FIGURA 3 FIGURA 4
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
179
Percebemos que o design é diferente
tanto no lugar de por a mão quanto
nas colheres, no original o lugar de
por a mão é liso e as colheres são
ovais e no falsificado não, além
desses detalhes, no original os
desenhos são mais delicados do que
na falsificação.
Entramos no último elemento que faz parte da classificação das falsifi-
cações: aquelas imitações mal feitas que não conseguem convencer o
consumidor, exemplificadas no museu a partir das meias da marca Nike
(Figura 7.). A embalagem do pro-
duto falso é bem diferente da do
produto original, não possuindo o
nome da marca, nem referência ao
tamanho da meia, o layout é bem
díspar e o logo Nike é significativa-
mente grosseiro na meia; outro caso
deste tipo de falsificação são os óculos da marca Ray Ban (Figura 8.). Neste
produto percebemos que a imitação dos
óculos é bem diferente do original, a arma-
ção é mais curvilínea na parte de cima, e
notamos também que o material da contra-
fação é mais opaco. Finalmente o estojo é
totalmente diferente e a própria assinatura
também recebe outro tratamento tanto na
cor quanto nos detalhes.
FIGURA 6
FIGURA 7
FIGURA 8
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
180
Existem muitos produtos que permitem entender como diferentes
características de cada tipo de falsificação são misturados num produto
só. Um exemplo desta mistura é o Perfume Flower by Kenzo (Figura 9.).
Podemos aqui identificar várias mo-
dificações entre o verdadeiro perfu-
me e o falso. O nome do falso é
Flower by Sellion, a flor gravada na
tampa do falso está murcha e a do
verdadeiro está cheia de vida, o ta-
manho da haste da flor também é
facilmente percebido e as informa-
ções das embalagens são diferentes.
Resumindo, a falsificação é um pro-
cesso de imitação ilícita que pretende
apropriar-se dos atributos tangíveis
de produtos que estão estabelecidos
e que são reconhecidos no mercado, com o objetivo de aproveitar
comercialmente o valor marcário dos outros em seu benefício.
Pirataria
A pirataria não é só o resultado de um processo de imitação comercial tan-
gível: ela envolve outras fases além da sua reprodução, “refere-se à reprodu-
ção e comercialização ilegal e em larga escala de obras legitimamente
criadas, envolvendo produtores, estabelecimentos comerciais, autoridades
governamentais, fisco e receptadores” (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 227).
No Museu da Contrafação de Paris podem-se encontrar documentação
e informação sobre os processos que fazem parte da pirataria, suas con-
FIGURA 9
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
181
sequências e punições. Tanto fotografias que documentam a produção,
como usinas de fabricação de produtos falsos de couro, quanto imagens
de apreensões de mercadoria falsa (couro e óculos) fazem parte da exi-
bição. Embora todos os produtos apresentados façam parte de algum dos
processos que constituem a pirataria, o museu também sublinha sua
importância por meio de textos informativos e banners sobre este
fenômeno e sua ligação com os direitos autorais. Eis uma alusão explicita
à pirataria, encontrada no museu:
“De julho a agosto de 2006, 8,3 milhões de CD e DVD foram apreen-
didos na China. 3.000 lojas foram fechadas e mais de 9.000 pequenos
estabelecimentos foram punidos (Jornal Les êchos, agosto de 2006).”5
Plágio
Normalmente associado à falta de crédito ou permissão da propriedade
intelectual, o plágio, como explicam Pereira (2001) e Giacomini Filho
(2011) também
(...) pode estar contido em falsificações, pirataria e imitações
trazendo prejuízos a diferentes entidades que idealizaram origi-
nalmente as obras, caso de uma empresa que tem sua marca ou
propaganda plagiada por concorrente, trazendo confusão ao
consumidor. (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 228).
O plágio está representado em todos os exemplos apresentados no museu,
já que as marcas são entidades legalmente constituídas e estas imitações
violam seus direitos de copyright (à cópia ou direito de reprodução). Ao
usar o nome ou identidade corporativa de uma marca estabelecida no
5. Museu da Contrafação, banner informativo “Droits d’auteur et piratage”.
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
182
mercado (legalmente e simbolicamente), está se cometendo um delito,
pois sua produção, distribuição e venda estão sendo desenvolvidos sem
autorização oficial das empresas fabricantes dos produtos originais.
Knockoff
Segundo Giacomini Filho, pautado em Carvalho (2006) o knockoff é um
“Conjunto marca/produto alusivo a outro já estabelecido no mercado
ou uma expressão promocional que arremeda outra já publicada, knockoffs
são itens ligeiramente diferentes do original, mas não são vendidos como
artigos genuínos” (GIACOMINI FILHO, p. 2011, 229).
Neste caso específico, o imitador toma algumas características ou
símbolos distintivos de produtos ou marcas reconhecidas (logomarcas,
embalagens, cores, formas, figuras, tipografias, entre outros) e os aplica
a um produto com um nome diferente. Este produto pode-se caracterizar
como um híbrido, pois mesmo que utilize algumas características iden-
titárias alheias, sua imagem também é constituída a partir de elementos
próprios.
Existem quatro grandes objetivos ou conseqüências ligadas aos knockoffs:
1. serem tomados como originais pelos consumidores que desco-
nhecem o verdadeiro original; 2. satisfazer seus consumidores, pois
embora conheçam o original, julgam ter na imitação um benefício
superior; 3. induzir seus compradores ao erro uma vez que as simi-
laridades acarretam confusão da imitação com o original; prejudi-
car o concorrente ou detentores dos direitos do bem original
(GIACOMINI FILHO, 2011, p. 230).
Para exemplificar este elemento da tipologia nos elementos presentes no
museu, apresentamos dois casos: o primeiro, O Casa Café (Figura 10)
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
183
se utiliza de um layout visual que se
aproxima bastante do produto Nescafé,
apesar de modificar a cor da caneca, a cor
do rótulo, o vidro que armazena o
produto e a tampa. Essas modificações
sutis em sua composição podem levar a
uma dúvida no consumidor que já está
acostumado com o Nescafé e gerar uma
compra errada.
O segundo caso trata-se do Molho
de pimenta Tabasco (Figura 11): o
molho de pimenta possui a sua
falsificação com o nome de Tabaro,
e aqui podemos notar a semelhança
no layout dos produtos, sendo que
o verdadeiro tem uma disposição
mais equilibrada. No produto, porém, a cor do molho falso é bem mais
escura, bem como o lacre.
Adaptação
As adaptações são ações que podem incluir diferentes tipos de processos
como adequações, transcrições, transmutações, reproduções, traduções
e transplantes de conteúdo. Normalmente, as adaptações partem de uma
obra original que serve como referência para inovar e criar uma nova obra.
No caso dos produtos apresentados no percurso do museu, cabe entender
a adaptação no sentido dado por Schnaars (1997), que “(...) emprega o
FIGURA 11
FIGURA 10
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
184
termo adaptações criativas para designar formas inovadoras de copia, pois
melhoram o modelo original ou fazem adaptações para novos contextos”
(GIACOMINI FILHO, 2011, p. 231).
Os produtos culturais e artísticos não dependem somente da obra, mas
também do contexto da leitura e da recepção que faz o autor, e as adapta-
ções podem ser celebradas como obras originais ou como leituras
inovadoras, como pode-se encontrar na indústria musical (MILLER, 2004,
p.25). Na nossa visita não encontramos casos que exemplificassem clara-
mente este elemento da tipologia, talvez porque não queiram fazer do
ato da imitação industrial uma apologia da criatividade das indústrias num
espaço didático, paradoxo que foi discutido anteriormente no artigo.
Paródia
Este conteúdo estético imita, de uma forma irônica e evidente, obra
alheia. Jonshon e Spilger (2000) conceituam a paródia como um tipo
de sátira caracterizada por imitação que ironiza um trabalho em particular
ou estilo de um determinado autor. Assim como acontece com a adapta-
ção, não existem produtos no museu que funcionem como exemplos des-
te elemento da tipologia. As imitações, de modo geral, tentam ser o mais
semelhantes com as marcas originais para aproveitar as construções
simbólicas e seu posicionamento no mercado. Fazer uma paródia de uma
marca reconhecida seria apagar alguns dos significados reconhecidos pelo
público em virtude de criar novos, ou seja, construir e posicionar uma
marca desde zero no mercado.
No entanto, isto não significa que não existam marcas que realizam paró-
dias e que apresentem as cinco características definidas por Johnson e
Spilger (2000) e comentadas por (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 232). É o
caso de Abreacombi & Fecha em relação à marca original Abercrombie &
Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...
185
Fitch. Usando a fonética da marca original, a adaptação junta um ele-
mento característico da vida cultural e econômica do país (o veículo popu-
lar kombi) e faz um jogo de palavras para criar uma identidade juvenil,
humorística e descontraída.
Considerações finais
O passeio pelas manifestações das categorias criadas por Giacomini Filho
(2011), associadas às manifestações encontradas no Museé da La
Contrefaçon de Paris, juntamente com às reflexões do consumo
hipermoderno dada por Lipovetsky, nos auxiliam a repensar a força e o
sentido estético do consumo pirata, sobretudo no seu aspecto fetichista
como aponta Canevacci (2005), pois mostra novos caminhos para os
sentidos do consumo, desvinculado de um valor ou enaltecimento à
propriedade e autoria, sugerindo inclusive o declínio de valores
fundamentais ao sistema capitalista. Nesse sentido, em que medidas
podemos afirmar que estamos vivendo uma ruptura das mentalidades em
efetivo em relação ao sistema capitalista moderno que se pautava no
direito à propriedade, à privativatização dos espaços? Ou tal processo se
dá numa contiguidade das transformações do sitema capitalista na sua
versão contemporânea, demarcada pelas mudanças nas formas de inte-
ração social, sobredeterminadas em parte, pela grande influência das mu-
danças tecnológicas e suas lógicas de participação e inclusão?
Essas perguntas demandam novos artigos e que aqui não encontram
resposta. Mas certamente, o paradoxo apontado pelo fenômeno do consu-
mo pirata e seus museus são reveladores de transformações e sentidos que
aqui buscamos pontuar como nossa contribuição, ao entendimento
estético do consumo pirata em suas manifestações de produtos, marcas
e da publicidade.
Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano
186
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189
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
JÔSE FOGAÇASILVIO KOITI SATO
Foto reprodução da internet: http://customizando.net/bolsas-de-grifes-customizadas/Crédito da Foto no site: Loja Tua
Introdução
Os estudos desenvolvidos pelo GESC3 procuram dar luz a aspectos
aparentemente contraditórios da contrafação, entendida como um movi-
mento que, por um lado, é produto do desenvolvimento capitalista e do
cenário contemporâneo e, de outro, põe em questão o sistema de mercado
vigente, uma vez que apresenta alternativas para a democratização do con-
sumo. Como as marcas se posicionam frente a esse movimento e em que
medida a pirataria afeta a performance da indústria formal são perguntas
presentes nas discussões que originaram este livro.
As macroanálises e interpretações do “espírito do tempo” sem dúvida nos
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
190
guiam nesse desbravar do universo e dos significados da contrafação,
mostrando que afirmações de senso comum – por exemplo, as que
colocam o preço como central na escolha por produtos contrafeitos –
não são suficientes para explicar o sucesso do fenômeno. Mas o estudo
não estaria completo sem que entendêssemos as manifestações empíricas
do fenômeno entre os próprios consumidores. Era necessário entender
o contexto que emoldura a escolha por uma imitação ou cópia e pergun-
tar: o valor da marca, expresso em preços proibitivos para a maior parte
dos consumidores no mercado formal, é o motor para a compra de um
produto falsificado ou é exatamente o desapego ou desinteresse pela
autenticidade de marca que leva a tal aquisição? Em outras palavras, seria
o “desejo autêntico” pela marca e seus significados o que aquece o mer-
cado pirata, fato que reverberaria na indústria formal, ou seria um “desejo
simulacro”, advindo do impulso de não desperdiçar as oportunidades de
bons negócios oferecidas no universo da contrafação? Por fim, estas dife-
rentes categorias de desejo e consumo estão relacionadas com diferenças
de nível socioeconômico dos consumidores?
Este capítulo perpassa tais questionamentos, iniciando por uma visão
geral do contexto em que estão inseridos o mercado de luxo e o mercado
pirata, visão que embasa a análise dos resultados obtidos em contatos
diretos com atores desse mercado: uma consumidora e uma vendedora
de produtos contrafeitos.
Consumo contemporâneo
Estamos expostos a grandes transformações atualmente, cercados por
mudanças que ocorrem rapidamente em diferentes esferas da vida coti-
diana. Modelos sociais, econômicos, políticos e culturais consagrados
parecem não funcionar mais, pelo menos não da mesma forma, e abrem
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
191
espaço para um mundo mais fragmentado e globalizado, marcado, sobre-
tudo, pelo excesso de informações, produtos e serviços, meios de comu-
nicação e trabalho. Este ambiente, de acordo com Lipovetsky (1989), é
caracterizado por traços como a elevação do nível de vida, a abundância
de mercadorias e dos serviços, culto aos objetos e aos lazeres e a moral
hedonista e materialista. É uma sociedade focada na expansão das neces-
sidades, na obsolescência, na sedução e na diversificação das mercadorias.
A Sociedade de Consumo é um ambiente em que os objetos, serviços e
bens materiais são multiplicados, e as relações dos indivíduos são mais
com objetos do que com outras pessoas: “o conjunto e suas relações sociais
já não é tanto o laço com os seus semelhantes quanto (...) a recepção e
manipulação de bens e de mensagens” (BAUDRILLARD, 2008: 13).
As múltiplas escolhas feitas no consumo diário dos bens passam a ter um
papel cada vez mais importante na formação da identidade dos indi-
víduos. É preciso lidar com alterações em certezas e conceitos culturais
anteriormente sedimentados (de raça, sexualidade, gênero, classe social
etc.) e que sempre nos auxiliaram no processo de identificação e projeção
de nossa identidade cultural (HALL, 2000).
O homem contemporâneo se constrói ao redor da imagem que ele projeta
para os outros neste consumo simbólico, entendido como o processo pelo
qual as pessoas atribuem significados aos produtos e objetos, além dos
que, acredita-se, sejam inerentes a eles. O consumo, portanto, é um pro-
cesso de organização, formação e exposição da identidade por meio de
bens materiais que simbolizam um estilo de vida, um gosto.
Podemos dizer, portanto, que os bens de consumo têm uma significação
que vai além do seu valor comercial, existe uma ampliação na habilidade
em carregar e comunicar significado cultural na sociedade contemporânea:
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
192
O sistema de design e produção que cria os bens de consumo é
uma empreitada inteiramente cultural. Os bens de consumo nos
quais o consumidor desperdiça tempo, atenção e renda são
carregados de significação cultural. Os consumidores utilizam esse
significado com propósitos totalmente culturais. Usam os
significados dos bens de consumo para expressar categorias e
princípios culturais, cultivar ideias, criar e sustentar estilos de vida,
construir noções de si e criar (e sobreviver a) mudanças sociais.
(MCCRACKEN, 2003:11)
Além de McCracken (2003), também Douglas & Isherwood (2009), são
autores que discutem a questão do consumo e seus significados. Têm em
comum o fato de tratar os bens para além do utilitarismo, abrindo novas
possibilidades de compreensão e desvendando que estes possuem uma
capacidade: a de produzir sentidos, definindo estilos de vida, identidades,
direitos e um papel: o de mediar as relações sociais.
Douglas & Isherwood, em O Mundo dos Bens (2009), assumem o
consumo nos termos de sua realidade cultural e coletiva, tendo como
função dar sentido ao fluxo incompleto dos acontecimentos. Os bens são
a “parte visível da cultura”, os “acessórios rituais” do processo ritual de
consumo. (DOUGLAS & ISHERWOOD, 2009:112-114). Segundo estes
autores, o ritual de consumo tem por finalidade primária classificar pes-
soas e eventos; os bens materiais de servirem como “marcadores das linhas
nas relações sociais”, de comunicarem a posição social a que se pertence
ou aquela que se deseja pertencer: “podem ser usados como cercas ou
como pontes” (Ibid.: 36).
Por tudo isso, a definição puramente econômica do que é um consumidor
deixou de ser suficiente: o pilar central da teoria do consumidor contem-
porâneo é que ele faz escolhas não somente pelos ganhos de utilidade,
mas também pelo significado simbólico destas escolhas, que é transferido
do bem e da marca consumidos para o consumidor.
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
193
Tal transferência de significado é uma importante chave no processo de
consumo, uma vez que é nesse movimento que a cultura se cria.
Conforme McCracken (2003), a função comunicadora dos bens não se
esgota em ser um mero emissor de mensagens; eles são um sistema de
construção da cultura, marcado por uma característica definidora: a
qualidade móvel do significado. O autor afirma que o significado está
“ininterruptamente fluindo das e em direção às suas diversas localizações
no mundo social, com a ajuda de esforços individuais e coletivos de desig-
ners, produtores, publicitários e consumidores.” (Ibid.: 99). Neste esque-
ma, a publicidade e o sistema de moda constituem meios através dos quais
o significado é investido no “código objeto” – eles movem o significado
do mundo culturalmente constituído para os bens de consumo –,
enquanto os rituais de consumo o transferem destes para o consumidor
(Ibid.:113 e 120).
Aqui se define nosso entendimento sobre consumo, fruto e criador de
cultura, que movimenta um sistema complexo de signos para além da
materialidade.
Existe um tipo de consumo, no qual o significado emocional dos bens
possui importância e características especiais, com carga simbólica
inequívoca e formas de transferência e rituais de consumo característicos:
o consumo do luxo.
Luxo, luxos
Os significados do luxo estão associados ao universo do prazer, da osten-
tação e da exuberância. De acordo com Lipovestky e Roux (2005: 115),
luxo não tem origem na palavra lux (luz), como seria conveniente, poético
e adequado numa visão positiva sobre este tipo de consumo. Mas, por
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
194
outro lado, a palavra tem associação com a luxúria, o que traz um viés
crítico em relação ao fenômeno do luxo. O uso dessa palavra, com o
sentido que conhecemos hoje, vem do século XVII, associando o con-
sumo ao que é considerado supérfluo, por mero prazer. Por outro lado,
historicamente, o consumo do luxo sempre marcou uma posição social
por parte dos grupos dominantes. Tecidos, metais, especiarias e cores
foram utilizados como uma maneira de estabelecer diferenciação social
e expressar estrutura de poder.
De acordo com Passarelli (2010), o luxo atual passa a ser construído a
partir da Revolução Industrial, com a ascensão da burguesia e o desen-
volvimento da produção em massa. O autor destaca o contraste entre o
caráter semiartesanal da produção do setor do luxo (mais próximo de pro-
cessos produtivos pré-capitalistas), sem a preocupação com a escala produ-
tiva, que marca este período.
Beleza, desejo, prazer, raridade, qualidade, tradição e refinamento são
palavras que ajudam a definir o que é um produto de luxo:
“Um produto de luxo é um conjunto: um objeto (produto ou
serviço), mais um conjunto de representações: imagens, conceitos,
sensações, que são associadas a ele pelo consumidor e, portanto,
que o consumidor compra com o objeto e pelos quais está disposto
a pagar um preço superior ao que aceitaria pagar por um objeto
ou um serviço de características funcionais equivalentes, mas sem
essas representações associadas. (LIPOVESTKY; ROUX, 2005: 127)
Podemos dizer que o consumo do luxo gira em torno da sedução, da emo-
ção, do prazer e da estética. Sedução ao extremar a relação fetichizada
entre mercadoria e consumidor, que corteja e enxerga o bem como um
objeto de desejo. Trata-se de uma relação emocional em função do envol-
vimento existente neste tipo de consumo, injustificável com o uso de
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
195
argumentação meramente racional. O prazer está relacionado ao hedo-
nismo, à gratificação e recompensa individual (e também social) atribuída
a uma determinada aquisição. Finalmente, a relação estética se dá pela
concretização, no plano sensível, de uma série de valores e significados
relacionados a um determinado bem, que se materializa com sua
aquisição.
O consumo do luxo estabelece a ponte para o grupo com o qual se almeja
ser reconhecido e é também a cerca para a distinção dos demais, que
ficaram fora dele. Envolve, sobretudo, o reconhecimento do consumidor,
que a partir da aquisição e uso do bem passa a compartilhar valores que
o integram ao grupo que reconhece a legitimidade destes produtos a partir
de uma identidade consagrada.
A legitimidade traz consigo a ideia daquilo que é aceito pela lei, tradição
e pelo savoir faire. Essa consagração passa normalmente por questões
técnicas e funcionais como a qualidade dos produtos, matérias primas
nobres e seus métodos de execução, normalmente de tradição artesanal.
Nesse sentido, o luxo dialoga com a dimensão do tempo (é preciso um
certo período para ser legitimado, não pode ter surgido ontem) e com o
espaço (a execução é feita de uma certa maneira, num certo lugar de
origem).
Já a identidade pode ser caracterizada como algo que é único, singular e
que mostra que algo é fiel a si mesmo. A identidade é uma medida que
traz a segurança e a confiança associadas, características muito bem-vindas
em tempos de grande instabilidade para o consumidor pós-moderno.
“Identidade é a permanência sob as mudanças, as rupturas, a inovação,
portanto, a invariância sob as variações. Identidade é o que torna uma
descontinuidade contínua, é o que conecta o desconectado. É o que
integra a ética a estética.” (LIPOVESTKY; ROUX, 2005: 142)
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
196
A legitimidade e a identidade de um bem de luxo são simbolizadas pelas
marcas de luxo. Em tempos de produtos com ciclos cada vez mais curtos
(muda-se tudo a cada temporada) e de bens cada vez mais comoditizados,
a relação é construída sobre as marcas, que nesse setor são, muitas vezes,
centenárias, com uma herança narrativa muito valiosa, enriquecida por
modernas técnicas de gestão de marketing, comunicação e branding,
como veremos a seguir.
Marcas de luxo
Marca pode ser definida atualmente como “uma conexão simbólica e
afetiva estabelecida entre uma organização, sua oferta material, intangível
e aspiracional e as pessoas para as quais se destina” (PEREZ, 2004, p. 10).
Nesse entendimento de marca, a ideia do vínculo e da relação é ressaltada,
num diálogo sempre em evolução.
O objetivo da marca do ponto de vista da gestão da empresa é criar vín-
culos e relações baseadas em novos significados, que deixam de ser somen-
te concretos para serem emocionais e baseados em crenças da marca, a
fim de tornar cada vez mais forte a lealdade à marca.
Podemos dizer que atualmente o consumidor não deseja comprar um
produto que não o insira numa atmosfera atraente para ele mesmo e aos
outros. Como nos evidenciou Baudrillard (1996), o homem está inserido
em um sistema de significações que o leva a buscar satisfações simbólicas
e não apenas funcionais, estabelecendo com as marcas uma relação aspira-
cional e emocional. Assim, marcas ultrapassam produtos e serviços, e as
investigações das tendências de comportamento e consumo, por meio
de novas metodologias quase sempre qualitativas, podem fornecer argu-
mentos convincentes para as estratégias marcárias, que assim passam a
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
197
refletir os valores imateriais almejados pelos consumidores da sociedade
contemporânea.
As marcas ganham novos significados, e não existem mais somente para
designar propostas de consumo concretas e tangíveis. Elas simbolizam
novos estilos de vida, comportamentos, opiniões, visões de mundo, valo-
res, interesses e traços de personalidade e convidam o indivíduo a uma
relação de compartilhamento e interação com esses significados.
As marcas de luxo, como comentamos anteriormente, possuem muitas
vezes histórias centenárias, com um longo e contínuo trabalho de gestão
que constrói uma rede de associações poderosa na mente dos
consumidores:
A pujança de marcas como Hermès, Baccarat e Cartier pode ser
percebida pelo seu perfil robusto: fortemente posicionado no
psiquismo dos consumidores. São marcas vencedoras de um
conjunto de batalhas comerciais travadas nos últimos séculos.
Criaram raízes profundas no imaginário do consumidor e, na
maioria das vezes, mostram-se menos sujeitas a modismos.
(PASSARELLI, 2010: 56)
O consumo das marcas de luxo mudou ao longo do tempo: novos merca-
dos consumidores trouxeram novas estratégias e subcategorias (semiluxo,
novo luxo, luxo verdadeiro, mastige, prestige, premium, etc) que refletem
conflitos e dilemas centrais do setor, relacionados principalmente aos pla-
nos de expansão econômica que possibilitem crescimento das marcas e
ampliação de seus públicos, mas que garantam a manutenção da aura de
tradição e exclusividade aos quais os produtos estão associados. Ou seja,
a expansão dos produtos de luxo para outros extratos da pirâmide socio-
econômica pode representar um grande risco para as marcas: “a popula-
rização de um bem pode representar risco de o consumidor tradicional
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
198
decepcionar-se com o posicionamento da marca, o que, consequentemen-
te, deterioraria o prestigio dela” (Ibid.: 47).
Por outro lado, é preciso evidenciar que é com muita clareza que se
visualiza o consumo de luxo pelos níveis socioeconômicos mais altos da
nossa sociedade, mas sabe-se que este não se restringe, hoje em dia, a essa
pequena parcela da população.
Segundo Lipovetsky e Roux (2005), é errôneo até mesmo pensar que os
homens primitivos estavam destinados a uma condição miserável sem
luxo, como é também equivocada a ideia de que os luxos não estão pre-
sentes nas camadas menos favorecidas da população. Remetendo à tradi-
cional regra sociológica da reciprocidade, explicam que o princípio do
luxo está no “espírito de dispêndio” e não na fabricação e consumo de
bens com preço elevado, sendo estes a consequência e expressão do pri-
meiro (LIPOVESTKY; ROUX, 2005, p.22).
Neste ponto, os autores nos apresentam a noção do luxo “estilhaçado”,
fruto da democratização de massa que tornou o fenômeno plural: hoje
nos deparamos com muitos luxos, luxos acessíveis, luxos em diferentes
graus, não mais apenas um ou “o” luxo de exceção e exclusivo (Ibid.: 15),
sendo então que mesmo marcas que tradicionalmente comercializam pro-
dutos a preços muito elevados, tornam-se uma realidade para as diferen-
tes camadas sociais, chegando até estas em forma de produtos secundários
(o lenço ou pequeno acessório Louis Vuitton, por exemplo), possibili-
tando o sentimento de pertença ao que seria o seleto grupo de compra-
dores da marca e partilhando, por mínimo que seja, de sua herança e
história.
Entendemos que os produtos pirateados também se colocam nesta posi-
ção, carregando signos e atribuindo sentido ao seu consumo, podendo
assim ser também considerados como estilhaços de luxo.
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
199
Ainda segundo Lipovetsky e Roux (2005), o luxo começa a ser demo-
cratizado pela propagação do kitsch, das cópias e dos similares, “produtos
que compensam sua impessoalidade pela redundância, as ornamentações
sobrecarregadas, a proliferação de acréscimos, os excessos expressivos”,
característicos da burguesia. (Ibid: 45) Esse movimento é reforçado pela
proliferação dos grandes magazines que conseguem baixar os preços dos
produtos de luxo proporcionando e incentivando de forma espetaculosa
o acesso de muitos ao que antes era restrito às elites.
Baudrillard já nos colocava tal discussão em sua obra A Sociedade de
Consumo (2008), enfatizando que, equivalente ao clichê no discurso, o
kitsch surge como categoria cultural, definindo-se pela sobreposição e
abundância de signos distintivos, mas de forma desarmônica e amontoa-
da, vulgarizando-os e retirando deles, assim, o poder de distinção. A
expansão do kitsch tem estreita relação com a mobilidade social que
caracteriza a sociedade de consumo: aqueles que ascendem às camadas
sociais superiores buscam também suas referências culturais, mas se dão
por satisfeitos ao se revestirem e manifestarem os signos dessa cultura,
ainda que não a tenham incorporado de fato.
Baudrillard evidencia que essa apropriação dos signos pela população que
ascende socialmente provoca uma reação das classes superiores:
“O acesso de camadas mais numerosas a esta ou aquela categoria
de signos obriga as classes superiores a distanciar-se por meio de
outros signos em número restrito (quer pela origem, como os
objetos antigos autênticos, os quadros, quer sistematicamente
limitado, como as edições de luxo, os carros fora de série)”
(BAUDRILLARD, 2008: 141).
Por esta ótica, Baudrillard entende que o kitsch acaba por revalorizar o
objeto raro, pensamento que vai ao encontro da teoria do Trickle-Down
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
200
proposta por Simmel1 e reformulada posteriormente por McCracken
(2003), e que está no cerne de formulações importantes sobre o tema da
contrafação, como o “paradoxo da pirataria” citado por Anderson (2009),
como se verá mais adiante.
Os conceitos de luxo estilhaçado e de kitsch são importantes para a
discussão do consumo pirata. Nossa posição é a de que, embora poten-
cialmente kitsch, o contexto de uso de produtos pirata é algo valorizado
e há certa racionalização e cuidado para que o consumo não se configure
como tal. Em outras palavras, entende-se que há um gradiente que vai
do pequeno estilhaço de luxo, possível de ser consumido e ostentado por
qualquer um sem causar dúvidas ou críticas alheias, passa por um limite
dos luxos possíveis e cabíveis em cada contexto e chega até o kitsch, em
que a exacerbação do luxo estaria em dissonância com o contexto e
circunstâncias de vida do consumidor, denunciando a falsidade do objeto
e a falta de legitimidade de seu uso.
Luxo pirata: um mergulho na realidade
A pirataria de produtos e marcas de luxo tem como locus privilegiado de
produção a China. É importante alertar que, embora principie por alterar
este quadro, a pirataria na China possui características singulares. Con-
forme descrito por Chris Anderson (2009), ela se estende a praticamente
todos os setores no país e possui significados distintos do que encontramos
no Ocidente, em função de seus sistemas legais e também da influência
confuciana que enaltece o ato de copiar como uma forma de respeito ao
autor do objeto original e também como parte da educação.
1. Em 1904 Georg Simmel definiu sua teoria do Trickle-Down no artigo “Fashion”,International Quarterly, 10, 130-155.
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
201
Na imprensa ocidental, a pirataria chinesa é considerada crime.
Mas na China, produtos pirateados não passam de outro produto
a outro preço, uma forma de segmentação em versões imposta pelo
mercado. Comprar ou não uma bolsa Louis Vuitton pirateada não
é uma decisão moral, mas uma decisão baseada em qualidade,
status social e redução de riscos. Se as pessoas tiverem o dinheiro,
preferirão comprar o original, porque, em geral, é a melhor versão.
Mas a maioria das pessoas só pode pagar pelas versões pirateadas.
(Ibid.: 206)
Segundo o autor, a pirataria na China não destruiu o mercado, mas ao
contrário o preparou para os novos consumidores da classe média emer-
gente e, ao mesmo tempo, beneficiou o mercado de luxo legítimo chinês,
um dos maiores do mundo. (Ibid.: 208)
Neste ponto, o autor nos apresenta o “paradoxo da pirataria”, baseado
na ideia de que as imitações podem ajudar o produto original, princi-
palmente na indústria da moda – o produto pirata massificaria o produto/
modelo anteriormente exclusivo e limitado, o que provocaria uma obso-
lescência mais rápida e contribuiria para que os consumidores tradicionais
das marcas deixassem de gostar do modelo e o substituíssem por um
modelo mais novo, saindo em busca novamente de algo exclusivo e novo.
Aqui retomamos a questão do consumo de luxo por diferentes classes so-
ciais, uma vez que é ponto pacífico que a pirataria possibilita que pessoas
com menor poder aquisitivo tenham acesso a modelos de luxo.
O fato é que estamos diante de uma realidade que não corrobora com-
pletamente a ideia de que o consumo do luxo pirata se dá prioritariamente
pelas camadas menos favorecidas da população. O fato do preço mais
baixo viabilizar a aquisição de determinado produto (desejado no original)
não é suficiente para explicar a motivação para a compra de um produto
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
202
pirata, sendo que então não se pode estabelecer como consequência lógica
que os produtos piratas, especialmente os de luxo, são comprados prin-
cipalmente por pessoas de nível social mais baixo. No Brasil, vemos
inclusive uma tendência que se afasta de tal afirmação: as classes AB con-
somem mais pirataria que as CDE2 e tudo indica que é o consumo de
luxo que está pesando na balança das classes mais altas.
Para além dos grandes números e da constatação de insuficiência do preço
como explicação única para a compra de contrafação, fomos entender
de forma mais aprofundada as motivações que sustentam o fenômeno,
realizando um exercício de cunho exploratório que visou dar caminhos
para as questões que se colocaram no início deste trabalho.
Neste estudo foram realizadas entrevistas em profundidade com uma
consumidora3 e uma vendedora4 de produtos contrafeitos, bem como
tivemos oportunidade de analisar os produtos comprados pela consumi-
dora em viagens para Hong Kong e aqueles que então estavam sendo
oferecidos pela vendedora, numa abordagem de fotoetnografia. A seleção
das entrevistadas possibilitou que tivéssemos por um lado um parâmetro
2. Conforme dados de pesquisa realizada pela Ipsos e Fecomércio em 2011, o consumo
de produtos contrafeitos é declarado por 57% dos brasileiros das classes AB, 52% daclasse C e 44% das classes DE. O consumo de CDs e DVDs é feito por 8 de cada 10indíviduos e o consumo pirata ultrapassou, pela primeira vez, a metade da população
atingindo 52%, o equivalente a 74,3 milhões de brasileiros – um acréscimo de 6 milhõesde brasileiros em 12 meses.
3. Entrevista realizada em 17/09/2011 com I.V., 44 anos, paulistana, separada,executiva da área de cosméticos, com longa carreira em empresas multinacionais de
consumo e vivência profissional e acadêmica no exterior. As fotos utilizadas neste artigoforam feitas na mesma data, na residência da entrevistada.
4. Entrevista realizada em 12/05/2012 com A.P.V.H., 35 anos, paulistana, casada.Fotos feitas na mesma data e retiradas do Facebook da vendedora.
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
203
do mercado de mais alto luxo, pela visão de uma consumidora de nível
social elevado e, por outro lado, do mercado mais popular, pelo olhar da
vendedora com sua clientela menos abastada, proporcionando impor-
tantes pistas para a análise com base em diferenças socioeconômicas.
Os relatos: o que nos dizem os atores do comércio pirata?
A consumidora entrevistada afirma nunca ter comprado produtos piratas
no Brasil em função da baixa qualidade. Sua motivação de compra em
Hong Kong foi a promessa de que os produtos piratas seriam manu-
faturados nas mesmas fábricas que produzem a marca original: “O que
me atraiu em Hong Kong foi saber que o produto tinha a possibilidade
de ter uma melhor qualidade, que vem da fábrica. Eles dizem que é pro-
duzida uma quantidade a mais e essa é que vai pro mercado informal pra
venda principalmente para turista. O que me falaram é que eles vendem
o excedente de fábrica.” O conflito ao lidar com uma prática ilegal e vista
de forma culturalmente negativa no Brasil foi amenizada de certa forma
na compra realizada no exterior: “Me parece que eu comprei algo mais
legalizado, é diferente de saber que foi feito numa loja de fundo de quintal,
com trabalho escravo.”
Apesar de ter comprado bolsas, relógios e joias, existem limites no tipo de
produto a ser comprado no mercado pirata: “Sapato eu não compraria em
hipótese nenhuma, tenho medo que afete a minha saúde. Cosméticos ja-
mais, uma sombra, imagina, um produto pro olho. Da Chanel, eu comprei
um batom original, paguei 60 dólares só no batom e fiquei muito feliz!”
Os limites da compra de piratas aparecem também na circunstância de
uso. No caso de uso pessoal, este consumo parece mais aceitável do que
numa ocasião para presentear: “Fiquei bem à vontade pra comprar,
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
204
porque [a compra] era pra mim. Não teria coragem de dar de presente
porque teoricamente não é original, eu prefiro dar uma marca mais sim-
ples, mas uma bolsa original.”
A consumidora também faz uma diferença entre o consumo de produtos
piratas populares e os mais sofisticados, de melhor qualidade. Existem,
portanto, diferentes níveis de produtos, de acordo com a qualidade e a
semelhança com o produto e marca originais, o que reflete também no
preço das mercadorias. Em Hong Kong, ela não fez compras em ruas
populares – preferiu agendar horários com vendedores que atendem em
salas comerciais ou que se locomovem até o hotel no qual o cliente está
hospedado. Ao falar sobre a compra de um relógio (figuras 1 e 2),
comenta: “Esse aqui, que é a imitação do Cartier, eu paguei 120 dólares.
Um relógio destes custa 15 mil dólares. E quando você segura, vê que é
um relógio que tem peso, não é igual a um de plástico, porque existem
imitações ruins também lá em Hong Kong.”
Figuras 1 e 2: Relógio “Cartier” (frente e verso)
Os vendedores de artigos piratas de luxo não comercializam todas as
marcas. “São as marcas que realmente são bem caras que ele tem: Hermès,
Cartier... Eu comprei essa pulseira Hermès (figuras 3 e 4). Essa eu paguei
80 dólares. Não é uma coisa de 10 reais de qualquer forma. Lá em Hong
Kong, que eu vi, tem a Ladies Street, em que você compra relógio por
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
205
até 10 dólares. É uma feira enorme, que vende tanto produtos chineses
como porta guardanapos, como as marcas. Aí tem Calvin Klein, Diesel,
Armani, as marcas mais comerciais.”
Figura 3 e 4: Pulseira “Hermès” (frente e verso)
O foco da entrevistada antes da viagem era comprar uma bolsa Hermès,
marca criada em 1837 e representante do chamado “luxo verdadeiro”:
“Meu sonho de consumo é a Hermès, estava disposta a pagar mais. Eu
pensei, se for caro prefiro comprar uma só. Quando eu cheguei lá, a bolsa
[Hermès] que eu queria não tinha qualidade.” A expectativa e a exigência
da consumidora em relação a uma bolsa falsificada dessa marca se mostrou
muito alta: “As outras [bolsas] são industrializadas, e a Hermès é feita à
mão. Se é um excesso [de produção de bolsas originais], só daria pra ter
uma ou duas. De longe, dava pra ver que não era uma bolsa Hermès.
Não era feia, a variedade, a cor, mas faltou um não sei o quê, a cereja do
bolo, não comprei.”
Podemos refletir se “a cereja do bolo” a que a consumidora se refere (e
que não foi encontrada na bolsa pirata) seria a chamada experiência
sensorial e emocional que acompanha o processo total da compra, seja a
partir da escolha da loja, a preparação para a ida ao local (a loja da marca)
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
206
e sobretudo o desembolso de uma soma considerável na aquisição de um
produto supérfluo. “Quando você olha a Hermès [pirata], você vê que
não é uma Hermès original, pelo padrão de qualidade, acabamento. Não
fica igual nunca. Até porque uma Hermès custa 30 mil reais, né? Que
ela venda uma por 150 dólares, não dá pra chegar perto do padrão.”
Como não encontrou a marca que desejava, a entrevistada passou a olhar
outros modelos e marcas e acabou comprando sete bolsas e diversas
carteiras e nécessaires. No caso das outras marcas que foram adquiridas
(Chanel, Marc Jacobs, Louis Vuitton), cujas expectativas eram menores,
ela acabou consumindo sem restrições: “Eu já não senti essa diferença
com a Louis Vuitton, todas que ela tinha eram lindas, bem acabadas.”
Uma faceta interessante nos rituais de consumo dos produtos pirateados
é que o consumo não se dá somente pela aquisição dos produtos, mas
também pelas evidências falsas que comprovem que o produto não é uma
imitação, como recibos de venda, garantias e etiquetas, que podem
inclusive ser comercializados sem o produto, para dar a um objeto
ordinário o status da marca de luxo.
A preocupação com tais evidências falsas, apontadas por Chris Anderson
(2009), se concretizam no depoimento e nos produtos comprados: “Ela
(a vendedora) tem a preocupação de colocar tudo nos saquinhos das
respectivas marcas.” Os produtos vêm acompanhados por outros itens
que “comprovam” sua origem – e que se tornam mais importantes de
acordo com a posição da marca na hierarquia do luxo. No caso da bolsa
Chanel (figuras 5 e 6), um dos itens mais caros adquiridos pela compra-
dora, o conjunto de evidências tem direito até a um cartão de autenti-
cidade com um número da bolsa (figuras 6 e 7). Além disso, folhetos que
explicam o processo de produção da marca e história de tradição (figura
8), com o seguinte título: “Chanel: uma mulher, um nome, uma lenda.”,
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
207
reforçando os aspectos de legitimidade e tradição fortemente associados
às marcas de luxo, em conjunto com uma identidade caracterizada por
elementos de estilo essenciais à marca Chanel: logotipo, símbolo,
correntes, matelassê, etc.
Figuras 5 e 6: Bolsa “Chanel”
Figuras 7 e 8: Certificado de “autenticidade”
Figura 9: Interior de folheto que acompanha bolsa “Chanel”
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
208
Além disso, os modelos mais recentes são mais caros que os das coleções
passadas, seguindo a lógica do mercado de moda. Os vendedores fazem
promoções para que os produtos antigos sejam comprados rapidamente.
Finalmente, o apelo do consumo e das marcas numa situação diferente
da vivida em seu país de origem, longe do contexto cultural e social
cotidiano, parece muito forte, quase irresistível: “O estímulo é tão grande
pra comprar coisas das grandes grifes por preços acessíveis que você não
resiste. Você vê todo mundo comprando, dá vontade de comprar. Você
se sente dominado pelo bichinho de querer comprar uma grife.”
Esse desejo parece mais forte do que o risco associado a uma compra ilegal,
que é assumido, mesmo com receio: “Dá um pouco de medo. Não dão
nota fiscal. Como eu estava sozinha, fiquei com medo, você pode ser
assaltada, o produto não é de boa qualidade, meio Paraguai. “Dá um
medinho. Mas a mulher, pra consumir, faz qualquer negócio.”
Figura 10: carteiras compradas na China
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
209
Se, por um lado, a consumidora em questão bem representa as consu-
midoras de nível socioeconômico mais elevado, a entrevista com a ven-
dedora nos dá uma posição diferente, uma vez que sua clientela é consti-
tuída por mulheres e homens de classe média e média/baixa: são
empregados do comércio, funcionários do serviço público em geral,
gerentes e donos de lojas, manicures, cabeleireiros e seus clientes.
Seu trabalho se constitui em comprar bijuterias, cintos, lenços, carteiras,
relógios e bolsas na Rua 25 de Março, conhecida via de comércio popular
em São Paulo e revendê-los na capital e em uma cidade do interior do
estado. As compras são feitas semanalmente e ela mantém na sua rota
algumas lojas em que é freguesa assídua, nas quais consegue inclusive tro-
car peças que apresentem defeito. “Os chineses – ou coreanos, sei lá – se
você fica comprando direto com eles, se dá defeito eles trocam”.
A maioria dos seus produtos não é de marca, inclusive boa parte das bolsas
que vende é um tipo de produto que ela denomina de “normal” e nós
podemos chamar de genérico: são aquelas inspiradas nas tendências e
estilo encontrados nas coleções de marcas conhecidas, mas que não pre-
tendem ser idênticas aos modelos lançados por essas empresas e nem
levam qualquer marca. A vendedora cita as nacionais Arezzo e Schutz
como principais fontes das tendências, mas entre os modelos que ela tinha
para vender, há uma bolsa inspirada na Birkin da Hermès, mas não é assim
reconhecida por ela, talvez pelo fato de que as marcas nacionais já tenham
fartado suas vitrines com as chamadas “releituras” do tradicional modelo.
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
210
Figura 11: Exemplos de bolsas sem marca
É entre bolsas e relógios que encontramos os produtos com marca, em
duas categorias distintas: réplica e cópia. Segundo a vendedora, a principal
diferença entre elas é a qualidade do material, sendo as cópias bem
inferiores às réplicas e, por esse motivo, afirma que não mais comercializa
esse tipo de produto. A réplica é “igualzinha a que está no mercado, eles
copiam tudo, tem até nome nos botõezinhos, a alça é reforçada, por den-
tro tudo forrado com o nome, é um pouco mais cara, mas vai durar”.
As réplicas comercializadas por essa vendedora não chegam a custar 10%
do valor da original para a consumidora final e são geralmente das marcas
Louis Vuitton, Victor Hugo e Michel Kors, certamente marcas “mais
comerciais”, conforme esclareceu nossa consumidora classe alta.
A vendedora tem conhecimento de que há um segmento diferenciado
daquele que ela trabalha, ao analisar marcas de mais alto luxo: “Agora
entrou essa Hermès, é uma das bolsas mais caras que tem, antes eram só
as estrelas de Holywood que usavam essas, agora já tem lá [na Rua 25 de
Março], só que essas são bem caras pra comprar, eu não trouxe nenhuma,
porque para comprar está uns R$ 200, eu teria que vender por R$ 500,
ninguém paga, porque R$ 500 você compra uma bolsa da Arezzo, da
Corello, da Schutz, da Capodarte, e de couro!”
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
211
Isso poderia nos indicar que há um limite de gasto aceito para comprar
artigos não originais ou que, ao mesmo preço, a preferência se daria por
um produto original, ainda que de marca menos prestigiosa (neste caso
as nacionais) a um produto falsificado de marca com maior prestígio (as
importadas). Mas, ao ouvir mais atentamente a vendedora, entendemos
que a régua não está colocada no preço, mas no próprio luxo.
Em outras palavras, o que ocorre é que estas consumidoras de classe mais
baixa nem sempre se sentem a vontade para ostentar um nível de luxo
que não se encaixa no seu contexto social e de vida. “Elas falam: não tem
cabimento, quem vai me ver com uma bolsa dessas sabe que não tenho
condições de comprar a original”.
Aqui o luxo se tornaria kitsch, ultrapassando o limite - subjetivo, pois
estabelecido pelo senso de cada um – do que seria o aceitável naquele
gradiente que estabelece o que estaria em conformidade com a situação
social (ou imagem criada) de cada consumidora.
Sendo assim, apenas pequena parcela das freguesas desta vendedora
compra as réplicas, aquela parcela que “tem condições de ter a bolsa
original, e as pessoas não vão achar que é falsificada. Estas podem usar
porque só quem entende muito vai dizer que não é [original]”.
Figura 12: Exemplo de réplicas - Bolsa e relógios “Michel Kors”,carteiras “Louis Vuitton” e “Hermès”
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
212
Figura 13: Réplicas “Chanel” e “Hermès”, oferecidas pelo Facebook da vendedora.
Considerações finais
Ao final deste percurso, foi possível dar encaminhamento aos questio-
namentos inicialmente colocados, em especial entender possíveis dife-
renças nas atitudes de consumidores de distintos níveis socioeconômicos.5
Entendemos que, embora seja a pirataria uma alternativa e uma forma
de democratização do consumo na sociedade contemporânea, ela está
inserida no mesmo sistema que transfere os significados do universo cul-
turalmente constituído para o produto e deste para o consumidor, tendo,
5. Assumir a busca por estas diferenças evidencia nossa postura analítica, a qual considerao contexto social, econômico e, consequentemente cultural, como fatores de influência
no comportamento dos consumidores em geral e especificamente no que tange àaquisição de produtos contrafeitos. Entretanto, nosso entendimento não desconsiderao que é assinalado por Featherstone: que “o processo de decodificação do significado e
uso dos bens pelos indivíduos são complexos e problemáticos”. (FEATHERSTONE, 1995:123) e que não podemos imaginar que haja uniformidade absoluta do consumo (e deseu significado) dentro de uma determinada classe social. O que pretendemos, neste
estudo de cunho exploratório e inicial, é levantar a questão sobre a contextualizaçãosocioeconômica do uso do bem adquirido, indicando possíveis caminhos de reflexão eaprofundamento a partir das evidências encontradas.
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
213
potencialmente, a mesma capacidade comunicativa dos produtos origi-
nais, uma vez que carrega os mesmos signos divulgados pelos vetores
“oficiais” – publicidade e moda.
Entretanto, aqui se abre uma discussão para o contexto socioeconômico
e de disponibilidade de renda, que, não obstante possa impactar o aspecto
cultural e do gosto,6 por si só recoloca a questão do preço em um novo
quadro.
O que se vê é que o preço (baixo) do produto pirata é motivador relevante
para aqueles que almejam obter o bem de luxo e poderiam adquiri-lo no
mercado formal. Para estes, há a vantagem em ter o mesmo produto, sem
prejuízo em qualidade, na forma contrafeita. Aqui o preço representa uma
vantagem que pode ser aproveitada, sem que o fato de ter realizado uma
“compra esperta” prejudique o potencial comunicativo do bem adquiri-
do, uma vez que, nesse contexto, o fato não será do conhecimento dos
demais.
De forma distinta, para aqueles que não têm condições de adquirir as
marcas de luxo originais, o que importa não é o preço baixo do produto
falsificado, mas sim o preço (alto) do produto no original, que servirá
como balizador da credibilidade que o uso do produto pirata irá transmitir
aos demais. Sendo evidente que o original custa muito mais do que o
6. A discussão da influência do nível econômico sobre o padrão cultural e sobre o gostoestético é bastante densa e não cabe ser discutida neste trabalho. Sobre o tema, ver por
exemplo CALDAS, W. A Utopia do Gosto, São Paulo: Brasiliense, 2009 e FOGAÇA, J.“O Consumo, o Gosto, a Ponte e a Cerca: um estudo exploratório sobre gosto ereferências estéticas em propagandas dirigidas à baixa renda” in III Pró-Pesq PP –
Encontro Nacional de Pesquisadores em Publicidade e Propaganda (2012: São Paulo,SP) – Deve haver mais pesquisa na publicidade porque é assim que se conquista a realbeleza. Organizado por Eneus Trindade e Clotilde Perez. São Paulo: Schoba, 2013.
Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato
214
seu portador pode pagar, os signos do produto pirata perdem sua
legitimidade, pois não estabelecem um lastro com a realidade social e
cultural deste e o consumo perderá assim o sentido pretendido de ser a
ponte ou a cerca que gera o pertencimento ao grupo e se tornará kitsch.
Em ambos os casos, está presente o que chamamos de “desejo autêntico”,
baseado no valor da marca original e no reconhecimento deste, mas
apenas para aqueles que podem saciar seu desejo no mercado formal é
permitido usufruir, sem perda comunicativa dos significados expressos
pela marca, de uma “compra esperta” a preços mais baixos.
Não obstante haja frequentemente o impulso para aproveitar as
oportunidades de bons negócios oferecidos pelo mercado pirata (ao que
denominamos “desejo simulacro”), o uso dos produtos adquiridos parece
sempre merecer uma reflexão sobre o que ele vai comunicar, sobre o que
vai dizer de seu portador, e nessa reflexão pesam os contextos social e
econômico do consumidor, pois embora os signos estejam sendo trans-
feridos a partir de um objeto não autêntico, o significado a ser comuni-
cado e o sentido pretendido são sempre legítimos.
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Webgrafia
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217
Tepito, Cidade do México – DF:
A Versão Mexicana da Região da 25 de MarçoPaulistana e suas Adjacências
JEFFERSON HUGO PACHECO DE REZENDE
São Paulo e Cidade do México são consideradas por muitos pesqui-
sadores como as duas principais metrópoles latino americanas, seja por
seus gigantismos, seja por seus posicionamentos estratégicos do ponto
de vista econômico ou pelas similaridades em seus processos sócio-
organizativos, sobretudo se observarmos as duas urbes a partir do e finais
da década de 80, quando ambas as conurbações iniciam sua inserção no
movimento da globalização e aos poucos vão migrando sua base produtiva
baseada em uma economia indústria para uma base amparada no modelo
econômico-financeiro.
Se pensarmos nos milhões de habitantes que vivem na Grande São Paulo
(RMSP) e na Grande Cidade do México (RMCM), enxergaremos aí uma
das possibilidades de aproximação dentro de uma ótica analítica que
possibilite esboçar um quadro comparativo entre as duas metrópoles,
contudo, ao ampliarmos um pouco mais nosso olhar, perceberemos que
as semelhanças entre elas vai muito além do volume populacional e a
quantidade de riqueza que cada uma destas aglomerações urbanas gera
internamente para seu país e as contribuições que cada uma delas oferece
à economia internacional, seja no mercado formal ou informal.
Jefferson Hugo Pacheco de Rezende
218
Assim como toda cidade latino-americana, São Paulo e Cidade do México
experimentam o melhor e o pior da dualidade que os países em transição
econômica enfrentam. Considerados países emergentes, ambos atraves-
saram a década de 1990 do século XX compartilhando problemas e espe-
lhando a pujança econômica que alguns extratos de suas respectivas
sociedades alcançavam. Ambas as metrópoles concentram cerca de 40%
da produção do PIB,e expõem em suas ruas as disparidades sociais que
tal fenômeno potencializa, basta caminhar por suas ruas e avenidas.
Habituado a frequentar com certa regularidade a região central da capital
paulistana, e como habitante e consumidor local, sempre busquei a região
da Rua 25 de Março para consumir produtos de apelo popular a um preço
acessível, pois graças à concentração de atacadistas e varejistas esta região
oferece produtos populares à preços bastante atrativos. Conjugado a esta
oferta de produtos a região da 25 de Março também é um dos polos de
concentração e comercialização de artigos piratas, embora não seja o único
polo paulistano de comercio de pirataria, mas talvez se não for o principal,
certamente é o que oferece maior variedade de produtos e preços. O que
passarei à relatar daqui em diante é uma mescla das experiências empíricas
que tive quando das diversas visitas à capital mexicana, (com a peculiar
observação de um estrangeiro) associada a algumas referências utilizadas
como base bibliográfica quanto participei do grupo de pesquisa sobre a
Requalificação Urbana do Centro Histórico da Cidade do México, dirigido
pela Dra. Patrícia Olivera Martinez da Facultad de Filosofía y Letras (FfyL)
da Universidad Nacional Autónoma de Mexico – UNAM, em 2010.
Ainda estudante de graduação, eis que em outubro de 2006 visito a
Cidade do México pela primeira vez, por ocasião de um congresso do
qual participaria na semana seguinte à minha chegada. Após ser
conduzido por um grupo de amigos também estudantes e todos mexi-
canos por diversas áreas da capital: C.U., Polanco, Insurgentes Sur, Zona
Tepito, Cidade do México-DF: A Versão Mexicana da Região da 25 de Março ...
219
Rosa e la Condesa, todos bairros (localmente chamados de Colonias),
ao cair da tarde fui levado ao Centro histórico, para visitar a Catedral e o
Zócalo, (a principal praça do país – palco de manifestações políticas e
sociais mexicanas – como as que acompanharia ainda nesta mesma viagem
dias depois , quando da posse do atual presidente Felipe Calderón). Após
um empolgante jantar em um Sanborns instalado na casa de los Azulejos
(edifício emblemático do período colonial com sua atual fachada datada
de 1737), decidimos ir apreciar as apresentações de mariachis em uma
outra zona cêntrica chamada Garibaldi.
Como estávamos a passeio, e os meninos queriam mostrar tudo o que
podiam para mim, deixamos o carro em estacionamento perto dali e
seguimos caminhando até Garibaldi, que na verdade não era muito longe
dali, contudo para me mostrarem um pouco mais da cidade, meus amigos
resolveram fazer um caminho “distinto” e um “pouco mais longo” que
o habitual...
Ao passo que íamos caminhando e entrando nas ruas com edifícios his-
tóricos cada vez menos preservados e gradualmente mais movimentadas,
me deparava com os pensamentos (atrelados à minha condição de estran-
geiro) de que tal quadro urbano era comum às diferentes cidades latinas
e que São Paulo também era assim em seu centro. Seguimos caminhando
e começamos a ter que desviar das barracas e lonas estendidas no chão
que expunham produtos e brinquedos, e neste momento tive a ligeira
impressão que estava caminhando pelas travessas da 25 de Março, ou
sendo um pouco mais imaginativo, pelo calçadão da calle Florida, no
microcentro de Buenos Aires, Argentina.
Passavam das 22 horas de um sábado frio do outono mexicano, e o
comércio popular informal fervilhava como se fossem 10 da manhã de
uma quarta-feira. Ao passo que caminhávamos pessoas se aproximam
Jefferson Hugo Pacheco de Rezende
220
expondo produtos supostamente originais a preços quase inacreditáveis,
como por exemplo um indivíduo que se aproximou e abrindo sua jaqueta
me mostrou um relógio esportivo da marca Puma, que supostamente era
original ao custo de MXN 250,00 (pesos mexicanos), o que daria aproxi-
madamente à cotação da época uns USD 20,00 (dólares estaduniden-
ses)... E assim os produtos eram oferecidos de bolsas femininas (réplicas
de marcas famosas e desejadas como Prada, Louis Vuitton e Gucci) à car-
tazes com fotos de softwares e cuecas das marcas Calvin Klein e D&G.
Homens, mulheres e muitas vezes garotos nitidamente ainda na adoles-
cência eram os comerciantes daquela região seja nas barracas montadas
na forma de tiangues (a mesma forma organizativa observada nas feiras
livres brasileiras) e nas lonas que dividiam o corredor formado pelos
tiangues em dois por onde os transeuntes passavam. Os produtos expostos
nestas lonas iam de artigos de cozinha à utensílios domésticos, passando
por produtos têxteis (meias e roupas íntimas femininas) e óculos ( igual-
mente réplicas de produtos originais comercializados formalmente e a
preços surpreendentemente maiores no chamado Circuito Superior da
economia).
Como nosso destino final eram as apresentações dos mariachis em praça
Pública, retomamos a rota para lá e aos poucos fomos nos distanciando
de Tepito, que até este momento eu nem sabia que existia e tão pouco
que tivesse essa denominação. Quando por fim chegamos à Garibaldi,
comentei com uma de minhas amigas, que aquele lugar por onde passa-
mos se parecia muito com uma área de São Paulo, onde o comercio po-
pular dividia o espaço com a comercialização de artigos piratas e produtos
“da China”... Ela só sorriu e me disse: “Tepito está internacional enton-
ces... el bairro bravo, llegó al sur...”, e trocou de assunto voltando a
comentar sobre amenidades à cerca da Cidade do México.
Tepito, Cidade do México-DF: A Versão Mexicana da Região da 25 de Março ...
221
Dias depois, saindo da biblioteca central já no campus da UNAM, cruzei
com um pesquisador que já havia estado em nosso departamento
realizando seu intercâmbio, e conversando sobre minhas primeiras
impressões mexicanas, ele me pergunta o que já havia conhecido e entre
os diversos lugares citei Tepito, onde observei uma mudança em sua
expressão facial que denotou espanto, que se intensificou quando lhe
comentei que a tal visita havia ocorrido numa noite de sábado. Neste
momento este conhecido me explicou que Tepito (para mim a versão
mexicana da região da 25 de Março) era uma região tida como a mais
perigosa da capital mexicana, e que segundo ele a presença do comércio
informal facilitava a ação de delinquentes, trombadinhas e até traficantes
que se misturavam às massas consumidoras e aos ambulantes para
concretarem suas práticas criminosas.
A princípio me espantei com a informação, pois de fato essa primeira
impressão não me remetera a uma situação de perigo eminente como ele
afirmava, senão apenas a uma zona que conjugava o comércio informal
e a venda de produtos supostamente furtados porém de marcas
prestigiadas, igualmente ocorre na já referida região da 25 de Março em
São Paulo.
Cerca de 1 mês e meio depois retornava eu ao Brasil, justo às barbas do
natal, e havia decidido realizar minhas compras natalinas na região central
paulistana, e agora depois de quase dois meses, embora minha visita aqui
tenha sido vespertina, voltei a me deparar com a mesma situação viven-
ciada meses antes em Tepito, porém desta vez espremido entre as massas
consumidoras que entravam e saiam desesperadamente das lojas com suas
sacolas abarrotadas de “lembrancinhas de fim de ano”.
Os anos se passaram e voltei algumas vezes mais à Cidade do México,
embora sempre fosse passear, ou resolver alguma coisa nas proximidades
Jefferson Hugo Pacheco de Rezende
222
do Zócalo e da Casa de los Azulejos, não regressara até então à Tepito. Mas
em fins de 2009, 3 anos depois de chegar à capital mexicana pela primeira
vez, me fixei ali para realizar parte da pesquisa que desenvolvo através
de um intercâmbio de 6 meses, onde o consumo de produtos do segui-
mento prime em São Paulo e na Cidade do México são os objetos de
estudo. Contudo o intercâmbio previa atividades de pesquisa junto a um
grupo de estudos já operante na instituição que me acolhera. Então, iniciei
formalmente minhas atividades junto ao grupo da Dra. Patrícia Olivera,
como já mencionado anteriormente.
Embora a pesquisa dirigida pela Dra. Patrícia O. inicialmente fosse orien-
tada para o estudo das políticas públicas que poderiam ser empregadas
no processo de requalificação do centro histórico da Cidade do México,
ela me orientou a analisar os processos de consumo tanto de produtos
quanto do espaço, e esta então seria minha contribuição para o grupo.
Ainda que Tepito não fosse o centro de nossa área de estudo, era uma
região lindeira que seguramente produziria impactos na área principal,
seja pelas atividades praticadas ali ou por sua fama de “barrio bravo”.
Pesquisando sobre a formação da região central da capital mexicana, veio
o primeiro baque que um pesquisador brasileiro, com cabeça de pesqui-
sador brasileiro podia ter: ora, vivemos num país que nasce como país
há pouco mais de 500 anos, e nossas cidades, sobretudo São Paulo, ainda
nem têm essa idade e muitos dos processos que explicam suas atuais
realidades socioeconômicas se não são contemporâneos, têm suas raízes
em poucos décadas atrás, raramente esses fatos possuem idade superior a
100 anos.
Já a Cidade do México por sua própria história sócio-organizativa é
secular, e já tinha suas raízes atuais fincadas desde a época pré-colombiana.
E Tepito não foge a esta regra.
Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo
223
Com base em bibliografia específica constata-se que já no período pré-
hispânico, quando a atual Cidade do México ainda levava o nome de
Tenochtitlan, Tepito (Tecualhtepiton, em seu nome mexica) se configu-
rava em um ponto fronteiriço ao norte, com a cidade de Tlatelolco até que
está foi dominada pelos índios mexicas e conurbada à Tenochtitlan, e já
desde essa época a principal atividade desenvolvida pelo habitantes de
Tepito eram as trocas comerciais com habitantes de outros povoados.
No período colonial, já parte oficial da capital mexicana, Tepito se
configura em um dos parcelamentos habitacionais de administração
indígena mais prósperos e ricos da municipalidade, chegando a ser um
dos credores da municipalidade. É ali também que se cria um posto de
impostos para ingressar mercadorias na praça principal da municipalidade
com a criação da chamada Garita de Tepito.
Os anos passaram e as funções urbanas de Tepito sempre oscilaram entre
a residencial e a comercial. Se em princípios do século XX se instalaram
ali operários e artesãos,sobretudo sapateiros, nos tempos da globalização
Tepito também se globalizou e passou a se parecer cada vez mais com
outras zonas de comércio popular e de produtos piratas recorrentes nas
principais cidades latino americanas.
Durante o tempo de residência na Cidade do México, tive oportunidade
de voltar algumas vezes a Tepito, só, ou acompanhado por locais e
estrangeiros. E as experiências eram sempre similares, bem como as
observações dos companheiros de incursão. A diferença era que visitar a
zona durante o dia além de ser mais recomendável e segura, permitia
observar uma outra similaridade entre a zona de comércio popular
paulistana e a mexicana: a presença de atacadistas.
Também na versão mexicana, o comércio ilegal de artigos contrabandea-
dos, furtados e sobretudo os piratas, que são sem sombra de dúvida os
Jefferson Hugo Pacheco de Rezende
224
mais abundantes, convivem lado a lado com os comerciantes que
revendem produtos legais (embora grande parte seja produzida no oriente,
sobretudo na China e na Índia). A organização espacial é a mesma obser-
vada em São Paulo: no interior dos galpões e salões comerciais, encon-
tram-se os praticantes do comércio formal, onde é possível se conseguir
nota fiscal e até mesmo garantia dos produtos comprados, já em suas
calçadas estão os tiangues ou as lonas postas ao solo, e os tepiteños que
caminhando entre os transeuntes expõe e oferecem seus produtos que
podem variar de cd’s em formato MP3 ou discografia completas (vendidas
por 5 pesos no atacado e a 10 pesos no varejo), brinquedos (estes muitas
vezes de procedência oriental), remédios e bebidas alcoólicas (quase sem-
pre adulteradas), jóias e perfumes tanto piratas como artigos introduzidos
no país de formal ilegal ou contrabandeada ( no caso dos originais), até
mesmo DVD (convencionais ou em Blue Ray ao custo de 45 pesos, apro-
ximadamente US$ 3,60) tanto convencionais, quanto lançamentos que
muitas vezes ainda nem estrearam nas telas mexicanas, bem como os de
apelo pornográfico.
Um mercado no qual os comerciantes de Tepito estão se tornando refe-
rência entre os consumidores desta classe de filmagens, ali é possível
encontrar gravações supostamente feitas em móteis baratos da capital sem
que os hóspedes fossem notificados à filmagens de pornografia infantil
feitas em paraísos caribenhos como Cancún e Isla Mujeres.
O mais impressionante nesta última visita à Tepito, foi ao sermos reco-
nhecidos como “forasteiros” por um ambulante local que comercializava
relógios da marca Louis Vuitton, a oferta de títulos de graduação mestrado
e doutorado emitidos pela UNAM e pelo IPN – Instituto Politécnico
Nacional, segundo ele poupando assim anos de vida dura nos bancos da
Universidade.
Tepito, Cidade do México-DF: A Versão Mexicana da Região da 25 de Março ...
225
Neste sentido Tepito, vai além e deixa para trás seu par paulistano. Con-
tudo as diferenças entre uma zona comercial e outra parecem ser tão
poucas que muitas vezes se esquece que estamos em Tepito e quase
buscamos pela Ladeira Porto Geral. Contudo assim como a região da
rua 25 de Março a região mexicana gera números impressionantes por
conta de suas atividades comerciais.
De acordo com dados da Procuradoria Geral da República (México), a
nível nacional atualmente a economia ilegal é responsável por 20% do
PIB mexicano, sendo que o comércio ilegal gera perdas da ordem de
US$12,5 bilhões anuais, o mais irônico é que Tepito se localiza somente
a umas poucas quadras da sede da Procuradoria Geral da República,e é
justo em Tepito que se vendem 7 de cada um dos 10 produtos piratas
que se consomem no México.
Representações Espaciais de Tepito:
Mapa Comercial da Zona de Tepito:Diferenciação dos usos comerciais na Zona de Tepito
Jefferson Hugo Pacheco de Rezende
226
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http://letraslibres.com/revista/convivio/bienvenidos-tepito?page=full – visitadoem 16-09-2011.
227
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
Resultados de Pesquisa Coletiva Realizada pelos Integrantes doGESC3
JÔSE FOGAÇA, SILVIO K. SATO, CLOTILDE PEREZ, ALHEN DAMASCENO,CECÍLIA CURY, LAWRENCE KOO, CINIRA BAADER, RAQUEL CARDOSO
Participaram da pesquisa de campo os seguintes integrantes do GESC3:
Bruno Pompeu, Silvio Sato, Cinira Baader, Alhen Rubens, Raquel Car-
doso, Maria Cecília Cury, Lawrence Koo, Janiene Santos, Clotilde Perez,
Eneus Trindade, Andrea Meneghel, Gabriela Ayer e Jefferson Rezende. O
presente texto é decorrente da conciliação dos resultados da vasta pesquisa
teórica e empírica empreendidas pelo grupo. Explicita o esforço de
congregar os distintos relatórios anteriormente produzidos pelas duplas de
trabalho de campo, com a reflexão teórica aportada pelos textos dos autores
lidos e também pelas palestras e discussões promovidas pelo GESC3.
Até aqui já se sabe que o GESC3 proporcionou ampla e profunda dis-
cussão sobre o tema da contrafação – aqui sendo utilizado o termo pirata
com maior recorrência –, mergulhando no estudo de suas diferentes
facetas, de seus variados conceitos, buscando entender os elementos moti-
vadores e os seus sentidos na cultura. Junto a esse trabalho teórico, o
Grupo desenvolveu uma pesquisa empírica de base etnográfica que possi-
bilitou o contato direto com os atores do comércio pirata: consumidores,
vendedores, transeuntes e trabalhadores que movimentam esse mercado
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
228
e que deram voz, ilustraram, auxiliaram na interpretação ou ainda algumas
vezes, puseram a baixo as hipóteses iniciais levantadas durante nossas
reuniões e leituras.
O universo de pesquisa
Considerada o maior centro comercial da América Latina, a rua 25 de
Março em São Paulo é um ícone do comércio popular etambém um
grande centro de venda de produtos importados e contrafeitos.Originou-
se com as lojas atacadistas de tecidos, implantadas pelos imigrantes sírios
e libaneses, que faziam promoções de suas mercadorias a preços muito
baixos após as constantes enchentes que ocorriam no local, dando início
à tradição de ofertas e promoções nas lojas locais.
Nos anos 80 a rua25 de Marçodiversificou sua variedade de produtos com
a chegada dos comerciantes de artigos de época (Carnaval, Páscoa, Natal
etc.) e, na mesma década, instalaram-se no local comerciantes deoutras
etnias, majoritariamente coreanos e chineses, que trouxeram os “impor-
tados” para a região, principalmente para a galeria Pajé.1
Figura 1: foto da Rua 25 de Março, São Paulo-SPFonte: GESC3 2011
1. Conforme Estadão.com.br: http://economia.estadao.com.br/especiais/a-torre-de-babel-do-consumo%2c119411.htm
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
229
A rua costuma receber uma média de 400 mil frequentadores diários,
chegando a 1 milhão quando próximo de festas como Natal. Eles buscam
os mais variados produtos em suas 350 lojas e 3000 estandes em
shoppings, galerias e prédios que se concentram em seu entorno, além
dos 2000 ambulantesespalhados pelas calçadas.2
Figura 2: mapa dos principais centros de comprasno entorno da rua 25de março, São Paulo-SP
Fonte: reprodução da Internet Google Maps
Além do centro comercial em São Paulo, nosso maior foco de investi-
gação, a pesquisa estendeu-se também para outro importante pólo na
Capital Federal, a Feira dos Importados em Brasília, a região da rua
Uruguaiana no Rio de Janeiro, mais conhecida como Saara e para a feira
do bairro de Tepito na Cidade do México.
Em atividade desde 1997, atualmente a Feira dos Importados de Brasília
conta com 1990 boxes e 96 quiosques, ocupados por 1.758 permis-
2. Conforme Guia da 25 de Março: http://www.guiada25.com.br/historia_da_25demarco.asp
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
230
sionários que comercializam produtos alimentares e não alimentares,
nacionais e importados, eletro-eletrônicos, móveis, roupas, artigos para
o lar, som automotivo, informática, além de serviços.3
Figura 3: Feira dos Importados – BrasíliaFonte: Foto reprodução da Internet
http://www.feiradosimportados.com.br
A Feira de Tepito na Cidade do México é muito tradicional e antiga e
costuma funcionar dia e noite. A organização espacial é a seguinte: no
interior dos galpões e salões comerciais, encontram-se os praticantes do
comércio formal, onde é possível se conseguir nota fiscal e até mesmo
garantia dos produtos comprados, já em suas calçadas estão os “tiangues”
– as barracas – ou as lonas postas ao solo, e os tepiteños que caminhando
entre os transeuntes expõem e oferecem seus produtos originais e
contrafeitos.
3. Conforme site Fonte: http://www.feiradosimportados.com.br/, acesso em abril 2013
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
231
Figura 4: Feira de Tepito – Cidade do MéxicoFonte: Foto reprodução da Internethttp://www.barriodetepito.com.mx
Outro locus da pesquisa de campo foi a região da Saara, no Rio de Janeiro.
As ruas do que é hoje a Saara foram urbanizadas ainda no século XVIII,
décadas antes da chegada da corte portuguesa no Brasil. A principal rua
da região, a conhecidarua da Alfândega, é também a mais antiga. Ela
existia já no século XVII, com o nome de Caminho do Capueruçu.
Figura 5: Mapa da Saara – Rio de Janeiro.Fonte: www.comprenasaara.com.br
Como era bem próximo ao porto,4 este local também serviu como abrigo
aos inúmeros imigrantes sírios, libaneses, judeus, gregos, turcos, espa-
nhóis, portugueses e argentinos, que chegaram ao Brasil no final do século
XIX e início do século XX. Alguns deles, fugidos da primeira guerra
4. Conforme site www.comprenasaara.com.br
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
232
mundial, descobriram no Brasil um país de paz, com perspectivas me-
lhores para o futuro e muitos deles encontraram no comércio seu sustento
e possibilidade de cidadania.
Começaram a trabalhar para sustentar suas famílias, tradicionalmente nu-
merosas. Inicialmente, trabalhavam como mascates, que eram os vende-
dores ambulantes que carregavam maletas onde era encontrado “de um
tudo”, e que comercializavam suas mercadorias nas ruas, no modelo
“porta a porta”.
Com o desenvolvimento de suas atividades, os mascates foram se estabe-
lecendo em lojas que funcionavam no andar térreo de sobrados, onde a
parte superior era utilizada como residência.
O comércio na região da Saara funcionava muito antes da fundação da
Sociedade, que teve como principal objetivo, aumentar a voz ativa dos
comerciantes locais junto ao poder público. Este fato ocorreu no então
governo de Carlos Lacerda, que no intuito de remodelar o centro,
construiria uma “Via Diagonal” que ligaria a Central do Brasil à Lapa,
desabrigando todos os moradores daquela região.A necessidade de pro-
testar contra a reforma, fez com que os comerciantes se unissem na forma-
ção de uma sociedade, que reunindo mais força, pudesse ser melhor
ouvida pelas autoridades e por sugestão do próprio governador, foi
fundada a SAARA.
A Saara – A SOCIEDADE DE AMIGOS DAS ADJACÊNCIAS DA
RUA DA ALFÂNDEGA é uma associação formada em 19625 pelos
comerciantes de uma das mais antigas e dinâmicas áreas comerciais do
Rio de Janeiro, tornou-se de tal maneira popular que passou a identificar
todo o trecho do centro do Rio circundado pelas ruas dos Andradas,
5, Conforme site www.saarario.com.br
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
233
Buenos Aires, Alfândega e Praça da República.Na Saara, região de comér-
cio popular a céu aberto, é possível encontraruma ampla variedade de
mercadorias. Composta por 1200 estabelecimentos comerciais, distri-
buídos em suas 11 ruas, abrange inúmeros ramos de atividade: confecções,
cama, mesa e banho, brinquedos, ferragens, jóias, bijuterias etc...
Figura 6: Região da Saara, Rio de Janeiro.Fonte: foto Clotilde Perez
Para o GESC3, foi importante conhecer um pouco da história da região,
pois, na primeira impressão, todos imaginavam que o nome Saara era
decorrente da analogia com o deserto africano, uma vez que o calor é
imenso! Ledo equívoco histórico, mas perfeitamente possível como ficção
e metáfora vivida.
Sobre o método de coleta de dados
A pesquisa foi conduzida utilizando-se o método qualitativo com abor-
dagem fotoetnográfica (ACHUTTI, 2004) e baseada em entrevistas via
roteiro semi-estruturado, realizadas com vendedores epotenciais com-
pradoresnos centros comerciais selecionados e descritos acima.
O campo foi realizado nos meses de março e abril de 2011, setembro de
2011 e julho de 2012, pelos pesquisadores do GESC3, organizados em
duplas ou trios, em diferentes dias da semana.
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
234
Foram realizadas 12 entrevistas com compradores em São Paulo, 2 no
Rio de Janeiroe 8 com vendedores, sendo 6 em São Paulo e 2 em Brasília.
Devido à situação da entrevista (abordagem em ponto de fluxo e dentro
das lojas/boxes ou próximo às barracas de rua), a duração de cada uma
foi de, em média, 15 minutos, durante os quais foram mapeados os
seguintes aspectos:
– Breve histórico sobre o consumidor/vendedor
– Freqüência de visita à rua 25 de Março/ tempo de atuação
– O que busca / costuma comprar / vender
– Onde compra / origem dos produtos
– Para quem compra/vende
– O que busca nos produtos (atributos), quais critérios de escolha
As entrevistas foram gravadas e, ao final, foi solicitada uma fotografiada(o)
entrevistada(o).
O processo da entrevista: experiências no campo pirata
Figura 7: interdição do Shopping 25 de marçoFonte: GESC3 2011
Os pesquisadores não tiveram uma recepção muito amistosa ao chegar
ao local das entrevistas. Uma das duplas tinha inicialmente a Galeria Pajé
e o Shopping 25 como territórios de campo, porém, devido justamente
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
235
a uma ação contra pirataria realizada dias antes pela Guarda Civil Metro-
politana de São Paulo, ambos os estabelecimentos estavam inativos e
fechados. Optou-se por alterar o local das entrevistas para outra galeria
na mesma rua 25 de Março, que se mantinha em funcionamento.
Já no novo terreno, os pesquisadores não foram bem aceitos, tendo sido
chamados pela administração da galeria e advertidos sobre a proibição
de realizarem entrevistas no local. Após as devidas explicações, que
incluíam tratar-se de pesquisa de cunho acadêmico, e tendo havido um
compromisso de concluir rapidamente a sua missão, os pesquisadores
puderam terminar ali o seu trabalho.
Outra dupla de entrevistadores não teve tanta sorte, provavelmente por
estar à procura de ouvir vendedores, o que tornava a situação mais
“suspeita” aos olhos dos lojistas e seguranças.Estes pesquisadores, após
realizarem uma primeira entrevista na Galeria 960, foram abordados pelo
segurança e, após as explicações de praxe sobre do que se tratava a pesquisa,
o teor acadêmico etc., ouviram como respostaque, independente do que
fosseo trabalho, deveriam se retirar imediatamente, ao que acataram e
tiveram de procurar novacolocação.
Da mesma forma, embora estivessem em espaço aberto e público, os
pesquisadores que se colocaram na rua 25 de Março para entrevistar
transeuntes foram recebidos com bastante desconfiança. Ao buscarem um
lugar para iniciar as abordagens, foram interpretados como sendo fiscais
ou algo do gênero, causando imediato afastamento dos camelôs que
atuavam nas calçadas.
Após algum tempo e algumas conversas buscando maior aproximação,
os pesquisadores encontraram um espaço que não era tão próximo das
barracas dos camelôs, mas que ainda assim estavaem meio ao fluxo das
pessoas que passavam por elas.
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
236
A abordagem aos potenciais compradores, embora concorresse com a
grande movimentação da rua, com as abordagens dos vendedores e com
a pressa cotidiana das pessoas, foi exitosa após os pesquisadores compreen-
derem a importância de incluir, na breve explicação sobre o trabalho que
estava sendo realizado, grande ênfase ao seu cunho acadêmico. Os
transeuntes se solidarizavam mais rapidamente ao entender que ajudavam
estudantes e pesquisadores em seu trabalho para a Universidade.
Descrição dos resultados
• O ponto de vista dos consumidores
Foram entrevistados 3 homens e 9 mulheres, de 19 a 60 anos de idade,
advindos de diferentes regiões da cidade e de fora de São Paulo, com
diversos níveis de escolaridade e ocupações. Pode-se ilustrar a diversidade
da amostra mencionando a presença, por um lado, de um pedreiro de
56 anos que nunca estudou e, de outro lado, uma advogada com especia-
lização, ou uma estudante de moda de 19 anos. Tal diversidade retrata o
público heterogêneo que frequenta essa área e que é adepta desse tipo de
comércio, conforme já mostraram outros estudos realizados sobre a região
e o tema.6
De forma geral, a frequência de nossa amostra à Rua 25 de Março é alta,
em média 2 a 3 vezes por mês e os produtos buscados são bastante varia-
dos: bolsas, eletrônicos (celular, aparelho de som), utensílios domésticos,
6. Ver Estadão.com.br: http://economia.estadao.com.br/especiais/a-torre-de-babel-do-
consumo%2c119411.htm e Estudo Fecomércio-Rio/Ipsos, 2011: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/977400-mais-da-metade-da-populacao-consome-piratas-classes-ab-lideram.shtml
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
237
relógios, óculos, material para artesanato, bijuterias, produtos de beleza,
CDs, DVDs, pendrives. Mas as compras não se resumem ao planejado: a
visita objetiva olhar as novidades, aproveitar as oportunidades, seja nas
barracas de rua, seja nas galerias ou “shoppings”.
Os espaços fechados como as galerias são preferidos por uma suposta
segurança e para fugir da aglomeração das ruas. “Eu não compro nas
barraquinhas porque fica muito lotado, dá trombada”. É também ali onde
se costumam comprar os eletroeletrônicos como celulares e aparelhos de
som, os relógios e os óculos. Foram citadas as galerias Pajé e o Shopping
25 para a compra desses produtos. E estas lojas costumam entregar um
importante elemento para algumas categorias – a garantia – que varia de
acordo com o tipo de produto: 30 dias para relógios e aparelhos de som,
3 meses para o celular. A garantia é registrada no cartão comercial (cartão
de visita) da loja (figura 8), carimbado e assinado pela pessoa que vendeu
o produto. Uma das entrevistadas estava à procura de pendrives e planejava
comprar em uma loja por causa desse benefício:
No camelô não dá porque ele vai jurar que você não comprou
dele. Já comprei dez DVDs e quando cheguei em casa tinham dois
pornôs e os outros... Nenhum era o que estava escrito. Nunca mais
eu compro no camelô por causa disso. Na embalagem era uma
coisa... Passei um vexame com a família toda.
A experiência ser exitosa ou não é o que define a recompra:
O celular, eu quero comprar Nokia porque é bom, já tive um e
não tive problema(...) eu comprei aqui e não deu problema. Pode
ser parecido com Nokia, não precisa ser original.
Já tinha comprado o mesmo modelo [aparelho de som] para a
cunhada de Fortaleza, ela ligou de lá e pediu outro.
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
238
CD eu não compro, mas meu filho sempre pede. Eu digo que
não porque comprei e não valeu a pena porque não funcionou.
Falo pra ele pedir para o pai, eu não dei sorte.
Percebe-se que, enquanto as lojas são destinadas às compras mais plane-
jadas, as barracas da rua são a expressão da compra por impulso. Uma
consumidora resumiu que, ao passar pelas barracas da rua, você “compra
tudo que você não veio aqui pra comprar” (mulher, 47 anos, trabalha
com artesanato).
Nessas barracas são compradas bolsas, adesivos (de parede), bijuterias,
cintos, acessórios em geral, ou seja, artigos que não necessitam de garantia
e que podem ser testados no local.
Eu trago minhas amigas de Fortaleza...abre o zíper [das bolsas, para
testar], vê se não desfaz...
A compra é feita, em geral, para si e para a família, mas pode também ser
um presente para alguém. Foram citados como presentes: bijuterias,
brinquedos, bolsas, calçados, utilidades domésticas, pelúcias. Observa-
se,entretanto, certa restrição a alguns produtos, claramente identificados
como piratas e muito baratos, como os CDs e DVDs.
CD eu não levo de presente, compro 2 por 5 reais, vão falar: tá pobre tá?
Tem tanto presente baratinho por aí.
E o que buscam nos produtos comprados? Quais são os critérios de
escolha?
Neste ponto verificou-se uma distinção entre os consumidores dos dois
locais pesquisados: os frequentadores da rua não mencionaram buscar por
marcas, ao contrário, declaram buscar qualidade e modelos que viram na
TV, na Internet ou com outros amigos e não se importar com as marcas.
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
239
Não escolho marca, [vou] mais pela cor e beleza, você não quer
ela [uma bolsa] para sempre, você usa e depois quer outro modelo,
tudo muda, então é mais pela aparência que pela marca.
Você sabe que aqui nada é legítimo, você compra pelo modelo e
preço, você compra consciente de que aquilo não é legítimo, não
tem problema. Você olha e sabe que a etiqueta foram eles que
colaram. Relógio é a mesma coisa, paga 10, 15 reais, sem se preo-
cupar com a marca. Eles [sobrinhos que moram fora de São Paulo]
mandam as fotos dos relógios pela Internet.
Já as consumidoras da galeria estavam mais preocupadas em encontrar de-
terminadas marcas: Louis Vuitton, Victor Hugo, Gucci, Chanel, princi-
palmente em réplicas de óculos e bolsas. E, também nestes casos, o prin-
cipal critério para decisão da compra é a qualidade, seguidapelo modelo.7
Muitas vezes é necessária uma intervenção para adequar a marca escolhida
ao modelo oferecido, indicando que é possível realizar combinações entre
essas características.
Se você quiser, você pede uma etiqueta e ele troca na hora, põe
outra. Uma sobrinha queria uma bolsa D&G, tem que ser aquela
lá – Dolce e Gabanna. A pessoa quer ostentar aquela etiqueta. Aí
você pede pro coreano e troca. Normal, eles tiram com o alica-
tinho e prendem outra.
No caso da compra de celulares, os entrevistados também declaram não
ter uma marca pré-definida, buscando bom funcionamento e qualidade.
7. Sem dúvida também aqui o fator preço ou custo-benefício entra com forte peso na
decisão de compra, porém esse critério já está intrínseco à escolha da área comercialeleita na ocasião: ir à 25 de Março para comprar algo já implica em buscar preços maisbaixos que os encontrados nos shoppings ou lojas de bairros.
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
240
Ao término das entrevistas, os pesquisadores solicitaram fazer uma foto-
grafia dos entrevistados, para ilustrar o estudo. Apenas um deles se recu-
sou; todos os demais posaram para esse momento, o que indica não ser
esse ato de compra razão de constrangimento, muito menos entendido
como algo ilegal.
Figura 9: compradores na região da rua 25 de Março em São PauloFoto: GESC3 2011
• O ponto de vista dos vendedores
Foram entrevistados 2 homens, proprietários de lojas que começaram na
rua como camelô e puxador, e 6 mulheres, todas na função de vendedoras.
Chama a atenção que a maior parte declara ter 17 anos, é menor de idade,
portanto. É importante deixarmos claro que nem sempre a declaração
de “menor” idade é compatível com a aparência, no entanto, é com-
preensível dado limiar legal/ilegal com que trabalham cotidianamente.
Os produtos comercializados pelos entrevistados são bastante variados:
perfumes, loções e cremes, camisetas, bermudas, óculos de sol e de grau,
relógios, lenços e bolsas. As principais marcas são:
• Camisas e bermudas: Lacoste, Ferrari, Oakley, Tommy Hilfiger,
EckoUnltd, Armani, Adidas, Nike,EckoUnltd. Preços a partir de R$ 7,50
no atacado e R$ 10 no varejo.
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
241
• Relógios: Champion, Michael Kors, Dolce&Gabbana, Puma, Chanel,
Armani, Tommy Hilfiger, Adidas, Nike, Bulgari, Swatch, Guess. Preços
a partir de R$ 35.
• Perfumes: Joop, Armani, Ralph Lauren, Pólo, Ferrari. Preços a partir
de R$ 40.
• Bolsas: Victor Hugo, Louis Vuitton, Armani, Dolce&Gabbana,
Chanel, Prada e Tommy Hilfiger. Preços a partir de R$30, chegando a
R$ 500.
• Óculos: Prada, Ray Ban, Vogue, Dolce&Gabbana, Chanel, Gucci,
Carrera, Montblanc, Caile, Oakley, Sky Wear, Bulgari, Fendi, Puma,
Yves Saint Laurent, Dior, XY, Gucci, Armani. Preços a partir de R $35.
Figura 10: Camiseta “Lacoste” comercializada naregião da Saara, Rio de JaneiroFonte: foto Clotilde Perez, 2012.
Os preços das bolsas são os que mais variam, pois dependem da qualidade
do produto. Pudemos identificar pelo menos três diferentes tipos de
produtos: imitação, réplica de primeira qualidade e réplica de segunda
qualidade. A réplica de primeira qualidade é aquela que, segundo as
vendedoras, são idênticas à original, têm o mesmo material (couro em
geral) e apresentam a mesma qualidade de produção. Já as de segunda
linha não são tão fieis ao modelo copiado e algumas vezes usam material
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
242
de qualidade bem inferior. As imitações, mais baratas, são facilmente
distinguíveis das originais tanto pelo material (imitação de couro, por
exemplo) quanto pela forma de confecção (mais mal acabadas). Há ainda
variações na forma de apresentação do símbolo ou logotipo da marca
(figuras 11 e 12).
Figura 11: Símbolo Nike com distorções.Fonte: Foto Clotilde Perez, Saara, Rio de Janeiro, 2012
Segundo as vendedoras tanto de São Paulo, Rio de Janeiro como de Brasí-
lia, para as consumidoras de bolsas a marca é muito importante. Diferen-
temente do que se ouviu para outros tipos de produtos, as bolsas são pro-
curadas primeiramente pela marca e, em seguida, buscam modelos de
sua preferência.
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
243
Para a compra de óculos, relatam as vendedoras, os consumidores esco-
lhem em primeiro lugar o modelo que cai bem e combina com seu rosto,
depois verificam a marca. Pode-se dizer que o mesmo ocorre com os reló-
gios. Embora houvesse, na época das entrevistas, uma busca por relógios
Champions e Michel Kors, em geral os relógios são itens de compra por
impulso. Disse uma vendedora: “geralmente o pessoal não vem comprar
exatamente relógio. Vem comprar mais bolsa, camiseta, e acaba vendo relógio
e acaba... chamando atenção. Relógio não é um produto procurado, é um
produto achado, entendeu?”.
A publicidade das lojas é feita na própria rua em que se encontra a loja,
através de um funcionário que fica nas calçadas atraindo os potenciais
compradores um a um (os puxadores), entregando cartões e panfletos
ou ainda por meio de cartazes que atraem pela contundência e reiterada
exposição.
Figura 12: Camisetas de várias marcas com distorçõesde símbolo e logotipo. Rua 25 de Março, 2011.
Fonte: Foto Clotilde Perez
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
244
Figura 13 Figura 14: Loja de rua na SaaraRio de Janeiro.
Fonte: Clotilde Perez
Os puxadores têm um papel que vai além de atrair os consumidores. Eles
são responsáveis também por encaminhar (“puxar”) os potenciais
compradores para determinadas lojas, recebendo assim uma comissão
caso a venda seja efetivada. O trabalho realizado pelos puxadores é de
especial interesse para os vendedores que possuem seus locais de venda
com difícil acesso.
Quanto à origem dos produtos, as confecções (bermudas e camisetas) são
compradas semanalmente pelo lojista no bairro do Brás, importante polo
produtor de roupas em São Paulo e os demais produtos são adquiridos
em importadoras ou em fornecedores que visitam as lojas, com alta
frequência, sempre mais que duas vezes por semana.
O público alvo, na maior parte dos relatos, é formado por jovens, homens
e mulheres e, no caso das bolsas, destacam-se as mulheres adultas mais
velhas – as senhoras.
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
245
Figura 15: Produtos em lojas de São PauloFotos: GESC3 2011
Figura 16: bolsa “ Dior” vendida em galeria de São PauloFotos: GESC3 2011
Figuras 17 e 18: embalagem e réplica de primeira linhade bolsa Louis Vuitton em São Paulo
Fotos: GESC3 2011
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
246
Figuras 19 e 20: bolsa da marca Louis Vuitton e fachadade loja na Feira dos Importados – Brasília
Fotos: GESC3 2011
Figuras 21 e 22: óculos esporte e óculos de grauna Feira dos Importados – Brasília
Fotos: GESC3 2011
Breve olhar sobre o comércio pirata no México
A experiência de campo na Cidade do México se deu de forma mais
espontânea, incidental até, uma vez que foi realizada antes da estruturação
da pesquisa e do roteiro das entrevistas, baseando-se principalmente na
observação e apoiada no registro fotográfico.
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
247
Na feira de Tepito, a exemplo do que ocorre no Brasil, misturam-se pro-
dutos vendidos legalmente (em geral dentro de lojas no pavilhão da feira)
a produtos pirateados e, aqui bastante evidente, produtos originais contra-
bandeados ou advindos de furto. Por funcionar também à noite, a visita
ao local do comércio tem uma aura de perigo também para quem está a
visitar ou pretende fazer uma compra.
Os produtos são discretamente mostrados ao potencial comprador, estan-
do por vezes escondidos sob o casaco ou jaqueta ou apenas em fotos
demonstrativas das mais variadas mercadorias (bolsas Prada, Louis
Vuitton e Gucci, cuecas Calvin Klein e D&G, softwares etc.). Entre os
produtos mais inusitados estava a oferta, por um ambulante local que
comercializava também relógios da marca Louis Vuitton, de títulos de
graduação mestrado e doutorado emitidos pela UNAM e pelo IPN – Ins-
tituto Politécnico Nacional, segundo ele poupando assim anos de vida
dura nos bancos da Universidade.
Fato interessante é que, assim como no Brasil, aqueles que comerciali-
zavam os produtos neste centro mexicano eram também muitas vezes
garotos na adolescência, fato que hipoteticamente pode estar relacionado
à impossibilidade de imputação criminal destes, poupando assim proble-
mas aos donos do negócio com as prisões indesejadas dos seus vendedores.
Principais aprendizados
1. O preço como primeiro fator de atração: consenso
É sabido que a motivação primeira para a compra de produtos pira-
teados é o preço mais atrativo destes em comparação com os originais.
A comparação com os preços dos shoppings ou lojas de bairros foi
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
248
sempre mencionada, também em nosso estudo, como atrativo para
estarem ali em busca de determinado produto. A motivação é a de
uma compra “esperta”, de aproveitar uma oportunidade de aquisição
de produto similar ao original a um custo mais baixo.
2. Qualidade: que seja eterno enquanto dure... a moda
Ser similar é obviamente ter a mesma aparência que o original, mas a
similaridade buscada envolve também outra característica, a qua-
lidade. Entretanto, nem sempre a expectativa é a de que o produto
tenha o mesmo nível de qualidade que o original (o que acontece em
alguns casos de busca de bolsas de marcas de luxo), mas em geral
anseia-se que o produto tenha “qualidade na medida” para garantir
sua durabilidade até que seja substituído por outro. E a velocidade
com que os produtos tornam-se obsoletos é reconhecida e levada em
conta nessa equação.
A gente tem que olhar se vale a pena, se vai durar um pouco (...)
se tem boa durabilidade. Quando chegam novos modelos você
quer comprar, trocar. (...) Tem coisas que você quer que dure,
por exemplo, eletrodomésticos você quer que dure, não compraria
aqui. Sapato você quer que dure, tem que ser melhor.
O conceito de durabilidade é então relativizado: é preciso durar até
que o modelo novo chegue. O círculo virtuoso do fastfashion – a
produção rápida dos modelos recém-lançados – alimenta e justifica
a compra de produtos copiados.
3. A instituição de “la garantia soy yo”
Ainda que a expectativa da durabilidade não seja alta, esta tem que
ser minimamente garantida para alguns produtos, em especial os
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
249
eletrônicos. Não há aqui uma empresa ou instituição avalizando o
bom funcionamento dos produtos. A garantia é dada pessoalmente,
através de uma assinatura, da palavra do vendedor ou dono do esta-
belecimento, criando uma relação de pessoalidade e de confiança
distinta das encontradas entre as marcas e seus consumidores.
4. Há piratas mais piratas que outros
A velocidade do ciclo de vida da moda justifica a compra de réplicas
ou cópias de roupas e acessórios. Já instituída pelo fastfashion das
grandes redes como C&A, Renner, Zara, entre outras, a compra esper-
ta (a preço baixo com qualidade suficiente/mínima) de uma peça que
terá vida curta e será substituída em breve é uma prática vista com
bons olhos e que desculpabiliza a aquisição de pirateados. A compra
é percebida como resultado de uma oportunidade de mercado. Essas
peças podem inclusive serem dadas de presente, não há embaraço nem
constrangimento nisso.
Por outro lado,há menos simpatia pela aquisição de produtos
pirateados motivada apenas pelo preço baixo, implicando muitas vezes
em um mau negócio, devido a não garantia de bom funcionamento,
como a de reproduções não autorizadas de DVDs ou CDs. Produtos
como esse não se destinam a presentear outros e há maior resistência
em declarar esse tipo de compra.
5. É bonito e está na moda...
Durante o trabalho de campo foi possível comprovar que boa parte
das aquisições de produtos piratas não está vinculada a qualquer ação
ilegal. O produto de preço acessível, é bonito e está na moda... Essas
Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso
250
foram as razões que reiteradas vezes pudemos ouvir de diferentes
compradores. Não estavam, genuinamente, agredindo qualquer
marca, ao contrário “é bonito e está na moda”. Aqui chama a atenção
também o fato de que o lugar (Rua 25 de março, Saara, Feira de
Brasília ou mesmo Tepito) endossa e eleva a condição de “moda” o
que está ali ofertado: se está aqui é porque está na moda... (ER, 32 anos,
diarista, Rua 25 de Março, figura 23).
Figura 23: compradora da camiseta Diesel:É bonita e se está aqui é porque está na moda...
Fonte: foto Clotilde Perez
Além destes aprendizados que levantam questões importantes para serem
aprofundadas em novos estudos, a realização da pesquisa possibilitou a
retroalimentação do glossário, trazendo inclusive ao conhecimento do
Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações
251
Grupo novos termos usados cotidianamente pelos diferentes atores do
comércio pirata. Os termos populares podem ser vistos no segundo item
do Glossário intitulado “a linguagem cotidiana no campo pirata: novos
aprendizados”.
Glossário Pirata
255
Apresentação
ALHEN RUBENS DAMASCENOCINIRA BAADER
A proposta do desenvolvimento do glossário da pesquisa se deu espe-
cialmente pela necessidade de contextualização da temática por nós esco-
lhida para investigação – consumo e pirataria – em toda sua diversidade
e riqueza de termos, definições e significações.
A escolha dos termos (formais e coloquiais) colocados na composição do
glossário se deu a partir de diversas reuniões e trocas de experiências entre
os participantes do grupo, inicialmente discutindo sobre a temática da
pesquisa com base nos estudos teóricos desenvolvidos e, em um segundo
momento, já com base nos relatos das experiências vivenciadas em campo
pelos pesquisadores.
A partir dessas discussões, chegamos à estruturação de vários termos que
orientaram nossos estudos teóricos e também nos ajudaram a conhecer
melhor o universo da pirataria e tudo o que estaria a se mostrar para nós
nas imersões em campo.
Interessante observar que, com a vivência da pesquisa nas ruas, pudemos
constatar uma rede associativa de novos significados atrelados aos vocá-
bulos já existentes e jargões usados no cotidiano dos vendedores e consu-
midores dos produtos. Essas expressões idiomáticas e gírias foram também
Glossário Pirata
256
incorporadas ao glossário para uma melhor apreciação da realidade que
nos foi mostrada e vivenciada quando estávamos em campo. Tais
expressões se fazem mostrar de fácil reconhecimento por uma parcela
considerável da população que vê nos produtos pirateados uma forma
de inserção no mundo do consumo, principalmente o consumo das
marcas de luxo, em que a aquisição de produtos piratas se mostra como
uma prática comum e rotineira.
Contamos assim com o total de mais de 30 termos na composição do
glossário da pesquisa, selecionados a partir das leituras para o estudo do
tema e experiências compartilhadas na pesquisa de campo. Ao integrar
todos os textos para a formulação do glossário, procuramos criar um
padrão de formato para a apresentação de cada termo. Propusemos então
a seguinte formatação:
• Definição: texto referente à definição do termo em si.
• Contextualização: texto referente à contextualização do termo em
diferentes temáticas e, especialmente, no contexto da pirataria.
• Referências: indicação das referências de pesquisa de cada termo.
A seguir, relacionamos os termos que nos foram pertinentes no desen-
volvimento da pesquisa, no sentido de um maior conhecimento e dife-
renciação entre as diversas modalidades e sentidos que o universo sígnico
da pirataria nos apresenta.
257
Adaptação
JÔSE FOGAÇA
Definição
Nas definições encontradas em dicionários, adaptação é a ação ou efeito
de adaptar-se, e pode ser aplicada em diferentes contextos. No teatro, no
cinema ou na literatura por exemplo, peças, filmes e livros são adaptados,
algumas vezes visando um melhor entendimento ou maior acessibilidade
de seu conteúdo. É o ato de fazer algo combinar ou harmonizar com a
finalidade ou o resultado esperado, numa mudança de contextos.
Contextualização
Assinalam a ideia de adaptação a existência de uma obra (ou produto)
anterior – que vai passar por uma ação transformadora em termos de
suporte midiático ou da época – e a forma como será transformada -
envolvendo um ato criativo ou inovador.
Giacomini Filho (2011, p. 233), ao analisar as diferentes formas de
imitação na propaganda, definea adaptação como “conteúdos estéti-
cos apropriados de outros contextos deforma a caracterizar uma
intertextualidade”.
Glossário Pirata
258
Nas palavras do autor, adaptação é a “codificação de umconteúdo original
para outro suporte midiático, caso de um filme realizadoa partir de um
livro, de uma peça teatral transformada em obra literária, ouum seriado
de TV produzido a partir de um filme (BALOGH, 2004). (...) Nesse con-
texto, um anúncio publicitário pode imitar outro transmutando parte
do conteúdo deum trabalho artístico (pintura, peça cinematográfica, obra
literáriaetc) ou de outro anúncio” (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 231).
É importante ressaltar o elemento de inovação contido nas adaptações,
que pode inclusive melhorar o modelo original (cf. SCHNAARS, 1997
apud GIACOMINI FILHO, 2011, p. 231).
Na área da publicidade, a adaptação tem sido bastante utilizada e pode
envolver a retomada de uma ideia pelo mesmo anunciante (caso da ree-
dição ouremake), uma nova versão do mesmo anúncio (readequação ou
reelaboração), a repetição de um padrão de anúncio (reprodução),ou ain-
da a importação de uma obra conhecida ou discurso transplantado do
contexto original para o anúncio (o ready-made), sendo que o conteúdo
apropriado acaba por se constituir em estereótipo ou elemento kitsch
(idem, p. 231 e 233).
Referências bibliográficas
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da LínguaPortuguesa. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1995.
GIACOMINI FILHO, G. Tipologias de imitação estética na propaganda. InMATRIZes. Ano 4 – nº 2 jan./jun. 2011 – São Paulo, p. 216-238.
http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=adapta%E7%E3o(acesso em junho 2013)
259
Análogo
HÉLIO SILVA
Definição
Expressão originária do grego analogon (análogos) que traduz um certo
sentido de similaridade, proporção ou razão. Trata-se de algo que guarda
analogia, ou seja, semelhança com outra coisa. Pode-se dizer, ainda, algo
comparável, correspondente, simétrico, conveniente, similar que, no
entanto, preserva aspectos de diferenciação.
Contextualização
O análogo sugere um conceito complexo, pois se refere a objetos que não
são idênticos, porém também não se apresentam completamente dife-
rentes. Fundamentalmente, a sua expressão depende de comparações que
vão estabelecer as condições de conformidade, semelhanças, coincidências
ou diversidades. A tensão permanente entre essas forças, de certo modo,
vem questionar a própria ideia de identidade única dos objetos, uma vez
que esta (identidade) somente se manifesta nas suas semelhanças.
Foucault (1999) contribui para o entendimento do conceito de análogo
ao indicar as principais figuras cujas articulações promovem efeitos de
Glossário Pirata
260
semelhança e que são denominados pelo autor como “quatro similitudes”
(1999, p. 23). Na visão do autor, há a similitude por conveniência (conve-
nientia) em que apenas pontos vizinhos dos objetos se tocam ou se mistu-
ram, tornando difícil dizer onde termina uma e começa o outro. Outra
figura é a emulação (aemulatio) que remete a uma espécie de semelhança
à distância de objetos separados no espaço, sem nenhum contato, algo
como um reflexo no espelho. Também há a simpatia1 que promove uma
assimilação tão intensa que pode levar os objetos a se tornarem idênticos.
Ou, pelo menos, serem percebidos dessa maneira.
Finalmente, Foucault aborda a analogia, derivação do análogo, como uma
forma de similitude que se superpõe à conveniência e à emulação pois
sugere e encaminha ajustamentos, junturas e encadeamentos. Foucault
(1999, p. 30) afirma que “por ela (analogia) todas as figuras do mundo
podem se aproximar”. Baseada mais nas relações do que em semelhanças
reais, a analogia é “um espaço de irradiação” (FOUCAULT, 1999, p.31),
que executa similitudes invisíveis, sutis e irresistíveis.
Extrapolando agora a nossa visão do campo filosófico para o cotidiano
contemporâneo, vamos observar que a coisa análoga (objeto, ideia, racio-
cínio, etc) encerra uma tensão latente que tanto destaca as simetrias, igual-
dades e proporções, quanto faz lembrar as diferenças. Nesse contexto, o
análogo alimenta operações de sentido sofisticadas que, mais do que
traduzir semelhanças e similitudes, vão se conectar com a ideia de simu-
lacro (BAUDRILLARD, 1991; DELEUZE, 1974) para anular diferenças,
1. No livro As Palavras e as Coisas, Foucault desenvolve o conceito das quatro similitudesapresentando-as na seguinte ordem: conveniência, emulação, analogia e simpatia. Porém,
para o melhor encaminhamento das idéias desenvolvidas neste texto, fizemos a opçãopor inverter a ordem das duas últimas. Ou seja, primeiro falamos da simpatia e, porúltimo, da analogia.
Glossário Pirata
261
contestar modelos e promover representações aceitáveis, mesmo que não
originais.
Nas palavras de Deleuze, “o simulacro não é uma cópia degradada, ele
encerra uma potência que nega tanto o original como a cópia, tanto o
modelo como a reprodução” (DELEUZE, 1974, p.267-8).
Referências bibliográficas
BAUDRILLARD, Jean. 1991. Simulacros e simulação. Lisboa: Relógio d’Agua.
DELEUZE, Gilles. Platão e o simulacro. In: Lógica do Sentido. São Paulo:Perspectiva, 1974.
FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas. Uma arqueologia das ciênciashumanas. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
263
Autêntico
LÍVIA SOUZA
Definição
Diz-se de um produto autêntico quando este é, de fato, produzido pelo
autor (pessoa física, artista, corporação) a quem se lhe atribui. Nesse
sentido, um quadro ao qual se atribui a autoria de Matisse, por exemplo,
é dito autêntico quando se verifica que a autoria é, de fato, deste autor.
Do mesmo modo, um perfume que se intitula ser da marca Chanel, ou
um software Microsoft Office, são considerados autênticos caso seja
verificada sua genuinidade. Isto pode se estender para além da questão
da autoria em si, indicando também a comprovação da origem de um
determinado objeto. Por exemplo, uma porcelana Ming, denominação
que engloba época e local de fabricação. Na linguagem cotidiana, utili-
zamos o adjetivo autêntico para qualificar o indivíduo espontâneo, ou
seja, que não apresenta aos outros uma imagem diferente do que ele real-
mente é. Juridicamente, o adjetivo aplica-se a qualificar os profissionais
(tabeliães e magistrados) competentes a autenticar documentos e cópias,
comprovando assim sua veracidade. Ainda nessa seara, autêntico é aquilo
a que se pode dar fé, ou seja, que é legítimo, legalmente verificado. Pode-
mos, portanto, listar como sinônimos: fidedigno, legítimo, verídico,
verdadeiro.
Glossário Pirata
264
Contextualização
O adjetivo tem origem na palavra grega authentikós, que exprime aquilo
que é principal, primordial, que consiste num poder absoluto. A termi-
nologia deriva, por sua vez, do termo authéntés, que significa o senhor
absoluto. Desse modo, o autêntico está relacionado a um poder legiti-
mador e verdadeiro.
O tema da autenticidade tomou diferentes contornos no campo da
filosofia. O filósofo alemão Martin Heidegger publicou, em 1927, a obra
“Ser e Tempo”, um marco na filosofia existencialista ocidental do século
XX, e ali teorizou sobre os conceitos de autenticidade e inautenticidade
ligados à constituição da identidade do indivíduo frente aos demais.
Dita de maneira quase que superficial, no limite desta breve definição
de glossário, a autenticidade em Heidegger é um dos pilares da sua
definição sobre o homem, a que chama Dasein, ou pre-sença, ser-no-
mundo: em alemão, dasein significa a existência. Além de ser-no-mundo,
que traz o sentido da presença na espacialidade, o Dasein é também ser-
com-outro: ser-no-mundo implica, impreterivelmente, ser alguém com
outro e para outro.
Nessa existência na vida cotidiana, ser-no-mundo e ser-com-outros, o
indivíduo acaba por ser absorvido pela automatização de seus atos, em
uma existência superficial, ou inautêntica: “Na maioria das vezes e antes
de tudo, a pre-sença é absorvida por seu mundo” (HEIDEGGER, 1993:
164), tomando para si uma existência que não lhe corresponde. É dessa
situação de inautenticidade que o indivíduo, a partir de sua angústia, deve
buscar sua existência autêntica, ou seja, o seu verdadeiro ser, passo
fundamental para sua liberdade.
Glossário Pirata
265
Nessa mesma perspectiva, porém trazendo a discussão para um tema
contemporâneo, podemos mencionar o trabalho de Fidalgo (2009), “O
celular de Heidegger – comunicação ubíqua e distância existencial”. A
partir da visão de Heidegger quanto à constituição da identidade do
indivíduo no mundo e perante os outros, Fidalgo debate as possibilidades
do papel dos telefones celulares na constituição dessa identidade: seria
um elemento identitário essencial, ou fator de alienação, ou, portanto,
inautenticidade existencial?
Fidalgo discute, então, ambas as vertentes. Por um lado, o celular pode ser
visto sim como um aparelho a serviço da existência inautêntica, esti-
mulando o chamado falatório, que, para Heidegger, é a troca superficial no
diálogo entre os indivíduos sobre determinado assunto, sem que haja a
compreensão profunda e completa do tema, apenas bastando o entendi-
mento do que é dito. Por outro lado, se focarmos em situações específicas,
o celular hoje é parte fundamental de diversos tipos de relações sociais, e
tem seu papel no processo de identificação pessoal. Ele pode servir inclusive
à constituição de identidades autênticas em situações específicas, como,
por exemplo, em uma relação amorosa, cumprindo o papel das cartas de
amor de dois séculos atrás, como relembra Fidalgo (op. cit., 94).
O autor conclui, afinal, que as reações ao uso do celular podem natu-
ralmente pertencer a qualquer uma das vias, a eufórica ou a apocalíptica,
e a teorização heideggeriana quanto à questão da autenticidade, inauten-
ticidade e formação da identidade individual frente ao mundo e aos outros
serve para a análise deste fenômeno.
Após esta passagem por diversas formas de compreender a questão da
autenticidade, devemos voltar ao autêntico em sua ligação com o
consumo.
Glossário Pirata
266
Nas conceituações do autêntico vistas aqui, desde a concepção em sua
origem grega, até suas implicações na filosofia, o autêntico está profun-
damente relacionado a algo que é senhor de si mesmo.
Ao dizermos de um produto que ele é o autêntico, além da informação
de que ele é o original e não o falsificado, trazemos também uma carga
simbólica que está ligada à constituição da própria identidade marcária.
As marcas mais visadas pela pirataria são aquelas que têm grande presença
no mercado, são marcas consagradas e largamente conhecidas do
consumidor.
A partir dessa perspectiva, ao afirmarmos que determinado produto é
autêntico, estamos o envolvendo em um campo simbólico que diz
respeito também à sua própria identidade enquanto marca original e
genuína, que tem o poder legitimador de ser senhora de si mesma.
Referências bibliográficas
FIDALGO, António. O celular de Heidegger – comunicação ubíqua e distânciaexistencial. In: Revista MATRIZes, ano 3 – n. 1, ago / dez 2009. P. 81 –98.
HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Petrópolis: Vozes,1993.
HOUAISS A., VILLAR M. de S., FRANCO, F. M. de. Dicionário Houaiss dalíngua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.
Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php – Acesso em 09/05/2012.
267
Autoria
BIBIANA STOHLER SABENÇA DE ALMEIDA
De uma forma geral, autoria está vinculada a uma obra, cuja elaboração
foi concebida por seu criador, o autor. Existe, aí, um sentido de
pertencimentono plano material, ou seja, a obra (o objeto em si)
pertencente a um autor (o idealizador do objeto). Ela está ligada a ele
por sua arquitetura (planejamento) e construção (execução). Quando a
obra, por exemplo, é elaborada por vários autores, dizemos então que se
trata de uma obra de construção coletiva, enriquecida pelo conjunto de
perspectivas diferentes.
Vejamos também o sentido de autoria no dicionário. Dessa forma, autoria
significa: “1. Qualidade de autor; lavra.”(Minidicionário Luft. 2ª Edição.
Editora Scipione. São Paulo, SP. 1991). Para explorarmos melhor sua
significação, precisamos conhecer o significado das palavras “autor” e
“lavra” (Minidicionário Luft, 1991):
Autor: “1. Criador de uma coisa. 2. A causa principal; o agente.
3. O que propõe demanda judicial. 4. Indivíduo que escreve obra
ou científica.”
Lavra: “1. Ação ou efeito de lavrar. 2. Terreno do qual se extrai
ouro e diamante. 3. Produção; elaboração; autoria.”
Glossário Pirata
268
A palavra lavra vem do verbo lavrar, que quer dizer (Minidicionário Luft,
1991):
“1. Preparar a terra para o plantio; amanhar. 2. Fazer ornatos ou
lavores em. 3. Cinzelar; lapidar. 4. Exarar, redigir (atas, escritura,
documentos, etc.). 5. Explorar (minas). 6. Propagar-se; alastrar-
se; grassar.”
O temos aqui é que o significado de autoria é derivado do criador (o autor)
e da ação ou de seu efeito, sua produção (a lavra). Assim, a palavra autoria
é uma qualidade do autor, aquele que concebe a obra, e de sua lavra, o
fruto de sua produção, ou seja, a própria obra.
Contextualização
Nas artes, podemos observar a questão da autoria nas obras de Chiquinha
Gonzaga. Em 1913, Chiquinha inicia a luta pelos direitos autorais no
Brasil. Ao visitar a cidade de Berlim na Alemanha, a maestrina entrou
numa loja de música e encontrou partituras com suas músicas, cuja
reprodução fora realizada sem sua autorização.
Ao voltar para o Brasil, descobre que Fred Figner, diretor da Casa Edison
no Rio de Janeiro, concedeu tal autorização. O empresário editava
partituras e fazia gravações de discos para o mercado nacional, desde 1902.
Não só Chiquinha, mas também outros artistas da época sofreram com
as reproduções indevidas. Isso também acontecia com as composições
para o teatro. Chiquinha começou a polemizar o assunto por meio da
mídia, principalmente, aos veículos jornal e rádio. Após sua insistência
na questão, conseguiu receber indenização em dinheiro.
Glossário Pirata
269
Em 1916, a discussão ganha força e vai ao Congresso Nacional, que
aprova a primeira lei sobre propriedade artística e literária no país. Em
1917, os autores teatrais fundam a Sociedade Brasileira de Autores
Teatrais (SBAT). Essa sociedade garante todos os direitos aos autores
teatrais e compositores musicais. Chiquinha foi sócia fundadora e patrona
da SBAT.
No século XX, surge a primeira lei, que discorre sobre a temática no Brasil,
conhecida por Lei 9.610, aprovada em 19 de fevereiro em 1998:
“Parágrafo único. Aplica-se o disposto nesta Lei aos nacionais ou
pessoas domiciliadas em país que assegure aos brasileiros ou
pessoas domiciliadas no Brasil a reciprocidade na proteção aos
direitos autorais ou equivalentes.”
Com relação ao direito de uso, a lei protege em casos de publicação,
transmissão ou emissão, retransmissão, distribuição, comunicação ao
público, reprodução, contrafação (reprodução não autorizada), obra,
fonograma, editor, produtor, radiodifusão e artistas intérpretes ou
executantes.
Quanto aos aspectos gerais, a lei discorrerá sobre as obras intelectuais no
que tange à proteção, autoria, registro, direitos do autor, direitos morais
do autor, direitos patrimoniais e sua duração, limitações dos direitos
autorais, transferência dos direitos do autor, utilização de obras inte-
lectuais e dos fonogramas, edição, comunicação ao público, utilização
da obra de artes plásticas, utilização da obra fotográfica, utilização de
fonograma, utilização da obra audiovisual, utilização de bases de dados,
utilização de obra coletiva, direitos conexos, direitos dos artistas intér-
pretes e executantes, direitos dos produtores fonográficos, direitos dos
produtores de radiodifusão, duração dos direitos conexos, associações de
Glossário Pirata
270
titulares de direitos de autor e conexos, sanções às violações dos direitos
autorais, ações civis, prescrição da ação e disposições finais.
Referências bibliográficas
Minidicionário Luft. 2ª Edição. São Paulo: Editora Scipione, 1991.
http://www.casadoautorbrasileiro.com.br/sbat
http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/5198.html
271
Avatar: Nome Masculino, Mitologia Hindu
JOSÉ PALANDI JUNIOR
Para muitos a palavra AVATAR é um neologismo, criado pelos jogos
veiculados na rede mundial de computadores. No entanto, ela temorigem
na antiga mitologia Hindu.
AVATAR é empregado no sentido de transformação, metamorfose.A
palavra AVATAR tem sua origem em uma das 23 línguas oficiais da Índia,
o sânscrito Avatãra ou Avatãr, e tem como significado “Aquele que
descende de Deus”, ou simplesmente encarnação. AVATAR no hinduís-
mo é a encarnação do deus Vishnu na terra.
Vishnu é o segundo deus da tríade Hindu, e sua função é garantir a con-
servação do universo, sendo a tríade formada por:
Brahma, o criador
Vishnu, o protetor
Shiva, o destruidor
A Vishnu são atribuídos dez encarnações ou avatares.
Os AVATARES de Vishnu são deuses que se encarnam somente para
fazer o bem do universo, onde são conhecidos como:
Glossário Pirata
272
1º - Mataya, na forma de peixe
2º - Kurma, na forma de tartaruga
3º - Varâha, na forma de javali
4º - Nara-Simha, na forma de homem
5º - Vamana, na forma de anão
6º - Parasourâma
7º - Rama-Chandra
8º - Balarâma
9º - Krishna
10º - Kalki
No antigo Brahmanismo, modificado e atualmente chamada de
Hinduísmo, o próprio Buda era reconhecido como um AVATAR de
Vishnu.
Na Cibercultura a palavra AVATAR designa a aparência que assume um
internauta em ambiente virtual, com objetivo de ser reconhecido por
outros internautas. O AVATAR é uma figura imagética criada pelo
usuária da rede internacional de computadores, sendo assim, um
pseudónimo no navegador. Muitos jogos na internet utilizam a expressão
AVATAR, como exemplo o ambiente do Second Life, onde uma das
primeiras tarefas do jogador é criar seu próprio AVATAR.A palavra
AVATAR na informática tem praticamente o mesmo valor que para o
Hinduísmo, sendo uma criatura que representa um
operador, o original. Desta forma uma AVATAR
é um substituto do original.
A industria cinematográfica tem produzido vários
filmes explorando a figura do AVATAR, onde o
filme de mesmo nome escrito e dirigido por James
Cameron lançado em 2009 foi responsável pela
VISHNU, divindade Hindu
Glossário Pirata
273
popularidade do termo. Outros filmes exploraram a figura do AVATAR,
como Surrogates (Substitutos – estrelado por Gruce Willis e diretor
Jonathan Mostow) também tem como roteiro a ficção científica baseada
no AVATAR, que aqui é denominado substituto. O filme Matrix (
protagonizado por Keanu Reeves e dirigido pelos irmãoes Wachowski)
também baseou-se em AVATARES.
275
Clonagem
ENEUS TRINDADE
Definição:
Conceito originário nas Ciências Biológicas que diz respeito às ações
ou possibilidades (naturais ou artificiais) de reprodução assexuada de
organismos vivos, plantas e animais. O resultado desse processo seria um
clone, cuja origem etimológica da palavra vem do grego, dada pelo termo
klon, que designa a idéia de broto, ou seja, alguma coisa (ser vivo) que
deu origem a outro, idêntico, por meio de reprodução assexuada.
Contextualização:
A recuperação do termo grego no campo das Ciências Biológicas acontece
em 1903, quando o botânico norte-americano Herbert J. Webber decide
denominar por clone os resultados de experimentos com um conjunto
de células, moléculas ou organismos geneticamente iguais às de uma célula
matriz que lhe serviu de origem.
Existem processos naturais e artificiais de clonagem. As clonagens naturais
ocorrem em alguns organismos unicelulares que realizam sua reprodução
pelo método da bipartição. Além deles, alguns mamíferos como o tatu
Glossário Pirata
276
podem produzir um clone por meio da poliembrionia. Algo semelhante
ao caso humano, em que os clones naturais são os gêmeos univitelinos,
ou seja, são seres que compartilham do mesmo material genético (DNA),
sendo originados da divisão do óvulo fecundado.
Já a clonagem artificial possui várias técnicas. Uma delas possibilita clonar
um animal a partir de óvulos não fecundados, processo conhecido desde
o século XIX e praticado pelos agricultores que obtinham clones de plan-
tas. Uma planta matriz origina dezenas de novas plantas geneticamente
idênticas. A clonagem artificial pode advir de células de embriões e de
células adultas, como foi o caso da ovelha Dolly.
A clonagem instiga várias discussões sobre suas possibilidades nos avanços
das Ciências Biológicas e Médicas, mas também se insere em um contexto
de debates de ordem ética e religiosa. Entre as principais vantagens da
clonagem estão: a preservação de animais em extinção; o desenvolvimento
de animais imunes a algumas doenças que são contagiosas; clonagem de
células humanas para tratamento de doenças. Já as desvantagens, dizem
respeito às questões éticas e religiosas no que se refere aos limites da ciência
e da indústria biológica para o comércio da vida.
Conexão com o Tema:
Mas o termo clonagem não ficou restrito às Ciências Biológicas. E após
a divulgação na imprensa do fenômeno Dolly em 1997, as palavras clone
e clonagem começaram a ser popularizadas, designando os processos de
reprodução tecnológica ligados a à espionagem industrial ou a à cópia
de produtos originais, que geram os produtos piratas.
As palavras clone e clonagem, com seus sentidos biológicos, se tornam
metáforas da reprodução técnica, da cópia. Tanto em um caso como no
Glossário Pirata
277
outro residem questões éticas sobre o limite da técnica. Neste caso, o
limite técnico industrial, como ficam os direitos à autoria, a à criação e a
à inovação? Qual o limite para que a criatura não possa superar o criador?
E por que não poderia? Quais os riscos disso? Essas são questões que
devem alimentar não só as áreas biológicas, mas também devem nutrir o
mundo dos negócios e das indústrias na reorientação de seus papéis
sociais, pois as possibilidades técnicas são amplas e o velho sentido de
propriedade parece estar cedendo lugar para outros valores. O clone não
é cópia. Ele é um outro e, como outro, tem seu estatuto identitário. A
clonagem põe em crise e em discussão ética os limites do que é autêntico,
do que seria a propriedade sobre o produto clonado. Em que medida ele
pode ser reduzido ao sentido de cópia? E em que medida esse clone mer-
cadoria não reflete um anseio de igualdade da sociedade, que sempre foi
desigual, considerando-se que o direito à propriedade torna o mundo
excludente e cria sistemas de preservação que beneficiam os autores/pro-
dutores. A clonagem, nesse sentido, surge para beneficiar a expectativa
dos usuários que não podem possuir o produto matriz. A tecnologia e a
biologia obrigam o mundo a pensar uma nova ética.
Referências bibliográficas
PEREIRA, Lygia da Veiga. Clonagem: fatos & mitos. São Paulo:
Moderna, 2002.
http://www.brasilescola.com/biologia/clonagem.htm Acessado em 24 de
janeiro de 2010.
279
Contrafação
ANDRÉ PERUZZO
Definição
Nas discussões sobre propriedade intelectual, entende-se como o ato
ou efeito de contrafazer, na acepção estrita de reproduzir, imitar ou
arremedar o trabalho ou a obra de outrem por meio da falsificação.
Destaca-se sua relação de sinonímia com os vocábulos “simulação” e
“fingimento”, que acentua a intenção do contrafator de fazer passar a
imitação pelo original em uma tentativa de “ocultar ou esconder a
contrafação sob o manto do disfarce ou da camuflagem” (GARCIA,
2004, p. 65). Por essa perspectiva, o conceito é frequentemente utilizado
para salientar um ato de exploração ilícita do valor superior do objeto
contrafeito, uma vez que uma simples reprodução não representa,
necessariamente, um prejuízo ou ofensa ao seu autor ou inventor. Em
termos jurídicos, a Lei dos Direitos Autorais (Lei nº9.610/98, Art. 5, do
inciso VII) define a contrafação como a reprodução de uma obra não
autorizada pelo seu autor.
Glossário Pirata
280
Contextualização
Em relação à apreciação de uma possível contrafação, Garcia (2004)
destaca que a análise entre o objeto protegido por patente e o objeto
incriminado deve ser realizada segundo duas regras fundamentais: para
haver contrafação, é necessário que os meios essenciais constitutivos da
invenção ou obra sejam reproduzidos e que a apreciação considere as
semelhanças entre os objetos, e não suas diferenças, pois essas últimas não
excluem ou destroem a reprodução ilícita de qualquer semelhança essen-
cial. O autor também aponta que, assim que constatada, a lei pode punir
a contrafação mesmo que essa não acarrete prejuízo, pois a própria con-
corrência desleal e o descrédito do produto legítimo pelo infrator já
constituem um dano ao inventor ou autor.
Observa-se que a contrafação pode ser encontrada em diversas mani-
festações do contemporâneo, tais como: na reprodução ilícita de cédulas
e moedas nacionais; na confecção ou adulteração de documentos; por
meio da imitação de bens de consumo, como relógios ou até mesmo de
medicamentos; na reprodução de obras artísticas renomadas, que são
vendidas como originais em leilões especializados; entre muitos outros
casos. Por conseguinte, a Coalizão Internacional Anticontrafação, a maior
organização sem fins lucrativos dedicada à proteção da propriedade
intelectual e à contenção da contrafação, estimou em 2007 que as vendas
de reproduções não autorizadas correspondiam de 5 a 7% do comércio
mundial, o que equivaleria a 600 bilhões de dólares anuais. A tendência
era que esses valores crescessem devido à constante demanda de consu-
midores em busca de produtos com menores preços e ao aumento da
acessibilidade às ofertas de mercadorias falsificadas por meio do cres-
cimento do número de usuários da Internet e da tecnologia mobile, que
permitem que qualquer um compre um produto falsificado vendido em
Glossário Pirata
281
outro lugar do mundo. Refletindo essa expectativa, a Câmera Interna-
cional do Comércio apontou em 2011 que, até 2015, a contrafação e a
pirataria trarão danos sociais de até $1,7 trilhão.
Referências bibliográficas
CÂMARA INTERNACIONAL DO COMÉRCIO. Investigations. Disponívelem: <http://www.icc-ccs.org/icc/cib/investigation-services>. Acesso em:21 jun. 2013.
COALIZÃO INTERNACIONAL ANTICONTRAFRAÇÃO. Press Releases.Disponível em: < http://www.iacc.org/>. Acesso em: 21 jun. 2013.
GARCIA, Balmes Vega. Contrafação de Patentes: violação de direitos depropriedade industrial com ênfase na área químico-farmacêutica. 1. ed.São Paulo: LTr, 2004.
HOUAISS, Antonio. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa[intranet]. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.
TRINDADE, Eneus; SOUZA, Lívia Silva de; LINARES, Nicolás Llano.Museus da contrafação: crítica ou apologia ao consumo pirata?. In:Seminário Internacional de pesquisa - consumo: afetividades e vínculos, 2.,2012, São Paulo.
283
Cópia
BRUNO POMPEU MARQUES FILHO
Definição:
Termo de significados próximos, porém variados, “cópia” pode ser defi-
nido de maneira simplificada como a reprodução fiel de qualquer tipo
de material. De qualquer obra – texto, música, pintura, fotografia, filme,
objeto, produto, tanto faz – pode-se fazer cópias, bastando que haja, para
tanto, um mecanismo, que seja humano ou técnico.
Contextualização:
A palavra “cópia”, no Ocidente, remete diretamente ao momento em
que primeiro, na evolução social humana, se concretizou a reprodução,
não exatamente de objetos (como potes de barro ou lanças de metal),
mas de signos comunicacionais. Vai longe o tempo em que membros da
igreja católica passavam horas dedicados ao trabalho de copiar o texto
sagrado, promovendo a reprodução da Bíblia e, consequentemente, o
alastramento do cristianismo. Também com relação à música, o termo
cópia serve para designar as pessoas que, até recentemente, cumpriam a
função de copiar partituras, para serem distribuídas entre os músicos de
uma orquestra ou de um conjunto. A essa profissão – regulamentada e
Glossário Pirata
284
até relativamente prestigiada, pelo seu caráter árduo e artesanal – dá-se o
nome de “copista”.
Quando do surgimento dos mecanismos técnicos de reprodução – a
imprensa dos tipos móveis, por exemplo –, a noção de cópia passou a
incorporar um componente de fidedignidade até então muito pouco
perceptível. Enquanto as cópias dos livros e dos demais materiais escritos
eram feitas à mão, por copistas, ainda não havia a clara pressuposição de
similitude entre o texto original e as suas cópias. Com a criação da impren-
sa (e de outros mecanismos equivalentes), essa passou a ser a característica
mais marcante da cópia: a capacidade de se reproduzir fidedignamente
o original. Em outras palavras, estava criada a ideia de registro. Daí que,
até hoje, sejam feitas cópias de documentos e de outros materiais consi-
derados relevantes, como forma de registrar e compartilhar esses materiais.
Com o avanço da tecnologia, mais especificamente com o advento dos
computadores e da linguagem digital, a diferença entre o original e a cópia
deixou de existir. A partir de um mecanismo eletrônico relativamente
simples – hoje resumido ao corriqueiro “Ctrl + C” –, qualquer conteúdo
digital pode ser perfeitamente reproduzido, sem que se possa mais
distingui-lo de sua matriz. Isso fez com que os sentidos da palavra “cópia”
ficassem ainda mais complexos e paradoxais. Por um lado, os compu-
tadores pessoais, com suas impressoras, seus scanners e seus gravadores
de CDs e DVDs, trouxeram ao âmbito doméstico a capacidade de se
reproduzir materiais protegidos legalmente. Foi assim que músicas, livros
e filmes passaram a ser copiados indistintamente e trocados anarquica-
mente pela internet. Era a pirataria chegando às mãos de todo o mundo
e, a princípio, as cópias desse tipo, de grandes novidade tecnológica, pas-
saram a ser vistas como algo negativo, quase delito. Mas, hoje, por outro
lado, se há ainda algum resquício de sentido negativo na palavra “cópia”
– na certa baseado na comparação entre a reprodução e o seu “original”
Glossário Pirata
285
ou nas perdas financeiras que as cópias possam acarretar aos autores –,
com a popularização do digital esse sentido tende ao desaparecimento,
dando espaço a um significado dos mais nobres e valorizados. O termo
“cópia de segurança”, por exemplo, evidencia bem isso. Copiar arquivos,
hoje em dia, é uma forma de prevenção, está ligado à preservação dos
trabalhos e dos materiais valiosos, tem a ver com o compartilhamento e
a liberdade, está mais para o coletivo, para o massivo, para o democrático,
do que para o individual, para o elitista ou para o hermético.
Como qualquer palavra, como qualquer signo, “cópia” é também um
termo que tem seu significado alterado ao longo do tempo. Novas cama-
das de significação vão se sobrepondo às já existentes, enquanto outras
perdem sua capacidade de gerar sentido. De uma atividade regulamentada
ligada à igreja católica, passando pela crítica sociológica da indústria
cultural, a palavra “cópia” assume hoje uma miríade de sentidos, todos
eles muito próximos, mas com distinções relevantes entre si. De modo
geral, “cópia” pode ser considerada a reprodução fidedigna de algum
objeto. Entretanto, algumas diferenças sutis entre as suas acepções
merecem ser esclarecidas:
1. A cópia pode ser institucionalizada, legal, prevista e esperada. Um livro,
por exemplo, é lançado com uma certa quantidade de cópias. Nesse caso,
a palavra pode ser usada como sinônimo de “exemplar”. Jornais, revistas,
CDs – produtos editoriais, de uma forma geral – seguem o mesmo princí-
pio. “O disco daquele artista chegou ao mercado com vinte mil cópias”.
2. Pode-se também pensar em cópia como uma reprodução não
institucionalizada, mas plenamente aceita na sociedade. Documentos
pessoais são copiados, para fins burocráticos, assim como pequenos
trechos de livros podem ser também copiados, por estudantes, por
exemplo. Nesses casos, a palavra “cópia” pode substituir o termo popular
Glossário Pirata
286
“xerox”, ou o seu correspondente, “fotocópia”. Há, inclusive, o termo
“cópia autenticada” para designar esse mesmo tipo de cópia, porém ava-
lizada pela estrutura cartorária típica de nosso país. “Tira uma cópia do
seu RG e leva na secretaria”.
3. Por outro lado, a palavra “cópia” pode também entender alguma
reprodução menos desejada ou aceita. Um livro que seja reproduzido na
sua integridade, por exemplo, representa uma cópia que pode ser consi-
derada ilegal. No universo da pirataria, as cópias são os produtos falsifi-
cados, porém de qualidade inferior, que evidenciem de alguma maneira
seu aspecto de contrafação. Em uma escala comparativa, a cópia está em
um patamar abaixo das réplicas, por exemplo. “Tenho em casa uma cópia
de um Picasso”. “Pelo preço, este seu relógio só pode ser cópia”.
De um modo geral, percebe-se que a palavra “cópia”, na língua portu-
guesa, traz consigo uma certa ambiguidade entre o previsível e o inespera-
do, entre o proibido e o institucional, entre o corriqueiro e o recriminável.
Referências:
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da sua reprodutibilidade
técnica. In: LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da cultura de massa. 8a ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2011. p. 239-283.
BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. Uma história social da mídia: de
Gutemberg à internet. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2006.
SANTAELLA, Lucia. Linguagens líquidas na era da mobilidade. São
Paulo: Paulus, 2007.
. Cultura das mídias. São Paulo: Experimento, 1996.
287
Copyright e Copyleft
SILVIO KIOTI SATO
Definição:
Copyright, de acordo com o United States Copyright Office, é uma forma
de proteção proporcionada pela lei dos Estados Unidos para o autor de
trabalhos de autoria originais, incluindo literatura, música e outros tra-
balhos intelectuais, como softwares. Somente o proprietário da obra pode
autorizar reproduções, cópias, adaptações do trabalho, exibições públicas
do trabalho, entre outros direitos.
Como o próprio nome já diz, copyright refere-se ao direito à cópia ou
direito de reprodução, diferindo, portanto, do direito autoral. O copyright
protege a obra e a possibilidade de se poder copiar um patrimônio per-
tencente a alguém. O copyright de uma obra tem prazo de validade: para
obras criadas a partir de 1978, a duração dos direitos é de 70 anos após a
morte do autor.
Já copyleft é o nome de um conjunto de licenças criadas para que se pos-
sam utilizar softwares de forma livre, permitindo a alteração e redistribui-
ção do software, preservando a liberdade para novas mudanças e
distribuições.
Glossário Pirata
288
Contextualização:
A ideia da licença copyleft surgiu em 1984, quando Richard Stallman
criou o projeto GNU (sigla de “GNU is Not Unix”) para construir um
sistema de software completo, de propósito geral, mas completamente
livre. Segundo Barahona, Pascual e Robles (2003), Stallman se preocupou
desde o início com a liberdade que os usuários do seu software teriam,
além da liberdade das pessoas que recebessem seu software dos usuários
originais. Foi então que surgiu a Licença Pública Geral do GNU (GPL),
provavelmente a primeira licença de software que garantia que um progra-
ma fosse livre – uma licença alternativa às leis de copyright de softwares
existentes na época nos Estados Unidos. A GPL foi chamada de copyleft
e atualmente é o nome de uma grande família de licenças de software livre.
A posição de Stallman é que a legislação de direitos de softwares nos
Estados Unidos gerava um “monopólio de software” e não estimulava a
colaboração e o aprimoramento dos programas lançados, lançando a ideia
do “software livre”:
“My work on free software is motivated by an idealistic goal:
spreading freedom and cooperation. I want to encourage free
software to spread, replacing proprietary software which forbids
cooperation, and thus make our society better. That’s the basic
reason why the GNU General Public License is written the way
it is – as a copyleft.” (STALLMAN, 2002)
A GPL inverteu as regras do copyright, nas quais existe a garantia da
remuneração ao proprietário do software. O copyright é o direito sobre a
cópia, isto é, a preservação dos direitos de quem criou e registrou
determinada criação. No copyleft, existe a garantia de que qualquer um
possa ter acesso livre ao software, impedindo o registro futuro por parte
de alguém pela legislação de copyright.
Glossário Pirata
289
O termo copyleft surge em oposição ao termo em inglês copyright com o
trocadilho em inglês entre right (direita) e left (esquerda). Além disso, a
palavra left também significa o passado do verbo to leave (deixar). Neste
sentido, copyleft poderia ser traduzido como “deixamos copiar” ou “cópia
permitida”.
O trocadilho se estende também à frase que tradicionalmente acompanha
o termo copyright: all rights reserved (todos os direitos reservados). No caso
de copyleft, a frase foi transformada em “all rights reversed” (todos os direi-
tos invertidos/revertidos).
A oposição entre os termos copyright e copyleft é reforçada também pelos
símbolos utilizados para representar os termos: nos dois casos são utili-
zadas composições de círculos envolvendo a letra C, sendo a posição da
letra invertida para o copyleft (figuras 1 e 2).
Figura 1: Figura 2:Símbolo do “copyright” Símbolo do “copyleft”
É possível associar o surgimento do copyleft com a cibercultura, decorrente
do surgimento e uso das tecnologias de informação e comunicação
(TIC’s). De acordo com Lemos (2004): as TIC’s criaram um ambiente
favorável para trocas sociais por meio do compartilhamento de idéias,
arquivos, músicas, filmes, etc. Tudo isso de forma cada vez mais ampla,
rápida e dinâmica. Trata-se de um momento de novas interações, que
permitem (ou exigem?) a convivência entre o copyright e o copyleft, entre
a cultura centralizadora e a cultura aberta e colaborativa: “o princípio
emergente dessa cultura contemporânea é o que estamos chamando de
copyleft, uma cultura diversa, em colaboração e planetária que vai, pouco
a pouco, construir um contraponto à cultura copyright, da indústria
cultural dos mass media.” (LEMOS, 2004, p. 8)
Glossário Pirata
290
É interessante verificar que a tensão e a oposição entre o copyright e o
copyleft trazem também a discussão sobre a oposição entre capitalismo e
comunismo, o que pode ser visto na declaração de Bill Gates da Microsoft,
em entrevista realizada em 2005:
“Das economias do mundo, hoje em dia mais pessoas acreditam
na propriedade intelectual do que nunca. Há menos comunistas
no mundo hoje do que no passado. Mas existe um novo tipo de
comunista moderno que quer se livrar do incentivo para músicos
e cineastas e desenvolvedores de software sob vários pretextos.”
(GATES, apud ANDERSON, 2009, p. 229)
Esta oposição é reforçada por Sodenbergh (2002), para quem o copyright
foi inventado para e pelo capitalismo. Portanto, a oposição ao copyright
é a oposição ao capitalismo e, por isso, a teoria marxista acaba sendo o
ponto de partida natural quando se desafia o copyright. O software livre
traz uma questão anterior que é a maneira de lidar com um modelo de
contradições inerentes ao capitalismo na sociedade da informação. Nunes
(2007) também reforça o uso dos termos copyright e copyleft como a mar-
cação de uma posição política.
Atualmente, a convivência entre os modelos de copyright e copyleft provoca
tensões e debates não só relacionados à indústria do software, mas em toda
a produção de informação no ambiente das TIC’s: música, artigos, livros,
etc. Vários aspectos estão envolvidos no debate, sobretudo a dúvida sobre
qual é o modelo econômico que viabilize e incentive a produção cultural
e o desenvolvimento intelectual num ambiente de economia capitalista,
mas que quer cada vez mais produtos livres e gratuitos.
Glossário Pirata
291
Referências bibliográficas
ANDERSON, Chris. Free: grátis: o futuro dos preços. Rio de Janeiro: Elsevier,2009.
BARAHONA, J. G.; PASCUAL, J. S.; ROBLES, G. Introducción al softwarelibre. Fundació per la Universitat Oberta de Catalunya, 2003. Disponívelem http://cv.uoc.edu/~fcaulas/20041/90.783/portada_Into.pdf.Consultado em fevereiro de 2010.
CAMPOS, A. O que é software livre. BR-Linux. Florianópolis, março de 2006.Disponível em <http://br-linux.org/linux/faq-softwarelivre>.Consultado em fevereiro de 2010.
LEMOS, A. Cibercultura, Cultura e Identidade. Em direção a uma “CulturaCopyleft”? Contemporânea: Revista de Comunicação e Cultura. UFBA,Salvador, vol.2, no. 2, 2004.
NUNES, M.F.M. Novas tecnologias da comunicação e a função-autor na sociedadecontemporânea. Rastros – Revista do Núcleo de Estudos de Comuni-cação. Ano VIII, no. 8, p.71-81, outubro de 2007.
SODERBERG, J. Copyleft vs. Copyright: a marxism critique. First Monday, v.7,n.3, Mar 2002. Disponível em: http://firstmonday.org/htbin/cgiwrap/bin/ojs/index.php/fm/article/view/938/860
STALLMAN, R. Free software, Free Society: Selected Essays of Richard M.Stallman. Boston, Massachussetts: GNU Press, 2002.
. Copyleft: Pragmatic Idealism. Disponível em: http://www.gnu.org/philosophy/pragmatic.html
Circular 1: Copyright Basics. United States Copyright Office – Library ofCongress. Julho de 2008. Disponível em: http://www.copyright.gov/circs/circ1.pdf
Entenda o que é o conceito “copyleft”. Folha de S.Paulo. São Paulo, fevereiro de2003. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u12307.shtml
http://www.gnu.org/copyleft/copyleft.pt-br.html. Consultado em fevereiro de2010.
Glossário Pirata
292
http://www.creativecommons.org.br/index.php?option=com_frontpage&Itemid=1. Consultado em fevereiro de 2010.
http://www.amigosdolivro.com.br/lermais_materias.php?cd_materias=5658.Consultado em fevereiro de 2010.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Copyleft. Consultado em fevereiro de 2010.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_autoral. Consultado em fevereiro de2010.
293
Creative Commons
BRUNO POMPEU MARQUES FILHO
Definição:
Trata-se de uma organização sem fins lucrativos que desenvolve e ofe-
rece gratuitamente licenças jurídicas de direitos autorais para obras de
várias naturezas, fornecendo proteção aos seus autores e ao mesmo tempo
fomentando o compartilhamento da criatividade e do conhecimento.
Contextualização:
O Creative Commons surgiu como um grupo organizado em 2001, na
Califórnia, nos Estados Unidos, a partir da percepção de que as leis de
direitos autorais eram rígidas demais e pouco adequadas ao contexto em
que se vive – marcado pelo digital, pela conectividade, pela facilidade de
se produzir, capturar, armazenar, editar e propagar signos.
Diante disso, muito inspirado nos coletivos de software livre, o grupo
passou a desenvolver licenças de direitos autorais que pudessem de alguma
forma regulamentar a produção e sobretudo o compartilhamento de obras
de vários formatos – som, imagem, vídeo, texto, dados etc. Todas as
licenças que o Creative Commons disponibiliza são gratuitas, extrema-
Glossário Pirata
294
mente simplificadas e procuram não só proteger os autores, mas também
estimulam o compartilhamento daquilo que é produzido e licenciado.
Para ter acesso a uma das licenças, basta entrar no site do grupo e res-
ponder a algumas poucas e rápidas perguntas, que servem apenas para
selecionar o tipo mais adequado de licença. Em poucos minutos o usuário
consegue licenciar sua obra, nas bases que lhe forem mais convenientes.
Na medida em que tudo o que se produz (obra de qualquer natureza) é
objeto das leis de direitos autorais, que variam de país para país mas que
quase sempre garantem ao autor o direito pleno sobre sua produção, as
licenças do Creative Commons são de certa forma revolucionárias, porque
se pretendem internacionais e, mais ainda, porque estão baseadas no livre
compartilhamento.
Há licenças de vários tipos: umas mais rígidas, que obrigam, por exemplo,
os que da obra se aproveitarem a citar a fonte, não editarem seu conteúdo
e não a utilizarem com fins comerciais; e há as mais livres, que liberam
totalmente o uso, a edição e a propagação da obra – ou de parte dela.
Vale comentar que o Creative Commons acaba funcionando também
como uma rede colaborativa na internet, na medida em que fornece um
poderoso sistema de busca nas bases de obras licenciadas, conectando os
autores que já se servem das suas licenças e ao mesmo tempo fomentando
a adesão dos que procuram obras de uso livre.
No Brasil, o Creative Commons é administrado pelo Centro de
Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro.
295
Duplo
BIBIANA STHOLER SABENÇA DE ALMEIDA
No senso comum, duplo possui um sentido de mais um igual, dois,
dobro ou algo adicional, um plus. Denotativamente, duplo significa
(Minidicionário Luft, 1991):
“1. Multiplicativo de dois; 2. Formado de duas partes iguais; 3.
Quantidade duas vezes maior que outra, dobro; 4. Pessoa ou coisa
muito semelhante a outra.”
No feminino, dupla quer dizer: “1. Grupo de dois; 2. Conjunto de dois
elementos.” (Minidicionário Luft. 2ª Edição. São Paulo: Editora Scipione.
1991). Já o verbo duplicar (Minidicionário Luft, 1991):
“1. Multiplicar por dois; dobrar. 2. Redobrar; multiplicar;
intensificar; 3. Tornar-se outro tanto maior. Duplicação (sub);
Duplicado (adj); Duplicador (sub e adj).”
Dessa forma, o sentido de duplo evoca uma parte, mas, uma parte seme-
lhante, mesmo que haja a matemática do dobro, da duplicação ou do
conjunto, sugerindo mais partes.No universo biológico, podemos utilizar
o termo “clone” para designar um descendente de células, cuja origem
se deu na célula-mãe. Temos aí dois seres geneticamente iguais.
Glossário Pirata
296
Contextualização:
Na literatura, a primeira materialização de duplo foi eternizada na obra
“O Duplo” (1845) do escritor russo Fiódor Dostoiévski. No conto, o
autor narra a história de Iákov Pietróvitch Goliádkin, um alto funcionário
de repartição pública, com mania de perseguição por parte de seus ini-
migos (tormenta criada por ele mesmo). Numa noite gélida e sombria
de novembro, depara-se com um senhor fisicamente igual a ele (seu
homônimo). Chocado com tal visão, volta correndo para sua casa e acre-
dita que tudo fora um pesadelo. No dia seguinte, já no trabalho, seu chefe
apresenta-lhe um senhor humilde e recém-chegado à cidade, o senhor
Iákov Pietróvitch Goliádkin, de mesmo nome e sobrenome iguais ao seu.
Logo, este senhor (Goliádkin 2) se apropria de sua identidade e torna-se
seu pior inimigo.
Outra aparição de duplo foi em 2002, na obra O Homem duplicado do
escritor português José Saramago. No romance, o autor conta a trajetória
de dois homens fisicamente iguais: Tertuliano Máximo Afonso, um pro-
fessor de história e António Claro, um ator de cinema. Eles não possuem
relação de parentesco. No entanto, nasceram nos mesmos dia e ano, com
apenas 1 minuto de diferença. Isso assegura o primeiro nascido ser o origi-
nal e o segundo, a cópia.
Já o duplo na animação, pode ser encontrado em um episódio de Os
Simpsons, “Double, Double, Boy in Trouble” (2008). Bart Simpson
encontra seu duplo no banheiro de uma festa e troca de lugar com ele. Tra-
ta-se de Simon Woosterfields, um garoto rico, herdeiro de uma rede de
hotéis. Ele é seu duplo milionário. O título do episódio faz alusão à peça
MacBeth de Shakespeare. São as preces ditas por três bruxas ao revelar a pro-
fecia: “Double, double, toil and trouble”. No caso do desenho, quer dizer
que há um duplo correspondente ao garoto (Bart) e por isso, o problema.
Glossário Pirata
297
O duplo no cinema está presente em “O Grande Truque” (The Prestige),
com Hugh Jackman, Cristian Bale e Scarlet Johansson. A direção é de
Christopher Nolan (2006). Trata-se da história de dois mágicos amigos
que se tornam rivais e disputam um amor. Um deles tem o duplo que
toma o lugar do original e se sacrifica por ele.
Há também o “Duplo Amor” (Two Lovers), um filme com Joaquim
Phoenix, Gwyneth Paltrow e Vinessa Shaw. A direção é de James Gray
(2009). A trama tem como personagem principal Leonard,que vive uma
vida dupla entre dois amores.
Referências bibliográficas
Minidicionário Luft. 2ª Edição. São Paulo: Editora Scipione, 1991.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Clone
299
Fair Use
BRUNO POMPEU MARQUES FILHO
Definição:
Dispositivo legal do sistema jurídico norte-americano, que serve como
relativização das leis de direitos autorais. Sua tradução (uso justo, uso
honesto) faz perceber que se trata de uma lei ambígua, mas que faz reduzir
a rigidez das leis de direitos autorais dos Estados Unidos. Pela lógica do
fair use, dependendo de alguns fatores, a cópia de obras legalmente
protegidas deixa de ser uma violação à lei de direitos autorais.
Contextualização:
A lei norte-americana determina que o autor tem total direito sobre suas
obras produzidas, de modo que a reprodução dessa obra (ou de parte dela)
é proibida e pode ser considerada crime. Entretanto, em algumas situa-
ções, essa reprodução pode ser justificada no princípio básico da common-
law, que favorece o coletivo em detrimento do individual (sem que este
último se prejudique).
Assim, de acordo com o fair use, uma obra de qualquer natureza pode
ter partes reproduzidas, observando-se quatro questões:
Glossário Pirata
300
1. O fim e o tipo do uso que vai se dar à cópia – costuma-se considerar
fair use as reproduções usadas com fins educativos, de crítica, discussão
etc. Por exemplo, trechos de obras literárias reproduzidas em sala de
aula, frases de um livro reproduzidas em uma resenha crítica etc.;
2. A natureza do trabalho copiado – normalmente as cópias de obras
ficcionais enquadram-se menos no fair use do que as de obras docu-
mentais. O uso de fotografias de grandes acontecimentos, por exem-
plo, tende a ser mais aceito do que a reprodução de fotografias de
moda;
3. A quantidade do que foi copiado com relação ao todo – quanto menos
representativa do todo for a parte copiada, maior é a chance de sua
reprodução ser considerada fair use. Atualmente, já se consideram
fatores qualitativos e não apenas quantitativos, de modo que um
trecho de um livro, por menor que seja, se representar algo extrema-
mente relevante na obra completa, pode não se enquadrar no fair use;
4. O efeito da cópia nos interesses do autor – se a reprodução de um
trecho de uma obra comprometer mercadologicamente a exploração
da obra pelo seu autor, dificilmente vai ser considerada fair use. A
reprodução de artigos de revista, por exemplo, em um site, imedia-
tamente após o seu lançamento, ainda que com fins de crítica e discus-
são, pode prejudicar as vendas dessa revista. Nesse caso, o fair use não
se configura.
No Brasil, não há dispositivos legais semelhantes ao fair use, de modo
que oficialmente a lei acaba sendo mais rigorosa. Entretanto, a própria
lei de direitos autorais (9.610/98) traz em seu texto algumas situações
específicas, em que é permitida a reprodução de partes de obras prote-
gidas. O uso de trechos de obras literárias para fins educativos, por exem-
plo, é protegido pela dita lei, assim como a reprodução de qualquer tipo
de obraque se faça individualmente, para uso doméstico.
301
Falsificação
LÍVIA SOUZA
Definição
Entendemos por falsificação o ato de falsificar, o que, por sua vez, pode
ter como objetos diferentes categorias, como, por exemplo, alimentos,
medicamentos, assinaturas, obras de arte e outros. A falsificação está
sempre ligada a uma atividade fraudulenta e, portanto, envolve infrações
legais. A falsificação está relacionada, assim, a um tipo fraudulento de
imitação, e ocorre quando determinado objeto ou coisa, por meio de uma
aparência que leve ou pretenda levar ao engano, tenta se passar pelo objeto
verdadeiro, de autoria ou procedência legitimadas. O termo aparece,
muitas vezes, como sinônimo de contrafação.
Contextualização
Por ser aplicável a diferentes esferas, a falsificação tem, na legislação
brasileira, sua representação em diversas categorias.
Primeiramente, o Código Penal Brasileiro (Decreto-lei n. 2.848, de
1.940) descreve e prevê penalidades para diversas modalidades de falsi-
ficação ou adulteração de documentos. Assim, no Art. 297, temos: “Falsi-
ficar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento
Glossário Pirata
302
público verdadeiro”. Analogamente, no Art. 298, temos: “Falsificar, no
todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular
verdadeiro”. Temos, em ambos os casos, portanto, a falsificação em
oposição ao documento verdadeiro, seja a falsificação efetuada no
documento todo ou em apenas uma parte.
Também em outras esferas, como no Código de Trânsito Brasileiro (Lei
n. 9.503, de 1.997, Art. 234) e no Código Eleitoral (Lei n. 4.737, de
1.965, Art. 348), está prevista a mesma tipologia do crime de falsificação
de documentos, mas aqui aplicado aos documentos específicos destas área.
Além da falsificação de documentos, existem leis que tipificam a falsi-
ficação de diversos tipos de produtos.
Uma dessas leis é a Lei n. 9.279, de 1.996, que dispõe sobre a propriedade
industrial. Nesse sentido, ela se aplica à concessão de patentes, à concessão
de registros de marca, à repressão às falsas indicações geográficas, bem
como à concorrência desleal, no caso de determinado produto ou marca
levantar informações falsas a respeito do concorrente, prejudicando-o,
ou ainda, utilizar o invólucro ou recipiente que induza o consumidor ao
erro ao adquirir determinado produto.
Aqui, portanto, temos algo que se aproxima mais dos temas trabalhados
neste livro, ou seja, a pirataria do ponto de vista do consumo.
Podemos mencionar também a Lei n. 9.677, de 1.998, que se aplica à
falsificação de medicamentos e alimentos.Ela trata, para tanto, do que
chama de “falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância
ou produtos alimentícios”, bem como de “falsificação, corrupção,
adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou
medicinais”.
Glossário Pirata
303
Em âmbito internacional, foi justamente a falsificação de medicamentos
o objeto da primeira forma de mobilização no sentido de regulamentar
a proteção à propriedade industrial e intelectual, no século XIX.
Trata-se da atuação da UNIFAB – União dos Fabricantes, criada na
França em 1872, que inicialmente atendia aos interesses de empresas da
indústria farmacêutica, justamente com a missão de atuar no desenvol-
vimento de tratados internacionais a esse respeito na proteção de patentes
para a produção de medicamentos.
Nesse sentido, em 1883, a UNIFAB participou da elaboração da União
Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial e, em 1891,
do Acordo de Madri, relativo ao Registro Internacional de Marcas de
Comércio. Em 1951, a UNIFAB criou o Museu da Contrafação, em Paris
(Musée de La Contrefaçon), com objetivo didático quanto às diversas
categorias de contrafação, e suas implicações à economia internacional.
Diante de todas as diferentes aplicações do termo falsificação, torna-se
necessário, ainda, aproximá-lo mais da questão do consumo, a partir das
“Tipologias de imitação estética na propaganda”, artigo publicado por
Giacomini Filho (2011).
O autor enumera e diferencia seis diferentes modalidades da imitação
estética em publicidade: falsificação, pirataria, plágio, knockoff, adaptação
e paródia, baseado em pesquisa teórica (GIACOMINI FILHO, 2011: 225).
Particularmente a respeito da falsificação, Giacomini Filho esclarece, com
base em Bian e Moutinho (2009): “cópia ilícita de um direito marcário,
de forma que o bem imitador torna-se idêntico ou indistinto do original
desrespeitando os respectivos direitos”. De modo geral, a falsificação,
caracterizada como um tipo de contrafação, trata-se de um processo de
imitação de um produto original estabelecido no mercado, com o intuito
Glossário Pirata
304
de comercializá-lo como se fosse o original, tornando-se mais atrativo
devido a um preço menor. O processo, assim, é ilícito, e traz danos
autorais ao produto original e sua marca.
Referências bibliográficas
GIACOMINI FILHO, Gino. Tipologias de imitação estética na propaganda. In:Revista MATRIZes. Ano 4. v.2, jan/jun, 2011. p. 216-238.
HOUAISS, A.; VILLAR, M. de S.; FRANCO, F. M. de. Dicionário Houaissda língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.
Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php – Acesso em 09/05/2012.
Lei n. 9.279, de 1.996Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm– Acesso em 09/05/2012.
Lei n. 9.677, de 1.998Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9677.htm– Acesso em 09/05/2012.
Código Penal BrasileiroDisponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm – Acesso em 09/05/2012.
Código de Trânsito BrasileiroDisponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503.htm– Acesso em 09/05/2012.
Código EleitoralDisponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4737.htm– Acesso em 09/05/2012.
Site da Unifab – Union des Fabricants (União dos Fabricantes)Disponível em: http://www.unifab.com/ – Acesso em 09/05/2012.
305
Fantasia
ANDREA MENEGHEL
Definição:
Fantasia é algo que não tem existência real, que pertence somente à
imaginação, é algo idealizado, uma ficção. É uma imaginação criativa
caracterizada, na maioria das vezes, pelo exagero e pela extravagância,
tornando a fantasia inacreditável.
Na maioria das vezes a fantasia está associada ao impossível, ou seja, a
um objeto ou situação considerado impossível de se obter ou de se tornar
real. No entanto, essa afirmação não é correta uma vez que a fantasia pode
ser possível de se tornar real, como no caso de um indivíduo que idealiza
(fantasia) uma determinada situação que pode ser factível ou não.
Contextualização:
O substantivo fantasia tem origem na palavra grega phantasía, que
significa “imaginação criadora”, “o que é irreal”, “criação do que não existe
na natureza” (CUNHA, 1982). Originou-se provavelmente no folclore e
nos mitos e romances épicos, onde era utilizada para dar forma aos cená-
rios e às personagens, muitas vezes dotadas de poderes ou forças sobre-
naturais, caracterizando assim, o aspecto fantástico dessas históricas.
Glossário Pirata
306
O Carnaval é uma das formas mais comuns de entendermos a fantasia
no Brasil. Durante os festejos e desfiles, a fantasia se manifesta de maneira
muito marcante no vestuário, utilizado pelos carnavalescos como repre-
sentação de uma figura ou personagem de uma história ou como um
elemento que represente parte do tema do samba enredo. Nesse contexto,
a vestimenta, chamada de fantasia, tem como objetivo fazer com que
alguém pareça ser algo que de fato não é.
A fantasia em forma de roupa normalmente representa seres do passado,
do futuro, com poderes mágicos ou está associada a uma ideia de com-
portamento ou personalidade que se deseja transmitir.
Algumas empresas, também pensando em uma ideia ou imagem que
desejam transmitir, adotam um nome fantasia que é uma nomenclatura
diferente da razão social, que relaciona o produto ou serviço oferecido
pela empresa ao nome empresarial. Para simplificar o entendimento, a
razão social é como o nome de uma pessoa e o nome fantasia é como o
apelido.
O nome fantasia não é registrado ou protegido como a marca. Para que
a empresa tenha proteção, o nome fantasia precisa ser devidamente regis-
trado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), tornando-
se a marca do produto ou serviço oferecido pela empresa.
A fantasia está presente na vida de todos. Já na infância, a criança faz uso
da fantasia para atribuir significado às coisas e construir a sua visão de
mundo, sendo utilizada também para auxiliar no entendimento e ame-
nizar situações indesejáveis ou dolorosas, como a perda de um ente queri-
do. Basta observar uma criança durante suas brincadeiras para constatar
a forte presença da fantasia em sua vida: são dragões, princesas, castelos,
naves espaciais, animais dotados de fala, entre tantas outras criações da
imaginação infantil.
Glossário Pirata
307
Presente também na vida adulta, de acordo com Freud, a fantasia é uti-
lizada pelo indivíduo como forma de satisfazer algum desejo.
Freud parte da ideia de que a pessoa feliz nunca fantasia, somente
aquela insatisfeita. Sendo a correção de uma realidade insatisfa-
tória, a fantasia representa, como o sonho, a realização de um
desejo. São os desejos insatisfeitos que constituem as forças
motivadoras das fantasias, por isso Freud utiliza frequentemente
a expressão fantasia de desejo. (JORGE, 2010, p. 46)
Assim, os desejos motivam as fantasias que são criadas pelos indivíduos
durante toda a vida, inicialmente para construir suas concepções sobre o
mundo, depois para amenizar desejos frustrados ou reprimidos. Por meio
das fantasias, o indivíduo é capaz de inventar ou evocar imagens fictícias
e manifestar sua livre interpretação e entendimento sobre as coisas, o que
torna a fantasia intimamente relacionada à criação artística.
É no campo das artes que provavelmente a fantasia se manifesta com
maior liberdade, onde a criatividade do artista nos leva a experimentar
sensações e vivenciar experiências improváveis em nossa vida cotidiana.
Por meio da fantasia o artista liberta-se do usual, do conhecido, do já
experimentado, e cria algo novo, com sua própria leitura e entendimento,
como afirma Jeha:
A fantasia é mais que mera representação do produto, isto é, do
mundo como o conhecemos, ou de uma teoria de conhecimento
do mundo. Podemos abordar a fantasia como um tipo especial
de mimese: uma representação do processo de criação ontológica,
pela qual mundos possíveis e impossíveis adquirem existência.
(JEHA, 2001, p. 125)
Na literatura e no cinema, de modo geral, o termo ficção especulativa é
mais utilizado devido à grande dificuldade em separar os gêneros fantasia,
ficção científica e horror.
Glossário Pirata
308
Nesses campos a fantasia pode estar presente somente na ação de uma
determinada personagem, como o caso de Mary Poppins, ou em todo
um contexto fantasioso onde exista relação entre personagens também
fantasiosos como Super-homem e Lanterna Verde, super-heróis membros
da Liga da Justiça. A fantasia também pode acontecer em um universo
ou mundo inexistente, totalmente inventado e regido por outras regras,
ondea magia e as ações impossíveis ou irreais estão presentes como nos
livros e filmes Senhor dos Anéis, Crônicas de Nárnia e Alice no País das
Maravilhas.
De modo geral, a fantasia é uma possibilidade de vivenciar uma expe-
riência que se sabe não fazer parte da realidade. É uma aproximação do
fantástico com o real.
Referências bibliográficas
CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da línguaportuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial. <http://www.inpi.gov.br>
JEHA, Julio. A Semiose da Fantasia Literária. Signótica – Revista do Programade Pós-Graduação em Letras e Linguística da Universidade Federal deGoiás. V.13, n.1,p.117-136, jan./dez. 2001. Disponível em:<https://www.revistas.ufg.br/index.php/sig/article/viewFile/7295/5162>. Consultado em junho de 2012.
JORGE, Marco Antonio Coutinho. Fundamentos da Psicanálise de Freud àLacan, vl. 2 – a clínica da fantasia. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.
Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Consultado emjunho de 2012.
Glossário Pirata
309
NASIO, Juan-David. A fantasia: O prazer de ler Lacan. Rio de Janeiro: Zahar,2007.
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Fantasia_%28psicologia%29>. Consultado emjunho de 2012.
311
Genérico
JÔSE FOGAÇA
Definição
No senso comum o termo genérico designa aquilo que é inspirado em
algo de marca ou já bastante conhecido, mas constitui uma cópia e,
portanto, não possui a marca original.
Contextualização
O termo surge no universo farmacêutico, num movimento originário dos
Estados Unidos e que se constituiu fortemente no Brasil. Em 1999 a Lei
nº 9.787 estabeleceu a comercialização do medicamento genérico no país,
o qual contém os mesmos princípios ativos, concentração, forma
farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica de
um produto de referência ou inovador. Após a comprovação em testes
específicos sobre a eficácia, segurança e qualidade do medicamento
genérico, este é considerado intercambiável com o de referência.
Glossário Pirata
312
A ANVISA – Agência Nacional de
Vigilância Sanitária– descreve as três
diferentes categorias de medicamentos
que concorrem no mercado brasileiro:
Medicamento de marca ou referên-
cia: É o produto inovador, cuja eficá-
cia, segurança e qualidade foram com-
provadas cientificamente por ocasião do registro. É geralmente o primeiro
remédio que surgiu para curar determinada doença e sua marca é bem
conhecida. Ex: Aspirina.
Medicamento genérico: É um remédio intercambiável com o produto
de marca ou inovador. Isto é, pode ser trocado por estepois tem rigoro-
samente as mesmas características e efeitos sobre o organismo do paciente.
A garantia é dada pelo Ministério da Saúde que exige testes de bioequi-
valência farmacêutica para aprovar os genéricos. Testes de bioequivalência
servem para comprovar se dois produtos de idêntica forma farmacêutica,
contendo idêntica composição, qualitativa e quantitativa, de princípio
ativo, são absorvidos em igual quantidade e na mesma velocidade pelo
organismo de quem os toma. Os genéricos podem ser trocados pelos me-
dicamentos de marca quando o médico não se opuser à substituição.
Medicamento similar: Contém o mesmo princípio ativo, apresenta a
mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posolo-
gia e indicação terapêutica do medicamento de referência, mas não são
bioequivalentes. Sendo assim, não podem substituir os remédios de marca
na receitapois, apesar de terem qualidade assegurada pelo Ministério da
Saúde, não passaram por análises capazes de atestar se seus efeitos no pa-
ciente são exatamente iguais aos dos medicamentos de referência nos que-
sitos quantidade absorvida e velocidade de absorção.
Fonte: http://portal.anvisa.gov.br
Glossário Pirata
313
O produto genérico é geralmente produzido após a expiração ou renúncia
da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade e tem um
mercado em expansão no Brasil, tendo alcançado 26% de marketshare
em volume em 2012, segundo o IMS Health.
Com a grande divulgação desse tipo de medicamento e com a prescrição
compulsória do princípio ativo pelos médicos da rede pública, o termo
genérico se popularizou e passou a significar a opção por um produto
mais barato com a mesma qualidade, extrapolando o mercado de
medicamentos.
Assim, fora do contexto dos medicamentos, o uso do termo genérico se
expandiu para diversas áreas, em especial para o mercado de moda de luxo,
sendo utilizado nos casos em que se quer designar uma imitação de mode-
lo de marca famosa, que pode não apresentar marca alguma ou levar outra
marca menos famosa (em geral uma marca local) que produziu o modelo
de forma idêntica ou adaptada.
Glossário Pirata
314
Referências bibliográficas
http://www.progenericos.org.br/ (acesso em junho de 2013)
http://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2013/02/18/venda-de-genericos-tem-o-menor-crescimento-desde-2001.htm(acesso em junhode 2013)
http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/Anvisa+Portal/Anvisa/Inicio/Medicamentos/Assunto+de+Interesse/Medicamentos+genericos(acessoem junho de 2013)
315
Genuíno
ENEUS TRINDADE
Definição:
O termo genuíno designa a qualidade daquilo que conserva suas carac-
terísticas próprias ou naturais e não é falso, nem é uma imitação. Trata-
se de algo autêntico, puro, em que não se verificam hibridismos.
Contextualização:
Para a semiótica de Charles SandersPeirce, o sentido de genuíno é um
atributo relevante para qualificação das relações de sentidos. O conceito
de signo genuíno, para o autor, refere-se ao aspecto de semioses que acon-
teceriam dentro de relações triádicas que levam a processos de interpre-
tações da terceiridade junto aos processos cognitivos dos intérpretes. Só
interpretações da terceiridade, abstratas e, portanto, simbólicas, são passí-
veis de serem genuínas (PIMENTA, 2005, p. 54).
“O mundo dos fatos contém somente aquilo que é, e não tudo
aquilo que é possível de qualquer descrição. Daí, ele não pode
conter uma tríade genuína. Mas, embora não possa conter a tríade
genuína, o mundo dos fatos pode ser governado por tríades genuí-
nas” (PEIRCE, 1: 478).
Glossário Pirata
316
Percebe-se, a partir do exposto, que aquilo que guarda relações de inter-
pretações por signos em semelhanças ou de natureza indiciais geram
semioses que se constituiriam em signos degenerados.
Conexão com o Tema:
Nesse sentido, se formos pensar a produção de sentido ou semiose da
mercadoria pirata, podemos considerar que a sua performance é de um
signo degenerado, pois só o genuíno consegue se articular plenamente
de forma simbólica, gerando o interpretante argumentativo. A merca-
doria pirata geraria interpretantes remáticos ou dicendes em relação ao
produto autêntico. Por outro lado, o estar no mundo das mercadorias
piratas é governado por tríades genuínas, daí a sensação de satisfação que
advém desse tipo de consumo.
Referências bibliográficas
PEIRCE, Charles Sanders. (1931-1958). Collected Papers. 8 vols. Cambridge:Harvard University Press (citação traduzida por Francisco Pimenta).
PIMENTA, Francisco José Paoliello. (2005). Produções multicódigos e o con-ceito de signo genuíno em Peirce. Revista Comum. Rio de Janeiro: v. 10,n. 24. p. 58- 68.
317
Imitação
CLOTILDE PEREZ E SERGIO BAIRON
Definição:
O conceito de imitação tem forte conexão com reprodução (cópia
fiel, traduzir com fidelidade) o mais exato possível. Pode se conectar ainda
com a repetição de um determinado fenômeno a partir de suas peculia-
ridades, expressões, gestos, fala, fisionomia, vestimenta (quando pessoa).
Conferir aparência semelhante a...
Chega a ter conotação penal: contravenção por meio da reprodução e/
ou propagação com o intuito de confundir, ludibriar (intencionalidade).
Conotação neutra: em conformidade...
Contextualização:
Ao longo da história da estética, o termo imitação derivado do latim
imitatio (imitari, da mesma raiz de imago, “imagem”) foi utilizado como
sinônimo do termo grego mimesis (do verbo mimeisthai e de mimos,
“mímica”, “imitação”, “arte”, “mimese”). Apesar das suas diversas
metamorfoses semânticas, que vão desde uma cópia irrefletida da natureza
Glossário Pirata
318
à representação do universal, passando pela reprodução dos modelos
clássicos, pela seleção ideal, pela duplicação realista ou pelo simulacro
ilusionista, entre outras, existe entre elas um forte elemento comum: a
imitação supõe a apresentação de qualquer coisa num plano-outro-
mediato que se diferencia daquele plano-mesmo-imediato em que a coisa
é apresentada. Deste modo, torna-se menos redutora e insuficiente a
tradução verbal do conceito de imitação que, geralmente, se expressa
como reprodução mais ou menos imperfeita de um original conhecido,
seja a natureza, a sociedade e a sua vivência, um homem, uma obra mo-
numental do passado, as ruínas, o design, uma ideia etc.
A teoria da imitação foi utilizada pelos pitagóricos de forma a explicitar a
relação existente entre as coisas e o universo referencial dos números. Este
termo encontra-se, também, nos escritos hipocráticos designando a neces-
sidade da arte (e da medicina) acompanhar a natureza num esforço iden-
titário incompleto (observações igualmente registradas em Heráclito).
Segundo os Pitagóricos, todas as coisas imitavam a proporção, a ordem e
a medida presentes nas entidades numéricas, seu fundamento. Em sentido
idêntico, Platão (1987) descreve a relação entre as coisas sensíveis e as ideias
por meio do termo participação. Mas usa também o termo imitação para
expressar esta inferioridade ontognoseológica da dimensão sensível
relativamente à dimensão inteligível. A pintura, tal como a poesia, são
atividades circunscritas a “fazedores de imagens”, porque os artistas “criam”
fantasmas que se afastam triplamente da realidade e da verdade. Visto que
não imitam as coisas reais que existem na natureza, mas as obras dos
artífices, são imitadores da aparência da realidade (conhecendo por eikasia
– ilusão – as imagens ou cópias das cópias das coisas naturais e reais – os
eikones – que são espelhados nas suas pinturas e poemas). Devem ser assim,
afastados de uma cidade que se deseja racional e não irascível. O autêntico
criador/artista para Platão (1987), no livro X da República é o artífice divino
Glossário Pirata
319
que cria o original (eidos – ex: a ideia de cama – a cama real). Sobre esse
aspecto Platão faz a distinção entre três espécies de camas: uma que existe
na natureza das coisas e que foi criada por Deus, uma que é obra do
marceneiro, e uma terceira cama, a do pintor. A de Deus é a cama real, o
artesão que fabrica o objeto cama é o artífice, aquele que é capaz de repro-
duzir a cama divina numa cama particular, que tem uso, utilidade. E a cama
do artista, qual é? Platão define a cama do artista como imitação. Por isso,
na República, a cidade ideal de Platão, não haveria artistas, seres produtores
de “imitação do real”. Esta qualidade de imitador é o que Sócrates afirma
nesta explicação: “Há três artes que correspondem a cada objeto: a do uso,
a da fabricação e a da imitação.”
Aristóteles, na Poética, reabilita a imitação, libertando-a do seu estatuto
metafísico. Torna-a o fundamento da poética (poesia, épica e tragédia,
comédia, poesia ditirâmbica), da pintura, da música (flauta e lira) e de
todas as artes fazedoras de imagens, visto que são, em geral, modos de
imitação que se diversificam de acordo com os meios e as coisas que
representam ou intencionam representar. Desse modo, o que singulariza
a poesia não é o verso, mas a sua possibilidade de imitar aquilo que é
segundo as leis do verossímil, da semelhança... A legislação que preside à
imitação (verossimilhança) exerce-se, também, quando o artista completa
as imagens das coisas inacabadas ou favorece por meio dos mais belos
modelos (representação do universal), aquilo que na realidade pode causar
desprazer. Nesse sentido, o ato de imitar revela, mais uma vez, a não coin-
cidência ou identificação entre a representação e aquilo que é represen-
tado, caso contrário, o termo imitação se esvaziaria de sentido.
Em traços gerais, a tradição (neo)platônica reinterpreta o termo imitação
como representação de um original ou modelo ideal superior à natureza,
facultado pelo intelecto de seus intérpretes. Esta acepção influenciou a
atividade e a reflexão estética desde a Antiguidade até a Idade Moderna.
Glossário Pirata
320
No Renascimento, a imitação é, sobretudo, estudo e invenção. O artista
permanece fiel à natureza, reproduzindo-a com precisão, mas esta ativi-
dade imitativa reclama inovação técnica e não uma absoluta repetição
simplesmente passiva das formas.
A negação de uma imitação repetitiva e passiva da natureza foi vivificada,
de um modo descontínuo, no decurso dos séculos seguintes. Diderot é
um paradigma desta descontinuidade presente no século XVIII. Consi-
derava ser a arte ou o lugar de uma imitação menos imperfeita do Sol da
Natureza ou o “pretexto” para uma imitação progressiva, seletiva, inven-
tiva e transpositiva da realidade natural e mesmo social e humana, pois
não só duplicava, como também corrigia e reinventava tecnicamente a
natureza ou a sociedade, desenhando os contornos do Sol nascente-não
decalcado-da Arte. Neste último sentido, o artista menos súbdito da ins-
tância natural, deveria imitá-la segundo um modelo ideal por si construí-
do, abstraído e não circunscrito a características ou elementos singulares
e particulares naturais, aplicando-se os mesmos procedimentos à repre-
sentação da realidade social. Esta obra transpositiva se efetivaria com a
observação, a experiência, o talento, o tato (a sensibilidade) e a reflexão.
Recusava, no entanto, todos os artistas que desprezavam o princípio da
imitação em nome da maneira, da ficção e da alegoria.
Mas os infortúnios da imitação anunciam-se com o surgimento do
Romantismo: a arte e a natureza são, gradualmente, compreendidas como
forças inventivas e criadoras. O princípio da arte reside na atividade
criativa e criadora do artista que se assemelha à criatividade natural. Fun-
dada neste princípio subjetivo, a estética romântica liberta as obras de
arte da obediência cega e necessária a um exterior-objetivo, muitas vezes,
superior e anterior, considerando que estas são símbolos, organismos que
valem por si e que se formam a partir de uma coerência interna onde o
conteúdo, o referente é a própria obra: trata-se da queda definitiva do
Glossário Pirata
321
princípio da imitação como elemento exclusivo de compreensão de todas
as propriedades de uma obra de arte.
No século XX, a temática da imitação foi objeto de reflexão com o intuito
de clarificar conceitos como o de figuração e de representação em geral,
etc., continuando perdido o seu valor estético inicial.
Assim, notamos que a imitação sugere relacionar-se com os fenômenos
burlescos e caricaturais, onde a reprodução não é fiel, mas sempre parcial,
manifestando a ênfase nas particularidades/especificidades. A imitação
não vislumbra a perfeição ou a totalidade. Daí a conexão sígnica com o
arremedo, o que intensifica as associações com a reprodução deficiente,
malfeita...
Para Baudrillard (2001: 67), “o Real não está apenas morto (como Deus
está); ele pura e simplesmente desapareceu.” E quais são os riscos de
abandonar o real? O temor platônico pela ilusão e pela imitação está
presente nos críticos contemporâneos do virtual. Persiste a ideia, por
exemplo, de que o virtual é enganador e que só o real é o divino.
Genette (1979: 182) entende que a ‘imitação’ é sempre uma paródia por
acumulação e acentuação de traços específicos. A imitação – que equivale
ao conceito de simulação enunciado por Baudrillard – é considerada por
Genette como paródia, por ser esta re-apresentação do discurso primeiro,
do texto autêntico.
Glossário Pirata
322
Referências bibliográficas
BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. Trad.: Maria João da CostaPereira. Lisboa: Relogio d’Agua, 1991.
. A ilusão vital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
DIDEROT, Denis. OeuvresEsthétiques; Paris: Garnier, 1976.
ECO, Humberto e outros, História da Beleza, Lisboa: Difel, 2004.
GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa. Ensaio de método. Lisboa: Arcádia,1979.
PLATÃO, República, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987.
323
Kitsch
JANIENE SANTOS
Definição:
No seu significado comum, Kitsch pode ser definido pela ausência de
estilo, percebida na reinterpretação grotesca e distorcida de expressi-
vidades culturais bem como produtos cuja lógica de produção e consumo
está na necessidade de status e pertencimento.
Contextualização:
Para Moles (1971), Kitsch é um conceito universal e que corresponde,
acima de tudo, a uma época de gênese estética e a um “estilo marcado
pela ausência de estilo”. ( Ibid., p. 10). Realizando um resgate histórico
do termo utilizado para também (e não apenas) expressar mau gosto artís-
tico, descobre-se que a palavra Kitsch aparece no vocabulário dos artistas
e colecionadores de arte em Munique, em torno de 1860 e 1870 (a partir
de kitschen, “atravancar”, e de verkitschen, “trapacear”, vender outra coisa
no lugar do objeto combinado), o que nos remete ao sentido pejorativo
utilizado até a contemporaneidade, na qual o conceito recebe novas utili-
zações e contextos, como o da pirataria, fenômeno transversal a diversos
segmentos do consumo.
Glossário Pirata
324
Assim, no objeto Kitsch, signo do consumo pós-moderno, cuja função
pragmática é extrapolada pelo anseio de pertencimento, a negação do
autêntico, cópia e artificialidade tornam-se apenas algumas das marcações
atribuídas ao termo, e que são perceptíveis nas artes, na literatura e na
música, no design e produtos de uso cotidiano: de souvenirs, miniaturas
e outros adornos decorativos a eletrônicos e objetos de uso pessoal, como
roupas e acessórios.
A noção do estilo Kitsch se populariza na década de 1930 com os conceitos
de Theodor Adorno (1903-1969), Hermann Broch (1886-1951) e
Clement Greenberg (1909-1994), que o localizam na ideia de oposição
à inovação da arte moderna e a vanguarda. Firmando o conceito marxista
de “falsa consciência”, Adorno associa-o à indústria cultural e da produção
de massa.
Os produtos kitsch da sociedade industrial eram confeccionados, em geral,
a partir de novos materiais que simulavam outros, como a douração em
tinta para imitar o bronze, estabelecendo a dinâmica de utilizar matéria-
prima de qualidade inferior e acessível, alterando a constituição do projeto
original.
Para Lipovetsky (2005), o termo Kitsch pode ser associado ao momento
do surgimento do semi-luxo e do falso luxo. A idade moderna é contem-
porânea da separação entre o autêntico e sem preço e a imitação demo-
cratizada dos modelos. O autor coloca a manifestação do estilo e arte de
viver da burguesia como a primeira forma de democratização do luxo,
que coincide com a difusão social das cópias e dos “ersatz”, do neo-antigo
e de artigos que compensam sua impessoalidade pela redundância, as
ornamentações excessivas. “Na segunda metade do século XIX erguem-
se magazines voltados para o consumo da classe média que permitiu a
fomentação do Kitsch” (Ibid., p. 45). É nesse momento que o conceito
ganha pertinência ao universo da pirataria.
Glossário Pirata
325
Justificamos em Baudrillard (2007, p. 140), o sentido contemporâneo
atribuído ao termo: “O Kitsch revaloriza evidentemente o objeto raro,
precioso e único ( cuja produção pode também tornar-se industrial ). O
kitsch e o objeto autêntico organizam por si só o mundo do consumo,
segundo a lógica de um material distintivo hoje sempre móvel e em
expansão.” E ainda:
“A estética da simulação encontra-se profundamente associada
com a função socialmente assinalada ao kitsch de traduzir a aspi-
ração, a antecipação social de classe, a filiação mágica à cultura,
às formas, aos costumes e aos sinais da classe superior – estética
da aculturação que desemboca na subcultura do objeto.” (Ibid.,
p. 141)
Essa estética, assim, permite a utilização do termo no sentido de mau-
gosto e brega, em virtude da ornamentação rebuscada ou da distorção
de caracterísitcas em relação ao objeto representado (como por exemplo,
os souvenirs turísticos, miniaturas do real ). Faz-se importante também
citar aqueles produtos piratas (que ganham detalhes e alterações
projetuais resultantes da falta de qualidade e desatenção) que apenas reme-
tem a determinado produto, marca e contexto, constituindo, na realidade,
um novo item, derivado da distorção do original, descaracterizando a
cópia fiel mas reforçando a tentativa de parecer com o autêntico, caracte-
rística esta, no entanto, latente no conceito do Kitsch.
Além disso, existem situações de utilização do termo Kitsch que não se
pautam no “estilo marcado pela ausência de estilo” (MOLES, 1971) mas
apenas na simulação, como é o caso do trabalho do fotógrafo David
LaChapelle (classificado paradoxalmente como “propositalmente Kitsch
/brega” e cool ).
Glossário Pirata
326
Referências bibliográficas
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 2007.
LIPOVETSKY, G; ROUX, E. O luxo eterno – Da idade do sagrado ao tempodas marcas. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
MOLES, A. A. O Kitsch. A arte da felicidade. São Paulo: Editora Perspectiva,1975.
www.itaucultural.org.br
327
Knockoff
JÔSE FOGAÇA
Definição
Entre os diversos significados do termo knockoff na língua inglesa, está
aquele em que designa a produção de uma cópia de algo, ou a imitação
sem permissão. É nesse sentido que este termo interessa no contexto do
universo da pirataria.
Contextualização
É comum encontrarmos produtos com design ou nome que arremedam
a algum produto muito conhecido no mercado: os knockoffs. São produtos
que lembram de alguma maneira outros já lançados e com boa reputação.
Um exemplo disso é o “HiPhone”, um telefone com características pare-
cidas com as do telefone da Apple, o
iPhone, não só no nome, mas também no
design e em seu conteúdo.
Fonte: http://www.compredachina.com/super-hiphone-5-dual-chip-wi-fi-2-cameras-desbloqueado-
com-tv-p4592/ (acesso em junho 2013)
Glossário Pirata
328
Giacomini Filho (2011), ao realizar a tipologização de imitações estéticas
na publicidade, caracteriza oknockoffcomo uma categoria não exclusiva
da publicidade e que constitui um tipo muito específico de imitação, que
não se destina, como a princípio se pode supor ao considerar a sua defi-
nição no senso comum, a fazer-se passar pelo original ou induzir seu con-
sumidor a esse erro. Diferente disso, o knockoffvale-se da similaridade com
o original para ser associado a este, mas possui itens que o diferenciam
do seu similar.
O knockoff pode ser considerado um conjunto marca-produto
alusivo a outro já estabelecido no mercado ou uma expressão
promocional que arremeda outra já publicada, caso de Nide, ao
invés de Nike, ou Shel, ao invés de Shell. (...) são itens ligeiramente
diferentes do original, mas não são vendidos como artigos genuí-
nos (cf. BAMOSSY e SCAMMON, 1985; CARVALHO, 2006).
(GIACOMINI FILHO, 2011, p. 220 e 229)
Dessa forma, embora apresente similaridades com outros bens, o knockoff
não é idêntico ao original e possui propriedades próprias, o que impede
que seja tomado como original ou que induza os consumidores ao erro
e, sob este ponto de vista, não se configura como ameaça comercial ao
original, uma vez que sua aquisição se dá por escolha, uma escolha que
considera um benefício superior na imitação. (idem, p. 230)
Na maior parte das vezes o que ocorre é a cópia de um produto ou marca
líder e, em geral, esta não se importa com a imitação, desde que não seja
ofensiva ou agressiva (KOTLER e KELLER, 2006, p. 356, apud GIACOMINI
FILHO, 2011). Neste ponto vale lembrar o fato que é bastante claro no
mercado de luxo da moda, da imitação possuir um efeito benéfico à marca
original, pois ao massificar o produto ou modelo anteriormente exclusivo
e limitado, acelera sua obsolescência e, consequentemente, a inovação e
a busca por novidades da marca (ver ANDERSON, 2009).
Glossário Pirata
329
Trazendo a categoria para o campo da publicidade, Giacomini Filho
(2011, p.230) identifica dois contextos para o knockoff:quando uma
composição publicitaria citaa marca-produto ou quando se vale de expres-
sões retiradas de outras peças promocionais, o que pode ser ilustrado por
casos de pequenos anunciantes que se utilizam de canções de outros anun-
ciantes já estabelecidos, alocando ali a sua marca.
Referências bibliográficas
ANDERSON, C. Free: grátis: o futuro dos preços. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
GIACOMINI FILHO, G. Tipologias de imitação estética na propaganda. InMATRIZes. Ano 4 – nº 2 jan./jun. 2011 – São Paulo, p. 216-238.
MACMILLAN. English Dictionary for advanced learners. Oxford: MacmillanPublishers Limited, 2007.
331
Original
BRUNO POMPEU MARQUES FILHO
Definição
A rigor, o significado da palavra “original”, como seu radical faz supor,
tem a ver com a noção de “origem”. Por essa perspectiva, a palavra
“original”, na sua condição de adjetivo, seria usada, sempre de maneira
complementada (original de algum lugar), para designar aquele objeto
ou aquela pessoa originários de algum lugar ou de algum ponto específico.
A palavra serviria para indicar o início de alguma coisa, o momento do
surgimento de algo, a criação. Por exemplo: “essas flores, tão lindas, são
originais do oriente”; ou: “o poeta fez uma rima totalmente original”.
Quem concorda com essa visão é Stephen Nachmanovitch, violinista e
educador norteamericano, dedicado aos estudos sobre a criatividade. Em
seu livro Ser criativo (1993), o autor afirma: “Ser original não significa
ser diferente de tudo o que já se fez no passado ou está se fazendo no
presente: significa agir de acordo com a origem, com o próprio centro”
(p. 162). Na visão do estudioso, como se nota, a noção de original está
muito mais para a de autêntico, do que para a de diferente.
Glossário Pirata
332
Contextualização
Entretanto, ao menos na língua portuguesa, outros significados são
possíveis de se encontrar neste vocábulo – “original”. A ideia do diferente,
do novo e do inédito são, sim, também associadas à palavra “original”.
Quando se usa, então, esta palavra, nesses sentidos, usa-se como um
adjetivo, sem necessidade de complementação, quase sempre fazendo
denotar a característica de algo ou de alguém que se revela diferente da
maioria, nunca visto antes, desvinculado de padrões ou normas etc. Por
exemplo: “nunca tinha visto uma fantasia tão original”; ou: “tive um
aluno que, de tão original, só apresentava trabalhos surpreendentes”; ou
ainda: “a ideia apresentada naquele congresso era absolutamente original”.
Por outro lado, quando na condição de substantivo, a palavra ganha novos
contornos. Porque original é o nome que se dá ao manuscrito, do qual
depois se fazem livros; porque original é a pintura do artista, que depois vai
ser reproduzida por aí; porque original é tudo aquilo que se relaciona com
a sua origem criativa, com o seu momento de feitura ou elaboração. Ou
seja: “original” é tambémaquele objeto único de que depoissão feitas
cópias. Walter Benjamin, indefectível quando o assunto é a cópia ou a
reprodução de algo, em seu clássico texto “A obra de arte na era da sua
reprodutibilidade técnica”, afirma que “o hic et nunc do original constitui
o que se chama sua autenticidade” (2011, p. 246). É, mais uma vez, a
originalidade e a autenticidade caminhando juntas. Portanto, mesmo
novamente empregada como adjetivo, a palavra “original” também pode
ser usada para denotar aquele objeto que não é cópia, aquele objeto que é
legítimo, verdadeiro, autêntico. Por exemplo: “este CD aqui na banca,
senhor, é pirata ou original?”; ou: “eu jamais compraria uma bolsa original,
tendo cópias tão perfeitas e tão mais baratas por aí”; ou ainda: “ponha um
relógio original ao lado da sua cópia e não se consegue encontrar diferença”.
Glossário Pirata
333
Referências bibliográficas
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da sua reprodutibilidade técnica.In: LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da cultura de massa. 8. ed. São Paulo:Paz e Terra, 2011. p. 239-283.
HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo:Objetiva, 2007.
NACHMANOVITCH, Stephen. Ser criativo: o poder da improvisação na vidae na arte. 2. ed. São Paulo: Summus, 1993.
335
Paródia
CLOTILDE PEREZ
O termo parodiar nos remete à ideia de imitação, arremedo e de contra-
fazer. No entanto, acrescenta, subtrai, transforma, não é mera repetição...
Porque o intuito primeiro não é ser exatamente igual (como em muitas
situações de imitação de personagens ou mesmo de produtos e marcas).
A paródia deixa evidenciar a aproximação, em muitas situações exagera um
traço mais marcante (como os humoristas que parodiam celebridades ou
ainda as infinitas paródias de músicas que se tornaram absolutamente
populares em sites como o Youtube, por exemplo) em tantas outras situa-
ções, subtrai ou transforma aspectos menos relevantes, como os textos pu-
blicitários construídos a partir de clássicas citações científicas ou artísticas.
Contextualização
O termo paródia é utilizado por Linda Hutcheon, em seu livro A Teoria
da Paródia (1985), para designar a recriação de uma obra, modificação
de um texto já existente, por exemplo, podendo ter um caráter irônico,
cômico ou humorístico. Pode ser a simples re-apresentação de um mesmo
discurso, seja ele verbal ou visual construído com tom geral que permite
conectar sem dúvidas à origem, do mesmo modo que evidencia pequenas
adaptações.
Glossário Pirata
336
A paródia não quer confundir, geralmente quer homenagear a referência,
ou pelo menos, lembra-la, por isso que na sua essência sempre será possível
identificar o locusde onde vem a criação. Portanto, guarda bons níveis
de parecença com a origem.
É também entendida como um processo de intertextualidade, com a
finalidade de desconstruir e reconstruir uma ideia, ou seja, aportar nova
interpretação.
Referências bibliográficas
HUTCHEON, Linda. Uma teoria da paródia. Lisboa: Edições 70, 1985
337
Pirataria Moderna
ALHEN DAMASCENO
Pirataria ou pirataria moderna, como alguns denominam, é a prática
de vender ou distribuir produtos sem a expressa autorização dos proprie-
tários de uma marca ou produto. A pirataria é considerada crime contra
o direito autoral e a pena para este delito pode chegar a quatro anos de
reclusão e multa.
Os principais produtos pirateados no Brasil são roupas, calçados, bolsas,
óculos, utensílios domésticos, remédios, livros, softwares e CDs. A pira-
taria é considerada por muitos especialistas como “o crime do século
XXI”. Há uma série de referências que associam a pirataria ao narcotráfico
e também aos grandes grupos organizados e máfias internacionais.
Além de poder frustrar o consumidor nos quesitos qualidade, durabi-
lidade e eficiência, a pirataria de certos produtos, como remédios, óculos
de sol e bebidas, por exemplo, pode representar sérios danos à saúde do
consumidor.
Pirataria moderna se refere a cópia, venda ou distribuição de material
sem o pagamento dos direitos autorais, refere-se também à reprodução
e à comercialização ilegal e em larga escala de obras legitimamente criadas,
de marca e ainda de propriedade intelectual e de indústria – portanto,
quer pela cópia de uma obra anterior (falsificação), quer pelo uso indevido
Glossário Pirata
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de marca ou imagem, com infração deliberada à legislação que protege a
propriedade artística, intelectual, comercial e/ou industrial.
No Brasil, o comércio, a exposição à venda, ou a distribuição de pirataria
é um crime. A Lei 10.695, de 1.o de Julho de 2003 altera partes do
Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 acrescentando ao artigo
184, §4º, que ressalva que a criação de uma cópia pelo copista para uso
próprio e sem intuito de lucro, do material com direitos autorais, não
constitui crime.
Como o Código Penal Brasileiro, em seu artigo 184, parágrafos 1,2 e 3
determina que deve haver o intuito de lucro (direto ou indireto), não
comete pirataria aquele que compra ou faz download de arquivos para
uso privado. E o parágrafo quarto acrescentado pela Lei n° 10.695 ao
artigo 184 do Código Penal Brasileiro, autoriza expressamente a cópia
integral de obras intelectuais, ficando dispensada, pois, a “expressa auto-
rização do titular”.
No Brasil a pirataria fere a licença de copyright e contra ela existe a Lei
Anti-pirataria (10.695 de 01/07/2003 do Código de Processo Penal), que
pune os responsáveis e dependendo dos casos a pena pode chegar a 4
(quatro) anos de reclusão de pena, e multa. Apesar disso, a pirataria é mui-
to praticada no Brasil sendo responsável pela geração de um grande núme-
ro de empregos informais. A Polícia Federal do Brasil mantém operações
permanentes para coibir as diversas modalidades de pirataria.
De acordo com Giacomini (2011) “a pirataria contém ingredientes da
falsificação, caso da imitação ilícita de produtos. Porém, retrata também
a distribuição, venda e fluxo ilegal desses produtos no mercado, o que
inclui a propaganda nesse caso” (GIACOMINI, 2011, p. 227).
Warez, termo derivado da língua inglesa, segunda metade da palavra
software no plural. Primariamente se refere ao comércio ilegal (pirataria)
Glossário Pirata
339
de produtos com direitos autorais. Este termo geralmente se refere à
disponibilização por meio de grupos organizados, fazendo uso das redes
peer-to-peer (entre pares, é uma arquitetura de sistemas distribuídos carac-
terizada pela descentralização das funções na rede, onde cada nodo realiza
tanto funções de servidor quanto de cliente), de compartilhamento de
arquivos entre amigos ou entre grandes grupos de pessoas com interesses
similares. De acordo com o Dicionário Tecnologia e Inovação do
SEBRAE, Warez são softwares distribuídos ilegalmente através da
Internet. O “Z” é proposital, servindo para indicar algo que é ilegal. Pode
ser usado também em outros termos como Gamez (jogos pirateados),
Romz (jogos de videogame que rodam no PC através de emuladores, mas
também ilegais), etc.
Usualmente não se refere ao comércio de software falsificado. Este termo
foi inicialmente cunhado por membros de grupos de usuários de com-
putador do meio alternativo ou clandestino, mas se tornou um termo de
uso comum pela comunidade da internet e da mídia. O termo pirataria
é utilizado por estes círculos para se referir ao uso não autorizado de
propriedade intelectual.
Screener (termo em inglês derivado de screen – tela) é o nome que se dá,
na indústria cinematográfica, a uma cópia de um filme em vídeo ou
DVD, enviada antes do lançamento nos cinemas, aos críticos, jurados
de prêmios, lojas de vídeo (para o gerente e empregados), e outros pro-
fissionais da indústria do cinema, incluindo produtores e distribuidores.
Normalmente, cada cópia “screener” é enviada com marcas distintivas,
o que permite as cópias serem rastreadas até a fonte - o que não impede
sejam fontes de pirataria. No Brasil, o termo Screener é usado para designar
os filmes copiados diretamente da tela do cinema, com gravadores. O
filme geralmente é convertido para formatos de padrão AVI (DivX ou
XviD), e possui uma qualidade de imagem e som inferior aos originais
Glossário Pirata
340
em DVD ou VHS – além de registrar no conteúdo situações típicas de
cinema, tais como pessoas tossindo ou passando diante da tela. Estas
cópias são ilegais, muitas vezes distribuídas por compartilhamento de
arquivos na internet, ou até mesmo objeto de pirataria. O termo deriva
da cópia original, que era enviada a ser ilegalmente copiada – chegando
ao mercado antes mesmo do lançamento oficial de alguns filmes.
Referências bibliográficas
GIACOMIINI, Gino. Matrizes: Revista do Programa de Pós-Graduação emCiências da Comunicação da Universidade de São Paulo – Ano 4, nº2 (jan/jun. 2011), São Paulo: ECA/USP, 2011.
MELO & LEITÃO, Herbat dos Santos, Leonardo Costa (org.). DicionárioTecnologia e Inovação. Fortaleza: SEBRAE, 2010.
Lei 10.695, de 1 de Julho de 2003
Decreto nº 5.244, de 2004
Decreto de 13 de março de 2001
http://pt.wikipedia.org/wiki/Screener
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pirataria_moderna
http://pt.wikipedia.org/wiki/Warez
341
Plágio
LEANDRO BATISTA
Definição
Plagiar é usurpar, roubar a essência criativa de uma obra. No plágio de
uma obra, em alguns casos, os plagiadores, desde que não descobertos,
terão o aproveitamento econômico do crime. Já em outros, como os
estudantes, também se não descobertos, poderão ter o seu aproveitamento
material, ou seja, a nota pretendida. No entanto, esquecem do que deveria
ser verdadeiramente importante nesse processo: a criação de espírito, a
informação e o conhecimento por trás do simples ato de “pensar”.
A origem etimológica da palavra demonstra a conotação de má intenção
no ato de plagiar; o termo tem origem do latim plagiu que significa oblí-
quo, indirecto, astucioso. O plágio é considerado antiético (ou mesmo
imoral) em várias culturas, e é qualificado como crime de violação de
direito autoral em vários países.
Plágio não é a mesma coisa que paródia. Na paródia, há uma intenção
clara de homenagem, crítica ou de sátira, não existe a intenção de enganar
o leitor ou o espectador quanto à identidade do autor da obra.
Glossário Pirata
342
Contextualização:
O Conceito de Plágio Criativo: segundo Gabriel Perissé o plágio criativo
ocorre quando “roubamos’ da seara alheia (de autores conhecidos ou não)
algo que pode tornar o nosso trabalho mais fértil e promissor. Mais ainda:
devemos ser tão bons ladrões que ninguém perceba que fizemos com o
alheio algo melhor. O plágio criativo perfeito é quando o roubo é seguido
de “assassinato”, e nem precisamos citar a vítima, cuja alma absorvemos
e cujo corpo escondemos dentro do nosso próprio texto”.
O plágio criativo é uma imitação inteligente de versos e metáforas, de
idéias e frases, de resultados e conclusões de outros autores. Esse processo
criativo é utilizadíssimo pelos grandes escritores, que são ao mesmo tempo
grandes leitores e descobriram o óbvio: nada existe de novo sob o sol...
Frase que o autor do Eclesiastes deve ter copiado de algum outro escritor
(PERISSÉ, G, 2003, p. 78)
A tentação do plágio: Para expiação do pecado capital do mundo do
conhecimento que é o plágio, um primeiro passo pode ser a simples
confissão. Nos livramos da culpa do plágio citando a fonte de uma
informação ou argumento.
Quando um autor perde a capacidade de resistir ao mal o plágio se con-
suma. O ato de plagiar é então considerado um crime hediondo. Em seu
julgamento o réu será acusado de premeditação, falta de escrúpulos, deso-
nestidade, falta de ética profissional. Aos poucos os argumentos conde-
natórios resvalarão para o campo da moral. No comportamento anterior
do réu serão buscados indícios de vileza, vulgaridade e lascívia. Com tão
pungente peça acusatória o veredicto final só poderá ser a condenação
ao ostracismo intelectual.
Glossário Pirata
343
É claro que a defesa poderá sempre alegar que o crime foi passional,
argumentando que o acusado não resistiu a um impulso irracional de
apropriação indevida da criação alheia e agiu por amor, não por inveja
ou cobiça.
Se um texto é uma espécie de filho que colocamos no mundo, a moral nos
ensina que o melhor é que não seja fruto de um incesto. O plágio é um in-
cesto que realizamos com um irmão ou irmã de ofício, que nos seduziu atra-
vés do seu texto. A atração por plagiar é como um desejo incestuoso do qual
nos afastamos se resignando à imperfeição do nosso próprio texto.
Quer seja o plágio considerado como um vulgar crime motivado pela falta
de ética, ou como um ato passional, e até mesmo um incesto, no mundo
das letras não conseguimos evitar um sentimento misto de repulsa e
compaixão pelo criminoso plagiário, considerado mais uma pobre vítima
de uma tentação demoníaca.
Ao autor considerado pelos pares como sério, consistente e inovador pode
ser relevada uma falta até grave em sua vida privada. Dificilmente, porém,
lhe será concedido o perdão por um plágio comprovado e às vezes apenas
presumido.
Podemos, então, concluir que uma interdição tão severa como a que paira
sobre o ato de plagiar só pode mesmo ser explicada pela existência de um
desejo de transgressão que tenha a mesma intensidade (in PRAXEDES,
2009).
Glossário Pirata
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Referências bibliográficas
PERISSÉ, Gabriel. O conceito de plágio criativo. Revista Técnica FIPEP –Instituto Paulista de Ensino e Pesquisa, São Paulo, vol. 3, n. ½, , p. 73/88, jan/dez/2003.
PRAXEDES, Walter. Revista Espaço Acadêmico (on line) O intelectual semqualidades. Revista Espaço Acadêmico (UEM), v. n.100, p. 23-26, 2009.
http://www.infoseg.gov.br/arquivos/o-plagio-e-crime
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pl%C3%A1gio
345
Réplica
GABRIELA AYER
Réplica é um exemplar que não é original; imitação. Cópia fiel confec-
cionada de um objeto, imagem ou criatura real, normalmente de obra
de arte.
É possível conseguir réplicas de praticamente todo o tipo de obras de arte,
como escultura, pinturas, inscrições, livros antigos, moedas, armas,
molduras, etc. Normalmente, se faz réplicas de trabalhos de arte conhe-
cidos e apreciados por todo o mundo, de grandes mestres como
Michelangelo, Van Gogh, Rembrandt, Picasso, Da Vinci, Rodin, entre
outros.
Podem-se considerar dois tipos de réplicas:
• De alta qualidade para substituição dos originais duma forma perfeita.
Busca-se a máxima fidelidade ao original, com atenção a todos os
detalhes como materiais, colorações e técnicas. Deve-se ter atenção que,
sob o ponto de vista estrutural, haja forma de distinguir a réplica do
original.
• Comerciais, que embora de boa qualidade, não reproduzem em abso-
luto o original. Não carecem do rigor técnico de reprodução precisa
da obra. Por vezes fazem-se adaptações de ordem prática a fim de trans-
Glossário Pirata
346
formarem as réplicas em objetos de uso decorativo, assim, podem ser
confeccionadas em outro material que não o do originalou mesmo em
técnica diferente (gravuras de uma pintura, por exemplo) para viabilizar
a tiragem em grande número. Muitas vezes são feitas em dimensão
reduzida, ou seja, são também miniaturas.
Contextualização
Mas existem museus, institutos e fundações de artistas que fazem réplicas,
de obras de arte utilizando as formas originais, ou seja, as mesmas que o
artista usou, como “tiragens pós morte”, que são documentadas (inclusive
com marcas na própria obra) e só podem ser realizadas se houver um
documento com autorização do artista. Estas tiragens só são feitas de:
gravuras (litogravura, xilogravura, silk, etc.), esculturas em metal, e de
obras de arte contemporânea que existem como projeto (podendo assim
ser executadas sem a presença do artista).
A construção de réplicas é usada com várias finalidades:
SEGURANÇA – Substituição de originais por réplicas fiéis a fim de reduzir
os riscos de roubo ou vandalismo. Pode ser exposta no Museu detentor
da obra original ou emprestada para exposições em outros locais.
CONSERVAÇÃO – Substituição das obras expostas em áreas externas a fim
de evitar a degradação física das originais, muitas vezes por causa das
condições climáticas.
Outro uso de réplicas, ligado à conservação, refere-se a obras interativas,
obras de arte que foram produzidas para serem manipuladas. Neste caso
é permitido que o público toque as réplicas, preservando dessa forma as
peças originais.
Glossário Pirata
347
Isso não é muito comum e existem várias discussões a esse respeito até
porque em algumas obras a reprodução é impossível, como o caso de telas,
nas quais a pincelada é a assinatura do artista, e por melhor que seja a
réplica sempre estará muito distante do original.
DIFUSÃO – Para disseminar a cultura e o conhecimento das artes, ou da
obra específica.
Costuma-se fazer réplicas de obras de arte para atividades de arte-educação
para pessoas com deficiência visual, por exemplo. Permitindo que essas
pessoas conheçam a obra através do tato.
Referências bibliográficas
BELOTO, Carlos. Ementa da Oficina de Mosaico e Réplicas (2007/ 2008).Instituto de Artes e Ofícios da Universidade Autônoma de Lisboa.
LAVEZZO, Ariane (restauradora do Museu de Arte Contemporânea daUniversidade de São Paulo – MAC USP). Entrevistada por Gabriela Ayerde Oliveira. São Paulo, Brasil: 19 jan. 2010.
349
Reprodução
MARCOS HILLER
Definição
Reprodução é um conceito amplo que está vinculado a: 1) ato ou efeito
de reproduzir-se (produzir de novo); 2) imitação de quadro, fotografia,
gravura, etc. (exemplo: indivíduo comprou uma reprodução do Van
Gogh); 2.1) imitação fiel, cópia de obra de arte que tem sua divulgação
autorizada pelo autor; 2.2) estampa feita mecanicamente a partir de um
original (como acontece nas lojas dos inúmeros museus mundo afora);
3) traduzir com fidelidade, imitar, copiar 4) inserir em jornal ou revista
trecho extraído de outra publicação
Reprodução também conecta-se ao ato de copiar um ou mais exemplares
de uma obra literária, artística ou científica. Já em Biologia, reprodução
refere-se à função através da qual os seres vivos produzem descendentes,
dando seguimento à sua espécie, sem qualquer conotação de cópia no
sentido negativo, mas sim de continuidade.
Segundo Walter Benjamin (1996, p. 165) “na reprodução pelas mãos
do homem, o original não sofre abalos em sua autoridade, conservando-
se intacto. Com os meios de reprodução técnica, há uma interferência
direta no núcleo do original”. O filósofo instala a interferência da técnica
no processo de perda da aura da originalidade.
Glossário Pirata
350
Contextualização
Abreu (1968) lembra que na esfera da comunicação a reprodução é ine-
rente a atividade comunicacional. No caso da reprodução musical, tanto
em termos de interpretação como sonorização, há nessa atividade artística
e comercial a divulgação e difusão licita das obras criadas. (GIACOMINI,
2011, p. 218).
No entanto, o outro lado da reprodução está na apropriação de obras e
direitos de forma a trazer danos a outrem. E a duplicação, copia, ou repro-
dução que envolve, por exemplo, plagio de trabalhos escolares, falsificação
de documentos e comercialização de ideias profissionais.
Referências bibliográficas
BENJAMIN, Walter. Magia e Técnica, Arte e Política. Cap. “A obra de arte naera de sua reprodutividade técnica”. São Paulo: Brasiliense, 1996, p. 165-196.
FILHO, Plínio Martins. Artigo “Direitos autorais na Internet”. Ci. Inf., Brasília,v. 27, n. 2, p. 183-188, maio/ago. 1998.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_autoral
http://pt.wikipedia.org/wiki/Reprodu%C3%A7%C3%A3o
351
Screener
ALHEN DAMASCENO
Termo em inglês derivado de screen – tela. É o nome que se dá, na
indústria cinematográfica, a uma cópia de um filme em vídeo ou DVD,
enviada antes do lançamento nos cinemas, aos críticos, jurados de
prêmios, lojas de vídeo (para o gerente e empregados), e outros
profissionais da indústria do cinema, incluindo produtores e distri-
buidores. Normalmente, cada cópia “screener” é enviada com marcas
distintivas, o que permite as cópias serem rastreadas até a fonte - o que
não impede sejam fontes de pirataria.
No Brasil, o termo Screener é usado para designar os filmes copiados
diretamente da tela do cinema, com gravadores. O filme geralmente é
convertido para formatos de padrão AVI (DivX ou XviD), e possui uma
qualidade de imagem e som inferior aos originais em DVD ou VHS –
além de registrar no conteúdo situações típicas de cinema, tais como
pessoas tossindo ou passando diante da tela. Estas cópias são ilegais,
muitas vezes distribuídas por compartilhamento de arquivos na internet,
ou até mesmo objeto de pirataria. O termo deriva da cópia original, que
era enviada a ser ilegalmente copiada – chegando ao mercado antes
mesmo do lançamento oficial de alguns filmes.
Glossário Pirata
352
Warez
Termo derivado da língua inglesa, segunda metade da palavra software
“ware”, no plural. Primariamente se refere ao comércio ilegal (pirataria)
de produtos com direitos autorais evidentes. Este termo geralmente se
refere à disponibilização por meio de grupos organizados, fazendo uso
das redes peer-to-peer (entre pares, é uma arquitetura de sistemas
distribuídos caracterizada pela descentralização das funções na rede, onde
cada nodo realiza tanto funções de servidor quanto de cliente), de
compartilhamento de arquivos entre amigos ou entre grandes grupos de
pessoas com interesses similares. De acordo com o Dicionário Tecnologia
e Inovação do SEBRAE, Warez são softwares distribuídos ilegalmente
através da Internet. O “Z” é proposital, servindo para indicar algo que é
ilegal. Pode ser usado também em outros termos como Gamez (jogos
pirateados), Romz (jogos de videogame que rodam no PC através de
emuladores, mas também ilegais), etc.
Referências bibliográficas
GIACOMIINI, Gino. MATRIZes: Revista do Programa de Pós-Graduação emCiências da Comunicação da Universidade de São Paulo – Ano 4, nº 2(jan/jun. 2011), São Paulo: ECA/USP, 2011.
MELO & LEITÃO, Herbat dos Santos, Leonardo Costa (org.). DicionárioTecnologia e Inovação. Fortaleza: SEBRAE, 2010.
Lei 10.695, de 1o de julho de 2003
Decreto nº 5.244, de 2004
Decreto de 13 de março de 2001
http://pt.wikipedia.org/wiki/Screener
http://pt.wikipedia.org/wiki/Warez
353
Simulacro
BRUNO POMPEU
Definição:
“Simulacro” quer dizer simplesmente representação, semelhança,
parecença ou imitação. Só que, até mesmo no dicionário, já se encontra
um tom crítico nas definições. Porque, segundo o Houaiss, “simulacro”
é também a cópia malfeita ou grosseira e o arremedo.
Contextualização:
Pensando em uma acepção mais profunda e chegada à filosofia, não se
pode deixar de citar Jean Baudrillard, autor do famoso Simulacros e
simulação (1991). Não é o primeiro livro em que o autor se dedica à
questão do simulacro. Mas é nessa obra que Baudrillard dá ao termo
contornos mais contemporâneos e questionadores. Partindo da idéia mais
aceita de que o simulacro seria a representação de alguma coisa – de
alguma situação, de algum lugar, por exemplo –, o autor desenvolve seu
raciocínio no sentido de mostrar como, hoje, já não se tem mais neces-
sariamente a existência dessa coisa representada. É o que ele chama de
“precessão do simulacro”. Ou seja: cada vez mais o simulacro vem
Glossário Pirata
354
antecedendo a realidade. E por que não se poderia dizer, talvez, que o
simulacro, na contemporaneidade, vem prescindindo do real?
Outro autor que merece destaque é o espanhol Eduardo Subirats. Seu
livro A cultura como espetáculo (1989) também aborda a questão do
simulacro, só que a partir de um ponto de vista mais crítico e em um
tom muito mais inconformado. Para o autor, o simulacro está direta-
mente ligado à alienação. Ao considerar a televisão uma das formas de
espetáculo mais fortes do nosso tempo, por exemplo, Subirats nos mostra
o seu poder (da televisão) de criar uma nova dimensão do real, que
substitui a experiência real e a vivência subjetiva. A partir das imagens
espetaculares produzidas pela TV, pela computação gráfica etc., teria mais
importância o simulacro do que a realidade. Só existe o simulacro. O que
deve existir, para existir, deve estar no simulacro. O que está fora do
simulacro não existe.
Protestaremos em vão que esses olhos do mundo que são as telas da
mídia nos usurpam, dia a dia, um pedaço da nossa visão, pois o
simulacro midial é universal e, diante do reino absoluto da sua
irrealidade, nossa existência e nossa experiência particulares se diluem
como a nulidade de um átomo na infinitude do cosmos. (SUBIRATS,
1989: 73).
Referências bibliográficas
BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. Trad. Maria João Pereira.Lisboa: Relógio d’água, 1991.
HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo:Objetiva, 2007.
SUBIRATS, Eduardo. A cultura como espetáculo. Trad. Eduardo Brandão. SãoPaulo: Nobel, 1989.
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A linguagem cotidiana no campo pirata:novos aprendizados
O trabalho de campo nos centros de consumo pirata nos trouxe impor-
tante conhecimento acerca de novos termos utilizados no dia a dia dessas
relações. Trata-se de um repertório metafórico e rico na potência de sen-
tido que é compartilhado pelas pessoas nos centros visitados, configu-
rando-se como um código próprio, mas que não alija ao contrário está
em diálogo. Vejamos os mais recorrentes e significativos.
Paraquedas: refere-se ao vendedor que usa um pano estendido no chão,
com cordas amarradas às quatro pontas, que podem ser puxadas
quando aparece a fiscalização;
Figura 1: paraquedas:exposição no paraquedaspara venda de controleremoto: facilidade e rapidezde locomoção.
Glossário Pirata
356
Camelô: pessoa que vende seus produtos na rua, em barracas desmon-
táveis, em suportes móveis ou mesmo nas calçadas. Pode vender
os artigos mais variados.
Figura 2: camelôs na Rua 25 de Março em São PauloFonte: Foto acervo GESC3
Loja: estabelecimento que tem as portas voltadas para a rua e que geral-
mente vendem produtos menos populares. Em muitos casos tam-
bém fazem uso do espaço público – calçada – para expor seus
produtos e ofertas.
Figura 3: Loja com utilização de expositores nacalçada. Saara, Rio de Janeiro
Fonte: foto Clotilde Perez
Glossário Pirata
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Galeria: imenso estabelecimento (às vezes com vários andares), com
portas para a rua, cujos corredores são forrados de “boxes” menores,
geralmente comandados por chineses ou coreanos;
Olheiro: pessoa que fica (geralmente nas esquinas) verificando se a
fiscalização está se aproximando e tem a função de avisar os demais;
Puxador: pessoa que fica na calçada, falando com os que passam por ali,
tentando levá-los para as lojas de dentro das galerias. Ganham
comissão por pessoa levada e que compre algo na loja;
Homem da escada: pessoa que fica na calçada, no alto de uma escada
típica daquelas utilizadas na construção civil, olhando para dentro
da loja para fiscalizar furtos (substitui uma câmera, por exemplo);
Figura 4: Homem da escada.Saara, Rio de Janeiro.
Fonte: foto Clotilde Perez
Glossário Pirata
358
Rapa: qualquer tipo de fiscalização ou representante das diferentes
instâncias do Governo (Guarda Civil Metropolitana, Polícia
Federal etc.);
Vendedor de perfume: vendem seus produtos em carrinhos de mão
(como os de pedreiro), cada um embalado separadamente em uma
bandeja de isopor (como utilizados nos açougues e supermercados
para embalar carnes).
Figura 5: Carrinho demão utilizado paratransporte e venda deperfumes. Rua 25 deMarço, São Paulo.Foto: Clotilde Perez
Glossário Pirata
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Réplica / Réplica de primeira linha: produto pirata, de qualidade similar
ao original, às vezes feito pela mesma fábrica que produz os
originais, sendo bastante difícil distingui-lo destes. Muitas vezes
apresenta etiquetas similares ou mesmo as próprias originais.
Figura 6: Camiseta Lacoste com logotipo bordado, símbolo e etiquetasFonte: acervo GESC3
Cópia / Réplica de segunda linha: produto pirata, de qualidade inferior,
facilmente reconhecido como tal. O material (por exemplo, couro
sintético em vez de couro de boi) e os detalhes (zíper de bolsas,
estampas mal impressas, fechos etc.), além dos símbolos e logotipos
estão mal apresentados e, por isso, são visivelmente diferentes e cla-
ramente inferiores que os originais.
Glossário Pirata
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Figura 7: copia de calça da marca Versace com utilizaçãode logotipo e símbolos distorcidos
Fonte: acervo GESC3
Figura 8: cópia de segunda linha: simulação do logotipo da grife Dolce &Gabbana – troca da letra “G” pela “C”.
Fonte: acervo GESC3
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