pedido (conto) - danilo passos

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pedido conto de Danilo Passos

- Vamos nos casar? Perguntei. Ele ficou mudo. - Não podemos fazer isto. Ele respondeu.- Sei que pessoas como nós, não se casam. Ele ficou mudo. - Não é isto. - Então, o que é?Minha mão se aproximou da dele. As árvores balançavam as flores. O sol estava querendo se esconder. - Não existe casamentos ilusórios. Não entendi. Depois, entendi. - Casamento é ilusão?Ele desviou os olhos. - É?- Não. Casamento é a forma mais verdadeira de demonstrar o sentimento. - Mas o sentimento é ilusão. - Depende. Ele amava enigmas. Eu amava os seus olhos. Os ventos balançavam as flores. - O que depende? Perguntei. Voltei minhas mãos para o meu colo. - Nem todos os sentimentos são ilusões. - Então, vamos nos casar!Fui direto. Joseph era direto às vezes. Eu, fui.

- Não podemos. Respondeu novamente. Minhas mãos voltaram para o seu encontro. - Mas pessoas como nós podem se casar.- Eu sei disso, Marcos.- Então, vamos!- Não temos idade. Tenho doze anos. - Eu tenho treze e sei o que é um casamento. - Estás dizendo que és adulto?- Eu sou um adulto?- Não parece. Joseph engoliu o sorriso. Eu, sorri. - Não somos adultos, porém sentimos como os adultos. - O que sentimos?- Amor. - Os adultos sentem amor?- Minha mãe diz que sim.- Minha mãe diz que não. Meu pai, um dia, saiu de casa chorando e nunca mais voltou. E minha mãe não liga mais para o meu pai. Fiquei pensativo. - Eles não se veem? - Não. - Mas sua mãe fala sobre ele?- Fala sim, principalmente, sobre o passado. - Ah, então é amor. Sua mãe está equivocada. Amor é falar do passado. Sorri. Joseph apenas me olhou e desviou o olhar. - Eu sempre falo de você para minha mãe. - O que isso tem a ver?- Que eu te amo. Por exemplo, todos os dias de manhã, eu falo o que você fez no

dia anterior para a minha mãe. - E por que você faz isso?Joseph soltou um sorriso bobo. - Porque amor é falar do passado. Sorri. - E sua mãe? Ele perguntou. - O que tem?- Ela não acha... “estranho”?- Por que ela acharia estranho?- Minha mãe sempre diz que o mais bonito é quando um homem fala de uma mulher ou vice-versa. Ela fala que isto é um romance. - Sua mãe é equivocada sobre o amor, como ela pode falar de romance?- Não sei. Joseph revirou os olhos.- E então, vamos nos casar?Perguntei. - Já lhe disse que não existe casamentos ilusórios. - Sim. E o que isto tem a ver?- Não sei como te explicar. - Tudo bem. Tirei minhas mãos próximas dele. Deveria ter as mantidas. Mas, tirei-as. Ficamos em silêncio por um pequeno momento. - Mas, afinal, o que é casamento ilusório?Perguntei. Joseph olhou para mim.- Não sei, Marcos. - Nós podemos ter um casamento ilusório?- Acho que não é casamento.

- Casamentos ilusórios são de pessoas que se amam?- Uma vez, meu tio falou que a ilusão sempre existe a partir do amor.- Ah, então, deve ser. Joseph sorriu. Eu sorri, mais. Ficamos em silêncio por mais alguns minutos. - Será que os adultos vivem casamentos ilusórios? Perguntei. - Não sei.- Eu acho que os adultos vivem casamentos, por isso quero casar com você. - Meus pais não são casados, Marcos. - Mas é que sua mãe não sabe o que é o amor. - Será?- Sim. Vai por mim. - Mas nós não somos adultos. - Já lhe disse, tenho treze anos e sei o que é casamento. Nós seremos adultos e já casados. - Não sei...- Eu sei. Pois, casamento, como você disse, é a forma mais verdadeira de de-monstrar o sentimento.Eu iria fazer o pedido de casamento pela terceira vez, porém ouvi de fundo a voz da mãe de Joseph que o chamou para dentro de casa. O sol estava se pondo. Ele se despediu rapidamente e partiu.

Atualmente, Joseph tem vinte e oito anos, é casado com Marcela e tem um filho. Talvez seja por isso que não nos casamos: eu nunca entendi o que era um casa-mento ilusório. Ele sempre soube. No fim das contas, ele era um adulto.